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Felipe Macedo de Holanda Jhonatan Uelson Pereira Sousa de Almada
Ricardo Zimbrão Affonso de Paula(Organizadores)
IGNACIO RANGEL, DECIFRADOR DO BRASIL
homenagens pelo centenário de nascimento (1914-2014)
São Luís
2014
Copyright © 2014 by EDUFMA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO
Prof. Dr. Natalino Salgado FilhoReitor
Prof. Dr. Antônio José Silva OliveiraVice-Reitor
EDITORA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃOProf. Dr. Sanatiel de Jesus Pereira
Diretor
CONSELHO EDITORIALProf. Dr. André Luiz Gomes da Silva, Prof. Dr. Antônio Marcus de Andrade Paes, Prof. Dr.
Aristófanes Corrêa Silva, Prof. Dr. César Augusto Castro, Bibliotecária Luhilda Ribeiro Silveira, Prof. Dr. Marcelo Domingos Sampaio Carneiro,
Profª Drª Márcia Manir Miguel Feitosa, Prof. Dr. Marcos Fábio Belo Matos
Editoração EletrônicaRoberto Sousa CarvalhoMarcos André Cerveira
Impresso no BrasilTodos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida, armazenada
em um sistema de recuperação ou transmitida de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico, mecânico, fotocópia, microfilmagem, gravação ou outro, sem escrita permissão
do autor.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)Biblioteca Central da Universidade Federal do Maranhão
Ignacio Rangel: decifrador do Brasil / Felipe Macedo de Holanda, Jhonatan Uelson Pereira Sousa de Almada, Ricardo Zimbrão Affonso de Paula (Organizadores). _____ São Luís: Edufma, 2014.
352 p. ; 155x215 mm.
ISBN
1. Ignacio Rangel – biografia 2. Economia – História – Brasil I. Holanda, Felipe Macedo de II. Almada, Jhonatan Uelson P. Sousa de III. Paula, Ricardo Zimbrão Affonso de IV. Título
CDD 923.3CDU 923:33
IIGNACIO RANGEL, avocações
37Ignacio Rangel em São LuísBandeira Tribuzi
38
Vamireh Chacon
40Ignacio RangelMarcelo Minterhof
IIIGNACIO RANGEL, conjunções
45
Raimundo Palhano
64
Rossini Corrêa
13Prefácio
João Batista Ericeira
17
Ignacio RangelJhonatan Almada Ricardo Zimbrão Affonso de Paula Felipe Macedo de Holanda
SUMÁRIO
75Ignacio Rangel e seus interlocutores
Armen Mamigonian
83
Fernando Pedrão
100
RangelJosé Maria Dias Pereira
122
Luiz Carlos Bresser-PereiraJosé Márcio Rego
IIIIGNACIO RANGEL, incursões
153
Felipe Macedo de Holanda
162
Paulo de Tarso Pesgrave Leite Soares
202
Márcio Henrique Monteiro de Castro
229
Arissane Dâmaso Fernandes
248
Maria Mello de Malta
268
ao socialismo em Ignacio RangelElias Jabbour
276
Thiago Leone Mitidieri
292
José Messias Bastos
306
Celso Eugênio Breta FontesFelipe dos Santos MartinsFelipe Eduardo Lima Reina de Barros
333
RangelRicardo Zimbrão Affonso de Paula
Jhonatan Almada
341Os autores
Agradecemos ao Sr. Dorgival Pereira, à VALE e ao Sr. Carlos Gaspar pelo apoio para publicação
deste livro
Sabemos, entretanto, que a história, precisamente por ser história, isto é, desenvolvimento e mudança, jamais se repete, não obstante o caráter obviamente cíclico de muitos dos seus processos. Uma coisa, porém, é certa: a de que a nova geração, precisamente como a minha, deve estar preparada para a luta, para rijos combates, que exigem bravura e inteligência.
Ignacio Rangel
(Discurso como Patrono da turma de Economia da UFRJ, 1979)
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PrefácioO decifrador do Brasil
A portuguesa Maria da Conceição Tavares é uma das mais ferrenhas nacionalistas do clube dos economistas. Os seus acessos de ira e os rasgos de paixão pelo Brasil estão na memória das novas gerações, testemunhas dos seus indignados depoimentos sobre o país, avassalado pela ganância do capitalismo internacional e por suas sucessivas crises. A economista em depoimento prestado aos estudantes da matéria citou Ignacio Rangel, como um dos seus mentores, tanto nos estudos sobre a formação histórica brasileira quanto no persistente culto aos valores da nacionalidade. É dos muitos exemplos de discípulos de uma escola do pensamento econômico, depois adjetivada de rangeliana, centrada em interpretar este país a partir de categorias próprias. Pagou caro pela ousadia, não apenas com a prisão, mas com equívocos de interpretação dos radicais de esquerda que o apelidavam de direitista, ao tempo em que os conservadores o alcunhavam de socialista.
Suspeito que como Karl Marx não se disse marxista, Rangel não aceitaria caber em nenhum desses rótulos. Era desenvolvimentista, a favor do crescimento econômico com justiça social. Democrata e republicano era o cidadão e o
seus contemporâneos do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), Roland Corbisier, Guerreiro Ramos, Hélio Jaguaribe, muitos deles ex-integralistas, ex-comunistas, reunidos em torno do projeto ideológico do nacionalismo acoplado ao desenvolvimento nacional. Participou com esse grupo da criação da Petrobrás, da Eletrobrás, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico, onde atuou como funcionário exemplar, em um tempo que ainda havia amor e dedicação ao serviço público. Contribuiu na coordenação do Plano de Metas do Governo Juscelino Kubitschek, dele também participou Roberto Campos, de corrente ideológica diametralmente oposta.
Viviam-se os anos da Guerra Fria, da divisão do mundo entre os blocos capitalista e comunista, enquanto aparecia o ISEB, fundava-se a Escola Superior
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Silva, agregados em volta da doutrina da segurança nacional e da inevitabilidade
acompanharia este último. Fincavam-se os compromissos políticos e ideológicos
novamente o preço dos mal entendidos, da confusão entre desenvolvimentismo e populismo e do nacionalismo com o comunismo.
pela tradição familiar direcionado a Faculdade de Direito, onde se bacharelou,
sociais, nelas viu instrumentos para decifrar o Brasil. De uma região de homens destemidos, na juventude, nos anos trinta, tocado pelas injustiças sociais
que a Intentona de 35 levasse a sua extinção e consequente prisão dos seus membros. Amargou o cárcere, nele, aproveitou para aprofundar os estudos. Trabalhou em São Luís, e depois migrou para o Rio de Janeiro, palco de sua
ensaios, artigos que o consagraram como um os principais intérpretes do Brasil moderno. Aposentado do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que ajudara a fundar, prosseguiu a pregação cívica em defesa dos valores nacionais até falecer no dia 4 de maro acolheu e o viu brilhar nas letras pátrias. Sua geração de economistas ocupava cargos de direção nos bancos estatais para servir os interesses públicos e não para deles servir-se enriquecendo. Ele é um paradigma dessa postura ética.
Depois do triunfo nacional, Rangel, de volta a Província, viu-se empossado
antecessor José Jansen Ferreira, foi recepcionado por Josué Montello. Já se transformara em unanimidade nos círculos intelectuais do país.
No Maranhão, os seus discípulos reunidos no Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais (IPES), liderados por Raimundo Palhano, José Augusto dos Reis, Rossini Corrêa, Maureli Costa, Pedro Braga, Ana Maria Saraiva, José Caldeira, Saturnino Moreira, José Policarpo Costa Neto, publicaram “Um Fio
publicação.
Agora, na passagem do seu centenário, a Editora da Universidade
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Formação de Governantes (EFG), Raimundo Palhano, Rossini Corrêa, Jhonatan Almada, estão à testa do merecido tributo.
Sem nunca ter sido professor universitário, era por excelência o pesquisador, o acadêmico, a quem a cultura nacional deve muito. Sem adentrar nas categorias rangelianas propostas para as ciências econômicas, reservadas
socioeconômica brasileira. O que diria a Guido Mantega, um dos seus discípulos. Profundamente ético e buscando sempre o equilíbrio da Justiça, provavelmente recomendaria aos atuais dirigentes: não deixem de ouvir as vozes das ruas, ecoadas nas manifestações de junho do ano passado, naqueles dias que abalaram o Brasil.
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Introdução às avocações, conjunções e incursões na obra de Ignacio Rangel
Este livro nasceu da ideia de homenagear Ignacio Rangel pela passagem
Estado natal, o Maranhão. Ao longo das reuniões de organização das homenagens a proposta de um livro foi lançada. A ideia para materializar-se demandou a escolha e articulação dos colaboradores. Inúmeros acolheram o convite. Vindos de vários estados do Brasil, diferentes gerações, contemporâneos, coetâneos e admiradores de Rangel, aceitaram participar. Daí o livro veio ao mundo e instalou-se no suporte de papel para assumir seu lugar entre os bens mais preciosos que a humanidade lega às gerações atuais e vindouras: o conhecimento.
A iniciativa do Conselho Regional de Economia do Maranhão (CORECON-MA), do Departamento de Economia e do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Socioeconômico da Universidade Federal do Maranhão (PPGDSE/UFMA), reinicia um movimento de resgate do pensamento de Ignacio Rangel em terras gonçalvinas, cuja retomada em 2008 foi abruptamente
A organização das homenagens pelo centenário de nascimento de Ignacio Rangel reuniu um grupo de interessados sob a inspiração do valor imaterial que esse trabalho representa e dos seus desdobramentos futuros. Sob a liderança do CORECON-MA, Luís Spíndola, Felipe de Holanda, Raimundo Palhano, Saturnino Moreira, Ricardo Zimbrão, Manoel Barros, Jhonatan Almada, dentre outros, articularam este livro no âmbito da Comissão Organizadora do centenário.
As homenagens pela passagem do referido centenário no Maranhão além do lançamento deste livro incluem a realização de um seminário sobre a
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obra de Ignacio Rangel, a inauguração de sala no CORECON-MA com o nome de Ignacio Rangel, a concessão do título de Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA) a Ignacio Rangel, sessão de homenagem na Assembleia Legislativa do Maranhão, o lançamento de selo pelos Correios e a criação da Medalha Ignacio Rangel pelo CORECON-MA.
O livro como nascimento
O presente livro tem dois antecessores dos quais é herdeiro e continuador.
entrevista com Ignacio Rangel conduzida por Raimundo Palhano, Rossini Corrêa, Maureli Costa e Pedro Braga dos Santos, jovens intelectuais do Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais (Ipes). Esse órgão de estudos e pesquisas do Governo do Estado do Maranhão foi extinto três anos depois, no Governo
no Brasil de então. O livro seria o primeiro volume da Coleção Ignacio Rangel a ser editada em parceria com a Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e o
Ipes, se tornou o único volume publicado.
Ressaltamos que as fotos daquela entrevista foram incorporadas ao presente livro, rememorando aquele fato e recolocando-o como marco inaugural da aproximação de Rangel com o Maranhão. Um Rangel maduro que colhia os frutos de sua longa semeadura, um Maranhão dual e oligárquico como àquele em que viveu nos seus moços anos. Além das fotos, a caricatura de Baron também publicada no bojo daquela entrevista, foi base para a capa deste livro.
(2008), lançado no âmbito do Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos
e Orçamento do Maranhão, criado no Governo Jackson Lago em 2007. Raimundo Palhano, um daqueles jovens intelectuais do Ipes, se tornou Presidente do Imesc e retomou o plano editorial da referida Coleção Ignacio Rangel. O livro foi o segundo volume da Coleção, publicado dezessete anos depois. Com a
novamente abandonado.
Parece-nos que os referidos livros obedeceram a um ciclo involuntário
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XXI e este na segunda década do século XXI. O primeiro nasceu no contexto da recente democratização, de efervescência intelectual e social. Aqueles anos testemunharam uma das últimas manifestações de força da sociedade civil organizada e dos movimentos sociais, resultando no de Fernando Collor de Melo, primeiro presidente civil eleito democraticamente depois da
local e no bojo de um novo grupo no poder, surfava no apagar das luzes da expansão econômica do segundo mandato do Governo Lula da Silva e no início
Comparamos a publicação de um livro com o nascimento para Hannah Arendt. Segundo ela, o recém-chegado tem a oportunidade de começar algo novo, recolocando o mundo em relação à sua infância, isto é, à sua capacidade de começar ou começar-se. Este livro emerge em um ano de transição carregado da possibilidade da mudança, do começar algo novo. Também foi tocado pelos ventos das mobilizações sociais que varreram o Brasil em junho de 2013 e continuam a ocorrer de forma pulverizada. Mesmo que nasça no contexto dos desdobramentos da crise econômica mencionada, sinaliza para a necessidade de outros caminhos para o Brasil e para o Maranhão. Exige o pensar com a
realidade, atentos às conexões entre o local e o global – característica essencial da produção intelectual de Rangel.
Um quadro de Paul Klee representa um peixe diferente nadando em água escura na companhia de outros. Ele se distinguia dos demais por sua luminosidade dourada, enquanto os outros se confundiam com a água escura. Ignacio Rangel entre os economistas foi um dos poucos intérpretes do Brasil, entre estes, um dos poucos decifradores. Nesse sentido, tomando o conjunto de textos dos colaboradores, entendemos que a luz própria do pensamento rangeliano tem e terá um papel fundamental no dissipar das penumbras pairando sobre as análises e decisões quanto aos problemas brasileiros e maranhenses.
Dessa forma, o livro está organizado três partes, reunindo dezoito
artigos de jornal, cujos autores avocam, no sentido de chamar para si, a defesa da importância e atualidade do pensamento rangeliano. A segunda parte foi
acadêmicos que buscam uma análise de conjunto da obra rangeliana. A terceira
incursionam em determinados aspectos da obra rangeliana, enfatizando esses
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aspectos em relação ao conjunto.
Avocações
A primeira parte é constituída por três textos. O primeiro texto, intitulado Ignacio Rangel em São Luís, de autoria de Bandeira Tribuzi, foi escrito em
governos Vargas, Juscelino Kubistchek e João Goulart. Tribuzi destaca o renome
fazendo um apelo ao Governo do Estado que convide Rangel a contribuir mais com o Maranhão, instando-o a permanecer para uma ou mais conferências sobre o planejamento e o desenvolvimento.
O segundo texto, intitulado , de autoria de
lugar na História das Ideias do Brasil. A combinação de marxismo e positivismo, segundo Chacon, foi o caminho de Rangel para o desenvolvimentismo. Ainda que tenha divergências quanto às propostas desenvolvimentistas, Chacon considera que a visão dualista do Brasil, proposta por Rangel, continua interessante e importante.
O terceiro texto, denominado Ignacio Rangel, é de autoria de Marcelo Miterhof, escrito em 2013, referencia a contribuição de Rangel quanto ao
Ressalta que as posições de Rangel mudavam, como ocorreu com a utilização de empresas públicas para a expansão da infraestruturamas incompatível com a capacidade de endividamento da União nos anos de
de sua convicção de esquerda e de sua heterodoxia. Conclui que ainda que se discorde pontualmente de Rangel, se existissem mais economistas como ele, a economia como teoria e política avançaria mais.
Conjunções
A segunda parte é constituída por seis textos. O primeiro se intitula O
, de autoria de Raimundo Palhano. O autor esclarece que o lugar
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de Rangel se situa entre os intérpretes do Brasil pela originalidade, inovação
sistematização dos últimos anos, ainda não dispomos de um dimensionamento completo da obra ignaciana.
Rangel, segundo Palhano, permanece como um dos poucos economistas que conseguiram produzir sistema teórico e conceitual abrangente, complexo e articulado sobre a evolução e a realidade da economia brasileira. Palhano ressalta que no Maranhão, Rangel não foi plenamente descoberto, permanece privilégio de restritíssimos grupos sociais bem formados. Conclui que o resgate
que o Maranhão saia da penumbra, exposta de forma crua pela violência do presídio de Pedrinhas em São Luís, de repercussão nacional e internacional.
O segundo texto intitula-se , de autoria de Rossini Corrêa, destaca que as relações com Rangel, gradualmente se tornaram menos institucionais até se tornarem uma amizade transgeracional.
Rossini destaca a de Karl Marx, cujo instrumental teórico e metodológico, Rangel se apropriou de forma criativa. Aponta que na sua atuação acadêmica busca
dissertações e teses que realiza, colhendo de seus orientandos, surpresa e deslumbramento, quando entram em contato com a obra rangeliana.
Muitos intelectuais, segundo Rossini, por temer a originalidade de Rangel, o ignoravam ou silenciavam quanto às suas ideias, entre eles, cita Celso
em desfavor de Rangel.
Palhano e Rossini são dois dos intelectuais daquela geração pioneira do Ipes que introduziram Rangel no Maranhão. Convergem ao apontar nos seus textos a necessidade de um novo volume que se somará às Obras Reunidas de Ignacio Rangel (2 volumes), organizada por César Benjamin e publicada pela Editora Contraponto. Esse novo volume deveria resgatar artigos, entrevistas,
pouco conhecida ou mesmo inédita. Rossini organizou um pequeno almanaque reunindo boa parte do material que está em seu acervo particular, dos quais incorporamos com exclusividade para o presente livro: os textos de Bandeira Tribuzi e Vamireh Chacon, além das capas dos livros publicados por Rangel.
O terceiro texto denomina-se Ignacio Rangel e seus interlocutores, cuja
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autoria é de Armen Mamigonian, nas palavras de Palhano, “um rangeliano dos
é uma tarefa difícil explicitar as relações de Rangel com seus interlocutores, sobretudo pelo ostracismo que sofreu de tempos em tempos em face da mercantilização das ideias que valoriza e se submete aos interesses políticos do momento.
e afeta sobremaneira o trabalho intelectual. Os que antes poderiam ser considerados artesãos das ideias que não negavam seus predecessores e
Llosa.
Ignacio Rangel, segundo Armen, apontava que a desfaçatez da direita e a incompetência das esquerdas, levaram o Brasil a inúmeros desastres. À medida que o irracionalismo avançava na América Latina e no Brasil, crescia a “angústia
ou hábeis em omitir os créditos ou as fontes inspiradoras de suas ideias.
A contribuição de Rangel pirateada ou utilizada, mas omitida por muitos ao longo das décadas, na visão de Armen, reforça a necessidade de estudar de forma mais aprofundada os interlocutores declarados ou angustiados. Armen conclui que enquanto Celso Furtado e Caio Prado Júnior foram grandes intelectuais, Rangel foi um extraordinário profeta, cuja nobreza moral e estirpe são singularidades no tempo.
de autoria de Fernando Pedrão é o quarto texto. Pedrão compreende que a rebeldia de Rangel está em sua luta contra a redução do planejamento a um horizonte de curto prazo enquanto mero instrumento de governo, contraditoriamente a uma visão estrutural histórica da sociedade brasileira que impele sua utilização como meio de promover transformações sociais.
A rebeldia essencial de Rangel, segundo Pedrão, está em compreender que as condições nacionais de desenvolvimento estão internacionalmente situadas no ambiente cíclico da economia mundial. Colocando-o na linha de frente da crítica às teorias de desenvolvimento patrocinadas pelas Nações Unidas, subordinadas aos Estados Unidos e privatistas, bem como, as limitações
Segundo Fernando Pedrão, a crítica de Rangel ao Plano Trienal de
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acumulação periférica, apontando a limitação de uma política de curto prazo ali delineada com a verdadeira condição estrutural da economia periférica.
fragiliza sua capacidade de controle do poder, atualiza as críticas de Rangel às políticas de curto prazo e torna inevitável a volta às análises de longo prazo e a teoria dos ciclos. Isso demanda a superação do absolutismo lógico e a construção da análise estrutural por um movimento de autoregeneração do marxismo.
de autoria de José Maria Dias Pereira é o quinto texto. O autor compara a capacidade crítica e de largo alcance de Rangel, incompreendida à esquerda e à direita, com a águia de Zeus. O pensamento rangeliano em único voo abrangia a macro e a microeconomia, entendendo-a como processo histórico, cíclico e dialético.
Pereira considera a teoria dos ciclos e a tese da dualidade como as maiores contribuições de Rangel para a análise e compreensão da economia brasileira, sobretudo por evidenciar a singularidade do caso brasileiro onde existe uma interação entre o desenvolvimento das forças produtivas internas e externas em face de sua dependência em relação às economias centrais.
Rangel, segundo Pereira, é tanto profeta como visionário, devendo ser resgatado para inspirar as novas gerações de economistas. Profeta, como já
caminharia para o socialismo, não o estatismo soviético, mas sua perspectiva de socialismo, elemento a ser estudado na sua obra com mais precisão.
O cartão de visitas de Ignacio Rangel e a notícia de seu falecimento pelo jornal Folha de São Paulo que ilustram o livro são achados de Pereira. O cartão
palestra na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) no Rio Grande do Sul. Pereira nos chamou atenção quanto ao nome de Rangel.
seus livros e nas citações dos colaboradores deste livro muda bastante. Ignacio
á em Ignacio Rangel, uma escrita própria do
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O sexto texto é , de autoria de Luiz Carlos Bresser-Pereira e José Márcio Rego.
Inicialmente, os autores ressaltam a imaginação criadora de Rangel, a qual provavelmente nunca será conhecida no exterior, bem como, o ostracismo evidenciado pela falta de reedição de seus livros.
as citações que encontramos a essa obra, já referenciada nesta Introdução, citam-na como da autoria de Ignacio Rangel e não como obra sobre e com Ignacio Rangel. Ao optar pela segunda forma, omitem-se os nomes dos intelectuais
na capa do livro, leve a esse equívoco de citação.
método histórico e dialético é utilizado por Rangel com bastante liberdade e como arma heurística poderosa. O bom desenvolvimento da teoria econômica para Rangel necessita tanto do estudo do estado atual da teoria como dos clássicos do passado, aliado ao entendimento de que na ciência econômica tudo muda ao mudar a realidade estudada.
Ressaltam, assim como Pereira, que os ciclos, a dualidade básica e a
básica compreendem que sua ideia básica já existia no pensamento de Rangel,
sobretudo por estabelecer as bases da teoria endógena da moeda e apontar as
galopante ou depressão econômica). Além disso, também destacam o fato da
economia desaquece e desparece ou reduz sua intensidade quando a economia se aquece.
Incursões
A terceira parte é constituída por nove textos. O primeiro, intitulado
, de autoria de Felipe de Holanda, parte do diagnóstico
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avaliada como um período de superposição da fase descendente do quarto ciclo
uma crise mundial sincronizada, com impactos maiores nos países importadores de petróleo, a exemplo do Brasil) com uma crise interna. Esta se caracterizava
o diagnóstico de Rangel apontava a contraposição entre um setor privado superinvestido, principalmente nos segmentos de bens de capital e de insumos intermediários, e um setor público subinvestido, principalmente nos segmentos
transportes, saneamento básico, entre outros. A solução para o desbloqueio dos investimentos seria a conversão da concessão dos serviços de utilidade pública das empresas públicas para empresas privadas, as quais poderiam acessar fontes de crédito públicas e privadas de forma mais barata e com menores condicionalidades do que as empresas públicas.
O mecanismo proposto por Rangel para permitir às empresas privadas concessionárias o acesso ao crédito público e privado seria o aval do Estado brasileiro, com base em garantias hipotecárias sobre as instalações e equipamentos das concessionárias dos serviços públicos. Neste arranjo, impunha-se a prática de um realismo tarifário, que tivesse como referência o custo da execução dos referidos serviços, considerando-se a soma das despesas
investido e um lucro legalmente autorizado referenciado no custo de capital, de acordo com as condições do mercado acionário e de títulos internos. Tal era, em suma, segundo a formulação de Rangel, o mecanismo que permitiria a superação da crise recessiva de então e a geração de um novo ciclo de crescimento.
De acordo com Holanda, hoje, um quarto de século após, é impressionante como a análise de Rangel e suas prescrições permanecem pertinentes. O tema das concessões dos serviços públicos às empresas privadas transformou-se na grande aposta para a aceleração dos investimentos e a consequente viabilização de uma taxa de crescimento do produto menos modesta em comparação
O texto de Paulo de Tarso Pesgrave Leite Soares, , se divide em
três partes. Na primeira parte mostra o consenso entre autores marxistas, estruturalistas e até liberais de que a agricultura brasileira entravava o
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desenvolvimento do país.
a esse discurso consensual, negando-o ponto por ponto. Isto é, negaram que a agricultura não respondia aos preços do mercado; negaram que a oferta agrícola era inelástica; negaram que a agricultura atrapalhava o desenvolvimento da indústria; negaram que faltasse ao país uma revolução agrícola e/ou agrária; negaram que a agricultura tivesse qualquer responsabilidade pela crise em
last not but least negaram que houvesse qualquer perspectiva estagnacionista para a economia brasileira. Para o autor, mais surpreendente é ver que os argumentos dos dois obedecem a uma matriz teórica em estreita concordância com a de Lênin.
A terceira parte cumpre três objetivos. Em primeiro lugar, que a
maneira como eles entendem o relacionamento entre a cidade e o campo no
Netto entendem que o movimento da transformação da economia se dá da cidade para o campo e não do campo para a cidade. É a cidade que transforma o campo.
convergência tática e uma oposição estratégica. A acentuação do desenvolvimento
os interesses da grande burguesia progressista. O consenso ao que eles se opunham representava o interesse da pequena burguesia. Um confronto que foi tão bem descrito por Lênin no embate contra os populistas russos.
Em terceiro lugar, sugere que a diferença entre Rangel e os demais notórios marxistas também está em que estes, ao que parece, subestimavam a capacidade do capitalismo para submeter formas sociais pretéritas e/ou superestimavam a capacidade para, no Brasil, se transformar o desenvolvimento
contradição coerente com a matriz pequeno-burguesa que se vê como marxista.
Em , assinado por Márcio Henrique Monteiro de Castro, o autor faz uma leitura do homônimo escrito por Ignacio Rangel com o objetivo de servir de material didático num curso da
de Castro é incentivar a leitura e a avaliação de um texto que foi mantido hibernado pela ausência de debate, bem como provocar uma aprofundada investigação do
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legado rangeliano.
Segundo Castro, o objetivo de Rangel com foi construir uma teoria econômica para um novo modo de
produção que estava tomando corpo com as transformações do capitalismo do
Para tanto, Rangel utilizou-se de um ecletismo teórico econômico
profunda concepção historicista, típica de um autor que vê o mundo pela lente do
economia é a história, pois a ciência econômica varia com o modo de produção e este muda ininterruptamente. Assim, nômeno (história) e fenômeno (teoria) se complementam.
, como uma prática que se desenvolve em paralelo com uma teoria que evolui no tempo e se alimenta com os problemas e soluções enfrentadas por aproximações sucessivas e sistematizando, quando for possível, experiências dos analistas que, naturalmente, são de diferentes escolas teóricas e de diferentes
A , segundo Rangel, seria um modo de produção que está em desenvolvimento, no ocidente e no oriente. Seu objetivo é produzir valor de uso (como é universal na atividade econômica qualquer que seja o modo de produção) regulado pela vontade consciente e racional, através de um cálculo econômico. A categoria utilidade, apesar de seus problemas de medida, é a nova base para o cálculo econômico. Plano e projeto, através de seleção de técnicas e alocação de recursos, são seus instrumentos fundamentais. Isto difere do capitalismo onde a produção de valores de uso é regulada pelo mercado através do valor, seja ele explicado pelo trabalho, para os clássicos, ou pela utilidade marginal, para os neoclássicos.
Rangel, com isso, desenvolve a categoria utilidade afastada da categoria valor, isto é, o autor elabora uma categoria nova: a . O valor como nômeno e a categoria teórica valor como fenômeno estão relacionados a uma economia mercantil. A , que começa a tomar corpo, é o devir, está relacionada a outro momento histórico, outro nômeno, portanto. A utilidade está relacionada com essa problemática, ou seja, se exprime no fato de que todos os objetos úteis atendem a uma necessidade humana e social.
Castro conclui que hoje a está superada.
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capitalismo dos países da antiga cortina de ferro eliminaram, naquelas plagas, qualquer elemento de uma economia de projetamento.
se distanciou da convergência, esperada por Rangel, na produção de utilidades
economia de mercado em condições de capitalismo selvagem atuam em sentido contrário a qualquer coisa próxima a uma economia de projetamento, pois já
A também entrou em colapso nos países
globalização contemporâneo. Os estados perderam a capacidade de programar
desenvolvimento se transformaram em bancos de investimentos. O projeto como instrumento de avaliação de investimentos e alocação de recursos cedeu a vez para operações de mercado onde os usos e as fontes são desprezadas tendo em
, de Arissane Dâmaso Fernandes, tem como objetivo apresentar a teoria rangeliana como uma interpretação da realidade brasileira que tinha uma intenção concreta, qual seja, de intervir nessa realidade, através de uma análise que buscava propostas efetivas de ação. Daí sua importância histórica.
Para a autora, Rangel desenvolveu um modelo teórico de fato original o qual representava não somente sua percepção sobre a realidade brasileira, mas a defesa de seus próprios interesses (enquanto integrante de uma classe social) no aparelho de Estado. Sua teoria apresenta uma leitura da chamada
acerca desse processo como defendeu que o grupo ao qual ele pertenceu, os quais podem ser denominados de intelectuais nacionalistas, deveria ocupar uma posição privilegiada na condução (ou assessoria) das decisões políticas do país.
como a importância de sua atuação político-institucional, não pode desconsiderar o contexto no qual esse intelectual atuou e as relações institucionais que ele
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dentro desse espaço.
de Rangel, uma vez que foi a partir das temáticas discutidas pelo grupo da Assessoria, do ISEB (Instituto Superior de Estudos Brasileiros) e da CEPAL (Comissão Econômica da América Latina e Caribe) que ele desenvolveu as bases da sua teoria.
O texto de Maria Malta, , tem por objetivo mergulhar na compreensão da tese
rangeliana da uma rica chave de leitura, no campo da economia política, para a interpretação do Brasil.
Para tanto, divide sua análise em três etapas. Na primeira discute o método da . Segundo Malta, consiste numa adaptação original do materialismo histórico e da teoria econômica para a análise do caso brasileiro. Desta análise Rangel pretendia retirar leis gerais da formação histórica e de funcionamento da economia brasileira, descrevendo o processo de desenvolvimento do país, no campo da economia política.
Na segunda parte do texto, Malta discute a enquanto
os modos de produção (articulação dinâmica entre estrutura e superestrutura) existentes no Brasil em cada época. A condição histórica de se ter constituído como nação tardiamente em relação aos países do centro capitalista, na compreensão de Rangel, trazia a necessidade de apreciar sempre o movimento, de forma simultânea, de uma perspectiva interna e externa. Assim, cada dualidade da economia brasileira como um todo seria originada a partir da dupla determinação das relações internas e externas, que também vão consubstanciar a dualidade presente em todas as instituições econômicas brasileiras.
Enquanto teoria, ao descrever a história, fala de algo que já está determinado e aponta para uma dinâmica que pode ser mantida ou rompida. Porém, permanece a questão de se o rompimento teria que também vir do centro do capitalismo, ou se está aberto um movimento nacional ou da periferia articulada como possível saída.
teórico deu origem a uma interpretação do Brasil. Para a autora, a básica tem a função de representar os modos de produção tipicamente brasileiros, por meio de uma combinação delicada entre formas estruturais e
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formas superestruturais.
A autora conclui questionando o porquê de uma interpretação do Brasil tão rica e articuladora de teoria e história pôde ser tão amplamente abandonada.
As respostas, para Malta, encontram-se na seguinte forma: em primeiro lugar, a tem o limite de sua época, pois representava uma visão, um modo de pensar, que era irreconciliável com o movimento real que Rangel pretendia revelar e explicar. Neste sentido, uma teoria que não representasse a visão de nenhum dos grupos sociais mais destacados na política e na economia brasileira cairia no campo das curiosidades, muitas vezes incômodas, que pensamentos de vanguarda podem carregar.
Também, a visão de Rangel não encontrava base nas formulações dos dominados e de suas vanguardas representativas. Seu marxismo era mais brasileiro que universal, mais original que ortodoxo. Sua dialética era mais evolucionista que dinâmica e carregava a ordem de um cientista do seu tempo.
.
O texto em Ignacio Rangel, de Elias Jabbour, tem por objetivo a tentativa de atualização das ideias de Ignacio Rangel no Brasil contemporâneo.
O texto está dividido em cinco partes. Na primeira o autor discute a taxa de investimento e o setor privado no período pós-Plano Real. Defende que o setor
si. Em seguida, aborda capital estatal e capital privado na complexa formação social brasileira, defendendo que o socialismo brasileiro será construído a partir do por meio de um
nacional e, por conseguinte, não prescinde da unidade de contrários entre o grande conglomerado privado e sua congênere estatal.
Na terceira parte, o autor discute a reorganização das atividades econômicas sob a estratégia do NPND. Em resumo, Jabbour defende que o
fundir com a grande empresa, viabilizando a reprodução ampliada e o próprio
do endividamento externo e da simples utilização de recursos do tesouro e do
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Na quarta parte, seguindo o caminho de construção do NPND, o autor propõe um , qual seja, a institucionalização do monopólio estatal sobre as instituições que gerenciam os instrumentais macroeconômicos. Ou seja, o Estado exercerá centralidade numa estratégia de fortalecimento dos conglomerados nacionais (estatais e privados), conformando uma teia onde pulsarão os dois elementos constituidores de uma forte nação moderna: grandes empresas baseadas e fundidas com um poderoso sistema de intermediação
socialismo no Brasil.
Thiago Mitidieri, no texto , discute o livro ,
obra: fazer uma análise estrutural da economia brasileira, ser uma crítica do Plano Trienal e traçar as linhas gerais para uma política econômica alternativa.
Segundo o autor, Rangel nas circunstâncias políticas em que se encontrava o país naquele
pelo desejo popular de se avançar no processo de modernização da estrutura socioeconômica brasileira.
Para Mitidieri, é essencialmente uma obra com um objetivo político. Ao demonstrar os equívocos teóricos que fundamentavam o
conceitos originais e fez abordagens inovadoras sobre a estrutura e funcionamento da economia brasileira.
Em , de José Messias Bastos,
da crise estrutural da década de 80, através de debates, cursos, conferências
Catarina (PPGG-UFSC) ou concedendo entrevista para a Revista Geosul no
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Departamento de Geociências da UFSC. Segundo Messias é importante por em
das ideias de Rangel para decifrar a crise estrutural da economia
Messias, após uma síntese das principais ideias de Rangel, conclui que estas estiveram presentes na formação e construção dos trabalhos de dissertação
reconhecendo que a formação de uma rede urbana concentrada, consequência do desenvolvimento industrial oligopolista, e a integração do território nacional pelas rodovias, viabilizadas pra valer com a terceira dualidade (pacto de poder
, Celso Fontes et ali, analisam a importância de Ignacio Rangel para o pensamento econômico brasileiro, tomando como base sua teoria
Concluem que, para compreender a contribuição de Ignacio Rangel ao desenvolvimento do pensamento brasileiro, é necessário ter-se em conta a
como os brasileiros se posicionavam sobre as questões nacionais e internacionais.
Ricardo Zimbrão e Jhonatan Almada escreveram como fecho do livro, o texto Rangelcaminhos pouco ou ainda não explorados na obra rangeliana. Esses caminhos
a produção de novos estudos e pesquisas sobre Rangel.
por formação; economista autodidata por escolha e por vocação, Ignacio Rangel, sem ter tido uma carreira acadêmica convencional, foi dos mais brilhantes e destacados intérpretes e decifradores do Brasil no século XX. A riqueza e
neste livro, na certeza de que um maior conhecimento do pensamento rangeliano por parte de nossos acadêmicos e planejadores muito tem a contribuir para a solução dos dilemas econômicos, sociais e políticos de nosso tempo.
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Entrevista com Ignacio Rangel em São Luís, Maranhão
Os entrevistadores Rossini Corrêa, Raimundo Palhano, Pedro Braga e Maureli Costa (esquerda para direita) com Ignacio Rangel (centro).
O entrevistado
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Ignacio Rangel em São Luís*
Encontra-se em São Luís um dos maranhenses de maior envergadura intelectual, que aqui desembarcou a serviço do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico, para participar do Seminário sobre Políticas Governamentais, no capítulo referente a Programação do Desenvolvimento: Ignacio Rangel. Seu
de importantes obras entre as quais cumpre distinguir um dos mais relevantes enfoques de nossa problemática: .
Técnico que soma renome e capacidade, com conhecimento da realidade e dos problemas de nossa terra, Ignacio Rangel pode prestar ao Maranhão uma contribuição preciosíssima e esperamos que o Governo dele cobre essa contribuição.
pedir à Superintendência do Desenvolvimento do Maranhão, à Secretaria de Administração, ao Governo, a quem quer que deva pedir, que solicite ao Dr. Ignacio Rangel, aproveitando uma oportunidade que nem sempre se oferece, faça uma ou duas conferências abordando assunto de sua especialidade e ao qual trazer o esclarecimento da sua competência inquestionável.
Estou certo de que essa iniciativa for tomada o Dr. Rangel não se recusará e o Maranhão terá oportunidade de ouvir um técnico de alto gabarito que tem
economia regional e integração nacional etc.
Fica, portanto, aqui consignado este modesto pedido na esperança de que, posto seja modesto, não deixará de ser atendido já que visa objetivo superior: o contato de quantos se interessam pelo progresso do Estado com um economista maranhense, que, justamente e por sua alta capacidade, tem lugar marcante no panorama nacional.
* Publicado originalmente no Jornal do Dia, São Luís-MA, 29 de março de 1967, p. 3 (Coluna ASSIM É... Se Lhe Parece, assinada por Leucipo Teixeira) e gentilmente cedido por Rossini Correia, organiza-dor do livro “Canção d’amigo para Ignacio Rangel: pequeno almanaque comemorativo do seu primeiro centenário”.
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*
associar positivismo e marxismo é uma delas. Inclui professores da Faculdade de Direito do Rio de Janeiro na primeira metade do século – Castro Rebello e Leônidas de Resende – e até um dos fundadores do Partido Comunista, Cristiano Cordeiro. Da minha parte só posso ter, para com eles, empatia metodológica
um subsistema, não o contrário. Daí meu interesse pela História das Ideias. Nela no Brasil Ignacio Rangel tem o seu lugar. Rossini Corrêa, Maureli Costa, Pedro Braga e Raimundo Palhano prestam um grande serviço cultural na longa
pouco publicada pela Universidade Federal do Maranhão e Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais presidido pelo governador Edison Lobão. Uma espécie de
O próprio Ignacio Rangel não faz segredos. Confessa ter começado por
Barreto, chegando ao Maranhão com Benedito Leite, não foi bastante forte para
Lopes, prosseguiu em busca de uma síntese entre Comte e Spencer avessa ao
recebera de Tobias.
A combinação positivismo mais marxismo foi o caminho de Ignacio Rangel rumo ao desenvolvimentismo. Outros para ali convergiram vindo do integralismo: Roland Corbisier, Guerreiro Ramos, Rômulo de Almeida e Neiva
* Publicado originalmente no jornal Correio Brasiliense, Brasília-DF, 6 de janeiro de 1992 e gentil-mente cedido por Rossini Correia, organizador do livro “Canção d’amigo para Ignacio Rangel: pequeno almanaque comemorativo do seu primeiro centenário”.
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Moreira, entre muitos. Uma das questões consiste em saber se os marxistas continuaram internacionalistas num ambiente em que o nacionalismo
procedências. Uma espécie de nacional-socialismo, termo evitado no Brasil por suas conexões racistas alemãs, no caso brasileiro um nacional-estatismo desenvolvimentista com toques sindicalistas a que não faltaram, na prática,
Todo esse modelo vem sendo posto em questão. O próprio Marx apontava, com uma das missões da burguesia internacionalizar o capital, criando um mercado mundial. É na ex-União Soviética a fórmula estatizante jamais conseguiu socializar-se, seus adeptos estão agora prometendo outra tentativa, da próxima vez sem Stálins, como se eles não fossem produtos dos
o inimigo do socialismo humanista de Proudhon e do anarquismo de Bakunin que, para combatê-los, teve de começar a criação de uma máquina burocrática, daí em diante em marcha tirânica, irreversível porque sem contrapesos internos ou externos.
repartições públicas. Ao Estado terá de caber a ajuda indireta mediante
tempo, para evitar mais outro parasitismo.
Mesmo assim continua interessante e importante a visão dualista do Brasil por Ignacio Rangel, ao mesmo tempo capitalista e feudal, uma síntese das perspectivas de Caio Prado Júnior e Paulo Cavalcanti outro em polêmica.
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Ignacio Rangel*
Antecipo as homenagens pelo centenário de Ignacio Rangel que se iniciam em fevereiro de 2014. Faço isso porque distintos temas fazem lembrar dele, em especial sua capacidade de aliar uma criatividade aguda para elaborar conceitos com um senso de realidade raro entre economistas.
indicação do economista Thiago Mitidieri, com quem discuti sobre Rangel.
Nos anos 30, Rangel entendia que a industrialização precisaria vir junto com a reforma agrária. Mais tarde, reconheceu que no Brasil a industrialização, se não fosse um projeto de lideranças dos proprietários rurais, teria sido natimorta.
No entanto, isso não ocorreria sem graves problemas. A mecanização do campo sob uma estrutura fundiária concentrada jogaria muitas pessoas nas
absorvê-las, o que favoreceu a repressão salarial, travando o adensamento do mercado interno, o motor da industrialização brasileira.
Avançar na industrialização -dos bens leves para os de consumo duráveis e daí para a indústria pesada- era o jeito de continuar criando perspectivas. Porém os avanços ocorriam por saltos na estrutura produtiva em ciclos mais ou menos decenais, prósperos na primeira metade e recessivos na outra.
Não era tarefa fácil. Havia capacidade ociosa, por conta das grandes economias técnicas de escalas, e também estrangulamentos produtivos, fruto de desequilíbrios próprios de uma mudança estrutural e de restrições de divisas externas.
agregada no Brasil ser estruturalmente deprimida, pois dependente do investimento.
* Este artigo foi publicado originalmente pelo autor no jornal Folha de São Paulo, dia 9 de maio de 2013, o qual foi gentilmente cedido pela empresa Folha da Manhã S/A para este livro.
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mercado cartelizada, que elevava seus lucros espremendo tanto os consumidores
alimentos é pouco elástica, o aumento de seus preços fazia cair o consumo de outros bens pelos assalariados, aprofundando a recessão.
–tanto pela antecipação da compra de bens duráveis pelos mais ricos quanto em investimentos incrementais – quando um ciclo de mudança estrutural dava sinais de excesso de capacidade.
Essa imobilização especulativa mitigava a recessão e permitia alinhar as condições institucionais e o planejamento dos investimentos que fariam parte da nova fase de expansão industrial.
sabendo que seu papel foi circunstancial. A retomada do desenvolvimento viria pela realização de aperfeiçoamentos institucionais que o novo status de nação
o que permitiria melhor coordenar os investimentos, algo que o país ainda está longe de ter.
Também estava claro que a capacidade de expandir a infraestrutura por meio de empresas públicas tinha se esgotado. Rangel tinha apontado nos anos
sistemas de garantias, o que envolvia mudar o direito das concessões e realizar privatizações.
projetos com base na receita esperada. Nisso, a ideia de Rangel vingou.
Rangel não se furtava a mudar de posição, mas sem trocar uma crença idealizada no desenvolvimentismo e na cooperação por outra igualmente idealizada no liberalismo e na competição. Ele se manteve de esquerda e heterodoxo.
Isso não o impediu de transigir em questões concretas, defendendo que
defendeu as privatizações, antes de elas virarem uma efetiva bandeira liberal.
É possível discordar de Rangel em vários pontos, mas, houvesse mais economistas como ele, a economia avançaria bem mais, tanto como teoria quanto na política.
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O centenário da usina do pensamento:Ignacio Rangel, a capacidade dedecisão e o santo de casa
Um Mestre na capacidade de interpretar o Brasil
Chegamos a 2014 com uma grande motivação: celebrar a obra de Ignacio de Mourão Rangel, no momento em que se reverencia o centenário do seu nascimento. Um legado precioso e dos mais ricos em termos de análise da
suas ideias e pensamentos, que ainda hoje estão a exigir leituras e releituras, graças aos conteúdos de suas interpretações.
denominado Flor de Lima, nasceu Rangel, vulto destacado de um seleto grupo
Milton Santos, Sérgio Buarque de Holanda, Joaquim Nabuco, Manuel Correia de Andrade, entre outros.
No âmbito da história do pensamento econômico brasileiro e latino-americano, Rangel ocupa um dos patamares mais elevados, principalmente pela sua originalidade, inovação e capacidade formuladora.
Em termos maranhenses destaca-se, de maneira isolada e solitária, como a mais fecunda matriz intelectual produzida pelo torrão gonçalvino em termos de criação e elaboração de ideias no campo das ciências econômicas e da economia política.
Os pioneiros da propagação do pensamento rangeliano no Maranhão, dentre os quais orgulhosamente nos incluímos, sonharam e lutaram muito pela popularização de sua obra e publicação do seu legado intelectual.
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Impossível traduzir a alegria que sentimos quando do lançamento das
da reitoria da Universidade Federal do Maranhão, em 2005.
Ali nos reencontramos para atender ao honroso convite do Conselho Regional de Economia do Maranhão, presidido então por Dilma Pinheiro; da Academia Maranhense de Letras, liderada por Jomar Moraes; e da Universidade Federal do Maranhão, sob o reitorado de Fernando Ramos.
Em nosso discurso de apresentação da aludida obra destacamos o privilégio imerecido, pois ali poderiam estar Rossini Corrêa, Pedro Braga dos Santos Filho, Maureli Costa, jovens intelectuais apaixonados por Rangel, que se
torná-la conhecida em sua terra natal.
Poderiam estar ali também José Augusto dos Reis, João Evangelista da Costa Filho, Hiroshi Matsumoto, Alberto Arcangeli, Benjamin Mesquita,
Rocha, Cursino Moreira e Saturnino Moreira, e outros estudiosos coetâneos; ou
como Tetsuo Tsuji, Flávia Mochel, Niomar Viegas, Raimundo Arruda, Sebastião
entre tantos que formavam o referido movimento.
a importância do lançamento, entre nós, os conterrâneos de Rangel, de suas
dois volumes, primorosamente editados pela Contraponto, com o apoio do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), sob a presidência de Carlos Lessa, no contexto de uma coleção voltada ao resgate da memória do ciclo
espiritual, que se fazia presente na ocasião.
brindados com o ensaio de Márcio Henrique Monteiro de Castro, economista do
modo primoroso e didático, o conjunto da obra e sua contribuição ao pensamento econômico brasileiro.
Tanto em extensão, quanto em conteúdo, devemos destacar, não dispomos ainda de um dimensionamento completo da obra ignaciana, no sentido do resgate pleno do seu valor histórico para a cultura brasileira e para o
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pensamento econômico e social latino-americano. Tal fato, longe de desmerecer, atribui às interpretações passadas e presentes um extraordinário mérito: justamente o de terem evidenciado a necessidade do preenchimento de várias
gerações de economistas e cientistas sociais brasileiros.
pensamento de Rangel é a sua Tese da Dualidade.
Trata-se de engenhosa construção analítica que articula contribuições do materialismo histórico marxista, de economistas clássicos como A. Smith, de J.M.
Inscreve-se como uma resposta penetrante de Rangel ao tema focal colocado à
país e a maneira em que se daria a revolução brasileira, no sentido da evolução e superação do capitalismo.
na Revista de Economia Política - REP 1 (4), out./dez., o artigo “A História
apropriadamente, as articulações entre a dinâmica da Dualidade e os princípios teóricos de Kondratieff.
O resultado último desse esforço intelectual foi a construção de uma verdadeira teoria do desenvolvimento brasileiro, algo inédito no tempo em que foi esboçada e, ainda hoje, extremamente raro nos quadros da produção acadêmica sobre economia, no Brasil.
grandes teses de Rangel, expressões de suas interpretações sobre a economia brasileira, a teoria econômica e o desenvolvimento econômico, social, político,
[1] Tese da Dualidade Básica, que conjuga e sistematiza as leis gerais da formação histórica (em Marx), à estrutura e funcionamento da economia brasileira;
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[2] Tese da Dinâmica Capitalista, que articula as teorias dos ciclos, das crises e a questão tecnológica ao movimento da economia brasileira e mundial;
nome, transformada, pela sua densidade analítica, nível de formulação e grau de
do pensamento econômico brasileiro;
agrária brasileira e suas consequências para o desenvolvimento do capitalismo no Brasil;
[5] Tese sobre a Intervenção do Estado e Planejamento, que analisa o valor do planejamento do setor público como fator de equilíbrio econômico global e de redução de ociosidades setoriais na economia, campo este do qual
mobilizador de recursos ociosos para os setores produtivos, com ênfase nos investimentos em serviços de utilidade pública e infraestrutura.
Rangel, inquestionavelmente, foi o maior dos pioneiros, dentre os que estudaram a economia brasileira a partir de seu relacionamento com a teoria dos ciclos, apoiados em Kondratieff.
países e suas articulações com os avanços tecnológicos, de onde extraiu fundamentos metodológicos para suas teses sobre o Brasil, o desenvolvimento e o subdesenvolvimento econômico.
Desse esforço resultou a construção de outros marcos teóricos centrais,
do Kondratieff brasileiro. Mecanismo este que fez de Rangel produtor de um
de um país relacionando-o a outro. É de Rangel a tese de que o “atraso de um
Assim, passados 100 anos do seu nascimento, continua plenamente viva a certeza de que Ignacio Rangel permanece sendo o mais original analista do
que ele materializa um dos poucos, bem poucos, economistas brasileiros que conseguiram produzir um sistema teórico e conceitual abrangente, complexo e articulado sobre a evolução e a realidade da economia brasileira.
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O intelectual a serviço da capacidade de decidir
Em Rangel era visceral a obstinação em desenvolver a capacidade de decidir sobre os destinos do Brasil, levando-o a mergulhos profundos, sem
Márcio de Castro ilumina algo que singulariza a produção intelectual de Ignacio Rangel: foi um exemplo raro de teórico não acadêmico.
Todas as suas questões teóricas foram condicionadas pela busca de
se os sociais e políticos.
Um criativo produtor de ideias, nascidas da combinação do prático com a busca de soluções adequadas às necessidades nacionais.
pode ser vista como uma ciência exata. “A Economia, como a Política e o Direito
portanto, o essencial é saber quais devem ser os objetivos das decisões tomadas.
Muito antes de Comparato, Rangel já havia chegado a essa constatação ao ir fundo na resolução dos enigmas da formação social brasileira e a não se contentar em apenas formular explicações meramente acadêmicas, geralmente
recorrentes.
formação nacional e do seu desenvolvimento. Recusou de imediato a condição de transformar-se em apenas um adaptador de teorias importadas, comum na
As teses em vigor à época, tanto da direita como da esquerda, a seu juízo, precisavam ser revistas criticamente. Por isso teve que assumir posições fortes no debate intelectual e político da ocasião, a ponto de sua contribuição representar um novo olhar e uma nova interpretação sobre o Brasil e sua história.
Segundo Rangel, a dinâmica histórica brasileira não poderá ser compreendida se for pensada como os casos clássicos da história econômica dos países desenvolvidos.
Os processos internos da formação brasileira, sejam econômicos, sociais e políticos, dependem das relações que se estabelecem com os centros dinâmicos da economia internacional.
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Com base em fontes seguras, a sua obstinação pelo aprimoramento da capacidade de decidir sobre os caminhos do desenvolvimento econômico
que Rangel só reconhecia como superiores apenas três autores: Marx, Lênin e Aristóteles.
Um exagero, sem dúvida, pois, em mais de uma vez, pudemos ouvi-lo
pai, José Lucas Mourão Rangel, e de Antonio Lopes, estudioso que exerceu a liderança intelectual no Maranhão por quase toda a primeira metade do século XX.
Rangel, por sua privilegiada capacidade de gerar ideias, era
Ministério da Educação e Cultura, na presidência Café Filho, importantíssimo durante o governo de Juscelino Kubitschek e seguintes, logo fechado pelo regime
A revelação é de Gilberto Paim, durante exposição feita no I Simpósio
cidade de Florianópolis, Santa Catarina, imediatamente após o falecimento do homenageado, no Rio de Janeiro, onde residia, cujos anais foram publicados pela
trabalho organizado por Armen Mamigonian, um rangeliano dos mais festejados e guardião valoroso do legado do autor.
Por último, duas características, pelo menos, marcam a produção do intelectual maranhense: de um lado, a erudição, a criatividade e a originalidade, e, em seguida, a profunda sintonia com a realidade nacional, sua conjuntura
construção de uma agenda que possibilitasse incrementar a capacidade de decidir internamente, com precisão, sobre a melhor maneira de desenvolver a economia brasileira.
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Rangel: um tesouro a descobrir no Maranhão
continua sendo um ilustre desconhecido entre os seus conterrâneos. Círculos
popularizar a sua contribuição à cultura local e nacional ainda permanece atual, a despeito dos muitos esforços já feitos por admiradores e seguidores maranhenses, com o objetivo de desmentir o adágio popular.
Com efeito, desde o início dos anos 80 do século anterior, um grupo de economistas e representantes de outras áreas das ciências sociais, vinculados ao ex-Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais (IPES) e ao Departamento de Economia da Universidade Federal do Maranhão, vêm promovendo e divulgando a obra de Ignacio Rangel no Estado.
passou a ter seu nome em salas do IPES e Departamento de Economia/UFMA, emprestando-o também aos concludentes do curso de Especialização em Economia do Setor Público.
Conselho de Economia do Maranhão, acontecendo uma grande cobertura da mídia na ocasião de sua passagem por São Luís.
A partir daí tornou-se um colaborador regular da revista FIPES, do IPES.
visando estudos sobre desenvolvimento econômico que levou seu nome, tendo como um dos seus objetivos preservar a documentação e a memória intelectual do autor.
Além disso, realizou-se um convênio tripartite, envolvendo UFMA, IPES
sentido era difundir, através de livros, a obra do economista.
Os frutos daquele trabalho de divulgação apareceram ainda mais nítidos
de Letras, por iniciativa de intelectuais e literatos da terra, e o Governo do Maranhão, por intermédio da Secretaria de Cultura, evidenciando seu interesse em conceder-lhe uma comenda, pelo valor de sua contribuição cultural ao Brasil e ao Maranhão.
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Ignacio de Mourão Rangel foi um homem sólido de caráter, ideário,
construído, mas na ação prática cotidiana.
pela Aliança Nacional Libertadora (ANL).
Atuou como um dos organizadores da luta dos trabalhadores rurais espoliados do Alto Sertão maranhense e piauiense contra o poder do latifúndio.
presidiários políticos, e em São Luís, onde viveu sob intensa vigilância e com direitos de ir e vir cerceados.
clássico do pensamento econômico, está cotado pela Câmara Brasileira do Livro - CBL como um dos 50 mais importantes livros brasileiros do século XX.
Rangel não fez carreira acadêmica como docente, nem como pesquisador. Foi o maior dos economistas sendo formado em Direito e um dos maiores intérpretes do Brasil sem ter atuado no meio universitário. Respeitava as questões que a academia pautava, muito embora preferisse dar seus próprios mergulhos, profundos, nos problemas do desenvolvimento brasileiro.
A independência intelectual, somada à coragem política, bem como o fato
sobretudo por não ter tido a oportunidade de convivência permanente com alunos e seguidores que se encarregassem de difundi-la sistematicamente, impondo-lhe uma angustiante solidão intelectual, que o próprio Rangel denominava de
Embora tenha estudado com rigor as teorias de autores clássicos da
Kalecki, Hilferding, Harrod, Robinson, Schumpeter, Kondratieff, Juglar, entre os principais, se valeu de muitos deles na estruturação de suas teses sobre a Dualidade Básica.
de sua vida, referia-se aos grandes do seu tempo de Maranhão, a começar pelo próprio pai, já mencionado, seguindo-se Antonio Lopes da Cunha, com
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de outros fora do ambiente intelectual, como João Vasconcelos Martins e Caio
sua primeira e grande escola de aprendizagem da ciência econômica.
explicativos do desenvolvimento da formação social brasileira, presente na
Rangel jamais confundiu a ciência econômica com os fundamentos do equilíbrio neoclássico, ou com as matemáticas, ou com a econometria, tendência esta, segundo alguns, uma das mais importantes causas do empobrecimento do
decadência por que passam as escolas e faculdades de economia.
O desenvolvimento capitalista criou uma enorme periferia, da qual
de infraestrutura e de desigualdades. Para decifrar o país, seus problemas e crises, não basta examinar o desenvolvimento econômico como se observa o comportamento dos modos de produção clássicos. É fundamental antes de tudo
quando vem a falecer, Ignacio Rangel foi quem melhor explicou os fundamentos da formação social e do desenvolvimento econômico do Brasil, de maneira
A despeito da conspiração do silêncio e dos impactos produzidos pelo
plenamente válidas e assim permanecerão por muito tempo, pois não se trata de uma contribuição datada e localizada e sim de uma obra que agrega valores imensuráveis ao pensamento humano.
Em sua última visita a São Luís, falando a um grupo de admiradores,
Não temos dúvidas que os ecos da presença rangeliana no Maranhão existem, ainda que difusos, aqui e ali. É também verdadeiro admitir que são ecos muito tênues, fracos, distantes, ainda privilégio de restritíssimos grupos sociais bem informados presentes no meio maranhense, portanto muito aquém do esperado como divulgação para uma obra seminal como a do brilhante economista.
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Mesmo nos dias que correm, é possível perceber, nos círculos culturais e sociais mais institucionalizados e destacados da maranhensidade, que Ignacio
um nome a integrar o pantheon de barro em que se transformou a memória cultural maranhense.
Trata-se pois de um tesouro que precisa ser descoberto pelas escolas
País, sobretudo pelos seus estudantes, para quem Rangel tinha uma verdadeira predileção, pois acreditava que seriam eles os fecundadores das sementes de um novo Brasil.
Os caminhos do caminhante lapidam uma obra instigante
O corpo teórico produzido pelas ideias originais de Ignacio Rangel sobre o Brasil no mundo precisam ser revividas para que o país não pague um preço muito alto por essa omissão histórica.
temporal. Ele, no bairro das Laranjeiras, no Rio e nós, em boa parte, em São
formação acadêmica.
Nunca sentimos nele a menor pretensão de constituir discípulos
tais, a nós os orgulhosos divulgadores de sua obra no Maranhão naqueles tempos.
Apresentava-se sempre como um pregoeiro destemido e sério, um anunciador corajoso, um decifrador de enigmas, que teve o Brasil como maior
Fica assim evidente que o maior de todos os seus compromissos era mostrar caminhos novos aos jovens, sobretudo economistas, sobre o enfrentamento dos obstáculos postos ao desenvolvimento do Brasil.
Partia sempre da ideia de que os seus interlocutores podiam acompanhar o seu raciocínio e suas explicações a respeito de como superar os problemas do País. Ele nos levava, em expedições fantásticas, à convicção de que o mundo das desigualdades tinha saída, à pátria haveria um futuro promissor e que a
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humanidade viria a ser plenamente evoluída e feliz.
A maior de todas as suas utopias: a certeza de que todos os povos da
havia morrido.
Estava vivo e pulsando nas páginas do referido livro.
Estava mais belo do que nunca porque ressuscitara por mãos femininas, como as de Liudmila e Ana Rangel, sua sobrinha e de muitas outras que ali se encontravam.
Encerramos nosso pronunciamento com uma alegoria, que bem representa a alma ignaciana.
Não seria surpresa para nós, se, ao chegarmos em nossos lares, o Velho, de beijos e abraços com Aliete, sua inspiradora e combativa esposa, José
Celso Augusto, José Aldo e Dirceu Carmelo nos mandasse, como presentes por aquela festa comovente, uma bússola, um compasso, um relógio e uma régua de
quando fazia o curso da CEPAL no Chile.
Seria, sem nenhuma dúvida, mais um convite desse bravo “sobrevivente
Corrêa, para não desistirmos de decifrar e reinventar o Brasil.
Rangel foi um caminhante incansável que se fez ao caminhar.
Autodidata, estudou, com rigor, História e Economia. Cursou Direito na antiga Faculdade de São Luís. No imediato pós-guerra radicou-se no Rio de Janeiro,
tendo sido secretário da United Press e como tradutor e, posteriormente, como jurista, historiador e, principalmente, como economista.
A partir dos anos 50 esteve presente, lúcida e ativamente, nas instituições e nas trincheiras de luta pelo desenvolvimento nacional, a saber: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), hoje BNDES, Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), Instituto Brasileiro de Economia, Sociologia e Política (IBESP), Assessorias de Vargas e Goulart, Plano de Metas de Juscelino, Clube dos Economistas, Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro, Instituto de Economistas do Rio de Janeiro (IERJ) e, por último, na Academia Maranhense de Letras.
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Foram instituições nas quais atuou e realizou inúmeras trabalhos, conferências e ministrou cursos, além das várias exposições que fez a convite de universidades e instituições educacionais do país, tendo sido ainda colaborador permanente das principais revistas e publicações especializadas em economia, como a Revista de Economia Política, sendo um dos seus patronos, e dos maiores jornais do país, em especial a Folha de São Paulo.
Universidades do país. Nessa época torna-se colaborador regular e conferencista em cursos e seminários sobre economia, promovidos pelo Instituto Superior de Estudos Brasileiros-ISEB, pelo Instituto Brasileiro de Economia, Sociologia e Política-IBESP e pelo Clube de Economistas.
Nos últimos anos de sua vida passou a militar no Conselho Regional de
Instituto de Economistas do Rio de Janeiro-IERJ, onde ocupou a função de membro consultivo.
vários Rangéis:
1. Há o Rangel intérprete da economia brasileira. Seu lado mais conhecido. Dono de uma obra monumental, original e inovadora. Um dos formuladores do modelo de substituição de importações na economia brasileira;
2. Há o Rangel pensador. O criador original. O pioneiro. Aquele que vai fundo
maneira nova de se posicionar no debate. A forma peculiar com a qual trabalha a
privatização de serviços de utilidade pública, as análises sobre reserva de mercado, as propostas pioneiras à época, referentes à instituição de um
e de um mercado de capitais para o desenvolvimento do Brasil, ou as demonstrações acerca da importância estratégica do comércio exterior para a economia brasileira;
3. Há o Rangel erudito. Sua face reconhecida, mas pouco destacada. Em seus textos é fácil encontrar não só um analista profundo, mas, igualmente, um
conjunto imprimem a seu trabalho uma atraente e fecunda expressão
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literária;
4. Há o Rangel militante. Tanto aquele que optou pela militância intelectual como uma forma de atuação, como o militante político, autêntico e
meados daquela década integrou a ANL. Como consequência do levante
os Mosquitos e de outros direitos fundamentais, como o de tornar público o seu pensamento. Igualmente notável sua militância na burocracia e planejamento governamentais. Atuou e ajudou a construir instituições básicas ao desenvolvimento brasileiro do pós-Segunda Guerra, como
Rangel ocupou posição privilegiada nos principais centros de decisão econômica do Brasil. Ele próprio escreveu, deixando evidente sua peculiar
“Fui testemunha atenta de fatos importantes de nossa história por pura
5. Há ainda o Rangel missionário. O Rangel conselheiro. O Rangel profeta. Neste particular, aliás, ele se caracterizou como um analista que se houve sempre bem como antecipador dos desdobramentos históricos da economia brasileira;
6. Há ainda um Rangel muito especial, do qual Ignacio Rangel se orgulhava muito. O Rangel funcionário público. Aquele que tem a consciência e
íntegro que não foi seduzido pelas alturas, preferindo semear na planície. O cidadão que soube dizer sim, quando era para dizer e disse não, quando foi preciso. Instado pelo então presidente Goulart, no dia em que completava seus 50 anos, de vida, a escolher entre os cargos de Ministro Extraordinário da Moeda e do Crédito, a SUMOC, hoje Banco Central, Rangel, honrado e agradecido, recusou o convite, demonstrando ao Presidente que seria mais útil ao país continuando como servidor público, temeroso do poder imobilizador da alta burocracia e, como ele mesmo confessaria, da crise que cercava o Governo Goulart naquele momento.
Sua produção intelectual é vasta, não se limitando apenas a livros e
pareceres técnicos, planos de desenvolvimento, projetos institucionais e tantos outros.
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através de levantamentos em outras fontes, são estes os livros e principais textos avulsos de Rangel:
apresentada à Assessoria Econômica da Presidência da República e publicada
de curso na CEPAL;
Livraria Progresso de Salvador-BA;
passagem pelo Departamento Econômico do BNDE;
da Universidade da Bahia, obra pela qual Rangel reserva grande apreço, tendo merecido edição da Editora Bienal, de São Paulo;
no Rio pelo BNDE;
pelo CONDEPE, Recife-PE;
desenvolvidas em grupo de trabalho pela Presidência da República, visando apontar soluções ao problema agrário brasileiro, publicado pelo Conselho de Desenvolvimento da Presidência da República, no Rio de Janeiro-RJ;
Brasileiro, reeditado posteriormente pela Zahar, Brasiliense e Bienal, estando próximo da 10ª edição, sendo o trabalho mais divulgado de Rangel e hoje um clássico do pensamento econômico brasileiro;
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HUCITEC, São Paulo, compreendendo uma reedição revista dos trabalhos
Rio (RJ);
economia brasileira durante o regime militar;
selecionados, publicados em jornais e revistas de circulação nacional, período
anteriormente, estão arrolados, como contribuição intelectual de Rangel:
Economia e das Ciências Sociais, tais como Digesto Econômico, Cadernos do Nosso Tempo, Desenvolvimento e Conjuntura, Revista do BNDE, Revista da Civilização Brasileira, Estudos CEBRAP, Revista Agrária, Ensaios FEE e Revista de Economia Política;
[7] trabalhos de fôlego, como contribuição em coletâneas organizadas por
e Tecnológico;
[3] teses sobre o pensamento de Ignacio Rangel, elaboradas por Manoel Francisco Pereira (EASP/FGV/SP), Paulo Davidoff (UNICAMP) e Ricardo
Destacam-se mais dois trabalhos acadêmicos: a dissertação de F.J.C. de Carvalho (IFCH/UNICAMP) e o texto de Mauricio Tiommo Tolmasquim, estes sobre os ciclos na obra de Rangel, elaborado para o curso de Teoria e História
Sociales, de Paris.
Nos últimos anos de sua vida tornou-se colaborador assíduo dos principais jornais brasileiros, entre os quais a Folha de São Paulo e o Jornal de Brasília, onde veiculava sua produção.
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(23 artigos), perfazendo, no período uma média de quase 3 artigos novos por mês.
Não menos volumosa foi sua contribuição, nos últimos anos, a jornais e revistas especializadas em economia, tanto de projeção nacional quanto regional e estadual. São artigos, ensaios, entrevistas, veiculados pela grande imprensa e periódicos dos grandes centros do sul e de outras regiões brasileiras.
Adicionem-se a isto as crescentes solicitações a Rangel, provenientes das mais variadas instituições sociais e culturais do país, e até de universidades estrangeiras, interessadas em ouvir suas conferências, palestras e depoimentos.
de Rangel que permanece inédita ou desconhecida. São pareceres, relatórios técnicos, estudos e projetos, referentes a questões econômicas dos anos
governamental e militou nas instituições estratégicas, na formulação de idéias sobre o desenvolvimento do Brasil.
Em 2005, por iniciativa de César Benjamim, a Editora Contraponto editou
oito títulos essenciais de sua produção intelectual. O Volume 2 compreende
morte.
Apesar do hercúleo esforço de César Benjamin, Márcio de Castro e Liudmila em reunir a obra completa de Rangel, com certeza uma nova incursão em fontes ainda inéditas poderá fazer emergir textos e contribuições do autor espalhadas por esse imenso país, sob guarda de seus amigos e admiradores.
terem recolhido e juntado tesouros que se encontravam dispersos e que faziam uma falta enorme ao patrimônio cultural da nação, em especial à sua ciência econômica.
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Rangel e a penumbra
sombrio. O sol levanta e movimenta. A penumbra convida a permanecer. O Brasil visto de longe parece um sol imortal. O país de perto tem muitas sombras. O Maranhão muitas noites. Rangel é o sol vagueante que precisa ser encontrado para clarear noites e sombras.
Vivemos em um universo de poucas luzes, sobretudo o maranhense, que sobrevive das ilusões de um passado distante, muitas vezes eivado de mentiras e falsidades, e das miragens cotidianas, completamente ilusórias. Por
centenárias, solares. Tudo e todos estão cada vez mais líquidos, pastosos, penúmbreos.
Não se trata de pessimismo ou de culto a personalidades. O Brasil já ultrapassou a barreira dos 500 anos desde a ocupação colonial e parece que
décadas vive o destino das encruzilhadas frente ao ocaso anunciado: o desespero de não ter mais tempo e capacidade para se renovar.
decisões tomadas no passado remoto e recente do Maranhão, muitas das quais completamente equivocadas e incapazes de promover esperanças e aspirações coletivas sustentáveis. Avolumam-se os sentimentos de que erramos e por muito tempo.
colocam em xeque a capacidade de decidir dos governantes, tornando difícil encontrar e compreender as saídas do enorme labirinto de vontades construído pela sociedade em transe, colocando em risco a reputação e a competência das elites governantes e dirigentes, muitas delas plenamente incapacitadas ética,
conjuntura nacional, internacional e também pelas ruas.
Estamos em uma difícil encruzilhada, ofuscados por um sol escaldante ou completamente cegos na noite escura. Dia ou noite, cada vez mais, buscam
em arapucas da política partidária e amordaçada pela força das exclusões, em especial as educacionais, que negam o direito a uma leitura crítica dos contextos em que se insere.
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A realidade nua e crua tanto pode ser uma oportunidade para mudar, como uma ameaça a qualquer projeto transformador. O mundo em profusão de hoje relegou a segundo plano os poderes das fórmulas mágicas e a força dos milagres.
As lições deixadas pelo homenageado, em seu primeiro centenário, indicam que, sem coragem, capacidade e determinação, a vitória das trevas será inexorável.
Revelam que é preciso semear a terra, plantar em campos imensos e tomar decisões corretas para garantir a melhor das safras.
Em muitos casos a semeadura não produz frutos imediatos, precisa de
semeadores forem luminosos e preparados.
Rangel não foi um fatalista, nem tampouco um pessimista em relação ao futuro do Brasil e do Maranhão. Seu otimismo era tão forte que não fez outra coisa na vida que se aprofundar no conhecimento dos problemas brasileiros e
Todavia precisamos aprender com o seu exemplo de vida. As benesses não chegarão sem trabalho, dedicação e criatividade. O panorama apresentado
processo de centralização e concentração de poderes pelas oligarquias estaduais e municipais levaram a sociedade inclusiva a um estado de penúria material e cultural sem paralelo.
Aqui estão naturalizadas as injustiças, o compadrio, o apadrinhamento. O mérito pessoal como valor intrínseco pesa muito pouco nos processos de inserção no mundo do trabalho e da vida ativa, em especial na máquina do poder público, o que tem levado as instituições locais a crescentes níveis de
Aplicação aos estudos, valorização dos talentos dispersos no meio social não contam em nada se estiverem na outra margem do rio que banha o poder local.
A prova da falência desse sistema de dominação política e os sinais de sua incapacidade de encontrar saídas esta à mostra no noticiário nacional e internacional, cada dia mais com suas câmeras voltadas para a Província, revelando uma sequência crescente de crises fruto da incapacidade no setor público de planejar e gerir as políticas públicas.
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A implosão do sistema de segurança e a consequente eclosão de motins,
policial e amea
O inusitado em tudo isso é constatarmos que o cismo que abala as estruturas de poder no Maranhão tem origem em representantes da escória
portanto inadmissíveis em partidos políticos e nas instituições acadêmicas, de onde sempre esperamos que viessem os fundamentos da ruptura.
precisam de cura. É necessário sabedoria de decisões. Pensar que o tesouro do setor público, por mais entulhado que esteja de recursos arrecadados da sociedade, não vai secar nunca, portando nos permitindo queimar recursos públicos, como muitos ainda fazem hoje, é um erro que produzirá efeitos desastrosos.
Necessitamos de uma vida comunitária e social que escape desses determinismos que ameaçam o desenvolvimento do Maranhão e do Brasil. Os novos políticos precisam conhecer formas alternativas de direção política da sociedade e não continuarem imitando estratégias dos antigos regimes, ou por má fé ou por ignorância. Rangel nunca admitiu as fórmulas prontas, tanto da direita, como da esquerda. Penetrou fundo nos problemas recorrentes para construir as melhores soluções possíveis. Sem arrogância e vaidade.
O que iremos construir daqui para frente, inspirados no exemplo rangeliano, terá forçosamente que valorizar a competência e o talento, negar o imediatismo político, focar nas necessidade do desenvolvimento da sociedade como um todo, tendo como transversalidade um contrapoder social inteligente e capaz de avaliar decisões que sejam as mais adequadas e pertinentes à
Os efeitos das várias penumbras que ameaçam o destino do Maranhão precisam ser superados com urgência para que o otimismo rangeliano se concretize. Precisamos vencer a apatia e ampliar a capacidade de decidir sobre a sustentabilidade do desenvolvimento local. Precisamos de talentos vivos e ideias originais capazes de indicar os melhores caminhos e as mais consistentes saídas para fugirmos da noite soturna e chegarmos inteiros ao sol radiante do dia que virá.
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Canção d’amigo para Ignacio Rangel*
Ignacio Rangel: resposta a um Inquérito de Mônica Sinelli
Conheci Ignacio Rangel em São Luís do Maranhão, em conexão com o então Instituto de Pesquisa Econômicas e Sociais (IPES), organismo que congregou uma plêiade de estudiosos – entre os quais, os sociólogos Maureli Costa, Pedro Braga, Leo Costa e José Caldeira e os economistas Raimundo Palhano, José Augusto dos Reis, Ana Maria Saraiva e Saturnino Moreira. Sociólogos e economistas, bem como agrônomos, a exemplo de José Policarpo Costa Neto, demógrafos, estatísticos e outros mais – cuja nominata é naturalmente mais extensa.
As minhas relações com Ignacio Rangel daí derivaram, tornando-se menos institucionais e, de maneira gradativa, cada vez mais pessoais, conformando uma amizade transgeracional, que terminou por vencer o tempo, pois perpassou menos de uma década e meia e ultrapassará tanto a dele quanto a minha vida.
Fui casado com a excelente socióloga Maureli Costa e a amizade com
Ana Raphaela, que chamava o velho economista de Vovô Rangel, retribuindo o afeto que lhe era dispensado.
* Este texto prefacia o livro “Canção d’amigo para Ignacio Rangel: pequeno almanaque comemorativo do seu primeiro centenário”. O “pequeno almanaque” (são 274 páginas) será publicado posteriormente e contém rica documentação inédita de Ignacio Rangel ou sobre Ignacio Rangel em parte incorporada a este livro, com a autorização e a gentileza do autor.
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As marcas deixadas por momentos como luta armada no Maranhão, prisão no Rio de Janeiro e rompimento com o Partido Comunista foram indeléveis na existência de Ignacio Rangel.
Primeiro, porque no percurso rangeliano houve a constante
em um jogo de retroalimentação dialética. Ter participado da luta armada no
vigente no mundo. Creio que o episódio em questão preparou Ignacio Rangel para uma compreensão mais adequada de sua futura inserção no aparelho de planejamento do Estado, colaborando para a teoria e a prática de novos níveis de mudança de equilíbrio no Brasil.
Segundo, porque a prisão no Rio de Janeiro conferiu ao jovem Rangel uma possibilidade de convívio com parte do que o Brasil tinha de mais inteligente, cívico e generoso, ainda que pudesse ser – também – equivocado. O cárcere instaurou o jovem Rangel no centro do debate em torno do Brasil e do mundo, em uma década fatal, a de 30, esmagada entre as duas Guerras Mundiais e marcada por extrema polaridade ideológica, subsequente do socialismo de Estado, crise do liberalismo, ascensão do fascismo e crescente apelo e legitimação do nazismo.
Terceiro, porque o rompimento com o Partido Comunista representou, para Ignacio Rangel, a possibilidade intelectual de existência de Ignacio Rangel, sem o que seria mais um militante a repetir fórmulas e cartilhas de uma teoria da revolução forjada em Moscou, pelo Politburo. Este era a elite stalinista pensando ‘a revolução mundial’ a partir do ‘socialismo em um só país’ e ditando caminhos
Comunista da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Se ali permanecesse, Rangel seria um militante de brilho, mas sem autonomia intelectual, a repetir fórmulas abstratamente construídas pelos 11 membros eleitos pelo Comitê Central do Partido Comunista, a realizar análises equivocadas da realidade,
inúmeras vezes Ignacio Rangel repetir que o maior anseio intelectual só poderia ser pensar com a própria cabeça. Rompendo com o Partido Comunista, Rangel carimbou o passaporte para pensar com a própria cabeça.
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formado no espírito iluminista da Revolução Francesa, na Faculdade de Direito do Recife. Fora do círculo familiar, sem dúvida, a ascendência maranhense foi de Antônio Lopes, também advindo da Escola do Recife, que representou uma referência intelectual com abertura sociológica, na formação do pensador maranhense.
Dimitrievich Kondratieff.
A peculiaridade de Ignacio Rangel residiu na capacidade de dialogia e de
Dimitrievich Kondratieff – sem se reduzir a nenhum dos três, interpretando-os, reelaborando-os e construindo a si mesmo, na singularidade da sua perspectiva de teoria econômica.
Constato, inclusive, que aquilo que parecia inexorável teimosia em Ignacio Rangel a exemplo da teoria dos ciclos – vi uma vez Maria da Conceição
Henrique Cardoso não enuncia outra coisa, ao ponderar “A crise econômica
que se pensava e que, portanto, a previsibilidade através do planejamento, da antecipa .
Finalmente, registro a singularidade intelectual de Ignacio Rangel, em virtude da circunstância de que dispunha de cultura geral, transitando pelas
história, sociologia e direito, em poliedro difícil de encontrar entre os economistas.
Em uma formação social periférica e dependente, como a do Brasil, a tentação era, como efetivamente foi, a de transplantar o modelo marxista para uma realidade estranha à sua paisagem europeia, típica da sociedade urbana e industrial do século XIX.
do mesmo, produzindo o divórcio das ideias com a realidade, desembarcando
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aqui, mais uma vez, ideias fora do lugar, para recuperar a imagem de Sérgio Buarque de Holanda. Este caminho foi o do Partido Comunista, com o transplante de toda uma teoria da revolução formulada pelo Politburo, na União Soviética de Josef Stálin.
O tratamento que Ignacio Rangel conferiu a Karl Marx correspondeu a uma apropriação criativa do seu instrumental metodológico e teórico, com a
Ramos, não deixar, em hipótese alguma, de conferir prioridade empírica às circunstâncias peculiares da formação social brasileira, em sua singular historicidade.
Daí que, no Karl Marx de Ignacio Rangel, não há a sua apropriação dogmática segundo as fórmulas da teoria da revolução do Politburo, que se tornaram regras de ferro do Partido Comunista no Brasil, despindo-o o economista
capitalismo, o desaparecimento das classes médias, o imperialismo como último estágio do capitalismo, a total incompreensão do agir histórico periférico, a exemplo da percepção de Simón Bolívar por Karl Marx, tipicamente etnocêntrica ou eurocêntrica e, no mínimo, a visão de Karl Marx quanto a destruição colonial das formas de vida pré-capitalistas existentes nas Américas.
Em síntese, Ignacio Rangel depurou e reconstruiu o seu Karl Marx.
Com fundamento no discurso econômico rangeliano, não tenho dúvida de que a política econômica petista seria objeto de crítica e de discordância. O Ministro da Fazenda Guido Mantega é um conhecedor do pensamento de Ignacio Rangel, porém, no poder e na gestão, é menos o acadêmico Guido Mantega e
A preocupação rangeliana com a ativação dos recursos ociosos na economia brasileira, na dialética do setor privado com o setor público, sempre representou, em última instância, um compromisso com dinamismo e com o crescimento econômico no país.
No momento, as modestíssimas taxas de crescimento da economia
retomada da ascensão dos juros, sem dúvida, mereceriam a reprovação de Ignacio Rangel. Esse não poderia aplaudir o crescimento de 2% em 2012 e a previsão de, no máximo, 3% em 2013, ano em que a América Latina e o Caribe,
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na expectativa do Banco Mundial, com efeito, tenderão a um crescimento de 3,5%.
As propostas de Rangel, acaso existentes, sem dúvida, seriam criativas e surpreendentes, com o chamamento à responsabilidade dos gestores da economia, que poderão ter perdido uma oportunidade histórica de melhor fomento do seu dinamismo, por meio da poupança advinda do comércio de grãos e minérios com a China, enquanto esta crescia a taxas de 13%, como aconteceu no ano de 2007.
Permaneço lecionando e examinando teses no Brasil e fora dele. Não há lugar em que eu esteja, no qual, sendo cabível, não me reporte ao pensamento de Ignacio Rangel, ao discutir a vida nacional, inclusive, na sua dimensão jurídica, por ser a da minha mais orgânica atividade.
estabeleceu entre dualidade e Código Civil. Ensino de maneira sazonal na Universidade Católica de Brasília (UCB), assessoro o Centro Universitário de Goiás (Uni-Anhanguera) e estou, de forma constante, no Centro Universitário de Brasília (UniCeub) e, entre outros, no Centro Universitário Instituto de Ensino Superior de Brasília (IESB).
Regra geral, não há núcleos de estudos sobre a obra de Ignacio Rangel nos referidos ambientes acadêmicos, mesmo porque, a bem da verdade, houve uma implosão das Faculdades de Economia no ensino universitário privado no Brasil, levando-as ao encolhimento ou ao desaparecimento, com o decréscimo visível da clientela.
Em que medida a crise da teoria econômica responde pelo processo de desconstrução universitária em epígrafe, à falta de quadros explicativos para a economia do mundo pós-moderno, é um debate que precisa ser travado.
De mim para mim, tudo que posso fazer, efetivamente faço, examinando,
atenção, promover o acesso, provocar a remissão ao pensamento de Ignacio Rangel, colhendo sempre reiterado resultado: a surpresa e o deslumbramento.
Os alunos terminam por conjugar surpresa e deslumbramento, quanto à capacidade rangeliana de antever e de reconstruir as relações do público e
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do privado no Brasil, por exemplo, entre demais temáticas instigantes. Estas
ociosa, dos movimentos cíclicos e das diferentes fases e formas de inserção na economia internacional.
Assim caminho levando comigo – nos espaços onde circulo – a semeadura do pensamento e a construção da permanência de Ignacio Rangel, não por acaso, chamado de mestre dos mestres.
Por Ignacio Rangel falará a história: depoimento para Mônica Sinelli no centenário do economista brasileiro
Ignacio Rangel – agora chamado saudade – foi um dos acontecimentos da inteligência na minha vida que, desde o nascedouro, transcorreu na luz, não no obscurantismo. E, se o declaro, é para sublinhar que o grande economista,
sociólogo, foi como o sol do meio dia, astro luminoso a sobreiluminar uma galeria
mesmo entre os trânsfugas; fênix entre os que tombaram no caminho; convicto
mestre Rangel.
Aliás, o mestre dos mestres, como o designou o Ministro Bresser-Pereira, quando lhe entreguei, certa feita, em Brasília, um exemplar de “Um Fio de Prosa
companhia da socióloga Maureli Costa, do economista Raimundo Palhano e do
a mim, depois de descer da mesa de palestrante em João Pessoa, no seminário comemorativo dos sentent’anos do mestre Celso Furtado, organizado por dois notáveis nordestinos: o historiador Sales Gaudêncio e o economista Marcos Formiga.
Miguel Arraes, na intimidade, talvez mais soberbo do que populista, sobre quem escutei o testemunho, no Palácio Campo das Princesas, de um mordomo de quatro décadas, ou quase, que o servira em três governos – manhãs, tardes, noites e madrugadas, muitas madrugadas, secas e molhadas – sem dele nunca escutar um simples ‘obrigado, muito obrigado’. Se verdade for, foi este homem,
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de quem, ao contrário, testemunhei o Ministro e Governador Moura Cavalcanti garantir tratar-se de pessoa de gestos largos, com vocação para a nobreza de atitudes, o Miguel Arraes que eu assisti, lado a lado com grande Rangel, recolhê-lo da cadeira no auditório repleto, para ali festejá-lo em reverência calorosa, na quente tarde paraibana.
Conheci pessoalmente Ignacio Rangel em São Luís do Maranhão. Leitor precoce, de livro já o fruíra na adolescência, ouvindo, em complemento, do poeta e do economista maranhense Bandeira Tribuzi o depoimento de que, na esfera
do brilhante pensador timbira. Seguiram-se manhãs, tardes e noites repetidas em São Luís, Recife e Brasília, bem como João Pessoa, nas quais, algumas vezes, recebi o casal Rangel – Ignacio e Aliete – privando de sua companhia singular, chegando mesmo a hospedar o varão de Atenas na Veneza Brasileira
Em São Luís foram inúmeras as ocasiões em que nos encontramos, em uma cidade novamente povoada pelas presenças de Renato Archer e de Neiva Moreira, o primeiro, retornado da cassação e o segundo, egresso da cassação e do exílio, na qual debates e seminários reaconteciam, com a participação de Ignacio Rangel e o chamamento de personalidades como Luiz Carlos Prestes,
Guimarães e Fernando Henrique Cardoso, sem o olvido de Teotônio Vilela, o menestrel das Alagoas.
Distinto hemisfério – mais constante – nasceu do contato do velho Rangel com o Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais (IPES), organismo público que existiu no Maranhão, advindo da chamada Revolução de 30, nos tempos de Paulo Ramos, então dirigido pelos jovens e lúcidos economistas José Augusto dos Reis e Raimundo Palhano, que ali congregava quadros técnicos de primeira água, advindos de consistente formação acadêmica.
Na Ilha do Amor os colóquios, debates e seminários rangelianos se multiplicaram, no antigo sobradão da Rua Portugal, na Praia Grande, em que ainda funcionava o primeiro elevador instalado no Maranhão. O mestre dos mestres evitava sempre as escadas pelas quais subira na juventude, ora ascendendo pelo elevador preguiçoso, ora formando o grupo no mesão da térrea biblioteca. Daí decorreram momentos com a vocação da eternidade. Um mestre de saber cercado de ainda quase juvenis sociólogos, economistas, agrônomos,
momentos preciosos.
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De maneira retrospectiva, compreendo aqueles instantes como de puro exercício de responsabilidade do velho Rangel para com o futuro, nos quais
busca de dois elementos conectados: consciência e compromisso. Com efeito, contemporâneo do futuro, Ignacio Rangel venceu o tempo e consignou na agenda das gerações sucessivas, preocupações teóricas e práticas de que foi semente fecunda, fonte criativa e cadeia inteligente de transmissão.
Do convívio com egrégio economista em São Luís nasceu a pequena
do Monte Castelo – motivados pelo trabalho, ou na minha, debruçados sobre camaroadas, peixe pedra, torta de camarão, creme de bacuri e juçara de açaí, como dizia Graça Aranha.
Em Brasília, reencontrei Ignacio Rangel, para cá deslocado em função de convite formulado por uma central de empreendedores, interessada em rediscutir a questão nacional. Na oportunidade, em companhia do então jornalista – atualmente advogado maranhense radicado na Capital Federal, Eduardo Antônio Leão Coelho – pude facilitar que este o entrevistasse, em matéria estampada no ‘Jornal de Brasília-JBR’, ao qual emprestava a sua experiência de periodista econômico, desenvolvida na grande imprensa de São Paulo. Peregrinamos de extremo a extremo da Capital da Esperança, como a designou André Malraux, a usufruir da vitalidade e da disposição ainda visíveis, do sertanejo maranhense.
Em João Pessoa foi e não foi diferente. Baseados no Recife fomos
acompanhado de uma carga pesada em cérebros, composta, entre outros, pelo geógrafo Milton Santos. A motivação comemorativa estava nos setent’anos de Celso Furtado, ali a recepcionar, com o Governador Cunha Lima, convidados
Arraes, Hélio Jaguaribe, Armando Mendes, Maria da Conceição Tavares, Fernando Pedrão, Cristovam Buarque e muitos outros mais, que a memória esmaece. A salvo, naturalmente, Manuel Correia de Andrade, duas vezes notável, como historiador e como geógrafo.
Regressei para Recife em companhia do casal Rangel, em táxi solidário, posto que pareceu-nos melhor retornar logo, depois de uma semana
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Mauriceia privamos ainda, antes do retorno do ilustre casal para o Rio de Janeiro. Desse encontro mais duas recordações são imorredouras. A primeira, relativa a Ignacio Rangel: vi-o alquebrado pela primeira vez, como se estivesse envelhecido décadas em um dia, depois de ter passado mal, salvo engano, em São Paulo, onde fora participar, a convite de Joelmir Beting, de um debate na ‘Folha’ ou no ‘Estado’, e onde, segundo Dona Aliete Martins Rangel, tivera um eclipse total. A segunda, ao testemunhar o encontro, no calçadão do Hotel Tambaú, do constitucionalista paraibano radicado no Ceará, Paulo Bonavides, com o homenageado economista Celso Furtado:
Eis o sol dos trópicos:
Eis a lua da Sibéria:
O último contato pessoal que mantive com Ignacio Rangel foi quando o hospedei no Recife, a caminho de São Luís, para a sua posse na Academia Maranhense de Letras. Conduzi o mestre dos mestres a duas conferências: uma, na Secretaria de Estado de Planejamento do Estado de Pernambuco; outra, na Faculdade de Economia da Universidade Federal de Pernambuco. O co-cicerone foi meu sobrinho Fabrício Henrique Goulart do Couto Corrêa, que cogitava a
excelente advogado.
Caminhei com o velho Rangel pelo teatro das Revoluções Libertárias de 1817 e derivadas, da resistência liberal e radical de 1824 e do vulcão social de 1848, de que seus antepassados participaram ativamente. Bem como, em companhia do ilustre visitante, embalei-me pelos corredores do Palácio do Campo das Princesas, da Faculdade de Direito do Recife e dos antiquários livreiros confundidos com a alma esclarecida da cidade em que os seus ancestrais também derramaram sangue e sonhos. Na companhia do mestre dos mestres, percorri passo a passo os monumentos comemorativos da bravura pernambucana, um deles, o organismo vivo e pulsante da Rua da Praia, em rememória da Revolução Praieira.
Não fui a São Luís para a posse rangeliana na Academia Maranhense de Letras. Por uma destas coisas estranhas da vida, no instante do seu falecimento no Rio de Janeiro, soube que começara para Ignacio Rangel a ‘Grande Viagem’ pelo
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extraordinário brasileiro, a mim me satisfez sugerir que a Universalidade Federal do Maranhão lhe conceda – – o título de Doutor Honoris Causa, para seu engrandecimento institucional. A mensagem foi entregue a Jhonatan Almada. Tomara esteja a instituição à altura do homenageado. A mim me parece muito adequada a continuidade dos esforços para publicar a obra rangeliana – sobre o que tenho conversado com Raimundo Palhano – muito dispersa, a
que parece, com o concurso do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Ficaram à margem artigos, estudos, ensaios e entrevistas de
Perguntam-me sempre sobre o silêncio de Celso Furtado sobre Ignacio Rangel. Acredito tratar-se de uma questão de vigência intelectual, a carga que,
�do Exército e de preso na Ilha das Cobras, em consequência do fracassado golpe
da formulação teórica, foi o economista maranhense o mais criativo e o mais original de todos os que pensaram a matéria em cinco séculos de Brasil.
Prebisch, mais tomava consciência do tamanho da dívida de Celso Furtado para com o pensador argentino. O velho Rangel, pela autonomia criativa de formulação teórica, sem dúvida, era uma segura ameaça à pretensão de vigência
mestres, junto a mim estava quando exibiu uma obra do economista paraibano
sinal, dedicada a Raul Prebisch, cujo exemplar ostentava uma dedicatória do
estava, com a manifestação bem mais calorosa do que o compreensível silêncio posterior, pois a eclosão rangeliana em livros clássicos, como “Dualidade Básica
A propósito do livro com dedicatória, leu-a Celso Furtado, devolvendo o exemplar ao mestre dos mestres, no mais espectral silêncio. Em seguida àquele gesto, permaneceu o notável economista paraibano em hierática solidão povoada, enquanto o sábio maranhense, voltando-se para mim, comentou tratar-se do melhor livro de quantos escrevera o homenageado, que permanecera indisputável no conjunto de sua obra econômica.
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Humano, demasiado humano... Por Ignacio Rangel falará a história.
declarou que viveria só três anos, talvez soubesse aquém do devido uma verdade
qualquer palavra malévola teriam capacidade de sepultar a verdade que Guerreiro Dualidade Básica da
Economia Brasileira. Ignacio Rangel, na crônica das ideias no Brasil, é uma síntese de interpretação econômica ricamente original, capacidade criativa de análise histórica e dimensão teórica para a formulação de leis sociológicas.
Eis o motivo por que foi um só...
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Ignacio Rangel e seus interlocutores*
Expor as relações de Rangel com seus interlocutores em poucas páginas não só é tarefa difícil como pretensiosa. Entretanto, estas relações são importantes para o entendimento das suas ideias e foram pouco estudadas. Assim sendo, mesmo algumas pinceladas podem ser úteis.
Comunista de 1848 e desde então até sua morte foi militante marxista excepcional, corajoso na defesa de suas ações e de suas ideias, ideias pessoais que ele foi aplicando permanentemente à análise da realidade concreta brasileira e mundial, sempre disposto ao diálogo e ao debate, diferentemente de muitos intelectuais. Mesmo Caio Prado Júnior, outro marxista militante, após suas importantes contribuições ao conhecimento do Brasil, foi se tornando impermeável ao debate das novas ideias. Entretanto o marxismo, como qualquer ideia, sem um clima de debate tende ao enrijecimento dogmático.
Como outros grandes pensadores marxistas brasileiros, entre eles Octavio
ostracismo de tempos em tempos pois a produção intelectual no Brasil e no
aos interesses políticos mais fortes em cada momento, de esquerda ou de direita, como as birutas dos aeroportos. Aliás, as ideias, como seus produtores, os intelectuais, tornam-se mercadorias baratas, sobretudo nas conjunturas depressivas da economia mundial, como nos dias de hoje.
* Tomo a liberdade de indicar textos que escrevi sobre Rangel: Introdução ao pensamento de Ignacio Rangel, GEOSUL, 1987; Entrevista de Ignacio de Mourão Rangel, GEOSUL, 1991-92; Nota sobre as ra-ízes e originalidade do pensamento de Ignacio Rangel, UFSC, 1997 e reeditado pela Editora 34, 1988; O retorno do profeta desarmado, Carta Capital n° 352, 2005; e O pensamento de Ignacio Rangel e a questão nacional hoje, Princípios n° 103, 2009.
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O irracionalismo
A Revolução puritana inglesa do século XVII alavancou o país e deu origem à primeira Revolução industrial, que completou a transição do feudalismo ao capitalismo na Europa. Pouco a pouco a mercantilização capitalista avançou sobre tudo e sobre todos, desde a vida social até a vida familiar, como na expressão
século XVIII ao XIX, a Alemanha, muito frágil política e economicamente, tornou-
e Hegel deu origem ao moderno pensamento dialético, ao marxismo de Marx e
o avanço do capitalismo ajudou a apodrecer estes frutos, como o nascimento da geopolítica imperialista de Ratzel e Haushofer, o avanço do irracionalismo
Entre as duas guerras mundiais a ideia de crise do pensamento estava
mundo das ideias a luta entre materialismo e idealismo estava sendo superada pela luta entre racionalismo e irracionalismo. Por isto mesmo G. Lukács, em “A
pensamento alemão sofreu um ataque de irracionalismo furioso com Schelling, passando por Schopenhauer e Nietzsche até Heidegger, Spengler e E. Jünger. Sua maneira direta, dura e simples chocou a muitos espíritos frágeis do campo marxista, como Adorno e Lefebvre, pois o anti-stalinismo estava na moda, mas provavelmente não chocou a seu amigo Thomas Mann, que logo após a Segunda Guerra Mundial, vivendo nos EUA, apontou os primeiros germes fascistas do outro lado do Atlântico. O subtítulo do livro de G. Lukács, “o caminho do irracionalismo,
estrutura sólida e sua tese fundamental atingia grande dimensão e concluiu dizendo: “o livro parece destinado a suscitar durante longo tempo discussões
biógrafo de K. Marx, retomou a temática da irracionalidade dos dias de hoje na política e na cultura do mundo capitalista (Como a picaretagem conquistou o mundo, 2004), com a mesma contundência de G. Lukács.
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Artesãos das ideias
Desde o início do século XIX a ofensiva irracionalista vem afetando negativamente o trabalho intelectual. Mas antes, na Europa do século XVIII, sob vários regimes feudais, os intelectuais usufruíam de grande prestígio social e
Frederico II da Prússia ou Catarina da Rússia, deram origem ao pensamento iluminista. Tinham espírito aristocrático, como a coragem e a honradez, valorizavam o conhecimento enciclopédico e não as simples especializações, buscavam a verdade e não valorizavam o dinheiro. Como bons artesãos das ideias orgulhavam-se dos grandes pensadores do passado, de quem se tornaram discípulos reconhecidos. Entretanto, como demonstrou H. Bloom (A angústia da
os últimos grandes nomes da literatura que se orgulhavam de seus mestres, que eram explicitados, como Plutarco, Marcial e outros da antiguidade greco-romana, Shakespeare e Voltaire, entre outros. Assim como o brasileiro Gonçalves Dias tinha orgulho de ser devedor de Schiller.
As grandes exceções do século XIX, como Balzac e Tolstoi, eram espíritos dotados das qualidades feudais acima apontadas. Com o avanço do capitalismo foi surgindo um outro tipo de intelectual, caracterizado pela falta de coragem e de
assim pronto a escondê-las. A pirataria que estava em declínio nos oceanos do globo reaparecia nos lagos dos intelectuais de aluguel. Na América Latina o fenômeno de degradação da intelectualidade é muito recente, pois aqui o
dando origem a uma edição piorada e agravada pela queda da URSS, como FHC e Vargas Llosa, entre outros.
As apostasias tendem a fracassar
várias vezes de seu falecido amigo Jesus Soares Pereira, com o qual preparou nos anos 50 as leis da Eletrobrás, na assessoria de Getúlio Vargas. Com a capacidade de endividamento esgotada, o Estado precisava passar a concessão dos serviços públicos estrangulados, vale dizer as infraestruturas em energia, transportes, saneamento, etc à iniciativa
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privada. Não se tratava de vender usinas elétricas existentes, por exemplo, mas permitir a construção de novas usinas pela iniciativa privada. Rangel sabia que contaria com J. Soares Pereira nessa difícil batalha, que acabou derrotada, mas que é retomada hoje nas concessões em andamento do governo Dilma, com mais de vinte anos de atraso…
URSS, o Japão e o Brasil foram as economias mais dinâmicas do mundo no
honestas, que esses resultados extraordinários haviam exigido muitos sacrifícios, muita competência de seus dirigentes, incluindo a capacidade de enfrentar
caso do Brasil, o resultado excepcional resultou da vitória da Revolução de 30,
continuada no segundo governo Vargas, com Rangel na assessoria econômica
democraticamente e de outros sacrifícios, como a cassação dos direitos políticos
dominação do imperialismo segundo Rangel e que levaram ao desastre de
carta aberta de Ignacio Rangel dirigida aos economistas Roberto Campos e M. Conceição Tavares (22/3/85), solene e didática sobre a necessidade de se pôr em prática a concessão dos serviços públicos estrangulados à iniciativa privada, não obteve respostas. A Revista de Economia Política, da qual Rangel era um dos patronos, abandonou o campo nacionalista e assumiu o neoliberalismo agressivo, assim como os economistas do PT G. Mantega (Folha de São Paulo, 13/XI/83) e P. Sandroni (Folha de São Paulo 22/XI/83), seguidos, anos depois, pelo apoio político de A. Mercadante à venda da Usiminas pelo governo Collor. Ignacio Rangel caracterizou o governo Collor como contra-revolucionário e pró-imperialista monetária dos anos 80, o Cruzado, o Bresser, etc, bem a gosto e a mando do FMI, abriram o caminho ao neoliberalismo de Collor e FHC.
Como I. Rangel aprendeu com Lênin, outro marxista genial, as apostasias tendem a fracassar. Assim, em 2002 o governo Lula começou, a duras penas,
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econômico, apesar de não ter contado, assim como o governo Dilma, com assessoria econômica verdadeiramente competente. Também é interessante
social-democratas fortes (Lula, Brizola e Covas), mais uma incompetência das esquerdas na visão de Rangel, ele e Lula trocaram ideias sobre o Brasil.
adolescente Ignacio Rangel começou sua militância política em favor do Brasil. A URSS, com perdas humanas e materiais gigantescas, havia derrotado o nazismo, prestando um extraordinário serviço à humanidade. O Japão, derrotado
ao mundo todo. O Brasil havia se tornado uma pequena potência industrial na periferia do capitalismo mundial e estava dando as costas aos EUA e mesmo fazendo acordo espacial com a China.
No Brasil nos anos 80 o ambiente intelectual passava por grave crise e
de Hollanda e Caio Prado Jr, os intérpretes do Brasil, eram todos nacionalistas
naturalmente, apontavam traços semi-feudais da nossa realidade, que os ex-marxistas de hoje, da USP e de outras academias detestam admitir. Mas foi de C. Prado Jr (Evolução política do Brasil) que Rangel herdou a ideia de como agem e se comportam as classes dominantes brasileiras, como os senhores de escravos. Eles foram acabando com a escravidão lenta, gradual e seguramente,
pela abolição, mas o processo levou o século XIX inteiro, com as várias leis
já haviam monopolizado as terras e assim os antigos escravos se transformaram em servos da gleba, com casas, casamento e alguma roça. Tudo lenta, gradual e seguramente, como C. Prado Júnior explicou na obra citada. Ignacio Rangel teve a capacidade de aplicar esta ideia luminosa a toda a história brasileira.
No Brasil dos anos 80 já estava ocorrendo uma mudança para pior no
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mundo das ideias e dos intelectuais. O racionalismo dos intelectuais dos anos 30 e 40 acima descrito havia dado lugar, pouco a pouco, a um irracionalismo crescente. Assim, por exemplo, C. Prado Júnior insistia no tripé exportação, escravidão e latifúndio, que fazia sucesso nas esquerdas. Este tripé explicaria o Brasil na sua gênese como colônia portuguesa, que era uma colocação didática, mas sem profundidade marxista, pois não colocava os modos de produção no centro da análise, mas que assim mesmo serviu de ponto de partida para Celso
Ignacio Rangel, muito mais rigoroso, analisou o senhor de engenho como dono de escravos e vassalo do rei de Portugal, vendo o Brasil como dualidades sucessivas de modos de produção externos e internos.
Aliás, C. Prado Jr e Celso Furtado, apesar de brilhantes intelectuais, foram excessivamente europeizantes e focados na Europa, sobretudo Celso, e não se
atraso era uma das razões do fantástico crescimento nacional, comparável aos maiores do mundo, como URSS e Japão. No entanto, como Caio foi pioneiro na caracterização das classes dominantes brasileiras, Rangel apontou o pioneirismo de Celso em caracterizar a gênese de um centro econômico dinâmico no Brasil
Na verdade, enquanto C. Prado Jr e C. Furtado foram apenas grandes intelectuais, Ignacio Rangel foi um extraordinário profeta, e como tal detestado pelos anões intelectuais.
Os créditos foram esquecidos
Ignacio Rangel viu o Brasil como sucessivas dualidades complexas. Assim, por exemplo, a Independência deu continuidade à escravidão, mas as terras deixaram de ser do rei de Portugal, assim como rompeu o monopólio comercial português e criou o capital comercial brasileiro exercido por imigrantes europeus, como os Lundgren de Recife ou os Lage do Rio de Janeiro, que passaram a se vincular ao capital industrial inglês. Mudou, portanto, o polo externo, com consequências positivas para a economia nacional, como demostraram as pesquisas dos historiadores da UFF, que não apontaram os devidos créditos. Igualmente a teoria da dependência de FHC tem muito de Rangel, mas os créditos foram esquecidos. Os exercícios desastrosos de demiurgia de C. Furtado no Plano Trienal, apontados por Rangel, foram depois usados por Chico de Oliveira na crítica ao seu padrinho. A. Barros Castro, talvez dopado pelas suas leituras
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sobre a Teoria do Caos, resolveu ironizar Rangel como capaz de ver lógica até no
Kondratieff, até ser lembrado que as revoluções industriais ocorrem de dois em dois Kondratieff, e os Kondratieff intermediários são extensões da Revolução industrial ao setor de transportes, como o trem e o navio a vapor.
As ideias de Rangel
como nosso destino manifesto e C. Prado Jr clamava por uma reforma agrária urgente para retomar o crescimento. Além deles, outros denunciavam o “social-
esquerdista e todos juntos estimulavam direta ou indiretamente a inglória luta armada, que levou muitos jovens inexperientes ao sacrifício, em pleno “milagre
Celso Furtado, na aplicação do referido Plano Trienal, a pretexto de combater a
Jango. Mas como a história se repete como farsa, o malfadado Plano Cruzado, já
estruturalistas da Unicamp e da PUC-RJ, com direito à exibição televisiva das lágrimas de M. Conceição Tavares e com novos resultados trágicos para o Brasil.
Àquela altura Ignacio Rangel, patrono da Revista de Economia Política,
por carta burocrática de Bresserdos anos 80, serviçais inconscientes do imperialismo norte-americano que já
subalternos do mundo todo. Note-se que quando M. H. Simonsen propôs
capacidades ociosas nas indústrias, alavancando exportações, tirando o Brasil
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Interlocutores de Ignacio Rangel
O primeiro e fundamental interlocutor de Ignacio Rangel foi seu pai, formado na Faculdade de Direito do Recife e juiz de Direito em várias comarcas do Maranhão, que se responsabilizou pela sua formação intelectual, começando pelo debate do chamado contraditório jurídico e a retidão moral absoluta, pois nunca se sujeitou ao mandonismo feudal dominante. Seu pai tinha orgulho dos
adolescente Ignacio Rangel a entrar na política pelas portas do quartel militar em São Luís do Maranhão. O segundo grande interlocutor foi o Manifesto Comunista de Marx e Engels, que lhe ofereceu uma visão de mundo racional e de luta. Tendo
Rio de Janeiro, assim como na prisão Gramsci procurou entender a sua derrota, assim como na prisão muitos anos depois Deng Tsiaoping procurou decifrar os erros dogmáticos de Mao, sem desmerecer os seus acertos anteriores.
Seus interlocutores dos anos 50, J. Soares Pereira na assessoria econômica de G. Vargas, J. Ahumada na CEPAL e Guerreiro Ramos no ISEB
ásica da Guerreiro Ramos, ao elogiar a Dualidade lembrou que pensadores como Silvio Romero (História da literatura brasileira) e Euclides da Cunha (Os Sertões) haviam apontado os dois lados do Brasil, um externo e outro interno, mas que apenas Rangel conseguira sistematizar e teorizar as Dualidades.
Ignacio Rangel não era do litoral, mas do sertão, onde o latifúndio feudal nasceu precocemente e onde as qualidades de nobreza moral e de brasilidade sempre foram maiores do que as do litoral, como Euclides da Cunha já havia assinalado. Getúlio, Rangel, Graciliano Ramos, Ariano Suassuna, João
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A dialética da rebeldia desde Rangel até hoje
A rebeldia essencial
pensamento de Ignacio Rangel na luta contra a redução do planejamento a um horizonte de curto prazo contraditório com uma visão estrutural histórica do processo da sociedade periférica do capital. É a diferença entre planejamento como meio de promover transformações sociais ou como simples técnica de governo. A disputa acerca dos eventos do planejamento naquele momento
transcendente de projetar uma visão marxiana do processo da política econômica quando se questionavam ideias de teóricos como Rosa Luxemburg e Tugan Baranovski. A ortodoxia via a questão brasileira como exclusivamente nacional, enquanto os setores progressistas registravam os abalos causados pela intervenção soviética na Hungria, o advento da Revolução Cubana e as lutas pela reforma agrária. A questão social e política do planejamento não poderia ser mais colocada como um problema técnico como pretendiam as Nações Unidas.
momento no Brasil a separação entre a perspectiva do planejamento como meio de transformação social ou como mero exercício orçamentário.
Ignacio Rangel aparece na literatura brasileira de economia como um dissidente da academia ortodoxa, mas como um intelectual criativo, portador de
questionamento da historicidade brasileira. A construção da rebeldia essencial do pensamento de Ignacio Rangel no contexto da disputa pela política econômica brasileira surge da relação entre o reconhecimento das condições de crescimento sustentado e a tendência cíclica do sistema do capital . Essa premissa impõe pensar em termos de longo prazo e rejeitar a perspectiva do modo reformista
6 Refere-se à taxa garantida de crescimento proposta por Roy Harrod como aquela que o sistema pode sustentar por períodos prolongados.
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políticas em curto prazo podem dar conta de problemas de desenvolvimento em ambientes externos controlados pelos interesses de grandes capitais. As
em ciclos tal como proposto por André Marchal.
A incapacidade do marginalismo para conviver com uma economia mundial sujeita a depressão profunda se estendia ao fato de que as economias periféricas operam no contexto de ciclos dependentes. Se essa foi a brecha
interesses do capital. O desenvolvimento aceito será transformação social tolerada pelo sistema sem destruição da lucratividade das empresas. Assim, o que se desenvolveu e consolidou como políticas de desenvolvimento, de Arthur Lewis, Tinbergen e todos eles, são políticas de crescimento com dispositivos de distribuição da renda que não contemplam as condições de complexidade dos sistemas produtivos periféricos. Como se em todos os lugares e momentos as políticas de desenvolvimento pudessem ser igualmente válidas.
que marcou sua posição no debate econômico no Brasil e foi consequência de uma posição teórica incompatível com planejamento em curto prazo que é a de entender que o sistema capitalista gera suas próprias restrições, mas tem que superar seus bloqueios de mercado. Observe-se que aquele foi o momento em que os setores conservadores norte-americanos e latino-americanos montavam as bases da reação contra a CEPAL em seminário em Lago Como e quando o relativa à interpretação do funcionamento do sistema, se a prosperidade geral
pode responder a essa pergunta sem entrar na engrenagem do sistema produtivo.
Ao reconhecer que na relação global capital/produto há um capítulo especial da relação entre capital social básico e capital produtivo direto haverá um ajuste entre os períodos de maturação da infraestrutura e dos investimentos na indústria. Os sistemas de infraestrutura são de lenta maturação e longa duração operacional. Essa leitura da organicidade do sistema indica como a
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dos novos investimentos. É um tempo médio de ajustes entre essas duas escalas de investimentos, que faz a relação entre os planos estatais e privados de investimentos e o anonimato do mercado.
Essa ruptura se funda em um aspecto fundamental da teoria do capital em Marx que é a constatação da tendência à instabilidade do sistema produtivo que se materializa por meio de movimentos cíclicos. O ciclo em Marx é organicamente necessário e não é incidental como na teoria marginalista. Os ciclos de duração
respondem por deslocamentos na base da composição do capital na relação entre a composição técnica e a orgânica do capital. É deles que Rangel se ocupa.
segmentos de capital em diferentes condições de tecnologia, envolvendo as relações entre setores e regiões, alterando as condições de contratação de trabalhadores. No entanto, a análise industrial continuava com o viés de confundir
Marshall7
logicamente será parte da teoria do ciclo, como aliás está claro em Marx.
Em consequência dessas desigualdades as transformações no sistema mundial do capital derivam diferentes condições de instabilidade no centro e nas periferias do sistema, determinando composições de restrições externas e internas para cada economia nacional. As condições nacionais de desenvolvimento estão internacionalmente situadas no ambiente cíclico da economia mundial.
As visitas de Rangel à Bahia no momento em que se elaborava o Plano
Almeida e em que se realizavam pesquisas no Instituto de Economia e Finanças da Bahia, lugares que militei, deram lugar a uma amizade e intercâmbio de
uma oportunidade para voltar à busca do essencial e expor as tergiversações que são ameaças renovadas de substituir o processo pelo fenômeno, o essencial pelo circunstancial e o necessário pelo oportunismo. Os retornos da velha direita atualizada com a mesma alegação de privatizar passando à esfera privada a riqueza acumulada pelo Estado e enxugar a máquina pública mostram a atualidade daquela rebeldia fundante de identidade nacional.
7 Alfred Marshall, Industry and trade, Londres, Macmillan, 1926.
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O homem primordial
de constituir uma demarcação de história, um modo brasileiro de olhar o conservadorismo central e a reação latino-americana. A representatividade de
elas deveriam ser vistas através da lente do marxismo de Marx. O reducionismo do stalinismo8 seria contraditório com a esquerda, porque a tornaria vulnerável à racionalidade instrumental do capital. A crítica da análise de equilíbrio walrasiano não invalida a análise de relações interindustriais, mas a reduz a sua expressão de curto prazo e a seu inevitável positivismo. Nesse sentido a deshistorização
Raul Prebisch, ambos procurando soluções em médio e curto prazo para reverter tendências históricas inerentes à divisão internacional do trabalho e às relações de classe.
A necessidade de construir uma visão brasileira do processo da economia se estenderia à da visão do processo da teoria. Em seus primeiros textos Rangel se colocou na linha de frente da crítica da teoria do desenvolvimento patrocinada pelas Nações Unidas. Não se trata necessariamente de escrever uma teoria, mas de tratar teoricamente os problemas da realidade da desigualdade patrocinada pelo imperialismo. Tal atitude teria sérias implicações sobre trabalhar em economia no Brasil cuja academia, além de conservadora reduzia o Brasil ao eixo Rio-São Paulo. A ironia do ISEB e da assessoria de Vargas era justamente de serem redutos de nordestinos pouco dispostos a renderem vassalagem à linhagem de Gudin, Bulhões e companhia. Para o público brasileiro em geral esse conservadorismo estaria respaldado pela pureza ética de seus líderes, mas na realidade já era um sistema de empresas associadas com interesses internacionais. Os sacrossantos interesses dos exportadores, aliados à elite da
capital que já pouco tinha em comum com a velha grande propriedade rural. Antes que industrialização, havia um realinhamento das alianças de grandes capitais formados no país com capitais internacionais, aproveitando contratos de infraestrutura e de exportação de minerais.
8 Ver a teoria do planejamento escrita por Strumilin porta-voz da posição stalinista em economia, tal como aparece em seu artigo.
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De fato, o grande capital se atualizava muito mais depressa que o Estado, por não dizer a estrutura política. Com a pouca clareza com que se via o papel do Estado, tratava-se mais de pioneirismo que de estatização, mas no BNDE já
que assumiu a presidência do órgão com uma política contraria à do governo
de alinhamento automático com os Estados Unidos de Castelo Branco. Rangel tornava-se parte da contracorrente nacionalista do BNDE.
entretanto, era apenas a superfície de uma disputa mais profunda pelo modo de desenvolvimento do país que tinha desdobramentos setoriais e regionais e principalmente implicava no contraste entre uma visão independentista em longo prazo e uma outra de uma aliança subordinada com os Estados Unidos. Rangel tornou-se uma referência na disputa que se seguiu, em que a burocracia técnica
da CEPAL, onde Rangel foi o primeiro bolsista brasileiro, viria pelo aspecto de técnica de planejamento e de internacionalização do debate do desenvolvimento. Ficavam em aberto o recuo da polêmica ideológica e a perda da dimensão histórica do processo. Seriam as questões da consciência social do operariado e
Hungria não queria se tornar capitalista e aquela invasão determinou a ruptura de muitos intelectuais que inclusive viram a importância da autonomia da
social brasileira, muito além do celebrado debate sobre desenvolvimento. Mas esse debate se dividia entre um ramo acadêmico, disperso entre algumas universidades onde assumiu o fundo ideológico, e um ramo de setor público em que foi principalmente técnico. Somente a direita assumia sua orientação liberal no setor público. Homem do setor público, Rangel foi o único na época que atravessou a ponte e participou do debate do campo universitário ao qual levou a visão crítica do campo governamental. No governo em que prevaleceram as
governamental a ideologia do crescimento suplantou a do desenvolvimento retirando de cena as questões de distribuição da renda e mobilidade social.
desenvolvimento depois ou desenvolvimento primeiro e representada pelo
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estava reduzido à relação capital /produto. Agora é preciso reconhecer que a
com a linha de argumentação de Paul Baran, apontava à própria lógica do capital de aproveitar vantagens de custos de capital no manejo de comparações entre vantagens de grau de monopólio e de custos de renovação de equipamentos. Era o primeiro estudo crítico da burguesia industrial brasileira, que anteciparia o papel da concentração de capital na metamorfose política do capital que se
Os fundamentos da controvérsia ideológica estavam lançados, mas tornou-se claro desde então que não se trata de capital nacional e internacional, já que o capital é ou tende a ser internacional, senão da relação Estado-sociedade civil em que o Estado é representativo de uma relação de classes. Além das diferenças entre o grande e o pequeno capital há uma outra entre o capital moderno e o tradicional em que os modernos incorporam vantagens indiretas do sistema de comercialização. A noção de ciclo dependente compreende essas
A sequência desse argumento leva hoje a ver que a vitória do grande capital se concretiza na construção do mercado norte-americano, a partir da qual se expande sobre outros espaços nacionais, adequando-se em cada caso à composição de fatores do sistema produtivo em suas articulações internacionais. Diferentes situações de países mineiros e agro-exportadores. No Brasil desenvolveu-se um sistema de grande capital mercantil, basicamente montada sobre as grandes propriedades rurais, mas também com associações com a mineração. A dualidade detectada por Rangel está no nível operacional do sistema masé o fator de unidade que alavanca o controle do Estado.
Fomos, portanto, colocados diante da tarefa de voltar aos fundamentos
contradições que determinam o movimento social. Não se trata de responder à agenda da direita, mas de estabelecer a da esquerda que precisa ser representativa do processo social brasileiro sem compromisso algum com a
materialismo histórico para uma leitura independente da história brasileira que
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O panorama doutrinário
A questão doutrinária estava posta pelo fato de que a corrente desenvolvimentista, basicamente constituída da CEPAL e dos primeiros pós-
social da acumulação. Por isso, poderia cogitar de argumentos tais como de
internacionais. Somente ao voltar à relação fundamental entre formação de capital e acumulação seria possível revelar a centralidade da relação externa na constituição do grande capital.
O debate da época foi apresentado como apenas econômico e entre
técnicos da formação de capital. A percepção do panorama doutrinário nesse contexto precisa ser esclarecido porque do elenco dos envolvidos no processo da política econômica do Brasil na época cabe considerar que Rangel foi o estudioso que reuniu mais condições para enfrentar teoricamente os líderes do conservadorismo. Por isso é de interesse comentar suas tentativas de resgatar as contribuições de Joan Robinson sobre a acumulação de capital e de Michal Kalecki sobre graus de monopólio, em todo caso encontrar neles possíveis linhas de continuidade com Rosa Luxemburg, a quem considerava a principal voz do marxismo de maior proximidade teórica com os problemas do Brasil. É no Livro II de que se encontra a doutrina das diferenças de velocidade
onde as formas de imobilização correspondem a formalizações técnicas do grau de desenvolvimento das forças produtivas. A condição de subdesenvolvimento enuncia uma dependência externa na formação de capital e uma desigualdade interna no controle da acumulação, que envolve aspectos econômicos e políticos. Assim como não há uma teoria pura do desenvolvimento tampouco há uma teoria pura da política econômica. A política econômica enfrenta problemas concretos como da reforma agrária e da industrialização.
O problema histórico da industrialização é que ela acontece em contextos
modernas. Isso faz com que a contribuição de Joan Robinson não acompanhe a de Luxemburg no relativo às condições de velocidade na rotação do capital, mesmo quando as transformações de dinheiro a mercadoria pareçam dadas.
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superação do subdesenvolvimento não impedia que Rangel, tal como a esquerda cepalina não impediu seu rigor teórico marxista. Trata-se da auto-acumulação do capital e não de uma acumulação genérica. No entanto e por todas essas controvérsias seria igualmente necessário um esclarecimento sobre o que poderia ser a noção de método, portanto, a concepção básica de dialética.
O pensar dialético essencial
Certas dissenções no campo marxista e certo distanciamento da realidade social concreta, que leva a substituir a concretude dos processos da periferia por referencias de países centrais tornaram necessário rever o núcleo
limitada a alguns grupos e uma tradição clássica com algumas incursões no
se apresentava como progressista10. Os trabalhos de Rangel sobre a questão agrária e sobre a capacidade ociosa deram uma contribuição especial para substituir a análise agrícola convencional pela agrária e para colocar a teoria do capital de volta ao centro do debate.
Diante das dissenções e da necessidade de superar a ideologia pelo
a dialética. A dialética é a linguagem da esquerda. Esse seria o caminho de uma revisão da dialética como modo próprio do desenvolvimento do ser social. O sujeito do desenvolvimento econômico é o da vida social pelo que o esforço teórico pela ontologia do ser social termina por encontrar o homem comum.
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quando da queda de Salvador Allende.
10 Nota-se que os primeiros pós-keynesianos como Joan Robinson e Nicholas Kaldor, que representaram posições criticas e reformistas, podem ser incluídos como progressistas. Outros como Kenneth Kurihara, apareceram com um reformismo operacional não critico. Outros ainda, Alvin Hansen e Hyman Minsk, representaram o lado monetarista de Keynes, conservaores como o próprio Keynes. Alguns atuais neo--keynesianos representam posições reformistas discretas que se diferenciam dos neoclássicos empeder-nidos, aparecendo como progressistas comparados com o conservadorismo pesado da “austeridade” mas
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equilíbrio dinâmico que surge da progressão orgânica de contradições que respondem pelas transformações do sistema sócio-produtivo11. Distinguem-se contradições aparentes e essenciais, que são as que ligam o sistema econômico e o politico. A essência da esquerda é caminhar sobre a progressão orgânica
pelas forças sociais organizadas. O essencial é ousar discutir em nome de uma representatividade histórica fundamental. Como as contradições historicamente surgem de processos desiguais do capitalismo e não há como pensar em dialética do mundo social que não seja sobre as progressões das forças envolvidas. O mundo dominado ou pertencente a condições anteriores de organização é absorvido de modo subordinado pelo processo de poder com suas irradiações econômicas, políticas e culturais. A diferença entre a dialética genuinamente
Certas novas leituras do esforço de reconstruir os fundamentos ontológicos do ser social, que revelam aproximações subterrâneas das correntes que repudiaram o racionalismo dirigido do grande capital, convergindo para uma rebeldia essencial à inércia dos acordos de composição das diversas versões centristas12.
Frente a uma aceleração da substituição de tecnologia. O essencial da perspectiva da esquerda é focalizar em mudanças socialmente positivas o que a obriga a registrar a pluralidade do mundo social em que trata. Temas como pequena
pessoas. O mundo da pequena produção rural no Maranhão não se parece com o do oeste do Paraná. Há, portanto, um problema geral de representatividade
representatividade de cem sobre mil. Em universos amplos e complexos como o brasileiro a questão geral de representatividade atinge a própria reprodução do capital e a do trabalho. O movimento histórico do capital é a síntese de uma pluralidade de movimentos de diversos capitais historicamente formados que não se resumem nos dos capitais na ponta do sistema. Contemporâneo não coetâneo, dizia Rangel. O comando dos diversos sistemas nordestinos não
11 Por trás desse esclarecimento há todo um debate sobre a diferenciação entre a dialética moderna e a antiga, em que esta se distingue por compreender a noção de progresso, por extensão a de irreversibi-lidade.
12 É o Brasil das intermináveis composições partidárias girando em torno do poder de veto dos partidos centristas, produzindo acordos improváveis mais representativos dos interesses na sobrevivência dos próprios partidos.
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está em São Paulo, mas no conjunto das articulações internacionais próprias do processo nordestino. O que há de especial é o descobrimento marxista da essência contraditória do processo do capital no contexto nacional. Temos pela frente a imensa tarefa de descobrir a pluralidade própria de nosso processo social.
se um obstáculo para uma visão marxista historicamente centrada no Brasil. A superação do ranço do absolutismo lógico é um passo necessário para reconstruir a análise estrutural sobre suas reais bases históricas. Somente a partir de uma refundação do marxismo em Marx se encontraria o real histórico concreto do processo do capital na América Latina. No essencial, essa rebeldia é um movimento de auto-regeneração do marxismo na linha do proposto por Karl
primeiro viu desenvolvimento e subdesenvolvimento como dois processos concomitantes e opostos no contexto da globalização da captura de recursos naturais. A dinâmica econômica surgiu observando movimentos positivos do sistema. O registro de movimentos negativos é a ruptura com a ortodoxia, que revela o papel do imperialismo.
A questão central é o descompasso entre acumulação de capital e expansão de mercado. Haverá um mínimo de acumulação necessário para a reprodução do sistema, uma acumulação pretendida pelo capital e uma possível nas condições orgânicas do sistema produtivo. Por sua vez, a expansão do mercado dependerá da renda total gerada e de sua distribuição. A expansão do mercado envolve mudanças na composição de produtos e nos sistemas de comercialização. Refere-se a dados concretos de oferta e procura e nada tem a ver com propensões nem expectativas. Torna-se necessário expurgar o subjetivismo da teoria do desenvolvimento que trata com situações sociais concretas. Não se trata de talentos inovadores de empresários, mas de demanda concreta de capital das empresas.
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Com a perspectiva das contradições do capital globalizado torna-se mais
a organicidade da relação entre indústria e agricultura e a essencialidade do sistema, com a necessidade de transformar simultaneamente os setores de produtores de matérias primas e de manufaturados. No essencial, fortalecer a capacidade de intervir do Estado. Necessário lembrar que os resultados alcançados pela América Latina eram modestos e incertos e que o obstáculo
de importação, que não necessariamente era causada pela substituição de importações13. Na verdade a política nacional de desenvolvimento que tinha começado com um grande esforço em infraestrutura passava a um imediatismo de produtos manufaturados. O quadro externo certamente não era favorável. O controle politico do Brasil era parte da estratégia norte-americana da Guerra Fria14, mas isso não se traduziu em vantagem econômica alguma. Na prática a proposta reformista de política de desenvolvimento patrocinada pelas Nações
15.
A perda de espaço nas condições estruturais de formação de capital
capacidade para gerar os recursos para reproduzir e ampliar os sistemas sociais de utilidade pública. Foi o caso notório dos sistemas de habitação popular que se tornaram inviáveis, mas cuja visão de casas individuais continuou até hoje. Em suma, uma pressão crescente para contratar empréstimos externos que não se consegue pagar. Começava o longo e tortuoso caminho do endividamento que marcaria as décadas seguintes.
avaliar suas reais condições de governabilidade econômica e política, claramente, quando teria que inovar para sobreviver. Em vez disso houve uma proliferação de
13 -riais para a reprodução do sistema produtivo cuja atualização dependia de importação de tecnologia. A primeira restrição desse processo era o custo das moedas de onde provinham as importações.
14 Hoje se publica que Lyndon Johnson cogitou desembarcar fuzileiros em São Paulo e fazer ataques aéreos a partir da Argentina (Le monde diplomatique) em apoio ao golpe de 64. Outras notícias foram veiculadas pelo Washington Post em 1967 que houve um plano de aportar porta-aviões em Vitória para isolar o Nordeste.
15 Título de uma ampla pesquisa realizada por aquele órgão em 1970.
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social, polarizando um bloco de interesses bancários e industriais favoráveis à sustentação da taxa de lucros pela compressão dos salários e a progressão dos diversos movimentos de trabalhadores construindo um poder sindical.
Ao tratar desse período da história econômica não se podem ignorar
Fracassaram iniciativas de integração do Pacto Andino e a Aliança para o Progresso marcou uma cooperação controlada pela OEA. A sequência de turbulências começada com o Bogotazo em 48 e de golpes de Estado começada na Guatemala em 54 desenhava um continente instável em que os acordos de cooperação fracassavam seguidamente. A concentração do comércio internacional com os Estados Unidos era cada vez maior e as possibilidades de contornar a pressão
O modelo de desenvolvimento reformista defendido pela CEPAL foi bloqueado na Argentina pelo golpe que derrubou Frondizi e as possíveis opções representadas pelo pacto da democracia cristã também representavam outro tipo de interferência externa europeia. Esse esgotamento das condições concretas para um desenvolvimento reformista sob a pressão ascendente dos grandes interesses é o dado fundamental de um problema de política econômica que estava além das condições operacionais do governo. Na relação entre a composição política, basicamente formada de forças tradicionais, e o aparelho governamental encontra-se uma clivagem entre as concepções políticas do
adotasse um modo pessoal de governar, passando por cima das instituições, é a prova dessa falha.
Em tal contexto a experiência do ISEB é extraordinária porque representa
com o lado central do país, isto é, com o planejamento estadual em que a Bahia e Pernambuco foram os pioneiros. A experiência baiana foi a que provocou o Governo Federal para a criação da SUDENE, mas essa foi uma iniciativa que repetiu o pecado original de ignorar todas as experiências anteriores e começar do zero na concepção dos problemas da região.
O esgotamento do modo reformista de desenvolvimento foi um movimento de grande complexidade para as opções de desenvolvimento que
cujas motivações mais profundas não foram visíveis para seus próprios autores. A composição de interesses, genuínos e externamente controladas, caiu na
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Acumulação periférica e ciclo
O argumento central aqui em jogo é que o modo reformista de desenvolvimento está regulado pelo ciclo dependente. O controle de parte da acumulação pelo Estado reformista seria usado para desbloquear setores estratégicos para o funcionamento do capital moderno, no que se denominou de remover pontos de estrangulamento. Essas condições históricas concretas levam a rever as críticas atuais da teoria da regulação no quadro das alterações do modo operacional do imperialismo. Sobre esse ponto cabe ver o trabalho de Cesar Altamira sobre as condições atuais da esquerda na esfera ocidental.
da ideologia do desenvolvimento, isto é, do reformismo burguês. Dada a fragilidade do governo, o plano constituía a primeira capitulação da corrente do desenvolvimento aos postulados da teoria burguesa do capital, para a qual o mais importante era preservar o valor acumulado. Como se trata de teorias formadas com os pressupostos das condições de formação de capital em curto prazo, desse modo desconsiderando a condição cíclica essencial da acumulação de capital em geral e nas periferias.
Com essa manobra se excluía o papel do ciclo dependente da acumulação periférica como se ela fosse irrelevante para o sistema em seu conjunto. Não poderia ser de outro modo já que os marginalistas em geral, neoclássicos e
em 2008, as economias periféricas avançadas – Brasil, Turquia, África do Sul – tiveram desempenho melhor que as economias europeias, inclusive que a Alemanha.
Essa opção pelo conservadorismo teria consequências na concentração do sistema de crédito e nas opções de grandes projetos descentralizadores. Os planos regionais tornam-se contraditórios com uma proposta federal centralizadora. É uma tensão entre teoria econômica e práticas de política. Entre as políticas derivadas de uma perspectiva neoclássica com as do desenvolvimento
conduzida pelas elites em que a sucessão de ciclos acontece em um e único
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processo de industrialização em diferentes condições de desenvolvimento das previsões de tempo. Longe de ser uma crítica apenas ao aspecto político, divergir do plano era confrontar o modelo político da economia. Rangel se opôs ao Plano Trienal não só por considerar que essa era uma capitulação aos postulados da teoria burguesa do capital, mas porque esse plano implicava em desconsiderar o caráter cíclico do sistema capitalista de produção e o papel do ciclo dependente na dinâmica da industrialização. A pretensão de combinar os preceitos do monetarismo com o chamado estruturalismo implicaria em
absorvendo discordâncias no relativo ao papel do Estado. A crítica se estende mediante uma concepção do ciclo pela qual os ciclos sucessivos acontecem em diferentes condições de desenvolvimento do sistema produtivo. Longe de ser uma crítica apenas ao aspecto político, em si rejeitada, de uma cessão às pressões conservadoras crescentes no governo JK, era uma divergência acerca da viabilidade do modelo reformista de desenvolvimento, que ignorava os efeitos cíclicos do imperialismo.
Esse é o foco central da divergência entre a perspectiva otimista da
que contempla as condições do processo do capital. A industrialização periférica opera sob condições de controle externo de tecnologia e de propagação de ciclos
durações que simplesmente coincidem na formação do ciclo dependente. A economia periférica absorve os ciclos da economia central que reproduz de modo desigual e, à medida que amadurece, passa a ciclos dependentes que são aqueles gerados pelas condições de formação de capital externamente condicionada.
Assim, mais que simples divergência a oposição ao Plano Trienal foi uma tomada de posição na análise do capitalismo dependente. A tentativa
opostos no relativo a heterogeneidade do capital e ao reconhecimento de uma acumulação dependente. A crítica de Rangel levanta três argumentos a serem considerados. Primeiro, que o sistema internacionalizado do capital compreende que movimentos cíclicos em longa duração gerados no centro em seus grandes ajustes tecnológicos se difundem às periferias de modo desigual. Segundo, que as periferias mais complexas ou avançadas desenvolvem mecanismos de ciclo dependente que determinam condições próprias de longo prazo. Terceiro, que
restritas a ajustes limitados dos capitais, absorvendo os efeitos em longo prazo
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como se eles não existissem. Nesse contexto, políticas em curto prazo são alienadas em relação com as verdadeiras condições estruturais da economia periférica.
Logicamente, o caráter cíclico da economia do capital não é parte da
Tavares sobre Acumulação e crise que trata da condição cíclica da industrialização no Brasil, com uma contribuição para uma revisão marxista dos processos industriais periféricos, mas não estendeu a crítica à política de desenvolvimento em geral em que a indústria continuou na ciranda de inovação, tecnologia, aprendizagem, como se não se tratasse de processos do capital. No modo de acumulação do sistema do capital em geral as décadas de 70 e 80 foram de repetidos movimentos de instabilidade nas periferias e em 2008 reconheceu-se
realizar políticas de reanimação, supostamente breves mas que se prolongam sob eufemismos tais como austeridade.
No movimento em espiral da acumulação de capital a economia mundial passou desde então por um processo de centralização para o qual contribuíram o fortalecimento do sistema central de poder e o controle do mercado mundial por um número restrito de empresas. É um movimento que fortalece o poder de intervenção das potências hegemônicas, mas que revela a dependência de seu controle sobre as nações periféricas. Como é um jogo de poder que se repete, incorre em contradições crescentes, com uma inegável perda de capacidade da
a ascensão de novos protagonistas. A crise engendrada no início do novo século e revelada em 2008 mostrou a perda de competitividade das empresas norte-americanas até agora sustentadas pela preferência dos demais investidores . Tal dependência norte-americana do mercado externo, junto com o bloqueio da economia europeia, indicam que a instabilidade do centro desenha os contornos do ciclo de longo prazo. O império luta uma batalha defensiva pela qual é constrangido a alianças contraditórias com seus interesses e incorre em comportamentos que fragilizam suas alianças principais.
16 Quando capitais árabes compram o Waldorf Astoria e chineses compram o edifício do Citycorp em Manhattan e brasileiros aquecem o mercado imobiliário na Florida fazem parte desse movimento.
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No cenário de hoje há uma agressividade do poder ocidental que mostra sua luta para preservar seu poder. Há avanços inexoráveis da Ásia liderado pela China e espaços que se ampliam do poder recomposto da Rússia. Contra todas indicações dessa economia neoclássica do curto prazo que se tornou a linguagem do poder norte-americano, torna-se inevitável a volta à análise em longo prazo e à teoria dos ciclos.
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O voo da águia: reminiscências sobre o pensamento crítico de Ignacio Rangel
Introdução
Na mitologia grega, a águia é o símbolo de Zeus, o mais poderoso dos deuses. Seu principal atributo, além de voar mais alto do que as outras espécies, é a sua extraordinária capacidade visual, oito vezes mais precisa do que o olho humano. Caso Ignacio Rangel fosse uma pássaro seria uma águia. Seu pensamento costumava alcançar, num único voo, a macro e a microeconomia. Também enxergava longe: via a economia como um processo ao mesmo tempo histórico, cíclico e dialético.
Mas dentre os traços da personalidade marcante de Ignacio Rangel, o
como um homem de esquerda, mas, em determinado momento, foi rejeitado pela esquerda como sendo de direita. Isso é especialmente verdadeiro quando, nos
havia condições objetivas para a realização de uma reforma agrária no Brasil, mas que isso, em absoluto, inviabilizaria a retomada do crescimento econômico. Mesmo após o encerramento do ciclo de crescimento dos anos 70, quando passou a defender a reforma agrária, continuou a ser alvo da incompreensão da esquerda17.
17 Numa crônica publicada no jornal do Brasil, em 18/09/1979, reclamava da assessoria econômica de Miguel Arraes que continuava criticando-o por ser contra a reforma agrária quando, há muito, havia mu-dado de opinião. Escreveu ele: “Em matéria de assessoramento econômico, nossa esquerda é, em geral, uma catástrofe [...]. Ora, Miguel Arraes não constitui exceção. Sua assessoria não aprendeu nada, nem esqueceu nada, nestes três lustros [...] Só faltaria que, agora, em 1979, quando eu estou sustentando que isso (tese contrária a reforma agrária como pré-condição para o desenvolvimento) não é mais verdade, eles levantem a bandeira do meu velho livro (refere-se ao livro A Questão Agrária Brasileira), para
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Sua visão sobre desenvolvimento ia além das ideologias de esquerda e
fundamental para o desenvolvimento. Considerando a condição do Brasil como
primeiro governo militar a correção monetária como estratégia alternativa18.
face às distorções causadas pela correção monetária, sugeriu a criação de uma nova lei de concessão de serviços públicos. Através dela, o setor privado passaria a encarregar-se, de forma crescente, pelos investimentos públicos de infraestrutura. Essa sugestão não deixa de ser surpreendente, considerando que Rangel teve um papel importante na criação de grandes empresas estatais brasileiras, como a Petrobrás e a Eletrobrás. Nem em sonhos Rangel poderia
estatais iria tão longe.
o único curso formal de economia que Rangel frequentou foi, nos anos 50, na Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL), templo do estruturalismo latino-americano, no Chile. Nem por isso, Rangel poupou o
concentrada de intermediação – causa principal da alta do preço dos alimentos – com inelasticidade da oferta agrícola. Igualmente, não poupava os “nossos
seja, é o aumento de preços que leva as autoridades monetárias a aumentarem a quantidade de moeda e não o contrário.
de economistas de esquerda ou de direita, Rangel fosse, com raras exceções, solenemente ignorado por ambos os lados. Em certo momento, deixou transparecer alguma mágoa em relação a isso . O que poucos perceberam é
18 Conforme Bresser Pereira (Folha de São Paulo, 06/03/1994).
19
sou apenas um cidadão, mas também um economista. Um economista de esquerda (grifo do autor) [...] que continuou, infatigavelmente, a trabalhar seus esquemas, contra o vento e a maré, mas que tem a consciência de estar vencendo. Que viu chegar o momento de ver suas ideias – aquelas pelas quais se bateu, solitariamente, por tantos anos, expondo-se à chacota dos doutores – serem postas em circulação,
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que Rangel tinha maior autonomia de voo. Ambicionava construir uma teoria dos
das economias do centro capitalista desenvolvido. Para chegar até ela, baseou-se nas teorias dos ciclos longos (50 anos) do russo N. Kondratieff e dos ciclos médios (10 anos) do francês C. Juglar. Do ponto de vista da teoria econômica, foi
assim, a tese da dualidade da economia brasileira.
A teoria dos ciclos e a tese da dualidade
organizador do pensamento de Ignacio Rangel. Ela resulta de uma adaptação
porém, ao invés de uma sucessão de modos de produção, subdividiu o conceito
Por seu turno, cada uma dessas relações teria também um lado interno e outro
superior – quando as forças produtivas da sociedade crescem, entrando em
porém apenas um dos seus lados muda, permanecendo o outro com a mesma 20.
Posteriormente, Rangel incorporou o conceito de ciclo longo à tese da dualidade. Nesse sentido, resgatou a teoria dos ciclos longos do economista russo Nikolai Kondratieff21, desenvolvida por volta dos anos 20 do século passado. Os ciclos de Kondratieff tem duração aproximada de meio século,
Rangel se referia, em artigo-homenagem na semana de seu falecimento, na Folha de São Paulo, Bresser
criticavam Rangel pela imprecisão de seus conceitos econômicos” (1994, B2).
20 Rangel (1981:12).
21 Segundo Rangel (1982:17), “Kondratieff tornou-se um profeta maldito dos dois lados da Cortina de Ferro”. Na ex-União Soviética, foi destituído de seus cargos, preso e deportado para a Sibéria. No Ocidente, se não fosse Schumpeter que usou o seu nome para denominar os ciclos longos, teria sido um ilustre desconhecido. Rangel atribui esse descaso ao fato de que a sua teoria era desfavorável tanto ao capitalismo, por prever que, de tempos em tempos, a prosperidade acabaria (entraria na fase “b”); quanto ao socialismo, por admitir que, após cada crise, o capitalismo não se enfraqueceria – como previra Lênin – mas se fortaleceria (entraria novamente na fase “a”).
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mundial da seguinte forma: na fase ascendente, é favorecido pelo aumento de suas exportações; na fase descendente (crise), devido à escassez de divisas,
22.
O que diferencia o caso brasileiro das demais formações históricas clássicas, segundo Ignacio Rangel, é que existe uma interação entre o desenvolvimento das forças produtivas e das relações de produção internas e externas e, por causa da sua dependência em relação às economias centrais, estas últimas são determinantes em última instância do desenvolvimento das primeiras. Para explicar o desenvolvimento econômico, Rangel divide a economia brasileira em três setores: o primeiro, e mais atrasado, formado pela agricultura feudal ou pré-capitalista (ou de subsistência); o segundo, pela economia de mercado capitalista (todas as demais atividades) e, o terceiro, pelo comércio exterior. A transformação da economia seria sempre resultado da ação que o segundo setor (o capitalista) exerce sobre o primeiro, a partir de estímulos oriundos do terceiro setor.
A contrapartida política da tese da dualidade estaria na base da formação do Estado brasileiro. A mudança de um modo de produção para outro
classes dirigentes, uma representando o segmento interno e outra o segmento externo. A transição, de uma dualidade para outra, se faz por cooptação, isto é, “pela exclusão, pelo próprio grupo dirigente, dos elementos mais arcaicos, e sua
23. A história das dualidades brasileiras, segundo a cronologia de Ignacio Rangel, é mostrada nos diagramas a seguir24.
22 Ver, a esse respeito, o texto “O Brasil na fase “b” do 4º Kondratieff” incluído na coletânea Ciclo, Tecnologia e Crescimento
23 Rangel (1962) Apud
24 A análise que segue, assim como a elaboração dos diagramas está baseada no artigo de Rangel “História da Dualidade Brasileira”, publicado na Revista de Economia Política (vol1, n.4, out-dez/1981).
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A primeira dualidade brasileira, assim como as que vieram depois, formou-
substituição do capital mercantil português pelo nascente capitalismo mercantil brasileiro. Surgia nesse momento a classe dos comerciantes (principalmente exportadores-importadores), que seria uma das classes dirigentes do Estado no papel de sócio menor. Esses comerciantes, predominantemente estrangeiros, ainda estavam politicamente despreparados para o exercício do poder, mas eram
centro dinâmico impulsionava todo o sistema de acordo com os seus interesses.
No polo interno, a sociedade estruturava-se em torno da fazenda de escravos. Emergia dela o sócio maior da primeira dualidade, ou seja, a classe dos barões senhores de escravos. Dois acontecimentos – a independência (1822) e a abdicação de Dom Pedro I (1831) – são marcos históricos das mudanças efetivadas. No lado externo, havia toda uma pressão, sobretudo da Inglaterra, para que o escravismo fosse substituído pelo latifúndio feudal. No lado interno, o comércio de escravos abastecia regularmente não só a lavoura como também
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de cativos quanto à disponibilidade de terras. Ambas as condições passaram a
terras devolutas passassem a pertencer aos fazendeiros. Abria-se, portanto, a possibilidade de mudança de dualidade.
Kondratieff, datada do início dos anos 1870. Nela, o escravo passa a exercer
em que o servo está interessado no resultado do seu trabalho, passa a ter uma produtividade muito maior do que a do escravo. A fazenda tende a tornar-se internamente feudal e externamente uma empresa comercial. Paralelamente,
elemento comum nos dois polos da dualidade: o capitalismo mercantil.
A classe dos comerciantes, nascida nos primórdios do século XIX – em unidade com a burguesia industrial que fazia parte do lado externo do polo externo
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negócios do Estado. Havendo a segunda dualidade nascida na fase recessiva do ciclo longo, esta deveria promover alguma forma de substituição de importações. Caberia ao capital mercantil promovê-la, basicamente incentivando a industrialização interna através de processos artesanais e manufatureiros. Costuma-se datar a última década desse século como a do nascimento
homologação das mudanças ocorridas na segunda dualidade.
no Brasil cresceria em progressão geométrica25
seria inaugurada justamente numa ocasião em que a produção de café se
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encontrava no auge e que a demanda externa tendia a se retrair . A principal mudança foi a passagem do capital industrial para o lado interno do polo externo da dualidade em substituição ao capital mercantil. Sua exclusão do lado externo do polo externo, por sua vez, possibilitaria que outra formação (superior, porque o capitalismo hegemônico está sempre mais avançado) ocupasse o seu espaço,
27.
Embora como sócio menor da terceira dualidade, a burguesia industrial surgida como dissidência da classe dos comerciantes teria papel fundamental para alavancar o processo de substituição de importações. Como estudado por vários autores28, o esgotamento das reservas cambiais e a escassez de divisas criaram, automaticamente, uma reserva de mercado para a produção nacional
a Grande Depressão, o Brasil dispunha de um mercado interno relativamente amplo e uma estrutura industrial que, embora incipiente, possuía uma relativa
não duráveis ou simples para bens duráveis ou complexos. Mais adiante, no após-
importações, com o apoio decisivo de recursos do Estado, alcançaria os bens de capital.
O processo de substituição de importações não só não é interrompido na terceira dualidade como, a partir dela, a economia brasileira passaria a produzir o seu próprio ciclo endógeno . Não se tratava do ciclo longo, causado pela gestação e propagação de novas tecnologias, que é, por sua própria natureza, prerrogativa dos países industrializados integrados ao centro dinâmico. Tais ciclos
26
1929 tal crescimento foi quase cem por cento [...] Enquanto aumenta dessa forma a produção, mantêm--se praticamente estabilizadas as exportações. Em 1927-29 as exportações apenas conseguiam absorver duas terças partes da quantidade produzida”. Ib. p. 181
27
ou seja, surgido da união do capital industrial com o capital bancário, com a dominância do primeiro sobre o segundo. Não é como ocorre hoje em dia, onde os papéis se encontram invertidos.
28
Cardoso de Mello (1982), entre outros.
29 “Outra singularidade da terceira dualidade está no fato de que, embora havendo começado nas con-dições da fase recessiva do ciclo longo, a industrialização substitutiva de importações [...] não se inter-rompeu com a passagem ascendente do 4º Kondratieff. O dinamismo do processo de industrialização, engendrando demandas de importações sempre novas, fez com que o impulso se mantivesse” (RAN-
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seriam inerentes à construção do capitalismo industrial e seriam semelhantes aos chamados ciclos médios ou ciclos de Juglar, com duração aproximada de uma década. Após uma fase ascendente, a economia entra em crise, a qual
estimulando novos investimentos em segmentos econômicos não modernizados.
sistema econômico, o qual entra novamente numa fase ascendente.
se dá através de um processo que Rangel chamou de “dialética da capacidade 30. Após certo tempo, as atividades que receberam investimentos
geram capacidade ociosa enquanto outras atividades persistem como pontos
sistema econômico – um carregado de ociosidade e outro de antiociosidade – engendrará tensões sociopolíticas que, por sua vez, promoverão novas mudanças institucionais que irão desencadear novos investimentos, os quais deslocarão a economia novamente para uma fase ascendente. A teoria do ciclo endógeno de Rangel procurou demonstrar que, ao contrário do que muitos supunham, o modelo de substituição de importações não tinha se esgotado.
30 -ciência da capacidade para importar ressurgia sob a forma de demanda insatisfeita de um grupo novo de produtos [grifo do autor]. Este é o núcleo do problema que proponho que se estude sob a rubrica de dialética da capacidade ociosa, manifestada pela circunstância fundamental de que, no próprio ato de implantar-se, engendrava o seu contrário, tendendo, portanto, a perpetuar o esforço de desenvolvimen-
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A quarta dualidade brasileira, que seria também a última, ainda não havia se completado à época em que Rangel estudava o fenômeno. O ano de
daí o esforço do II PND (governo Geisel) de manter o crescimento “em marcha 31 de forma a completar a substituição de importações no Departamento I
da economia (produção de bens de capital) e insumos importados (principalmente petróleo) desembocaria numa grave crise do balanço de pagamentos, a partir do início dos anos 80 do século passado.
interna. Nessa fase, diante do avanço de sua industrialização, o Brasil estaria deixando de produzir muitas coisas importadas simplesmente pela falta de um
além dos limites impostos pelo mercado, gerando, portanto, sobreacumulação de capital. Era preciso fazer com que essas atividades detentoras de poupança, mas impossibilitadas de investir em suas próprias instalações, fossem estimuladas a transferir recursos para outras atividades carregadas de antiociosidade, que
de uma nova lei de concessão de serviços públicos, que permitisse ao setor privado encarregar-se, de forma crescente, pelos investimentos públicos de infraestrutura.
dualidade, representando o polo externo, e tendo como sócio menor a nova burguesia rural, representando o polo interno. Para viabilizar a mudança no polo interno da dualidade, seria preciso eliminar os últimos resquícios do latifúndio feudal – condição necessária para criar empregos no meio rural. Nesse sentido, Rangel advoga a diminuição do preço da terra. Na sua visão, o preço da terra no Brasil não decorre do seu uso enquanto tal, mas da sua utilização como
descendente do ciclo endógeno) desencadeia um processo de valorização dos ativos reais, como a terra, que nada tem a ver com o seu valor territorial. Nesse
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caso, os títulos fundiários concorrem com os títulos mobiliários32.
Tendo discordado da esquerda, nos anos 50, do papel prioritário da reforma agrária para desenvolver o Brasil – dado que o processo de substituição de importações criava uma reserva de mercado para a indústria – a partir da quarta dualidade, a reforma agrária tornava-se imperativa33.
Embora a teoria quantitativa da moeda tenha origens remotas34, os seus
todos os demais autores monetaristas que se seguiram, sendo Milton Friedman o mais importante deles.
A equação de trocas, de Fisher, é dada por MV=PT, onde M representa a quantidade de moeda, V é a velocidade de circulação da moeda, P é o nível geral de preços e T é o total de transações realizadas na economia em certo período (produto). Pela hipótese clássica de pleno emprego, o produto não se altera, de modo que T pode ser considerado estável no curto prazo. Levando em conta que as condições institucionais que determinam o número de vezes que a moeda troca de mãos mudam muito lentamente ao longo do tempo, então V também pode ser considerado como uma constante no curto prazo. Nessas condições,
32
também desencadeia um processo de “valorização” da terra, no sentido de elevação dos preços desse fator, em óbvio descompasso com a renda territorial (grifo do autor). Por outras palavras, os títulos fun-diários comportam-se em contracorrente com os mobiliários. A mesma recessão que deprime os valores
33 “Há tempos que o problema da terra, no Brasil, tomou a forma de um [grifo do
agrária, nada menos. Noutros termos, a reforma agrária que não precedeu a industrialização, como julgávamos nós, os revolucionários dos anos 30, terá de vir agora, como coroamento da mesma indus-
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moeda e preços era ainda mais visível (em especial, em David Hume).
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é a quantidade de moeda M – que representa a demanda – é responsável pela alteração no nível geral de preços P.
teórico desenvolvido pela CEPAL35, cujas teses principais foram resumidas por
ao crescimento da demanda, em especial a agricultura devido à inelasticidade da oferta de alimentos.
monetarista quanto a estruturalista, dá bem uma ideia do quanto não acreditava
, escreveu um artigo com esse mesmo título em que ironizava a ortodoxia, seja de direita, seja de esquerda . Nossos ortodoxos monetaristas (de direita), dizia ele, não percebem que a moeda é passiva, ou seja, é o aumento de preços que leva as autoridades monetárias a aumentarem a quantidade de moeda e não o contrário. Nossos ortodoxos estruturalistas (de esquerda), por outro lado, “tomaram a nuvem por
para o produtor, desestimula o aumento da produção por parte deste último e
monetaristas com base na hipótese do pleno emprego clássica; os estruturalistas
35 Comissão Econômica para a América Latina e Caribe, órgão ligado às Nações Unidas, sediado em Santiago do Chile, fundada em 1948, tendo à frente o economista argentino Raúl Prebisch, cujo objetivo principal era desenvolver um marco teórico alternativo (Desenvolvimentismo) para a América Latina, até então dominado por teorias construídas com base no cenário das nações que detinham a hegemonia econômica.
36 “[...] Cumpre notar que essa ortodoxia verdadeira não é privilégio nem de esquerda, nem da direita, sendo, ao contrário, um fundo comum da ciência econômica, pois as equações de Fisher já estavam per-feitamente formuladas nos parágrafos de Marx, e não há, no mundo moderno, nenhuma ortodoxia mais verdadeiramente ortodoxa do que a dos economistas soviéticos” (Rangel, 1962:267). Dizer isso hoje é
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37. O que os representantes dessas correntes não perceberam é a existência de capacidade
renda e não a uma elevação dos preços, conclui Rangel.
da equação, suponha que a variação no volume de moeda seja determinada pela elevação dos preços. Nessa hipótese, a igualdade da equação de Fisher MV=PT se converte na desigualdade MV. Essa hipótese não foi considerada
reestabelecer a igualdade entre o lado direito e esquerdo da equação, uma parte da produção não entraria no mercado, tal que MV=-t), onde t é a parte do produto físico retirada do mercado. Em concorrência pura, como supõem os monetaristas, isso não poderia acontecer. Mas numa economia de características monopolistas como a brasileira, a hipótese de retenção voluntária da oferta ou de capacidade ociosa planejada passa a ser perfeitamente plausível.
Essa retenção de parte da produção pelas empresas, caso persista por muito tempo, resultaria em queda da renda real pelo aumento do nível dos estoques. Se isso não ocorre é porque a elevação dos preços (de P para provoca alteração no primeiro membro do lado esquerdo da equação de trocas (de M para ), que poderia ser reescrita como V=T. Em outras palavras, a retirada de parte do produto do mercado (t), alterando o total de bens e serviços oferecidos ao mercado para T-t, sustenta o acréscimo no preço A emissão de moeda passa
circulante pelo governo, de M para destina-se a suprir as necessidades de caixa das empresas devido ao alto custo de manutenção de estoques, reestabelecendo
nesse processo, portanto, é passivo38.
37 “Porque a verdade é que o Brasil é um país de baixíssima propensão a consumir – e nem se pode conceber que seja de outro modo, dado o atual esquema de (má) distribuição de sua renda” (Rangel,
38 “Tudo se passa, portanto, como se a sociedade civil, movida por maquiavélica malícia, preparasse -
ção; e será punido se recusar a fazê-lo” (Rangel, 1978:26).
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O problema fundamental, para Ignacio Rangel, é descobrir por que algumas empresas privadas que dominam o mercado, em certos períodos, decidem elevar os seus preços – e mais – por que preferem até mesmo não
medida que nos afastamos do regime de concorrência pura e adotamos a tese mais realista da concentração de mercado, a manutenção da margem de lucro (regra do ), em períodos de escassez da demanda, passa a ser uma explicação convincente.
Nesse ponto, a teoria de formação de preços de Ignacio Rangel em muito se assemelha a de Michal Kalecki, embora não seja certo que ele conhecesse a obra do economista polonês
o mesmo ponto de partida (Marx). Para Kalecki, a característica normal da economia é operar com capacidade ociosa devido ao grau de monopolização das economias capitalistas40. O preço do produto ( ) é determinado por uma margem ( ) sobre os custos diretos (u), calculado pela equação + n , sendo m e n
se seu preço e vice-versa41.
Conquanto a escola estruturalista tenha entendido, corretamente, a
da economia, notadamente a inelasticidade da oferta agrícola, os estruturalistas inverteram a ordem natural das coisas: a inelasticidade está na demanda e não na oferta. É o intermediário oligopsonista-oligopolista que impede que a
39 A primeira edição de é de 1963, quando a obra do economista polonês era pou-co conhecida no Brasil. Por esse motivo, no prefácio da 3ª edição (1978), Luiz Carlos Bresser Pereira não acredita que Ignacio Rangel estivesse familiarizado com a teoria kaleckiana. O próprio Rangel, no posfácio que escreveu para a edição de 1978, mostrou estar em dúvida a esse respeito. “[...] tanto podia dizer que sim, como que não” (Rangel, 1978:129).
40 Não é outro o pensamento de Rangel, como pode ser comprovado pela leitura do prefácio do livro Recursos Ociosos e Política Econômica da expansão das forças produtivas, dado que, normalmente (grifo do autor), a sociedade subutiliza as forças de que dispõe. Assim, quando o marxismo me ensinou que toda crise é crise de superprodução, disse-me uma antiga novidade”.
41 Ver Kalecki (1983:8).
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elevação dos preços pagos pelo consumidor seja transferida para o produtor. Como a elevação de preços deprime o salário real do trabalhador – dado o peso da alimentação no orçamento das classes de renda mais baixas – o que existe é uma crônica inelasticidade da demanda e não da oferta.
A parte mais surpreendente do raciocínio de Rangel ainda não foi desvendada. A redução da demanda não ocorre nos chamados bens-salário e sim em outros bens, cuja procura é mais elástica do que os alimentos, tais como vestuário, calçados, etc. Em outras palavras, o aumento da parcela da renda do trabalhador comprometida com a alimentação provoca um efeito substituição na estrutura de consumo popular, aumentando o peso dos alimentos em detrimento de outras mercadorias e serviços menos essenciais. O aumento dos estoques,
dos seus produtos e sim nas empresas cuja elasticidade preço da demanda é maior. Os preços não caem, como supõem os monetaristas, porque a elevação inicial de preços e a retenção de estoques têm lugar em setores diferentes do mercado e são estas últimas empresas que recorrem ao sistema bancário à procura de crédito para manter os estoques que forçam o governo a emitir,
passa a expor o seu próprio pensamento a respeito das causas do processo
proporção do excedente ou realizada sobre os salários pagos pelo trabalho – para entender o processo de concentração de renda no país. Juntando os dois conceitos, Rangel concluiu que pelo fato da taxa de exploração ser alta é que a propensão marginal a consumir é baixa.
Um passo mais adiante e Rangel consegue explicar a recorrência de crises econômicas ou, como costumava chamar, as fases descendentes dos ciclos econômicos. Na medida em que é apropriada uma fatia maior da valia (ou que aumenta a taxa de exploração), as condições para aumento do
efetiva. Esta queda, por sua vez, resulta do aumento de produtividade não repassada para os salários. O dilema da economia brasileira reside, para Rangel, entre escolher entre crescimento cada vez mais acelerado – de forma a ocupar a grande carga de capacidade ociosa acumulada em seu parque industrial – e a crise econômica.
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de sustentação do nível de crescimento da economia. Para que a economia cresça é preciso manter um nível mínimo de demanda, o que só é possível
promovendo uma elevação forçada dos investimentos pelas empresas e das
portanto, está relacionada com aquilo que de mais estratégico existe para uma economia, ou seja, a sua própria taxa de formação de capital42.
Ignacio Rangel e a recessão dos anos 80
Consciente de que o Brasil se encontrava na fase descendente do seu
longo exógeno, o interesse de Rangel volta-se para a conjuntura econômica,
na década de 80 do último século43. Acertadamente, Rangel previu que a
do ciclo endógeno e sim um efeito induzido de uma temporária recuperação
do resto do mundo, praticamente inviabilizando aos países dependentes
Balanço de Pagamentos. Nesse sentido, a economia brasileira, que contava com considerável reserva de capacidade ociosa herdada do ciclo anterior, viu-se forçada a buscar divisas através de superávits na sua balança comercial para
suspiro de recuperação que não duraria muito.
A década de 80 marcou também o início do processo de aumento dos
42
mas com o que há de mais estratégico nela, isto é, com a taxa de capitalização ou de formação de capital” (Rangel, 1978:32).
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do ciclo, mas não na fase descendente, quando a demanda é mínima. Ora, na recessão, a tendência é haver subutilização da capacidade instalada, de modo que a redução da oferta é, até certo ponto, planejada. Porém, o que leva o
que, numa economia oligopolizada como a brasileira, quando a capacidade instalada ultrapassa a demanda, as empresas, defensivamente, reduzem a oferta e aumentam os preços para manter a sua margem de lucro. Essa é a explicação.
atividades que estiveram se modernizando prioritariamente na fase ascendente
tecnologicamente e cujo desenvolvimento passa a ser exigido pela sistema para sair da recessão. O nó a ser desatado consiste em criar condições para investimento de recursos das empresas daquelas atividades carregadas de
serviços de utilidade pública, como transportes pesados de carga, transportes de massa de passageiros (metrôs), energia, serviços urbanos, etc. Admitindo
para transferir poupança de um setor para outro, a solução do problema teria de passar pela intervenção do Estado.
poupança privada seria transferida (via dívida pública) para o Estado que se encarregaria de investir nas atividades retardatárias; b) ao Estado apenas caberia criar condições propícias ao investimento do setor privado nos serviços públicos, mediante mudanças no arcabouço legal. Desde logo, Rangel descarta a primeira alternativa, por se colocar no longo prazo, enquanto o problema exige solução de curto prazo. Para reforçar seu argumento, lembra que, no limiar de nossa industrialização, os atuais serviços públicos nasceram como concessões
44 “Trata-se, em suma, de precisar a síndrome da recessão. Os sintomas isolados que compõem essa sín-drome já se encontram razoavelmente cobertos, mas cada especialista tende a privilegiar o aspecto que, per faz et nefaz
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a empresas privadas, quase sempre estrangeiras45. Posteriormente, o Estado promoveu a nacionalização desses serviços. Agora, não deverá ser diferente. Haverá uma redistribuição de responsabilidades entre o setor público e o setor
.
A retomada do crescimento exigiria, para Rangel, uma reformulação
lucros dos setores portadores de capacidade ociosa sejam transformados em
da economia. A mudança institucional a que se refere Rangel passaria por uma
47. Mas não basta apenas uma mudança no arcabouço legal; seria preciso fazer com que as taxas reais de juros se transformassem de positivas em negativas – como acontecia à época em que os serviços públicos foram estruturados no Brasil. Aqui a análise de Rangel sofre forte
Não resta dúvida que o problema dos juros é o mais difícil de ser resolvido,
entre os países que apresentam as mais elevadas taxas de juros reais do planeta. Mas se há algo errado, adverte o mestre, é a existência de taxas reais de juros fortemente positivas e não o fato de, eventualmente, serem negativas. Segundo
contribuíram para que a taxa real de juros se tornasse positiva está o fato de que o setor público não tem outra garantia a oferecer a não ser o aval do Tesouro. Ora, o endividamento crescente do Estado e o risco de insolvência deste tornam esse aval de valor discutível, o que explica a existência de taxas reais de juros positivas.
45 Um exemplo de que a economia brasileira ainda não estava preparada para o fornecimento de tais ser-viços é o da empresa estrangeira Light que, para implantar o serviço de bondes nas grandes cidades, teve que importar desde o equipamento pesado para a geração e transporte de energia até os próprios bondes
46 “A presente crise deverá desembocar numa solução desse segundo tipo. Isso implicará, numa primeira etapa, a progressiva participação do capital privado na implantação de projetos rompedores de pontos de estrangulamento; [...] numa segunda etapa, não é possível excluir a possibilidade, ou de privatização pura e simples da atividade ou, dependendo das circunstâncias, de conversão dos serviços públicos de administra-ção direta, ou das empresas públicas, em 1982c: 81).
47 Ib. nota 30, pág. 22.
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Por uma simples questão de bom senso se chega à conclusão de que nenhum serviço público será capaz de remunerar a empresa privada com tarifas compatíveis com as elevadas taxas de juros do mercado. Para que as
nesses setores, torna-se necessário que o Estado levante recursos, através de
essas empresas com forte subsídio. Pode parecer que nada terá mudado com a passagem dos serviços públicos da responsabilidade do Estado para a empresa privada. Porém, em troca do seu aval, o Estado deixará de comprometer recursos
às empresas concessionárias. Em caso de má prestação do serviço público, poderá o Estado executar a hipoteca do concessionário, inclusive tomando-lhe a concessão, se for o caso, e negociando-a com outro concessionário.
estará nascendo como capitalismo de Estado. Mas isso não deve ser confundido com socialismo. Rangel mantém a esperança viva de que o Brasil ainda possa caminhar para o socialismo, mas não pela via da estatização da economia48.
não encontrando mercado à altura da capacidade produtiva criada na precedente fase ascendente do ciclo, recorre ao Estado para resolver seu problema; de outro, o Estado, prestes a esgotar a sua capacidade de endividamento, vê uma saída para a falta de recursos na transferência dos serviços públicos para a órbita
certas atividades, em cada momento, estão a cargo do setor privado, enquanto outras integram o setor público. Não necessariamente as mesmas, com o correr
A guisa de conclusão: Ignacio Rangel, profeta ou visionário?
Ao nos associarmos às comemorações do centenário do nascimento de
48
Brasil, por certo, caminha também para o socialismo, mas não pela via da mera estatização da economia,
tem ressurgido sempre das próprias cinzas”. Ibid., nota 31, pág. 81.
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ser visto como um indivíduo que prediz o futuro, quanto como um sonhador. A simples comparação com o presente, que emerge da leitura das seções precedentes deste texto, revela um Ignacio Rangel profeta. Previu, com cerca de duas décadas de antecedência, a privatização dos serviços públicos ou a concessão de serviços públicos à empresa privada, iniciada durante o governo de Fernando Henrique Cardoso e que chegou, em menor ou maior grau, até o governo Dilma Rousseff. Tinha também sonhos, que alguns podem considerar como utopias, como sua inabalável convicção de que o Brasil caminhava para o socialismo, embora talvez não no sentido comumente associado à palavra.
que os ciclos exógenos (das economia centrais) e endógenos (determinados
impunham limites a atuação do Estado no sistema de economia de mercado . Daí haver necessidade da parceria do capital público-privado – sempre com o controle do primeiro –, alternando as suas áreas de atuação ao longo do ciclo
galgar mais rapidamente as etapas do desenvolvimento, o qual pressupõe avanço tecnológico e justiça social.
multifacetado, é resgatar a sua contribuição no terreno da economia, de sorte que possa servir de inspiração para as novas gerações de economistas, assim como foi para a formação deste articulista50. Formado em Direito, Rangel foi, ao longo
49 Ignacio Rangel já pensava globalmente numa época em que a globalização ainda não fazia parte da agenda dos economistas.
50 -
e monetaristas (direita). O livro , de I. Rangel, que havia sido recentemente (1978)
ocasião do lançamento do seu livro Ciclo, Tecnologia e Crescimento, conheci-o pessoalmente. Na oca-sião (11/08/1982), no curto diálogo que tivemos enquanto ele dava o autógrafo, mencionou que o meu sobrenome lhe trazia à lembrança um amigo muito querido (referia-se a Jesus Soares Pereira, já falecido, que, junto com Rangel, teve um papel importante na criação de grandes empresas estatais brasileiras, como a Petrobrás e a Eletrobrás). Cerca de uma década depois, quando fazia meu doutoramento, na
Osório de Cerqueira), trouxe Rangel para uma conversa com os estudantes. Daí surgiu a ideia de escre-ver uma “comunicação” sobre os 30 anos da 1ª edição do seu livro , publicada pela Revista de Economia Política (v.3, n.13, jul-set/1993). Meu derradeiro encontro com I. Rangel se deu
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de sua vida, um autodidata. Apreendeu economia por conta própria, começando
na CEPAL, no Chile. Ao contrário daqueles que se dizem “economistas de
pensar dialeticamente. Do mesmo modo, sem menosprezar a importância do
. Rio de Janeiro:
BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos. Rangel, um grande mestre. ,
CARDOSO DE MELLO, J.M.
CASTRO, Antonio Barros de. . Rio de
CONCEIÇÃO TAVARES, Maria da.
FURTADO, Celso. . 20ª edição. São Paulo: Cia.
KALECKI, Michal.
PEREIRA, José Maria Dias. nos anos 70
Economia Política
há cerca de um ano antes de seu falecimento (ocorrido em 04/03/1994). Embora com a saúde debilitada, Rangel aceitou o convite para fazer uma palestra, na instituição em que eu trabalhava (UFSM), se não
sempre. Deixou um legado de valor inestimável, mas pouco reconhecido. Ao escrever o presente texto, além do propósito de homenagear o grande mestre expondo suas principais ideias, o autor pretendeu também a ajudar a reparar essa injustiça.
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RANGEL, Ignacio Mourão.
______.
______.
, v.1, n.1. São
______. A história da dualidade brasileira. In: , v.1,
______. . In: Ciclo, tecnologia e crescimento.
______. . In: Ciclo, tecnologia e crescimento.
______. . In: Ciclo, tecnologia e crescimento. Rio de
______. . In: Ciclo, tecnologia e crescimento. Rio de Janeiro:
______. . In: , v.4, n.1. São
______. In: ,
______. . In: , v.10, n.4.
SUNKEL, Osvaldo.
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Um mestre da economia brasileira: Ignacio Rangel revisitado
Poucos cientistas sociais estudaram a economia brasileira de maneira tão
propostas. Rangel foi provavelmente o mais original analista do desenvolvimento econômico brasileiro. Apenas Celso Furtado teve uma contribuição comparável na análise da dinâmica da economia brasileira. Formado em direito, autodidata em economia, intelectual sempre preocupado com a prática, com as transformações do mundo em que viveu, seu pensamento nem sempre seguia as normas da academia. Era, porém, um pensamento poderoso e profundamente engajado no desenvolvimento nacional. No exterior provavelmente Rangel nunca será conhecido, embora pelo menos uma de suas contribuições tenha valor universal: a tese da moeda endógena. Rangel foi antes de tudo um economista nacional, formado, primeiro, no marxismo, e, nos anos 50 na escola nacionalista do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) e na escola estruturalista da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL). Foi um pensador profundamente
muito pessoal. É um economista que sempre se distinguiu pelo pioneirismo, pela criatividade, pelo pensamento independente. Na segunda metade dos
conhecimento que não participava dessa visão era Ignacio Rangel, ao qual devo as mais importantes intuições sobre a natureza do problema central da acumulação naquele período de transição (...). Assim mesmo, relendo-o hoje,
à imaginação e vigor criativo de
de seu pensamento.
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metade dos anos 70 a obra de Ignacio Rangel foi relegada, por circunstâncias políticas e pessoais, ao ostracismo, evidenciado na falta de reedição de seus livros já esgotados. Seu clássico , por exemplo, que havia
de reavaliação de suas contribuições para o pensamento econômico brasileiro
no reconhecimento de ter sido um dos fundadores do pensamento econômico brasileiro, quando foi criada a Rangel foi considerado um de seus patronos, ao lado de Caio Prado Jr. e Celso Furtado.
Também o próprio Rangel, após graves problemas de saúde,51 voltou nos anos 70 à sua produção com a inteligência e o vigor que lhe eram característicos. Cremos que seu primeiro aparecimento em reunião de economistas ocorreu na reunião da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) em São Paulo. Depois de muito tempo desaparecido, ele trouxe um artigo baseado na teoria dos ciclos de Kondratieff, onde ele previa que em breve a economia mundial entraria em uma grande crise, embora naquele momento no Brasil vivêssemos em ritmo de milagre, e no resto do mundo as taxas de crescimento continuassem muito
nos economistas presentes, mesmo nos economistas estruturalistas. Mais uma vez Rangel estava confrontando o saber convencional tanto neoclássico quanto
promoveu a publicação da terceira edição de , na qual incluiu
51
muito breve, estava equivocado, porque hoje ainda aqui estou, com uma sobrevida razoavelmente sau-dável e laboriosa... Eis que a história, nada menos, brindou-me com outro régio presente: o prazer de conhecer e de conviver com a geração que se supunha perdida por efeito do golpe de Estado de 1964... Muitos deles me desvanecem apresentando-se como meus discípulos e estão atentos ao que digo e escrevo... Estou tendo, pois, a alegria de conhecer o julgamento dos meus pósteros, sem ter-me dado o trabalho e o desprazer de morrer”. (Rangel, 1987: 7)
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em novos trabalhos transformados em livros, bem como na reedição de outros livros já esgotados.
cíclica. Na terceira seção, sua teorização sobre o ciclo longo, e na quarta, sobre a dualidade, os dois instrumentos fundamentais que utilizou em sua análise da economia brasileira. Finalmente, na quinta seção, a abordagem de Rangel sobre
capacidade ociosa e os ciclos decenais ou de Juglar. Em todo o texto procuramos recorrer, sempre que possível, às palavras do próprio autor.
no Estado do Maranhão. Sendo seu bisavô, seu avô e seu pai juízes de direito, também foi educado para ser juiz. Desde a década de vinte, Rangel lia muito. Seu pai, José Lucas Mourão Rangel, era um magistrado esclarecido, sempre em oposição ao governo. Em consequência, era nomeado para comarcas pequenas
A tradição familiar de Rangel, sua personalidade, bem como suas leituras
Governo Federal.
Ainda no início dos anos 30 começa a ler Marx. A partir de então, torna-se militante do Partido Comunista Brasileiro e participa da tentativa de tomada de
entanto, proibido de se afastar da cidade de São Luís.
1a. Conferência das Classes Produtoras (CONCLAP) que seria realizada em Teresópolis, Rio de Janeiro. Rangel, além de escrever dois trabalhos para a
Maranhão, que representaria esse Estado no evento. A participação no evento das
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classes produtoras em Teresópolis faz o chefe de polícia de São Luís lhe fornecer
Rio de Janeiro escreve para sua mulher discutindo a possibilidade de não voltar para São Luís, recebendo dela encorajamento para começarem uma nova fase de suas vidas na então Capital Federal. Rangel começa a trabalhar no Rio de Janeiro como tradutor de novelas policiais. Em seguida, também como tradutor, trabalha para a agência de notícias Reuters. Seus trabalhos de tradução eram sempre de meio expediente. O outro meio expediente era em sua casa.
economia que escrevia somente para sistematizar suas ideias. Cinco deles são selecionados e vendidos por esse amigo para a Associação Comercial do Rio de Janeiro. A partir desse primeiro dinheiro que Rangel ganha como economista, inicia uma intensa produção de artigos para publicação.
assessoria da Confederação Nacional da Indústria e passa a trabalhar com ele.
de Almeida ao então Presidente Vargas, que o convida para sua assessoria. Assim,
Vargas, grupo este muito prestigiado pelo Presidente. Nessa assessoria, entre inúmeras tarefas, colabora na elaboração do projeto da Petrobrás e da Eletrobrás.
Rangel escreve seu primeiro livro, ,
brasileiros, antevendo a importância de Rangel nas ciências sociais do Brasil, registra, no seu prefácio ao livro, que este “é um marco na história das ideias do
um dos textos fundamentais da sociologia brasileira ( ), fora companheiro de Rangel no Instituto Brasileiro de Economia, Sociologia
Estudos Econômicos e Sociais (ISEB). Nesses dois institutos um grupo de intelectuais, entre os quais se salientavam, além do economista Rangel e do sociólogo Guerreiro Ramos, os cientistas políticos Hélio Jaguaribe e Cândido
desenvolvido um pensamento poderoso e original sobre a evolução econômica,
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política e social do Brasil, transformando-se, juntamente com Celso Furtado, que teve uma rápida passagem pelo ISEB, nos principais analistas e ideólogos do projeto nacional de industrialização que então se desenrolava no Brasil. Rangel, como o mais importante economista do grupo, tinha um papel fundamental nesse processo. Por outro lado, conjuntamente com outros técnicos, prestava sua contribuição ao governo, ajudando a formular e administrar o projeto nacional em curso. Provavelmente pensando nisto, ao mesmo tempo que
das ciências sociais tivemos um pensamento nacional em primeiro lugar graças à contribuição dos economistas. Só posteriormente a nossa sociologia tomou, não sem lutas, o caminho já escolhido pelos nossos economistas... O público, mesmo especializado, não está informado sobre as verdadeiras proporções da transformação por que estão passando, na prática, a economia e a sociologia no Brasil. O que, em forma impressa ultrapassa o âmbito dos serviços técnicos
pela contribuição que vêm prestando à ciência social brasileira, no exercício de funções técnicas. A importância das tarefas que desempenham, provada na prestação efetiva de serviços absorventes, não lhes deixa tempo para realizar uma carreira de escritores. Tudo parecia concorrer para que Ignacio Rangel, também absorvido por tarefas concretas, fosse impedido de cumprir sua missão de escritor. Esse ano, porém, publica três livros. O aparecimento dessas obras
cuja versão brasileira foi
do Departamento Econômico. Realiza, então, dois trabalhos inspirados pelos problemas que a análise de projetos que realizava no BNDE suscitava: o longo artigo “Desenvolvimento e ProjetoProjetamento
. No período em que já se encontrava no BNDE, publica
economia estava em crise, seu livro clássico, após a saída de Carvalho Pinto, é convidado pelo Presidente João Goulart para
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condições especiais, porque os médicos nunca lhe deram alta. Aposenta-se em
Publicou ainda as coleções de ensaios - Recursos Ociosos e Política Econômica
milagre ,
, que reuniu os artigos que escreveu para a sua coluna diária com esse título no jornal Última Hora
Política
tornou colaborador assíduo da
Metodologia
O método utilizado por Rangel para analisar a economia brasileira sempre foi essencialmente histórico. Sua origem marxista é evidente. Mas Rangel usa Marx com absoluta liberdade. O materialismo histórico e dialético é uma arma heurística poderosa, quando utilizada não como uma receita pronta, mas como um verdadeiro instrumento de pensamento. Guerreiro Ramos, no
que, diferentemente da maioria dos cientistas sociais que utilizaram esse método para analisar a sociedade e a história brasileiras, Rangel não se deixa levar por uma postura ideológica romântica em relação à burguesia, não aplica o método mecanicamente através da simples transposição das fases históricas
da economia brasileira. Nestes termos, Rangel, “adotando o método histórico, conserva, no entanto, uma posição de severo objetivismo, isto é, não sucumbe à tentação de invectivar os fatos. E porque domina o emprego desse método, não se submete a conclusões pré-fabricadas e procura pensar o processo brasileiro diretamente, induzindo, dos fatos que examina em primeira mão, as observações
Para Rangel é necessário não apenas analisar a realidade econômica
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como um processo histórico, mas também entender a ciência econômica como uma ciência histórica por excelência, obrigada, portanto, a uma permanente mudança e atualização à medida que os processos históricos evoluem. Utilizando
um processo evolutivo duplo: o fenomenal (“como representação, como ideia da
como resultado de uma representação da realidade transcendente, a qual, implicitamente, permaneceria sempre igual a si mesma. Assim, por exemplo,
Destaca Rangel que, ao se admitir que cada nova teoria incorpora
apenas à teoria mais recente, ao dos arraiais da ciência econômica... As discrepâncias entre a teoria mais recente e as anteriores seriam apenas expressão do que nas primitivas havia de errôneo. Tornou-se moda, por exemplo,
da ciência que resultou no seu estado atual não precisaria ser revisitada, pois suas contribuições positivas já estão incorporadas ao estado atual da ciência.
pensamento econômico desnecessária do ponto de vista do progresso da teoria, pois “se todas as contribuições positivas do passado encontram-se assimiladas ao estado presente da teoria, a história do pensamento converte-se em uma história de erros e antecipações. Erros quando a doutrina que se presumira verdadeira no passado afasta-se substantivamente daquela que integra o estado
Coerente com seu método, Rangel defende uma atitude mais respeitosa para com o que os antigos pensaram, ao mesmo tempo que está claro o caráter historicamente condicionado do seu pensamento. “Esse pensamento... continha uma espécie de verdade que não passou às teorias mais recentes pelo simples
a estratégia de leitura dos textos da história do pensamento desvinculada de seu
também cabe aos economistas atuais fazer repensar permanentemente a teoria
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econômica a partir dos fenômenos históricos novos que estão permanentemente transformando a realidade econômica.
Para Rangel, o bom desenvolvimento da teoria econômica deve ser feito simultaneamente nas duas fontes, familiarizando-se tanto com o estudo atual da ciência quanto com os clássicos do passado. O objetivo, entretanto, é sempre compreender a realidade concreta ou histórica da economia brasileira. Para isto a ciência econômica desenvolvida no exterior é essencial, mas, de acordo com um dos princípios básicos que o grupo do ISEB defendeu mas que hoje parece estar sendo crescentemente esquecido, esta ciência deve estar sendo sempre submetida à nossa crítica, em função da nossa realidade, para que possa
econômica estrangeira - antiga ou contemporânea, ‘radical’ ou ‘conservadora’ - ou de demoli-la, para, sobre seus escombros, erigir uma ciência autóctone, mas, ao contrário, de salientar um aspecto próprio da nossa economia... pela
aperfeiçoar esses instrumentos, reformular os princípios, pelo emprego da moderna tecnologia, no que esta for aplicável, mas não podemos excluir in limine
Do instrumental marxista, Rangel utiliza, além do método histórico, o método dialético. Rangel vê o desenvolvimento econômico, sobre o qual concentrou todo o seu esforço intelectual, como um processo marcado por
de movimentos cíclicos, de dualidades - que trazem sempre embutidos a sua própria síntese: a retomada do desenvolvimento depois de uma crise cíclica, a
a reversão do ciclo econômico a partir da transferência de recursos dos setores onde eles se tornaram ociosos devido ao excesso de investimentos para os setores nos quais não existem oportunidades para a acumulação, o surgimento de uma nova formação social dominante a partir da superação da dualidade anterior.
A dialética faz parte intrínseca da forma de pensar de Rangel. As relações entre as variáveis não são meramente de causa e efeito, como pretende a lógica formal, mas relações muito mais complexas de interdependência, em que as consequências muitas vezes se transformam em causas, obrigando o analista
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a se aproximar do problema sob muitos ângulos ao mesmo tempo para poder compreendê-lo. Rangel adota essa postura metodológica automaticamente, à medida que pensa e escreve. Em certos casos, porém, ele fará alusão expressa
não se deixa surpreender logo ao primeiro exame. Ao contrário, ao primeiro exame, o que podemos obter são algumas determinações ilusórias. A essência
de desfeitas várias ilusões que nos dão toda a aparência de verdade. Por isso,
exposto. É que a análise empírica, com a ajuda da simples lógica formal, revelou-
uma descrição dogmática de todo o processo, antecipando assim as conclusões. Trata-se de um movimento de ida e volta do espírito, desde o fenômeno, isto é, do concreto sensível, imediatamente apreensível através das informações disponíveis, até a , que não se descobre ao primeiro exame; e desta, de novo, ao fenômeno. Somente depois de concluído esse segundo movimento é que o problema se revelará com toda a clareza. Não creia o leitor que tenhamos chegado arbitrariamente, ou ao acaso, a esta metodologia. E que esta alusão ao método dialético não tenha o efeito de desanimar o leitor. A dialética não é
Assim, as teorizações de Rangel decorreram de uma original e livre utilização do método marxista com elementos das teorias econômicas de Smith,
ensaio de adaptação da teoria da história do pensamento econômico à análise
formação histórica e de funcionamento da economia brasileira. Para Rangel, a
que, afora a técnica de tratamento dos fenômenos econômicos - que é algo que progride sempre e constitui um fundo comum - tudo muda na ciência econômica
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O Ciclo Longo
A concepção do desenvolvimento econômico e político do Brasil de Rangel
ciclos longos de Kondratieff52 são centrais em sua análise da evolução histórica de nossa economia e sociedade: “O relacionamento que faço das vicissitudes de nossa história nacional com as ondas longas, cuja simples existência não é aceita mansamente, faz-me sentir um pouco como Heidrich Schliemann quando resolveu levar a sério a , na busca da localização exata de Tróia, valorizando, assim, um documento que muitos consideravam uma tessitura de mitos. Assim, comecei por levar a sério a teoria das ondas longas, buscando com ela compaginar nossa própria história nacional. E não duvido de que os
hipóteses, como lançarão nova luz sobre aquela teoria, fazendo progredir a
Rangel aprendeu a teoria dos ciclos longos de Kondratieff lendo de Schumpeter e o próprio texto de Kondratieff publicado em espanhol
pela .53 Para Rangel, o processo de desenvolvimento é um processo eminentemente cíclico, regido por ondas de inovação tecnológica e pelo processo de acumulação de capital. Rangel assinala, insistentemente, que esse processo cíclico independe da vontade humana, portanto, da política e do planejamento. É um processo contraditório através do qual a inovação
com os capitais existentes que são por ela depreciados. A massa de recursos acumulados funciona como um fator de resistência ao progresso tecnológico,
A reversão cíclica ocorre porque, “a certa altura, em seguida a um período de
para a preservação dos capitais recém-criados, e a capacidade instalada
52 Para uma discussão teórica sobre os ciclos longos de Kondratieff no Brasil ver Bresser-Pereira (1986b). A literatura sobre o tema desenvolveu-se extraordinariamente nos últimos anos, provavelmente a partir do fato de que a desaceleração das economias desenvolvidas, ocorrida a partir do início dos anos
-velmente completa do assunto ver Solomou (1990).
53 Ver Rangel (1981b), onde Rangel examina a dinâmica dos ciclos de Kondratieff.
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O paralelismo que faz entre as vicissitudes de nossa história econômica e política e os ciclos longos é sugestivo.54
se desacelera, embora mantendo taxas positivas de crescimento, é sempre
‘b’ do 1o. Kondratieff, tivemos a Independência; a ‘b’ do 2o. deu-nos a Abolição-
industrialização, foi, segundo todas as aparências, um incidente da fase ‘b’ do
ou recessivas dos ciclos longos “manifestam-se primordialmente pelo relativo
. Como essa fase ocorre de forma sustentada por todo um quartel de século, as economias periféricas têm tempo para se ajustarem à nova situação. “No caso brasileiro, a economia tem encontrado sempre meios e modos de ajustar-se ativamente à conjuntura implícita no ciclo longo. Em especial, confrontada com o fechamento do mercado externo para os nossos produtos resultante da conjuntura declinante dos países cêntricos, temos reagido por uma forma qualquer de substituições de importações, ajustada ao nível de desenvolvimento
resultar que o nosso desenvolvimento econômico “dista muito de ser limitado
Quadro 1: Ciclos Longos
Ciclos Longos Fase a Fase b1o Kondratieff 1770-1815 1815-1847
2o Kondratieff 1847-1873 1873-1896
3o Kondratieff 1896-1920 1920-1948
4o.Kondratieff 1973-...
54
2o. ciclo longo: fase “a”: 1847-1873 fase “b”: 1873-1896 3o. ciclo longo: fase “a”: 1896-1920 fase “b”: 1920-1948 4o. ciclo longo: fase “a”: 1948-1973 fase “b”: 1973- (?)
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Ignacio Rangel não utilizou a teoria dos ciclos longos apenas para
na economia mundial o primeiro choque do petróleo ainda não ocorrera, Rangel, que após o seu enfarte estava desaparecido, surpreendeu a todos quando previu a crise mundial a partir da dinâmica de Kondratieff.55 Rangel observa que
tem início uma nova onda de expansão que atravessa a Segunda Guerra Mundial e o período de intensa reconstrução. Entretanto, observa Rangel, temos, “depois
dinâmico’. Noutros termos, acumulam-se os indícios de que entramos numa era semelhante
Kondratieff. Em um artigo posterior Rangel reconheceu este fato. Equivocou-se, entretanto,
periféricos, uma queda do dividendo nacional , ou mesmo uma desaceleração
supunha que poderia novamente reproduzir-se a expansão que ocorrera na fase recessiva do terceiro Kondratieff, quando isto, de fato, já não podia ocorrer, já que o modelo de substituição de importações se esgotara.
A Dualidade Básica
O segundo instrumento teórico que Ignacio Rangel utilizou para
que ele próprio considera sua principal contribuição ao entendimento do Brasil.
esta tese já era uma ideia desenvolvida no pensamento de Rangel pelo menos
que o acompanharia pelo resto de sua vida. É Rangel quem registra: “lembro-
55 Este artigo foi apresentado em São Paulo, em julho de 1972, ao congresso anual da Sociedade Brasi-leira para o Progresso da Ciência. Entre outros, estavam na reunião, Antônio Barros de Castro, Francisco de Oliveira e Paulo Singer. O artigo foi publicado no ano seguinte em Estudos CEBRAP.
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me de ter lido algures (em Schumpeter, provavelmente) que os economistas que deixaram sua marca na história de nossa ciência já tinham, aos 25 anos, concebido o vigamento-mestre do seu ideário, mas seriam necessários tantos anos quantos lhes tocasse ainda viver - e nem sempre com êxito - para precisar e dar forma inteligível para os outros, a essas ideias. Sem pretender deixar a tal marca na história do pensamento econômico - coisa pouco provável para quem teve minhas condições para trabalhar e a língua portuguesa no qual escrever -,
coube-me o privilégio de conviver, em diversas prisões da ditadura de então, com alguns dos melhores homens que o Brasil havia produzido. As ideias que então germinaram em meu espírito teriam longa trajetória a desenvolver, mas são as mesmas ideias, essas que estou agora tentando passar... Outros homens, como Jorge Ahumada, Guerreiro Ramos, J. Soares Pereira, os colegas do ISEB e do BNDES deixaram sua contribuição, mas as ideias são as mesmas, nascidas no
a impressão de que Rangel considerou, num certo ponto de sua vida, que se deixara guiar idealisticamente na juventude por uma transposição mecânica de teses revolucionárias estranhas à realidade brasileira. E que, daí para frente, sua grande obsessão passou a ser o entendimento dessa realidade através de análises que recusavam o uso de teorias importadas sem a devida adaptação
razão, mas como não teve acesso à produção jornalística de Rangel nos anos
abandonei a faculdade para fazer revolução agrária. No alto sertão maranhense, soube achar o caminho do coração dos camponeses espoliados, organizei-os para a resistência contra a capangada do latifúndio, mas vim ter à Frei Caneca para um longo estágio (sic), porque alguma coisa não estava certa no meu
catedrática e profana, estudei a experiência alheia e nacional, à tanto bisbilhotei as causas, que, de jurista que devia ter sido, virei economista. Preocupado com as peculiaridades da história do Brasil, que fazem com que as coisas que estão certas alhures se tornem erradas aqui, resumi todas as meditações na teoria da dualidade básica. De posse desse instrumento, não apenas julgo haver explicado meus erros de juventude como ter encontrado a chave para muitíssimos outros
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No prefácio ao seu livro , registra Rangel a importância
Comte-De Greef, dialetizada por meu professor de Introdução à Ciência do Direito, mostrou-me a conexão entre o Direito e a Economia. Descobrir o fundo
iniciais só serviram para acirrar-me o interesse, e a estava no desfecho lógico dessas cogitações. O leitor vai encontrar
aqui (em ) uma aplicação concreta da teoria da dualidade. Sem esta, não poderemos entender o Brasil: seu direito, sua economia e sua política. O Brasil é uma dualidade e, se não o estudarmos assim, há de parecer-nos uma construção caótica, sem nexos internos estabelecidos e, sobretudo,
A teoria histórica da dualidade de Rangel analisa a contradição essencial que colocou em movimento a história do país. A explicação dialética sobre o desenvolvimento oriundo da teoria da dualidade de Rangel, como vimos no trecho do autor anteriormente citado, não é apenas uma explicação sobre a dinâmica da esfera econômica. É uma teoria que abarca também outras esferas da realidade social, concebida como uma totalidade histórico-estrutural, que
possui um setor capitalista e outro pré-capitalista.
Para Rangel, que se municiou do instrumental metodológico marxista,
características correspondentes a várias etapas do desenvolvimento histórico da economia mundial. Para ele, o que é necessário é “investigar atentamente como agem umas sobre as outras as leis correspondentes a essas diferentes
desaparece antes que estejam desenvolvidas todas as forças produtivas que possa conter, e as relações de produção novas e superiores não tomam seu lugar antes que as condições materiais de existência dessas relações tenham sido instaladas no próprio seio da velha sociedade. Nestes termos, durante muito tempo coexistem relações de produção diferentes. Rangel utilizou com grande criatividade esta ideia básica de Marx. Para ele diferentes economias ou diferentes relações de produção que coexistem na economia brasileira “não se justapõem mecanicamente, ao contrário, agem umas sobre as outras, acham-
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universal, especialmente a europeia, porque nossa evolução não é autônoma,
historicamente defasadas em relação às relações de produção existentes na
outro externo. No polo interno situam-se, internamente, as relações de produção dominantes e a correspondente classe dominante, que ele chama de “sócio-
emergentes e o correspondente sócio menor, que na dualidade seguinte se transformará no sócio maior. A dualidade, porém, aparece também no fato de
às relações de produção vigentes nos países centrais e que no Brasil vão ser dominantes no polo seguinte. Estas relações estão sempre adiantadas em relação às relações vigentes no Brasil, assinalando o caráter dependente do desenvolvimento brasileiro. A dinâmica histórica brasileira se distingue, portanto, dos casos clássicos porque os processos sociais, econômicos e políticos não decorrem apenas da interação entre desenvolvimento das forças produtivas e relações de produção internas ao país, mas também da evolução das relações que este mantém com as economias centrais. Conforme observa Rangel: “Embora seja mais fácil surpreender o fato da dualidade no estudo de um instituto particular do que na economia nacional como um todo, é evidente que a sua origem se encontra nas relações externas. Desenvolvendo-se como economia complementar ou periférica, o Brasil deve ajustar-se a uma economia externa diferente da sua, de tal sorte que é, ele próprio, uma dualidade. Os termos dessa dualidade se alteram e desde logo podemos assinalar que mudam muito mais
etapas. Nos primeiros quatro séculos de nossa história, vencemos um caminho correspondente a, pelo menos, quatro milênios da história europeia. A rigor, nossa história acompanha a história do capitalismo mundial, fazendo eco as suas vicissitudes. O mercantilismo nos descobriu, o industrialismo nos
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Quadro 2: A dualidade básica da sociedade brasileira
DualidadesPolo Principal
/ Lado externo
Sócio MaiorPolo Secundário
/ Lado externo
Sócio Menor
(relações de produção dentro
e fora)
(classe dominante)
(relações de produção
emergentes)
(classe dominante
na fase seguinte)
1a 1815-1870 (Independência)
Escravismo /
Feudalismo mercantil
Senhores de escravos
Burguesia mercantil
/ Comerciantes
Fazendeiros latifundiários
2a. 1870-1920 (Abolição e República)
Feudalismo mercantil /
Capital Mercantil
Fazendeiros latifundiários
Capital mercantil /
Capital industrial
Burguesia mercantil
3a 1920-1973
(Revolução de 1930)
Capital Mercantil /
Capital Industrial
Burguesia mercantil
Capital industrial /
Burguesia industrial
4a. 1973-...Capital Industrial
/ Capital Financeiro
Burguesia industrial
Cap. Financeiro / ...
Capitalistas
relação à 3a. e a 4a. dualidades, já que nem sempre Rangel é claro a respeito.
A dualidade está em toda parte na economia e na sociedade brasileira. Está na fazenda de escravos que é mercantil e escravista, está no latifúndio após-Abolição, que é mercantil e feudal (porque dominado pelo instituto jurídico
está na fábrica capitalista que enfrenta um mercado de insumos e um mercado para seus produtos ainda mercantil ou mesmo pré-capitalista. A partir daí, Rangel
dominantes dentro e fora de cada unidade da economia, ou seja, de por em evidência as porque cada uma delas, em seu próprio campo, é dominante. A isso proponho que se chame da economia brasileira. A dualidade é a lei fundamental da economia brasileira. Podemos formulá-la nos seguintes termos: a economia brasileira se rege
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Rangel analisa a história econômica e política do Brasil a partir do século XIX como uma sucessão de dualidades, que correspondem às fases de declínio
ciclos longos de. E corresponde também a um fato político dominante: a Independência na primeira dualidade; a Abolição e a República, na segunda
existentes em cada polo. De uma forma até um certo ponto mecânica mas muito instigante, a relação de produção dominante no polo secundário corresponde à relação de produção dominante no lado externo do polo principal, e se transformará na relação de produção dominante no polo principal da dualidade
uma dualidade se transformará no sócio maior da seguinte.
Na dualidade (1815-1870), a relação de produção principal ou interna é o escravismo. A fazenda de escravos, entretanto, é essencialmente dual. Externamente, ou secundariamente, dada a fase do capitalismo na
sócio maior. Esta dualidade é caracterizada pelo que Rangel chama de “latifúndio
“o latifúndio brasileiro não é idêntico ao feudalismo medieval europeu ou
começa com a transformação do sócio menor da segunda dualidade no novo
não são precipuamente os cafeicultores, mas o que Rangel chamou, muito
pelos pecuaristas do Sul (Getúlio Vargas) e por latifundiários do Norte-Nordeste, que irão se aliar à burguesia industrial nascente para comandar a revolução
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classes dominante.dualidade (a burguesia industrial) transforma-se no sócio maior.
Nem sempre Rangel é claro em sua análise. Na terceira dualidade, referida
no polo interno é ainda feudal, como já era na segunda dualidade. Houve aqui provavelmente um erro, uma repetição. Devíamos ter aqui o capital mercantil como relação dominante e os latifundiários-fazendeiros, que eram o sócio menor
a análise, uma ausência é marcante: a tecnoburocracia. Em nenhum momento Rangel reconhece a importância extraordinária que a burocracia civil e militar, pública e privada vinham assumindo em todo o mundo, inclusive no Brasil. Os intelectuais a serviço do Estado, como Rangel, são tecnoburocratas, mas têm
uma verdadeira classe social. Entretanto, apesar das restrições que cada um de nós possa ter, não há dúvida que a teoria da dualidade básica de Rangel permite-nos uma compreensão muito melhor da dinâmica histórica da economia brasileira, combinando de maneira extremamente esclarecedora e original seu caráter cíclico, dependente e dual.
percebido que a natureza de um dos problemas centrais de nosso processo de acumulação era a necessidade de transferir excedentes dos setores atrasados ou pouco dinâmicos para os setores de maior potencial de expansão. Suas ideias
pelo problema dos recursos ociosos é coevo dos primeiros movimentos de minha consciência no sentido da problemática econômica, a um tempo em que
56 Rangel não fala em “doença holandesa”, que não era então um conceito conhecido, mas percebeu que Vargas montou seu pacto político envolvendo a parte da oligarquia que não exportava, e, portanto, era preciso impor um imposto de exportação sobre os produtores de commodities, particularmente os cafeicultores, para manter a taxa de câmbio competitiva.
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experiência no comércio e na indústria, bem como sua rica experiência adquirida
na economia brasileira era um fenômeno a ser analisado. “Era preciso descobri-los e descobrir os meios de pô-los em evidência (...) não era coisa irrelevante que fôssemos tomando consciência da existência de um potencial ociosoPrefácio).
Rangel preocupava-se com um caminho alternativo de alavancagem da acumulação capitalista que não o da compressão salarial ou o do endividamento
terceiro caminho, como alternativa ao comprometimento da soberania nacional
havia ocupado especialmente dos aspectos reais do processo econômico... Foi assim que cheguei à percepção dos problemas suscitados pela acumulação
a qual as duas correntes em pugna a tratavam... A pedra de toque para avaliar essas teorias é a capacidade ociosa. As duas escolas a negam, aberta ou sub-repticiamente. Embora a acumulação de capacidade ociosa seja um fato empiricamente demonstrado, as duas correntes estudam a emissão como o ato inicial de um processo conducente à expansão da demanda global do sistema. Ergo [Logo], se houvesse capacidade ociosa em condições de ser utilizada - e, sem isso, deixai-me que acrescente, não há capacidade ociosa - essa expansão da demanda global conduziria a uma expansão da renda, e não a uma elevação
com efeito. Não percebem que é a “variação autônoma do nível de preços (que pode resultar da variação dos preços de alguns produtos) não compensada
pioneira, estabelece as bases da teoria endógena da oferta de moeda. Outros
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fenômeno.57 Mas foi Rangel quem primeiro desenvolveu de forma clara a ideia. A
58
A oferta de moeda é, portanto, endógena ou passiva para Rangel. Os estruturalistas, por sua vez, embora compreendendo o caráter endógeno
distribuição da renda. Essa má distribuição ou essa alta taxa de exploração deriva da estrutura agrária baseada no latifúndio e do desemprego crônico. O problema se agrava com a expulsão dos agricultores do campo à medida que a agricultura
ao se basear na substituição de importações, permitirá que a industrialização tenha êxito sem prévia mudança da estrutura agrária. A alta taxa de exploração causada por esses fatores implica uma baixa propensão a consumir e capacidade ociosa – algo que monetaristas e estruturalistas não conseguiam detectar
no bojo da economia. É o resultado de um duplo processo. De um lado, as grandes empresas, a começar por aquelas que controlam a comercialização de produtos agrícolas, organizam-se em forma de oligopsônio-oligopólio, e passam a aumentar seus preços autonomamente, como uma forma de defender seus
mas estende-se para a grande indústria e para os serviços públicos. Nesse
é principalmente administrada ou de custos, e não de demanda.
momentos de crise; é ela que impede que a economia entre em uma crise
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jamais uma explicação clara do caráter endógeno da moeda, que hoje é uma ideia essencial não apenas
58 Ver Bresser-Pereira (1986b).
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é compensada por uma elevada taxa de imobilizações. Para se defender contra a desvalorização da moeda e aproveitar-se de taxas negativas de juros, as empresas e os indivíduos imobilizam o mais possível, e assim mantêm o nível de demanda agregada e a taxa de lucros. Nesse processo, o papel do governo, emitindo para fazer frente aos aumentos de preços e a consequente diminuição da quantidade real de moeda, é óbvio. Emitindo, o governo cobre o seu próprio
política de aumentar a carga tributária. Por outro lado, ele novamente faz a
e dialética era uma análise de quem estava profundamente engajado no processo político da época, e preocupava-se com a crise em que a economia
um todo era um mecanismo de defesa da economia em face a seus próprios desequilíbrios, inovaram radicalmente o pensamento econômico brasileiro. Mas
criticado, tanto pela esquerda quanto pela direita. Diria melhor: talvez tenha sido um dos mais incompreendidos trabalhos sobre economia brasileira, dado que, se
um parágrafo de seu livro, entretanto, Rangel delineia o limite da funcionalidade
esse instrumento por muitos que sejam os serviços que já nos prestou, ele tem limitações e, precisamente porque é útil, não devemos abusar dele, para não
, aquilo que poderia ser um declínio da atividade do sistema econômico, num movimento relativamente inócuo de alta de preços. Mas, notemos bem, em certa
. Para além, teremos, simultaneamente, que destrói o próprio instrumento, e a
Para Rangel, a economia brasileira apresenta ciclos breves (decenais) regulares. É exatamente a partir da análise de nossos ciclos breves que Rangel
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dos anos 80. “Os ciclos breves - também apelidados de Juglar-Marx, ou, na
como de 7 a 11 anos. Mas é de notar que nossos ciclos breves, companheiros de nossa industrialização substitutiva de importações, cobrem lapsos muito
implantação de sucessivos grupos de atividades, isto é, dos setores em que é possível dividir o sistema econômico brasileiro: “começando pela indústria leve e empreendendo, depois, a indústria pesada e os serviços de infra-estrutura.
longo. Para Rangel, não é improvável que esse fator tenha gravitado sobre o nosso
dos anos 70 foi, não apenas mais curta, como mais amena. Entretanto, como é sabido, a situação inverteu-se violentamente no início dos anos 80. Teve início a fase recessiva do ciclo breve endógeno, e isso nas condições da persistência da fase recessiva do ciclo longo, que é exógeno, do ponto de vista brasileiro.
nega a teoria universalmente aceita, embutida na curva de Philips, segundo a
integra a síndrome da recessão, isto é, surge ou se exacerba e, inversamente, desaparece ou, pelo menos, tem sua intensidade
reduzida quando a . Não há, portanto, nenhum
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...trata-se de saber o , dessa supostamente correlação entre os índices de preços e os indicadores de conjuntura... Para isso não temos ainda respostas tão claras e contundentes, mas, pelo mesmo como primeira , podemos alinhar dois fatos relevantes: (a) como vem insistindo Bresser-Pereira, a economia acha-se fortemente oligopolizada, o que permite uma medida considerável de ; o oligopólio, como se sabe, é um monopólio em potencial, desde que os oligopolistas se entendam entre si; (b) como venho propondo eu próprio para completar essa explicação, podem criar-se condições tais que induzam o setor oligopolista-oligopsonista a usar seu novel poder de administração dos preços em escala macroeconômica, e não por simples má-fé, mas porque as condições gerais de operação do sistema a isso o impelem. Com efeito, se escasseiam oportunidades de investimento – fato típico das fases recessivas dos ciclos – o empresariado, no comando de excesso de capacidade, pode desinteressar-se da formação das chamadas ’sobras de caixa’
liquidez , pode induzir a manobras no sentido de evitar a acumulação da mesma liquidez, limitando sua produção. Esse é o
nos períodos recessivos (quando a demanda é mínima) e não nos períodos ascendentes (quando a demanda é máxima).
a taxa de câmbio se deprecia violentamente e, em consequência, a taxa de
um mecanismo de defesa da economia nos momentos de crise, é também um sintoma da crise. Por isto temos a curva de Rangel: quando a crise se agrava, a
acelerar devido à prosperidade ou ao excesso de demanda. Mas este é um fenômeno de curto prazo, enquanto que a curva de Rangel é um fenômeno de
de Rangel.
com os movimentos cíclicos da economia levou Rangel a não compreender a
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baseada na distinção entre os fatores aceleradores e os fatores mantenedores Seguindo a tradição de todos os economistas que precederam essa
teoria, Rangel não faz essa distinção. Torna-se, assim, difícil para ele admitir que a indexação formal e principalmente informal da economia mantenha a
que a estão acelerando ou desacelerando. Por outro lado, e neste caso com mais
dúvida se acha profundamente inserido no processo cíclico da economia, possa ser eliminado com um simples choque, como algumas visões mais vulgares da
fracasso do Plano Cruzado: “Alguns mestres explicavam que, para acabar com a
com as variações dos preços relativos. Outros mestres, igualmente eminentes,
ser mandada embora não menos miraculosamente, visto não ter nenhuma
Conclusão
Poderíamos continuar a analisar muito mais longamente a obra de Ignacio Rangel, cuja riqueza é inesgotável. Esperamos, entretanto, ter deixado claro como o notável mestre, adotando um método histórico e dialético, crítico e original, usa com liberdade os instrumentos da teoria econômica, particularmente da teoria dos ciclos, da sua própria teoria da dualidade, para explicar o processo de desenvolvimento do Brasil e a os seus mecanismos de defesa, particularmente
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1983, com Yoshiaki Nakano, os autores distinguem com clareza os fatores aceleradores dos mantenedo-
60 -cos, maior é a nossa angústia diante das coisas que nos escapam por entre os dedos” (Veja, 14.10.1992,
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Em toda a sua análise, Rangel é de um lado pioneiro, pronto sempre a inovar, de outro nunca se esquece de sua missão de intelectual engajado no processo de desenvolvimento brasileiro e se antecipar na análise de seus grandes problemas. Todo o seu pensamento está voltado para a ação prática, para a política econômica. Por isto, nesta conclusão queremos nos referir brevemente
Posfácio da terceira edição de o Estado brasileiro estava entrando em uma profunda crise, ao mesmo tempo
dessas atividades, mas é claro que esse tempo passou, porque os recursos externos começaram a escassear, o mesmo acontecendo com os recursos
oportunidades de investimento, dispondo de recursos ociosos, enquanto que
investimentos. Desta forma, não obstante suas origens de esquerda, Rangel não tem qualquer dúvida em propor a privatização, que para ele permitiria a retomada do desenvolvimento, o início de um novo ciclo expansivo. Para isto, entretanto,
do dia da economia brasileira, conjuntamente com a privatização, é a solução
uma vez se comprovavam.
ARIDA, Persio. A história do pensamento econômico como teoria e retórica. In: REGO, José Márcio Rego (org.).
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SOLOMOU, Solomos. . Cambridge:
TAVARES, Maria da Conceição.
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de utilidade pública: atualidade do pensamento de Rangel
as grandes transformações ocorridas na sociedade brasileira ao longo do século XX: esta, de eminentemente rural a avassaladoramente urbana; de pré-industrial
economia e quadro da CEPAL; de integrante da Aliança Libertadora Nacional e encarcerado pela ditadura de Getúlio Vargas a conselheiro econômico deste último e também dos presidentes JK e Jango. Como tecnoburocrata e formulador da política econômica, Rangel foi participante e observador privilegiado do processo de transformação dos mecanismos de intervenção estatal e planejamento que deram sustentação à referida trajetória histórica do Brasil.
Na abordagem singular de Rangel sobre o desenvolvimento econômico brasileiro aparecem dois construtos teóricos dotados de centralidade – a teoria dos ciclos econômicos e o processo de substituição de importações como motor
emanadas do centro dinâmico da economia mundial, com aproximadamente 50 anos de duração, as quais determinam a forma como se desenvolve a divisão internacional do trabalho, vale dizer, as possibilidades de inserção das economias periféricas no mercado internacional.
No caso brasileiro, economia periférica, as fases ascendentes do ciclo externo se traduziram em um intenso dinamismo do setor exportador, com ampliação da corrente de comércio e da especialização da estrutura produtiva. Nas fases descendentes do ciclo de Kondratieff, a contração da demanda externa e a decorrente redução da capacidade de importar (expressa na desvalorização dos termos de intercâmbio) dá lugar a um ciclo de substituição de importações
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que permite avançar na constituição de uma economia crescentemente urbana e industrial.
As economias periféricas, a exemplo da brasileira, caracterizam-se por uma dualidade entre o setor exportador, especializado e de elevada produtividade,
baixa produtividade. Em cada mudança de fase cíclica observam-se mudanças sociais, que abarcam, segundo Rangel, a constituição de novas estruturas políticas, jurídicas e institucionais, cuja síntese se consubstancia na alteração do próprio pacto de poder existente. Por sua vez, o pacto de poder reúne em cada fase do ciclo a classe (ou fração de classe) hegemônica remanescente do período anterior e uma nova classe (ou fração de classe) que emerge nas novas condições econômico-sociais do momento presente.
A fase descendente do terceiro ciclo Kondratieff, compreendida entre os
no Brasil, dotando o sistema econômico da capacidade de avançar segundo uma dinâmica cíclica própria – os ciclos juglarianos (de aproximadamente 10
autonomia da economia brasileira em relação aos ciclos emanados do centro dinâmico da economia mundial. Assim, no período ascendente posterior (a fase
industrialização com participação fundamental do Estado enquanto promotor e agente responsável pelos segmentos de infraestrutura, permitiu a continuidade e o aprofundamento do processo de substituição de importações. O pacto de poder subjacente à passagem para a economia urbano-industrial tinha como polo hegemônico a classe dos latifundiários feudais (capitalistas em suas relações
porteiras) e como polo associado a emergente classe industrial.
Um aspecto importante na formulação de Rangel é que os momentos de mudanças nos pactos fundamentais de poder se caracterizaram pela ocorrência de crises recessivas, durante as quais a economia passava a ser tensionada pela contraposição de setores com excesso de capacidade produtiva e outros
da política econômica e aos gestores das agências estatais para solucionar tais
a criação de mecanismos para transferir os recursos ociosos dos setores com excesso de capacidade (poupança) para aqueles setores com gargalos de oferta (investimentos).
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Este processo de realocação de recursos envolvia também uma redivisão
determinadas atividades, ao mesmo tempo em que exigia a assumpção pelo Estado de uma gama de novas funções e atividades necessárias para dar sustentação ao novo ciclo de expansão econômica. Tais medidas, nada triviais, muitas vezes foram adotadas pelos gestores sem que estes soubessem exatamente o alcance que as mesmas teriam nos anos seguintes.
Cada crise recessiva, relacionada a determinado estágio do desenvolvimento das forças produtivas do país, exigiria, segundo Rangel,
super e subinvestidos. Assim, no período pós 2ª guerra mundial, a Instrução 70 da SUMOC representou o cerne de tais medidas, viabilizando a continuidade da substituição de importações de bens duráveis de consumo, através da criação de taxas de câmbio preferenciais para a importação de máquinas, equipamentos e insumos industriais.
parlamentar brasileira, abrindo um ciclo ditatorial que demoraria 20 anos para se exaurir, exigiu outro conjunto de medidas para viabilizar a transferência de recursos dos setores superinvestidos para os subinvestidos. A correção monetária constituiu o cerne das inovações institucionais que criaram as condições para o
. O problema fundamental que se colocava na época era estruturar um novo
relativamente altas, viabilizar a aquisição de bens duráveis de consumo (automóveis e eletrodomésticos) e a formação de um mercado secundário para os títulos da dívida pública federal que lastreassem operações de crédito destinadas à implantação dos grandes fundos de investimentos públicos em infraestrutura e serviços de utilidade pública (Eletrobrás, Telebrás, Siderbrás, Petrobrás) e em habitação (Sistema Financeiro da Habitação).
político-institucional: a crise dos anos 80 foi avaliada por ele como um período de superposição da fase descendente do quarto ciclo de Kondratieff
sincronizada, com impactos maiores nos países importadores de petróleo, a exemplo do Brasil) com uma crise interna. Esta se caracterizava como uma crise
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a contraposição entre um setor privado superinvestido, principalmente nos segmentos de bens de capital e de insumos intermediários, e um setor público subinvestido, principalmente nos segmentos dos serviços de utilidade pública,
outros.
O processo brasileiro de urbanização acelerada, caracterizado pela ausência de planejamento e pela formação de enormes aglomerados urbanos carentes de infraestrutura básica, apontava para a necessidade imperiosa da realização de grandes investimentos nos serviços de utilidade pública. Tais investimentos, na medida em que ofereciam um canal de valorização para os recursos ociosos existentes no setor superinvestido da economia, apontavam o caminho para a superação da crise.
O problema é que as empresas públicas responsáveis pela prestação dos referidos serviços de utilidade pública, encontravam-se em situação de “profunda
. A solução para o desbloqueio dos investimentos seria a conversão da concessão dos serviços de utilidade pública das empresas públicas para empresas privadas, as quais poderiam acessar fontes de crédito públicas e privadas de forma mais barata e com menores condicionalidades do que as empresas públicas.
O mecanismo proposto por Rangel para permitir às empresas privadas concessionárias o acesso ao crédito público e privado seria o aval do Estado brasileiro, com base em garantias hipotecárias sobre as instalações e equipamentos das concessionárias dos serviços públicos. Neste arranjo, impunha-se a prática de um realismo tarifário, que tivesse como referência o custo da execução dos referidos serviços, considerando-se a soma das despesas
investido e um lucro legalmente autorizado referenciado no custo de capital, de acordo com as condições do mercado acionário e de títulos internos. Tal era, em suma, segundo a formulação de Rangel, o mecanismo que permitiria a superação da crise recessiva de então e a geração de um novo ciclo de crescimento.
Hoje, um quarto de século após, é impressionante como a análise de Rangel e suas prescrições permanecem pertinentes. O tema das concessões dos
61 Um dos motivos pelos quais se agravou a insolvência das concessionárias de serviços de utilidade
captação de empréstimos externos no período 1973-1980. Sobre o tema ver CRUZ (1984).
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anátema no atual governo) transformou-se na grande aposta para a aceleração dos investimentos e a consequente viabilização de uma taxa de crescimento do produto menos modesta em comparação ao patamar que vigora após a eclosão
Os acontecimentos do último quarto de século podem ser sumarizados com o apoio de algumas das categorias rangelianas. A forte ampliação da
combate à recessão no centro dinâmico do capitalismo mundial – permitiram ao governo brasileiro renegociar a dívida externa e ampliar o estoque de reservas internacionais, o que viabilizou o lançamento de uma estratégia bem sucedida de estabilização monetária - o Plano Real - em um horizonte de tempo bem inferior ao que Rangel imaginara .
tornado um importantíssimo ativo eleitoral, permitiu o alongamento do horizonte de crédito das empresas e dos consumidores, o que engendrou um aprofundamento dos mercados de consumo, especialmente de bens duráveis. As mudanças institucionais novamente foram fundamentais para permitir a realocação de
abriu o caminho para a expansão do crédito e dos investimentos imobiliários. O tripé macroeconômico herdado do segundo governo Fernando Henrique Cardoso
dois governos do Presidente Lula, deu sustentação ao crescimento do crédito
A política de elevação real do salário mínimo em cerca de 40% acima da
da massa salarial brasileira, com maiores impactos entre os trabalhadores de renda mais baixa, reduzindo a desigualdade salarial e ampliando o acesso desses segmentos da população ao mercado de bens de consumo. Após duas décadas de elevação do desemprego e de ampliação do peso do segmento informal,
62 O sucesso obtido com estabilização monetária teria sido maior não fossem os graves erros de estra-tégia cometidos: a experiência internacional e a teoria econômica relevante recomendam que a abertura
anos 1992-3, seguida por uma rápida abertura comercial, o que levou a uma rápida valorização cam-bial, ampliando a pressão competitiva sobre a indústria. A abertura externa, funcional para o controle
mobiliário do setor público que se encontrava no patamar de 27% do PIB no lançamento do Plano Real,
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observou-se na década de 2000 um processo de reestruturação do mercado de trabalho brasileiro, o qual se traduziu na redução da taxa de desemprego e no aumento da formalização da força de trabalho ocupada.
A expressiva ampliação dos programas de transferência de renda,
efetiva no que diz respeito à redução da desigualdade, contribuiu para melhorar a segurança alimentar e o acesso à educação básica de milhões de famílias, especialmente nas regiões Nordeste e Norte do país. A ampliação e capilarização
como nova classe C .
No front externo, em um contexto de expansão da liquidez internacional (sustentada na política monetária anticíclica norte-americana), destacou-se o vertiginoso ciclo de industrialização chinês, que impactou os mercados de
agrícolas e minerais, levando a uma valorização dos termos de troca
Pode-se descrever um ciclo expansivo do centro dinâmico da economia
qual a economia brasileira se conectou ao mercado internacional de forma privilegiada - registrou-se, no interregno 2002 a 2008, uma triplicação do valor das exportações brasileiras, ao mesmo tempo em que a China se transformou no principal parceiro comercial brasileiro.
Ao contrário do ciclo expansivo anterior, observou-se na última década um recuo no processo de substituição de importações. As exportações de manufaturados, que constituíam cerca de 2/3 da pauta no início da década
também um expressivo crescimento da penetração das importações na estrutura industrial brasileira, concomitante a uma redução dos efeitos multiplicadores
63 O controverso argumento sobre o surgimento de uma nova classe média no Brasil na última década deve ser pontuado pelo fato de que a esmagadora maioria dos componentes deste segmento emprega-ram-se nos subsetores da construção civil e de comércio e serviços, com rendimentos médios concen-trados no intervalo entre 1 e 2 salários mínimos. Sobre o debate em torno do surgimento de uma nova classe média no Brasil ver, entre outros: NERI (2008) e POCHMANN (2012).
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teria como fatos marcantes a revolução da internet e a emergência da China como potência industrial,
subprime nos EUA.
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dos investimentos, em função do crescimento da participação das importações de máquinas, equipamentos e insumos industriais no valor dos novos projetos em instalação no país.
de importantes cadeias produtivas na estrutura industrial brasileira, a exemplo dos segmentos da eletroeletrônica, mecânica, química e têxtil, o que coloca
expansivo um departamento D1 (de bens de capital) integrado e resiliente.
No que tange à natureza do ciclo de crescimento da última década, é importante observar que o mesmo se sustentou, além do dinamismo das exportações líquidas, em um acelerado crescimento do consumo doméstico, tanto do setor privado, quanto do setor público. O investimento agregado registrou
a 18% no período, incapaz de promover o desejável crescimento sustentando no longo prazo.
imobiliária nos EUA e com profundos impactos nos países no centro dinâmico da economia mundial, veio para interromper o período de bonança no comércio internacional, com uma abrupta redução da taxa de crescimento dos países avançados, avanço do desemprego e volatilidade nos mercados de capitais. O cenário tornou-se menos favorável ao Brasil, cuja taxa de crescimento
cenário de menor liquidez internacional (redução dos estímulos monetários nos
se completará somente após o encerramento das eleições gerais de 2014, em
Neste cenário, a partir do inevitável ajuste da relação câmbio-salário, novamente se acionará um processo de substituição de importações, cuja intensidade e extensão, dependerão da capacidade de fazer operar no Brasil do próximo quinquênio a transferência de recursos dos setores com excesso de capacidade (complexos industriais primário-exportadores e seus respectivos
Destacam-se, dentre os setores subinvestidos, retomando o diagnóstico
pública, a exemplo do segmento de transportes (rodovias, ferrovias e hidrovias), logística (portos, aeroportos) e armazenamento (silos e centrais de distribuição
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de grãos). O setor de saneamento ocupa lugar de destaque dentre os setores subinvestidos, constituindo um segmento de enorme carência no país e com potencial para absorver expressivo contingente de mão de obra, não esquecendo os enormes impactos sobre cadeias minero-metalúrgicas e de construção civil.
Na agenda reposta das concessões dos serviços de utilidade pública à iniciativa privada, os parâmetros apontados por Rangel continuam válidos. Seja qual for a estratégia escolhida em cada segmento, é necessário que se busque um modelo tarifário que permita cobrir as despesas correntes, amortizar o imobilizado e remunerar as concessionárias de acordo com as taxas de retorno
prazo ou buscar determinar a taxa de retorno dos concessionários, a experiência recente demonstrou de forma cabal, são caminhos para inviabilizar ou sabotar a realização dos investimentos pretendidos.
Não é demais frisar que para Rangel a prática de realismo tarifário era de grande importância para o sucesso das concessões dos serviços de utilidade pública. Neste sentido, a prática de , a exemplo do subreajustamento dos preços dos combustíveis praticado nos anos recentes
Programa do Etanol) e do corte das tarifas de energia elétrica (pela geração de
grandes incertezas com relação ao valor presente dos investimentos e deve ser colocado no rol das práticas testadas e rejeitadas.
Os ensinamentos do mestre Ignacio Rangel sobre a economia brasileira continuam atuais e fecundos e suas ideias sobre a concessão de serviços de utilidade pública às empresas privadas permanecem válidas na conjuntura atual e devem ser retomadas e debatidas. A viabilização de um bloco de investimentos nos serviços de utilidade pública atuará como fator compensador dos efeitos sobre a economia brasileira do ciclo atual de desaceleração da economia
A incorporação desses investimentos fará do Brasil um país mais integrado, competitivo e dotado de cidades mais justas e sustentáveis.
CRUZ, P. D. anos 70
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In: HOLANDA, F. M. (Org.). . São Luís: IMESC/SEPLAN, 2013.
NERI, M.C. . Rio de Janeiro: FGV/IBRE, CPS, 2008. Disponível em: http://www.fgv.br/cps/classe_media (acesso em 18 de junho de 2012)
POCHMANN, M. brasileira. São Paulo: Boitempo Editora, 2012.
– Volume 1 (organização de Cesar Benjamim). Rio de Janeiro: Contraponto: Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento, 2012.
– Volume 2 (organização de Cesar Benjamim). Rio de Janeiro: Contraponto: Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento, 2012.
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Convergências entre Ignacio Rangel e
uma análise com base em Lênin
Apresentação
convite, ao Jhonatan Almada, do Departamento de Desenvolvimento do Ensino de Graduação, da Pró-Reitoria de Ensino da Universidade Federal do Maranhão, que já tinha um texto pronto, escrito no início dos anos 2.000, mas ainda inédito,
Dei uma lida no material, achei que o texto estava bom e que era só fazer
o natal e ano novo, quando estaria em férias, num local aprazível, no interior de Minas Gerais, com a condição de trabalho que a obra de um Mestre como o Rangel merece. Isso foi importante.
na minha vida acadêmica. Foi uma parte fundamental na minha Dissertação
diagnósticos nela tratados. Analisada por uma banca composta pelos Profs. Drs. André Montoro Filho (orientador), José Roberto Mendonça de Barros e Luiz Carlos Bresser Pereira, foi aprovada com nota dez com Distinção. Hoje essas menções
aprovado. Uma mediocridade acadêmica consentânea com a mediocridade
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da fase monopólica do capitalismo. Basta mostrar destreza na aplicação de um modelo. Para um velho como eu, no entanto, aquelas coisas ainda têm importância, ainda estão na memória e Ignacio Mourão Rangel, portanto, ainda é uma referência fundamental, inclusive pela argúcia teórica e política, pela
o resultado que estava obtendo. Comecei a conjecturar que o texto original estava
iniciados nos temas ali tratados. Não me parece conveniente que um texto em
A tática original começou a me parecer mais didática: primeiro mostrar o
deles ao consenso. Finalmente mostrar como essas críticas estavam de acordo
Introdução. Não estou em competição por número de publicações estimulada
interessado apenas na compreensão dos alunos.
O texto que se segue é fruto de uma pesquisa no estágio probatório do Regime de Dedicação Integral à Docência e à Pesquisa (RDIDP) na Universidade de São Paulo (USP). Ele seria um dos quatro capítulos de uma futura Tese de Livre Docência, todos tendo como matriz teórica os trabalhos do Lenin. O impedimento ao meu acesso, como professor, ao curso de pós-graduação em economia fez
agora. A única mudança aqui promovida foi no título. Antes era “Sobre as teses
A pesquisa e o texto em que ela se consubstanciou e está aqui sendo apresentado é uma continuidade do esforço desenvolvido na minha Tese de Doutorado (Um estudo sobre Lenin e as defesas da reforma agrária no Brasil,
Brasil com base nos trabalhos de Lenin.
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O texto está dividido em três partes. A primeira, curta, mostra o consenso entre notórios autores de que a agricultura brasileira entravava o desenvolvimento do país. Nomes famosos faziam parte dele. Note-se, no espectro político
(Notas sobre Problema Agrário) e Mário Alves (Dois Caminhos Para a Reforma Agrária). Note-se, no espectro teórico estruturalista, Celso Furtado (Plano Trienal
enfoque estruturalista está presente até no Programa de Ação Econômica do
espectro político e os nomes famosos que faziam parte do consenso ao qual
mestres.
se opuseram a esse discurso consensual, negando-o ponto por ponto. Eles negaram que a agricultura não respondia aos preços do mercado, negaram que a oferta agrícola era inelástica. Eles negaram que a agricultura atrapalhava o desenvolvimento da indústria. Eles negaram que faltasse ao país uma revolução agrícola e/ou agrária. Eles negaram que a agricultura tivesse qualquer
que houvesse qualquer perspectiva estagnacionista para a economia brasileira.
Para os não iniciados nessa literatura é surpreendente essa convergência
brasileiro. Mais surpreendente para esses não iniciados é ver que tais opiniões obedecem a uma matriz teórica em estreita concordância com a do Lenin. Sim, a ditadura começa com uma matriz econômica pequeno-burguesa (Roberto Campos) e só depois se revela comprometida com a grande produção capitalista
se imagina marxista e leninista.
A terceira parte mostra, em primeiro lugar, que a convergência entre
entendem o relacionamento entre a cidade e o campo no desenvolvimento
entendem que o movimento da transformação da economia se dá da cidade para o campo e não do campo para a cidade. É a cidade que transforma o campo. Essa terceira parte, em segundo lugar, mostra que havia, entre Rangel e
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representava os interesses da grande burguesia progressista. O consenso ao que eles se opunham representava o interesse da pequena burguesia. Um confronto que foi tão bem descrito por Lenin no embate contra os populistas russos e em
sistema quando ele esgotou suas potencialidades e, sendo assim, defender os interesses da pequena burguesia era atrasar esse esgotamento e, portanto, a chegada da revolução socialista. A terceira parte, em terceiro lugar, sugere que a diferença entre Rangel e os demais notórios marxistas também está em que estes, ao que parece, subestimavam a capacidade do capitalismo para submeter formas sociais pretéritas e/ou superestimavam a capacidade para, no Brasil, se
que se vê como marxista.
O encerramento do texto se dá, propositalmente, de forma abrupta, com uma citação, sem complementos escritos por mim. A intenção de tal encerramento é deixar marcado para o leitor uma citação do Mestre Ignacio Mourão Rangel que sintetiza o que foi tratado.
Consenso: o campo entravava o desenvolvimento da economia brasileira
pessimismo quanto ao futuro da economia brasileira. O desempenho da agricultura era visto como tendo um papel fundamental na formação desse
desenvolvimento da agricultura retardava o desenvolvimento da indústria.
Este diagnóstico estava presente em diversos autores marxistas, dos quais o mais famoso, talvez, seja Alberto Passos Guimarães que, no texto clássico
Em primeiro lugar, porque o sistema latifundiário feudal-colonial está constituído para exportar toda a sua produção e ao fazê-lo, por
cedendo-se aos trustes internacionais. Para que tal mecanismo de sucção funcione sem prejuízo da parte que cabe à classe latifundiária, esta transfere, para seus trabalhadores e para a população do país
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onde se situa, os ônus decorrentes desse processo de expoliação. Em segundo lugar, porque o sistema latifundiário feudal-colonial exige, como peça inseparável de seu mecanismo, a organização de uma rede de intermediários-compradores e intermediários-usuários que atuam no sentido de facilitar a transferência da parte dos lucros especulativos para as mãos dos trustes internacionais, como no sentido de ainda mais reduzir a remuneração dos trabalhadores agrícolas ... E em terceiro lugar, porque todo esse aparelho pré-capitalista de produção e distribuição, à medida que promove a evasão de parte da renda gerada para o exterior, descapitaliza o país e limita o desenvolvimento industrial; e, à medida que comprime o poder aquisitivo das massas rurais, limita a expansão do mercado
O mesmo diagnóstico estava presente em outros autores marxistas,
A revolução agrária no Brasil de nossos dias é um imperativo. Forças
da há muito ultrapassada estrutura agrária que herdamos do Império e que a República Feudal-Burguesa timbrou em conservar. Estas forças são: a) as massas dos sem-terras e os proprietários aparentes; b) os operários das cidades vítimas diretas de uma agricultura atrasada que entrava o desenvolvimento da indústria e
de consumo; c) os industriais, interessados particularmente na elevação do poder aquisitivo de mais de 40 milhões de brasileiros que vivem no campo e que não podem comprar não somente rádios, televisores, máquinas de costura, mas nem mesmo roupas e sapatos; d) os agricultores capitalistas, que reclamam terra barata
e estava presente em autores como Mário Alves que, no texto intitulado “Dois
o desenvolvimento econômico do país contribui para agravar, em escala considerável, a contradição entre as forças produtivas e o monopólio da propriedade da terra pelos latifundiários. O crescimento da indústria, dos serviços e da população urbana exige um aumento rápido da produção de alimentos e matérias-
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primas, reclamando imperiosamente a exploração das terras dos latifúndios e a elevação da produtividade do trabalho agrícola.
de 135% em termos reais, o produto agrícola aumentou de apenas 42%. A expansão da indústria impõe, paralelamente, a ampliação do mercado interno mediante a elevação do poder aquisitivo da
O diagnóstico da agricultura entravando o desenvolvimento da indústria estava presente mesmo em autores não marxistas, como Celso Furtado que, no
“Desfalcado de parcela substancial do seu excedente de produção, que o coloca em contato com a economia de mercado, monetária, o camponês sem terras não consegue elevar o seu padrão de vida e
a expansão do mercado de produtos industriais, nem tampouco
ou da adoção de técnicas mais elaboradas de exploração da terra.
a agricultura entravava o desenvolvimento da indústria e, consequentemente, do país. Roberto Campos, num documento elaborado para explicar o relacionamento entre o Programa de Ação do Governo do Marechal Castelo Branco e as Reformas de Base do Governo João Goulart, intitulado “O programa de ação e as reformas
O quadro se completa pela precariedade das condições do meio agrário: uma elevada percentagem da população dependente da atividade agrícola; níveis de tecnologia e de mecanização bastante reduzidos; pequena área cultivada por trabalhador ocupado; condições de vida das mais precárias, no que se refere a habitações, educação e nível sanitário. Por isso mesmo, é reduzidíssima a produtividade per capita no meio rural brasileiro, bastando que se atente para a seguinte relação: no Brasil, um indivíduo ativo
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na agricultura provê alimentos para cinco outros, enquanto que na França, Canadá e Estados Unidos, a mesma relação é de um para dez, um para vinte e um para trinta, respectivamente. ... “O problema vem se agravando agudamente com a crescente industrialização do país e com a concentração populacional nos grandes centros urbanos. Toda essa população, absorvida no trabalho urbano, cria exigências cada vez maiores de suprimento de alimentos, demandando uma organização mais sistematizada de sua produção, transporte e distribuição. Em contraposição, o crescimento da produção industrial gera a necessidade de alargamento do mercado consumidor, ou seja, a incorporação de novas áreas da população no consumo de produtos industriais, que se pode obter pela elevação dos padrões econômicos da população rural, facultando-lhe poder aquisitivo para acesso aos produtos manufaturados (PAEG e as reformas, pp. 124 e 125).
Contra essa corrente predominante no cenário nacional de então, dois autores que se tornaram ícones entre os economistas se levantaram: Ignacio
marxista. O esforço dispendido no estudo da obra desses autores, investigando os pontos de coincidência e de divergência, buscando uma explicação para eles, constitui o presente capítulo
A crítica do consenso
ser sintetizado na seguinte maneira: em razão da ausência de uma revolução/modernização no campo, a agricultura crescia extensivamente, constituindo-se num setor que não respondia aos preços, tinha uma oferta inelástica, retardava o crescimento da indústria.
A estratégia de exposição, aqui adotada, será a de começar por apresentar os argumentos que questionam a alegada falta de resposta, da agricultura, aos preços, contestar a existência da citada inelasticidade de oferta agrícola. O passo seguinte será o de apresentar os argumentos que contestam a proposição de que o crescimento da agricultura não acompanhava as necessidades do
mostrar o equívoco da proposição sobre a necessidade de uma revolução agrícola/agrária, mas os dois autores em tela apresentam outros argumentos contra essa proposição e eles serão aqui reproduzidos.
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Os diagnósticos desses autores serão, então, apresentados na seção seguinte. O capítulo será concluído com uma seção mostrando as perspectivas que esses autores vislumbravam para a economia brasileira.
A falta de resposta aos preços?
Seminário de Economia Brasileira realizado na FEA/USP, intitulado a “Agricultura
(27,8% a.a.) e recebidos pelo produtor rural (24,5% a.a.) como indicadora do atraso relativo da agricultura.
Uma contestação, de ordem puramente estatística, dizia que essa
Uma contestação, de ordem econômica, dizia que essa diferença podia
da produção agrícola:
A prova em si mesmo é falha quando se sabe que nos últimos dez anos houve uma verdadeira revolução na comercialização dos produtos agrícolas e que quase todos eles são fornecidos aos
Netto, Agricultura no PAEG, p. 285).
que os estruturalistas ignoravam um problema fundamental, o da estava na existência de um cartel comercializador de produtos agrícolas. O sucesso desse cartel só era possível devido à existência de grande elasticidade de oferta e baixa elasticidade de demanda:
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Os estruturalistas explicaram a elevação autônoma dos preços pela existência de certos pontos de estrangulamento na economia, notadamente pela e pela inelasticidade da oferta do setor agrícola. Noutros termos, o problema estaria na estrutura da oferta do sistema econômico – donde o nome da escola – ou para usar a expressão dos economistas marxistas, na composição natural do produto social (Rangel,
Ao estudarem a inelasticidade da oferta de produtos agrícolas, os estruturalistas tomaram a nuvem por Juno. Concretamente, o que há é que, em numerosos casos, a agricultura não reage à elevação dos preços ocorrida no , por um aumento
agrícola, mas, simplesmente, que a comercialização dos produtos em causa é feita através de um oligopsônio-oligopólio, que opera como se monopsônio-monopólio fosse, e que intercepta, no nível do
impedindo que êste chegue ao produtor. Trata-se de uma anomalia no mecanismo de formação de preços e não de inelasticidade da oferta agrícola. Ao contrário, para que êsse mecanismo funcione, é necessário que a oferta agrícola seja, não sòmente elástica ao preço – entenda-se, ao preço para o produtor agrícola – mas muito elástica. O aparelho comercializador oligopsonista-oligopolista não poderia, de modo algum, operar, não fora contar com uma virtual rigidez da demanda de gêneros agrícolas, especialmente
Em suma, a diferença entre os preços pagos pelo consumidor e recebidos
Rangel, pela interferência do cartel de comercialização dos produtos agrícolas.
Agricultura retarda o crescimento da indústria?
ao argumento da diferença de taxas de crescimento setorial para explicar o caso brasileiro pois o próprio PAEG reconhecia que “
diferença de taxas de crescimento setorial, além do mais, não suportava a tese
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de atraso da agricultura pois correspondia à diferença entre as elasticidades renda da demanda por cada um desses setores:
agrícola se expandiu 5% ao ano e o setor industrial, 12,5% ao ano. Indicam essas taxas uma disparidade tão surpreendente para
‘crescimento harmônico’, as taxas deveriam estar entre si como estão as elasticidades-renda das demandas de produtos agrícolas e industriais. Ora, a relação entre as taxas é de 1:2,5. Segundo o
é quase certo que eles estão entre si em proporção parecida com essa. De fato, as elasticidades-renda da demanda de produtos agrícolas da ordem de 0,5 (citada no Programa) e a demanda de
Agricultura no PAEG, pp. 282 e 283).
que, pela natureza de cada um desses setores, o efeito multiplicador é maior na
crescimento maiores na indústria do que agricultura:
(...) podemos conceber a industrialização como o conjunto de transformações tecnológicas, econômicas e jurídicas por que passa a economia de um país, no esfôrço para transferir essa produção industrial, do interior da fazenda agrícola, para estabelecimentos especiais ou fábricas, com o resultado de multiplicar muitas vêzes a produção que se pode obter de cada hora de trabalho. Não se trata, pois de roubar tempo às atividades pròpriamente agrícolas, mas às atividades não agrícolas da agricultura. ... Além disso, para que a produção se possa fazer nas novas condições (com maior produtividade agrícola), urge criar serviços especiais, como o transporte, já referido, construir cidades para alojar a população deslocada (do campo para a cidade), dotá-la de facilidades dispensáveis nas condições de vida rural, mas indispensáveis nas condições de vida urbana. Tudo isso representa uma formidável
êsses recursos é de natureza essencialmente industrial, não agrícola, e isso faz com que a produção não agrícola tenda a crescer muito mais ràpidamente do que a produção agrícola, durante todo o processo de industrialização (Rangel, Industrialização, pp. 248 e
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Em suma, a maior velocidade de crescimento da indústria, vis a vis a
elasticidades renda de cada setor e, por Rangel, como resultado da diferença entre o multiplicador dentro de cada setor.
Falta de uma revolução agrícola/agrária?
exógeno no campo, para incentivar o desenvolvimento da agricultura brasileira:
(...) o Brasil não precisava de nenhuma revolução agrícola, uma vez que o setor primário desde o início do processo liberou
foi um instrumento dúctil na transferência de recursos para o setor secundário e terciário. Em nenhum momento do desenvolvimento econômico brasileiro, pode-se reconhecer forças inibidoras poderosas derivadas do setor agrícola. Com tal passividade e respondendo com relativa rapidez aos estímulos externos (tanto do
Após lembrar que, na ausência de pesquisas genéticas mais intensas e de produção de sementes selecionadas mais intensas, em razão da ausência de
nem sempre o ganho de produtividade obtido com adubos e inseticidas é maior
Netto apresenta o que considera o principal fator explicativo da racionalidade privada do crescimento extensivo da agricultura brasileira:
sendo o fator terra relativamente abundante, a forma mais econômica de aumentar a produção para o empresário privado é combinar terra
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tinha explicações apenas na racionalidade privada. No já citado “Agricultura no
de crescimento:
produção pela extensão da área, a agricultura aumenta o emprego quase na mesma proporção, absorvendo o excedente de mão-
é conveniente para o país é evidente, quando se considera que a produtividade marginal do capital é mais elevada no setor industrial do que no setor agrícola e quando se lembra que neste setor existe mais possibilidade de aplicação de técnicas poupadoras de capital
Uma unidade de capital que possa ser utilizada alternativamente na agricultura ou na indústria, deve ser aplicada no segundo setor. De fato, utilizando o capital no setor industrial criamos emprego urbano e aumentamos a demanda de produtos agrícolas, sem prejudicar em nada a produção, porque pode-se supor que a produtividade marginal do trabalhador (ainda que não a produtividade marginal do trabalho) seja nula. Utilizando essa unidade de capital no setor agrícola temos que se libera mão-de-obra (que não encontra emprego urbano), mas não se aumenta a produção global: substitui-
não apenas que se maximize a produtividade marginal do capital, mas também a taxa de utilização de mão de obra, dois resultados altamente desejáveis em qualquer caminho de expansão para o
industrialização sem ter necessitado reformar, previamente, as relações sociais no campo:
O Brasil empreendeu sua industrialização, sem previamente remodelar as relações de produção na agricultura. Daí resulta que, acima das contradições internas do seu setor capitalista (entre o capital e o trabalho) e do seu setor feudal (entre o latifúndio feudal e a servidão da gleba), paire a contradição entre o seu lado
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moderno, isto é, capitalista, e o seu lado arcaico, isto é, feudal
Com efeito, o pacto fundamental de poder estabelecido em
latifúndio saído da Abolição da escravatura e da I república, com o capital industrial nascente, surgido por um efeito de diferenciação do antigo capital comercia. Essa coalizão de classes, que preside
econômica no fato de que a criação do capital industrial, nos quadros de um esfôrço de substituição de importações, oferecia condições propícias para uma ampla formação de capital, relativamente independente da expansão do consumo global e do preço da mão-de-obra. Noutros têrmos, havia condições para a industrialização, sem prévia mudança na estrutura agrária – circunstância esta que situamos na origem de tôda a nossa presente problemática
desenvolvimento, apenas moldado-o numa maneira peculiar. O caminho do desenvolvimento do capitalismo, no campo, não fora o de assegurar as condições para o surgimento de uma policultura mercantil, capaz de assegurar uma ocupação estável do solo. No jargão moderno, o problema estava em que o desenvolvimento do capitalismo, no campo brasileiro, não fora de acordo com
com a penetração do capitalismo no campo – através da conversão direta do latifúndio feudal em latifúndio capitalista – desmantelam-se as bases da policultura feudal (nos quadros da ocupação estável da terra característica da servidão da gleba, sob tôdas as suas formas) sem o aparecimento de condições para uma policultura mercantil (nos quadros da pequena propriedade independente, capaz de assegurar, também, a ocupação estável
Crise dos anos 1960
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do capitalismo que teriam suas origens no atraso da agricultura. O desempenho medíocre da economia brasileira era resultado da política econômica adotada.
Numa apostilha de sua autoria, elaborada para a cadeira XXV Economia IV, no curso de economia da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA/USP), aqui referida como Agricultura no PAEG,
mas essa estratégia, ao ser implementada, “
a
da economia brasileira era resultado do superinvestimento na indústria, generalização da capacidade ociosa na indústria. Um resultado temporário,
preparado institucionalmente para receber os investimentos:
Com a revelação de capacidade ociosa em quase todos os setores já institucionalmente preparados para receber investimentos, eis que o problema ressurge. As medidas estruturadas em tôrno da Instrução 204 da SUMOC prepararam mais algumas oportunidades de inversão no campo da iniciativa privada cuja efetivação, juntamente com a criação do enorme capital de giro necessário à operação das indústrias recém-criadas, produtoras de bens duráveis, tanto de consumo, como de investimento, absorveu momentâneamente os crescentes recursos disponíveis, Mas era evidente desde havia algum tempo, que êsse <<estoque>> de oportunidades de inversão caminhava para o esgotamento e que, portanto, a sociedade brasileira seria confrontada com um período crítico, que levantaria numerosos problemas, alguns maduros para a solução, e outros não. O primeiro desses problemas são os que se referem à preparação de nôvo grupo de oportunidades de inversão, graças às quais a taxa de formação de capital deve voltar a elevar-se, ao passo que os segundos são os que põem em causa o próprio esquema fundamental entre cujos marcos se vem desenvolvendo a
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Perspectivas para a economia brasileira
Inc. e pela Fundação Getúlio Vargas, aqui referido como Advertisinga Council
mercado e a expansão da infra-estrutura econômica permitiam a realização de investimentos com elevada relação capital-produto e, consequentemente, não havia qualquer perspectiva estagnacionista para a economia brasileira:
Atualmente a economia brasileira apresenta-se já com uma
industriais quer produtores de bens de consumo, quer produtores de bens de produção. As dimensões dos projetos foram extremamente ampliadas e a possibilidade de produzir internamente os bens anteriormente importados apresenta-se, agora, com grande plenitude. Mais ainda, existe uma infra-estrutura em forte expansão,
Advertising Council / FGV-RJ, p. 22)
volta a salientar as perspectivas otimistas para a economia brasileira. O tamanho do mercado interno comportava vultosos investimentos, gerando economias de escala para permitir o acesso da produção doméstica ao mercado internacional que, por sua vez, expandia o próprio mercado interno e viabilizava novos e vultosos investimentos:
Um país com as dimensões do Brasil, com um elevado mercado de consumo gerado por um nível de renda bastante elevado em determinadas áreas, e por uma população já bastante grande,
que extensos setores industriais possam instalar-se produzindo a custos competitivos ... o Brasil possui condições necessárias para um desenvolvimento auto-sustentável, com base na ampliação do seu mercado interno. Mais ainda, a expansão do mercado interno cria condições favoráveis de competição no mercado internacional, mercado esse que poderá constituir, em futuro próximo, nova fonte de dinamismo do desenvolvimento. Por outro lado, é evidente que a ampliação do mercado externo é condição básica para a própria
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utópicas, de reforma agrária, lembrava as potencialidades de crescimento da economia brasileira:
Esse estado de coisas somente esgotará suas virtualidades
também se houverem esgotado as condições para a expansão do investimento, isto é, para a absorção da crescente massa de mais valia que o aumento da produtividade do trabalho, não
ninguém pretenderá que a economia brasileira, dados os seus presente níveis e dinamismo da renda e da demanda global, já esgotou todas as suas oportunidades de investimento (Rangel,
Ora, conservado o atual pacto fundamental de poder que é a essência do Estado brasileiro, é possível, como o demonstraremos,
políticas e jurídicas para a efetivação de nova e ampla demanda de capital capaz de absorver parte decisiva da mais valia disponível ou em perspectiva. Consequentemente, é isso o que está na ordem natural das coisas, e é isso o que nos deve ocupar. Fora daí caímos em pleno reino da utopia e, julgando servir aos interesses da sociedade e das massas trabalhadoras brasileiras, apenas os estaremos desservindo, desunindo e impelindo a Nação
grifo no original)
Haviam inúmeros campos virgens para serem explorados pelos investimentos, faltando apenas prepará-los institucionalmente. O fantasma da estagnação não rondava a economia brasileira:
brasileira corresponde a um mecanismo de defesa do sistema econômico, contra a depressão econômica, agravando-se sempre que esta nos ameaça, quando se esgotam as oportunidades de inversão suscetíveis de utilização. Vimos, também, que se trata de um arranjo extremamente feliz, visto como os inconvenientes da
econômica – são incomensuràvelmente menores do que as devastações que costumam acompanhar a depressão econômica. Finalmente, considerando que a escassez de oportunidades de
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inversão tende a ser temporária, aguardando apenas que se tomem as medidas destinadas a preparar novos campos virgens ou pouco explorados para investimentos, são escassas as possibilidades de
regredir, tão prontamente quanto preparemos êsses novos campos de inversão – assunto que trataremos no próximo capítulo (...)
da investigação sobra a raiz das coincidências e das divergências entre esses autores.
Relação campo-cidade no processo de desenvolvimento
Um ponto central na discussão da relação cidade-campo no processo de desenvolvimento é a direção da causação: se ela vem do campo para a cidade ou vem da cidade para o campo.
agricultura, promovida pelo capitalismo:
Este capítulo nos oferece um esboço extraordinariamente claro, conciso e cabal da gigantesca revolução levada a cabo na agricultura pelo capitalismo, ao converter o rotineiro ofício de camponeses humilhados pela miséria e esmagados pela ignorância em aplicação
agricultura e ao imprimir (e continuar imprimindo) um impulso ao rápido desenvolvimento das forças produtivas do trabalho social. O sistema de três campos foi substituído pela rotação das culturas, melhoraram a criação de gado e o trabalho da terra, aumentaram as colheitas e tomou grande desenvolvimento a especialização da agricultura, a divisão do trabalho entre as múltiplas explorações. A uniformidade pré-capitalista foi substituída por uma diversidade cada vez maior, acompanhada pelo progresso técnico de todos
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os ramos da agricultura. Iniciou-se e se desenvolveu rapidamente a mecanização da agricultura, a aplicação do vapor; começa-se a utilizar a eletricidade, que na opinião dos especialistas virá a desempenhar um papel mais importante que o vapor neste setor da produção. Desenvolveram-se a construção de caminhos de acesso, os trabalhos de melhoramento do solo e o emprego de fertilizantes
vegetal; começou-se a aplicar a bacteriologia à agricultura (Lênin,
O ponto relevante para o presente é que o motor dessa revolução, promovida pelo capitalismo, na agricultura, é a concorrência, que aprofunda a divisão social do trabalho, levando à especialização e ao crescimento das cidades, expandindo a demanda para a produção agrícola:
ao crescimento do mercado (em particular ao crescimento das cidades), à subordinação da agricultura à concorrência que impôs a transformação da agricultura e sua especialização (Lênin, Livro de
O tema da transformação do campo promovida pela cidade também está presente num texto escrito sobre o desenvolvimento do capitalismo na agricultura norte-americana, intitulado “Capitalismo e agricultura nos Estados unidos da América: novos dados sobre as leis de desenvolvimento do capitalismo
texto Lênin chama a atenção que “
mercantilno crescimento da produção dos mesmos produtos e sim numa alteração na composição da produção:
não segue, de forma alguma, a via ‘simples’ imaginada ou suposta pelos economistas burgueses, e que consistiria no crescimento da produção dos mesmos produtos. Não. O desenvolvimento da agricultura mercantil consiste, com maior frequência, na passagem de uma determinada produção à outra. A passagem da produção do feno e dos cereais à dos legumes insere-se precisamente nestas transformações em
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Essa mudança na composição da produção, essa passagem da produção de feno e cereais para a de legumes, era resultado da alteração na composição da demanda, promovida pelo desenvolvimento do capitalismo nas cidades:
Em todos os países capitalistas o desenvolvimento das cidades, fábricas, cidades industriais, terminais ferroviários, portos etc., provoca uma demanda crescente de produtos deste gênero (legumes), faz subir seus preços, aumenta o número de empresas agrícolas que os produzem para a venda (Lênin, Agricultura nos EUA,
Na introdução a este capítulo foram expostas teses endossadas por autores neoclássicos (PAEG), estruturalistas (Celso Furtado) e marxistas
desenvolvimento industrial causado pelo retardamento do desenvolvimento agrícola. Em todas essas exposições a propulsão para o desenvolvimento está no campo, a direção da causação é do campo para a cidade. O limite para o desenvolvimento da cidade, portanto, é dado pelo campo.
Na primeira seção deste capítulo foram apresentados argumentos,
preços recebidos pelo produtor rural indiquem a existência de inelasticidade da oferta agrícola, que a diferença nas taxas de crescimento setorial indiquem a existência de atraso relativo na agricultura, negando, por conseguinte, que a falta de uma revolução agrícola/agrária cause impecilhos para o desenvolvimento do país.
Netto contestam os mesmos pontos, mas com argumentos diferentes. O que
Apesar das matrizes teóricas absolutamente distintas, a matriz
coincidem num ponto fundamental: a propulsão para o desenvolvimento vem da cidade para o campo; o sentido da causação é da cidade para o campo; o limite para o desenvolvimento do campo, portanto, é dado pela cidade. Um ponto interessante a registrar é que essa concepção da relação cidade-campo,
dos estruturalistas e de outros marxistas.
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comércio exterior:
(...) é extremamente duvidoso que se possa superar o impasse da falta de mercado (para a indústria) por uma ampliação da demanda agrícola. Seria, de fato, a primeira vez na história que teríamos uma aceleração do desenvolvimento (não propiciado por uma ampliação do comércio exterior) com uma ampliação do setor primário. Como é claro, uma indústria de massa, exige uma sociedade de massa e não é razoável supor que tal possa realizar-se sem um intenso processo
para o desenvolvimento da agricultura estava no desenvolvimento da indústria:
O grande problema da agricultura brasileira é o aumento da sua
sem criar para si mesma, problemas de preço. Em outras palavras, o grande problema da agricultura brasileira é o ampliar-se ainda mais
O ponto central é a inelasticidade preço da demanda pelos produtos agrícolas, que faz com que os ganhos de produtividade gerados na agricultura sejam repassados para o consumidor:
Dada a conhecida inelasticidade-preço da demanda de produtos alimentícios, isso terá de provocar uma redução de seus preços relativos, a não ser que a demanda aumente rapidamente. O aumento de produtividade, será, então, transferido para os centros urbanos na forma de salários reais mais elevados e na forma de um aumento do lucro do setor comercial (devido à oligopolização do
Essa transferência de ganhos de produtividade da agricultura para os setores secundário e terciário, mediante a queda nos preços relativos, só não aconteceria se houvesse “centros urbanos
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despeito do violento crescimento da produção industrial, da renda per capita e da urbanização, o comportamento dos preços industriais e do preço no atacado dos produtos agrícolas indicavam que “a oferta (agrícola)
Diante desses fatos o que se deve esperar de uma ampliação da
agricultura, isto é, a transferência dos ganhos de produtividade para o setor secundário e terciário. O efeito indireto seria, portanto, o da liberação do poder de compra das classes urbanas (que gastariam relativamente menos com alimentação) e uma pequena ampliação da demanda dos bens de consumo duráveis por elas consumidos (p. 270)
Chegamos assim, à conclusão de que a ideia de fazer o desenvolvimento econômico realizar-se por uma elevação da produtividade dentro do próprio setor agrícola equivale a alguém querer levantar-se pelos próprios cabelos. Para que a agricultura possa melhorar seu nível de produtividade é preciso que receba um impulso dinâmico da demanda do setor exportador ou do setor
como o processo de transferir, da fazenda para a cidade, as atividades que
de transformações que não são exclusivamente econômicas mas também tecnológicas e jurídicas:
(...) podemos conceber a industrialização como o conjunto de transformações tecnológicas, econômicas e jurídicas por que passa a economia de um país, no esforço para transferir essa produção industrial, do interior da fazenda agrícola, para estabelecimentos especiais ou fábricas, com o resultado de multiplicar muitas vezes a produção que se pode obter de cada hora de trabalho. Não se trata, pois de roubar tempo às atividades propriamente agrícolas, mas às atividades não agrícolas da agricultura (Rangel, Industrialização, p. 248).
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A agricultura, nesse processo de transferência de atividades, precisa gerar um excedente de produção agrícola e liberar mão-de-obra:
A industrialização confronta a agricultura com um duplo problema: ao mesmo tempo exige dela que aumente sua oferta de bens agrícolas e que libere parte da mão-de-obra que ocupa (Rangel, Industrialização, p. 248).
A limitação a esse processo não estava na própria agricultura e sim na indústria, não estava no campo, mas na cidade:
Para que a indústria possa efetivamente substituir a agricultura na tarefa de converter os produtos primários em produtos acabados, deve não apenas acumular um capital importante, como principalmente um capital constituído por bens de natureza especial – máquinas e instalações de tipo diferente das anteriormente usadas (em âmbito rural). Isso implica em dizer que o ritmo de desenvolvimento é limitado pelo suprimento de bens de produção de novo tipo – de produtos da indústria pesada (Rangel, Industrialização, p. 248, grifo meu).
No caso da economia brasileira, as transformações no campo estavam acontecendo numa velocidade maior do que na cidade. A maior velocidade de modernização do campo, de transformação do latifúndio feudal em capitalista, produzia a crise agrária, cuja expressão era: a) o excedente de produtos agrícolas, que aliado às limitações para se exportar para os países socialistas, saturava o mercado dos países imperialistas e gerava um problema de balanço de pagamentos; b) o excedente de mão-de-obra, que em função do lento crescimento da indústria, gerava um inchaço nas grandes cidades:
(...) o desenvolvimento capitalista exige um certo aumento da
permitir, simultâneamente, o deslocamento de parte da mão-de-obra rural para atividades não agrícolas, e assegurar o suprimento dos bens agrícolas aos setores não agrícolas, cujas necessidades crescem com a urbanização e com o desenvolvimento da indústria. Num país de economia complementar como o Brasil, urge, ainda, suprir os bens necessários à exportação. Pois bem, a crise agrária,
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na agricultura desenvolve-se em ritmo superior ao necessário, com o duplo resultado de aparecimento de excedentes agrícolas
convertidos em desemprêgo urbanono original).
se a cidade não se desenvolve, o campo também não se desenvolve. Uma coincidência de concepção que, com certeza, surpreenderá a muitos. Se Rangel
teórica neoclássica, tinham posições coincidentes a respeito das principais questões em debate sobre o desenvolvimento da economia brasileira. A origem dessa coincidência está na identidade de concepção da relação cidade-campo, no processo de desenvolvimento.
Para um marxista, não existe qualquer problema, qualquer desvio ideológico, com tal coincidência. Para responder às críticas feitas pelos populistas, de que o discípulos de Marx e Engels estavam renunciando “à herança das
ensaios publicísticos, reunidos numa obra editada cerca de trinta anos antes,
A leitura desse livro, quase completamente esquecido hoje, é extraordinariamente instrutiva para o estudo do problema que nos interessa, ou seja, o da atitude dos representantes da <<herança>> em relação aos populistas e aos <<discípulos russos>> (Lênin, Herança, p. 48).
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-tas: adeptos de Marx e Engels. Este termo era usado, conforme nota explicativa no. 82, conforme nota do tradutor.
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A obra foi escolhida porque representava uma ideologia burguesa progressista e a intenção era mostrar o caráter progressista das teses dos
Um populista olharia Skáldine provavelmente com altivez e diria simplesmente: ele é um burguês. Sim, efectivamente Skáldine é um burguês, mas é representante de uma ideologia burguesa progressista, ao passo que o populista representa uma ideologia pequeno-burguesa e, numa série de pontos, reacionária (Lênin, Herança, p. 55).
Lênin queria chamar a atenção que os termos progressista e reacionário não deviam ser entendidos de maneira absoluta. Os iluministas foram
estavam centralizados na luta contra a servidão, as novas relações econômicas e sociais e as suas contradições estavam em estado embrionário e os ideólogos burgueses acreditavam e desejavam sinceramente a prosperidade, não tendo, ainda, manifestado um interesse meramente egoísta:
dissemos que Skáldine é um burguês. As provas desta caracterização
ressalva de que entre nós se compreende com frequência de modo absolutamente incorrecto, estreito e anti-histórico esta palavra, ligando-a (sem distinguir épocas históricas) à defesa egoísta dos interesses de uma minoria. Não se deve esquecer que na época em que os iluministas do século XVIII (que são reconhecidos pela opinião geral como dirigentes da burguesia), e em que escreviam também
sociais se reduziam à luta contra a servidão e os seus vestígios. As novas relações económicas e sociais e as suas contradições encontravam-se ainda em estado embrionário. Por isso, nenhum interesse egoísta se manifestava então nos ideólogos burgueses; ao contrário, tanto no Ocidente como na Rússia eles acreditavam com toda a sinceridade na prosperidade geral e desejavam-na sinceramente; não viam sinceramente (e em certa medida não podiam ver ainda) as contradições do regime que surgia do regime de servidão. Não é sem razão que Skáldine cita Adam Smith numa passagem do seu livro: vimos que tanto as suas concepções como o carácter da sua argumentação repetiam em muitos pontos as tese deste grande ideólogo da burguesia avançada (Lênin, Herança, p. 57).
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Interessante registrar que Lênin chama a Adam Smith de “representante da burguesia avançada. O conhecimento deste fato certamente surpreenderá
era progressista. A razão para tal esta em que ele é uma etapa de limpeza do passado e construção do futuro. O capitalismo é uma etapa de preparação das bases materiais, sociais e políticas para o socialismo.
Num texto que se tornou um clássico do marxismo, “O desenvolvimento do capitalismo na Rússia: O processo de formação do mercado interno para a
expõe porque o capitalismo prepara as bases materiais e as bases sociais para o socialismo.
O capitalismo prepara as bases materiais para o socialismo porque, ao promover uma ampliação da produção sem a correspondente ampliação do consumo, ao libertar a acumulação das barreiras impostas pela limitação do consumo, desenvolve enormemente as forças produtivas:
O desenvolvimento da produção (e, logo, do mercado interno) voltado predominantemente para os meios de produção parece paradoxal e constitui, sem dúvida, uma contradição. Trata-se de uma verdadeira ‘produção pela produção’, uma ampliação da produção sem uma ampliação correspondente do consumo. Mas esta não é uma contradição teórica: é uma contradição da vida real; é precisamente uma contradição que corresponde à própria natureza do capitalismo e às outras contradições desse sistema de economia social. É precisamente essa ampliação da produção sem a respectiva ampliação do consumo que corresponde à missão
consiste em desenvolver as forças produtivas da sociedade e a segunda exclui a massa da população do usufruto das conquistas técnicas. Há uma inequívoca contradição entre a tendência ilimitada à ampliação da produção (tendência própria do capitalismo) e o consumo limitado das massas populares (limitado em razão da sua condição proletária) ... {...} Ademais, não há nada mais absurdo que das contradições do capitalismo deduzir sua impossibilidade, seu caráter não progressista etc., o que implica em procurar nas celestes regiões dos devaneios românticos refúgio contra uma realidade desagradável, porém indiscutível. A contradição que existe entre a tendência ilimitada ao crescimento da produção e o consumo limitado não é a única do capitalismo, que só pode existir e se desenvolver em meio a contradições. Elas, aliás, atestam o caráter historicamente transitório do capitalismo, iluminando as condições
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e as causas da sua decomposição e da sua transformação em uma forma superior (Lênin, Desenvolvimento, p.25).
O capitalismo prepara as bases sociais para o socialismo porque a
especialização, a concentração da produção em unidades produtivas separadas produzindo para toda a sociedade, concentrando nas cidades, uma classe livre de velhas amarras, com maior capacidade de entendimento da realidade em que vive e com maior capacidade de organização. A expansão das bases materiais é, simultaneamente, a socialização do trabalho e a criação e o desenvolvimento de duas classes sociais antagônicas: a burguesia e o proletariado, a primeira concentrando e a segunda sendo excluída dos benefícios do progresso da técnica. O desenvolvimento do capitalismo, portanto, prepara as bases sociais para o socialismo:
A socialização do trabalho pelo capitalismo se manifesta nos seguintes processos. Em primeiro lugar o próprio crescimento da produção
própria da economia natural, e reúne os pequenos mercados locais num grande mercado nacional (depois mundial). {...} Em segundo lugar, o capitalismo substitui a antiga dispersão da produção por uma concentração sem precedentes, quer na agricultura, quer na indústria. {...} Em terceiro lugar, o capitalismo elimina as formas de dependência pessoal que são parte inalienável dos antigos sistemas econômicos. {...} Em quarto lugar, o capitalismo cria necessariamente a mobilidade da população, que era desnecessária aos sistemas de economia social anteriores, {...}. Em quinto lugar, o capitalismo provoca uma redução constante da parte da população ocupada na agricultura (onde sempre predominam as formas mais atrasadas de relações econômicas e sociais) e um crescimento do número de grandes centros industriais. Em sexto lugar, a sociedade capitalista aumenta a necessidade de união e associação da população e dá às suas organizações um caráter peculiar, distinto em relação aos períodos anteriores. Destruindo as limitadas uniões corporativas locais da sociedade medieval e instaurando uma concorrência impiedosa, o capitalismo fratura simultaneamente o conjunto da sociedade em grandes grupos de pessoas que ocupam diferentes posições na produção, impulsionando vigorosamente a constituição de associações no interior de cada um desses grupos. Em sétimo lugar, todas as referidas transformações do antigo regime econômico, operadas pelo capitalismo, levam inevitavelmente á mudança da estrutura moral da população (Lênin, Desenvolvimento, pp.374 e 375).
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porque o capitalismo prepara as bases políticas para o socialismo. Na etapa da grande indústria, a exploração está completamente desenvolvida, está com seu aspecto puro e, por isto, o trabalhador pode ver claramente que o que o oprime é o capital e que sua luta tem que ser contra uma classe, contra a burguesia. O desenvolvimento do capitalismo, portanto, torna mais fácil para o trabalhador compreender adequadamente a questão da luta pela abolição da exploração:
(...) La explotación del trabajador en Rusia es en todas partes capitalista por esencia, si se dejan a un lado los restos agonizantes de la economia del régimen de servidumbre; lo unico que ocurre es que la explotación de la masa de productores es nimia, dispersa, no desarrollada, mientras que la explotación del proletariado fabril
el primer caso esta explotación se encuentra todavía envuella en
ninguno de los aditamentos que embrollan la questión. El obrero no
la lucha contra la clase de la burguesia (Lênin, Amigos del pueblo, p. 201).
Na medida em que o desenvolvimento do capitalismo torna as coisas claras, mostra onde está a fonte da exploração, ele também desperta a consciência do trabalhador, converte o descontentamento surdo e vago em protesto consciente, em luta de classe pela libertação de todos os trabalhadores:
Si se compara esta aldea real con nuestro capitalismo, se comprende entonces por qué los socialdémocratas consideram progresista la labor de nuestro capitalismo, cuando éste concentra estos pequeños mercados aislados en un mercado que abarca a toda Rusia, cuando
al régimen, un puñado de grandes ‘pilares de la patria’; cuando
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subordinación al gran capital. Esta subordinación es progresista en compración con aquella - apesar de todos los horrores de la opresión del trabajo, de la agonía lenta, del embrutecimiento, de la mutilación de los organismos femininos e infantiles etc. - porque DESPIERTA
en protesta cosciente, convierte el motín aislado, pequeño, ciego, en lucha organizada de clases por la liberación de todo el pueblo trabajador, lucha que extras su fuerza de las condiciones mismas
contar incondicionalmente con un EXITO SEGURO (Lênin, Amigos del pueblo, p.128).
Contrariamente aos marxistas, os populistas se opunham ao desenvolvimento do capitalismo. O primeiro traço distintivo do populista era não enxergar o caráter progressista do desenvolvimento capitalista:
considerar o capitalismo na Rússia como uma decadência, uma regressão ... esquece que ‘para trás’ deste capitalismo nada há senão
de dependência pessoal, que agravam a situação do trabalhador; nada há senão a rotina e a estagnação na produção social, e, por conseguinte, em todas as esferas da vida social. Ao lutar contra o capitalismo do seu ponto de vista romântico e pequeno-burguês, o populista abandona todo o realismo histórico, comparando-o sempre
Skáldine, por seu turno, criticava o regime de servidão e defendia o desenvolvimento do capitalismo. As teses de Skáldine eram, portanto, progressistas e os discípulos deviam apoiá-las na luta contra as teses populistas:
Pois bem, se confrontarmos as aspirações práticas de Skáldine, por um lado com as concepções dos populistas russos contemporâneos, e por outro lado com a atitude dos <<discípulos russos>> para com elas, veremos que os <<discípulos>> estrarão sempre a favor das aspirações de Skáldine, pois estas expressam os interesses das classes sociais progressistas, os interesses vitais de todo o desenvolvimento social pela presente via, ou seja, a capitalista. E o que foi alterado pelos populistas nestas aspirações práticas de Skáldine ou no seu modo de formular os problemas é um facto negativo que os <<discípulos>> rejeitam (Lênin, Herança, p. 57).
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Entende-se, assim, a razão pela qual os discípulos vão apoiar os iluministas contra os populistas. Estes últimos querem deter o desenvolvimento do capitalismo. Discípulos e iluministas querem o desenvolvimento do
e acelerar sua substituição por um modo de produção superior e os segundos querem-no para eternizar este modo de produção. A aliança entre discípulos e iluministas, portanto, não era estratégica e sim tática.
percebe as contradições que lhe são inerentes. O populista teme este desenvolvimento por ter notado já estas contradições. O
de um futuro melhor unicamente no pleno desenvolvimento destas contradições. A primeira e a última corrente tendem por isso a apoiar, acelerar e facilitar o desenvolvimento pelo caminho atual, a eliminar todos os obstáculos que entravam e retardam este desenvolvimento. O populismo, pelo contrário, tende a deter e paralisar este desenvolvimento, teme a destruição de certos obstáculos que se opõem ao desenvolvimento do capitalismo. A primeira e a última corrente caracterizam-se pelo que se pode chamar optimismo histórico: quanto mais longe e mais depressa as coisas caminharem, como estão a caminhar, tanto melhor. O populismo, pelo contrário, conduz naturalmente ao pessimismo histórico: quanto mais longe as coisas caminharem assim, tanto pior ... Os <<iluministas>> nem sequer levantaram os problemas relativos ao carácter do desenvolvimento posterior à reforma ... O populismo colocou o problema do capitalismo na Rússia, mas resolveu-o no sentido de que o capitalismo era reacionário, e por isso não pode receber integralmente a herança dos iluministas ... Os <<discípulos>> resolvem o problema do capitalismo na Rússia no sentido de que ele é progressivo, e por isso não só podem como devem aceitar plenamente a herança dos iluministas, completando-a com a análise das contradições do capitalismo do ponto de vista dos
As divergências entre iluministas, populistas e discípulos, têm sua origem nos diferentes interesses de classe que pretendiam representar. Os primeiros pretendiam representar o interesse geral da nação, ainda que representassem, de fato o interesse da grande burguesia. Os segundos pretendiam representar o interesse do trabalho em geral, ainda que representassem o interesse da pequena burguesia. Os terceiros pretendiam representar e, de fato, representavam, o interesse do proletariado. Uma aliança tática progressista, entre iluministas e
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discípulos, porque representam as classes da sociedade moderna, formadas e desenvolvidas pelo capitalismo:
Os iluministas não destacaram como objeto de atenção especial nenhuma classe da população, falavam não só do povo em geral como mesmo da nação em geral. Os populistas desejavam representar
grupos do sistema atual de economia; na prática, adoptavam sempre o ponto de vista do pequeno produtor, o qual o capitalismo converte em produtor de mercadorias. Os <<discípulos>> não só tomam como critério o interesse do trabalho, como indicam além disso grupos
produtores que não são proprietários. A primeira e última correntes correspondem, pelo conteúdo de suas aspirações, aos interesses das classes que são criadas e desenvolvidas pelo capitalismo; o populismo corresponde, pelo seu conteúdo, aos interesses da classe dos pequenos produtores, da pequena burguesia, que ocupa uma posição intermédia entre as outras classes que compõem a sociedade atual (Lênin, Herança, p. 72).
refere ao desenvolvimento da economia brasileira, em particular quanto ao relacionamento cidade-campo. Existe, no entanto, uma diferença fundamental
Ambos estão interferindo no debate com o objetivo de ajudar a promover o desenvolvimento, mas a avaliação e o objetivo último são absolutamente distintos. O ponto que distingue Rangel é a avaliação crítica desse processo.
Rangel, apesar de defender o desenvolvimento da economia brasileira pela via capitalista, não era ufanista. Ao contrário, Rangel apontava, denunciava, que esse desenvolvimento se dava com uma série de distorções, com um conjunto de irracionalidades.
A industrialização sem reformar, previamente, as relações sociais no campo é que permitiu o pacto de poder entre o latifúndio feudal a burguesia industrial. A tese de Rangel, no jargão atual, é que o acelerado desenvolvimento do capitalismo, no campo brasileiro, não fora de acordo com o modelo conhecido
A modernização da economia brasileira, consequentemente, não se deu de maneira a assegurar as condições para o surgimento de uma policultura mercantil, capaz de assegurar uma ocupação estável do solo. A rápida transformação do
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latifúndio feudal em latifúndio capitalista, sem o correspondente crescimento da indústria, que estava limitado pelo lento desenvolvimento da indústria de base, resultou na criação de um desmesurado exército industrial de reserva de mão-de-obra:
Êsse estado de coisas se agrava à medida que, com a penetração do capitalismo no campo – através da conversão direta do latifúndio feudal em latifúndio capitalista – desmantelam-se as bases da policultura feudal (nos quadros da ocupação estável da terra característica da servidão de gleba, sob tôdas as suas formas) sem o aparecimento de condições para uma policultura mercantil (nos quadros da pequena propriedade independente, capaz de assegurar, também, uma ocupação estável do solo). Resulta que, por um lado, aumenta a produtividade do trabalho agrícola em ritmo maior que o da expansão do mercado para bens agrícolas e, em conseqüência milhões de camponeses são arruinados e deslocados, dispondo-se a disputar um lugar ao sol fora da agricultura, virtualmente por qualquer salário
O esquema de distribuição de renda é um ponto fundamental no processo de desenvolvimento e a via prussiana do desenvolvimento do capitalismo, no campo brasileiro, gerava um enorme exército industrial de reserva de mão-de-obra que deprimia o poder de barganha da massa trabalhadora no setor capitalista:
tudo na operação do sistema econômico capitalista, depende, direta ou indiretamente, do esquema de distribuição da renda nacional, o qual encarna, em última instância, a correlação entre a folha total de salários (V) e a mais valia (lucro, renda territorial, rendimentos dos setores improdutivos da população), isto é (P). Tudo, portanto, depende da razão P:V ... a razão investimento:consumo
dividendo nacional mas sobre a própria magnitude desse dividendo
A rationalede que a folha de salários é o item decisivo do fundo social de consumo, enquanto o investimento é a destinação decisiva, típica,
O capitalismo brasileiro recruta a sua mão-de-obra num mercado convulsionado por todas essas manifestações da crise agrária, isto
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é, do processo de desagregação da velha estrutura agrária (feudal) e de sua conversão na nova estrutura agrária (capitalista). Em especial, age como elemento perturbador do mercado de trabalho capitalista
formação de uma oferta excessiva de mão-de-obra, a qual deprime o poder de barganha das massas trabalhadoras do setor capitalista
Essa distribuição extremamente desigual da renda, fruto do desmesurado exército industrial de reserva de mão-de-obra, provocada pela crise agrária, produzia uma economia com um crescimento extremamente dependente da
para a geração de capacidade ociosa:
ao papel moeda e aos depósitos à vista), notaremos os seguintes efeitos sôbre o comportamento geral da economia: 1) as camadas de renda média ou elevadas mostrarão certa propensão por antecipar o consumo corrente; 2) as pessoas e as famílias mostrarão certa propensão a adquirir bens duráveis ou suscetíveis de conservação, isto é, imobilizarão mais, embora essa imobilização não tenha o caráter de investimentocontabilidade social, que considera como de consumo tôdas as compras das famílias; 3) as emprêsas e os próprios órgãos do poder público investirão mais, isto é, realizarão imobilizações não necessárias, à rigor, à operação das indústrias e serviços, mas que
que o investimento seja necessário, se bem que sòmente para data
Uma economia que depende para o seu simples equilíbrio e para sua expansão, de uma elevada taxa de imobilização, tende continuamente para o superinvestimento, considerando que os investimentos produtivos são a destinação mais natural e típica das
importante, que se tornem as imobilizações não produtivas ou de consumo, a capacidade produtiva tende a tornar-se excessiva, dada a mecânica da demanda global, presa a uma demanda de consumo
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A culminação desse conjunto de distorções, de irracionalidades do ponto de vista social, eram as imobilizações com rentabilidade negativa:
Isto posto, o conceito de rentabilidade negativa se investe de todo o seu valor. Mesmo que, em data posterior, ao serem liquidados os acervos criados, produzam, em termos reais, isto é, , algo menos do que neles se inverteu, para adquiri-los e conservá-los,
desde que o desconto suportado seja menor que o que se teria
moeda como reserva de valor, de meio de entesouramento (Rangel,
repetido, criticou a tese do desenvolvimento promovido pelo campo. Sem um rápido aumento da renda e da demanda pelos produtos agrícolas, um aumento da produtividade no campo seria repassado para a cidade, seja na forma de aumento de salários, promovida pela queda dos preços em razão da conhecida inelasticidade preço da demanda pelos produtos agrícolas, seja na forma de maiores lucros para o setor de comercialização, em razão da oligopolização do setor:
Dada a conhecida inelasticidade-preço da demanda de produtos alimentícios, isso terá de provocar uma redução de seus preços relativos, a não ser que a demanda aumente rapidamente. O aumento de produtividade, será, então, transferido para os centros urbanos na forma de salários reais mais elevados e na forma de um aumento do lucro do setor comercial (devido à oligopolização do
Uma primeira observação a ser feita é que essa argumentação está incompleta, pois omite que tal resultado depende da existência de concorrência entre os produtores agrícolas. Uma segunda observação a ser feita é que a argumentação admite explicitamente a existência de oligopólio na comercialização de produtos agrícolas.
Ora, concorrência entre produtores e cartel na comercialização, conforme já visto, são pontos sustentados por Ignacio Rangel para criticar a tese estruturalista de inelasticidade da oferta agrícola. Como não é de se esperar
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os produtores, cabe, então, perguntar por que ele não usou a argumentação de
A resposta não pode ser encontrada no campo da teoria econômica e sim no campo da política. Ao não enfatizar a oligopolização do setor comercializador
um adversário político e não ressalta uma falha no mecanismo de mercado, justamente num ponto tão importante para o desenvolvimento do país. A falta de ênfase na oligopolização do setor comercializador pode ser vista como uma
coincidências no que diz respeito ao desenvolvimento da economia brasileira, particularmente no que se refere ao relacionamento cidade-campo, têm uma diferença fundamental: o compromisso de classe, a opção doutrinária. Rangel quer o desenvolvimento para desenvolver a classe operária e promover a
o capitalismo. A coincidência tática não exclui a divergência estratégica.
Num trabalho intitulado El programa agrario de la socialdemocracia en
campo, defronta-se com relações sociais que lhes são antecedentes e que a ele se opõem. Defronta-se com um tipo de propriedade que é a expressão de relações de produção diferentes das que ele traz consigo.
A propriedade privada da terra é uma forma de propriedade privada que existe desde antes da sociedade organizar-se aos moldes capitalistas. A penetração e desenvolvimento do capitalismo no campo, consequentemente, exige que ele amolde, ao seu estilo, a propriedade que não foi criada por ele. Não existe, portanto, uma forma única em que o capital submete a propriedade privada da terra aos seus desígnios e impõe as relações de produção que lhes são características.
propriedad agraria que encuentra en la historia el modo capitalista de producción cuando comienza a desarrollarse, no corresponde
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al capitalismo. El proprio capitalismo crea para sí las formas correspondientes de relaciones agrarias, partiendo de las viejas formas de posesión de la tierra: la terrateniente-feudal, la campesina-comunal, la gentilicia, etc. En el lugar citado, compara Marx los diferentes procedimientos por los que el capital crea las formas de propriedad agraria que le corresponden. En Alemania, el cambio de las formas medievales de propriedad agraria se desarrolló, por decirlo así, siguiendo la senda reformista, adaptándose a la rutina, a la tradición, a las posesiones feudales, que se fueron transformando lentamente en haciendas de junkers, a los lotes rutinários de los campesinos-holgazanes, que atraviesan el difícil período de tránsito
Inglaterra, esta transformación fue revolucionária, violenta, pero la
se ejerció sobre las masas campesinas, que fueron extenuadas por los tributos, expulsadas de las aldeas, desalojadas, que fueron extinguiéndose o emigraron. En Norteamérica, esta transformación fue violenta con respecto a las posesiones esclavistas de los Estados del Sur. Allí se ejerció la violencia contra los terratenientes feudales. Sus tierras fueron fraccionadas; la gran propriedad agraria feudal se convirtió en pequeña propriedad burguesa (Lênin, Programa agrario,
A substituição dos métodos de exploração pré-capitalista pelos métodos de exploração burgueses, pode ser feita paulatinamente, conservando-se a grande propriedade fundiária, ou com maior velocidade, destruindo a grande propriedade fundiária:
Los restos del feudalismo puedem desaparecer tanto mediante la transformación de las haciendas de los terratenientes como mediante la destrucción de los latifundios de los terratenientes,
haciendas de los terratenientes, que paulatinamente se tornen cada
también teniendo al frente las pqueñas haciendas campesinas, que por vía revolucionaria extirpen del organismo social la ‘excrecencia’
ellos por el camino de la agricultura capitalista de los granjeros (Lênin, Programa agrario, p.28)
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O caso Inglês é um exemplo típico de como o capital é implacável nessa transformação. Nesse país, todas as condições que não correspondiam ou que se contradiziam às condições do capitalismo, foram, literalmente, “varridas sem
limpeza das terras para o capital. Esse processo foi tão intenso, na Inglaterra, que pode-se dizer ter sido um processo de negação da propriedade privada das terras para o capital, feito na perspectiva do grande proprietário de terras:
(...) a partir de la época de Enrique VII, en ninguna parte del mundo ha sido tan implacable la producción capitalista con el régimen agrícola tradicional, en ninguna parte se han creado unas condiciones tan perfectas (adequadas = idealmente congruentes), en ninguna parte ha sometido hasta tal punto estas condiciones a su arbitrio. En este sentido, Inglaterra es el país más revolucionario del mundo. Todo el orden de cosas herdado de la historia, allí donde contradecía las condiciones de la producción capitalista en la agricultura o no correspondía a estas condiciones, fue barrido sin piedad: no sólo fue
derruidos estos poblados; no sólo fueron arrasadas las vivendas
barridos los centros tradicionales de la economía, sino que se puso
en el Reino Unido, no la encontramos en ningún país continental. ... no aceptaraon todas las condiciones de la produccióntal como existían tradicionalmente, sino que fuero creando, en un proceso historico, estas condiciones en forma que respondiesen en cada caso concreto a als exigencias dela aplicación más vantajosa del capital. En este sentido no existe, pues, realmente propriedad sobre
derecho de explotarlibremente su hacienda, interesándose de un modo exclusivo por obtener ingresos pecuniários. (Lênin, Programa
O caso inglês é uma exceção e o padrão é seguir o modelo ocorrido na
caminho é mais lento, mantendo a grande propriedade fundiária.. Na via “norte-
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Estos dos caminos del desarrollo burgués objetivamente posible,
de tipo norteamericano. En el primer caso, la explotación feudal del terrateniente se transforma lentamente en una explotación burguesa, junker, condenando los campesinos a decenios de la
minoría de ‘Grossbauern’ (‘labradores fuertes’). En el segundo caso, no existen haciendas de terratenientes o son destruídas por
En este caso predomina el campesino, que pasa a ser el agente
granjero capitalista (Lênin, Programa agrario, p.28).
Ambos os caminhos são trilhados pelo capital para submeter o campo ao
(...) cuanta más tierra hubiesen recibido los campesinos al ser
Rusia, tanto más alto habría sido el nivel de vida de la población,
rapidez habrían sido aplicadas las máquinas a la producción; en una palabra, tanto más se habría asemejado el desarrollo económico de Rusia al desarrollo económico de Norteamérica (Lênin-40, Programa
caminhos de transformação do campo pela cidade. O ponto central de sua preocupação, na relação cidade-campo, era se a agricultura respondia aos preços, se tinha atendido de maneira satisfatória aos requisitos da indústria. O ponto central da sua preocupação, no processo de desenvolvimento, era se a indústria estava se desenvolvendo. Em ambos os casos sua resposta era positiva.
Rangel estava atento para a questão dos dois caminhos da transformação do campo pela cidade. Conforme já referido na seção anterior, a transformação
com manutenção da grande propriedade fundiária e grande sofrimento para os trabalhadores.
Com o que foi exposto, fundamentado em Lênin, sobre os dois caminhos da transformação do campo pela cidade, pode-se compreender a diferença entre Rangel e os marxistas como Alberto Passos Guimarães, Mário Alves e
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subordinar relações sociais pré-capitalistas ou imaginavam poder transformar a
trabalhadores, melhorar suas condições de vida.
Rangel entendia ser impossível, naquela ocasião, tal transformação. A impossibilidade decorria da falta de condições objetivas para tanto:
Na apreciação desse problema não devemos perder de vista a observação crítica de Karl Marx, segundo a qual ‘nenhum regime desaparece antes de haver suscitado todas as forças produtivas que é capaz de comportar’. Neste particular, não nos podemos guiar nem pelos nossos desejos subjetivos, tomando-os como realidade, ou como se eles fossem a lei do mundo, nem por ideias gerais. Trata-se de conhecer as condições concretas nas quais tem lugar o
O pacto de poder vigente, entre o latifúndio feudal e a burguesia industrial, estava longe de ter esgotado todas as suas potencialidades:
Esse estado de coisas somente esgotará suas virtualidades –
houverem esgotado as condições para a expansão do investimento, isto é, para a absorção da crescente massa de mais valia que o aumento da produtividade do trabalho, não acompanhado de
que a economia brasileira, dados os seus presente níveis e dinamismo da renda e da demanda global, já esgotou todas as
original).
brasileira era, portanto, obra de utopistas ou de demagogos:
É por esse motivo que a questão agrária volta periodicamente à ordem do dia, para depois ser adiada ou receber soluções parciais e indiretas, que não satisfazem os seus propugnadores, geralmente utopistas bem intencionados, mas teoricamente desarmados mas, noutros casos, demagogos que querem capitalizar o
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Elementos de economia do projetamento
Escrevo este artigo como um convite aos estudiosos de economia para participar da tarefa de destrinchar esse livro do Professor Rangel. Livro esquisito,
com as quais nos defrontamos. Em determinados momentos somos induzidos a fazer analogias com as teorias citadas, mas, para o leitor formado em economia, é visível um uso original por parte de Rangel da herança teórica que maneja. Maior esclarecimento sobre a obra dependeria de um estudo sobre os interlocutores intelectuais que estão presentes no texto. Não dispondo de tempo para tanto, deixamos a ideia com a esperança de que, se realizada, ilumine problemas que não conseguimos esclarecer nesse trabalho.
Não devemos nos iludir com a falsa simplicidade de “ELEMENTOS DE
A leitura de seu conteúdo revela o objetivo do autor. Construir, a partir do acervo da ciência econômica, com todas suas escolas e distintas abordagens, uma teoria econômica da economia do projetamento, entendida esta como a economia que o processo histórico estava desenhando no século XX, a partir do
A ambição intelectual do livro encontra paralelo indiscutível na sua
Rangel com as teorias e interpretações existentes no trato das questões de sua contemporaneidade.
Mas o presente livro não provocou nenhuma reação por parte de seus possíveis interlocutores, sendo ignorado até por aqueles que acompanharam mais de perto a obra rangeliana . Se isso se deve a uma imediata rejeição ao
66 Devemos registrar como exceção a conferência proferida pelo Professor Milton Santos no SEMINÁRIO IG-NACIO RANGEL E A CONJUNTURA ECONÔMICA, em 10/11/1997, no Anfiteatro de Geografia da USP.
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mero material didático não sabemos responder, mas devemos concordar que não existe urgência em se responder essa questão.
Ao contrário, avaliar se a tentativa de síntese teórica de Rangel tem algum sentido e se a busca de uma nova teoria, para uma pretensa nova etapa dos modos de produção, é um programa de pesquisa válido, são questões que
O artigo que se segue objetiva, quando muito, incentivar a leitura e a avaliação de um texto que foi mantido hibernado pela ausência de debate. Não pretende fazer um estudo exaustivo do livro. Destaca dos seis capítulos que o compõem algumas passagens e aspectos, que incentivarão uma aprofundada investigação do legado rangeliano.
Peço desculpas ao leitor pelo excesso de uso de citações e reproduções do texto original, mas dado o caráter polêmico, ou original, dos enunciados preferi esconder-me nas palavras do autor. Também abusei da utilização dos colchetes não só para abreviar com minhas palavras as inúmeras citações, como é usual, mas como um recurso para explicitar ideias mais íntimas, buscando num cochicho com o leitor alguma cumplicidade.
Duas características da abordagem rangeliana
A originalidade da análise da obra de Rangel – marca reconhecida pelos comentadores do autor- é o resultado de ecletismo teórico desinibido e de uma profunda concepção historicista. Esta última derivada de sua visão marxista de mundo .
em geral, impunha uma apropriação particular das teorias que por serem
BÁSICA, 287). “A ciência econômica varia com o de produção e este muda
67 “A obra de Rangel corresponde a um original ensaio de adaptação do materialismo histórico e da teoria econômica à análise do caso brasileiro ” (Bielschowsky , 1988, 248) “O método utilizado por Rangel para analisar a economia brasileira sempre foi essencialmente histórico. Sua origem marxista é evidente mas Rangel usa Marx com absoluta liberdade” (Bresser-Pereira L C & Rego, J.M.; in Mamigonian & Rego 1998 18) “... Rangel era o menos conhecido... apesar de ser o mais criativo e original dos economistas brasileiros ” (Mamigonian in Mamigonian & Rego 1998 129)
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historicista, Rangel relata que “em meus estudos sobre economia brasileira,
acrítica dos modelos importados – marxistas ou não- sinaliza que “o que importa
partida de todo e qualquer estudo. Mas, é preciso compreender que não é a única .
Apesar do ecletismo teórico e do relativismo historicista, a obra tem unidade lógico-teórica, muitas vezes desconsiderada por seus interlocutores. O papel da teoria da dualidade básica como “princípio organizador básico de seu
pouco valorizado por seus interlocutores, o que provocou manifestações de Rangel para esclarecer sua importância .
Um dos aspectos de sua obra que merece melhor atenção é seu ecletismo teórico, explicitado na nota de rodapé do parágrafo anterior . E aqui, nosso autor é réu confesso70.
Podemos transcrever inúmeras e provocativas passagens onde sua visão sobre as diferentes abordagens teóricas aparece sem nenhum disfarce. Vamos a algumas delas.
O ponto de partida é a já apresentada historicidade da economia,
68 Reforço o argumento com outras citações “economia é uma ciência histórica por excelência. Quer isso dizer que está submetida a um duplo processo evolutivo: o fenomenal e o nomenal. O conceito vulgar ad-mite explicitamente pen s evolução fenomenal da economia” (Rangel, 2005, vol. I, DESENVOLVIMENTO E PROJETO, 204). Para Rangel “tudo flui – no campo da coisa representada como no campo da represen-tação da coisa” Com revolução russa “o planejamento econômico tornou-se possível e tivemos as teorias que correspondem à nova problemática ”(idem, 206).
69 “idéia central da dualidade [é] fecunda para explicar a evolução econômica, social e política do Bra-sil” “embora surgissem aqueles que julgavam poder concordar em numerosas coisas sem aceitar idéia central da dualidade” “Trata-se, evidentemente, de um equívoco, visto como toda a minha contribuição ao esclarecimento da problemática brasileira pode ser definida como a aplicação do marxismo ao enten-dimento da economia e da sociedade brasileiras” sem me privar “de utilizar outras contribuições, com especial atenção para as teorias econômicas ‘ocidentais’ destacando-se, aí, Marshall e Keynes” “E a teoria da dualidade foi precisamente chave para isso” (Rangel, 2005, vol. II, DUALIDADE E “ESCRAVISMO COLONIAL” 634).
70 Ecletismo ressaltado por Bresser Pereira & Rego(1998) e por Santos (1997).
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enquanto processo real e expressão teórica desse processo. No nosso caso histórico, no caso brasileiro para sermos exatos, a historicidade da teoria é ainda mais relativizada, na medida em que a formação social é dúplice, ou seja,
virtualmente, lado a lado e agindo umas sobre as outras, todas as formas que a
pesquisadas, como as do capitalismo, e as imperfeitamente estudadas, podem
nosso nômeno é
E PROJETO, 207).
Ainda no mesmo livro encontramos uma argumentação didática que
a evolução do nômeno, ou seja, da história, e do fenômeno, da teoria.
“A história do desenvolvimento capitalista apresenta duas etapas muito
a tendência espontânea do sistema é para a estagnação por falta de procura
conclui “Se ampliarmos um pouco a perspectiva histórica, para abarcar o período anterior ao capitalismo – uma produção baseada no artesanato, na ‘pequena produção’ não capitalista de mercadorias – quanto o que o sucede – o socialismo – encontraremos duas situações que, díspares de todos os pontos de vista, têm
tendem a tornarem-se efetivas no mesmo momento e são (Idem, 237).
Com desenvoltura pragmática em relação à ciência econômica, Rangel
econômicos – que é algo que progride sempre e constitui um fundo comum -, tudo
para sublinhar o processo de evolução da teoria, retomar a já citada passagem que sinaliza uma nova problemática teórica com o planejamento soviético. (ver
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É com esse espírito que Rangel se afastará do estudo da realidade brasileira e partirá para uma de suas mais ambiciosas obras: ELEMENTOS DE ECONOMIA DO PROJETAMENTO. É pela história, portanto, que ele chega à teoria. Vale sublinhar que o objetivo dessa obra é construir uma teoria econômica para um novo modo de produção que estava tomando corpo com as transformações do
As categorias fundamentais do projetamento71
as são o custo e o E que “projetar consiste em última análise em ordenar o emprego de... recursos [para] obter... recursos. E “toda a teoria do projetamento... [é] um esforço para precisar
(I, §1 e §2).
Seria imprópria uma analogia com os clássicos e mais precisamente
economia do projetamento é o projeto produtor de utilidade, que se exprime no quociente custo/benefício expresso em riqueza, entendida esta última como
seja, a riqueza como um conjunto de utilidades.
Uma questão analítica similar à questão do valor aparece quase imediatamente. Como homogeneizar recursos para podermos construir uma
Um parênteses. O leitor que leu com atenção a introdução do livro, está informado que o projetamento é uma prática que se desenvolve em paralelo com uma teoria que evolui no tempo e se alimenta com os problemas e soluções enfrentadas por aproximações sucessivas e sistematizando, quando for possível, experiências dos analistas que, naturalmente, são de diferentes escolas teóricas
71 As referências das citações do texto “ELEMENTOS DE ECONOMIA DO PROJETAMENTO” indica-rão em algarismos romanos os capítulos e em arábicos os parágrafos.
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Mas vamos em frente de onde paramos: a busca de uma denominação comum para a razão custo/benefício.
Antecede essa busca uma citação esclarecedora do pensamento do autor sobre o caráter provisório e relativo do conhecimento teórico. “Dezenas de teorias
ou menos aceitáveis, segundo as condições de sua aplicação. Preliminarmente, cabe advertir que todas essas teorias, e os critérios de prioridade que nelas assentam, por um lado não podem conduzir senão a aproximação e, por outro,
“Todas estão subordinadas à cláusula a qual pode
O que tem de comum o custo e o benefício “é qualidade que esses objetos
é qualidade que tem certas coisas de serem 72 e,
utilidade contida respectivamente nos produtos e nos fatores. O objetivo da unidade produtiva ou do projeto é produzir, e produzir é, muito estritamente, conferir o atributo de utilidade a coisas que não o tinham, ou acrescentar utilidade
Devemos concordar que, em termos de heterodoxia e ecletismo, Rangel apresenta-se sem disfarces. Faz reengenharia de questões da economia clássica com soluções próximas do neoclassicismo. Veremos no segundo capítulo a combinação Marx-Marshall determinando o valor da força de trabalho pela utilidade marginal.
E para não deixar dúvidas com relação à naturalidade de suas composições teóricas explica.
“É mister advertir que não cogitamos aqui da antiga polêmica em torno do valor. Os fatores e produtos devem, a rigor, ser medidos enquanto recursos,
uma quantidade de utilidade, “pode ser diferente da soma dos valores de bens e
Talvez seja oportuno abrir outro parênteses para esclarecermos um aspecto central. A economia do projetamento é um modo de produção que está
72 “ as coisas são úteis quando o homem pode satisfazer suas necessidades por meio delas” (I §9) um con-ceito genuinamente marshalliano.
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em desenvolvimento, no ocidente e no oriente, para usar palavras do autor. Seu objetivo é produzir valor de uso (como é universal na atividade econômica qualquer que seja o modo de produção) regulado pela vontade consciente e racional, através de um cálculo econômico. A categoria utilidade, apesar de seus problemas de medida, é a nova base para o cálculo econômico. Plano e projeto, através de seleção de técnicas e alocação de recursos, são seus instrumentos fundamentais. Isto difere do capitalismo onde a produção de valores de uso é regulada pelo mercado através do valor, seja ele explicado pelo trabalho, para os clássicos, ou pela a utilidade marginal, para os neoclássicos.
Tendo se afastado da categoria valor e chegado à utilidade como o homogeneizador dos recursos, o próximo passo é chegar à utilidade abstrata “que se exprime no fato de que todos os objetos úteis atendem a uma necessidade
valor como nômeno e a categoria teórica valor como fenômeno estão relacionados a uma economia mercantil. A economia do projetamento, que começa a tomar corpo, é o devir, está relacionada a outro momento histórico, outro nômeno, portanto. A utilidade está relacionada com essa problemática.]
Mais uma passagem reforça seu ecletismo e sua visão da práxis
através das opções dos consumidores e superiores [no caso de uma economia
que é o criador de utilidade que só existiria anteriormente ao projeto em termos
analisar projetos e vai enfrentar a questão da contribuição dos fatores para a utilidade do produto.
Descarta a fatoração, a contribuição isolada de cada fator para a utilidade
acréscimo a um dos fatores e sua apropriação por parte de “pessoas detentoras de certas posições de comando no processo produtivo, sujeito a condições institucionais, isto é externas ao projeto... é um fato de da riqueza criada, que interessa à Economia Política, sem dúvida, mas não no que concerne
O problema da medição da utilidade dos fatores leva Rangel a lançar mão do conceito de utilidade marginal para contabilizar o custo alternativo do fator “Em
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excluído o emprego menos produtivo de quantos tenham o fator, ou É pela utilidade total do fator nesse emprego – utilidade marginal –
. E prossegue “O custo, portanto,
Similarmente, “ , pois,
A ponte entre a microeconomia e a macroeconomia começa a ser superada ao mostrar como o projeto afeta o sistema da economia nacional pela
as demais unidades através dos respectivos mercados “O efeito líquido sobre encontra sua expressão característica... [e] se
exprime através de variações da (que encontra expressões aproximativas como produto e renda (I, §41).
As relações entre projeto e economia nacional geraram polêmicas em torno da validade ou mesmo viabilidade de projetar e planejar. Rangel, entretanto, não se deixa enredar nestas polêmicas. Alerta que os fatos desmentem os argumentos. O projetamento está evoluindo e planos e projetos estão se aperfeiçoando. Unindo as duas práticas, temos “circunstância já apontada de que o efeito global – seja do projeto, seja do plano – encontra sua expressão mensurativa na referência da dos fatores a um só desses fatores. Ora, esse efeito pode ser investigado . É graças a isso que podemos e
(I, §43).
Como “os efeitos de cada projeto são, ao mesmo tempo, globais e
“conduz o resultado buscado da elevação da utilidade
Como conclui Rangel “desenvolvimento não é perseguição do equilíbrio, mas a introdução de causas de novos desequilíbrios de natureza especial. Essas mudanças assumem duas causas: mudança tecnológica e realocação de
A medida da utilidade
expressos em utilidade e que esta deve ser entendida como utilidade abstrata, a
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questão da medida da utilidade deve ser enfrentada.
Rangel começa descartando o valor de uso como a explicação para as relações de troca. E assinala que “os clássicos referiram o valor a quantidade de
política clássica-marxista registra que a discordância com os marginalistas, a outra grande escola dominante do pensamento econômico contemporâneo, “gira em torno de fatos de superfície, e que é chegado o momento de levar adiante o trabalho encetado por Schumpeter, para recolher os frutos do pesado labor
Adiante questão da “contabilidade da riqueza em termos de trabalho
de que os três fatores se combinam em todo ato de produção para produzir nova utilidade – utilidade virtual. Mas, apesar disso, opta por usar o trabalho, pois
Nos próximos passos, seguindo Ricardo, é feita a redução da contribuição da terra em termos de trabalho e capital. Com o que é possível fazer uma redução
73
“Por trabalho devemos entender aqui utilidade alternativa da mão-de-obra – da força de trabalho, na sistemática marxista. Por capital, os instrumentos e materiais usados, medida sua utilidade alternativa na mão-de-obra, que, em
trabalho é a medida de todas as utilidades alternativas dos fatores absorvidos pelo projeto. E para não deixar dúvidas quanto a sua posição encerra o argumento
§12)
Como o trabalho concreto é heterogêneo ele tem diversas utilidades, chegou a hora de buscarmos a utilidade do trabalho nas condições menos
escola marginalista, o salário, isto é, o preço do trabalho como fator, como mão-de-obra. Consequentemente, teríamos, nesse suposto, não apenas a unidade natural da utilidade, mas também sua expressão monetária, o que facilita seu emprego como medida de todas as utilidades contidas nos fatores e nos produtos. Obtida essa expressão monetária, podemos abandonar sua primitiva forma natural, e medir simplesmente a utilidade marginal de todos os fatores pelo
73 A solução rangeliana em termos formais lembra a redução ao trabalho datado, realizada por Sraffa. Afir-ma que podemos fazer redução semelhante a partir de qualquer insumo da matriz de insumo-produto.
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A partir da relação marginalista entre salário e utilidade marginal da mão-de-obra, Rangel faz ponderações mostrando que nas condições de desemprego ou de subemprego a igualdade entre salário e utilidade marginal do trabalho não ocorreria. Para a empresa, entretanto, o salário igualaria a utilidade marginal da mão-de-obra empregada, que seria diferente da utilidade marginal da mão-de-obra total. Da mesma maneira, a utilidade total do produto é diferente da receita da empresa, que expressa a utilidade marginal que determina o preço. Tudo isso
A percepção da discrepância entre salário e utilidade marginal do trabalho,
projetamento, na medida em que não podemos garantir que o melhor emprego
Mas, apesar de todas essas ponderações sobre o construto neoclássico
marginal e total] não impediu o suposto marginalista de instruir a solução de
grandemente os instrumentos de análise, que provavelmente nos permitirão em breve retomar as teses abandonadas provisoriamente dos clássicos, para
As páginas se sucedem apresentando a ideia de que o esforço de construção da ciência econômica deve continuar e, para isso, todas as heranças – a ocidental e a oriental - são válidas. Discorrendo sobre esta questão, comete
contribuição teórica do marginalismo. Isso, entre parênteses, não os impediu de continuarem a cultivar cuidadosamente a ignorância mais completa de todos os aspectos teóricos dessa elaboração – do que, de resto, eram pagos na mesma
Além da convergência teórica na construção de uma teoria da economia
A primeira delas é o reconhecimento do “defeito fundamental do trabalho
trabalho, o salário, depende dos preços [o que também implicaria em circularidade, argumento que não foi explorado pelo autor], mas os preços expressam a utilidade marginal e não a utilidade média, que se relaciona com a utilidade total. Com o
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tempo a utilidade marginal diminui e com ela a média. A não consideração desse aspecto pode levar a uma superestimação do produto total expresso em utilidade.
Continuando a ponderação sobre o trabalho como medida da utilidade, levanta hipótese de que “os graves desequilíbrios ultimamente denunciados no seio da economia dos países socialistas podem estar perfeitamente relacionados
“Em resumo, portanto, o problema capital do projetamento, a medida da
74
A segunda ideia foi expressa em duas frases lapidares “É indispensável
contabilidade social e , e, enquanto esse objetivo não se alcança, [devemos] elaborar [balanços separados] (40) “O primeiro balanço, deverá
; outro, o § 41).
Seleção de técnica
da utilidade, com um pragmatismo emblemático. “Embora informados de que mensuração desse atributo [utilidade] comum é problema que não comporta senão soluções tópicas e aproximativas, o fato de que, em casos particulares, tal
Trata-se, agora, de analisar os fatores em sua heterogeneidade, ou seja,
Rangel cria um conjunto de exercícios onde um mesmo produto pode ser produzido com diferentes funções de produção. A escolha entre elas é orientada pela melhor razão benefício/custo. Este resultado nos permitirá escolher a técnica. Pondera que além da substituição imediata entre os fatores poderá haver uma substituição com a interposição de uma produção intermediária que resolverá possíveis estrangulamentos de recursos, o que é feito em algum intervalo de
74 Esse problema será mencionado diversas vezes ao longo do texto.
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tempo. A busca da elaboração de soluções com produção intermediária, quando esta for a escolha técnica, pode ser melhor viabilizada no projetamento.
O passo seguinte é discutir a relação seleção de técnica e desenvolvimento econômico.
como o aumento de produto
autoconsumo E “o objetivo do projetamento é promover o desenvolvimento e, . (III, §23).
Avançando na explicação da seleção de técnicas, demonstra que, no pleno emprego, o aumento do produto , ou seja, o desenvolvimento, só poderá ocorrer devido a funções de produção que substituam trabalho por terra(recursos naturais). “Podemos, pois, conceituar o desenvolvimento como
com a elevação da composição orgânica do capital].
independentemente da conversão de trabalho por terra. O objetivo, portanto, do projetamento nessa situação será buscar o emprego de toda a mão-de-obra. (III, §34).
Conclui o capítulo dizendo que o projetista deve ser orientado por um plano-mestre geral, mesmo que este não esteja formulado e “se há desemprego deve trabalhar para induzir o emprego pleno; alcançado este, deve buscar a
A alocação de recursos
No capítulo anterior foi discutido como seriam produzidos os bens. Agora
Esta questão levou ao estudo da demanda. Inicia por uma discussão sobre
uma estrutura de demanda, que deverá ser atendida por uma estrutura de oferta
(IV, §4).
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para o projetista e menos verdadeiro para o planejador, e o projeto está voltado para o futuro, o esforço do projetamento será para compatibilizar as duas estruturas. No projetamento complexo – - a relação entre os diferentes projetos e a demanda derivada de bens de capital formata uma opção consciente, inteiramente subordinada aos imperativos da técnica.
O equilíbrio formal via preços pode ser aparente “... a análise da contabilidade das indústrias, tomadas estas isoladamente, poderá revelar
alerta que o equilíbrio microeconômico pode diferir do verdadeiro equilíbrio do sistema. “O sistema não estará operando ao seu maior rendimento a menos que as razões benefício/custo de todas as indústrias tenham o mesmo valor, e que qualquer discrepância... implica em desperdício de recursos, isto é,
Rangel constrói um exercício para apresentar o argumento ou seja “se não seria possível obter um razão consolidada melhor para as duas indústrias [do exemplo apresentado], tomadas conjuntamente, independentemente de melhoramento da técnica, assunto que foi objeto do capítulo anterior. Noutros termos, trata-se de saber se não poderíamos melhorar dita razão consolidada pela
de acontecer no socialismo, onde os recursos podem ser alocados levando-se em conta a razão benefício/custo consolidada das indústrias; no capitalismo, cada empresa cuida apenas de sua própria razão e a igualação ocorre entre as empresas independentemente das indústrias.
Em resumo, o desenvolvimento, o aumento do produto , depende da técnica selecionada e da alocação de recursos. [Mas a alocação de recursos pressupõe uma coordenação, entre as unidades produtivas, mais complexa e abrangente do que a seleção de técnicas, que na maioria dos casos pode ser feita pela empresa individualmente]75 .
A partir desse ponto duas questões são explicitadas. A primeira mostra que pela expansão de diferentes indústrias podemos nos aproximar “da
projetos marginais, ou, nas palavras do autor, “desde que nos possamos apoiar
75 Será que encontramos nessa passagem a diferença entre capitalismo e socialismo no que se refere à inovação? Até que ponto o planejamento atrasou a incorporação no aparelho produtivo dos avanços tec-nológicos?
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A segunda questão gira em torno das “correlações entre as razões das
consolidada por indústria não tem sentido, pois as empresas tendem igualar as razões e o “regime socialista, onde em princípio, é possível operar à base do balanço consolidado, [e] a exigência da identidade das razões das últimas
considerada.
“Mas ainda aí no regime socialista regra prática deve ser a identidade das razões marginais benefício/custo de todas as empresas a criar, isto é, de todos
como entre projeto e plano.
Rangel retoma a diferença entre a receita da empresa e a utilidade criada, (diferença que é a renda do consumidor), para discutir a diferença entre a
Mas nem sempre as decisões privadas levarão ao equilíbrio. Esta seria uma das razões para a intervenção do estado na economia. O que não se faz sem problemas. “Intervenção do estado na economia apresenta problemas absolutamente novos... todas as soluções até aqui oferecidas... são... parciais e
§40).
A assimetria básica do projeto
Como a riqueza social se mede pela utilidade e não pelo valor, é “útil
medida da utilidade, a discrepância entre valor (= utilidade marginal) e utilidade, reaparece na abertura desse capítulo para apresentar outra questão. “O progresso da técnica permite-nos vislumbrar a possibilidade de uma sociedade onde as coisas úteis [utilidades] sejam tão abundantes que não mais tenham utilidade
“Vimos que essa marcha no sentido da abundância resulta de inovações tecnológicas... cuja essência está no fato de permitirem a progressiva substituição
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do fator trabalho pelo fator terra, único meio de elevar o produtoa inovação só se efetivará através de novos projetos “o que implica
principal questão tratada nesse capítulo.
Parte de ideias simples. A descoberta, no tempo, de utilidade nova para coisas já existentes é “fonte de enriquecimento... independente da técnica de
o papel do capital na produção. [E faz uma análise do que poderíamos chamar de ‘fetichismo do capital’. Alerta que a participação do capital no processo produtivo deve ser analisada com cuidado. Na aparência, “o que parece acontecer é maior participação do capital, enquanto os como já foi visto “no aumento líquido de capital não vamos encontrar senão terra
A resultante da acumulação de capital, portanto, é o aumento do produto e um aumento da razão terra/trabalho. O capital abaixo da superfície,
o que só pode ser visto através de análise, é apenas o meio para substituir o trabalho humano pela natureza ou seja “o meio objetivo para poupar o fator
Mas na aparência, o fetichismo se impõe “de modo que os méritos [da
capital assumem o comando de todo o processo produtivo e podem [se apropriar de uma parcela do produto]. Mas, vale prestar atenção, “essas considerações dizem respeito à da utilidade criada, escapando, assim, a nossas
é assunto da economia política (I, §20).
E segue o caminho para ligar tempo e capital.
“O que importa compreender é que, qualquer que seja o regime [capitalista ou socialista], o capital terá sempre custo diferente do custo dos fatores usados, elo fato de que implica em . É como que, em
O investimento é um “ . Noutros termos, a utilidade alternativa contida nos fatores usados para a produção do bem de capital será transitoriamente irá decorrer um “lapso de tempo... entre o momento em que é produzido o bem de capital e aquele em que a sociedade
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Vamos tentar explicitar algumas diferenças entre a economia política e a economia do projetamento. Supondo que o processo de desenvolvimento (aumento do produto ) prossiga, haverá o aumento da relação terra/trabalho “qualquer redução relativa da participação do trabalho implica em declínio
agora atenção “O preço da terra é um fato de [de economia política],
eventualmente se colocam em condições de cobrar ao resto do corpo social certa parcela das utilidades produzidas. Mas, para a sociedade como todo, a terra é rigorosamente gratuita, de modo que o aumento relativo de sua participação
Voltemos ao tempo.
Como o capital é produto “e como tal, cristaliza certa soma de utilidade
custo diminui no tempo desde que ocorra aumento da produtividade, ou seja, com o desenvolvimento econômico. Dessa maneira, deverá ser paga uma diferença entre o menor custo futuro, quando do consumo, e o custo maior efetivado no momento de produção.
A questão da valoração do capital no tempo põe em relevo a taxa de desconto, isto é, a taxa que atualiza os valores futuros, que assume a forma de taxa de juros.
Para Rangel, os economistas do século XIX, de Menger a Marx, não aprofundaram o estudo sobre a taxa de juros.
propriedade, fato típico do capitalismo avançado, provocará uma distinção entre lucro – utilidade virtual dos fatores – e o juros – preço do fator capital (V, §17), que é a e, como qualquer preço, varia inversamente a quantidade ofertada. Dessa forma “o juro tem... fundamento material, relacionado ao processo real de crescimento [e o juro é] a expressão monetária da utilidade
A visão dos economistas modernos, de que a taxa de juros seria determinada no mercado monetário, levaria a uma distinção entre taxa monetária e taxa natural de juros.
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produto não nos interessa senão a taxa real de juros, para o efeito de desconto, e que a única maneira de pesquisá-la é a referência ao ritmo de crescimento do produto (V, §20).
A taxa monetária não é um instrumento válido para a avaliação dos
§20). Adiante retorna ao tema e reforça a conclusão “taxa corrente de juros pode discrepar da taxa natural por estar presa muito mais a vicissitudes da moeda... do que à taxa real de crescimento... [portanto] torna-se indispensável relacionar os valores futuros com os preços por um fator que exprima o crescimento esperado
Em sendo o projeto, do ponto de vista das projeções dos custos e benefícios
uma assimetria estrutural, a determinação do fator, que relacione as utilidades no tempo é fundamental “Esse fator é a taxa de crescimento do produto
E nesse fator, e não a taxa monetária de juros, temos uma fundamental diferença entre a cálculo econômico do projetamento e o do capitalismo.
pois quanto maior a taxa de crescimento, que se projetará na taxa de desconto, maior depressão dos valores futuros o que será “fator tendente a dar preferência – dialética na adoção de novas técnicas, na medida em que a inversão, que mobiliza nova técnica também a imobiliza e, uma vez realizada, impede, ordinariamente, inovação subsequente. As consequências dessa dialética da técnica – do congelamento fruto do investimento, com uma estabilização temporária da função de produção, e adiamento de novas inovações fruto da não depreciação
serão tratadas no último capítulo.
A macroeconomia do projeto
O desenvolvimento, crescimento do produto , no longo prazo, depende do progresso técnico, isto é, de “novas combinações de fatores que em última instância viabilizem a substituição de trabalho por terra [recursos naturais
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É desta maneira que Rangel introduz o tema do último capítulo que versa sobre a estratégia do desenvolvimento diante de uma economia com desemprego. Pois diante dessa circunstância “o projetista deve ajustar seus critérios
de projetamento, mas, nesse arranjo, diante do desemprego, recupera a idéia desenvolvida no capítulo IV de que o crescimento do produto pode
razão terra/trabalho].
“O desemprego dos fatores limitados trabalho e capital] representa a possibilidade de expansão do produto independentemente de mudança nas combinações de fatores. Noutros termos, o produto pode crescer
mercado de engendrarem uma solução para o desemprego.
forma de promover o pleno emprego e alerta que “as empresas não dispõem
rigidez das combinações de fatores da indústria moderna, (VI, §12)] O que faz com “que no curto prazo, a demanda de fatores [seja] consideravelmente inelástica ao
Em seguida levanta a questão do mercado para o produto das empresas Resgata o argumento fundamental de “que a fonte última que nutre o poder de
Por esse chiste, para usarmos uma palavra grata ao autor, imediatamente, se vê obrigado explicar “o modo como realmente o projeto cria sua própria
Duas ideias são combinadas para esclarecer a questão. A primeira é a já apresentada que nada mais é do que o reconhecimento
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entre criação de demanda e de capacidade produtiva]. Essa assimetria estará na explicação dos movimentos cíclicos, como se lê na seguinte passagem “é graças a essa característica, que se torna cada vez mais acentuada, à medida que a técnica progride, que, ao invés de uma tendência continuada para a depressão
(VI, §15). Mas, apesar do movimento cíclico “o capitalismo tende no longo prazo a uma situação de emprego menos que pleno por causa do modo como se distribui
gasto dos capitalistas é (relativamente) independente de seus lucros correntes, ao passo que o gasto dos trabalhadores depende de seus salários, os capitalistas,
segundo os capitalistas encontram ou não interesse em gastar além de suas necessidades correntes de consumo – vale dizer, na medida em que descubram
A diminuição de salário em condições de desemprego levaria a redução da demanda global ao invés do aumento de investimentos. Por um lado, a rigidez da técnica impede a substituição dos fatores, por outro, o barateamento do trabalho com relação à terra e ao capital [que pode ser decomposto em terra e trabalho]
fator mais barato – o trabalho – e que portanto diminuirá a procura de bens de
Mas a demanda de mão-de-obra diminuiria em função da queda dos investimentos. E nada levaria os capitalistas a investir “se produção corrente não
aumentos de inversão induzidos por uma queda no salário, mas por algo que provoque independentemente, com relação a este, um aumento geral nas
Podemos esperar, para os países de capitalismo pouco desenvolvido, uma espontânea saída da crise. O setor pré-capitalista de subsistência sustenta níveis absolutos de salário e consumo. Com a quebra das empresas mais débeis “demanda efetiva os preços vigentes torna -se maior do que a oferta, criando-se
“Nos países de capitalismo desenvolvido esse mecanismo de sustentação do salário pela via do emprego alternativo na produção para autoconsumo perde
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A variável chave é o preço do capital, que pode ser entendido como “duas ; b) a
juros preferência pela liquidez pode impedir a queda ou mesmo elevar a taxa de juros e, com isso, o preço do capital. Aqui, encontramos papel para a política econômica “manipulação do poder emissor pode satisfazer a sede de liquidez do
livremente a taxa de juros... Desta maneira, o capital pode tornar-se relativamente mais barato que o trabalho e induzir combinações de fatores propendentes a
No curto prazo, o aumento do investimento provoca a expansão do emprego nas palavras de Rangel “
E com essa observação introduz outra problemática alertando que “iludido pelas aparências o planejador ou o projetista de país subdesenvolvido ou de país em depressão pode sentir-se inclinado a preferir técnicas que enfatizem diretamente o emprego de mão-de-obra, no nível do (VI, §30), o que não seria atitude sábia
Mas informa que, excepcionalmente, “há um caso em que escolha do projeto mais primitivo do ponto de vista técnico... é o [projeto] que assegura a
(VI §31). É quando a demanda derivada de um “projeto mais avançado do ponto de vista tecnológico (mais poupador de mão
questão. Em outras palavras, é necessário um estudo sobre aspectos espaciais do efeito multiplicador dos investimentos.
Conclui o capítulo chamando atenção para as possíveis formas de utilização dos fatores locais na formação de capital. Como a construção civil, principalmente na época da elaboração do livro, tendia a empregar fatores locais, a questão incidia sobre os equipamentos. Estes poderiam ser fabricados localmente ou comprados por recursos locais que seriam materializados em produtos de exportação ou de substituição de importações. Seguindo a ponderação, Rangel alerta que, no caso
o investimento e um possível efeito no emprego de recursos locais. E conclui “análise do custo social de um projeto pode obrigar-nos a investigações em
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Gostaríamos de concluir este artigo com algumas observações pontuais.
A primeira é o reconhecimento de que “ELEMENTOS DE ECONOMIA
considerava este livro o mais importante trabalho de Rangel e acrescento, numa
de necessidades e está carregada de juízos de valor. Pois estamos diante de
fetiches e senhor de seu destino. A crença no progresso e traços prometéicos na relação com a natureza completam uma visão que tem raízes no racionalismo clássico. O socialismo não é um fato fortuito, é o devir esperado que está sendo construído historicamente.
A terceira refere-se ao, hoje inexistente, objeto teórico principal da obra: a economia do projetamento, que, quando da elaboração da obra, estava em construção e tinha no planejamento soviético sua mais notável expressão.
Essa economia do projetamento está historicamente superada ou, pelo
para o capitalismo dos países da antiga cortina de ferro eliminaram, naquelas plagas, qualquer elemento de uma economia de projetamento. Da mesma
convergência, esperada por Rangel, na produção de utilidades dentro de uma
mercado em condições de capitalismo selvagem atuam em sentido contrário a qualquer coisa próxima a uma economia de projetamento, pois já deve estar
projetamento produtor de utilidades.
A economia do projetamento também entrou em colapso em nosso
processo de globalização contemporâneo. Os estados perderam a capacidade de
de desenvolvimento se transformaram em bancos de investimentos. O projeto
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como instrumento de avaliação de investimentos e alocação de recursos cedeu a vez para operações de mercado onde os usos e as fontes são desprezadas
de Rangel, poderíamos falar que o nômeno deixou de existir tirando o substrato histórico da teoria.
Pensamento econômico brasileiro: o ciclo ideológico do
BRESSER PEREIRA, L. C. e REGO, J. M. Um mestre da economia brasileira Ignacio Rangel. In: MAMIGONIAN, A. e REGO, J. M. (orgs.).
São Paulo:
KEYNES, J. A teoria geral do emprego. In: SZMRECSÁNYI,T. (org.). . São
MAMIGONIAN, A. Notas sobre as raízes e originalidade do pensamento de Ignacio Rangel In: MAMIGONIAN, A. e REGO, J. M. (orgs.).
São Paulo:
MAMIGONIAN, A. e REGO, J. M. (orgs.). São
RANGEL, I. Rio de Janeiro: Editora Contraponto, 2005.
_______. Desenvolvimento e projeto. In: RANGEL, I. Rio de Janeiro: Editora Contraponto, vol. I, 2005.
_______. Dualidade básica da economia brasileira. In: RANGEL, I. Rio de Janeiro: Editora Contraponto, vol. I, 2005.
_______. Elementos de economia do projetamento. In: RANGEL, I. Rio de Janeiro: Editora Contraponto, vol. I, 2005.
_______. Dualidade e escravismo colonial. In: RANGEL, I. Rio de Janeiro: Editora Contraponto, vol. II, 2005.
SANTOS, M. . Conferência no seminário Ignacio
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A importância histórica da teoria de Ignacio Rangel: um breve ensaio
Ignacio Rangel é detentor de uma obra reconhecida por sua originalidade
. Para Bresser Pereira e José Márcio Rego, Rangel foi um economista que “sempre se
77. 78,
Paulo Davidoff Cruz e por Fernando Cardoso Pedrão80. Essas análises, que em grande medida discutem a teoria rangeliana sob um viés econômico, esclarecem aos leitores que desconhecem a obra de Ignacio Rangel, que ele foi um economista que, na maior parte da sua vida, esteve vinculado a instituições burocrático-administrativas fundamentais para a economia brasileira, como o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), onde Rangel foi funcionário por mais de 20 anos, e a Assessoria Econômica do presidente Vargas. Além disso, tais análises também destacam o fato de que Rangel
O intelectual em questão, desempenhou um papel fundamental na consolidação das chamadas condições de produção capitalistas no Brasil,
76 Bielschowsky, 2000:209.
77 Bresser Pereira e Rego, 1998:13.
78 1998:131.
79 1980:01.
80 No artigo “Ignacio Rangel”, publicado em 2001.
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do BNDES (que, na época, desempenhava o papel que, anos depois, caberia ao Ministério do Planejamento) e participou da elaboração do Plano de Metas81, no governo de Juscelino Kubitscheck. Essa trajetória político-institucional se demonstra ainda mais interessante se for levado em consideração o fato de
militante do PCB (Partido Comunista Brasileiro), tendo inclusive participado de uma luta armada ocorrida no estado do Maranhão no contexto da chamada
Além disso, ainda no período de sua militância política82, após ter adotado
83 (enquanto pré-requisito para a revolução democrático-burguesa84), fato que lhe rendeu 10 anos de prisão (entre o presídio Frei Caneca, no Rio de Janeiro e 8 anos de prisão domiciliar). O que chama a atenção, em sua trajetória política, é que de opositor a Vargas, Ignacio Rangel se tornou um de seus principais assessores e, a partir daí, se consolidou nos cargos burocrático-administrativos do Estado. Uma vez inserido nesses cargos e tendo participado de cursos na CEPAL (Comissão Econômica
81 Enquanto chefe do Departamento de Economia e do Conselho de Desenvolvimento, ambos do BN-DES.
82 A militância política de Ignacio Rangel ocorreu entre 1930 e 1947, ano em que ele se desvinculou do Partido Comunista.
83 Revista Geosul, 1991/92:117.
84 A revolução democrático-burguesa constitui, na ótica comunista, uma etapa da revolução socialista na qual se consolidaria a chamada ditadura do proletariado, quando os trabalhadores assumiriam o controle do Estado. Naquela etapa os “entraves” para um desenvolvimento capitalista autônomo seriam eliminados, essencialmente o imperialismo e, com ele, o latifúndio e a burguesia vinculada ao capital estrangeiro, tidos como os seus “sócios internos”. Essa etapa da revolução seria realizada por uma asso-ciação entre camponeses, operários e a burguesia nacional. Assim, as duas etapas fundamentais desse programa nacional democrático da revolução brasileira seriam a “revolução agrária” (suprimindo as relações de produção baseadas no monopólio latifundiário da terra e instaurando relações de produção em que os trabalhadores assumissem o controle da terra) e a “revolução nacional”, que visava suprimir a dominação imperialista. Juntas, essas duas “revoluções” eliminariam os obstáculos à produção nacional e ao progresso social, condições tidas como essenciais para que a “ditadura do proletariado” pudesse
-lista e antifeudal, foram reverberadas no Brasil a partir da década de 1920, através do PCB, advindas da teoria leninista e da Internacional Comunista. A partir daí essa temática passou a ser discutida por vários intelectuais (como Astrojildo Pereira, Otávio Brandão, Caio Prado Jr., Nelson Werneck Sodré e Jacob
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para a América Latina e Caribe) e, também, composto o quadro de professores do
do governo JK – Rangel desenvolveu um modelo teórico de fato original o qual representava não somente sua percepção sobre a realidade brasileira, mas a defesa de seus próprios interesses (enquanto integrante de uma classe social) no aparelho de Estado.
Dessa maneira, a intenção deste ensaio é chamar a atenção para a importância histórica da teoria rangeliana a qual, ao apresentar uma interpretação da realidade brasileira tinha uma intenção concreta: intervir nessa realidade, através de uma análise que buscava propostas efetivas de ação. A l é m dessa característica, a teoria desenvolvida por Ignacio Rangel apresenta uma abordagem interessante da história econômica brasileira, uma leitura da chamada
acerca desse processo como defendeu que o grupo ao qual ele pertenceu, os quais podem ser denominados de intelectuais nacionalistas, deveria ocupar uma posição privilegiada na condução (ou assessoria) das decisões políticas do
a importância de sua atuação político-institucional, não pode desconsiderar o contexto no qual esse intelectual atuou e as relações institucionais que ele
dentro desse espaço.
o fato de que a sua militância (prematura), teria terminado a partir de uma discordância teórica com a direção do Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro85. Esse desacordo teria emergido, anos antes, de constatações surgidas
pouco, da qual Rangel teria sido um dos dirigentes. Após esse episódio, em
teria iniciado uma espécie de revisão das bases do pensamento comunista, do qual ele teria sido adepto até ali . A dissidência de Rangel em relação à teoria comunista, como já apontado, estaria na ideia de que, ao contrário do que o PCB postulava, a reforma agrária não necessariamente deveria preceder o
85 Rangel, 1991:62-63.
86 Revista Geosul, 1991/92: 117-118.
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processo de industrialização e esse, na perspectiva rangeliana, seria o caso do Brasil, uma realidade sui generis na história universal (RANGEL, 2005a: 537). O
Coluna Prestes, Euclides Neiva), teria sido o ponto de partida para a construção da teoria rangeliana, cujas ideias iniciais teriam sido mal recebidas por parte
resultado da não aceitação dessas ideias teria sido o desligamento de Rangel do Partido, por iniciativa dele, dois anos depois desse episódio87. No mesmo ano desse rompimento, Rangel teria feito o primeiro esboço do que viria a ser a base da sua brasileira. De acordo com o próprio intelectual, essa primeira aproximação teria sido apresentada em uma prova na faculdade de Direito, já no Rio de Janeiro, em
88.
Anos depois, os conhecimentos técnicos apresentados por Ignacio Rangel, em sua leitura dualista do Brasil, lhe abriram as portas de importantes órgãos governamentais, propiciando sua consolidação nos cargos de poder. Dentre esses órgãos estava a Assessoria Econômica do presidente Vargas e de Juscelino Kubitscheck e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), além de instituições fundamentais na formulação da ideologia desenvolvimentista, tais como a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL) e o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB). Mas a sua
rompimento com a esquerda. Ao contrário, com base nas temáticas discutidas naquelas instituições, Rangel aprimoraria suas análises sobre a dualidade
que isso, seu projeto político-ideológico.
A realidade brasileira sob a perspectiva teórica de Ignacio Rangel
As análises apresentadas por Rangel, ao abordarem a economia sob uma perspectiva histórica, traçam um interessante e detalhado panorama da realidade brasileira o qual é arregimentado pela teoria da dualidade. Nessa abordagem, seguindo os pressupostos básicos da teoria cepalina, Rangel (2005a: 225) via o Brasil como um país subdesenvolvido e, por
87 Rangel, 1991:62.
88 Rangel, 1991:67.
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conseguinte, a economia brasileira era tida como uma economia complementar ou um “complemento de outras economias muito mais desenvolvidas, aquelas
unidades econômicas aqui surgidas como um prolongamento da economia europeia, relacionavam-se diretamente com o mercado europeu e eram, a rigor,
Sendo assim, Rangel (2005a: 448) via o Brasil como “uma formação social periférica, que toma algum tempo para se aperceber de certos fatos ocorridos no centro dinâmico em torno do qual gravita, muito embora sofra muito
explicou que, justamente por ser dependente das economias centrais, a dinâmica da economia brasileira, seria marcada por movimentos que alternavam uma
de importações, conforme a conjuntura externa. Conforme explicações do próprio Rangel:
Ao longo de nossa história econômica, o movimento mais elementar de nossa economia tem sido esse: segundo a conjuntura externa, através das mudanças induzidas nos termos de intercâmbio e na capacidade para importar, o Brasil realça seus fatores entre a produção para exportação e a produção para o consumo interno. No primeiro caso, substitui produção nacional por importações; no
O Brasil, de acordo com essa análise, possuía uma a qual Rangel resumiu da seguinte forma: “como parte da economia mundial, ou seja, pelo seu comércio exterior, é parte de um complexo econômico, enquanto o mesmo Brasil, por sua produção orientada ao mercado interno, é uma economia
contradição entre a posição da economia dependente, vista em si mesma (ou seja, como economia capitalista não desenvolvida e dotada de pré-requisitos para uma pronta recuperação), e a mesma economia vista como parte do mercado mundial (situação em que esses pré-requisitos não aparecem). A substituição é a forma como
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Essa situação, ainda de acordo com essas premissas, só teria indicado
demanda externa por seus produtos (e com ela a redução de sua capacidade
industrialização incipiente, pautada na substituição de importações. Na análise rangeliana, portanto, a dinâmica da economia brasileira (até a o início
com o comércio exterior e, inclusive, o início do processo de industrialização no país teria sido uma resposta da economia brasileira diante da crise nas economias centrais, a qual resultou em uma diminuição da demanda externa pelos produtos brasileiros, diminuindo, em consequência, a sua capacidade de importação (dentro daquele sistema de trocas de matérias-primas por produtos elaborados). Nas palavras de Rangel (2005a: 42): “só em certo momento, quando a demanda externa por seus produtos começou a reduzir-se, essa situação precisou mudar, pois a economia brasileira converteu-se então em um complemento maior do que necessitavam as economias que
relativa, da capacidade para importar, a economia reage com a substituição . Sendo assim, segundo essa análise, “o comando de todo o
e a “chave de tudo está em sustentar o processo de substituições, uma vez . Isso porque a industrialização, inicialmente a partir da substituição
de produtos que até então eram importados, criava condições para que a economia brasileira começasse a se desvincular de uma situação de completa dependência aos movimentos (de ascensão e depressão) do comércio exterior .
89 -versal, especialmente a européia, porque nossa evolução não é autônoma, não é produto exclusivo de suas forças internas. Nossa economia nasceu e se desenvolveu como complemento de uma economia heterogênea e sempre esteve sujeita às suas vicissitudes”.
90
De acordo com ele, “toda a marcha do nosso desenvolvimento em forma mais abstrata” poderia ser resu-mida no seguinte “processus dialético”: “Tese: uma contração da capacidade para importar e do volume físico de nossas exportações rompe o equilíbrio anterior nas relações interindustriais de nossa economia.Antítese: a economia nacional reage por um esforço de substituição de importações que implica aumento das inversões capitalistas e crescimento do setor capitalista da economia.Síntese: aumenta a produtividade per capita, procura de importações, impelindo o sistema a repetir o processo, em nível superior”.
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92 Nas análises de Celso Furtado, semelhantemente, a consolidação da indústria brasileira resultaria em
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O desenvolvimento da economia brasileira estaria, essencialmente, na da transferência de fatores (mão-de-obra e capital) do setor agrícola
aos setores não agrícolas (manufatura e serviços), ou seja, na substituição da
a condição para que a economia dualista brasileira alcançasse um nível mais elevado de crescimento. Ainda de acordo com essa perspectiva, pelo fato de a industrialização brasileira ter ocorrido sem uma reforma agrária prévia (dada a
de exploração (cuja tendência seria se elevar ainda mais com o aumento da produtividade do trabalho), não compensada por uma “paralela elevação dos
.
“fenômeno característico de uma economia capitalista, que se desenvolve
A teoria da dualidade preconizava que à medida que o
no Estado, a taxa de exploração dos trabalhadores cairia e o consumo tenderia a
ótica, era necessária uma mudança no pacto de poder, o que só se efetivaria com o desenvolvimento das forças produtivas e a queda total do latifúndio
,
uma internalização do centro de decisão, o qual modificaria a situação de dependência da economia do Brasil em relação às economias externas. A partir desse processo, de acordo com Furtado, o país deixaria de ser uma “economia reflexa”. Essa discussão foi apresentada, de maneira mais pontual, na obra Desen-volvimento e Subdesenvolvimento.
93 Essas particularidades seriam resultantes do fato de a economia brasileira ser essencialmente dualista. Daí, a industrialização ter ocorrido sem uma reforma agrária prévia a qual, na percepção de Rangel
Dentre as “particularidades” ou “anomalias” advindas desse processo, podem ser citadas: a crise agrária (com a alternação de superpopulação/ superprodução e escassez (sazonal) de mão-de-obra e de matérias--primas; a atuação dos monopólios de produtos agrícolas; o preço da terra e todos os efeitos gerados pelo
avessas”, iniciada pelo Departamento II da Economia (de bens de consumo) e não pelo Departamento I (de bens de produção) , como ocorreu com as economias centrais.
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stracta)organização:
1) A “ (ou a economia natural): nela, a produção que seria consumida pelo próprio produtor e, para alcançar um maior nível de desenvolvimento econômico, deveria haver uma “alteração no modo de distribuição do tempo de trabalho no interior da
2) A “ ) – nessas áreas dominaria um capitalismo, mas semelhante ao capitalismo europeu do século XIX;
3) A “) – essas relações econômicas seriam dominantes no campo
do comércio exterior.
A existência dessas três estruturas superpostas, as quais estariam
[...] uma viagem através do Brasil é como uma viagem através dos tempos. Encontramos aqui, lado a lado, formações socioeconômicas da mesma índole das contemporâneas dos países mais desenvolvidos e outras que não podemos encontrar senão recuando no tempo. Noutros termos, no Brasil, coexistem e se condicionam mutuamente a Idade Moderna e a Idade Média [...].
94 A tese dos 3 níveis (strata) econômicos distintos que coexistem na economia brasileira foi apresenta-da já na primeira obra de Rangel, O Desenvolvimento Econômico no Brasil – 1954 (Rangel, 2005a:92 - 94), no ano seguinte ela foi retomada em (Ran-
Desenvolvimento e Projeto (p.213). Mas foi no livro Dualidade Básica da Economia Brasileira
brasileira, ou seja, a idéia de que essas três formações se opõem duas a duas, dando origem a duas dua-lidades diferentes - os stratas 1/2 e 2/3. O desenvolvimento, nessa ótica, estaria na segunda dualidade: a passagem da economia de mercado para o comércio externo. Ao que tudo indica, essa tese consistiu em uma prévia do quadro das dualidades, apresentado de maneira realmente detalhada em um artigo publicado em 1981, intitulado A História da Dualidade Brasileira.
95
96 Em Desenvolvimento e Projeto (1956)
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Ao considerar que a economia brasileira não seria “uma simples superposição das três zonas, mas sim uma combinação das três, que permanentemente interferem umas sobre as outras, cada uma delas reagindo ao
, Rangel estabeleceu que o processo de desenvolvimento econômico brasileiro (que se consolidaria a partir da industrialização), ocorreria a partir de dois princípios básicos: um aumento da produtividade, principalmente da mão-de-obra inserida nas zonas 2 e 3; e a absorção, por essas duas zonas, de uma
Sucintamente, essa análise defendia a ideia de que o desenvolvimento econômico brasileiro resultaria da transferência da população da economia
palavras do próprio Rangel:
O nosso desenvolvimento tem resultado e provavelmente resultará cada vez mais no futuro previsível, da transferência dessa população para o nível da segunda formação, daquele onde domina o capitalismo privado - razão porque prognosticamos um prolongado desenvolvimento capitalista para o Brasil (RANGEL, 2005a:148).
Essas colocações deixam explícitas duas questões importantes: primeiro, que a ideia de está na base da teoria rangeliana e, segundo (sob a
, que o desenvolvimento da economia brasileira se daria a partir de estruturais. A respeito desse último aspecto,
Essa mudança, processual, deveria acabar com o que ainda
presente na teoria rangeliana, era que, embora o latifúndio brasileiro apresentasse
97
98
seu livro sem uma palavra de gratidão para a Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) e, em especial para don Jorge Ahumada, diretor do curso de capacitação, em Santiago do Chile. Foi aí que metodo-logicamente fui informado das modernas teorias sobre desenvolvimento econômico, e que, encontrei também contradita sábia e fecunda, dessas que apuram o espírito e o animam a prosseguir.
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feudo medieval
O latifúndio brasileiro distingue-se do feudo europeu ou asiático pelo fato de ser, ao contrário deste, uma empresa comercial, como já o fora antes da fazenda brasileira de escravos. Enquanto os barões europeus cobravam tributo aos seus servos para atender diretamente às suas próprias necessidades de alimento, de moradia, de luxo, o latifundiário brasileiro apropriava-se desse tributo na intenção de vendê-lo, de auferir uma renda monetária. Mas o modo de organizar a produção dentro da fazenda era essencialmente o mesmo do feudo medieval, embora, muitas vezes, o tributo assumisse formas diferentes, isto é, se disfarçasse em lucro comercial ou industrial (RANGEL, 2005a:150).
Nessa perspectiva analítica, as relações de produção que prevaleciam no
100 nas relações econômicas que
capitalista, mas que estaria bem próximo das práticas presentes no feudalismo. Como ele mesmo explicou:
Se observarmos o modo de produção que corresponde a essa estrutura jurídica, vamos descobrir que só uma parte do tempo de trabalho e dos meios de produção ao dispor do camponês se aplica na produção de bens destinados ao mercado. Uma parte desses bens é entregue ao proprietário da terra – como aforamento ou como lucro comercial, pouco importa – e a outra parte é vendida pelo próprio camponês. Da parte recebida pelo latifundiário uma parcela variável é vendida e outra consumida diretamente por ele. A parte que o latifundiário vende, assim como a parte que o
99 É importante demarcar a semelhança dessa perspectiva com a abordagem feita por de Nelson Werneck Sodré, o qual apontou a estrutura econômica colonial composta por diferentes relações de produção.
-vistas e estão ligadas aos interesses do mercado externo, às necessidades do desenvolvimento do capital comercial. Já na pecuária e na mineração, predominariam as relações feudais. Ou seja, aproximando-se da perspectiva rangeliana, Sodré via a economia brasileira como sendo composta por duas ordens: exter-namente mercantil (através do modo de produção escravista), seguindo os interesses da ordem mundial capitalista e internamente feudal.
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a uma renda monetária. A parte que o camponês e o latifundiário consomem diretamente não é mercadoria e não resulta em renda monetária. Note-se bem: ao contrário do que ocorre numa economia monetária, onde a cada produto corresponde uma renda, razão pela qual ao medirmos a renda nacional estamos medindo o produto nacional, aquela parte do produto do meeiro, que ele próprio e o latifúndio consomem, não corresponde renda alguma, senão no
Longe de haver, por parte da teoria rangeliana, um interesse em ressaltar a questão da exploração dos trabalhadores rurais, a ênfase dessa teoria recaía sobre o fato de que esses camponeses destinavam grande parte do seu tempo
atividades não agrícolas da agricultura é o fato de resultarem, do ponto de vista das necessidades que satisfazem, na produção dos mesmos bens que, numa
101. Considerando que para Rangel (assim como para o ISEB e para CEPAL) o desenvolvimento
intenção da sua argumentação: defender a necessidade de transferir fatores (essencialmente mão-de-obra e capital) do setor agrícola para os demais setores
para o nível 2, da economia de mercado). Rangel resumiu esse argumento da seguinte maneira:
que, ao lado de um pequeno setor capitalista, tem enormes reservas de mão-de-obra empregadas em condições pré-capitalistas, parte dentro da economia e parte, a maior, fora dela. O desenvolvimento da economia brasileira supõe, pois: primeiro, a gradual transferência da mão-de-obra empregada em condições naturais para a economia de mercado (incorporação ao esquema nacional da divisão do trabalho); segundo, a expansão do setor capitalista a custa dos pré-
101 Deve-se destacar que essa perspectiva é observada nas análises rangelianas desenvolvidas entre os
perspectiva analítica.
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Em explícito que a dualidade brasileira não se resumia a coexistência de atividades
nessa percepção, a economia brasileira seria composta pelo:
comunismo primitivo, nas tribos selvagens; certas formas mais ou menos dissimuladas de escravidão, em algumas áreas retrógradas, onde, sob a aparência de dívidas, se compram e se vendem, não raro, os próprios homens; o feudalismo, em diversas formas, um pouco por todo o país; o capitalismo em todas as suas etapas,
de Estado que, do ponto de vista formal, pode ser confundido com o
Diante dessas circunstâncias, das particularidades da realidade brasileira, Rangel chamou a atenção para o fato de que as teorias estrangeiras não deveriam ser meramente importadas pelas análises que se empenhassem em compreender essa realidade102
por perceber a economia brasileira ser constituída por “aspectos de todas as
Houve quem pretendesse também explicar a história do Brasil como importação de formas e culturas estrangeiras, sem atentar para o fato de que realmente vamos construindo um edifício original e que, se aqui ressurgem institutos de outras eras que a história clássica registra, a única razão disso está em que a história da civilização não
102 -mente nos isebianos e cepalinos.
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103.
Nesse sentido, ele deixava bem claro qual era a sua intenção: ordenar e
torne capazes não apenas de prever a marcha dos acontecimentos, mas nela
princípio visivelmente presente na teoria rangeliana o qual pode ser resumido na ideia de Ou seja, a teoria desenvolvida por Rangel foi sua
parâmetros de intervenção na sociedade brasileira os quais delimitavam os papéis a serem desempenhados por cada uma das classes sociais.
Partindo desse princípio, e com base na teoria da dualidade é que Ignacio Rangel escreveu sua compreensão da história brasileira. E na sua tentativa de
o regime escravista. Uma vez que a teoria da dualidade é o modelo explicativo que Ignacio Rangel desenvolveu para abordar as transformações econômicas no Brasil (as que estariam em curso e as que deveriam ocorrer) e, a partir dela,
análise rangeliana deve, necessariamente, partir da brasileira.
Considerações Finais
Visando compreender o porquê de a industrialização ter ocorrido sem reforma agrária prévia, Rangel desenvolveu um modelo original e bem estruturado no qual não só a economia nacional foi discutida, mas a história do Brasil de uma maneira geral. O que se constata é que a teoria da dualidade é uma leitura histórica do processo de crescimento econômico brasileiro e não se encerra numa demonstração da historicidade dos fatos que apresentou, mas ela é, essencialmente, uma tentativa de compreender a dinâmica da economia
103 Retomando as palavras de Rangel: “As leis da economia brasileira são, em certo sentido, próprias, peculiares. As diferentes economias que nela coexistem não se justapõem mecanicamente. Ao contrário,
ao sistema. Noutros termos, estão em unidade dialética, unidade de contrários. A resultante não é nem
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104. Em linhas gerais, as análises apresentadas por Rangel teorizavam medidas que pudessem impulsionar o
que fossem apresentados no decorrer desse processo.
Já no que se refere aos diferentes grupos sociais (os trabalhadores, rurais e urbanos, os industriais, os intelectuais) e ao Estado, suas teorizações se
o crescimento econômico brasileiro fosse mantido. Na abordagem de Rangel, diferente da comunista, a classe trabalhadora estaria muito longe de ser o personagem central na condução do Estado socialista o qual, aliás, não nasceria de uma revolução dos trabalhadores, que tomariam o controle decisório, mas de revoluções graduais, resultantes da dinâmica das dualidades brasileiras.
Deve-se destacar o fato de que o maranhense Ignacio de Mourão Rangel foi um economista autodidata que se tornou um importante tecnocrata do Estado, mas que se mantém praticamente desconhecido nos círculos acadêmicos. As poucas análises ao seu respeito foram realizadas essencialmente por economistas os quais, com unanimidade, apontam a sua independência e originalidade teórica105.
Entretanto, ao resgatar informações referentes à sua atuação nos quadros burocráticos do Estado, bem como o núcleo dos tecnocratas com os quais ele
uma vez que foi a partir das temáticas discutidas pelo grupo da Assessoria, do ISEB (Instituto Superior de Estudos Brasileiros) e da CEPAL (Comissão Econômica da América Latina e Caribe) que Rangel desenvolveu as bases da sua teoria.
Além disso, embora Rangel tenha se desvinculado do PCB (Partido
(pautado na teoria básica) no qual as questões discutidas pelos
104 Um bom exemplo disso é que a teoria da dualidade desenvolvida por Ignacio Rangel partiu das pre-missas deixadas pelo “planejador soviético” Nikolai Kondratieff com o objetivo, ao que tudo indica, de estabelecer uma cronologia (com a intenção inclusive de prever os futuros comportamentos da economia
ido além de 1920, pois dele não há notícia desde os últimos anos daquela década, mas a extrapolação é perfeitamente admissível”.
105- Dentre esses autores estão: Armen Mamigonian, Márcio Rego, Bresser Pereira e Ricardo Bielscho-wsky.
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mapeados, livres do voluntarismo utopizante [...]107. Mas é interessante perceber como esse mesmo esquerdismo, que resultou no fechamento do ISEB (o qual ele integrou) e no afastamento de Jesus Soares Pereira (seu amigo da Assessoria Econômica) dos cargos burocráticos do Estado, não afastou Ignacio Rangel de suas funções tecnocráticas. Acredita-se que essa situação se deveu à sua habilidade política, e o exemplo mais representativo disso foi a intervenção do
político-administrativos na época.
(segundo os preceitos socialistas) de revolução democrático-burguesa, Rangel passou a questioná-los, situação que culminou com a sua saída do PCB. O que o intrigava era o fato de que, diferente do que era postulado pela ANL108 e pelo PCB, o Brasil continuava se desenvolvendo economicamente, mesmo sem ter
feudal e antiimperialista.
sua interpretação acerca da revolução socialista que deveria se processar dentro das condições apresentadas pela realidade brasileira. Sua básica foi a forma encontrada para explicar essas questões. Segundo ela, como já foi apontado, o caso brasileiro era uma particularidade, um caso sui generis na história universal , dada a sua como parte da economia mundial (por suas relações com o comércio exterior) ela era vista como parte de um complexo econômico, mas, por sua produção orientada ao mercado interno, era uma economia capitalista pouco desenvolvida110.
106 O título desse artigo é “O direitismo da esquerda”, publicado na obra Ciclo, tecnologia e crescimento (1982) e republicado no segundo volume das Obras Reunidas
107
108 Aliança Nacional Libertadora.
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111, o processo revolucionário no país (diferente das economias centrais) seria parcial,
(nas relações internas de produção)112. Desse modo, a passagem de um modo de produção para outro seria um processo muito lento e gradativo no qual o
Em sua interpretação da revolução democrático-burguesa no Brasil, a qual culminaria com o estabelecimento de um Estado socialista, embora se utilizando de referenciais teóricos russos (como Lenin, Kondratieff e M.
integrantes da Nação brasileira, a classe trabalhadora estaria muito longe de ser o personagem central na condução do Estado socialista o qual, aliás, não nasceria de uma revolução dos trabalhadores que tomariam o controle decisório (a chamada ditadura do proletariado), mas de revoluções graduais, resultantes da
é que deveria assumir a condução desse Estado. No projeto político-ideológico proposto por Rangel, havia a intenção de criar um projeto de unidade entre as
capitalistas. Sendo assim, diferente do modelo socialista, esse projeto não
produtivas e, além disso, com a expansão do capitalismo para o setor agrícola, haveria uma aproximação entre os interesses dos latifundiários capitalistas e os industriais.
Em sua atuação político-administrativa, Rangel realizou uma complexa tarefa: tentou conciliar a defesa de seus interesses de classe com a formulação
111 As principais “particularidades” ou “anomalias” eram a crise agrária, a atuação dos monopólios de -
ciada pelo Departamento II da Economia (de bens de consumo) e não pelo Departamento I (de bens de produção) , como ocorreu com as economias centrais.
112
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foi a proposição de uma releitura da revolução democrático-burguesa para as condições brasileiras, através da sua teoria . Nela, Rangel
clássica diferenciação desse modelo político-ideológico com os regimes fascistas
no Brasil), mas sem deixar de ser coerente com o seu modelo teórico, pautado na teoria da dualidade.
Foi a partir da perspectiva dualista que Rangel resolveu a questão do
direito trabalhista à manutenção e expansão das relações de produção feudais
não implicava retorno algum, pois ainda não tínhamos sindicalismo moderno, e correspondia aos interesses não apenas das indústrias e do patronato, como
113.
Tal contradição, vista sob a perspectiva dualista, torna-se aparente, já que para a teoria rangeliana, a CLT114, por excluir os trabalhadores rurais (dos benefícios das leis trabalhistas), demonstrava a força política que os
terceira dualidade).
A perspectiva dualista, portanto, para além de constituir os fundamentos do modelo teórico rangeliano, foi fundamental na luta político-ideológica que Rangel enfrentou dentro do aparelho de Estado. A partir de sua teoria da dualidade, ele demonstrou sua interpretação sobre a história econômica brasileira, formulou sua concepção de revolução brasileira e defendeu a posição de uma elite intelectual na condução do processo político nacional.
que a teoria rangeliana da dualidade não esteja sendo estudada ao lado das análises desenvolvidas pelos intelectuais da esquerda brasileira, tais como Alberto
115.
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114 Consolidação das Leis Trabalhistas.
115 escravismo colonial, questionou a perspectiva rangeliana da dualidade que via a coexistência entre feudalismo e escravismo no Brasil.
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Pois, assim como eles, Ignacio Rangel apresentou uma interpretação da história do Brasil na qual as condições da revolução democrático-burguesa foram discutidas, mas com uma variável fundamental: o fato de ele ter desenvolvido suas análises a partir de uma posição privilegiada, dentro do aparelho de Estado.
A comemoração do centenário de Ignacio Rangel (cuja teoria ecoa de discussões fundamentais dentro da esquerda brasileira e a qual, não obstante alguns distanciamentos, se manteve como um ponto de diálogo durante sua trajetória político-institucional), acaba sendo um convite à (re)visitar sua obra e a
trad.
BRESSER-PEREIRA; REGO. Luís Carlos; José Márcio. Um mestre da economia brasileira: Ignacio Rangel. In: MAMIGONIAN, Armen; REGO, José Márcio (orgs.). O
CRUZ, Paulo Roberto Davidoff Chagas. – o debate econômico dos anos sessenta. Dissertação de Mestrado. Campinas, Unicamp,
MAMIGONIAN, Armen; REGO, José Márcio (orgs.). Rangel
permanência. In: Vol. IV, Campinas, Ed. da Unicamp, 2000.
,
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colonial”) publicado no terceiro volume da , em 1978. Esse mesmo artigo foi republicado no segundo volume das Obras Reunidas de Ignacio Rangel. Segun-do a teoria da dualidade, desenvolvida por Rangel, “a escravidão, salvo como exceção – antecipação, sobrevivência ou acidente – numa sociedade feudal é, por certo, um contra-senso, mas numa sociedade (e economia) externamente feudal, pode haver relações de produção essenciais de caráter escravista,
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, Rio de Janeiro,
Obras
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______. Desenvolvimento industrial do Brasil e suas características dominantes
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In: , Rio de Janeiro,
, Rio de
, Rio
Obras
Obras , Rio
, Rio de
______. Entrevista com o professor Ignacio de Mourão Rangel. Revista Geosul.
Rio de Janeiro:
PEDRÃO, Fernando Cardoso. Ignacio Rangel. Estud. av., São Paulo , v. 15, n.
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A categoria dualidade básica como uma interpretação do Brasil
Introdução
Ignacio Rangel foi um pensador do Brasil. Sua contribuição transcende a de um estudioso em temas e questões brasileiras. Tem a cara da complexidade desse país que, segundo ele, seria irretratável por teorias estrangeiras, precisava de uma teoria própria que descrevesse seus movimentos tão particulares e, ao mesmo tempo, tão conectados às inquietações da ordem externa.
Maranhense da cidade de Mirador, nascido no segundo décimo do século
muito provavelmente por isso, era transferido constantemente entre localidades no interior do Estado. O menino Rangel teve que se construir intelectualmente como autodidata, na medida em que em muitas das cidades em que viveu não
as venturas e desventuras da Coluna Prestes, Rangel acabou integrando-se à
uma ação: a Aliança Nacional Libertadora. Desta vez terminou preso.
Enviado para cumprir pena no Rio de Janeiro participou de uma espécie de Universidade Popular do presídio que, segundo o próprio, tratava de dar cabo do estudo de alemão, francês, inglês, sociologia, economia e matemática
impedido de sair durante oito anos.
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dominante. Percebia que o país vivia os estertores de uma crise e que não era possível pensar o Brasil sem esta dimensão. Por isso Rangel foi um dos autores
brasileiro sob crise. Seu trabalho marca as penas de autores fundamentais para a construção do debate, inclusive universitário, no Brasil, como é o caso da professora emérita Maria da Conceição Tavares, que já se declarou muitas vezes rangeliana em sua análise sobre o desenvolvimento brasileiro. Contraditoriamente, não é amplamente reconhecido como um pensador importante na academia brasileira.
Rangel, como teórico, ainda que não acadêmico, organizava seu pensamento a partir de um esquema analítico que construíra com base no método dialético de aplicação do materialismo. A este esquema de compreensão da realidade brasileira chamou de tese da dualidade básica da economia brasileira. O objetivo deste trabalho é mergulhar na compreensão da tese rangeliana da
chave de leitura, no campo da economia política, para a interpretação do Brasil.
A dualidade básica e seu método
A tese da dualidade básica corresponde a uma adaptação original do materialismo histórico e da teoria econômica para a análise do caso brasileiro. Desta análise o autor pretendia retirar leis gerais da formação histórica e de funcionamento da economia brasileira, descrevendo o processo de desenvolvimento do país, no campo da economia política.
Rangel via a história como uma sequência de etapas nas quais se articulavam os modos de produção da vida, suas relações sociais de produção e o desenvolvimento das forças produtivas. Rangel considerava que, correspondentes a tais formas estruturais, existiam formas superestruturais que derivavam e
116 Podemos destacar sua referência na introdução a sua obra “Da substituição de importações ao capi-
o padrão de acumulação brasileiro que continha uma forte crítica a interpretação estagnacionista do
que o sistema entrasse em crise total e não deixa de ser uma ironia para um intelectual crítico que o governo posterior aplicasse “ortodoxamente” não poucas das receitas “heterodoxas” recomendadas por
um sentido histórico inteiramente distinto daquele que aconselhava o autor (p.18).”
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eram limitadoras desta infraestrutura117. Cada etapa de desenvolvimento deste conjunto dialético de estrutura e superestrutura corresponderia a um modo
dinâmica de seu argumento preservava a essência dialética do materialismo, ainda que permeado por um tanto de esperança evolucionista, ou seja, seguia a lógica de que um modo de produção se transformaria em outro, mais avançado, no momento em que as suas relações de produção deixassem de estimular o desenvolvimento das forças produtivas e passassem a entravá-lo.
para se perceber como a sequencia de etapas brasileiras se distinguira da trajetória do centro capitalista durante seu processo de formação. Assim, abriu espaço em sua teoria para a adaptação crítica das teses econômicas existentes no campo do marxismo e da teoria econômica ocidental para a análise do Brasil,
capitalismo.
Segundo Rangel, o elemento fundamental que diferenciaria, desde o ponto de partida, a análise de uma economia como a economia brasileira seria a evolução das suas relações com as economias centrais. Tais relações, combinadas com a interação entre o desenvolvimento das forças produtivas e das relações sociais de produção, dariam origem aos processos sociais, econômicos e políticos brasileiros. Em larga medida as relações externas são determinantes do desenvolvimento das forças produtivas internas e, consequentemente, também das relações de produção internas.
Não se poderia encontrar um método mais marxista autêntico no sentido de preocupar-se em ser materialista, histórico e dialético. Materialista por jamais perder o concreto como ponto de partida e de retorno do processo de
com todas as contradições presentes como constituintes do movimento do todo. No entanto Rangel foi obscurecido no debate da história do pensamento econômico brasileiro por ser considerado um determinista, dualista e por isso
117 As formas superestruturais eram muito importantes na análise de Rangel, pois sendo compostas das leis, das formas políticas de governo e sucessão, bem como de todo o aparato da consciência social (em larga medida ideológico), traziam em si o espaço de concretude da disputa das ideias. Para ele, conhecer as leis de um país era uma parte fundamental do processo de compreensão da sua formação histórica, na medida em que é nas leis que se inscreve a história dos vencedores.
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A dualidade básica enquanto categoria e enquanto teoria
pelo Instituto Superior de Estudos Brasileiro (ISEB) na série
. Neste período, a noção de dualidade estava associada a dois grupos: a direita agrarista conservadora e o stalinismo ortodoxo118. Apesar de representarem pensamentos bastante opostos do ponto de vista político, ambos eram largamente contestados pelo pensamento crítico libertador da época. e , respectivamente de Sérgio Buarque de Holanda e Caio Prado Junior, já tinham sido publicados há cerca de duas décadas e eram o norte do pensamento daqueles, como
Brasil conforme interpretado por aqueles que tinham como norte uma orientação metodológica ou naturalista, ou de tipo positivista, apresentando uma visão hierárquica e/ou autoritária da sociedade.
sua juventude foi marcada por pensamentos e ações revolucionários, o que o incompatibilizava com o pensamento de direita. Do outro lado, não havia entrado no Partido Comunista Brasileiro (PCB) por possuir uma interpretação teórica
partido. A visão de dualidade rangeliana era (e é) extremamente original, como veremos a seguir. Neste ponto, nos parece razoável supor que o autor fez recurso a expressões já institucionalizadas no âmbito de várias teorias com vistas à
Brasil, porém falhando simbolicamente na construção de novas referências.·.
A categoria de dualidade básica aparece na obra de Rangel sempre
o autor assume no prefácio sua tarefa crítica e seu elemento conservador. Lá
de não abandonar a ciência econômica estrangeira, ou “demoli-la, para, sobre os seus escombros erigir uma ciência autóctone, mas, ao contrário, de salientar
118 Sobre esta questão ver Freitas (2000).
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estudos o haviam levado a conclusão de que o que há de peculiar no Brasil é a dualidade, no sentido de que todas as nossas instituições e categorias possuem dupla natureza, e se apresentam como coisas diversas, se vistas do interior ou do exterior, partindo imediatamente para aplicá-la à formação histórica da nação brasileira, cujo ponto de partida seria a abertura dos portos.
Em todos os seus textos Rangel tem sempre como referência analítica sua teoria da dualidade básica. Seus textos sobre a questão agrária, sobre tecnologia e crescimento e sobre economia brasileira e projeto nacional, escritos no calor de debates fundamentais na história brasileira do século XX, possuem a marca indelével desta teoria original. Por isso não é possível pensar Rangel sem compreender esta estrutura básica. Então vamos a ela.
A primeira questão a ser compreendida é que a categoria dualidade pretende descrever a complexidade da formação histórico-social predominante em um período no Brasil. Deste modo, podemos dizer que esta categoria cumpre
e superestrutura) existentes no Brasil em cada época. A condição histórica de se ter constituído como nação tardiamente em relação aos países do centro capitalista, na compreensão de Rangel, trazia a necessidade de apreciar sempre o movimento, de forma simultânea, de uma perspectiva interna e externa. Assim, cada dualidade da economia brasileira como um todo seria originada a partir da dupla determinação das relações internas e externas, que também vão consubstanciar a dualidade presente em todas as instituições econômicas brasileiras.
Vale a pena esclarecer que Rangel articula os dois lados (interno e
dinâmica de desenvolvimento, construindo uma unidade de contrários, mas uma unidade, ainda assim preferiu descrevê-la como dualidade.
Como em toda análise dialética, nosso autor introduz um movimento que ao mesmo tempo é a essência e a explicação da tese da dualidade brasileira. Cada dualidade é um modo de produção complexo que combina elementos de diferentes modos de produção já referenciados na análise da história europeia/mundial. Os modos de produção brasileiros (dualidades) se sucedem segundo uma lógica que se expressa em cinco leis que organizam os movimentos dos componentes da dualidade.
Cada dualidade possui um polo externo e um polo interno e cada polo possui dois lados.
O polo interno expressa a convivência de dois modos de produção no
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país. O lado interno do polo interno diz respeito à relação interna de produção mais arcaica, ainda que predominante em parte do tempo. É no lado interno do polo interno que está a forma a ser superada. O lado externo do polo interno representa a nova forma de organização produtiva que começa minoritariamente convivendo com a antiga até o momento em que o desenvolvimento das forças produtivas indica que é a hora de superar-se o modo arcaico e substituí-lo. O lado externo do polo interno comunica-se com o lado interno do polo externo na dualidade.
O polo externo representa as relações do país com o exterior tanto em sua face de inserção no mercado mundial, como em sua face de recepção do movimento mundial. O lado interno do polo externo é a forma por meio da qual o país se relaciona com o exterior, e que traz em si o modo de produção mais adiantado. Segundo Rangel, será esta a forma de produção que ocupará o lado
do polo externo representa o modo de produção vigente no centro do sistema.
Assim, os lados interno e externo do polo interno, bem como o lado interno do polo externo dizem respeito às formas das relações sociais de produção e às forças produtivas vigentes no Brasil, enquanto o lado externo do polo externo retrata o andamento das relações sociais e forças produtivas em curso no centro capitalista, ao qual o país está submetido .
A caracterização dos polos e dos lados da dualidade é importante para sua compreensão, mas ainda não revelam sua chave analítica, qual seja, o seu movimento. Rangel pretendia apresentar uma leitura baseada na lógica dialética, portanto o aspecto essencial para sua compreensão está na sua capacidade de descrever o movimento das estruturas caracterizadas.
A descrição do movimento transformador das dualidades foi sumariado pelo autor nas cinco leis de funcionamento da dinâmica das dualidades. As leis foram apresentadas do modo a seguir:
1. o desenvolvimento das forças produtivas muda a dualidade, mas a mudança ocorre apenas em um dos polos;
2. os polos interno e externo mudam alternadamente;
3. o polo muda pelo processo de internalizar o modo de produção existente no seu lado externo;
119 Vale destacar as semelhanças entre a visão de Rangel e a formulação da teoria da dependência de Cardoso e Faletto (1967), no entanto tais autores não possuem referências explícitas ao economista maranhense.
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4. incorporando elementos de um modo de produção mais avançado;
5. as mudanças na dualidade brasileira são provocadas por mudanças no centro dinâmico.
Assim, as leis de movimento garantem que cada polo muda sempre sozinho e que uma mudança no polo externo será sempre seguida por uma mudança do polo interno e vice-versa. Não é possível que um dos polos mude sem implicar em mudanças no outro, ou que mude novamente antes do outro polo o acompanhar. A dinâmica da mudança é sempre a incorporação do externo para dentro. O que implica, em última instância, que o movimento detonador do processo de mudança vem sempre de fora. Esta visão evidencia o grau de
também, muitos o chamaram de determinista.
A interpretação deste trabalho como determinista padece da incompreensão de que se trata de uma explicação para a história do Brasil. A tese da dualidade básica, ao descrever a história, fala de algo que já está determinado e aponta para uma dinâmica que pode ser mantida ou rompida. Porém, permanece a questão de se o rompimento teria que também vir do centro do capitalismo, ou se está aberto um movimento nacional ou da periferia articulada como possível saída. O devir presente na análise de Rangel restringe-se à quarta dualidade que mudou fartamente de caracterização a partir de sua análise de conjuntura de cada período (apesar de sua esperança desejar sempre encontrar o socialismo no lado externo do polo externo na quarta dualidade).
Para Rangel a dinâmica do centro também segue uma lógica, que é a do ciclo de Kondratieff. Segundo Kondratieff a economia capitalista se desenvolve em ciclos de aproximadamente 50 anos. Esses ciclos longos são relacionados com o processo de difusão das inovações tecnológicas, cuja dinâmica implica em uma progressiva substituição técnica, em que a onda de investimento produtivo gera emprego até o ponto onde a nova técnica passa a dominar a anterior. Esta dominância determina uma obsolescência da tecnologia antiga que determinará um sacrifício de recursos materiais e humanos correntemente em uso, se expressando na forma de crise. A superação da crise é dada pela própria dinâmica do ciclo, sob o qual após um período de crise, em que há queima de capital e desemprego de trabalho, abre-se espaço, posterior à maturação no último ciclo de investimento, para a introdução progressiva de uma novíssima técnica, restaurando seu movimento ascendente por meio do investimento em nova tecnologia.
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A questão de Rangel era que, no entanto, no Brasil não era possível
uma economia dependente do ponto de vista tecnológico. Nossa dinâmica de inovação não era traçada internamente. Rangel era bem radical desse ponto de vista, supunha totalmente ilusória para o Brasil a hipótese de independência
estruturado. De seu ponto de vista, o efeito fundamental deste ciclo longo na dualidade brasileira é que na fase recessiva do ciclo há uma mudança dos parceiros da aliança de poder que domina as relações político econômicas. Isto
medida em que há um estrangulamento do comércio exterior nos momentos de crise na infraestrutura, passa por rupturas, seguindo a lógica dos ciclos longos de Kondratieff.
Põe-se então nossa última questão: como este complexo esquema
A dualidade como uma interpretação do Brasil
A teoria da dualidade de Rangel foi construída como uma crítica marxista ao etapismo que vigorava na ortodoxia do pensamento deste campo sob o stalinismo ou no marxismo destituído de sua dialética. O próprio Rangel, em
referência o etapismo ortodoxo. Acreditava que sem a reforma agrária não seria possível que o Brasil se industrializasse. Em seguida assistiu a primeira fase do processo substitutivo de importações, precisou parar para compreender os limites da abordagem que seguira e chegou à teoria da dualidade. Não rompeu completamente com a visão de que o desenvolvimento ocorre em etapas, mas
outros países que pudessem ser considerados mais avançados que o Brasil.
Em sua primeira formulação a teoria da dualidade partia da concepção de que “fora da história, a economia se reduz à lógica, à dialética e a uma gnosiologia, que tanto são econômicas como físicas ou químicas. Não existe, pois, economia ‘pura’ (…). A ciência econômica, porém, varia com o modo de produção e este
para dar partida ao intento de interpretar o Brasil com sua teoria historicizada é Mauá.
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Rangel destaca em Mauá a preocupação de fazer uso do “bom senso
da noção de historicidade das leis da ciência social. De seu ponto de vista, estava aí colocada a ideia de que o homem varia seu ser e sua consciência
para explicar
o caso da economia brasileira – bem como por Prebisch, por ter se recusado a admitir o sentido de universalidade que normalmente se pretende atribuir às teorias formuladas nos centros mundiais.
Recuso-me a admitir que a economia de uma tribo indígena pré-cabralina seja regida pelas mesmas leis que regem o funcionamento da bolsa de Nova York ou os planos quinquenais soviéticos. (Rangel,
Sob esta certeza Rangel formula questionamentos sobre o comportamento
permanente em uma economia capitalista é que períodos de depressão se alternam com períodos de prosperidade. Indica, inclusive, que alternativas solucionar esta instabilidade cíclica foram sendo construídas historicamente.
estariam postas pelo socialismo, de um lado, e pelos gastos públicos, no contexto capitalista. Destaca, em ambos os casos, a ação humana deliberada em prol da estabilidade, e assim o sentido do planejamento. Para nosso autor uma lei que
processo real, torna-se falsa com o correr da história. Isto porque é substituída por outra cuja construção é resultado deliberado de ações humanas, “porque o
Se isto é verdade para as economias modernas, centrais, Rangel se pergunta, o que dizer então de uma economia que seja ao mesmo tempo
A resposta que encontra a esta pergunta é a dualidade. No Brasil, a convivência de modos diversos de organização social da vida implicaria a impossibilidade de se aplicar as leis do capitalismo a partes importantes
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constituintes do sistema econômico vigente dentro de nossas fronteiras. Em
capitalista não era homogêneo, na medida em que se articulava externamente com um capitalismo que estaria, em sua visão na fase descendente do ciclo, enquanto internamente a própria crise mundial articulava um “vigoroso
do desenvolvimento da economia ao longo da história em nosso país, o que intrigava o intelecto de Rangel era descobrir como as leis dos vários modos de produção coetâneos se articulavam, auxiliavam ou limitavam umas às outras.
Com esta questão em mente Rangel apresentou, talvez de forma mais acabada em seu artigo interpretação sobre o Brasil na forma da construção de dualidades que se foram transformando.
A primeira dualidade iniciar-se-ia com a abertura dos portos em 1808, pois considera que este movimento gestou a integração do polo externo brasileiro. A hipótese implícita de Rangel é que só com a vinda da Família Real a economia do Brasil passou a ter centralidade real e formal para ser pensada em sua dinâmica própria. De seu ponto de vista, a sanção política desde movimento foi dada pela Carta da Lei de 1815, criando o Reino do Brasil, ganhando sua forma
brasileiras mudam a partir de alterações que ocorrem no centro capitalista, mais
primeira dualidade, o autor destaca que os movimentos no centro iniciaram-se
(1815), com a restauração.
Assim, o polo externo na primeira dualidade brasileira teria em seu lado externo o capitalismo industrial europeu, que se articulava com o lado interno por meio do capitalismo mercantil constituído dentro do Brasil, a partir de 1808, com a instituição de um aparelho de intermediação mercantil distinto do serviço público concedido a uma empresa pela Coroa de Portugal.
O polo interno da primeira dualidade tem outras referências, pois havia se caracterizado em seu lado interno pela organização da produção escravista, centrada na fazenda de escravos que “tende a tudo reduzir à condição dos
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na medida em que a produção escravista, segundo Rangel, se dava sobre uma estrutura de propriedade e uso feudal da terra, seguindo as máximas “toda terra
caracterizada pelo domínio de apenas duas classes (duais) representativas
como hegemônicos e representando o polo interno, e os capitalistas mercantis, representando o polo externo. O grupo social hegemônico Rangel denomina de
da dualidade, enquanto o outro grupo dominante é intitulado de . O movimento de mudança interno é apresentado com a lógica
teria a função precípua de “fortalecer-se economicamente, assumir novas posições de comando no sistema e amadurecer politicamente, ganhando coesão, homogeneidade e clara
Caracterizada assim e nascida sob o signo na transição da fase A para a fase B do primeiro Kondratieff, a primeira dualidade teria como papel histórico resolver o problema de assegurar o crescimento da economia, não obstante o estancamento prolongado do comércio exterior, ou em outras palavras, promover um processo de substituição de importações120.
As considerações que acerca da substituição de importações elaboradas pelo autor são muito heterodoxas. Em sua visão a permissão de existência de
de instalação de uma indústria substitutiva de exportações, no sentido próprio,
outro lado houve substituição de importações no Brasil no contexto do feudo-fazenda de escravos. Em suas palavras:
Com efeito, escorraçado da economia de mercado, o esforço de substituição de importações, nas condições da fase B do Kondratieff
atividade produtiva, no interior da fazenda de escravos, vale dizer nas condições da economia natural, onde o poder de competição da
120 Esta será a dinâmica de ajustamento em toda dualidade. As mudanças de dualidade são sempre prece-didas deste tipo de movimento, cuja dinâmica é dado pelo ciclo de Kondratieff das economias centrais. Somente após a instauração de um setor produtor e desenvolvedor de bens de capital no Brasil é que poderíamos pensar em uma dinâmica de transformação movida por nosso próprio ciclo de inovação e investimento.
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indústria capitalista do centro dinâmico chegava mais enfraquecido
A esta ação substitutiva de importações Rangel atribui a mudança de natureza da fazenda de escravos, que crescera em escala e se tornara menos agrícola, na medida em que realocava seus recursos internos para atividades como construção, indústria de transformação e serviços. Em sua visão, o feudo-fazenda de escravos se tornara mais autárquico, o que implicava que o país
diferenciado daquele marcado pelo padrão do comércio exterior.
Foi este mesmo movimento que deu origem a agudização das contradições, internas à fazenda de escravos, representadas pelo arcaísmo das relações sociais de produção e pelas mudanças vivenciadas nas forças produtivas. Destas contradições nasce a mudança do polo interno na qual há uma transformação da fazenda escravocrata em uma estrutura feudal para dentro, enquanto da
modo de produção do lado interno do polo externo. Neste contexto os “vassalos-
transformações das limitações legais de importação da mão de obra escrava e a lei de terras, ambas iniciadas em 1850.
A passagem da primeira para a segunda dualidade foi resultado de um longo processo de trabalho das contradições mencionadas. Na nova dualidade a fazenda internamente feudal tinha seus produtos – extraídos como tributo
Sobre esta base econômica se assentava a superestrutura de um Estado cujo agora era a burguesia comerciante (capitalistas mercantis),
anterior, e como os fazendeiros, latifundiários feudais por um lado e comerciantes outro. Nesta dualidade o antigo fortalecera-se e fora capaz de tomar a posição de na ocupação do Estado.
As condições externas sob as quais nascera esta segunda dualidade também se referiam a uma fase recessiva do ciclo longo. Neste caso, era a fase recessiva do segundo Kondratieff. Novamente a questão chave estava na substituição de importações. Agora o esforço principal estaria nas mãos do
produção interna por processos artesanais e manufatureiros.
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A interpretação rangeliana aponta para uma mudança na fazenda no período de ascensão do segundo ciclo longo que levou a uma acumulação, nas mãos dos senhores, de uma renda monetária que fora convertida em gastos na direção do espaço urbano, especialmente no que tange à moradia. Levaram
trabalhadores escravos aplicados em serviços urbanos e atividades artesanais e cujo recebimento era totalmente entregue aos seus proprietários. O autor
a orientação do capitalismo mercantil, nos preparamos para a nova fase da industrialização substitutiva de exportações que viria a ocorrer na dualidade seguinte.
A segunda dualidade também fora marcada pela 1ª Guerra Mundial,
o que reforçou a necessidade do processo de substituição de importações,
Kondratieff, representado pela Grande Depressão Mundial, que abriria as portas para nossa terceira dualidade.
A terceira dualidade se forma a partir da mudança do polo externo da segunda dualidade, pois este era o polo mais antigo e que tenderia a ser alterado. A alteração esperada pelo esquema de Rangel seria a internalização do modo de produção do lado externo do polo externo, ou seja, a introjeção do capitalismo industrial com forma de organizar as relações entre o país e o exterior.
Do lado externo, a organização mundial pós Grande Depressão teve como
anárquico tinha dado origem à fase B do terceiro Kondratieff, além de carregar em si a dualidade capital industrial – capital bancário. A estrutura multinacional
a implantação do capitalismo industrial no lado interno do polo externo. Revelando não apenas uma troca de hegemonia interna, mas também uma troca de hegemonia no plano internacional (hegemonia inglesa pela hegemonia americana).
A superestrutura da terceira dualidade era formada por um que era a burguesia industrial nascente, representando o polo externo, mas interessantemente Rangel destaca que o eram os fazendeiros-comerciantes, representantes do polo interno. “Tal como das outras vezes, a origem desse sócio-menor foi uma dissidência da classe hegemônica da
aparece como uma
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dúvida: o que seria a tal burguesia comercial brasileira, se não os fazendeiros-
Rangel parece revelar em si uma dualidade entre urbano e rural na disputa da dominação do Estado brasileiro.
Nestas condições percebia-se o nascimento de uma economia periférica que produzia seu próprio ciclo, na medida em que desenvolvia um processo de substituição de importações industrializante, no qual o Estado entrava subsidiando o capital por meio de uma acumulação de recursos em suas mãos engendrada pela nova legislação trabalhista.
Assim, considera a entrada em cena dos ciclos de Juglar (ciclos de investimento independentes de um novo padrão tecnológico que ocorrem aproximadamente a cada 10 anos) para explicar a dinâmica da dualidade brasileira a partir do advento da industrialização no Brasil, ou seja, de seu
brasileiros seriam causados pelo acentuado desajustamento estruturais do nosso processo de industrialização, orientando o ajustamento da capacidade ociosa intersetorial e gerando a necessidade periódica de ajustes institucionais para reestruturação de sua fase de ascensão.
Outra singularidade da terceira dualidade está no fato de que a industrialização não se interrompeu quando da fase A do quarto Kondratieff. “O dinamismo do processo de industrialização, engendrando demandas de importações sempre novas, fez com que o impulso se mantivesse, não obstante
industrialização brasileira teve fôlego, passando de sua fase de produção apenas de bens não duráveis de consumo, para a produção industrial de peças, bens duráveis de consumo, bens de investimento e insumos básicos. Rangel ainda destaca que esta industrialização esteve presente também na própria agricultura, tornando mais agudas as contradições internas do setor e do sistema como um todo.
Enxerga ali a crise da terceira dualidade e a possibilidade de se desembocar na
contradições internas.
O quadro externo também indicaria o movimento de entrada na fase B
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primeira crise do petróleo. Também estava presente a crise do comércio exterior normalmente diagnosticada como o elemento detonador de um processo interno de reorganização da produção para substituição de importações crucial para o acirramento das contradições internas e a mudança de dualidade brasileira. A diferença é que esta crise não viria inicialmente pelos fatores tradicionais de restrições expressivas de quantum exportados e piora dos termos de troca, ao contrário o aumento de exportações, por meio da desvalorização cambial,
Nesta análise, ainda destaca que o esforço de substituição de exportações que seria necessário para a criação das condições para uma mudança na dualidade brasileira seria o de substituir mais do que apenas o petróleo internacional por sua produção interna ou por fonte de energia alternativa, mas uma mudança na forma de produzir os vários bens dependentes desta base energética em nossa matriz insumo-produto. Nosso autor preocupava-se, pois este tipo de alteração na estrutura industrial demandaria vultosas imobilizações
permitisse viabilizar esta notável formação de capital.
Daqui nascia sua observação mais polêmica, pois a mudança da terceira para a quarta dualidade implicaria em uma alteração no polo interno da dualidade e de seu ponto de vista, isto implicaria em enfrentar a questão agrária. Aqui retomava a questão que lhe fez pensar os problemas do desenvolvimento
com efeito, estivemos industrializando o país com uma estrutura agrária por reformar, e isso somente foi possível pelo motivo (…) de que a execução de projetos industriais (elevada relação capital/produto), num país de capacidade para importar inelástica e não dispondo ainda de um parque moderno produtor de meios de produção, implicava a produção desses meios por processos pré-
A novidade agora seria que tal industrialização se maturou, caracterizando-se pelo tradicional formato poupador de mão de obra, inclusive na agricultura, levando o sistema a produzir um exército industrial de reserva superdimensionado, cuja solução efetiva seria limitada pelo preço proibitivo da
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terra. Em sua opinião este preço não era inerente à terra, mas ligado a este ativo
Esta excelente observação, especialmente no que tange a tentativa de compreender o fenômeno da terra urbana hoje, provavelmente foi a origem
aceitação inversamente proporcional à sua importância para a compreensão do desenvolvimento brasileiro. Acredita que tenha sido sufocada pelo debate da Revolução Brasileira.
A ideia de dualidade não se encaixava sem na posição ortodoxa, nem na revisão teórica que tomou corpo a partir de A revolução brasileira, de Caio Prado Junior. A visão da questão agrária, dela derivada, afastava a teoria da dualidade das duas posições dominantes. Antes de provocar uma grande polêmica, foi ignorada e envolvida por um manto de silêncio. (Castro, 2005, p. 20)
Conclusão
Ao recuperar o fôlego após este mergulho em apneia na categoria
clara para interpretar o Brasil, que encontra naquela categoria sua chave de leitura.
A dualidade básica tem a função de representar os modos de produção tipicamente brasileiros, por meio de uma combinação delicada entre formas estruturais e formas superestruturais.
formas dominantes e dominadas que compõem a produção social da vida em nossas fronteiras. Internamente a organização da produção das atividades dominantes e subordinadas na economia brasileira, o instituto da propriedade sobre a terra e as relações de trabalho no interior do país formam o eixo de análise. Externamente é a maneira como o Brasil se insere no mercado mundial que indica sua relação dinâmica com as economias centrais.
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classes e frações de classe pela direção política. De seu ponto de vista, a expressão mais concreta das vitórias e derrotas deste processo é dada pela transformação das leis. Para o autor, pensar a disputa pelo poder a que corresponde cada forma estrutural, é fundamental pois ao mesmo tempo dá os termos e a dinâmica do desenvolvimento da formação econômico-social brasileira.
um dos grandes intérpretes do Brasil, na medida em que coloca a formação da nação em perspectiva histórica, busca captar o sentido desta formação no passado, analisa a conjuntura presente, sempre atualizando os termos da mudança prenhe de um seu programa político para o futuro.
tão rica e articuladora de teoria e história pode ser tão amplamente abandonada. Inscreve-se aqui uma possibilidade interpretativa que está no campo da análise das condições sócio-históricas que levam à alimentação de certas visões com respeito ao funcionamento da sociedade e não de outras.
De nosso ponto de vista, a dualidade básica da economia brasileira tantas vezes trabalhada e transformada por Rangel tem o limite de sua época, pois representava uma visão, um modo de pensar, que era irreconciliável com o movimento real que Rangel pretendia revelar e explicar. Neste sentido, uma teoria que não representasse a visão de nenhum dos grupos sociais mais destacados na política e na economia brasileira caía no campo das curiosidades, muitas das vezes incômodas, que pensamentos de vanguarda podem carregar.
De outro lado, a visão de Rangel também não encontrava base nas formulações dos dominados e de suas vanguardas representativas. Seu marxismo era mais brasileiro que universal, mais original que ortodoxo. Sua dialética era mais evolucionista que dinâmica e carregava a ordem de um cientista do seu tempo.
Sem base social concreta a heterodoxia de Rangel, sua criatividade e seu ecletismo foram ao mesmo tempo a fonte de sua inovação interpretativa que deu origem a uma autêntica interpretação do Brasil e o motivo de seu ostracismo.
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A conjuntura, o setor privado e o caminho brasileiro ao socialismo em Ignacio RangelElias Jabbour
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No último decênio nosso país tem patinado numa faixa de 18% na relação PIB x investimentos. Já é consenso desde neoliberais até desenvolvimentistas que uma relação neste patamar constitui-se no grande nó górdio que paralisa a economia brasileira, demonstrando – assim – não somente os limites de um crescimento pautado pela combinação, nada paradoxal, entre incentivos ao
em estratégia estatal a busca da estabilidade monetária pela via do câmbio
Deveríamos crer que a discussão acerca do papel do capital privado a um novo ciclo de desenvolvimento econômico tem sido feita pela sua “porta
de maiores taxas de investimentos sem a participação mais profunda do setor privado. Inclusive, o governo acerta em cheio ao promover um amplo programa de concessões no âmbito das infraestruturas e na área do petróleo. Porém, está fora de cogitação colocar em questão os limites institucionais que travam o desenvolvimento e, por conseguinte, o investimento privado.
Neste aspecto, é importante frisar que nos últimos dez anos de governos
nos ombros de amplas parcelas do empresariado nacional. Medida de corte progressista, mas que não devidamente acompanhada por subsídios sob a
câmbio e juros, cuja consequência mais clara é a baixa taxa de investimentos
em xeque o desenvolvimento do próprio modelo nascido em 2003. Desenvolvimento este que não deverá ocorrer, como não ocorre em nenhum país de desenvolvimento capitalista tardio, sem a combinação de amplos subsídios
121.
Neste sentido, se a baixa taxa de investimentos é uma poderosa
121 . In, Folha de S. Paulo, 27/12/1983. Disponível em: http://www.interpretesdobrasil.org.
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estabilidade da moeda, longo
uma economia completamente indexada a uma única taxa de referência, a SELIC122.
Se a chave da anatomia do macaco é a anatomia humana, nada mais correto do que colocar em seus devidos termos o poder determinante da macroeconomia sobre os rumos da participação do capital privado no processo. O debate tende à esterilidade e ao diletantismo caso não exista uma justa combinação entre uma estratégia de tomada, pelo setor privado, de seu devido lugar na história econômica brasileira, com os parâmetros institucionais e macroeconômicos capazes de abrir condições objetivas a este processo:
de investimentos. Em suma, pouca gente costuma colocar em questão a relação
através de mais abertura comercial e certa dose de arrocho salarial. Por outro
taxa de investimentos no Brasil e a barbárie que vivenciamos no dia-a-dia das grandes cidades123.
Posta uma discussão – baseada na centralidade da política monetária – ao papel do setor privado em um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento, passemos ao , sem antes colocar o seguinte
: a história econômica e política de uma como o Brasil indica uma transição nada reta ao socialismo. De certo é que esse socialismo chegará pelas mãos do sob a forma de um Novo
122 É imprescindível eliminar, gradativamente, a indexação da dívida pública pela taxa SELIC. O Brasil é a única grande economia do mundo onde a mesma variável mediadora da dívida pública também serve
indexação da dívida pública pela SELIC. Por outro lado, a manutenção de taxas de investimento na casa
no curto, médio e longo prazos.
123 Sobre esta relação entre a taxa de investimentos x barbárie, ler: RANGEL, Ignacio: “Criminalidade e crise econômica”. In, Ensaios FEE, v.1 nº 1 (1980). Disponível em: http://revistas.fee.tche.br/index.php/ensaios/article/view/38/377 Ler também: JABBOUR, Elias: “As manifestações, neoliberalismo x mais de-senvolvimento”. In, Portal da Fundação Maurício Grabois, 06/2013. Disponível em, http://grabois.org.br/
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. E
Conglomerado privado este surgido nas entranhas de imensas concessões de serviços públicos. A compreensão dialética deste processo demanda um alto grau de abstração. Desta forma, neste todo complexo que envolve concessão e privatização o
da função do Estado passa por uma transformação:
Post ante. Decifrando o conceito, por podemos compreender, partindo de uma formação hegemonicamente capitalista, como o Brasil, onde resquícios de remotos modos de produção convivem com formações
do comércio exterior sob os governos de Ernesto Geisel e Lula). Daí termos claros resquícios feudais em instituições como o Supremo Tribunal Federal e
coerente com um país que em pequenas distancias territoriais convivem, em
possível. Em uma formação deste tipo a complementaridade entre os setores público e privado da economia funciona quase que como uma
Logo, esta convivência deverá nos acompanhar – inclusive – nos estertores de nossa transição ao socialismo124.
Ainda quando abordamos a transição ao socialismo numa formação atípica como a brasileira devemos ter em mente que o sistema sendo capitalista ou socialista, haverá momentos em que a competição e a empresa privada se
Haverá casos, também, em que a competição – posta historicamente –será
coloca à disposição a possibilidade de opção (e mesmo de combinação/competição) entre a empresa pública e a privada125.
124 Esta convivência pode ser observada em outras formações sociais complexas, cabendo destaque à China e Índia. Nestas formações onde desenvolvimento ocorre, apesar e em plena consonância com a convivência entre o “velho” e o “novo”. Desta forma advém outra lei objetiva desta morfologia de for-mação social na combinação entre atraso e dinamismo.
125 -ples of Communism”. In, Selected Works of Marx & Engels, Volume One, p. 81-97, Progress Publishers, Moscow, 1969. Disponível em: http://www.marxists.org/archive/marx/works/1847/11/prin-com.htm
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Sob este prisma, é oportuno assinalar menção ao fato de trabalharmos categorias como economia de mercado e propriedade privada levando-as em conta como categorias históricas, ou seja, cuja superação demanda o surgimento de condições objetivas e subjetivas para tal. Em outras palavras: o mercado e a iniciativa privada só devem ser proscritos no momento em que a existência deste tipo de instituição se constituir em verdadeiras barreiras ao desenvolvimento das forças produtivas.
Assim, vaticinamos que a diferença entre capitalismo e socialismo é uma questão que, afora a composição de classes no âmbito da superestrutura, obedece a certa ênfase. O capitalismo só recorre ao setor público em casos extremos (acumulação de tipo tardia), enquanto que o socialismo poderá recorrer ao capital privado sob duas hipóteses: como complemento das forças produtivas socialistas e determinados objetivos em determinadas cadeias produtivas.
A reorganização de atividades
O que extrair desta combinação entre baixas taxas de investimentos, desenvolvimento histórico em uma e a transição a outro sistema social mediado por uma espécie de capitalismo de Estado sob o
A resposta não deve ter um ideológico e a-histórico. O Brasil é um país capitalista e o desenvolvimento de seu capitalismo é fator de aumento de tensões externas e internas que, por sua vez, poderá gerar as condições políticas necessárias à transição ao socialismo.
A baixa taxa de investimentos, muito antes dos averages em PIB, demonstra uma crise quase invisível aos olhos que se remetem somente às menores taxas históricas de desemprego
126 É nesse contexto que, historicamente, a discussão entre estatal x privado ganha força. Uma polêmica nada recente e sempre presente em nosso processo de desenvolvimento desde os tempos em que a Coroa de Portugal geriu um verdadeiro estanco para gerir nosso comércio exterior.
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Neste ponto, a grande problemática passa pela necessidade de uma completa reorganização das funções da grande empresa privada (e de seu
grande empresa, o grande conglomerado empresarial privado deve ser chamado a assumir seu papel, sobretudo no desatamento do ponto de estrangulamento infraestrutural (via concessões de serviços públicos, muitas já em andamento) e reorganizando, para si, todo o arsenal produtivo ainda legado da instalação – brilhante – do Departamento 1 Novo da economia (indústria mecânica pesada)
127 (7). É nesse aspecto que repetimos o já
não prescinde da unidade de contrários entre o grande conglomerado privado e sua congênere estatal. Conglomerado privado este surgido nas entranhas de
128.
E a crise urbana em andamento apenas acelera essa necessidade.
O novo papel do Estado
A (visão de ) e a (visão ) deve nos remeter à constatação
para quem uma grande ordem de concessões e/ou privatizações deverá ser seguida pela estatização de umas tantas outras atividades .
O pelo claro motivo
127 . In, Folha de S. Paulo, http://www.interpretesdobrasil.org.
128 -
-cimento do monopólio.
129 Sobre isto ler: RANGEL, Ignacio: “A história da Dualidade Brasileira”. In, Obras Reunidas de Ignacio Rangel, Vol. 2, p. 655-686. Contraponto. Rio de Janeiro, 2005. Ler também: “As polêmicas teses de Ignacio Rangel”. In, Voz da Unidade. Disponível em: http://www.interpretesdobrasil.org.
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si, pois a participação privada (nacional e estrangeira) em imensos processos de concessões de infraestrutura não prescinde da
aos produtores nacionais.
Para tanto, esta nova função do Estado demanda sua participação em outro patamar no que tange a política monetária (políticas cambial e de juros), podendo chegar ao limite de institucionalização do monopólio estatal sobre as instituições que gerenciam os instrumentais macroeconômicos. Momento este
de solução.
A constituição do capitalismo de Estado (NPND) em sua plenitude,
reserva de mercado, não prescinde da . A estatização
da taxa de câmbio (como ocorre na China e Índia) tem centralidade numa estratégia de fortalecimento dos conglomerados nacionais (estatais e privados), conformando uma teia onde pulsarão forte os dois elementos constituidores de uma forte nação moderna:
Desta forma, não apenas estaremos dando plenas condições ao um
estará diante de sua libertação na mesma proporção em que o monopólio do comércio exterior exerça e jogue papel na neutralização dos efeitos, sobre o nosso futuro, da lei do desenvolvimento desigual e combinado.
A revolução brasileira no desenvolvimento
Assim encerramos este breve ensaio onde intentamos expor a importância do setor privado ao nosso processo de desenvolvimento não como
que vão da macroeconomia, passando por sua historicidade e desembocando num arcabouço histórico/teórico capaz de delinear os escaninhos da transição ao socialismo numa formação atípica como a brasileira.
funcionamento de uma formação social complexa como a brasileira, temos
do que chamaram um dia de revolução brasileira.
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O caminho exposto aqui é por deveras tortuoso e com grande margem de improbabilidade diante de uma conjuntura de sobrevivência e hegemonia do pensamento neoliberal no Brasil. Porém, temos claro que, sendo vitorioso este caminho, estaremos mais próximos do socialismo do que imaginamos e mesmo do que poderão imaginar aqueles que estarão a viver este momento em seu devido tempo histórico.
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Ignacio Rangel e o problema da
da industrialização
Ignacio de Mourão Rangel foi um dos mais importantes economistas brasileiros do século XX, e um dos mais notáveis servidores públicos da história
econômico nacional ideias inovadoras sobre a economia brasileira, revelando ao público a originalidade do seu pensamento. Formulou um sistema teórico que busca explicar a dinâmica da economia brasileira, conferindo sentido à evolução histórica da estrutura socioeconômica do país e fundamentando nela sua análise
Rangel reúne em sua pessoa o intelectual que se propõe interpretar Brasil e o homem político, engajado na transformação da estrutura socioeconômica brasileira, num primeiro momento como revolucionário em armas, e, posteriormente, como servidor público, na assessoria econômica do segundo governo Vargas, no Conselho de Desenvolvimento e no BNDE130.
nela três objetivos principais: fazer uma análise estrutural da economia brasileira, ser uma crítica do Plano Trienal e traçar as linhas gerais para uma política econômica alternativa.
130
pelo banco. Nestas instituições, participou ativamente do processo de industrialização do Brasil, tendo sido o relator do projeto de lei que criou a Eletrobrás e sendo chefe do departamento econômico do BNDE durante o Plano de Metas.
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que se encontrava o país naquele momento, com a economia pressionada pela
pelo desejo popular de se avançar no processo de modernização da estrutura socioeconômica brasileira.
O debate econômico brasileiro e latinoamericano havia se polarizado, nos anos 50, em torno da questão da industrialização. De um lado estavam
(CEPAL), defensores da industrialização e do planejamento como meio de
liberais e neoclássicas em economia, contrários à industrialização promovida por meio de intervenção estatal.
Ao longo dos anos 50, Rangel esteve junto aos estruturalistas na defesa da
processo de industrialização por substituição de importações havia se esgotado (tese estagnacionista131
A obra possui um objetivo político franco de contestação do Plano Trienal e de refutação de seus alicerces teóricos, principalmente, nos aspectos
la. Para rechaçar as medidas do receituário monetarista contido no Plano Trienal, elaborou uma análise complexa e original da realidade econômica brasileira
não levasse o país nem à estagnação econômica nem a rupturas sociais132. Para Rangel, a experiência econômica em países latino-americanos que adotaram a
131 Sobre as teses estagnacionistas ver: Hirschman, A. “The Political Economy of Import-Substituting Industrialization in Latin America”.The Quarterly Journal of Economics, Vol. 82, No. 1 (Fev.,1968).
132 O Plano Trienal acabou se mostrando um fracasso.Contrariando o espírito do tempo, precipitou pelo lado econômico pressões sociais que vieram a culminar, posteriormente, no golpe militar em 1964.
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demonstrar seus efeitos sobre a economia133.
Em sua obra como um todo, Rangel buscou demonstrar como a dinâmica da economia brasileira esteve subordinada aos movimentos cíclicos propagados desde as economias centrais, fazendo alternar no interior da economia brasileira, de modo relativamente regular, desde o ciclo da economia açucareira até o ciclo
exterior, puxado pelas exportações, seguida de uma fase caracterizada pelo processo de substituição de importações134.
A evolução da economia brasileira, nestas circunstâncias, condicionava a estabilidade do pacto de poder em vigor e das forças sociais hegemônicas. Os momentos de ruptura do pacto de poder eram suscitados, em última instância, por interesses econômicos emergentes que orientavam a ação política, e levavam, inevitavelmente, à formação de um novo pacto de poder, que acabava por promover mudanças jurídicas e institucionais necessárias ao surgimento de novas oportunidades de acumulação desejadas pelos membros da classe dominante135.
Em Rangel, a categoria analítica do Pacto de Poder constitui o ponto de partida institucional de sua análise. São os interesses das classes sociais que compõem o pacto de poder vigente que vão determinar as decisões fundamentais,
macroeconômico do país.
A crise do capitalismo nos países centrais, consumada na 1ªGuerra
precipitou uma série de eventos que culminaram na revolução de 30, momento de formação, segundo os esquemas duais de Rangel, de um novo pacto de poder,
133 Segundo Rangel, “os autores do Plano Trienal não tomaram em consideração essas múltiplas inter--relações que fazem com que tudo dependa de tudo. Mas, embora sem retraçar a trama lógica desse
análise econômica profunda, porque isso pode ser constatado empiricamente: foi o que aconteceu em
134
de substituição de importações evoluiu ao longo de seus diversos ciclos na história brasileira.
135 Esse processo, na obra de Rangel, representa um dos mecanismos da sua teoria da dualidade. As dualidades interior/exterior, arcaico/moderno, campo/cidade, correspondem a uma estrutura dual básica na qual se sucedem os esquemas duais de pacto de poder dependente do desenvolvimento das forças
capitalismo, no “estado da arte”, dos países centrais.
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constituído pela burguesia industrial nascente e o latifúndio feudal137.
A crise havia deixado um enorme problema para ser resolvido. Na década
rural brasileiro carregado de capacidade ociosa, na forma conjugada de uma superprodução agrícola e de uma superpopulação rural.
Segundo Rangel, o fato da industrialização brasileira não ter sido precedido por um processo de reforma agrária gerou graves desequilíbrios estruturais e um alto custo econômico para o desenvolvimento brasileiro. O grande contingente de mão de obra originado do complexo rural em dissolução, migrou em direção aos centros urbanos, em busca de empregos na indústria (e serviços), e criou um grande desequilíbrio no mercado de trabalho que estava se institucionalizando em bases capitalistas. O desemprego criado nas cidades, pelo excesso de mão de obra, contribuía para a redução do poder de barganha dos trabalhadores138, levando ao quadro de achatamento dos salários .
Como o fundo de salários constitui a base do consumo agregado, a depressão dos salários tornou o mercado consumidor doméstico reduzido e inadequado face à capacidade produtiva que estava sendo criada ao longo do processo de industrialização por substituição de importações, elevando os custos
136 O conceito de feudalismo usado por Rangel está relacionado à forma dominante de propriedade e das relações de produção existentes no meio rural brasileiro após a abolição da escravatura. O controle da riqueza, da mão de obra e dos recursos produtivos passa a ser determinado pela propriedade da terra, e não mais pela posse de escravos. A analogia entre o instituto jurídico determinante do feudalismo clás-sico e do feudalismo no Brasil é ponderado pela própria dualidade de Rangel, no sentido de que o Brasil é um país que se constrói sobre estruturas duais, ao mesmo tempo em que predominavam no complexo rural brasileiro instituições características do feudalismo, nos centros urbanos brasileiros, e em nossas relações exteriores, predominavam formas econômicas urbanas e capitalistas.
137 No esquema rangeliano, o latifúndio feudal foi o sócio menor no pacto de poder da República Velha que tinha como sócio maior o capitalismo comercial, ligado aos interesses do comércio exterior. A partir de 30, o latifúndio feudal foi elevado à posição de sócio maior no novo pacto de poder, encarnado na
138 Pelo reduzido poder de barganha dos trabalhadores, os aumentos de produtividade do trabalho não eram traduzidos em aumentos de salários.
139 O custo de oportunidade do trabalhador rural brasileiro migrar para as cidades era muito baixo nas condições de dissolução do complexo rural, porque as condições de vida eram muito precárias e a pro-dutividade do trabalho no campo muito baixa.
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produzidos pela indústria brasileira, com repercussões em todo o sistema.
Para Rangel, as raízes dos problemas econômicos brasileiros residem em
agrária. Rangel utilizou o conceito de taxa de exploração do sistema140 para representar as consequências econômicas do quadro econômicocorrente nas condições da dissolução do complexo rural brasileiro como
possuía uma elevada taxa de exploração, isto é, os lucros correspondiam, desproporcionalmente, à parcela majoritária da renda nacional.
Em Rangel, a taxa de exploração da economia determina as condições do desenvolvimento industrial brasileiro. No esquema teórico rangeliano, a elevada taxa de exploração levava a uma baixa propensão a consumir do sistema, que por sua vez, tornava o crescimento da renda nacional muito dependente dos gastos de investimento por causa da restrição do mercado consumidor. Os investimentos realizados, além dos efeitos sobre a renda real, resultavam em aumento da capacidade produtiva, que nas condições de uma elevada taxa de exploração e baixa propensão a consumir do sistema, tendiam a se tornar capacidade ociosa.
A observação de acúmulo de capacidade ociosa no setor industrial, à medida que os setores vão sendo instalados ao longo do processo de substituição de importações, é a principal evidência empírica de que a economia brasileira não poderia sofrer, em nível macroeconômico, de excesso de demanda, conforme premissa assumida no diagnóstico do Plano Trienal. Rangel inverte o diagnóstico
capacidade ociosa em sua estrutura econômica. Como resultado desse quadro
estrutural da economia brasileira à depressão141.
Rangel entendia que sem condições políticas para a realização da reforma agrária, como forma de melhorar a distribuição da renda nacional, a continuação do processo de desenvolvimento dependeria majoritariamente do investimento.
140A taxa de exploração do sistema, que corresponde à razão entre lucros e salários pagos pela economia num determinado período, equivale ao conceito de distribuição funcional da renda.
141“Para que o Brasil pudesse fugir ao império dessa lei, que exige que sua economia se expanda a ritmo crescente, como alternativa à depressão, seria mister alterar o esquema fundamental de distribuição de sua renda. Em última instância, seria necessário aumentar o poder de barganha das massas trabalhadoras,
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de maturidade do problema, cuja raiz residia em sua estrutura socioeconômica, a solução mais pragmática consistia em planejar os investimentos, que promoveriam o próximo ciclo de crescimento econômico, retirando a economia de sua tendência à depressão.
investimentos ocorresse no setor de serviços de utilidade pública, basicamente infraestrutura. O setor escolhido para ser o novo campo de oportunidade para os investimentos era um grave ponto de estrangulamento causando prejuízos e perda de produtividade (até hoje).
Da perspectiva do planejador, Rangel havia proposto uma direção pelo lado dos usos, mas cumprida essa etapa restava equacionar o problema das
de canalizar os recursos acumulados nos setores com capacidade ociosa142 para os setores que constituem os gargalos ou pontos de estrangulamento. Segundo Rangel, historicamente, cada etapa do processo de substituição de importações costumava ser precedida por mudanças institucionais que tinham por objetivo
administrativamente.
Para viabilizar a montagem da indústria leve, o controle cambial e as taxas múltiplas de câmbio permitiram baratear as importações de máquinas e equipamentos destinadas às indústrias de bens de consumo não durável. Rangel considerava a correção monetária uma inovação institucional que viabilizou a
duráveis e construções residenciais, os motores do crescimento no período do milagre econômico brasileiro.
Rangel esquematiza as mudanças institucionais e jurídicas necessárias
dos investimentos fosse o setor de serviços de utilidade pública, se incumbe
institucionais seriam necessárias.
142 O conceito de capacidade ociosa em Rangel é amplo e representa todos os recursos econômicos dis-poníveis, sejam os contabilizados como imobilizado das empresas, mão de obra ou os recursos líquidos, que não estejam ativos produtivamente ou aplicados operacionalmente. O conceito de capacidade ociosa
-dutivo dos recursos econômicos disponíveis levando a um estado geral de menor bem estar econômico.
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passaria pelo desenvolvimento e estruturação do mercado de capitais, que fosse
ociosa para os setores que representariam as novas oportunidades de investimento.
A estrutura rangeliana de polos sistêmicos, passivo e ativo, sendo o primeiro, o local de acumulação de capacidade ociosa, e o segundo, onde se encontram as oportunidades rentáveis de investimento, constitui uma ferramenta de análise aplicada por Rangel ao processo de industrialização, seja em suas etapas sequenciais internas (ou ciclos) de substituição de importações143, seja na realocação de recursos campoindústria ocorrida, a partir da crise dos anos 30, decorrente da ruptura do complexo rural brasileiro.
No auge da crise dos anos 30, o país estava diante de um quadro em que havia de um lado um setor carregado de capacidade ociosa (polo passivo), e de outro, um setor que prometia ser capaz de absorver essa capacidade ociosa (naquelas circunstâncias, majoritariamente constituída por mão de obra), e ser um novo campo de oportunidades para aplicação do capital em investimentos mais rentáveis (polo ativo). A indústria representou para o capital nacional, a abertura de novos campos para aplicação, e assim, a industrialização brasileira se tornou assunto de Estado144, passando a ser objeto de uma política industrial
urbanizar o país.
brasileiro. Face à tendência da economia brasileira para a depressão, Rangel
recessão.
143 O processo de industrialização por substituição de importações ocorre em etapas, as próximas etapas tornam-se os novos campos para investimento e os últimos setores instalados o lócus onde se acumula a capacidade ociosa.
144
desenvolvimento industrial, o motor do desenvolvimento econômico nacional, era o centro de todas as preocupações. Industrializar era a meta a alcançar e as demais variáveis desempenhavam papel secun-dário. O pacto de poder formado nos anos 30, cujo um dos sócios era a burguesia industrial, sustentava politicamente o modelo macroeconômico.
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Em condições macroeconômicas onde prevaleciam taxas reais de juros negativas145, os agentes econômicos fugiam da moeda correndo para os bens
sua riqueza ou evitar o máximo possível de perdas. Em nível macroeconômico, Rangel chama esse movimento de fuga da moeda de depressão da preferência pela liquidez do sistema.
Os agentes econômicos não tendo como manter sua poupança em caixa
buscavam imobilizar esses recursos em partes do ativo menos suscetíveis a
.
da preferência pela liquidez do sistema, induzindo as imobilizações, ou seja, a
riqueza. É por meio da taxa de imobilização do sistema que Rangel estabelece
perde a sua função de reserva de valor, e em condições de taxas de juros reais negativas, as imobilizações em ativos reais, ganham importância nas decisões
Dessa forma, a sustentação da taxa de imobilização provocada pela
como uma força contrária à tendência à depressão da economia brasileira147. A demonstração desse mecanismo é a grande contribuição teórica da obra de Rangel.
145
o teto da taxa de juros.
146 Rangel considerava as imobilizações tanto no âmbito das empresas como no das famílias. Nas em-presas demandavam-se bens de capital e bens intermediários e nas famílias bens de consumo duráveis.
147 “Nestas condições a economia é particularmente sensível às variações da taxa de imobilização. A
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O grande problema desse mecanismo é que as novas imobilizações só faziam agravar o problema da capacidade ociosa. A lógica das imobilizações
que a rentabilidade negativa das novas imobilizações148. Porém, seria necessária
negativas crescentes. Segundo Rangel, “com efeito, à medida que passe o tempo,
sem que se abram novos campos de investimento, a economia se aproximará
em si, macroeconomicamente meritória. Mas também não vitupera contra a
no seu lado industrial, produtivo. O objetivo de todos os intelectuais brasileiros de esquerda da geração do Rangel era transformar o Brasilfazenda numa moderna sociedade industrial. Na visão de Rangel, o processo de não ocorre
mas não deveria ser combatida como propugnava o Plano Trienal.
na realidade concreta da economia brasileira. A incompatibilidade entre a teoria monetarista e a realidade econômica nacional, segundo Rangel, tornava o
elevação de preços e aumento da quantidade de moeda. Rangel assume que existe uma correlação positiva entre o nível de preços e a quantidade de moeda, e, para representar essa relação, usa a equação de trocas , base da teoria quantitativa da moeda.
Rangel utiliza a equação de trocas, mas, inverte as premissas normalmente assumidas pela teoria monetarista, obtendo resultados distintos.
148 “Com efeito, se sobem os preços, é razoável esperar que subam também os valores nominais dos ativos imobilizados em cuja compra se aplicam os excedentes da mais valia (...) mesmo nos casos em
-nimizado, que não foi tão grande quanto o teria sido se o inversionista houvesse ‘preferido a liquidez”
149 P.Y = M.V, onde P são preços, Y, renda real, M, quantidade de moeda e V, velocidade de circulação da moeda.
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ou seja, a elevação de preços corresponde à decisão autônoma dos agentes econômicos, tomada no âmbito de suas atividades, e, nas circunstâncias do ambiente econômico em que se encontram. Ao invés do aumento da quantidade
quantidade de moeda150. Nesse sentido, o aumento da quantidade de moeda é
em nível de pleno emprego e assume que os fatores de produção estão sujeitos a dinâmica da capacidade ociosa, variável dependente do ciclo. Sob as novas premissas estabelecidas por Rangel, a equação de trocas leva a resultado distinto. Primeiro, os preços sobem, autonomamente, no bojo da economia, o que torna a equação de trocas, imediatamente, uma inequação, sendo P’.Y >M.V (sendo P’ o nível de preços elevado após a contabilização de um período
prevê que se a quantidade de moeda M não for aumentada, os preços voltariam ao nível anterior, restabelecendo novamente a equação.
Rangel demonstra que se a quantidade de moeda não for aumentada a igualdade da equação de trocas poderia ser igualmente restabelecida por uma redução de Y, sendo P’.Y’ = M.V, onde Y’ é o produto reduzido após o ajuste hipotético que poderia fazer a inequação voltar à equação. Segundo Rangel, os preços poderiam se elevar num setor e a redução da renda ocorrer em outro; o setor agrícola era seu ponto de partida teórico para analisar a elevação de preços que teria como consequência a redução da renda no setor industrial.
Rangel considerava haver uma anomalia de mercado no mecanismo de formação dos preços agrícolas que era responsável por uma pressão
entre os produtores rurais e os mercados consumidores urbanos, as empresas comercializadoras de produtos agrícolas atuavam como um oligopsônio face aos produtores rurais e como um oligopólio face aos consumidores151. Eles deprimiam os preços aos produtores e elevavam os preços aos consumidores, elevando a sua margem até onde o mercado fosse capaz de suportar; por um
150Pela teoria quantitativa da moeda ortodoxa, em que se considera o pleno emprego, o aumento da
151 Rangel dizia que eram, simultaneamente, um oligopólio e um oligopsônio, que atuavam como se monopólio e monopsônio fossem.
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lado não incentivavam o aumento da produção agrícola, e por outro, mantinham uma oferta relativamente cara152.
demanda real de bens do setor industrial153. Como os produtos agrícolas são
redução no consumo dos bens menos básicos, exatamente os bens industriais
voltando à equação de trocas, caso não ocorresse um aumento da quantidade de moeda (de M para M’) que restabelecesse a igualdade da equação de trocas em P’.Y = M’.V, o ajuste se daria por uma redução do produto (de Y para Y’).
As empresas industriais, face à redução da demanda por seus produtos
(seus estoques cresciam a custa de seu disponível). Os bancos, por sua vez, recorriam à autoridade monetária, o poder emissor, para recompor a sua própria liquidez. Segundo Rangel, esse é o mecanismo primário do aumento da quantidade de moeda. As empresas industriais para amortizarem suas obrigações junto ao sistema bancário precisavam aumentar suas vendas, para o qual se fazia necessário o restabelecimento da renda real dos consumidores mediante o aumento do salário nominal154.
152 A descrição de Rangel sobre o modus operandi do setor comercializador de produtos agrícolas se aproxima muito do conceito de Sabotage, desenvolvido pelo economista americano Thorstein Veblen em seu livro The engineers and the price system. Em Veblen, o conceito de Sabotage é muito mais
Sabotage. O sistema industrial contemporâneo, nos países centrais, atingiu uma capacidade produtiva acima da capacidade de absorção do mercado, o que levou a consolidação de empresas e o controle da produção por oligopólios. A Sabotage, por um lado, reduz a oferta (causando aumento dos custos unitários) e, por outro, cobra o preço que o mercado é capaz de suportar, buscando permanentemente colocar os produtos ao nível de preço mais caro pos-sível e criando uma pressão para a elevação de preços. Os atacadistas agiam como prediz o conceito de Sabotage, deprimirem os preços aos produtores rurais não criavam incentivo para o aumento da produtividade) e,
de partida lógico, pelo alto peso que os produtos agrícolas, em especial os alimentos, representava na cesta de consumo de parcela majoritária da população.
153 -da real se dá em outro setor, levando a um aumento do nível geral de preços P, e à redução de Y, podendo
a seu nível anterior, assumindo que a velocidade de circulação da moeda é constante no curtoprazo, M precisaria se elevar, isto é, fazia-se necessário aumentar a quantidade de moeda.
154Para Rangel, o mecanismo de reajuste salarial, institucionalizado pela legislação trabalhista cumpria
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Nas palavras de Rangel: “a elevação dos preços, começando no setor de bens agrícolas, deprime a renda real do público consumidor e, através do mecanismo das elasticidadesrenda da demanda, provoca o aparecimento de estoques noutros setores, nas empresas produtoras de bens de elevada
fazendo crescer o realizável (estoques), a custa do disponível, levando-as a pressionar, através do sistema bancário, o poder emissor, isto é, o Estado. O restabelecimento do disponível das empresas não resolve todo o seu problema, porque os estoques persistem e o resgate dos seus compromissos com os bancos
é indispensável que se restabeleça a renda real dos consumidores – dentre
produtos agrícolas como ponto de partida teórico de sua análise, embora existissem
a sua transmissão via custos ou recomposição de perdas. Rangel destaca como
preços dos produtos agrícolas pela sabotagem do aparelho comercializador; a estrutura precocemente oligopolizada da indústria brasileira; do ponto de
de utilidade pública (preços administrados); as desvalorizações cambiais e os reajustes salariais.
uma vez institucionalizada, deve estar prevista no orçamento da União, levando consequentemente à emissão de moeda. Rangel coloca o orçamento da União
a seguinte lógica, segundo Rangel: “a emissão é necessária, nas presentes condições brasileiras, para que os preços subam; a elevação dos preços é necessária, para que se deprima a preferência pela liquidez do sistema; a depressão da preferência pela liquidez é necessária, para que a taxa de imobilização do sistema se mantenha; a sustentação da taxa de imobilização é necessária, para que o nível geral da atividade econômica se sustente, por sua vez, contrariando a tendência para a depressão implícita na crescente
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Face ao quadro econômico desenvolvido em sua análise e considerando uma rigidez estrutural relativa ao esquema de distribuição da renda, Rangel
tenderia a se acelerar nos momentos de crise e desacelerar quando a economia
para Rangel era oposta à lógica econômica tradicional onde crescimento e 155.
crescimento do PIB e se reduz quando a atividade econômica começa a esfriar.
economistas, naturalmente, não habituados a esse fenômeno. A formulação rangeliana se aproxima muito do conceito de cunhado em língua inglesa, nos anos 70, como consequência do efeito recessivo do choque de preços do petróleo nas economias centrais durante os anos 70. O fenômeno
ter entrado para o conjunto de fenômenos econômicos ocorridos nos países centrais.
dependeria da continuidade do processo de desenvolvimento econômico, e a política econômica apropriada seria estruturar os investimentos no polo ativo do sistema fazendo uso da capacidade ociosa existente no interior da economia brasileira. A sustentabilidade desse processo dependeria dos investimentos, como também, em mais longo prazo, dos avanços institucionais e da melhoria do esquema de distribuição da renda nacional. A conclusão de Rangel, e a solução implícita para o problema, não poderia ser mais oportuna para um país que não poderia àquela altura interromper o processo que estava em pleno curso.
155 -mico brasileiro. O termo milagre econômico, cunhado para se referir ao período econômico brasileiro entre 1968 e 1972, expressa exatamente o aparente paradoxo entre o rápido crescimento e a tendência
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resumida na seguinte passagem de sua obra: “quem ainda não sabe que o Brasil é useiro e vezeiro em acertar por equívoco, não sabe da missa a metade. Se estivermos certos no fundamental – ou seja, se acreditarmos no país – iremos corrigindo os erros
Conclusão
Reserva de mercado, controle do comércio exterior, correção monetária, taxas de juros reais negativas, monopólio de recursos naturais, planejamento,
privado nacional foram alguns dos principais instrumentos utilizados pela política econômica brasileira durante o período de industrialização, ocorrido entre as
A política econômica heterodoxa estava lastreada no pacto de poder constituído mediante a revolução de 30, entre a classe latifundiária e a burguesia industrial nascente, que prevaleceu ao longo de todo o período desenvolvimentista. O objetivo estratégico da política econômica era a industrialização. A transformação do Brasilfazenda em uma economia moderna exigiria o desenvolvimento de instituições e estruturas que o país não tinha, fundamentais para se atingir uma sociedade de consumo em bases capitalistas.
Sem um Estado que pudesse mobilizar as forças sociais e econômicas que levasse ao sucesso do empreendimento, a industrialização não passaria de
o Estado o único ente capaz de mobilizar os recursos necessários para suportar os investimentos vultosos.
toda a população, pelo aumento da renda , criação de um mercado interno dinâmico, urbanização e melhoria das condições de vida da parcela majoritária da população.
entre os ciclos, um papel de sustentação da demanda real, via as imobilizações. As imobilizações adicionais, nessas condições, levavam ao acúmulo de
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cada vez maior poderia compensar imobilizações com rentabilidade cada vez mais negativas.
crise da dívida externa no início dos anos 80 e sua dissolução levou cerca de 10 anos até a implantação do Plano Real, que consolidou o novo arcabouço macroeconômico, sustentado na abertura comercial, âncora cambial , e posteriormente no sistema de metas, desindexação, taxas de juros reais positivas (e elevadas), privatização, entrada de capital estrangeiro, criação das agências reguladoras condizentes com o novo papel governamental do Estadoregulador.
A nova macroeconomia aboliu a política econômica anterior pondo no
A crise dos anos 80 engendrou a formação e consolidação de um novo pacto
de acumulação para a classe dominante brasileira, mediante estratégias de arbitragem de juros e cambio, gerando aplicações com retornos extraordinários, sustentada no alto diferencial entre taxa de juros interna e externa e cambio valorizado157.
As condições da economia brasileira se alteraram radicalmente com a transição da macroeconomia da industrialização para a macroeconomia da
poderia suceder no ambiente macroeconômico pós-real em que as taxas de juros reais são positivas e elevadas, anulando a engrenagem das imobilizações.
O processo de desenvolvimento econômico brasileiro legou um país
causando impactos no mercado de trabalho, por exemplo, com efeitos sobre o esquema de distribuição de renda.
essencialmente uma obra com um objetivo político. Ao demonstrar os equívocos teóricos que fundamentavam o diagnostico do Plano Trienal sobre o problema
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157 Incluindo-se na conta a “farra do boi” das privatizações brasileiras, a rentabilidade supramencionada seria mais que extraordinária.
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sobre a estrutura e funcionamento da economia brasileira. Por essa obra, Rangel poderia ser considerado o mais heterodoxo dos economistas brasileiros.
refutar tão categoricamente premissas e proposições oriundas da ciência econômica tradicional somente poderia vir de alguém que ocupou posições de observação privilegiada da economia brasileira por um longo período. E a
vir de alguém profundamente comprometido com o desenvolvimento do país.
RANGEL, Ignacio. . Volumes 1 e 2. Rio de Janeiro: Editora Contraponto 2005.
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considerações
Ignacio Rangel pensador da formação social brasileira em seu mais
(pode-se citar, por exemplo, o Senhor de Engenho que era ao mesmo tempo vassalo do Rei de Portugal e Senhor de Escravo); da estrutura política (pacto de poder onde as classes dominantes se sucedem duas a duas) e da organização do território brasileiro (integração do arquipélago brasileiro com o fechamento das fronteiras externas, a quebra das fronteiras estaduais e a rodoviarização que se acelera após 30), não foi poluído pelo academicismo imperante nas universidades que sempre estiveram limitadas a interpretar o mundo e não de transformá-lo. Como um verdadeiro profeta se antecipava aos problemas debatendo com rigor, com seus pares e adversários, as medidas nacionalistas a serem tomadas pela administração pública federal de acordo com a realidade
voluntarismo, longe de ser determinista, guardava estreito vínculo com o estágio alcançado pelo desenvolvimento das forças produtivas no âmbito das infraestruturas econômicas e numa escala superior - política superestrutural - das relações de produção.
Consciente do seu tempo como cidadão numa formação social periférica
se perguntava a todo o momento, qual a vantagem em concentrar energias
de querer as coisas possíveis foi muito pouco compreendido e muitas vezes
pela desfaçatez da direita reacionária. Exerceu com dignidade sua cidadania, por
e, por outro, politicamente militando sem descanso publicando artigos, notas e livros. Por ser um pensador independente e não integrar a corporação de ofício
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– Academia Universitária – suas ideias ou eram plagiadas ou descaradamente marginalizadas.
Rangel foi um dos poucos pensadores a perceber que “
mais criativa, foi responsável pela construção de uma interpretação original da história econômica do desenvolvimento brasileiro e, portanto
obteve resultados semelhantes àqueles que a escola da regulação francesa realizou mais de vinte anos depois. As substituições estruturais de importações ocorridas no Brasil em cada fase ‘b’ dos ciclos longos corresponderam a verdadeiras regulações econômicas, incluindo seus enquadramentos jurídico-institucionais158.
nos momentos de radicais depressões que os homens sentem a necessidade
na esteira da fase depressiva do terceiro ciclo de Kondratieff que a realidade - Revolução de 30 - impôs a necessidade de pensar a sociedade brasileira
30 e aos 21 anos como líder integrante da Aliança Nacional Libertadora quando treinou 200 camponeses para invadir São Luís. Nessa empreitada foi preso. Cumpriu pena por dois anos no Rio de Janeiro e oito anos em regime coacto na cidade de São Luís do Maranhão). Assim, num esforço de pensar a sociedade brasileira, perseguiu a partir do cárcere e durante toda sua trajetória e militância
um quebra-cabeça global para compreender a estrutura e o funcionamento
158 Mamigonian (1996).
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brasileira ocorre exatamente na crise estrutural da década de 80, através de
curso e participando de banca no PPGG-UFSC ou concedendo entrevista a Revista Geosul no Departamento de Geociências da UFSC. É importante por
excelência das ideias de Rangel para decifrar a crise estrutural da economia política brasileira. A prova cabal desta tese pode ser comprovada pela realização
comemoração ao seu aniversário de 80 anos. Mas, infelizmente, não foi possível contar com sua presença em virtude do seu desaparecimento, mas seus mais importantes interlocutores e amigos compareceram e as discussões realizadas foram devidamente registradas num livro com o título do referido evento.
A crise econômica iniciada na década de 80 havia sido prevista por Rangel quando foi incumbido por Jesus Soares Pereira de relatar a lei que criaria a Eletrobrás, uma vez que o cerne da presente crise encontra-se no gigantesco endividamento do setor público e no estrangulamento dos serviços de utilidade pública. Mas esta crise veio acompanhada de outra, a crise
representantes dos comerciantes agroexportadores hegemônicos políticos da
e, mesmo reconhecendo o esforço dos governos Lula-Dilma, esses políticos
industriais brasileiros, classe social amadurecida para o exercício da hegemonia política da nação brasileira na quarta dualidade. Por isso que o emperramento da economia se prolonga por mais de 30 anos, pois as mudanças institucionais necessárias (a concessão dos novos grandes serviços para a iniciativa privada), para a retomada do crescimento econômico estão começando a ser aprovadas e, ainda, não conseguiram desencadear a retomada sustentada do crescimento
que é a passagem da 3ª para 4ª dualidade somam-se às resistências externas
estranguladas infraestruturas do país. Aliás, esta substituição de importação
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das infra-estruturas não é como as outras substituições industriais, pois nessas
estadunidense que deverá, agora, ser substituído pelo brasileiro. Mas a pressão
setores reacionários, não pararam por ai, impuseram, primeiramente, uma abertura comercial sem precedentes na história recente do país e, em seguida, promoveram a elevação a taxa de juros, e, em terceiro lugar a sobrevalorização cambial - a mais nociva das políticas macroeconômicas na atual conjuntura pois é a principal responsável pelas importações predatórias.
inúmeras fusões, adquiriu empresas ou implantou outras como o Itautec, Itec,
caso se efetivasse pra valer a política de privatização na forma de concessão dos novos serviços de utilidade pública, a iniciativa privada brasileira. Assim obteria ganho de escala e competência para disputar com os credores internacionais as oportunidades de inversões que ainda estão ai por fazer. Mas, o Estado
e internacional promoveu o da economia nacional. Ou seja, a venda de empresas estatais supercapitalizadas. O exemplo do metrô de Porto Alegre é muito didático: numa licitação internacional, a Mafersa (estatal) é escolhida
o Estado brasileiro teve que aceitar a decisão, deixando o país de manter em território nacional os rendimentos gerados nessa transação para uma empresa internacional. Como se sabe, o EUA nesta época tinham o maior poder político e econômico no BIRD, seguido pelo Japão. As questões que se seguem são: o que
ponto de vista macroeconômico da transferência do patrimônio de uma empresa estatal com capacidade ociosa, como a Mafersa e a Usiminas, para o setor
.
É preciso lembrar que o da economia brasileira cresceu
das exportações brasileiras, a venda de ativos nacionais para o capital
159 PIZZO, M. do R. Rangel e a concessão de serviço públicos a iniciativa privada. In. O pensamento de
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internacional, a incapacidade de promover a reforma agrária são alguns exemplos da história recente do país que vão exatamente no sentido inverso do interesse do desenvolvimento nacional que Rangel lutava, defendia e desejava.
sentida de forma mais aguda nos grandes centros urbanos. Nos últimos anos da
desemprego para 17%. A desindustrialização, a capacidade ociosa da indústria mecânica pesada, a carência de investimentos em infraestrutura provocam o crescimento das deseconomias de aglomeração gerando o aumento da violência, da poluição, dos engarrafamentos, etc. Por outro lado, potencialmente nesta metrópole nacional estavam disponíveis as grandes possibilidades de investimentos em infraestrutura (metropolitanos, saneamento, etc.).
Diferentemente dos cepalinos e dependentistas, Rangel é o único economista brasileiro que fez um marxismo rigoroso, pois trabalha dialeticamente com as categorias de Modo de Produção e formação social, daí a singularidade de relacionar atraso com dinamismo e então responder à questão: “por que a
explicar o atraso. Rangel postula: Uma economia pode ser moderna e se encontrar estagnada, mas, também, e é o caso brasileiro, uma economia atrasada pode ser dinâmica. Ora, se analisarmos a história do Brasil ao longo dos cinco séculos de sua existência, constataremos que a distância em relação ao centro do sistema vem se encurtado gradativamente, o que se deve a questão da dualidade,
posteriormente corroborado por Rangel, gerando essa aproximação do Brasil aos grandes movimentos da economia mundial.
A passagem da 3ª para a 4ª dualidade, que conforme Rangel consiste no
representados por relações capitalistas no campo e nas cidades. Nesse sentido o Brasil perdeu a oportunidade de alcançar sua independencia economica, o que poderia ter ocorrido na década de 80, se o desenvolvimento nacional tivesse sido pautado para o investimento, com recursos próprios, em infraestrutura e com incentivo à indústria nacional na produção de equipamentos para o mercado interno, o que implicaria na melhoria das condições básicas de vida da população tanto no campo como nas cidades. Essas medidas reduziriam o endividamento do Estado brasileiro e aumentariam a capitalização da indústria nacional alem da geração de empregos.
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Reencontrar o trilho do desenvolvimento
Para Rangel, no Brasil atual, não existe uma questão tecnológica como está colocada para os países integrantes do centro do sistema capitalista. A fase
desfecho) vem sendo marcada pelo engendramento de inovações tecnológicas ligadas, sobretudo, a microeletrônica que imprimirá no futuro próximo à retomada
dúvida que o Brasil sentirá as consequências destas inovações tecnológicas (a plena robotização e informatização da economia e da sociedade). Mas esse novo paradigma tecnológico que possibilitará a recuperação dos baixos índices
Assim, essas inovações tecnológicas fundamentais são para as economias centrais praticamente as únicas possibilidades concretas de maciços investimentos, pois a estrutura produtiva existente a ser sucateada dará lugar gradativamente à outra moderníssima capaz, portanto, de recuperar a lucratividade perdida. Investimentos gigantescos em novas bases tecnológicas caracterizarão, portanto, uma nova fase expansiva da economia.
Cabe acrescentar que em praticamente todos os países centrais a infraestrutura existente dos grandes serviços de utilidade pública é expressiva e atende satisfatoriamente às necessidades básicas da população e da economia, não se constituindo, portanto, no “
economia.
No caso brasileiro, a situação é bastante diversa, pois a construção da última etapa do edifício industrial criou em certa área da economia (mecânica e construção civil pesada e petroquímica) uma supercapacidade de produção,
públicos que requerem maciços investimentos com tecnologia existente e em boa parte dominada pela indústria brasileira. Segundo Rangel a modernização
de crescimento industrial registravam índices de dois dígitos ao ano. Entretanto
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desejava Rangel na sua incansável militância intelectual dos anos 80 e início
mesas redondas, artigos para diversos periódicos e em seus livros. Mas a
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agora estamos jogando tudo o que se pensava no lixo, e a moda é
a economia nacional no contexto mundial. Penso que estamos fazendo isto de forma atabalhoada, sem discussão real do que serve para o país. Está todo mundo com vergonha de não ser moderninho. Todo mundo.
Esta conclusão de Biondi revela exatamente o que vem ocorrendo com
ideias de Rangel para superar a crise estrutural vivida está exatamente no casamento dos bancos com a indústria para o surgimento de um capitalismo
coisasdo capitalismo brasileiro. Através dessa união de bancos e a indústria nacional o
o Brasil no novo ciclo do capitalismo.
Outro importante aspecto ressaltado por Rangel para o desenvolvimento da economia brasileira e a entrada do país nesse novo estágio do capitalismo se processaria através da concessão dos serviços públicos à iniciativa privada, sendo o Estado como poder concedente e na medida em que avançassem estas concessões, o próprio setor privado exigiria do poder estatal que assumisse as funções de credor hipotecário, pois é o único que pode receber como garantia o imobilizado de um serviço de utilidade pública. Rangel assinalava: “Qual o banco
A demora na implementação dessas medidas institucionais criou nas principais regiões metropolitanas do país, como foi comentado anteriormente, deseconomias de aglomeração, pois em São Paulo “(a)
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numa das maiores concentrações populacionais do planeta.
A questão agrária
Após analisar alguns dos principais aspectos que viabilizariam a retomada do desenvolvimento econômico do país, baseados na obra de Rangel, entre eles: a privatização dos novos serviços públicos, o incentivo da indústria nacional para o avanço tecnológico e a construção de uma infraestrutura condizente com os novos caminhos delineados pelo capitalismo brasileiro atual, Rangel também realizou uma análise sobre o setor rural e da reforma agrária no Brasil.
Com relação ao espaço agrário, uma das teses existentes era a do crescimento bloqueado, discutido por Maria Conceição Tavares, Paul Singer
estagnação do setor agrícola resultava do atraso do meio rural brasileiro. Esta
ser resolvida por uma ampla reforma agrária no país. Para Rangel, entretanto, a crise agrária decorria da mecanização da agricultura imposta pela penetração do capitalismo no campo que, por sua vez, liberava grandes contingentes de mão de obra os quais as cidades não conseguiam absorver. Transferindo a tensão social do campo para as cidades e a reforma agrária foi, assim, sofrendo
A crise cíclica de acumulação do capitalismo industrial brasileiros do
necessidades e abastecer o meio rural, enquanto que o campo produzia basicamente para abastecer as cidades. Assim, pode-se inferir que a estagnação estava nas cidades e não no campo. Ora, na verdade, como a agricultura estava submetida a uma compra oligopsônica, assim o rebaixamento dos preços dos produtos agrícolas, promovido pelos atravessadores, na então crise vivida, desestimulava a produção de determinados produtos no campo. A consequência era o desabastecimento das cidades, pois a produção agrícola não tinha preço que fosse capaz de remunerar os investimentos realizados. O problema só se
política dos preços mínimos para que os produtores rurais tivessem garantia do
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escoamento de suas produções.
Para Rangel a estrutura agrária latifundiária permaneceu intocada durante todo o processo de desenvolvimento industrial, devido ao pacto de poder estabelecido nos anos 30 (3ª Dualidade), quando o latifúndio feudal voltado para o mercado interno, sobretudo do Rio Grande do Sul, de Minas Gerais e do Sertão Nordestino, juntamente com a burguesia industrial paulista apeiam do poder os setores ligados à agro-exportação, ou seja, os comerciantes de exportação e importação e o latifúndio exportador. Assistiu-se desde então a um trabalho
seja, industrialização sim reforma agrária não. Cabe lembrar que o feudalismo precoce do sertão nordestino e do pampa gaúcho foi uma verdadeira escola para criação de lideranças políticas capazes de protagonizar a revolução nacionalista
Mesmo com a expansão da fronteira agrícola, com o desenvolvimento da indústria e a consequente chegada do capitalismo no campo, que Rangel
, os princípios institucionais do latifúndio tradicional continuaram imperando. Estas circunstâncias imprimiram um brutal processo de desruralização da população que proporcionou um dos mais extraordinários processos urbanização do mundo. O ritmo anual médio
representa a população urbanizada de uma grande São Paulo em pouco mais de seis anos.
Ao mesmo tempo, juridicamente a terra passa paulatinamente a
um bem comercializável, passa a servir de garantia aos empréstimos junto aos
cada vez mais uma cisão no interior da classe hegemônica da 3ª Dualidade, pois o latifúndio capitalista que emerge submete o semi-salariato-rural (boia fria) pela força do capital e da técnica e não pelo poder da propriedade da terra como velho latifúndio impunha.
Assim, o novo latifúndio agrícola capitalista poderia conviver tranquilamente com uma reforma agrária. Reforma esta que permitiria aos trabalhadores do campo manter um quintal com alguns milhares de metros
160 O primeiro descobrimento se deu com a chegada dos portugueses ao litoral, o segundo quando os Bandeirantes se embrenharam pelo interior do país e por último com a anexação de terras até então con-sideradas não agriculturáveis do Cerrado , da Hiléia, do Sertão etc. teve-se o terceiro “descobrimento” do Brasil.
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quadrados junto à sua própria residência. Além de poder produzir parte de sua subsistência teriam um destino seguro junto as suas famílias nos períodos da entre safra.
de boias-frias que perambulam pelo meio rural brasileiro e que estão com suas famílias cindidas e, portanto, sujeitas aos problemas das periferias urbanas
pequenos furtos, etc. Com a recomposição da unidade familiar a migração em
realmente resultará em melhoria da qualidade de vida de sua família. Por outro
melhores condições salariais para os trabalhadores do meio urbano. Uma nova conjuntura nas relações trabalhista será vivida com a queda na oferta de mão de obra e, portanto, se o capital necessitar daqueles trabalhadores rurais terá
cidade.
A questão agrária como assinalada anteriormente é, portanto, uma
poderá se encaminhar tal problemática, mesmo porque não é possível sonhar com dissolução, para efeitos de reforma agrária, da fazenda agrícola capitalista. Precede, como se vê, que a economia industrial se restabeleça da crise em que vive para programar uma reforma agrária viável de ser executada, com o preço da terra estável e sem os acréscimos especulativos.
As visões ideológicas tanto de esquerda como de direita que vêem
as fronteiras nacionais são extrapoladas por atividades que se difundem pelo mundo através das grandes empresas, estão em antagonismo com a visão de Rangel. No comércio exterior, por exemplo, ao invés desta multilateralidade da
Rangel, a aproximação do Brasil aos países da periferia do sistema capitalista e os chamados emergentes, nas relações comerciais e o fechamento às importações
próprio desenvolvimento, como vem fazendo à décadas a Coréia do Sul e Taiwan, conforme OLIVEIRA:
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Para implementar essa opção por sua própria industrialização, precisaram as elites dos dois NPIs asiáticos dotar-se de um Estado do tipo do moderno Estado japonês. Um Estado apto a também mediar, no interior do próprio país, entre as forças do mercado e a decisão consensual das elites de elevar a economia nacional ao nível da plena industrialização.
Na mesma direção de proteção do mercado nacional contra o capital especulativo, CHESNAIS assinala que:
A integração internacional dos mercados resulta, sim, da liberalização e desregulamentação que levaram à abertura dos mercados nacionais e permitiram sua integração em tempo real. Mas baseia-se, sobretudo, em operações de arbitragem feitas pelos mais importantes e mais internacionalizados gestionários de carteiras de ativos, cujo resultado decide a integração ou a exclusão em relação
nos últimos quatro meses de 2013.Tal política de queima de divisas tinha objetivo de frear a desvalorização do Real para combater a elevação das taxas
em transações corrente foi de mais de 81 bilhões de dólares. Essa política de câmbio sobrevalorizado que perdura desde o segundo governo Lula tem destruído importantes setores da indústria brasileira com as importações predatórias cuja consequência foi sentida na balança comercial de produtos industrializados que
e não a causa da crise. Na verdade o problema da crise está na capacidade ociosa da indústria de bens de capital que não tem encomenda porque o setor de infraestrutura não avança na velocidade que poderia. Mas, o mais pernicioso dos problemas é que a política de câmbio sobrevalorizado tem conduzido as construtoras de infraestrutura a realizar suas encomendas fora do Brasil. Ou seja, além dos serviços de utilidade pública avançarem lentamente seus efeitos multiplicativos não ocorrem no mercado doméstico nacional. Fica muito evidente
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A proposta de Rangel para o comércio de exportação e importação, nesta altura do desenvolvimento das forças produtivas nacionais, deve ser organizada
Na medida em que as exportações aumentam, a produção tratará de acompanha-la, mas o que se assiste é o aumento das importações a partir,
possui condições de produzir, mas que ainda não adquiriu capacidade para se lançar na concorrência internacional. Um exemplo que mostra claramente que as
inicialmente, o governo liberou as importações, houve uma grande entrada de automóveis estrangeiros no país, mas o oligopólio automobilístico pressionou e o governo teve que voltar atrás aumentando as tarifas para os níveis históricos de 70%. Assim, a partir de pressões do setor automobilístico, o governo acabou por imprimir uma política industrial para o setor que resultou na instalação de novas montadoras (Peugeot, Kia, Renault, Honda, etc.) e de novas plantas das
absurdas estabelecidas pelos governos estaduais e municipais para serem a sede das novas fábricas, esta política é muito mais promissora para os trabalhadores e para economia brasileira do que a importação de carros japoneses, coreanos, ou americanos.
Na verdade, se nos reportarmos ao histórico do desenvolvimento industrial de qualquer país do mundo, encontraremos uns sem-número de medidas governamentais que têm por objetivo proteger a indústria nacional. No
Turismo um estudo da FUNCEX (Fundação Centro do Comércio Exterior) sobre o sistema de proteção aplicado por dez parceiros comerciais do Brasil, exceto os do MERCOSUL, contra produtos brasileiros. Segundo o ministro Dornelles,
a abertura comercial dos países desenvolvidos é apenas retórica. ‘não há ninguém mais protegido do que os países exportadores de capital, os mesmos que se apresentam como donos do liberalismo comercial. No Brasil a abertura da economia matou culpados (os setores que não se adaptaram a novas condições de comércio) e inocentes (os atingidos pelas restrições de outros países. Os maiores obstáculos são mantidos pelos EUA e União Européia. As tarifas aplicadas pelo Canadá a alguns produtos lácteos brasileiro
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pois a desordem tomou conta da política econômica brasileira, e alguns setores denunciavam o protecionismo dos principais parceiros econômicos do país.
quebrando e importantes líderes empresariais caminhavam como lemminges resignadamente rumo ao precipício (este é o lado feudal dos empresários que se submetem servilmente diante do poder estatal).
Essas breves notas sobre o pensamento de Ignacio Rangel tiveram por objetivo primeiramente destacar à importância do referido autor na analise da economia brasileira. Analise esta que não se baseou somente em marcos
e privada e na longa trajetória política de militância que se estendeu desde anos 30 até se desaparecimento. A constatação de Rangel de que as teorias clássicas existentes e que preconizavam a reforma agraria como ponto fundamental para
complexidade da economia brasileira trazia implicita uma dualidade entre os pólos externos e internos que frequentemente pareciam contraditórios mas que por outro lado se complementavam numa visão ampliada desse cenário. Esse ano, que seria o ano do centenário de Rangel, sua visão política e econômica do
do Estado, reforma agrária, desenvolvimento tecnológico, investimento em infraestrutura, privatização e política economica são essenciais para a compreensão da trajetória vindoura do país. A teoria de Rangel possibilita uma
ciclo do capitalismo, com a tônica do crescente desenvolvimento tecnológico em todos os setores da economia, caminho esse necessário para que o Brasil supere a retomada de seu papel tradicional de exportador de commodities. Para
uma visão holística que engloba muito mais do que a noção de espaço e tempo mas também a articulação destes com a esfera política e econômica que no seu conjunto possibilitam uma visão de sociedade, mercado e Estado. As ideias de Rangel estiveram presentes na formação e construção dos trabalhos de
deste artigo, reconhecendo que a formação de uma rede urbana concentrada, consequência do desenvolvimento industrial oligopolista, e a integração do território nacional pelas rodovias, viabilizadas pra valer com a terceira dualidade
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no Brasil.
BASTOS, J. M. . Tese doutorado, FFLGH-USP, 2002.
BENKO, G. . São Paulo:
BIONDI, A. (debatedor). In: ODÁLIA, N. (org..). :
CHESNAIS, F.
DINIZ, C. C. e SANTOS, F. B. T. Sudeste: heterogeneidade estrutural e perspectivas. In: AFONSO, R. de B. Á.; SILVA, P. L. B. .
In: Geosul, n. 28. Florianópolis:
MAMIGONIAN, A. Notas sobre as raízes e originalidades do pensamento de Ignacio Rangel. In:
MAMIGONIAN, A (org.). O . Florianópolis: UFSC,
OLIVEIRA, A. P. de. . Instituto de Estudos Avançados da
PIZZO, M. do R. Rangel e a concessão de serviço públicos a iniciativa privada. In: MAMIGONIAN, A (org.). O . Florianópolis: UFSC,
RANGEL, I. Dualidade e ciclo longo.
______.
______. O Brasil é dual. In: F
______. A Revolução Russa
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originalidade e independência no pensamento brasileiro
Introdução
Neste trabalho, analisamos a importância de Ignacio Rangel para o pensamento econômico brasileiro. Para tal, apresentaremos alguns aspectos de
brasileira.
Ignacio Rangel, formado pelo ISEB (Instituto Superior de Estudos Brasileiros) e pela CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina), é um dos mais importantes teóricos do desenvolvimentismo brasileiro. Apesar de seu quase esquecimento nos dias de hoje pelo pensamento hegemônico, Rangel foi um pensador de seu tempo e contribuiu bastante para que a compreensão da formação político-econômica brasileira. No presente trabalho, destacaremos duas das suas contribuições: a tese da dualidade brasileira, que dá unidade a toda
interpretações hegemônicas à época: os monetaristas e os estruturalistas.
Assim, para realizarmos um trabalho de releitura, dividimos esse estudo
fatos mais importantes de sua vida. No primeiro capítulo, tratamos a questão da dualidade econômica brasileira (o núcleo do pensamento de Rangel) e de como ele analisa de forma inovadora essa questão com seus polos e lados. No segundo
do autor.
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Mirador, no estado do Maranhão. Bacharel em direito, tornou-se formalmente
anos no Rio de Janeiro, depois de uma tentativa frustrada de implantação de
da 1ª Conferência das Classes Produtoras (Conclap) – que seria realizada em Teresópolis, Rio de Janeiro – como chefe da assessoria da Associação Comercial do Maranhão, consegue com o chefe da polícia uma nova identidade
estabelecendo uma nova vida no Rio de Janeiro.
No Rio de Janeiro, começa a trabalhar como tradutor de novelas policiais e para a agência de notícias Reuters. Ao mesmo tempo, estudava economia por
economista, após um amigo vender cinco de seus artigos à Associação Comercial no Rio de Janeiro. A partir de então, inicia uma intensa produção de textos para publicação.
Nacional da Indústria. Dois anos depois, Rangel começa a fazer parte da assessoria econômica do presidente Getúlio Vargas. Nessa assessoria, elabora projetos que culminaram na criação de grandes empresas estatais, como a Petrobras
Econômico (BNDE), onde, posteriormente, torna-se chefe do Departamento
Presidência da República. Três anos mais tarde, após a saída de Carvalho Pinto, ministro da Fazenda no governo João Goulart, é convidado pelo presidente a
Rangel escreveu seu primeiro livro, “A dualidade básica da economia
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de Estudos Brasileiros (ISEB). No ISEB, convive com um importante grupo de intelectuais, entre eles, o sociólogo Guerreiros Ramos, os cientistas políticos Hélio
Economia Política (REP) e tornou-se colaborador assíduo da Folha de São Paulo.
A tese da dualidade da economia brasileira
A tese da dualidade básica da economia brasileira é o principal elemento organizador do pensamento de Rangel, elemento que dá unidade a sua contribuição para as mais distintas áreas: comércio exterior, planejamento,
211), sem ela não se compreende a rationale da posição política de Rangel frente à questão da reforma agrária e da revolução brasileira – temáticas centrais
políticos das suas análises econômicas. A tese da dualidade é o núcleo da análise de economia política de Rangel, nela se associam o movimento do processo econômico conjuntamente com as metamorfoses das classes sociais, isto é, ela é o lócus em que a luta de classes se mescla com o desenvolvimento das forças
162 A respeito da reforma agrária, Monteiro de Castro destaca, em um depoimento de Rangel sobre seu
Rangel a reforma agrária não era uma condição necessária para a industrialização, algo de impossível concepção para aqueles que se consideravam de esquerda à época. Rangel (apud Monteiro de Castro,
que para mim era uma coisa tão difícil, chegava a ser um pecado mortal para uma pessoa que se diziam
antidogmático do pensamento de Rangel, sempre atento mais atento à realidade brasileira do que aos dogmas das doxas econômicas.
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produtivas, que sempre busca superar as relações sociais de produção que em determinado momento impedem o seu pleno desenvolvimento.
Considerada por Guerreiros Ramos (apud Monteiro de Castro, 2005:
parte menos compreendida da obra de Rangel. Devido a essa incompreensão, proliferam-se as interpretações fragmentárias da obra do autor. Uma interpretação
mas que ignora o livro Dualidade Básica da Economia Brasileira, o que é bastante irônico, pois, conforme apontado anteriormente, a tese da dualidade é
.
Com esta tese, Rangel estava interessado em dar uma resposta à
nossa formação nacional, encontrar as suas leis de movimento. Compreender como a economia brasileira se integrava a economia mundial e encontrar os motores dinâmicos desse processo (como veremos, a resposta não é simples, pois a economia brasileira não é meramente passiva a dinâmica da economia mundial, mas sua dinâmica está restringida pela última). Rangel compreendia que a teoria econômica foi desenvolvida a partir de uma realidade distinta da brasileira: a economia europeia. Foi a partir da compreensão da formação e evolução da economia europeia, economia como um modo de produção mais
e a base de edifício teórico a usufruto dos economistas. Rangel, dessa forma, compreende que, agora, a tarefa dos economistas de regiões tão distintas quanto à brasileira e a latino-americana consiste em integrar esse legado teórico
social periférica. Buscando dá cabo dessa tarefa, Rangel desenvolve a tese da dualidade básica da economia brasileira.
A tese foi inicialmente desenvolvida em “Dualidade básica da economia
econômica, foi incluído o pacto de poder entre as elites econômicas (diferente da
163 Uma hipótese aventada por Monteiro de Castro para o esquecimento da tese da dualidade brasileira
pela visão ortodoxa e pela revisão teórica desenvolvida a partir de de Caio Prado Jr. – relativa à questão agrária. Em razão dessa visão destoante no debate sobre a natureza da revolução brasileira, a dualidade brasileira “antes de provocar uma grande polêmica, foi ignorada e envolvida por
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dominação de uma única classe, a história brasileira demonstra que a dominação política foi sempre realizada por meio de um pacto político entre as classes hegemônicas – classes dominantes que podem possuir interesses divergentes, porém não são antitéticos, isto é, seus interesses podem ser opostos, mas não são contraditórios possibilitando o pacto de poder) que controlam os aparatos
tese da dualidade com clareza não obtida nos textos anteriores (principalmente, em Dualidade básica...) retomando os elementos expostos nesses textos adicionados com a dinâmica dos ciclos de Kondratieff. Nessa exposição sobre a tese da dualidade, teremos por base o último texto com adição de alguns insights expostos no primeiro texto .
Desejamos, inicialmente, destacar duas ideias expostas em Dualidade básica da economia brasileira: a noção de historicidade das leis econômicas
ou seja, certos conjuntos de leis econômicas são expressões das formulações teóricas das escolas de pensamento econômico que teorizam a partir de determinada realidade social. Por isso, suas leis não tem validade transhistórica, apesar da pretensão de determinados economistas e escolas. Possuem validade histórica: se determinada lei (econômica) consegue explicar o movimento da vida social em determinado momento histórico, não há razão para se crer que ela vai realizar o mesmo intento caso se revolucione a vida social (ela pode até
pressupostos para a validade dessa lei, um mero acaso).
primitiva, escravismo, feudalismo e capitalismo) estão integrados com as divisões convencionais da história da civilização (pré-história, antiguidade, idade média e idade moderna): a reprodução material da vida em cada período histórico se realiza de uma determinada maneira. Essa reprodução material da vida, ademais, possui um meio de produção fundamental e um modo de propriedade. Rangel
histórico, meio de produção fundamental e modo de propriedade) da seguinte maneira:
164 Aconselhamos ao leitor disposto a estudar a tese da dualidade que inicie sua leitura pelo terceiro texto, para então ler o livro clássico de Rangel – Dualidade básica... – e o segundo texto.
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Meio de produção
fundamentalModo de propriedade
Pré-História O próprio homemColetivo (o homem
pertence à tribo)Antiguidade O próprio homem Privado (o escravo)Idade Média A terra Privado (o servo)
Idade
Moderna
O capital (essencialmente
uma riqueza móvel)
Privado (trabalho
assalariado)
O meio de produção fundamental demarca o elemento sobre o qual se organiza a vida social e o modo de propriedade, o processo crescente privatização da riqueza social. Assim, na pré-história, a reprodução material da vida se erigia através do trabalho humano organizado em tribos nas quais o produto do trabalho
satisfazer as carências de consumo da tribo. Na Idade Moderna, a produção social não busca satisfazer as carências de consumo da população, mas sim as necessidades de acumulação do capital que cada vez mais mercantiliza a força de trabalho num crescente processo de assalariamento da força de trabalho. A evolução da história da civilização tem, então, dois sentidos bem claros: o modo de propriedade que passa de coletivo (do homem em tribo) para privado (para o homem assalariado) e o meio de produção fundamental do homem para o
Carvalho questiona a Rangel que compreender a história econômica como combinações dos cincos modos de produção fundamentais é uma visão por demais esquemática dessa história econômica . Rangel responde que, apesar de aparentemente simplória, os cincos modos de produção comportam notável complexidade: entre o primeiro e o quinto modo de produção vários caminhos são praticáveis e o tem sido ao longo da história humana. Ademais, para o estudo da
com o estudo dos cincos modos fundamentais de produção, sendo mister descer a muito maior detalhe, na consideração dos estágios do desenvolvimento
165 Além dos quatros já apontados, o quinto modo de produção fundamental é o socialismo.
166 Em suas palavras: “Ainda no que diz respeito à questão do dualismo, não nos parece adequada a sua -
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da luta de classes, consiste na seguinte ideia: a economia brasileira, devido a sua formação histórico-econômica, é uma economia dual, isto é, as suas relações externas de produção são distintas das relações internas de produção . Todas as instituições e a própria economia nacional são uma dualidade. Assim, o latifúndio brasileiro é uma instituição mista: feudal-capitalista; suas relações de produção internas são feudais e suas relações de produção externas, capitalistas.
A estrutura da dualidade brasileira
Como dissemos, em A história da dualidade brasileira, Rangel expõe sua tese da dualidade com clareza e objetividade não alcançada nos textos anteriores. Nesse texto, a dualidade básica da economia brasileira está estruturada em dois polos, um interno e outro externo. Cada polo, por sua vez, tem um lado interno e outro externo. Desta forma, a dualidade da economia brasileira agrupa quatro modos elementares de produção (um para cada lado) que conjuntamente formam um modo de produção complexo único. Ao longo da história brasileira, a
lados) e a maneira como estes se combinam para formar os polos.
Os polos expressam diferenças econômicas regionais e/ou estruturais
um polo dinâmico e outro estagnado:
167 -rica, também era uma dualidade: “no seio de uma sociedade feudal haviam-se desenvolvido fulcros de capitalismo”; mas era uma dualidade distinta da dualidade brasileira, pois era temporária (haja vista a necessidade do capitalismo eliminar restos de uma sociedade feudal, tarefa realizada através da revolu-ção francesa e inglesa) e o polo interno era o mais avançado e o externo o mais atrasado, ou seja, temos o inverso da dualidade brasileira.
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Neste caso, o polo estagnado é o polo interno, e o polo dinâmico é o externo. Temos também que o polo dinâmico exerce a hegemonia sobre o polo estagnado. Por exemplo, podemos pensar, também, em termos de um polo feudal e outro capitalista:
Agora, não nos referirmos a uma diferença regional, mas estrutural. O
econômico ou de capacidade política.
Os lados de cada polo expressam as relações de produção das classes dominantes brasileiras, que são caracterizadas por um bifrontismo: por exemplo, os senhores de engenhos são escravocratas nas suas relações internas de produção, isto é, das porteiras de seus engenhos para dentro; mas são senhores feudais nas suas relações com a Coroa, ou seja, nas relações externas (id. ibid.). O lado interno está relacionado à economia nacional, já o lado externo está relacionado com as relações dessa economia nacional com o resto do mundo:
O lado externo não deve ser confundido com os lados internos das outras economias nacionais . Para captar o movimento desse lado externo que está
168
1994: 66).
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associado com o centro dinâmico do capitalismociclos longos (ou ondas longas) de Kondratieff. De enorme importância para a teoria schumpeteriana (e para o próprio Schumpeter), as ondas longas de Kondratieff são ciclos de longa duração: em média, tem duração de meio século com duas fases, uma fase ascendente (fase A) e uma descendente (fase B), com 25 anos
Kondratieff impelem a nossa formação periférica a reagir ora produzindo excedentes exportáveis (fase A) ora substituindo importações (fase B). Assim, a economia brasileira, ao contrário de outras formações periféricas, não reage passivamente a pressão exercida pelo centro dinâmico restaurando hábitos de consumo e técnicas de produção arcaicas.
Para César Guimarães, a dualidade de Rangel é a sucessora da
fechada em si mesma, mas sim integrada como resto do mundo em constante interação:
problematização a própria noção de economia nacional. Para as
a economia nacional em si, abstraindo-se o restante da economia mundial ou reduzindo-o à condição de uma cláusula. O esquema dual criou o conceito de lados de uma economia nacional, colocando em pé de igualdade conceitual a economia nacional e o resto do mundo.
O conceito de lados de uma economia nacional, sua internalidade e sua externalidade, é extensiva aos polos (id. ibid.). O lado externo do polo externo é o resto do mundo, o lado interno é expressão de uma dinâmica própria. O lado interno do polo interno possui uma dinâmica própria, já o lado externo estabelece a relação com o polo externo:
169 O centro dinâmico é “o conjunto de países desenvolvidos, capazes de participar do processo de novas técnicas, sintetizando nova tecnologia” (Rangel, 1978: 12-13). Até a Independência, o centro dinâmico
--americano.
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por sua dualidade, possui um movimento de transformação equivalente ao sentido geral da evolução da sociedade humana – isto é, passando de um modo de produção inferior para um modo de produção superior – mas a passagem de um modo de produção a outro modo de produção transcorre de uma forma
Rangel observou que essa passagem se processa em observância às seguintes
1ª lei: quando as forças produtivas da sociedade crescem, entrando em
se transforma pela mudança de apenas um dos polos, guardando o outro sua estrutura;
2ª lei: alternadamente, mudam o polo interno e o externo;
3ª lei: o polo muda pelo processo de passar para o lado interno o modo de produção já presente no seu lado externo;
4ª lei: em consequência, o lado externo do polo em mudança muda-se também, passando a adotar instituições características de um modo de produção mais avançado;
5ª lei: as mudanças da dualidade brasileira, como formação periférica que é, são provocadas não apenas pelo desenvolvimento nacional das forças produtivas, mas também por mudanças no comércio internacional;
5ª lei e o ciclo longo: como dissemos anteriormente, essas mudanças no comércio internacional se darão de forma cíclica e os ciclos mais
o movimento do centro dinâmico capitalista170.
leis de tendência assim como a lei da tendência decrescente da taxa de lucro de Marx – que, no caso, manifesta-se em larga escala e em longa duração. De forma
técnico da economia e a acumulação de capitais. Em suma, as “tendências são
170 As “leis” foram indicadas em Rangel (1978: 12).
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social – a sociedade brasileira – e são de longo prazo (os ciclos de Kondratieff).
brasileira – é a contrapartida política da dinâmica da dualidade. O argumento principal desse texto é: a superestrutura política acompanha o movimento da
por rupturas súbitas e violentas. As duas classes dirigentes advêm de cada polo da dualidade – uma do polo interno e outra do polo externo – que conjuntamente formam um pacto de poder171. Cada novo pacto de poder, por sua vez, expressa uma nova dualidade em que estamos imersos.
A transição de uma dualidade para outra não envolve (ou envolveu, até nossos dias) a conquista do poder por classes não componentes da coalizão dominante com a consequente derrubada deste. De acordo com Rangel (apud
pelo próprio grupo dirigente, dos elementos mais arcaicos, e sua substituição por
donos do poder político e das estruturas estatais: há uma dinâmica contraditória
O movimento de transformação de uma dualidade a outra é descrito por
Cada classe se transforma ao repudiar uma das duas ordens de
da classe aferra à velha composição de interesses e como esta sucumbe, enquanto a outra se renova e passa à dualidade seguinte. Essa nova classe surge ao resolver o problema econômico que levou a velha composição de interesse à morte. Por isso, um fato econômico marca a sua ascensão ao pacto de poder. E, como é
171
classes dirigentes (por se tratar de quatro modos de produção fundamentais um para cada lado), na reali-
sobre os “negócios do Estado” se exerce intermediada por uma ou ambas as classes dirigentes, não como integrante do Estado nacional; e (ii) o polo interno está subposto a apenas uma classe e não duas, isto é, “os interesses correspondentes aos dois modos elementares de produção, dialeticamente unidos no pólo (sic) interno, manifestam-se como ordens diferentes e contraditórias de interesses (potencialmente inconciliáveis) do mesmo grupo de pessoas”.
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uma classe nova, inexperiente, assume a posição de sócio menor da dualidade. Por outro lado, a classe do outro polo não se transforma economicamente, mas amadurece politicamente, e assume a condição de sócio maior. Um fato político marca a sua ascensão À hegemonia: na condição de agente hegemônico, esse fato político tem não só a aparência, mas também a essência de fato nacional.
As quatro dualidades
A primeira dualidade brasileira tem início com a Abertura dos Portos às Nações Amigas (o fato econômico) e com a declaração da Independência (o fato político homologatório). Nessa primeira dualidade, as transformações ocorrem no polo externo: na Europa, temos a Revolução francesa, ascensão do liberalismo e o surgimento do moderno capitalismo industrial na Inglaterra.
Inicia-se, por sua vez, a segunda dualidade brasileira com abolição da escravatura (fato econômico) e com a Proclamação da República (fato político). As transformações, em observância à 2ª lei, transcorrem no polo interno: antes escravista, o lado interno do polo interno passa ao modo de produção feudal conforme a 3ª lei. Em acordo com a 4ª lei, o lado externo do polo interno caminha em direção ao um modo de produção superior: o capitalismo mercantil. Os latifundiários feudais – uma nova classe surgida a partir dos germes dos antigos senhores de escravos que produziam em formas mais arcaicas – tornaram-se o novo sócio menor, enquanto a burguesia comerciante, agora amadurecida, é o sócio majoritário.
Com a crise do café na década de 20, a decadência da burguesia comercial e o nascimento da burguesia industrial substituidora de importação (fatos econômicos) e – como fato político – a Revolução de 30, emerge a terceira dualidade. Em conformidade com a 2ª lei, o polo externo entra em transformação:
externo, justamente, o processo de industrialização brasileiro. Temos, então, que
de catch-up: a formação periférica brasileira, através do processo de substituição de importação, irá se apropriar do progresso tecnológico desenvolvido no centro dinâmico para então iniciar o processo de industrialização e formação de uma classe capitalista industrial. Após a revolução de 30, o novo pacto de poder está consolidado: os latifundiários feudais são o sócio maior e a nascente burguesia industrial o sócio minoritário.
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A quarta dualidade é mais uma novidade trazida pela texto A história da
data para a transição para a quarta dualidade são: a crise do petróleo e o ano de
que existiam no lado externo do polo interno se generalizam para o lado interno,
semi-salariado porque parte da mão-de-obra agrícola recebe, além do salário,
em agricultura de caráter semi-capitalista, pois esta gera lucos e renda a partir da terra. O novo pacto de poder se dará entre a nascente burguesia rural (sócia menor) e a burguesia industrial (sócia maior).
Em suma, podemos sintematizar o que foi apresentado no quadro abaixo:
Encerrando essa seção sobre a tese da dualidade brasileira, gostaríamos de descatar duas críticas: o suposto mecanicismo do esquema da dualidade e
Primeira(1815-1888)
Segunda Terceira
Polo Interno
Lado Interno
escravismo feudalismo feudalismo semisalariado
Lado Externo
feudalismocapitalismomercantil
capitalismomercantil
semicapitalismorural
PoloExterno
Lado Interno
capitalismomercantil
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capitalismoindustrial
capitalismoindustrial
Lado Externo
capitalismoindustrial
capitalismoindustrial
capitalismo capitalismo
Pacto de Poder
Sócio Maiorfazendeiros
escravocratasburguesiamercantil
fazendeirosfeudais
capitalismoindustrial
Sócio Menor
burguesiamercantil
fazendeirosfeudais
capitalismoindustrial
nova burguesiarural
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o conceito de relações externas de produção é carente de elucidação: embora próximo do conceito de relações de produção de Marx, é de natureza distinta172.
Para responder essas críticas, será de grande valia o texto de Monteiro de Castro (2005). A respeito do suposto mecanicismo, Monteiro de Castro contesta, em primeiro lugar, que o conteúdo dos quatros lados que estruturam uma dualidade é variado: o lado interno do polo interno, é sempre um dos modos produção stricto sensu, isto é, refere-se às formas de produção concretas, porém o conteúdo do lado externo do polo interno é de natureza distinta. Este lado pode não ser uma relação de produção básica e pode variar conforme a dualidade. “Pode ser um arcabouço jurídico-político – uma forma de apropriação das terras baseada na lei das sesmarias, como na primeira dualidade – ou uma
diferente do conteúdo do lado interno, como também aquele muda a cada dualidade. Por exemplo, na primeira dualidade, o polo interno era escravismo-feudalidade; enquanto, na segunda dualidade, o mesmo polo se transformou
relação de propriedade de terras que está regulando a relação dos senhores de escravos com o velho Estado colonial português; na segunda, é uma relação social básica de produção, ou seja, o feudalismo de ambos os lados (interno e externo) são de natureza distintas. Assim, conclui Monteiro de Castro (id., ibid.): “Trata-se de uma explicação que nada tem de mecânica, pois a todo momento precisamos parar e pensar sobre o que se trata. Poderia ser mais simples, mais
Com isso, podemos responder a crítica de Carvalho. As “relações
as instituições brasileiras são duais, inclusive, a própria formação nacional é dual e, por isso, suas classes sociais são híbridas (escravista-feudal, por exemplo). Os senhores de escravos são escravista da porteira de suas fazendas para dentro e
172 “Acreditamos que esse ecletismo seja o responsável pela não elucidação de proposições de grande importância dentro do próprio pensamento do autor, como, digamos, o conceito ‘relações de produção’, em particular o de ‘relações externas de produção’, que, embora pareça estar fazendo referência à conhe-cida expressão marxista, não tem sentido que se possa aproximar àquele encontrado nos textos de Marx”
de suas ‘relações externas’ que acabam por resumir-se à constatação do destino mercantil, ou não, que é dado aos bens produzidos” (id., ibid.). Como veremos, essa resposta é incompleta.
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podem ser tanto um arcabouço jurídico-político quanto uma relação econômica presa à esfera da circulação.
Feito esses esclarecimentos, a tese da dualidade brasileira, conforme expresso anteriormente, constitui a base analítica do pensamento de Rangel. A
privilegiada na seção seguinte.
Ignacio Rangel já havia percebido que um dos problemas centrais da economia brasileira era a necessidade de transferir excedentes dos setores menos dinâmicos da economia para os de maior potencial de crescimento, dessa
brasileira enquanto o governo do então presidente João Goulart colocava em vigor o Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social, encabeçado por Celso
em sua análise, o conceito de dualidade que singulariza a economia brasileira.
Rangel173
dominado por duas correntes aparentemente inconciliáveis: os monetaristas174 e
com a qual ambas escolas tratavam o assunto e como ambas não captavam
173A fonte principal é Rangel (1963). Para evitar repetições desnecessárias, serão citadas apenas as fontes diferentes.
174
-minação se originava da forte oposição a posição estruturalista. Sustenta Bielschowsky, o estrutralismo
argumentavam haver pleno emprego e acreditavam haver compatibilidade entre estabilidade monetária e crescimento, mesmo em regiões atrasada, eram, potencialmente, economistas “monetaristas”, no sen-
principal razão pela qual um autor keynesiano como Roberto Campos podia ser chamado de ‘monetaris-
texto possui a conotação de antiestruturalismo e não de antikeynesianismo, mais popular nos dias atuais.
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aspectos reais da economia brasileira que em sua análise eram centrais para explicar o problema, como a capacidade ociosa.
quanto aos estruturalistas, o autor confronta a inelasticidade da oferta, o que faz
Todavia, antes de apresentar a crítica de Rangel às correntes aparentemente inconciliáveis, primeiramente analisaremos as premissas básicas de casa corrente, para, então, viabilizar a apresentação da crítica de Rangel, a qual será exposta na seção posterior.
Os monetaristas
quantitativa da moeda, onde é articulado a relação entre o montante dos meios de pagamento em circulação (M), a velocidade de circulação da moeda (V), o nível de preços (P) e a quantidade total de bens e serviços que compõem o produto nacional (T), da seguinte maneira:
MV = PT (1)
Para os monetaristas, a variação nos preços (P) é resultado da variação do volume do meio circulante (M). Assim, a emissão por parte do governo federal
A teoria monetarista postula que uma variação no primeiro membro da equação (membro monetário) deve corresponder necessariamente a uma variação no segundo membro (lado real da economia). Não é possível uma variação autônoma dos preços, onde P1 > P0, gerando uma desigualdade (MV <
das seguintes hipóteses ocorreria:
inércia de V, deve aumentar M;
o índice geral dos preços retornaria ao nível anterior (hipótese que baseava a política monetária ortodoxa);
constantes o primeiro membro da equação e o índice de preços, uma parte do produto material seria retirada do mercado (T).
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Os estruturalistas
Aos estruturalistas cabe o mérito de perceberem que o processo
moeda. Eles explicaram a elevação autônoma dos preços pela existência de
capacidade para importar e pela inelasticidade da oferta do setor agrícola, ou seja, o problema está na estrutura de oferta do sistema econômico, daí vem o nome dessa corrente teórica.
Rangel reconheceu a contribuição da teoria estruturalista na compreensão da economia brasileira, sobretudo através da intervenção do Estado, o que culminou em investimentos rompedores de pontos de estrangulamentos, como o Plano de Metas, no governo de Juscelino Kubitschek, o qual acelerou o desenvolvimento da economia brasileira. Porém, após a transposição desses pontos de estrangulamento, por meio de políticas de substituição de importações
pelo pensamento estruturalista, o que fez Rangel concluir que quanto menos
A questão estava posta: a análise estruturalista tinha em comum com
setorial no caso dos estruturalistas).
Rompendo com os paradigmas
A Ilusão Monetarista
Para Rangel, quando há uma variação autônoma do nível dos preços, a qual resulta da variação do preço de alguns produtos, não compensadas pela variação, em sentido inverso, dos preços dos demais produtos, tal que P1 > P0, rompendo a igualdade da equação monetarista é rompida, MV < P1T. O que ocorre, empiricamente no Brasil, é a retirada de parte do total do produto nacional do mercado (T -t), e a temporariedade dessa retirada é muito relativa, podendo durar anos inteiros e até resultar no perecimento do produto, principalmente
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numa sociedade precocemente monopolista como a brasileira. Rangel destaca o caso no mercado de café.
A equação (1) poder-se-ia reescrita dessa maneira:
MV = P1(T – t) (2)
onde t é igual a parte do produto retirada do mercado.
A comprovação dessa hipótese leva a análise econômica para questões antes não observadas pelos monetaristas. Em vez de reajustamento de preços para o nível anterior, como postulado, haverá um declínio no nível de renda real; primeiro, pelo efeito da retenção do produto, segundo, por causa da redução do
caminharia para a depressão. Todavia, a experiência brasileira aponta a existência de uma saída, que foi institucionalizada, a ampliação do membro monetário (M) na economia. A retenção de estoques por parte das empresas,
o realizável da empresa à custa do seu disponível. A empresa reage recorrendo ao sistema bancário sem problemas, tanto mais quando o realizável da empresa cresce com os estoques, aumentando o seu índice de solvência. Isto afetará negativamente o equilíbrio do sistema bancário que, por sua vez, culminará na emissão por parte do governo.
mas sim em movimentos autônomos de empresas privadas. O governo presta-se a um papel passivo. Noutros termos, a elevação nos preços induz, no Brasil, a uma maior emissão de moeda por parte do governo federal, ou seja, uma relação de causalidade oposta a apresentada pela corrente monetarista, a emissão não
O governo da União recebe, ainda, um prêmio pela emissão. Com a
gerado. Além disso, o governo auferirá diretamente o valor do novo circulante criado e, em terceiro lugar, receberá recursos através dos depósitos compulsórios. Portanto, a recusa por parte do governo em emitir, além de penalizá-lo
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A Ilusão Estruturalista
Para Rangel, os estruturalistas deveriam ocupar-se do comportamento
monetaristas quanto estruturalistas estavam iludidos com um suposto excesso
gêneros alimentícios, cria condições propícias para a manipulação da oferta desses bens e serviços, e obriga o consumidor a aceitar uma alta dos preços (isto é, a substitutibilida dos produtos agrícolas é baixa); por outro lado, pela
sistema, induz o superinvestimento em numerosos setores, o que é, por sua vez, causa da elevação dos custos unitários e, por sua vez, dos preços.
A elevação do preço de gêneros essenciais na cesta de consumo dos trabalhadores, como no caso de gêneros alimentícios, implica numa redução do salário real, diretamente proporcional à taxa de elevação dos preços. Essa redução da renda real dos trabalhadores implica, por sua vez, numa diminuição da mesma magnitude da demanda por outros bens e serviços.
Posto isso, tratando-se de curto prazo, a demanda dos trabalhadores por gêneros alimentícios é muito menos elástica que a demanda por outros itens de consumo, como vestuário, calçado, etc., o resultado é uma mudança na estrutura da demanda popular, diminuindo ao percentual de renda destinado à compra de bens mais ou menos duráveis de consumo. É assim que se produz a retenção de parte do produto na economia:
- o aumento dos preços (P1 > P0) tem origem não em uma limitação da oferta, mas na inelasticidade da demanda, que permite a grupos bem organizados manipular a alta;
- a retenção dos estoques (T – t) se realiza não nas atividades causadoras da alta, necessariamente, mas em outras atividades, supridoras de bens de maior elasticidade-renda da demanda, e são essas últimas empresas que, através do sistema bancário, forçam o governo a emitir.
Isso explica porque o congelamento do primeiro membro da equação de trocas (MV) não força uma baixa nos preços ao nível anterior, restabelecendo a equação. É que a elevação original dos preços e a retenção dos estoques têm lugar em áreas diferentes do sistema econômico.
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Rangel ateve-se a um questionamento após suas conclusões macroeconômicas. Por que a sociedade brasileira permite a operação de anomalias, consentindo na estruturação de oligopsônios e oligopólios manipuladores de alta e com o governo que os institucionaliza (através de
O problema da demanda global
Baseado em sua teoria da dualidade, Rangel argumentou que o capitalismo industrial brasileiro se desenvolveu nos quadros de uma estrutura agrária não reformada previamente. Tem-se uma economia moderna e arcaica ao mesmo tempo, com um lado capitalista (capital e trabalho) e outro feudal
ligado ao desenvolvimento do capitalismo no Brasil e sua unidade dialética. Um capitalismo que se desenvolve concomitantemente com uma estrutura feudal em crise.
trabalho na agricultura desenvolveu-se em um ritmo superior ao necessário, com
que esse último, elevado pelo êxodo rural, é convertido em desemprego urbano.
Com isso, a formação desse enorme exército industrial de reserva deprime o poder de barganha das massas trabalhadoras frente ao setor capitalista. Em tais condições, a distribuição de renda tende a ser excessivamente desigual, concentrando-se uma parcela exagerada como rendas elevadas de uma
pulverizada sob forma de pequenas rendas.
destinada a compor a demanda global por bens e serviços de consumo e maior
Apesar dos mecanismos criados pela economia nacional para driblar os efeitos da elevada taxa de exploração (que é inversamente proporcional à propensão a consumir), a crescente pressão do exército industrial de reserva, sob a forma de um desemprego crônico e generalizado, impede que haja elevação da demanda de consumo no mesmo ritmo da elevação da produtividade
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do trabalho. Assim, a expansão do produto real torna-se excepcionalmente dependente da expansão dos investimentos, isso quer dizer que a propensão marginal a consumir é muito baixa, acarretando portanto em um menor o efeito do multiplicador do consumo.
Logo, os efeitos dos investimentos adicionais sobre o consumo são fortemente decrescentes, o que quer dizer que o sistema econômico tende para uma crônica subutilização de sua capacidade produtiva, somente mantendo acima do ponto crítico abaixo do qual a prosperidade se converte em depressão.
Rangel argumenta que a economia só se mantém acima desse ponto crítico por causa de estímulos especiais que sustentam em elevado nível a taxa de inversão da economia, ou seja, o total de imobilizações brutas – tanto de produção como de consumo – como percentual da renda bruta.
Uma economia que depende, para seu simples equilíbrio e para sua expansão, de uma elevada taxa de imobilização, tende continuamente ao superinvestimento, considerando que o investimento produtivo é a destinação mais natural e típica das imobilizações globais. Ou seja, por mais que as imobilizações não produtivas se tornem importantes, a capacidade produtiva tende continuamente a tornar-se excessiva, dada a mecânica da demanda global, presa a uma demanda de consumo que se expande, como diz Rangel, preguiçosamente.
Uma vez saturados os campos preparados para absorver investimentos novos, e antes que se preparem outros, a rentabilidade de novas aplicações tende
dos meios pelos quais a economia resiste a essa tendência, sustentando a taxa de imobilização do sistema (diminuindo a preferência por liquidez), até que sob a
necessárias à preparação de novos campos virgens para investimentos, para ão de preços
tendência à redução da taxa de imobilização do sistema, a qual, se efetivada, resultaria na depressão econômica. Assim, a expansão monetária por parte
paliativo a depressão econômica, procurando manter o crescimento econômico nacional.
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para manter relativamente estável a economia brasileira evitando o colossal desperdício de recursos que a depressão econômica traz. Porém, o autor
partindo de uma situação caracterizada pela acumulação de capacidade ociosa, essa resulta na ampliação da capacidade ociosa, implicando em uma menor rentabilidade das novas aplicações, a qual tenderá a tornar-se cada vez mais
substancialmente o esquema de distribuição de renda e sem que se abram
embrionário na economia brasileira e argumenta a seu favor. A ausência de um
de atividade, criando obstáculos à circulação intersetorial do capital e, portanto, a migração dos setores de rentabilidade negativa para outros em expansão. É notória a escassez de capital observada em certas áreas do mercado brasileiro
convertendo-se, então, em superabundância.
reduziria, ou mesmo desapareceria, quando se resolvesse os problemas
nos setores já desenvolvidos e com capacidade ociosa, para os setores a se desenvolver; segundo: à reestruturação dos serviços desses últimos setores, a
do esquema de distribuição de renda.
Essa corrigindo a baixa propensão a consumir da população o que ajudaria a eliminar a acumulação de capacidade ociosa em diversos setores da economia a qual gera restrição da demanda por outros produtos. Dessa maneira,
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Conclusão
Para compreender a contribuição de Ignacio Rangel ao desenvolvimento do pensamento brasileiro, é necessário ter-se em conta a realidade nacional e
posicionavam sobre as questões nacionais e internacionais.
teoria econômica. A noção de totalidade, que contém contradições, foi trocada
nitidamente histórica, revelando a realidade brasileira como um processo histórico contraditório, no qual a consistência do bloco rural de poder permitiu que o controle da terra fosse utilizado como mecanismo de reprodução.
A reintrodução da história econômica nos estudos de economia brasileira foi feita por Celso Furtado, que, entretanto, assumiu uma posição positivista, desconsiderando o percurso do pensamento histórico brasileiro que sempre tratou da relação entre formação de patrimônio e interesse na esfera exterior e na esfera derivada do controle direto da terra.
Concordamos inteiramente com Pedrão (2001: 130), em seu texto Igna-
Desde seu primeiro texto sobre planejamento, Rangel adotou como foco de análise um eixo de transformação do capital e do sistema institucional — ou seja, o questionamento do papel do
efeitos imediatos nos negócios, mas por seu papel na acumulação de capital. Distinguem-se os aspectos monetários propriamente ditos, aspectos de distribuição da renda, portanto, de impacto
de crescimento do produto social, isto é, sobre as alterações que se introduzem na composição do capital. A composição do capital e a composição do bloco de poder são referências fundamentais. Entende-se que uma e outra mudam ao longo do tempo.
Se apropriando do materalismo histórico, Rangel, esse grande mestre da economia brasileira, articulou com liberdade os instrumentos da teoria econômica,
teoria dos ciclos e de sua própria teoria da dualidade para explicar o processo
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de desenvolvimento do Brasil e seus mecanismos de defesa, em destaque a
maneira tão original e independente quanto Rangel, que, dada sua capacidade argumentativa, sustentou a validade de suas propostas tornando-as sempre contemporâneas e uma fonte para estudar a nossa riquíssima formação social: a sociedade brasileira.
Pensamento econômico brasileiro: o ciclo ideológico do desenvolvimentismo. Rio de Janeiro: Contraponto, 2000.
CARVALHO, Fernando José Cardim de.
(Mestrado em Ciências Econômicas) – Instituto de Economia, Universidade
GUIMARÃES, César. A dualidade brasileira de Ignacio Rangel. Política
MONTEIRO DE CASTRO, Márcio Henrique. Nosso mestre Ignacio Rangel. In: Rangel (2005).
PEDRÃO, Fernando Cardoso. Uma apresentação ao pensamento de Ignacio Rangel. , Salvador, n. 3, 2000.
______. Ignacio Rangel. , São Paulo, v. 15, n. 41, p. 127-137, 2001.
PEREIRA, Luiz Carlos Bresser; REGO, José Márcio. Um mestre da economia brasileira: Ignacio Rangel. , São Paulo, v. 13, n. 2
RANGEL, Ignacio de Mourão. . In: Rangel (2005).
______. . In: Rangel (2005)
______. . In: Rangel (2005).
______. A história da dualidade brasileira. , São
______. . Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Contraponto. Organização: César Benjamin, 2005.
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Ignacio Rangel
Cartão de visitas de Ignacio Rangel.
Notícia do falecimento de Ignacio Rangel
publicada no jornal Folha de São Paulo.
“As armas ensaia,
Penetra na Vida,
Pesada ou querida,
Gonçalves Dias
Ignacio Rangel
(Discurso como Patrono da turma de Economia da
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Notas de pesquisa para novos caminhos investigativosem Ignacio Rangel
1. Tendo este livro se originado no Maranhão, nos é fortemente perceptível o problema da descontinuidade, especialmente das políticas públicas. Paradoxo ainda a ser explorado pelos pesquisadores locais é que ela não seja comum no âmbito político. Nesse sentido, atentos ao amplo painel de análises da obra de Ignacio Rangel que nos antecede, produzimos estas notas de pesquisa, com o objetivo de propor caminhos de investigação pouco ou ainda não explorados naquela obra.
2. Diferentemente de Celso Furtado, Ignacio Rangel não foi acolhido de forma institucional, o que limita sobremaneira a divulgação de seu pensamento. A ausência de um Instituto ou Fundação que preserve sua memória é um ponto
sine
é inescapável. No nome porque acabada a vida, compassadamente deixamos de ser mencionados. A principal forma que os homens e mulheres descobriram para burlar a morte, celebrar a vida e honrar seus antecessores foi criando instituições.
3. Pensando a importância das formas institucionais, entendemos que é
de Documentação, Memória e Estudos do Desenvolvimento Regional (NIRDEC) da UFMA. Além disso, está mais que na pauta a criação de uma instituição que leve o nome de Rangel e possa preservar seu legado, além de atuar como “usina
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concretas para os problemas de planejamento e desenvolvimento.
4. A continuidade na busca pelo conhecimento é fruto da permanente inquietação do pesquisador, tal como Fausto de Goethe, insatisfeito com suas tentativas de
verdade, isso foi só um exemplo a evidenciar a angústia do personagem por tudo conhecer. Tudo conhecer, sem a contribuição do outro, como nos ensinou Paulo Freire, torna esse conhecimento desprovido de sentido e diversidade.
5. A articulação dos colaboradores do livro evidencia a potencialidade da criação
permanente da obra de Ignacio Rangel, em especial, quanto aos problemas do planejamento e desenvolvimento brasileiro. A coordenação dessa rede poderia ser rotativa entre as instituições que a formassem. Sua constituição abre possibilidades para a produção de pesquisas em rede, realização de eventos e novas publicações conjuntas.
explorados na obra de Ignacio Rangel. Algo provocado pelo texto de Raimundo
percursos. O primeiro seria do nascimento à saída do Maranhão. O segundo envolve seu retorno ao Maranhão, em especial suas contribuições e passagens institucionais.
7. Nesse aspecto, isso implica em recuperar o papel do Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais (Ipes) e de seus quadros no cenário maranhense, pois muitos deles mais tarde formaram o corpo docente da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). E justamente pelo trabalho desses intelectuais, Rangel é reinserido no Maranhão e tem sua obra divulgada.
publicado na Revista FIPES, editada pelo Ipes. Anos depois, o texto foi incorporado
como mencionado na Introdução a este livro.
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possibilitaria compreender por que alguns integrantes da Assessoria Econômica do Presidente Vargas foram convidados a retornar para seus estados de origem e assumirem posições de destaque nos governos estaduais, enquanto Rangel parece-nos um ponto fora da curva no Maranhão.
10. Outro aspecto a esclarecer é que o Maranhão só foi objeto de análise por Rangel,
originalmente pela Revista FIPES e depois no aludido livro “A singularidade do
à dimensão política do desenvolvimento e este texto ainda não mereceu nenhum estudo mais profundo. O mesmo se pode dizer do Maranhão, o qual poderia ser analisado na perspectiva da tese da dualidade, situando-o em relação ao Brasil.
Rossini Corrêa, Armen Mamigonian, Bresser-Pereira, José Messias Bastos, dentre outros, expõem um grande débito para com a memória de Rangel. Até o momento
políticos, empresários, artistas ou esportistas.
12. Um diálogo com Plekhanov175 poderia trazer elementos instigadores quanto
nos rumos do país, especialmente nas conjunturas em que esteve próximo
periodicamente, impõe a toda sociedade, a necessidade de reformar suas instituições, enfrentar seus problemas. É aí que a intervenção dos homens se faz necessária e a depender das respostas produzidas poderão singularizá-los ante a história e aos demais.
Ignacio Rangel jamais será conhecido fora do Brasil. Isso evidencia um limite
175
Expressão Popular, 2008.
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a barreira linguística. Nossas publicações quase sempre se limitam à língua portuguesa. Isso também se aplica a este livro. Está, portanto, na ordem do dia, a tradução da obra completa de Ignacio Rangel para outros idiomas, inicialmente inglês e espanhol. A mesma tarefa se impõe aos organizadores deste livro para uma segunda edição.
(Ignacio Rangel visita a Letônia: crise e economia política da dualidade). Aplicando a tese da dualidade de Rangel, analisa o caso da Letônia observando a interação entre as relações internas e externas do país.
pesquisadores, inicialmente proposta no âmbito nacional. Paulo Freire pôde, no exílio, trabalhar e divulgar sua obra, colhendo a criação de inúmeros Centros de Estudos e Pesquisas de seu pensamento em vários países do mundo. Talvez na mesma senda, Rangel possa também ser divulgado por aqueles que têm apreço pela sua produção intelectual e a compreendem viva para análise da realidade atual.
acadêmico ainda não estimulou a realização de um estudo completo sobre suas colaborações e passagens institucionais na Universidade brasileira ou no exterior. Isso é válido desde que desconsideremos que o ISEB não foi uma instituição acadêmica tradicional, estaria hoje mais próximo do conceito de . O
e quase ausência de programas de pós-graduação, cuja criação e consolidação ocorrerão nas décadas seguintes à sua existência institucional.
17. Fernando Pedrão destacou que Rangel foi o único a atravessar a ponte entre o campo governamental e o campo acadêmico ao não fugir do debate sobre as decisões de política e planejamento. José Maria Dias Pereira e José Messias Bastos destacaram algumas dessas contribuições nas suas Universidades, seja
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18. Armen Mamigonian coloca um tema que aparece em praticamente todos os textos: os interlocutores de Ignacio Rangel. Entre os mais citados estão seu pai Mourão Rangel, o professor da Faculdade de Direito, Antônio Lopes; Karl
a apropriação criativa e pessoal de Rangel daqueles com os quais dialoga para produzir a si mesmo, não possuímos um estudo detalhado desses interlocutores, dimensionando a profundidade e as marcas dessa interlocução na obra rangeliana.
das relações com seus interlocutores, Fernando Pedrão ressalta duas pautas importantes: o reconhecimento das experiências estaduais de planejamento, destacando os casos de Pernambuco e Bahia; e o retorno das análises de longo prazo e da validade da teoria dos ciclos na conjuntura de nova crise econômica.
20. Não encontramos estudos pertinentes às experiências estaduais de planejamento, seja pela sua dispersão ou localismo das produções, seja pela ausência de uma análise integradora do conjunto dessas experiências no tempo. É fato que Rangel prestou assessoramento ou consultoria a governos estaduais, tal dimensão necessita ser recuperada. Algumas décadas transcorreram
sobre o planejamento no Brasil. Registre-se o esforço de publicação na área do planejamento público, desenvolvido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) na última década, sobretudo na gestão de Márcio Pochmann.
21. O retorno das análises de longo prazo necessita ser mais analisado, apesar de alguns trabalhos da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, como Plano Brasil 2022, no âmbito governamental, ainda prevalecem as visões de curto prazo.
22. A concepção de socialismo de Ignacio Rangel ressaltada por alguns colaboradores, como José Maria Dias Pereira e Elias Jabbour, talvez compatível
sobretudo quando se leva em conta o engajamento na luta armada e o impacto
Mamigonian.
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23. A colaboração de Rangel na imprensa, ao contrário de suas publicações na
detido. A visão de Rangel sobre sua contemporaneidade é um aspecto a ser mais conhecido, especialmente quando se sabe da sua observação intensiva e
24. A análise dos artigos de opinião publicados por Rangel na imprensa,
enriqueceria sua face mais estudada, a de analista do longo prazo. Um Rangel observador na perspectiva da história do tempo presente parece-nos um viés
análises de conjuntura, tecidas em entrevistas à revista Carta Capital, coligidas
25. Os integrantes da Assessoria Econômica de Vargas ainda não foram objeto de estudo mais aprofundado, ainda que o produzido por esta Assessoria tenha sido abordado em alguns trabalhos acadêmicos relevantes. A ideia é ir além dos
presidente Vargas e dedicar mais fôlego aos seus membros. O livro “Os boêmios
Marcos Costa Lima é uma referência inicial que explora esse veio de pesquisa.
Armen Mamigonian, bem como, sua autonomia intelectual e não vassalagem aos instituídos do eixo Centro-Sul, talvez explique o pouco interesse na produção de documentários audiovisuais sobre cada um deles. Os Filhos do Norte, como diria Gonçalves Dias, ainda hoje e apesar de inequívoca sua contribuição ao país, tem assimilação difícil na produção acadêmica do Centro-Sul, sobretudo fora dos espaços que abriram com suas inteligências, inquietações e amizades.
com o método rangeliano a pensar à quinta dualidade da economia brasileira.
ter destaque tanto nos meios acadêmicos como no mercado, em especial, nos países centrais da economia mundial.
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28. Como foi instigado por Felipe de Holanda num dos capítulos deste livro, pode-se descrever o ciclo expansivo do centro dinâmico da economia mundial
ascendente se caracterizaria pela revolução da internet e a emergência da
estouro da bolha imobiliária subprime nos EUA, a partir de 2008.
30. Note-se que estamos invertendo as posições nessa quinta dualidade. O capital industrial que se tornou o sócio maior na quarta dualidade rangeliana e foi responsável por determinar um ciclo endógeno da economia brasileira,
A reprimarização do saldo exportador brasileiro, sem dúvida, principalmente a partir de 2003 seria um fator importante na explicação. Em suma, pensa-se
interpretação atual da economia brasileira.
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Os autores
Humana, atuando principalmente no tema da industrialização.
Arissane Dâmaso Fernandes possui graduação em História pela Universidade
mesma instituição. Tem experiência na área de História, com ênfase em História do Brasil.
José Tribuzi Pinheiro Gomes (Bandeira Tribuzi), economista e escritor maranhense
Celso Eugênio Breta Fontes possui graduação em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e é mestrando em Economia pelo Programa de Pós-Graduação em Economia da UFF (PPGE/UFF).
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Elias Jabbour
2007 - Assessor Econômico da Presidência da Câmara dos Deputados (Brasília-DF). Atualmente é colaborador do Núcleo de Estudos Asiáticos (NEAS) do
Universidade Federal de Santa Catarina (CFH-UFSC). Tem experiência na área
Economia Política, Economia Política Internacional e Planejamento Econômico atuando principalmente nos seguintes temas: China, desenvolvimento, categoria de formação social, Pensamento Independente de Ignacio Rangel, Brasil e infra-estruturas. É autor de “China Hoje: Projeto Nacional, Desenvolvimento e
Comitê Central do PCdoB.
Felipe Macedo de Holanda é graduado em Economia pela Faculdade de
é professor assistente do Departamento de Economia da Universidade Federal do Maranhão, tendo se afastado das atividades docentes no início de 2011 para participar do Programa de Doutorado em Políticas Públicas - PGPP/UFMA. Desde agosto de 2011 coordena Grupo de pesquisa da Área de Economia do Projeto Monitoramento dos Objetivos do Milênio nos Municípios do Entorno da
Universidade Federal do Maranhão - UFMA, a Universidade Federal Fluminense UFF, a ONU Habitat e a PETROBRAS SA. Desde 2008 coordena o Grupo de Conjuntura Econômica Maranhense, sendo responsável pelo Boletim Indicadores de Análise de Conjuntura Econômica Maranhense. Como consultor coordenou a realização da parte socioeconômica de EIAS-RIMAS e estudos socioambientais
Desenvolveu experiência como analista macroeconômico junto ao Citibank (São
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desde 2001 desenvolve atividades de docência e pesquisa no Departamento de Economia da Universidade Federal do Maranhão (Macroeconomia I e II, Economia Monetária, Economia Internacional, Introdução à Economia, Economia Brasileira e Política e Planejamento Econômico).
Felipe dos Santos Martins possui graduação em Economia pela UFRJ e é Mestrando em Economia pelo Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal Fluminense (PPGE/UFF).
Felipe Eduardo Lima Reina de Barros possui graduação em Economia pelo Instituto de Economia da UFRJ (IE/UFRJ).
Fernando Cardoso Pedrão possui graduação em Ciências Econômicas pela
Atualmente é Presidente do Instituto de Pesquisas Sociais, Professor visitante da Universidade Federal do Recôncavo e Presidente do Instituto de Pesquisas Sociais e professor da Universidade Salvador. Tem extensa experiência internacional como técnico das Nações Unidas, como colaborador da CEPAL e como diretor de projetos de cooperação internacional, com experiência em planejamento, projetos e em politicas públicas com atuação internacional em Planejamento Urbano e Regional, principalmente nos seguintes temas: desenvolvimento econômico, política econômica regional, economia política, economia do ambiente e da energia.
Jhonatan Uelson Pereira Sousa de Almada possui graduação em História pela Universidade Estadual do Maranhão (2007), aperfeiçoamento em Formação
especialização em Gestão e Políticas Públicas pela Fundação Getúlio Vargas (2011) e mestrado em Educação pela Universidade Federal do Maranhão (2012).
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Foi Chefe de Gabinete do Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos e
como, um dos organizadores do livro “A singularidade do pensamento de Ignacio
Universidade Federal do Maranhão, lotado no Departamento de Desenvolvimento do Ensino de Graduação da Pró-Reitoria de Ensino, sócio fundador do Instituto Jackson Lago e secretário executivo da seção estadual da Associação Nacional de Política e Administração da Educação (Anpae). Atua principalmente em planejamento público e educacional, com ênfase nas relações entre educação e
José Márcio Rebolho Rego possui graduação em Administração Publica pela
em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
São Paulo e Professor contratado (horista) da Fundação Getúlio Vargas-SP. Tem experiência na área de Economia. Atuando principalmente nos seguintes temas: retórica em economia, Metodologia da Economia, História do Pensamento Econômico Brasileiro.
José Maria Dias Pereira possui graduação em Ciências Econômicas pela
Economia e Estatística (FEE). Aposentou-se como professor-adjunto do curso de Economia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), onde ocupou diversos cargos, inclusive o de Pró-Reitor de Planejamento. Desde 2002 é professor do Centro Universitário Franciscano (Unifra), tendo sido Diretor da Área de Ciências Sociais Aplicadas. Foi autor do projeto de criação do curso de graduação em Economia da Unifra e foi seu primeiro coordenador, tendo elaborado também o projeto e coordenado o curso de pós-graduação em Finanças na mesma
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instituição. Atualmente, leciona nos cursos de graduação em Economia e Administração e nos cursos de especialização em Finanças na Unifra. Foi o idealizador e coordenador geral da pesquisa do Índice do Custo de Vida de Santa Maria (2005-2011). Atua em pesquisa nas áreas de macroeconomia, história econômica e economia brasileira. Tem artigos publicados em diversas revistas
jornais locais. Tem quatro livros publicados. Autor do texto “Os trinta anos de A , v.13, n.3
São Paulo (2002). Atualmente é professor associado da Universidade Federal de Santa Catarina, onde desenvolve atividades de pesquisa, ensino e extensão. Tem
principalmente nos seguintes temas: desenvolvimento, comércio e serviços, indústria, urbanização e formação sócio-espacial.
Luiz Carlos Bresser-Pereira possui graduação em Direito pela Faculdade
e livre-docência em Economia pela FEA/USP/. Atualmente é professor titular
Cinemateca Brasileira, do Conselho de Administração da Restoque, do Conselho Consultivo do Grupo Pão de Açucar. Tem experiência de ensino e pesquisa e trabalhos publicados nas áreas de Economia, Sociologia, Ciência Política e Administração Pública. Principais temas: desenvolvimento, macroeconomia do
sociedade, democracia, nação e nacionalismo, sociedade civil, classes sociais,
toda a sua obra está disponível em www.bresserpereira.org.br.
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Marcelo Miterhof possui graduação em Economia pela Unicamp, MBA em Finanças pelo Ibmec-RJ e mestrado em Economia pela Unicamp. É economista do BNDES desde março de 2002. Atualmente, trabalha na Área de Infraestrutura do departamento de Energia Elétrica do banco. Foi editorialista do jornal Folha de São Paulo (2000/2002), do qual é, atualmente, colaborador eventual das seções de artigos. Foi professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade Federal de Juiz de Fora, lecionando as seguintes disciplinas: Economia Brasileira, Microeconomia e Introdução à Economia. Também foi pesquisador-bolsista do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, em Brasília.
Márcio Henrique Monteiro de Castro possui graduação em Economia pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Mestre em Engenharia de Produção pela
2010. Trabalhou como economista nas áreas de planejamento, insumos básicos, infraestrutura, social, industrial, crédito e operações indiretas. Exerceu diversas funções executivas no Movimento de Renovação dos Economistas. Diretor do Instituto dos Economistas do Rio de Janeiro (IERJ). Presidente do Conselho Regional de Economia (CORECON-RJ) e membro do Conselho Federal de Economia
Maria Mello de Malta possui graduação em Economia pela Universidade Federal
pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2001) e doutorado em Economia pela Universidade Federal Fluminense (2005). Atualmente é professora adjunta da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Economia Política, atuando principalmente nos seguintes temas: economia política, história do pensamento econômico, pensamento econômico brasileiro e desenvolvimento econômico.
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Paulo de Tarso Pesgrave Leite Soares possui mestrado e doutorado em economia pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP). É Professor Doutor no Departamento de Economia da FEA-USP e professor doutor (licenciado) no Departamento de Economia da Faculdade de Economia e Administração da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (FEA/PUC-SP). Desenvolve, atualmente, duas linhas de pesquisas complementares. Uma delas é se a etapa monopólica (imperialista) é a última fase do capitalismo ou o primeiro estágio da barbárie. A outra é se as modernas técnicas de gestão de empresas afetam diretamente a produtividade ou são apenas o disfarce do velho chicote que impõe a disciplina na produção, daí aumentando a produtividade.
Raimundo Nonato Palhano Silva possui graduação em Ciências Econômicas pela
MA e presidente da Associação Maranhense de Formação de Governantes, membro titular da Academia Caxiense de Letras. Ex-coordenador programa educação semiárido do Ministério da Educação/Undime, ex-consultor acadêmico e em educação a distância - Faculdade do Maranhão, ex-presidente do Instituto
áreas de Economia, Administração, História e Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: planejamento e gestão de políticas públicas, política, planejamento e gestão educacional, planejamento do desenvolvimento local e regional, políticas para educação superior e básica.
Ricardo Zimbrão Affonso de Paula possui graduação em História pela
pela Universidade Estadual de Campinas (2001) e doutorado em Ciência
Departamento de Economia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).
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José Rossini Campos do Couto Corrêa possui Bacharelado em Ciências Sociais
Assuntos de Pós-Graduação do Centro Universitário de Goiás UniAnhanguera e Representante Técnico do Centro Universitário de Goiás-Uni-Anhanguera,
Extremadura-UEX-ES, Coordenador da Cátedra Daisaku Ikeda, sediada no Centro
Assessor Jurídico da Igreja Memorial Batista, Presidente do Instituto Avocare e Pesquisador Visitante do Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos
Professor do Centro Universitário Instituto de Educação Superior de Brasília, do Centro Universitário do Distrito Federal e Professor da Pós-Graduação em Direito e a Inteligência no Combate ao Crime Organizado e ao Terrorismo, da Universidade Católica de Brasília. Conselheiro Federal Titular, pelo Distrito Federal, da Ordem
Nacional de Educação Jurídica, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados
vastíssima experiência, nacional e internacional, na área de Direito, com ênfase
Teoria Geral do Direito e do Estado.
Thiago Leone Mitidieri possui graduação em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e é economista do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
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Vamireh Chacon de Albuquerque Nascimento possui graduação em Direito
titular do Centro Universitário de Brasília. Tem experiência na área de Direito , com ênfase em Teoria do Direito.
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