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O CINEMA HOLLYWOODIANO ENSINANDOCOMO SER HOMEM E MULHER
HOLLYWOOD CINEMA TEACHING TO BE A MAN AND A WOMANEl T. Henn Fabris
Professora na Universidade do Vale do Rio dos Sinos-UNISINOSMesa-redonda n 54 Eixo temtico 8 Educao e Comunicao
Palavras-chave: Gnero- cinema-pedagogia cultural
Nascemos com um corpo sexuado e essa marca tem sido considerada, em nossa
sociedade, um passaporte para vivermos o masculino e o feminino. Esse determinismo
biolgico atravs do sexo, tem produzido muitas histrias de excluses que se agregam
dentro de um quadro daquelas referncias, que tm sido denominadas de anormalidades.
Podemos situar neste quadro os homossexuais, as lsbicas e todos os sujeitos que vivem
a identidade sexual de um outro jeito, que no a heterossexualidade.
Neste trabalho, vou deter-me nas identidades de gnero, embora sexualidade e
gnero sejam identidades que se aproximem estarei, neste momento, analisando como o
cinema hollywoodiano produz sentidos sobre a forma de ser homem e mulher, mais
especificamente como as identidades de gnero conectam-se s identidades docentes e
discentes.
Na sua constituio histrica os estudos de gnero mostram diferentes relaes e
prticas. Inicialmente a emergncia foi a luta contra o masculino, excluindo esse plo de
seu universo. Ao entender o gnero como uma categoria histrica que se produz nas
relaes sociais e, portanto, percebendo a limitao de excluir o plo masculino de suas
anlises e de restringir seus estudos s questes de dominado e dominador, passa ento,
a entender que h outros aspectos variados, mltiplos e desafiadores a serem
investigados nesta relao, tais como: raa/etnia, classe social, sexualidade,
nacionalidade, etc.Ao tomarem o gnero como construo social que se constitui nas relaes, estes
estudos nos possibilitam olhar para as prticas sociais que se estabelecem na sociedade,
para a forma como homens e mulheres vivem a masculinidade e feminilidade, isto ,
como os femininos e masculinos se constituem na cultura.
Vou analisar aqui, achados de uma pesquisa1 desenvolvida com dezesseis filmes
hollywoodianos em que o tema central abordava a escola e seus protagonistas;
1 Trata-se da pesquisa Representaes de espao e tempo no olhar de Hollywood sobre a escola,desenvolvida com apoio da CAPES, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, concluda em 1999.
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professores/as e alunos/as. Sero focos de anlise as representaes de professores/as e
estudantes que esses filmes colocam em circulao em salas de cinema e na televiso ou
em vdeos exibidos tanto nas residncias, quanto nas escolas, nas universidades e em
diferentes cursos de formao de professores/as.
O olhar de Hollywood
O cinema faz parte de uma arte que tambm indstria e, que, ao trazer para o
nosso cotidiano, imagens em movimento, revoluciona o conhecimento. Diferentes tipos
de imagens interpelam, intensamente, a civilizao contempornea. Quando surgiram,
tanto como formas grficas quanto atravs de imagens fabricadas por engenhosas
invenes, como a mquina fotogrfica e o cinematgrafo, elas produziam uma
fascinao, um arrebatamento, um chamamento, para que se vivesse e sentisse a
imagem. Hoje esse processo no menor, mas podemos dizer que as transformaes e
invenes do mundo tecnolgico e informacional, intensificaram-no. Estamos, talvez,
como sugerem alguns autores, (LVY, 1993) modificando nossa forma de sermos
humanos.
Hollywood, a maior indstria cinematogrfica de todos os tempos, com todo seu
aparato de grandes estdios, com um investimento volumoso na distribuio dos filmes
e em famosos atores e atrizes, desenvolve uma agradvel, sedutora e irresistvel
pedagogia. Silva (1999a), ao comentar os recursos econmicos e tecnolgicos
mobilizados por essas formas culturais de pedagogia, cujos objetivos so quase sempre
econmicos, assim se refere a elas:
Elas apelam para a emoo e a fantasia, para o sonho e aimaginao: elas mobilizam uma economia afetiva que tantomais eficaz quanto mais inconsciente. precisamente a foradesse investimento das pedagogias culturais no afeto e naemoo que tornam seu currculo um objeto to fascinante de
anlise para a teoria critica de currculo (p.140).
, portanto, sobre esse material que me detive em minhas anlises,
sobre as imagens em movimento. Imagens de filmes que contam histrias sobre
como ser professor, professora e estudante na sociedade contempornea.
Esses estdios marcam seus filmes com cones de seu pas de origem, mas
tambm falam e se pretendem universais, seno, planetrios. As imagens
construdas para anunciar os estdios cinematogrficos denotam toda essa
pretenso csmica; so imagens do globo, de montes elevados e de deusas que
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iluminam o planeta, entre outros cones que procuram mostrar a grandiosidade
e abrangncia de sua ao.
Diferentes autores tm nos mostrado como Hollywood cria uma esttica
e uma linguagem que nos captura para suas histrias e para seu American way
of live, ou seja, seu modo de vida americano. Gonalves (2001) nos chama
ateno para as seguintes questes, que desenvolvem este modo americano de
viver: exaltao ao trabalho, individualismo, racionalizao e organizao
metdica da vida, utilitarismo e pragmatismo, otimismo, valorizao do
sucesso material, consumismo. Nogueira (2001) mostra em sua anlise que o
cinema de Hollywood tem regras muito explcitas: a) no se produziro filmes
contra os princpios morais do pblico, b) sero apresentados modelos corretos
de vida, sujeitos apenas ao drama e ao entretenimento, c) a lei no ser
ridicularizada nem poder despertar simpatia por sua violao (p.67).
sobre essa pedagogia cultural exercida pelo cinema hollyoodiano que
centro esta anlise. Estou entendendo pedagogia cultural como um jeito de
ensinar prprio desses artefatos culturais, como uma forma de pedagogia
exercida por outros espaos culturais. Uma pedagogia que se diferencia da
pedagogia escolar. Essa pedagogia cultural, desenvolvida por Hollywood, est
carregada de sentidos que interessam a esse cinema que tem uma esttica e
uma linguagem comprometida em ensinar o modo de vida americano. Portanto,
essa pedagogia exerce uma regulao e colonizao cultural. Essa pedagogia
sedutora e irresistvel traz nas suas histrias, no apenas marcas culturais
diferentes, mas, com mais poder para algumas posies, fixando os sujeitos em
lugares de inferioridade ou superioridade conforme seu modo interessado de
narrar as histrias.
O cinema hollywoodiano exerce um poder colonizador tanto do pontode vista econmico como cultural, pois uma indstria que tem seu produto
distribudo em todo o mundo, com isso tem o poder de criar e produzir sentidos
nas mais variadas e distintas culturas. Ao colocar suas histrias em circulao
vai definindo um padro de identidade como o melhor, o verdadeiro, e
tudo que foge dele, como excntrico, extico e anormal. Para a docncia esse
um jogo extremamente produtivo para dar a ela um status menor. Essa
estratgia dentro da poltica cultural tem uma fora muito intensa na definio
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do que tem legitimidade ou no, do que vlido ou no, do que podemos fazer
ou no como mulheres e homens que esto exercendo a docncia.
preciso registrar que a presente anlise foi elaborada por uma
profissional da rea da educao. No ser, portanto, uma anlise semitica no
sentido tradicional nem uma anlise puramente esttica. A anlise de discurso
aqui desenvolvida utilizar os recursos da anlise cinematogrfica mas no se
restringir a ela, buscar na anlise cultural discutir a educao e os sentidos
que tm sido atribudos s representaes de professores/as, estudantes e escola
na nossa cultura. Tambm no ser uma anlise de recepo. Este exerccio
analtico olhou para o dizvel (legendas, falas, msicas, sons, sinopses que
acompanham os filmes) e o visvel (imagens em movimento com todos os seus
recursos da linguagem cinematogrfica, tudo que ajuda na construo dos
significados culturais nesses filmes que falam do universo escolar).
Na docncia, uma forma de viver o feminino e o masculino.
Os filmes analisados, ao mostrarem um jeito de ser professor e
professora, vo marcando uma forma de viver o feminino e o masculino,
ensinam um jeito de ser homem e um jeito de ser mulher.
Na maioria dos filmes analisados o lugar do mestre ocupado por um
homem. Estas produes so endereadas principalmente aos jovens, pois so
filmes de ao e aventura. Essa estratgia se justifica, pois para o lugar de
heri, da personagem que interpreta aes violentas e de ao, na nossa cultura
o masculino sempre privilegiado. Quando aes desta natureza so praticadas
por mulheres so tomadas algumas estratgias, entre elas a de masculinizar
essas personagens. Como o caso da atriz Michele Pfeifer no filme Mentes
perigosas que para enfrentar uma turma de alunos perigosos e violentos usade roupas masculinizadas e de aes como lutar carat ou afirmar para a turma
de alunos e alunas ser da Marinha, uma profisso considerada, por muito
tempo, espao do masculino.
Os homens desses filmes so, jovens e bonitos para o padro ocidental
e, na maioria, brancos. Vivem a heterossexualidade e obedecem a um padro
de moral elevado. As histrias mostram sempre heris solitrios e milagreiros
em oposio a viles. Os docentes que esto a mais tempo na escola, queestudaram para ser professores/as, so os acomodados, os viles da histria.
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Aqueles que vm de outras profisses, os outsiders, so considerados
excepcionais, amigos, lutadores e verdadeiros heris, docentes que vencem os
mais diferentes desafios. Aqui o modo de vida americano fica marcado;
preciso vencer sempre. Os melhores sempre vencem, no importando, para o
caso da Educao, se pela fora fsica ou com o uso de chantagens.
O que menos aparece nestes filmes a pesquisa, o estudo e a discusso
do trabalho intelectual do professor. A pedagogia que exercem uma
pedagogia ativista, competitiva, uma pedagogia que precisa preocupar-se,
prioritariamente, com as relaes. O conhecimento desenvolvido para atingir
os planos do heri, representado quase sempre pelo professor homem.
Desta forma, Hollywood vai marcando um lugar para homens e
mulheres. A mulher no consegue lidar com adolescentes violentos, ela sempre
corre perigo e precisa que algum a ajude, esse algum sempre um homem,
que pode ser o marido, como o caso de A histria de Marva Collins ou,
um professor substituto, como o caso do filme O substituto.
Outro lugar ocupado pelas mulheres professoras a de parceira, amiga,
ou, ainda, de algum que cuida. Filmes como Uma escola atrapalhada, Mr.
Holland, adorvel professor, Ao mestre com carinho e Mentes perigosas
mostram as mulheres em posio diferenciada das posies ocupadas pelo
masculino. O diretor da escola manda, administra, est quase sempre em um
gabinete, a diretora ocupa os lugares de conciliao, de relaes afetivas e de
cuidados. Como podemos ver no seguinte dilogo:
Preciso ir. Tenho que dar banho numa das garotas da Clinty. Por qu? Esto reclamando, no a querem. Qual o problema? Higiene pessoal. Quatorze anos e no tem jeito. Voc tem sorte
(referindo-se ao professor). O que as mulheres no fazem. (Excerto
do dilogo da diretora da escola com o professor Mark no filmeAo
mestre com carinho).
Neste filme interessante analisar a forma que o personagem central,
representado pelo ator Sidney Poitier, apresenta-se com um vesturio quase
sempre composto por terno e gravata, enquanto as professoras esto deuniforme tipo guarda-p ou roupas mais simples. Tudo isso ajuda a construir
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esse lugar privilegiado para este heri que vai sendo construdo durante a
narrativa flmica. A trilha sonora, os ngulos de filmagem, a posio da
cmera, todas essas estratgias e recursos desta linguagem ajudam na
construo desses significados. Vemos o heri em tomadas no alto de
escadarias, posio que privilegia o significado de superioridade. Posio
necessria para um heri.
Nesses filmes os homens demonstram fora fsica, exercem poder de
seduo sobre alunas e professoras, s os viles podem romper com os
padres de moralidade. Parece que este lugar converge para os lugares
tradicionais que o homem tem ocupado na cultura ocidental: espaos pblicos,
externos, onde a fora fsica e estratgias que demonstram inteligncia,
perspiccia, astcia e coragem so atribudas ao masculino. O feminino
marcado pela fragilidade, medo, incapacidade para lidar com desafios que
envolvem drogas ou o mundo violento das comunidades, marcadas, nestes
filmes, como as comunidades perifricas. As aes ligadas ao afeto e cuidado
se fazem constantes para essas professoras.
problemtica a forma como Hollywood marca essas aes como
femininas ou masculinas, criando um padro de referncia cultural, onde ser
professora se constitui como este espao limitado e o ser professor neste outro
domnio que tambm o limita para aes tidas como essencialmente
masculinas.
Desta forma o cinema hollywoodiano vai marcando e justificando a
desigualdade social, mostrando que as professoras so competentes para
algumas aes e os professores para outros, o que no seria problemtico se
esses lugares no ocupassem na cultura, lugares hierrquicos e de menor
prestgio social. Produz identidades definidas pela marca biolgica do sexo. Ognero torna-se uma priso e coloca atrs de suas grades, como mostra esta
pesquisa, tambm o professor/a e aluno/a. Aspecto esse que uma crtica
cultural procura colocar em suspeio, pois como nos alerta Louro ( 1997):
necessrio demonstrar que no so propriamente ascaractersticas sexuais, mas a forma como essas caractersticasso representadas ou valorizadas, aquilo que se diz ou se pensasobre elas que vai constituir, efetivamente, o que feminino oumasculino em uma dada sociedade e em um dado momento
histrico. Para que se compreenda o lugar e as relaes dehomens e mulheres numa sociedade importa observar no
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exatamente seus sexos, mas sim tudo o que socialmente econstruiu sobre os sexos (p.21).
Ao marcar um jeito de ser como prprio do professor/a definidos pelo
ser homem ou mulher, Hollywood vai produzindo uma pedagogia especfica,uma pedagogia do heri. Nesta pedagogia expressa-se as marcas da poltica
neoliberal, o individualismo, as aes que precisam convergir sempre para o
sucesso.
O professor e professora que assistem a esses filmes, ao final da
narrativa, a maioria deles, convocado para ocupar o lugar de fracassado, pois
esses lugares, criados pelas histrias hollywoodianas, so muito difceis de
serem ocupados por educadores/as. So espaos ocupados por heris e heronashoolywoodianos, facilmente desempenhados por atores e atrizes, mas muito
distantes de nossas possibilidades de educadores do quotidiano, inseridos em
escolas situadas fora da tela do cinema. Esses sentidos vo ajudando a
posicionar a docncia e a pedagogia como um dom, uma marca natural, uma
estratgia que no depende de estudo e pesquisa. Uma posio que depende
apenas do herosmo, de sujeitos que no podem errar, ou, quando erram, so
logo re-encaminhados a posio de professor heri. Posio que o acolhe como
heri ou milagreiro, que tem uma vida de sacerdcio, dedicada ao magistrio.
Essa pedagogia do heri vai nos afastando da possibilidade de errar, de
tentar novamente, de no saber enfrentar muitas situaes e buscar no grupo,
na pesquisa e estudo, a sustentao para discutir os encaminhamentos e
desafios que nos afligem como educadores/as de nosso tempo. Esses filmes
parecem dizer que um professor e professora que lida com o no saber, com
tudo aquilo que no se encaminha para o que tido como padro de excelncia
na docncia, ou seja, que no tenha um excelente domnio de classe ou
manejo de classe um fracassado. Parece que para todos os problemas o
bom professor tem uma resposta na hora, assegurada na cartilha, no manual
que aprendemos das pedagogias disciplinares, corretivas ou psicolgicas
(Varela, 1996). E, sempre ser vencedor, como heri, o professor homem.
Talvez no deva nos preocupar tanto quem ganha ou quem perde, se
homens ou mulheres, mas como esses homens e mulheres so transformados
em perdedores e ganhadores. Os homens vencedores so sempre fortes,
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administradores e inteligentes. As mulheres perdedoras so representadas como
auxiliares, passivas, fracas, sem iniciativa e acomodadas. So estas estratgias
que vo aprisionando a docncia em lugares definidos, como se a marca
biolgica do sexo produzisse um jeito nico e definitivo de ser homem e
mulher e por conseqncia, ser professor/a.
A cultura adolescntrica ensinando um jeito de ser homem e
mulher.
Na maioria desses filmes hollywoodianos os alunos e alunas so representados
como adolescentes. Apenas em Um tira no jardim de infncia e emA histria de Marva
Collins e restritas imagens em Sociedades dos Poetas Mortos, aparecem cenasenvolvendo crianas. Ao marcar esse jeito de ser estudante como adolescente,
Hollywood vai mostrando certos valores, certos padres do que considera e marca como
um jeito de ser adolescente na nossa cultura.
Esses filmes so endereados principalmente a jovens, pois o gnero
predominante ao e aventura, categoria que disputada por essa parcela do mercado
consumidor de filmes. Parece que Hollywood acompanha um fenmeno que vem sendo
estudado por muitos autores da contemporaneidade que a transformao do conceitode infncia, adolescncia e adultez.
Philippe Aris (1981), desde uma outra perspectiva analtica, nos diz que
durante um longo tempo a sociedade viveu a infncia como um longo processo, e a
adolescncia consistia em uma preparao para a idade adulta o sonho de toda
criana e adolescente. Nesse tempo eram comuns as artimanhas dos jovens para
parecerem mais velhos: o uso de costeletas e de fraques pelos meninos e, pelas meninas,
o uso de corpetes e de saias com fartos forros e muitos enchimentos.
Hoje se observa o inverso. Esse mesmo historiador chama a ateno para a
ampliao do perodo da adolescncia e designa o sculo XX de "sculo da
adolescncia". Observamos, cada vez mais, uma precocidade para o exerccio das
funes antes designadas ao adolescente e ao mesmo tempo uma longevidade no
processo de "adolescer". H um prolongamento desse perodo, em que pais, mes, tias e
tios partilham com os/as adolescentes os mesmos costumes, comportamentos, roupas,
espaos e ocupam-se em manter um corpo tambm jovem, "malhado", "esculpido". H
uma ampliao dessa fase do "ser adolescente", no sentido em que as crianas so
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chamadas muito cedo a "adolescer", diminuindo o perodo considerado culturalmente
como infncia, e os adultos, por sua vez, sendo interpelados por discursos que falam de
um retorno adolescncia, ampliando, assim, esse perodo.
A psicanalista Maria Rita Kehl (1998) diz, em um artigo na Folha de So
Paulo, que se abriu um espao nas relaes: isso significa que a vaga de 'adulto' em
nossa cultura est desocupada(p.7). Nesse mesmo Caderno, vrios escritores/as e
especialistas foram convidados para opinarem sobre esse fenmeno do nosso sculo, a
"adultecncia"2. Com esse neologismo designada a "pessoa imbuda de cultura jovem,
mas com idade suficiente para no ser. Geralmente entre os 35 e 45 anos, os
adultecentes no conseguem aceitar o fato de estarem deixando de ser jovens. Ao
mesmo tempo, ao jovem so delegadas cada vez mais cedo, novas e importantes
responsabilidades, como o caso, na sociedade brasileira, da legislao que permite o
voto aos dezesseis anos. Outra transformao que vem ocorrendo o fato desses jovens
terem permanecido por mais tempo no convvio de suas famlias, mesmo aps o incio
de sua independncia financeira.
O que desejei mostrar com esses exemplos so os mltiplos discursos que
proliferam na sociedade sobre o "ser adolescente", discursos esses que so produtos de
prticas sociais que se estabelecem na cultura em diferentes espaos e tempos. Esses
discursos, atravs dos processos da globalizao e da mundializao da cultura, entre
outras prticas, se tornam cada vez mais uniformes e de grande fora na imposio de
sentidos. Hollywood cria representaes com seus filmes, em conexo com as prticas
sociais, ao mesmo tempo em que outras prticas so produzidas por estes significados
criados pelo cinema.
O que precisamos discutir em nossas anlises o processo de produo dessas
prticas, a representao sempre guarda na sua inscrio, no significante, as marcas
culturais de sua produo. A representao usa de artifcios para naturalizar aquilo que pura produo. Neste sentido ela guarda estreita relao com o processo de traduo.
Ela sempre uma forma de narrar, descrever, ler e traduzir o outro (DUSCHATZKY,
Silvia e SKLIAR, Carlos). Neste caso, sempre uma forma de criar sentidos sobre o
outro do gnero, o outro da sexualidade. Nessa relao o outro no apenas o outro,
2 O verbete foi extrado de Um glossrio para os anos 90, de David Rowan, publicado no Caderno Mais
de 20 de setembro de 1998, da Folha de So Paulo que, atravs de diversos artigos, analisa por que osadultos copiam cada vez mais os adolescentes e por que a cultura jovem tem se mostrado to hegemnica.
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mas um outro produzido na cultura como carregando o nus da representao.
Vejamos como Silva (1999b) nos fala sobre essa questo:
...no regime dominante de representao, a identidadedominante a norma invisvel que regula todas as identidades.
Homem, branco ou heterossexual (ou todas essas coisas juntas):identidades que, por funcionarem como norma, no aparecemcomo tais. o outro que tnico. o outro, comohomossexual, que aparece como identidade inteira eexclusivamente definida pela sexualidade. A identidadefeminina marcada por falta em relao do homem. Aidentidade subordinada sempre um problema: um desvio danormalidade. Ela , sempre, a identidade marcada. Comoconseqncia, a pessoa que pertence a um grupo subordinadocarrega, toda a carga e todo o peso da representao. Comoidentidade marcada, ela representa, sempre e inteiramente,aquela identidade (p.49).
Diversas anlises da situao da sociedade capitalista atual tm nos indicado
que o mercado consumidor jovem uma fatia desejada por todos. Se essa uma faixa
de grande consumo, considerada uma parte do mercado em que cada vez mais pessoas
se enquadram, assim nesta lgica do mercado tudo indica que investir nela e cham-la a
consumir seus objetos de desejo a soluo adequada. Tudo isso, aliado a outras
prticas culturais que mostram a predominncia da cultura jovem em nossa sociedade,
faz com que Hollywood tambm faa uma opo pelo mercado adolescente.Hollywood, como indstria, aposta nesse filo do mercado. Os filmes que
analisei variam da comdia, da stira, da ao-aventura ao drama, mas todos eles
apresentam astros famosos e com forte apelo aos jovens adolescentes como uma forma
de atrair esse pblico ao cinema. Michele Pfeifer, Tom Berenger, Mark Harmon, Nick
Nolte, Arnold Schwarzenegger, Sidney Poitier so alguns desses nomes. As sinopses
apresentadas nesses filmes de vdeo e as cenas escolhidas para ilustrar as suas capas nos
mostram jovens, gangues, violncia, atores em ao, atriz sedutora, todos,
contemporaneamente, bons ingredientes para filmes que desejam atingir um pblico
jovem. Com isso, quero dizer que esses filmes tm um destino preferencial, e talvez
essa tambm seja uma das causas de no encontrarmos a predominncia de crianas em
suas histrias. Conforme Fischer (1996), referindo-se aos filmes produzidos para
adolescentes, "para os meninos a combinao de violncia e aventura tambm
permanece como frmula de sucesso" (p.52). Canclini (1998), por sua vez, diz que o
gnero mais procurado nos videoclubes o de ao-aventura.
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Portanto, se o perodo da adolescncia em nossa cultura passou a ser um longo
e desejado perodo e se o jovem disputado nesse mercado, esses filmes, ao trazerem
preponderantemente nas representaes de estudantes, personagens adolescentes, de
certa forma esto reforando essas posies. Se for possvel dar um "adeus infncia",
podemos, com base em todos esses indcios culturais, saudar uma adolescncia que se
estabelece em nossa cultura como uma fase prolongada e que se prope agregar tanto
infantes como adultos. Podemos estar ingressando numa cultura "adolescntrica".
Como esta cultura tem ensinado a ser homem e mulher? Os adolescentes
masculinos so apresentados como jovens violentos, pertencentes a gangues e
desempenhando papis que os posicionam como demonizados, violentos e agressivos.
Na maioria dos filmes pertencem a grupos que infernizam os espaos escolares e
colocam os professores/as em constantes desafios, tornando-os heris que vencem
sempre essas grandes batalhas. Para estes alunos so comuns as lutas com violncia
fsica e at o uso de armas como nos filmes Mentes perigosas, O substituto, O
substituto-parte 2, Ao Mestre com Carinho 2 e Meu mestre, minha vida.
Para as meninas os filmes mostram cenas de conciliao, de seduo, ou at
mesmo, como alvo da violncia e abuso sexual. Tambm so comuns os papis onde h
uma filha amorosa ou uma irm que se desbobra no cuidado dos irmos. Papis esses
que coincidem em diferentes locais da cultura como prprios para o feminino. Esses
filmes marcam lugares como sendo naturalmente destinados mulher, quando eles so
historicamente datados e socialmente produzidos.
Nestes filmes analisados vemos poucos deslocamentos quanto s posies
tradicionalmente ocupadas por homens e mulheres, tanto para os estudantes como para
os mestres. O que os estudos de gnero tm nos possibilitado entender que no
devemos nos restringir a analisar as relaes entre masculino e feminino apenas pela
idia reduzida de papis/funes de mulher e de homem. Temos que buscar em nossasanlises ver o prprio gnero das instituies, dos saberes, smbolos, leis e outros
espaos que nos constituem como sujeitos masculinos ou femininos. Os saberes que
circulam na escola so generificados, a lngua e leis de um pas nos constituem de
determinadas formas, nos ensinam como ser homens e mulheres. Ao que nos ensinou
Simone de Beauvoir, no nascemos mulheres, mas nos tornamos mulheres, eu
acrescentaria que nem nascemos homens, nos tornamos homens no social e na cultura.
Com certeza, esses filmes nos ensinam e contribuem na nossa constituio de homens emulheres, ao nos posicionarem como docentes e estudantes desta cultura.
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Prestar ateno a essa pedagogia cultural exercida pelo cinema hollywoodiano
pode nos ajudar na poltica cultural que, como docentes e estudantes, desempenhamos
em nosso tempo. Essa uma luta constante e que no se direciona a um nico foco,
cotidianamente travada em diferentes e mltiplos espaos sociais. A escola, como um
desses espaos sociais, no pode ficar alheia s interpelaes da mdia na constituio
dos sujeitos que educa.
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Filmografia
Ao mestre, com carinho (To Sir, With Love). Diretor: James Clavell. 1967.Conrack. (Conrack). Diretor: Martin Ritt. 1974.A histria de Marva Collins (The Marva Collins Story). Diretor: Peter Lewin. 1975.
Escola da desordem (Teachers). Diretor: Arthur Hiller. 1984.Momentos decisivos (Best Shot). Diretor: David Anspaugh. 1986.Curso de frias (Summer School). Diretor: Carl Reiner. 1987.Sociedade dos poetas mortos (Dead Poets Society). Diretor: Peter Weir. 1989.Meu mestre, minha vida (Lean On me). Diretor. John G. Avildsen. 1989.Um tira no jardim de infncia (Kindergarten Cop). Diretor: Ivan Reitman. 1990.Mentes que brilham (Little Man Tate). Diretora: Jodie Foster. 1992.Sarafina, o som da liberdade (Sarafina). Diretor: Darrell James Roodt. 1993.Mentes perigosas (Dangerous Minds). Diretor: John N. Smith. 1995.Ao mestre, com carinho, Parte 2 (To Sir, With Love II). Diretor: Peter Bogdanivich.1996.
Mr. Holland, adorvel professor(Mr. Holland`s Opus). Diretor: Stephen Herek. 1996.O substituto (The Substitute). Diretor: Robert Mandel. 1996.O substituto 2 (The Substitute 2: Schools Out). Diretor: Steven Perl. 1998.
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