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Homenagem aos 75 anos de Luiza Soares de Jesus
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(Registro no.605.261 – Escritório de Direitos Autorais da
Fundação Biblioteca Nacional- Ministério da Cultura)
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Luiza Soares de Jesus
Nascida aos 21 de março de 1921, LUIZA SOARES
DE JESUS completa agora setenta e cinco anos de idade.
Uma foto de 1943, aqui reproduzida, mostra a transparên-
cia de seus olhos, na realidade azuis, contrastando com os
cabelos escuros. Hoje, os olhos se parecem ainda mais
azuis, os cabelos, porém, tingiram-se de branco, como uma
coroa serena pela vida de luta e força de vontade.
Em 1941, casou-se com GERALDO RODRIGUES
CÂMARA em Formiga, MG. A cidade já era quase centenária,
pois fora fundada aos 6 de junho de 1858. Apesar disso,
era tão pacata com relação ao mundo da época, quanto o é
com relação ao de hoje. A vida era difícil, situação agravada
pela guerra que explodia na Europa. Luiza e Geraldo inicia-
vam a vida conjugal tirando o sustento familiar de uma
pequena porta de comércio que mantinham.
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Nasceram-lhes os três primeiros filhos.
Na década de cinqüenta, Juscelino Kubistchek
iniciava a construção de Brasília, atraindo para lá muitas fa-
mílias mineiras. Luiza e o marido foram buscar melhores
oportunidades naquela região. Estabeleceram residência em
Anápolis, GO, onde permaneceram por cinco anos.
Mais dois filhos nasceram naquelas paragens.
O retorno para Formiga, em 1958, afetou a
estabilidade econômica da família. Geraldo, então, decidiu
retomar os negócios que deixara no Brasil Central. Partiu
sem a família. Mas as rodas da fortuna não o favoreceram
nessa segunda vez.
O tempo passou, desfazendo laços...
Luiza, desamparada, armou-se para uma guerra
5
santa: criar os filhos que trouxera ao mundo. Alimentou-os
com fé, dignidade, coragem, princípios esses de que é de-
positária inesgotável. O suprimento material teve
momentos críticos. Porém, sobrevive-se a essa falta,
estando presentes aqueles outros elementos. Mas essa é
uma história que só ela poderia contar, pois somente o
silêncio de seu coração a vivenciou, sofreu e registrou por
inteiro. Ainda que tenha tido êxito em sua luta, não soaria
elegante, agora, relembrar fatos e circunstâncias que o
tempo se encarregou de tornar distantes e indolores.
Este livrete, embora vasculhe o tempo à procura
do passado, pretende focalizar outra história: a genealogia
da família de LUIZA SOARES DE JESUS.
Não desfilarão aqui grandes personagens, nem
fatos importantes, mas pessoas e circunstâncias comuns,
abrangidas por ideais igualmente simples, como o trabalho,
a educação e a religiosidade.
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Um estudo detalhado sobre esses antepassados
será posto num livro, cuja conclusão depende da difícil co-
leta de dados sobre pessoas que viveram há cem, duzentos
e mais anos. Dificuldade essa que não é apenas atual. Para
se ter uma idéia, em 1823, ou seja, há mais de cento e
setenta anos, quando FRANCISCO XAVIER GOULART, um tri-
savô de LUIZA SOARES DE JESUS, deveria comprovar sua
condição de batizado para se casar, não encontrou o
assento respectivo nos livros paroquiais da época. Reuniu
algumas pessoas para testemunharem perante o vigário de
Piumhí que, de fato, ele havia recebido o batismo por
ocasião de seu nascimento em 1790. Redigiu-se, então, um
termo:
"Em [mil e setecentos e] noventa
batizou solenemente e pôs os san-
tos óleos o Reverendo Vigário Mi-
guel de Albuquerque a FRANCISCO
filho legítimo de Francisco Xavier
Goulart e Rosa Joaquina. Foram
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padrinhos Francisco José Ferreira e
D. Umbelina Rosa. E por não ter en-
contrado o próprio assento que,
bem informado por pessoas dignas,
abri o presente [termo] que assino,
Vigário José Severino Ribeiro."
Assim, a história aqui narrada, além de resu-
mida, contém lacunas que pesquisas futuras poderão, even-
tualmente, sanar. Portanto, não é um trabalho definitivo,
mas foi feito com um destino exclusivo: as mãos e os olhos
de LUIZA SOARES DE JESUS, como um presente pelo trans-
curso do seu 75º aniversário.
Ao ler estas palavras que ela filtre daqui
uma homenagem, uma manifestação de gratidão, carinho e
amor de todos seus filhos e netos.
Feliz Aniversário!
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FORMIGA, MG
Não se pode desvincular a genealogia de
LUIZA SOARES DE JESUS da história de Formiga. Tanto pelo
lado paterno, como pelo materno, a família está arraigada
na região há mais de um século e meio, ou seja, quando se-
quer existia aqui uma vila.
Um grande número de povoados surgiu em
Minas Gerais entre 1650 e 1690 com a descoberta do ouro.
Não foi o caso de Formiga, pois aqui não se encontrou o
precioso metal. Mas a região era cortada por tropeiros e
aventureiros que tinham como destino as minas em
Paracatu e Goiás. Esse caminho era a famosa "Picada de
Goiás", ao longo da qual foram surgindo os primeiros
arraiais. A data do aparecimento do primeiro rancho às
margens do ribeirão, que veio a se chamar "das Formigas", e
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o nome de quem o construiu talvez jamais sejam conheci-
dos. Mas do Dicionário Histórico e Geográfico de Minas
Gerais, do Dr. Waldemar de Almeida Barbosa, colhem-se
algumas informações sobre as origens da cidade:
"...é uma das raras cidades minei-
ras que conservam o nome dado
pelos primeiros povoadores da re-
gião. Realmente, as sesmarias con-
cedidas ali, antes da ereção da
capela, fazem menção da paragem
chamada a Formiga. Assim a de
Antônio Gonçalves Lopes, de 1768,
e a de Domingos Antônio da Silvei-
ra, de 1777. Também numa carta
do Conde Valadares ao Capitão-
Mor do Tamanduá, de 1769, há
menção de nomes de indivíduos
'moradores no sertão chamado da
Formiga'..."
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Há três versões sobre a origem desse curio-
so nome de cidade. A primeira está relacionada com os tro-
peiros que se arranchavam às margens de um ribeirão e ti-
nham suas cargas de açúcar atacadas por formigas, resul-
tando daí a denominação Rancho, ou Sítio, das Formigas. O
nome passou ao riacho, Ribeirão das Formigas, e depois ao
povoado.
Outra versão diz que o nome é decorrente
dos índios que habitavam a região, por terem o costume de
se alimentarem de uma espécie de formiga, as tanajuras ou
içás.
Finalmente, segundo Djalma Garcia Campos,
o nome foi dado pelos pioneiros de origem açoriana, que
repetiam na região os topônimos de sua terra natal. Assim,
São Miguel, hoje chamada Calciolândia, copiou o nome da
maior ilha do Arquipélago dos Açores. Furnas também de-
nomina um lago na Ilha de São Miguel. A hoje cidade de
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Candeias teve seu nome a partir de N.S. das Candeias,
padroeira da Ilha do Pico. Nessa linha, chegou-se a Formiga,
cuja região lembrava aos pioneiros os Ilhéus das Formigas,
localizados entre as ilhas de São Miguel e a de Santa Maria.
"Depois que surgiu a capela, as ses-
marias já fazem menção à aplica-
ção de São Vicente de Ferrer de For-
miga. Esta capela, dedicada a São
Vicente de Ferrer, foi erigida de
conformidade com a previsão
episcopal de 13 de abril de 1780"
No livro nº 119 do Arquivo Diocesano de
Divinópolis, há um assento de batizado que certamente
terá sido um dos primeiros realizados na Capela de São Vi-
cente de Ferrer:
"Aos sete de janeiro de 1771, o re-
verendo Pe. Dr. Salvador Pais Godoi
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batizou solenemente a Vicente, fi-
lho natural de Ana de Barros.
Foram padrinhos o Capitão José de
Sousa Souto e Ana Roza de Jesus. E
para constar mandei fazer este as-
sento."
O naturalista francês, Auguste de Saint-
Hilaire, passou pelo povoado de Formiga por volta de 1819
e no relato que deixou, "Viagem às Nascentes do Rio São
Francisco", dá indicação das remotas origens da cidade:
".O povoado estava então com pou-
co mais de mil habitantes, uma
quarta parte dos quais, aproxima-
damente, era constituída por pes-
soas da raça branca. Entretanto,
em meados do século anterior o
arraial ainda nem existia. Conheci
um ancião que fora o primeiro a se
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estabelecer ali, em 1749, ocasião
em que se iniciou a construção de
uma capela."
O francês não registrou o nome do ancião e
a história de Formiga perdeu um significativo dado. Leo-
poldo Correia, médico e historiador, em seu "Achegas à
História do Oeste de Minas", entendeu que o ancião mencio-
nado pelo gaulês talvez fosse o Sargento-Mor João Gonçal-
ves Chaves, cuja provisão foi concedida aos 11 de março de
1765.
Seguindo a cronologia histórica da cidade,
em 1832, criou-se a Paróquia de São Vicente de Ferrer. O
censo demográfico de 1838 revelou que o arraial e região
contavam com 6290 habitantes. No ano seguinte, foi
elevado à condição de vila com o nome de Villa Nova de
Formiga e, pela Lei 880 de 6 de junho de 1858, fundou-se a
cidade.
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15
AS ILHAS
Assim como Formiga é importante na his-
tória da família, algumas ilhas portuguesas, perdidas no
meio do Oceano Atlântico, também o são.
Antes de descobrir o Brasil, em 1500, os
portugueses já haviam colonizado as ilhas que compõem
os arquipélagos da Madeira e dos Açores. O primeiro dista
800 quilômetros da costa portuguesa e o segundo, 1500.
Em razão dessas distâncias, consolidou-se nas ilhas uma
vida social distinta da de Portugal, com costumes diferen-
ciados e influências novas. Para se ter uma idéia, os Açores
receberam grande número de holandeses, gente clara, de
olhos azuis, cabelos louros e nomes estranhos. Já para Ma-
deira, além de estrangeiros europeus, foram levados escra-
vos negros e mouros.
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O desenvolvimento das ilhas foi rápido e a
população cresceu muito. Por volta de 1529, já se falava em
superpopulação, principalmente nos Açores. Por isso, João
de Mello da Câmara, Governador da Ilha de São Miguel,
escreveu ao Rei D. João III, pedindo doação de terras no
Brasil para onde pretendia levar dois mil moradores das
ilhas:
"omens de muinta sustança e pes-
soas muy abastadas e que podem
cosigo llevar muitas eguas, cavalos,
gados e todallas cousas necessarias
para frutyficamento da terra".
Mais tarde, aqui do Brasil, D. Lourenço de
Almeida escrevia ao Rei de Portugal, sugerindo que facili-
tasse a vinda de famílias açorianas para Minas. Em sua
carta datada de 19 de abril de 1722, ele dizia:
"... nestas Minas não haviam mu-
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lheres brancas que houvessem de
casar e agora se faz necessário pôr
na real presença de Vossa Majesta-
de que pela experiência que tenho
deste país e pelo modo de viver de
seus habitantes, me parece ser mui-
to conveniente ao real serviço de
Vossa Majestade que se faça toda
diligência porque se introduzam
nelas os mais casais que for possí-
vel introduzir-se, assim porque
todos estes moradores são moços
solteiros e por esta causa menos
obedientes (...) das Ilhas Terceiras é
que podiam vir muitos casais para
estas Minas, assim pela abundância
que há deles nas ditas ilhas, como
pela muita terra que tem estas Mi-
nas..."
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O Rei de Portugal, então, estabeleceu
um incentivo de emigração aos casais açorianos, repre-
sentado por instrumentos e ferramentas de trabalho, con-
cessão de terras e isenção aos filhos de prestarem serviço
militar. Além disso, a situação ficara mais precária nos
Açores em razão de erupções vulcânicas que inutilizaram
grandes áreas de plantio, deixando o solo inadequado para
novas culturas.
Assim, entre 1710 e 1730, JOSÉ GARCIA
PEREIRA, natural da Ilha do Faial e MANOEL MONIS DA
CÂMARA, originário da Ilha da Madeira, chegavam ao Brasil,
fixando-se em Minas Gerais.
Duzentos anos mais tarde, em Formiga,
LUIZA SOARES DE JESUS, uma descendente do pioneiro
açoriano, casou-se com GERALDO RODRIGUES CÂMARA,
descendente do madeirense.
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José Garcia Pereira
JOSÉ GARCIA PEREIRA, pentavô de
Luiza, natural da Ilha do Faial, certamente beneficiou-se do
incentivo, vindo para Minas. Através das informações
apuradas, não se detecta nele intenção de procurar ouro,
sua vocação era efetivamente a agropecuária. Veio para o
novo mundo motivado a se estabelecer em definitivo, cons-
truir o futuro e não simplesmente procurar uma suposta
fortuna fácil.
Pode-se imaginar como terão sido difí-
ceis aqueles tempos. Depois de meses de viagem por mar,
chegavam a Bahia ou ao Rio de Janeiro, enfrentando, logo a
seguir, uma penosa viagem por terra. Em Minas, pro-
curavam as autoridades para se informarem sobre a loca-
lização das prometidas terras que, com certeza, não se
situavam perto das vilas e povoados, nem de regiões ricas
em ouro, mas sertão adentro, longe de tudo, onde a pri-
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meira providência seria levantar uma choupana, descansar
um pouco e começar a luta para construir o futuro.
O testamento de JOSÉ GARCIA PEREIRA,
redigido no dia primeiro de agosto de 1823, quando já teria
perto dos cem anos de idade, fornece alguns dados sobre
sua pessoa, família e bens:
Naturalidade e filiação:
"Digo eu José Garcia Pereira, que
achando-me em meu juízo perfeito
com saúde resolvi-me a fazer meu
Testamento da forma e maneira se-
guinte:
Declaro que sou natural da Ilha do
Faial, Bispado da Ilha de Angra.
Declaro que sou filho legítimo de
João Garcia Pereira e Maria do
21
Santo Antônio. "
Esposa e filhos:
"Declaro que fui casado com Mar-
garida Feliciana da Silva, cuja
minha mulher já é falecida, de cujo
matrimônio não tenho senão
quatro filhos que são:- José Garcia
Pereira, Thomas Garcia Pereira,
Januveva, já falecida, e por ela os
seus filhos, Maria e por ela o seu
filho, os quais instituo meus legí-
timos herdeiros."
Bens:
"Declaro que os bens que possuo é
uma fazenda de cultura e campos,
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escravos e gado de criar"
Disposições religiosas:
"Declaro que sou terceiro do Carmo
da Vila de São João em cujo hábito
será o meu corpo envolto e onde
quer que eu morra, digo, eu fale-
cer, será o meu corpo acompa-
nhado pelos Reverendos Sacerdotes
e todos dirão missa de corpo pre-
sente (...) dirão pela minha alma
trinta e quatro missas cada um. -
Declaro que deixo de esmola para a
Capela de São Vicente de Ferrer de
Formiga cem mil réis. - Declaro que
deixo para as obras da Senhora
Mãe dos Homens da Serra do Cara-
ça cem mil réis. - Declaro que no
dia do meu enterro se dará aos
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pobres cinqüenta mil réis. - Declaro
que deixo forro o crioulo por nome
Felisberto e meu testamenteiro fará
todo o favor que puder à mulher do
dito. - Declaro que deixo forra a
minha escrava Maria Nova."
Esse testamento foi redigido na Capela
de São Vicente de Ferrer de Formiga, para a qual JOSÉ GAR-
CIA PEREIRA deixou esmola de cem mil réis. Pode-se dedu-
zir que a família Garcia Pereira estivesse assentada na
região de Formiga desde 1780, ou seja, cerca de cinqüenta
anos antes da morte do pioneiro açoriano, ocorrida em
1828.
O filho mais velho do açoriano,
também chamado JOSÉ GARCIA PEREIRA, já nascido na
região de Formiga, tetravô de Luiza, casou-se com MARIA
JOANA BERNARDES DA SILVEIRA, filha dos também
açorianos BERNARDO HOMEM DA SILVEIRA, natural da Fre-
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guesia de Nossa Senhora da Piedade da Ilha do Pico, e de
MARIANA FRANCISCA DE BELÉM, natural da Ilha de Santa
Maria.
O casal teve nove filhos, dos quais des-
taca-se MESSIAS GARCIA PEREIRA, que foi proprietário da
Fazenda Tamboril, no município de Pains, MG. Faleceu aos
nove de julho de 1899 e, segundo os autos de seu
inventário processado na comarca de Formiga, foi casado
com MARIA FRANCISCA DA SILVEIRA, que era sua prima e
lhe deu quinze filhos.
Neste pequeno relato, limita-se a men-
ção apenas às pessoas diretamente relacionadas com a
ascendência de Luiza Soares de Jesus, como SEVERIANA
BERNARDA DA SILVEIRA, sua bisavó, filha de MESSIAS e
MARIA FRANCISCA. O advogado e historiador Djalma Garcia
Campos, ao longo de vários anos, anotou, compilou e
organizou a genealogia de todas as ramificações da família,
disponibilizando-a em seu livro "Iguatama, História e Ge-
nealogia".
25
OS FLAMENGOS
Como se observou no capítulo anterior,
MESSIAS GARCIA PEREIRA, neto do açoriano JOSÉ GARCIA
PEREIRA, casou-se com sua prima MARIA FRANCISCA,
também neta dos açorianos BERNARDO HOMEM DA SIL-
VEIRA e MARIA FRANCISCA DE BELÉM. Uma filha de Messias
e Maria Francisca, SEVERIANA BERNARDA DA SILVEIRA, bi-
savó de Luiza, casou-se com ANTÔNIO GONÇALVES GOU-
LART, cuja origem familiar também está ligada àquelas
longínquas ilhas portuguesas.
Embora não se tenha conseguido saber
com exatidão de onde os ancestrais de ANTÔNIO
GONÇALVES GOULART vieram, pode-se considerar a Ilha do
Pico como a provável origem. Nesse sentido, indica a
seguinte pista: Antônio era filho de FRANCISCO XAVIER
GOULART e neto de outro FRANCISCO XAVIER GOULART.
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Este nasceu por volta de 1750 e viveu na região de Piumhí,
MG. Contemporâneos dele e também residentes em Piumhí
foram Manoel Goulart da Silva, Francisco Goulart da Silva,
José Joaquim Goulart e outros, todos filhos de Agostinho
Goulart da Silva e Maria Josefa de Jesus, naturais da Fre-
guesia de S. Matheus da Ilha do Pico. Francisco Xavier Gou-
lart talvez fosse sobrinho ou primo desse Agostinho.
FRANCISCO XAVIER GOULART, o filho,
foi casado com MARIANA LEONOR DA ASSUMPÇÃO, sendo
os pais desta o Capitão FRANCISCO GONÇALVES DE MELLO
e LEONOR DA ASSUMPÇÃO. Os filhos do casal tiveram o
sobrenome composto GONÇALVES GOULART.
O sobrenome Goulart é tipicamente
açoriano, de remota ascendência holandesa. O nome origi-
nal, na língua flamenga, terá sido "Gelvaert" ou "Gouilward"
que ao invés de se aportuguesar, assumiu grafia e sonori-
dade francesas. A memória familiar com relação às raízes
holandesas perdeu-se ao longo do tempo, de sorte que no
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século passado, quando predominava influência francesa
na nossa sociedade, os Goulart, equivocadamente, julga-
vam-se descendentes de franceses. JOSÉ FRANCISCO GON-
ÇALVES GOULART contratou, por volta de 1870, um profes-
sor francês, Aristides Frederico Viot, para educar seus
filhos. O francês, que se casou com uma das filhas de José
Francisco, ampliou suas atividades de magistério,
educando também os filhos de fazendeiros vizinhos. Mais
tarde, abriu escola primária em Muriaé, colégios em Ubá e
São João Nepomuceno, tornando-se conhecido em vasta re-
gião. O fato de o professor Viot ter se associado aos Goulart
por amizade, profissão e casamento cooperou, então, para
firmar a equivocada idéia de um clã original francês da fa-
mília.
Certa vez, ANA AMÉLIA DE JESUS, mãe
de Luiza e neta de ANTÔNIO GONÇALVES GOULART,
mencionou que Antônio "era muito branco". Ana Amélia
tinha olhos azuis, assim como os tem Luiza Soares e
certamente os teve ANTÔNIO GONÇALVES GOULART, con-
28
firmando-se, então, o legado genético dos distantes ances-
trais holandeses.
ANTÔNIO GONÇALVES GOULART tornou-se
fazendeiro abastado em Pains e diante da morte prematura
de sua esposa SEVERIANA BERNARDA DA SILVEIRA, dei-
xando órfãos os menores Maria, Mariana, Pedro e José, pro-
cedeu da mesma forma que JOSÉ FRANCISCO GONÇALVES
GOULART, contratando professores para educar as crian-
ças.
MARIANA LEONOR GOULART, segunda filha
de Antônio e Severiana, nascida por volta de 1890, avó de
Luiza, costumava narrar aos netos e bisnetos como fora
criada: pajens negras, professores particulares e todo luxo
que a época e recursos permitiram. Tinha profundos olhos
azuis e desenho nasal aquilino pronunciado que lhe confe-
riam ar de mistério. Diziam-na detentora de poderes
paranormais, correndo ainda hoje na família histórias en-
volvendo benzeduras, aparições e outros relatos insólitos.
29
PIMENTA, MG
LUIZA SOARES DE JESUS e seus pais, ANA
AMÉLIA DE JESUS e JOÃO SOARES BARBOSA, nasceram na
hoje cidade de Pimenta, que, à época dos respectivos nasci-
mentos, era apenas um distrito do Município de Formiga. A
história de Pimenta, contudo, tem suas peculiaridades: foi
fundada pelo Capitão Manoel Gonçalves de Mello, que por
volta de 1841 deu início à construção de uma Capela dedi-
cada à N.S Auxiliadora e outra à N. S. do Rosário da Estiva.
A partir de 1921, o arraial passou a fazer parte do
município de Piumhí e, em 1942, dele se desvinculou, assu-
mindo a condição de cidade.
JOÃO THEODORO DE MELLO, avô de Luiza,
tendo se casado em Pains com MARIANA LEONOR
GOULART, fixou residência em Pimenta, donde provavel-
mente era natural, pois possuía ali uma fazenda. Talvez
30
fosse descendente do fundador da cidade, Capitão Manoel
Gonçalves de Mello. Porém, as únicas pistas nesse sentido
são o sobrenome Mello e a menção de ANA AMÉLIA DE
JESUS sobre um dos seus avós ter se chamado Manoel.
MARIANA LEONOR GOULART e JOÃO
THEODORO DE MELLO tiveram os seguintes filhos:
1. Maria Goulart de Mello
2. ANA AMÉLIA DE JESUS
3. Áurea Goulart de Mello
4. José Goulart de Mello
5. Marieta Goulart de Mello, "Tia Santa",
morando atualmente em Formiga.
A mãe de Luiza Soares de Jesus deveria por
direito, a exemplo de seus irmãos, ter se chamado ANA
GOULART DE MELLO. Porém, o nome corrente que mais
usou foi ANA AMÉLIA DE JESUS. Em documentos diversos,
ele aparece como ANA AMÉLIA DE MELLO, ANA SOARES DE
MELLO ou, inexplicavelmente, ANA AMÉLIA GOMES, não se
31
sabendo de onde viria esse Gomes. Uma informação des-
coberta recentemente, além de surpreender, serve para fir-
mar um nome como definitivo: por ocasião de seu casa-
mento com JOÃO SOARES BARBOSA, realizado em 1920, ela,
de 15 anos, e o noivo, de 25, lançaram no Livro de Casa-
mentos do Cartório do 1º Ofício de Formiga suas respecti-
vas assinaturas. A surpresa consiste no fato de ANA AMÉLIA
ter sido considerada não-alfabetizada, ela mesma dizia que
não "conhecia leitura". Mas sua assinatura, ainda que com
pequeno erro de ortografia, "Ana Amélia di Jesus", é prova
em contrário, conforme pode-se ver no registro aqui
reproduzido.
JOÃO SOARES BARBOSA, esposo de ANA
AMÉLIA, era filho de JESUÍNO SOARES BARBOSA, originário
da Bahia, e de, VIRGÍNIA MARIA DE JESUS, segundo a
tradição familiar, de sangue índio. Filhos do casal:
1. LUIZA SOARES DE JESUS,
2. Floripes Soares
32
3. José Soares
4. Cirilio Soares
5. Messias Soares
6. Maria Soares.
33
34
35
O SOBRENOME CÂMARA
O sobrenome Câmara é originário da Ilha da
Madeira, proveniente de uma localidade chamada CÂMARA
DE LOBOS, onde o navegador português João Gonçalves
Zarco surpreendeu uma colônia de lobos marinhos, aninha-
da num abrigo natural, em forma de caverna ou gruta
(câmara).
Um descendente direto de Zarco, em oitavo
grau, MANOEL MONIS DA CÂMARA, nascido em 1671, na
Ilha da Madeira, veio para o Brasil no início do século XVIII,
entre 1710 e 1715. Estabeleceu-se em São João do Morro
Grande, atual Barão de Cocais, onde vivia seu fundador,
outro descendente do primeiro Câmara, Cel. Manoel Bitten-
court da Câmara.
MANOEL MONIS DA CÂMARA foi casado com
DOMINGAS PINHEIRO CARDOSO, tendo, entre outros filhos,
36
a JOSEFA MONIS DA CÂMARA que se casou com MANOEL
GOMES RODRIGUES em 1738. Residiram em São Miguel do
Piracicaba, hoje Rio Piracicaba, onde lhes foram concedidas
terras para cultivo. Constituíram numerosa família, mais de
dez filhos, que se espalharam por Minas Gerais. Um deles,
FELIPE GOMES RODRIGUES DA CÂMARA, nascido em 1750,
fixou-se em Capela Nova, hoje Betim, casando-se, por volta
de 1784, com JOANA ALMEIDA DA SILVA. Eles tiveram oito
filhos, dois dos quais, João e José, foram os responsáveis
pela chegada dos Câmaras a Formiga.
João Gomes Rodrigues da Silva, filho mais
velho de Felipe, embora não assinasse Câmara, foi o pri-
meiro da família a se fixar na região de Formiga. Era furriel,
patente militar da época, destacado, por volta de 1820,
para o então povoado de São Vicente de Ferrer de Formiga,
onde chegou já viúvo. Adquiriu uma fazenda em Timburé,
(distrito de Formiga, e casou-se, pela segunda vez.
Simultaneamente, a uns 200 quilômetros
37
dali, em Piedade do Paraopeba, povoado ao sopé da serra
da Moeda, seu irmão, JOSÉ GOMES RODRIGUES DA CÂMARA,
levava a vida mesclando as atividades de lavrador, mineiro
e comerciante, ajudado pelo filho Thomás. Piedade era um
pequeno e decadente povoado, de sorte que os outros dois
filhos, Joaquim e Delfino, já haviam ido buscar melhores
oportunidades na capital da Província de Minas Gerais.
Assim, desde 1830, eles tinham uma porta de comércio na
Imperial Cidade de Ouro Preto.
Em 1833, JOAQUIM GOMES RODRIGUES
CÂMARA casou-se com TEREZA BERNARDINA DE SOUSA,
numa clara intenção de se fixar definitivamente em Ouro
Preto.
Das listas de habitantes de Ouro Preto, re-
lativas ao censo demográfico realizado em 1838, colhem-se
as seguintes informações: Joaquim Gomes Rodrigues
Câmara tinha 28 anos; sua esposa, Teresa Bernardina de
Sousa, 18; e Delfino Gomes Rodrigues Câmara, 25. Sabiam
38
ler e escrever. O casal tinha, então, três filhos: Augusto, 4
anos; Emílio, 3 e Francisca de um ano de idade.
No ano seguinte, uma tragédia se abateu
sobre aquela família. Tereza, esposa de Joaquim, morreu de
parto.
Viúvo aos 30 anos de idade, com quatro
crianças, uma delas recém-nascida, Joaquim não viu outra
alternativa senão buscar ajuda dos pais em Piedade do
Paraopeba.
Os pais de Joaquim, JOSÉ GOMES RODRI-
GUES DA CÂMARA e VITÓRIA IGNOCÊNCIA DA SILVA BREJO,
que contavam com 54 e 55 anos de idade respectivamente,
se dispuseram a cuidar das crianças até que Joaquim re-
organizasse sua vida.
Certamente tinham boas notícias de JOÃO
GOMES RODRIGUES DA SILVA, o furriel, que estava bem es-
39
tabelecido em Formiga, já elevada à condição de vila, com
sua fazenda no distrito de Timburé, soldo da patente mi-
litar e ainda rendimentos de um porta de comércio.
Não há dados que permitam reconstituir a
viagem de Joaquim, Delfino e as crianças para a Villa Nova
de Formiga. Mas os primeiros sinais deles nessa localidade,
começam a surgir a partir de 1843, quando se celebrou o
casamento de Delfino Gomes Rodrigues Câmara e Maria
D'Arantes, na Matriz de São Vicente de Ferrer de Formiga. Já
em 1847, JOAQUIM GOMES RODRIGUES CÂMARA casou-se
com Maria Felisberta de Arantes.
Em 1858, quando a Villa Nova de Formiga
foi elevada à condição de cidade, os Câmara estavam
devidamente arraigados na região: uns viviam nos distritos
de Timburé e Cachoeira, outros eram comerciantes na cida-
de, AUGUSTO GOMES RODRIGUES CÂMARA, era ser-
ventuário da justiça, como Partidor, e Juvêncio Gomes
Rodrigues da Silva, seu primo, Contador Judicial. Este,
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aliás, trilharia caminhos mais destacados: teve patente
militar (tenente), foi juiz municipal, vereador e, entre 1877
e 1881, prefeito de Formiga, abrindo caminho para quatro
outros descendentes dos primeiros Câmaras, já no século
XX, ocuparem o principal cargo do Município, a saber,
Frederico Aluísio Soares, Ary Aluísio Soares, Mariano
Gomes da Silva, Arnaldo Barbosa.
AUGUSTO GOMES RODRIGUES CÂMARA
casou-se duas vezes, sendo que do primeiro matrimônio
não deixou descendentes. Já do segundo, com DELMINDA
MARIA DO NASCIMENTO, natural de Campo Belo, deixou vá-
rios, entre eles ILLÍDIO GOMES RODRIGUES CÂMARA, nasci-
do em 1880. Este, em 1900, casou-se com ANA AMÉLIA DE
MELLO, que teve vários filhos, entre os quais GERALDO RO-
DRIGUES CÂMARA que se casou com LUIZA SOARES DE
JESUS.
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A FAMÍLIA
"Aos doze (12) de fevereiro de 1942,
na matriz de Formiga, depois das
formalidades prescritas e três de-
nunciações canônicas, não apare-
cendo impedimento algum, por
palavras de presente, na forma do
Ritual, em minha presença e das
testemunhas José Pedro da Silva e
Oswaldo Moureira, receberam-se
em matrimônio GERALDO RO-
DRIGUES CÂMARA e LUIZA SOARES
DE JESUS. Ele solteiro com 23 anos
de idade, filho legítimo de Elídio
Rodrigues Câmara e Ana Amélia de
Melo, nascido, batizado e morador
em Formiga, freguesia do Bispado
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do Aterrado. Ela, solteira com 21
anos de idade, filha legítima de
João Soares Barbosa e Ana Soares
de Melo, nascida e batizada em Pi-
menta, moradora em Formiga,
freguesia do Bispado do Aterrado.
Para constar, lavrei este termo que
assino:
O Vigário: Pe. Remaclo Foxius"
A partir desse matrimônio, Luiza gerou cin-
co filhos: Rui, Ruth, Rubens, Roberto e Robeson. Por que
tanto erres? Tudo começou com o primeiro filho, que o pai
gostaria que se chamasse Guilherme. Ocorre que Luiza
ponderou que o bebê era muito pequeno e não deveria ter
um nome assim tão grande, sugeriu Rui. Geraldo pensou
um pouco, pronunciou o nome algumas vezes e concordou.
Ironicamente, Rui é hoje o mais alto dos filhos, mais de um
metro e oitenta, ou seja, por ocasião de seu nascimento, a
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intuição paterna estava mais aguçada. Quando nasceu a se-
gunda criança, uma menina, não houve muita dúvida quan-
to ao nome: Ruth. O terceiro filho, Rubens, teve o mesmo
nome de um primo que nascera dias antes.
Os nomes dos próximos filhos tiveram,
conseqüentemente, a mesma inicial: Roberto e Robeson .
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O FUTURO
O tempo não tem freios, passa rápido. Há
quase trezentos anos, quando aqueles pioneiros se embre-
nhavam pelo sertão, procurando ouro, terra para cultivar
ou pastos para criar seus rebanhos, certamente arriscavam
um olhar para o futuro, querendo antever o amanhã.
Hoje, algumas crianças alegram a família
brincando, fazendo algazarra. Lentamente vão crescendo,
aprendendo as coisas, descobrindo o mundo...
Os netos de LUIZA SOARES DE JESUS são o
futuro da grande família:
RUDICAR ANTÔNIO CÂMARA, nascido em
03.01.1974, e HELDER CÂMARA, de 08.05.1978, ambos
naturais de Passos, MG, filhos de Rui Rodrigues Câmara e
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Maria Esméria da Fonseca Câmara;
HEDERSON GERALDO RESENDE, nascido em
Formiga, MG, aos 20.05.1986, filho de Ruth Aparecida
Resende e Joaquim Lopes Resende;
ROBERTA CÂMARA e MARCELO CÂMARA, ela
nascida em Nova Serrana, MG, ele, em Formiga, MG, aos
14.05.1987 e 14.09.1988, respectivamente, filhos de Rober-
to Rodrigues Câmara e Maria Goreti Gonçalves Câmara;
BRUNO CÉSAR CÂMARA, nascido em
13.04.88 e RÔMULO ELIAS CÂMARA, em 02.09.1990, ambos
naturais de Formiga, MG, filhos de Robeson Antônio
Câmara e Marla Elias Rios Câmara.
LUIZA CASTRO CÂMARA, nascida aos
30.11.2008, em Formiga, MG, filha de Rubens Rodrigues
Câmara e Ana Catarina do Amaral e Castro.
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FIM
Nota do autor: Na medida do possível, lacunas e incorreções nas
informações genealógicas contidas neste livro poderão ser
sanadas no livro do autor “NOMES, DATAS E LUGARES – CRÔNICA
DE CINCO SÉCULOS DO SOBRENOME CÂMARA”, ainda no prelo.
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