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ELIANE PANDOLFO
ANÁLISE DISCURSIVA NAS PROPAGANDAS DAS SANDÁLIAS
HAVAIANAS
SINOP
2009
1
ELIANE PANDOLFO
ANÁLISE DISCURSIVA NAS PROPAGANDAS DAS SANDÁLIAS
HAVAIANAS
Monografia apresentada ao instituto de Estudos da
Linguagem, da Universidade Estadual de Sinop
como requisito parcial para obtenção do título de
licenciado em Letras.
Orientadora: Profª Ms. Neusa Inês Philippsen
SINOP
2009
2
ELIANE PANDOLFO
A ANÁLISE DISCURSIVA NAS PROPAGANDAS DAS SANDÁLIAS
HAVAIANAS
Monografia apresentada ao instituto de Estudos da
Linguagem, da Universidade Estadual de Sinop
como requisito parcial para obtenção do título de
licenciado em Letras.
BANCA AVALIADORA:
Profª. Ms. Neusa Inês Philippsen
Orientadora
Profª. Dra. Cristinne Leus Tomé
Avaliadora
Profª. Dra. Tânia Pitombo de Oliveira
Avaliadora
Profª. Dra. Rosana Rodrigues da Silva
Ministrante da disciplina
Profª. Ms. Olandina Della Justina
Chefe do Departamento de Letras
SINOP
02 de Dezembro de 2009
3
Dedico este trabalho a meu
esposo Antonio, pela
compreensão dos momentos
ausentes e pela colaboração
constante nas profícuas opiniões.
Aos meus pais e irmãos, pela dedicação e
incentivo aos meus estudos.
4
AGRADECIMENTOS
À Profª. MS. Neusa Inês Philippsen, minha orientadora que acreditou no meu
potencial e dedicou seu tempo e disponibilidade com carinho e ternura a me ajudar neste
trabalho, meu eterno agradecimento.
À Profª. Drª. Rosana Rodrigues da Silva, pela contribuição de conhecimento a esta
trajetória importante do curso.
À Profª. Drª. Tânia Pitombo de Oliveira, pela participação ativa e direta a este passo
importante do nosso engrandecimento profissional.
À instituição Universidade Estadual de Mato Grosso - UNEMAT, onde tive a
oportunidade de dar um grande rumo ao crescimento científico e profissional.
Aos meus colegas de estudo que me acompanharam nesta caminhada, meus sinceros
agradecimentos.
A todos que de alguma forma participaram e contribuíram de alguma forma para a
realização deste trabalho, meus agradecimentos.
5
“Sendo a linguagem da propaganda até certo
ponto reflexo e expressão da ideologia
dominante, dos valores em que se acredita, ela
manifesta a maneira de ver o mundo de uma
sociedade em certo espaço da história”
Antonio Sandmann
6
RESUMO
As propagandas possuem um excelente poder de persuasão por meio da criatividade e
do domínio linguístico-discursivo. São gêneros textuais utilizados por autores/publicitários
para influenciar o consumidor para que o produto atinja a sua finalidade, ser consumido. Com
base nos estudos da Análise do Discurso de linha francesa e noções da Teoria da
Comunicação enfatizamos a noção operatória do interdiscurso como fonte para a realização
destes estudos e necessário para analisar a memória discursiva presente em três propagandas
de sandálias havaianas. Também procuramos apreender nas formulações de nosso corpus as
funções de linguagem empregadas no intuito de compreender melhor a materialidade
discursiva e imagética e as estratégias persuasivas utilizadas no campo dessa publicidade,
estratégias essas que alteraram, ao longo de mais de quatro décadas, a identificação atribuída
à empresa São Paulo Alpargatas e, consequentemente, seu público alvo.
Palavras-chave: Linguagem. Gênero textual-disvursivo. Propaganda. Interdiscurso. Teoria da
Comunicação. Análise de Discurso.
7
ABSTRACT
The advertisements have an excellent power of persuasion through creativity and the
command linguistic-discourse. The text genres are used by authors / advertisers to influence
the consumer to the product achieves its purpose, be consumed. Based on studies of discourse
analysis of the French line and notions of Communication Theory we emphasize the operative
notion of the interdiscourse as a source for these studies and to analyze the discursive memory
presents in three advertisements of Havaianas sandals. We also seek to grasp in the
formulations of our corpus the functions of language used in order to better understand the
materiality of discourse and images and the persuasive strategies used in the field of
advertising, these strategies have altered over more than four decades, the identification given
to São Paulo Alpargatas company and therefore its target audience.
Key words: Language. Gender Textual–Speech. Advertising. Interdiscourse. Theory of
Communication. Analysis of Speech.
8
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1: Havaianas Tradicional____________________________________________19
FIGURA 2: Havaianas Top__________________________________________________ 19
FIGURA 3: Havaianas Baby_________________________________________________ 20
FIGURA 4: Havaianas Com Diamantes________________________________________21
FIGURA 5: Havaianas Com Detalhes em ouro 18K______________________________21
FIGURA 6: Espaço Havaianas_______________________________________________ 22
FIGURA 7: Havaianas Slim_________________________________________________ 28
FIGURA 8: Deusa Afrodite__________________________________________________ 30
FIGURA 9: Comercial Havaianas com Reynaldo Gianecchini_____________________ 32
FIGURA 10: Havaianas Kids Monsters_______________________________________ 34
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO_________________________________________________________10
1. A ANÁLISE DO DISCURSO: APONTAMENTOS CONTEXTUAIS___________12
1.1 Uma breve abordagem do interdiscurso _________________________________ 13
1.2 Teoria da Comunicação: noções e conceitos ______________________________15
1.3 Os atos comunicativos e as funções da linguagem _________________________ 16
2. A HISTORICIDADE DO GRUPO SÃO PAULO ALPARGATAS_____________18
2.1 Percurso publicitário das sandálias havaianas_____________________________18
2.2 As sandálias mais populares____________________________________________22
2.3 A linguagem publicitária e seus efeitos de sentido__________________________24
3. PROPAGANDAS DAS SANDÁLIAS HAVAIANAS: EFEITOS DISCURSIVOS 27
3.1 Análise de propaganda impressa________________________________________27
3.2 Análise de propaganda Televisiva_______________________________________31
3.3 Análise de propaganda de meio eletrônico________________________________34
CONSIDERAÇÕES FINAIS______________________________________________37
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
10
INTRODUÇÃO
O foco deste trabalho, analisar três propagandas de sandálias Havaianas, parte dos
pressupostos teóricos da Análise do Discurso (AD) de linha francesa, que busca os sentidos
produzidos pelo sujeito/autor ao elaborar um discurso, as suas intencionalidades e a forma
como é recebido por quem ouve ou lê seus enunciados na publicidade, e de noções da Teoria
da Comunicação.
Elegemos, como noção operatória, a interdiscursividade, que foi apresentada e
conceituada no capítulo I dessa pesquisa e desenvolvida no corpo do trabalho em que dialoga
com os principais teóricos abordados durante o desenvolvimento da pesquisa.
Este estudo, portanto, procura apreender como se manifesta o interdiscurso no campo
da publicidade, em especial nas propagandas das sandálias Havaianas, o que permitiu
compreender o poder de persuasão que o discurso tem neste tipo de gênero textual-discursivo.
Na problemática central dessa pesquisa, questionamos: como as estratégias linguístico-
discursivas e estilísticas utilizadas no mundo da publicidade pelo autor/locutor, assim como o
imagético, as funções da linguagem e as marcas sócio-ideológicas dialogam com o público
alvo e atingem os objetivos de levar o leitor/interlocutor ao consumo, questionamentos que
procuramos responder ao longo do trabalho. O corpo do trabalho está dividido em três
capítulos.
O primeiro capítulo apresenta a conceitualização da análise do discurso (AD) francesa
e do interdiscurso, bem como noções da Teoria da Comunicação e sobre as funções da
linguagem. O segundo aborda toda a contextualização histórica do grupo São Paulo
Alpargatas e alguns pontos importantes sobre a linguagem da propaganda relacionadas com
as sandálias havaianas.
E, por fim, no terceiro capítulo são realizadas as análises do corpus selecionado e
apresentados os efeitos de sentido apreendidos na materialidade discursiva e imagética.
Destacamos que o corpus compõe-se de três propagandas que se destinam a públicos
distintos, ou seja, uma para o público feminino, uma para o público masculino e uma para o
público infantil, que foram selecionadas em diferentes canais discursivos, respectivamente,
uma propaganda impressa, um comercial de televisão e uma propaganda de um meio
eletrônico.
Ressaltamos que a preferência dada pela publicidade das sandálias Havaianas foi por
tratar-se de um produto brasileiro com excelente repercussão nacional e internacional, e por
11
estar no mercado consumidor há mais de quatro décadas, alcançando, a partir da década de 90
do século passado, o primeiro lugar na vendagem e aceitabilidade do produto, atingindo todos
os públicos alvos.
Acreditamos que essa pesquisa possa contribuir para a produção de conhecimento e
material de consulta para novos trabalhos, visto que atualmente há uma proliferação de
estudos em AD que, contudo, ainda requerem novos olhares dialógicos para o seu
fortalecimento, assim como fortalecer práticas pedagógicas que poderão ser úteis para o
exercício profissional do ensino.
Outro fator relevante para a escolha do objeto é poder torná-lo acessível a acadêmicos
de Letras e de outros cursos, assim como para professores e pesquisadores que, independente
da área, necessitam ter domínios linguísticos e discursivos para a excelência profissional. O
propósito desse estudo discursivo visa, ainda, contribuir com a possibilidade de leitura crítica
que a sociedade poderá realizar para compreender melhor as estratégias persuasivas e razões
do mundo da publicidade nas propagandas das sandálias Havaianas.
12
1. A ANÁLISE DO DISCURSO: APONTAMENTOS CONTEXTUAIS
Nesse primeiro capítulo apresentaremos a conceitualização da Análise do Discurso e
da noção com a qual operamos nossas análises, o interdiscurso, bem como noções da Teoria
da Comunicação sobre as funções da linguagem. Tais noções têm o propósito de
complementar as análises interdiscursivas que se fazem presentes nas propagandas das
sandálias havaianas para uma melhor compreensão da materialidade discursiva e das
estratégias persuasivas utilizadas no campo da publicidade, o que nos permite apreender o
poder de persuasão que o discurso tem neste tipo de gênero discursivo.
A Análise do Discurso, doravante AD, é uma prática materialista do campo da
linguística e da comunicação que propõe a análise ideológico-discursiva de textos. Surgiu na
França, com Michel Pêcheux em sua tese "Analyse Automatique du Discours" em 1969,
obtendo como objeto de estudo, o discurso. M. Pêcheux propôs uma forma de reflexão sobre a
linguagem na elaboração da análise do discurso nas ciências humanas, com sofisticação
descobriu a arte de refletir nos entremeios.
Segundo Helena H. Nagamine Brandão (2007, p.11):
A linguagem enquanto discurso não constitui um universo de signos que serve apenas
como instrumento de comunicação ou suporte de pensamento; a linguagem enquanto
discurso é interação, e um modo de produção social; ela não é neutra, inocente e nem
natural, por isso o lugar privilegiado de manifestação da ideologia.
De acordo com a autora, é entre a língua e a fala que temos o discurso, nele
encontramos pontos de articulação dos processos ideológicos, sendo a linguagem um lugar de
conflito, de confronto ideológico, que deve ser analisado na realidade do homem, os aspectos
históricos e sociais fazem parte desse processo.
A ideologia, nesse contexto, tem uma carga significativa de interesses que são
apresentados sutilmente através de condições sociais e históricos que influenciam a sociedade
a obter valores e então sentirem a necessidade ideológica como uma necessidade básica.
Dessa forma, para Brandão, os estudos analíticos da AD tornam-se relevantes ao
funcionamento da língua por considerarem as condições de produção como um elemento
sócio-histórico:
A AD buscou realizar uma análise, considerando o texto na sua opacidade. Para ela, a
interpretação devia considerar o modo de funcionamento lingüístico textual dos
discursos, as diferentes modalidades do exercício da língua num determinado contexto
histórico-social de produção (BRANDÃO, 1998, p. 19).
13
A AD, portanto, considera importante relacionar o discurso com suas condições de
produção, que incluem a situação, o sujeito, o interdiscurso (memória discursiva). A situação
diz respeito ao contexto situacional do discurso. O sujeito é afetado pela ideologia em que os
significados das palavras são determinados de acordo com as posições ideológicas inseridas
num contexto sócio-histórico. Diante disso, tem-se o que é chamado “formação discursiva”
quando, diante de uma dada posição, determina-se o que deve e pode ser dito assim, não há
intenção do sujeito.
Segundo Dominique Maingueneau (1997, p.113):
Como se vê, contrariamente às representações espontâneas dos sujeitos, a formação
discursiva aparece como o lugar de um trabalho no interdiscurso; ela é um domínio
“inconsistente”, aberto e instável, e não a projeção, a expressão estabilizada da “visão
do mundo” de um grupo social.
No item a seguir apresentaremos, sucintamente, a conceituação da noção com a qual
operamos em nosso capítulo das análises, o interdiscurso, ancorada nos pressupostos teóricos
da AD francesa.
1.1 Uma breve abordagem do interdiscurso
Nesta pesquisa, em que abordamos como noção operatória central o interdiscurso,
importa considerar que o interdiscurso não é apenas discurso de um indivíduo, pois há uma
historicidade desse sujeito que está inserido no seu discurso, e é exatamente para esse
contexto sócio-histórico-ideológico que lançamos o nosso olhar ao buscarmos nos fios
discursivos a interação do locutor e do interlocutor nas propagandas analisadas no capítulo
três desse Trabalho de Conclusão de Curso.
Cabe, dessa forma, correlacionar a noção de interdiscurso a outros termos que estão
interligados e que compõe o todo enunciativo, dentre eles destacamos o universo discursivo, o
campo discursivo e o espaço discursivo.
O universo discursivo é assim definido por Maingueneau (ibidem, p.116):
Entende-se por “universo discursivo” o conjunto de formações discursivas de todos os
tipos que coexistem, ou melhor, interagem em uma conjuntura. Este conjunto é
necessariamente finito, mas irrepresentável, jamais concebível em sua totalidade pela
AD. Quando uma tal noção é utilizada, é essencialmente para aí recortar os “campos
discursivos”.
14
É importante também destacar que nessa conjuntura as formações discursivas
representam as formações ideológicas. Desse modo, o sentido sempre é determinado
ideologicamente, não há sentido que não o seja. Tudo o que dizemos tem, pois, um traço
ideológico em relação a outros sentidos ideológicos.
Assim, procurarmos apreender o universo discursivo presente nas propagandas das
sandálias havaianas a partir das formações discursivas que interagem entre si, com o intuito de
resgatar os interdiscursos que constituem a materialidade discursivo-textual. Para essa
apreensão, contudo, é necessário delimitar anteriormente o “campo discursivo”, tal como
definido por Maingueneau (Idem, p.116-17):
O “campo discursivo” é definível como um conjunto de formações discursivas que se
encontram em relação de concorrência, em sentido amplo, e se delimitam, pois, por
uma posição enunciativa em uma dada região. O recorte de tais campos deve decorrer
de hipóteses explícitas e não de uma partição espontânea do universo discursivo.
Para a delimitação do campo discursivo, de acordo com o autor, é necessário que se
parta de situações enunciativas explícitas em que o sujeito revele marcas de posicionamento
discursivo. O interdiscurso representado nessas marcas pode ser chamado de um conjunto de
discursos que se situa entre uma mesma formação discursiva e entre formações antagônicas.
Há, então, nesse conjunto enunciativo-discursivo espaços que permitem extrair um
subconjunto, constituídos de pelo menos dois posicionamentos discursivos mantendo relações
particularmente fortes.
O “espaço discursivo”, dessa forma, delimita um subconjunto do campo discursivo,
ligando pelo menos duas formações discursivas que, supõe-se, mantêm relações privilegiadas,
cruciais para a compreensão dos discursos considerados. (Idem, p.117)
Para o nosso contexto de pesquisa, cabe salientar que partimos do universo do discurso
da mídia impressa, televisiva e meios eletrônicos, em seguida, transitamos pelos campos da
economia e da publicidade e, finalmente, recortamos o espaço discursivo das propagandas das
sandálias havaianas.
Resta enfatizar que são as condições de produção que determinam a posição sujeito no
interdiscurso (memória) e promove o assujeitamento a determinada formação discursiva que
interagem entre si para a apreensão dos efeitos de sentido discursivos que circulam no
universo midiático. Desse modo, destacamos a importância de atermos nosso olhar reflexivo
ao conjunto interdiscursivo que se revela nos fios discursivos e imagéticos das propagandas
15
escolhidas em nosso corpus, juntamente com os recursos estilísticos e persuasivos (funções de
linguagem) empregados e melhor explicitados pela Teoria da Comunicação.
1.2 Teoria da Comunicação: noções e conceitos
A Teoria da Comunicação é considerada uma importante área de investigação da
Linguística, que visa descrever ou explicar a linguagem verbal humana, oral ou escrita através
dos signos que o homem produz representando a comunicação, que não ocorre apenas com a
linguagem verbal, mas também com a linguagem não-verbal através de outros signos
linguísticos representados por imagens ou códigos, recursos esses que são amplamente
utilizados pela publicidade nas propagandas, em outdoors, revistas, e outros.
A comunicação, tal como conceituada pela Teoria da Comunicação, é um ato de
comunicar, de transmitir uma mensagem a alguém. É importante lembrar que há comunicação
quando houver uma troca de mensagens entre emissor e receptor, entre remetente e
destinatário, entre codificador e decodificador.
Jakobson entende o processo de comunicação desta forma:
É mister uma perspectiva sumária dos fatores constitutivos de todo processo
linguístico, de todo ato de comunicação verbal. O remetente envia uma mensagem ao
destinatário. Para ser eficaz, a mensagem requer um contexto a que se refere (ou
“referente”, em outra nomenclatura algo ambígua), apreensível pelo destinatário, e que
seja verbal ou suscetível de verbalização; um código total ou parcialmente comum ao
remetente e ao destinatário (ou, em outras palavras, ao codificador e ao decodificador
da mensagem); e, finalmente, um contacto, um canal físico e uma conexão psicológica
entre o remetente e o destinatário, que os capacite a ambos a entrarem e
permanecerem em comunicação. Todos estes fatores inalienavelmente envolvidos na
comunicação verbal podem ser esquematizados como segue:
CONTEXTO
REMETENTE --------MENSAGEM ------- DESTINATÁRIO
CONTACTO
CÓDIGO (JAKOBSON, 2007, p. 122-23)
Traduzindo o processo comunicativo ao nosso estudo, podemos afirmar que temos
vários remetentes, as revistas que editam e publicam os textos (mensagens) publicitários. Do
mesmo modo há destinatários distintos, o público alvo a que se direcionam as revistas
selecionadas, que utilizam como código a língua portuguesa. O contexto é representado pelo
objetivo a ser atingido, a venda do produto, no caso as sandálias havaianas, que é igualmente
16
enaltecido pelos recursos e estratégias que o canal físico (a revista) utiliza para manter o elo
psicológico de comunicação e, consequentemente, de persuasão.
1.3 Os atos comunicativos e as funções da linguagem
São muito utilizadas nos vários textos de gêneros discursivos distintos as funções da
linguagem como recurso para chegar à finalidade daquele tipo de gênero. Neste trabalho o
gênero a ser analisado são as propagandas das sandálias havaianas, que tem o propósito maior
de persuadir o consumidor a adquirir o produto. Para tanto, inicialmente, lançaremos olhar
sobre a materialidade discursiva, isto é, sobre a mensagem tendo em vista a sua finalidade de
transmissão e recepção.
Segundo Chalhub (2001), o psicólogo Karl Bühler apontou três fatores básicos para
compor o funcionamento da mensagem: o destinador (mensagens de caráter expressivo), o
destinatário (mensagens de caráter apelativo) e o contexto (mensagens de caráter
comunicativo).
O linguista Roman Jakobson (2006), a partir dos pressupostos da Teoria da
Comunicação, ampliou as funções da linguagem de três para seis funções, que são
respectivamente: Função referencial, informativa ou denotativa (em que o emissor apenas
transmite a mensagem, de modo claro e objetivo, sem admitir mais de uma interpretação, com
a finalidade de espelhar a realidade); Função emotiva ou expressiva (na qual o emissor volta-
se para si mesmo, para os próprios sentimentos, revelando o seu estado emocional ); Função
conativa ou apelativa (em que o emissor deseja atuar sobre o receptor, levando-o a uma
mudança de comportamento); Função metalinguística (em que a linguagem discorre sobre o
próprio código); Função fática (na qual se emprega a linguagem para iniciar, prolongar,
verificar, testar ou interromper a própria comunicação); e Função poética (em que o emissor
tem um cuidado especial na escolha das palavras, realçando sons que sugerem significados
diversos e empregando imagens sugestivas, a fim de expressar ou enfatizar a sua mensagem).
Quanto à função referencial, importa dizer que ela separa-se em dois níveis de
linguagem, o denotativo e o conotativo. Quando nos referimos a uma mensagem conotativa
compreendemos como uma “linguagem figurada”, ou seja, um mesmo objeto traz mais de um
significado e quando nos referimos a uma mensagem denotativa geralmente apreendemos a
mensagem no sentido real, pois o significado chega mais próximo do objeto.
17
Segundo Chalhub, é inevitável que haja um diálogo entre as funções num mesmo
texto, algumas das funções podem enfatizar um determinado ponto da mensagem. No gênero
propaganda, por exemplo, é presumível que o texto tenha um enfoque na mensagem e a
imagem tenha outra função predominante na mensagem transmitida.
Por trás da mensagem publicitária há sempre o imperativo do consumo da mercadoria
apresentada, diferentemente da função estética da arte, que não intenciona persuadir
para fins de consumo. A publicidade apropria-se, para formulação de sua linguagem, e
é próprio dela, dos níveis gráficos, visual e sonoro dos signos, conforme o canal que
medeia a informação: outdoor, revista, televisão, rádio e outros.(CHALHUB,2001, p.
23-5).
Embora outras funções da linguagem possam ser utilizadas no campo da publicidade,
na linguagem da propaganda é a função conativa ou apelativa que se evidencia, podemos
afirmar, inclusive, que essa função é central para esse gênero , pois é através desta função que
o emissor pretende atrair a atenção do receptor e influenciá-lo a receber a mensagem,
porquanto esta é a principal característica da propaganda, ela quer vender um produto e, para
tanto, necessita convencer o receptor da necessidade de possuir aquele produto.
Para a consolidação do seu objetivo, a mensagem publicitária frequentemente utiliza
diferentes tipos de argumentos: Argumentos apelativos (que têm a intenção de convencer),
expressam-se pelas afirmações das características intrínsecas do produto; argumentos
emotivos (que trabalham com as emoções), destinados a mexer com a vaidade e os
sentimentos do consumidor; argumentos racionais e lógicos (que procuram explicar),
identificados algumas vezes pelo silogismo1; e argumentos não agressivos (de quem adquire )
que convencem de forma sutil.
Destacamos, ainda, que os efeitos alcançados devem-se à preocupação fundamental de
quem redige de pôr em cada slogan, em cada frase de anúncio, muita expressividade, dando à
linguagem mais eficácia persuasiva e mais poder informativo.
No próximo capítulo apresentaremos um resumo breve da história do grupo São Paulo
Alpargatas, da qual procuramos apreender a evolução da publicidade do produto ao longo da
trajetória de sua existência, com o intuito de resgatar o contexto sócio-histórico que importa
às análises a serem realizadas.
1 Silogismo é uma forma de raciocínio lógico na qual há duas premissas e uma conclusão distinta destas
premissas.
18
2. A HISTORICIDADE DO GRUPO SÃO PAULO ALPARGATAS
As informações abordadas neste capítulo foram retiradas em sua maioria de meios
eletrônicos devido à dificuldade de acesso a referenciais teóricos impressos, televisivos e
meios eletrônicos sobre o assunto, necessário para a contextualização histórica do grupo São
Paulo Alpargatas, que importa ao nosso trabalho de pesquisa para implementar os teceres
analíticos sobre propagandas das sandálias havaianas que realizaremos no terceiro capítulo.
Desse modo, este capítulo traz o histórico do desenvolvimento publicitário do grupo
São Paulo Alpargatas, que apresenta ao mercado consumidor um produto brasileiro com
grande repercussão nacional e internacional, e está em circulação há mais de quatro décadas,
atingindo todos os públicos alvos.
O desenvolvimento desta empresa deve-se muito às publicidades que sempre foram
bem elaboradas e fazem grande sucesso. Atualmente as sandálias aparecem muito coloridas e
com desing diferenciado, anatômico e confortável, características que foram se definindo
como próprias delas através da publicidade. Mas essa identificação é uma construção
moderna, pois, a princípio, elas eram caracterizadas como as sandálias de pessoas humildes,
classe baixa, pois eram baratas e duráveis.
2.1 Percurso publicitário das sandálias havaianas2
O nascimento das sandálias havaianas surgiu em 1962. Foi inspirada em uma típica
sandália japonesa chamada Zori, feita de tiras de tecido e solado de palha de arroz, por isso as
sandálias havaianas têm o solado com o desenho de grãos de arroz, detalhes que as tornam
inconfundíveis. As primeiras sandálias havaianas eram de borracha, tinham o solado branco
com a lateral azul e as tiras azuis.
Figura 1: Havaianas Tradicional3
2 Informações obtidas através do site. Disponível em; http://www.havaianas.com/pt-BR/#/history. Acesso em 22
de abril de 2009, às 23:00h.
3 Imagem obtidas através do site. Diponível em; http://mundodasmarcas.blogspot.com/2006/05/havaianas-as-
legtimas.html. Acesso em 20 de junho de 2009, às 20:30hs.
19
Em 1970 surgiu o lançamento do grande slogan “Havaianas. As legítimas”, basta
ouvir a continuidade do slogan “Não deformam, não soltam as tiras e não têm cheiro.” para
nos lembrarmos dos comerciais de Chico Anysio nas décadas de 70 e 80. Nesta época
empresas concorrentes tentavam imitar as havaianas. Contudo, o grande investimento em
publicidade que surge nesse contexto tinha o intuito de transformar as havaianas em número
de vendagem neste tipo de calçado e dizer que as outras eram apenas imitações baratas.
Em 1980, já eram vendidos mais de 80 milhões de pares por ano. As sandálias foram
consideradas um item indispensável pelos brasileiros, ou seja, assemelhavam-se a um item da
cesta básica, como arroz e feijão.
Em 1993, com a mania de inverter o solado das havaianas para parecerem únicas,
surge a ideia para a criação das havaianas Top, que inicialmente foram lançadas com oito
cores, as do arco-íris, e hoje já ultrapassam 20 cores.
Figura 2: Havaianas Top4
4 Imagem obtidas através do site. Diponível em; http://mundodasmarcas.blogspot.com/2006/05/havaianas-as-
legtimas.html. Acesso em 20 de junho de 2009, às 20:30hs.
20
Em 1994, com o slogan “Havaianas. Todo mundo usa.”, a publicidade das havaianas
passa por uma grande transformação. Alguns artistas famosos passam a fazer comerciais
divertidos, que desperta a atenção do consumidor. Na TV pessoas como Malu Mader, Bebeto,
Hortência e Luana Piovani mostravam seus pés. Era verdade, todo mundo usava havaianas,
essa era a construção discursiva que se pretendia veicular. Nas revistas, na TV e nos meios
eletrônicos uma explosão de cores traduzia o bom astral das sandálias havaianas.
Assim, a partir da década de 90 o grupo São Paulo Alpargatas não parou mais de
inventar moda, até para quem nem sabia andar, como as sandálias baby. Tinha como objetivo
central atingir pessoas de todas as idades.
Figura 3: Havaianas Baby5
Outra ideia para o lançamento de novos modelos surgiu com a exploração de temáticas
que mobilizam toda a sociedade. Dessa forma, em 1998 foi lançado um modelo para a Copa
do Mundo, com uma bandeira do Brasil na tira, e logo se tornou objeto de desejo no exterior e
orgulho para os brasileiros. A Copa não foi vencida pelo time brasileiro, contudo, as
havaianas ficaram conhecidas internacionalmente.
Em 2000, dando sequência ao projeto de internacionalização do produto, as sandálias
tornam-se mania também em outros países, tais como Havaí, Austrália, França e não para por
aí, estrangeiros compram e levam para seus países, propagam e divulgam a mercadoria, o que
5Imagem disponível em;
http://images.google.com.br/images?hl=ptBR&source=hp&q=havaianas+baby&um=1&ie=UTF8&ei=6IkhS7zy
NIOruAfv3JXQCg&sa=X&oi=image_result_group&ct=title&resnum=1&ved=0CBIQsAQwAA. Acesso em 21
de Junho de 2009 às 19:23h.
21
faz com que as havaianas conquistem algumas das vitrines mais concorridas do planeta. Hoje
elas podem ser encontradas em mais de 60 países.
Desde 2003, “Havaianas” participa do Oscar, presenteando cada um dos participantes
com sandálias exclusivas. Começa então a produção de havaianas personalizadas para atingir
todos os níveis sociais.
Em 2004, com o lançamento do slogan “Diamantes são eternos, Havaianas também”,
é lançado uma edição especial de sandálias assinadas pelas joalherias H. Stern com
acabamento em ouro 18k e diamantes. Uma sandália que é uma jóia.
Figura 4: Havaianas com diamantes6
Figura 5: Havaianas com acabamento em ouro 18k7
6Imagem disponível em;
http://images.google.com.br/images?hl=ptBR&um=1&sa=1&q=havaianas+com+diamantes&aq=f&oq=&start=0
Acesso em 22 de Junho de 2009 às 23:01h.
7 Imagem disponível em;
http://images.google.com.br/images?hl=ptBR&um=1&sa=1&q=havaianas+com+detalhes+em+ouro&aq=f&oq=
&start=0. Acesso em 28 de Junho de 2009 às 22:16h.
22
Em 2006 são lançadas as havaianas Slim, mais femininas com tiras mais finas e
delicadas, própria para as mulheres, pois deixam os pés com um ar suave e delicado, para um
público exigente e ícone da marca.
Em 2007, finalmente, o grupo São Paulo Alpargatas abre uma sede em Nova Iorque nos
EUA, atingindo o mercado internacional com mais vigor e, em 2008, passa a atuar
diretamente na Europa, um dos lugares escolhido para abrigar o escritório da marca é Madri.
Com a conquista do mercado nacional e internacional e com o intuito de valorizar
ainda mais a marca, em 2009, um “espaço havaianas” é montado em São Paulo, que reúne
tudo que apaixonados por havaianas sempre sonharam: linha completa de sandálias, produtos
exclusivos para o mercado internacional, customização e novos produtos. O espaço visa a
transmitir a energia das cores alto astral e apresenta um formato de barraca de feira com frutas
das estações em homenagem à origem popular do produto. Ali o consumidor pode montar a
sandália no modelo que desejar.
Figura 6: Espaço Havaianas8
2.2 As sandálias mais populares9
8 Imagem obtidas através do site. Diponível em; http://mundodasmarcas.blogspot.com/2006/05/havaianas-as-
legtimas.html. Acesso em 20 de junho de 2009, às 20:30hs.
9Informações para contexto histórico retiradas do sit. Disponível em;
http://mundodasmarcas.blogspot.com/2006/05/havaianas-as-legtimas.html. Acesso em 20 de junho de 2009, às
20:30hs.
23
Após esse breve contexto histórico abordado, temos como resultado efetivo que a linha
das sandálias Havaianas cresceu de apenas um modelo até 1994 para 59 tipos diferentes nos
dias atuais, comercializadas em mais de 60 cores e em países distintos. Entre os mais
populares destacam-se;
BRASIL - Sandálias lançadas em 1998 que possuem uma bandeira do Brasil pregada nas
tirinhas e listras das cores da bandeira em torno da base.
SURF – Surge em 1998, com modelos simples de tiras pretas e cores e estampas renovadas
com desenhos de manobras, paisagens, tribais e grafismos, que refletem o espírito do surf.
BABY - Sandálias que foram lançadas em 2005, em tamanhos variados, com feixe para
prender ao calcanhar para não escapar do pezinho da criança. Possuem as alterações Baby
Pets (com bichinhos nas tirinhas), Baby Brasil (com estilo idêntico ao modelo adulto) e Baby
Estampadas (com estampas coloridas na base).
JOY - Modelo feminino lançado em 2005 com salto pequeno de três centímetros. Não possui
estampa nem variação de modelos, apenas de cores. Todas as sandálias trazem flores
delicadas presas às tiras. Essas sandálias vão além do básico, dão um ar mais sofisticado.
ESTAMPADAS - Linha que chegou ao mercado em 2006, com estampas coloridas na base,
de flores e borboletas. Possui variações denominadas Alamoana, Butterfly, Floral, Flowers,
Hibisco e Sunny. Todas com diferentes formas de flores e borboletas.
IPÊ - Sandálias com estampas de animais em extinção lançadas em 2006 em parceria com o
Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ), em que 7% das vendas líquidas foram destinadas ao
Instituto. Possuem a variação IPÊ Filhotes que, como o nome sugere, traz estampas de
filhotes e tamanhos menores para crianças.
MENINA – No mesmo ano, 2006, aparece uma linha com modelos perfumados para meninas
que com muita delicadeza traz o cor-de-rosa e estampas de corações, flores e frutas. Nessa
linha surgem modelos variados como Kids Flores, Kids Lucky, Kids Stars e Kids Tropical,
que vêm com uma bolsinha estampada.
MENINO - Também lançada em 2006 para meninos que gostam de esportes radicais e
aventuras. Existem as versões Kids Radical e Kids Monsters.
SLIM – Ainda em 2006 foram lançadas as sandálias para o público alvo feminino, sandálias
que apresentam um toque de simplicidade e com tiras mais finas para realçar a delicadeza
feminina aos pés. Possuem duas variações, a Slim, lisa, contando apenas com variação de
cores, e a Slim Season, com tiras e estampa floral douradas.
24
WAVE - São criadas em 2007 as sandálias masculinas com formato anatômico e com tiras de
várias cores e mais largas.
Destacamos que, para nosso contexto de pesquisa, é relevante conhecer os momentos
históricos (o interdiscurso) da construção da popularidade do Grupo proprietário acima citado
para compreender a ideologia presente nas propagandas selecionadas em nosso corpus de
análise e como os efeitos de sentido das estratégias utilizadas na produção podem ser
apreendidos pelos interlocutores consumidores.
2.3 A linguagem publicitária e seus efeitos de sentido
A linguagem da propaganda é sempre muito rica, as propagandas das sandálias
havaianas utilizam-se de imagens bem coloridas e criativas para dar autenticidade ao produto
e chamar a atenção do consumidor que, em seguida, lê os enunciados trazidos na
materialidade. O grupo São Paulo Alpargatas é um exemplo de projeção por meio da
linguagem publicitária utilizada pelos produtores de marketing para vender seus produtos com
sucesso ao longo de mais de quatro décadas. Esse sucesso é o reflexo da manipulação social
engendrada nas propagandas.
O autor Leite fala-nos desse discurso da propaganda como meio de manipulação
social:
Indiscutivelmente, a propaganda é um instrumento de manipulação social que integra
nosso cotidiano. Pretende-se convencer nas entrelinhas, no espaço entre o dito e o
não-dito, para vender o produto e fazer crer que ele não tem somente valor unitário,
mas principalmente, possui um valor simbólico, que confere status e poder para quem
o adquire. (LEITE, 2003, p.101)
A linguagem, desse modo, oferece muitos recursos de persuasão/sedução para o
consumidor, estratégias bem utilizadas que garantiram e garantem o crescimento vertiginoso
de vendagem das sandálias havaianas, assim como muitos recursos estilísticos que
influenciam nas escolhas dos produtos. Esse processo de construção e utilização de recursos
na linguagem publicitária atua diretamente no interdiscurso que se encarrega de fixar a marca
do produto e fazer crer que aquela marca é a melhor, ou seja, faz o consumidor pensar não em
um chinelo de borracha, mas em uma sandália havaianas. A memória discursiva, portanto,
garante ao produto uma fidelidade que resiste ao longo do tempo e é constantemente
realimentada com novas propagandas bem elaboradas, garantindo assim o sucesso da marca.
25
Maingueneau enfatiza esse assunto a partir da marca e dos discursos produzidos e
enaltecidos pela publicidade:
O nome de uma marca, como qualquer nome próprio, está associado a um conjunto
variável de representações sedimentadas ao longo do tempo, uma “imagem de marca”,
sobre a qual a empresa deve agir constantemente. A evolução dessa imagem se deve
em boa parte aos discursos que a empresa emite e emitiu sobre ela mesma e sobre seus
produtos, em particular pela publicidade. Por mais que uma marca se coloque como
uma identidade que transcende os enunciados que ela produz, ela é, na realidade,
modificada por esses enunciados: tais enunciados podem reforçar ou, ao contrário,
modificar essa imagem. (MAINGUENEAU, 2008, p.212).
Esse processo ocorreu com as sandálias havaianas que, a princípio, tinham como
imagem as sandálias de borracha consumidas por pessoas sem muitos recursos financeiros,
um produto barato e durável, mas menos comercializado devido a essas características. Após
uma mudança de identidade em que as havaianas passaram a ser usadas por modelos e artistas
famosos, os quais se esforçaram para tecer um novo discurso por meio da publicidade e, desse
modo, conquistaram a simpatia de outras classes sociais que também passaram a usar o
produto, sendo hoje conhecida e muito comercializada no Brasil e em vários países do
exterior.
Os recursos e estratégias utilizadas pelos produtores de publicidade exploram em
especial o discurso produzido pela marca e que precisa estar em harmonia com o nome do
produto. Assim, ainda de acordo com Maingueneau (2008), o produto entra no mercado para
que lhe seja atribuído um nome e que se deve negociar com as coerções impostas pela
categoria de produto e pela imagem de marca resultante dos discursos já produzidos: vender
uma sandália de borracha impõe certas coerções, vender uma havaianas impõe outras
coerções.
Podemos também, no campo da publicidade, perceber algumas importantes distinções
entre provérbios e slogans. O primeiro refere-se à maneira como tudo funciona no mundo e às
verdades que devem ser apreendidas pelo co-enunciador nesse processo, o segundo traz em
sua materialidade a sugestão a que se destina, acima de tudo, de fixar na memória dos
consumidores potenciais a associação da marca com o argumento persuasivo de compra,
como no slogan das sandálias havaianas “As legítimas”, que tem o propósito de levar à crença
de exclusão de imitações e garantir à memória discursiva a necessidade de comprar havaianas
porque nenhuma é igual. Outra distinção entre ambos é que os provérbios cristalizam-se ao
longo dos tempos e os slogans sofrem as influências diretas das transformações das mídias,
contudo, tanto um quanto outro é ferramenta indispensável do publicitário.
26
Tais estratégias elaboradas pelos profissionais da publicidade, como vimos,
necessitam levar em consideração o alocutário-consumidor, pois ele é o alvo do destino das
propagandas, ele é o sujeito que deve ser influenciado. Aqui importa considerar o
interdiscurso (memória discursiva), noção operatória central dessa pesquisa, não apenas como
um discurso de um indivíduo, pois há uma historicidade desse sujeito que está inserida no seu
discurso e que estabelece a interação entre locutor e interlocutor.
Segundo Cardoso, a representação do alocutário, no discurso da propaganda, é peça-
chave de todo processo:
O discurso na propaganda tem por objeto atingir o alocutário, de modo a levá-lo a uma
ação específica, que é a de comprar o produto que se apresenta. Nesse sentido, a
linguagem é uma forma de ação, orientada para influenciar pessoas, e a interação entre
o locutor e o alocutário se estabelece via as regras determinadas. (CARDOSO, 2003,
p.94)
O locutor, para essa autora, atua no discurso da propaganda por meio de um jogo
ambíguo, onde o eu não atua como sendo tal, mas sim como ele. Assim, cria-se como
referente uma ilusão de objetividade. A publicidade deseja, portanto, persuadir, associar o
produto que vende a um corpo em movimento, a um estilo de vida.
Sandmann visualiza o texto na propaganda de forma mais ampla:
É comum termos hoje propagandas com imagens - jornais, revistas e outdoors – e sons
musicais, principalmente na televisão. Pode-se dizer que, muitas vezes, o texto escrito
ou falado é apenas parte do todo, isto é, o conjunto da propaganda, a textualidade ou o
texto completo é formado por sons, imagens – estáticas ou em movimento – e texto
lingüístico. (SANDMANN, 2003, p.11)
É, portanto, o conjunto da propaganda, a sua textualidade que tem o poder de
persuadir o sujeito, de convencer que aquele produto é o melhor, mais completo, de maior
durabilidade, e que ao usar o produto ele (o sujeito) será aceito na sociedade. Assim, uma
grande quantidade de recursos da linguagem da propaganda se faz necessária para captar a
atenção do leitor, desafio que leva o propagandista ou o publicitário a buscar incessantemente
por meios estilísticos, sonoros, imagéticos e linguísticos para prender ou até mesmo provocar
o leitor a adquirir os produtos que enuncia, no caso dessa pesquisa as sandálias havaianas.
No próximo capítulo apresentaremos o corpus de análise, propagandas que trazem em
sua materialidade linguística e imagética a marca Havaianas e os efeitos de sentido por elas
propagados.
27
3. PROPAGANDAS DAS SANDÁLIAS HAVAIANAS: EFEITOS
DISCURSIVOS
Neste último capítulo reservado às reflexões analíticas apresentamos três propagandas
veiculadas em suportes midiáticos distintos. Para a seleção desse corpus optamos por dar
ênfase aos dois gêneros, feminino e masculino, e ao universo infantil. Para tanto, escolhemos
respectivamente propagandas que contemplam cada um desses públicos consumidores.
Dentre os efeitos de sentido que procuraremos apreender destacamos as estratégias
discursivas e estilísticas utilizadas no mundo da publicidade pelo autor/locutor, assim como o
imagético, as funções da linguagem e as marcas sócio-ideológicas que dialogam com o
público alvo e tem como propósito atingir os objetivos de levar o leitor/interlocutor ao
consumo.
Conforme ressaltamos no capítulo I, os pressupostos teóricos que fundamentam nossa
pesquisa são a Análise do Discurso de linha francesa e a Teoria da Comunicação, aportes
teórico-metodológicos que nos permitem compreender a materialidade discursiva e imagética
empregada nas propagandas das sandálias havaianas e as intencionalidades pretendidas pelos
sujeitos enunciadores. Nosso olhar reflexivo dará prioridade ao conjunto interdiscursivo que
se apresentar nos fios discursivos e imagéticos das propagandas selecionadas.
Enaltecemos ainda que os três meios de publicidade selecionados abrangem classes
sociais diferentes e públicos distintos, como veremos a seguir. Os recortes foram feitos,
respectivamente, de uma propaganda impressa em revista, de um comercial de televisão e de
uma propaganda em um meio eletrônico.
3.1 Análise de propaganda impressa
A propaganda apresentada abaixo foi veiculada na revista Capricho da Editora Abril
em janeiro de 2009. Traz em sua materialidade discursiva e imagética elementos indicativos
que revelam tratar-se de uma sandália destinada ao público feminino, mais especificamente ao
púbico feminino jovem.
Figura 7: Havaianas Slim10
10
Revista Capricho Editora Abril, Edição nº 1061 4.jan.2009.
28
A revista Capricho da Editora Abril é uma revista de público adolescente feminino de
12 a 16 anos, que apresenta dicas de beleza e de fofocas de artistas que estão na mídia, seu
preço de vendagem é bem acessível e custa em média de R$ 3,99, o público desta revista,
portanto, é jovem e de classe média baixa. São jovens movidas pelas formações discursivas
do meio em que vivem, nesse espaço é a mídia que manipula a moda, seja impressa, televisiva
ou eletrônica, e é dentro deste universo discursivo que a jovem leitora/consumidora é levada
ao consumo, que se sintetiza como uma necessidade de consumir determinado produto.
É relevante aqui lembrarmos a historicidade do grupo São Paulo Alpargatas como
mencionada no capítulo II. Se a princípio as sandálias eram destinadas para um público de
classe baixa, a partir de investimentos de grande monta, mais especificamente na década de
90 do século passado, e após um grande trabalho de publicidade o público alvo mudou
drasticamente e atinge hoje todas as classes, gêneros e faixas etárias.
Esse investimento que lançou ao mercado variados modelos de sandálias Havaianas
com temáticas distintas foi acompanhado ininterruptamente por estratégias midiáticas que
alteraram significativamente a imagem inicial veiculada, na década de setenta, pela marca no
slogan “Havaianas. As legítimas”. Contudo, esta memória discursiva ainda é um traço muito
forte na publicidade das sandálias, pois ela remete-nos à imediata identificação do produto e
por termos sido levados a acreditar que ele “não deforma, dura mais e não tem outro igual” é
que no contexto atual pagamos mais caro por esse produto.
29
Na propaganda impressa apresentada acima essa identificação se faz em uma das tiras
que mostra e evidencia a palavra Havaianas e no plano de fundo em que palavra aparece em
destaque maior no canto inferior direito. Para que as jovens leitoras da revista sejam obrigadas
a visualizarem e apreenderem as materialidades discursivas e imagéticas destina-se à
propaganda o espaço de duas páginas inteiras, em que se explora fundamentalmente um jogo
de imagens destinado a seduzir e atrair o olhar das adolescentes.
Outro recurso utilizado pelo autor/publicitário foi produzir um efeito de continuam na
propaganda, ou seja, a materialidade discursiva aparece ‘costurada’ com a materialidade
imagética, esse efeito é alcançado pelo plano de fundo que utiliza imagens difusas de tiras e
solados de sandálias retorcidas e atravessadas no todo como fios jogados que esperam para
serem tecidos. Em duas dessas tiras, que aparecem unidas, encontramos o texto enunciativo
“Combinam com biquíni, shortinho, vestido, calça, minissaia. E se o namorado da sua amiga
olhar para você, com saia justa.”
Dentre os efeitos de sentido possíveis de serem apreendidos nessa formulação, temos o
interdiscurso da vaidade feminina como recurso para persuadir a consumidora a comprar o
produto, argumentando-se que o produto combina com uma grande variedade de tipos de
vestimentas, ou seja, a vantagem de se adquirir a sandália é que ela combina com tudo.
Isso ocorre devido a um fator sócio-cultural de muita importância para o público
feminino, a moda, amplamente difundida pela mídia e colocada em circulação pelas pessoas
que aceitam adquirir e usam determinado produto, mantendo-o no mercado consumidor.
Dessa forma, podemos afirmar que foi a aceitação do público que levou as sandálias
havaianas à popularidade, o que a fez tornar-se moda. É importante ressaltar aqui que a
manutenção dessa moda é realimentada ininterruptamente pela publicidade veiculada no
universo midiático, que se transforma em memória, e mantém a hegemonia da empresa São
Paulo Alpargatas.
Destacamos ainda, nos elementos linguísticos que constituem o enunciado, a utilização
da função referencial, abordada capítulo I, item 1.3, na expressão “saia justa” que é
empregada aqui para expressar a ambiguidade entre o sentido denotativo, que remete a uma
vestimenta feminina e que, nesse contexto, associa-se às mulheres jovens, pois são essas que
utilizam com mais frequência saias justas, e o sentido conotativo, que revela o ‘clímax’ da
estratégia enunciativa, pois aguça ao extremo a vaidade feminina e leva a adolescente a
interpretar que se adquirir a sandália anunciada ficará tão bela que chamará a atenção
inclusive “do namorado da sua amiga” e o deixará numa situação difícil, de ‘saia justa’.
Podemos apreender também como função referencial o emprego do verbo combinar que se
30
apresenta na 3ª pessoa do plural do presente do indicativo (combinam) ao se inter-relacionar
com o imagético da cor dourada, que se alterna em matizes claras e escuras entre as sandálias
e o plano de fundo, num entrelaçar de misturas que denotam que Havaianas combinam com
“biquíni, shortinho, vestido, calça e minissaia”, ou seja, combinam com qualquer vestimenta,
pois a cor completa o verbo utilizado, isto é, assegura que as sandálias caem bem com
qualquer veste ou demais cores.
Complementando nossas análises sobre a materialidade imagética disponibilizada pela
propaganda, podemos perceber que as sandálias sobrepõem-se ao plano de fundo e mostram a
delicadeza do produto nos pés, o modelo apresenta um design com tira atrás do calcanhar que
nos lembram das sandálias usadas pelos povos gregos, o dourado, nesse contexto, representa a
riqueza e o poder associado à figura de uma mulher, que se deixa entrever entre as tiras e os
solados retorcidos do plano de fundo. Essa mulher, que aparece com os braços erguidos e com
uma das pernas levantada, é a representante da feminilidade do produto e além de expressar a
liberdade tão almejada pelas adolescentes nessa fase de suas vidas simboliza também a
concretização do poder caso as jovens de classe média baixa adquiram as sandálias. Além
disso, ressaltarmos que essa mulher pode ser considerada uma deusa moderna, uma
representação atual da deusa Afrodite da mitologia grega, deusa da beleza, do amor e do sexo,
também chamada pelos romanos por deusa Vênus, que nasce na ilha de Chipre.
Figura 8: Deusa Afrodite 11
Segundo o Dicionário da Mitologia (2003), existem duas versões para o nascimento
dessa deusa de acordo com Hesíodo, Afrodite nasceu de forma incomum. Após Cronos cortar
11
Uma das representações de Afrodite Disponível em: http://api.ning.com/files/uQkaLeVyFr5mRcAx3G2X87zTRmTUt9KkuJeNQffiL5LZDrvdguBYsOmDMmEomWXMFdRfU
3Y5*rdHEcr9Qamk7h9WTo6cpzC/deusaAfrodite1.jpg Acesso em 16 de Novembro de 2009, às 18:06h.
31
os órgãos de Urano (seu pai) e jogá-los ao mar, formou-se em torno desses órgãos uma
espuma branca que, misturando-se ao mar, como se fosse uma fecundação, teria dado origem
a Afrodite. A segunda versão vem de Homero, mais convencional, que afirma que Afrodite
era filha de Zeus (deus dos deuses) e Dione (deusa das ninfas). Ela casou-se com o deus do
fogo, Hefesto. Porém teve muitos amantes, inclusive homens mortais, teve vários filhos
dessas aventuras. Na época do Renascimento vários artistas retrataram Afrodite.
Portanto, essa mulher que aparece nos entremeios das tiras e dos solados como fundo
delicado representa, juntamente com toda a linguagem conativa e apelativa que se evidencia
na propaganda apresentada, a sutileza do poder feminino na liberdade de expressão dos
tempos atuais, sutileza explorada pelo autor/publicitário para convencer o público adolescente
da necessidade de possuir o produto.
3.2 Análise de propaganda Televisiva
O comercial apresentado abaixo foi ao ar em 1 de outubro de 2007 em emissoras de
TV aberta e por assinatura, atingindo, portanto, audiência na maioria dos lares brasileiros e
sendo apresentado a todos os públicos e a todas as classes. Ressaltamos que a ênfase reflexiva
analítica que faremos manterá o enfoque no gênero propaganda. Pretendemos, assim,
apreender no comercial, que entendemos ser uma versão móvel da propaganda, as estratégias
e recursos utilizados pelo autor/publicitário, a serviço do grupo São Paulo Alpargatas, para
persuadir consumidores a adquirir o produto. Nesse caso, por tratar-se de uma sandália
masculina é esse público que se pretende atingir.
É importante reiterar que a mídia televisiva trabalha essencialmente com a cultura de
massa, ou seja, a maioria dos telespectadores, muitos dos quais utilizam a televisão como
único suporte de acesso à informações e entretenimento. Nesse contexto, a televisão é um
importante instrumento de formação de opinião e disseminação de ditames comportamentais.
Há muito o campo da publicidade investe seus esforços e grandes montantes financeiros nessa
mídia, essa é uma forma segura de popularizar e/ou lançar novos produtos no mercado.
Explora-se, dessa forma, a rede interdiscursiva que circula na sociedade e opera-se
com estratégias estilísticas e discursivas que objetivam promover, fundamentalmente, a
sensibilização do público para impulsioná-lo a adquirir produtos e, sobretudo, convencê-lo da
necessidade da aquisição desses produtos para ser mais feliz e, assim, ser aceito nas
formações ideológicas em que circula.
32
Há, todavia, um incessante movimento nos fios discursivos e imagéticos que circulam
na mídia, esse movimento permite rupturas no tecido da memória discursiva e uma
reconstrução contínua em que novos discursos aparecem e permitem (re)escrever novas
histórias. É assim que se explica a transformação de identificação efetivada pela empresa São
Paulo Alpargatas, que modificou radicalmente seu público alvo. As sandálias que nasceram
para as humildes camadas da população ganharam projeção nacional e tornaram-se sandálias
‘nobres’.
Figura 9: Comercial Havaianas com Reynaldo Gianecchini 12
Breve descrição imagética do comercial
Materialidade discursiva do comercial:
transcrição
O ator Reynaldo Gianecchini e um amigo
estão passeando por um shopping.
Gianecchini inicia o diálogo questionando
esse amigo se ele já havia reparado que
todas as propagandas das Havaianas exibem
uma moça bonita usando as sandálias e a
partir de então “rola” um papo. Nesse
instante, surge uma jovem bela que elogia
as sandálias de Gianecchini. Há, contudo,
na seqüência dos fatos uma quebra de
expectativa, pois a moça queria apenas
informações sobre a sandália para comprar
o modelo para o namorado. O comercial
encerra-se com uma espécie de moral em
que o amigo fala para Gianecchini que
Gianecchini: Cara, você já reparou que nos
comerciais havaianas tem sempre uma
gostosa que aparece do nada e usa as
havaianas para puxar assunto.
Amigo: É verdade!
Moça: Que legal essas havaianas! Onde
você achou essa cor?
Gianecchini: Por quê? A gatinha quer
comprar uma pra ela?
Moça: Não! Pro namorado dela.
12
Comercial Havaianas Disponível em: http://www.portaldapropaganda.com/comunicacao/2007/09/0036.
Acesso em 08 de Novembro de 2009, às 15:55h.
33
“quem quer ser muito esperto se dá mal”.
Amigo: Já reparou que sempre quem dá
uma de gostosão se dá mal no final.
Slogan: Havaianas, todo mundo usa!
A mudança de discurso publicitário ocorre, sobretudo, a partir de vultuosos
investimentos em todas as mídias e com a alteração do o slogan, que passa a ser “Havaianas.
Todo mundo usa.” Esse slogan, como apresentado no capítulo II, foi lançado em 1994. Para
popularizá-lo e mostrar ao grande público que “todo mundo usa” alguns artistas começaram a
fazer os comerciais das sandálias havaianas.
No comercial acima, por exemplo, o protagonista é o ator e galã Reynaldo
Gianecchini, que inicia a narrativa fazendo uma brincadeira sobre os comerciais das sandálias
havaianas com o intuito de reafirmá-los. A estratégia da utilização de atores conceituados para
a divulgação das sandálias atingiu amplamente seus objetivos, pois registramos, a partir de
então, em nossa memória que de fato “todo mundo usa” havaianas, inclusive Gianecchini.
A propaganda, como dito no parágrafo anterior, discorre sobre o próprio código, isto é,
utiliza-se do recurso da metalinguagem, Função metalinguística. Esse recurso é empregado
quando Gianecchini faz referência a comercias anteriores das sandálias havaianas, que devem
ser ativados na memória do telespectador, e em cujos enredos aparecem o flerte como
temática central, principalmente nas propagandas de sandálias masculinas. Essa temática é
reiterada constantemente para levar os homens a acreditarem que só terão sucesso com as
mulheres bonitas se usarem havaianas. O enunciado do amigo “É verdade” é trazido na
materialidade linguística para confirmar essa metalinguagem e reforçar a ideia de que homem
que usa havaianas chama a atenção das mulheres.
Os adjetivos “gostosa” e “gostosão”, ainda que utilizados com sentidos distintos,
expressam sentidos denotativos e refletem o uso coloquial da linguagem, que respectivamente
significam mulher com um corpo muito bonito dentro dos padrões de beleza impostos pela
mídia e, consequentemente, aceitos pelo público masculino; e homem que se julga perito em
conquistas e que seduz facilmente as mulheres.
Denota-se ainda na materialidade imagética um jogo de expressões fisionômicas que
se alternam entre os protagonistas, é esse jogo que acentua o clímax da narrativa, momento
em que Gianecchini imagina ser o início do flerte, e se desfaz no momento seguinte com a
quebra de expectativa dos personagens masculinos, pois há a irrupção de um novo sentido, a
recusa. O fracasso no flerte, todavia, não altera os sentidos projetados pelo slogan
34
“Havaianas. Todo mundo usa.”, pois o fato da “gostosa” ter recusado o jogo da sedução de
um galã de novela significa que as havaianas são mais importantes do que ele, são elas as
verdadeiras estrelas do comercial, e quem usá-las, mesmo homens comuns, podem
transformar-se em celebridades.
3.3 Análise de propaganda de meio eletrônico
A propaganda que apresentamos a seguir pode ser acessada no site denominado Izip –
Mídia Colorida (ver endereço na nota de rodapé), que traz como slogan Tudo sobre
Promoções – Marketing – Propaganda – Publicidade e Mídia!. Trata-se da divulgação de um
novo modelo de sandália Havaiana lançada para o público infanto-juvenil que foi batizado de
Kids Monsters.
A publicidade, nesse contexto, tem como público alvo a classe média e alta que tem
acesso à hipermídia. Os hipertextos veiculados por essa mídia são muito procurados
geralmente pelo público jovem, cada vez mais jovem, que gosta de informação,
entretenimento e interatividade. Esse público no cenário atual tem recebido especial atenção,
pois ele tem fortalecido a economia por exercer grande influência nos pais e familiares que
são levados a adquirir os desejosos produtos de consumo.
Figura 10: Havaianas Kids Monsters13
13
Propaganda Kids Monsters. Disponível em: http://www.izip.com.br/blog/havaianas-kids-monsters-e-kids-
star.html. Acesso em 27 de Setembro de 2009, às 21:38h.
35
A propaganda acima das sandálias havaianas kids, linha exclusiva para crianças da
empresa São Paulo Alpargatas, explora essencialmente a ludicidade e as fantasias do universo
infanto-juvenil. Objetiva levar crianças e pré-adolescentes a (re)viverem emoções e medos,
para tanto, constrói um cenário imagético “monstruoso”.
As sandálias integram esse cenário e apresentam o monstro principal desenhado no
solado. Pode-se enfatizar aqui que há total sintonia entre a materialidade discursiva e a
imagética, além disso, todas as estratégias e recursos empregados pelo autor/publicitário
remetem a interdiscursos e visam a resgatar memórias discursivas cristalizadas por narrativas
orais e ficcionais.
No plano imagético podemos destacar a função referencial, expressa pelo sentido
conotativo, que se destaca pelo retângulo em relevo, dentro do qual encontramos o cenário, e
pelas cortinas que aparecem próximas ao retângulo nas laterais e na parte superior. Esses dois
elementos possibilitam interpretações e resgates de memória distintos.
Dentre eles o efeito de olhar pela janela e ver expresso na escuridão um cemitério
sombrio, a noite de lua cheia, que pode remeter à memória da história do lobisomem, homem
que em noites de lua cheia se transforma em lobisomem, meio lobo meio homem, ao fundo
uma casa com luzes acessas, que nos faz lembrar das casas mal-assombradas de filmes de
terror muito apreciados pelo público infanto-juvenil.
Outro efeito possível de ser apreendido através das cortinas que enquadram o
imagético é o que simula um teatrinho de monstros, ou seja, a apresentação de um espetáculo,
isso lembra a criança das representações de histórias de fantoches. Reiteramos que, em ambos
os efeitos, as sandálias havaianas são apresentadas como o principal personagem do
espetáculo, colorida e com estampa de monstro. Recurso esse que pode ter sido enaltecido por
querer enfatizar o lançamento desse novo modelo que traz um título sugestivo às ilustrações
protagonizadas, Kids Monsters.
Quanto à materialidade discursiva ”Se tem um monstro embaixo da cama de seu filho?
Depende. Onde ele guarda as Havaianas?”, parece estar mais em consonância com o primeiro
efeito. Essa constatação se faz, fundamentalmente, por meio do substantivo “cama” que
remete ao espaço quarto e, consequentemente, ao mundo de fantasia que as crianças
conseguem criar/ver pela janela no universo externo ao quarto.
No enunciado temos ainda um novo interdiscurso, o que leva a lembrar da velha lenda,
contada por gerações para as crianças, para instigar-lhes o medo e fazê-las dormir, pois se
36
saíssem da cama poderiam encontrar um monstro debaixo dela. Aqui há uma inversão da
função referencial anterior, o sentido agora passa a ser denotativo, isto é, se as sandálias
havaianas estiverem debaixo da cama então literalmente haverá um monstro lá.
Percebemos assim que o interdiscurso (memória discursiva), juntamente com a
linguagem conativa e a linguagem referencial que se evidenciam em todas as propagandas,
são muito explorados e eficientes na elaboração de estratégias e recursos utilizados pelo
campo da publicidade no gênero propaganda porque envolvem o universo histórico-cultural
do consumidor, seja criança, seja adolescente, seja homem ou mulher, que atribuem, dessa
forma, uma valoração positiva ao produto que o leva à aceitação e ao desejo de aquisição.
37
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após enfatizarmos em nossas análises a interdiscursividade, o imagético, as funções
da linguagem, a intencionalidade com o público alvo, a ideologia e as principais marcas
linguístico-discursivas utilizadas nas propagandas das sandálias havaianas, podemos afirmar
que os objetivos deste trabalho de pesquisa, que elegiam, dentre seus propósitos, analisar o
interdiscurso nas propagandas das sandálias havaianas para compreender melhor a
materialidade discursiva e as estratégias persuasivas utilizadas no mundo da publicidade,
foram amplamente atingidos.
Ressaltamos que, a partir dos resultados de análises obtidos, constatamos que a
publicidade das sandálias havaianas é cuidadosamente bem elaborada, pois utiliza, dentre
outros, elementos da linguagem como o duplo sentido (conotativo e denotativo) para alterar
os sentidos e jogar com as possibilidades de interpretação, assim como exploram a
sensitividade e o estado de arte do leitor/consumidor.
Também percebemos que a memória discursiva, utilizada essencialmente como
recurso para despertar o sentimento de proximidade do público com o produto, e,
consequentemente, de aceitabilidade, é (re)construída continuamente a partir de várias
estratégias, dentre as quais destaca-se os slogans, (re)formulados de acordo com as
expectativas da empresa proprietária da marca. O que fez, por exemplo, com que o
consumidor substituísse com facilidade a imagem/identificação de sandálias de borracha por
havaianas, a marca.
Esses resultados também nos mostram que o campo da publicidade é muito explorado
na sociedade contemporânea brasileira e é responsável pelas atitudes do cidadão-consumidor.
Assim, é possível afirmar que o interdiscurso (memória discursiva) analisado nas propagandas
das sandálias havaianas, recurso imprescindível para a persuasão/manipulação, caminha junto
com o sucesso de mais de quatro décadas de publicidade bem elaborada, investimento este
que mantém a empresa São Paulo Alpargatas líder do mercado nacional do gênero e agora
expandindo com sucesso no mercado internacional.
As análises, assim, demonstram que a criatividade e a produtividade são
minuciosamente detalhadas em cada propaganda e elaboradas de acordo com cada público,
homens, mulheres e crianças, retratam também o contexto sócio-histórico-ideológico,
responsável pelo (re)criar de sentidos e pela mobilização das ações dos sujeitos, que são
impulsionados ao consumo.
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