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Falso técnicoda ONUprovocouconfusãoentre doisministériosCASO Gabinetes de Paulo Portas eCarlos Moedas foram obrigados atrocar informações sobre disponi-bilidade do Brasil, em 2011, paracomprar dívida, tal como referiu o
"economista da ONU".Mas alguém lembrou
o que Dilma Rouseffdisse: "Dívida só tri-
pleA." Baptista da Sil-
va diz-se alvo de "jul-gamento sumário" e
'linchamento decarácter". POLÍTICA
PÁGS.BE9
Artur Baptista da Silva disse por sms à Lusa estar a ser vítima de um "linchamento de carácter"
Falso técnico da ONU provocouconfusão entre ministériosGoverno. Gabinetes de Paulo Portas e Carlos Moedas estiveram em contato para confirmar disponibilidade daPresidente do Brasil para comprar dívida portuguesa, tal como disse Artur Baptista da Silva, o "funcionário" da ONU
CARLOS RODRIGUES LIMA
Não foi só nos meios de comunicação social
que Artur Baptista da Silva, um indivíduoque nas últimas semanas surgiu publica-mente na qualidade de técnico do Progra-ma das Nações Unidas para o Desenvolvi-mento (PNUD), provocou confusão. Estatambém se alastrou ao governo na sequên-cia da entrevista do "homem" das NaçõesUnidas àTSF, dando conta da disponibilida-de do Brasil, em 201 1, para comprar dívida
portuguesa e que isso poderia ter evitado o
pedido de ajuda financeira internacional.Tal declaração, segundo apurou o DN, levoua que o gabinete de Paulo Portas, ministrodos Negócios Estrangeiros, e de Carlos Moe-
das, secretário de Estado adjunto do primei-ro-ministro, tivessem uma série de contac-tos para confirmar a informação. É que oBrasil ainda poderia ser um alvo do marke-ting português para a compra de dívida.
Mas, ambos os gabinetes rapidamentechegaram à conclusão que a "revelação" deArtur Baptista da Silva não correspondia àverdade. Até porque, como a própria presi-dente brasileira, Dilma Rousseff, tinha de-clarado, em março de 201 1 durante uma vi-sita a Portugal, o Brasil só comprava "dívida
triple A", isto é, títulos com o máximo da no-tação financeira. Durante o passado fim de
semana, e depois do boom mediático de Ar-
tur Baptista da Silva, o ministério dos Negó-cios Estrangeiros esteve em contato com aMissão de Portugal junto da ONU para con-firmar as credenciais do indivíduo, que se
apresentava como técnico da ONU. Porém,
oficialmente, o ministério de Paulo Portasnão emitiu qualquer declaração, confir-mando ou "desconfirmando" a ligação de
Baptista da Silva à Organização das NaçõesUnidas.
No domingo, o DN questionou por emailo PNUD sobre a ligação de Baptista da Silvaà organização. A resposta chegou na segun-da-feira à noite: "Na sequência de diligên-cias internas, podemos dizer que o senhorArtur Baptista da Silva não é funcionário do
PNUD", escreveu a assessora Julie Marks.Ainda que não afastando a possibilidade deo homem trabalhar para uma organizaçãoque esteja a trabalhar com o PNUD, a asses-sora acrescentou, contudo, que presente-mente o PNUD não tem em curso qualquer
projeto relativo à economia portuguesa. Re-corde-se que Baptista da Silva apresentou-se ao Grémio Literário, ao InternationalClub of Portugal e ao semanário Expresso(que até divulgou um cartão de visita do
próprio) como membro do PNUD e coorde-nador de um estudo feito por esta agênciadas Nações Unidas sobre a economia por-tuguesa e o plano de austeridade previstono memorando da troika.
Apesar dos vários dados sobre o seu pas-sado revelados pelo DN - como o facto deter estado preso, assim como o de contra si
correrem vários processos de burla, abusode confiança e emissão de cheques carecas-Artur Baptista da Silva disse por SMS à
agência Lusa estar a ser vítima de um "julga-mento sumário", em que lhe foi aplicada a
pena de "linchamento de caráter". O DNtentou chegar ontem à fala como visado,mas este permaneceu incontactável.
ERC
Carlos Magno diz quecaso será analisado
> O presidente da EntidadeReguladora para aComunicação Social, CarlosMagno, disse ontem ao DNque sobre este caso há-depronunciar-se "na altura pró-pria". Mas, por agora, o res-ponsável sempre foi adian-tando:'^ caso merece inte-resse e análise. Foram váriosos órgãos de ComunicaçãoSocial a caírem na burla, o
que significa que emPortugal a agenda mediáticaestá cartelizada. Há muitotempo que eu venho dizendo,precisamente, isso, que aagenda está cartelizada".Entretanto, O InternationalClub of Portugal, onde ArturBaptista da Silva realizouuma palestra, e o próprioNicolau Santos, diretor-ad-junto do semanário Expresso[ver entrevista nestas pági-nas) , já admitiram avançarcom queixas para os tribu-nais. RA. eC.R.L.
Os 'sauditas' que deixaramPortugal em alvoroçopartida Enganar toda a gente, in-cluindo a imprensa, não é tarefa fá-cil. Mas já houve quem o fizesse nopassado. E em pleno Marcelismo.Uma "brincadeira" ainda recorda-da mais de 40 anos depois.
Treze de fevereiro de 1971. OPaís acorda com a notícia da pas-sagem pela capital, numa viagem--relâmpago, de uma endinheiradadelegação saudita encabeçada porum tal "príncipe Iben Seddak, pri-mo de Iben Saud", interessada emnegócios na área do petróleo.
Na mesma altura, no Irão, nego-ciava-se aquele que viria a ser co-nhecido como o Acordo de Teerão,salvaguardando a participação em55% das receitas petrolíferas pelospaíses que detinham as reservas, e
a "visita" inesperada ganhava es-
pecial relevância.Emmanchete, O Século titulava
a cinco colunas: "Negocia-se emTeerão - Mas encontram-se árabesem Lisboa e o tema também é pe-
tróleo". Consta que o próprio che-fe do Governo, Marcelo Caetano,terá ligado ao ministro dos Negó-cios Estrangeiros, Ruy Patrício,questionando-o sobre o facto denão ter sido informado daquela vi-sita. O DN, rival de O Século, rea-giuàmanchete enviando dois jor-nalistas para as ruas, buscando emvão os árabes.
Na realidade, tudo não passou deuma partida sofisticada, engendra-da por um grupo de amigos emque se incluíam o chefMichel, o pi-loto de Fórmula 1 Nicha Cabral eManekas Mocelek (gerente das dis-cotecas Stones e Ad-Lib).Na véspe-ra, tinham alugado disfarces de ára-bes e um Rolls-Royce, dirigindo-seao restaurante Tavares Rico. O obje-tivo era verificar se conseguiriampregar a partida sem ser desmasca-rados. Correu tão bem que o geren-te do Tavares Rico ligou para O Sé-culo. O resto é história.PEDRO SOUSATAVARES
Reviver uma partida históricaTAVARES RICO Trinta e um anos depois, em 2002, grupo de amigos regres-sou ao restaurante onde pregou uma das mais mediatizadas partidas de
sempre. Faltavam Manekas Mocelek e Frederico Abecassis, falecidos
O percurso daprisão à televisão> A partir de maio deste ano,cerca de cinco meses após asua libertação, Artur Baptistada Silva começou a apresen-tar-se como economista daONU e a ganhar progressiva-mente mais protagonismo
Dezembro de 201 1
> Libertado da prisão, depoisde ter cumprido, desde 1993,várias penas por burla, abuso
de confiança e emissão de
cheques sem cobertura.Entre detenções chegara a
desempenhar, entre 2005 e
2007, o cargo de secretário-
geral de uma associação de
creches e pequenas escolas.
Maio 2012
> Publica carta no portal do
Clube de Pensadores, a 4 de
maio, intitulando-se econo-mista com o prémio "FeelingsAward das N.U.". A 27 pubLica
artigo de opinião no portalPara Uma Esquerda Livre,
como PhD in Social
Economics e CoordinatorAdvisor do PNUD (ONU) .
3o de junho
> Comparece numa assem-bleia do Sporting (onde che-
gou a ter um cargo na presi-dência de Jorge GonçaLves),
na qual faz muitas perguntassobre parceria com câmarade Odivelas. Na reunião s é
convidado a integrar comis-
são de acompanhamentomas não volta.
31 de outubro
> É convidado de honra e ora-dor principal de um jantar-de-bate no International CLub of
Portugal dedicado ao tema:"A Crise Europeia - A Utopiada U.E. e o Pesadelo do Euro.
Que Saída Digna para o
Equívoco de Portugal?"Várias figuras públicas assis-
tem à apresentação.
30 de novembro
> Identifica-se em declara-
ções feitas a um artigo do jor-nal Púbtico (nos dias seguin-tes fará declarações a vários
outros órgãos de comunica-
ção) como "consuLtordo
Banco Mundial". Critica as
medidas implementadaspelo Governo portuguêse a atuação da troika.
Dia 4 deste mês
> Dá conferência no Grémio
Literário dedicada
ao tema: "A Crise Europeia - a
Utopia da UE e o Pesadelo do
Euro - Que Saída Digna para o
Equívoco de Portugal". É apre-sentado como professor emSocial Economics na (inexis-
tente) Milton Wisconsin
University, dos EUA.
Dia 15
» 'Expresso' titula: "Equipadas Nações Unidas propõe
renegociação da dívida portu-guesa". É identificado como o
coordenador de uma equipade sete economistas do
PNUD. Faz declarações for-tes que têm amplo destaquena imprensa nacional e inter-nacional.
Sábado/domingo
> É convidado do programaExpresso da Meia-Noite, da
SIC Notícias. É na sequênciadesta aparição televisiva,onde é reconhecido por liga-ções antigas, que começam a
surgir dúvidas em relação à
autenticidade das suas cre-denciais. A própria SIC veio a
questioná-las no domingo.
Segunda-feira
> DN revela que Artur Baptista da
Silva esteve preso até há um ano e
que universidade norte-america-na onde diz dar aulas não existe.
Entre outras afirmações semfundamento inclui-se ainda a deter sido deputado à AssembleiaConstituinte. Vários órgãos de
comunicação social dão contade crescentes suspeitas.
Ontem
> Internacional Clube of
Portugal, onde deu conferên-
cia, e o jornalista NicoLau
Santos, que o recebeu no pro-
grama Expresso da Meia-Noite, admitem recorrer à
justiça. Baptista da Silva
envia SMS à Lusa em que se
diz vítima de "linchamento de
caráter".
ENTREVISTA: NICOLAU SANTOSDiretor adjunto do 'Expresso'
conta como conheceu o burlão e recorda almoço que teve com ele. Lamentanão ter feito "o trabalho de casa" por não confirmar o seu currículo e admite processá-lo
judicialmente. Está farto de lhe telefonar, mas não obtém resposta. Hoje há reunião do Conselhode Administração da Impresa e amanhã do Conselho de Redação para tomada de posição
" Quero processá-10. Isto lesa aminha credibilidade mas, piorque isso, prejudica o 'Expresso'"
FILOMENA ARAÚJO
Já falou com Artur Baptista daSilva depois de perceber que ele o
enganou?Não. Estou farto de lhe ligar, masnão atende nenhum dos três con-tactos que tenho dele, um númerofixo e dois de telemóvel.Vai tomar alguma medida?
Quero processar judicialmente osenhor. Isto lesa a minha credibili-dade, mas pior do que isso, preju-dica o Expresso. Amanhã [hoje]tenho umareunião com o Conselhode Admnistração da Impresa e naquinta-feira [amanhã] há uma reu-nião do Conselho de Redação do
Expresso.Não desconfiou de nada?Não. Ele mostrou-me as linhas ge-rais do discurso que ia fazer noGrémio Literário [4 deste mês] .
Quando e em que circunstânciaso conheceu?Recebi um telefonema a dizer queestava em Portugal um alto funcio-nário da ONU, de nacionalidadeportuguesa, com um programa de
reestruturação das dívidas dos paí-ses da Europa do Sul e que ele iafazer uma apresentação no GrémioLiterário. Perguntaram-me se euqueria almoçar com ele e respondique sim. Eu almoço com tanta gente.O almoço com o Artur Baptista daSilva foi no dia 1 5 de novembro, noRestaurante Os Arcos, em PaçoD'Arcos.Na altura não desconfiou das cre-denciais que apresentava?Não. Ele mostrou-me as linhas ge-rais do discurso que ia fazer noGrémio Literário, do qual é consó-cio. Tinha um discurso económicocoerente e relativamente sólido.
Quem é que lhe telefonou a pro-por o almoço?Só amanhã [hoje] quando regres-sar à minha secretária é que vousaber quem foi. Passaram-me achamada e fiquei com a sensaçãode que o contacto estava a serfeito através de uma agência de
comunicação. Tenho de procuraros e-mails no computador.Depois do almoço manteve outroscontactos com ele?
A Carmen Lima, que é secretária e
penso que mulher dele, contactou-
me para que fosse ao GrémioLiterário assistir à conferência e fi-casse para o jantar. Como naqueledia tinha outros compromissos não
pude ir. Foi a Anabela Campos.Quando voltou da conferência, elavinhamuito agradada e perguntou-me se lhe podíamos fazer uma en-trevista. A Anabela Campos e o JorgeNascimento Rodrigues foram en-trevistar Artur Baptista da Silva e amesma foi publicada no Expressoa 17 de dezembro.A seguir convidou-o para ir aoExpresso da Meia-Noite,da SICNotícias?Sim. Mas é no Grémio Literário queestão os sábios deste país e na con-ferência estiveram todos os notá-veis e mais um par de botas. Alémdisso, o Artur Baptista da Silva já se
tinha encontrado com o PCP e oBloco de Esquerda, mas tambémcomaCGTPeUGT.Quando é que percebeu que esta-va a ser enganado?Nasexta-feira recebi um telefone-ma de alguém com quem ele este-
ve, de que não posso revelar o
nome, a dizer-se que o ArturBaptista da Silva era megalóma-no. Estava a fechar o jornal e des-valorizei a informação. Mais tarde,já saído do jornal, alguém me disse
que ele já tinha tido problemascom a justiça.Como é que reagiu?Percebi que tinha posto o pé na ar-gola porque não fiz o trabalho decasa e não fui confirmar o curricu-lum. Não sou desconfiado e nuncame passou pela cabeça que umapessoa que vai ao Grémio Literárioestivesse a enganar-me. Porém, fuio primeiro a escrever que ele é umaldrabão. Disse-o na Antena 1 e naSIC.
PERFIL
NICOLAU SANTOS> Tem 55 anos e é economista de
formação.> É autor dos Livros Fazer Um Nóde Gravata Dá Muito Trabalho,Por isso É Que eu Uso Laço e
Portugal Vale a Pena.> É diretor adjundo do sema-nário Expresso e co-apresen-tador do programa semanalExpresso da Meia-Noite, quepassa na SIC Notícias.
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