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memoráveis

Com 82 anos, em plena ati-vidade, com título de especialis-ta desde a década de 1960, o gaú-cho Ely Toscano Barbosa incor-porou a SBC à sua paixão: acardiologia. O objetivo associati-vo da Instituição na área de pes-quisa, ensino, assistencial e ati-vidades afins justifica sua identi-dade com a vida da Sociedade esua participação em 47 dos 48últimos Congressos.

Curiosamente, Ely come-çou sua vida associativa comojogador de futebol, no Grêmio,é claro, como lateral direito. Otécnico dos profissionais, o uru-guaio Ricardo Dias, já promoviainiciantes das categorias inferio-res para treinar entre os profis-sionais. Foi o ginasiano, o garo-to Ely, com 15 anos, um dos doispromovidos. Ao justificar suasfaltas aos treinos, para prestar osexames escolares, levou a maiorbronca: “no sabe usted que es mejor

un pié en la pelota, que una cabeza en

la escuela?”. Anos depois ElyToscano Barbosa reencontrouseu antigo técnico, retrucando abronca: “mais vale uma cabeçana escola que um pé na bola” -válida para a década de 1940.

O Dr. Ely continuou estu-dando. Ficou um ano e meio

no Instituto Nacional de Cardio-logia do México (1954-1955),instituição com marcada contri-buição à cardiologia clínica bra-sileira. A influência dos trabalhose orientação de Tranchesi, aamizade e ensinamentos domestre e amigo Enrique Cabreraformaram um sólido lastro nosconhecimentos em eletrocardio-grafia de Ely, propiciando suascontribuições científicas poste-riores. Complementou sua for-mação, em hemodinâmica, naClínica Mayo (1955-1957). Foinovamente privilegiado especta-dor de novos e revolucionáriosprocedimentos em cardiologia.Ainda em funcionamento, umacentrífuga humana em atividadepor alguns anos fornecia as pri-meiras variáveis hemodinâmicasem humanos, liberados do G(gravidade). Essas informaçõespioneiras possibilitaram os êxi-tos na corrida espacial na déca-da seguinte.

Vinte dias após sua chegadaà Clínica, Toscano-Barbosa(como era conhecido) descreveunão apenas o padrão eletrocar-diográfico do defeito congênitodo canal atrioventricular, mastambém identificou as alteraçõesdo campo elétrico como um dis-

túrbio de condução intraven-tricular, não conhecido na épo-ca. O distúrbio de conduçãoapontado por Toscano-Barbo-sa, questionado na época, foicomprovado, experimentalmen-te, por Rosembaum, 11 anosapós, como sendo o hemiblo-queio ântero-superior esquerdo.Essa contribuição científica re-solveu uma preocupação não sóa equipe de Kirklin, como todasas equipes, pois permitiu a dife-renciação pré-operatória de umacomunicação intra-atrial (CIA)com o defeito do canal atrio-ventricular. Publicou, na épo-ca, vários trabalhos com inte-resse de âmbito internacional,em especial o ECG em umsimpósio de CIA, que 25 anosapós foi considerado, pelo edi-tor do AJC-1958, Wil l iamRobert, a melhor contribuiçãoda publicação, concorrendo,entre outras com a de MasonSones: Cinecardigraphic Findings In

Congenitac Heart Diseases.Já de volta ao Brasil, em 1960

o Dr. Ely foi convidado para ins-talar o serviço de cardiologia doPrimeiro Hospital Distrital deBrasília. Foi quando se casoucom a “ainda” sua esposa, a gi-necologista Jurema Toscano Bar-

bosa. No terceiro dia, em plenalua-de-mel, os recém-casadosdormiam no chão, em um im-provisado apartamento, três diasantes da inauguração da novacidade, ainda em obras.

Um fato inesquecível ocor-reu três meses após a inaugura-ção da cidade. Por ocasião do VICongresso Interamericano deCardiologia, no Rio de Janeiro,ciceroneou 29 dos 42 cardio-logistas estrangeiros convidadospara visitar a nova capital doBrasil, na época motivo de insó-litas referências da imprensa domundo inteiro. “Juscelino rece-beu a comitiva no Palácio doPlanalto, encantando os con-gressistas pela maneira cativan-te (na época, seus adversários,diante de sua habilidade políticae maneira de a todos bem tratar,diziam: “Se não queres ser ami-go, mais ainda, admirador deJuscelino, não fales com ele”. OPresidente, ainda que desculpan-do-se por sua ausência, convidouos visitantes para uma feijoada,após a visita à cidade, na Granjado Ipê, sua residência oficial. Adelegação, ao chegar na granjado Ipê, assistiu à concomitantechegada do helicóptero presiden-cial. Juscelino mudou sua agenda

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para almoçar com os confrades.Ely garante que nenhum doscardiologistas estrangeiros ja-mais esqueceu aquele dia, e, me-lhor, voltaram todos com umanova e extremamente positivaimpressão do Brasil.

Como Presidente do XXXVCongresso, realizado em Brasília,em 1979, elaborou, pela primei-ra vez na história da Sociedade,um minucioso relatório, apon-tando as falhas, os acertos e assugestões que transformaram oevento “orquestrado por um sóhomem” em uma organizaçãoinstitucional. Já no Congressoseguinte, foi implantada a suaidéia da Central de Eventos e da

Comissão Científica específicados Congressos. Como Vice-Presidente e Presidente da SBC(1980-1981), iniciou a campanhapara contratação de um adminis-trador. A sociedade era um em-preendimento administrado poramadores, justificando, ao fi-nal das reuniões de Diretoria,dizer: “Tudo combinado, nadaresolvido”. Cada Diretor vol-tava para seus estados e nadaacontecia. Sua idéia de publi-cação das memórias da SBC sófoi implantada por Enio Can-tarelli, 10 anos após, com apublicação dos livros: SBC -

c i nqü en t a ano s d e h i s t ó r i a ,(Rafael Luna), Os cinqüenta

como o “Escravo da Ditadurada Constituição da SBC”.

Lembra Ely que, por trás dasrealizações e muitas lutas, hátambém erros. Dá risada ao lem-brar que ao temer prejuízos como Congresso de Brasília, fez umarifa de automóvel. “Vendi maisde 60 números, até que alguémalertou que rifa era ilegal, dava

cadeia. Tivemos que cancelar oprojeto e devolver o dinheiro.”

Brasília não decepcionou omédico, Livre docente em Car-diologia, responsável pela insta-lação de um modelar serviço decardiologia no Hospital Distrital,que servia de estrutura para es-tágio oficial de formandos devárias universidades e da forma-ção curricular da própria UNB,propiciando a formação de cen-tenas de cardiologistas, hoje ematividade em todo país. Traba-lhos Científicos eram apresen-tados e publicados nos Congres-sos da SBC, desde a década de1960, bem como capítulos de li-vros didáticos na especialidade.A inclusão de seu nome entreos memoráveis da SBC enche deorgulho o médico Ely, que seconsidera dignificado pelo pou-co que fez pela SBC e pelacardiologia.

anos de Congressos” e a mono-grafia “Contribuição Brasi-leira à Cardiologia Universal”,este último em comemoraçãoaos 60 anos da SBC, editadospor Ely Toscano.

Na década de 1990 idealizoua criação do Museu da SBC, for-necendo todas as publicações desua coleção de programas, temaslivres, crachás e planilhas queguardara desde seu primeiroCongresso, em 1958. Lembra,com orgulho, o espinhoso tra-balho de 10 anos como mem-bro e Presidente da Comissão deLegislação e Ética Profissional ea implantação, em ato pioneiro,no Congresso de Belo Horizon-te, 1993, do processo eleitoralautomatizado, via computador e,finalmente, o planejamento dosistema eleitoral, via internet, em2000, que mereceu elogios doTribunal Eleitoral. Seu maiororgulho é o de ter dado conti-nuidade às modificações esta-tutárias até 2000, sucedendo ostrabalhos de Reinaldo Chiaverinie Rubens Maciel. Costuma dizer“o Presidente da Sociedade temque administrar com o Estatutodebaixo do braço”. Não desejaser reconhecido na SBC peloscargos, trabalhos ou idéias, mas