ilustrada - exalunos.portoseguro.org.br · do francês Tristan Murail, 63, seu professor, e um dos...

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    SEGUNDA-FEIRA, 8 DE MARÇO DE 2010 ★ E1

    CINEMA‘PRECIOSA’ LEVACINCO ESTATUETASNO INDEPENDENTESPIRIT AWARDSPág. E4

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    Felipe Lara, 31,posa para foto no bairrode Tribeca, em Nova York

    Ex-guitarrista derock, compositorerudito brasileiroradicado em NovaYork Felipe Laraganha inéditaprojeçãointernacional,com apenas31 anos................................................................................................IRINEU FRANCO PERPETUOCOLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    No próximo sábado, dia 13,no Festival Ars Música, em An-tuérpia, na Bélgica, o QuartetoArditti toca “Tran(slate)”, docompositor brasileiro radicadoem Nova York Felipe Lara.

    Fundado pelo violinista bri-tânico Irvine Arditti em 1974 eatração da edição de 2010 doFestival Internacional de In-verno de Campos do Jordão, ogrupo já gravou nada menosque 160 CDs e é tido como omais destacado quarteto decordas do planeta no quesitoi nterpre tação d e músicacontemporânea.

    Ser tocado pelo QuartetoArditti é uma honra para qual-quer compositor. No caso do jo-vem sorocabano de 31 anos,contudo, está se tornando umarotina. “Conheci o quarteto em2005, quando ajudei a organi-zar um concerto com músicanova dos doutorandos em com-posição da NYU (Universidadede Nova York)”, conta Lara.

    Foi para este evento que eleescreveu seu primeiro quartetode cordas —“Corde Vocale”,que o grupo apresentou em SãoPaulo, em 2007, quando parti-cipou do Festival Música Nova.

    Não parou por aí. Em 2008,Lara embolsou os K 3.000 doStaubach Preis no 44º Curso deFérias de Música Nova deDarmstadt —o evento quetransformou a cidade germâni-ca, no pós-Guerra, na meca dasvanguardas da música contem-porânea por disseminar as es-téticas de compositores comoPierre Boulez, 84, e KarlheinzStockhausen (1928-2007).

    Pois bem: a obra com que La-ra venceu o prêmio foi justa-mente “Tran(slate)”, que mis-tura a execução do quarteto decordas com recursos eletrôni-cos em tempo real.

    “Em ‘Tran(slate)’, utilizogravações de samples da minhavoz e de três harmônicos com-plexos do violão como materialharmônico”, explica. A obratambém tem, contudo, umaversão puramente instrumen-tal, sem recursos eletrônicos.

    É n e s s e f o r m a t o q u e“Tran(slate)” será tocado emAntuérpia pelo Quarteto Ardi-tti. E é nele, ainda, que acaba deser apresentado em Nova York,pelo Jack Quartet. O tom dacrítica assinada por AnthonyTommasini no “The New YorkTimes”, na última quinta-feira,dia 4, é altamente elogioso.

    Tommasini chama a obra de“brilhantemente realizada”, edescreve como todas as sonori-dades específicas da músicaeletrônica “são evocadas pelosmúsicos em uma obra tecnica-mente formidável e ampla-mente variada, que evolui emseções crepitantes. A perfor-mance foi um ‘tour de force’ deintensidade e cor”.

    Neste ano, Lara tem aindaduas encomendas internacio-nais: o Ensemble Recherche,da Alemanha, pediu-lhe um“Liebeslied” (“Canção deAmor”), uma peça puramente

    instrumental para incluir naturnê em que comemora 25anos de atividade.

    Também em terras germâni-cas, o Donaueschingen Musik-tage, o mais antigo festival demúsica contemporânea do pla-neta, realizado desde 1921 nosudoeste da Alemanha, estreia

    uma obra do compositor emoutubro com a NetherlandsChamber Radio Philharmonic,de Amsterdã, sob a batuta doregente e compositor húngaroPeter Eötvös, 66.

    Nascido em Sorocaba, em1979, e criado em São Paulo,Lara era, na adolescência, umguitarrista de rock que se apai-xonou por jazz e MPB. Em1999, ganhou uma bolsa paraestudar seu instrumento e ar-ranjo na Berklee College ofMusic, em Boston (EUA).

    “Até então, eu conhecia pou-quíssima música clássica, equase nada escrito depois da‘Sagração da Primavera’”, afir-ma, citando o célebre bailadodo compositor russo Igor Stra-vinski (1882-1971), estreado emParis, em 1813.

    A virada foi um concerto daSinfônica de Boston, regida porSeiji Ozawa, tocando a “Sinfo-nia Turangalîla” (1948), dofrancês Olivier Messiaen(1908-1992). A partir dali, Lararesolveu virar compositor. Seusite (www.felipelara.com)lista 32 obras de sua autoria.

    Hoje, ele é doutorando emmúsica na Universidade de No-va York, onde pesquisa a obrado francês Tristan Murail, 63,seu professor, e um dos princi-pais nomes da corrente van-guardista conhecida como es-pectralismo.

    CREDF,1.,6, ..................................................................

    ovanguardistaComentário

    Complexas e “difíceis”, composiçõesnão são para ficarem engavetadas................................................................................................SIDNEY MOLINACRÍTICO DA FOLHA

    CCC omo seria se a busca de“unidade na diversida-de” (que é a assinaturade um autor como Mozart) seunisse com o trabalho de varia-ção contínua sobre um “míni-mo denominador” (que definea personalidade poética de Bee-thoven)? Uma resposta podeser “Tutti”, de Felipe Lara, es-crita para uma formação came-rística análoga à de “Pierrot Lu-naire” de Schoenberg (1874-1951), e disponível em excelen-te gravação no CD “Música Plu-ral” (2009), interpretada peloPercorso Ensemble dirigidopor Ricardo Bologna.

    Escrita em apenas um mêsquando o compositor contava25 anos (ele acaba de completar31), não é, entretanto, músicatradicional: “Tutti” é obra “difí-cil”, conectada com os experi-mentalismos das vanguardasda segunda metade do século20. Nela todos os músicos to-cam o tempo todo (não há so-los), o que permite escutar o

    grupo de câmara como se fosseum único instrumento comple-xo: esse som, “sintetizado arte-sanalmente”, flui e reflui até es-tancar em momentos de satu-ração e colapso —ou mesmo em“pausas para reflexão”, comoocorre perto do final.

    Ao mesmo tempo, cada linhade cada instrumento é tambémum todo em si, construído mi-nuciosamente de modo ora apreservar, ora a subverter ca-racterísticas idiomáticas. A so-lução de confrontar a estatici-dade dos harmônicos naturais(a série harmônica) com quatroséries dodecafônicas, a capaci-dade de graduar e recusar a li-nearidade rítmica e o controleda tensão formal entre desen-volvimento retórico e justapo-sições súbitas são algumas dascategorias brilhantemente tra-balhadas na peça.

    Mais do que um “hegelianis-mo delirante”, as antinomiasde Lara parecem compor umateia que abarca lógica formal edialética, como se saíssem da“filosofia concreta” de MárioFerreira dos Santos (1907-68).

    “Tran(slate)” (2008), por ou-tro lado — a obra que será apre-sentada pelo Quarteto Ardittino Festival Ars Musica da Bél-gica—, dramatiza “kantiana-mente” a inquietação diante daimpossibilidade de acessar“coisas em si”. Tal como em“Corde Vocale” (2006), o pri-meiro quarteto de cordas, tam-bém estreado e gravado peloArditti (o registro está no CD“Quatro Visões Contemporâ-neas na Música Paulista”, de2008), processos radicais de“tradução” acabam por se tor-nar uma imagem do próprio atode compor.

    Em entrevista à Ilustrada, odiretor turco Semih Kaplano-glu (vencedor do Urso de Ourono Festival de Cinema de Ber-lim deste ano) definiu seus fil-mes como “difíceis”. Isso nãoimpede, entretanto, que sejamrealizados, apresentados, pre-miados e debatidos. Felipe La-ra não escreve música para fi-car engavetada: sem abrir mãodas cicatrizes do espírito, suamusicalidade complexa atraiintérpretes e provoca a escuta.

    BARÍTONOBRASILEIROESTREIA EM NY

    O barítono brasileiroPaulo Szot estreou nasexta no Metropolitande Nova York. Szot in-terpretou o protagonistada ópera “O Nariz”, deChostakóvitch, baseadaem conto homônimo deGogol, sob regência deValery Gergiev.

    Neste ano, ele aindacanta em uma monta-gem de “Carmen”, deBizet, em Valência, como maestro Zubin Mehta.Em novembro, em NovaYork, começa os ensaiosde um musical baseadono filme “Mulheres àBeira de um Ataque deNervos”, do espanholPedro Almodóvar.