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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Produção Didático-Pedagógica
Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7Cadernos PDE
VOLU
ME I
I
MARIA LINDINALVA CUNHA E SILVA
A PEÇA TEATRAL COMO GÊNERO DISCURSIVO DA ESFERA LITERÁRIA
UNIDADE DIDÁTICA VIA PLANO DE TRABALHO DOCENTE
LONDRINA 2010
MARIA LINDINALVA CUNHA E SILVA
A PEÇA TEATRAL COMO GÊNERO DISCURSIVO DA ESFERA LITERÁRIA
Proposta de Material Didático apresentado ao Programa de Desenvolvimento Educacional do Estado do Paraná. Orientadora: Profª Drª. Alba Maria Perfeito
LONDRINA
2010
SUMÁRIO 1 IDENTIFICAÇÃO..........................................................................................................4
2 PRINCÍPIOS NORTEADORES ....................................................................................5
3 QUADRO SÍNTESE DA DIDÁTICA DO PTD.............................................................7
4 OBJETIVOS ...................................................................................................................8
5 PRÁTICA SOCIAL INICIAL........................................................................................9
5.1 ANÚNCIO DOS Conteúdos ................................................................................................9
5.2 VIVÊNCIA COTIDIANA DOS Conteúdos ..............................................................................9
5.3 DESAFIO : O QUE GOSTARIAM DE SABER A MAIS? ..............................................................10
6 PROBLEMATIZAÇÃO .................................................................................................11
6.1 Dimensão Conceitual .....................................................................................................11
6.2 Dimensão Estético-literária ............................................................................................11
6.3 Dimensão Histórico-cultural...........................................................................................11
6.4 Dimensão Social ............................................................................................................11
7 INSTRUMENTALIZAÇÃO...........................................................................................12
7.1 Lendo uma peça teatral...................................................................................................12
7.2 Analisando o contexto de produção ................................................................................17
7.3 Analisando o Conteúdo Temático...................................................................................19
7.4 Analisando o Arranjo Textual.........................................................................................19
7.5 Analisando as Marcas Linguístico-enunciativas..............................................................20
8 CATARSE .......................................................................................................................31
8.1 Elaborando uma Peça Teatral (curta) ..............................................................................31
8.2 Avaliação e auto-avaliação das dimensões trabalhadas ...................................................31
9 PRÁTICA SOCIAL FINAL ...........................................................................................32
9.1 Intenções e Ações sobre o conteúdo apreendido .............................................................32
REFERÊNCIAS.................................................................................................................33
ANEXOS ............................................................................................................................35
ANEXO A - Panorama Histórico do Teatro .........................................................................36
ANEXO B - A Construção Composicional do Texto Dramático...........................................37
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SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO
DIRETORIA DE POLÍTICAS E PROGRAMAS EDUCACIONAIS PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL
PROFESSOR PDE – TURMA 2009/2010
1 IDENTIFICAÇÃO
PROFESSOR PDE: MARIA LINDINALVA CUNHA E SILVA
ÁREA/DISCIPLINA PDE: LÍNGUA PORTUGUESA
NRE: LONDRINA
PROFESSOR ORIENTADOR IES: PROFª DRA. ALBA MARIA PERFEITO
ES VINCULADA: UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA (UEL)
ESCOLA DE IMPLEMENTAÇÃO: COLÉGIO ESTADUAL PROF. PAULO FREIRE
PÚBLICO ALVO: ALUNOS DO ENSINO MÉDIO
MATERIAL DIDÁTICO:
UNIDADE DIDÁTICA VIA PLANO DE TRABALHO DOCENTE: dirigido a
professores e alunos do Ensino Médio
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2 PRINCÍPIOS NORTEADORES
Associando nossa prática pedagógica às teorias da linguagem,
trabalharemos com os conceitos encontrados em Bakhtin que, conjuntamente a outros
teóricos, realiza estudos que contribuem à filosofia de uma linguagem fundamentada no
processo de interação. Segundo Geraldi (2004), em tal processo o sujeito é “produto da
cultura e de suas ações sobre ela”, ou seja, é pela interação verbal (oral ou escrita) que o ser
humano se desenvolve, compreende o mundo onde vive, agindo e interagindo com outro
sujeito.
Sob essa ótica, vemos a linguagem produzida por discursos. Interagir por
meio dela é realizar uma atividade discursiva significante, considerando o dito, a quem é dito,
de que forma é dita, em que contexto e circunstância houve a interlocução. Desta feita, a
produção de discursos se relaciona com outros produzidos anterior e posteriormente, estando
sempre em relação mútua.
Sabendo que os discursos se revelam por meio de textos, os quais se
organizam num dado gênero destacamos, para nosso material, a peça teatral (curta).
O presente material didático buscará contemplar atividades que revelem tal gênero como parte das práticas sociais a ser aprendido pelo aluno-sujeito nas práticas pedagógicas. Baseando-nos em Bakhtin (2000, p. 279), em Barbosa (2003, p. 12 e 13) e Rojo (2005, p.196), consideramos observar, nas práticas pedagógicas aspectos relativos:
ao contexto de produção - autor/enunciador, destinatário/interlocutor, finalidade, época e local de publicação e de circulação; ao conteúdo temático – objeto de sentido- temas avaliativamente manifestados por meio dos gêneros, explorando-se, assim, sobretudo na leitura, para além decodificação, a predição, inferência, críticas, criação de situações-problema, emoções suscitadas etc.; à construção, forma composicional – elementos de estrutura comunicativa e de significação e às marcas linguístico-enunciativas - de regularidade na construção composicional e linguística do gênero, veiculadas, dentre outras, pela expressividade do locutor (PERFEITO; OHUSCHI e BORGES, 2010, p. 55, 56).
O texto dramático é uma das possibilidades de organização do discurso na
esfera literária. Em sendo dessa esfera, tem a clara intenção de ser um canal de comunicação
entre um enunciador (dramaturgo) e um enunciatário (leitor). O diálogo é um de seus
elementos principais. É por meio dele que se configura a interação verbal, ou seja, a emissão
6
de enunciados dirigidos sempre a outro em condições específicas de comunicação, marcando
a construção de sentido.
No entrelace à mediação escolar, nos orientamos pela metodologia exposta
em Gasparin (2009) para um plano de trabalho docente (PTD,) visando ao processo teoria-
prática-teoria, isto porque “ninguém começa do zero”, mas precisa do professor para atingir
um segundo nível de conhecimento. Assim, ressaltamos a necessidade em se trabalhar o
gênero exposto, por meio do PTD, considerando que “a escola, em cada momento histórico,
constitui uma expressão e uma resposta à sociedade na qual está inserida.” (GASPARIN,
2009, p. 2)
Nessa percepção, trabalharemos considerando uma teoria dialética do
conhecimento, na qual aluno e professor são seres sociais e o conhecimento, objeto social
mediado pelo professor. Dessa forma, é importante instalar no ambiente escolar uma
predisposição em favor da aprendizagem. Para tanto, o professor precisa conhecer a prática
social do aluno acerca dos conteúdos curriculares e também suas relações sociais no todo.
Pois como postula Gasparin: “Conhecer essas duas dimensões do conteúdo constitui uma
forma básica de criar interesse por uma aprendizagem significativa do aluno e uma prática
docente também significativa” (GASPARIN, 2009, p.13)
Tendo em vista o exposto apresentamos um quadro síntese da didática que
permeará nosso material.
7
3 QUADRO DEMONSTRATIVO DO PLANO DE TRABALHO DOCENTE
PRÁTICA
( Zona de Desenvolvimento
Real)
TEORIA
(Zona de Desenvolvimento Proximal)
PRÁTICA
( Zona de Desenvolvimento
Potencial )
Prática social inicial do conteúdo
Problematização Instrumentalização Catarse Prática Social Final do
conteúdo 1)Apresentação do conteúdo;
2)Vivência cotidiana do conteúdo;
3) O que o aluno já sabe: visão da totalidade empírica.
Mobilização.
4) Desafio: o que gostaria de saber a mais
1)Identificação e discussão sobre os principais problemas postos pela prática social e pelo conteúdo;
2) Dimensões do conteúdo a serem trabalhadas.
1) Ações docentes e discentes para a construção do conhecimento.
Relação aluno x objeto do conhecimento através da mediação docente.
1)Elaboração teórica da síntese, da nova postura mental. Construção da nova totalidade concreta.
2) Expressão da síntese. Avaliação: deve atender às dimensões trabalhadas e aos objetivos.
1) Intenções do aluno. Manifestação da nova postura prática, da nova atitude sobre o conteúdo e da nova forma de agir.
2) Ações do aluno. Nova prática social do conteúdo.
Quadro 1: Demonstrativo do Plano de Trabalho Docente Fonte: Gasparin, 2002, adaptado por Alba Maria Perfeito (2010)
8
4 OBJETIVOS
Considerando nossa proposta inicial para intervenção, esse material didático
intenciona propiciar ao aluno atividades para uma reflexão acerca do gênero Peça Teatral
(curta) que contemple os elementos essenciais do texto dramático, de acordo com os conceitos
bakhtinianos transpostos por meio de um Plano de Trabalho Docente (PTD) que oriente o
professor no desenvolvimento de estudos com o gênero por nós pesquisado. Salientamos que
nosso intuito é contribuir com uma prática pedagógica mais próxima do cotidiano do aluno,
assim, tudo que expomos aqui deve ser encarado como uma possibilidade plausível de
modificações e adaptações ao gosto e necessidade de cada realidade escolar.
9
5 PRÁTICA SOCIAL INICIAL
5.1 ANÚNCIO DOS Conteúdos
Apresentam-se os conteúdos e pode fazer um registro escrito no quadro:
O gênero Peça teatral/ O Teatro;
As características da Peça Teatral;
Organização textual da Peça Teatral;
Marcas Linguísticas que contribuem para a construção de efeitos de
sentido do texto.
5.2 VIVÊNCIA COTIDIANA DOS CONTEÚDOS
Atividade oral para resgatar os conhecimentos prévios dos alunos:
Você sabe o que é uma Peça de teatro?
Peça teatral e texto dramático são a mesma coisa?
Você conhece alguma Peça Teatral?
Já leu ou assistiu? Qual/quais?
Onde você teve acesso a esses textos ou espetáculos?
Quem não tem experiência a esse respeito como imagina que seja?
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5.3 DESAFIO: O QUE GOSTARIAM DE SABER A MAIS?
O que vocês gostariam de saber a mais sobre esses textos?
O que vocês esperam aprender com nossos estudos?
11
6 PROBLEMATIZAÇÃO: LER OU ENCENAR? EIS A QUESTÃO.
Partindo desse questionamento motivador, levantar questões dentro do
conteúdo e tentar resolver os problemas indicados na prática social inicial, as atividades serão
de pesquisa em dicionário, enciclopédia, internet e registradas no caderno.
6.1 Dimensão Conceitual
Pesquise a importância do texto e da encenação do gênero Peça Teatral para
posterior discussão em sala. Registre sua pesquisa no seu caderno.
6.2 Dimensão Estético-literária
Considerando que o texto dramático pertence à esfera literária, qual sua
importância estética?
6.3 Dimensão Histórico-cultural
Qual é a origem do teatro/peça teatral?
Com o passar do tempo houve mudanças significativas desse gênero ou ele
continua intacto desde sua origem?
6.4 Dimensão Social
Qual é a função do gênero Peça Teatral?
Por que ele é importante na sociedade?
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7 INSTRUMENTALIZAÇÃO
Propor a leitura de uma peça teatral (curta), seguida de alguns questionamentos, os quais
deverão ser respondidos por escrito, pelos alunos, com a mediação do professor
http://textoscurtosparateatro.blogspot.com Acesso em 20/11/2010
7.1 Lendo uma peça teatral
SOMBRAS DA OUVIDOR
de Ruy Jobim Neto
(C) Ruy Jobim Neto
Personagens
ANTÔNIA GIBI
(a cena se passa no Rio de Janeiro, em 1907.
Um banco de jornaleiro - origem das atuais
bancas de revista - é localizado na Rua do
Ouvidor, no Centro da cidade. Um gibi – um moleque que vende jornais – está atento com o movimento até
que uma moça se aproxima)
GIBI (segue um pedestre
imaginário prum lado) VAI UMA GAZETA AÍ,
SEU MOÇO? (segue pro outro) VAI UMA
GAZETA AÍ, SEU PADRE? TEM TAMBÉM “O
MALHO”, TEM “O TICO-TICO” PRA PETIZADA!
(ANTONIA se aproxima, GIBI percebe) VAI UMA
GAZETA AÍ, SENHORITA?
ANTÔNIA
13
NÃO, MUITO
OBRIGADA... (tempo) POR FAVOR, EU
PODERIA ME SENTAR AQUI UM POUQUINHO?
GIBI
PODE, SIM...(percebe) VOSSUNCÊ TÁ BEM? (tempo) É QUE... O FISCAL DA GAZETA
PODE PASSAR POR AQUI E EU... É QUE ESSE BANCO NÃO É MEU! AQUI EU SÓ VENDO
JORNAL.
ANTÔNIA OH, NÃO, POR FAVOR! NÃO QUERO TE CAUSAR
PROBLEMA!
GIBI PODE FICAR,
SENHORITA! É QUE EU FALO MUITO, SABE?
VOSSUNCÊ NÃO LIGUE NÃO! EU FALO MUITO.
(tempo. A presença de ANTONIA torna-se algo
incômodo, pelo silêncio dela., GIBI
retorna aos clamores pela venda de jornal
aos transeuntes)
GIBI VAI UMA GAZETA AÍ, SEU MOÇO? Ô, SEU
MOÇO! O MOÇO COMPROU ONTEM AQUI
COMIGO, TÁ ALEMBRADO? (para
outra pessoa) VAI UMA GAZETA AÍ, DOUTOR? O
DOUTOR TÁ COM PRESSA! (olha para
ANTONIA)
ANTONIA
QUAL O SEU NOME?
GIBI MEU NOME É JOÃO
ETELVINO. MAS TODO MUNDO AQUI ME
CHAMA MESMO É DE “GIBI”.
ANTONIA
GIBI?
GIBI É. GIBI. GIBI POR
CAUSA QUE EU VENDO JORNAL AQUI, SABE? EU FICO GRITANDO ASSIM PRO POVO TODO: “QUER ‘A
GAZETA’ AÍ? VAI LEVAR ‘A GAZETA’? E ‘O MALHO’? HOJE TÁ
BOM!” (ri) O FISCAL DA GAZETA DIZ QUE EU TÔ
É...”ANUNCIANDO”! (ri) BONITO, NÉ?
“ANUNCIANDO”!...ATÉ ME ACHO IMPORTANTE!
ANTONIA MAS VOSMECÊ É IMPORTANTE!
GIBI
(ri) EU FICO ATÉ SEM JEITO! IMPORTANTE, EU? POBRE DE MIM.
ANTONIA
VOSMECÊ SABE LER?
GIBI NÃO.
ANTONIA
ENTÃO COMO É QUE VOSMECÊ SABE QUAL É
A GAZETA?
GIBI EU SOU ESPERTO, SABE? EU SEI POR
CAUSA DO DESENHO! (pega um jornal) TÁ
AQUI, Ó! ESSA AQUI É A GAZETA!..(tempo) OU
NÃO É?
ANTONIA CLARO QUE É!
GIBI
ENTÃO, VIU? E ASSIM EU PASSO O MEU DIA
VENDENDO TUDO QUANTO É JORNAL
AQUI, NESSE BANCO!
ANTONIA QUE BOM, FICO FELIZ.
GIBI
DESCULPA PERGUNTÁ, MAS A SENHORITA TÁ ESPERANDO ALGUÉM?
ANTONIA
(para si) NÃO... EU NÃO ESTOU ESPERANDO
NINGUÉM.
GIBI AH. (tempo, volta a anunciar jornal) VAI UMA GAZETA AÍ, SEU
PADRE? Ô, SEU PADRE...HOJE TÁ
BOM...
(tempo)
ANTONIA AQUI SEMPRE TEM
SOMBRA, NÉ?
GIBI NÃO, SENHORITA. NESSE BANCO, DE
MANHÃ, PEGA MUITO
14
SOL! E PÕE SOL, VIU? É SOL QUE NÃO ACABA MAIS! E QUANDO EU
VENHO LÁ DO CORTIÇO, LOGO DE
MANHÃ, BEM CEDINHO, QUE NEM SOL TEM, EU OLHO PRO CÉU! E AÍ VOSSUNCÊ OLHA PRO FIRMAMENTO ASSIM E DIZ: HOJE VAI FAZER
SOL. E FAZ, VIU? MUITO SOL!
ANTONIA
SEI. (repentinamente, ANTONIA chora,
respira, e depois se recompõe)
GIBI
EU FALEI ALGUMA COISA DE ERRADO,
SENHORITA? OLHA, ME DESCULPA AÍ, VIU? ME
DESCULPA DE CORAÇÃO! EU SOU
MESMO IGNORANTE, UM BURRO, SABE?
ANTONIA
NÃO... NÃO FOI NADA DO QUE VOSMECÊ
FALOU. ESTÁ TUDO BEM! É COISA MINHA,
AQUI!
GIBI É, PORQUE A GENTE FALA, FALA, O DIA
INTEIRO A GENTE FALA PRA MODO DE VENDÊ
JORNAL, VENDÊ GAZETA, SABE? E ASSIM A GENTE NÃO PERCEBE
AS COISA QUE FALA. DESCULPA AÍ VIU?
ANTONIA
ESTÁ TUDO BEM.
(impaciente) VOSMECÊ POR ACASO CONHECE AS PESSOAS AQUI, NA
OUVIDOR?
GIBI AH, MAS TODO MUNDO
AQUI, VIU? TODO MUNDO! CONHEÇO UM
POR UM, UMA POR UMA! SEI ATÉ QUEM
NÃO É DAQUI DA CIDADE, SABE? (ri) TEM
ATÉ OS MARINHEIRO GRADUADO... VEM
ALEMÃO, VEM INGLÊS... GENTE DE TUDO
QUANTO É JEITO, DO ESTRANGEIRO... ESSES
SÓ NÃO COMPRA JORNAL AQUI COMIGO PORQUE NÃO ENTENDE AS LETRA! (ri) PARECE
EU! (ri) BANDO DE BURRO! (ri)
ANTONIA
NÃO É ISSO NÃO...
GIBI NÃO?
ANTONIA
EU IA PERGUNTAR SE VOSMECÊ CONHECE UMA CERTA PESSOA.
GIBI
SE EU CONHEÇO TODO MUNDO... PODE
PERGUNTAR!
ANTONIA É UM MOÇO.
GIBI
AH, ENTÃO A SENHORITA TÁ
ESPERANDO ALGUÉM MESMO, NÉ?
ANTONIA
SIM... É UM ADVOGADO QUE TEM ESCRITÓRIO
LOGO ALI, NA AVENIDA CENTRAL. ELE SEMPRE
FREQUENTA A COLOMBO...
GIBI
A CONFEITARIA CHIQUE?
ANTONIA
É. (ri) VOSMECÊ CONHECE MESMO.
GIBI
SÓ NÃO ME CONVIDARAM PRA
COMER LÁ NESSA TAL COLOMBO AÍ...
ANTONIA
(ri) ESSE MOÇO... (tom) EU ESTOU
CARREGANDO UM FILHO DELE.
(tempo)
GIBI
COMO É QUE EU POSSO AJUDAR?
ANTONIA
EU SÓ PRECISO CONVERSAR COM ELE.
GIBI
EU CONHEÇO MUITA GENTE, MAS NÃO SEI QUEM TÁ PRENHE DE
QUEM.
ANTONIA (ri) ESQUECE O QUE EU DISSE. É COISA MINHA. SOU EU COM MINHAS
SOMBRAS.
15
GIBI SOMBRAS? AMANHÃ VAI FAZER SOL DE NOVO.
FOI O QUE EU VI OLHANDO PRO CÉU. VAI TER SOMBRA POR
ESSA HORA AQUI, TAMBÉM.
ANTONIA
EU PODERIA DEIXAR UM RECADO!
GIBI
PODE CONFIAR EM MIM, EU NÃO SEI LER! (ri, olha e berra para o
entorno) EI, VAI UMA GAZETA AÍ? UM
“MALHO”? UM JORNAL DO COMMÉRCIO?
ANTONIA
QUANTAS IGREJAS TÊM AQUI NO RIO?
GIBI
SEI NÃO, SENHORITA! TEM UM MONTE,
AGORA, QUAL É QUAL, NÃO SEI ATINAR!
ANTONIA
E SE EU ESPERAR ESSE MOÇO PRA ME CASAR
COM ELE NUMA IGREJA?
GIBI A SENHORITA TÁ
PERGUNTANDO ISSO PRA EU?
ANTONIA
EU POSSO ENFEITAR TUDO COM ROSA VERMELHA, BEM
RUBRA, DA COR DOS CABELOS DA FILHINHA
QUE VOU TER COM ELE. GIBI
É MENINA, É?
ANTONIA É. E VAI SE CHAMAR MARIA. PARA TER
BASTANTE ESPERANÇA NESSA VIDA.
GIBI
QUE NEM NOSSA SENHORA?
ANTONIA
QUE NEM NOSSA SENHORA.
GIBI
EU ACHO QUE SEI DE UMA IGREJA DE NOSSA
SENHORA...
ANTONIA EU TAMBÉM SEI. UMA LINDA. EU IA SEMPRE
COM MINHA MÃE E MEU PAI. E EU VOU
ENFEITAR ELA COM ESSAS ROSAS VERMELHAS... VERMELHAS E
BRANCAS...VAI SER UM DIA ENSOLARADO, QUE
NEM HOJE, ASSIM.
GIBI VOSSUNCÊ VAI ME
CONVIDAR?
ANTONIA CLARO! MAS O FISCAL DA GAZETA NÃO VAI
BRIGAR COM VOSMECÊ?
GIBI A GENTE DÁ UM JEITO. EU QUERO MUITO VER
VOSSUNCÊ ASSIM, SORRINDO.
ANTONIA
EU ME CHAMO ANTONIA.
GIBI
EU NUNCA VI VOSSUNCÊ AQUI ANTES.
POR QUÊ?
ANTONIA EU NÃO SABIA QUE IA
ME CASAR!
GIBI E NEM QUE TAVA
PRENHE DA MARIA.
ANTONIA É. POR ISSO EU CAREÇO
DA AJUDA DE VOSMECÊ.
GIBI
MAS NÃO SEI O QUE FAZER. EU SÓ VENDO JORNAL AQUI, MAIS
NADA. NEM DESSA VIDA EU SEI.
ANTONIA
ELE, COM CERTEZA, VAI PASSAR AQUI, POR ESSE BANCO, VAI COMPRAR JORNAL, AINDA HOJE.
GIBI
E COMO ELE É?
ANTONIA COMO ELE É? (sorri)
ELE TEM O SORRISO DE UM ANJO. VOSMECÊ JÁ
VIU UM ANJO, GIBI?
GIBI UM ANJO? JÁ. NASCE
MUITO LÁ NO CORTIÇO. TODO DIA.
ANTONIA
E ELE É ASSIM. UM
16
ANJO. QUANDO VOCÊ ENXERGAR UM, ME
AVISA.
GIBI ELE TEM ASA?
ANTONIA
NÃO.
GIBI ENTÃO FICA DIFÍCIL.
ANTONIA
(ri) ELE TEM UM JEITO DE FALAR... UM JEITO
DE OLHAR PRA VOSMECÊ NOS OLHOS...
UM JEITO DE TOCAR TUA MÃO QUE
NINGUÉM MAIS TEM.
GIBI VOSSUNCÊ É BONITA
QUANDO RI. QUE PENA QUE EU SOU ASSIM, TÃO PEQUENO, TÃO
NOVINHO... TÃO GIBI.
ANTONIA ME AJUDA, VAI!
GIBI
E O QUE EU FAÇO? SAIO BERRANDO POR AÍ: “EI, TEM UM ANJO AÍ? TEM
UM ANJO VOANDO AQUI NA RUA DO OUVIDOR?” VÃO DIZER QUE VARIEI
DAS IDÉIAS.
ANTONIA EU BERRO JUNTO COM
VOSMECÊ!
GIBI AÍ VOU PERDER MEU BANCO. ELE É MEU
SUSTENTO, SENHORITA!
ANTONIA
MAS EU PRECISO ME CASAR!
GIBI
E EU PRECISO DO BANCO PRA VENDER
JORNAL! OU VOSSUNCÊ NÃO TÁ VENDO?
ANTONIA
E VOSMECÊ NÃO QUER IR NO MEU
CASAMENTO, NA IGREJA DE NOSSA
SENHORA?
GIBI QUERER EU QUERO,
MAS NÃO SEI NEM POR ONDE COMEÇAR!
ANTONIA
PODE DIZER PRA ELE QUE EU MORRI, GIBI. VOSMECÊ DIZ ASSIM
PRA ELE?
GIBI DEUS ME LIVRE E
GUARDE! EU NÃO SEI DIZER ESSAS COISAS,
NÃO!
ANTONIA VOSMECÊ PODE DIZER QUE ME CONHECEU,
QUE ME ACHOU BONITA QUANDO EU DOU UMA
RISADA.
GIBI E VOU DIZER O QUÊ DA
MARIA?
ANTONIA QUE ELA VAI SER UMA MULHER LINDA, ASSIM COMO A MÃE DELA.
GIBI VOSSUNCÊ TÁ ME METENDO MEDO.
ANTONIA
QUE VAMOS SER MUITO FELIZES JUNTOS.
GIBI SEI.
ANTONIA
QUE ELE SEMPRE SERÁ UM ANJO EM MINHA
VIDA. E TODO DIA BEM CEDINHO IRÁ ME
ACORDAR E ME TRAZER UMA BANDEJA DE CAFÉ
COM LEITE.
GIBI NA COLOMBO?
ANTONIA
NA NOSSA CAMA. EU ESTAREI DEITADA,
MEUS CABELOS SOLTOS. OS
TRAVESSEIROS SERÃO FOFOS. A LUZ VAI
ENTRAR MACIA, PELA JANELA, E VAI LEVANTAR UMA
POEIRINHA BRANCA. E NOSSA FILHA VAI BRINCAR COM AS
BONECAS TRAZIDAS DE PARIS, DE PORCELANA, COM VESTIDINHO ROSA.
UM TOPEZINHO NO CABELO, TODO
LOIRINHO.
GIBI POSSO ATÉ VER.
ANTONIA
DIZ PRA ELE QUE EU AMEI ELE MUITO. QUE
EU ESPEREI ELE NA PORTA DA IGREJA DE
17
NOSSA SENHORA. ESSA MESMA, TODA
DECORADA DE ROSAS VERMELHAS, TODA
BONITA. E EU PRECISO IR AGORA. ANTES QUE
ACABE A SOMBRA.
GIBI A SOMBRA CONTINUA,
SENHORITA. ATÉ À NOITINHA. MAS ATÉ LÁ
EU JÁ VOLTEI PRO CORTIÇO, ONDE TEM
ANJO NASCENDO TODO DIA.
ANTONIA
GIBI, ME PROMETE QUE VOSMECÊ VAI FALAR DE
MIM PRA ELE, PROMETE?
GIBI
PRO ANJO?
ANTONIA É. PRA QUANDO
VOSMECÊ VER ELE POR AQUI, COMPRANDO
JORNAL CONTIGO. DIZ TUDO ISSO QUE EU
FALEI, QUE EU SINTO POR ELE.
GIBI
A SENHORITA VOLTA AMANHÃ?
ANTONIA
VOLTO. QUEM SABE VOSMECÊ ME VÊ NA PÁGINA DO JORNAL?
GIBI
EU NÃO SEI LER, TÁ ALEMBRADA?
ANTONIA
MELHOR ASSIM, GIBI. (ela o beija na testa) ME VOU, AGORA. (sai
na penumbra)
GIBI (olha em volta) QUEM VAI QUERER? TEM “O
MALHO”, TEM A GAZETA, TEM JORNAL DO COMMERCIO, TEM TICO-TICO! Ô, MOÇO!
LEVA AÍ! LEVA AÍ, MOÇO!
(luz em resistência)
FIM
O texto acima está protegido pelas Leis brasileiras de Direito Autoral. É obrigatório que se solicite permissão para ser montado. Não fazê-lo será passível de ações legais. Para solicitação, falar com
os autores pelo e-mail: jobimneto.ruy@gmail.com
7.2 Analisando o contexto de produção
Onde foi ou pode ter sido veiculado o texto?
Quem, provavelmente, lê esse “tipo” de texto?
Podemos encontrar esse gênero somente em livros?
Onde mais podemos encontrar textos como esse?
Quem cria (escreve) esses textos?
Você conhece algum escritor deste “tipo” de texto?
É possível que a vida do autor influencie na sua produção? Conheça a vida de Ruy Jobim Neto e comente a forma como cria suas obras.
18
arquivo do autor
uy Jobim Neto nascido em Canoas (22/07/1965) é cartunista, autor teatral brasileiro e cineasta, formado em Cinema pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), criador do personagem Cão Jarbas. Participou de vários
curtas nos anos 80 em várias funções. Como ator, trabalhou no PAC (Projeto Artes Cênicas) em "O Enigma dos Turins" (infantil de Edson Martins) e "Escola de Mulheres" (de Molière, direção - Ubirajara Mohana). Professor de História em Quadrinhos, tem livros publicados pela Editora Bentivegna ("Na Tigela com Jarbas", de 2002, e a coleção "Heróis do Brasil", de 2005). Como autor teatral, estreou nos palcos paulistanos com a comédia "Virgens à Deriva" em 2007 e com o drama "Do Claustro", com Débora Aoni e Carolina Mesquita no elenco, direção - Eduardo Sofiati, em janeiro de 2008. O espetáculo percorreu São Paulo, o Festival de Curitiba e Rio de Janeiro. Ainda em 2008, participa como autor no Dramamix das Satyrianas 2008 ("Andares Acima", dir.: Carol Guedes, "Sobre o Teu Corpo e Duvidei", dir.: Ricardo Corrêa e também como diretor em "De Eterno Flerte, Adoro Ver-te"). No final de 2008, ganha o edital Novos Textos de Dramaturgia para Teatro com o projeto do drama de época “Lourenço”, peça que discute a condução da História pelas mãos do Homem. Em junho de 2010 estreia a comédia "Talhado Mundo", no Rio de Janeiro, sob direção de Marcos Wainberg, o drama "Do Claustro", direção de Filipe Peña, no Espaço Beta do 3o. andar do SESC Consolação, em São Paulo e no dia 21 de junho, o drama "Lourenço" é lido no evento Letras em Cena, no MASP.
Dramaturgia
A Farsa dos Agudos - (comédia) - 1994 De Eterno Flerte, Adoro Ver-te - (comédia) - 1994 Bodas em Campos de Arroz - (comédia) - 1997 Pelas Próprias Mãos - (comédia) - 1998 Virgens à Deriva - (comédia) - 2007 Do Claustro - (drama) - 2007 Talhado Mundo - (comédia) - 2008 Dos Muros da Cidade, Eu Vi Teus Olhos - (drama) - 2008 Andares Acima - (drama) - 2008 Sobre o Teu Corpo e Duvidei - (drama) - 2008 Sombras da Ouvidor - (drama) - 2008 Bem Longe da Traçalândia - (infantil) - 2008 Ao Primeiro que Viu a Maré - (drama) - 2008 Uma Brisa de Noite no Olhar - (drama) - 2008 As Águas se Juntam no Céu de Anis - (drama) - 2008 De Canoa e de Rede - (comédia dramática) - 2009 Lourenço - (drama) - 2009 Descasos Indeléveis para Uma Noite em Si Bemol - (comédia dramática) - 2009 O Homem que Olhou para Cima - (comédia dramática) - 2009 Exame - (comédia) - 2009
R
19
O Mapa do Coração do Mundo - (drama) - 2009 Dois para o Saguão - (comédia) - 2009 Das Horas Cruas - (drama) - 2009
7.3 Analisando o Conteúdo Temático
Lendo apenas o título é possível inferir o tema do texto?
Esse tema/assunto se confirma no decorrer do texto?
De acordo com a linguagem utilizada pelas personagens como podemos caracterizar cada
uma?
O tema/assunto tratado no texto é atual? Comente.
Você costuma se interessar por textos que tratam desse tema? Por quê?
Indique o trecho do texto que mais sensibilizou/intrigou você e explique por que.
7.4 Analisando o Arranjo Textual
Observando a silhueta (disposição no papel) desse texto há alguma indicação específica de
seu gênero?
A forma como o texto está disposto no papel/espaço provocou alguma dificuldade na
leitura/compreensão? Explique.
O texto Sombras da Ouvidor é um texto dramático. Você reconhece alguma indicação que
nos leva a caracterizá-lo dessa forma?
Existe marcação de tempo, lugar nesse texto? Justifique sua resposta.
Percebemos a presença de narrador? Existe alguém contando a história?
Como são apresentadas as personagens?
Qual sinal é utilizado para marcar a fala das personagens?
Existe um conflito? Qual é? O que o desencadeia?
O desfecho apresenta uma solução para o conflito? Comente.
Que outro desfecho poderíamos esperar para o texto?
20
7.5 Analisando as Marcas Linguístico-enunciativas
O que o uso dos parênteses indica?
O uso de letras maiúsculas e minúsculas durante todo o texto tem alguma importância?
Justifique.
Em “Sombras da Ouvidor” o plural desta frase é marcado por qual elemento? Comente sobre
essa construção.
“Tem até os marinheiro graduado...”
Observando as falas de Antonia, podemos inferir que era:
( ) fria
( ) sonhadora
( ) invejosa
Justifique sua escolha:
Expressões como “vossuncê”, “alembrada”, “perguntá” denunciam de Gibi:
( ) que fugiu da escola.
( ) que fala dessa forma para mostrar que domina a gramática.
( ) pertence a uma classe social que, na época, não tinha oportunidade de frequentar uma
escola.
( ) É seu modo de falar e deve ser respeitado, pois mostra uma variante da nossa língua.
Justifique sua escolha:
O que indica cada tempo e modo verbal utilizado ao longo do texto:
Imperativo
Futuro do pretérito do indicativo
Pretérito perfeito do indicativo
21
Sabendo que o diminutivo pode expressar diferentes sentidos ( tamanho pequeno, elogio, carinho, ironia, atenuação...), conforme ao contexto de uso,explique o sentido de cada um dos seguintes diminutivos empregados no texto:
a) pouquinho e) poeirinha i) noitinha b) cedinho f) vestidinho c) filhinho g) topezinho d) novinho h) loirinho
22
TRABALHANDO OUTRA PEÇA DE RUY JOBIM NETO
AO
PRIMEIRO QUE VIU A
MARÉ
Personagens VINDINHA JESUÍNO
de
Ruy Jobim Neto
...........................
(a cena se passa diante do mar, de madrugada)
JESUÍNO (está agachado e sorri
muito) VINDINHA! OLHA ISSO!
VINDINHA
ISSO O QUÊ, JESUÍNO? O QUE CÊ TÁ VENDO?
JESUÍNO
(rindo muito) A BALEIA! EU VI! ASSIM QUE BATEU A ONDA, ELA APARECEU! E FOI COM TODA A CAUDA
PRUM LADO!
VINDINHA
VAMO SIMBORA, HÔMI.
JESUINO DEIXA DISSO,
VINDINHA! É LINDO POR DEMAIS!
VINDINHA
NÃO É BALEIA, NÃO, JESUÍNO. É VISAGEM
TUA, NÃO VÊ?
JESUÍNO É BOM SINAL,
VINDINHA! É BOM SINAL!
VINDINHA
SINAL DE QUÊ?
JESUINO (vai até ela) SINAL DE
FARTURA! DE BOA PESCA! DE MAR
ABERTO, SOL O ANO INTEIRO! DE QUE EU E
VOCÊ VAMOS NOS CASAR!
VINDINHA
QUE SINAL É ESSE, HOMI DE DEUS? (ri) FICOU LOUCO, É?
JESUINO
NÃO, VINDINHA! EU TE AMO E TU SABE DISSO! A GENTE VAI SE CASÁ, VAI TER FESTA BONITA
AQUI NA ALDEIA! TODOS OS HOMIS DA REGIÃO VÃO FICAR SE BABANDO DE EU TAR ME CASANDO COM A MOÇA MAIS BONITA,
MAIS FORMOSA DAQUI.
VINDINHA CÊ NUNCA ME
PERGUNTOU ISSO.
JESUINO CLARO QUE
PERGUNTEI. EU TE PERGUNTEI SE VOCÊ
QUER SE CASAR COMIGO.
VINDINHA
QUANDO? NÃO ME ALEMBRO.
JESUINO
EU TE PERGUNTEI EM MEUS SONHOS. E NOS MEUS SONHOS VOCÊ VINHA LINDA, TODA
LINDA COMO TÁ AGORA, VINHA DE VÉU
E GRINALDA. E COM UMAS FLORES BONITAS QUE NEM TE CONTO!
VINDINHA
CÊ É MESMO MUITO MALUCO, JESUÍNO. MAL TEM PRO TEU PRÓPRIO
SUSTENTO, NEM DEIXOU DE MORAR COM
TUA MÃE AINDA, E QUER SE CASÁ COMIGO,
ASSIM, DO NADA?
JESUINO NÃO É DO NADA, VINDINHA! EU TE
GOSTO FAZ TEMPO! MINHA MÃE E TODA A ALDEIA SABE DISSO,
TODO MUNDO, ATÉ A BALEIA SABE DISSO.
23
VINDINHA
CÊ É MESMO MUITO MALUCO. ATÉ A
BALEIA? (ri)
JESUINO ELA MESMA. FOI UM
PEDIDO QUE EU FIZ PRA ELA.
VINDINHA
MAS NINGUÉM FAZ PEDIDO PRUMA BALEIA,
JESUINO. SÓ VOCÊ MESMO.
JESUINO
POR ISSO, VINDINHA! EU QUERIA SER
DIFERENTE, FAZER DIFERENTE! E QUANDO
ABRISSE A MARÉ, QUANDO EU OUVISSE
ELA CANTANDO, LÁ NO MEIO DO MAR ABERTO,
BATENDO A CAUDA PRUM LADO E PRO OUTRO, AH, ELA IA
SABER, E EU TAMBÉM. É SINAL DE BOA VENTURANÇA!
VINDINHA
E TUA MÃE? O QUE ELA FALA DISSO?
JESUINO
DE A GENTE SE CASÁ?
VINDINHA NÃO! DISSO TAMBÉM, MAS...DESSA HISTÓRIA TUA DESSE TEU PEDIDO
AÍ, PRA BALEIA! NÃO ERA MAIS CERTO
ACENDER UMAS VELAS PRA SANTO ANTONIO?
JESUINO
TODO MUNDO FAZ ISSO, VINDINHA! TODO MUNDO ACENDE VELA PRA SANTO ANTONIO. MAS EU TE GOSTO, EU QUERO SER TEU HOMI,
E POR ISSO EU FIZ DIFERENTE.
VINDINHA
CASÁ COMIGO?
JESUINO É A COISA QUE EU MAIS QUERO NESSE MUNDO,
VINDINHA!
VINDINHA UM HOMI QUE FAZ UM
PEDIDO PRUMA BALEIA? PRA BALEIA ATENDÊ? EU NÃO SEI SE QUERO ISSO PRA MIM, NÃO,
JESUINO.
JESUINO OXE, QUE ESTRANHO. POR QUE TU NÃO QUÉ, VINDINHA? NÃO GOSTA
DE MIM?
VINDINHA GOSTÁ, GOSTÁ, EU
GOSTO, JESUINO! (ele se aproxima, ela se
afasta) MAS NÃO ASSIM. NÃO DESSE
JEITO.
JESUINO ARRE, VINDINHA! QUE
JEITO?
VINDINHA ESSA ESQUISITICE.
JESUINO
NÃO TEM ESQUISITICE NENHUMA, VINDINHA! TEM SÓ EU E VOCÊ!
VINDINHA
E ESSA BALEIA!
JESUINO EU SÓ FIZ UM PEDIDO PRA ELA, MAIS NADA.
VINDINHA
E ELA ATENDEU?
JESUINO NÃO SEI AINDA. FALTA
VOCÊ DIZER.
VINDINHA EU JÁ FALEI QUE ASSIM DESSE JEITO EU NÃO
VOU TER NADA CONTIGO NÃO,
JESUINO.
JESUINO MAS VOCÊ ME GOSTA? COMO DISSE AGORA HÁ
POUCO?
VINDINHA GOSTO.
JESUINO
ENTÃO, VINDINHA. VAMO SELÁ ISSO TUDO
COM UM BEIJO.
VINDINHA EU NÃO SEI SE QUERO TE BEIJÁ. EU NÃO VOU
QUERER BEIJAR ALGUÉM ASSIM, DIANTE
DA PRAIA, PRUMA BALEIA VÊ. COMO SE ELA FOSSE ABENÇOÁ.
JESUINO
(ri) TU TÁ MANGANDO DE MIM QUE EU SEI.
24
VINDINHA EU NÃO FICO
MANGANDO COM ESSAS COISAS NÃO, JESUINO. ISSO É MUITO PRECIOSO
PRA MIM, É MINHA VIDA.É MEU FUTURO. E VOCÊ NEM TEM BARCO AINDA. PRA COMPRAR
UM BARCO VAI PRECISAR DE MUITO
DINHEIRO, MUITA LIDA.
JESUINO MAS EU NÃO TENHO
MEDO DE NADA DISSO NÃO, VINDINHA.
VINDINHA
ENTÃO FAZ UMA COISA PRA MIM. PRA EU ME
CASAR CONTIGO.
JESUINO COMPRAR UM BARCO?
EU COMPRO UM BARCO E A GENTE SE CASA?
VINDINHA
ANTES DISSO.
JESUINO É SÓ TU DIZER,
VINDINHA. O QUE QUE É PRECISO FAZER?
VINDINHA
(tempo) CÊ PEGA ESSA BALEIA PRA MIM.
JESUINO
ARRE! FICOU LOUCA, É? A BALEIA? JUSTO A BALEIA? JUSTO ELA? FOI PRA ELA QUE EU
FIZ O PEDIDO, VINDINHA! EU NÃO
POSSO MATAR A BALEIA! EU NÃO POSSO
FAZER ISSO!
VINDINHA
VOCÊ PEGA A BALEIA E EU CASO CONTIGO.
JESUINO
ISSO NÃO, VINDINHA. FAZ ISSO, NÃO.
VINDINHA
QUE AMOR É ESSE QUE VOCÊ ME TEM?
JESUINO
VOCÊ QUER UMA PROVA DE AMOR,
VINDINHA?
VINDINHA SE VOCÊ PEGAR ESSA BALEIA, TODOS OS
HÔMIS DA ALDEIA E DA REGIÃO, TODOS ELES VÃO TE RESPEITÁ. E
QUANDO TU FOR RESPEITADO, TUA MÃE VAI ENTENDER QUE O
FILHO DELA PRECISA DE ARRANJÁ UMA ESPOSA. E AÍ VOCÊ COMPRA O
BARCO, VAI TER O DINHEIRO PRA IR PRO
MAR ABERTO, PRA CONTRATÁ PESCADOR, E PRA COMPRAR NOSSA
CASA TAMBEM, JESUINO.
JESUINO
EU NÃO POSSO MATAR A BALEIA, VINDINHA. NÃO ME PEDE ISSO.
VINDINHA
FAZ A CONTA, HÔMI. VÊ SE EU NÃO TÔ
CERTA.
JESUINO EU NÃO PRECISO
PROVÁ QUE EU TE GOSTO. NÃO BASTA
VOCÊ OLHÁ NOS MEUS OLHOS? EU SOU HÔMI DE BEM, VINDINHA. SE EU FIZ PROMESSA PRA BALEIA EU NÃO POSSO MATAR JUSTAMENTE
ELA!
VINDINHA ELA ATENDEU O
PEDIDO?
JESUINO EU NÃO VOU MATAR A
BALEIA, VINDINHA!
VINDINHA SÓ TU VIU AQUELA BALEIA, SE É QUE É MESMO UMA BALEIA,
JESUINO! SE TU VIU, A BALEIA É TUA, É PRA TU PEGAR E GANHAR
DINHEIRO COM ELA. AÍ VOCÊ VAI PODER PENSAR EM MIM.
JESUINO
ARRE, MULHÉ! EU PENSO EM TU O TEMPO
TODO!
VINDINHA EM ME TER COMO TUA MULHÉ, JESUINO. EU
PENSO NESSAS COISAS. E VOU QUERER ME
CASAR COM UM HÔMI QUE TOMA UMA
DECISÃO! QUE PENSA NO FUTURO DELE. QUE SE VÊ NUMA CASA, COM
A MULHÉ, COM OS FILHOS, E QUE VAI QUERER UMA VIDA DECENTE QUANDO
FICAR VELHO!
25
JESUINO
TU SABE COMO É QUE EU VEJO ISSO?
VINDINHA
NÃO.
JESUINO EU IMAGINO EU E TU CORRENDO MUNDO
AFORA.
VINDINHA LONGE DAQUI?
JESUINO
É.
VINDINHA MAS MINHA FAMILIA TÁ
AQUI, JESUINO.
JESUINO QUE É QUE TEM? A MINHA TAMBÉM. A
GENTE NÃO PODE SER EGOISTA, VINDINHA. A GENTE TEM UM MUNDO A CORRER POR AÍ. PRA CORRER JUNTO UM DO
OUTRO.
VINDINHA NÃO PRECISA SER TÃO
LONGE.
JESUINO O FILHO NÃO É FEITO PRA GENTE, É FEITO PRO MUNDO. NÃO SEI QUEM FOI QUE FALOU
ISSO.
VINDINHA AÍ É QUE TÁ! PRA TU SE
CASAR COMIGO, PRA CORRER O MUNDO
JUNTINHO DE MIM, É PRECISO FAZER
ALGUMA COISA. ALGO DE GRANDE.
JESUINO
MAS EU FAÇO ALGO DE GRANDE, VINDINHA. É
TU QUE EU AMO.
VINDINHA MAIOR QUE ISSO.
JESUINO
(ri) NÃO TEM NADA MAIOR QUE ISSO.
VINDINHA
ALGUMA COISA QUE FAÇA VALER.
JESUINO NÃO ME PEDE ISSO DE
NOVO, NÃO, VINDINHA. EU NÃO VOU MATÁ A BALEIA, POR NADA
NESSE MUNDO.
VINDINHA E POR MIM?
JESUINO
AGORA TAMBÉM NÃO SEI MAIS.
VINDINHA
É TAO RUIM ASSIM O QUE EU FALEI,
JESUINO? TODO MUNDO QUER UM LUGAR NO
MUNDO, E EU SEI QUE ATÉ TU TAMBÉM QUÉ.
PENSA QUE EU NÃO SEI?
JESUINO A BALEIA EU NÃO
MATO.
VINDINHA QUE PESCADOR TU É, JESUINO? VAI FICAR A
VIDA TODA TRABALHANDO PRA
CONTRATADOR, PEGANDO UMAS
MIGALHAS DE CAMARÃO A VIDA TODA, NESSA
PORCARIA DE EXISTÊNCIA?
JESUINO
EU QUERO MAIS PRA MIM, VINDINHA.
VINDINHA
ENTÃO TOMA A DECISÃO. E DEPOIS
FALA COMIGO.
JESUINO AS COISAS DA VIDA NÃO
SE DECIDE DESSA FORMA NÃO.
VINDINHA
EU JÁ DISSE QUE EU SOU MULHÉ, JESUINO.
QUERO MAIS DESSA VIDA.
JESUINO
MAIS?
VINDINHA POR ISSO EU NÃO VOU TE DAR NENHUM BEIJO E NEM TE RESPONDER A TUA PERGUNTA. NÃO DIANTE DESSA BALEIA. VAMBORA, HOMI. VÊ SE DESCANSA TUA CABEÇA E PENSA NESSAS COISAS
QUE EU TE DISSE.
JESUINO PODE IR, VINDINHA. EU
VOU FICAR MAIS UM TEMPO. VOU OLHAR PRO MAR ABERTO E
PENSAR AQUI COMIGO. QUIETO NO MEU
26
CANTO. ESPERÁ O SOL RAIÁ E SER O PRIMEIRO A VER A MARÉ. EU VOU
PENSAR EM TU, VOU PENSAR EM MIM, E VOU
PENSAR EM TUDO.
VINDINHA TÁ BEM, MAS EU TENHO
CÁ PRA MIM UMA COISA, JESUINO.
JESUINO O QUÊ?
VINDINHA
QUE ESSA BALEIA TODA TÁ É AÍ, DENTRO DA
TUA CABEÇA.
JESUINO DORME BEM, VINDINHA.
(Vindinha sai)
JESUINO
(está agachado, como no início da cena)
BALEIA. ME DIZ AQUI. FALA PRA MIM. JOGA
TUA CAUDA PRUM LADO E PRO OUTRO.
GRITA, CANTA, ISSO... ASSIM... PRA MIM...
MERGULHA BEM SUAVE, JOGA TEU CORPO,
CHAMA TEU FILHOTE. SEGUE MAR ABERTO E BEM DISTANTE, BEM SEGURA. EU, DO MEU
LADO, AQUI, TE ABENÇÔO. SEGUE BEM
E SEGUE EM PAZ, MINHA AMIGA. SEGUE. ISSO. ASSIM. EU FIZ O PEDIDO, TU ME OUVIU.
MAS NÃO TEM A PRECISÃO DE FICAR ME ATENDENDO NÃO. TU TEM MAIS COISA PRA
FAZER. TEM QUE CUIDAR DO TEU
FILHOTE, TEM QUE SUMIR DA VISTA
DAQUELE QUE QUÉ TE PESCÁ. TEM QUE SER LIVRE. VOCÊ É MÃE, TEM FILHO. NÃO TEM
QUE GOSTÁ DE ALGUÉM SÓ PORQUE ESSE ALGUÉM TE FALA
COISAS. VOCÊ SÓ OUVE O MAR. EU QUERIA SÓ PODER OUVIR O MAR. POR ISSO VOU FICAR
AQUI, CONTIGO, VENDO TUA
LIBERDADE. EU TU VAI CANTAR PRO TEU
FILHOTE E PRA MIM TAMBÉM. CANTAR PRO PRIMEIRO QUE VIU A
MARÉ. (sorri)
(luz fecha em resistência, ao som de
baleias e do mar)
FIM
O texto acima está protegido pelas Leis brasileiras de Direito
Autoral. É obrigatório que se solicite permissão para ser montado. Não fazê-lo
será passível de ações legais. Para solicitação,
falar com o autor: jobimneto.ruy@gmail.com
CONVERSANDO SOBRE O ASSUNTO
1) Antes de começar a história o autor apresenta os nomes das personagens. Você julga
importante esta apresentação? Por quê?
2) Qual é o tema da peça?
3) É possível estabelecer relação de semelhança entre o tema dessa peça e o tema da
peça SOMBRAS DA OUVIDOR? Explique.
27
4) Nesta peça uma das personagens não consegue tomar uma decisão para mudar sua
vida, pois se sente pressionado pelo ente amado. Em nossa vida há momentos que
precisamos tomar decisões difíceis. Você já passou por situações parecidas? Como
chegou a uma solução?
5) Você ficou surpreso(a) com o final do texto? Comente.
EXPLORANDO A LINGUAGEM DO TEXTO
1) Procure no dicionário o significado da palavra visagem?
2) O que os verbos no modo imperativo indicam? Pesquise em uma gramática e
assinale:
sugestão Ordem Pedido crítica
3) Após encontrar o sentido dos verbos no imperativo encontre no texto exemplos do
mesmo.
4) Os vícios de linguagem são reduções ou junções de palavras que são utilizadas no
dia-a-dia. Exemplo: para > pra, para + um > prum. Quais são os exemplos de
vícios de linguagem que podemos encontrar neste texto?
5) Segundo a gramática, o vocativo é usado para chamar o ser com quem se fala,
através do nome, apelido ou característica. Encontre os vocativos presentes no
texto.
28
6) Encontre as interjeições – palavras que expressam sentimentos e emoções dos
personagens – e explique por que elas são empregadas.
7) - Atribua adjetivos que caracterizem os personagens Jesuíno e Vindinha, depois
compare sua resposta com as de seus colegas.
EXPLORANDO A PONTUAÇÃO DO TEXTO
1) Observe a pontuação do texto e responda:
a) Ela é intensa ou não?
b) Qual o objetivo desse uso da pontuação?
2) A vírgula é utilizada para marcar algumas funções. Por exemplo, separamos por
vírgula ao elemento de uma lista qualquer. A esta função damos o nome de
enumeração. Separamos por vírgula também expressões intercaladas, daí a função
de intercalação. A vírgula também serve para suprimir um verbo dentro de um
período.
Leia a frase a seguir:
Eu, do meu lado, aqui, te abençôo.
O uso da vírgula demonstra:
intercalação
enumeração
supressão
3) O uso das reticências pode demonstrar uma dúvida, hesitação ou suspensão do
pensamento, deixando algo subentendido. Pode indicar também a omissão parcial
de uma citação.
No trecho:
29
Grita, canta, isso... assim... pra mim... mergulha bem suave, joga teu corpo,
chama teu filhote. Qual o sentido das reticências?
4) Nesta peça teatral predomina o discurso direto. Como é sua pontuação? Qual a
importância desse tipo de discurso para a construção das vozes das personagens?
5) Para concluir, podemos dizer que a pontuação é bastante explorada nessas peças? Explique.
REVISANDO CONTEÚDO
1) Variação linguística é a maneira como cada pessoa utiliza a língua. Cada variação
recebe um nome diferente. Por exemplo: A variação que ocorre de uma região para
outra é chamada de geográfica. A variação que existe na fala de um jovem para a
fala de um idoso é chamada de sociocultural. A variação situacional ocorre de
pessoa para pessoa de acordo com o meio em que ela vive ou trabalha e a variação
histórica acontece com a mudança de época, pois na medida em que, o tempo vai
passando a língua também vai se modificando.
Identifique com X a variação lingüística presente em cada grupo de palavras,
considerando os textos:
a) Sombras da Ouvidor:
Prenhe, atinar, careço, variei
Geográfica
Histórica
Sociocultural
30
Situacional
b) Ao primeiro que viu a maré:
arre, oxe
Geográfica
Histórica
Sociocultural
Situacional
2) Nos textos que analisamos de Ruy Jobim Neto, qual o tipo de linguagem
predominante?
Formal
Informal
Cite exemplos retirados dos textos.
3) Dentre as características da peça teatral escrita estão as rubricas. Para que elas
servem? Elas são importantes para que o leitor compreenda o texto? Justifique sua
resposta.
4) É possível entender o texto teatral sem ler as rubricas?
5) Encontre as interjeições – palavras que expressam sentimentos e emoções dos
personagens – e explique por que elas são empregadas.
6) Segundo a gramática, o vocativo é ... (pesquise e complete). Depois: a) Encontre vocativos presentes no texto
b) Explique se há pouca ou muita exploração desse recurso.
c) O que é possível concluir com essa constatação?
31
8 CATARSE
É o momento de o aluno mostrar o que apreendeu após todo estudo sobre o
gênero.
8.1 REVENDO CONCEITOS APRENDIDOS
Em grupos de no máximo 4 pessoas, os alunos analisarão a peça “Bem
longe da traçalândia”, do mesmo autor, identificando os elementos essenciais do gênero.
8.2 ELABORANDO UMA PEÇA TEATRAL (CURTA)
Com o mesmo grupo, os alunos deverão elaborar, por escrito, uma peça
teatral (curta) com uma temática de escolha do grupo.
8.3 AVALIAÇÃO E AUTO-AVALIAÇÃO DAS DIMENSÕES TRABALHADAS
Tendo um roteiro com os itens trabalhados e a serem observados, cada um
fará sua avaliação do processo de aprendizagem. O professor deve elaborar junto com a turma
os itens a serem avaliados. Dessa maneira terão consciência do processo e conteúdos
apreendidos.
O professor, após corrigir todas as produções, deverá a partir dos equívocos
encontrados promover uma discussão com os alunos para esclarecimentos pertinentes.
Se necessário poderá retomar um dos textos ou outro disponível no blog do
autor e refazer o percurso de estudo.
32
9 PRÁTICA SOCIAL FINAL
Após o estudo sobre o gênero Peça teatral (curta), sistematizar as intenções
e as propostas de ação que serão realizadas com os conteúdos apreendidos. Por serem ações
concretas é importante a interação dos alunos e professor, decidindo e ouvindo as várias
opiniões/sugestões.
9.1 INTENÇÕES E AÇÕES SOBRE O CONTEÚDO APREENDIDO
Sugestões:
Reconhecer e valorizar o teatro enquanto patrimônio cultural.
Reconhecer elementos linguísticos do gênero e compreender seus
efeitos de sentido na leitura e no espetáculo.
Valorizar o teatro em seus vários âmbitos: popular, clássico,
moderno, interativo...
33
REFERÊNCIAS
BAKHTIN, M. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
BALL, D. Para trás e para frente: um guia para leitura de peças teatrais . São Paulo: Perspectiva, 1999.
BARBOSA J. P. Orientações para o professor.: Receita. São Paulo: FTD, 2003. p. 1-24. (Coleção trabalhando com os gêneros do discurso. Coord. J. P. Barbosa).
GARCEZ, L. H. C. A escrita e o outro: os modos de participação na construção do texto. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1998.
GASPARIN, J. L. Uma didática para a pedagogia Histórico-Crítica. 5ed. Rev. Campinas, SP : Autores Associados, 2009.
GERALDI, J. W. (ORG.) O texto na sala de aula. 3ª Ed, 9ª impressão. São Paulo: Ática, 2004.
MAGALDI, Sábato. Iniciação ao teatro. 7ª Ed. São Paulo: Ática, 1998.
MAINGUENEAU, D. Pragmática para o discurso literário - leitura e crítica. Trad. Marina Appenzelller São Paulo: Martins Fontes, 1996
MENEGASSI, R. (org.). V. 1. ed. (revista) 2. Maringá: EDUEM, 2010 (no prelo)
PALLOTTINI, Renata. Introdução à dramaturgia. São Paulo: Ática, 1988.
PARANÁ. Secretaria de Educação do Estado. Diretrizes Curriculares do Paraná. Curitiba: julho/2008.
PASCOLATI, S. A. V. Operadores de Leitura do texto dramático. In: Teoria da literatura: abordagens históricas e tendências contemporâneas. EDUEM: Maringá, 2009.
PERFEITO, A. M. Concepções de Linguagem: teorias subjacentes e ensino de língua portuguesa. In: Concepções de Linguagem e ensino de Língua Portuguesa. Coleção Formação de professores. EAD. Nº18. Ritter, L.C.R e Santos, A.R.(Orgs.). Maringá: EDUEM, 2005.
PERFEITO, A. M.; OHUSCHI, M. C. G.; BORGES, C. A. G. Bula de remédio: da teoria à prática em sala de aula. In: Mikhail Bakhtin: cultura e vida. E. M. R. Osório (org.). São Carlos: Pedro e João Editores, 2010. p. 51-75.
ROJO, R. Gêneros do Discurso e Gêneros Textuais: questões teóricas e aplicativas. In: MEURER, J.L; BONINI, Adair; MOTTA-ROTH, D. (Orgs). Gêneros: teorias, métodos, debates. São Paulo: Parábola Editorial, 2005.p.184-207.
SAVIANI, D. Escola e Democracia. 32 ed. Campinas: Autores Associados, 1999.
34
SAVIANI, D Pedagogia histórico-crítica – verbete. Disponível em http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/glossario/verb_c_pedagogia_historico.htm (Acesso em 17/03/2010).
SOARES, Angélica. Gêneros Literários. Editora Ática. Série Princípios. 6ª ed. 4ª impressão, 2001.
Crédito das imagens
http://textoscurtosparateatro.blogspot.com Acesso em 20/11/2010
http://www.publicdomainpictures.net/hledej.php?hleda=teatro Acesso em: 14/07/2010
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ruy_Jobim_Neto Acesso em: 28/04/2010
36
ANEXO A
Panorama Histórico do Teatro
Não se pode assegurar a época de nascimento do teatro, mas, segundo
Pascolati (2009), a dimensão da teatralidade é inerente ao ser humano remontando a rituais de
danças tribais, ritos religiosos e pela necessidade de experimentar o mundo,via fantasia e
ludicidade. Citando a Poética de Aristóteles, a autora salienta a imitação como algo natural ao
ser humano e fonte de prazer.
Na Grécia Antiga, o teatro se solidificou em função das manifestações em
homenagem ao deus do vinho Dionísio (equivalente ao deus romano Baco). Por ocasião de
uma nova safra de uva, em agradecimento, realizavam procissões, as quais eram conhecidas
como Ditirambos. Ficando cada vez mais elaboradas, surgiram os "diretores de coro" (os
organizadores das procissões).
O primeiro diretor de coro foi Téspis, que foi convidado pelo tirano Prétato
para dirigir a procissão de Atenas. Téspis desenvolveu o uso de máscaras para representar,
pois, em razão do grande número de participantes, era impossível todos escutarem os relatos,
porém podiam visualizar o sentimento da cena pelas máscaras.
Em uma dessas procissões, Téspis inovou ao subir em um tablado (Thymele
– altar), para responder ao coro, e assim, tornou-se o primeiro respondedor de coro
(hypócrites). Surgiram, assim, os diálogos e Téspis tornou-se o primeiro ator grego.
Como podemos perceber, não só na Idade Média, mas também hoje, a
teatralidade ocupa espaços importantes em nosso dia a dia: apresentações artísticas de toda
natureza tomam os efeitos teatrais para si, no intuito de cativar cada vez mais uma grande
37
público; sem contar a esfera publicitária que constantemente usa esses recursos como apelo ao
consumismo.
O fenômeno teatral se dá pela junção de texto e espetáculo. Pascolati (2009)
lembra que estudá-lo pressupõe uma dupla dimensão: estudar o texto, literatura dramática e
estudar o espetáculo.
Conforme Aristóteles, o drama é uma maneira de imitação e necessita da
mediação dos atores numa ação direta. Assim, ao falar da tragédia, afirma: “o espetáculo
cênico há de ser necessariamente uma das partes da tragédia” (ARISTÓTELES, apud
PASCOLATI, 2009, p.94).
Ele mesmo também confirma o espetáculo cênico como sendo “o mais
emocionante, mas também o menos artístico e o menos próprio da poesia. Na verdade, mesmo
sem a representação e sem atores, pode a tragédia manifestar seus efeitos; além disso, a
realização de um bom espetáculo mais depende do cenógrafo que do poeta” (ARISTÓTELES,
apud PASCOLATI, 2009, p. 94).
Aqui, encontramos um nó do teatro: o que é mais importante, o texto ou a
encenação? Não nos enveredaremos por esse caminho. Acreditamos na Arte e na sua função
estética. O que nos ocupará como linguistas é o texto dramático, suas particularidades e como
torná-lo atraente ao sabor de nossos discentes.
As Condições de Produção do texto Dramático
38
A língua, seja falada ou escrita, reflete, de certa forma, a organização da
sociedade, desvelando esferas comunicativas e instaurando enunciados na forma dos mais
diversos gêneros. Tal organização deixa transparecer as tradições de grupos sociais e traços de
sua cultura.
É no contexto e vivência, que cada sociedade emana suas ideologias, isto é,
conceitos/temas materializados na forma de discursos. Nesse sentido, esses fatores é que
influenciaram e influenciam a produção deste ou daquele gênero utilitário ou literário. O
teatro é um microcosmo da sociedade. Nesta é que “o teatro vai ver a reprodução de uma
parte de seu todo, considerá-lo, compará-lo, aproveitá-lo em seu desenvolvimento e
perfeição”. (BOCAIÚVA apud FARIA, 1998, P. 41).
O texto dramático está ligado a esta situação. Nascido da teatralidade,
inerente ao ser humano, compreendemos que seu objetivo foi se adaptando com o passar dos
tempos, desde a necessidade de reverenciar um deus, passando pela diversão do espectador
até chegar às mais variadas funções e sendo encontrado nas mais diferentes condições de
produção hoje.
Contudo, mesmo se utilizando de uma linguagem literária, seu enunciador
(dramaturgo) parte de um contexto real, no qual as sociedades externam suas idéias,
necessidades etc., num processo de interação e construção de valores e verdades, que vão ao
longo do tempo, num processo dialético, se entrelaçando como explica Bakhtin:
Toda enunciação efetiva, seja qual for a sua forma, contém sempre, com maior ou menor nitidez, a indicação de um acordo ou desacordo com alguma coisa. Os contextos não estão simplesmente justapostos, como se eles fossem indiferentes uns dos outros; mas eles encontram-se numa situação de interação e de conflito tenso e interrompido (BAKHTIN 1992, p. 107).
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Assim sendo, tal como a maioria dos textos da esfera literária, a peça teatral
busca, ora de forma sutil, ora de forma irreverente, convencer o leitor/espectador de uma
verdade defendida pelo autor, levando-o a comungar da mesma posição exposta no texto,
o que objetiva um fazer-realizar, ou seja, influenciar o leitor à prática de uma ação.
Desse modo, trazemos à baila, as ideias de Bakhtin que enfatiza o caráter
interativo da linguagem, no qual ela é compreendida por sua natureza sócio-histórica.
Para ele, “as palavras são tecidas a partir de uma multidão de fios ideológicos e servem
de trama a todas as relações sociais em todos os domínios” (BAKHTIN 1929, p. 41).
Nesse sentido, a construção do discurso está intrinsecamente relacionada às
condições de produção e às direções proposicionais que se engendram num determinado
contexto.
Tomando o texto dramático nessa perspectiva, sua enunciação deve ser vista
pelas condições que levam seu criador/roteirista a adequar-se a seu interlocutor real,
variando de acordo com o grupo social, a hierarquia etc., além de considerar o espaço
físico e histórico no qual sua narração/ação acontece. Assim, Bakhtin afirma:
A enunciação humana mais primitiva, ainda que realizada por um organismo individual, é, do ponto de vista de seu conteúdo, de sua classificação, organizada fora do indivíduo pelas condições extra-orgânicas do meio social. (BAKHTIN, 1992, p. 106)
Em se tratando dos aspectos orais e escritos, observamos a tentativa em
manter o êxito na conquista do espectador/leitor. Percebemos uma transposição marcada
na escrita por recursos retóricos/paratextuais tais como: as didascálias ou rubri cas, a
marca das vozes, a disposição do texto (silhueta), a relação de sentido, os diálogos, a
reação-resposta, as marcações dos personagens presentes na maioria dos textos
dramáticos com o intuito de funcionar como substitutivos às expressões gestuais e fônicas
do gênero em sua versão encenada.
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Os Conteúdos Temáticos Abordados
A interação verbal a as relações sociais coletivas podem ser consideradas
aspectos importantes que, conjuntamente articuladas, contribuem para a construção da língua.
Tendo em vista seu caráter dialógico, é nela e por meio dela, que encontramos o acervo de
conteúdos que movem as relações das sociedades. Sendo assim, a situação da enunciação e as
condições discursivas determinam como este ou aquele tema é interpretado e tomam
relevância no todo coletivo e histórico.
Pelos conteúdos temáticos é que percebemos os vários discursos e
polifonias, o que nos leva a considerar a dimensão da palavra enquanto todo, que compreende,
segundo Bakhtin, os aspectos ligados ao conteúdo (sentido), à sua expressão (escrita) e ao
estilo (entonação onde transparece a atitude valorativa acerca do objeto). Nesse sentido, não
há enunciado neutro, sem intenção ou imparcial.
Os gêneros têm caráter polifônico, estão cheios da palavra do outro, então, de outras vozes,
pois assim afirma Bakhtin:
Em cada palavra há vozes, vozes que podem ser infinitamente longínquas, anônimas, quase despersonalizadas (a voz dos matizes lexicais, dos estilos, etc.), inapreensíveis, e vozes próximas que soam simultaneamente (BAKHTIN, 1979, apud GARCEZ, 1998, p. 65).
Convém, aqui, explicitar que é da postura carnavalizante encontrada em
Bakhtin que entendemos dialogismo e polifonia no texto literário, ou seja, a escrita na qual se
lê o “outro” tido como espelho que reflete, de maneira diferenciada, a imagem original. O
dialogismo é, então, princípio constitutivo da linguagem e condição de sentido do discurso. E
a presença da polifonia num texto vai depender das estratégias discursivas nele empregadas,
mostrando as várias vozes, os vários discursos nele existentes.
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Podemos perceber esse reflexo nos conteúdos temáticos presentes no teatro,
se considerarmos a intencionalidade com que foi produzido: a louvação, a crítica à sociedade
de uma época, a personagens histórica de destaque para determinada casta social, ou
simplesmente para o deleite do espectador/ leitor, e etc.
É importante considerarmos no trato desse gênero, a reação do público
espectador ou leitor. Considerando o espetáculo (encenação), ele se dá num momento
irrepetível; o texto dramático, no entanto, é perene, é o que se mantém e poderá ser “estudado,
analisado, relido, reinterpretado, reencenado”. (PASCOLATI, 2009, p. 95).
Nessa perspectiva, há duas considerações importantes, ao nos referirmos às
várias possibilidades de encenação do texto dramático e os possíveis sentidos que o leitor
pode atribuir ao interagir em seu momento particular com o texto. Pois,
Diferentes produções interpenetram-se e enriquecem-se (...) criando um movimento incessante entre tradição/novidade ou tradição/situação. Esse movimento (...) não é característico só das produções populares, mas é característica básica das interações verbais enquanto processo discursivo (GUIMARÃES, 2000, p. 90-91).
Portanto, os conteúdos temáticos são explícitos pelo caráter dialógico da
palavra, numa atitude responsiva entre sujeitos ativos, o objeto dito e as características
temporais e espaciais, ou seja, o momento histórico único em que acontece a interação verbal
(enunciação). O que é endossado por Bakhtin ao dizer que:
O interlocutor ideal não poderá ultrapassar as fronteiras de uma classe e de uma época bem definidas. (...) Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém (BAKHTIN 1929, p. 113).
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E mais, “para a palavra (e, por conseguinte, para o homem) nada é mais
terrível que a irresponsabilidade (a falta de resposta)” (BAKHTIN 1929, p. 383).
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ANEXO B
A Construção Composicional do Texto Dramático
A característica de destaque da peça teatral é a presença do chamado texto
principal, composto pela parte do texto que deve ser dito pelos atores na peça e que, muitas
vezes, é induzido pelas indicações cênicas, ou didascálias, texto também chamado de
secundário (com valor próprio, não menos importante), que informa aos atores e o leitor a
dinâmica do texto principal (cenário, movimentos/ atitudes de atores,efeitos acústicos, etc)
Por exemplo, antes da fala de um personagem são colocadas expressões, indicando como o
texto deve ser falado. Essas indicações normalmente vêm em itálico diferenciando-se do texto
principal.
As indicações cênicas ou didascálias, segundo Maingueneau (1996), são os
textos secundários inseridos no texto principal, que normalmente estão transcodificados em
actos, em movimentos dos atores, em objetos, em cenário, em efeitos acústicos, em espaço
cênico. Essas indicações são colocadas no texto, fornecendo um referencial ao leitor e
também aos atores e diretores que irão utilizá-las ao transpor o texto para o espetáculo.
Outro elemento destacado é a ação, oriunda da própria etimologia de drama
podemos afirmar que é em torno dela que percebemos a organização da história, uma vez que
não há um narrador explícito nesse gênero. Por meio do encadeamento das ações a peça ganha
a atenção do seu leitor/espectador que vai construindo ao longo da interação com a obra as
expectativas do enredo, criando assim o que Ball (1999) chama de metáfora do jogo de
dominó. As ações vão se engendrando e contribuem à construção de sentido no todo da obra
(lida ou encenada).
No diálogo - outro elemento desse gênero - evocando os conceitos
bakhtinianos, podemos perceber que ele é em algumas situações uma forma de manipulação
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do outro, uma vez que nele se externa a luta ideológica entre as personagens. Nessa
perspectiva, faz sentido a intensidade das réplicas dando autenticidade e dinamismo à situação
discursiva. Por outro lado, há peças em que o diálogo se perde configurando-se em
“alternância de monólogos” (Pascolati, 2009).
Esse elemento pode ganhar características peculiares se o analisarmos na
linha do tempo. Segundo a autora, no drama naturalista, por exemplo, tal elemento tem uma
espontaneidade relevante; já na tragédia clássica, ele é visto por uma alternância de falas
longas e expositivas.
Fechando o tripé dramático, o conflito nasce das divergências entre as
personagens “O querer de uma personagem e a existência de um obstáculo à realização desse
desejo constituem a forma canônica de conflito no teatro” (PASCOLATI 2009, p. 101).
As Marcas Linguístico-Enunciaticas
Podendo ser encontrada nas esferas literária e artística, a peça teatral é um
gênero mobilizado por marcas lingüísticas que evidenciam com regularidade seqüências de
diálogos alternados por indicações cênicas. No primeiro, observamos a presença do enunciado
seguido de ação; uma ordenação de eventos numa sucessão temporal e causal (ordem
cronológica que por vezes apresenta-se de forma não-linear, salientando o retorno no tempo
por “flashbacks”). Seu aspecto narrativo é marcado pelo encadeamento das ações e sua
relação de causa e conseqüência/efeito. Dessa forma, há predominância de verbos em
primeira pessoa; as personagens se articulam por meio do discurso direto. Pode haver ou não
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a determinação do tempo e do espaço vai depender dos objetivos do criador do texto,
condições de produção ligadas à força ideológica que se pretende.
Outras marcas que podem aparecer são: o uso de vocativos, o modo
imperativo no sentido de ordenar ou pedir; o futuro do pretérito indicando delicadeza; os
pronomes indefinidos mostrando o sentido de completude; os dêiticos com a função de
apontar para o contexto situacional – a significação referencial dos dêiticos só pode ser
definida em função da situação, do contexto, do receptor de um ato de fala.
Além desses, é próprio do texto dramático a pergunta (reação-resposta)
marcada pela interpelação com uso de pronomes que indicam um contato direto, o dinamismo
no diálogo e proximidade dos interlocutores.
A presença da catáfora retomando as situações vividas e a polissemia
variando os significados de uma mesma palavra no texto, também são presenças marcantes no
discurso dramático.
Como podemos perceber, marca essencial no aspecto formal da peça teatral
é o trabalho do escritor num processo minucioso e singular de seleção vocabular e eleição dos
arranjos lingüísticos, um esmerilar de palavras que lhe garantirá o sucesso em seu objetivo de
construção de sentido junto ao seu leitor preferencial. Salientamos que, no bojo dessa
construção, cada enunciador mobilizará, dentro do exposto para o gênero, recursos
fraseológicos, lexicais, gramaticais, semânticos e estilísticos que denunciarão as
peculiaridades e sua performance enquanto criador.
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