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Dissertação de Mestrado_FAUP
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Ema Castro Alves Dissertação de Mestrado em Arquitectura | FAUP 2009 / 2010
- um estudo prático de espaço público
Docente acompanhante - Arqº Nuno Brandão Costa
3
4
AGRADECIMENTOS
Em especial, ao Professor Arquitecto Nuno Brandão Costa, pelo apoio e orientação prestada no decorrer da
tese e na minha formação,
À minha família, sempre disposta a ajudar,
Aos Professores Arquitectos Miguel Rodrigues e Alberto Lage, pela abertura e boa informação,
Aos meus amigos que me aconselharam e ouviram, ao Carlos, ao Paulo, à Sónia, à Rita,
E a todos os que me brindaram com um sorriso de incentivo.
5
RESUMO
“When the travellers of old came to Oulu by sea, the first things they saw were the Tar exchange at the
harbour, the warehouses along the shore and the houses of the richer merchant families.”1
A praça passou, então, de porto de chegada e partida de embarcações e mercadorias, a zona de
mercado, cujo brio vem esmorecendo com a passagem do tempo. Hoje, o espaço fica votado ao abandono
durante os dias de Inverno e é reactivado no Verão, pelo conjunto de bares e restaurantes que ocupam os
antigos armazéns em madeira.
Podemos, assim, dizer que falta à Praça do Mercado de Oulu uma maior vocação, que a transforme num
espaço identitário da cidade. Ao invés de constituir um simples abrigo para actividades ocasionais, ser, ela
própria, espaço de disponibilidade e convívio permanentes, a partir de infra-estruturas que viabilizem o
“estar” no domínio do espaço público.
Pensar a praça no seu real valor e significado, fazê-la a livre expressão de um povo, foi o propósito ao
qual me propus. Ao fim de contas, o que é uma praça sem gente?
1 KORHONEN, Markus H.M.A., cultural historian, Oulu, A city at the heart of its region, Studio Ilpo Okkonen Oy, 2006
6
RESUMÉ
“When the travellers of old came to Oulu by sea, the first things they saw were the Tar exchange at the
harbour, the warehouses along the shore and the houses of the richer merchant families.”¹
La place { passé d’un port d’arivée et départ dês bateaux merchants et de la marine { une marché avec
un fierté qui se fane au cours du temps. Aujourd’hui, le space reste abandonné pendant l’hiver et est
reactivé en l’été pour touts ces cafés et restaurants q’ocupent les historiques entrepôts en bois.
Donc, nous pouvons dire que la Place du Marché d’Oulu a besoin d’un plus grand vocation pour se
tranformer en un espace identificatif de la ville, un espace de disponibilité et convivialité permanents, à
partir d’infrastructures qui permettent un “être” dans l’espace de domaine publique.
Pour penser en le vrai valeur et signification de la place, pour sa conversion en l’expression libre d’un
people, c’est ça mon engagement. Après tout, qui est une place sans les gens?
ABSTRACT
“When the travellers of old came to Oulu by sea, the first things they saw were the Tar exchange at the
harbour, the warehouses along the shore and the houses of the richer merchant families.”¹
The square has then passed from a port of arrival and departure of navy and merchant boats, to a
market area whose pride tends to fade through time. Today, the space is left abandoned during the winter
and is reactivated in the summer given all the bars and restaurants that fill the old historical wooden
shelters.
Therefore, we can say the Market Square of Oulu is in lack of a higher vocation that would turn it into
an identifying space of the city itself, a space of permanent availability and togetherness, made out of infra-
structures that would allow the “staying” inside the public space domain.
To think about the square’s real value and meaning, converting it into the free expression of the people,
was the purpose I committed myself to. After all, what’s a square without people?
7
OBJECTIVO
O tema elegido para a dissertação tem como local a Praça do Mercado de Oulu, cidade onde
actualmente estudo, no ano vocacionado ao programa de Erasmus.
Oulu é uma cidade situada a leste do Golfo do Bótnia, reconhecida como a capital do Norte da Finlândia,
ocupando o 6º lugar na escala dos seus maiores centros urbanos.
A escolha desta praça enquanto objecto do meu estudo prático para a disciplina de Projecto V, pelo
Departamento de Arquitectura de Oulu, fez-se enunciar pelo seu ponto estratégico de descompressão,
dentro de uma malha estritamente regular que se estende ao longo do seu núcleo urbano.
O que se designa como centro urbano de Oulu é o encontro de duas ruas principais num largo que
esventra parte da estrutura axial da cidade, para lhe acentuar o carácter de rua pedestre – Rotuaari.
Desde já, reforço a convicção de que intervir na praça do mercado, frente ao estuário do rio Oulu,
funde-se num contexto essencial para a vitalidade e imagem da cidade como um todo harmonioso na
relação com os seus habitantes. Parte intrínseca à cultura finlandesa é o conceito de refúgio, na
salvaguarda da privacidade e do frio fustigador que atinge grande parte do ano.
Pensar a cidade, torná-la mais bela, deverá ser o enunciado convergente das necessidades acima
resumidas, bem como da idealização do espaço público consumado em uma entidade revisitada que jogue
as cartas de um povo, lance os dados da história e desafie as regras rígidas do tabuleiro onde assenta a
cidade.
O sentimento comunitário encontra-se subjugado pelo pragmatismo dos acolhedores espaços
habitacionais e residuais espaços de convívio. A limpeza e homogeneidade urbana denunciam clareza de
princípios mas rara liberdade, uma vaidade escassa frente a uma cidade constantemente devastada por
fogos e invasões.
Pensa-se mais o país como porto de abrigo do futuro, das novas tecnologias e concertados acordos
internacionais. Falta, parece-me, alguma “distinç~o” na arquitectura da cidade. Na Praça do Mercado de
Oulu, adivinha-se a demanda de algo mais que vagos lugares de estacionamento ou feiras sazonais, num
local com tamanha dignidade e potencial urbanístico.
O que significa, por último, o Mercado de Oulu neste semear de alusões? Porventura, um ponto onde
agarrar os resquícios da História, por igual uma permeabilidade no juntar de gerações, relacionando
produtos frescos e artesanato com demais actividades de lazer.
Pensar no equilíbrio, deixar o espaço fluído e influente. Em suma, facilitar, reequacionando os
problemas existentes.
Oulu, 12 de Março de 2010
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METODOLOGIA
O método de trabalho que aqui se adopta levanta questões de fundo sobre como pensar um projecto,
construído a partir desse ponto central, para onde apontam todos os focos radiantes. Essa relação em que
se envolve a Praça do Mercado de Oulu, é composta por partes de importância local ou de contexto
análogo, sendo a associação possível, coexistindo por meio de uma argumentação fundamentada. Da
filtragem deverá resultar a intenção concertada, um leito mais calmo.
A parte I reúne um conjunto de praças, seleccionadas na relação com a Praça do Mercado de Oulu, de
forma mais ou menos abrangente e/ou directa. O que, em primeiro lugar, se pretende é adquirir noções
válidas quanto ao espaço de Praça e a possível ligação às actividades de Mercado. Da súmula destes
exemplos, com assento geográfico-social se informa, préviamente, o projecto.
A parte II persegue o sentido da forma projectual, aliado aos seus valores de estrutura, função e poética
do espaço edificado. São abordados os três princípios de Vitrúvio, em três exemplos de afinidade
partilhada; o resultante espera-se, n~o só um jogo de cheios e vazios, antes um vazio “cheio”, a praça
pensada em termos de fruição humana, num país do frio.
A parte III é o projecto resolvido em função do conjunto das questões tipológica, funcional e
volumétrica. A intitulada Análise Tipológica e Identidade incide sobre a estrutura e imagem da Praça do
Mercado, em leitura imbuída na forma urbana. A Análise Funcional e Significado conjuga a vertente
funcional da praça com impressões associadas ao acto enquanto indutor sócio-cultural. Da Análise
Volumétrica e Implantação, fomenta-se a boa integração do projecto no pensamento da volumetria
existente. Adequa-se a escala à obra colectiva, pela aproximação ao individual e ao detalhe, até ao indivíduo
livre. Em sociedade.
9
O. INTRODUÇÃO
RESUMO/RESUMÉ/ABSTRACT 5
OBJECTIVO 7
METODOLOGIA 8
I. O ESTUDO DA PRAÇA EM RELAÇÃO COM A PRAÇA DO MERCADO DE OULU
Introdução Histórica 13
Ligação à Arte: “Quadro branco sobre fundo branco” 15
Exemplos análogos: 17
Praça da Erva, Verona
Praça do Mercado, Nuremberga
Antiga Praça do Mercado, Nottingham
Mercado de Rialto, Veneza
Kultorvet, Copenhaga
Praça da Ribeira, Porto
Praça Maior, Madrid
Praça do Comércio, Lisboa
Pórticos do Templo, Paris
Praça do Mercado, Helsínquia
Mercado de Natal, Montreux
Antiga Base Submarina, Saint Nazaire
Praça do Mercado, Gurna
10
ÍNDICE
II. O PROCESSO INTUITIVO NA BASE DO PROJECTO
FIRMITAS: Pavilhão Barcelona de Mies van der Rohe 35
– o espaço desmaterializado.
UTILITAS: Mercado e Fórum de Trajano em Roma 45
– uma estrutura social.
VENUSTAS: Praça de São Marcos em Veneza 55
– visualidade fluída.
III. O MÉTODO APLICADO EM FUNÇÃO DO LUGAR
ANÁLISE TIPOLÓGICA E IDENTIDADE: definição e delimitação na malha urbana. 69
ANÁLISE FUNCIONAL E SIGNIFICADO: o lado social das actividades. 77
ANÁLISE VOLUMÉTRICA E ESTRUTURA: leitura entre espaço envolvente e espaço operante. 85
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 97
BANCO DE IMAGENS 99
11
A Volta do Malandro
“Eis o malandro na praça outra vez
Caminhando na ponta dos pés
Como quem pisa nos corações
Que rolaram nos cabarés
Entre deusas e bofetões
Entre dados e coronéis
Entre parangolés e patrões
O malandro anda assim de viés
Deixa balançar a maré
E a poeira assentar no chão
Deixa a praça virar um salão
Que o malandro é o bar~o da ralé.”2
2 Chico Buarque , A Volta do Malandro in Chico ao Vivo, 1999
12
I. O ESTUDO DA PRAÇA EM RELAÇÃO COM A PRAÇA DO MERCADO DE OULU
13
“Stanza della Segnatura”, Vaticano, Roma,
Sócrates em Atenas falando com Platão (pintura
de Rafael).
Imagem de reconstituição da Acrópole de Atenas.
O Egipto foi onde surgiram as primeiras aduanas.
Os séculos XV e XVI a.C. formaram o período
mais florescente do comércio.
Lojas no exterior da estrutura do Mercado de
Peixe de Pompeia.
Planta do Mercado do Peixe de Pompeia, 179 d.C.
1.
2.
3.
4.
5.
14
Introdução Histórica
O termo praça tem origem latina platea e a sua significação atravessa o campo de tudo aquilo que se
apresenta. Local excepcional para onde desembocam as ruas como entradas diversas nesse cenário. O
espaço público que deriva do termo República, enquanto res publica, da coisa pública, é o espaço para a
assembleia, no sentido de organizar a polis, elenco de coisas que se sucedem, no desafio aos seus activos
déspotas.
O sistema democrático, do uso livre da razão, é conservado e perpetuado a partir destes espaços de
praça, onde os cidadãos são livres de reivindincar direitos ou proclamar ideias maiores. O fenómeno do
ajuntamento anima o poder colectivo e reforça a segurança do indivíduo, enquanto membro de uma
sociedade reagente ao rumo tomado pelo governo local. O Homem que se (re)vê diante da praça ampla,
onde o lugar da pausa conduz à reflexão, e da reflexão à esperança. O espaço vazio, rico em abstracção, que
abre caminho a um plano mais vasto de hipóteses.
O mercado nasce, então, a partir de uma necessidade de trocas entre os homens. O facto de se instalar
ou não no seio de um espaço público mais alargado, como é o de praça, está a par das condições geográficas
e da evolução da humanidade e sua fixação. As primeiras formas de mercado foram praticadas pelos
Assírios, os Babilónios e os Hebreus, na forma de concentrações avulsas às portas das cidades. Já no Antigo
Egipto, o mercado estava sobretudo ligado às rotas caravaneiras, embora houvesse lojas que vinham
emitindo peremptórios sinais do que viria a suceder-se no mundo greco-romano.
Nos primórdios da civilização grega, o mercado e a praça pública concentravam-se num todo unitário.
A ágora era o nome por que se designavam ambos os termos, usando de um forte sentido pragmático.
Formava-se, espontaneamente, no seio das aldeias, e os edifícios em volta iam-se constituindo sem
organização precisa. Vindo-nos à memória o extraordinário exemplo da Acrópole em Atenas, onde se lê, em
tão recuada idade civilizacional, o livre arbítrio do espaço construído na valorização dos espaços
percorríveis, com potencialidades valentes a ambos.
A área da acrópole era composta de partes dialogantes associadas ao comércio, desde uma zona
reservada aos vendedores ou comerciantes, até aos bancários, instalados nos pontos de maior tráfico,
rodeados por todos os falidos, negociantes ou meros trapaceiros. Era frequente Sócrates deambular por ali
na prerrogativa dos seus “tipos humanos”. Nesse favorável agregado urbano montava ainda sede, num
contexto perimetral, a elite comercial dos médicos, barbeiros e perfumeiros. Duas tipologias de ágora
foram identificadas na História: a iónica e a arcaica, merecendo uma comum homenagem a forma
rectangular com que o espaço se ficava a rodear de edifícios públicos e arcadas, rasgado por entradas de
acesso, na segunda versão tipológica.
O desenvolvimento da ágora primitiva até ao período romano ficou patente pela obra de Miletus, cujo
esplendor da forma serve de contraponto ao sistema hipodâmico regular da malha urbana. Estimulado
pela ascensão do poder de Roma, com a expansão do Império para ocidente, o fórum foi sendo habitado de
edificação cada vez mais digna de enorme fausto, destinada ao exercício político-judicial, tendo,
consequentemente, sido deslocadas as lojas atreitas ao comércio para zonas várias da cidade, na formação
de mercados especializados. A ideia de mercado enquanto estrutura solidamente pensada surgiu apenas
por volta de 179 d.C., a partir da construção do Mercado do Peixe, de seu nome original macellum, pela
virtuosa obra do mercado coberto de Pompeia.
15
6.
7.
Símbolo
Contexto Urbano Elemento Natural
Kazimir Malevitch (1878-1935), pintor da
vanguarda russa, foi o fundador do
suprematismo. Esta nova corrente veio
revolucionar as mentalidades da época sendo
considerada uma visão à frente do seu tempo,
levando o abstraccionismo das formas
geométricas puras à sua simplicidade extrema,
num sábio conluio de significado. Dessas
composições puras e cerebrais sobressaem, pela
radicalidade atingida, o “Quadro negro sobre
fundo branco”, pintado entre 1913 e 1915,
presente no Museu Estatal Russo, em São
Petersburgo, seguido, em 1918 pelo "Quadro
branco sobre fundo branco" , hoje no Museu de
Arte Moderna de Nova York. " Malevich adopta a
ideia de que por detrás do mundo aparente
existe uma realidade maior.
16
Ligação à Arte: “Quadro branco sobre fundo branco”
O quadrado foi para Malevich a "forma" zero, atrás da qual está o caminho para novos métodos de
criação. Depois de um quadrado preto, cheio de novas potencialidades, um quadrado vermelho veio dar o
sinal da Revolução, a fim de alcançar o "quadrado branco como movimento puro".
De que forma podem ser percebidas essas potencialidades? Imaginemos, na abstracção sui generis do
quadro, o fundo negro como o espaço do projecto, inserido nesse branco mais vasto, construído por uma
“história”, um contexto que o clarifica e que o esbate em subtis pinceladas de branco, purificado na tão
simples existência. Uma perfeiç~o ilimitada de um “quase” alcanç|vel. Atentemos de novo ao fundo negro,
elemento limitado e cheio, definido nas formas, imbuído, porém, de uma força que roça os limites e, por
fim, se desprende a partir dessa mesma centralidade em tensão. Na realidade, um projecto tem que convir
às ciências dos modos de ser e de viver de um povo, o imposto branco de fundo que, por questões
incontornáveis, abrange e dá forma ao quadrado negro. Posto isto, como intervir na realidade emergente,
instigando-a a permanecer?
No esquema agora apresentado, proponho três vectores que vão intervir no conceito de Praça, com
distâncias variáveis, determinados pelas características inatas ao local. A ideia é elucidar o projecto,
trazendo luz libertando-o, a partir do momento em que o objecto se reconhece no seu meio, sobrevivendo
apenas por suaves contornos. Ficam assim formadas praças distintas, ao longo da História, que se regem
por estes factores de importância relativa, merecendo a nossa devida atenção.
17
Frauenkirche, a igreja em estilo gótico.
Chafariz encimado por uma estátua do período
romano, a "Nossa Senhora Verona”.
O edifício que se vê na esquina é o Merchants (ou
Domus Mercatorum), um grande edifício do
século XVI.
Mercado de Natal de Nuremberga, à noite.
10.
9.
8.
11.
12.
Vista aérea da medieval Praça da Erva, Verona.
18
Praça da Erva, Verona: Desde o Império Romano, a Piazza delle Erbe (ou simplesmente Piazza Erbe) é a
mais antiga praça de Verona. Foi construída no local do antigo Fórum Romano, outrora o centro da vida
política e económica da cidade. Muitos dos palazzi, igrejas e monumentos da cidade datam dessa época,
sendo que a maioria do edificado que rodeia a praça é referente ao período medieval. A Praça da Erva tem
origem no antigo mercado de legumes da cidade que chega até aos dias de hoje. Neste distinto espaço
central conserva-se ainda a função administrativa da cidade.
O lado norte é ocupado pela Câmara Municipal, a Torre Lamberti, a Câmara dos Juízes e as casas de
Mazzanti. A oeste, o lado menor fecha-se com vista para o barroco Palácio Maffei, de 1668, adornado com
várias estátuas de deuses gregos: Zeus, Hércules, Minerva, Vénus, Mercúrio e Apolo marcam a fachada. À
sua frente, ergue-se uma coluna em mármore branco que sustém o leão de S. Marcos, símbolo da
integração de Verona, em 1405, na República de Veneza. Do lado sul da praça, surge a Casa Merchants (ou
Domus Mercatorum), um grande edifício do século XVII, onde agora está sedeada a Banca Popular de
Verona. As restantes casas do entorno, de seu carácter mais anónimo, lembram, pelas proporções que
apresentam, as antigas casas-torre de origem comunal.
O mais velho monumento da praça é um chafariz encimado por uma estátua chamada a "Nossa Senhora
Verona", de 380 d.C. A estátua, que data dos tempos do Império Romano, pontua o centro da praça e regista
o uso desta para actividades de mercado, há já 2000 anos. Igualmente histórico é o capitello, datado do
século XIII, período no qual seria usado em diversas cerimónias. Do século XIV, na direcção da Via Cappello,
uma outra coluna mostra uma edícula com relevos da Virgem e dos Santos Zeno, Pedro e Cristóvão.
Símbolo
Elemento Natural Contexto Urbano
Praça do Mercado, Nuremberga: Nuremberga foi ponto de confluência das vias de comunicação entre a
Baviera, a Francónia, a Suábia e a Boémia, num vale percorrido pelo rio Pegnitz. Fundada em 1040, esta
cidade alemã nasceu ao redor de um mercado. Na Renascença, a cidade torna-se ponto de passagem
obrigatória do comércio terrestre entre a Europa Setentrional, a Baviera e os países alpinos, o que acabou
por enriquecê –la, nomeadamente no aspecto cultural. Apesar disso, manteve-se firme à sua configuração
medieval.
O “coração” da cidade de Nuremberga continua a ser a Praça do Mercado ou Haupmarkt. O espaço, de
uma enorme vivacidade, é dominado pela bela Frauenkirche, a igreja construída a mando de Carlos IV em
estilo gótico, entre 1352 e 1362. A fonte Schöner Brunnen, de 1385, está também entre os mais
importantes monumentos do gótico alemão tardio.
Em Dezembro, a praça torna-se tumultuosa com gente de todo o mundo que acorre ao afamado
Mercado de Natal de Nuremberga, um dos mais antigos e famosos, contido num factor global. A cada ano,
mais de dois milhões de visitantes vêm experimentar os encantos deste Mercado de Natal, que reúne cerca
de 180 bancas de madeira. As bancas, envoltas num toldo tingido de cor vermelha e branca, emprestam ao
local a designaç~o de ”Pequena cidade de madeira e pano”.
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15.
14.
16.
Recinto temporário de patinagem no gelo na
antiga Praça do Mercado de Nottingham.
Obra de reconversão da antiga Praça de
Nottingham, 2007.
Edíficio da Pescheria e o Campo della Pescheria à
esquerda.
Ponte de Rialto sobre o Grand Canal.
13.
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14.
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15.
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16.
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20
Símbolo
Elemento Natural
Contexto Urbano
Antiga Praça do Mercado, Nottingham: Nos dias anteriores à formação da cidade de Nottingham, o
mercado constituía o ponto principal entre duas cidades vizinhas, tendo estado o espaço do mercado no
centro do crescimento de Nottingham, de há centenas de anos desde então. Por volta de 1155, o centro do
mercado foi intitulado de Praça do Mercado, pelas mãos do rei Henrique II.
As duas cidades estavam divididas por um muro que o projecto da nova praça inclui, indo recriar a
antiga fronteira que dividia Nottingham. A praça delimita-se, a poente, por Beast Market Hill, Row Smithy
situa-se ao longo da margem norte e South Parade define o seu extremo sul. A nascente, a Câmara do
Concelho, pontuada por dois leões de pedra, símbolos da cidade, enobrecem o espaço da praça. Duas fontes
ficavam, na altura, a ladear o eixo central nos respectivos centros de cada uma das piscinas, até ao
redesenho último do espaço, concluído em 2007, quando uma nova fonte de maior dimensão foi criada
para o topo da praça, consumando fontes de jacto e cachoeiras. Caso necessário, todo o equipamento da
fonte é desactivado, dando lugar a um anfiteatro que funciona enquanto espaço recriativo, utilizado para
variados shows e concertos. Neil Porter, Director da equipa vencedora do projecto, esclarece: “Our aim
with the design was to provide a relaxing and flexible space for everyday activities as well as an exciting
destination for events and local markets.”3
A natureza da praça faz com que esta seja frequentemente utilizada para os principais eventos,
manifestações cívicas, visitas reais, festas, feiras, shows ou exposições, além de ir acolher o mercado de
Natal, tradicionalmente alemão. Ainda neste prestigiado e histórico local, é celebrado o Ano Novo.
Símbolo
Elemento Natural
Contexto Urbano
Mercado de Rialto, Veneza: Rialto tornou-se num importante distrito em 1097, quando o mercado de
Veneza se transferiu para lá. De modo a servir a ligação ao movimentado Bairro de Rialto, uma ponte de
barcas foi criada, um século depois, vindo, pouco mais adiante, a ser substituída pela Ponte de Rialto. Rialto
tem frente para o Grand Canal, sob os arcos dos palácios monumentais projectados pelos arquitectos mais
influentes da história.
Na qualidade de capital e centro nervoso do comércio internacional da Sereníssima, o mercado cresceu,
havendo a necessidade de serem construídos armazéns, de que é exemplo o famoso Fondaco dei Tedeschi.
Entretanto, lojas apareceram que vendiam produtos de luxo, além de bancos, escritórios fiscais e agências
de seguros. A maioria dos edifícios de Rialto foram destruídos num incêndio em 1514, tendo apenas
sobrevivido a Igreja de San Giacomo di Rialto, originária de 429. Todo o resto da área foi sendo,
3 www.e-architect.co.uk
21
13.
14.
15.
Vista aérea de Kultorvet, atravessada na diagonal
por Købmgergade.
Vista para o Grand Canal, do Campo della
Pescheria, onde se localiza o actual mercado das
frutas.
Kultorvet, 1890.
Kultorvet num dia de movimento banal.
17.
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Interior da Pescheria, onde se realiza o mercado
do peixe.
18.
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20.
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21.
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22
sucessivamente, reconstruída. A Fabriche Vechie, com participação do arquitecto Jacoppo Sansovino, nasce
deste período sequente, enquanto a Fabbriche Nuove, de construção um pouco mais tardia, ergue-se a
1553. A estátua II Gobbo di Rialto é, igualmente, uma obra do meio artístico do século XVI.
A área é um atribulado retalho de ruas e praças. No Campo delle Beccarie, é possível encontrar-se um
movimentado mercado, durante a manhã. Por sua vez, a rua homónima conduz-nos ao Campo della
Pescaria e ao Campo Cesare Battisti - o mercado de peixe e frutas e o mercado de flores, respectivamente.
Ao atravessar o Fabbriche Nuove, atingimos a plataforma de desembarque do Mercato. Se do Campo San
Giacomo passarmos debaixo da arcada do Banco Giro, atrás da Fabbriche Vecchie, chega-se ao Campo
dell’Erberia, com uma vista magnífica sobre o Grand Canal, considerado um dos mais belos recantos de
Veneza.
Símbolo
Elemento Natural
Contexto Urbano
Kultorvet, Copenhaga: Copenhaga encontra-se a uma latitude considerável no hemisfério norte, em
contacto com o Mar do Norte, resultando em baixos ângulos solares, ventos indesejáveis e escuros dias de
Inverno. Em contraste, a época veronil traz dias longos e luminosos, com temperaturas que alcançam os
20º centígrados. Quase se poderia assumir que Copenhaga de Verão e de Inverno são, virtualmente, duas
cidades diferentes. A praça foi fundada a 1175. Traduzindo, Kultorvet é a “Praça do Carv~o” vindo,
antigamente, os cidadãos de Copenhaga aqui comprar o seu combustível.
Købmgergade é a rua que atravessa a praça na diagonal. Quando a rua foi fechada ao trânsito, em 1973,
foram, igualmente, removidos os carros estacionados que a ocupavam, no intuito de promover Kultorvet a
um estrito uso pedonal. O trânsito viário viu-se assim invertido pela multidão que atravessa a praça na
direcção de Købmgergade.
“Tem-se procurado recentemente substituir o conceito de centro, envolvido pelas zonas residenciais,
como um caroço de fruto, por faixas de atravessamento ou centro percurso que não sendo privativo de
nenhuma, serve por secância ou tangência, não só as áreas imediatas mas mais extensos territórios.”4
Kultorvet é hoje uma apetecível mistura de actividades e de espacialidade, tornado um local popular
pelas várias lojas e quiosques oferecidos ao público, além dos cafés e barracas que vendem flores, frutas e
legumes, arrebanhados nessa área convencional de praça. O espaço cruza ainda outros tipos de actividades,
tais como demonstrações políticas e ideológicas, performances, música de rua, paradas, etc.
Símbolo
Elemento Natural
Contexto Urbano
4 PORTAS, Nuno, A cidade como arquitectura : apontamentos de método e crítica, pref. Fernando Távora. Lisboa : Livros Horizonte, 2007, pág.
135
23
Actual Praça do Cubo na Ribeira.
Mercado da Ribeira, nos antigamente
denominados “Cobertos da Ribeira”.
Ribeira, hoje reconvertida numa zona de
restauração.
22.
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23.
24.
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26.
25.
Vista aérea da Praça Maior sobre a malha urbana
de Madrid.
Praça Maior de Madrid, origem no século XV.
24
Praça da Ribeira, Porto: Considerada uma das mais antigas praças da cidade, a Praça e o Cais da Ribeira
já eram mencionados em cartas régias de 1389. No início do século XV, a Ribeira fervilhava de gentes
ligadas às múltiplas actividades do rio e do mar, domínio dos mercadores e geradora de burgueses, com o
centro na Praça da Ribeira e em expansão para a Rua Nova. Em 1491, um violento incêndio consumiu
grande parte das casas da Praça e das zonas circunvizinhas. Ao processo de reconstrução da área juntou-se
a decisão de lajear o piso da praça. As fachadas das casas da Ribeira, no processo de reconstrução,
formavam arcos que assentavam sobre colunas e criavam um espaço que, na época, era denominado de
“Cobertos da Ribeira”, lugar de uma intensa actividade comercial.
O plano almadino apenas foi concretizado nas frentes norte, com a monumental fonte da Praça da
Ribeira, a poente. A sul, a muralha antiga acabou por ser derrubada em 1821 e, a nascente, as construções
medievais sobrevivem até hoje. Na década de 1980, as intervenções arqueológicas feitas no local põem a
descoberto, no centro da praça, um chafariz do século XVII. Reconstruído no seu local de origem, o chafariz
foi coroado por uma peça escultórica da autoria de José Rodrigues, conhecida vulgarmente por "Cubo da
Ribeira". A 24 de Junho de 2000, foi inaugurada, no nicho da Fonte da Praça da Ribeira, uma estátua de São
João Baptista, da autoria do escultor João Cutileiro.
Actualmente, a Praça da Ribeira é um lugar de visita indispensável a quem passa pela cidade, zona
muito frequentada por turistas, atraídos pelos muitos bares e restaurantes que fomentam uma animada
vivência nocturna e de pura diversão.
Símbolo Elemento Natural
Contexto Urbano
Praça Maior, Madrid: As origens da praça remontam ao século XV, quando na confluência dos caminhos
que ligavam Toledo a Atocha, fora da cidade medieval, estava a Plaza del Arrabal, o mercado principal da
vila, tendo sido aí construído um primeiro edifício portificado para regular o comércio da zona. Em 1580,
depois de se haverem transferido as cortes para Madrid em 1561, Filipe II encarregou o arquitecto Juan de
Herrera do desenho de remodelação da praça.
A Casa de la Panadería, a norte, foi então o primeiro edifício a surgir na nova praça, em 1590. Em 1617,
Filipe III encarregou Juan Gómez de Mora de finalizar as obras, tendo sido terminadas a 1619. Uma estátua
equestre de Filipe III foi colocada no centro da praça, corria o ano de 1848. Todavia, o perfil representativo
e monumental da Praça Maior de Madrid foi sendo construído e reinventado ao longo de três grandes
incêndios. É uma praça rectangular, de 129 metros de comprimento por 94 de largura, com uma grande
uniformidade das fachadas, cedendo-lhe o cariz de “peça única e completa”. Rodeada, em todas as frentes,
de edifícios de três pisos, ergue-se a sul a Casa de la Carniceria, oposta à Casa de la Panaderia. As entradas
efectuam-se a partir dos nove pórticos distribuídos pela praça, sendo independentes dos eixos de
circulação viária. O pórtico mais conhecido é o Arco de Cuchilleros, com o acesso feito por escadas, no canto
sudoeste da praça.
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30.
31.
Gravura da Praça do Comércio, séc. XVIII.
Vista aérea sobre a Praça do Comércio.
Arraial Gay Pride Lisboa 2010.
Alçado sul dos Pórticos.
Planta dos Pórticos do Templo, 1781.
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Povoada por centenas de turistas, as suas cores, beleza e o seu constante movimento face ao estático
passar dos anos, dão um valor especial à Praça Maior de Madrid. Nas arcadas dos pórticos estão hoje
estabelecidas lojas tradicionais e cafés e, ao Domingo, é neste espaço praticada a feira dos Coleccionadores.
Símbolo
Elemento Natural Contexto Urbano
Praça do Comércio, Lisboa: A história da Praça do Comércio volta-se para a época dos Descobrimentos,
ali chegando os carregamentos das especiarias, entre outros produtos provenientes das rotas marítimas.
No ano de 1511, o rei D. Manuel I decide transferir a sua residência real para este sítio junto ao rio. O Paço
da Ribeira, assim denominado, bem como a Biblioteca Real de 70.000 volumes foram, porém, alvo da
avassaladora destruição do terramoto de 1755. No projecto de reconstrução da cidade que se seguiu, a
Praça do Comércio define um dos pólos, juntamente com o Rossio, na estruturação da nova malha
pombalina. Em 1759, constrói-se a nova praça, no local do antigo terreiro do Paço, ficando regularizado o
seu espaço.
Apesar de constituir uma excepção no próprio universo cultural português, a Praça do Comércio de
Lisboa demarca-se como um dos mais belos exemplos de praças reais, concebidas sobretudo no período
barroco e no contexto do Iluminismo. É, ainda, uma das maiores praças da Europa, com cerca de 36.000 m²
(180m x 200m) de área. Os edifícios formados por arcadas que circundam a praça, acolhem os
departamentos de vários Ministérios do Governo Português, onde se vê emiscuído o famoso café do
“Martinho da Arcada”. No centro da praça, alcançando os 14 metros de altura, está a estátua equestre de
D. José, erigida em 1775. A norte, o Arco Triunfal da Rua Augusta dá entrada para a Baixa, decorado por
uma majestosa estatuária: no cimo, a Glória coroa o Génio e o Valor, e sobre os pilares assentam figuras
importantes da História de Portugal. O lado sul da praça, com as duas torres quadradas, volta-se para o
Tejo, consagrando esta nobre entrada de Lisboa.
A Praça do Comércio era o local para onde se dirigia a comitiva reaccionária no 25 de Abril de 1974,
que pôs fim ao regime ditaturial do Estado Novo, numa proclamação de liberdade ímpar, sem
derramamento de sangue. Hoje, a praça serve de cenário a vários eventos culturais e espectáculos.
Símbolo
Elemento Natural
Contexto Urbano
Pórticos do Templo, Paris: As últimas décadas do Antigo Regime Francês apontam uma poderosa
inflexão das tipologias arquitecturais e urbanas. Os novos programas de arquitectura surgem aquando dos
planos gizados para a abertura de ruas e de praças, dos quais se esperavam melhoramentos na higiene
pública, no domínio da distribuição e da função dos estabelecimentos especializados. Sem que a noção de
monumento desapareça do panorama arquitectónico, a sobriedade acentua a grandiosidade, repondo-se ao
ornamento. A ideia do carácter próprio do edifício vem exercitar um tipo de arquitectura analógica à
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Vista aérea de Helsínquia com o Mercado a
bordejar Katajanokka a nascente e o Mar Báltico
a sul.
A marina e o mercado de Helsínquia vista do
extremo sul da Praça do Mercado, inícios de 800.
Mercado de Helsínquia com a Igreja ortodoxa e
um edifício de Aalto ao fundo.
35.
36. Mercado de Natal de Montreaux iluminado à
noite.
Mercado de Montreaux, 1891.
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função que nele decorre. Os Pórticos do Templo surgem assim no meio burguês parisiense em 1781,
através do desenho de M. Pérard de Montreuil.
A designação de Pórticos do Templo vê-se justificada pelo claustro onde foram construídos, marcados
pelo carácter isolado do conjunto edificado. Com 37 metros de comprimento e extremidades circulares, o
centro do complexo permite um pátio comum aberto, que liberta um espaço de 33 metros por 6 metros de
largura. Do exterior, a construção fica conformada por uma galeria coberta com quarenta e quatro arcadas,
apoiadas em colunas da ordem toscana que abrigam vinte e oito lojas, com as respectivas zonas de serviço
e a sobre-loja, totalizando a altura das arcadas. Acima destas, elevam-se dois pisos (existindo um terceiro
nível apenas praticado em altura) divididos em pequenas habitações. A austeridade e simplicidade da
arquitectura não diminui, todavia, o manifesto interesse que sobressai da elegância do edifício.
Símbolo
Elemento Natural Contexto Urbano
Praça do Mercado, Helsínquia: A cidade de Helsínquia espraia-se por uma série de baías, penínsulas e
ilhas. A Praça do Mercado, dos inícios de 1800, fica localizada perto do centro de Helsínquia, no extremo
leste da Splanati, fronteiriça à península de Katajanokka, a nascente, e ao mar Báltico, a sul.
Perto do Parque da Esplanada, num ponto- limite do mercado, situa-se uma fonte com a estátua de
Havis Amanda, a “sereia” de Helsínquia. Voltados para o mar est~o os edifícios da C}mara Municipal de
Helsínquia, da Embaixada da Suécia e do Palácio Presidencial. Junto à praça, por detrás dos portos, está o
antigo Mercado Municipal, o primeiro de seu tipo na Finlândia, um edifício vermelho e amarelo-tijolo
construído em 1888. Recentemente renovado, é um óptimo lugar para provar os produtos típicos como o
peixe, a carne seca de rena, pães, frutas, dentro de tantas outras iguarias regionais.
Entre a Primavera e o Outono, a Praça do Mercado é animada pela actividade de vendedores, expondo
alimentos frescos e souvenirs, tal como pelos muitos cafés ao ar livre que servem o espaço. O auge da
popularidade da praça acontece nos inícios de Outubro, com o anual mercado de arenque
(silakkamarkkinat em finlandês). Existe, também, uma longa tradição de exibição de carros antigos
americanos, na sexta-feira de cada mês. De Verão, a praça fica ocupada até tarde da noite.
Símbolo
Elemento Natural
Contexto Urbano
Mercado de Natal de Montreaux: O Mercado de Montreaux é um dos três mercados de Natal na região
do Lago de Genebra. Próximo do famoso Casino de Montreux, cujos jardins se enfeitam para a ocasião, o
Mercado de Natal de Montreux representa a tradição dos mercados europeus de Natal, de atmosfera
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Frente da base alemã submarina de Saint-
Nazaire, do período da II Guerra Mundial.
Cobertura do edifício com ligação à cidade feita
por uma rampa.
Interior da base submarina reactivado para dar
lugar aos novos equipamentos urbanos.
Arco de dupla axialidade, colocado a meio da
estrutura, enfatizando as diversas entradas.
Estrutura coberta do Mercado de Montreaux.
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francesa. A história destes mercados de Natal remonta aos tempos medievais, quando se introduziram
alguns eventos para o público no negrume do Inverno, de modo a iluminar os dias escuros e o espírito do
povo. Pousado sobre a margem do lago, o mercado remonta ao ano de 1891.
Tendo a reputação de mais belo mercado de Natal de toda a Suíça, apresenta mais de 120 bancas de
madeira, ricamente decoradas em estilo chalet, pelas mãos de artesãos e comerciantes que oferecem uma
série de presentes originais de Natal, em ambientes quentes e acolhedores, associados a um
entretenimento musical excepcional. As adições mais recentes deste Marché de Noël foram desenvolvidas
especialmente para crianças: a Fábrica de Brinquedos do Pai Natal e a cénica viagem de comboio para
visitar o Pai Natal, na sua casa de montanha no topo de Rochers Naye. Em 1992, uma estátua do célebre
cantor dos Queen, Freddie Mercury, foi colocada junto ao mercado, nos jardins à margem da água.
Símbolo
Elemento Natural
Contexto Urbano
Antiga Base Submarina, Saint Nazaire: Saint- Nazaire possui uma imensa baía na margem direita do
estuário do rio Loire, junto ao Oceano Atlântico. De próspero porto comercial do início do século, passou a
porto nazi, na II Guerra Mundial. Uma fortificada base submarina foi então construída, com 9 m de
espessura de betão na cobertura, capaz de suportar os bombardeamentos da força aliada.
O novo projecto para a base submarina de Saint-Nazaire constitui, sobretudo, uma afirmação de
consciência do presente e de superioridade sobre o passado. A intervenção forte e catalizadora sobre a
antiga base alemã, transformou-a no cerne atractivo dos espectáculos urbanos, recuperando em
simultâneo algumas das actividades ligadas à construção naval. De lembrar que a água, nas cidades
portuárias, está associada à refundação e afirmação da nova condição urbana. Trataram-se os espaços
envolventes e da cobertura do edifício, uma “praça” aberta { cidade, com a construç~o de uma ligaç~o por
rampa. Transparência através da massa é o conceito por detrás deste portentoso volume. A penetração da
base, transformada em um enorme átrio, permite contemplar, desde o alto, as distintas formas da cidade, o
estuário do rio e a excepcionalidade geográfica da região.
Domesticar a base abrindo-a a um uso público mais amplo, com um sistema flexível de espaços e fluxos,
de programação variada e sistemática, espectáculos diversificados e exposições, é o mote do projecto. O
arquitecto: “Mi trabajo se sitúa sobre la piel de las ciudades. Su epidermis es lo que estudo, lo que disfruto y lo
que me permite abordar sus estructuras m|s profundas.“5
Símbolo Elemento Natural Contexto Urbano
5 SOLÀ-MORALES, Manuel de, De cosas urbanas, Textos Kenneth Frampton, Hans Ibelings. Barcelona: Gustavo Gili, 2008, p.23
31
Entrada na Praça do Mercado.
Planta do Mercado de Gurna, 1948.
1) entrada pública. 2) fiscal. 3) restaurante ao ar
livre. 4) café. 5) zona de exposição de
mercadorias. 6) zona dos vendedores de grão. 7)
exibição do gado. 8) entrada na aldeia. 9) pombal
Arcadas no local de venda de mercadorias.
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Praça do Mercado, Gurna: Gurna, que significa “promontório”, é uma pequena aldeia, cerca de 100
metros para leste do Templo de Seti I. Criada sobre a vasta necrópole do Túmulo dos Nobres, já do segundo
milénio a.C. onde os ricos e poderosos instalaram as suas tumbas, a comunidade inteira vivia então de
explorar esses túmulos. Essa situação manteve-se até que o governo egípcio tentou mudar a povoação de
7.000 habitantes, em 1948, para uma nova aldeia construída nas margens do Nilo.
De forma lastimável, a experiência em Nova Gurna fracassou, sem nunca ser terminada. Toda a teoria
de construção com tijolos de adobe e a atitude levada a cabo para um tipo de habitação rural, no uso de
materiais não industriais e de habilidade tradicional, foram condenadas como excêntricas e impraticáveis.
O que resta da original Nova Gurna é a mesquita, o mercado e um par de casas, sendo a maioria da
habitação existente de posterior construção.
Centro da economia da aldeia, o mercado funciona ao alvitre das estações e do ritmo da vida
campesina. Confinado ao canto sudoeste da aldeia, nas proximidades do caminho-de-ferro, a praça celebra
uma festa pública sem igual, fonte de regozijo e de uma sábia mestria social, que dá como concluídas todas
as transacções da aldeia num único dia da semana. Reporta o arquitecto de Nova Gurna:
“Eu queria dar à praça do mercado de Gurna um aspecto mais acolhedor. Os animais têm
manjedouras permanentes, a altura indicada para cada um – camelos, cabras ou burros – e estão
todos à sombra, graças a várias árvores dispostas de forma regular. Os comerciantes podem montar
as suas bancas à sombra de uma sequência de abóbadas e h| um café para os homens.”6
Símbolo
Elemento Natural Contexto Urbano
6 FATHY, Hassan, Arquitectura para os Pobres, uma experiência no Egipto Rural, publicação original: Cairo, 1969; trad.Joana Pedroso Correia,
Argumentum e Dinalivro edições, 2009, p.86
33
“Tales construcciones deben lograr seguridad, utilidad y belleza. Se conseguir| la seguridad
cuando los cimientos se hundan sólidamente y cuando se haga una cuidadosa elección de los
materiales, sin restringir gastos. La utilidad se logra mediante la correcta disposición de las partes
de un edificio de modo que no ocasionen ningún obstáculo, junto com una apropriada distribución
–según sus proprias características - orientadas del modo más conveniente. Obtendremos la
belleza cuando su aspecto sea agradable y esmerado, cuando una adequada proporción de sus
partes plasme la teoria de la simetría.”7
7 POLÍON, Marco Vitrúvio, Capítulo tercero, Partes de la arquitectura in Los diez libros de arquitectura, int. Delfín Rodríguez Ruiz, versión
española José Luis Oliver Domingo, Madrid, Alianza, 1995, p.73
34
II. O PROCESSO INTUITIVO NA BASE DO PROJECTO
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Entrada no pavilhão.
Alçado principal.
O pavilhão alemão para a Feira Universal de
1929, Barcelona.
Espelho de água e o pavilhão em fundo.
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FIRMITAS: Pavilhão Barcelona de Mies van der Rohe
– o espaço desmaterializado.
conceitos
Faça-se uma primeira abordagem à obra a partir das directrizes simbólicas que a guiam ao longo dos
seus elementos singulares. A arquitectura de Mies trata a ilusão, tal como a esperança, num duplo sentido
que intenta completar o real, atingindo-o com notas subtis em ligação com o que o rodeia. A obra parte de
um simulacro universal, não pretendendo a reinscrição na realidade, mas sendo em parte dada à
sugestibilidade. A esse fenómeno que a faz desprender-se do contexto, através de um desenho
empreendedor e singular, dá-se o nome de totalização.
”Totalization in Mies’s work becomes an aesthetic means to overcome the constraints of the
immediate situation and to reveal the active influence of a whole range of social and historical
forces on the particular architectural event.”8
A arquitectura de Mies encontra-se num estádio exigente do desenvolvimento do estilo moderno, onde
se treinam novos modos de percepção, necessários a que funcionalmente se ocupe uma próxima situação.
Todavia, o que se pretenderá com tal façanha no campo da arquitectura? Considerada a intenção de se
atingirem acordos bilaterais que fomentem o sucesso futuro para a indústria dos países, a obra de Mies
existe dentro de uma forma de se libertar dos constrangimentos actuais, dando azo a que se crie uma nova
visão válida, na afirmação pela diferença, dentro dos domínios políticos, sociais e estéticos, bem
ponderadas as devidas valências espaciais. O desenho do Pavilhão Barcelona, concordante com um espaço
aberto, de intuição e imagética, apresenta assim traços de intemporalidade que o fazem alvo de inspiração
futura.
“For Mies, the interpretation of any intervention in a given reality entails not the nullification of
that reality, either physically or conceptually, but rather the construction of the demand and the
terms for that reality’s real transformation in a specific future.”9
A influência activa que o acompanha em toda a extensão social e histórica, fá-lo um acontecimento
incontestável para a criação de uma nova imagem estética “(…) architecture becomes social through its very
opposition to society, becomes significant through its refusal to signify.”10 O espaço tenta realizar-se, ao
máximo, amplo e flexível. O pavilhão apresenta uma grande clareza formal no seu interior, servindo-se dos
planos parietais na orientação do utente para os pontos de acesso do edifício, e na intermediação dos
espaços de passagem com os de estar.
elementos arquitectónicos
O pavilhão alemão foi implantado no limite meridional da Gran Plaza de la Fuente Mágica, o centro vital
da exposição, por detrás de oito altas colunas jónicas de pedra arenisca que, já em 1923, haviam construído
Puig e Cadalch, como elementos definidores do limite geométrico do grande recinto central da exposição.
8 HAYS, K. Michael, The Mies Effect in Mies in America, by Phylis Lambert, phot. by Guido Guidi and Richard Pare, Montréal, CCM, cop. 2001 9 ibidem 10
Allegory unto Death: An Etiology of Eisenman’s Repetition in Cities of Artificial Excavation, exh. Cat. Canadian Centre for Architecture, New York, Rizzoli, 1994, p.104 - 117
37
Interior / exterior.
Passagem / Estar.
Zona de estar.
Pátio menor.
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Mies é frequentemente reconhecido dentro dos quadrantes classicistas que o apontam como um
veterano da corrente, numa busca ansiosa de significado. Dentro dos que de tal o acusam está o arquitecto
espanhol Ignasi de Solà – Morales11. Numa interpretação da sua crítica, o redesenho das obras clássicas,
nesta obra objectivamente, apresenta-se em completude do que se passa em volta. Se numa alusão ao
Parténon, como primeiro paradigma do mundo clássico (originalmente um edifício coberto, de uma
soberania transposta para as gigantescas colunas que assentam sobre um plateau portentoso), o
simbolicamente associarmos às inovadoras ideias do arquitecto alemão, apercebemo-nos, então, dos
factores intervenientes no projecto de Mies: que propõe para o espaço uma cobertura, a 3,10 metros do
solo, “varrendo” toda a estrutura, bem como uma assinal|vel plataforma onde vai assentar o “pavilh~o
invisível”. S~o estes elementos, somados { zona circundante com as oito colunas ali dispostas em linha,
como se aguardassem ser úteis a um espaço coberto, que fazem do projecto uma entidade única.
A leitura arquitectónica fica envolta por um espaço de influências remotas e diversas, de resistência na
modelação de conceitos próprios, “So the appearance must be similarly minimal, similarly barren, in effect,
almost nothing.“12 O pátio, que nasce desse “palco”, plataforma elevada, é portanto o espaço da
representação, composto por elementos representantes que participam do cenário. Vejamos o espelho de
água, os visitantes e o banco afilado com o plano de travertino em fundo, com redobrada atenção sobre o
espelho de água - a sua presença no espaço projectado atesta à supra sensibilidade da forma aparente,
sendo que a subalternidade exposta na imagem reflectida ousa transpor a própria realidade.
O sentimento de “estar dentro” é evocado por este tipo de elementos que captam a luz através de
espaços não cobertos e que, na vida do dia-a-dia, são somente imaginados enquanto paredes confinantes,
“Borders turn us inward, but allow us to sense an “outside”, beyond enclosed space.“13 Este pensamento é
transversal à arquitectura de Mies, os seus limites fundem-se no apelo à nossa curiosidade por os
atravessar e melhor conhecer esse terreno da arquitectura onde nos vemos inseridos. A fechar o espaço a
sul, existe ainda um pequeno pátio fechado. Estes dois pátios, em conjunto, dão resposta a questões de
fundo da arquitectura, indo resolver problemas culturais e climáticos no controlo e manipulação da luz,
ventilação, privacidade e segurança. No pátio menor foi colocada uma estátua de Georg Kolbe, posicionada
lateralmente em relação ao espelho de água, e a eixo com a passagem para o exterior, a nascente.
As paredes interiores não desempenham a função de suporte da cobertura, servindo apenas um jogo de
divisórias contemplativas. Afim de se destituírem de quaisquer imposições rígidas, as paredes demonstram
um livre carácter em planta, negando a simetria e o estaticismo clássicos. A sua continuidade e suporte
estão garantidos por perfis metálicos em U com dimensões iguais aos módulos adoptados pela pedra, indo
ainda adoptar uma menor espessura, visto que o peso da cobertura fica apoiado por pilares cruciformes
que organizam a estrutura do edifício.
De facto, a estrutura esbelta dos perfis metálicos dão um ar extraordinariamente leve ao espaço
edificado. A laje fica então apoiada em oito colunas de secção cruciforme, cobertas por placas cromadas.
Estas colunas, executadas com uma técnica avançada para a época, são uma solução de modernidade que
situam, em posição superior, o pavilhão no seu tempo, assumindo-se enquanto imperativo da forma de
pensar e das complexidades urbanas e tecnológicas.
11
mies van der rohe y el minimalismo in Diferencias: topografia de la arquitectura contemporânea, de Ignasi de Solà-Morales; prol. Peter Eisenman, Barcelona : Gustavo Gili, 2003 12 K. Michael Hays,The Mies Effect in Mies in America, by Phylis Lambert, phot. by Guido Guidi and Richard Pare, Montréal, CCM, cop. 2001 13
Within…in Mies in America, by Phylis Lambert, phot. by Guido Guidi and Richard Pare, Montréal, CCM, cop. 2001
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Passagem a nascente, vista desde o pavilhão
principal.
Caixa em vidro fosco com iluminação interna.
Escultura de Kolbe no enfiamento visual da
passagem a nascente.
Pavilhão iluminado.
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materiais
A obviedade da proposta arquitectónica como forma minimalista é tratada por Mies através da
economia de meios que transporta para os desenhos e, consequentemente, para o espaço arquitectónico.
Desse projecto arquitectónico que tem por fim servir a sociedade, enuncia o próprio: “Architecture is a
language with the discipline of a grammar. In ordinary life, one can use this language as prose; but if one is
very good, one can be a poet.”14
O espaço tem de se imbuir de um certo estado espiritual que o faça receptáculo do homem, na sua
necessidade de abrigo, de silêncio e de domínio ou paz. A boa arquitectura encontra-se então entabulada
por dois cânones que a fomentam: um, a natureza (o lado de fora), o outro, os seres humanos (o lado de
dentro). Para que a arquitectura “respire”, é fundamental que haja trocas. O pavilhão, em latim papillio,
tenda prazeirenta ou edifício livre, está associado, em regra, aos temas de jardim ou paisagem natural.
Só a partir das condições materiais podemos almejar alcançar as forças que actuam no seu interior e o
autêntico campo de actuação que é, sem dúvida, o dos significados. Mies, em 1953, “The visible creates
material form; the invisible gives it value.”15
Comentários da época louvam os reflexos, os brilhos, a perfeição e a alta tecnologia que os materiais do
pavilhão alemão exibem, nessa forma de matéria abstracta, geometricamente cortada, lisa e polida, matéria
consistente, evidente, sólida e com uma exactidão e clareza de montagem inigualáveis. O sentido pioneiro
da obra de Mies está compreendido na distinção clara que se estabelece entre os elementos estruturais e
não – estruturais, numa visão aberta e livre, que oferece um tipo de espaço completamente novo.
São quatro os tipos de mármore que compõem o Pavilhão de Barcelona: o travertino romano, o
mármore verde dos Alpes, o mármore verde de Tinos e o ónix Atlas. O mármore que mais vai marcar a
imagem do edifício é o travertino romano, do qual estão feitas as paredes exteriores e todo o pavimento. O
interior e o exterior são ordinariamente tidos como entidades autónomas, a tensão que daí nasce permite-
nos sentir, alternadamente, “o dentro” e “o fora”. Contudo, o papel dos elementos comuns que assinalam
ambos os espaços é, pelo contrário, o de atribuir totalidade ao espaço, mediante uma leitura contínua. A
14
Mies van der Rohe, citado por David Spaeth, p.7 15 Wilhelm Richard, Laotse, ibididem, capítulo 11
57.
Planta do Pavilhão Barcelona, de Mies van der Rohe.
41
Loja do pavilhão.
Muro e banco reflectidos na água.
Passagem a nascente, vista para o pavilhão.
Peça de mobiliário desenhada para o Pavilhão de
Barcelona.
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propósito destas reflexões, diz-nos o grande sábio chinês Laotse: “The origin of both is one; they are
different only in name. The secret lies in their unity”16, visando a continuidade. O pavimento estava dividido
em lousas quadradas de aproximadamente 1,10 metros de lado, que Mies tomou a liberdade de modificar,
numa quadrícula jamais adoptada em rigor.
Todavia, o tipo de mármore que mais ênfase garante ao edifício é, sem dúvida, o ónix Atlas, comprado a
um marmorista de Hamburgo, que forma o muro livre central do espaço coberto do pavilhão. Constituído
por peças de grandes dimensões: 235 x 135 x 3 cm, converte o plano de parede numa peça majestosa de
beleza ímpar, em harmonia com todos os referenciais do espaço. Tal como nas casas antigas chinesas, que
demonstram uma adaptação completa ao estilo de vida do ocupante, do espaço que habita – mesmo que
hábitos regulares como comer e dormir estejam nele incluídos, ou a mais elevada concentração espiritual -
o ser humano inscreve-se num espaço que o deixa completamente em comunhão consigo próprio.
Este edifício de vidro e mármore projectado por Mies providencia ao visitante o sentido de refúgio dos
restantes e apinhados espaços da exposição. O muro, partido em três segmentos que cercam o edifício e
conformam o espelho de água menor, é de mármore verde dos Alpes, enquanto que o muro que se adossa à
entrada principal, junto às escadas de acesso, é executado em mármore verde de Tinos. A
desmaterialização, por um lado, e a estranheza dos materiais, por outro, permitiram ao Pavilhão Barcelona
ser transformado numa experiência estética. O espaço proíbe o barulho e esconde conversas, convida à
meditação e dá a impressão do sagrado.
O encerramento visual do pavilhão fica a cargo dos planos de mármore, bem como das lâminas de vidro
que, em alguns locais, são coloridas (cinzento, verde ou branco), reflectindo objectos, árvores e pessoas. A
única parede transversal foi feita em vidro fosco e possui luzes que proporcionam a iluminação interna e
externa do pavilhão. A bailarina de Kolbe, contida num fundo de matizes verdes, produz um sentimento de
nobre calma e sublime tranquilidade.
Os percursos estão definidos não só pelos planos que conduzem o indivíduo, mas igualmente pelo
mobiliário que controla o desenho dos espaços e a forma clara como nos movemos dentro da casa. No
interior, os bancos e cadeiras, com a patente do pavilhão, foram feitos com barras de aço cromadas,
forradas com almofadas de couro branco, e os tampos das mesas realizados em placas de vidro negro
opaco.
experiência pessoal
Decorria o 2º ano do curso de Arquitectura quando se deu a viagem a Barcelona, organizada no âmbito
da disciplina de Projecto II. Uma multidão de estudantes que acorreram aos locais de maior interesse na
cidade e planos limítrofes, com uma panóplia de coisas para explorar: o centro histórico integrado no plano
de Cerdà, a Fundação Joan Miró, as Faculdades de Arquitectura, a piscina em Cornellà de Llobregat e o
Instituto Meterológico de Álvaro Siza, o Fórum de Barcelona de Herzog & de Meuron, a Torre Agbar do
Foster, bem como toda a prolífera obra de Gaudi, entre tantos outros apontamentos de cidade e, como não
poderia deixar de ser, o Pavilhão Alemão de Mies van der Rohe.
16 Wilhelm Richard, Laotse, Tao Te King, capítulo 1º, Köln, 1975
43
62. Desenhos de análise ao Pavilhão alemão na Feira Universal de Barcelona, na relação com o projecto.
44
Recordo-me bem. Aproximámo-nos do local, o pavilhão alcançável já à vista, ouvíamos as indicações da
visita e referências sobre a obra. Parecia um enorme objecto ali pousado a um canto. Afigurava-se, contudo,
algo com demasiada transparência para se transpor ao plano puramente escultórico e demasiadamente
curioso, para que de modo simples, fosse reportado a um tipo de arquitectura óbvia, concisa no significado.
À medida que irrompíamos por aquela estrutura adentro, o “para que serve” que me sulcava o
subconsciente, foi-se transformando em deleite gradual, perante essa arquitectura que recolhia
cuidadosamente amostras de todos os locais fascinantes do mundo e os recolocava sabiamente em
uniformidade. O travertino do chão afigurando-se um deserto imenso, a água apartada a um dos oceanos,
as paredes em mármore de cada textura e cor, distintas cópias dos tipos de rocha espalhados pelos quatro
cantos do mundo.
Tudo tão horizontal, numa aproximação mais real que a própria realidade natural. O homem que
dispõe do mundo à sua escala. Habitação simbólica, percorrível através de uma sinalética planar que nos
orienta e intui na descoberta dos espaços. A sensação de liberdade é de tal ordem que os planos parietais
são o que confinam o espaço e o extrapolam em igual ordem. Trata-se de paixão, a mesma que nos
arremessa aos braços de quem gostamos até que sintamos para lá da sua massa corpórea. Estamos na
presença de um edifício com alma.
45
Reconstrução 3D da Biblioteca do Fórum.
Coluna de Trajano no pátio entre as duas
bibliotecas. Atrás vê-se a Basílica Úlpia e, em
primeiro plano, o Templo de Trajano.
Fórum de Trajano na actualidade, atravessado à
cota superior pelo trânsito viário.
Maqueta do complexo dos Fóruns, Roma.
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65.
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46
UTILITAS: Mercado e Fórum de Trajano em Roma
– uma estrutura social.
o locus
O Fórum Romano, centro do Império, referência na construção e na transformação de muitíssimas
cidades do mundo clássico, e fundamento da arquitectura do classicismo, tem formas e situação anómalas
em relação à ciência da cidade, tal qual era praticada pelos romanos. O Fórum de Trajano, construído entre
107 e 112 d.C., tem origens simultaneamente geográficas e históricas, uma zona baixa e pantanosa entre
colinas alcantiladas e águas estagnadas entre choupos e canaviais, que alagavam completamente o centro
durante as chuvas, sobre as colinas, bosques e pastagens.
Com uma área de 300 x 190 metros, o projecto abrangia uma área de 5,5 hectares, havendo a
necessidade de se expropriar grande parte das áreas habitadas, com vista à ambiciosa construção do
fórum. No programa, foi necessário o recurso a terraplanagens e à execução de terraços, por forma a
permitir a estabilização do terreno e a abertura de um caminho até à encosta sul do Quirinal. O Fórum
Monumental de Trajano foi, assim, o último e o maior a ser erguido na Roma Antiga, permanecendo activo
até ao ano 800, para cerca de um milhão de pessoas que habitavam a capital italiana.
Na sua condição de centro cívico, é composto por diversas actividades, recolhidas nos equipamentos
que servem o povo e enobrecem a imagem do Imperador. Enuncio, de seguida, os elementos que possuem
uma relação directa com as entidades atrás mencionadas, a par das funções que lhes são complementares.
o imperador
Para vanglória do chefe, celebra-se, então, o imenso Império conquistado com a construção de um
grandioso projecto para o centro de Roma. A colossal coluna de Trajano que fica a assinalar o fórum é um
1) Fórum de Júlio e templo de Vénus Genetrix. 2) Fórum de Augusto e templo de Marte Ultor. 3) Fórum Transitório e templo de Minerva. 4) Fórum de Trajano. a) Basílica Úlpia. b) Coluna de Trajano. c) Templo de Trajano divinizado. d) Mercado de Trajano.
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71.
Imagem de reconstituição da entrada para a
Basílica Úlpia.
Imagem de reconstituição do centro do fórum.
Imagem de reconstituição da Basílica Úlpia do
fórum.
Colunas deixadas ao alto no actual fórum.
70.
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monumento comemorativo da conquista da Dácia. O imperador, idolatrado a partir de uma estátua de
bronze dourado, posta a 30 metros de altura, encima a coluna, dominando toda a vista sobre Roma.
o popolu
O Forum Romanus ou Forum Magnum sempre se estabeleceu como facto específico da cidade, uma
parte que sumariza o todo pelo espólio das actividades com que se define e pelas gentes que habitam a sua
arquitectura, enquanto vivência única e exemplar. É na qualidade de lugar de encontro que o fórum
permanecerá vivo até à queda do Império. “Resume Roma e é parte de Roma, a sua individualidade é mais
forte que o conjunto dos seus monumentos (…)”17
A entrada para o recinto assume autonomia arquitectónica e é resolvida com o tipo de arco honorário.
Muros altos ficavam a cercar o fórum, impedindo a vista do exterior, como também acontecia nos teatros
romanos implantados na urbe. Aproximando-se da forma quadrada, o centro do fórum media 118 x 89
metros, circundado por pórticos que abrigavam galerias e pela basílica que nasce do seu lado norte –
ocidental. O templo tradicional, servido do espaço da praça como recinto limitador é, no contexto aplicado
ao Fórum de Trajano, preterido em função da imagem da basílica, cuja disposição liberta a praça de
contemplações subalternas.
O fórum aqui revisto, embora partilhando aspectos em comum com os fóruns precedentes, soube
explorar novos conceitos produtores de uma expressão revigorada, patente nas sensíveis considerações
feitas ao espaço. Na leitura da colunata em volta, o tempo traduzido em ponto focal da perspectiva, foi
suplantado pela imagem frontal e contínua da praça, onde fica, numa das frentes, inserida a fachada da
basílica, composta por rica ornamentação.
Um outro acontecimento vem alterar a história da praça do fórum, deixando-a isenta de funções
adjacentes ou, até então, convenientes pela lisura intrínseca ao espaço amplo da praça. Por meados do
século IV, o mercado deixa de se servir da praça para exposição do mais variado tipo de artigos,
instituindo-se esta como verdadeira praça, a sala-de-estar de um povo. Proferia Aristóteles: “A praça
pública… n~o ser| nunca conspurcada por mercadorias e a entrada ser| proibida aos artes~os… longe e bem
separada dela estar| a praça destinada ao mercado(….)”18
o administrativo
A Basílica Úlpia estava afecta às actividades judiciais e políticas, realizadas nos espaços entre os
pórticos no seu interior, com decoração que narrava a história do Império a partir de baixos-relevos
figurativos. A elegância do conjunto transparecia dos pilares e colunas talhados a mármore branco, das
galerias do último piso, do telhado de madeira com caixotões, ou mesmo das telhas de bronze mencionadas
por Pausanius. Tudo se constituía como motivo de virtuosidade do edifício, formalmente um todo
17
ROSSI, Aldo, A arquitectura da cidade , Lisboa : Cosmos, 2001, p.178 18 ROSSI, Aldo, A arquitectura da cidade , Lisboa : Cosmos, 2001, p.176
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Mercado de Trajano construído na encosta do
monte Quirinal.
Via Biberática a poente.
Vista lateral do mercado.
Centro comercial com estrutura em abóbodas de
aresta.
Nível da êxedra do Fórum.
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transversal com 165 metros de comprimento. Era a maior basílica jamais construída no Império, com uma
planta de cinco naves e ábsides nas extremidades que exerciam o papel de êxedras (salas de reuniões
científicas, filosóficas, etc).
De uma coesa relação com o poder do príncipe, o tribunal, que funcionava neste espaço, ditava as leis e
decretava os regulamentos jurídicos, de aplicação aos concidadãos romanos. Nas diversas salas do
complexo, proclamava-se o jus romanus e procediam-se aos julgamentos importantes. Advogados,
senadores e juristas discutiam a Res publica.
O sentido de glorificar o poder do Império e de Trajano, seu dirigente e combativo soldado, fica ainda
expresso na natureza triunfal da decoração dos pórticos e da basílica, em particular nas estátuas dos
prisioneiros Dácios. A impressão que há de transposição do estabelecimento militar para o coração
administrativo e judiciário de Roma, não passa, contudo, de vulgares e infundadas ilações. De certa forma,
os esquemas monumentais do Fórum de Augusto repetem-se ou são aqui reinterpretados e, a julgar pelos
textos e inscrições encontradas, vigoram os temas da administração e da justiça como principais
delegações.
o cultural
Em ambos os lados do pátio, onde queda a monumental coluna de Trajano na retaguarda da basílica,
ficavam as duas bibliotecas, uma grega e outra latina, formando a componente cultural do fórum. A
disposição que as duas peças apresentam denota uma certa semelhança com o Templo da Paz de
Vespasiano. A estrutura, com lados que alcançam os 30 metros de comprimento, é coberta com abóbadas
de berço intersectadas, ao modo das basílicas e balneários romanos. Nas paredes, nichos acrescentam um
toque profuso ao espaço interior, completando o repositório de uma civilização que neste local acolhe
obras antigas greco-latinas, legadas à cultura romana em herança histórica, literária e científica, a
continuar.
o sagrado
O complexo só virá a ser completado com a obra de Adriano, filho adoptivo de Trajano, seu herdeiro e
sucessor. Adriano manda construir o santuário de Trajano divinizado, bem como o friso histórico que, num
baixo relevo datado de 117, descreve os episódios da guerra contra os Dácios ao redor da coluna, em
conjunto com o depósito das cinzas de Trajano, no lugar do pedestal.
A rematar o eixo nascente – poente do fórum, numa vasta esplanada semi-circular rodeada por
pórticos, localizava-se o santuário octóstilo, no alinhamento último com a quadriga da entrada triunfal, a
estátua equestre no centro da praça, o eixo central da basílica e a Coluna de Trajano que o antecede. No
frontão do santuário, sustentado por dois fustes de granito com dois metros de diâmetro e quase com 20
metros de altura, estava representada uma imagem do herói na sua encarnação imortal. Dentro do templo,
o soberano deus, o divus trajanus, encontrava-se sentado no trono, como Júpiter, numa escultura
gigantesca que ocupava o espaço da cella. Em ressalva, fica a importância de Apollodorus de Damasco no
seu papel de benfeitor responsável por grande parte da arquitectura de tributo público à cidade de Roma,
síntese da vida política, judicial e religiosa do século II.
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77.
78.
78.
79.
Galeria curva, abobadada, no segundo nível do
mercado.
Rua de abastecimento atrás do centro comercial.
Tabernae, ao nível da êxedra, com arquitrave em
travertino.
52
o comercial
O mercado, enquanto fonte de trocas de bens e produtos e meio mobilizador da economia, assegurava
uma função essencial à vida de um milhão de romanos. Implantado por detrás da êxedra, no extremo norte
da praça imperial, a sua estrutura em semicírculo segue o movimento da colina galopante do Quirinal. Do
declive a que está sujeito - o mesmo se verificando com as êxedras da Basílica Úlpia e com a êxedra que se
lhe opõe do lado contrário da praça - nasce uma arquitectura rica nas potencialidades de adaptação ao
terreno, de acordo com as vicissitudes de cariz utilitário. Perfazendo uma altura máxima de seis pisos
erigidos, ergue-se a estrutura nos domínios da funcionalidade e da articulação de volumes, sob as
condições naturais do terreno. De forte relação com o que acontecia nos teatros romanos de contexto
urbano, a “casca”da construç~o é fundamental { sua imagem e determina a concepç~o global do edifício.
A plasticidade obtida pelo revestimento feito em opus cimentum, de construção base em tijolo, concede
uma leitura simples da tipologia do mercado, no acervo dos contrastes com o fórum, de elevados efeitos
marmóreos e com outro nível de detalhe.
O terreno não permitia um mercado porticado em torno de um pátio, ao estilo pompeiano ou
puteoliano, não apresentando pátios, colunas e arquitraves, antes galerias, arcadas e abóbadas.
Abandonando os princípios de axialidade na planta e de simetria na composição dos volumes, o arquitecto
de Trajano criou assim uma das melhores obras da arquitectura utilitária romana. A êxedra central,
inteiramente revestida a tijolo, comporta dois andares assentes num grande semicírculo de 60 metros de
diâmetro. No rés-do-chão estão 11 tabernae, cavadas directamente sobre a rocha da colina. Os pés-direitos
destas e as arquitraves em travertino marcam um ritmo de fachadas que se repete em cima, numa série de
24 janelas sobre as arcadas, encadeadas por pilastras com bases e capitéis igualmente em travertino, que
conformam uma galeria curva abobadada que a percorre por detrás. De fecho para a praça imperial, ficam
duas salas hemicirculares, cobertas de meias-cúpulas, que rematam a galeria com escadas de acesso entre
os dois pisos. Já a norte, a galeria prolonga-se por um corredor com tabernae de ambos os lados.
O terceiro nível do hemiciclo, ligeiramente recuado, comporta sobre um terraço formado sobre o
corredor, uma série de lojas abertas para o sentido oposto às anteriores, dando para uma rua de
abastecimento que se junta a poente com o movimento da estrutura curva. Apelidada, na Idade Média, de
Via Biberática, por nela haver casas de “comes e bebes”, a rua conduz-nos, a norte, até um edifício que
parece ter desempenhado um papel relevante no coração do complexo; uma espaçosa nave rectangular
coberta por abóbadas de aresta, com tabernae dispostas lateralmente e janelas que abrem para a Via
Biberática. A grande altura da nave permitiu a instalação de um segundo andar de lojas sobre as primeiras.
Mais a sul, a rua conduz-nos a duas partes, repartidas em dois níveis, onde funcionam os escritórios e os
serviços da administração do fórum.
conclusão
Tais eram os objectivos do plano, desenvolvidos a partir de uma linha vertical que atravessa todo o
corpo do fórum e de um outro eixo horizontal, menos marcante, que parte do centro da praça na direcção
do mercado, mergulhando na Roma Antiga:
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80. Desenhos do Fórum e do Mercado de Trajano, na relação com o projecto.
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O eixo vertical, de matizes cerimoniosos, tem um percurso formalizado em três níveis distintos que se
iniciam no cidadão comum, passando pela estátua equestre do triunfante imperador, feito o panegírico
máximo na coluna de Trajano (o segundo nível) e, por fim, rematando no espaço sagrado de Trajano
divinizado. É um eixo com limites definidos que lembra, de certa forma, a arquitectura do Antigo Egipto,
nas devidas semelhanças com o Templo de Karnak, pelo testemunho do caminho da vida até à morte e do
profano ao sacro.
O eixo horizontal toma por escala o homem e faz uma intrusão pelos planos inerentes às suas
actividades, desde a parte social ao carácter mais privado da sua habitação. Primeiro, a praça enquanto
livre disposição do homem colectivo, é o centro representativo do Homem. O mercado, construído num
plano intermédio, intercede a favor do conjunto de trocas a que os indivíduos se obrigam para vencer as
necessidades diárias, de abastecimento de bens de primeira ordem e afins, sendo, por assim dizer, os
“vesti|rios” da cidade, o que a serve e explora. Por último, a cidade como plano final dessa corrente
humanamente estruturada, é onde o cidadão se encontra já dentro de espaços com características cada vez
mais condizentes consigo próprio, entrando nos domínios da habitação. O eixo urbano, deste modo
organizado, formaliza uma conduta que percorre desde o abrigo colectivo, o fórum, ao abrigo individual da
sua casa ou morada.
O fórum tem implícita uma linguagem concreta, que reúne informações preciosas quanto à sua
adequação às valências funcionais. É possível o anúncio das formas estabelecidas, no desígnio da função e
imagem que se pretendem atingir, através de uma esquadria do desenho bastante ortogonal, sofrendo de
desvios impostos pela introdução de paredes curvas.
A linha curva por onde se efectua a passagem entre dois espaços, é um gesto que incita ao
acontecimento social, se averiguado numa perspectiva exterior de entrada no recinto, ou que, por sua vez,
exalta a condição do homem livre pelo movimento inverso de saída. Estes dois exemplos estão registados
pela disposição dos arcos de entrada para o recinto e pelo majestoso mercado que se “debruça” sobre o
fórum, de forma arqueada e abundante, numa feliz consagraç~o desse espect|culo “vivo”. J| a linha curva
de fecho, dá forma aos espaços de maior contenção do espírito, estando entregues, não raras vezes, ao
imagin|rio divino da luz que “desce dos céus”. Esta intenç~o arquitectónica é tida em conta no fecho do
recinto a norte, perfazendo o perímetro do santuário, e nas êxedras laterais do fórum, alvos de especial
atenção dado o destino dos seus usos.
55
A Praça de São Marcos no século XVI.
Vista aproximada à Baía de Veneza, com a Praça
de São Marcos e o Grand Canal.
Vista aérea sobre a cidade de Veneza.
O pátio do Palácio Ducal com entrada pela Porta
della Carta.
83.
82.
84.
81.
.
56
VENUSTAS: Praça de São Marcos em Veneza
– visualidade fluída.
a cidade
No fim da Idade Média, Veneza destacava-se pelo seu espólio de imensa riqueza e beleza inigualável,
difundido nesse território envolto por água. Nenhuma outra cidade lograra tamanhas conquistas na
aplicação de regras universais de estrutura medieval.
A localização estratégica que estabelece no mapa-múndi, tornou-a desde os tempos medievais o centro
comercial entre o Oriente e o Ocidente. Crescendo da abundância trazida dos mares, Veneza torna-se o
reflexo dessas vantajosas trocas comerciais.
“Embora exigisse as fidelidades dos homens, no decorrer das gerações, por seu esplendor e sua
ordem, não tinha pretensões de ser uma cidade ideal: representava meramente o melhor que uma
sucessão de enérgicos mercadores e industriais, que cortejavam o dinheiro e o poder podem
comprar, em condições de conceder.“19
As vizinhanças e as zonas industriais de Veneza, sem intenção de lhe retirar unidade, contribuíram para
evitar a concentração excessiva de população no seu centro. Contudo, em dias de feriado público, caso do
Festival Aquático, que celebrava o casamento da cidade com o mar Adriático, toda a gente confluía para a
Piazza de San Marco, a Piazzetta e os cais vizinhos, num enorme ritual colectivo. O maior dos canais de
Veneza, o Grand Canal, que rasga a cidade numa linha sinuosa, vai desaguar muito próximo da Piazza,
marcando bem o centro cívico da cidade. A meio desse curso de grande fluidez comercial, damos com
Rialto, o centro comercial por excelência de Veneza, que liga também por terra com a Piazza, através da
marceria, uma rua de mercadores.
Veneza, já uma fonte de imensa riqueza, vê implantada a República da Sereníssima no século IX. A
cidade ergue-se orgulhosa e lança-se na elaboração do mito como forma de propaganda universal, que é
apanágio da arquitectura clássica.
“N~o h| nada que os Venezianos n~o procurassem acrescentar { grandeza do estado, { sua
glória, ao seu esplendor. E isto leva-nos a fazer da sua cidade um vivo, maravilhoso monumento do
amor e da reverência que nutriam pela República. (…)”20
A cidade era um exemplo inovador em termos de urbanismo. Para os cidadãos, a singularidade obtida
através das unidades celulares de urbanismo, era fruto de um mero acidente de natureza da urbe, sem
mais julgarem os valores universais utilizados, sucessão de adaptações únicas e ousadas. “Num método de
caracterização coerente, a prosa torna-se função inseparável da poesia espacial, tanto na escala
arquitectónica como na dimens~o urbana.”21, ultrapassando qualquer tempo histórico ou imagem fixada da
cidade. A singularidade de Veneza é atributo dessa continuidade construtiva, unindo fachadas, ruas e
canais numa dialéctica comum, baseada na ordem complexa. A cidade, vista como um maravilhoso
percurso contínuo, associação de linguagens num só gesto.
19
MUMFORD, Lewis, A cidade na história : suas origens, desenvolvimento e perspectivas, 2ª ed., São Paulo : Martins Fontes, 1982, p.353 20 BERENSON, Bernard, The italian painters of the renaissence, Londres 1954; ed.it., Florença, 1965 in ROSSI, Aldo, A arquitectura da cidade , Lisboa : Cosmos, 2001, p.142 21 ZEVI, Bruno, Uma definiçäo de Arquitectura, trad. de José Manuel Pedreirinho, Lisboa : Ed. 70, 1986, p.110
57
Gravura com a colunata da Procuradoria Nova.
Vista aérea sobre a Praça e a Piazzetta de São
Marcos.
Frente de água do complexo de São Marcos.
87.
86.
85.
88.
Pórtico da Torre do Relógio e a Piazzetta dei
Leoni.
85.
58
a praça
A Praça de São Marcos é o símbolo da Veneza Republicana, representada pelo poder do Império, o
santuário nacional e a residência oficial do cabeça – de – estado, o doge. Todos os grandes eventos tiveram
aqui lugar, desde as coroações ducais até aos funerais de estado, as grandes vitórias navais, os rituais do
calendário cristão e, claro, a festa do padroeiro. A prova do seu carácter universal fica exposta pelos
participantes que a estas celebrações concorriam, provindo dos vários quadrantes da sociedade, como
modo de contribuírem para a imemorabilidade do evento.
No centro de Veneza, a Praça de São Marcos é um espaço aberto diante de sua igreja bizantina, onde
ficavam, a princípio, os pomares de São Marcos. A escolha da localização prévia do castelo ducal e da capela
dedicada ao primeiro padroeiro da República, foi essencialmente estratégica. A ilhota era suficientemente
firme e larga, fazendo face com a água na zona conhecida como a Baía de São Marcos, um seguro e extenso
porto para as embarcações. Por esta altura, a forma em L da Piazza e da Piazzeta já estava estabelecida,
embora não tivesse sido ainda reclamado ao mar o piso que veio permitir o livre deambular pela Piazzetta.
Próximo do lugar onde foi pela primeira vez edificado o Campanile, no século XII, construiu-se uma
casa de hospedagem para os peregrinos destinados à Terra Santa. Foi assim que começou a zona de hotéis
que surgiu depois. Já no século XII, uma Piazza, cheia de barracas de mercado, tomava forma ali. As
edificações que agora se elevavam ao redor da praça recordam o contínuo desenvolvimento que começou
com a própria reconstrução da Igreja de São Marcos, defronte da praça, em 1176, e que mais tarde fora
transformada em Basílica de São Marcos, inaugurada em 1094. Sucede-se a edificação do velho Campanile,
em 1180, cuja forma actual remonta ao ano de 1514. Iniciado em 1300, na contiguidade com a igreja,
estendendo-se para a Piazzetta, está o Palácio Ducal, e de 1520 é o antigo Palácio do Procurador, constrito
à ala esquerda da Piazza, um projecto de Pietro Lombardo. A Biblioteca Marciana, a cargo de Sansovino,
seguiu o resto das contruções, sendo o edifício que fecha o lado contrário da Piazzetta, de 1536, no local
das antigas padarias. Por fim, no braço direito da Piazza, a Nova Procuradoria foi construída em 1582.
Notemos que esta adição final da praça hoje existente, que a tornou um todo estético, se realizou tão só em
1805, uma vez concretizado o remate ocidental da Procuradoria. A praça actual apresenta 175 metros de
comprimento inseridos num espaço vasto, que vão desde o limite da praça a poente até à fachada da
Basílica de São Marcos.
Os caminhos para chegar à Praça de São Marcos apresentam direcções várias. Se nos aproximarmos de
São Marcos pela Ala Napoleónica, vemos a Basílica e o Campanário num plano frontal. Caso venhamos por
uma das várias entradas feitas ao nível do rés-do-chão da Procuradoria Velha, o cenário adquire outro
dinamismo, pela forma indirecta como estão hierarquizados os edifícios em perspectiva. Vindos da
Piazzetta dei Leoni, acabamos por ter, talvez, a mais interessante das aproximações, dentro de uma lógica
de percurso gradual. Já chegados por mar, a praça lê-se então como um prolongamento do porto, de
entrada imediata no centro cívico de Veneza. Por certo, a forma mais aparatosa e não menos deslumbrante
de chegar.
O método encontrado para descrever num nível mais rigoroso de relações de escala e estilo, os volumes
da praça, passou pela formulação de um trajecto que aproxime os diferentes elementos arquitectónicos a
partir da linha enunciada, porque a ordem é complexa e em tudo concreta nas determinações locais.
59
Ala esquerda da Praça de São Marcos com a
Procuradoria Velha.
Vista da Praça sobre o fundo denso da cidade.
Loggeta na base do Campanário.
Basílica de São Marcos enquadrada pela Torre do
Relógio à esquerda e o Campanário à direita.
92.
91.
90.
89.
60
O trajecto tem como referente inicial a Torre do Relógio, projecto de Mauro Codussi, datado de 1496. É
um importante elemento no arranjo da praça, marcando o ponto onde a marceria, a principal rua comercial
que segue dos mercados de Rialto, liga com São Marcos, tendo as embarcações e o mar como fundo. A torre
exibe, no cimo, figuras em bronze que batem com martelos no grande sino, ajudando à imagem icónica e à
gradual sofisticação das relações espaciais da praça. Peça introdutória a quem chega da Piazzetta dei Leoni,
remata por igual a vista a quem se aproxima da Piazza pela água, definindo um dos extremos desta enorme
praça em U. O espaço vai desenrolar-se em torno de um homogeneizado conjunto agrupado em três alas.
Adossada à Torre do Relógio, a norte, a primeira ala a ser construída foi a Procuradoria Velha, edifício
que veio abrigar os procuradores de São Marcos, os oficiais responsáveis pelo santuário. A Procuradoria foi
93.
Planta da Praça e da Piazzetta de São Marcos.
61
Torre do Relógio.
Esplanadas na extensão das arcadas das
Procuradorias.
Piazzeta di San Marco, vista para o Molo.
96.
97.
95.
94.
Piazzetta di San Marco, vista para a praça.
62
construída com características do estilo bizantino – veneziano, com uma longa colunata no rés-do-chão e
apartamentos e escritórios para os procuradores no primeiro piso. O facto de possuir uma escala superior
relativamente à Torre do Relógio vizinha, notório nos alinhamentos horizontais, é compensado pela
extensão do edifício e na visibilidade da Torre do Relógio, enquanto fragmento icónico reavaliador da
qualidade estética da basílica, face à estrutura funcional da Procuradoria que se lhe junta.
A ala mais estreita do conjunto, opondo-se à basílica, do lado contrário da praça, foi alvo de sucessivas
transformações. É o exemplo perfeito de que a cidade é o produto diverso de finalidades urbanas
cumulativas, “modificadas pelas circunstâncias, pela função e pelo tempo, produtos orgânicos que nenhum
génio humano sozinho poderia conceber em alguns meses”22 A Igreja de San Gimignano, reconstruída no final
do século XV e inícios do século XVI, veio aumentar a profundidade da praça, deixando-a com o dobro do
seu tamanho original. Somente em 1557 se deu início à construção do segundo edifício da Procuradoria, a
Procuradoria Nova, obra da autoria de Sansovino, conformando por fim a Praça. Sansovino decidiu
também que estes novos edifícios iriam incorporar uma colunata contínua que partia da fachada poente,
percorrendo todo o lado sul e retornava, por fim, ao outro extremo da praça.
Em 1797, após Napoleão ter alcançado a capitulação final da República de Veneza, o papel da praça, na
sua significação e contexto aparentes, acabou alterado. Napoleão planeja transformar a Procuradoria Nova
num novo palácio para o seu vice-rei italiano, da qual a mais dramática mudança foi a construção da Ala
Napoleónica, iniciada em 1807, que força a demolição de todo o fundo da praça a poente, incluindo a Igreja
de San Gemignano. O exterior da ala fora baseado nas duas primeiras ordens, a contar do nível térreo da
Procuradoria Nova mas, em detrimento de uma terceira ordem, a ala era encimada por um plano vertical,
decorado com frisos e figuras dos imperadores romanos. É possível, ainda, observar-se o modo como o
arquitecto da obra, Scamozzi, renunciou a enquadrar plasticamente a Procuradoria Nova, fazendo um
recuo quase imperceptível das três ordens mais do entabelamento, numa delicada separação altimétrica do
espaço fechado.
Da análise de cada edifício, em separado, concluímos que todos possuem uma identidade muito
própria. Neste sentido, a Procuradoria Nova liberta o Campanário da agregação de estruturas à volta da sua
base, e a torre sineira torna-se um elemento de maior dramatismo, activo símbolo da cidade. Inicialmente,
era também o ponto de observação e controlo da lagoa, além de se ter mantido, desde sempre, como marco
dominante na cidade. Com uma altura de 98,6 m, as suas formas são simples, sendo o corpo principal uma
coluna de tijolos, de 12m de lado e 50m de altura, sobre a qual assenta o campanário que aloja cinco sinos.
Perto da entrada da basílica, estabelece com esta um diálogo em tensão, por onde se descobre a passagem
entre as duas praças, em perfeita interdependência.
“(…) e é afrontando problemas deste tipo que nos damos conta da razão porque era tão
importante a arquitectura no mundo antigo e no Renascimento. Ela “conformava” uma situaç~o; as
suas próprias formas modificavam-se com a mais geral modificação da situação, constituíam um
“todo” e serviam para um acontecimento, constituindo-se elas próprias como acontecimento; só
22 MUMFORD, Lewis, A cidade na história : suas origens, desenvolvimento e perspectivas, 2ª ed., São Paulo : Martins Fontes, 1982, p.350
63
100.
101.
99.
98.
A Biblioteca Marciana e a coluna do grego
Todaro, patrono da cidade.
Coluna coroada pelo leão alado de São Marcos.
Travessia sobre o Canal di Palazzo.
Molo de São Marcos.
64
assim se pode compreender a importância de um obelisco, de uma coluna, de uma lápide. Quem pode
já distinguir entre o acontecimento e o sinal que fixou este acontecimento?”23
Na base do Campanário, a Loggeta desempenha por igual um papel importante no desenvolvimento
urbano da praça, respondendo ao alinhamento proposto pela monumental Porta della Carta, que dá
entrada para o Palácio Ducal através do seu pátio interno. Pequena em escala, a Loggetta é, porém, rica no
detalhe ornamental, rivalizando com a Porta della Carta em exuberância. Era aqui o ponto de encontro dos
membros da nobreza, onde estes aguardavam antes de se dirigirem para as sessões do Conselho Maior.
Símbolo máximo da cidade, a famosa Basílica de São Marcos encaixa-se num dos melhores exemplos da
arquitectura bizantina. Localizada ao lado do Palácio dos Doges, é a sede da arquidiocese católica romana
de Veneza, desde 1807.
“Inaugurada em 1094, é concluída nos três séculos seguintes com uma espectacular decoraç~o
de mosaicos, de esculturas, de ourivesarias. São Marcos sobressai em primeiro plano, faz valer seus
direitos não só pela opulência das formas tridimensionais, mas também pela luz da tarde que
proporciona efeitos de brilho em funç~o dos mosaicos...”24
A igreja apresenta uma planta actual em cruz grega, baseada nos exemplos de Santa Sofia e da Basílica
dos Apóstolos, ambas em Constantinopla. Embora a estrutura básica do edifício tenha sido pouco alterada,
a sua decoração mudou muito ao longo do tempo. Era raro um navio veneziano voltar do Oriente sem
trazer um qualquer excêntrico artefacto destinado à igreja. Aos poucos, a alvenaria exterior de tijolos foi
recoberta com mármores e demais elementos decorativos. Uma nova fachada foi erguida e os zimbórios
foram cobertos com estruturas mais altas, em madeira, de modo a dotar o conjunto de uma maior
harmonia na relação com o novo estilo gótico do Palácio Ducal.
O Palácio Ducal vem sendo refeito em formas góticas desde 1340, até ao fim do século XV. A grande
massa do novo edifício serviu para definir a Piazzetta e o Molo, dominando todo este inteiro lado da baía. O
estilo do palácio prestava uma sincera homenagem à cultura e civilização venezianas. A parte alta do
grande salão do Conselho Maior parece, à primeira vista, assentar milagrosamente sobre a parte
subjacente, aparentemente esvaziada de matéria, graças ao ritmo incessante dos arcos simples em pedra,
duplicados num segundo nível. Sem dúvida, um modelo de vitalidade, aromatizado com exaltação oriental,
imprimindo ritmo e decoração às arcadas reflectidas pelas águas.
O Molo era o ponto simbólico de recepção e de chegada, ficando o Palácio do Governo, ou palácio Ducal,
do seu lado nascente. A poente, a Piazzetta ia acumulando uma miscelânea de lojas, pousadas e barracas de
mercado que providenciavam facilidades tanto a cidadãos como a peregrinos, mas eram em tudo
detractoras da emergente dignidade do novo coração da cidade.
A história vem, em todo o caso, encarregar-se de atribuir o papel de praça da República à Piazzetta,
enquanto a Piazza permaneceu no lugar de santuário ducal. Na pretensão de enaltecer a já tão decorosa
Piazzetta, Ziani erigiu duas altas colunas monolíticas, em granito, dando uma mais ilustre imagem à
entrada por mar na cidade. As colunas foram coroadas por estátuas na representação dos dois patronos da
república: o grego Todaro e o leão alado de São Marcos.
23
ROSSI, Aldo, A arquitectura da cidade , Lisboa : Cosmos, 2001, p.155 24 BENEVOLO, Leonardo, História da cidade, trad. Silvia Mazza, 3ª ed. São Paulo : Ed. Perspectiva, 1999, p.290
65
102. Desenhos da Praça de São Marcos, na relação com o projecto.
66
Por último, temos a Biblioteca de São Marcos ou Biblioteca Marciana, também desenhada por
Sansovino. Uma vez completa, a biblioteca finalmente substituiu a esquálida colecção de pousadas e tendas
de mercado, que ainda lá se encontravam a desfigurar esse local de crescente importância cívica. A
elegância e sofisticação da biblioteca formam um fino contraste com o palácio que se lhe opõe na Piazzetta,
incutido no estilo, nos materiais e nas funções diversas. A biblioteca, compacta, horizontal, com ritmo
próprio e decoração copiosa, é tão poderosa quanto os demais edifícios, representa a cultura e marca um
momento importante no processo de revalorização da Piazzetta.
“Por ejemplo, el orden regular espacial de la Piazza de S. Marco, no es sino unas contradicciones
violentas en escala, ritmo y texturas, para no mecionar la variación de alturas y estilos de los
edifícios que la limitan.”25
conclusão
Atendendo à evolução construtiva da praça, desde os primeiros assentamentos até aos edifícios que
hoje comportam um maior calibre, percebe-se que a actual praça disposta em L, nasce do encerramento
desse vazio, feito através da duplicação do edificado que a envolve. Com a construção do castelo defensivo
no lugar do palácio ducal e de uma capela para acolher as cinzas do santo padroeiro São Marcos, que
entretanto deu forma à majestosa Basílica de São Marcos, seguida do campanário, um ponto de referência
avistado a toda a volta, sem rival, logo pela Procuradoria Velha, uns séculos mais tarde, foi assim nascendo
toda a bordadura da praça, na relação com a cidade. Primeiro, delimitando o espaço, garantindo-lhe já a
identidade dicotómica, apresentada pela arquitectura pretensiosa do homem, de um lado e, do outro, um
espaço que se lança para os limites naturais e cálidos, dos azuis do céu e da água, e do verde do Jardim Real
na frente para o cais.
A evolução da praça avança com a construção da Procuradoria Nova a cercar a ala sul e poente da
mesma. A ala poente, onde existira a Igreja de San Gimigniano, veio assim a ser recuada, indo aumentar a
profundidade da praça e dando cada vez maior ênfase à capela que se tornou Igreja de São Marcos e, por
fim, basílica, soberba na significação simbólica que atribui ao santo. São Marcos, por sua vez, dá nome
também à praça e, portanto, desafia todo o conjunto para que se faça elemento único, essencial, vistoso, a
“jóia” da cidade. Mais tarde, dá-se a construção da Biblioteca Marciana, que dobra o conjunto deste lado
externo, no fechamento da Piazzetta.
O que se pretende é a anulação de dúvidas quanto aos pontos focais a demarcar na área: a basílica,
símbolo de Veneza por consagração de São Marcos, e o Mar Adriático, assim emoldurado num exuberante
cenário de recepção aos navegadores, sendo entrada solene na cidade. As colunas dos patronos de Veneza
marcam uma linha divisória entre o Molo e a Piazzetta. Da parte de quem vem pelos diversos mares dar a
este porto, é surpreendido pelo abundante registo ornamental das fachadas, com vista direccionada para a
Basílica de São Marcos, que se adianta em relação ao alinhamento perimetral do palácio. De facto, ambas as
praças se abrem, em discreta forma trapezoidal, para o santuário, no perfeito “embuste” do espectador
sobre a espetacularidade do espaço tangível.
25 VENTURI,Robert, Complejidad y contradicción en la arquitectura; introd.Vincent Scully, 2ª ed, 8ª tirada, Barcelona : Gustavo Gili, 2003, p.84
67
“Oulu puede seguir conservando su posición turística si la reforma económica se realiza com
una perspectiva suficiente respecto a las personas y a la naturaleza.”26
26
AALTO, Alvar, Alvar Aalto : de palabra y por escrito, ed. by Göran Schildt; trad. Eeva Kapanen, Ismael García Ríos, Madrid : El Croquis, 2000, p. 321
68
III. O MÉTODO APLICADO EM FUNÇÃO DO LUGAR
69
Gradação de escalas da cidade numa vista da
marina.
Mapa da área metropolitana de Oulu junto ao
Golfo de Bótnia.
A emblemática estátua do Polícia de Oulu, a
lembrar as antigas rondas pelo porto.
Vista aérea da Praça do Mercado de Oulu com a
envolvente próxima.
105.
106.
103.
104.
70
ANÁLISE TIPOLÓGICA E IDENTIDADE: definição e delimitação na malha urbana.
Oulu, uma cidade de aproximadamente 140 mil milhões de habitantes, é a capital do norte da Finlândia
e o seu sexto maior centro metropolitano. A cidade desenvolve-se em redor de um grande estuário que
desemboca no Golfo de Bótnia, com pequenas ilhas a pontuar o plano da água entre a área residencial
suburbana, a norte, e o centro e áreas limítrofes, a sul e a nascente. O primeiro grande plano urbano
desenhado para Oulu é de 1661, destruindo o “grosso” do car|cter medieval da cidade. Após um
devastador incêndio em 1822, os arquitectos Carl Ludvig Engel e Johan Albrecht Ehrenström produziram,
dois anos passados da tragédia, um plano de traçado rectilíneo, que se foi alargando à envolvente próxima,
marcando a cidade dentro de um padrão regular de assentamento.
A área para onde se cumpriu o projecto de renovação da Praça do Mercado de Oulu, situa-se numa zona
da cidade designada por Meritulli, uma zona marginal para onde, na década de 60, se projectaram alguns
dos edifícios culturais de referência à cidade, o Teatro e a Biblioteca Municipais. As sobreposições
temporais marcam esta parte delicada da cidade, onde o cenário moderno da cidade vem colidir com uma
arquitectura preservada ao passado, das velhas casas-de-armazém portuárias que fazem a frente do
passeio marítimo. Em paradoxo com a cidade, sendo uma espécie de “museu” ao ar livre, ainda hoje se
pode olhar para essa arquitectura sobrante, como um actuante símbolo da cidade - porto de mar, com
ampla visibilidade para a história nacional.
A descrição da cidade tendo em conta o lugar tomado como sua condição integrante faz então, desta
primeira análise, um processo fulcral no entendimento das razões de fundo para onde são projectados os
acontecimentos actuais. O tipo de praça convergirá das conclusões tiradas, mediante uma abordagem que
proponha pistas para que mais perto se caminhe da essência do lugar, “sendo tudo aquilo que, n~o obstante
Vista geral sobre a Praça do Mercado durante o período estival.
107.
71
Tenda de feira e as casas tradicionais em madeira
de fundo.
Esplanadas dos restaurantes e bares, em
funcionamento desde o início de Maio até fins de
Agosto.
Fachada do mercado com o “Polícia de Oulu”.
Espaço de feira.
111.
110.
109.
108.
72
cada transformaç~o, sempre se impôs “ao sentimento e { raz~o”, como princípio da arquitectura e da
cidade.”27
Comece-se, então, pela análise do tipo. Para destrinçar o tipo é necessário que se proceda a um
correcto enunciado da morfologia urbana sobre o qual assenta determinado pedaço de cidade. No que
respeita à Praça do Mercado, equaciona-se a forma arquitectónica da praça, dentro da densidade da
estrutura urbana, e daí se retiram as devidas conclusões em matéria de: localização, importância do local
em relação à estrutura viária da cidade e outras polaridades, factores de ordem ambiental, etc. Do
somatório destes factores, organizados e assimilados individualmente, surgirão as características
particulares do sítio, ficando assim expostas em evidência de situação. Esse exercício final de contenção
morfológica na praça, após breve dialogação com a forma do território urbanizado, é que, por fim, repõe a
natureza do lugar, “o encontro com a intemporalidade da praça na procura da essencialidade das suas
formas.“28
Quando Oulu começou a ganhar importância de cidade, séculos atrás (a cidade foi fundada pelo rei
Carlos IX da Suécia, em 1605) o centro, que ainda hoje permanece enquanto centro histórico da cidade,
embora esvaziado de gente, foi estabelecido tendo em conta a topografia ligeiramente mais acentuada que
o local apresentava, para onde foi, entretanto, construída a igreja luterana, com a torre sineira como o
ponto mais elevado da cidade. Naqueles tempos, a zona costeira de Meritulli tão pouco constava acima dos
níveis da água, visto que a cada século o mar foi descendo sete metros. O que sucedeu com o decorrer do
desenvolvimento da forma urbana, foi a passagem das sinergias da cidade para níveis de cota inferiores. A
Praça do Mercado nasceu então da transladação da feira , que decorria no antigo centro, o centro cívico na
altura, para a zona portuária, com as mais - valias de acesso e transporte dos bens e mercadorias. Porém, a
praça actual de que se fala tem, lastimavelmente, vindo a subtrair ao seu valor identitário, resultado do
esmorecimento da actividade mercantil.
Na contemporaneidade, Oulu, pese embora alguns centros dispersos, algo subvertidos a casuais lugares
de passagem, pode-se dizer uma cidade aprazível. Estes centros, alvos ora de densa vegetação, temporária
deserção (à imagem da praça do mercado) ou encorajados por actividades do foro estritamente terciário,
carecem, uns e outros, de maior afeição. A Praça do Mercado, na orla da cidade com a água, partilha a
proximidade com as pequenas ilhas, que servem de pontos intermédios de passagem para a margem
superior. É, também, vizinha do centro propriamente dito, que se desenrola hoje dois quarteirões recuado
da baía estuária.
De notar que os elementos nucleares urbanos portugueses partilham de uma afinidade com o sistema
de composição urbano finlandês, incidente no fenómeno fragmentado como estes núcleos se dispersam
autonomamente pela cidade. O espaço central pode ser identificado dentro de uma leitura não de
centralidade ou dimensão física, mas de significado urbano. No caso de Oulu, a cidade possui um centro
que coliga o pragmatismo social com uma eficiente programação comercial, activando nitidamente aquela
parte da cidade. Porém, a cidade não possui uma única praça que estabeleça o símbolo do poder colectivo.
A Praça do Mercado será, possivelmente, o espaço mais apto a ser entendido como tal, desde que
correctamente repensada a sua dimensão espácio - temporal, ficando a própria encarregue da
27
ROSSI, Aldo, A arquitectura da cidade , Lisboa : Cosmos, 2001, p.55 28 SILVA, Maria Madalena Ferreira Pinto da, Forma e Circunstância : a praça na cidade portuguesa contemporânea, Porto : Faup, 2009, p.234
73
Parque de estacionamento rebaixado em relação
ao nível da praça.
Biblioteca Municipal e percurso de bicicletas na
chegada à praça.
Percurso que conduz à ilha de Pikissäri. A
Biblioteca Municipal à direita e o Teatro na frente
oposta.
Zona de estacionamento fronteiriça à Praça do
Mercado.
115.
114.
113.
112.
74
requalificação do território sob o ponto de vista ambiental, na sua ligação à água, paradigma último da
cidade portuária.
Ao exemplo das praças mayores espanholas e das praças reais francesas, a praça posta aqui à discussão
apresenta, em conformidade com as demais, traços de uma praça fechada, pelo seu carácter fortemente
geométrico. Para mais, está inserida em retícula regular para onde convergem as ruas transversais aos
principais troços da cidade. O sentido unitário destas praças fechadas é normalmente salientado pela
inclusão de porticados que ajudam na configuração do recinto. Por esta razão, bem como pela afinidade
com as praças de mercado de origem medieval, com as suas voluptuosas arcarias, opto por, em projecto
meu para a praça, desenhar uma estrutura longitudinal semelhante, em que as paredes em arco
conceptualmente se vinculam às janelas complanares do mercado.
Em conclusão, a reunião preconizada entre dimensão, excelência geográfica e força de símbolo, confere
à praça uma imagem representativa e monumental, apoiada pelo forte carácter civil destas praças, que em
Oulu se manifesta, durante o período estival, na sua magnanimidade popular.
No projecto para a área de Meritulli, na década de 60, apontavam-se já os principais motivos de queixa,
derivados dessa ligeira inflexão relativamente a um ponto central da cidade que, apesar da intervenção
feita, manteve ainda um dado fulcral a reconsiderar, a escala desconjuntada do lugar, desvirtuada na sua
relação com o território. Um outro factor de causa apresentado ia de encontro à ineficiência na utilização
da marginal, parte devido à forte emersão do vento nesta fronte costeira. Num outro concurso realizado
em 1972, reincidindo sobre Meritulli, incluía-se no programa a zona da praça, a base artificial fruto do
projecto urbanístico da década de 60 e as restantes áreas envolventes que cerceiam a água. Do plano
constava toda uma gama de áreas de habitação, comércio, serviços culturais e actividades associadas ao
lazer.
Fica entretanto a crítica geral sobre o modo como a arquitectura tem vindo a ser encarada dentro de
outro tipo de interesses confluentes. A ilusão do fant|stico com que hoje se “empoa” o edificado, deixando-
se impregnar de artificialismos técnicos exuberantes e falsos, que faz crescer o desejo de reabilitar a
arquitectura com eloquência e noção de permanência; passando por se criar novas memórias de velhas
imagens, onde fique implícita a tradição nesse trajecto de discurso revisto, sendo que tal se pode designar,
com efeito, de modernidade, no seu âmbito mais exógeno, mais real, porque é também uma forma de
homenagear o progresso do homem, pela expressão da sua arquitectura.
Dos vários projectos a concurso, prevaleceu o que manteve o local da praça um imenso vazio, tal como
a vemos actualmente, e que é, em parte, deveras gratificante pela sensação de liberdade que se respira no
espaço a descoberto da praça. Quanto ao vento que por aqui abre caminho, correndo na direcção da urbe,
não se logrou encontrar forma de demover este de se imiscuir em todos os espaços que não constituam em
si limites fechados e/ ou tradicionalmente adoptados. O dever do arquitecto perante este tipo de
adversidades que vêm ameaçando o lugar, terá de ser o de melhor fundamentar o projecto pelo
cumprimento das equações programáticas, formais e simbólicas decorrentes dos registos da cidade,
utilizando-as do modo mais inteligente na decomposição do tecido urbano, tanto ao nível dos estratos
urbanos como dos seus mais vivos contornos.
75
Vista de Rantakatu.
Aproximação ao local por uma rua transversal a
Torikatu.
Árvores ladeiam o trajecto pedonal entre os
parques de automóveis.
Espírito reanimado com a chegada do tempo
quente.
119.
118.
117.
116.
76
“Por qué la identidad viene del corte? Porque la identidad de las ciudades no es la identidad
parroquial, de lo pequeño frente a lo grande, de lo local frente a lo universal, de lo autóctono frente a lo
extranjero, de lo vernáculo frente a lo consumista, sino las maneras particulares de relacionar das
diferencias metropolitanas.”29
A secção feita à escala territorial da cidade é, assim, uma ferramenta importante no trabalho do
arquitecto, uma vez que permite o relacionamento das diferenças metropolitanas com a afinação dos
ritmos sequenciais, dentro de um enquadramento estratégico. Pela secção transversal efectuada ao plano
da cidade, entendem-se tanto melhor os ritmos, como a intercalação dos cheios e vazios. Uma cidade, sendo
um pólo concentrador dos meios de sobrevivência colectiva, sofre do efeito de uma progressiva
massificação que, inequivocamente, terá de ser contrariada pela interposição de espaços livres, com o
objectivo de se atingir um maior equilíbrio geral.
Ao contrário das praças tidas anteriormente em referência, a Praça do Mercado não se pode afirmar,
em verdade, uma praça de centro. Tal fica a dever-se à sua localização geográfica que a deixa exposta em
uma das frentes ao meio natural da água e, por outro lado, temos a salvaguarda do domínio privado do
povo finlandês, que facilmente pretere a forma de Praça - pensamento urbano, em favor da Praça – vazio
urbano ou, se preferirmos, lugar de actividades ocasionais, dadas as exigências do espaço livre. Embora,
historicamente, o valor que possui seja bastante claro, tendo em conta o seu incontornável legado
arquitectónico, a praça peca pela lacuna intervencionista, deixado um espaço negligenciado ou em
decadência.
Também o conceito discutido de terrain-vague nos interessa aqui estudar, pela relação reflexiva entre a
ausência de usos e o sentido íntimo de liberdade, o lugar da pausa na sua condição de vazio que valida a
pré-existência e que a sustém. Tal como o exercício prático da observação de um qualquer objecto requer a
atribuição de uma certa distância que potencie a dinâmica da quarta dimensão, num olhar que se detém
sobre todos os pontos da superfície em deslocação deliberada, assim é o conjunto de objectos a que se dá o
referencial de cidade, onde cada um dos homens não passa de um ponto minúsculo nesse tabuleiro vasto, e
em que também ele se move numa compulsão imediata em captar o seu complexo habitat. A existência de
espaços urbanos maiores é, portanto, uma reivindicação do homem tendo em conta a sua capacidade de
observação e o seu poder de percepção, que lhe permitem ter uma visão abrangente dos elementos
constituintes da cidade.
A praça, entendida enquanto espaço deixado em vazio, desmonta a realidade construída no exercício da
sugestibilidade à qual se propõe. Numa manifestação sempre alerta de nós, das nossas vivências colectivas,
escreveu Merleau Ponty ”Já não é uma sobrevivência, que é forma hipócrita do esquecimento, mas uma nova
vida, que é forma nobre da memória (…)”30 Numa sala de aula, estabelecer-se-ia essa mesma harmonia de
trocas pela representação do quadro onde se escreve e apaga sucessivas ilações na aprendizagem, numa
casa, pela sala-de-estar como lugar-comum de convívio, num banquete seria a mesa à volta de onde todos
se sentam a cear... Poder-se-ão, então, concluir três pressupostos fundamentais: uma assembleia disposta,
um espaço possível de trocas, um propósito.
29
SOLÀ-MORALES, Ignasi de, Territorios , pról. de Saskia Sassen, Barcelona : GG, 2002, p.179 30 GREGOTTI; Vittorio, Dentro l’architettura, Torino : Editore Bollati Boringhieri, 1991, p.75
77
Aproximação do local pela rua de maior trânsito
afluente de Torikatu.
Vista desde a biblioteca para norte.
Vista desde a biblioteca para sul.
Vista desde o mercado.
123.
122.
121.
120.
78
ANÁLISE FUNCIONAL E SIGNIFICADO: o lado social das actividades.
A Finlândia é um país com características singulares na sua relação geográfica e climatérica, indo-se
reflectir nos modos de vida dos seus habitantes, forçados a adoptar um estilo de vida sedentário e de
introspecção. Este facto leva a que as cidades sejam pensadas mais como tema da habitação e do trabalho,
perdendo espaço a dimensão da cidade, do ponto de vista lúdico e dos espaços públicos. Esta visão anti-
citadina, em algo semelhante ao que acontece nos E.U.A.31 é uma realidade que atinge um suporte
simbólico e imaginário, longe de uma efectiva união colectiva. Estimula-se o lugar do anonimato que
prospera nos recônditos espaços dos núcleos habitacionais, lugares de vizinhança limitada em que se
pretende a criação de micro-cosmos, sem substancial relevo da forma afectiva. Este fenómeno desencadeia
um sentimento de insegurança que se estabelece sobretudo nos meios suburbanos, mas que são também a
causa da densificaç~o das cidades, sem o atrevimento do “vazio” convidativo a uma assembleia de
cidadãos. O desejo de escapatória manifesta-se, então, nas deslocações semanais para lugares de segundas
residências.
Dentro de tal asserção, Oulu, como um clássico exemplo do tipo de urbanidade finlandesa, presume-se
relacionado com um ambiente pré-urbanizado, pelo valor atribuído ao interior, de forte carga positiva, em
detrimento do exterior, tido numa conotação negativa. É evidente que a grande questão se trava na
adversidade ao frio que irrompe durante meses afim, tornando a cidade escura e taciturna. Ao invés do que
seria uma situação ideal (em que as praças públicas aconteceriam enquanto prova morfológica do
progresso a par com o desenvolvimento socio-económico), sucedem-se os encontros múltiplos e dispersos,
numa imagem espartilhada da cidade.
Os actuais elementos catalisadores da Praça do Mercado de Oulu que servem a transformação espacial
do território são, naturalmente, o mercado e as casas tradicionais, construídas integralmente em madeira.
Salvas dos fogos e invasões que devastaram por mais que uma vez a cidade, foram reactivadas enquanto
bares e lojas de souvenirs, prolíferas em curiosidades locais, entre outros elementos de manufactura que se
ligam à memória produtiva do carvão, do vinho e do salmão, os símbolos do passado industrial da região.
Por outro lado, o Mercado Municipal, de 875m², comporta um peso histórico de sucessivas nuances
sociais. O mercado reflecte-se na história da cidade e do seu progresso. Se nos primórdios, o aglomerado de
gentes e dinâmicas urbanas se fazia verdadeiramente sentir, hoje a representação de uma imagem social
está porventura mais esbatida. Com o efeito da globalização, já não são valorizados ou comparados
produtos dentro de um limite urbano, mas a escala mundial cavalgante dá mote às grandes modas e aos
centros comerciais multifuncionais, sinais do progresso e do poder. De facto, um dos centros de maior
“vida” da cidade desenrola-se no interior de um dos quarteirões centrais, ocupado pelo popular
STOCKMAN. As marcas internacionais e a oferta de produtos variados destes modernos estabelecimentos
comerciais, face a estruturas municipais muitas vezes deficitárias, quer na exposição e venda de produtos,
sem os acautelamentos necessários de higiene, quer pelo dificultado transporte das compras de maior
capacidade, somado ainda a um horário de funcionamento mais curto, dão crédito à logística dos primeiros
espaços porque favorecem o conforto dos utentes.
31 RÉMY, Jean, A cidade : rumo a uma nova definição? ; trad. de José Domingues de Almeida, Porto: Afrontamento, 1994, p.97
79
126.
124.
125.
127. Vista desde o patamar de entrada nas casas.
Passeio marítimo.
Tendas de mercado no centro da praça.
Casa-de-armazém reabilitada enquanto loja.
127.
80
Que qualidades advirão do mercado, então, para que continue o normal funcionamento, ainda que algo
apagado pelo suceder dos anos e do avançar geracional dos seus utentes? Haverá razões suficientes para
que se intervenha no edifício e sua envolvente próxima? Poderá o termo mercado ter o alcance de um
significado mais lato, de trocas fortuitas no espaço da cidade?
A resposta é fácil. Mais do que zelar pelo património, premeia-se o cultivo de um modo de estar sincero,
de ambientação bem menos repuxada de artificialismos ou pedagogias baratas, em franca relação com a
cidade histórica. São estes espaços de tradição que representam a identidade de um povo. Sobretudo são o
lugar onde, além do acto de abastecimento, as pessoas se cumprimentam por rotina. Os mercados,
curiosamente, sempre foram um alvo apetecível por parte dos pintores, que se debruçam sobre estes
lugares riquíssimos em cor e movimentos fugazes, atraídos pela livre expressão do agir social, no seu modo
mais espontâneo e gracioso. A singeleza do gesto artístico é a prova de que os retratos urbanos são capazes
de perdurar no tempo, uma vez fiéis à tradição.
Um nível abaixo temos o mercado expandido para um novo espaço, que oferece a mais - valia de servir
os clientes com uma maior quantidade de produtos, durante o longo período dos frios meses de Outono e
Inverno, altura em que a área comercial se vê confinada à estrutura coberta existente, servida por um piso
apenas. Sabe-se ainda que o espaço de feira ocupa cerca de 4480m², em relação aos 875m² do actual
mercado coberto. Pretende-se, pois, reavivar os valores humanos, largamente ampliados em sociedade.
“No hay mayor honor para una ciudad que contar com una amplia vida pública y disponer de
‘lugares públicos’ bellos y funcionales, entre los cuales se destaquen las plazas como punto final de
los quehaceres matutinos.”32
A razão pela qual me vi compelida a reformar a Praça do Mercado de Oulu, deve-se a essa vontade de
travar o isolamento social, no incitamento à prática de uma vida enriquecedora, seguindo o rastro da
Humanidade: do Ginásio grego à Agora, às Termas romanas ou ao Fórum, passando pelo Grémio e pelas
Praças medievais de Mercado ou Catedrais, toda uma panóplia de equipamentos que contribuiu para
humanizar a Cidade, torná-la uma “aproximação sensível entre homem e homem.”33
Ou seja, a cultura enquanto chave deste território sem definida forma humanizada, expresso nas
palavras s|bias de Aalto: “La cultura es la trama que atraviesa todos los fenómenos; la cultura puede
humanizar incluso la más pequeña de las tareas cotidianas al aportarle armonia.”34 A cultura une não só
uma sociedade como é razão de uma cidade embelezada. Se a vida depende dos homens e “sociedade e
indivíduo, contrapõem-se e confundem-se na cidade”, como afirma Rossi, há pois que intervir no ambiente
onde o homem se move, tornando-o mais hábil, cedendo-lhe espaços maiores como o de praça, onde
conviva o individual e o corpo colectivo em presença complacente. Em solidariedade, o nosso tributo como
cidadãos de etérea sorte, deveria ser o de prestarmos as devidas honras à cidade. Numa só voz,
defendendo-a:
32
AALTO, Alvar, Alvar Aalto : de palabra y por escrito, ed. by Göran Schildt; trad. Eeva Kapanen, Ismael García Ríos, Madrid : El Croquis, 2000, p.31 33 GIEDION, Sigfried, La exigência de vida comunitária in Escritos Escogidos, Murcia : COAAT, 1997, p.180 34
AALTO, Alvar, Alvar Aalto : de palabra y por escrito / ed. by Göran Schildt; trad. Eeva Kapanen, Ismael García Ríos, Madrid : El Croquis, 2000, p. 25
81
130.
131.
129.
128.
Vista desafogada para a água.
Deque.
Antiga nau conservada e Teatro Municipal em
fundo.
Feira da Rena actualmente.
Local do deque como espaço para sentar.
132.
82
“A principal funç~o da cidade é converter o poder em forma, a energia em cultura, a matéria
inanimada em símbolos vivos da arte, a reproduç~o biológica em criatividade social.”35
Com o projecto quis assim reforçar esse fluxo de energias urbanas, por agora camufladas e estagnadas
em contidos espaços dedicados à cultura, dando a ilusão de actividade ilícita ou suja, de curiosidade
remota. Achei sensato ampliar a dimensão cultural de Oulu e investir em actividades de lazer que integrem
o meio onde me propus intervir. A ideia é que as pessoas se sintam seduzidas a participar e a discutir
livremente nestes novos espaços criados, de plataformas neutras que negam o espaço interior único,
conspícuo e concentrado. Valorizo, pelo contrário, a multiplicidade, apostada no pluralismo e na abertura
das funções. “Pero la simplicidad estética, que es una satisfacción para la mente, deriva, cuando es válida y
profunda, de la complejidad interior.”36
A estrutura em L opera em duas frentes. O corpo de menor leitura à superfície, cavado na praça a norte,
dela perpassando ligeiramente para se reencontrar de novo com a luz, é um espaço múltiplo que se
aproxima funcionalmente dos corpos que convivem na margem oposta. O Teatro e a Biblioteca Municipais
são pólos culturais por excelência, com dimensão e imagem fortes, muito embora as funções a que se
destinam sejam, talvez, demasiado rígidas, faltando-lhes alguma permeabilidade de usos e mesmo
condições para tal. Se no Teatro os eventos recreativos têm um carácter irrevogavelmente formal, pelo
nível ou parâmetros gerais a que as escolas de teatro ou bandas musicais estão submetidas, à Biblioteca
Municipal falta-lhe a componente áudio – visual, incluída em programas mais recentes da tipologia. Fiz-me,
contudo, alvo de felicitação própria quando habilitada a dar vida a esses espaços dentro do imaginário do
projecto, ao me ir apercebendo destas subtis e não menos perniciosas omissões ao longo da minha estadia
em Erasmus.
Posto isto, do lado norte nasce um corpo alongado, dividido transversalmente a meio, onde numa
primeira parte, de pé-direito duplo, encaixada numa área coberta de 1175m², se dão concertos de ordem
mais banal ou contemporânea desse modo de vida acelerado de contínua sugestão criativa, com lugares
postos para um número aproximado de 100 indivíduos (de notar que os finlandeses são especialmente
dotados para a música visto que, à falta de melhor passatempo para aguentar o tempo frio e escuro, se
refugiam entre quatro paredes, partilhando o conforto do lar com os instrumentos musicais). Segue-se um
espaço com laje de cobertura ao nível da praça, de luz ao fundo e com uma parede a eixo que agudiza a
perspectiva das salas, dividindo-as em diferentes áreas culturais.
À direita, o balcão, dispondo de um generoso espaço de entrada, a áudioteca (100m²), e a videoteca
(80m²), colmatando numa cafetaria (290m²), que comunga as duas alas. À esquerda, em 335m² de área, o
espaço apresenta um carácter porventura mais flexível. Da minha vontade, resulta que o espaço organizado
com armários, gavetões, mesas longas e cadeiras, seja usado para actividades plásticas, de âmbito público,
por meio de uma fundação que a partir de um processo cíclico, juntasse fundos pela quantidade de obra
vendida, fazendo da produção artística uma actividade livre de custos ou outros quaisquer requisitos. Seria
a meu ver interessante, pela aposta numa relação de cooperação e entreajuda, entre grupos de reduzida
dimensão.
35 MUMFORD, Lewis, A cidade na história : suas origens, desenvolvimento e perspectiva ; trad. Neil R. da Silva, 2ª ed., São Paulo : Martins Fontes, 1982, p.616 36 VENTURI,Robert, Complejidad y contradicción en la arquitectura; introd.Vincent Scully, 2ª ed, 8ª tirada, Barcelona : Gustavo Gili, 2003, p.29
83
135.
136.
134.
133.
137.
Feira da Rena celebrada há várias décadas na
Praça do Mercado de Oulu.
“O melhor do mercado é a sua atmosfera”.
Interior original do Mercado Municipal,
mantendo hoje substancialmente o seu carácter.
Local de armazenagem e venda do vinho da
região.
Antigos armazéns portuários.
84
Tendo, assim, o programa como base do discurso, e atentando ao desenvolvimento do fenómeno das
massas flutuantes, é o indivíduo que se coloca no centro das relações de troca. Ele determina a sua escolha
em função do vasto leque de sugestões postas à sua disposição pelos media, que o levam a formar um juízo
próprio sobre o seu projecto pessoal. Por esta via, fica cada vez mais difícil pensar uma consciência social,
numa sociedade tão globalizante como individual, e em que a colectividade perde representação.
Logo, é numa vis~o actual centrada no “eu”, que centros de lazer como os acima propostos são bem
recebidos, porque facilitam o resguardo e a descoberta de interesses pessoais, nesse mesmo reencontro do
“eu” de cada qual. Um lugar em que a própria partilha do espaço é controlada pelo utente, num esforço
projectual que acompanha o sinal de modernidade, no livre uso da expressão individual e no desafio a uma
leitura congénita/ colateral das vivências colectivas, sendo, a cada um, tornado possível revelar o seu
punctus – singularis,
“(…)o instante de reconhecimento do tempo na sua superfície indiferenciada. Isto é, o lugar
absolutamente precioso e inalienável, em que a imagem passa a ser a minha (onde eu a reconheço e
inscrevo-lhe um sentido) … Digamos que o seu fim é a sua desconstruç~o como imagem e a sua
reconstruç~o como potência (absolutamente subjectiva). É essa a sua condiç~o mítica (…)”37
De retorno aos conceitos práticos, falemos agora do corpo maior do L, que funciona enquanto charneira
entre a cidade e a praça. Este está preparado com uma zona coberta interior de 1000m², sendo um corpo
que se percebe na sua transparência e diálogo com os espaços, prestando-se ao propósito de oferecer aos
utentes um espaço sincero de recolhimento. A escassa marcação de planos verticais no interior responde a
uma intenção minimalista do espaço, no respeitante tanto ao resguardo como à fluidez dos movimentos,
sem que tão pouco exista um programa fixado para o espaço. Poder-se-iam, eventualmente, apontar
possíveis usos como os de galeria de arte ou de simples café. Não obstante, quem pelo espaço deve zelar
são os habitantes da cidade ou, por outras palavras, os que habitam os espaços comuns à cidade, sendo-
lhes oferecida a hipótese de aproveitar o espaço de cidade dentro de interpretações várias e, por hipótese,
sucedâneas. Tendo que “La amibigüedad v|lida fomenta la flexibilidad útil.”38 Também no inteligente dizer
de Rossi, o edifício vem reagir à pele movediça da cidade, sempre em movimento, nem tanto de formas,
mais de ideais. Logo, a estrutura deve saber-se adaptar {s v|rias funções que surjam desta “regra” aplicada
às tipologias únicas, na valorização do seu significado implícito.
Numa alusão de cenário vivo do corpo principal que faz o fundo da praça, as arcadas que saem
alinhadas pelas direcções das laterais do mercado podem ser, em si, um convite a uma mesma forma
artificiosa de estar publicamente. Esclarece-nos Goffman, que insiste na importância da dualidade
bastidores/ palco na vida social. O palco, “lugar da representaç~o face a um público”, em que se geram
relações de conflito e competição, e os bastidores como entidade mais serena e protegida, num
distanciamento que permite “evitar armadilhar-se pela representaç~o”39. O palco, por analogia, será a praça.
Os bastidores, a estrutura montada à sua volta.
37
BISMARK, Pedro Levi, Nenhuma arte é louca. Nenhuma arte é arquitectura. Punctum in Puncto, Arquitectura nunca abolirirá o acaso, Porto:, Minerva, 2010 38
VENTURI,Robert, Complejidad y contradicción en la arquitectura; introd.Vincent Scully, 2ª ed, 8ª tirada, Barcelona : Gustavo Gili, 2003, p.53 39 GOFFMAN, Erving, La mise en scène de la vie quotidienne, Paris : Éd. De Minuit, 1973
85
138.
139.
Vista geral sobre a Praça do Mercado, durante o período estival. Vista geral sobre a Praça do Mercado, durante o período estival.
Vista aérea do projecto para a Praça do Mercado de Oulu.
Vista desde o Hotel Radisson sobre a praça e o projecto.
86
ANÁLISE VOLUMÉTRICA E ESTRUTURA: leitura entre espaço envolvente e espaço operante.
Se de arquitectura se faz a cidade, faz-se ainda mais da sua gente. O estado crítico geral resvala na
contrariedade face aos espaços desafogados, são pessoas por natureza recolhidas, apostadas numa
harmonia fechada. Na Praça do Mercado, o movimento sofre de tremendas nuances sazonais, o Inverno é
ríspido e congela o espaço da praça como que não exista. Evita-se aquele imenso deserto, contorna-se e
condena-se um espaço deixado vazio, frio, sem o aconchego das construções, sem os investimentos dos
privados que o cobiçam e que, sem tudo isso, sobrevive ao Inverno. Com as mudanças drásticas na luz, o sol
reúne de novo gente disposta ao convívio, à cerveja fresca que comemora mais um Inverno deixado para
trás e a vinda dos dias longos e das esplanadas raiadas até bem perto do final do dia.
Em retrospectiva ao capítulo anterior, o espaço público da cidade é composto por vários níveis que
convergem nas actividades sociais como teor de uma urbanidade baseada nos indivíduos que a compõem,
no respeito à cidade enquanto acontecimento reunido. Sendo esse estado em “alerta” do homem que se
redescobre nos outros, que o persuade à vivência do espaço em presença colectiva e o ajuda a ser realista.
O realismo interessa ao arquitecto pela suposta aproximação ao homem comum. Já o tradicionalismo
“desenterra” o passado como peça reconstrutiva de uma arquitectura gasta, e, por fim, o modernismo
cativa pelas “novas formas”, que d~o um passo em frente no modo como se pensa a arquitectura e o curso
da cidade.
“A more apt idea would be a “trichotomy” in the style of the Kritisk Revy: traditionalist –
modernism – realism. Obviously, the first two trends are formally and emotionally charged; the third
one might also be called rationalism.”40
Creio ser razoável concluir que o pensamento realista, como fenómeno do discernível, é o propulsor da
arquitectura enquanto poder accionado do social entre as concomitantes razões linguístas do passado e do
futuro. Adiante, praticando-se a arquitectura como arte social, feita para o homem, numa alusão maior da
sua dimensão, pela aproximação do mundo que o rodeia. O efeito da reconciliação com o mundo através da
arquitectura é sustentado por Nietzsche quando profere:
“One day, sometime soon we must realize what is missing from our large cities: quiet, extensive
public places for contemplation. Since we are Godless, we can no longer formulate our thoughts in
spaces similar to temples. We want to see ourselves transformed into stones and plants. We want to
journey within ourselves when we walk among buildings and gardens.“41
Ou, pela comparação contemplativa de Leonardo Da Vinci sobre o homem e o mundo:
“o homem é chamado pelos antigos um mundo menor, designaç~o justa, pois que é composto de
terra, de água, de ar e de fogo, e parece-se, portanto, com ele. Se o homem possui os ossos para
servirem de armadura e para sustentarem a carne, o mundo tem as rochas que sustentam a terra; se
o homem contém em si um lago de sangue, em que aumenta e diminui o pulmão na respiração, o
corpo da terra tem o mar oceânico que aumenta e diminui de seis em seis horas; se deste lago de
40 WERONICA, Ronnefalk, Modus operandi : architectural desires : recent works from the School of Architecture, KTH, Royal Institute of Technology, Stockholm : School of Architecture, 1995, p.89 41 NIETZSCHE, The Gay Science, Greek ed. p.83
87
Perspectiva interior do corpo maior.
Aproximação à praça pelo lado sul.
140.
141.
88
sangue saem as veias que se vão ramificando por todo o organismo, também o mar oceânico enche o corpo
terrestre de inúmeras veias de água: mas faltam ao nosso globo os nervos que não lhe foram dados porque se
destinam ao movimento. Ora, o mundo, na sua perpétua estabilidade, não se move, e quando não existe
movimento, os nervos s~o inúteis. Mas, quanto ao resto, o homem e o mundo s~o semelhantes.”42
Contudo, move-se o homem no mundo, incutindo-lhe energias estranhas à indiscutivelmente bela
paisagem natural, uma energia acrescida que se revolve sem o pretenso adormecimento nessa pele
terrena. A arquitectura, como produto do humano, deverá reflectir e restabelecer essa ligação à terra,
verticalidade pautada por dinâmicas horizontais com assento no lugar, o lugar da concordância.
Liberdade total é, portanto, um pensamento irrealista no presente actual, todos nós vivemos em
dependência, os nossos direitos e deveres e mesmo o que criamos, realizamos ou edificamos são
manifestações da nossa presença no mundo. A liberdade terá de ser conjectura de um conceito
radicalmente abstracto ou, porventura, o seu oposto enigmático - ligação eficaz entre as informações
alcançáveis:
“As soon as I begin to think about this question, I realize that my work has been influenced by
many places (...) So I immerse myself in the place and try to inhabit it in my imagination, and at the
same time I look beyond it at the world of my other places.“43
Reverte-se, desta forma, a fácil atribuição de liberdade à inteligência do lugar, o livre pensar que é
factor de junção essencial entre os seres simbióticos. É usada a verdade como caminho para a “Tradiç~o
Universal”, em que os estilos arquitectónicos est~o j| indigitados, consagrados e representados na extensa
cartografia da Arquitectura, sendo que uma questão só prevalece: a de reunir referências de forma
ordenada e verificativa de cada momento espacial, de um modo livre e conhecedor.
“Libre de la agitación y de las trabas de esta libertad de la alección, causa de la mitad de los
males de este mundo; libré de la obligación forzosa de estudiar todos los estilos pasados, presentes o
posibles, y capaz, por la concentración de la energia individual y de las energías de la multitud, de
penetrar los secretos más ocultos del estilo adoptado, el arquitecto veria expansionar-se su espírito,
hacerse seguros y aptos sus conocimentos y alegra y vigorosa su inteligência, a la manera de la de
niño que hace flexibles sus miembros retorzando en un extenso y cerrado jardín.”44
No projecto para a cidade de Oulu, o plano da praça estende-se até ao Hotel Radisson, definindo o limite
a norte, e o alçado da rua de Rantakatu preenche o fundo da praça, a nascente. O mercado e corpos afins
pousam sobre a frente sul, vê-se o mar a poente, intervalado com os colossais monumentos do Teatro e da
Biblioteca Municipais, que marcam austeramente a praça da base artificial onde assentam. Um percurso
encaminha gente de bicicleta e peões até esse novo maciço, com área equivalente ao espaço vazio da praça,
e uma pequena estrada serve a entrada aos parques de estacionamento, de ambos os lados.
Procura-se a inércia necessária, que coligue volumetrias e acarrete uma relação ao máximo pacificada
com os elementos naturais, “In the work of Pikionis, and mainly in his mature work, the playful is a priority
42
Traité de la peinture de Leonardo da Vinci, cap. XII, «De la Figure», p.351 43 ZUMTHOR, Peter, From passion for things to the things themselves in Architects in Architecture of the Essential, Jyväskylä, Pirkko Tuukkanen, 1995, p.92 44 RUSKIN, John, Las Siete Lâmparas de la Arquitectura, Barcelona : Editorial Alta Fulla, 2000, p.211
89
142.
143.
Vista geral sobre a Praça do Mercado, durante o período estival.
Corpo vazado.
Aproximação ao local, pelo lado norte.
90
(…)”45 mas, e ainda, como repensar um local de tal prioridade cívica e tão pesados contrastes de utilização e
valências? O que fazer perante estilos arquitectónicos oriundos de tempos diferentes e com emergências
próprias, em volta desse espaço que se vê alvo de agudas altercações e perfis descontínuos?
A praça, do inglês “the core” (do latim cor, coraç~o) é onde dever~o coexistir a unidade das funções e
suas formas, na verdade da “unidad difícil de la inclusión”46. Pretendi, assim, dar resposta a um espaço
demasiado vasto e/ou constrito em desconcertante fatalidade. Fechar, deixando-o ligado, tentando
apaziguar espíritos discordantes nas suas várias frentes. A estrutura em L a que me propus foi a forma
encontrada para vencer as problemáticas em jogo:
A subserviência à malha urbana enquanto forma unificada e legível, no seio de construções
planimétricamente rígidas,
O apelo à contenção da área em benefício do seu conforto, dada a dimensão exagerada da praça
(21.600m² desde a frente do mercado até ao limite do jardim),
A desarticulada altimetria da envolvente próxima,
A intenção de movimento dado às massas que ocupam aquele espaço, inclusivé a base artificial
onde tomam lugar o Teatro e a Biblioteca Municipais, explicado na forma de gesto descolado dos
limites naturais; uma espécie de “cheio” retirado ao “vazio” da praça.
Por outro lado, era vital libertar o centro da praça de construções que lhe retirassem visibilidade ou
potencialidades de uso. A sua maior valência, actualmente, abona no sentido de receber os grandes eventos
municipais e regionais, que ali são celebrados com a chegada de gentes de toda a parte. São feiras culturais
de prática anual, com ligação às actividades piscatórias e ao culto da rena enquanto ícone nacional,
servindo ainda a praça como ponto de encontro entre motards vindos de todo o norte da Europa, ou
enquanto recinto de patinagem no gelo, concertos e afins.
O projecto, que se limita a conformar a praça, foi então uma forma de manter limpo e legível um espaço,
já de si, aperreado. Na frente virada para o mercado, definindo um vazio simbólico no entremeio deste com
o corpo do projecto, fica ancorada a estátua em chumbo do “Polícia de Oulu” (que antigamente fazia a
ronda no porto) para regozijo de todos os visitantes que o “envaidecem” com fotografias e poses.
Comecei então por dar escala ao edifício do Mercado Municipal pela projecção de um corpo autónomo,
leve, que se lhe adianta enquanto sua extensão linear. A forma deste edifício, de uma só altura e de nível
com o resto da praça, surgiu deste abraço dialéctico entre as partes. O mesmo material de cobertura da
envolvente próxima, a chapa de zinco-escuro, foi seleccionado para o projecto, sendo que, em vista aérea
sobre a praça, dá uma leitura bastante homogénea com o que se lhe rodeia, pretendendo-se igual efeito
numa perspectiva desde a praça para a frente de rua, pela insinuação de um firme traço, feito pela chapa de
zinco, sobre a espessura branca da laje. Por fim, emprestando também alguma modernidade ao
esquadrinhado alçado dos edifícios neo-clássicos, pela sobreposição aos seus frisos e às suas janelas em
arco.
Mais uma vez, a estrutura quer-se leve, funcionando como um muro fácil de transpor e permeável. A
ideia é que o espaço construído convide a quem o vê de fora a penetrá-lo, com o fim de se atingir o centro
45 KOTIONIS, Zissis, The Essential in the Pathology of Architecture, five Greek Architects in Architecture of the Essential, Pirkko Tuukkanen, Jyvaskyla : Alvar Aalto Foundation, 1994, p.58 46 VENTURI,Robert, Complejidad y contradicción en la arquitectura ; introd.Vincent Scully, 2ª ed, 8ª tirada, Barcelona : Gustavo Gili, 2003, p.26
91
144.
145.
Percurso marginal.
Praça do Mercado.
92
da praça. Planos, como “membrana” que protege um de outros espaços, ajudando a hierarquiz|-los e a
descobri-los. Tenta-se evitar o efeito do vazio da praça e o conseguinte sentido de abandono, enquanto
fenómeno que “surge cuando las formas que lo rodean, es decir, los contornos, no imponen una organización
estructural sobre la superfície en cuestión.”47
No corpo mais estreito do L existe uma dupla passagem, que percorre tanto o nível térreo como o
subterrâneo. Este último, conduz-nos por um espaço que é primeiramente concebido em piso duplo, para
que se possam aí operar concertos ou demonstrações de maior dimensão artística, para depois seguir na
direcção da água, numa zona já de piso único, com um fosso de luz ao fundo a rematar este corpo mais
baixo, com vista para o longínquo que se divisa no contorno à base betonada.
Os dois eixos ficam vazados no nó resultante de ambos para permitir a passagem directa para a praça,
por uma das ruas perpendiculares à agitação normal de Torikatu. Pensa-se a estrutura no cerco do volume
vazio da praça, emoldurando-a na simplicidade das suas linhas vectoriais, orientadas segundo forças
urbanas maiores.
“Esta ambigüedad de las esquinas rectangulares fue bien recibida por Piet Mondrian, que en sus
últimos años se dedico a eliminar en sus pinturas abstractas la diferencia «realista» entre objetos
visuales sólidos y espacio vacio. En una carta escrita en 1943 a James Johnson Sweeney, explicaba:
Sabes que la intención del cubismo – en todo caso al princípio – era expressar volúmenes… Esto se
oponía a mi concepto de abstracción, según el cual este espacio debe ser destruido. En consecuencia,
empecé a destruir también la superficie plana, lo que hice por médio de líneas que cortan los planos.
Pero el plano se mantenía demasiado intacto, así que me limite a las líneas e introduje el colore
nellas.“48
Infelizmente para a arquitectura, esta não se faz de um só gesto, a volumetria que a alberga implica
atenção ao detalhe, num jogo de intercâmbios formais, daí que tudo se revele mais complexo do que o
primeiro “sopro” de uma ideia. Como j| referido, os estilos s~o abundantes e enchem o espaço. É
necessário, pois, uma contenção de esforços que os estabilize num só edificado ao que me proponho, dando
o devido protagonismo à praça enquanto centro colector de tamanha riqueza identitária:
“Para sentir-se seguro, una personalidade fuerte puede enfrentarse com la soledad
estableciéndo-se, él o ella, como el centro e irradiando havia lo que rodea a tal centro com una
explosión de fuerzas que animam el vacío. Bajo estas condiciones, la ausência de obstáculos que
contraresten y se opongan puede crear incluso un estimulante sentido de libertad.”49
Posto tal enunciado a descoberto, da observação dos arcos ogivais exibidos nas laterais do mercado,
construo um discurso idêntico de arcadas, fundamentadas pela História, em especial no respeitante às
praças de mercado onde outrora os mercadores armavam as suas barracas por debaixo do vazio dos arcos.
É, por mais, uma arquitectura singela, que oferece requinte e vaidade ao visitante, dentro de uma estrutura
que equacionei o mais simples possível, partindo de uma estreita e mera afinidade simbólica.
“It is as if one wanted to project the concrete phenomena of ancient architecture onto a modern
grid and in so doing make their meaning comprehensive, negating both time and context. In this way
47 ARNHEIM, Rudolf, Vacio y abandono in La forma visual de la arquitectura, Barcelona : Gustavo Gili, 1978, p.23 48
ARNHEIM, Rudolf, Cruces y plazas in La forma visual de la arquitectura, Barcelona : Gustavo Gili, 1978, p.46 49 ARNHEIM, Rudolf, Vacio y abandono in La forma visual de la arquitectura, Barcelona : Gustavo Gili, 1978, p.22
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146.
147.
Vista desde o jardim próximo à biblioteca..
Cafetaria.
94
the design becomes very difficult, even unsolvable, and the pathological condition of design as invention is
reproduced.“50
São arcos de volta perfeita, desenhados por forma a imprimir um ritmo de galeria ao corpo
longitudinal, pautado por arcos maiores de duplo diâmetro que se vão apoiar no chão. Quanto aos
restantes arcos, deixa-se vazado o maciço com que se emolduram no topo, assim que perfazem os 180º
diametrais. A intenção passa também por suavizar a relação entre as áreas interior e exterior, sem que a
caixilharia exerça demasiado “peso” sobre a construç~o. Os planos menores, transversais, s~o tratados com
caixilharia regular, provendo o conjunto de um paradoxo formal assumido enquanto resultado apelativo e
experimental.
Ao modo de Mies van der Rohe, adapto as superfícies ao sentimento que acolhe cada espaço, numa
mescla de tons e gradações propostas pela envolvente. Do lado nascente, na frente de rua, onde o alcatrão e
os passeios assumem grande protagonismo, a parede que se lhe encosta é deixada em betão aparente,
sempre numa busca pela continuidade que ajude à solução solidária do edifício. Já do lado que se volta para
a praça, a cor que marca o “muro” (evoco, aqui, a imagem de muro pela distância com que o apreendemos e
o fechamento visual que impõe à praça) estabelece semelhanças tonais entre o edifício proposto, realizado
em mármore vermelho, e o mercado e estabelecimentos anexos, de construção em tijolo avermelhado.
Por último, o mármore negro é aplicado em dois casos distintos, tanto se encontra no corpo menor,
subjugado por debaixo da expressão linear da pala branca, num refúgio que lhe retira corporeidade e dá
aparência à extensão do corpo maior, como serve um plano acutilante, marcado pela abertura de um único
arco em ogiva, para lá do plano da cobertura. Esse desvio à regra, calculado através do jogo de alçados, e
mesmo aquando da implantação do edifício, ligeiramente desalinhado com a envolvência, propõe-se
acrescentar à ideia “uma maior tens~o din}mica.“51
Quanto à vegetação existente, dediquei-lhe a merecida atenção com vista ao reforço da edificação, pela
transmissão de serenidade, protecção e aliança com o natural. As árvores são um organismo comunicante,
atrevo-me a dizer, mais do que a própria arquitectura. Vacilando com o vento dão voz ao espaço, na sua
dignidade de criaturas maiores e mais pacíficas que nós. São o oxigénio também da arquitectura que
respira ao abrigo destas. A natureza, onde quer que esteja, protege, salva-nos da enorme baforada do
homem moderno e do seu vício construtivo.
No projecto, as árvores são-me úteis no ajuste das escalas. O caso das árvores de grande porte, em
frente ao Hotel Radisson, suavizam as relações altimétricas e colocam-se como uma cortina verde para a
praça. Existe, ainda, uma fileira de árvores a estabelecer um percurso que dirige o peão, através de uma
curta travessia, para o outro lado da água, onde estão situados o Teatro e a Biblioteca Municipais. São de
porte mais modesto e aguardam crescimento para que se tornem mais esbeltas e em justa proporção com a
imensidão que lhes faz frente. Os bancos postos à sua guarda ficam com vista para a praça ou as suas
costas, a norte. Duas entradas para o parque de estacionamento posicionam-se também sobre a praça,
numa intromissão de “arestas ao alto” por onde se faz a passagem para o novo espaço de estacionamento
subterrâneo.
50 KOTIONIS, Zissis, The Essential in the Pathology of Architecture, five Greek Architects in Architecture of the Essential, Pirkko Tuukkanen, Jyvaskyla : Alvar Aalto Foundation, 1994, p. 61 51 ARNHEIM, Rudolf, Niveles de complejidad in La forma visual de la arquitectura, Barcelona : Gustavo Gili, 1978, p.143
95
148.
149. Vista geral da maqueta.
Vista sobre a Praça, para nascente.
150.
Vista geral da maqueta.
96
Para melhor servir o público durante todo o período em que o mercado praticado na praça se vê
cancelado devido às más condições atmosféricas, decidi passar parte da área comercial do mercado
exterior também para o piso subterrâneo, com luz obtida, verticalmente, da zona conformada pelo
mercado e corpos anexos da praça. A luz zenital que ilumina este espaço é filtrada por um vidro
translúcido. No interior, planos de parede delimitam entre si espaços de venda, tendo sido as medidas
destes, transportadas da função exterior de mercado, por paridade dos usos. A riqueza deste tipo de
espaços vem explicada por Elías Torres: “Su autonomia va acompañada de una luz íntima, enigmática,
secreta, protegida, ajena a la realidad circundante y, a veces, algo clandestina.”52
Pretende-se deste modo diferenciar as duas áreas de mercado, de modo lógico e racional, convertendo
uma linguagem antiga numa ambivalência contemporânea e tradicional independentes e de mútuo realce.
O espaço adopta, por igual, uma maior unidade ao serem fechadas as passagens existentes entre os anexos
contíguos ao mercado, no espaço entre a praça e a zona de abastecimento do mercado, a sul. Do extremo
oposto do complexo, cria-se uma segunda entrada virada para a praça, planeadas a fachada e a água
adjacente do telhado, no mesmo vidro translúcido da superfície, que faz a cobertura do mercado à cota
inferior. Em planta como em alçado, a fachada desse corpo desenha uma seta que marca o acesso para o
mercado abaixo.
nota final
O espaço envolve ou não envolve. É assim que eu vejo a arquitectura, um fenómeno que assenta como
leve poeira no vazio. Deve ser leve e comovente nessa transitoriedade indelével. Deve saber pensar o ocaso
e o amanhecer da História. O local, como balança de contrastados pesos, terá de pesar a harmonia,
composta de entidades somadas, plurifacetadas. E pesos diferentes podem também ser expressão:
“When one tries to understand that which is idiosyncratic in a work, it is as if one tries to turn an
enemy into a friend, running the risk of losing that which was of initial interest; the difference
embodied in the so-called “enemy.”53
A harmonia não obriga à igualdade turva entre as partes, apenas as partes se prestam a vínculos, ávidas
de linguagem que exprima um significado. “Meaning occurs rather in an aesthetic invention actualized from
the existing figures of the “world- in –loss.”54 Lógica articulada em toque melódico e austero ou difuso e
suave. Ritmo estendido ao território, emitindo um sinal, sondando o silêncio das coisas…
É dessa essência das diversas partes onde se dissolve o projecto, corroborando no seio de todo o
elenco, querendo ser plano e geratriz, concordância e causa, que se realiza um projecto de formas e corpos
dissonantes, na partilha de um espaço tão franco. Espreita o potencial tal como a desventura predita.
Falhas competem à distância do real com o sonho eloquente de um reflectido traçado urbano. Pratica-se o
fácil acima da elegância, não é condenável, mas da confusão nasce a assistência de uma ideia melhor.
52
TORRES, Elías, Luz cenital autonomia del espacio interior in Luz cenital, Barcelona : COAC, 2005, p.15 53 KOTIONIS, Zissis, The Essential in the Pathology of Architecture, five Greek Architects in Architecture of the Essential, Pirkko Tuukkanen, Jyvaskyla : Alvar Aalto Foundation, 1994, p.52 54
KOTIONIS, Zissis, The Essential in the Pathology of Architecture, five Greek Architects in Architecture of the Essential, Pirkko Tuukkanen, Jyvaskyla : Alvar Aalto Foundation, 1994, p.56
97
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ANEXOS:
1 e 2 - arquivo pessoal
1. PRAÇA DO MERCADO DE OULU piso 0 | esc. 1|2000
Ground Floor plan_ scale 1|2000
2. PRAÇA DO MERCADO DE OULU piso -1 | esc. 1|2000 / perfis | esc. 1|2000
Longitudinal Section 1|2000
Cross Section 1|2000
Longitudinal Section 1|2000
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