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APLICANDO CONCEITOS DE
SUSTENTABILIDADE EM
INDICADORES DE DESEMPENHO
Sandra Naomi Morioka (POLI-USP)
sanmorioka@gmail.com
Marly Monteiro de Carvalho (POLI-USP)
marlymc@usp.br
A implantação de sustentabilidade no ambiente corporativo é um
desafio para empresas e para a academia. Uma forma de abordar essa
discussão é conciliar os conceitos de desenvolvimento sustentável em
um tema já bastante disseminado na literaatura, os indicadores de
desempenho. Nesse contexto, o objetivo do trabalho é discutir
indicadores de desempenho de projetos com foco nos três pilares da
sustentabilidade. A metodologia adotada foi a de estudo de caso
conduzido em uma empresa de tecnologia. Os resultados mostram que
essa definição de indicadores, bem como a coleta desses dados não
estão sendo conduzidas de forma sistematizada. Verificou-se ainda que
há dificuldade em discutir o interrelacionamento entre os indicadores,
considerando os tradeoffs entre os pilares econômicos, ecológicos e
sociais. Não obstante, verifica-se uma preocupação das empresas em
elevar o patamar na discussão da sustentabilidade, sendo que há
espaço para impulsionar contribuições da área acadêmica para apoiar
essa discussão
Palavras-chaves: indicadores de desempenho, desenvolvimento
sustentável
XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção
Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012.
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1. Introdução
O conceito básico de sustentabilidade tem sua origem no relatório elaborado pela Comissão
Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento publicado na Comissão de Brundtland
em 1987, que apresentou a seguinte proposta para o desenvolvimento sustentável dos países:
"satisfazer as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras
em satisfazer suas próprias necessidades" (CMMAD, 1987). Nesse contexto, Elkington
(1998) cunhou o termo triple bottom line, evidenciando a interdependência entre seus três
pilares: social, econômico e ambiental. Associando esses conceitos, o desenvolvimento
sustentável pode ser definido como sendo o interesse e as chances de desenvolvimento que
tenham como obrigação lidar com recursos ecológicos, sociais e econômicos, garantindo às
próximas gerações a oportunidade de satisfazer suas necessidades da mesma forma que as
gerações contemporâneas (por exemplo, BURGER, MAYER, 2003).
O engajamento de diversas áreas de conhecimento no tema sustentabilidade é de extrema
importância, já que os impactos tanto econômicos quanto socioambientais existem em
diversas atividades. Para as empresas lucrativas, sabe-se que o seu principal motivador é o
resultado financeiro, apurado baseado na diferença entre suas receitas e despesas. Porém, o
governo e a população têm exigido e valorizado cada vez mais dessas empresas soluções que
sejam sustentáveis, resultando em um desafio para o mundo corporativo em instituir
processos com a abordagem do tripple bottom line. Nesse contexto, a discussão de
indicadores de projetos sob a ótica da sustentabilidade, ou seja, considerando os três pilares da
sustentabilidade, vem como importante instrumento para direcionar os processos da empresa
para o desenvolvimento sustentável.
Nesse contexto, o objetivo do trabalho é discutir a adoção de indicadores de sustentabilidade
no contexto corporativo, evidenciando os desafios da sua implantação sistemática. Assim, o
trabalho pautou-se em um levantamento teórico que discute indicadores de desempenho que
considerem não somente aspectos financeiros, mas também sociais e ambientais. Baseado
nesse levantamento, o artigo se propõe também aplicar esses conceitos ao discutir um estudo
de caso único em uma empresa do setor de tecnologia de grande porte.
Esse artigo está estruturado em 6 seções. A seção 2 apresenta os principais conceitos
referentes ao desenvolvimento sustentável e aos indicadores de desempenho com um viés de
sustentabilidade. Após apresentar a metodologia na seção 3, o artigo segue com a
apresentação do estudo de caso conduzido na seção 4. Por fim, são conduzidas as discussões
(seção 5) e conclusões e limitações do trabalho (seção 6).
2. Síntese do quadro teórico
2.1. Desenvolvimento sustentável
O desenvolvimento sustentável está ligado à capacidade de se tomar decisões hoje, levando
em consideração as suas consequências de longo prazo tanto na esfera econômica, mas
também na social e ambiental (por exemplo, BURGER, MAYER, 2003). Assim, diversas
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áreas de conhecimento devem estar presentes nessa discussão complexa, que exige
conhecimento interdisciplinar técnico e gerencial.
Uma evidência de que a preocupação com o desenvolvimento sustentável já está de certa
forma presente nas empresas é a intensa disseminação de sistemas integrados de gestão
voltados para a padronização de processos representados pelas normas ISO 9001, ISO 14000,
OHSAS 18001 (JORGENSEN et al., 2005) e mais recentemente também pela ISO 26000.
Isso porque tratam, respectivamente, dos temas qualidade, meio ambiente, saúde e segurança
no trabalho e responsabilidade social corporativa. A sequência na qual as normas se
popularizaram pode ser vista como um indicativo quanto à evolução de prioridade do mundo
corporativo. Inicialmente, em 1987 criou-se a ISO 9001, com o foco principalmente no pilar
econômico do triple bottom line, já que está diretamente ligada à redução de custos de
qualidade do produto e de processos da empresa. Já no início da década de 1990, a ISO 14001
foi formulada com o objetivo de normatizar aspectos relacionados aos impactos ambientais de
uma determinada empresa, ou seja, está lidando com o pilar ecológico do tripé. Alguns anos
mais tarde, foi iniciada a discussão voltada para o pilar social com normas para o público
interno à empresa em 2005 (OHSAS 18001) e para a sociedade em geral, em 2010 (ISO
26000). Essa ordem de prioridades para as empresas parece razoável, já que inicia com uma
preocupação mais imediata de sobrevivência econômica, passando pela visão de impactos
quanto aos insumos consumidos e rejeitos produzidos, até chegar ao desafio de tomar
decisões baseadas também em colaboradores e na comunidade ao redor. As normas são uma
importante ferramenta de integração capaz de colocar em discussão nas empresas seus
processos e tarefas no ciclo de gestão (planejamento, execução, avaliação e ação), como
indicado por Jorgensen et al., 2006. Os autores acreditam que o sistema integrado serve
também para criar uma cultura de aprendizado, envolvimento de stakeholders e melhoria
contínua, fundamentais para o desenvolvimento sustentável em uma determinada empresa, ou
seja, no setor como um todo.
Um outro assunto que tem coerência com a discussão de desenvolvimento sustentável é o
conceito de Product-Service System (PPS). Tratando de uma forma particular de servitização,
a ideia básica desse modelo é a “desmaterialização” dos produtos, ou seja, reduzir o seu custo
por meio a introdução serviços agregados (BAINES et al,, 2007). Dessa forma, os autores
argumentam que as necessidades dos clientes podem ser atendidas e, ao mesmo tempo, os
impactos nocivos ao meio ambiente podem ser reduzidos por meio da redução de resíduos
físicos, considerando também o bem estar da sociedade como um todo. Assim, bens que até
então são tratados tradicionalmente como produtos físicos podem ser planejados e executados
como serviços para agregar valor à receita da empresa.
No setor na manufatura, a discussão da sustentabilidade vem evoluindo, tornando-se cada vez
mais sofisticada e complexa, conforme Araujo (2010). O autor verifica essa evolução,
passando pelos seguintes marcos:
- Conformidade: passo inicial dado durante a United Nations Conference on the Human
Environment em junho de 1972
- Produção mais limpa: criação do Centro de Produção Mais Limpa pela ONU em 1994
(organização para desenvolvimento industrial)
- Eco-eficiência: criação da estratégia de eco-eficiência pelo Conselho Empresarial par ao
Desenvolvimento Sustentável
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- Produção Sustentável: último estágio da evolução, resultado de uma abordagem mundial
para sustentabilidade fincado em novos modelos de negócio.
Já no âmbito dos impactos sociais, a Responsabilidade Social Corporativa (RSC) tem
ganhado visibilidade perante dirigentes e colaboradores (FEDATO, 2005). Sob uma
abordagem sociológica, Fischer (2004) trata da RSC como sendo os papéis e as atividades da
empresa que impactam relações humanas, considerando o contexto da cultura organizacional.
Nesse contexto, Melo Neto e Froes (1999) indica sete vetores, que podem ser classificados em
responsabilidade social:
- interna: investimentos nos funcionários, em seus dependentes e no ambiente de trabalho;
retorno aos acionistas;
- externa: apoio ao desenvolvimento da comunidade; preservação do meio ambiente; sinergia
com parceiros; satisfação de clientes e consumidores
- mista: transparência perante o público interno e externo.
Porter e Kramer (2006) trazem uma visão de que as empresas que estiverem realizando
iniciativas na área social não devem considerar esse desembolso como sendo simplesmente
custo para a empresa. Isso porque essas iniciativas podem ser vistas como oportunidade de
inovação e consequente ganho de competitividade.
2.2. Indicadores de desempenho
A tradução da saúde de uma determinada empresa em indicadores de desempenho é
fundamental para a sua perpetuidade. Isso porque, como definido por Neely (1998, p. 5-6),
um sistema de indicadores de desempenho "permite que decisões sejam tomadas e ações
sejam realizadas, pois quantifica a eficiência e efetividade de ações passadas por meio de
aquisição, junção, classificação, análise, interpretação e disseminação de dados apropriados".
Analisando diversos frameworks divulgados na literatura (como JOHNSON; KAPLAN,
1987; KEEGAN; EILER; JONES, 1989; FITZGERALD et al., 1991 e KAPLAN; NORTON,
1992), Kennerley e Neely (2002) discutem algumas características do sistema de indicadores
que podem ajudar as empresas a escolher adequadamente sua abordagem:
ser balanceado;
apresentar-se de forma sucinta e objetiva;
integrar uma visão multidimensional;
ser compreensivo, abordando todos os aspectos relevantes da empresa;
integrar tanto entre funções quanto entre níveis hierárquicos;
apresentar relação de causa e efeito entre os indicadores, permitindo desenhar cenários
futuros possíveis.
Uma forma de classificar os indicadores apresentada na literatura trata dos conceitos de
indicadores leading e lagging. Enquanto os indicadores leading (direcionadores) são capazes
de impactar no futuro de uma organização, os lagging (de resultado) exprimem a
consequência de uma determinada ação (KAPLAN e NORTON, 1996). Esse tipo de
classificação permite avaliar de forma crítica uma lista de indicadores disponíveis para certa
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empresa, verificando a interrelação causal entre indicadores, quando possível. Isso porque não
basta que a empresa seja capaz de definir uma lista de indicadores de desempenho
independentes entre si. A relação entre eles deve fazer sentido para que sejam capazes de
cumprir a função de apoio à tomada de decisão.
A escolha e construção de indicadores é fundamental para esse processo de tomada de
decisão. Nesse sentido, vale dizer que definir indicadores não é uma tarefa trivial, já que a
forma como uma determinada informação é mostrada pode acabar influenciando o tomador de
decisão. Nessa discussão Keeney (2005) evidencia algumas características mínimas exigidas
para um bom atributo ou indicador. As propriedades são:
Não ambíguo: relação causal entre os indicadores e suas consequências.
Abrangente: o indicador cobre uma quantidade razoável de valores possíveis
Direto: o indicador representa diretamente uma determinada consequência
Operacional: a informação sobre o indicador pode ser devidamente obtida ou estimada
Inteligível: o indicador pode ser facilmente entendido e comunicado.
Outra importante função dos indicadores é compor, juntamente a outros dados sobre as
empresas, relatórios para divulgação de informações sobre a empresa ao público interessado.
No campo da sustentabilidade, a Global Ressource Initiative (GRI) tem papel fundamental
nesse objetivo, já que essa iniciativa tem como missão prover um framework global, com
linguagem consistente e métricas (GRI, 2011). Nesse sentido, a organização realizou um
estudo bastante aprofundado sobre os indicadores que devem (ou podem) constar em um
relatório de sustentabilidade de uma determinada empresa. Com diferenciação entre níveis de
implantação do relatório (de A a C, sendo a versão C a mais simplificada), a empresa pode
optar por escolher e publicar uma série de indicadores a seu respeito. Esses indicadores estão
organizados em blocos: social, ambiental e econômico, conforme mostrado no Quadro 1.
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Quadro 1. Categorias dos indicadores propostos pelo GRI.
É razoável pensar na dificuldade de interrelacionamento entre esses indicadores quanto à
relação causa-e-efeito ou de influência positiva ou negativa. Assim, existe o desafio de
identificar e explicitar os trade offs entre indicadores pertencentes aos diversos pilares de
sustentabilidade. A publicação de Orlitzky et al (2003) verifica estudos quantitativos que
buscaram inferir a dependência entre desempenho socioambiental e desempenho financeiro da
empresa, resultando em uma correlação positiva, segundo os estudos de sua amostra. Os
autores chegam até a reduzir as importância da influência do Estado em novas
regulamentações voltadas para o pilar social e ambiental, já que, com o resultado financeiro
positivo, a própria empresa estaria interessada em ter tais normas a serem seguidas. Porém
essa correlação é bastante complexa, devendo ser observada de forma contingencial.
3. Metodologia de pesquisa
Conforme apresentado na seção introdutória, o objetivo do trabalho é discutir a adoção de
indicadores de voltados para os pilares do triple bottom line no contexto da implantação de
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sustentabilidade na empresa. Para isso, optou-se pela abordagem de estudo de caso
exploratório desenvolvido em uma única empresa, já que o assunto ainda está pouco
estruturado tanto na academia quanto nas empresas (FORZA, 2002). Assim o método de
entrevista semi-estruturada permite a exploração do assunto de forma mais abrangente e
flexível.
Os critérios de seleção do caso adotado analisaram o contexto da empresa de forma que fosse
reconhecida pela sua preocupação com sustentabilidade e tivesse em seu organograma uma
área destinada à sustentabilidade, além de haver disponibilidade para acesso a documentos e à
equipe interna por parte dos pesquisadores. Visto isso, foi escolhida uma empresa de
tecnologia de grande porte de origem alemã. As diretrizes para condução de estudo de caso
foram seguidas (VOSS et al., 2002), com dados obtidos por meia interpretação de
documentos internos, relatórios publicados e uma entrevista realizada concomitantemente
com a gerente da área de sustentabilidade, uma colaboradora dessa área e um gerente PMO
(Project Management Office). A presença deste último é justificada pelo forte direcionamento
para projetos fundamentado na realidade da empresa.
Além da escolha das empresas, foi estruturado um roteiro dos principais tópicos a serem
abordados na entrevista semi-estruturada. Foi priorizado como tema para discussão assuntos
como a relevância da sustentabilidade para a empresa e as ações tomadas nesse sentido, o
tratamento dos projetos tendo em vista os pilares de sustentabilidade e os próprios indicadores
utilizados. Para reduzir eventuais desencontros de entendimento, as entrevistas foram
gravadas e transcritas em documento eletrônico para envio aos entrevistados e validação de
conteúdo.
Como já indicado, a presente pesquisa utilizou também como fonte de informações
documentos disponibilizados pela empresa referentes à esfera tanto nacional quanto
internacional. Isso porque a estratégia da matriz e das filiais devem ser convergentes. Dessa
maneira, a análise dos dados obtidos foi realizada pela triangulação entre informações
provenientes das entrevistas, documentos e revisão bibliográfica sobre o assunto. O resultado
dessa discussão será apresentado a seguir.
4. Apresentação de resultados
4.1. Sustentabilidade na empresa
O estudo de caso foi conduzido em uma empresa de tecnologia de grande porte, engajada nas
áreas de automação industrial, energia, saúde e soluções para infraestrutura e cidades.
Fundada na Alemanha há mais de 150 anos, a empresa possui filais em diversos continentes,
sendo que a entrevista foi conduzida em sua filial de São Paulo. Sua estratégia está
intimamente ligada à inovação, buscando estar sempre atuante nas tendências globais, como
mudanças climáticas e aumento da população.
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Dada a sua privilegiada posição de mercado, a empresa tem consciência de sua capacidade de
influenciar o mercado e governos. Nesse contexto, a área de sustentabilidade vem sendo
estruturada e ganhando cada vez mais reconhecimento tanto interna quanto externamente. O
aumento da relevância do tema sustentabilidade culminou no início das atividades da área
formal de sustentabilidade na Alemanha em 2009. As diretrizes para a instituição da área no
Brasil começou em 2010, sendo que a área tem ganhado robustez e delineamento com o
passar do tempo.
No Brasil, inicialmente a área era composta por 20 pessoas que eventualmente foram
divididas em grupos menores, para facilitar o desenvolvimento do trabalho. Hoje a estrutura é
enxuta, sendo composta por duas colaboradoras e o Diretor de Estratégia e Sustentabilidade.
A principal função da área é a de governança corporativa, realizando o alinhamento dos
conceitos e práticas de sustentabilidade disseminadas nas áreas de negócio, bem como
consolidando informações para suporte à elaboração de relatórios para publicação. Além
disso, a área de sustentabilidade é responsável pela gestão daqueles stakeholders específicos
de sustentabilidade como por exemplo Ethos, CNI (Confederação Nacional da Indústria) e
FGV (GV-Ces). Com essas parcerias, a empresa tem contanto não somente com as próprias
organizações, mas também com as demais empresas que fazem parte dessas associações,
possibilitando a troca de informações e conhecimento.
A Área de Sustentabilidade estrutura as iniciativas de desenvolvimento sustentável em quatro
categorias:
Comunicação: foco construção de imagem externa de sustentabilidade;
Fornecedores: foco em avaliação, seleção e monitoramento do desempenho de
fornecedores;
Cidadania corporativa: foco em promoção de trabalhos voluntários;
Engajamento de colaboradores: foco nas iniciativas dos Green Teams.
O objetivo de estruturação de Green Teams espalhados pela empresa é promover a
participação daquelas pessoas que já têm pré-disposição e motivação para se envolver com o
assunto a montar grupos de trabalho para planejar e implementar ações de sustentabilidade
que tenham intersecção com suas tarefas diárias. Dessa forma, a empresa busca motivar as
pessoas, dando autonomia para levar adiante atividades que promovam a sustentabilidade,
bem como promover o trabalho em equipes multidisciplinares. Por exemplo, na fábrica em
Manaus, as pessoas se engajaram no tema ecoeficiência promovendo ações contínuas de
redução do consumo de energia e matéria prima no processo produtivo e nas instalações
fabris. Além disso, promovem-se palestras e reuniões de discussão para contribuir para o
conhecimento das pessoas e identificar pontos de melhoria.
De certa forma, essas iniciativas de sustentabilidade apontadas pela empresa sempre
estiveram presente no cotidiano da organização, já que sua cultura organizacional proporciona
condições para esse quadro. Porém, com a estruturação da Área de Sustentabilidade, a
empresa está sendo capaz de compilar e consolidas dados que estavam até então dispersos nas
diversas unidades de negócios da empresa.
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Quadro 2. Principais características da empresa de tecnologia estudada.
4.2. Indicadores de sustentabilidade
Os indicadores gerais de sustentabilidade da empresa estão sendo implementados em duas
ondas. A primeira é de início imediato e outra para o curto/médio prazo, com o objetivo final
de obter reconhecimento perante o mercado, construindo uma imagem de empresa
diferenciada em termos de sustentabilidade. Nesse contexto, a empresa sente dificuldade tanto
para definir os indicadores em si quanto para apurar dados razoáveis para essas métricas. A
empresa está coletando de forma sistemática, pela primeira vez, dados relativos aos impactos
socioambientais de suas atividades, ou seja, muitos desses dados não estão disponíveis de
forma adequada ou estão desestruturados. Além disso, dada a abrangência da empresa, há a
dificuldade de coleta e consolidação de todas as iniciativas que possam ser consideradas
iniciativas de sustentabilidade. A segunda onda, prevista para os próximos anos, deverá conter
indicadores mais adequados e precisos para avaliar a sustentabilidade na empresa, já que
poderá contar com lições aprendidas na primeira onda, bem como avanços acadêmicos.
Em paralelo à definição de indicadores para metas internas, a empresa utiliza também
indicadores com base dos relatórios GRI (nível C) para elaborar seus relatórios. Incorporados
ao relatório referente à saúde financeira da empresa desde 2010, determinados indicadores de
sustentabilidade do GRI complementam o relatório formal da organização perante a sociedade
(ver Quadro 3). Os indicadores propostos pelo GRI são úteis na padronização dos indicadores
divulgados pelas empresas dispersas no mercado, bem como contribuem diretamente no
processo de acúmulo de conhecimento e consequente aprendizagem e amadurecimento da
área de sustentabilidade.
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Categoria Código Descrição
EC2Implicações financeiras e outros riscos e oportunidades para as atividades da
organização devido a mudanças climáticas
EC3Cobertura das obrigações do plano de pensão de benefício oferecido pela
organização
EC7Procedimentos para contratação local e proporção de membros de alta gerência
recrutados na comunidade local em unidades operacionais importantes
EN21 Descarte total de água, por qualidade e destinação
EN22 Peso total de resíduos, por tipo e método de disposição
EN26Iniciativas para mitigar os impactos ambientais se produtos e serviços e a extensão
da redução desses impactos
LA1 Total de trabalhadores, por tipo de emprego, contrato de trabalho e região
LA4 Percentual de empregados abrangido por acordos de negociação coletiva
LA7Taxas de lesões, doenças ocupacionais, dias perdidos, absenteísmo e óbitos
relacionados ao trabalho por região
LA8
Programas de educação, treinamento, aconselhamento, prevenção e controle de
risco em andamento para dar assistência a empregados, seus familiares ou
membros da comunidade com relação a doenças graves
LA10Média de horas de treinamento por ano, por funcionário, discriminado por categoria
funcional
LA12Percentual de empregados que recebem regularmente análises de desempenho e
desenvolvimento de carreira
SO1Natureza, escopo e eficácia de quaisquer programas e práticas para avaliar e gerir os
impactos das operações nas comunidades, incluindo entrada, operação e saída
SO3Percentual de empregados treinados nas políticas e procedimentos anticorrupção
da organização
SO4 Medidas tomadas em resposta a casos de corrupção
PR1
Fases do ciclo de vida de produtos e serviços em que os impactos na saúde e
segurança são avaliados visando à melhoria, e o percentual de produtos e serviços
sujeitos a esse procedimento
PR3Tipo de informação sobre produtos e serviços exigida por procedimentos de
rotulagem, e o percentual de produtos e serviços sujeitos a tais exigências
PR5Práticas relacionadas à satisfação do cliente, incluindo resultados de pesquisa que
medem essa satisfação
Performance
econômica
Performance
ambiental
Práticas
trabalhistas
Sociedade
Responsabilidade
sobre produtos e
serviços
Quadro 3. Indicadores presentes do relatório baseado no GRI.
5. Discussão dos resultados
Dado que a empresa tem direcionamentos claros e formais da matriz da Alemanha de avançar
na implantações de direcionamentos de desenvolvimento sustentável, podem ser notadas
evidências concretas de que iniciativas nesse sentido estão sendo conduzidas. Uma delas é a
introdução de indicadores de sustentabilidade no seu relatório anual desde 2010. Os
indicadores do GRI usados pelo estudo de caso estão, em número, aproximadamente
balanceados. Isso porque, com exceção da categoria de "Direitos Humanos", cada categoria
está representada por pelo menos três indicadores. O relatório teve então a seguinte
distribuição:
Performance econômica: 3 indicadores
Performance ambiental: 3 indicadores
Práticas trabalhistas: 6 indicadores
Sociedade: 3 indicadores
Responsabilidade sobre produtos e serviços: 3 indicadores
Vale ressaltar que esses indicadores usados na empresa podem de fato oferecer um panorama
geral do cenário da organização, buscando avaliar aspectos relacionados aos pilares do triple
bottom line. Porém, é possível observar também que esses indicadores não são exaustivos, já
que a identificação de todos os indicadores necessários é uma tarefa bastante complexa tanto
para a empresa quanto para academia. Além disso, no relatório em que esses indicadores
foram publicados não há a discussão da interligação entre o desempenho de cada um deles
para evidenciar a complexa relação de trade-off sob a qual estão submetidos.
Apesar dos direcionamento de indicadores do GRI serem de grande utilidade, a empresa
busca também desenvolver seus próprios indicadores para garantir sua aderência às
prioridades e à realidade da empresa. A organização enfrenta a dificuldade, porém, de avançar
na discussão de definição de indicadores adequados, que representem de forma razoável a
realidade do negócio. Além disso, há o desafio da coleta dos dados, já que eles estão dispersos
em diversas áreas de negócio e nos variados projetos.
6. Conclusões
A discussão sobre indicadores de desempenho já vem sendo bastante discutido pela literatura
(como por exemplo NEELY, 1998; KAPLAN; NORTON, 1992; KENNERLY e NEELY,
2002). Porém, essa discussão tem foco principal na saúde financeira da empresa, já que esse
parâmetro é de grande importância para fundamentar a tomada de decisão e garantir a
perpetuidade da organização.
Nesse sentido, a preocupação com desenvolvimento sustentável de uma organização vem
sendo discutida no sentido de melhorar o desempenho da empresa, considerando não somente
seus resultados financeiros, como também os impactos socioambientais de seus produtos e
processos. Nesse contexto, o estudo da empresa discutida neste artigo teve foco principal
identificar os indicadores de desempenho monitorados pela organização que estejam
alinhados ao desenvolvimento sustentável.
Vale ressaltar que a implantação de uma série de indicadores de sustentabilidade não torna a
empresa uma organização com desenvolvimento sustentável. O mesmo vale para o fato de
que mesmo que uma empresa não possua indicadores de desempenho de sustentabilidade não
significa automaticamente que ela não seja sustentável. Isso porque iniciativas voltadas a
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impactos socioambientais podem estar presentes na empresa, mesmo que não exista
formalmente uma área de sustentabilidade. A relevância, porém, desses indicadores está na
ideia de que ao monitorar de forma sistemática determinados impactos que antes não eram
evidenciados, a organização passa a compilar dados que servirão como base para propor
melhorias de processos e tomar decisões mais alinhadas ao desenvolvimento sustentável.
Apesar da limitação da particularidade do caso único, que dificulta a generalização dos
resultados, pode-se concluir que a existência de sugestões de indicadores não é suficiente para
monitorar o desenvolvimento sustentável de uma empresa. Isso porque o tema é bastante
complexo, exigindo uma análise cruzada, focada nos tradeoffs entre esses indicadores. A
visão complexa da interrelação entre indicadores de desempenho voltados para
sustentabilidade é um tema bastante complexo, podendo ser considerado como potencial
lacuna de conhecimento para próximos estudos.
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