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Didática e docência: formação e trabalho de professores da

educação básica

Prof. Dr. José Carlos Libâneo

I Simpósio sobre Ensino de Didática LEPED - Laboratório de Estudos e Pesquisas em Didática

e Formação de Professores27.3.2012

TÓPICOS

1. Didática: ciência profissional do professor

2. Didática como campo disciplinar e profissional:

um diagnóstico pouco estimulante

3. Para além da didática instrumental e didática

crítica: o epistemológico, o psico-pedagógico e

o sociocultural

Minha tese no XIV ENDIPE (RS):

O campo investigativo e profissional da

didática enfrenta, hoje, o dilema entre a

fidelidade ao seu objeto e o canto das sereias,

representado pelas múltiplas tentativas de

outros campos em solapar dela seu objeto ou

substituí-lo por outros.

No entanto, continua sendo, junto com as

didáticas disciplinares, o elemento nuclear no

desenvolvimento profissional de professores.

Minha tese no XV ENDIPE:

O núcleo do problema didático é a relação com o conhecimento, no qual estão implicadas questões lógicas e psicológicas. Não o conhecimento em si, mas o processo mental do conhecimento, o que implica processos de apropriação.

A apropriação de conhecimentos tem a ver com a forma de constituição dos saberes (questão epistemológica) e com a relação do aluno com o objeto de conhecimento (questão psico-pedagógica).

Conclusão: o problema didático envolve uma relação epistemológica e psicológica.

Minha tese para hoje:

A didática somente pode ser ciência profissional do professor se puder orientar os saberes profissionais do professor a partir dos seguintes pilares:

– Reconhecimento da função da escola como promotora do desenvolvimento intelectual dos estudantes

– Centramento na relação com o conhecimento e na atividade de aprendizagem (missão pedagógica X missão social)

– Vinculo entre didática e epistemologia das ciências

– Interface entre os conteúdos e as práticas socioculturais e institucionais

– Características pessoais e profissionais do professor em sua relação com o conhecimento

– Mudança do formato curricular da formação profissional: unidade entre conhecimento pedagógico e conhecimento disciplinar (da educação infantil às licenciaturas específicas)

2. DIAGNÓSTICO POUCO ESTIMULANTE

1. Tendência crescente no campo das políticas educacionais e no próprio campo científico da educação de predomínio das análises externas (sociopolíticas e institucionais) sobre as internas:

– Redução da análise pedagógica das questões educacionais em contraste com a prevalência da análise sócio-política;

– O fator pedagógico-didático tem sido o elo perdido entre as políticas públicas da educação e as práticas reais das escolas e salas de aula;

– Depreciação do pedagógico e do didático no meio acadêmico e institucional: desvalorização da pesquisa específica sobre aprendizagens e práticas de sala de aula (falta de instrumentalização para a docência).

– Enfraquecimento do campo teórico, da atividade profissional e da pesquisa em pedagogia X predominância do campo sociológico

- Anemia teórica no campo pedagógico e didático7

2. Pressão global e das políticas públicas anti-

conhecimento (e anti-escola centrada no

conhecimento), em favor da escola do acolhimento e da

integração social (Posição do Banco Mundial, Unesco,

etc., dos movimentos pós-modernos, da abordagem de

currículo instrumental das reformas educativas

internacionais)

Consequências:

• Esvaziamento do conteúdo

• Escola focada no aluno (características individuais

e sociais), não no conhecimento e aprendizagem

• Realce a um currículo de experiências,

basicamente de práticas de integração social

3. No campo propriamente didático:

– Desvinculação aprendizagem/ensino

– separação conteúdo/método da ciência/metodologia do ensino

– desconexão didática geral/didática das disciplinas

– desfocamento dos conteúdos, privilegiamento do metodológico

– fragmentação ou distorções nas relações entre aspectos sócio-políticos-culturais/aspectos pedagógico-didáticos

– separação entre didática geral (conhecimento pedagógico) e didática das disciplinas (conhecimento disciplinar)

– Fragmentação entre o socio-político, o epistemológico, o psicológico, o pedagógico

4. Dissociação conteúdo/forma ou entre conhecimento do

conteúdo e conhecimento pedagógico do conteúdo nos

currículos de formação de professores para as séries

iniciais (licenciatura em pedagogia) e para as séries

subsequentes (demais licenciaturas).

DILEMA DA LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

Para entender o problema pedagógico da mediação

entre o sujeito e o conhecimento, o conhecimento

pedagógico não é suficiente. A aprendizagem da

profissão requer o domínio de conteúdos e a formação de

ações mentais conexas a esse conteúdo (conhecimento

do conteúdo e conhecimento pedagógico do conteúdo).

Metodologia e conteúdos são indissociáveis. Esta é

precisamente, una questão epistemológica.

DILEMA DOS CURSOS DE LICENCIATURA PARA A 2ª FASE DO ENSINO FUNDAMENTAL

Para entender como se ensina um conteúdo para determinados alunos, no espaço peculiar da sala de aula, em uma realidade sociocultural complexa, somente o conhecimento do conteúdo é insuficiente. É necessário saber como converter pedagogicamente a ciência em matéria de ensino (conhecimento pedagógico do conteúdo: características dos alunos e seu contexto, adequação do ensino, organização de situações pedagógico-didáticas). Esta é, precisamente, uma questão pedagógica.

3. Para além da didática instrumental e

didática crítica: o epistemológico, o

psico-pedagógico e o sociocultural

1. Reafirmação do campo teórico e investigativo da

pedagogia e da pesquisa propriamente pedagógica.

- A didática pertence ao campo investigativo da

pedagogia

- Não é possível revigorar a didática sem o

revigoramento da pedagogia.

- Sem teoria pedagógica e sem a pesquisa

propriamente pedagógica, as questões de educação e

ensino se fragmentam em temas isolados, ao gosto dos

campos científicos que disputam poder na área da

educação.

Educação:

uma prática social,

materializada numa atuação efetiva na formação

e desenvolvimento de seres humanos,

em condições socioculturais e institucionais

concretas,

implicando procedimentos peculiares e

resultados,

visando mudanças qualitativas na aprendizagem

e na personalidade dos alunos.

ESPECIFICIDADE DA ANÁLISE PEDAGÓGICO-

DIDÁTICA

• A pedagogia, ou a análise pedagógico-didática, diz respeito às formas pelas quais práticas sociais formam o desenvolvimento cognitivo, afetivo e moral dos indivíduos. O resultado social, pedagógico, cultural, da escola, expressa-se nas aprendizagens efetivamente consumadas.

• A atividade pedagógica somente é pedagógica se ela mobiliza internamente o desenvolvimento das capacidades cognitivas e a formação da personalidade global dos alunos

2. Didática, como ciência profissional do professor: aprendizagem por meio do ensino

– O objetivo da ação didática: assegurar o processo de conhecimento pelo aluno, por meio do ensino.

– O elemento nuclear da didática é o processo mental do conhecimento.

– Mediação didática visa: apropriação, pelo aluno, de métodos e instrumentos mentais como meios da atividade humana, em função do desenvolvimento global dos alunos.

– Instrução: unidade entre ensino e aprendizagem.

Na visão da teoria histórico-cultural (Vygotsky):

ensino (“obuchénie”) entendido como uma atividade que

junta, no mesmo processo, o ensino e a aprendizagem, a

transmissão e a apropriação de conhecimentos.

Ou seja:

a) aprender com a intenção e orientação de alguém, num

ambiente social de aprendizagem; unidade dos processos

de ensino e aprendizagem;

b) aprender como atividade autônoma do aluno, orientada

por adultos ou pares, implicando participação ativa na

apropriação de conhecimentos.

A didática é um campo científico interdisciplinar

cujo objeto é o ensino dirigido para a aprendizagem.

Seu propósito é prover a organização adequada da

atividade de ensino-aprendizagem com vistas ao

desenvolvimento das capacidades intelectuais e da

personalidade integral dos alunos.

S O

Mediaçãocognitiva

Mediaçãodidática

MEDIAÇÃO DIDÁTICA E MEDIAÇÃO COGNITIVA

21

3) Foco nos conteúdos, enquanto base para a

formação de processos mentais (conceitos)

O conhecimento (o processo mental do

conhecimento) como questão de fundo da didática

Apropriação de conteúdos visando a formação de

processos mentais (processo mental do

conhecimento).

Instrução: ensino-aprendizagem

4) Inseparabilidade entre conteúdos e metodologias

– Os métodos de ensino são derivados dos processos investigativos pelos quais se chega à constituição de um conteúdo.

– Vínculo entre didática e epistemologia das ciências. Vínculo didática básica/didáticas disciplinares.

– A formação inicial de professores precisa estabelecer relações teóricas e práticas mais sólidas entre a didática e a epistemologia das ciências.

– Romper com a separação entre conhecimentos disciplinares e conhecimentos pedagógico-didáticos

Meirieu:

• “nenhum conteúdo existe fora do ato que permite pensá-

lo, da mesma forma que nenhuma operação mental pode

funcionar no vazio”.

• Ou seja, a formação de ações mentais supõe os

conteúdos, pois as ações mentais estão já presentes nos

processos investigativos e procedimentos lógicos da

ciência ensinada.

• O que importa é a capacidade do professor de traduzir os

conteúdos de aprendizagem em procedimentos de

pensamento. Isto é, colocar os alunos em uma atividade

mental, em uma seqüência de operações mentais, onde

possa operar com conceitos.

5) Articulação entre práticas pedagógicas (o pedagógico-

didático) / práticas socioculturais e institucionais

As práticas socioculturais e institucionais que

crianças e jovens compartilham na família, na

comunidade e nas várias instâncias da vida cotidiana

são, também, determinantes na formação de

capacidades e habilidades, na apropriação do

conhecimento e na identidade pessoal. As práticas

socioculturais aparecem na escola tanto como contexto

da aprendizagem quanto como conteúdo.

Na abordagem do duplo movimento, enfatizamos as

relações entre conceitos cotidianos já adquiridos pelas

crianças, conceitos da matéria e conhecimento local. O

principal ponto do duplo movimento no ensino é criar

tarefas de aprendizagem que podem integrar o

conhecimento local com relações conceituais nucleares de

uma matéria, de modo que o aluno possa adquirir o

conhecimento teórico a ser utilizado em suas práticas

locais. (...)

Na abordagem do duplo movimento, o plano de ensino

do professor deve avançar de características abstratas e

leis gerais de um conteúdo para a realidade concreta, em

toda a sua complexidade. Inversamente, a aprendizagem

dos alunos deve ampliar-se de seu conhecimento pessoal

cotidiano para as leis gerais e conceitos abstratos de um

conteúdo (HEDEGAARD, 2005, pp. 69-70).

TRÊS QUESTOES PONTUAIS NA TEORIA DIDÁTICA:

a) A lógica dos saberes a ensinar, isto é, a relação do

ensino com os conteúdos: este é um problema

epistemológico.

b) A lógica dos modos de aprender dos alunos com base

em seus processos cognitivos, afetivos, linguísticos, etc.

Este é um problema psicológico.

c) Organização do ambiente social para o desenvolvimento

humano pela organização das situações didáticas e dos

meios do ensino, em que se une o epistemológico e o

cognitivo. Este é um problema pedagógico-didático.

6) Investimento prioritário na investigação dos saberes

profissionais do professor a partir das lógicas próprias das

práticas de ensino.

Não a partir dos discursos dos professores sobre as suas

práticas.

Centrar a pesquisa pedagógica na escola e no ensino

pode ser um caminho para formar a estrutura da atividade

de ensino, de onde decorrem os saberes profissionais

SABERES DOCENTES COM BASE NA

TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL

1. Conhecimento do conteúdo

2. Domínio da metodologia de ensino: conhecimento epistemológico e pedagógico-didático do conteúdo

3. Conhecimento e sensibilização em relação às características individuais e sociais em sua relação com a aprendizagem escolar.

4. Conhecimento e sensibilização em relação às práticas socioculturais e institucionais que atuam (intervêm) na mediação pedagógica

5. Interiorização de características pessoais e profissionais da profissão professor

7) Ampliação dos elementos constitutivos da

didática: socioculturais, antropológicos, lingüísticos,

estéticos, comunicacionais, midiáticos.

- Incorporação de temas de outras áreas relacionados com a linguagem, a cultura, a diferença, os processos comunicações, as mídias.

Campo

da

didática

8) Mudar o formato da formação profissional de

professores para a educação básica.

• Estabelecer sólidas relações entre a didática e a

epistemologia das disciplinas

• Formação de professores: integração entre conhecimento

do conteúdo e conhecimento pedagógico do conteúdo.

• Busca de outro formato de formação, dando unidade à

formação para séries iniciais e séries posteriores.

DILEMA DA LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

Para entender o problema pedagógico da mediação

entre o sujeito e o conhecimento, o conhecimento

pedagógico não é suficiente. A aprendizagem da

profissão requer o domínio de conteúdos e a formação de

ações mentais conexas a esse conteúdo (conhecimento

do conteúdo e conhecimento pedagógico do conteúdo).

Metodologia e conteúdos são indissociáveis. Esta é

precisamente, una questão epistemológica.

DILEMA DOS CURSOS DE LICENCIATURA PARA A 2ª FASE DO ENSINO FUNDAMENTAL

Para entender como se ensina um conteúdo para determinados alunos, no espaço peculiar da sala de aula, em uma realidade sociocultural complexa, somente o conhecimento do conteúdo é insuficiente. É necessário saber como converter pedagogicamente a ciência em matéria de ensino (conhecimento pedagógico do conteúdo: características dos alunos e seu contexto, adequação do ensino, organização de situações pedagógico-didáticas). Esta é, precisamente, uma questão pedagógica.

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