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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS
CAMPUS DE JABOTICABAL
Orientador: Prof. Dr. Mateus J. R. Paranhos da Costa
Trabalho de Iniciação Científica
apresentado à Faculdade de
Ciências Agrárias Veterinárias
UNESP, Campus de
Jaboticabal, como parte das
exigências para graduação em
Zootecnia.
.
JABOTICABAL – SP
2º SEMESTRE DE 2007
Efeitos da distância e do tipo de
veículos usados no transporte de bovinos
sobre o pH final e a freqüência de
hematomas como indicadores de bem-estar.
José Rodolfo Panim Ciocca
i
Dedico este...
A Deus...
Por estar presente em todos os momentos
que precisei.
À minha família...
Pessoas especiais Que sempre fizeram
a diferença.
Á minha namorada…
Pela compreensão e carinho.
ii
AGRADECIMENTOS
A Deus pela oportunidade e pelo privilegio que me foi dado em compartilhar
tamanha experiência com todos que nesta faculdade convivi.
Ao Professor Mateus José Rodrigues Paranhos da Costa, pelo incentivo,
simpatia e presteza no auxilio das atividades e discussões sobre o andamento e
normatização desta monografia.
À banca examinadora, Prof. Dr. Mateus José Paranhos da Costa, Prof. Dr.
Alexandre Amstalden Moraes Sampaio, Msc. Julia Eumira Neves, por todas as
sugestões e discussões que contribuíram para a melhoria do trabalho.
A todos os professores da FCAV que de alguma forma contribuíram com meu
amadurecimento, pelo espírito inovador e empreendedor na tarefa de multiplicar seus
conhecimentos, pela sua disciplina nos ensinando a importância do trabalho em grupo.
Ao grande amigo Stavros Platon Tseimazides, pela paciência, pelos grandes
ensinamentos e oportunidades dadas para a realização deste.
À amiga Patrícia Cruz Barbalho, que também me deu grande apoio em muitos
momentos que precisei para a discussão sobre o tema.
À Julia Eumira Neves pela sua paciência nas explicações e pelos conhecimentos
passados.
A todos os integrantes do Grupo ETCO, Adriano, Adriana, Ana Lucia, Murilo,
Julia, Gerusa, Aline, Anita, Natalia, e em especial a amiga Livia (Novilha) por todos os
“quebra galhos” que fez por mim enquanto estive fora, o que foi de suma importância
para este.
Ao PET-Zootecnia, por ter me dado a oportunidade de realizar um grande
desenvolvimento pessoal e intelectual. Agradeço em especial a Prof. e Tutora Maria
Imaculada Fonseca, pela amizade e pelos grandes conselhos que me concebeu durante
minha permanência no grupo.
Aos amigos da Embrapa Suínos e Aves, Eduardo Baggio, Denis, Gustavo,
Ediane. Em especial aqueles que de alguma forma auxiliaram no desenvolvimento da
escrita do trabalho, Natália Athaíde, Aurélia de Araújo, Nelise Triques e Osmar Antônio
Dalla Costa.
iii
A grande família com que compartilhei os melhores momentos de minha vida. A
todos esses irmãos que com orgulho convivi durante toda minha faculdade, em especial
as repúblicas Entrometheu, Adriano (Tiririca), Vinícius (Pergunta), Marco (Koringa),
Gustavo (Bodão), Haroldo (Pistolinha), Alex (Lôrpa), Felipe (Tumor), Oberdan (Lírou),
Fernando (Futum), Guilherme (Pedala), além dos inúmeros veteranos e agregados, em
especial o amigo Fabiano.
E à República Mata Bixera Pistolinha, Lírou, Pedala, Victor (Cervo), Mikhael
(T-tinha), Bruno (Mininão), Thiago (Gozo), Daniel (Rombo), Maurício (Gaúxo) e
Eduardo (Biruleiby), além dos veteranos-mores e agregados.
Aos colegas de classe pela espontaneidade e alegria durante a inesquecível
convivência de cinco anos. Pela troca de informações e materiais como uma
demonstração de amizade. São eles: Pistolinha, Bodão, K-strado, Mala, Tansso,
Novilha, Xoko, Rodela, Caxão, Pinto, Refugo, Mama-ki, 100 Bola, Furunku, Missóka,
Bidê, Xoxota, Gripi, Farofa, Anemia, Mariçol, Tulipa, Pipeta, Budega, Pirikita, Pixoka,
Gazaio, Passivo, Bago, Vurto, Kotoko, Berla, Guache, Ternura, Porka, Cintra, Sô-
Larga, Fudêncio, Sô-Bobo, Menudo, Gretchen, Tibola, Tigela, Lennon, Madinbú, Janju,
Kirim, Supimpa, Fefelety, Freada, Ana Roberta, Cabral...
Não poderia esquecer-se de agradecer novamente a todos da minha família, ao
meus pais, meus irmãos, tios, primos e avós. Estes que em todo o momento sempre me
apoiaram e me incentivavam nessa caminhada.
À Bruna de Campos Micelli, por toda sua compreensão, amor e carinho em
todos os momentos em que mais precisei.
E a todos aqueles que não mencionei mas que de alguma forma contribuíram
para a desenvolvimento.
iv
EFEITOS DA DISTÂNCIA E DO TIPO DE VEÍCULOS USADOS NO
TRANSPORTE DE BOVINOS SOBRE O PH FINAL E A FREQÜÊNCIA DE
HEMATOMAS COMO INDICADORES DE BEM-ESTAR.
RESUMO - O transporte rodoviário de bovinos, um dos segmentos do manejo racional
pré-abate, é considerado relevante quando se trata em bem-estar animal. No entanto,
esse tipo de transporte pode provocar estresse, perda de peso e contusões, podendo
inclusive levar animais à morte, quando realizado em condições desfavoráveis. O
trabalho teve como objetivo avaliar a influência da distância percorrida e do tipo de
veículo utilizado sobre a incidência de contusões e nas variações de pH em carcaças 24
horas após o abate, como indicadores do bem-estar de bovinos durante o transporte.
Foram avaliados 1776 animais, sendo 69,9% transportados em caminhões tipo “truck” e
30,1% em caminhões tipo carreta, seguindo-se a rotina normal de trabalho de um
frigorífico. Foram consideradas seis categorias de distâncias para a avaliação do
trabalho (até 200km, de 200 a 400km, de 400 a 600km, de 600 a 800km, de 800 a
1000km e acima de 1000km), para a avaliação das contusões nas carcaças, seguiu-se o
critério descrito pela Aus-Meat (2001) e o pH foi avaliado 24 horas post-mortem.
Observou-se que houve efeito significativo das classes de distâncias de viagem para as
duas variáveis estudadas pHu (P<0.01) e freqüência de hematomas (FH: P=0,025),
sendo que os maiores valores médios de pHu foram encontrados para as classes de
distâncias entre 800 e 1000Km (pHu=5,83) e >1000Km (pHu=5,93), que diferiram
entre si e também das demais médias, que variaram entre 5,67 e 5,75. Por outro lado, o
mesmo não ocorreu para a freqüência de hematomas; com freqüência mais alta na classe
v
de distância <200Km (FH=1,58), que não diferiu da classe de distância de 800 a
1000Km (FH=1,57), mas diferiram das demais (FH= 1,48 para distância >1000Km;
1,33 para 200 a 400Km e 1,27 para 400-600 Km; Figura 1). Com base nestes resultados
pode-se concluir que tanto viagens longas como viagens curtas podem causar estresse e
sofrimento aos animais, com conseqüentes perdas quantitativas e qualitativas à carne.
Palavras-Chave: Transporte, veículo, hematoma, bovino.
vi
EFFECTS OF DISTANCE AND VEHICLE TYPE USED ON CATTLE
TRANSPORT ON MEAT QUALITY.
SUMMARY - The objectives of this study were to evaluate the influence of the
distance traveled and the vehicle type used during cattle transport on the frequency of
bruising in the carcass and the pH of meat, both as indicators of the animal welfare. The
study was done with 1776 animals, 69.9% of them transported non-articulated trucks
and 30.1% in articulated trucks, following the usual routine adopted for cattle
transportation. The pH was measured in the muscle longissimus dorsi, 24 hours after
slaughter (pHu). Six categories of distances were considered: up to 200km, from 200 to
400km, from 400 to 600km, from 600 to 800km, from 800 to 1000km and >1000km.
The evaluation of bruises in the carcasses was done according the Aus-Meat (2001) and
the pH values were measured in the muscle longissimus dorsi 24 hours after slaughter
(pHu). There was significant effect of the distance on pHu (P <0.01) and bruises
frequency (FH: P=0.025). The largest mean of pHu was found for distances larger than
1000km (pHu=5.93), followed by the class from 800 to 1000Km (pHu=5.83); for the
other classes of distances the pHu means ranged from 5.67 to 5.75. On the other hand,
the frequency of bruises was higher for the distance class <200Km (FH=1.58) that didn't
differ from the class from 800 to 1000Km (FH=1.57), which differed of the others
distance classes (FH = 1.48 for distance >1000Km; 1.33 for 200 to 400Km and 1.27 for
400-600 Km. According to these results it were concluded that long trips as well as
short trips result in higher stress for cattle.
KEYWORDS: Transport, vehicle, bruising, cattle.
vii
ÍNDICE
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 1
2. OBJETIVOS ................................................................................................................ 5
3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .................................................................................. 6
3.1. Bem-estar animal ................................................................................................. 6
3.2. Manejo pré-abate ................................................................................................. 9
3.3 Transporte ........................................................................................................... 11
3.3.1. Distância e duração da viagem ..................................................................... 12
3.3.2. Veículos ........................................................................................................ 15
3.4. Qualidade da carne ............................................................................................ 16
3.4.1. pH .................................................................................................................. 17
3.4.2. Contusões ...................................................................................................... 19
4. MATERIAS E MÉTODOS ...................................................................................... 21
4.1. Analise estatística ............................................................................................... 22
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO .............................................................................. 24
5.1. Efeitos das classes de distância no pHu e na freqüência de hematomas ....... 25
5.2. Efeitos do tipo de veículo no pHu e na freqüência de hematomas ................ 29
5.3. Efeitos da localização do animal nos compartimentos de carga dos veículos
.................................................................................................................................... 30
6. CONCLUSÕES ......................................................................................................... 31
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 32
1
1. INTRODUÇÃO
O Brasil é considerado maior produtor e exportador de carne bovina do mundo e
sua exportação em 2005 correspondeu a 1.892 mil toneladas equivalente carcaça,
contribuindo com uma parcela muito importante do PIB brasileiro. Segundo
ANUALPEC 2005, apenas 22,8% da produção de carne do país é para exportação,
enquanto 78% são destinados ao consumo interno. Seu rebanho é de aproximadamente
194 milhões de cabeças, localizado em sua maior parte na região centro-oeste do país
(34,7% do efetivo nacional), principalmente nos estados de Mato Grosso, Mato Grosso
do Sul e Goiás.
De acordo com os dados da ANUALPEC 2005, são abatidos por ano 45,4
milhões de bovinos, o que corresponde a uma taxa de abate de 27,5%, sendo assim,
mais de 40 milhões de bovinos anualmente transportados em caminhões pelas rodovias
brasileiras com destino aos frigoríficos para serem abatidos, sendo esta uma etapa
crucial no sucesso da pecuária brasileira.
2
No Brasil o tipo de transporte mais comum é o rodoviário, que é geralmente
realizado em caminhões boiadeiros do tipo “truque” com capacidade média de 20
animais (JOAQUIM, 2002).
De acordo com o Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes
(DNIT), da extensão total das rodovias brasileiras (1.610.076 km), 88% dos trechos não
são pavimentados e, dos trechos pavimentados, 95% são de pista simples. Além disso,
segundo a Pesquisa Rodoviária de 2005, realizada pela Confederação Nacional do
Transporte (CNT, 2005), 72% das principais rodovias do país encontram-se com estado
geral deficiente.
Esses fatores somados ao transporte inadequado comprometem o bem-estar
animal, causando estresse, contusões, fraturas, arranhões, exaustão metabólica,
desidratação e até a morte de animais. Além disso, outros procedimentos envolvidos no
manejo pré-abate podem ter efeitos no bem-estar animal, por exemplo o aumento do
sofrimento dos animais, com conseqüências negativas na qualidade da carcaça e da
carne, causando problemas de cortes escuros ou carne exudativa (FERNANDEZ et al.
1992; GREGORY, 1994; ROÇA & SERRANO, 1996).
Para KNOWLES (1999), durante o transporte, os animais são expostos a
ambientes estranhos e muitas vezes são misturados com outros grupos que possuem
animais com chifres, alta reatividade e de diferentes sexos e idades. Outros pontos que
contribuem para o estresse são o manejo inadequado dos animais antes do embarque,
condições climáticas extremas, como excessivo calor ou frio, uso de choque elétrico,
estado de manutenção do veículo, a densidade de animais no caminhão e os manejos
grosseiros por imperícia ou negligência dos operários. Essas situações podem acarretar
em perda de peso e contusões, podendo inclusive levar animais à morte.
3
Essas alterações que ocorrem na carga emocional dos animais, aliadas ao esforço
físico realizado no período de embarque, transporte, desembarque e o tempo de espera
no curral, modificam o metabolismo post-mortem (velocidade de glicólise) e o nível de
acidez muscular (AHN et al. 1992; BOLES et al. 1993).
O aumento nas exportações da carne bovina brasileira e as constantes exigências
internacionais na qualidade da carne e no bem-estar dos animais vêm forçando um
aumento em pesquisas cientificas almejando mudanças em toda cadeia produtiva da
carne. Segundo SWATLAND (1999) a tecnologia do abate dos animais destinado ao
consumo, somente assumiu importância científica quando se observou que os eventos
que se sucedem desde a propriedade rural até o abate do animal tinham grande
influência na qualidade da carne.
Transporte, manejo e espera dos animais nos currais do frigorífico podem afetar
não só o peso da carcaça como também outras características como o pH, cor, textura e
capacidade de retenção de água (WARRISS, 1990). Para HOFMANN (1988), o pH
influencia na cor, textura, sabor, retenção de água e também na vida útil do produto.
Segundo LUCHIARI FILHO (2006) há grande amplitude no termo “qualidade”
quando se trata a respeito de carne, o que pode levar a diferentes interpretações, citando
a explicação em que WARRISS (2000) define ser através do rendimento e composição;
aparência; palatabilidade, integridade do produto e qualidade ética, sendo a última
relacionada a questões de bem-estar animal.
Para BARBALHO (2006), encontra-se uma convergência para a produção do
produto carne, mostra que o excesso de agressividade no manejo pré-abate gera não
apenas estresse aos animais como também tem influencia negativa na qualidade
intrínseca da carne, além de descartes por hematomas.
4
LUCHIARI FILHO (2000) também afirmou que todo e qualquer estresse
imposto ao animal na fase ante mortem terá efeito na qualidade da carne. A diminuição
na qualidade no que diz respeito à maciez, por exemplo, pode ocasionar carnes mais
duras se comparadas àqueles que não sofreram estresse e que estes problemas estão
diretamente relacionados ao manejo dispensado no período anterior ao abate.
Assim, programas de qualidade de carne devem ter como ênfase não só a oferta
de produtos seguros, nutritivos e saborosos, como também ter compromissos com a
produção sustentável e a promoção do bem-estar animal e humano, assegurando
satisfação do consumidor e renda ao produtor e a indústria (PARANHOS DA COSTA,
2002).
5
2. OBJETIVO
O trabalho teve como objetivo avaliar a influência da distância percorrida e do
tipo de veículo utilizado sobre a incidência de contusões e nas variações de pH em
carcaças 24 horas após o abate, como indicadores do bem-estar de bovinos durante o
transporte.
6
3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
3.1. Bem-estar animal
O tema bem-estar animal vem recebendo atenção especial nos meios
técnico, científico e acadêmico. Aliado as questões ambientais e a segurança alimentar,
o bem-estar animal vem sendo considerado entre os três maiores desafios confrontando
a agricultura nos anos vindouros (ROLLIN, 1995).
Bem-estar é um termo de uso corrente em várias situações e seu significado
geralmente não é preciso. Entretanto, definição objetiva de bem-estar faz-se necessária
para a utilização científica e profissional do conceito. Bem-estar deve ser definido de
forma que permita pronta relação com outros conceitos, tais como: necessidades,
liberdades, felicidade, adaptação, controle, capacidade de previsão, sentimentos,
sofrimento, dor, ansiedade, medo, tédio, estresse e saúde (BROOM & MOLENTO,
2004).
7
Para uma definição de forma simples e clara, bem-estar é o estado de um
indivíduo em relação às suas tentativas de adaptar-se ao seu ambiente em um dado
momento (BROOM 1986).
Segundo PARANHOS DA COSTA & PINTO (2006), a definição do estado de
bem-estar de um determinado animal deve considerar três abordagens distintas, porém
complementares:
1. Estado psicológico do animal – quando o bem- estar é definido em função dos
sentimentos e emoções dos animais, sendo que animais com medo, frustração e
ansiedade enfrentariam problemas de bem-estar.
2. Funcionamento biológico do animal – os animais deverão manter suas
funções orgânicas em equilíbrio, sendo capazes de crescer e de se reproduzir
normalmente, estando livre de doenças, injúrias e sem sinais de má nutrição, além de
não apresentarem comportamentos e respostas fisiológicas anormais.
3. Vida natural – assume-se que os animais deveriam ser mantidos em ambientes
próximos ao seu habitat natural, sendo livres para desenvolver suas características e
capacidades naturais.
Nas últimas décadas, diferentes indicadores para avaliação do bem-estar de
animais de produção têm sido descritos e levam em conta as três abordagens acima
citadas. Esses indicadores podem ser divididos em três grupos, de acordo com
(CAMBRIDGE E-LEARNING INSTITUTE, 2006): 1- indicadores fisiológicos; 2 -
indicadores do comportamento - relacionados aos estados mentais do animal e 3 -
indicadores de produção - baseados no resultado de produção dos animais (produção de
leite, ganho de peso).
8
É possível observar estes diferentes indicadores em plantas frigoríficas. Entre os
exemplos de indicadores, cita-se o pH da carne como fisiológico, o medo do animal
frente ao homem (transporte e recuo de animais nos currais) e a permanência em
ambientes não familiares como psicológico e comportamental e a perda de peso como
um exemplo de indicador produtivo.
Sabe-se que o comportamento animal ainda é pouco utilizado na aplicação de
práticas de manejo em fazendas e frigoríficos, resultando em manejos inadequados e
grandes perdas em níveis de bem-estar e qualidade da carne.
GRANDIN (1996) afirma que existem cinco problemas básicos no bem-estar em
plantas frigoríficas:
1. Métodos e equipamentos estressantes
2. Distrações que impedem o movimento do animal
3. Ausência e/ou carência de treinamento aos funcionários
4. Pouca manutenção em equipamentos
5. Más condições em que os animais chegam ao frigorífico.
Atualmente os consumidores têm uma preocupação crescente de que a carne que
compram deva vir de animais criados, manejados e abatidos de maneira que leve em
consideração o seu bem–estar. De acordo com WARRISS (2000), as pessoas desejam
comer carne com “qualidade ética”, isto é, carne de animais que tenham sido criados,
tratados e abatidos em sistemas que promovam o bem–estar, mas que também sejam
sustentáveis e ambientalmente corretos. ROPPA (2001) declarou que os países
candidatos a exportar para a União Européia deverão estar aptos a satisfazer as Normas
Européias de Rastreabilidade, de Proteção do Meio Ambiente e de Bem-estar dos
Animais.
9
Segundo MACHADO FILHO (2000), no Brasil, embora o bem–estar animal possa
ainda não ser uma questão prioritária entre os consumidores, qualidade da carne e
impacto na saúde já aparecem como questões centrais para o público. Os produtores
brasileiros podem esperar uma demanda crescente por produtos “orgânicos” e
saudáveis. Esta demanda poderá talvez incluir a preocupação com o bem–estar animal.
3.2. Manejo pré-abate
O manejo de bovinos no pré-abate é uma das principais causas da depreciação do
bem-estar, que pode ser avaliado através da presença de lesões traumáticas na carcaça e
redução da qualidade da carne (GRANDIN 1997, 2000). Para DALLA COSTA (2005)
os responsáveis por esta etapa da produção são agroindústrias, produtores,
transportadores e poder público.
O efeito do manejo pré-abate e as respostas quando em contato com o homem
são de extrema importância para os bovinos (GRANDIN, 1997; SHUTT & FELL,
1990). O excesso de agressividade nesta fase, além do estresse dos animais, poderá
influenciar de forma negativa sobre a qualidade da carne e como conseqüência desse
manejo pré-abate inadequado tende a apresentar alterações depreciativas na cor, maciez
e pH. Os prejuízos econômicos gerados pelo descarte de carne de baixa qualidade
podem ser evitados com a implantação de técnicas de manejo racional.
Segundo estimativas de GRANDIN (1980), o estresse dos bovinos no manejo
pré-abate gera aproximadamente três milhões de dólares/ano de prejuízo aos
abatedouros em decorrência das contusões nas carcaças. A economia americana perde
anualmente US$ 22.500.000,00 com os danos equivalentes em aproximadamente 9,2%
10
das carcaças, enquanto que na Nova Zelândia, dos bovinos abatidos 40% seriam
contundidos no manejo pré-abate.
Para que as carcaças não sofram alterações irreversíveis quantitativas (lesões e
hematomas) e qualitativas (carnes PSE – pale, soft, exudative - e DFD – dark, firm e
dry) é necessário um manejo pré-abate adequado, com adequação de instalações (na
propriedade e no frigorífico), condições de transporte (duração, densidade, boas
estradas), período de descanso no frigorífico e sistema de atordoamento eficaz. Sendo
necessário para isso, dispor de mão-de-obra qualificada para executar estas atividades
com eficiência (DALLA COSTA, 2005).
A preocupação com o bem-estar dos bovinos contribui para a formação do
conceito e da imagem do produto no mercado, sendo este importante fator de produção
para os consumidores, geralmente associado à questão da segurança alimentar e da
preservação do meio ambiente (DEN OUDEN, 1997).
GRANDIN (2003) afirmou que as indústrias elevam seus gastos na aquisição de
novos equipamentos, mas se esquecem das boas práticas de manejo pré-abate que
podem levar a resultados tão bons quanto a aplicação de novas tecnologias.
É importante ressaltar que um manejo pré-abate realizado de forma adequada
pode melhorar os resultados e proporcionar o bem-estar dos bovinos, minimizando
perdas quantitativas e qualitativas da carne e que instalações adequadas influenciam
substancialmente na qualidade do serviço resultando numa maior produtividade. A
utilização de equipamentos que facilitem e contribuam com o bem-estar do trabalhador
e do animal são requisitos fundamentais para impulsionar o desempenho de uma
organização.
11
3.3 Transporte
O transporte e abate de bovinos representam os estágios finais do manejo pré-
abate no sistema de produção designado a produzir um constante produto de alta
qualidade com características organolépticas desejadas. Entretanto, é freqüentemente
sugerido que ambos, transporte e condições dentro do frigorífico, podem resultar em
estresse, que é prejudicial ao bem-estar do animal e a qualidade da carne
(TRUNKFIELD & BROMM, 1990; LENSINK et al, 2001; VAN DE WATER et al
2003).
Alguns trabalhos com enfoque no transporte de bovinos estão disponíveis
(KNOWLES, 1999; GRANDIN, 1997; HEMSWORTH et al, 1995; TARRANT, 1990;
TRUNKFIELD & BROMM, 1990). STEPHENS (1980) e FRASER et al (1975)
discutindo a ocorrência de estresse e suas causas e a adoção de algumas medidas para
melhorar o bem-estar dos animais.
O estresse provocado pelo transporte afeta vários aspectos em relação à
qualidade da carne de animais domésticos (MITCHELL, HATTING, & GANHAO,
1988; TARRANT, 1981; TARRANT, KENNY, HARRINGTON, & MURPHY, 1992).
Para GREGORY (1996) outros fatores também podem agir juntos ao estresse emocional
do transporte, tais como: brigas, medo, ruídos, vibrações e doenças.
No Brasil, o transporte de bovinos é realizado em grande parte por caminhões
e/ou carretas, muitas vezes sem manutenção adequada e a presença de metais ou peças
soltas acabam gerando ruídos desagradáveis aos animais levando, muitas vezes, ao
estresse. Por outro lado, durante o transporte, os bovinos não são capazes de
expressarem todos os comportamentos normais.
12
O elevado nível de estresse fisiológico e o esforço físico dos animais durante o
transporte podem causar depleção do glicogênio muscular, conduzindo ao alto valor do
pH último, o que pode resultar em carne DFD (dura, firme e seca) (McVEIGH &
TARRANT, 1982). Para VAN DE WATER (2003) carnes do tipo DFD não são
atrativas para consumidores devido à cor escura e a aparência seca, como também é
mais susceptível à deterioração bacteriana pelo alto pH (>5,8), não permitindo
exportação.
3.3.1. Distância e duração da viagem
Segundo GRANDIN (1997), a distância pode causar estresse psicológico aos
bovinos, uma vez que os animais estão submetidos a ambientes novos, manejo (não
familiares) e estresse físico devido a cansaço, contusões, temperaturas desagradáveis e
jejum alimentar.
Em trabalho de WARRISS et al. (1995) a distância percorrida pelos bovinos
entre a fazenda e o frigorífico foi considerada como causa da perda de peso. As
diferentes distâncias percorridas entre a origem e o abatedouro também podem gerar
decréscimo do peso vivo dos animais, que levam aproximadamente 5 dias após a
viagem para recuperar o peso perdido. Em outro trabalho do mesmo autor (WARRISS,
1990), a perda maior de peso ocorre nas primeiras 24 horas após a suspensão do
alimento, sendo superior no período inicial de 12 horas. A porcentagem de peso perdido
em bovinos varia entre 3 a 11%, quando leva-se em conta o peso inicial. GALLO et al
(2003) também confirmou que há perdas conforme a duração do transporte, sendo que
as mesmas aumentam proporcionalmente ao tempo, podendo chegar a valores de 11,9%
após 24 horas.
13
Algumas propostas são recomendadas para reduzir a perda de peso do bovino e
da carcaça, como também na redução da deterioração na qualidade da carne, que ocorre
durante o transporte, como a utilização de soluções eletrolíticas via oral (SCHAEFER et
al., 1997), enquanto que a administração de vitaminas injetáveis A, D e E não
apresentam efeito na redução da perda de peso (JUBB et al., 1993b).
A freqüência de hematomas pode ser amplificada com a ocorrência de mais de
um embarque ou desembarque de bovinos, como é o caso de alguns países em que os
animais saem das propriedades para os leilões e, posteriormente, são encaminhados para
o abatedouro (JARVIS et al. 1995; McNALLY e WARRISS 1996; ELDRIDGE et al
1984).
Para WARRISS et al. (1995) o nível de cortisol dos bovinos está diretamente
relacionado ao tempo de transporte, com uma viagem mais curta os animais
apresentaram maiores níveis de cortisol. Concluíram que com o passar do tempo os
níveis de cortisol dos bovinos baixavam.
Os resultados de AGNES et al. (1990) mostraram que o procedimento de
embarque levou ao maior nível de cortisol. Entretanto TARRANT (1990) afirmou que
embarque e desembarque não são a maior fonte de estresse para bovinos, e que estar
dentro de um veículo em movimento é o fator mais estressante. Isso baseado no
aumento do nível de cortisol, interação social e aumento da taxa de micção. A
concentração do cortisol retorna rapidamente aos níveis normais após o desembarque
(KENT & EWBANK, 1983).
Para alguns autores (JONES & TONG, 1989; BATISTA DE DEUS et al. 1999;
KNOWLES, 1999; HARGREAVES et al. 2004) o aumento da distância percorrida
14
resulta em maior estresse nos animais, aumentando também a freqüência de carnes do
tipo DFD.
TADICH et al. (2005), avaliando novilhas transportadas durante 3 ou 16 horas,
verificaram a diminuição na concentração de cortisol plasmático após a entrada destas
nos veículos. Para MITCHELL et al. (1988) a explicação para esta redução seriam os
métodos de coleta de sangue para a avaliação do cortisol. Houve também um
decréscimo nos valores dessa variável após o desembarque das novilhas no frigorífico,
contrariando o reportado por VAN DE WATER et al. (2003).
As características sensoriais da carne são influenciadas pelo tempo de transporte
dos animais. Pesquisas mostraram que em viagens muito curtas, por não permitirem ao
animal tempo para reconhecimento da nova situação, ou excessivamente longas, que
provocam cansaço, ocasionando depleção total do glicogênio muscular o que prejudica
a queda necessária do pH para transformação do músculo em carne (SANZ et al. 1996;
GREGORY, 1998; SARTORELLI et al. 1992; TARRANT et al. 1992; MARIA et al.
2003; VILLARROEL et al. 2003).
Segundo WARRISS (1995), em trabalho desenvolvido para avaliar os efeitos
fisiológicos na duração da jornada de transporte de 5, 10 e 15 horas de viagem, concluiu
que o tempo de viagem é considerado o fator mais importante comparado à distância e
que curtos e longos períodos de transporte demonstraram maiores indicadores de
estresse do que em viagens de média duração. Por outro lado, usando um simulador de
transporte, SARTORELLI et al (1992) concluiu que a duração da viagem não é um fator
crucial no estresse do transporte como um todo.
15
3.3.2. Veículos
Diferentes tipos de veículos são empregados para o transporte de bovinos. No
Brasil são utilizados caminhões tipo “truck” (Figura 1), que costumam carregar 18
animais em ponto de abate por viagem, ou carretas (Figura 2), que transportam em torno
de 27 animais da mesma categoria.
O comportamento dos bovinos na gaiola pode ser influenciado por sua
localização em relação ao veículo em que está sendo transportado, com alteração dos
batimentos cardíacos, incidência de hematomas, elevação do pH ou aumento do nível de
cortisol plasmático. TARRANT et al. (1988) observaram que os bovinos que foram
transportados no terço final dos caminhões tiveram a concentração de cortisol alterada
em relação aos demais. Enquanto que VAN DE WATER et al. (2003) observaram que
os batimentos cardíacos foram alterados durante o transporte naqueles alocados na parte
traseira dos veículos. Essa taxa foi decrescendo gradativamente durante os primeiros 60
minutos após o início da jornada dos animais nas diferentes partições dos veículos e
estabilizando-se durante o restante do percurso.
Neste caso, deve-se atentar ao fato de que animais embarcados por ultimo
podem ter sido submetidos a um manejo mais brutal por haver maior resistência ao
entrar no veículo, o que poderá interferir na analise conclusiva do fato. JARVIS &
COCKRAM (1994) trabalhando com ovelhas, encontraram maior incidência de
contusões nos animais que viajaram na parte anterior do veículo se opondo ao
observado por TARRANT et al. (1988) e VAN DE WATER et al. (2003).
16
Figura 1. Caminhão “truque” não articulado com três eixos usado para o transporte de bovinos.
Figura 2. Veículo articulado (carreta) com um piso usado para o transporte de bovinos.
3.4. Qualidade da carne
A restrição alimentar e hídrica reduz o peso vivo dos bovinos principalmente
através das fezes, urina e desidratação, mas há também a redução no peso da carcaça
(GALLO e GATICA 1995; KNOWLES 1999). Transporte, manejo e tempo de espera
nos currais antes do abate também podem causar efeitos adversos em outras
características da carcaça, tais como pH, cor, textura e capacidade de retenção de água
(WARRISS 1990).
17
HOFMANN (1988) verificou que o pH influencia na cor, textura, sabor,
capacidade de retenção de água e na vida útil da carne, assim como a presença de
hematomas na carcaça.
3.4.1. pH
A maior influência do transporte na qualidade da carne para JOAQUIM (2002) é
a depleção do glicogênio muscular por atividade física ou estresse físico, promovendo
uma queda anômala do pH post-mortem, originando a carne DFD.
A velocidade de queda do pH, bem como o pH final da carne após 24-48 horas,
é muito variável (FORREST et al., 1979). A queda do pH é mais rápida em suínos,
intermediária nos ovinos e mais lenta nos bovinos (LUNDBERG & VOGEL, 1987).
A glicólise se desenvolve lentamente em bovinos, o pH inicial (0 horas, no
momento do abate) em torno de 7,0 cai para 6,4-6,8 após 5 horas e para 5,5 - 5,9 após
24 horas (HONIKEL et al., 1981, 1981a; SEYDI & FAYE, 1990). Por outro lado, nos
suínos a velocidade de queda é maior, atingindo valores de 5,6 - 5,7 após 6 - 8 horas
post-mortem e 5,3 - 5,7 após 24 horas (FORREST et al., 1979).
Em suínos, quando o pH 45 minutos post-mortem atinge níveis inferiores a 5,8
tem-se o indício da presença de carne PSE (HOFMANN, 1988; WIRTH, 1980, 1987).
Esta glicólise extremamente rápida, que ocorre principalmente em suínos geneticamente
susceptíveis ao estresse, não é observada em bovinos (FERNANDEZ et al., 1992;
TARRANT & MOTHERSILL, 1977), embora LOCKER & DAINES (1975) tenham
encontrado mudanças post-mortem em músculo bovino incubado a 37oC, que podem ser
consideradas como uma leve forma de PSE.
18
A carne DFD é caracterizada devido ao esgotamento dos níveis de glicogênio
causado pelo estresse crônico (BROWN et al., 1990). O manejo pré-abate realizado de
forma inadequada é o principal fator de indução ao aparecimento de cortes escuros, uma
vez que esta forma de manejo causa exaustão física ao animal (BARTOS et al., 1988;
BRUAS et al., 1990; WIRTH, 1987).
Altos valores de pH são resultados das características físicas da cor escura e alta
capacidade de retenção de água que ocorre devido à baixa conversão do ácido lático
decorrentes da reserva do glicogênio (HAMM, 1960; FIELD, 1981)
A medida do pH igual a 6,0 tem sido considerada um valor que caracteriza a
carne como sendo, ou nao, DFD, porém alguns autores demonstram que existem valores
de pH em torno de 6,2 – 6,3 que podem não caracterizar cortes escuros (NEWTON &
GILL, 1981; WIRTH, 1987). Assim como há valores de pH equivalentes a 5,8 – 5,9 que
podem ser caracterizados como esse tipo de corte.
De acordo com as exigências impostas pela União Européia (entre outros
mercados consumidores estrangeiros), valores de pH aceitos sem restrição alguma são
aqueles que variam na faixa de 5,5 a 5,8. Animais que apresentam valores de pH acima
de 6,0 (carne tipo DFD – do inglês Dark, Firm, Dry – Escura, Dura, Seca) são
destinados apenas ao mercado interno, atingindo valores econômicos menores.
A incidência de corte escuro é variável de acordo com o país em estudo: na
Finlândia 22% (PUOLANNE & ALTO, apud BROWN et al., 1990); na Irlanda 3,2%
(TARRANT & SHERINGTON, 1980), na França 3,6% (BRUAS et al., 1990), na Grã
Bretanha 4,1%, (BROWN et al., 1990). Em estudo na Grã Bretanha variações na
frequencia de carnes DFD podem ser observadas de acordo com a idade e do sexo: 1 a
19
5% para novilhos e novilhas; 6 a 10% para vacas e 11 a 15% para machos adultos
(ZEROUALA & STICKLAND, 1991).
3.4.2. Contusões
A presença de hematomas em bovinos pode resultar em perdas econômicas na
indústria da carne e é um indicador de problemas no bem-estar durante o manejo pré-
abate. Contusões podem potencialmente ocorrer na fazenda, durante o transporte, em
leilões e nos frigoríficos. Estas são provocadas por diversos fatores: o estresse (que
pode resultar em aumento da pressão arterial, causando rompimento de vasos
debilitados), a utilização de choque elétrico no manejo e a mistura de animais que nunca
conviveram juntos (GRANDIN, 1996; FAO, 2004).
O transporte influencia a qualidade da carcaça, principalmente devido ao
aumento na freqüência de hematomas, que prejudicam a qualidade visual do produto e
se estes forem graves, a carcaça deverá ser aparada, acarretando assim uma perda direta
(KNOWLES, 1999).
TARRANT et. al (1992) mostraram que a extensão do hematoma aumenta
proporcionalmente com a densidade no caminhão, com graves contusões ocorrendo em
densidades acima de 600 kg/m2 quando comparadas a outras duas densidades avaliadas
(200 kg/m2 e 300 kg/m
2 ).
Em outro trabalho, TARRANT et al. (1992) reforçou essa tese mostrando que as
extensões das contusões foram crescentes com o aumento da densidade, principalmente
quando ultrapassaram 600kg/m2. Os autores encontraram também maior incidência de
carcaças com pH acima de 6,00 nos animais que foram transportados em alta densidade.
20
Em trabalhos com suínos, LAMBOOY et al. (1985) e LAMBOOY & ENGEL (1991)
descreveram que os animais deitam com mais facilidade quando viajam em baixas
densidades e ficam mais propensos, a partir do momento em que estão deitados, a serem
pisoteados e conseqüentemente a terem novos hematomas (BARTON GADE &
CHRISTENSEN, 1998).
Quando o animal é contundido, o local do hematoma passa por uma seqüência
de mudanças que são importantes na ciência da carne em dois aspectos: o pH do
músculo e a idade do hematoma a qual pode ser estimada (GREGORY, 1996)
Para GRACEY & COLLINS (1992) hematomas brilhantes, ou seja, vermelho
vivo, são considerados recentes (com 0 a 10 horas) e hematomas escuros tem em média
24 horas de ocorrência. Estudo feito por MCCAUSLAND & MILLAR (1982)
utilizando métodos histológicos para estimar a idade da contusão demonstrou que 43%
e 90% de bovinos com hematomas analisados eram provenientes do frigorífico.
MCNALLY & WARRISS (1996) mostraram que o tamanho do hematoma
aumenta proporcionalmente com a distância e o tempo de espera nos currais do
frigorífico. Eles encontraram uma correlação positiva entre o aumento do número de
contusões e o pH último do músculo, o que é indicativo de depreciação na qualidade da
carne.
A maior influência do transporte na qualidade da carne é através da depleção do
glicogênio muscular pela atividade física e estresse físico. Durante as 24 horas após o
abate do animal, o glicogênio é convertido em ácido lático havendo associação com
queda do pH do músculo/carne. Se os níveis de glicogênio são reduzidos, a queda do pH
será menor, diminuindo a resistência da carne a ação de microorganismos o que
depreciará a qualidade da carne.
21
4. MATERIAS E MÉTODOS
Foram avaliados 1776 animais, sendo 69,9% transportados em caminhões não
articulados com três eixos (tipo “truque”, com capacidade média para 18 animais) e
30,1% em caminhões articulados com um piso (tipo carreta de um andar, com
capacidade média para 27 animais). As avaliações foram realizadas no Frigorífico
Marfrig em Promissão – SP, seguindo a rotina normal de trabalho durante o transporte
dos animais.
4.1. Medidas do pH último e freqüência de contusões.
Para avaliação das contusões nas carcaças, seguiu-se o critério descrito pela
AUS-MEAT (2001), que definiu hematoma como qualquer lesão no tecido muscular,
caracterizada por apresentar pelo menos dois cm de profundidade ou 10 cm de diâmetro
22
(ou área equivalente), exceto para as lesões no contra-filé (Longissimus dorsi), que
foram sempre consideradas graves independentemente do tamanho.
Essas avaliações foram realizadas na linha de abate dos bovinos, logo após a
retirada do couro, sendo registrada a identidade de cada animal e o local do hematoma
(quando ocorria), marcando “x” em desenhos de carcaças.
Ao final da linha de abate, as carcaças eram levadas para a câmara fria com
temperatura nunca inferior a 2°C, onde permaneciam por aproximadamente 24 horas.
Após este período (24 horas) foi mensurado o pH no músculo Longissimus dorsi (pHu)
de cada carcaça, utilizando-se o peagâmetro digital Mettler-Toledo, modelo 1140.
4.2. Analise estatística
Para a análise dos dados foi usado o procedimento GLM do pacote estatístico
SAS, sendo consideradas como variáveis dependentes a freqüência de hematomas por
carcaça e o pHu.
Dada a alta ocorrência de valores zero (0) na freqüência de hematomas por
carcaça, esses dados foram transformados em raiz quadrada de (x + 1) antes de se
proceder às análises.
Foram consideradas as seguintes variáveis independentes: distância de transporte
(definidas em 6 classes), tipo de veículo (duas classes), numero de divisórias no
compartimento de carga e posição do animal no compartimento de carga durante o
transporte (na frente, no meio ou atrás), as variáveis ocorrência de hematomas na
carcaça (pHem: 1= sim, 2= não), período ano (antes e após o treinamento dos
23
caminhoneiros), densidade de carga (baixa, ideal e alta) e ocorrência de cortes escuros
(DFD: 1= sim, 2 = não), foram incluídas nas análises apenas para ajuste dos dados.
Foram definidas seis categorias de distâncias para a avaliação do trabalho (até
200 km, de 200 a 400 km, de 400 a 600 km, de 600 a 800 km, de 800 a 1000 km e
acima de 1000 km), porém não houve nenhuma ocorrência de transporte na categoria de
distância 600 a 800 km.
Foi definido o seguinte modelo de análise:
Yijkl = µ + Di + Vj + Ck + Pl + eijkl,
onde: Y representa as variáveis dependentes, freqüências de hematomas nas carcaças
(dados transformados) e pHu; = a média geral; Di é o efeito da i-ésima classe de
distância (i=1,...,6); Vj o efeito do j-ésimo tipo de veículo (j= 1, 2); Ck o efeito do k-
ésimo número de divisórias no compartimento de carga; Pl a l-ésima posição do animal
no compartimento de carga e eijkl, o erro ou resíduo.
24
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Das 1776 carcaças avaliadas durante a coleta de dados verificou-se que mais da
metade dos animais apresentaram hematomas (57,7%) com um pH último (pHu) médio
de 5,75. Os animais que obtiveram pHu maior que 6.0 contabilizaram 2,82%,
caracterizando a carne do tipo DFD.
Os resumos das análises de variância de pHu e freqüências de hematomas são
apresentadas na Tabela 1.
25
Tabela 1. Resumo da análise de variância do pH da carne 24 horas após o abate (pHu).
Fontes de variação GL Quadrados
médios
pHu
Quadrados médios
Freqüência de
hematomas
Distância da viagem 4 1,41** 0,23*
Tipos de veículo 1 2,06** 0,32*
Número de divisórias 1 0,01ns 0,03ns
Posição do animal 2 0,02ns 0,10ns
Ocorrência de hematomas 1 0,04ns 203,39**
Período 1 0,71** 0,65**
Densidade de carga 2 0,18** 0,22ns
Ocorrência de DFD 1 11,34** 0,05ns
Resíduo 1762 0,01 0,08
CV 2,03 20,02
r2 0,56 0,62
onde: GL= graus de liberdade, CV= coeficiente de variação, r2= coeficiente de
determinação, ns = não significativo, * = P<0,05 e **= P<0,01.
5.1. Efeitos das classes de distância no pHu e na freqüência de hematomas
As porcentagens de animais transportados em função das classes de distâncias
são apresentadas na Figura 3, caracterizando que a maioria das viagens avaliadas
(50,7%) foi nas distâncias entre 200 e 400 km. Porém, houve variações das classes de
26
distância em função do tipo de veículo utilizado, com predominância de carretas em
viagens mais longas, sendo que em distâncias abaixo de 200km o transporte de animais
foi feito, quase em sua totalidade, por caminhões não articulados (trucks), como
apresentado na Figura 2.
Houve efeito significativo das classes de distâncias para as duas variáveis
estudadas pHu (P<0.01) e freqüência de hematomas (FH: P=0,025), sendo que os
maiores valores médios de pHu foram encontrados para as classes de distâncias entre
800 e 1000 Km (pHu=5,83) e maior que 1000 Km (pHu=5,93), que diferiram
significativamente entre si e também das demais médias, que variaram entre 5,67 e 5,75.
Os melhores resultados de pHu foram encontrados para as categorias de
distância entre 200 e 400 Km (pHu=5,69) e entre 400 e 600 Km (pHu=5,67).
22,6
51,7
4,7 4,2
16,9
0
10
20
30
40
50
60
0-200 Km 200-400 Km 400-600 Km 800-1000 Km >1000 Km
Po
rce
nta
ge
m
Figura 3. Porcentagens de animais transportados em função das classes de distâncias
das viagens entre as fazendas e os frigoríficos.
27
Figura 4. Porcentagens dos animais transportados em função das classes de distância e
dos tipos de veículos utilizados.
Segundo WARRISS et. al. (1995), após períodos longos de viagem há queda na
concentração de cortisol, provavelmente devido à adaptação dos animais ao transporte.
Estes resultados foram contraditórios aos encontrados por BATISTA DE DEUS et. al.,
(1999), que constataram menor média de pHu nas carcaças em distâncias curtas.
Resultado semelhante ao encontrado por KNOWLES (1999), que mostrou pHu é maior
depois de 24 horas de transporte quando comparado a uma hora de viagem.
GALLO (2003) em sua pesquisa encontrou resultados parecidos com o anterior
quando comparou os efeitos do tempo de duração no transporte (3h e 16h) concluindo
que a média do pH final de animais transportados durante 16h foi 0,236 maior que os
animais transportados por um período de 3 horas.
Deve-se ressaltar que no caso de viagens muito longas, espera-se que ocorra a
fadiga dos animais resultando em conseqüências negativas para o bem-estar animal e
para a qualidade da carne. A Figura 5 mostra que há problemas de pHu em carcaças
oriundas de animais que viajaram distâncias superiores a 800 Km. O mesmo não
ocorreu para a freqüência de hematomas; com freqüência mais alta na classe de
distância <200Km (FH=1,59), que não diferiu da classe de distância de 800 a 1000Km
0,00%
20,00%
40,00%
60,00%
80,00%
100,00%
Até 200 km 200 - 400 km 400 - 600 km 800 - 1000 km > 1000 km
Truck Carreta
28
(FH=1,57), mas diferiu das demais (FH= 1,48 para distância >1000Km; 1,33 para 200 a
400Km e 1,27 para 400-600km), como apresentado na Tabela 2.
Como mostra na tabela, os valores de pHu encontrados nas categorias de
distâncias acima de 800km não podem ser destinados a exportação uma vez que os
valores ultrapassam a margem estabelecida pelos compradores externos (<5,8).
Tabela 2: Valores médios de pHu e de freqüência de hematomas por carcaça em função
das classes de distância das viagens.
Categoria de distância pH Hematomas Exportação
Até 200 km 5,76c 1,59
a S
200 - 400 km 5,69d 1,33
c S
400 - 600 km 5,67d 1,27
c S
800 - 1000 km 5,83b 1,57
a N
> 1000 km 5,93a 1,48
b N
Não é possível explicar esta variação na freqüência de hematomas, com maior
ocorrência de contusões nas viagens mais curtas. Uma hipótese seria atribuir este
número a falhas de manejo no embarque, a possibilidade de que a viagem não tenha
sido realizada de maneira tão cuidadosa e também a efeitos de densidade. Entretanto,
ambas as situações não foram controladas. As ocorrências de hematomas e outros tipos
de injúrias são de fato preocupantes, e espera-se que ocorram com maior freqüência em
longas jornadas, mas que podem ocorrer também em viagens curtas (TARRANT &
GRANDIN 2000). Como caracterizado pelos resultados do presente estudo, o que nos
leva a concluir que mesmo viagens curtas podem causar estresse e sofrimento aos
animais, com conseqüentes perdas quantitativas e qualitativas da carne.
29
Figura 5. Efeito das distâncias das viagens no pH da carne e nas freqüências de
hematomas nas carcaças bovinas.
5.2. Efeitos do tipo de veículo no pHu e na freqüência de hematomas
Houve efeitos significativos (P<0,05) do tipo de veículo nas duas variáveis
estudadas. A média de pHu foi ligeiramente mais alta para animais transportados em
caminhões do tipo truck (pHu= 5,77) do que para os animais transportados em carretas
(pHu= 5,72). Entretanto, deve-se considerar que geralmente os caminhões do tipo truck
são destinados a viagens mais curtas e as carretas a viagens mais longas, o que pode
causar um confundimento de ambos os fatores (distância e tipo de veículo utilizado).
Apesar de pequena, a variação nestes valores merece atenção em função de
limites nos valores de pH para certas transações comerciais; por exemplo, há restrições
de mercado para carnes com pH maior que 5,8 para comercialização com a União
Européia, devido ao aumento da probabilidade de ocorrência de cortes escuros e de
carne DFD, de forma que valores próximos a este devem ser considerados como
indicadores de risco (SCHÖEBITZ, 1998).
5,5
5,55
5,6
5,65
5,7
5,75
5,8
5,85
5,9
5,95
Até 200km 200-400km 400-600km 800-1000km >1000km
pH
0
0,2
0,4
0,6
0,8
1
1,2
1,4
1,6
1,8
Hem
atom
as
pHm
Hematomas
30
Com relação aos hematomas, os resultados encontrados diferiram
estatisticamente, mas também com pequena variação entre os dois tipos de veículos. Foi
encontrado para caminhões do tipo truck uma média de 1,43 hematomas por animal,
enquanto que para as carretas foi encontrada uma média de 1,39. Considerando a rotina
de análises do frigorífico, esses dados não expressam perdas quantitativas significativas
quando comparados entre si.
5.3. Efeitos da localização do animal nos compartimentos de carga dos veículos
No presente estudo foram analisados também os efeitos do número de divisórias
e da posição dos animais no compartimento de carga. As carretas analisadas neste
estudo tinham os compartimentos com três divisórias e os caminhões truck tinham duas
ou três, com predominância de caminhões com duas divisórias.
Não houve diferenças estatísticas na freqüência de hematomas (P = 0,53 e 0,29,
respectivamente) e nem no pHu (P = 0,48 e 0,18, respectivamente), em função do
número de divisórias e também da posição do animal no compartimento de carga.
31
6. CONCLUSÕES
A distância de transporte afetou a queda do pH post-mortem e a freqüência de
hematomas. Pode-se concluir que tanto viagens longas como viagens curtas podem
causar estresse e sofrimento aos animais, com conseqüentes perdas quantitativas e
qualitativas à carne.
A pequena diferença entre tipos de caminhões utilizados no transporte de
bovinos não permite conclusões seguras para indicar qual o melhor.
Tanto a localização do animal dentro do caminhão quanto o número de
divisórias no compartimento de carga não influenciaram no bem-estar e na qualidade da
carne. Todavia, não é descartada a idéia da necessidade de se buscar melhorias neste
item, uma vez que ainda são necessários estudos a respeito dos tipos de veículos.
Melhorias no sistema de transporte devem ser implementadas, uma delas deve
ser a redução na freqüência de transporte de longa distância.
32
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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