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ASPECTOS GERAIS DA
MEDIAÇÃO E DA CONCILIAÇÃO
LUCIANA AMICUCCI CAMPANELLI
Oficial Substituta do 2º Registro de Imóveis de Ribeirão Preto (atual)
Mediadora Judicial credenciada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo
Mestre em Direito Político e Econômico e Especialista em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie
Oficial Substituta do 1º Registro Civil de São José do Rio Preto (2007 a 2019)
Livro Publicado: Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. Ed.Juarez de Oliveira
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 2
SUMÁRIO
Introdução 04
1. Conflito 04
2. Políticas Públicas 05
3. Breve histórico da mediação no mundo 06
4. Breve histórico da mediação no Brasil 08
5. Métodos alternativos de solução de conflitos 09
6. Legislação atual 10
7. Teoria dos Jogos (Cooperação) – John Nash 12
8. Gráfico de Leonard Riskin 13
9. Ferramentas para provocar mudanças 14
9.1 Recontextualização 14
9.2 Enfoque prospectivo 15
9.3 Perguntas orientadas 16
9.4 Organização de questões e interesses 16
9.5 Sessões privadas ou caucus 16
9.6 Inversão de papéis 17
9.7 Normalização 17
9.8 Afago 18
9.9 Validação de sentimentos 18
9.10 Audição de propostas implícitas 18
9.11 Silêncio 19
9.12 Geração de opções 19
9.13 Teste de realidade 20
10. Técnicas usadas na mediação 20
10.1 Escuta ativa 20
10.2 Rapport 21
10.3 Sessão individual ou caucus 22
10.4 Recontextualização, Resumo, Parafraseamento 22
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 3
10.5 Teste de realidade 23
11. Escolas e modelos de mediação 23
11.1 Modelo de Harvard 23
11.2 Modelo transformativo 24
11.3 Modelo circular-narrativo 24
12.Negociação 25
13. Princípios éticos 26
13.1 Princípio da imparcialidade e da independência 27
13.2 Princípio da confidencialidade 27
13.3 Princípio da autonomia da vontade e da decisão informada 28
13.4 Princípio da oralidade e da informalidade 28
13.5 Princípio do empoderamento 28
13.6 Princípio da validação 29
13.7 Princípio da competência 29
13.8 Princípio do respeito à ordem pública e às leis vigentes 29
14. Etapas da mediação 29
14.1 Preparação ambiental 30
14.2 Início da sessão de mediação 30
14.3 Reunião de informações 30
14.4 Identificação das questões, interesses e sentimentos (QIS) 31
14.5 Esclarecimentos 32
14.6 Resolução das questões 32
15. Acordo 33
Conclusão 35
Referências 36
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 4
INTRODUÇÃO
A cultura da judicialização dos conflitos impera no Brasil e encontra guarida na própria
Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, inciso XXXV), bem como no artigo 3º, caput do Código
de Processo Civil de 2015, os quais preveem que a lei não excluirá da apreciação do Judiciário
lesão ou ameaça a direito.
Esse princípio da inafastabilidade da jurisdição e o crescente aumento populacional
brasileiro elevaram exponencialmente as disputas judicializadas, razão pela qual ficou
prejudicada a entrega da prestação jurisdicional pelo Poder Judiciário, gerando evidente
insatisfação por parte dos jurisdicionados.
Nesse contexto, torna-se relevante a Resolução 125 de 2010 do Conselho Nacional
de Justiça, ao instituir a Política Judiciária Nacional de Tratamento Adequado de Conflitos,
cujo espírito pautou diversos artigos do Novo Código de Processo Civil brasileiro (Lei 13.105
de 2015), bem como a Lei de Mediação (Lei 13.140 de 2015).
É importante mencionar que o acesso à justiça distingue-se do acesso ao Poder
Judiciário, visto haver maneiras de solucionar os conflitos fora dele, destacando-se, dentre
elas, a mediação (método autocompositivo, por excelência).
1. CONFLITO
As relações humanas trazem inúmeros conflitos, potencialmente ampliados pelo
crescimento da população e pelo dinamismo da vida moderna.
Na acepção mais ampla do termo, o conflito é a ausência de concordância; de
entendimento. Ocorre quando há a oposição de interesses ou de opiniões.
Em termos jurídicos, conflito “é o estado resultante da divergência ou entrechoque
de ideias ou interesses. Cognatos: conflitar (v.), estar em oposição; colidir; conflitante e
conflituoso (adj), contraditório, colidente, que conflita”. (Dicionário Jurídico. Academia
Brasileira de Letras Jurídicas. 3ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária, 1994,
página 172).
Assim, os conflitos advêm da pretensão resistida e, independente da natureza da
questão envolvida, ocorrerão quando um indivíduo ou grupo se opuser à solicitação de outros.
Nesse contexto, os conflitos serão enfrentados como forma de buscar a satisfação de
interesses.
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 5
Para Fernanda Tartuce:
(...) “há certa tensão envolvida no conflito, e a perspectiva
jurídica busca enfrentá-la a partir da noção da satisfação dos
interesses. Satisfazer alguém, contudo, tende a ser algo mais
complexo do que simplesmente lhe apresentar a resposta
oferecida pelo ordenamento jurídico”. (Mediação nos Conflitos
Civis. 5ª ed. São Paulo: Editora Método, página 6).
2. POLÍTICAS PÚBLICAS
É evidente a morosidade do Poder Judiciário, ocasionada principalmente pelo
desequilíbrio entre a excessiva demanda e a escassez de contingente humano para lidar com
ela. Essa delonga contraria o princípio constitucional da celeridade processual e
administrativa, previsto no artigo 5º, inciso LXXVIII da Constituição Federal de 1988.
Com o intuito de melhorar a solução de conflitos, foi necessária a criação de Políticas
Públicas, que em linhas gerais, consistem em emações e medidas implementadas pelo Estado
Brasileiro (lato sensu) para dirimir a questão.
Após muitas discussões e ampla pesquisa multidisciplinar, o Conselho Nacional de
Justiça (CNJ) instituiu a Resolução 125 de 2010, que versa sobre a Política Judiciária Nacional
de Tratamento adequado dos conflitos, cujo espírito pautou diversos artigos do Novo Código
de Processo Civil brasileiro, bem como a Lei de Mediação.
Observa-se que a referida Resolução prevê a mediação e a conciliação como
instrumentos efetivos de pacificação social, solução e prevenção de litígios, cabendo ao CNJ
“organizar programa com o objetivo de promover ações de incentivo à autocomposição de
litígios e à pacificação social por meio da conciliação e da mediação”. (artigo 4º).
Conforme prevê o Manual de Mediação Judicial do Conselho Nacional de Justiça, os
principais objetivos da Resolução 125/2010 são:
“i) disseminar a cultura da pacificação social e estimular a
prestação de serviços autocompositivos de qualidade (art. 2º);
II) incentivar os tribunais a se organizarem e planejarem
programas amplos de autocomposição (art. 4º); iii) reafirmar a
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função de agente apoiador da implantação de políticas públicas
do CNJ (art. 3º).” (6ª edição, página 37).
Dessa maneira, com o intuito de realizar as sessões de conciliação e mediação, o
CNJ previu a instalação de Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania – Cejuscs
(artigo 7º, IV da Resolução 125).
Muito embora os Cejuscs sejam unidades pertencentes ao Poder Judiciário, há a
possibilidade de conciliação e mediação tanto na fase processual quanto na fase pré-
processual, sendo que, em ambos os casos, as sessões serão realizadas por mediadores e
conciliadores capacitados, na forma prevista no anexo da Resolução 125/2010. (artigo 12).
Os mediadores e os conciliadores, devidamente reconhecidos pelo Conselho
Nacional de Justiça como “facilitadores de diálogo entre as partes” (artigo 12, parágrafo 4º)
farão curso de capacitação, treinamento e aperfeiçoamento e ficarão submetidos ao Código
de Ética estabelecido na mencionada Resolução (artigo 12, parágrafo 4º).
A autocomposição realizada pela mediação, paulatinamente, vem-se mostrando
como “principal “política pública do judiciário para a solução efetiva de conflitos”,
demonstrando, assim, a importância da Resolução 125 no cenário nacional de pacificação de
disputas.(Manual de Mediação Judicial. Op.cit., página 44).
3. BREVE HISTÓRICO DA MEDIAÇÃO NO MUNDO
Invariavelmente, onde há pessoas há algum tipo de conflito, passível de resolução de
acordo com a cultura, o tempo e o lugar. As controvérsias sempre existiram e, com elas, suas
formas de solução: pela imposição do mais forte; pela lei do Talião; pelo acordo lato sensu;
pela negociação ou qualquer outra maneira.
Segundo Fernanda Tartuce e Diego Faleck, cogita-se que a mediação exista antes
mesmo da história escrita, até mesmo havendo relatos dela na Bíblia. Afirmam, ainda, que há
centenas de anos a mediação já era utilizada na China e no Japão como forma primária e
instintiva de resolver conflitos, assim como em tribos africanas, aldeias ao redor do mundo e
em disputas entre nações (Introdução histórica e modelos de mediação, disponível em
http://www.fernandatartuce.com.br/wp-content/uploads/2016/06/Introducao-historia-e-
modelos-de-mediacao-Faleck-e-Tartuce.pdf, página 4).
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 7
De qualquer forma, e independente do local ou da época histórica em que a mediação
era utilizada, o intuito era sempre o de promover a pacificação social com a resolução das
disputas.
Diante desse contexto, fica delicado precisar o início da mediação, razão pela qual a
doutrina indica alguns marcos específicos nos Estados Unidos, na Europa e em países da
América Latina, nos quais a mediação apresenta-se como meio de enfrentamento de conflitos.
Acrescenta-se que de acordo com os autores acima mencionados, destacam-se
como marcos da mediação os seguintes fatos: (1) EUA - início da colonização, ocasião em
que surgiram conflitos entre grupos de colonos e a Coroa e, de forma sistematizada, por
ocasião da Conferência Roscoe Pound em 1976; Coroa; (2) Europa – Grã-Bretanha, em 1978,
com o movimento “parents Forever”; (3) América Latina, pelo Banco Mundial, em 1996, que
dispôs sobre a adoção de políticas de mediação e justiça restaurativa como procedimentos
alternativos ao sistema judicial tradicional. (Introdução histórica e modelos de mediação. Op.
cit., página 6 a 10).
Independentemente do marco inicial, a resolução de conflitos tem raiz multidisciplinar,
conforme se pode extrair do seguinte trecho:
“O campo de resolução de disputas tem raízes
multidisciplinares e variadas: suas bases intelectuais e práticas
têm como fontes a antropologia, a sociologia, a psicologia
social, a psicologia cognitiva, a economia, a ciência política, a
teoria dos jogos, as relações internacionais, o Direito e os
estudos de paz”.
(...) “As raízes multidisciplinares do campo de resolução de
disputas foram aos poucos se fundindo: os cientistas sociais
que se dedicavam à análise das disputas em campos mais
abrangentes e em padrões de conflitos nas relações sociais se
aproximam de juristas; estes, por sua vez, mostravam-se mais
focados na natureza concreta das disputas particulares”.
(Fernanda Tartuce. Mediação nos conflitos civis. Op. cit.,
páginas 170 e 171).
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4. BREVE HISTÓRICO DA MEDIAÇÃO NO BRASIL
O Poder Judiciário ainda constitui a forma mais difundida para solucionar conflitos no
Brasil. É a chamada heterocomposição, em que um terceiro, estranho à lide (juiz), decide
unilateralmente a questão apresentada.
Outra forma de solução de conflito é a autocomposição, havendo diversos dispositivos
constitucionais e infraconstitucionais previstos no Código de Processo Civil que a preveem.
Com o advento da Resolução 125 de 2010 do Conselho Nacional de Justiça e da Lei
13.140 de 2015 reforçou-se a ideia de que os conflitos podem ser resolvidos de diversas
formas e de maneira complementar. É o chamado sistema “multiportas”, estando dentre eles,
a mediação.
A mediação é uma forma autocompositiva para solução de conflitos, na qual as partes
envolvidas chegam à solução pacífica mediante a facilitação do diálogo feita por um terceiro
imparcial (mediador).
Para Fernanda Tartuce, “mediação é o meio consensual de abordagem de
controvérsias em que uma pessoa isenta e devidamente capacitada atua tecnicamente para
facilitar a comunicação entre as pessoas e propiciar que elas possam, a partir da restauração
do diálogo, encontrar formas proveitosas de lidar com as disputas”. (Mediação nos conflitos
civis. Op. cit., página 53).
Os meios consensuais de resolução de conflitos são efetivamente formas de
distribuição da justiça, especialmente porque viabilizam a resolução das questões de forma
célere, atendendo ao princípio constitucional previsto no inciso LXXVIII do artigo 5º da
Constituição Federal.
Segundo Maria Berenice Dias, “o mediador favorece o diálogo na construção de
alternativas satisfatórias para ambas as partes. A decisão não é tomada pelo mediador, mas
pelas partes, pois a finalidade da mediação é permitir que os interessados resgatem a
responsabilidade por suas próprias escolhas”. (Manual de Direito das Famílias. 12ª ed. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, página 75).
Logo, a mediação tem caráter eminentemente educativo e transformador, visto que a
sentença nem sempre possui efeito apaziguador, especialmente quando há também
envolvidos sentimentos e vínculos, como ocorre, por exemplo, com o direito de família.
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 9
5. MÉTODOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS
Atualmente, vigoram no Brasil diversas formas de solução de conflitos. É o chamado
sistema “multiportas” ou sistema pluriprocessual de enfrentamento de controvérsias.
Como métodos de heterocomposição, há o Poder Judiciário (mais utilizado no país),
bem como a arbitragem.
No Poder Judiciário, a questão será decidia por um juiz, cuja sentença tem força
vinculativa, coercitiva e obrigatória, independente de as partes a acharem justa ou adequada.
Por outro lado, em linhas gerais, a arbitragem pode ser realizada apenas para conflitos
relativos a direitos patrimoniais disponíveis, situação em que a controvérsia será dirimida
também por um terceiro, chamado de árbitro. As regras específicas da arbitragem estão na
Lei 9.307/1996.
De acordo com Carlos Alberto Carmona a arbitragem ocorre quando “uma ou mais
pessoas recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nesta
convenção sem intervenção do Estado, sendo destinada a assumir eficácia de sentença
judicial”. (Arbitragem e processo: comentário à Lei 9.307 de 1996. 3ª ed. São Paulo: Editora
Malheiros, 2009, página 31).
A sentença arbitral produz os mesmos efeitos de sentença judicial e, se for
condenatória, constitui título executivo judicial, conforme dispõem o artigo 515, VII do Código
de Processo Civil e o artigo 31 da Lei 9.307/1996.
Na verdade, é possível realizar a mediação na arbitragem a qualquer momento, tendo
em vista que a facilitação do diálogo entre os contendores acaba por elucidar melhor as
circunstâncias do caso apresentado.
Todavia, os métodos alternativos de solução de conflitos têm ganhado destaque no
cenário brasileiro, figurando dentre eles, a mediação, a conciliação e a negociação.
Com o advento da Resolução 125 de 2010 do Conselho Nacional de Justiça, da Lei
13.140 de 2015 e dos inúmeros dispositivos inseridos no Novo Código de Processo Civil
brasileiro, institucionalizou-se o sistema “multiportas” para resolução de conflitos.
A título meramente exemplificativo, cita-se o artigo 334, caput do Código de Processo
Civil, que prevê a audiência de conciliação ou mediação no início do procedimento comum, ou
seja, mesmo escolhendo-se a via Judiciária, ainda assim, tenta-se a mediação previamente à
própria defesa do réu.
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 10
Corroborando a importância da autocomposição pelas partes, o artigo 139, V do
Código de Processo Civil dispõe que o juiz deverá promovê-la a qualquer tempo,
preferencialmente, com o auxílio de conciliadores e mediadores judiciais.
De qualquer forma, a escolha por um método alternativo ou consensual para
resolução de controvérsias deve considerar a adequação das peculiaridades do caso concreto
à forma de solucioná-lo, chamado pela moderna doutrina como princípio da adaptabilidade,
“visto que há vantagens e desvantagens de cada processo que devem ser consideradas em
função das características específicas de cada conflito”. (Manual de Mediação Judicial, página
40).
É importante mencionar que os métodos para solução de conflitos são
complementares, visto que podem e devem interagir.
Neste sentido é o ensinamento de Fernanda Tartuce ao mencionar que:
“Na escolha da forma como lidar com a disputa, costumam ser
cotejados fatores como custos financeiros, celeridade, sigilo,
manutenção de relacionamentos, flexibilidade procedimental,
exequibilidade da solução, desgastes emocionais,
adimplemento espontâneo do resultado e recorribilidade, entre
outros”. (Mediação nos conflitos civis. Op. cit., página 73).
Ademais, a mediação tem caráter pedagógico, já que a decisão é colaborativa, ou
seja, tomada pelas próprias partes envolvidas no dilema, propiciando a manutenção do
relacionamento.
6. LEGISLAÇÃO ATUAL
Conforme mencionado anteriormente, a mediação está presente em diversos
dispositivos da legislação brasileira. A sua importância transcende à própria Lei 13.140 de
2015, uma vez que está em inúmeros artigos do atual Código de Processo Civil e na Lei 9.307
de 1996.
O artigo 3º, parágrafo 3º do estatuto processual evidencia o papel relevante dos
métodos consensuais de resolução de controvérsias, ao dispor que:
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 11
“A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflito
deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e
membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial”.
O novo Código de Processo Civil inovou ao indicar o mediador e o conciliador como
auxiliares da justiça (artigo 149), o que não era previsto no Código processual anterior.
Acrescenta-se que os artigos 165 a 175 dispõem sobre: função, inclusão e exclusão de
mediadores e conciliadores do cadastro específico, quarentena, princípios aplicáveis à
mediação, dentre outras questões específicas.
O artigo 148, inciso II do referido Código prevê, também, a aplicação dos
impedimentos e suspeições aos mediadores e conciliadores, que figuram como auxiliares da
justiça.
A resolução consensual de conflitos encontra previsão para aplicação expressa nas
ações que versem sobre direito de família, havendo a possibilidade até mesmo da suspensão
do processo, se as partes se submeterem à mediação.
Segundo o artigo 694 do Código de Processo Civil:
“Nas ações de família, todos os esforços serão empreendidos
para a solução consensual da controvérsia, devendo o juiz
dispor do auxílio de profissionais de outras áreas de
conhecimento para a mediação e conciliação.
Parágrafo único. A requerimento das partes, o juiz pode
determinar a suspensão do processo enquanto os litigantes se
submetem a mediação extrajudicial ou a atendimento
multidisciplinar”.
Verifica-se que como a mediação tem como intuito facilitar o diálogo entre as partes,
pode ser utilizada em inúmeros outros conflitos, como questões envolvendo direito ambiental,
direito trabalhista, direito de vizinhança e qualquer outro em que as partes tenham interesse
em fazer a pacificação do conflito de forma consensual, daí sua enorme importância no
contexto jurídico.
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 12
7. TEORIA DOS JOGOS (COOPERAÇÃO) – JOHN NASH
A Teoria dos Jogos é um ramo da matemática e, em termos gerais, estuda estratégias
para que o jogador (ou parte interessada) escolha situações em que irá minimizar eventuais
perdas dentro de um conflito. Foi desenvolvida no século 20 em razão da Primera Guerra
Mundial.
John von Neumann sistematizou a referida teoria no ano de 1944 e desenvolveu a
aplicação econômica para a Teoria dos Jogos, uma vez que, segundo ele, um competidor
ganharia se levasse o outro à derrota, conhecida como soma-zero, posto que se baseava
essencialmente na competição.
Ao desenvolver um pouco mais a essência da Teoria dos Jogos, John Nash partiu do
pressuposto de que seria mais produtivo se as partes cooperassem entre si. Dessa forma,
com base em uma escolha racional, ambos implementariam estratégias para reduzir eventuais
perdas. Logo, não haveria um ganhador e um perdedor.
A teoria de John Nash foi chamada de Equilíbrio de Nash, cujo mais popular exemplo
de aplicação foi o dilema do prisioneiro (Manual de Mediação Judicial. Op. cit., página 62).
O conceito de John Nash revolucionou diversas áreas do conhecimento como a
Economia e a Ciência Política, o que acabou por dar-lhe o Prêmio Nobel de Economia no ano
de 1994 e ter sua história retratada no filme Uma Mente Brilhante (ano de 2001).
Verifica-se que a Teoria do Equilíbrio de Nash é utilizada amplamente em Ciência
Política, em que há situações de conflito já instaladas ou iminentes a serem dirimidas. Guga
Chacra explica que:
“(...) o boom dessa teoria foi justamente na Guerra Fria, no
Cenário de tensão permanente entre dois superpoderes
geopolíticos”. (... ) E continua explicando que também é aplicável
aos casos do Irã e da Crimeia, o que confirma a aplicação prática
e atual da mencionada teoria dos Jogos, inclusive entre nações
mundiais. (Gustavo Chacra. Jornal O Estado de São Paulo, 19
de marco de 2016. Disponível em
http://cienciapoliticaparajornalistas.blogspot.com/2016/03/escal
adas-belicas-e-teoria-dos-jogos-os.html?m=1, página 2).
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 13
A Teoria dos Jogos de Nash configura uma estratégia bastante eficiente a ser utilizada
na mediação. Isso porque “as partes têm a ganhar com soluções cooperativas” (Manual de
Mediação Judicial, página 69), situação típica de “ganha-ganha”, em contraposição ao “ganha-
perde”, característico das decisões proferidas pelo Poder Judiciário.
8. GRÁFICO DE LEONARD RISKIN
Segundo Leonard Riskin, advogados e mediadores possuem perspectivas diferentes
sobre a mediação. Em razão disso, desenvolveu o Gráfico Riskin, que propiciou o debate sobre
o direcionamento e o futuro das mediações.
De acordo com o mencionado gráfico, a mediação divide-se em quatro quadrantes
diferentes, quais sejam: mediador avaliador ou mediador facilitador, bem como conflito simples
ou complexo.
O mediador avaliador, segundo Riskin, ingressa no mérito (conteúdo) das questões
conflituosas, ao passo que o mediador facilitador utiliza-se de técnicas e ferramentas para
conduzir às partes a uma solução (negociação), sem adentrar no mérito das questões.
(Estudos de Arbitragem, Mediação e Negociação, vol. 3. Mapeando a Mediação – Os Riscos
do Gráfico de Riskin. Disponível em https://cursomediacao.com.br/wp-
content/uploads/2019/02/Mapeando-A-Media%C3%A3o_-OsRiscos-Do-Gr%C3%A1fico-De-
Riskin.pdf, página 2).
Assim, o mediador avaliativo coordena e instrui para que as partes cheguem a um
acordo, enquanto que o mediador facilitador viabiliza a melhora da comunicação entre as
partes para que, sozinhas, componham-se amigavelmente.
Os moldes da mediação proposto no Brasil volta-se à figura definida por Leonard
Riskin como mediador facilitador, posto que a função do mediador não é emitir qualquer juízo
de valor, mas propiciar e facilitar o diálogo entre as partes envolvidas no conflito.
O Manual de Mediação Judicial do Conselho Nacional de Justiça deixa evidente esse
viés facilitador do mediador, ao dispor constituir “a mediação um processo autocompositivo,
segundo o qual as partes em disputa são auxiliadas por uma terceira parte neutra ao conflito
ou por um painel de pessoas sem interesse na causa, para se chegar a uma composição”.
(Op. cit., página 20).
Quanto ao grau identificado por Riskin, o conflito pode ser simples ou complexo. Na
prática, verifica-se que em muitas situações, o conflito torna-se mais complexo em razão da
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 14
dificuldade de comunicação das partes, razão pela qual a habilidade do mediador revela-se
absolutamente decisiva para a solução da controvérsia.
9. FERRAMENTAS PARA PROVOCAR MUDANÇAS
Há diversas ferramentas que são utilizadas na mediação, cabendo ao mediador, com
sensibilidade e conhecimento técnico, escolher o momento adequado e qual será aplicada.
De acordo com o Conselho Nacional de Justiça, “um dos maiores desafios do
mediador consiste em desarmar as partes de suas defesas e acusações, e buscar cooperação
na busca de soluções práticas”. (Manual de Mediação Judicial. Op. cit., página 234).
Independentemente da técnica, o objetivo sempre é propiciar o restabelecimento da
comunicação entre as pessoas para que reflitam sobre as questões apresentadas.
Observa-se que em uma mesma sessão de mediação, várias técnicas podem ser
utilizadas concomitante e sucessivamente, uma vez que são complementares e não
excludentes.
O Conselho Nacional de Justiça aborda as ferramentas possíveis de utilização no
procedimento da mediação a partir da página 233 do Manual de Mediação Judicial.
Resumidamente são elas:
9.1. RECONTEXTUALIZAÇÃO
A recontextualização é a ferramenta mais utilizada na mediação.
Em linhas gerais, na recontextualização, o mediador reconta a fala das partes de
forma mais neutra possível, sem qualquer emissão de valor ou opinião. É a paráfrase daquilo
que foi contado pelas pessoas. É a devolução da interpretação, o resumo.
No entanto, devem-se eliminar eventuais ruídos, palavras negativas ou sentimentos
específicos do falante, de forma a tornar a comunicação mais inteligível e clara e promover a
organização das ideias.
É recomendável, também, evitar a repetição de termos vagos, abstratos ou ambíguos
que tenham sido eventualmente mencionados pelas pessoas, porque trazem carga muito
subjetiva e acabam dificultando o diálogo.
A emissão de observações ou de qualquer conteúdo avaliativo igualmente tem que
ser evitados pelo mediador, sob pena de ferir sua imparcialidade.
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 15
A recontextualização é o momento propício para o mediador apresentar um enfoque
prospectivo dos fatos, de modo com que as partes consigam desapegar-se exclusivamente
das circunstâncias passadas e focarem no momento presente, conforme será abordado a
seguir.
Ao finalizar essa técnica, o mediador deve se certificar de que a recontextualização
está de acordo com a fala das partes. Para tanto, podem ser feitas perguntas no seguinte
sentido:
Estou correta em minha fala? É isto mesmo que pude entender? Está certo isso? Faz
sentido isso que falei?
O intuito das referidas perguntas é possibilitar a confirmação pelas partes daquilo que
foi dito e havendo qualquer falha, este é o momento adequado para esclarecimentos.
A técnica da recontextualização pode ser comparada ao “pedido de retorno”
defendido por Marshall B. Rosenberg. Para ele, repetir com outras palavras aquilo que
escutamos é a “oportunidade de reformular partes de nossa mensagem de modo que resolva
qualquer discrepância que possamos ter notado no retorno que recebemos”. (Comunicação
não-violenta. Técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais. Tradução
Mário Vilela. 4ª ed. São Paulo: Editora Ágora, página 113).
No entanto, essa ferramenta deve ser utilizada após a fala das pessoas envolvidas e
englobando os conflitos e os interesses de todos, preservando a imparcialidade do mediador,
necessária ao bom procedimento.
9.2. ENFOQUE PROSPECTIVO
Nessa técnica, o intuito é direcionar as partes para solucionar o conflito com base em
seus reais interesses.
Com esse intuito, o mediador faz com que os envolvidos desapeguem-se das
circunstâncias, culpas e desentendimentos do passado e atenham-se ao momento presente,
para a partir dele, resolverem a questão controvertida.
Essa ferramenta visa, de certa forma, abstrair o negativismo do passado e focar na
solução, possível se as partes relegarem a segundo plano suas posições consolidadas e
enraizadas e priorizarem seus reais interesses.
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 16
9.3. PERGUNTAS ORIENTADAS
Para que o mediador consiga fazer perguntas orientadas e obter os interesses reais
das partes, ainda que não estejam claros, deverá identificar três elementos do mnemônico
“QIS”, quais sejam: questão; interesse e sentimento.
Os referidos elementos devem constar da recontextualização e configuram pontos
norteadores para o mediador conduzir a sessão, posto que revelam sentimentos e desejos
que, muito embora sequer tenham sido falados pelas partes, constituem a verdadeira razão
ou interesse real da disputa.
Um questionamento que viabiliza ao mediador extrair o real interessante das partes
é: Para que você(s) quer(em) determinada situação/coisa/objeto?
Assim, o mediador conduz a sessão de modo a obter a convergência de interesses
supostamente divergentes.
9.4 ORGANIZAÇÃO DE QUESTÕES E INTERESSES
A ferramenta organização de questões e interesses tem como objetivo fazer com que
o mediador capte o foco principal das partes.
Para tanto, precisa separar as questões das pessoas e pontuar os enfrentamentos, o
que é possível ao identificar questão; interesse e sentimento.
O mediador deve iniciar sua narrativa pelos pontos convergentes para após, tratar
dos pontos divergentes, sempre de forma neutra e clara.
Essa ferramenta está bastante ligada à ferramenta: perguntas orientadas.
9.5. SESSÕES PRIVADAS OU “CAUCUS”
São sessões individuais ou reuniões separadas que o mediador faz com apenas uma
das partes do conflito, ao perceber o desconforto ou resistência de uma delas ou de ambas,
em falar fatos ou sentimentos na frente da outra.
É importante observar que, após a fala da pessoa, o mediador deve perguntar quais
questões poderá trazer e abordar na sessão conjunta. É necessário permissão do falante,
porque de outra forma, infringiria o princípio da confidencialidade.
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 17
9.6. INVERSÃO DE PAPÉIS
A inversão de papéis é uma ferramenta que deve ser utilizada pelo mediador quando
perceber a dificuldade da parte de entender as circunstâncias, as razões e os sentimentos da
outra, situação essa que dificulta o restabelecimento do diálogo.
A troca de papéis traz empatia e humanidade à relação conflituosa, sendo mais
poderoso do que se possa imaginar. Isso porque, conhecer o outro e aquilo que ele quer e
precisa facilita a comunicação e, naturalmente, a solução do conflito.
Segundo William Ury são muito importantes os seguintes questionamentos: “Como é
o mundo sob o olhar do outro? Como é ser essa pessoa? Se eu tivesse vivido a vida dela,
como eu agiria e reagiria?“ (Como chegar ao sim com você mesmo. Tradução de Afonso Celso
da Cunha. Rio de Janeiro: Editora Sextante, 2015, página 94).
A essência desta referida ferramenta está na frase: Quando alguém criticar o teu
caminho, ofereça a ele seus sapatos.
Assim, a inversão de papéis gera a possibilidade da reflexão, importante para o
encaminhamento da solução.
9.7 NORMALIZAÇÃO
A normalização está bastante atrelada a outras ferramentas, especialmente à
recontextualização, à validação de sentimentos e ao afago.
Isso porque, a recontexalização deve ser feita pelo mediador de forma a identificar e
normalizar os sentimentos e as aflições da parte (validação), tratando o conflito como algo
natural nas relações humanas (normalização).
A técnica em questão é importante para normalizar o conflito, bem como incentivar
as partes a conversarem sobre ele, de modo a obter a melhoria da relação. Assim, ao agir
dessa forma, o mediador concretizará também o afago, outra ferramenta da mediação.
Segundo o Manual de Mediação Judicial:
(...) o mediador deverá apresentar uma versão que
implicitamente demostre que conflitos são naturais em
quaisquer relações humanas e que às partes cabe a busca da
melhor resolução possível diante do contexto existente. Esta
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 18
demonstração implícita de que conflitos são naturais e que as
partes não devem se envergonhar por estarem em conflito é
comumente denominada normalização”. (Conselho Nacional
de Justiça. Op. cit., página 178).
9.8. AFAGO
O afago deve ser utilizado tanto com as partes envolvidas, bem como com os
advogados. Funciona como um reforço positivo à boa atitude ou ao adequado comportamento.
O afago faz com que as pessoas sintam-se encorajadas a perpetuar com determinada
conduta e, também, incentiva a outra parte, ainda que inconscientemente, a fazer algo no
mesmo sentido. Por esse motivo, o afago deve ser bastante específico.
Essa ferramenta torna o ambiente da mediação mais harmônico e tranquilo.
9.9 VALIDAÇÃO DE SENTIMENTOS
Na validação de sentimentos, o mediador verbaliza para as partes que identificou os
sentimentos delas com relação ao caso apresentado.
No entanto, validar não significa concordar, mas apenas e tão somente identificar.
Segundo o CNJ “ao validar sentimentos o mediador indica, em um tom normalizador, às partes,
que identificou o sentimento gerado pelo conflito”. (Manual de Mediação Judicial. Op. cit.,
página 182).
Deve-se ter cuidado porque a validação de sentimentos somente é viável na sessão
conjunta, se os sentimentos forem comuns. Caso contrário, deverá ser utilizada somente na
sessão individual (caucus) para não haver perda da imparcialidade.
Nessa técnica, o mediador deve ater-se especificamente à identificação dos referidos
sentimentos e jamais ingressar no mérito das questões controvertidas, porque não lhe cabe
analisar.
9.10 AUDIÇÃO DE PROPOSTAS IMPLÍCITAS
Esta ferramenta implica escutar ativamente as partes e extrair seus interesses reais,
que não são narrados por elas, na grande maioria dos casos concretos.
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 19
O mediador deve observar e sentir os desejos dos mediandos e, por intermédio de
propostas implícitas, conduzir a mediação para que eles próprios cheguem à solução do
conflito.
9.11 SILÊNCIO
O silêncio, utilizado no momento adequado pelo mediador, pode funcionar como um
convite às partes para a reflexão.
Por outro lado, o mediador deve atentar-se à duração do silêncio, posto que revela
diferentes situações, sendo necessária a aplicação de ferramentas diferentes para cada caso.
Especificamente quanto aos mediandos, o silêncio breve simboliza o momento de
reflexão, que deve ser respeitado e não interrompido pelo mediador. Por outro lado, o silêncio
longo indica um desconforto ou entrave, razão pela qual o mediador deverá interrompê-lo,
aplicando uma técnica específica como, por exemplo, o caucus.
De acordo com o Manual da Mediação Judicial, “a situação de silêncio provoca nas
partes a reflexão, ainda que momentânea, sobre a forma como estão agindo”.
(...) também pode ser utilizado como “forma de estimular a
reconsideração de determinado comportamento”. (Conselho
Nacional de Justiça. Op. cit., página 206).
9.12 GERAÇÃO DE OPÇÕES
Considerando que a mediação tem como intuito o “ganha-ganha”, então o mediador
deve fazer perguntas para as partes, de modo a gerar várias opções de solução da
controvérsia.
Não se deve indicar as opções para os mediandos, mas estimulá-los a gerar
possibilidades. Assim, a solução será decidida por eles próprios, que optarão por aquela que
melhor lhes aprouver.
Isso “porque espera-se que a mediação tenha um papel educativo e se a parte
aprender a buscar opções sozinha em futuras controvérsias ela tenderá a, em futuros conflitos,
conseguir encontrar algumas novas soluções”. (Manual de Mediação Judicial. Op. cit.,página
238).
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 20
9.13 TESTE DE REALIDADE
O teste de realidade permite ao mediador certificar-se de que os envolvidos possuem
consciência da realidade e das consequências pessoais de eventuais termos da composição
amigável.
É recomendável que o teste de realidade seja realizado em sessão individual, de
forma a evitar qualquer constrangimento. Os binômios necessidade x possibilidade e
possibilidade x vontade devem ficar bastante claros, visto que a parte não deve comprometer-
se a cumprir determinada obrigação (vontade) se não tiver condições para tanto
(possibilidade).
O teste de realidade e a inversão de papéis devem ser utilizados apenas nas sessões
privadas, posto que implementá-las na sessão conjunta poderia trazer a ideia de que o
mediador está sendo tendencioso e, até mesmo, parcial para com uma das partes.
10. TÉCNICAS USADAS NA MEDIAÇÃO
Há diversas técnicas específicas de negociação, mas que são aplicáveis à mediação,
tendo em vista proporcionarem o acolhimento das pessoas e a criação de vínculo entre elas e
o mediador.
Há confluência entre certas técnicas e ferramentas da mediação, sendo certo que
algumas já foram abordas anteriormente. De qualquer forma, podem-se citar algumas técnicas
10.1 Escuta Ativa
O mediador deve fazer a escuta ativa apenas observando as partes e suas narrativas,
separando observação da avaliação. Isso porque juízos de valor e julgamentos são
incompatíveis com o procedimento da mediação e violam a imparcialidade peculiar do
mediador.
Separar a observação da avaliação é o primeiro componente da comunicação não
violenta (CNV), muito importante para uma mediação eficiente. Neste contexto, Marshall B.
Rosenberg leciona que:
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 21
“As observações constituem um elemento importante da CNV,
em que desejamos expressar clara e honestamente a outra
pessoa como estamos. No entanto, ao combinarmos a
observação com a avaliação, diminuímos a probabilidade de
que os outros ouçam a mensagem que desejamos lhes
transmitir”. (Comunicação não-violenta. Op. cit., página 50).
A escuta ativa deve ocorrer tanto do mediador para com as partes, assim como entre
as próprias partes, mutuamente. Escutar a narrativa de outro é uma forma de demonstrar
respeito e somente ao fazê-lo “poderá o mediador identificar as questões mais importantes, as
emoções e a dinâmica do conflito – o que faz com que as intervenções do mediador sejam
muito mais eficientes e oportunas”. (Manual de Mediação Judicial. Op. cit., página 203).
A escuta ativa feita pelo mediador preparado faz com que as pessoas sintam-se
compreendias e respeitadas e confere dignidade à pessoa humana, um dos fundamentos do
Estado Democrático de Direito, conforme previsto no artigo 1º, inciso III da Constituição
Federal de 1988.
William Ury descreve com precisão o impacto do respeito. A saber:
“Respeitar significa dar atenção positiva e tratar o outro com a
dignidade com que você gostaria de ser tratado. Se queremos
chegar ao sim com os outros, não há maneira mais eficaz de
começar que demonstrando o respeito que todo ser humano
merece”. (Como chegar ao sim com você mesmo. Op. cit.,
página 90).
10.2 Rapport
Termo francês que em sua literalidade significa “criar uma relação” ou “trazer de
volta”. Essa técnica tem como intuito estabelecer a empatia com outra pessoa, de forma que
a comunicação fique mais fácil e com menor resistência. Visa estabelecer a receptividade.
O Conselho Nacional de Justiça define rapport como “estabelecimento de uma
relação de confiança”. (Manual de Mediação Judicial. O. cit., página 201).
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 22
Há várias atitudes que podem ser praticadas pelo mediador a fim de garantir rapport
positivo com as partes. A título meramente exemplificativo podem-se citar: chamar os
mediandos e os advogados pelo nome; sorrir e apertar as mãos das pessoas com firmeza;
permitir que se sentem nos locais em que ficarem mais confortáveis; fazer declaração de
abertura clara e simples, de modo com que todos os presentes possam entendê-la; respeitar
o tempo e a narrativa das partes, sem interrupções, dentre outros.
Uma técnica utilizada no rapport é o espelhamento. Nele, o mediador imita as
narrativas das partes, incluindo até mesmo o tom da fala, de maneira que a outra perceba seu
próprio comportamento no mediador, como se fosse um espelho.
Essa técnica do espelhamento depende da habilidade do mediador, porque se não
bem empregada, poderá parecer provocação ou deboche, tornando o procedimento da
mediação um fracasso.
10.3 Sessão individual ou caucus
A sessão individual não se faz necessária em todas as sessões, embora seja uma
técnica bastante eficiente para o mediador exercer o controle na mediação.
De acordo com o CNJ, o caucus é recomendável nas situações em que as partes não
estiverem se comunicando bem; quando houver elevado grau de animosidade entre elas; se
o mediador perceber a existência de conflitos que serão verbalizados somente em sessão
individual; dentre outras. (Manual de Mediação Judicial. Op. cit., página 187).
10.4 Recontextualização, Resumo ou Parafraseamento
Essa técnica deve ser aplicada após o final das narrativas dos mediandos. Nela, o
mediador apresenta o resumo dos fatos, as principais questões e os interesses subjacentes.
O resumo faz com que as partes “percebam o modo e o interesse com que o medidor
tem focalizado a controvérsia, como também possibilita ao mediador testar sua compreensão
sobre o que foi indicado”. (Manual de Mediação Judicial. Op. cit., página 178).
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 23
10.5 Teste de realidade
Em virtude do conflito, as pessoas envolvidas tendem a se concentrar apenas em seu
mundo interior, deixando de perceber os fatos e os acontecimentos à sua volta.
Por esse motivo, recomenda-se a utilização do teste de realidade, em que se estimula
“a parte a proceder com uma comparação do seu ‘mundo interno’ com o ‘mundo externo’-
como percebido pelo mediador”. (Manual de Mediação Judicial. Op. cit., página 241).
11. ESCOLAS E MODELOS DE MEDIAÇÃO
Há três escolas de modelos de mediação, quais sejam: Modelo de Harvard; Modelo
Transformativo e Modelo Circular-Narrativo.
11.1 Modelo de Harvard
Os estudiosos de Harvard inovaram no assunto resolução de conflitos e mediação,
trazendo conceitos, teorias e pesquisas que são utilizadas no mundo todo.
A linha-mestre da mencionada escola é focar nos interesses, ao invés de posições,
além de basear a negociação em princípios ou em méritos. Conduzir a mediação dessa forma
faz surgir opções de ganhos mútuos, porque abarca interesses convergentes e concilia
interesses divergentes.
As posições são os “pedidos” concretos e tangíveis feitos pelas pessoas. Apenas para
traçar um paralelo com o processo judicial, seriam as pretensões formuladas na petição inicial
(pedidos).
Os interesses, por sua vez, constituem as necessidades reais, os desejos e anseios
das partes, os quais muitas vezes, sequer são verbalizados por elas. Portanto, a função do
mediador revela-se fundamental, já que conduzirá a sessão de forma a extrair das pessoas
envolvidas os referidos interesses reais.
Com base na negociação de Harvard, as partes devem cooperar entre si para
preservar o relacionamento e propiciar o “ganha-ganha”. Assim, considerando os interesses
reais das partes, o negociador propicia opções de acordo.
Neste sentido informa o Manual de Mediação Judicial ao dispor que a negociação não
deve fixar-se somente nas posições manifestadas pelas partes, uma vez que:
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 24
“(...) a posição manifestada muitas vezes não indica os
verdadeiros interesses daquele negociador. Encontrar o ponto
médio entre posições também pode não produzir um acordo
que efetivamente abordará os verdadeiros interesses que
impulsionaram os negociadores a apresentarem suas
respectivas posições.” (Op. cit., página 75).
O modelo da escola de Harvard é utilizado no Brasil, ficando evidentes seus
conceitos, princípios e linhas mestras no Manual de Mediação do Conselho Nacional de
Justiça.
11.2 Modelo Transformativo
Para a corrente transformativa, a mediação deve transcender a mera solução de
problemas, já que as disputas são oportunidades de crescimento.
Para tanto, o mediador precisa empoderar as partes para que busquem a modificação
comportamental, que vai muito além de simplesmente intentar um acordo. “Na mediação
transformativa os propósitos são promover fortalecimento (“empowerment”) e reconhecimento
em respeito pleno à autodeterminação das partes”. (Fernanda Tartuce. Mediação nos conflitos
civis. Op. cit., página 259).
O empoderamento ocorre “quando os envolvidos fortalecem a consciência sobre seu
próprio valor e sobre sua habilidade de lidar com quaisquer dificuldades com que deparem a
despeito de pressões externas”. (Fernanda Tartuce e Diego Faleck. Introdução histórica e
modelos de mediação. Op. cit., página 13).
Parte-se da premissa de que o conflito é algo ocorrido no passado, mas no momento
presente as partes têm a oportunidade de dialogarem sobre as questões e mudarem seus
comportamentos, ainda que não haja um acordo.
11.3 Modelo Circular-Narrativo
Esta corrente está baseada na doutrina de Sara Cobb, que resgata a doutrina de
Harvard acrescentando “outras fundamentações teóricas (teoria geral de sistemas, cibernética
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 25
de primeira e segunda ordens, terapia familiar sistêmica, teoria do observador, teorias da
comunicação e da narrativa, dentre outras”. (Fernanda Tartuce e Diego Faleck. Introdução
histórica e modelos de mediação. Op. cit., página 14).
É importante mencionar que o modelo transformativo e o modelo circular-narrativo
também se apoiam nos interesses, razão pela qual não poderiam ser “considerados como
contrapostos à Harvard, mas sim desdobramentos dos estudos de sua linha mestra”.
(Fernanda Tartuce e Diego Faleck. Introdução histórica e modelos de mediação. Op. cit.,
página 11).
12. NEGOCIAÇÃO
A negociação é evidente no procedimento da mediação, posto que as partes deverão
transigir, de alguma forma, para obtenção de eventual composição amigável.
Há duas formas diversas de negociação. A primeira delas seria a negociação
distributiva e, como o próprio nome sugere, implica retirada de algo de uma das partes com a
consequente entrega para a outra.
Este tipo de negociação caracteriza o “ganha-perde”, uma vez que somente uma
parte sairá vencedora, ainda que seja em uma questão específica da controvérsia.
Neste sentido descreve Antonio Donizete Evangelista de Souza:
“O termo distribuir remete ao fato de que o montante de um
objeto é retirado de um jogador ou parte, para ser dado a outro.
Como são também de soma-zero, as barganhas distributivas
tendem a gerar dinâmicas competitivas ou não-cooperativas. A
única forma de não haver conflito em uma negociação
distributiva na mediação de conflitos, é de que uma das partes
aja de forma altruísta, ou seja, ceda de forma voluntária a sua
parte para a outra”. (A negociação na mediação de conflitos.
Disponível em
http://ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&
artigo_id=16517&revista_caderno=21, página 4).
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 26
Por outro lado, na negociação integrativa ocorre o somatório dos valores, de forma
com que ambas as partes saem ganhando. É a situação típica do “ganha-ganha” defendida
por John Nash na Teoria dos Jogos.
Por óbvio, a negociação integrativa é muito mais eficiente para as partes, devendo
ser estimulada pelo mediador por intermédio das técnicas e ferramentas utilizadas no
procedimento de mediação.
13. PRINCÍPIOS ÉTICOS
A mediação é regida por algumas diretrizes, juridicamente intituladas de princípios,
os quais encontram-se previstos no artigo 2º da Lei 13.140 de 2015, no artigo 166 do Código
de Processo Civil e no artigo 2º do Anexo 2 do Manual de Mediação Judicial.
Os princípios constituem a razão fundamental de ser da própria norma, são preceitos
fundamentais que irradiam valor para todo o ordenamento jurídico.
Segundo De Plácido e Silva, no sentido jurídico os princípios são:
“(...) as normas elementares ou os requisitos primordiais
instituídos como base, como alicerce de alguma coisa.
E, assim, princípios revelam o conjunto de regras ou preceitos,
que se fixaram para servir de norma a toda espécie de ação
jurídica, traçando, assim, a conduta a ser tida em qualquer
operação jurídica”. (Vocabulário Jurídico. Verbete: princípios.
2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1990, página 447, 3 v).
Deixa-se consignado que o Código de Ética do Mediador apresenta os seguintes
princípios: confidencialidade; decisão informada; competência; imparcialidade; independência
e autonomia; respeito à ordem pública e às leis vigentes; empoderamento e validação.
De qualquer forma, serão abordados somente alguns princípios da mediação, embora
haja outros previstos nos dispositivos legais acima mencionados.
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 27
13.1 Princípio da imparcialidade e da independência
O mediador precisa ser imparcial (neutro) para conduzir a mediação de forma
adequada. Para tanto, não pode conhecer previamente as partes ou ter qualquer vínculo
anterior com elas.
A imparcialidade também se refere à ausência de emissão de qualquer espécie de
opinião ou juízo de valor sobre os fatos constantes do conflito. De outra forma, haveria afronta
evidente à credibilidade e à independência do mediador e acabaria por gerar a invalidação do
procedimento de mediação.
O parágrafo único do 5º da Lei 13.140 de 2015 deixa bastante clara a conduta do
mediador ao dispor:
“A pessoa designada para atuar como mediador tem o dever
de revelar às partes, antes de aceitação da função, qualquer
fato ou circunstância que possa suscitar dúvida justificada em
relação à sua imparcialidade para mediar o conflito,
oportunidade em que poderá ser recusado por qualquer das
partes”.
Os mediadores são reconhecidos como auxiliares da justiça e, por expressa previsão
lega, ficam sujeitos às regras de suspeição e impedimento previstas nos artigos 144 e 145 do
Código de Processo Civil.
13.2 Princípio da confidencialidade
Todas as questões e informações mencionadas no procedimento de mediação serão
sigilosas, cujo teor não poderá ser utilizado para fim diverso daquele permitido pelas partes
(artigo 166, parágrafo 2º do Código de Processo Civil).
Em razão deste princípio, questões abordadas em sessão individual ou caucus
somente poderão ser utilizadas pelo mediador em sessão conjunta, se o falante assim o
permitir.
A confidencialidade “é o instrumento apto a conferir um elevado grau de
compartilhamento para que as pessoas se sintam à vontade para revelar informações íntimas,
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 28
sensíveis e muitas vezes estratégicas”. (Fernanda Tartuce. Mediação nos conflitos civis. Op.
cit., página 235).
13.3 Princípio da autonomia da vontade e da decisão informada
O procedimento da mediação é voluntário tanto para as partes, como para o
mediador, de forma com que ninguém é obrigado a permanecer em procedimento de mediação
(artigo 2º, parágrafo 2º da Lei 13.140 de 2015).
A decisão informada refere-se ao direito de os litigantes obterem informações corretas
e adequadas quanto aos seus direitos e ao contexto no qual se encontram inseridos.
13.4 Princípio da oralidade e da informalidade
O procedimento de mediação não tem um rito específico, uma vez que o objetivo
primordial é restabelecer o diálogo e a interação entre as partes.
Verifica-se que as técnicas e as ferramentas utilizadas pelo mediador têm como intuito
conduzir a sessão de forma a promover a comunicação entre os envolvidos no conflito, o que
não significa, em nenhuma hipótese, a existência de rito pré-determinado.
A oralidade, por sua vez, é da própria essência da mediação, posto que seu objetivo
principal é a conversa entre os envolvidos. Para que isso ocorra, têm-se que instalar um
espaço democrático e sem a rigidez típica de processos judiciais. Para Fernanda Tartuce,
“como meio focado no (r)estabelecimento da comunicação, configura um procedimento
pautado por iniciativas verbais”. (Mediação nos conflitos civis. Op. cit., página 222).
Segundo o CNJ, o uso de um tom informal da conversa é mais produtivo e estimula
o diálogo, que é objetivo central na mediação (Manual de Mediação, página 147). No entanto,
a informalidade e a oralidade não significam ausência de postura profissional adequada ao
procedimento.
13.5 Princípio do empoderamento
A mediação é um procedimento eficaz e educativo, porque a autocomposição das
partes acaba por gerar o empoderamento delas, que ficam seguras em resolver, sozinhas,
eventuais futuros conflitos.
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É uma forma eficaz de desenvolver a autonomia das pessoas.
13.6 Princípio da Validação
Segundo o Manual de Mediação Judicial, validar significa estimular as partes a
perceberem-se mutuamente como seres humanos dignos de respeito e de atenção. É a
síntese do princípio da pessoa humana previsto na Constituição Federal. (Op. cit., página 241).
13.7 Princípio da competência
Há regras para o exercício da função de mediador, sendo que, atualmente, faz-se
necessário o curso de capacitação, devidamente reconhecido pelo Conselho Nacional de
Justiça, assim como a frequência em cursos de reciclagem (artigo 12 da Resolução 125 de
2010 do CNJ).
13.8 Princípio do respeito à ordem pública e às leis vigentes
O mediador tem a incumbência de garantir que eventuais acordos realizados pelas
partes não contrariem a legislação pátria em vigor, o que é vedado pelo ordenamento jurídico.
14. ETAPAS DA MEDIAÇÃO
Embora o procedimento da mediação seja pautado no princípio da informalidade e da
oralidade, inexistindo um rito específico e pré-determinado, há uma sequência lógica em que
o mediador deve pautar-se para conduzir a sessão.
Em linhas gerais, destacam-se:
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 30
14.1 Preparação ambiental
Refere-se ao ambiente da mediação, que deve conter elementos propícios ao diálogo,
tais como acomodações confortáveis; local silencioso e reservado, além de itens de apoio,
destacando-se: calculadora, papel, caneta e água.
14.2 Início da sessão de mediação
Com o intuito de fazer um bom rapport, é aconselhável que o mediador recepcione
as partes e os advogados na porta da sala, cumprimentando-os com aperto de mão firme,
sorriso e sempre com contato visual, de modo a demonstrar empatia, segurança e firmeza.
Embora pelo CNJ haja disposição específica para as partes sentarem-se à mesa
(Manual de Mediação Judicial. Op. cit, página 163), devendo o medidor conduzir de forma a
observá-la, se os mediandos quiserem fazer de modo diverso, é interessante que o mediador
assim o permita, demonstrando firmeza e segurança.
Isso porque, se sentirem-se compelidos a sentar em local não desejado, certamente
instalar-se-á um ambiente de constrangimento e animosidade, absolutamente indesejável para
uma boa mediação.
Logo no início, o mediador fará a Declaração de Abertura, com a sua apresentação e
esclarecimentos importantes, como o papel do mediador; a função e o propósito da mediação;
os princípios essenciais que a norteiam; as regras do procedimento.
14.3 Reunião de informações
Neste momento, o mediador ouvirá atentamente as partes, que poderão relatar os
fatos e suas percepções ou opiniões.
É relevante estabelecer um critério objetivo de ordem para exposição das informações
e esclarecer que todos terão as mesmas oportunidades e tempo para se manifestar, devendo
o mediador utilizar-se das ferramentas adequadas para garantir que cada envolvido fale sem
qualquer interrupção.
O mediador tem que ter escuta ativa para perceber as nuances das falas, visto que
“a etapa do relato é importante para que haja a identificação de questões, interesses e
sentimentos dos mediandos, assim como o esclarecimento das controvérsias e a elucidação
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 31
das questões controvertidas”. (Fernanda Tartuce. Mediação nos Conflitos Civis. Op. cit.,
página 276).
Nessa fase, o mediador deve ouvir atentamente (escuta ativa), sem efetuar
interrupções, deixando para formular perguntas posteriormente. Ao agir desse modo,
demonstrará respeito e atenção às partes, gerando uma atmosfera propícia ao diálogo.
Após a escuta ativa, o mediador deve fazer a recontextualização (paráfrase) dos
fatos. Essa é uma das doze ferramentas que podem ser utilizadas na mediação, sendo que
todas elas têm o intuito de acarretar mudanças no comportamento dos envolvidos.
14.4 Identificação das questões, interesses e sentimentos (QIS)
Enquanto os mediandos estão expondo suas versões dos fatos, o mediador deve
anotar questões centrais que envolvam o assunto, assim como pontos que precisam de
esclarecimentos.
Depois dos relatos, o mediador fará perguntas para identificação das questões,
interesses e sentimentos, bem como para esclarecimento dos elementos controversos.
De acordo com CNJ, a questão “é um ponto controvertido. Assim, questões não se
relacionam com a personalidade, valores e crenças religiosas das partes; tem, portanto, cunho
objetivo”. Os interesses, por sua vez, podem ser definidos “como algo que a parte almeja
alcançar ou obter”. (Manual de Mediação. Op. cit., página 184).
Em suma, as questões referem-se especificamente aos pontos (posições)
mencionados pelos mediandos, ao passo que os interesses referem-se aos desejos íntimos
ou interesses reais (subjacentes), ainda que não verbalizados. Por esse motivo, o mediador
deve ter escuta ativa para identificar e diferenciá-los.
Os sentimentos, por sua vez, fazem parte de todo processo de mediação e precisam
ser percebidos pelo mediador. Geralmente têm-se a raiva, o ressentimento, a frustração, a
mágoa e até mesmo o amor em uma mesma sessão de mediação.
Cumpre ao mediador, afastar todo e qualquer sentimento por ocasião da
recontextualização, de modo a tornar a situação mais inteligível e simples. Ademais, ao
reforçar sentimentos verbalizados ou não pelas partes, poderá parecer parcial a uma delas,
situação essa inadmissível.
O Conselho Nacional de Justiça destaca a importância da identificação do mnemônico
“QIS” ao mencionar que:
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 32
“A sessão conjunta de identificação de interesses, questões e
sentimentos tende a ser uma das etapas mais valiosas da
mediação, pois é nela que as partes começam a perceber o
conflito como um fenômeno natural e por meio do qual
resolverão suas questões e realizarão seus interesses”.
(Manual da Mediação Judicial. Op. cit., página 185).
14.5 Esclarecimentos
Nesta fase de esclarecimentos, o mediador novamente poderá utilizar-se de outras
ferramentas para obter dados, bem como servir-se daquelas para fazer com que os mediandos
entendam a situação de forma global. Frequentemente, neste momento, as partes percebem
que não precisa haver a polarização da situação.
Esclarece-se que “a polarização da relação consiste na percepção de que a única
forma de compreender aquela relação consiste em um envolvido estar integralmente correto
enquanto o outro, em posição diametralmente oposta, encontra-se inteiramente errado”.
(Manual de Mediação Judicial. Op. cit., página 186).
O mediador não analisa o mérito de nenhuma questão. No entanto, lançando mão
das ferramentas e das técnicas existentes, provoca questionamentos e reflexões nas partes,
de modo a facilitar o diálogo entre elas e, eventualmente, propiciar a solução da controvérsia
(acordo).
14.6 Resolução das questões
A etapa de resolução de questões está intrinsecamente ligada à negociação e é
anterior à eventual composição, embora todos estejam conectados.
O mediador deve iniciar pelas questões e pontos convergentes, de maneira a envolver
e estabelecer a empatia entre os mediandos e, após, apresentar os pontos convergentes.
Assim, propicia um ambiente mais harmônico e favorável à eventual composição
amigável.
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 33
O acordo propriamente dito, não é o objetivo final da mediação, embora seja uma
consequência desejada. Isso porque o foco principal do procedimento é o restabelecimento
do diálogo entre os mediandos e a geração de opções para solucionar as controvérsias.
Em suma, gerar opções significa criar possibilidades para convergência.
15. ACORDO
Mesmo nas situações em que não há a composição amigável, ainda assim o
procedimento de mediação figura-se válido. Isso em razão de seu caráter pedagógico, porque
viabiliza as partes perceberem a situação e as circunstâncias sob outra ótica, sob o ponto de
vista do outro.
Neste sentido é o entendimento do Enunciado 625 do Fórum Permanente de
Processualistas Civis, realizado em 24 a 26 de março de 2017, na cidade de Florianópolis.
“(art. 167, § 3º) O sucesso ou insucesso da mediação ou da
conciliação não deve ser apurado apenas em função da
celebração de acordo (Grupo: Mediação e conciliação (CPC e
Lei 13.140/2015)).”
Na verdade, essa fase conclusiva pode resultar em diversas situações, como a
suspensão temporária de eventual processo judicial; o agendamento de nova sessão de
mediação; a celebração de algum compromisso e, até mesmo, o fim da controvérsia mediante
a celebração de um acordo, decisões essas que dependerão “das partes, que no exercício de
sua autodeterminação escolherão o caminho que desejam trilhar”. (Fernanda Tartuce.
Mediação nos conflitos civis. Op. cit., página 278).
Assim, desde que bem conduzida, a mediação torna-se um poderoso instrumento de
resolução de conflitos, independentemente do resultado final dela, uma vez que “dá voz e vez
a protagonistas de conflitos dispostos a investir produtivamente em um novo roteiro para suas
histórias”. (Fernanda Tartuce. Mediação no Novo CPC: questionamentos reflexivos. Disponível
emhttp://www.fernandatartuce.com.br/wpontent/uploads/2016/02/Media%C3%A7%C3%A3o-
no-novo-CPC-Tartuce.pdf, página 16).
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 34
Se as partes se compuserem amigavelmente, será redigido o intitulado acordo pelo
mediador, com a participação efetiva dos próprios mediandos. Em ato seguinte, são feitas a
leitura, a assinatura e a homologação judicial.
Nos casos de mediação pré-processuais, os acordos serão homologados pelo Juiz
Coordenador do Cejusc e nas mediações realizadas em ações já propostas, os acordos serão
homologados pelo Juiz do feito, conforme artigo 39, § §1º e 2º do Provimento CSM nº
2348/2016. (Guia Prático de Mediação Judicial e Conciliação – TJSP, 4ª edição, 2019, página
18).
2º Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto 35
CONCLUSÃO
A função mais importante dos métodos autocompositivos, dentre eles, a mediação, é
educar e transformar as pessoas para que percebam que a melhor solução para os conflitos
advém delas próprias. Isso porque, conhecem as reais intenções, os interesses e os
sentimentos que envolvem cada questão, circunstâncias essas que não serão objeto de
análise pelo poder jurisdicional.
A mediação e a conciliação são práticas utilizadas nos tribunais e estimuladas pelos
magistrados a qualquer tempo no processo. Na verdade, o novo Código de Processo Civil traz
em inúmeros dispositivos formas consensuais de solução de conflitos, destacando-se o artigo
3º, parágrafo 2º, artigo 139, inciso V, artigo 334, artigo 335, artigo 359 e artigo 694.
Ademais, na mediação todos saem ganhando, situação essa possível em virtude da
mútua cooperação entre as partes, gerando a sensação de resultado justo da decisão, uma
vez que os envolvidos contribuem e participam do conteúdo decisório.
Infelizmente, em virtude da dinâmica do mundo atual, as pessoas estão cada vez
mais egocêntricas, artificiais e descomprometidas, somando-se a isso a dificuldade de
estabelecer vínculos duradouros, que são frágeis e fugazes.
É a chamada modernidade líquida, segundo o sociólogo Zygmunt Bauman, já que
nada é feito para durar. (Amor Líquido – Sobre a fragilidade dos laços humanos. Tradução de
Carlos Alberto Medeiros. São Paulo: Editora Saraiva, 2017.)
Em virtude disso, atos supostamente cotidianos geram conflitos, que por absoluta
falta ou falha de comunicação, acabam criando ainda mais desavenças.
Essa situação denomina-se espiral do conflito, na qual a causa originária,
progressivamente, torna-se secundária, visto que a preocupação é responder, de forma
imediata, a ação anterior que originou sua própria reação.
Portanto, a mediação apresenta-se como uma opção eficiente de solução de conflitos,
cujo principal objetivo é facilitar o diálogo entre as partes e, assim, restabelecer a harmonia e
a paz sociais.
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REFERÊNCIAS
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Forense Universitária, 1994.
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relacionamentos pessoais e profissionais. Tradução Mário Vilela. 4ª ed. São Paulo: Editora
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