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Centro Universitrio de Braslia
Instituto CEUB de Pesquisa e Desenvolvimento - ICPD
CARLOS MAGNO DE SOUZA
NORMAS, PRINCPIOS, REGRAS E POSTULADOS NA JURISPRUDNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA
Braslia 2010
CARLOS MAGNO DE SOUZA
NORMAS, PRINCPIOS, REGRAS E POSTULADOS NA JURISPRUDNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA
Trabalho apresentado ao Centro Universitrio
de Braslia (UniCEUB/ICPD) como pr-
requisito para obteno de Certificado de Concluso de Curso de Ps-
graduao Lato Sensu em Direito Processual Civil Aplicado Atividade
Profissional.
Orientador: Prof. Dr. Rodrigo P. de Mello
Braslia 2010
CARLOS MAGNO DE SOUZA
NORMAS, PRINCPIOS, REGRAS E POSTULADOS NA JURISPRUDNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA
Trabalho apresentado ao Centro Universitrio de Braslia (UniCEUB/ICPD) como pr-requisito para a obteno de Certificado de Concluso de Curso de Ps-graduao Lato Sensu em Direito Processual Civil Aplicado Atividade Profissional.
Orientador: Prof. Dr. Rodrigo P. de Mello
Braslia, ___ de _____________ de 2010.
Banca Examinadora
_________________________________________________
Prof. Dr. Tnia Cristina Silva Cruz
_________________________________________________
Prof. Dr. Einstein Lincoln Borges Taquary
Ao Deus Eterno, Todo-Poderoso. Porque Nele, e por Ele, e para Ele, so todas as coisas.
Aos meus pais, irmos, minha famlia, enfim: pela f, amor e esperana.
minha esposa, Luciana, e aos meus filhos, Larissa e Alexandre, meus portos seguros.
AGRADECIMENTO(S) Ao Professor Dr. Rodrigo Pereira de Mello, por aceitar o desafio de orientar este trabalho, nas condies adversas em que foi proposto. Prof. Dr. Tnia Cruz, pelo incentivo.
Em memria de Diva Alves Barcelos, querida av, que partiu durante a execuo deste trabalho. Combateu o bom combate, acabou a carreira, guardou a f. Resta-lhe agora a coroa da justia, que o SENHOR, justo juiz, lhe dar naquele dia.
RESUMO
Normas, princpios, regras e postulados, como so apresentados na doutrina e como so atualmente aplicados na jurisprudncia do Superior Tribunal de Justia/STJ, constituem o tema deste trabalho, resultante do cotejo das concluses colhidas em pesquisa bibliogrfica confrontada a pesquisa jurisprudencial na base de dados do STJ. As fontes doutrinrias adotadas esto limitadas ao pensamento de Norberto Bobbio, Jos de Oliveira Ascenso e Humberto Bergmam vila, dado o carter destacvel da influncia destes autores no pensamento jus-filosfico nacional. O conceito de norma recebido como gnero, no obstante a viso contrria e bem fundamentada de Oliveira Ascenso. D-se especial destaque ao conceito de postulados normativos e, em decorrncia, doutrina de vila. A jurisprudncia citada, embora no esgote a matria, reflete com razovel segurana o entendimento atual da Corte que, nos termos da Constituio Federal, tem o papel de uniformizar a aplicao da legislao federal infraconstitucional. As concluses apontam para uma falta de preciso terminolgica e indcios de confuso conceitual com que o tema tratado pelo STJ.
Palavras-chave: Filosofia do direito. Interpretao jurdica. Normas. Princpios. Regras. Postulados. Doutrina. Jurisprudncia. Superior Tribunal de Justia.
ABSTRACT
Norms, principles, rules and postulates, as presented in the doctrine and how they are currently applied in the jurisprudence of the Superior Tribunal de Justia / STJ, are the subject of this work, resulting from the comparison of the conclusions drawn in research literature faced in jurisprudence from the STJ database. The sources of doctrine adopted are limited to the thought of Norberto Bobbio, Jos de Oliveira Ascenso and Humberto Bergmam Avila, given the remarkable character of the influence of these authors in the brazilian philosophical thought. The concept of norms is received as gender, despite the vision contrary and well-founded of Oliveira Ascenso. It gives special emphasis to the concept of normative postulates and, consequently, the doctrine of Avila. The case law cited, though not exhausted the subject, reflects with reasonable certainty the current understanding of the Court that under the Constitution, has the role of uniform application of federal law. The findings point to a lack of precise terminology and evidence of conceptual confusion with which the subject is treated by the STJ.
Key words: Philosophy of Right. Legal interpretation. Norms. Principles. Rules. Postulates. Doctrine. Jurisprudence. Superior Tribunal de Justia.
SUMRIO
INTRODUO 10
1 NORMAS, PRINCPIOS, REGRAS E POSTULADOS 12
1.1 Consideraes gerais 12
1.2 Norma jurdica no pensamento de Norberto Bobbio 13
1.3 Norma, regra e princpio no pensamento de Oliveira Ascenso 15
1.4 A tripartio normativa proposta por Humberto vila 22
2 NORMAS NA JURISPRUDNCIA DO STJ 29
2.1 Origem e papel do Superior Tribunal de Justia 29
2.2 Norma como prescrio de comportamento 30
2.3 Norma como gnero 33
2.4 Postulados normativos 35
2.4 Postulados normativos: um estudo de caso 37
CONCLUSO 43
REFERNCIAS 45
10
INTRODUO
A doutrina, como lhe prprio, diverge quanto aos conceitos de normas e
suas variantes (princpios, regras e, mais recentemente, postulados), deixando para
a jurisprudncia o papel de atuar como o fiel da balana, elegendo e aperfeioando
uma determinada tendncia. Ocorre que esse trabalho lento, gradual e
constantemente revisto, at em funo do contexto histrico e social, do qual no
pode, evidentemente, se divorciar.
Da ento o que se prope o presente esforo: incursionar na
jurisprudncia do Superior Tribunal de Justia para extrair de l uma melhor idia de
como se apresenta no atual contexto (o ps-positivismo jurdico) em que os
princpios de direito ganham papel de destaque.
O objetivo no oferecer um diagnstico completo, preciso, cirrgico.
Nem tampouco se deseja desqualificar a contribuio que a jurisprudncia do
Superior Tribunal de Justia prestou e presta ao pas. Antes, o que se buscou foi
proceder a uma anlise que permitisse delinear os pontos satisfatrios e apontar
aqueles que devem ser aperfeioados para que a jurisprudncia esteja altura da
Corte que a produz.
Para alcanar esses objetivos, procedeu-se inicialmente a uma reviso
doutrinria, por meio de pesquisa bibliogrfica, fundada nas correntes jusfilosficas
mais evidentes, ou com maior influncia, no meio jurdico nacional. Aps, cuidou-se
de extrair da base de dados que contm a jurisprudncia do Superior Tribunal de
Justia julgados em que os conceitos foram explcita ou implicitamente empregados,
para, da anlise de seus fundamentos, inferir o grau de exatido tcnica no emprego
conceitual.
Esperamos, assim, demonstrar se o atual estado da jurisprudncia
tecnicamente aceitvel, ou se os agentes que contribuem para a sua formao
devem se esmerar mais na fundamentao terica para que, como dito, esteja
altura da misso constitucional da Corte.
O presente trabalho foi ento estruturado em apenas dois captulos.
O primeiro captulo, terico, apresenta as principais correntes
jusfilosficas e as linhas gerais com que tratam o tema. Ali se encontram expostos,
11
em apertada sntese, o pensamento de Norberto Bobbio, Jos de Oliveira Ascenso
e Humberto Bergmam vila.
O segundo captulo, de nuance mais pragmtico, cuida dos julgados que
foram pinados, dentre os muitos extrados da considervel massa de dados que
contm a jurisprudncia do Superior Tribunal de Justia, os quais, avaliou-se,
mereciam ser analisados, porque tidos como representativos do estado atual com
que so tratados na corte de uniformizao os conceitos objeto deste estudo.
12
1 NORMAS, PRINCPIOS, REGRAS E POSTULADOS
1.1 Consideraes Gerais
O homem um ser social. Por suas inerentes limitaes e por sua
extrema fragilidade somente sobrevive com a assistncia de seus semelhantes, pelo
menos at e enquanto se perceba senhor de suas faculdades mentais.
Por isso, vive em grupos, construindo relaes mais ou menos
complexas, que variam no tempo e no espao, que se ajustam e se compem para
permitir no s a sobrevivncia do indivduo, mas tambm e principalmente da
comunidade em que est inserido.
A organizao destes grupos sociais evolui, numa perspectiva linear, de
parentes para famlias, destas para grupos de famlia, cls e grupos de cls, todos
marcados por evidentes relaes de parentesco (FERRAZ JR., 2003, p. 53-54),
como se pode inferir de modelos ainda hoje encontrveis, por exemplo, em
sociedades tribais indgenas.
Essa convivncia grupal, a par de todos os benefcios que proporciona,
traz tambm o campo propcio para ecloso de inevitveis conflitos, evidenciando a
necessidade de estabelecimento de parmetros e convenes tendentes a limitar as
liberdades individuais em nome de um bem maior: a conservao da unidade grupal.
A estes preceitos, modelos ou linhas de conduta, que se prestam
limitao dos comportamentos individuais, que se denominam normas
(GUIMARES, 2004, p.408), palavra derivada do grego gnorimos, que significa
esquadro, aferidor da pauta, ou padro, de conduta (SILVA, 2004, p.958).
Com o tempo, os agrupamentos foram se tornando maiores, e as
demandas sociais mais diversificadas, impondo-se gradativamente um
gerenciamento supra-individual das tenses, necessidade respondida com a
instituio do Estado, entidade concebida para assegurar a manuteno da ordem -
exercendo, tambm, a prestao jurisdicional - de modo a pacificar as relaes
13
sociais. Nesse estgio, a sociedade natural evoluiu para sociedade civil (BOBBIO et
all, 1977, Vol.2, p.1.206-1.211).
Embora vista assim a noo possa parecer quase intuitiva, o conceito de
norma e sua relao com os conceitos correlatos de princpios e regras rende, ainda
hoje, longas discusses doutrinrias.
1.2 Norma jurdica no pensamento de Norberto Bobbio
Norberto Bobbio (2005, p. 23-44) defende que o conceito de norma
jurdica no unvoco, podendo ser analisado por vrios enfoques, segundo a
corrente doutrinria a que se filie quem o examina. Reconhece que, embora seja
legtima a abordagem da experincia jurdica pela tica da normatizao, h outras
abordagens de tal experincia que consideram como elementos caractersticos fatos
diversos das regras de conduta. Assim, aponta a existncia de trs correntes: a
corrente institucionalista, a corrente relacionista e, por fim, a corrente normativista.
A corrente institucionalista defende a Teoria do Direito como Instituio
e tem como expoentes, dentre outros, o francs Maurice Hauriou e o italiano Santi
Romano. O conceito de direito, nessa teoria, se funda em trs elementos. Primeiro,
a interdependncia dos conceitos de direito e sociedade, no sentido de que um s
possvel em razo do outro. S h direito onde h sociedade e s h sociedade
onde h direito. Segundo, o conceito de direito pressupe uma ordem social, ou
seja, uma determinada disposio das coisas para a consecuo de um fim comum
e, em terceiro, de se considerar que esta ordem imposta pelo direito mais ampla
que aquela dada pela existncia, de modo que se constitui, por si s, em um ente.
Em outras palavras, o conceito de direito, nesta teoria, constitudo por trs
elementos: a) a sociedade, como suporte ftico da existncia do direito; b) a ordem,
como fim almejado por ele e c) a organizao, meio necessrio para realizao da
ordem (BOBBIO, 2005, p. 28-30). Destes trs elementos, a organizao seria o mais
importante ou, no dizer de Bobbio (2005, p. 30) a razo suficiente do direito, a razo
pela qual o direito aquilo que , e sem a qual no seria o que .
teoria institucionalista se reconhece o mrito de perceber o direito como
um conjunto de normas mais amplo que aquele emanado do prprio Estado, pois,
14
nela, nenhuma instituio pode ser criada sem a produo de regras, ainda que a
recproca no seja necessariamente verdadeira. Ademais, estas normas tm,
quando consideradas isoladamente, pesos distintos, formando, no seu conjunto, um
ordenamento, em que determinadas regras sujeitam-se a outras ditas superiores e
conservam sob seu domnio normas ditas subordinadas.
Para a corrente relacionista, o elemento caracterstico da experincia
jurdica a relao intersubjetiva. Essa doutrina sofreu severas crticas dos adeptos
da corrente institucionalista, em que pese o fato de, em ltima anlise, nascerem de
um mesmo fundamento, qual seja, o de que o direito um fenmeno social. A
diferena que para os institucionalistas o direito considerado um produto no dos
indivduos entre si, como querem os relacionistas, mas da sociedade em seu
complexo (BOBBIO, 2005, p.37).
Dentre os expoentes do relacionismo jurdico, Bobbio cita Immanuel Kant,
com sua Doutrina do Direito, de 1797, e o jurista italiano Giorgio Del Vecchio e do
pensamento destes dois jusfilsofos extrai argumentos para refutar as principais
crticas feitas pela escola institucionalista ao relacionismo (BOBBIO, 2005, p.38-40).
Para os adeptos do relacionismo, o elemento caracterstico da
experincia jurdica a relao jurdica, que se constitui entre dois sujeitos, dos
quais um titular de uma obrigao e o outro de um direito. Essa relao ,
portanto, intersubjetiva (do homem com seu semelhante), e diferente da moral
(relao subjetiva, do homem consigo mesmo) ou da economia (relao objetiva, do
homem com as coisas) (BOBBIO, 2005, p. 40-41).
Bobbio, porm, defende que a considerao do direito como relao
intersubjetiva no afasta a considerao normativa pois, sendo, em ltima anlise
uma relao direito-dever, enquanto confere direito a um, impe obrigao a outros
e esta obrigao no deriva seno de uma regra, que ordena ou probe. Visto assim,
o direito apenas o reflexo subjetivo de uma norma imperativa, seja ela positiva ou
negativa, por isso, a existncia e incidncia de uma norma que qualifica
determinada relao como jurdica e no vice-versa. Uma relao, enquanto no
regulada pelo direito apenas uma relao de fato. Conclui, assim, que a teoria
normativista, que percebe o direito como norma, no excluda pelas outras duas
correntes, antes, funciona como pressuposto de validade de ambas. A seu ver, as
teorias se integram, cada uma evidenciando um aspecto da experincia jurdica: a
15
teoria da relao, o aspecto da intersubjetividade; a da instituio, o da organizao
social; a normativista, o da regularidade (BOBBIO, 2005, p.44).
Assevera, entretanto, que, dos trs, o aspecto fundamental sempre o
aspecto normativo, visto que os primeiros so condies necessrias, mas a
regularidade (existncia e eficcia da regra) condio necessria e suficiente.
A norma, ento, poderia ser enunciada como prescrio de
comportamento, permissiva ou proibitiva, emanada de uma dada sociedade
organizada e destinada a assegurar mediante sano externa e institucionalizada
a consecuo de fins previamente definidos pela sociedade que a criou. (BOBBIO,
2005, p. 160). Esse conceito, entretanto, no unnime, como se ver.
1.3 Norma, regra e princpio no pensamento de Oliveira Ascenso
Jos de Oliveira Ascenso (1984, p. 11) considera que a norma no um
fenmeno da natureza, de ocorrncia espontnea, como a chuva ou os desastres
naturais. Trata-se, antes, de uma construo da mente humana. No , contudo,
construo do homem isoladamente, mas uma construo social, vez que a norma,
enquanto prescrio de comportamento, manifestada exteriormente, buscando
criar e manter uma determinada ordem social, necessria formao e
sobrevivncia da sociedade. Essa ordem, criada e mantida pelas normas, pode ser
percebida em qualquer ajuntamento humano, de qualquer lugar e em qualquer
tempo, mas s pode ser encontrada entre sociedades, sejam simples ou complexas,
nunca fora delas.
Por outro lado, e enquanto fenmeno social, as normas que criam e
sustentam a ordem social no so, exclusivamente, as positivadas no direito. Com
efeito, a ordem social j se apresentava com o mesmo significado antes do
aparecimento da escrita, e as instituies continuam hoje a operar a sua ao,
levem ou no formulao de regras escritas (ASCENSO, 1984, p.19).
A ordem social se desdobra em quatro aspectos: a ordem religiosa, a
ordem moral, a ordem de trato social e a ordem jurdica.
16
A ordem religiosa uma ordem normativa fundada nas relaes com
Deus. As normas que a compem tm um carter predominantemente intra-
individual, mas com repercusso na sociedade, na medida em que ordena preceitos
aos seus membros. Trata-se, tambm, de uma ordem instrumental, pois prepara, ou
torna possvel, uma ordem posterior, transcendental, que no deste mundo
(ASCENSO, 1984, p. 30).
A ordem moral uma ordem de condutas, que visa o aperfeioamento da
pessoa, dirigindo-a para o bem (ASCENSO, 1984, p.30). Tambm tem carter
intra-individual, destinando-se mais ao aperfeioamento do indivduo que ao da
organizao social. Todavia, tambm nelas se pode perceber um transbordamento
para a sociedade, pois a compreenso dos comportamentos sociais
necessariamente pressupe a compreenso das convices morais individuais.
A ordem do trato social, expresso com que Ascenso traduz o vocbulo
alemo sitte, , em ltima anlise, uma ordem ditada pelos usos e costumes,
entendidos como prticas rotineiras e usuais, reiteradamente observadas e dotadas
de um certo sentido de ser devido, j que a violao destes usos e costumes
provoca reprovao social, por vezes manifestada em forma de sanes sociais
difusas, como, por exemplo, a segregao do indivduo considerado inconveniente.
Com tudo isso, a principal caracterstica desta ordem ainda a ausncia
da coercibilidade, at porque no se observando estas regras, a convivncia torna-
se mais difcil, mas no se pe em causa a comunidade (ASCENSO, 1984, p 31).
O indivduo pode, em ltima anlise, optar por submeter-se regra social ou assumir
as conseqncias de sua violao.
A ordem jurdica, por sua vez, aquela voltada para os aspectos mais
importantes da convivncia social. expressa por normas jurdicas, tendentes
realizao de valores como a justia e a segurana.
As principais caractersticas desta ordem so imprescindibilidade e
universalidade.
A ordem jurdica imprescindvel formao e manuteno da
sociedade pois na sua ausncia tm-se o estado de anomia, que necessariamente
conduz ao caos e desordem, impedindo a sobrevivncia de qualquer sociedade.
17
Da, a sociedade s possvel enquanto sujeita ordem jurdica o direito que
sempre um fenmeno social: ubi ius, ibi societas.
A universalidade da norma jurdica pode ser facilmente percebida, pois se
verifica que qualquer ajuntamento humano constri esta ordem, cujo fim o bem
comum. O seu propsito ordenar os aspectos elementares da convivncia
humana, de modo a criar as condies exteriores que permitam a conservao da
sociedade e a realizao pessoal dos seus membros (ASCENSO, 1984, p. 184).
Da a mxima ubi societas, ibi ius. No haveria, por isso, uma s
sociedade que no tenha estabelecido tal ordem. Note-se que, contrariamente ao
que defende Norberto Bobbio, para Jos de Oliveira Ascenso o direito est no
mago de toda e qualquer ordem social.
As normas jurdicas so o meio pelo qual a ordem jurdica se expressa. O
conjunto de modos de formao e revelao das normas jurdicas designado por
fontes do direito. As principais fontes do direito so os costumes e a Lei.
Para Ascenso, a doutrina e a jurisprudncia no so propriamente fontes
do direito. A jurisprudncia porque, em ltima anlise, um meio em que se forma o
ambiente propcio para que as verdadeiras fontes do direito criem regras
(ASCENSO, 1984, p. 241) e a doutrina, em que pese colaborar poderosamente
para a vida jurdica e ainda que no se possa negar a sua autoridade, guarda com a
jurisprudncia o mesmo carter de meio para atuao das fontes autnticas
(costumes e lei) na formao de regras (ASCENSO, 1984, p. 256-257).
O costume, enquanto fonte autntica, formado por dois elementos: o
uso e a convico de obrigatoriedade. Por uso se deve entender a prtica social
reiterada (ASCENSO, 1984, p. 193). Quanto convico de obrigatoriedade,
apresenta-se como elemento da conscincia social, na medida em que os membros
de uma dada comunidade tm a conscincia do dever-ser, da prpria
obrigatoriedade, de tal modo que sua observncia no derive s da cortesia ou da
rotina.
Assim, o costume a prtica reiterada, com convico de
obrigatoriedade, que pode ser secundum legem (nas situaes em que lei e costume
coincidem por inteiro); praeter legem (quando o costume no contraria a lei, mas vai
18
alm dela, alcanando matria que a prpria lei no regula) ou contra legem (nas
situaes em que costume e lei esto em contradio).
A noo de lei, por sua vez, no facilmente determinvel, como bem
explica o jusfilsofo em extensa parte da sua obra (ASCENSO, 1984, p. 206-238).
Todavia, no se furta a esboar um conceito:
Lei um texto ou frmula significativo de uma ou mais regras jurdicas, emanado, com observncia das formas eventualmente estabelecidas, da autoridade competente para pautar critrios normativos de soluo de casos concretos. Se quisermos pressupor a noo de ato normativo, que no interessa diretamente quando se contemplam os modos de revelao de regras jurdicas, diremos simplesmente que lei o texto ou frmula, imposto atravs das formas do ato normativo, que contiver regras jurdicas. (ASCENSO, 1984, p. 208)
Outro trao caracterstico da Lei a generalidade de sua fora obrigatria
(ASCENSO, 1984, p. 238). Uma vez vigente, a lei impe-se igualmente a toda
sociedade, vinculando todos que se encontrem sob mesma situao jurdica.
Das fontes do direito - costumes ou leis - derivam regras jurdicas, que
so modos de expresso da ordem jurdica (ASCENSO, 1984, p. 422), formadas
por dois elementos: a previso e a estatuio.
Toda regra prev um acontecimento ou estado de coisas, (de onde a
previso), que constitui aquilo que o autor designa facti species, conceito no muito
distante do que, no direito ptrio, usualmente se designa por suporte ftico, podendo
incluir situaes ou fatos. Nesse sentido, apenas, se pode dizer que a regra
hipottica, pois sua aplicao s se verifica quando se produz um fato que
corresponda sua prpria previso (ASCENSO, 1984, p. 425). Logo, regras so
de aplicao condicionada, todavia, sempre que seus pressupostos so verificados,
tornam-se imperativas, pois estipulam conseqncias jurdicas para o caso de
ocorrncia ftica do acontecimento previsto. Eis a a estatuio.
Outras caractersticas apontadas pelo autor como comuns s regras so
a generalidade e a abstrao (ASCENSO, 1984, p. 428).
A noo de generalidade contrape-se idia de individualidade. Como a
norma necessariamente tpica, pressupe uma facti species que , por natureza,
heternoma, no se refere a pessoas determinadas, de onde a generalidade.
19
Quanto abstrao, os fatos e as situaes previstas de antemo pela
regra no esto previamente concretizadas (ASCENSO, 1984, p. 428). So
situaes futuras que podem vir ou no a ocorrer. Por isso, inerente a toda regra
certo grau de incerteza quanto concreo: cria-se a regra para fatos incertos, no
previamente conhecidos. Esta a caracterstica da abstrao, prpria da regra e
no encontrvel no conceito de norma jurdica defendido pelo autor, para quem uma
ordem emanada de autoridade competente determinando o recolhimento de todas
as armas em poder dos cidados norma, mas no regra, pois se trata de
situao preexistente e conhecida (ASCENSO, 1984, p. 430-431). No h,
portanto, abstrao. Regra haveria se a determinao obrigasse que todas as armas
que, doravante, viessem a ser adquiridas, fossem apresentadas autoridade
policial, pois nesta hiptese estaria presente a abstrao que deve caracterizar a
regra.
Enquanto a regra representa critrios de deciso de casos concretos
presentes ou futuros, sendo estabelecida para vigorar a posteriori, a norma, no
entender do autor, representa critrios materiais de apreciao e soluo de casos
concretos com aplicao pretrita ou presente (ASCENSO, 1984, p. 368), de onde
concluir que a norma propriamente dita, ao contrrio da regra, no caracterizada
pela abstrao (ASCENSO, 1984, p. 431).
Quanto aos princpios de direito, Ascenso os percebe como integrantes
de uma categoria qualitativamente diversa da regra, destinada a solucionar os casos
no debelados por esta. que a regra, por ser necessariamente tpica e referir-se a
situaes ou fatos especficos, torna-se limitada para abarcar todos os casos da
vida. Da decorrem as lacunas, algumas das quais podem ser superadas por
processos analgicos. Todavia, no se pode esperar que a integrao analgica
possa superar todas as lacunas. Sem fico, no podemos pretender que as
regras, quer expressas, quer induzidas, bastem para resolver todos os problemas
(ASCENSO, 1984, p. 368). Nesses casos, os princpios se apresentam como
salvaguarda da preocupao da ordem jurdica de no denegar soluo aos casos
concretos.
Para abranger os casos que no se deixam solucionar pelas regras, os
princpios devem ser concebidos como critrios formais de soluo e, neste ponto,
vo se diferenciar das normas, que so critrios materiais.
20
O problema que os critrios formais calam perante situaes de grande
importncia ou perante solues paralelamente enunciadas (ASCENSO, 1984, p.
173). O exemplo, apresentado pelo prprio jurista, inspirado na questo da
segregao racial: o lema separados, mas iguais pode satisfazer formalmente
justia (critrio formal), porm a sua essncia (critrio material) fere as disposies
bsicas do direito natural. Em outras palavras: formalmente a expresso no coloca
nenhum grupo em posio inferior, j que ressalta, pelo menos na forma, a
igualdade. Todavia, como explica o autor:
Essa igualdade satisfaria a justia. Todavia, no deixaria de haver violao do direito natural, pois mesmo assim uma discriminao racial violaria os princpios essenciais sobre a dignidade e a comunho humanas. (ASCENSO, 1984, p. 173)
Por outro lado, e em que pese o problema apresentado, critrios formais
tm seu valor.
que os critrios materiais so, por natureza, limitados e esgotam-se
com a analogia. Os critrios formais no. A sua maior amplitude permite que se
socorra deles para solucionar as lacunas deixadas pelas regras. Assim, os
princpios, enquanto critrios formais, no determinam diretamente condutas, mas
estabelecem critrios que permitem, mediante uma valorao, disciplinar as
condutas (ASCENSO, 1984, p. 370).
Os princpios so, ento, grandes orientaes que percorrem a ordem
jurdica e a tornam viva e que, por isso, tm a potencialidade de conduzir a novas
solues. Como componentes da lei, merecem o mesmo respeito e obrigatoriedade
da prpria lei (ASCENSO, 1984, p. 371).
Assim, para Jos de Oliveira Ascenso, os conceitos de norma, regra e
princpio so distintos.
A norma uma construo social, consistente em prescries de
comportamentos para os indivduos que integram determinado grupo (ASCENSO,
1984, p. 13-14). Cria ela uma ordem social, que se desdobra em ordem religiosa,
ordem moral, ordem de trato social e ordem jurdica (ASCENO, 1984, p. 30-32),
esta expressa por normas jurdicas, tendentes realizao de valores como a justia
e a segurana. A norma jurdica consiste em critrios materiais, limitados por
natureza e que se esgotam com a analogia, destinados apreciao e soluo de
21
casos concretos (ASCENSO, 1984, p. 368) com aplicao pretrita ou presente,
mas nunca futura, de onde se concluir que no caracterizada pela abstrao
(ASCENSO, 1984, p. 431).
As regras, por sua vez, so modos de expresso da ordem jurdica,
formadas por dois elementos: a previso e a estatuio (ASCENSO, 1984, p. 422).
Previso porque elege acontecimentos ou estados de coisas (facti species) a que
atribu (estatui) efeitos jurdicos (ASCENSO, 1984, p. 423). Nesse sentido, as
regras so hipotticas e de aplicao condicionada, tornando-se imperativas sempre
que seus pressupostos so verificados (ASCENSO, 1984, p. 425). Caracterizam-
se, ainda, pela generalidade, porque no se refere a pessoas determinadas
(ASCENSO, 1984, p. 429) e pela abstrao, porque dirigida para fatos futuros e
incertos, que podem ou no se tornarem reais (ASCENSO, 1984, p. 431). Esta
abstrao a principal diferena entre a norma e a regra.
Princpios de direito so grandes orientaes, critrios formais de
soluo (e no materiais, como as normas), consistentes em prescries
extremamente abstratas, integrantes de uma categoria qualitativamente diversa da
regra, destinada a solucionar os casos no debelados por ela (as lacunas),
permitindo ordem jurdica no denegar soluo a casos concretos (ASCENSO,
1984, p. 368-371).
Diz o autor:
Os princpios do direito so pois, antes de mais, princpios ou grandes orientaes da ordem positiva, que a percorrem e vivificam, e que tm assim a potencialidade de conduzir a novas solues. Porque a ordem jurdica no um amontoado casual de elementos, iluminada por grandes orientaes que lhe do o travejamento bsico e que, dissemos, como componentes da lei, merecem o mesmo respeito e obrigatoriedade da prpria lei. Assim, o princpio da boa f, o princpio da conservao dos negcios jurdicos e tantos outros que tem sido elaborados. Estes princpios no so normas, so princpios de carter formal. (ASCENSO, 1984, p. 371)
Pode-se concluir, ento, que na doutrina de Jos de Oliveira Ascenso,
norma, regra e princpio no se confundem: so modos diversos de expresso da
ordem jurdica, pelo que no h, entre eles, qualquer relao gnero/espcie.
22
1.4 A tripartio normativa proposta por Humberto vila.
Na doutrina nacional merece destaque a tese de Humberto Bergmann
vila, que rompe com a usual bipartio da norma em princpio e regra.
Embora no se preocupe tanto em estabelecer expressamente um
conceito para normas, o autor se prope a conservar a distino entre os conceitos
de princpios e regras, reestruturando-os sobre outras bases:
Este trabalho procura, pois, contribuir para uma melhor definio e aplicao dos princpios e das regras. Sua finalidade clara: manter a distino entre princpios e regras, mas estrutur-la sob fundamentos diversos dos comumente empregados pela doutrina. (VILA, 2009, p. 25)
A principal contribuio resultante de suas reflexes pode ser sintetizada
na tese de que princpios e regras so duas das trs espcies em que o gnero
norma pode ser dividido. A terceira so os postulados normativos (VILA, 2009, p.
27).
Para vila, a norma jurdica no pode ser confundida com o texto da lei.
Primeiro porque existem normas, a exemplo do princpio da segurana jurdica e da
certeza do direito, que no esto expressos nos textos legais. Depois, nem todo
texto legal traz em si uma norma, a exemplo do que ocorre com o prembulo da
Constituio Federal de 1988 (VILA, 2009, p. 30). Conclui, assim, no existir uma
correspondncia direta entre texto e norma (VILA, 2009, p. 31).
Diz ainda que a norma no resulta dos textos em si, mas de uma
construo derivada da interpretao sistemtica que o intrprete faz deles (VILA,
2009, p. 30) ou, em outras palavras, no norma o que est escrito, mas o
comando que se extrai ao interpretar o que foi escrito pelo legislador. Ressalva,
entretanto, que a construo de sentidos, a cargo do intrprete, no se constitui em
um poder ilimitado, j que h traos de significados mnimos incorporados ao uso
ordinrio ou tcnico da linguagem (VILA, 2009, p. 32).
Vista por este prisma, a interpretao que d origem ao sentido da
norma uma reconstruo, porque interpretar construir a partir de algo, por isso
23
significa reconstruir (VILA, 2009, p. 33) e, porque reconstruo, a qualificao
normativa, se regra ou se princpio, no pode ser estabelecida a priori: depender
em grande parte, da colaborao constitutiva do intrprete (VILA, 2009, p. 35).
No tocante aos princpios e regras, diz vila que o exame da doutrina
acerca da matria permite identificar quatro critrios usualmente empregados para
diferenciar tais conceitos: o carter hipottico-condicional, o modo final de aplicao,
o relacionamento (ou conflito) normativo e o fundamento axiolgico.
A distino pelo carter hipottico-condicional consiste em que as regras
so aplicadas ao modo se..., ento... e, por isso, possuem uma hiptese e uma
consequncia que predeterminam a deciso. Os princpios, por sua vez, se limitam a
indicar fundamentos para que o aplicador possa, em casos futuros, determinar a
regra aplicvel a casos concretos.
A distino pelo modo final de aplicao est em que as regras so
aplicadas de modo absoluto critrio tudo ou nada enquanto os princpios
comportam aplicao parcial critrio mais ou menos - vale dizer: so ponderados.
(VILA, 2009, p. 44). Todavia, vila demonstra, com fundamento em decises
judiciais, que o carter absoluto das regras comporta temperamentos, de modo que
as circunstncias do caso concreto tambm podem permitir alguma ponderao que
resulta, concretamente, na mitigao ou na supresso da incidncia da regra.
(VILA, 2009, p. 44-51).
O modo como os princpios e as regras se relacionam nas hipteses de
conflito normativo usualmente apontado como critrio distintivo entre as espcies
normativas. A diferena estaria em que a antinomia entre regras se constitui em
verdadeiro conflito, s se resolvendo com a declarao de nulidade de uma delas
(ou de ambas), ao passo em que a antinomia entre princpios to somente um
conflito aparente (VILA, 2009, p. 51).
Esse entendimento, contudo, criticado pelo autor, sob trs argumentos.
Alega, inicialmente, a ocorrncia de casos em que as regras entram em conflito sem
que percam, por isso, a validade, hipteses em que a antinomia se resolve por
ponderao (VILA, 2009, p. 52). Depois, diz que o relacionamento entre regras
gerais e regras excepcionais e entre princpios que se imbricam no diferente
quanto ponderao de valores em si, mas intensidade da apreciao que o
24
aplicador faz, menor na primeira hiptese, entre regras, que na segunda, entre
princpios. (VILA, 2009, p. 56).
Por fim, lembra que a ponderao de regras verificada na delimitao
de hipteses normativas semanticamente abertas, ou de conceitos jurdico -
polticos, como estado de direito, certeza do direito, democracia. (VILA, 2009, p.
57). Conclui, da, que a atividade de ponderao no exclusiva dos princpios, mas
inerente a qualquer norma. O tipo de ponderao que se faz que diverso.
(VILA, 2009, p. 63).
No que diz com a distino entre princpios e regras pelo fundamento
axiolgico, conclui:
Tanto as regras quanto os princpios possuem o mesmo contedo de dever-ser. A nica distino quanto determinao da prescrio de conduta que resulta da sua interpretao: os princpios no determinam diretamente (por isso prima-facie) a conduta a ser seguida, apenas estabelecem fins normativamente relevantes, cuja concretizao depende mais intensamente de um ato institucional de aplicao que dever encontrar o comportamento necessrio promoo do fim; as regras dependem de modo menos intenso de um ato institucional de aplicao nos casos normais, pois o comportamento j est previsto frontalmente pela norma. (VILA, 2009, p. 63)
vila, aps criticar esses critrios usuais, prope que a distino entre as
espcies normativas se d a partir da natureza do comportamento prescrito (VILA,
2009, p. 71-73); da natureza da justificao exigida (VILA, 2009, p. 73-76); e da
medida de contribuio para a tomada de deciso (VILA, 2009, p. 76-78).
Assim, quanto natureza do comportamento prescrito, as regras, porque
descrevem condutas a serem adotadas e tm como escopo obrigaes, permisses
e proibies, so normas imediatamente descritivas. J os princpios estabelecem
um estado de coisas, situaes qualificadas por determinadas qualidades que, para
se tornarem reais, requerem a adoo de certos comportamentos.
Por isso, enquanto princpios so normas-do-que-deve-ser, cujo
contedo se refere a um estado ideal de coisas, as regras so normas-do-que-
fazer, com contedo associado diretamente a aes (VILA, 2009, p. 72)
A distino pelo critrio da justificao exigida pode ser assim sintetizada:
25
A interpretao e a aplicao das regras exigem uma avaliao de correspondncia entre a construo conceitual dos fatos e a construo conceitual da norma e da finalidade que lhe d suporte, ao passo que a interpretao e a aplicao dos princpios demandam uma avaliao da correlao entre o estado de coisas posto como fim e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessria. (VILA, 2009, p. 73)
Para vila esse critrio enfoca a justificao necessria aplicao da
norma e, por isso, pode ser verificado a priori (VILA, 2009, p. 73). Afasta, ainda, a
diferenciao pelo modo de aplicao tudo ou nada para as regras e mais ou
menos para os princpios que s poderia ser verificado ao final (VILA, 2009, p.
73).
No que tange ao critrio da medida de contribuio para a deciso, os
princpios, por abrangerem apenas parcialmente os aspectos relevantes para uma
tomada de deciso, no tm a pretenso de gerar uma soluo especfica. Apenas
contribuem, a par de outras razes, para a tomada de deciso. As regras, por este
prisma, so normas preliminarmente decisivas e abarcantes (VILA, 2009, p. 76)
que, por pretenderem abranger todos os aspectos relevantes para a tomada de
deciso, tendem a apresentar solues especficas para conflitos entre razes.
Alm de princpios e regras que promovem a realizao de um estado
de coisas existem normas destinadas a disciplinar o modo como o dever de
promover um estado de coisas deve ser aplicado. Estas normas metanormas ou
normas de segundo grau situam-se num nvel diverso dos princpios e regras, pelo
que requerem definio distinta: os postulados normativos. (VILA, 2009, p. 124).
Quanto distino entre os conceitos de postulados, princpios e regras,
diz o autor:
Os postulados funcionam diferentemente dos princpios e das regras. A uma, porque no se situam no mesmo nvel: os princpios e as regras so normas objetos da aplicao; os postulados so normas que orientam a aplicao das outras. A duas, porque no possuem os mesmos destinatrios: os princpios e as regras so dirigidos primariamente ao poder pblico e aos contribuintes; os postulados so frontalmente dirigidos ao intrprete e ao aplicador do direito. A trs, porque no se relacionam da mesma forma com outras normas: os princpios e as regras, at porque se situam no mesmo nvel do objeto, implicam-se reciprocamente, quer de modo preliminarmente complementar (princpios), quer de modo preliminarmente decisivo (regras); os postulados, justamente porque se situam num metanvel,
26
orientam a aplicao dos princpios e das regras sem conflituosidade necessria com as outras normas. (VILA, 2009, p. 124)
Especificamente quanto diferena entre princpios e postulados, diz o
autor que se torna mais evidente quando se considera que aqueles, tomados como
normas que estabelecem um estado ideal de dever-ser, podem ser cumpridas em
vrios graus e admitem, por isso, ponderao. Vistas assim as coisas, os postulados
definitivamente no so princpios, pois no estabelecem um dever-ser ideal, no
admitem aplicao gradual e nem tampouco so sopesados (VILA, 2009, p. 125).
Por outro lado, os postulados tambm no so regras. Se as regras so
normas descritivas do comportamento a ser observado, devem ser cumpridas
integralmente e so excludas em caso de antinomia (VILA, 2009, p. 124-125), os
postulados no descrevem comportamentos, no so cumpridos integralmente e
no possvel exclu-los do ordenamento (VILA, 2009, p. 125).
Dessarte, os postulados no so nem princpios, nem regras. So normas
metdicas, que estruturam a aplicao de outras normas com rgida racionalidade
e assim, fornecem critrios bastante precisos para a aplicao do direito (VILA,
2009, p. 125).
Os postulados podem classificados em postulados hermenuticos e
postulados normativos aplicativos.
Postulados hermenuticos so aqueles destinados compreenso
interna e abstrata do ordenamento jurdico (VILA, 2009, p. 125) como, por
exemplo, o postulado da unidade do ordenamento jurdico (VILA, 2009, p. 126),
que admite ser dividido em postulado da coerncia (VILA, 2009, p. 126), que impe
ao intrprete da lei, dentre outros deveres, o de relacionar as normas com outras
que lhe sejam formal ou materialmente superiores, e o postulado da hierarquia
(VILA, 2009, p. 126), que reclama a compreenso do ordenamento como uma
estrutura escalonada de normas.
Postulados normativos aplicativos so condies que se aplicam para
solucionar questes que surgem com a aplicao do direito ao caso concreto
(VILA, 2009, p. 135). Resolvem, assim, antinomias contingentes, concretas e
externas, assim explicadas pelo autor:
27
Contingentes, em vez de necessrias, porque surgem ocasionalmente diante de cada caso; concretas, em vez de abstratas, porque surgem diante de um problema concreto; e externas, em vez de internas, porque no surgem em razo de conflitos internos ao ordenamento jurdico, mas decorrem de circunstncias externas a ele. (VILA, 2009, p. 135-136)
vila (2009, p. 136) apresenta como principais postulados aplicativos a
proporcionalidade, a razoabilidade e a proibio de excesso.
Os postulados normativos aplicativos, por seu turno, podem ser divididos em
duas categorias: postulados inespecficos e postulados especficos (VILA, 2009, p. 144-
145).
Os postulados inespecficos, ou incondicionais, so postulados
eminentemente formais, no sentido de que estabelecem vinculao entre elementos
e impem-lhes determinada relao sem, contudo, especificar quais so os
elementos e os critrios que devem orientar a relao entre eles (VILA, 2009, p.
144). O autor coloca nessa categoria os postulados da ponderao (VILA, 2009, p.
145-147), concordncia prtica (VILA, 2009, p. 147) e proibio de excesso
(VILA, 2009, p. 147-152).
Quanto aplicao dos postulados normativos aplicativos especficos (ou
condicionais), diz o autor que depende da existncia de determinados elementos e
pautada por determinados critrios (VILA, 2009, p. 144), e argumenta:
A igualdade somente aplicvel em situaes nas quais haja o relacionamento entre dois ou mais sujeitos em funo de um critrio discriminador que serve a alguma finalidade. Sua aplicabilidade condicionada existncia de elementos especficos (sujeitos, critrio de discrmen e finalidade). A razoabilidade somente aplicvel em situaes em que se manifeste um conflito entre o geral e o individual, entre a norma e a realidade por ela regulada, e entre um critrio e uma medida. Sua aplicabilidade condicionada existncia de elementos especficos (geral e individual, norma e realidade, critrio e medida). A proporcionalidade somente aplicvel nos casos em que exista uma relao de causalidade entre um meio e um fim. Sua aplicabilidade est condicionada existncia de elementos especficos (meio e fim). Nessas hipteses os postulados normativos exigem o relacionamento entre elementos especficos, com critrios que devem orientar a relao entre eles. Tambm so postulados normativos formais, mas relacionados a elementos com espcies determinadas... (VILA, 2009, p. 144-145).
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O autor dedica, ento, parte considervel da obra (p. 152 a 178) a explicar os
postulados especficos (igualdade, razoabilidade e proporcionalidade) descrevendo seus
aspectos gerais, o modo como se desdobram e se relacionam com outros postulados e
valores (razoabilidade como equidade ou como equivalncia, por exemplo), as muitas
facetas que podem assumir (relao entre meio e fim, inerente ao postulado da
proporcionalidade, por exemplo) descendo a detalhes que no nos pareceram teis
conduo deste trabalho, pelo que foram aqui dispensados.
Todavia, pode-se concluir, pelo exposto, que VILA admite norma como gnero
do qual so espcies os princpios e as regras (VILA, 2009, p. 35), afinando-se, no
ponto, com o pensamento de BOBBIO e, naturalmente, refutando as teses de
ASCENO para quem, como visto, no h qualquer relao entre tais conceitos.
Porm, ao acrescentar uma terceira espcie, VILA realmente rompe com
os fundamentos comumente empregados pela doutrina (VILA, 2009, p. 25) para
apresentar como postulados normativos (com caractersticas muito prprias) o que,
em geral, visto apenas como princpios jurdicos.
29
2 NORMAS NA JURISPRUDNCIA DO STJ.
2.1 Origem e papel do Superior Tribunal de Justia
O Superior Tribunal de Justia STJ relativamente novo e, embora
resulte de debates travados na segunda metade do Sculo XX, foi oficialmente
criado pela Constituio Federal de 1988, instalando-se no ano seguinte.
Numa perspectiva histrica, o STJ apresenta-se como sucedneo do
Tribunal Federal de Recursos TFR este criado em 17 de maio de 1947 com a
misso de funcionar como segunda instncia da Justia Federal.
Todavia, o expressivo volume de processos a cargo do Supremo Tribunal
Federal fomentou reflexes sobre a falta de um Tribunal que pudesse se dedicar ao
processamento e julgamento de questes infraconstitucionais, lacuna mais
evidenciada na medida em que as questes constitucionais ganhavam maior
relevncia e, por isso, reforava a necessidade de uma Suprema Corte dedicada
exclusivamente s normas contidas na Carta Poltica, mormente com a
intensificao do movimento pela redemocratizao, a partir de 1985.
O Superior Tribunal de Justia, em sua pgina na rede mundial de
computadores (www.stj.jus.br), assim registra esse momento de sua prpria histria:
A primeira iniciativa legal no sentido de se criar uma nova corte partiu dos prprios magistrados do TFR. A instituio, em 1976, mandou a minuta de um projeto de lei ao Congresso para a instituio do Supremo Tribunal de Justia, que seria a ltima instncia das leis infra-constitucionais do pas, deixando para o STF a prerrogativa exclusiva de controlar a constitucionalidade. Somente no recente perodo de redemocratizao, em 1985, a iniciativa ganhou fora. Atentos possibilidade de convocao de uma Assemblia Constituinte, os magistrados do TFR resolveram se mobilizar. No ano seguinte, com o incio dos trabalhos da Assemblia, o TFR formou uma comisso de magistrados capitaneada pelo ministro Antnio de Pdua Ribeiro para atuar junto aos parlamentares. O empenho dos magistrados resultou em uma verdadeira revoluo no Judicirio a partir da promulgao da Constituio, em 5 de outubro de 1988. Smbolo mor dessa transformao foi a criao do STJ, ltima instncia das leis infra constitucionais tanto no mbito da Justia Federal como no da estadual.
30
Com efeito, na reorganizao do Poder Judicirio Brasileiro, promovida
pela Constituio vigente, coube ao Superior Tribunal de Justia o papel de
uniformizador da interpretao da legislao federal infraconstitucional, atuando
como ltima instncia das causas que no estejam diretamente fundadas na
Constituio Federal, ou que sejam da competncia da Justia do Trabalho, da
Justia Militar ou da Justia Eleitoral. , assim, o rgo de convergncia da Justia
Federal e da Justia Comum, com jurisdio em todo o territrio nacional
(Constituio Federal, art. 105).
Com a reforma do Poder Judicirio, promovida pela Emenda
Constitucional 45, de 2005, o Superior Tribunal de Justia acrescentou sua
competncia o exame da concesso de cartas rogatrias e a homologao das
sentenas estrangeiras.
Dessarte, em que pese a importncia da sua competncia e o crescente
volume dos seus julgados, a pouca idade do Superior Tribunal de Justia e as
sucessivas alteraes de seu Regimento Interno constituem fundamentos para
afirmar que a jurisprudncia da Corte , ainda, incipiente.
Some-se a isso o fato de que o crescimento do volume de julgados no
se traduz, necessariamente, em melhor qualidade dos debates.
Ainda assim, o exame de alguns acrdos, tarefa de que agora se cuida,
permitir inferir as linhas gerais com que o Superior Tribunal de Justia delimita os
conceitos de norma, princpios e regras.
2.2 Norma como prescrio de comportamento
Como j se registrou no captulo anterior, para BOBBIO (2005, p. 160), a
norma pode ser enunciada como prescrio de comportamento, permissiva ou
proibitiva, emanada de uma dada sociedade organizada e destinada a assegurar
mediante sano externa e institucionalizada a consecuo de fins previamente
definidos pela sociedade que a criou.
Embora o conceito, como tambm j se disse, no seja unnime,
encontra eco nos julgados do Superior Tribunal de Justia.
31
No julgamento do Recurso Especial n. 1.042.760/PE, de que foi relator o
Ministro Napoleo Nunes Maia Filho, tem-se bom exemplo.
O contexto ftico do caso em tela pode ser assim resumido: ocorrendo
vaga para o cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco,
vaga esta destinada a auditores, elaborou o rgo lista trplice e a remeteu ao
Governador do Estado que, por sua vez, escolheu da lista um nome.
Sentindo-se prejudicados por no terem sido sequer includos na primeira
lista, dois outros auditores impetraram mandado de segurana, requerendo a
nulidade do processo para que nova lista fosse elaborada, respeitando o critrio de
antiguidade.
A Corte Especial do Tribunal pernambucano, por maioria de votos,
concedeu a ordem, nos termos em que pedida. Todavia, em razo de afastamentos
de uns e impedimentos de outros membros do rgo julgador, a sesso de
julgamento foi integrada por desembargadores convocados sem respeito ordem
decrescente de antiguidade, de modo que os 18 e 19 mais antigos foram
preteridos, convocando se outros, mais modernos.
O fato ensejou a oposio de embargos declaratrios, opostos pelo
auditor inicialmente escolhido e pelo Estado de Pernambuco, que alegaram omisso
quanto aplicao do artigo 99, 2, da Lei Orgnica da Magistratura Nacional -
LOMAN, ao fundamento de composio irregular da Corte Especial, embargos estes
rejeitados, por maioria de votos, em acrdo assim ementado:
Embargos de Declarao com efeitos infringentes. Recurso no conhecido tendo em vista a pretenso de se lhe atribuir efeitos modificativos. E sim, recebidos, to somente para os efeitos de prequestionamento. Isto porque, conforme jurisprudncia pacfica, firmada na Smula 169, do STJ e Smula 293, do STF, no se admitem embargos infringentes contra acrdo que por maioria de votos concede ou denega Segurana em processo de competncia originria do Tribunal; menos ainda, contra deciso em matria constitucional submetida ao Plenrio dos Tribunais.
Auditor e Estado interpuseram, ento, recursos especiais e
extraordinrios alegando ambos, nos especiais, preliminar de negativa de prestao
jurisdicional e, no mrito, violao ao art. 99 da LOMAN.
32
Essa a origem do aprofundado debate que marcou o julgamento do
Recurso Especial, prevalecendo, por apertada maioria de votos, o do Relator,
acompanhado pelos Ministros Jorge Mussi e Laurita Vaz. O Ministro Felix Fischer
conheceu do recurso e lhe deu provimento por fundamento diverso, enquanto o
Ministro Arnaldo Esteves Lima, em voto vencido, no conhecia do recurso.
Nesse contexto, o ncleo do Recurso Especial consistia na aplicao da
norma contida no artigo 99, 2, da Lei Orgnica da Magistratura Nacional
obrigando, naturalmente, ao exame de sua natureza.
No ponto, eis o que disse o Relator fez em seu voto:
13. Registro que, conforme adverte o eminente Professor NORBERTO BOBBIO, as normas jurdicas se endeream. de ordinrio, disciplina das condutas humanas (Teoria da Norma Jurdica, traduo de Fernando Pavan Baptista, So Paulo, EDIPRO, 2003, Cap. I), mas, desde o surgimento das estruturas reguladoras da vida social e dos seus vrios processos internos, se ps o problema das chamadas normas de organizao, que se imbricam, naturalmente, com aquelas referidas estruturas e os seus referidos processos, ora estabelecendo as competncias, ora normatizando as dinmicas dos procedimentos, da a diviso do mundo das normas (na expresso do celebrado mestre de Turim), em normas de conduta e normas de organizao. 14. Merece ressalto que a inobservncia das normas de ambas as naturezas acarreta sanes, ou seja, conseqncias que visam a reparao dos efeitos das infraes e tambm a sua preveno; essas infraes podem ser classificadas, (a) em primeiro lugar, como atos infracionais subjetivos, subordinadas ao Direito Sancionador, quando se trata de normas de condutas individuais, ou (b) como deformaes da organizao, subordinadas s regras do Direito Administrativo, determinantes da nulidade por vcio manifesto, com a possibilidade (ou no) de repetio do procedimento afetado. (grifo nosso)
de se notar, para o que importa neste trabalho, que o acrdo acolhe as
teses de que (a) norma comando destinado disciplina da conduta humana
projetando-se, portanto, para situaes futuras e incertas e (b) o conceito de norma
associado ao de sano, ambas, como j demonstrado, marcas do pensamento de
Norberto Bobbio, divorciando-se, no ponto, do conceito de ASCENSO,
demonstrado no captulo inicial, para quem consiste em critrios materiais, limitados
por natureza e que se esgotam com a analogia, destinados apreciao e soluo
de casos concretos com aplicao apenas pretrita ou presente, no caracterizada
pela abstrao.
33
2.3 Norma como gnero
Na base de dados que contm a jurisprudncia do Superior Tribunal de
Justia no h muitos julgados que permitam afirmar, com segurana, qual seja a
orientao da Corte quanto distino conceitual entre norma, princpio e regra.
No obstante, h dois acrdos, ambos mui recentes, julgados pela
Segunda Turma e da relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques, que
possibilitam algumas reflexes.
O primeiro, Embargos Declaratrios nos Embargos Declaratrios no
Recurso Especial n. 1.020.969/RJ, foi proferido em matria tributria e publicado no
Dirio da Justia Eletrnico do dia 5 de novembro de 2010.
Recebeu a seguinte ementa:
EMBARGOS DE DECLARAO EM RECURSO ESPECIAL. TRIBUTRIO. EXTINO DO CRDITO-PRMIO DE IPI. MATRIA DE ORDEM INFRACONSTITUCIONAL. AUSNCIA DE OMISSO, OBSCURIDADE OU CONTRADIO. REJEIO. PRETENSO INFRINGENTE. EMBARGOS MANIFESTAMENTE PROTELATRIOS. MULTA. ART. 538, PARGRAFO NICO, DO CPC. 1. No havendo omisso, obscuridade ou contradio, merecem ser rejeitados os embargos declaratrios interpostos pela empresa que tm o propsito infringente. 2. A extino do crdito-prmio de IPI foi operada pela ausncia de confirmao legal do benefcio, pois o art. 1, da Lei 8.402/92 no o abrangeu, muito embora tivesse tratado de um outro benefcio previsto no art. 5, do Decreto-Lei 491/69. A verificao da existncia ou no de lei que confirmaria o benefcio tema infraconstitucional, invocando-se apenas reflexamente a aplicao do art. 41, 1, do ADCT, por no poder o STJ, como qualquer outro tribunal, desconsiderar as normas (princpios e regras) constitucionais em vigor. Nesse sentido, se a invocao do art. 41, 1, do ADCT reflexa, o seu tratamento deriva do art. 257 do RISTJ e da Smula n. 456, do STF, no havendo que se falar em prequestionamento. 3. Hiptese de interposio dos segundos embargos de declarao veiculando matria idntica cujo mrito j foi decidido inclusive em sede de recurso representativo da controvrsia (REsp. N 1.129.971 -BA, Primeira Seo, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 24.2.2010). O intuito protelatrio do recurso assim se evidencia, o que faz incidir a norma do pargrafo nico do art. 538 do CPC. Aplicao de multa em 1% do valor da causa empresa recorrente. 4. Embargos de declarao rejeitados, com a fixao de multa. (grifo nosso)
34
O segundo, o Recurso Ordinrio em Mandado de Segurana n.
32.544/PB, tratava de Direito Administrativo concurso pblico publicado no Dirio
da Justia Eletrnico de 12 de novembro de 2010 foi assim ementado:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINRIO EM MANDADO DE SEGURANA. CONCURSO PBLICO. NOMEAO. PRAZO PARA POSSE. DILAO AT O TERMO FINAL DE VALIDADE DO CONCURSO PBLICO. CANDIDATO QUE, AO TEMPO DA POSSE PREVISTA, NO CUMPRE OS REQUISITOS PREVISTOS LEGALMENTE. PRINCPIO DA LEGALIDADE. INEXISTNCIA DE DIREITO LQIDO E CERTO. 1. Sustenta o recorrente, em sntese, que foi o nico candidato aprovado portador de deficincia, tendo direito lquido e certo a tomar posse apenas no trmino de validade do concurso pblico, cabendo, portanto, a dilao do prazo entre nomeao e posse a fim de que cumpra todos os requisitos previstos no edital (no caso concreto, na data agendada para posse no cargo de Analista Judicirio, o impetrante-recorrente no tinha concludo o curso de Direito). 2. Uma vez nomeado em obedincia ordem classificatria do certame, no existe norma jurdica (princpio ou regra) que assegure prolongamento da data da posse a fim de que o seja possibilitado ao candidato nomeado o cumprimento extemporneo dos requisitos previstos em lei e no edital. 3. Ao contrrio, os arts. 5, inc. II, e 37, caput, da Constituio da Repblica vigente impem ao particular e Administrao Pblica obedincia ao princpio da legalidade, sendo certo que, nomeado, o candidato que se inscreve no concurso pblico sabe que deve adimplir os requisitos para exerccio do cargo pblico na data da posse. 4. Neste sentido, tem-se o art. 16, 1, do Regulamento Administrativo do Tribunal de Justia da Paraba, segundo o qual "[a] posse ocorrer no prazo de trinta dias contados da publicao do ato de provimento, prorrogvel por mais trinta dias, a requerimento do interessado". No mesmo sentido, o art. 13, 2, da Lei Complementar n. 58/03, que traz o Estatuto dos Servidores Pblicos Civis da Paraba. 5. Recurso ordinrio em mandado de segurana no provido. (grifo nosso)
Estes julgados se destacam porque, na base de dados pesquisada -
acervo digital da jurisprudncia do Superior Tribunal de Justia - so os primeiros
que empregam a expresso norma jurdica (princpio ou regra).
No voto condutor do primeiro acrdo, o Ministro relator consignou:
Desta forma, a extino do crdito-prmio de IPI foi operada pela ausncia de confirmao legal do benefcio, pois o art. 1 da Lei 8.402/92 no o abrangeu, muito embora tivesse tratado de um outro benefcio previsto no art. 5, do Decreto-Lei 491/69. A verificao da existncia ou no de lei que confirmaria o benefcio sim tema
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infraconstitucional, invocando-se apenas reflexamente a aplicao do art. 41, 1, do ADCT, por no poder o STJ, como qualquer outro tribunal, desconsiderar as normas (princpios e regras) constitucionais em vigor. Se a invocao do art. 41, 1, do ADCT reflexa, o seu tratamento deriva do art. 257 do RISTJ e da Smula n. 456, do STF, no havendo que se falar em prequestionamento. (grifo nosso).
J no segundo acrdo, que tratou de matria bem diversa, registrou:
Penso que no assiste razo ao recorrente. Uma vez nomeado em obedincia ordem classificatria do certame, no existe norma jurdica (princpio ou regra) que assegure prolongamento da data da posse a fim de que o seja possibilitado ao candidato nomeado o cumprimento extemporneo dos requisitos previstos em lei e no edital. (grifo nosso).
de se notar que, em contextos completamente diversos, o Ministro
Relator, ainda que no tendo esse aspecto como o alvo da discusso, deixa entrever
que admite o conceito de norma como um gnero, do qual so espcies os
princpios e as regras.
No ponto, afasta-se o relator da doutrina de ASCENSO, para quem,
como visto, no h qualquer relao de continncia entre tais conceitos, e de VILA,
que defende uma terceira espcie, os postulados normativos.
Nota-se, portanto, maior afinidade do Ministro Campbell com a doutrina
de BOBBIO.
2.4 Postulados normativos
Ensina VILA que o gnero norma pode ser dividido em trs espcies:
princpios, regras e postulados normativos (VILA, 2009, p. 124-125).
Entretanto, se o argumento de pesquisa fornecido base de dados da
jurisprudncia do Superior tribunal de Justia for postulado$ ADJ normativo$, o
sistema retornar apenas oito decises monocrticas, mesmo quando programado
para buscar em todos os bancos disponveis. (dados relativos a 28 de novembro de
2010, data de fechamento desta pesquisa).
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Destes julgados, em sete a expresso consta de transcrio dos acrdos
recorridos, e no so objeto de deliberao dos Ministros relatores.
Em um deles, o Recurso Especial n. 928.136/MG, publicado no Dirio da
Justia Eletrnico do dia 6 de abril de 2010, a Relatora, Ministra Maria Thereza de
Assis Moura, emprega literalmente a expresso nas suas razes de decidir.
Trata-se de um Recurso Especial interposto pela Universidade Federal de
Minas Gerais contra acrdo do Tribunal Regional Federal da Primeira Regio, que
desobrigou professora universitria aposentada de devolver Unio, a ttulo de
indenizao, valores relativos a um curso de doutorado.
A deciso foi assim ementada:
RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. SERVIDOR PBLICO. LICENA CAPACITAO COM VENCIMENTOS. DOUTORADO. RETORNO S ATIVIDADES. APOSENTADORIA VOLUNTRIA ANTES DO TRMINO DO PRAZO ESTIPULADO PARA RETRIBUIO DOS SERVIOS, EM FUNO DO AFASTAMENTO REMUNERADO. NECESSIDADE DE RESSARCIR O ERRIO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
Todavia, o trecho da deciso em que se debate o tema foi assim redigido:
De outro lado, depreende-se da leitura dos autos que a recorrida adquiriu os requisitos necessrios para se aposentar. Porm, sua aposentadoria ocorreu no curso da contraprestao firmada com a Administrao Pblica, no sentido de empregar os conhecimentos adquiridos no estudo de doutoramento financiado com os proventos remuneratrios. Ainda que se trate de um direito incorporado ao seu patrimnio jurdico, podendo ser exercido a qualquer tempo, tal concretizao desse postulado normativo revela um prejuzo Administrao Pblica, no sentido de no contar mais com a contraprestao estabelecida nos moldes do acordo firmado sob gide da referncia legislativa em vigor. Dessa forma, em ateno aos princpios da moralidade e da boa-f no mbito do exerccio do servio pblico, a servidora ora recorrida, ainda que exera seu direito constitucional fruio de sua aposentadoria, deve indenizar a Universidade recorrente pelo perodo restante da contraprestao anteriormente estabelecida, uma vez que a finalidade do ato administrativo de custear os estudos de doutoramento no se limita ao usufruto prprio da recorrida, mas tambm necessidade de contraprestao perante a Administrao Pblica. (grifo nosso)
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Nota-se, da, que a expresso, tal qual foi empregada, apresenta-se como
sinnimo de direito incorporado a patrimnio jurdico e, portanto, muito distante do
significado a ela atribudo por VILA.
2.5 Postulados normativos: um estudo de caso.
No obstante a aparente divergncia no emprego do conceito, como
demonstrado no item anterior, possvel afirmar que o Superior Tribunal de Justia
emprega, na fundamentao de seus julgados, os postulados normativos aplicativos,
de modo que os limites delineados na doutrina de vila conforme referidos no item
1.4 do Captulo 1 deste trabalho podem ser identificados na formao/exposio
das razes que suportam as teses apresentadas pelos magistrados desta Corte.
A ttulo de exemplo, prope-se o exame do Recurso Especial n. 745.710,
do Rio de Janeiro, decidido pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justia, por
maioria de votos, vencido, inclusive, o relator original do feito, Ministro Csar Asfor
Rocha. Lavrou o acrdo, na forma regimental, o Ministro Jorge Scartezzini.
A matria posta em discusso orbitava em torno do valor fixado pelo
Tribunal de Justia do Estado do Rio de Janeiro a ttulo de indenizao por danos
morais decorrente de morte em acidente de trabalho, e a possibilidade de reviso
quantitativa de tal valor em sede de Recurso Especial.
No ponto, e para que se possa melhor aquilatar a importncia desse
julgado para o propsito do presente trabalho, de se registrar que o Superior
Tribunal de Justia tem por preceito geral no examinar, na via do recurso especial,
valores fixados a ttulo de indenizao por danos morais, a teor do enunciado n. 7
de sua Smula, que impede o revolvimento de questes fticas, salvo quando os
valores fixados so exorbitantes ou irrisrios.1
Essa premissa, por sinal, no escapou ao relator para o acrdo, Ministro
Jorge Scartezzini, que fez constar de seu voto:
De incio, como cedio, resta pacificado nesta e. Corte de Uniformizao que, somente ante evidente exagero ou manifesta irriso na fixao, pelas instncias ordinrias, das verbas
1 Smula n. 7 do STJ: A pretenso de simples reexame de prova no enseja Recurso Especial
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indenizatrias de danos morais, em flagrante vulnerao aos princpios da razoabilidade e da proporcionalidade, s regras de experincia e ao bom senso, decorrente da inobservncia de parmetros atinentes gravidade e repercusso da leso, ao grau de culpa e ao nvel socioeconmico das partes, admite-se a respectiva reviso por este e. Tribunal, sem que se cogite de mcula aos ditames da Smula 07.
Nesse caso, por conta das peculiaridades, o valor da indenizao se
tornou o objeto da discusso.
O contexto ftico que ensejou a ao pode ser deduzido da ementa do
acrdo recorrido, prolatado pelo Tribunal de Justia do Estado do Rio de Janeiro:
APELAO. Ao de reparao de danos decorrentes de acidente com vtima fatal bito que no decorreu da exploso e incndio em plataforma martima da r, mas, sim, da queda de baleeira ao mar, ocasionando a morte de trinta e seis ocupantes, dentre eles o filho dos autores. A causa eficiente do resultado foi a negligncia da Petrobrs na manuteno da embarcao, bem como na falta de treinamento para o abandono da plataforma e de pessoal martimo capacitado para avaliar o estado do material e dos equipamentos, notadamente os de acionamento do sistema de liberao da baleeira antes da descida. Culpa grave. Pensionamento indevido por no haver sido comprovada a dependncia econmica do falecido filho, que no se presume. Admissvel o dano moral, ainda que poca do acidente (1984) no houvesse previso legal. J ento, os Tribunais reconheciam o dano extrapatrimonial como fator determinante da responsabilidade civil e causa de indenizao reparadora. Discutia-se a possibilidade de cumulao de danos materiais e morais, sendo majoritrio o entendimento em favor da cumulao. Exasperao da verba reparatria global para o equivalente a 1.000 salrios, em atendimento ndole dplice (sano e compensao), conduta e situao econmica da r, forma trgica em que se deu a morte, durao do sofrimento e s condies sociais dos autores, sendo atribudo a cada um destes o correspondente a 500 salrios mnimos, isto , R$ 130.000,00. Juros de natureza simples, dado que no se pode cogitar de ilcito penal, mas civil, a contar da citao. Compensao do quantum recebido pelos autores de Pozos International, sociedade empresarial responsvel pela perfurao do poo petrolfero, com o que vierem a receber em decorrncia desta demanda, para que se evitem o bis in idem e o conseqente enriquecimento ilcito. Custas e verba honorria pela r, a teor do art. 21, pargrafo nico, do CPC. Mantida a condenao da Petrobrs como responsvel exclusiva pelo dano, o adesivo interposto por Pozos Perfuraes Ltda. resulta prejudicado. Provimento parcial dos primeiro e segundo recursos, prejudicado o terceiro.
O relator, Ministro Jorge Scartezzini, afastou as preliminares arguidas pela
recorrente (Petrobrs) e, no mrito, manteve o entendimento do Tribunal de origem
quanto a no restarem demonstrados os danos materiais.
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A excluso da culpa da recorrente foi igualmente afastada, ao seguinte
fundamento:
No tocante fixao da culpa da recorrente, as instncias ordinrias examinaram o conjunto probatrio e julgaram que a morte do filho dos autores decorreu da negligncia da PETROBRS na manuteno da baleeira, o que causou a morte do filho dos recorridos por afogamento. Consta do acrdo: "A relao de causa e efeito entre a morte e a conduta da Petrobrs est na falta de manuteno da baleeira. Estivesse esta em perfeitas condies de operao, no teria ocorrido a morte por afogamento. E tal falta configura culpa grave, visto que a explorao de petrleo em alto-mar no pode prescindir dos meios de salvatagem adequados, dada a absoluta falta de alternativa para acudir os embarcados em caso de acidentes, que, como notrio, no so incomuns em plataformas." No ponto, incide o verbete n. 7 da Smula/STJ.
Com isso, a discusso se limitou ao valor da indenizao por danos
morais, devida aos pais de um dos falecidos no acidente na plataforma martima de
explorao de petrleo. O Tribunal carioca arbitrou quinhentos salrios mnimos
para cada um dos autores (os pais), poca equivalente a duzentos e sessenta mil
reais, valor que a recorrente pretendia reduzir.
O relator originrio da causa, Ministro Csar Asfor Rocha, acolheu a
pretenso, nos seguintes termos:
Tenho que o valor da indenizao deve ser reduzido, porque o montante fixado na origem mostra-se excessivo, tendo em vista os padres de quantificao pelos quais essa Turma tem se orientado. Com efeito, em casos assemelhados, de indenizao por danos morais decorrentes de morte de filho, tm sido deferidos valores em torno de 500 salrios mnimos. Levando-se em conta as especiais circunstncias do caso, bem como os princpios de moderao e razoabilidade, o valor deve ser reduzido para R$ 175.000,00 para os pais. Assim, conheo em parte do recurso e, nessa extenso, dou-lhe provimento para reduzir o valor da indenizao por danos morais para R$ 175.000,00 (Cento e setenta e cinco mil reais) mais correes.
Portanto, o relator props um valor final equivalente a aproximadamente
dois teros do originalmente arbitrado, no que foi seguido pelo segundo vogal, o
Ministro Aldir Passarinho Jnior.
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O terceiro Ministro a votar, Jorge Scartezzini, inaugurou a divergncia, no
que foi seguido, aps sucessivos pedidos de vista, pelos Ministros Hlio Quaglia
Barbosa e Massami Uyeda.
No ponto, o voto afinal vencedor consignou:
Na assentada de 29.06.2006, o e. Min. Relator CESAR ASFOR ROCHA, no que foi acompanhado pelo e. Min. ALDIR PASSARINHO JUNIOR , conheceu parcialmente do recurso e, nesta extenso, deu-lhe provimento, para, em sntese: a) afastar a contrariedade aos arts. 3, 6, e 267, VI, do CPC, vez que, na esteira de inmeros precedentes deste e. Colegiado, os pais de vtima falecida em acidente laboral possuem legitimidade para pleitear indenizao por danos materiais e morais; b) concluir pela incidncia da Smula 07/STJ no concernente culpa grave - negligncia - da recorrente como determinante do evento danoso, fixada pelas instncias ordinrias mediante percuciente anlise do conjunto probatrio; c) reconhecer a ocorrncia de danos morais aos autores, presumindo-se, in re ipsa, o respectivo prejuzo; d) assentar o excesso do quantum indenizatrio dos danos morais - ante a orientao desta c. Quarta Turma que, em casos de morte de filho, defere valores globais aproximados de 500 salrios mnimos - e, na seqncia, reduzir o valor ao total de R$ 175.000,00 para os pais. Naquela oportunidade, quanto perquirio da exorbitncia e conseguinte reduo do quantum reparatrio, ousei divergir do entendimento de meus e. pares, no que, afinal, fui seguido pelos e. Min. HLIO QUAGLIA BARBOSA (15.08.2006) e MASSAMI UYEDA (05.12.2006), pelo que procedo lavratura do presente voto. De incio, como cedio, resta pacificado nesta e. Corte de Uniformizao que, somente ante evidente exagero ou manifesta irriso na fixao, pelas instncias ordinrias, das verbas indenizatrias de danos morais, em flagrante vulnerao aos princpios da razoabilidade e da proporcionalidade, s regras de experincia e ao bom senso, decorrente da inobservncia de parmetros atinentes gravidade e repercusso da leso, ao grau de culpa e ao nvel socioeconmico das partes, admite-se a respectiva reviso por este e. Tribunal, sem que se cogite de mcula aos ditames da Smula 07 (REsp ns 331.225/PB e 240.441/MG, Rel. Min. SLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA , DJU 04.02.2002 e 05.06.2000). De outra feita, consoante ressaltado pelo e. Min. Relator, tambm no se olvida a orientao desta c. Quarta Turma no sentido de que, fulcrado o pleito indenizatrio de danos morais em morte de parente, a respectiva condenao tem-se efetivado em valor equivalente a 500 salrios mnimos, a tanto no importando o nmero de integrantes do plo ativo da demanda. A propsito, confiram-se os precedentes oriundos dos seguintes julgamentos: REsp n 163.484/RJ, Rel. Min. RUY ROSADO DE AGUIAR , DJU 13.10.1998: "Deferimento de indenizao equivalente a 500 salrios mnimos, a ser repartida igualmente entre os beneficirios" (vivo e filhos da vtima); REsp n 41.614/SP, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO
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JUNIOR, DJU 11.12.2000: "Dano moral devido como compensao pela dor da perda e ausncia suportados pelos autores, no equivalente a 500 (quinhentos) salrios mnimos por cada uma das vtimas, a serem repartidos eqitativamente, consideradas as circunstncias dos autos" (beneficirios: vivo/pai e filhos/irmos das vtimas); AgRg Ag n 495.955/SP, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JUNIOR , DJU 25.02.2004: "(...) o valor da indenizao pelo dano moral, estabelecido no montante de 500 salrios mnimos, pela morte de filho em decorrncia de circunstncia trgica, no se configura abusivo" (beneficirio: pai da vtima); AgRg Ag n 627.816/MG, Rel. Min. FERNANDO GONALVES , DJU 07.03.2005: "o arbitramento da indenizao em comento no valor de 500 (quinhentos) salrios mnimos coloca-se em parmetros razoveis e conforme a jurisprudncia desta Corte" (beneficirios: viva e filhos da vtima); REsp n 714.869/SP, Rel. Min. CESAR ASFOR ROCHA, DJU 06.11.2006: "De fato, esta eg. Turma, usualmente, tem estipulado padres mais elevados no arbitramento de danos morais em situaes similares, em que ocorre morte de filho. (...) Assim, elevo o valor da indenizao para R$ 175.000,00 (cento e setenta e cinco mil reais), hoje correspondente a 500 (quinhentos) salrios mnimos" (beneficirio: pai da vtima). Pois bem, to-s neste ponto dissinto de tais orientaes, justamente por entender que, aos parmetros usualmente considerados aferio do excesso ou irriso no arbitramento do quantum indenizatrio de danos morais - gravidade e repercusso da leso, grau de culpa do ofensor, nvel socioeconmico das partes -, perfaz-se imprescindvel somar o nmero de lesados, a quantidade de integrantes do plo proponente da lide. Em outros termos, tenho que a consecuo da eqidade, a observncia das regras de experincia e bom senso, dos princpios da isonomia, razoabilidade e proporcionalidade quando da fixao da indenizao de danos morais no se coaduna com o desprezo do nmero de pessoas lesadas pela morte de parente. Nesta esteira, colaciono trecho de voto por mim proferido quando do julgamento, aos 28.06.2005, do REsp n 687.567/RS, Rel. Min. CESAR ASFOR ROCHA, DJU 13.03.2006: "Sr. Presidente, peo vnia aos que pensam de maneira contrria, mas, no caso concreto, entendo que os quinhentos salrios mnimos, que so o teto fixado no Tribunal, se aplicam a cada um e no ao total da famlia. No h como se fixar quinhentos salrios mnimos a ttulo de indenizao para uma famlia que se compe de dez pessoas e, em caso semelhante, fixar os mesmos quinhentos salrios para uma famlia que se compe de duas pessoas. Penso que o mximo de quinhentos salrios mnimos estabelecidos por esta Corte razovel na medida em que esse patamar seja aplicado com equidade, de acordo com cada caso concreto, utilizando-se como referncia, tambm, o nmero de lesados. Destarte, a uma empresa do porte econmico como, no caso, da recorrente, entendo que absolutamente razovel o valor fixado. Portanto, ouso divergir somente nessa parte."
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Destarte, em ateno s peculiaridades da espcie - entre outras, sofrimento extremo advindo da morte de filho em situao trgica; culpa - negligncia - exclusiva e grave da r, empresa de altssimo porte econmico, e a condio social dos autores -, tenho que a manuteno do quantum indenizatrio arbitrado pelo e. Tribunal a quo, em valor equivalente a 500 salrios mnimos para cada um dos autores, pais da vtima do acidente laboral, observa a eqidade e os princpios da isonomia, da razoabilidade e da proporcionalidade, no implicando em enriquecimento sem causa. Por tais fundamentos, no conheo do Recurso Especial. (Grifo do original)
Tem-se, ento, que estava em causa a vulnerao aos princpios da
razoabilidade e da proporcionalidade, s regras de experincia e ao bom senso,
decorrente da inobservncia de parmetros atinentes gravidade e repercusso
da leso, ao grau de culpa e ao nvel socioeconmico das partes e estes foram, em
sntese, os fundamentos do acrdo que, ao final, no conheceu do Recurso
Especial para manter ntegra a indenizao fixada pela segunda instncia.
Logo se v que o tratamento conceitual dado s normas (princpio, regras
e postulados) no tecnicamente preciso, aparentando uma miscelnea das
doutrinas de Bobbio (para quem razoabilidade e proporcionalidade so princpios)
Asceno (que afirma a inexistncia de correlao entre regras e princpios e admite
que regras podem ser retiradas da experincia e do bom senso) e vila (que
defende a construo da norma aplicvel a partir da realidade objetiva).
Ou, em outras palavras, nos fundamentos de um mesmo acrdo pode-se
perceber a mescla de vrias posies doutrinrias que, tomadas isoladamente,
seriam antagnicas (Bobbio e Ascenso, por exemplo).
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CONCLUSO
Mesmo sem a pretenso de ser exaustivo, o estudo permitiu compreender
que o tratamento dado ao conceito de norma na jurisprudncia do Superior Tribunal
de Justia ainda carece de maior rigor tcnico.
Os termos normas, princpios, regras e postulados em alguns casos
so empregados como sinnimos e, em outros, como conceitos distintos. Ora
guardam alguma relao entre si, ora so apresentados nos julgados como termos
sem qualquer correlao. H julgados em que se pode inferir a filiao conceitual a
determinada doutrina e outros tantos em que a confuso conceitual de tal ordem
que no se pode apontar uma tendncia dominante.
Dos tericos adotados na reviso doutrinria que deu suporte a este
trabalho, Bobbio o mais citado, mas nem por isso, o mais compreendido. Se o
mestre de Turim pudesse hoje visitar a jurisprudncia do STJ dificilmente a
consideraria filiada corrente institucionalista, corrente relacionista ou corrente
normativista. Provavelmente diria que, por se tratar de um Tribunal relativamente
novo, com uma jurisprudncia ainda em formao, no se posicionou
doutrinariamente.
Ascenso, ao seu turno, reforaria a convico de que a norma uma
construo da mente humana, e uma construo social (colegiada?). Pelo menos
o que se pode inferir da jurisprudncia da Corte, que fixou objetivamente o valor de
indenizao por danos morais pela perda de um filho em acidente em servio. De
resto, veria que nossa jurisprudncia pautada em normas (passado e presente) e
no em regras (presente e futuro) como seria de se esperar de um Tribunal
constitucionalmente destinado uniformizao da aplicao da legislao federal
infraconstitucional. Talvez este autor tenha percebido isso ainda ao tempo do extinto
Tribunal Federal de Recursos quando, na condio de professor do Curso de
Mestrado da Faculdade de Direito do Recife, redigiu a obra em que se baseou esta
pesquisa nela gravando, como dedicatria: A Angola, Minha Terra.
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Humberto vila no diria, mas bem poderia diz-lo, que o Superior
Tribunal de Justia aplica, sim, os postulados normativos aplicativos nos seus
julgados. S no tem conscincia disso.
Em qualquer caso, evidente a impreciso terminolgica, a ressaltar,
tambm, a necessidade de aprofundamento dos debates, para possibilitar um
tratamento mais uniforme do tema.
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REFERNCIAS
ASCENSO, Jos de Oliveira. O Direito. Introduo e Teoria Geral. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian, 1984. VILA, Humberto. Teoria dos Princpios: da definio aplicao dos princpios jurdicos. 10 ed. So Paulo: Malheiros, 2009. BOBBIO, Norberto; MATTUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionrio de Poltica. 10 ed. Braslia: UnB, 1977. BOBBIO, Norberto. Teoria da Norma Jurdica. 3ed. So Paulo: Edipro, 2005. BRASIL. Superior Tribunal de Justia. Embargos Declaratrios nos Embargos Declaratrios no Recurso Especial n. 1.020.969/RJ, Relator o Ministro Mauro Campbell Marques, Braslia, DF, 21 de outubro de 2010. DJe de 05/11/2010. BRASIL. Superior Tribunal de Justia. Recurso Especial n. 928.136/MG, Relatora a Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Braslia, DF, 5 de maro de 2010. DJe de 06/04/2008. BRASIL. Superior Tribunal de Justia. Recurso Especial n. 745.710/RJ, Relator para o acrdo o Ministro Jorge Scartezzini, 4a Turma, Braslia, DF, 5 de dezembro de 2006. Lex: jurisprudncia do STJ e Tribunais Regionais Federais, So Paulo, v. 213, p. 128. Revista dos Tribunais, So Paulo, v. 862, p. 116. DJ de 9/4/2006. BRASIL. Superior Tribunal de Justia. Recurso Especial n. 1.042.760/PE, Relator o Ministro Napoleo Nunes Maia Filho, 5 Turma, Braslia, DF, 13 de maio de 2008. DJe de 15/09/2008. BRASIL. Superior Tribunal de Justia. Recurso Ordinrio em Mandado de Segurana n. 32.544/PB, Relator o Ministro Mauro Campbell Marques, 2 Turma, Braslia, DF, 4 de novembro de 2010. DJe de 12/11/2010. FERRAZ JR., Trcio Sampaio. Introduo ao Estudo do Direito: Tcnica, deciso, dominao. 4ed. So Paulo: Atlas, 2003. GUIMARES, Deocleciano Torrieri. Dicionrio Tcnico Jurdico. 6 ed. So Paulo: Rideel, 2004. SILVA, De Plcido e. Vocabulrio jurdico. 25 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.
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