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A CONSTRUÇÃO SOCIAL DA DESIGUALDADE ENTRE GÊNEROS ESUAS INFLUÊNCIAS
FAMILIARES: um estudo da percepção de pais e mães acerca daeducação dos filhos
THE SOCIAL CONSTRUCTION OF INEQUALITY BETWEEN GENDERS ANDTHEIR FAMILY INFLUENCES: a study of perception of parents about education of
children.
Fernanda Silva Sant’ana – fernandassantana@hotmail.com Letícia Cavina
Bispo – leticiacbispo@hotmail.comGraduandas do UNISALESIANO
Prof.ª Ma. Liara Rodrigues de Oliveira –liara_ro@hotmail.com
Docente do UNISALESIANO
RESUMOA presente pesquisa tem como objetivo a compreensão sobre o que os
pais e mães consideram importante em relação à questão de gênero na criação e educação de seus filhos e como estes influenciam no desenvolvimento, considerando que a definição de gênero depende de um conjunto de fatores como, os aspectos biológicos, psicológicos e sociais, essa constituição ocorre por meio do contato com a sociedade e cultura que determina assim os papeis sexuais. Realizou-se a pesquisa quantitativa- descritiva com 15 mães e 15 pais com idades entre 25 e 55 anos de idade. Para a coleta de dados foi utilizado um questionário com 25 questões sendo12 fechadas e 13 abertas, onde as respostas foram categorizadas e analisadas a partir da Psicologia Sócio- Histórica. Através dos discursos obtidos nas entrevistas foi possível identificar a transmissão de crenças que refletem a desigualdade entre os sexos e corroboram para a limitação da menina quanto a atividades ligadas à força, coragem, lógica e o menino quanto à sua sensibilidade, expressão de emoções.
Palavras-chave: Gênero. Sexualidade. Infância. Sócio-Histórica. Estereótipos
sexuais.
ABSTRACT
The current research aims at understanding what parents consider important in relation to the issue of gender in the creation and education of their children and how they influence development, considering that the definition of gender depends on a set of factors such as, the biological, psychological and social aspects, this constitution occurs through the contact with the society and culture that determines the sexual roles. The study quantitative-descriptive was carried out with 15 mothers and 15 fathers between 25 and 55 years old. For the data, a questionnaire was used with 25 questions, 12 of which were closed and 13 were open, which the answers
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were categorized and analyzed from Socio-Historical Psychology. Through the speeches obtained in the interviews, it was possible to identify the transmission of beliefs that reflect the inequality between the sexes and corroborate the limitation of the girl (females) in relation to activities related to strength, courage, logic and the boy your sensitivity,expression of emotions.Keywords: Gender. Sexuality. Infancy. Socio-Historica. Sexual stereotypes.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho teve como objetivo pesquisar e analisar os sentidos
presentes na concepção de mães e pais acerca da educação de seus filhos, no que
concerne aos valores incorporados nessa educação. As pesquisadoras, – partindo
do pressuposto de que a criação mediatizada no contexto familiar pode ser o maior
condutor de valores sociais e culturais, que por sua vez pode vir a fomentar e
reproduzir determinadas concepções estigmatizantes acerca da questão de gênero
– preocuparam-se em investigar e analisar quais valores estão presentes na
concepção de pais e mães no tocante a educação de seus filhos, de modo a
constatar a presença ou não de tais conteúdos que cristalizam e intensificam
desigualdades existentes na dicotomia homem- mulher na sociedade.
Os papeis sociais assumidos pelo homem e pela mulher – consolidados
histórica e culturalmente, – são transmitidos ao longo das gerações e reforçados
muitas vezes de forma acrítica e a-histórica, desconsiderando as novas
configurações sociais e familiares, bem como os novos papéis assumidos pelo
homem e pela mulher. A psicologia voltada a compreensão dos fenômenos
psíquicos, sociais, afetivos e comportamentais deve se movimentar na mesma
proporção em que essas transformações ocorrem. Por isso a inquietação das
pesquisadoras, no sentido de propor a compreensão e revisão de tais conceitos
presentes no contexto de socialização primária, tão responsável pela formação do
indivíduo, tal como preconiza Vigotsky (2000) ao se referir ao desenvolvimento
infantil e a aquisição da cultura e a aprendizagem, entende que o ser humano
necessita de condições adequadas para que possa se desenvolver em sua
integralidade, ou seja, o meio em que está inserido irá influenciar seu aprendizado e
desenvolvimento integral.
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Entende-se aqui como corrobora Louro (1997) a questão de gênero como
uma construção social, cultural, psíquica e biológica pelo qual todo indivíduo está
submetido. Desde a fase intrauterina é gerado as expectativas em relação ao sexo
do bebê e com isso a idealização dos estereótipos femininos e masculinos
(WHITAKER, 1988).
Todas essas ideias serão continuadamente transmitidas durante toda a vida
do indivíduo, inicialmente com a socialização primária que se dá com os pais –
família, secundariamente na escola, e ademais pela mídia e tantos outros meios aos
quais se é inserido e consequentemente influenciado.
O método utilizado foi o qualitativo, com a investigação por meio de
questionário semiestruturado, aplicado junto a quinze pais e quinze mães, com
idades entre 25 e 55 anos. O questionário continha 25 questões, sendo 12 fechadas
e 13 abertas, permitindo caracterizar os respondentes, bem como acessar os
sentidos presentes em suas respostas, analisando-as a luz da psicologia sócio-
histórica.
Assim, a pesquisa foi planejada tendo como referência teórica a abordagem
sócio-histórica da psicologia, que apresenta a concepção de sentidos e significados
que auxiliam a compreensão dos discursos dos indivíduos entrevistados,
considerando o processo de constituição da dimensão subjetiva da realidade,
empregando assim o sentido como descreve Vigotsky (2000) “uma formação
dinâmica, fluída, complexa, que tem várias zonas de estabilidade.” (p.165). E o
significado da palavra, que só se configura como um fenômeno de pensamento
quando este se vincula à palavra e assim substancializa-a (VYGOTSKY, 2000).
Por meio da coleta de dados com o questionário de entrevista
semiestruturado, foi possível constatar que os pais e as mães transmitem aos filhos
valores que refletem nas crianças e/ou adolescentes a disparidade entre os gêneros.
A proposta de intervenção portanto reside na necessidade de promoção de
diálogos acerca das discrepâncias encontradas e condicionadas para os sexos
(feminino-masculino), como isso determina as desigualdades no tocante ao gênero e
uma revisão de como está sendo articulado a educação das crianças e jovens, no
tocante as especificidades de cada gênero.
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1 GÊNERO E SEUS DESDOBRAMENTOS: DEFINIÇÃO E DIFERENCIAÇÃO
Os estudos acerca das representações de gênero vêm se modificando ao
longo da história, o conceito de sexismo e estereótipos sexuais reconhecem o
homem como forte e racional, enquanto as mulheres são vistas como incapazes
intelectualmente e pré-racional. Sendo anteriormente esta caracterização de gênero
uma condição vinculada apenas ao sexo biológico (NUNES; SILVA, 2000).
O conceito de gênero está vinculado à história do movimento feminista
contemporâneo, diversas ações isoladas ou coletivas contra a discriminação e
aviltação das mulheres foram vistas em alguns momentos históricos, contudo
quando se fala sobre o cenário do feminismo como movimento social organizado,
remete-se ao Ocidente, século XIX, acarretando mudanças (LOURO, 1997).
A mudança é vista na ampliação do contexto da caracterização dos gêneros,
onde ser homem e ser mulher ultrapassa os limites biológicos e passam a ser vistos
e estudados a partir da visão integral do ser humano, levando em conta o contexto
cultural e social pelo qual o indivíduo está inserido. Destarte, as variações de gênero
estão ligadas à como o indivíduo se sente, seja no masculino ou no feminino,
independentemente do seu sexo biológico e de seu genótipo, refere-se a uma
vivência psíquica (SERRANO, 2008).
1.1.1 Diferenciação de identidade de gênero e identidade sexual
O ser humano, visto como ser complexo e integral engloba em si uma série
de características, marcas e determinações, que podem ser de origem
biológica, social, cultural ou histórica.
O sexo pode ser entendido como a marca biológica do ser humano, a
caracterização genital e natural, aquilo que diferencia anatomicamente os corpos
femininos e masculinos (WEEKS, 2007).
A sexualidade é um conceito definido através da construção cultural de uma
significação pessoal e social de traço genital, que todos nós temos naturalmente,
característica inerente ao ser humano. Podendo ser definida como uma questão
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pessoal, social e política, construída ao longo de toda vida, de muitas maneiras
(LOURO, 2007).
Para Foucault (1988) a sexualidade é um dispositivo histórico, ou seja, é uma
invenção social construída a partir de múltiplos discursos sobre o sexo, esses
discursos regulam, normatizam, instauram saberes e produzem verdades.
1.2 Interface com a psicologia
A hierarquização entre os sexos que perdurou durante muito tempo na
literatura psicológica, encobriu as habilidades das mulheres em áreas muito
reconhecidas pela sociedade atual, estas não tiveram as mesmas condições para
elaborar suas capacidades, afetando suas habilidades emocionais e causando
desmotivação. Todos esses valores aqui destacados estão enraizados em nossa
sociedade e talvez possam perdurar ainda por algum tempo.
Destarte criam-se estereótipos sexuais, molda-se homens fortes e objetivos e
mulheres fracas e emotivas, esta falta de equidade poderá acarretar medo de
sucesso e déficit intelectual, devido a sociedade construir e instituir as diferenças de
gêneros (BARROSO, 1975).
É evidente a necessidade de construir uma ponte entre o feminino e
masculino, haja vista os modelos repressores engendrados em nossa cultura e a
falta de comunicação entre os gêneros.
2 PEDAGOGIAS DE GÊNERO E SUA INTERFACE PSICOLÓGICA
Vygotsky (2000) defende a teoria Sócio interacionista, segundo a qual o
desenvolvimento humano acontece por meio das relações de trocas, através de
processos de interação e mediação. O autor enfatiza o processo histórico- social e a
função da linguagem.
O desenvolvimento psicológico é produzido a partir das interações, estímulos
e aprendizados nos quais são proporcionados à criança (VYGOTSKY, 2000).
A socialização é entendida como o processo pelo qual todos os seres
humanos passam, onde neste ocorre a internalização de uma série de padrões,
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modelos, crenças, que nos moldam e nos constitui como integrantes de uma
determinada cultura (WHITAKER, 1988).
Bock et al. (1995) colabora para o pensamento acerca da socialização
primária que se dá através da interação social. A criança quando nasce começa a
pertencer a um mundo social dado, organizado, mas que não está acabado, onde a
permanente construção deste ocorre através dos grupos sociais.
A socialização primária acontece dentro do grupo familiar, ou seu substituto
como a creche, ou instituição de acolhimento.
Desde muito pequenas, as crianças dividem-se até mesmo na atividade
lúdica, meninas são a participarem de brincadeiras que descrevem o mundo
doméstico. Aos meninos, estes são encorajados a chutar bola, subir em árvores,
carrinhos e de lutar, influência que estimula as noções de espaço e direção.
Assim, a infância é marcada por ser um período castrador, tanto para
meninas quanto para os meninos (WHITAKER, 1988).
Em contrapartida, a escola tem a função de assegurar e estimular a
sexualidade “normal” dos alunos, sem que isso estimule-os ao interesse em
questões voltadas à sexualidade e sua prática (LOURO, 1997).
3 IMPACTOS SOCIAIS DA CONSTRUÇÃO DA DESIGUALDADE DE GÊNERO
Segundo os dados da Oxfam Brasil, 2017 - Oxford Committee for Famine
Relief (Comitê de Oxford de Combate à Fome) sobre rendimentos salariais dos
sexos masculinos e femininos mulheres com o terceiro grau completo ganham, em
média, R$ 1.338,00, ou seja, 66% do que ganham os homens com respectiva
escolaridade (R$ 2.023,00) (OXFAM, 2017).
O Brasil é o sétimo país do mundo com maiores taxas de feminicídio. Em
2012, o número de estupros foi superior a 50.000. Desta forma, de acordo com o
Relatório de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas o Brasil
ocupa a 85ª posição em desenvolvimento humano e desigualdade de gênero.
Desde os 5 anos de idade as meninas são induzidas a realizarem tarefas
domésticas, enquanto meninos não são estimuladas para estas atividades. Esta
diferença perdura durante a vida adulta, onde a média de horas dedicadas aos
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serviços do lar por mulheres acima de 16 anos é de 25 horas semanais e por
homens com a mesma faixa etária é de 10 horas (IPEA, 2011).
4 METODOLOGIA E DESENVOLVIMENTO DE PESQUISA
O projeto foi submetido na Plataforma Brasil atendendo a resolução 466 do
Ministério da saúde e aprovado pelo comitê de Ética e Pesquisa do Centro
Universitário Católico Salesiano Auxilium – Parecer nº 2.358.232 - data da relatoria:
30 de outubro de 2017. Todos os participantes tiveram ciência da pesquisa e
assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido de forma voluntária.
O tipo de pesquisa utilizado no estudo é a Pesquisa de Campo quantitativo-
descritiva que segundo Fonseca: “Caracteriza as investigações em que para além
da pesquisa bibliográfica e/ou documental, se coletam dados juntos com pessoas,
utilizando diversos tipos de pesquisa” (2002, p.32).
Para a coleta de dados utilizou-se uma entrevista semiestruturada, na qual há
uma combinação de 12 perguntas fechadas e 13 abertas em que o entrevistado
pode falar sobre o tema proposto sem respostas e exigências pré-estabelecidas
(MINAYO, 2000).
Os participantes da entrevista foram 15 pais entre 29 a 51 anos de idade e 15
mães entre 25 a 55 anos de idade de crianças e adolescentes que possuem entre 0
a 18 anos de idade da região de Lins/SP.
As pesquisadoras a partir do parecer favorável pelo Comitê de Ética
demarcaram as datas e os locais os quais as entrevistas foram aplicadas. Depois de
todas as dúvidas esclarecidas, os participantes assinaram o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE, autorizando a própria participação.
4.1 Análise de dados
Em 54% dos entrevistados é com a mãe que a criança passa sua maior parte
do tempo em contraposição do pai que aparece em 19% das respostas. Esse
resultado revela a predominância dos cuidados maternos para com os filhos.
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A partir do resultado de pesquisa foi possível constatar que em maioria – 73%
dos participantes acreditam que existem diferenças relacionadas a brinquedos para
meninos e meninas.
Ao serem questionados sobre as questões consideradas importantes na
educação de seus filhos, 80% dos participantes incluíram em suas respostas o item
valores morais, que pode ser entendido como o conceito do que é certo ou errado,
discernimento das ações e comportamentos que são aprendidos através da
socialização primária e secundária fundamentada na cultura pelo qual o indivíduo
está inserido (BOCK, 1995; VIGOTSKY, 2000).
Quando questionados sobre a existência de diferenças na criação de filhos
homens e mulheres, 16 participantes afirmaram haver diferenças justificadas por
considerarem desproporcional as características femininas das características
masculinas.
Esses resultados reforçam a ideia de Whitaker (1988) que retrata que é na
família que são construídos os primeiros arquétipos da dicotomia homem – mulher,
onde aprende-se a dar continuidade nos hábitos e costumes familiares.
É notável a questão de gênero nas concepções sobre o que é levado em
consideração para a diferenciação da educação de seus filhos (menino- menina),
pais e mães reproduzem a vinculação da menina à sensibilidade e repressão e o
menino quanto à violência e independência (WHITAKER, 1988).
Em contrapartida, 14 participantes relataram que não há diferença, haja vista
que a educação/criação dos filhos deve ser a mesma independente do sexo da
criança e/ou adolescente.
Indagados sobre as características próprias de ser homem percebeu-se
grande variedade nas respostas, sendo as mais citadas: não há diferença,
machismo, comentários sobre a submissão da mulher, força e provedor da casa.
Sobre as características consideradas femininas destacou-se: cuidadora do
lar, delicadeza, sensibilidade e aspectos fisiológicos como: menstruar e gerar filhos.
Cria-se homens fortes e objetivos e mulheres emotivas. Deste modo, estão
inseridos em uma sociedade construída a base de diferenças de gêneros, delega-se
determinadas distribuições de tarefas e habilidades cognitivas de maneira
preconceituosa. (BARROSO, 1975).
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Algumas respostas dos participantes evidenciam a diferenciação entre as
características consideradas próprias de cada gênero.
Quanto as vantagens em ser homem, oito participantes responderam que não
existem vantagens. A grande maioria não tinha uma opinião formada sobre essas
diferenças entre os gêneros, o que gerou respostas únicas e vagas.
Dentre as respostas coletadas, podem ser agrupadas em: ausência de
vantagens, área profissional e financeira, maior permissividade social, maior
liberdade, menor responsabilidade, menor preocupação com as tarefas domésticas.
Nove participantes responderam que a área profissional é uma das vantagens
do homem.
Dez participantes alegaram a ausência de vantagens em ser mulher.
Evidencia-se novamente as questões ligadas aos estereótipos sexuais onde
considera-se que mulheres necessitam de maior proteção e que elas tem vantagens
em relação aos homens pela existência de leis que estabelecem os direitos e
asseguram a segurança física e emocional da mulher (OXFAM, 2017).
Quando questionados sobre as desvantagens masculinas, destacam-se os 13
participantes que afirmaram a ausência de desvantagens em ser homem.
Logo, percebe-se a divisão de papéis entre os sexos feminino e masculino, e
que esta ocorre de forma impositiva e ao mesmo tempo sutil, ou seja, somos
inseridos nesses padrões e reproduzimos esses comportamentos muitas vezes,
automaticamente, sem passar por um crivo.
A respeito das desvantagens das mulheres, a maior parte das respostas
referem-se a área profissional, violência e o julgamento da sociedade.
Uma análise comparativa mostra notórias desvantagens apresentadas
relativas às mulheres com relação à sociedade, violência e principalmente o aspecto
profissional, se comparadas as desvantagens de ser homem, que predominou:
“nenhuma desvantagem”.
Todavia, meninos são estimulados a buscar conquistas e êxitos profissionais,
os jogos “masculinos” estimulam o raciocínio lógico, a competição e ambição
(CASTAÑEDA, 2006).
1
Entre os pais e mães entrevistados, 8 deles consideram que existam
facilidades para educar meninos/meninas. As explicações dadas referem-se aos
estereótipos designados à cada gênero.
Na menina busca-se desde seu nascimento repreender qualquer tipo ou
reflexo de agressividade, domestica-se para que elas sejam doces e passivas, assim
como compreensivas (WHITAKER, 1988).
A preocupação dos pais gerada pelas possibilidades mundo a fora pode ser
explicada hipoteticamente pelos altos índices em que as mulheres sofrem agressões
e são socialmente consideradas vulneráveis e frágeis, ou seja, passíveis de
violência e subservientes ao homem (OXFAM; WHITAKER, 1988).
As dificuldades apresentadas para educar meninos e meninas foram descritos
e alegados pelos pais e mãe de acordo com os estereótipos sexistas.
A existência de diferença entre brinquedos de meninas e meninos se fez
explícita, onde a maior parte afirmou que cores e brinquedos podem influenciar na
sexualidade de uma criança. 23 participantes disseram existir diferença e apenas 7
disseram que ambos podem brincar do que desejarem.
Praticamente desde o início de seu desenvolvimento há diferenças entre as
atividades lúdicas para meninas e meninos, eles são estimulados a correr, subir em
árvores, lutar, jogar futebol; as garotas ficam com as atividades manuais e delicadas,
referindo-se aos cuidados maternos e domésticos, sendo estas: casinha e
panelinhas. Cria-se o gênero masculino para o mundo e o feminino para a
domesticação. (WHITAKER,1988)
Os brinquedos e brincadeiras precisam ser compreendidos como um meio de
aprendizagem e diversão, no qual a sexualidade não entra em questão.
Vinte participantes disseram não haver diferenças entre os afazeres femininos
e masculinos. Porém, contrapondo as respostas coletadas nota-se maiores
estímulos aos cuidados domésticos para as meninas.
Whitaker (1988) corrobora:
Do meu ponto de vista, todo mundo deve ser educado para o lar. Afinal, um lar é formado, regra geral, por homens e mulheres. Mas não. Nesse importante segmento do nosso sistema educacional, as meninas aprendem conceitos de culinária e higiene (!), cuidados com o bebê, costura e economia doméstica. Quanto aos meninos, aprendem coisas realmente técnicas:
1
eletrônica, impressão, rudimentos de marcenaria, fotografia etc. A disciplina dos meninos chama-se artes industriais (p. 65).
Por inúmeras vezes, mulheres e homens estão inseridos em um mesmo
ambiente de trabalho, com diferentes significados simbólicos das funções que
realizam. Como no exemplo entre a aeromoça e o piloto de avião, ou aquelas que se
casam com políticos e recebem o título não possuindo um significado profissional.
(WHITAKER,1988)
CONCLUSÃO
Com o levantamento das respostas das pesquisas realizadas, em
consonância com as bibliografias referenciadas foi possível analisar e categorizar os
relatos de pais e mães dentro do contexto Sócio Histórico, que nos permitiu verificar
o que estes consideram importante em relação à questão de gênero na educação
dos filhos.
Foi constante dentre os relatos dos participantes o condicionamento da
fragmentação entre ser homem e ser mulher, caracterizando os estereótipos
sexistas, como os modelos femininos em que a mulher é considerada delicada,
frágil, maternal e cuidadora do lar, e os modelos masculinos sempre ligados à força,
coragem, agressividade, racionalidade.
Essa dicotomia ocorre de maneira muito natural e sutil, desde o momento da
concepção de um filho, onde destina-se aos meninos o uso de azul, brinquedos que
remetem a liberdade e aventuras, frases que estimulam sua sexualidade e sua força.
Para as meninas, os registros que começam a serem instalados é o de delicadeza,
vaidade e tarefas domésticas, sendo incentivadas a brincarem de ninar bonecas,
fazer comidinhas, usar e gostar do rosa e repreendidas se quiserem entender sua
sexualidade.
Todas essas reproduções impostas pela nossa sociedade implicam em uma
série de bloqueios e limitações para a sociedade em geral, haja vista, meninos e
meninas são acometidos pela caracterização desses estereótipos. De um lado,
meninas que não desenvolvem habilidades racionais e práticas, de outro lado,
meninos privados de sua sensibilidade, do afeto e do colorido.
1
Há um investimento excessivo para que sejamos moldados e assim então,
para que sejamos enquadrados no ideal de masculinidade e
feminilidade, mesmo que para isso seja necessário anular a singularidade e
subjetividade do sujeito. Pode-se constatar essa imposição quanto aos brinquedos
e brincadeiras infantis, onde, a boneca para um menino é enxergado para alguns
pais como uma ameaça a sexualidade heteronormativa. Em geral, pode-se
constatar que tanto os pais quanto as mães reproduzem o discurso sexista para
seus filhos, e que muitos deles quando indagados sobre as vantagens e
desvantagens de ser homem e de ser mulher tiveram dificuldades em caracterizar
esses tópicos, embora em outras questões deixaram evidentes a separação do que
é considerado próprio a cada gênero.
Entendemos, a condição entre os gêneros como um processo histórico e
social, no qual a autonomia da mulher só vai acontecer quando houver o
desprendimento do homem as suas resistências, ao sentir-se livre dos padrões
relacionados a sexualidade, ou seja, não haverá libertação a mulher enquanto o
homem ainda estiver preso a esses ideais, e o mesmo com o homem, que não
alcançará a mudança de comportamento enquanto as mulheres estiverem
reproduzindo e reafirmando essa condição.
Faz-se relevante a continuidade dos estudos científicos sociais que abordem
a temática da desigualdade entre os gêneros, sua reprodução e condicionamento,
para que possamos encontrar meios e alternativas para lidar com essa condição
estigmatizante e compreender de modo mais específico e prático como e o quanto
esses padrões sexistas interferem no desenvolvimento das capacidades
psicológicas, sociais, cognitivas e físicas tanto dos meninos quanto das meninas.
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