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AS DIFERENÇAS CULTURAIS NO CONTEXTO ESCOLAR E A
ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO
Autora: Persídia Pereira1
Orientadora: Maria Antonia de Souza2
Resumo
Devido à expansão das cidades e o crescimento demográfico surgem as vilas e bairros. Com a obrigatoriedade da educação para todos houve o aumento da população escolar, surgindo a necessidade da construção de Grupos Escolares em bairros, vilas e no centro da cidade, o Ginásio, hoje Colégio. Esse fenômeno acarreta a entrada de alunos no Ensino Médio provenientes de vilas e bairros, trazendo para a escola a riqueza de diversidade sociocultural, uma riqueza de ideias, comportamentos, e diversidade. O principal objetivo deste trabalho é demonstrar uma ação realizada na escola com o intuito de acolher os alunos para que esses ao chegarem ao Colégio sintam-se inseridos e obtenham sucesso nos estudos. Buscou-se, portanto, a inserção dos alunos no ambiente social escolar para que ocorra uma real interação entre eles e desta forma alcancem seus objetivos. A metodologia utilizada teve início com o levantamento da procedência dos alunos através da ficha de matrícula, seguida de entrevistas e conversas informais com professores e alunos. Tratou-se do fazer uso das técnicas da pesquisa qualitativa, com o intuito de revelar as diferenças culturais na escola e o como os professores e coordenadores pedagógicos pensam tal realidade. Concluiu-se ao final das atividades realizadas com os alunos que, se a escola é um espaço de socialização, é necessário estimular ao máximo a convivência e o respeito às diferenças existentes em seu interior. Palavras-chave: cultura; diferenças; escola pública; jovens.
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo busca apresentar uma organização de
acontecimentos para que se possa perceber o andamento e evolução dos
trabalhos realizados até então e posteriormente sua organização para
1 Pedagoga no Colégio Estadual Regente Feijó – Ensino Médio e Profissional. Professora do Curso de
Formação de Docente no Instituto Estadual de Educação Professor Cesar Prieto Martinez – Ensino Fundamental, Médio, Profissional e Normal, ambos na cidade de Ponta Grossa, Paraná. 2 Professora do Curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Ponta Grossa. Professora do PPGED –
Mestrado e Doutorado em Educação – da Universidade Tuiuti do Paraná.
enfrentamento e amenização, quiçá solução, das dificuldades encontradas por
alunos oriundos dos mais diversos locais da cidade e das mais variadas
diferenças econômica, social, étnica, cultural e estética. Num primeiro
momento, será desenvolvido um breve panorama conceitual. Na sequencia
será apresentada a descrição dos dados obtidos no trabalho de campo
realizado com trinta e três (33) alunos da 1ª série da turma “F”. O terceiro e
último momento, traz a análise dos resultados, com apontamentos dos
principais aspectos que indicam possibilidades de mudanças na realidade
escolar.
As diferenças culturais existem dentro da sociedade ao longo da
história, hoje se manifestam dentro do ambiente escolar. Essas manifestações
desencadeiam dificuldades na integração do aluno, o que ocasionam
problemas de aprendizagem.
2. SOBRE AS DIFERENÇAS CULTURAIS
Os alunos trazem para dentro da escola suas diferentes histórias
pessoais que se conflitam entre si. A escola passa a ser o palco de disputas e
auto-afirmações que, muitas vezes, não são compreendidas pelos educadores
diante de tantos afazeres que lhes são solicitados, sejam eles no campo
pedagógico ou no administrativo.
Segundo Bueno (2001, p. 105)
Se, em determinados momentos históricos, a escola se constituiu no locus privilegiado de acesso aos bens culturais produzidos e valorizados pela humanidade, já que outros espaços sociais e comunitários (como a “família” ou a “vizinhança”) contribuíam para a formação dos sujeitos, os processos de urbanização parecem ter confinado à escola, cada vez mais, a função de formação dos sujeitos, o que a transformou em espaço social privilegiado de convivência e em ponto de referência fundamental para a constituição das identidades de seus alunos.
Nessa perspectiva o Colégio Estadual Regente Feijó, Ensino Médio e
Profissional, localizado no centro da cidade de Ponta Grossa, no Estado do
Paraná, recebe alunos de quase todos os dezessete bairros que compõem a
cidade (17 zonas ou regiões). Esses são oriundos de diversas localidades, com
históricos de vida, muitas vezes, completamente diferentes, seja econômica,
social, cultural, estética ou étnica trazendo para o ambiente escolar uma
riqueza incomparável, conforme escreve Bueno (2001, p.106):
Com relação ao alunado, a escola como espaço de convivência social, se torna um centro de referência pessoal que marca os sujeitos que por ali passam, pelo simples fato de estar nessa e não em qualquer outra, fruto de traços que a identificam, a tornam única: as oportunidades de convívio, as atividades das quais participam, as formas pelas quais “vivem” o cotidiano escolar.
Esse novo momento de convivência com outros indivíduos, longe dos
pais e do seu habitat natural, a Escola da Vila “X”, é muito desafiador, é o
momento em que irão colocar em prática vivencias e experiências adquiridas
até então sobre relacionamento, convivência, solidariedade, tolerância,
respeito, responsabilidade e autonomia. Os alunos se encontram num
momento desafiador, onde a interação com o meio a socialização e a
assimilação de conteúdos passa a ser uma constante em suas vidas. Muitos
reconhecem que as diferenças entre os alunos existem, mas, essas diferenças
só vêm somar para uma convivência rica de experiência o que fica muito claro
quando o aluno “2” relata:
(...) o Colégio é um lugar que tem muitas pessoas diferentes, há muita diferença entre os alunos. A escola é a chave para o futuro, um lugar que você faz muitos amigos, faz amizade com os professores e leva para toda a vida. (aluno 2)
A superação desse período pode ser conquistada com o envolvimento,
dedicação e acolhida de todas as pessoas que fazem parte da escola, onde os
adolescentes, e principalmente os pais, tem em sue imaginário a escola como
porto seguro, e Alarcão (2001, p. 10) argumenta:
Essa reflexão é importante para nós, os educadores, já que temos uma responsabilidade acrescida na compreensão do presente e na preparação do futuro. Compete-nos interpretar na atualidade os sinais emergentes do porvir para o qual estamos preparando as nossas crianças e os nossos jovens cuja formação a sociedade, em parte, quis confiar-nos.
Quais outros espaços e momentos teriam os adolescentes para refletir
sobre suas angústias pessoais, medos, anseios, desejos, esperanças e
realizações? A escola passa a ser um dos locais mais apropriados para isso,
pois é nela que os adolescentes contam com seus pares que, bem ou mal, pelo
menos os escuta e “aconselham”, os professores, pessoas mais experientes,
estudadas e com condições de dar uma orientação, muitas vezes conduzir os
conteúdos no sentido de proporcionar aos alunos uma compreensão dos fatos
para esse ou aquele desfecho. É nesse sentido que Ribeiro (2006, p.55)
procura nos mostrar a necessidade de que:
Os profissionais da educação têm a obrigação não só de conhecer os mecanismos da dominação cultural, econômica, social e política, ampliando seus conhecimentos antropológicos, mas também perceber as diferenças étnico-culturais sobre essa realidade cruel e desumana.
Também Oliveira (2001, p.3 e 4) destaca que:
A escola é o espaço onde se encontra a maior diversidade cultural e também é o local mais discriminador. Tanto é assim que existem escolas para ricos e pobres, de boa e má qualidade, respectivamente. Por isso trabalhar as diferenças é um desafio para o professor, por ele ser o mediador do conhecimento, ou melhor, um facilitador do processo ensino- aprendizagem. A escola em que ele foi formado e na qual trabalha é reprodutora do conhecimento da classe dominante, classe esta, que dita as regras e determina o que deve ser transmitido aos alunos. Mas, se o professor for detentor de um saber crítico, poderá questionar esses valores e saberá extrair desse conhecimento o que ele tem de valor universal.
Ao chegar a um ambiente diferente de sua realidade econômica, social,
psicológica, intelectual, física e estética esse aluno se depara com algumas
dificuldades de relacionamento, de comportamento e de conhecimento
conforme descreve Cupolillo e Freitas (2007, p. 383).
(...), a escola pública passa a receber alto contingente de alunos e se depara com a questão da diferença: a clientela predominante não é mais a que dispunha de acesso e valorizava, por sua condição social de classe, aspectos do conhecimento formal e da cultura dominante (...). Dessa diferença, emergem conflitos no ensino-aprendizagem originados pela discrepância no atendimento às expectativas da escola. Acostumada ao “aluno ideal”, a instituição educativa se depara com alunos reais em suas diferenças, com suas marcas de identidade individuais e de classe social.
Ainda, segundo Dayrell (1996, p. 15):
A sala de aula também é um espaço de encontro, mas com características próprias. É a convivência rotineira de pessoas com trajetórias, culturas, interesses diferentes, que passam a dividir um mesmo território, pelo menos por um ano. Sendo assim, formam-se subgrupos, por afinidades, interesses comuns, etc. (...) A ocupação dos territórios, muitas vezes, coincide com os comportamentos dos grupos: a turma da bagunça tradicionalmente ocupa o fundo da sala, tornando-se a "turma de trás", os CDF ocupam as cadeiras da frente, é a "turma do gargarejo". Com as conversas e brincadeiras ocorrendo preferencialmente no interior de cada um deles, cada grupo tem regras e valores próprios. Ao mesmo tempo, há vários alunos "soltos", que parecem não se ligar a nenhum dos grupos, ou porque não se identificam, ou porque, de alguma forma, são excluídos.
O aluno que chega a um ambiente diferente da sua realidade pode
tornar-se refém de integrantes do novo grupo. Alguns utilizam sua autoridade,
segundo suas intenções e necessidades de comando sobre o grupo assumindo
a liderança por pressão ou coação.
Por vezes os alunos desprovidos de malícia se deixam envolver,
cooptar, por aqueles que têm uma estratégia já organizada de comando, de
dominação, dentre elas estão as coações, as agressões físicas, verbais, morais
e chantagens.
O aluno tem poucas opções, se “enturmar”, e entrar na roda viva, ou se
anular, se esconder, o que vai levá-lo ao desestímulo, ao medo, ao
desinteresse, a depressão, a desistência, a repetência e a evasão.
Diante dessa situação o aluno torna-se um indivíduo “desprovido de
propriedade”, ou seja, a partir do momento em que se deixa envolver por
imposições de terceiros ele perde suas características intelectuais, culturais,
entre outras (MCLAREN, 2001).
É importante dizer que os alunos necessitam de atenção especial por
parte dos professores e dos pedagogos. Dos professores por estar mais tempo
com o aluno em sala de aula, assim conhecendo melhor o comportamento
individual e da turma. Dos pedagogos para que esses possam fazer os devidos
encaminhamentos e intervenções no âmbito do planejamento pedagógico e
promover a socialização, a ambientação dos novos alunos, vindos dos mais
diferentes bairros e vilas, visto que a maioria procede de escolas do bairro
onde, muitas vezes nasceram e se criaram.
Diante dessa realidade surge a pergunta “a organização do trabalho
pedagógico atende às necessidades decorrentes da dinâmica sociocultural”? O
planejamento pedagógico contempla a diversidade sociocultural presente na
escola?
3 APLICAÇÃO DO PROJETO
Durante o segundo semestre do ano letivo de 2011, estávamos
participando dos estudos nas IES. Algumas dificuldades foram encontradas
visto que os alunos já estavam instalados e adaptados ao Colégio. No turno da
tarde o Colégio contava com vinte e quatro turmas ao todo, sendo que na
primeira série do Ensino Médio havia quatorze (14) turmas com quatrocentos e
vinte e seis (426) alunos, quatro (4) turmas de primeira série do Curso de
Secretariado Integrado com cento e trinta e sete (137) alunos, três (3) turmas
de 2ª série do Curso de Secretariado integrado com cento e nove (109) alunos,
duas (2) turmas de 3ª série do Curso de Secretariado integrado com cinqüenta
e dois (52) alunos e uma (1) turma de 4ª série do Curso de Secretariado
integrado com quarenta e um (41) alunos; perfazendo um total de vinte e
quatro (24) turmas, setecentos e sessenta e cinco (765) alunos, somente no
turno da tarde. Nesse contexto, foi escolhida a 1ª série, turma “F”, composta
por trinta e três (33) alunos para ser aplicado o projeto.
Com o auxílio de um banner foi apresentado aos alunos os objetivos e
a justificativa do projeto. Um dos pontos que precisava ficar claro a eles era a
riqueza que traziam para o interior do Colégio, visto que existem alunos das
mais variadas regiões da cidade de Ponta Grossa.
Com o auxílio de um mapa foi apresentado aos alunos a cidade
dividida por bairros (regiões), num total de dezessete (17), sendo que alguns
deles são maiores que muitos municípios do estado, seja em população, em
desenvolvimento econômico, social ou político. Com esse material os alunos
Figura 1: Mapa dos bairros de Ponta Grossa.
Fonte: HTTP://geo.pg.pr.gov.br/webgis/map.phtml
desenvolveram a primeira de uma série de atividades. O principal objetivo
dessa atividade era coletar informações referentes a localidade de moradia dos
mesmos. Cada aluno escreveria um pequeno texto relatando, seu nome, onde
mora bairro ou vila, com quem mora, quanto tempo mora no local, quais os
pontos positivos e negativos que possui o local de moradia.
No levantamento realizado, após os relatos dos alunos temos como
exemplo a região da chapada que é composta pela: Vila Real – Vila Borato –
Portal do Norte – Núcleo Santa Luzia – Jardim Vitória – Parque do Café -
Jardim Estrela do Norte – Jardim Manacas – Jardim Três Rios – Parque
Bonsucesso I e II – Vila Congonhas – Jardim Bela Vista – Jardim Sabará. Dos
seis alunos que moram nessa região, a maioria nasceu na Vila ou vive há muito
tempo com seus pais e irmãos na localidade.
Essa região tem como ponto de destaque o Rancho Degraf (antiga
fazenda que, também, deu origem a região) – Subestação da Copel Sabará –
Unidade de Saúde (em quatro das vilas) - Metalúrgica Schiffer S/A
Implementos Rodoviários – TW Avestruz (criadouro) – Parque Aquático
Monteiro – Banco do Brasil – Supermercados – Igreja São Pedro – Escola
Municipal ( em quatro das vilas) - Colégio Estadual Padre Carlos Zelesni –
Escola Estadual Professora Sirley Jagas - CEMEI (em quatro das vilas) –
Hotéis – Cartório de Registro de Imóveis - Auto Peças – Revenda de
Caminhões, etc.
Os pontos positivos apontados pelos alunos foram: a calmaria de
algumas Vilas, as facilidades como, Posto de Saúde, Escolas, Creches em
algumas Vilas e outros serviços. Já os pontos negativos foram: falta de
policiamento, assaltos, droga, roubos e brigas. Dos seis alunos que moram
nessa região, a maioria nasceu na Vila ou vive há muito tempo com seus pais e
irmãos.
A maioria dos moradores das várias vilas que compõem a região ou
bairro, principalmente as mais antigas, é de descendentes dos imigrantes
europeus ou dos tropeiros, que colonizaram a região e a cidade. Também faz
parte dessa colonização, pessoas oriundas de outras regiões tanto do estado
como de outros lugares do Brasil. Na região, denominada de Chapada, uma
das maiores da cidade, encontra-se a mais variada profissão de fé dos
moradores. Quase todas as vilas contam com paróquias, Igrejas católicas e
templos não católicos. No que se refere ao lazer a região conta com um grande
parque aquático e um pesque e pague. A representação política na região é
exercida com a organização dos moradores através das Associações de
Moradores, que quase todas as vilas possuem.
No segundo encontro, considerando que seria importante o aluno
conhecer como estava organizado o Colégio em sua estrutura, como estavam
distribuídos os turnos, quem é o Diretor Geral e quem eram os diretores
auxiliares, as Pedagogas do Colégio, a quantidade de turmas e alunos, a
localização do Colégio no mapa da cidade e o local de moradia de cada um dos
alunos, nas suas respectivas regiões, foi realizada uma atividade explicativa.
O objetivo dessa atividade era para que o aluno tivesse clara a
importância de estar ali, naquele Colégio, naquele ano letivo; sentir-se inserido e
parte dessa estrutura, como alguém que poderia estar em outro lugar, mas
naquele momento estava no Colégio Estadual Regente Feijó e não em outro
Colégio. Também, levá-lo a compreender que agora ele faz parte de um novo
grupo social mais amplo, visto que na sala de aula e no pátio há indivíduos de
várias partes da cidade, com bagagem sócio cultural as mais variadas. Não é,
mais, como quando ele estava na Escola da Vila, convivendo com os colegas do
bairro, quando muito com colegas de bairros vizinhos. O grupo social ao qual ele
está inserido nessa etapa de sua vida, vai se alargar e esse alargamento trás a
possibilidade de socializar suas idéias e conhecimentos, adquiridos até então, e
receber de seus pares conhecimentos e ideais, vivencias as mais variadas, cuja
riqueza é valiosa.
Foi falando sobre a importância das pessoas acolherem umas as outras
ao chegarem a um ambiente novo, desconhecido, considerando que são de
diferentes lugares, mas que trazem consigo muitas coisas interessantes e
importantes, que a aluna “1” muito bem relatou:
(...) a dinâmica de hoje serviu para nos alertar de que nem sempre é bom você deixar as pessoas de lado, “você” agindo assim estará excluindo você próprio, de descobertas, até mesmo do conhecimento, por isso devemos pensar no próximo e em nós mesmos. (aluna 1).
Diante dessa diversidade que ora freqüenta o Colégio, composta de
pessoas que moram em vilas distantes, trabalham no comércio e estuda no
Colégio, seja no período diurno ou noturno. Diante dessa nova perspectiva
alguns alunos se deslumbram com as facilidades e perdições ofertadas pela
adjacência do Colégio tais como: Shopping, calçadão, Parque Ambiental, Pátio
da Estação, Praças, Galerias de Edifícios, Lanchonetes, Lojas e
Supermercados. Os alunos que não têm em mente estudar fazem tudo na
escola, menos o que deveriam que é estudar. Conforme relato da aluna “3” ao
escrever:
(...) eu acho que cada um tem seu jeito e cinqüenta por cento dos alunos vem pra aula e não entram no Colégio por influência dos amigos, namorado (a), saem, gazeiam, fumam e deixam de entrar para a escola e daí chega na metade do ano daí vê que ta reprovado daí se (...) pra estuda. Muitas vezes até entram pra escola mais sem fazer a tarefa ou o trabalho, tem vez que tem prova e tira 0,5. Isso é um relaxo, depois quem se (...) é a mãe, o pai ou responsável. Nessa idade muitos alunos já têm namorado (a) e tem vez que saem gazear pra vê o namorado (a). Acho que eles não pensam o que é o futuro. O futuro é a escola é terminando os estudos pra ter um emprego bom e assim um futuro bom. (aluno 3)
Essas análises realizadas pelos alunos, são provenientes da leitura
que fizemos do texto intitulado “Porta de Colégio” (SANT´ANNA, 1999, p. 11-3,
Apud OLIVEIRA, 2004, p. 228-229). Após a leitura sugeri que se colocassem
no lugar do autor e descrevesse a visão que tinha de seu próprio Colégio, dos
colegas e concluísse descrevendo quem seria e como se sentia nesse
contexto. A análise que fariam dava-lhes a possibilidade de interpretar uma
situação que eles próprios vivem, mas com olhos de observador e fariam seus
relatos dando a impressão sobre os fatos presenciados por eles.
Ao iniciarem a leitura percebi que alguns identificavam situações
vividas no dia a dia e ao longo da carreira estudantil. Como bom analista e
observador o aluno “1” descreve o seguinte:
Na frente do colégio, na praça, sempre tem uns grupinhos. Tem o grupo dos descolados, dos fumantes, dos jogadores, dos alcoólatras, dos namorados. Sempre tem alguém que fica agarrado com o namorado, alguma que está grávida, as
patricinhas que tem o mundo de princesa, onde só as coisas delas são melhores e tem também as pessoas que não querem se enturmar, que ficam só na deles. Tem pessoas que conversam com todo mundo. (aluno 1 ).
Outra aluna faz uma análise, um tanto quanto interessante, quando
começa a descrever as situações antes da entrada do Colégio, o estar na
praça aguardando o horário de entrada e também os amigos e os (as)
namorados (as). Passeia seu olhar atento sobre a entrada, momento em que
os alunos não querem entrar, querem ficar beijando, conversando, reunidos
sem nenhum compromisso. Os que entram exibem seus artefatos de luxo, de
grife, fone de ouvido, celular, mochilas, tênis, óculos de sol, etc.. Já nos
corredores tanto as meninas como os meninos apresentam suas armas de
sedução, livres dos olhares dos outros meninos que muitas vezes não são
alunos, mas com o intuído de “caçar” ou mesmo levar a namorada para mostrar
aos demais meninos que aquela menina tem “dono”, atitude que afugenta, no
momento, os mais tímidos e desprevenidos, principalmente por estar em
terreno perigoso (a praça), já em território seguro (pátio do Colégio) ficam mais
animados, e nesse momento meninos e meninas começam o jogo de sedução
e interesse, que é normal entre os jovens, muitas vezes rende briga na saída
do Colégio. No final do dia, sempre tem um batalhão de meninos e meninas
aguardando a tão desejada e esperada saída, momento que fica bem descrito
e explicado pela aluna “4”.
Na saída é aquele alvoroço, os olhares de sedução, os beijos de namorados de matar a saudade da tarde inteira, meninos querendo brigar, meninas querendo seduzir com suas roupas coladas, mais não imaginam que estão se desvalorizando. Eu sou aquela amiga que nas horas boas e ruins estou junto, amiga dos populares e dos não-populares, mais odiada por alguns. Não gosto de confusão mais não saio de cabeça baixa. Sou às vezes durona, mas quando a dor bate ai nem me reconheço. ( aluno 4 )
As características de sala de aula, propriamente dita, não são muito
diferentes. Os alunos que residem na mesma localidade estão sempre
próximos uns dos outros. Na hora de formar grupos de estudos ou realizar
trabalhos eles se organizam de modo que fiquem sempre juntos. Alguns, mais
espertos, preferem formar grupo com meninas ou meninos que são de outras
localidades para puxar assunto, amizade, paquerar, garantir sua popularidade,
é o balé da conquista, da sedução.
Quando desenvolvemos uma atividade denominada “dinâmica da
solidariedade e companheirismo”, os alunos ficavam a vontade circulando pelo
espaço ao som de palmas ritmadas. Ao ouvir o comando, de um número,
deveriam reunir-se conforme o solicitado. Exemplo: Dois, eles deveriam formar
pares; cinco, eles deveriam formar grupos com cinco alunos, e assim
sucessivamente até restar um único grupo.
Os alunos que não conseguiam formar os grupos, sobravam, saiam da
brincadeira. Assim foi realizada a brincadeira até que restou somente um grupo
de pessoas e os demais ficaram de fora da brincadeira. Essa dinâmica é uma
variação da “dança das cadeiras” ou “Roda Cutia”.
Terminada a dinâmica, os alunos sentaram em circulo e foram realizar
movimentos sincronizados para que percebessem que esse movimento só era
possível por estarem em sintonia, por estarem juntos e pensando no colega do
lado, ora da direita, ora da esquerda. Falaram sobre a sensação de não
conseguirem entrar para formar o grupo e ter que ficar de fora. Qual foi a
sensação de alguns correrem para pegar um e não outro para fazer parte do
grupo. Qual a sensação de ser procurado por alguns só para completar o grupo
para não perder a formação no momento, e quando em outro momento, que
eram menos componentes esses mesmos alunos deixava de procurá-lo.
Após a realização da dinâmica fomos para a sala de aula, onde os
alunos iria por escrito concluir as ações realizadas. A aluna “2” concluiu a
dinâmica dizendo:
Eu penso que quando uma pessoa é aceita só porque as outras pessoas precisam dela e fingem ser amigas só porque precisam e quando não precisam fingem que não conhece, não olham na cara para não cumprimentá-la e ficam falando mal dela, ficam dando risada da cara dela só porque é tímida e é daquele jeito.
A aluna “2” continuando suas anotações descreve uma situação que é
muito comum entre os alunos. Ao perceberem que outro aluno é tímido ou
possui um jeito diferente de conversar, rir, arrumar os cabelos, andar, ou
mesmo por ser novo no grupo, esse passa a ser “incomodado” por alguns, pois
é visto como diferente. Esse diferente pode ser positivo quando acrescenta
para os curiosos conhecer outra forma de ser, de fazer as mesmas coisas, e a
pessoa em questão não se sente constrangida, mas quando começa a
incomodar e causar transtorno para o aluno “diferente”, esse comportamento
passa a ser negativo (caracteriza Bullying). Com relação a estética a aluna “2”
ainda concluiu:
Mas cada pessoa tem seu jeito de ser e de viver a vida, cada pessoa é igual a outra pessoa não importa se a outra pessoa é mais bonita do que a outra o que importa é o caráter dela e não a beleza dela se aquela pessoa é daquele jeito não precisa excluir ela de ser sua amiga (aluna “2”).
Foi ressaltada a importância das pessoas acolherem as que chegam a
um ambiente novo, desconhecido, pois, essas pessoas trazem consigo muitas
coisas interessantes e importantes. Por coincidência, havia uma aluna recém
chegada de outro colégio da cidade, ela estava meio ressabiada, pois não
conhecia ninguém, mas como todo adolescente, foi se enturmando e os outros
alunos se mostravam muito receptivos com relação a ela. Nas atividades que
realizamos, ela participou normalmente e relatou: Adoro minhas amigas e
colegas do meu antigo Colégio. Mas tenho certeza que logo farei amizade
neste novo Colégio.
O aluno “4” ao analisar a movimentação de sala de aula argumenta:
(...) somos diferentes das pessoas que convivemos no nosso dia a dia, que umas pessoas são ignoradas outras são aceita e a escola está aqui para ajudar que essas pessoas sejam um grupo que ajude um ao outro.
A partir dessa análise feita pelo aluno “4”, Dayrell (1996, p. 17)
argumenta que:
Vista por esse ângulo, a escola se torna um espaço de encontro entre iguais, possibilitando a convivência com a diferença, de uma forma qualitativamente distinta da família e, principalmente, do trabalho. Possibilita lidar com a
subjetividade, havendo oportunidade para os alunos falarem de si, trocarem idéias, sentimentos. Potencialmente, permite a aprendizagem de viver em grupo, lidar com a diferença, com o conflito.
Após os trabalhos, os alunos se sentiram mais próximos uns dos
outros. Nos primeiros dias sugeri que se agrupassem em pares, os que já
estavam próximos. Alguns alunos argumentaram que gostaria de sentar com
seus colegas, que não conheciam muito bem aquela pessoa que estava ao seu
lado.
Argumentei que devemos conhecer o grupo como um todo, que as
atividades são coletivas e não individualizadas. Num primeiro momento
aceitaram sentar-se com o “desconhecido” para fazer os trabalhos.
Após essa dinâmica todos concordam que têm que trabalhar com todos
os elementos da sala, que a troca de experiências é essencial para o bom
relacionamento, a aprendizagem, a tolerância, o conhecimento, o que ficou
bem específico para a aluna “5”, quando argumentou:
(...) a dinâmica faz a gente entender aquela pessoa que fica isolada na sala, que muitas vezes se feriu, se machucou com algo que fizeram para ela, agora a partir de hoje essa sala vai ser um grupo, um grupo unido com força, sem brigas eu vou fazer minha parte, agora os outros alunos fazem a parte deles, para ter uma sala muito unida, inteligente, cooperativa, alem de tudo, todos ajudando todos como um grupo deve ser.
Os alunos, após dinâmicas e leituras realizadas, mostraram que
possuem compreensão de que as diferenças encontradas no ambiente escolar,
mesmo na sala de aula, são reais, pois a diversidade, seja em qual sentido for,
existe no nosso dia a dia, mas o como lidar e reconhecer essa diversidade
enquanto riqueza e não como algo pernicioso é que é a questão.
4 O QUE FAZER?
Para Dayrell (1996, p.17),
Olhar a instituição escolar pelo prisma do cotidiano permite vislumbrar a dimensão educativa presente no conjunto das relações sociais que ocorrem no seu interior. A questão que se coloca é que essa dimensão ocorre predominantemente pela prática usual dos alunos, à revelia da escola, que não a potencializa. Os tempos que a escola reserva para atividades de socialização são mínimos, quando não reprimidos.
Sendo a escola um espaço de socialização, é necessário estimular ao
máximo a convivência e o respeito às diferenças existentes em seu interior. Ao
propiciar momentos de interação com atividades sócio-culturais envolvendo os
alunos em trabalho de equipe, danças, teatros, músicas, enfim, envolver a
socialização das diferentes culturas presentes no interior da escola, estaremos
proporcionando o convívio e o conhecimento dessas diversidades culturais. Ao
envolvê-los nessas discussões com atividades e com projetos de participação
efetiva proporcionamos a integração do saber do aluno, enquanto ser individual
que possui uma história e vem de algum lugar. Esse tipo de ação vai além da
aquisição dos conhecimentos acumulados pela humanidade, pois há uma troca
de saberes que faz parte do cotidiano escolar e nos possibilita conhecer melhor
quem são os alunos com os quais trabalhamos. Bem como os alunos passam a
conhecer melhor os próprios colegas com os quais convivem os melhores anos
de sua vida, o período de escola.
A organização do trabalho pedagógico é pensado e organizado para
contemplar a riqueza de diversidade existente no interior do Colégio, visto que
na vida em geral a igualdade, a homogeneidade é impossível, mas, quando a
escola se organiza e trabalha para reconhecer as diferenças e, principalmente,
aceitar que os alunos trazem para seu interior culturas diversas é possível,
trabalha essa diversidade para valorizar o potencial de cada um e desenvolver
projetos interdisciplinares, culturais e assim minimizar os problemas existentes
no processo de socialização, ensino/aprendizagem na comunidade escolar.
Conhecer a procedência do aluno é possível através das matrículas
realizadas pela secretaria do Colégio, onde pesquisa-se o local de residência
dos mesmos. Esse levantamento é apresentado para os professores na
semana pedagógica e fica a disposição na sala da Equipe Pedagógica.
Também é apresentado aos alunos nas primeiras semanas do ano letivo para
que os mesmos visualizem o fluxo de pessoas oriundas de quase todas as
vilas da cidade e a complexidade de relacionamentos, idéias, etnias, condições
sócio cultural e econômica que convergem para o mesmo local, o Colégio, e
que essa complexidade, essa riqueza, seja para o desenvolvimento dos
componentes desse novo grande grupo.
No que se refere aos alunos, esses nas primeiras semanas do ano
letivo são encaminhados ao auditório para saberem como é o funcionamento
do Colégio como um todo e no período específico de cada turno. Durante o
período letivo, as pedagogas fazem interferências na sala de aula e trabalham
determinadas dinâmicas pedagógicas com os alunos, bem como com textos
relacionados ao comportamento social, grupal e individual.
Durante a aplicação do projeto, com esclarecimentos da estrutura do
Colégio, sua formação e dinâmica, a procedência dos demais alunos, a
quantidade de turmas, turno e alunos, os mesmos se sentiram mais próximos
uns dos outros. Nos primeiros dias sugeri que se agrupasse em pares, os que
já estavam próximos, alguns alunos argumentaram que gostaria de sentar com
seus colegas, que não conheciam muito bem aquela pessoa que estava ao seu
lado.
Afirmei que devemos conhecer o grupo como um todo, que as
atividades são coletivas e não individualizadas. Num primeiro momento
aceitaram sentar-se com o “desconhecido” para fazer os trabalhos. Após essa
dinâmica todos concordam que têm que trabalhar com todos os elementos da
sala, que a troca de experiências é essencial para o bom relacionamento, para
a aprendizagem, para a tolerância, para o conhecimento, o que ficou bem
específico para a aluna “5”, quando argumenta:
(...) a dinâmica faz a gente entender aquela pessoa que fica isolada na sala, que muitas vezes se feriu, se machucou com algo que fizeram para ela, agora a partir de hoje essa sala vai ser um grupo, um grupo unido com força, sem brigas eu vou fazer minha parte, agora os outros alunos fazem a parte deles, para ter uma sala muito unida, inteligente, cooperativa, alem de tudo, todos ajudando todos como um grupo deve ser.
Os alunos, após dinâmicas e leituras realizadas, mostraram que
possuem compreensão de que as diferenças encontradas no ambiente escolar,
mesmo na sala de aula, são reais, pois a diversidade, seja em qual sentido for,
existe no nosso dia a dia, mas o como lidar e reconhecer essa diversidade
enquanto riqueza e não como algo pernicioso é que é a questão.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em uma das conversas que tivemos, falei sobre a conduta dos alunos
de Ensino Médio, que esses devem ser autônomos, decididos, espertos,
audazes, confiantes, solidários, cooperativos, e tantos outros adjetivos
positivos. Expliquei que os especialistas da educação da SEED/PR., estudaram
uma maneira de levá-los a se interessar mais por aprender; e que o ensinar e o
aprender não fossem mais uma situação monótona e exaustiva para alunos e
professores. Desse estudo surgiu uma nova modalidade de ensino por
blocos para atender a dinâmica dos tempos. Esse novo aluno precisa ser
mais participativo, construir e organizar seu conhecimento. O professor é
alguém que sabe um pouco mais e que irá orientar e organizar situações que
vão requerer dos alunos efetiva participação e envolvimento na tomada de
decisões e construção de novos conhecimentos. Que os alunos possam aplicar
na sala de aula conhecimentos que obtiveram de modo assistemático, no seu
dia a dia e que essa aplicação venha a colaborar com o desenvolvimento da
turma, como um todo, e contribuir para com o efetivo ensino/aprendizagem.
O desenvolvimento do projeto teve seu início com o levantamento do
local de residência dos alunos, passou pela apresentação dos resultados para
a turma e culminou com a realização de encontros, leituras, troca de idéias,
informações e dinâmicas. O objetivo central era a integração e a socialização
entre os mesmos, demonstrando que a diversidade existente entre os que
freqüentam o Colégio é sinônimo de riqueza para a formação de um aluno
autônomo, decidido, esperto, audaz, confiante, solidário e cooperativo para a
sua real aprendizagem, socialização e cidadania.
Realizar o PDE foi muito importante. Pude trocar idéias e
conhecimentos com várias pessoas ligadas a educação, ler autores que se
preocupam com o tema das diferenças culturais na escola, conversar com
professores e alunos que acreditam ser possível tornar a escola um local de
convivência pacífica entre conhecimento, aprendizagem, alunos e professores.
Estamos, todos, trabalhando para o mesmo objetivo, a EDUCAÇÃO.
Buscamos soluções para problemas crônicos e emergenciais, e nosso grande
objetivo é melhorar a qualidade de ensino, a formação do cidadão e tornar
realizável o nosso trabalho no dia a dia.
REFERÊNCIAS
ABDALLA, Vilma. Conversas sobre ensino médio, reformas, alunos e
professores: A difícil arte do encontro/Vilma Abdalla. São Carlos: UFSCar,
2007.
ALARCÃO, Isabel. Escola Reflexiva e Nova Racionalidade. Porto Alegre.
Artmed Editora. 2001
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. A Educação como cultura. SP: Brasiliense.
1986.
BUENO, José Geraldo Silveira. Função social da escola e organização do
trabalho pedagógico. Educar, Curitiba, n. 17, p. 101-110. 2001. Editora da
UFPR
CUPOLILLO, Mercedes Vilma, e FREITAS, Ana Beatriz Machado de.
Diferença: Condição Para Subjetividade. In Revista Semestral da
Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (ABRAPEE) •
Volume 11 Número 2 Julho/Dezembro 2007, P. 379-389.
DAYRELL, Juarez Tarcisio. A Escola Como Espaço Sócio Cultural. Belo
Horizonte: UFMG, 1996.
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