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No. 22 - Pe 20 a 26 da março de 1972 RIO - CrS 2,00
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Zweig, w^~~^ ÍL Chagas e
homem que '^® irj&^ ° Pastor
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CRISEDA CULTURANACIONAL
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LIÇÃO: 0 MUNDO
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POLITIKA
2kplunaaberta
As amargas, não
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A Editoria
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Os leitores encontrarão, neste número,um trabalho de Hélio Duque baseado em
pesquisas da FAO e um estudo de PauloMartinechen inspirado em pesquisa daRand Corporation. Não são trabalhos defácil digestão. Antes, são trabalhos quenos levam a meditar sobre conflitos.Conflitos econômicos e conflitos ideoló-
gicos. Que tenhamos de recorrer a insti-tuições internacionais para manipular da-dos de nossa realidade social é um fato
que atesta uma grave deficiência de nos-sas instituições de pesquisas, é como se,de repente, o País adotasse o slogan doescritor Álvaro Moreyra:
"As amargas,
não". Porque de estatísticas estamoscheios, mas somente de estatísticas querevelam coisas boas: o cresci «mento doProduto, as reservas cambiais etc. Asamargas, não.
Por que estaria o Departamento de Esta-do tão interessado em conhecer a realida-de profunda da Igreja na América Latina,especialmente nos países-chaves desta
parte do continente? A própria RandCorporation, encarregada da pesquisa, es-tá dando a resposta. Por toda parte, naAmérica Latina, a Igreja está deixandode ser o suporte ideológico do status-
quo: se esvazia na medida em que conti-nua meramente ritualista e deixa de serinstrumento de coesão (coerção) socialna medida em que se engaja em movi-mentos de reivindicações. Alguma coisa,
que não a simples violência, precisa subs-ti tu ir a Igreja. Os americanos estão aten-
tos para o problema. E nós?
Também não é menos dramática a situa-
ção dos que, nesta parte do continente, e
em nosso próprio país, vivem com os
níveis mais baixos de renda. E que são a
grande maioria da população.
Esta sema-
na, todos os jornais contaram a história
daquele pai que, em Brasília, deixou um
filho de 3 anos no meio de uma pista de
alta velocidade... (Mira ser atropelado.
Com a indenização pela morte desse f i-
Iho ale espera salvar-se e salvar os outros
filhos. Nós temos revelado pronta sensi-
bilidade .para as situações de flagelo. Bas-
ta que haja uma enchente ou uma seca
para que o governo e entidades partícula-res se mobilizem no sentido de ajudar as
áreas e as populações flageladas. O que
precisamos reconhecer (e agir em conse-
qüência) é que existe, independentemente de ostástrofes naturais, uma multidão
incalculável de flagelados pela miséria
crônica, pela falta de acesso a níveis
humanos de subsistência. Os dados daFAO revelam isso. E os nossos, o querevelam?
Os leitores poderão, também, perguntarpor que omitimos qualquer informaçãoou qualquer análise a respeito da visitado presidente Lanusse. Porque essa visitaé para inglês ver. Politicamente, o Brasilfaz tudo para fugir ao modelo argentinoe a Argentina se sente até ofendida quan-do a comparam conosco. Existe o comer-cio entre os dois países, com alguns itenstrancados por protecionismo de lá e decá. Mas Lanusse não veio aprofundar na-da. Tanto que a declaração conjunta dosdois oresidentes é, como disse o Jornaldo Brasil,
"o documento oficial mais oti-
mista da história das relações entre osdois países". Em outras palavras: asamargas, não.
O general Ariel Paca, que visitou o novo
prédio da Assembléia Legislativa de Mi-nas Gerais e mais uma vez reafirmou s
doutrina da "democracia
responsável", é
uma das carreiras mais brilhantes do
Exército. Um homem extraordinária-
mente inteligente. E, coisa rara na paisa-
gem brasileira de nossos dias, um homem
que não se esconde das coisas amargas.
Nem as esconde.
As três firmas que cuidam da limpeza e
conservação do prédio do Congresso mo-
bilizaram, nesta semana, um verdadeiro
exército de operários e faxineiros para
que, no dia 1o de abril, as instalações do
legislativo estejam brilhando de limpas.
Cuidem os nossos deputados e senadores
de honrar essa limpeza. Nada de sujeiras
com os seus mandatos. Nada de escon-
der, sob os tapetes, as coisas amargas. Ou
aparentemente amargas.
O governo precisa nomear, com urgência,
um grupo de trabalho para examinar a
situação das empresas jornalísticas e, es-
pecialmente, de seus empregados. O nú-
mero de jornais e revistas (para não falar
em estações de rádio e televisão) em crise
não é normal. Essa investigação se torna
necessária, urgente e total. Ainda que serevele amarga.
Hélio Beltrão
Agenda*
Ê incrível que a Arena semostre perplexa por falta de
um programa. Em 1968, em
convenção nacional, o parti-do escolheu uma comissão
para tratar da questão. Oentão ministro do Planeja-mento, Hélio Beltrão, foi
escolhido presidente dessaComissão. A Comissão reu-niu-se com técnicos, com
juristas, com estudantes,
viajou por todo o Brasil e játinha um material apreciável
quando ocorreu o A1-5. Emnosso próximo número,
contaremos a história dessa
Comissão. Quando menos,
para acordar a desmemoria-
da direção da Arena. *
Por
falar em Hélio Beltrão, hoje
totalmente voltado para os
interesses de um grupo pri-vado, vale lembrar que ele
era e continua a ser membro
do diretório nacional da
Arena. Será que a Arena se
lembra disso? *
Recado
para o deputado Marcos
Freire, onde quer que se
encontre: procure-nos com
urgência. Queremos ouvi-
lo. *
Outro recado, este
para a direção dos Cursi-lhos: continuamos interes-
sados numa entrevista com
quem estiver em condições
de falar em nome do movi-mento. Vários cursilhistas,
que nos procuraram paradefender o movimento, ai-
guns até dizendo-se dirigem
tes, não se consideram auto-rizados a falar em nome dos
Cursilhos. Continuamos
afirmando que a matéria
que nos for concedida será,antes de sua publicação,submetida à leitura da dire-
ção dos Cursilhos. Para nãohaver dúvida quanto à au-tenticidade do que for pu-bl içado.
* Marcello Leite
Barbosa estudando, com asautoridades do Banco Cen-trai, uma campanha institu-
cional da Bolsa de Valores.
Como a de 1967-68. Capazde levantar até papéis mor-
tos: *
O ministro Delfim
Neto, ao que parece, não ébom padrinho para órgãosde divulgação: o
"Diário de
Notícias", que ele tomounos braços, continua desa-cordado; o
"Correio do
Manhã", que procurou fazer
HflJP' i\ á ~^^JflV^7fl
tudo para agradá-lo, não vai
bem das pernas; o Serginho
Figueiredo, que passa as
noites acordados para ser
lido com o café da manhã,
agora só estará nas bancas
depois do meio-dia, com a
Última Hora; em São Paulo,
o grupo Paulo Machado de
Carvalho, a quem o ministro
quis dar a mão, afunda-se
cada vez mais. Deve ser porisso que o POLITIKA está
cada vez mais robus-
to. *
Por falar em Delfim:
ele esteve reunido por mais
de uma hora com o presi-dente da Petrobrás, Ernesto
Geisel. Assunto: petróleoafricano. O mínimo que se
pode dizer dessa conversa
que Delfim conseguiu um
aliado poderoso para provar
que sua estratégia em rela-
ção à África é melhor (oumais rendosa) do que a de
Gibson. *
E por falar em
Petróleo: não se espantem
se a ESSO, mais cedo do
que se pensa, resolver levan-
tar acampamento do Brasil.
A alta direção da ESSO (oravivai) considera a concor-
rência com a Petrobrás, a
médio prazo, inglória. Pois
nós achamos que é inglória
a curto prazo. *
Não tem o
menor fundamento as ver-
soes que explicam a fusão
Bradesco-União de Bancos
como uma espécie de apo-
sentadoria de Walter Morei-
ra Salles. Na verdade, o ho-
mem nunca esteve tão cheio
de planos, como agora, nem
tão feliz como com o futu-
ro. *
Notícia de Hélio Fer-
nandes: "não
convidem parao mesmo almoço um co-
nhecido jornalista e um su-
perbanqueiro desta praça".Pois nós acrescentamos:"Por
enquanto, ainda po-dem convidar; mais tarde é
que vai ser impossível".
POL1TIKA
¦ W
Philomena
Gebran
José Celso Martinez, o maior
diretor do teatro brasileiro,
convoca os intelectuais para
uma análise da grande
crise
de toda a cultura nacional.
depoimento
José Celso Martinez denuncia
A
CUL TURA
NACINAL
I7'v.
« ¦
José Celso
Para uns, o teatro está morto.
Para outros é o cinema que está
morto. Outros já dizem que o romance
está morto, ou a poesia está morta.
Na verdade, o que assistimos é a
fande
crise da cultura brasileira,
um encadeamento que se processa
nas várias frentes culturais: arte,
ciência, política. A crise, que
começou na década de 60, é o
resultado de um dado momento histórico que
agrediu os modelos sócio-culturais
do nosso País. E a arte é o
reflexo dessa realidade que vivemos.
Toda vez que há uma crise cultural,
ela se reflete primeiro no teatro, por
ser a mais direta e a mais didática
de todas as artes. Estão aí os exemplos
históricos do teatro grego, do teatro
inglês e sobretudo, mais recentemente,
do teatro alemão, que só foi salvo
pela capacidade de resistência de
Bertold Brecht. No Brasil, se
procurarmos, hoje, um sinônimo de^
teatro, o mais evidente é o "Oficina".
E "Oficina"
é antes de tudo José Celso.
IJosé Celso Martinez Corrêa,
diretor e autor de teatro, nasceu em
Araraquara, São Paulo, em 1937. E
um dos mentores do Teatro Oficina
desde 1958. Na fase amador ística do
"Oficina",
até 1961, escreveu três
peças: "Vento
Forte Para Papagaio
Subir", "A
Encubadeira" e, em
colaboração com Augusto Boal, uma
adaptação de "A
Engrenagem", de
Sartre. Em 1961, estreou como diretor
profissional com "A
Vida Impressa em
Dólar", de Clifford Odets. Depois
dirigiu "Os
Pequenos Burgueses", de
Gorki; "Andorra"
de Max Frisch; "Os
Inimigos", de Gorki; e, mais recentemente,
"Roda Viva", de Chico Buarque;
"O Rei
da Vela", de Oswald de Andrade; "Galileu
Galilei", de Brecht, e "Na
Selva da
Cidade", de Brecht). Pois é José Celso,
sinônimo do "Oficina",
portanto do novo
teatro brasileiro, quem diz: "O
teatro
está morto. Está morto porque estamos
mortos. Estamos mortos porque a cultura
brasileira está morta por asfixia."
Para ressuscitar o teatro e a cultura
brasileira, é que José Celso, depois
de um longo processo experimental,
chama os intelectuais brasileiros para
o desafio da ressurreição da cultura
nacional: "Recriação", "revolição"
(assim com "i"
: querer de novo, tentar
de novo, fazer cultura de novo). Para
isso, o grupo
"Oficina" viajou 10
meses pelo Nordeste, passando inclusive
pelas menores cidades, apresentando suas
peças, mas principalmente pesquisando
e
criando. O primeiro resultado desse trabalho
é "Gracias,
Senor". Experiência
coletiva. Pesquisa de campo. Trabalho
verdadeiramente científico, que traduz a
realidade sócio-político-cultural do
País, transformada numa obra de arte. Numa
obra aberta. O que é a peça? É tudo. É
experiência. É participação. É
sensibilidade. Mas é sobretudo a tentativa
de explicar, na medida do possível, alguma
coisa que está acontecendo no nosso mundo
real (não no mundo da ficção), sob nossos
olhos e, por isso, em contínua mudança, em
contínua transformação. São 4 horas
ininterruptas de vivência, não de
representação teatral. É uma recusa das
definições estáveis, acadêmicas
e acomodadas. E a apresentação do
homem (no sentido antropológico do
termo) em toda a sua dimensão, em
toda a sua energia. É a substituição
do teatro discursivo pelo teatro dialético.
E enfim o encontro de nova funcionalidade
para o teatro como arte eminentemente
didática, através de uma nova linguagem.
E uma magnífica aula de política e de
conscientização. Não farei aqui uma
crítica de "Gracias,
Senõr", porque
também a crítica está morta (os críticos
já morreram há muito tempo). E não fiz uma
entrevista formal -
perguntas e respostas
— porque também este tipo de entrevista já
era. O que trago aqui é o depoimento» a
autocrítica sofrida, machucada, violentada
de um artesão da cultura: um dos raros grandes
artesãos da cultura brasileira, o maior
diretor do teatro nacional e que, embora sendo
raro e grande, ou por isso mesmo, se
apresenta humildemente diante da intelectualidade
brasileira trazendo nas mãos sua própria
asfixia que joga na arena para o debate
aberto da nossa cultura morta.
*
POLITIKA
depoimento)
"Antes do Rei da Vela, sofria
de grande influencia externa.
Na peça, fui fiel a mim mesmo.
Eu tinha sido jntegralista,vomitei e meu integralismo."
A CRISE
DA CULTURA
NACIONAL
"Em 1968, houve a interrupção do
processo. E tudo mudou bruscamente"."Este é um depoimento em
processo. Estou pensando demaisem tudo. Vai ser um depoimentodifícil de fazer. Estou num processode repensamento de uma série decoisas. Tenho a impressão de quehouve uma mudança na atmosfera
geral das coisas. Esse processocomeçou em 1968, aliás em 67,com
"Reis da Vela" e
"Roda Viva",
quando começamos a descobrir a
possibilidade de escrever algumacoisa para o teatro comolinguagem, discutir o teatro comolinguagem, e descobri que atravésdo teatro você podia realmentecomunicar uma série de fatosimportantes que estavamocorrendo na nossa vida e na vidanacional.
Até então eu me consideravaum artesão, um sujeito eficiente,capaz mas medíocre. Via umdistanciamento muito grande entreminha atividade profissional e o
que eu vivia, o que me interessava.Inclusive, era muito interessado
por política. No teatro encontravauma coisa e outra, mas era muitotímido.
A partir do
"Rei da Vela", ou
melhor, a partir da negação dalinguagem teatral, comecei a
perceber o potencial dessalinguagem, o potencial dacomunicação no teatro. Antes do"Rei
da Vela" eu sofria uma
grande influência estrangeira. No"Rei
da Vela", fui totalmente fiela mim mesmo. Foi uma peça em
que vomitei todo o meu
provincianismo. Tinha sido atéintegralista, e na peça vomitei todoo meu integralismo. Foi a minhaverdadeira descoberta do teatro.Inclusive, a realização de umsonho antigo, de um dia pertencera uma geração (aquele mito: quemaravilha, oiha, esses caras quetêm uma geração!) E, de repente,
aconteceu. Depois do "Rei
daVela", apareceu o tropicalismo,
apereceu Glauber, apareceu
Caetano, apareceu todo aquelemovimento e me vi, mais autêntico.O mais verdadeiro meu estava ali.Não era uma coisavque eu ia
buscar fora, ia buscar em mimmesmo. E surgiu ali. Além disso,era todo um moyimento do País.Foi o ano mais intenso, mais felizda minha vida. Absorvi muita coisae passei a perceber uma coisa
fantástica: que o teatro começavaa interessar fora do teatro. Porque
eu tinha verdadeiro horror deteatro e de público de teatro,daquela platéia disciplinada deteatro. E de repente vi o potencialque existia de transcender aquelacoisa restrita de teatro. Tambémhouve uma certa coincidência como momento histórico, uma série defatores se conjugaram e eu fui
junto.Houve a inter rupação do
processo de 68. Então, toda uma
programação, todo um potencialplanejado, a partir de
"Roda Viva"
e "Rei
da Vela" sofreu umainterrupção brusca. Na época a
gente tinha pensado, paraconseguir realizar o que se
pretendia, fazer uma companhiachamada CU (CompanhiaUtópica). Uma companhia quereunisse as melhores pessoas, as
pessoas mais integradas naquele
processo todòe que pudesse levaraquilo adiante. Já naquela er3ocalutava-se» pela profissionalizaçãodo ator, para o ator poder ter amesma carteirinha da prostituta,— "é
preciso a dignificação dotrabalho do ator", — esses valorestodos. Eu não participava muitodisto. Nós lutávamos de outramaneira, nas assemblé*r_is,
politicamente. E naquela época a
profissionalização excessiva podiadeterminar toda uma castração do
próprio significado do teatro comofator político-cultural.
Com a interrupção brusca do
processo, tudo que estava para serfeito não pôde ser feito. E houve,então, um certo retrocesso."Galileu",
por exemplo, que foiuma peça muito adequada para omomento (estreou no dia 13 dedezembro de 68) foi uma peçamuito castrada.
Sofremos antes de todo mundoa ruptura do processo, com osatentados nos teatros de São Pauloe no Rio Grande do Sul.
0 "Galileu" estreou muito
contido. Tínhamos uma versãofantástica do
"Galileu". Mas nesta
época não se podia nem olhar o
público, não se podia tocar, oespetáculo era todo preso ao
palco. Era palco - platéia. Não
tinha nada com a realidade. Tãocastrado que, dos meusespetáculos, era o que eu menos
gostava, na época. Vim a gostar de"Galileu" depois, durarvte a
excursão, quando "a
gentedeliberou Galileu da suaversão-negação. Na época, eu já viao teatro com uma funçpo muitomaior do que uma funçãomeramente didática. Via de umamaneira mais ambiciosa,
' como
possibilidade de uma modificaçãode linguagem, uma possibilidademuito mais avançaâa. No"Galileu"
não estava só em chequea história do
"Galileu" a ser
montada, estava em cheque tambémuma série de outros dados, estavaem cheque inclusive já a discussãoda razão nova. Na peça se discutea razão renascentista contra arazão tomista medieval. Então, a
própria peça tinha possibilidade dediscutir já a própria razãoErechetiana, que corresponderia àlinha do racionalismo maisacadêmico. Em
"Galileu" há
possibilidade de começar a jogarcom outra razão, a razão social.Por isso meu espetáculo jogavamuito com aquela dinâmica danarrativa Erechetiana didática eaquela narrativa do coro queculminaria no carnaval. Uma razãonova, que é uma razão que se
procura agora, uma razão que temalguma coisa da contra-cultura,mas não é bem isso também.Galileu estreou freado e foram seismeses de angústia, de ódio aoteatro, de horror. Eu me dizia-"Quero
acabar com esta profissão,não quero mais saber disso, queroir embora". Nesta época, tudo eramuito limitado, muito preso,muito contido. Muito grilo demais.Meu contacto com isto ilustrava ogrande grilo, aquela paranóia toda.
— Pensei: dá vontade de pegareste teatro, botar no rinq de boxee acabar. Então, resolvi fazer umapeça subjetivista que eu tinha na
gaveta há cinco anos. Tinha umaatração irressistível por ela, semsaber porquê, sem entender a peçasem saber o que era
"A Selva da
Cidade". Disse: "Agora
vou daruma colher de chá a mim mesmo.Como todo mundo no Brasil nestaépoca, eu fiz isso. Dei uma colherde chá a mim mesmo, porque atéentão eu era de uma discriçãoabsoluta, um sujeito totalmenteobjetivo tanto na criação quantona vida e tudo. Então peguei o
uGalileu 91
uma peça
castradatexto da
"Selva da Cidade" e já
que não podia fazer nada, partipara a experiência individual. Nostrancávamos no teatro de manhã ànoite, fazíamos caratê, (até pordefesa pessoal, porquecontinuavam nos ameaçando),
ginástica rítmica, expressãocorporal, laboratório, era umtrabalho alienador para fugirdaquela situação. Trabalhávamosdemais, ficávamos o dia inteiro no«teatro trabalhando. Fizemos umespetáculo brilhante de
"A Selva
da Cidade". Ensaios maravilhosos,lindos, duravam dez horas, trêsdias. Começava ensaiar, não sabiaquando terminava. E fui colocandotodo um aspecto não só nosso,mas talvez de muita gente noBrasil, naquele momento,colocando todo um aspecto desubjetividade, preparando assimaquele clima todo do ano 70,trabalhando inclusive uma série deatores mais tradicionais e umasérie de autores jovens muito bons,com todo um potencial deformação a ser aproveitado. Nestaépoca a Companhia era RenatoBorghi, ítala Nandi e eu. Fizemosaquele trabalho com grandeentusiasmo, mas aí o trabalhotinha de estrear. A Companhiaainda era ehnprêsa, tivemos quereduzir e bolar uma versão possíveldentro do esquema comercial,traindo muito nosso objetivo, o
que nós tínhamos conseguidocomo experiência, comorealização, porque os ensaios eramrealmente fenomenais. Era umapeça toda literária e queconseguimos fazer em silêncio, semdizer uma palevra e comunicarabsolutamente tudo. Descobrimoso potencial do silêncio, fazíamossilêncio horas e horas ecomunicávamos tudo da peça.
*--
A CRISE
DA CULTURA
NACIONAL
POLITIKA
"Se nos outros paises foi uma
coisa lenta, no Brasil foi
brusco, ninguemestava no nível
de processo, por experiência, [depoimentopor medo, por total impotência
"Analisando politicamente a situação
morte. Ai começamos a ver a morte- "Mas
aí veio a censura,
obrigaram a cortar muito texto da
peça, ela ficou reduzida a três
horas. Aquilo esfacelou, foi um
trauma em todo o sonho
esteticista do elenco. Alienado,
muito alienado. 0 pau comendo
em volta, e nós naquela
experiência esteticista, naquele
aprofundamento humano
necessário para nós, importante,
bonito, lindo, mas de repente a
realidade de ter que comercializar
e aí foi um pau. Cisão. De um
lado o pessoal do teatro
profissional achando que aquilo
era certo, do outro lado os mais
novos, completamente perdidos,
porque não se reconheciam mais
naquela experiência. E nós com
prestígio, com dinheiro na mão,
com sucesso inclusive da peça,
fizemos um prazo de contrato de
quatro meses, sentimos haver
alguma coisa no ar: -"Esta
companhia tem de parar, agora.
Eram três facções: a facção
profissional, a nossa facção
indecisa e a facção dos que
ficaram completamente perdidos.
Sentimos que não dava mais para
continuar apesar de haver três
facções muito claras.- Até então, t ínhamos
conseguido fazer um trabalho
muito integrado, era tudo muito
conjunto. Apesar de ser empresa,
era tudo muito coletivo, muito
fácil tudo. Já aquela facção de três
grupos nos assustou. -"Tem
alguma coisa errada, não vai dar
certo". Paramos. Fomos viajar.
Viajei pela Europa, Estados
Unidos, América Latina. Eu sentia
que no ano 70 era totalmenteimpossível de, no Brasil, fazer
alguma coisa, se esforçar poralguma coisa, partir para uma
grande realizarão Sentia querealmente a dissociação j_>individualismo, a atomizaçãotinham tomado conta de tudo.
Aquela subdivisão da "Selva"
em
três grandes grupos era aindaresquício de 68. Porque já depoisveio aquela experiência deatomização cada vez maior, mais
progressiva. No ano de 70 em
Princípio não fizemos nada,
quisemos descobrir o que estava se
passando. Descobrir quais eram asconseqüências da nova realidade.Estávamos todos com o coraçãomagoado, machucado. Havia uma
grande mudança em conseqüência
da mudança da situação política e
de outras mudanças também no
mundo. Não quis assumir
responsabilidade nenhuma de
direção, porque alguma coisa em
mim estava sempre me dizendo:"Não
faça nada este ano, este ano
não há o que fazer". Alguma coisa
me intimou profundamente:- "Não
há o que fazer. Observe,
tem alguma coisa no ar".
— Aí começamos a ver a morte
em tudo. Analisando politicamentea situação, descobrimos a morte.
Este espetáculo de agora ("Gracias,
Senor") nasceu de uma
conferência que eu fiz em Rio
Preto, SP., em que eu começava
falando: - "Nós estamos aqui
mortos. O senhor está morto, este
que está ao seu lado está morto.
Eu estou morto". Isto com uma
carga mágica, que eu tinha da
época incrível, e que dava uma
verdade, ao que eu dizia, fora do
comum. Essa morte, na época a
gente sentia muito sensorialmente,
muito mais que hoje. Eu ia comer,
não comia porque sentia naquele
arranjo de prato alguma coisa
morta. Sentia em tudo que eu
tinha morrido. Depois vi que tudo
aquilo que tínhamos começado em
68 estava morto. Mais do que
nunca estávamos mais mortos do
que nunca. Não tinha mais
vontade de fazer absolutamente
nada, nada, nada. Sentia a
inutilidade de tudo. Não ia mais a
lugar nenhum, ficava o dia inteiro
no apartamento, sem fazer nada.
Uma época terrível, '
uma
experiência terrível. Mas não foi
uma experiência individual. Foi de
todo o grupo. Foi um tipo de
radicalização muito grande, de
consciência muito grande das
coisas. Fra um processo muito
profundo.- A frustração pegou boa parte
da juventude e desvalorizou todo o
resto. Por exemplo, se o hippismo
ou processo de contracultura teve
um desenvolvimento mais normal
na Europa e Estados Unidos, aqui
no Brasil foi muito mais
traumático. Não acho que tenha
sido inautêntico todo o desespero
de 70. Se nos outros países foi
uma coisa lenta, uma percepção,
no Brasil foi brusco, houve uma
mudança na maneira de pensar. O
nível de exigência política era
____ _______________ ____________)£' ________________________r___ ___¦_¦__________________________! t -u»
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"Gracias Senor"
muito grande e ninguém estava à
altura do processo, não só por
falta de condições objetivas, como
também, por inexperiência, por
medo e de impotência total diante
da realidade. A nossa faixa, a faixa
intelectual sofreu isto bruscamente
de uma hora para outra. O custo
social nesta camada foi muito alto.
A gente pulava de um lado pra
outro e via que acabou tudo.
Inclusive fui convidado para dirigir
peças, mas não queria nada.— Até que chegou o momento
que esse processo teve que ser
cortado: —"Não, agora tem que
ser tomada uma atitude. Não
podemos continuar confusos,
porque estamos todos caminhando
para o suicídio". Inclusive, havia
muita coisa, mas eu fiquei fraco,
impotente. O Renato, que
terminava uma filmagem, nos viu
naquele estado, e fez uma"revolição",
nos esculhambou a
todos e disse: - "Vamos ter que
reenfrentar tudo, não tem nada de
hippismo, de contracultura, tem a
nossa realidade". Por isso, não foi
nada importado, foi tudo muito
ligado a btí. Muita coisa tinha que
jogar fora, muita coisa tinha de
morrer no grupo, muita coisa tinha
de ficar pelo caminho. O que se
morreu por aí não foi brincadeira.
O Renato chega, bota tudo de pé
e diz: -"Temos que remontar o
Galileu". Eu não suportava mais
aquelas peças, e nem podia sonhar
que um dia eu viesse a remontar.
Inclusive eu era muito pretensioso,
. quando montava uma peça, era
tlixo, não queria mais saber.
Fizemos uma remontagem sem
elenco, pegando gente na rua, uma
, descobri a
em tudo."loucura, pusemos a peça de pé,
remontamos, e aí começa a chegar
aquele pessoal que tinha saído na"Selva
da Cidade". Todos
arrebentados, na base do
macrobiótico, acidentados, pedaços
de gente que foram pingando. De
repente há umas 40 pessoas. Então
chegou a solução: era pegar a
colaboração global de todos,
deixando para trás os erros de 70,
e compor uma nova coisa, que é
uma tentativa inclusive de aplicar a
experiência do grupo da
contracultura com o grupo da
política, revisar tudo, repsicanalisar
tudo e começar junto a querer.
Foi um mês de "Teatro
Oficina"
todo trancado. Eram mais ou
menos 40 pessoas que começavam
uma disciplina militar, monástica.
Começamos a impor disciplina
rígida. Só aí já caiu metade. Ficou
um pequeno grupo, e esse pequeno
grupo começou a colocar todos os
seus planos, todos seus traumas,
tudo que quis fazer, tudo que
pensou fazer, tudo que sofreu,
tudo que não consegui, tudo não
fez, enfim, toda experiência
política intelectual, e começamos a
dar forma à experiência, e acabei
descobrindo a I ição de
esquizofrenia.— Fizemos uma análise rigorosa
de qual era nossa divisão. E
descobrimos profundamente qual
era nossa energia encarcerada,
porque nenhum de nós estava
satisfeito. Nem com a careta da
economia, nem com a careta da
política convencional. A nossa
divisão era: o careta e a energia
encarcerada. E consegui analisar
em cada um de nós o que era uma
coisa, o que era outra. Então
fizemos aquilo mais ou menos que
o Mao Tse-tung* fez com os
chineses, que era se reunir
coietivamerue e cadd um chorar
suas misérias e de repente sentir
que as misérias eram conseqüentes
do mesmo fenômeno que a gente,
eram enfim vítimas do ano de 70,
era muito por culpa desse troço
todo. Então começamos a analisar
isto tudo cada vez mais
objetivamente, mais
cientificamente e acabamos
redigindo este trabalho, ("Gracias,
Senor") como um documento,
uma espécie de constituição nossa.
9
POLITIKA
depoimento
"É
muito difícil realizar-se
alguma coisa. A desconfiança
é o grande problema
do trauma
político, da doença
política.
Todos desconfiam de todos."
A CRISE
DA CULTURA
NACIONAL
"Com
a crise, perdeu-se
a noção do real e houve
a volta ao psicologismo"
Aí, a gente topou com a reali-
dade e começamos a viagem pelo
Brasil, começo de 71. Na viagem
adotamos o processo de apresentar
as peças e depois ir fazendo aquele
trabalho paralelamente. Através de
um grupo fechado, disciplinado,
organizar livremente uma espécie de
Universidade para criar livremente a
respeito de qualquer assunto, obje-
tivando também um processo de
comunidade. Não a comunidade
como objetivo final do grupo, mas
como meio. Estudar cientificamen-
te, em todos os sentidos: emocio-
nal, sexual, social, tudo, tudo, que
tudo estava em jogo. Construir um
grupo realmente de pensamento,
pela revalorização pessoal, além de
recoletivisar as pessoas. Já que nos
reduziram a crianças inaptas^a solu-
ção era criar um grupo para apren-
der novamente a vida coletiva e
praticar a auto-gestão. O objetivo
era criar um grupo modelo, experi-
mentàl, científico, para criar uma
linguagem que refletisse a vida coti-
diana. Criar uma nova linguagem fora
da linguagem teatral convencional.
Sabemos que a nossa língua-
gem cotidiana representa um status
quo que não interessa. Se você a
utiliza, mesmo combatendo o status
quo, você está firmandò o status,
está afirmando as coisas como elas
são, você está utilizando o repertó-
rio disponível. A primeira obrigação
de quem se propõe a mudar as
coisas é mudar a linguagem. O Ma-
rio de Andrade, quando quis mudar
em "Macunaffiia",
mudou a lingua-
gem. Tanto que a linguagem dele já
hoje começa a ser entendida. Quan-
do se muda a linguagem, muda-se o
conteúdo, . © sentido, tudo. Desde
o começo da viagem e da prepara-
ção do trabalho, a preocupação era
criar uma nova lirçjuagem, mas nós
não conseguimos inteiramente, por-
que alguns de nós ainda não se
convenceram disso. As palavras
resolvem os problemas até um certo
ponto, mas chega um momento em
que elas não resolvem mais nada.
Este tipo de comunicado de
linguagem que está aí, ninguém
mais ouve ou se interessa por ele. A
gente se pretendia um grúpo de
comunicadores não só de atores. A
gente se interessava por pessoas que
tivessem tido outras experiências e
se interessassem em passa-las adian-
te. Estabelecer contatos entre estes
grupos e criar uma obra, que não é
ainda esta que está daí, que está
longe da que pensamos. Os próprios
espetáculos antigos se modificaram
através da nossa viagem pelo inte-
rior. A partir de um certo momen-
to, saímos das salas para representar
nas quadras, caindo da classe média
e entrando em contato com outras
faixas.
Nós vivíamos o teatro. Passáva-
mos o dia em permanente laborató-
rio. Usávamos uma série de proces-
sos psicológicos de comunicação
para levar uma comunidade a fazer
coisas que ela devia e podia fazer.
Por exemplo, uma pequena cidade
do sertão cercada de rios vivia ilha-
da. Através do teatro levamos a
cidade a construir uma ponte. Cria-
mos toda uma situação de comuni-
cação para convencer o povo a fazer
coisas concretas e não permanecer
numa atitude passiva de assistência.
Tínhamos duas linhas de traba-
lho: uma na cidade, outra na zona
rural. Foi a partir daí que surgiu o
projeto nosso de, a longo prazo,
fazer um espetáculo e um filme
sobre "Os
Sertões", de Euclides da
Cunha. "Os
Sertões", na realidade,
é um livro pouquíssimo conhecido,
pouquíssimo lido. E que eu acho
uma das maiores obras da literatura
internacional, e onde estão as raízes
de qualquer repensamento brasi-
leiro. ê "O
Capital" brasileiro.
Tanto que, na peça, em determi-
nado momento, mostramos o livro.
Esta viagem ao Nordeste foi toda
uma pesquisa para
"Os Sertões".
Todo espetáculo feito em zona
rural tinha uma atitude messiânica.
Hoje em dia, no Brasil, uma
grande faixa dos intelectuais tem
muito a ver com o povo porque está
vivendo a mesma experiência de
marginalidade. Em toda nossa via-
gem, partíamos do princípio de
uma certa morte social no país, e
todo o trabalho era uma espécie de
tentativa, no plano da psicologia
social, de redespertar, de requerer,
de fazer a revo/ição, uma espécie de
massagem nas populações submeti-
das a todo um processo de lavagem
cerebral, principalmente a classe
t I >
Bj
IB
média, que precisa voltar a querer.
Particularmente eu gostaria de fazer
um trabalho muito mais objetivo,
muito menos próximo à psicologia
e à antropologia e muito mais pró-
ximo à política e à economia. Nossa
experiência mostrou que não é fácil
atingir o equilíbrio da comunica-
ção. Porque este equilíbrio não
depende de nós. Depende da pró-
pria conjuntura, é muito importan-
te este aspecto do porque da difi-
culdade de as pessoas ainda se uni-
rem. Coloca-se uma questão para o
próprio público e vemos que, hoje
em dia, o povo brasileiro se habi-
tuou a, numa assembléia, falar, mas
a manifestação sempre é neurótica,
as pessoas se atacam, se agridem,
uns acusam os outros. Todo mundo
com problema de culpa, é semprè
aquela Xingação danada, é incrível,
é uma coisa de-psicanalise.
— A verdade é que, com a crise
política toda, perderam a noção
real sobre as coisas e houve uma
volta a um psicologismo, um grande
individualismo, um retrocesso mui-
to grande. Talvez as pessaos tenham
ganho outras experiências. Mas
perderam a experiência mais con-
creta, que é do trato com a reali
dade, do trato com o outro, do
trato coletivo. Desaprenderam mes
mo. São muito pobres coletiva-
mente, politicamente, como forma
<te deformação da realidade. Hoje
em dia é muito difícil realizar algu-
ma coisa. Todo mundo desconfia de
todo mundo. Desconfiança, descon-
fiança. Aí vêm aquelas couraças, a
desconfiança em forma de defesa.
Vem a couraça psicológica, a pessoa
vem com o psicologismo para anali-
sar por que que ela desconfia da
outra, porque a outra tem comple-
xos disso e daquilo, etc. E não é
nada disso. A desconfiança é conse-
qüência de um comportamento
social e pol ítico. é o grande proble-
ma do trauma político, da doença
política. E este espetáculo (gracias
senor") é testemunha dessa época.
Quando ele sai ruim, ele é o que
pode ser, é o espelho do que está
acontecendo agora, é o termômetro
social muito grande do que se passa.
Não só do que nós fazemos, mas do
que o público faz também, é difícil
a comunicação do público. As pes-
soas não se olham, não integram. É
toda uma coisa louca, bruta, solitá-
ria. E individualmente elas estão
com tudo, estão fazendo psicaná-
lise, énfim tudo. Mas quando estão
em grupo, em multidão, elas viram
cavalos.
— O comportamento grupai foi
desaprendido totalmente. E nosso
esforço no espetáculo é recuperar
isto. Porque, se não recuperar isto,
realmente acabou. Se você tem uma
mulher, um amigo, uma mãe, um
filho, politize essa relação,
que tudo
tem que ser politizado, discutido. A
sociedade está sofrendo do mal de a
comissão técnica resolver tudo,
enquanto o resto é um bando de
órfãos débeis mentais, impotentes,
incapazes, gente sem contato ne-
nhum com a real. Neste ano de 72
esse dado de retomada de posições
é muito importante: de voltar a
querer coisas concretas, querer
o
seu lugar. As pessoas se procuram
com uma vontade muito grande de
acertar, até que vão se formar deter-
minadas constelações de pessoas
que vão se èntender, que vão come-
çar produzir a ideologia. Tenho
uma fé profunda nisso'e espero que
aconteça alguma coisa que facilite
esse processo, mas é uma coisa a
longo prazo, de muito, muito tempo.
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Roosevelt e Stalin no encontro de Yalta
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C/71/ En-Lai
POLITIKA
Artnur
Loureiro
: "'• " *¦ . «fe -
De Gaulle e Chu-En-Lai foram
os primeiros
a entender que
a ameaça à segurança interna
vinha daqueles que prometiam
ajudá-los: os EUA e a URSS.
China acabo
com o
mundo só
para
dois
repartição do mundo pelo
Tratado de Yalta e coisas
semelhantes. A realidade,
entretanto, como a carne, estava
muito mais por baixo desse
angu. Conversando com o
iuguslavo Milovan Djillas,
Stalin tinha posto os pingos
nos /$, com brutal clareza:
"Cada um impõe o seu sistema nas
áreas que os seus próprios
exércitos dominam." Exatamente
nos pontos da periferia
onde não
ficara bem clara, ao final da
Segunda Guerra, a posição desses
exércitos, foi que durante mais
de um quarto de século se
localizaram os focos de atrito
e as guerras limitadas: Berlim,
Oriente Médio, Coréia e Vietnã.
4
0 sistema vinha funcionando com
perfeição matemática há mais de
um quarto de século. Havia os
dois Grandes, cada qual com os
respectivos satélites. Toda vez
que qualquer satélite tentava
colocar os seus próprios
interesses acima dos interesses
do astro principal, o rolo
_
compressor entrava em ação.
No primeiro tempo, era lançada
A ACUSAÇÃO - equivalente
moderno de pecha, hoje
folclórica, que mouros e
cristãos atribuíam-se mutuamente
na idade média. Daí em diante
tudo ficava justificado:
desrespeito aos tratados,
desprezo às soberanias, agressão
militar aberta ou disfarçada,
etc. Foi assim na Hungria, na
Tchecoslováquia, na Guatemala
e na República Dominicana.
Os ingênuos falavam muito em
I
?
POLITIKA
¦contexto
Na década de 50, os Estados
Unidos apoiaram o Paquistão
com uma finalidade que
hoje
provocaria gargalhadas: não
deixar a China se expandir.
China acaba com o
mundo só para
O astro
ameaça
o satélite
0 exame imparcial e objetivo
desses fatos leva obrigatoriamente à
seguinte conclusão, contra a qual
não se consegue apontar nem mes-
mo a sombra de um exemplo: A
VERDADEIRA AMEAÇA AS SE-
GU RANÇAS NACIONAIS PAR-
TIU SEMPRE DO ASTRO PRINCI-
PAL DO SATÉLITE E NUNCA DE
QUALQUER PONTO DO OUTRO
SISTEMA. Veja-se o caso das nossas
200 milhas de mar territorial e per-
gunte-se se vem de Cuba, da URSS
ou da China a ameaça.
Os que primeiro perceberam
essas verdades elementares, foram
Tito, De Gaulle e os chineses. Tito
escapou logo, porque não estava
dentro da área dominada pelos
exércitos soviéticos, dos quais não
dependeu para libertar o país dos
nazistas. Já os casos de De Gaulle e
dos chineses foram diferentes do
iuguslavo, mas bem semelhantes en-
tre si. França e China, embora alia-
das dependentes, representavam tra-
dições culturais, diplomáticas e mi-
litares muito mais antigas e respeitá-
veis do que as das respectivas potên-
cias principais. França em Suez
(1956) e China na crise das ilhas
Quemói e Matsu (1958) viram-se
abandonadas, quando os seus inte-
resses não constituíam também in-
teresses dos seus líderes. Ambas
foram frustradas no desejo de obter
ajuda para desenvolver forças nu-
cleares independentes, pelos mes-
mos motivos que o Brasil também
não obteve auxílio nem mesmo pa-
ra incrementar uma tecnologia nu-
clear pacífica. Por outro lado, tanto
a França quanto a China viram suas
respectivas potências principais, tão
cautelosas em Suez e em Quemói e
Matsu, correrem, sem titubear, ris-
cos imensos em Cuba e em Berlim,
quando estavam em jogo suas pró-
prias conveniências e não as dos
satélites.
De Gaulle e Chu-En-lai tiraram as
conclusões lógicas de todos esses fa-
tos. De Gaulle declarou, em novem-
bro de 1959: "Quem
pode dizer
que, se a ocasião se apresentar, os
dois poderes ao decidirem não lan-
çar mísseis contra o inimigo princi-
pai, para se colocarem a si próprios
a salvo, não esmagarão os outros?
É bem possível imagina^ que num
dia aziago Moscou varresse a Euro-
pa Ocidental do mapa e Washington
V:jt* '
W
fu
Fidel Castro
O mundo
sempre foi
dividido
a Europa Central. E quem pode
afirmar que os dois rivais, depois de
não sabermos que cataclismo social
e político, não se unirão? "
E come-
çou a falar numa Europa do Atlân-
tico aos Urais. Chu En-lai, por sua
vez, logo após a Conferência de
Bandung (1955), começou a propor
a reaproximação com os Estados
Unidos. Mas ainda era cedo. Os ho-
mens teriam que esperar até a déca-
da dos 70 para que o degelo come-
çasse a corroer a estupidez monolí-
tica da guerra fria.
A confrontação entre ocidente e
oriente, entre mundo livre e mundo
comunista nada mais foi do que
uma luta entre os interesses da
Rússia e os dos Estados Unidos, cu-
jos apetites encontravam-se poder o-
samente acirrados pelo vazio decor-
rente do afundamento dp todas as
demais potências na segunda guerra
mundial, derrotadas umas e total-
mente esgotadas outras. A rival ida-
de entre Ocidente e Oriente fora
criada há mais de 10 séculos, por-
que os ocidentais estavam obsoluta-
mente certos de que o Espírito San-
to procedia do Pai e do Filho, en-
quanto os orientais também esta-
vam obsolutamente certos de que o
Espírito Santo procedia somente do
Pai. A rivalidade posterior à segun-
da guerra não se baseava em razões
melhores do que essas, até porque
mais de metade das nações que
compõem o chamado mundo livre
está composta por ditaduras decla-
radas.
Mais importante, porém, do que
tudo isto era a falta de lógica dos
quadros em que se petrificara a
guerra fria e a impossibilidade de
qualquer espécie de solução. Esse
conflito potencial opunha dois blo-
cos de nações industrializadas e
ricas (embora desigualmente) que
lutavam por dois grupos de objeti-
vos na realidade secundários: 1) al~
guns pontos geográficos periféricos;
2) o regime econômico e político
do resto do mundo, constituído
essencialmente de nações subdesen-
volvidas. O absurdo de uma guerra
quente entre os dois blocos fica
visível se considerarmos que ela le-
varia esses blocos ricos da humani-
dade a se destruírem mutuamente,
com o único objetivo de determinar
qual dos dois teria o privilégio de
fornecer o modelo que o resto da
humanidade iria adotar para li-
vrar-se da fome e da pobreza.
Mas foi preciso que todo um con-
junto de fatos ocorresse para que os
homens começassem a ver tudo
com nitidez. Em primeiro lugar,
veio o conflito sino-soviético, insus-
cetível de solução militar em virtu-
de da extensão territorial e da for-
midável massa demográfica do saté-
lite rebelde. Em seguida, o impasse
dos Estados Unidos no Vietnã, com
a conseqüente revolta de opinião
pública americana, já abalada
pela
crise econômica, pelo recrudesci-
mento do problema racial e pela
chamada crise de civilização. Por
cima de tudo isto, acicatando o
bom-senso e espaventando as bru-
xas cada dia menos úteis, chegou a
campanha eleitoral. E foi aí quenós,
que já tínhamos visto Stalin
com Hitler, Churchill com Stalin,
Roosevelt com Stalin, Eisenwoher
com Krushchev, etc. etc. - foi ai'
que nós vimos Nixon com Mao e
estamos nos preparando para vpr
Nixon com Brejnev e Nixon com
Fidel Castro.
A reaproximação sino-americana
já tinha produzido conseqüências
importantíssimas muito antes de
Nixon embarcar para Pequim. Em
25 de outubro do ano passado, a
China Popular foi admitida na ONU
em substituição ao Governo de For-
mosa, embora Washington defen-
desse a tese da dupla representação
do ex-Império do Centro, rejeitada
com obstinação tanto por Taipé
quanto por Pequim. Ao que tudo
Paquistão
uno na ONU
EUA-China
indica, americanos e chineses esta-
vam de acordo em adiar a decisão
até este ano, de forma a preparar
Chang Kai-Chek e a opinião pública
nos Estados Unidos. Em 3 de de-
zembro de 1971, aconteceu o que
ninguém seria capaz de prever três
meses antes: a China Popular
apoiou uma resolução americana à
qual a Rússia opusera o seu veto.
Em conseqüência, dia seguinte (4
de dezembro) eclodiu a guerra do
Paquistão, pondo a nu os interesses
estratégicos dos três Grandes.
O Paquistão, uma loucura consti-
, tu ida por dois disparates separados
por 1.700 quilômetros de território
hindu, era na verdade não um, mas
dois países: o Paquistão Ocidental,
árido, atravessado pelo Indus; e o
Paquistão Oriental, úmido, superpo-
voado, pertencente já ao sudeste da
Ásia. Essa loucura era o resultado
da descolonização no sub-continen-,
te indiano, ao fim da segunda guer-
ra.*Gandhi, o mais irredutível adver-
sário da colonização inglesa, lançou
o seu famoso: "Ingleses,
saiam da
índia." Ao que retrucou o líder mu-
çulmano Muhammad AI^.Jinnah:"Ingleses,
dividam a partam."
Jinnah, que não era religioso e não
falava o árabe, foi quem criou o
Paquistão, estado cuja única justifi-
cativa seria a unidade religiosa.
Gandhi previra tudo: "Se
o Indos-
tão deve ser um país reservado ape-
nas aos hindus e o Paquistão um
país reservado apenas aos muçulma-
nos, então o Paquistão e o Indostão
serão países transbordantes de vene-
no". E na verdade assim foi.
Na década de 50, os Estados Uni
dos aliaram-se ao Paquistão com
uma finalidade que hoje provoca
gargalhadas: queriam conter a
China. Nehru denunciou a mano-
bra, declarando que o auxílio ame-
ricano apenas modificava a relação
de forças na querela do Cachemir,
mas não a capacidade de resistência
ao comunismo. Em 1966, a interfe-
rência de americanos e russos juntos
conseguiu deter o conflito entre
índia e Paquistão, com aplausos do
mundo inteiro.
*
a
D
El
ai
China acaba com o
mundo só para dois
Os russos conseguiram provar
que o que é bom para eles, o
é para o comunismo. Aqui, uma
alteração: o que é bom paraos EUA é bom para o Brasil.
I ^*J ^ 111 kT/1
i
I kontexto—
As eleições no Paquistão apenas constataram a
realidade geográfica: o pais era duas nações. .~ r _¦ -_.__ mmsmmmMtammm I ___¦___» _-»r_mr_ HpiyaraiTI 3 Ri
Yahya Khan, colocado no
poder em lugar de Ayoub Khan por
um golpe de estado, resolvera con-
vocar eleições no intuito de superar
o descontentamento existente nas
duas partes do país, em virtude de
uma gestão econômica ineficiente e
dos privilégios de algumas famílias.
As eleições, realizadas em fins de
1970, produziram a confusão geral.A oeste, o partido de oposição de
Bhutto alcançou expressiva vitória.
Mas a leste, houve uma verdadeira
avalancha em favor do partido auto-
nomista liderado por Sheikh Muji-
bur Rahman, coisa que não chegava
a ser surpreendente, tendo em vista
que a província oriental há^anos
vinha sendo tratada como autêntica
colônia.
A situação poderia ser contor-
nada se Bhutto aceitasse um acordo
baseado na concessão de larga auto-
nomia ao Bangla-Desh. Na impossi-
bilidade de tal acordo, Sheikh Muji-
bur proclamou a secessão de Benga-
la Oriental. O Governo de Bhutto
enviou tropas para Leste, prendeu
Sheikh Mujibur e iniciou uma re-
pressão extraordinariamente violen-
ta contra os separatistas. Essa re-
pressão provocou o êxodo de 10
milhões de refugiados, que foram
buscar abrigo nos campos da região
de Calcutá, na fndia. Indira Gandhi,
cujos partidários acabavam de con-
quistar uma grande vitória eleitoral
em março, começou a lançar drama-
ticos apelos à comunidade interna-
eional no sentido de obter auxílio
para a solução do problema com
que se via a braços. Inútil dizer quenão veio auxílio nenhum.
Em agosto, Gromyko foi a Nova
Deli para assinar um tratado de ami-
zade com a índia, no qual a Rússia
se comprometia a assegurar apoio
soviético caso a índia fosse atacada.
A manobra russa, resposta brilhante
à aproximação sino-americana, che-
gava exatamente na hora justa. A
China, a braços com uma grande ri-
validade interna entre o partido e as
forças armadas, estava imobilizada
por completo. De agora em diante,via-se obrigada a se defender, ao
norte, em face das quarenta e nove
divisões soviéticas ali estacionadas e
via-se também obrigada a vigiar oflanco sul. Era o cerco, em face das
quarenta e nove divisões soviéticasali estacionadas e via-se tambémobrigada a vigiar o flanco sul. Era ocerco.
^K^B^ ^11
Maotse-tung
____________________________
mSAmm BE ^^ ^^K
_____H_L_____________________k _______i________________í
Indira Gahndi
A China
apenas se
defendiaAssinado o tratado entre russos
e hindus, uma ponte aérea encami-
nhou a Nova Deli em fluxo gigan-
tesco de material militar. Os mei-
dentes começaram a se multiplicar e
em breve as tropas da índia intervie-
ram no conflito, apoiando os com-
batentes do Bangla-Desh. Sentindo
já U CJUblU ua üciiuiu, • "• • i .
tentou um golpe desesperado: quis
repetir o feito dos israelenses, des-
vencilhando-se, de um golpe, do
grosso da aviação hindu e ordenou
o bombardeamento dos aeróoYomos
inimigos. A iniciativa foi um fracas-
so Algumas horas mais tarde (4 de
dezembro de 1971) a índia lançava
a ofensiva contra o Paquistão. Treze
dias depois ocorria a queda de Daca
e a instalação de um governo do
Bangla-Desh independente. Em is-
lamabad, Yahya Khan era substitui-
do por Bhutto.
Já se disse que a guerra do Pa-
quistão foi um dos raros conflitos
modernos sem conotação ideoló-
gica. Isto seria o de menos. O im-
portante é que a guerra do Paquis-
tão foi um conflito onde as posi-
ções ideológicas se encontraram
exatamente invertidas. Em primeiro
lugar, a fndia - a mais populosa na-
ção do mundo democrático cujas
tendências pró-ocidente ninguém
discute-alinhou-se ao lado da
Rússia, de quem recebeu apoio e ar-
mamento. Quando os Estados Uni-
dos enviaram um porta-aviões para
golfo de Bengala, numa última
tentativa desesperada de pressionar
Nova Deli, os russos responderam
despachando várias fragatas lança-
mísseis para a região. Na ONU, o
apoio soviético não foi menos deci-
sivo. O veto da Rússia à resolução
americana que determinava a recon-
ducão das tropas às linhas de parti-
da (resolução apoiada pelps
chinês!!!) foi o que permitiu a In-
dia a sua vitória relâmpago.
Em segundo lugar, além da ines-
perada aliança sino-americana da
ONU, havia o surpreendente apoio
do governo de Mao a um dos regi-
mes mais reacionários do mundo
atual, em detrimento de um povo
que lutava pela autodeterminação e,
de certa forma, lutava até para se
libertar de uma situação colonial.
Tornando o quadro mais irônico .
ainda, havia também a coincidência
do apoio de americanos e chineses
ao governo de Islamabad, um gover-
no que, como vimos, estabeleceu o
primeiro tratado com os Estados.
Unidos com o fim de impedir a ex-
pansão da China.
Para finalizar com chave de
ouro, a manobra russa de cercar a
China pelo sul, através do tratado
com a fndia e da influência que
com certeza terão os russos em Ban-
nla-Desh. nada mais é do que uma
versão soviética do "China
contain-
ment policy" de John Foster
Dulles. Com esse tratado, com essa
influência, com a exploração do
descontentamento japonês em face
da orientação americana da China, a
Rússia está fazendo com a China
exatamente aquela pol ítica de cor-
dão sanitário que os europeus utili-
zaram contra Moscou.
O Bangla-Desh nasceu e a ideo-
logia morreu do parto. Se houvesse
hoje uma nova Conferência de
Bandung, os povos do terceiro mun-
do deixariam a China de fora dessa
vez, como deixaram a Rússia da ou-
tra. O caráter puramente verbal do
apoio chinês às revoluções externas
já ficara mais ou menos visível com
o largo crédito aberto à Etiópia, a
despeito da brutalidade da repres-
são da guerrilha na Eritréia, e com a
sustentação que o governo de Mao,
juntamente com os Estados Unidos,
a Rússia, a Grã-Bretanha, a índia e
o Paquistão, havia dado ao governo
do Ceilão, também envolvido com
problemas de guerrilha. Agora, fica-
ra escandalosamente claro que a
China Popular, como todos os ou-
tros povos, dedicava-se apenas à de-
fesa dos interesses próprios e nada
mais.Em resumo: a China quer se in-
dustrializar; a Rússia quer passar
para a etapa pós-industrial; e os Es-
tados Unidos querem diminuir as
despesas militares, sanear a econo-
mia, atenuar o conflito racial, gastar
mais em saúde, em educação, em
problemas urbanos, etc. Guerrilha
camponesa, internacionalismo pro-
letário,, defesa do mundo livre e
contenção do comunismo são ape-
nas fórmulas verbais úteis na luta
pela conquista daqueles objetivos.
A ideologia foi sempre uma cor-
tesa de raro impudor. Para Hegel, a
suprema manifestação da Idéia se
concretizava no Estado Prussiano.
Os russos lograram convencer os ou-
tros de que o que era bom para a
URSS era bom para o comunismo
e, entre nós, já se disse que o que é
bom para os Estados Unidos é bom
para o Brasil.
Houve época em que era admis-
sível acreditar-se nessas racionaliza-
ções. O conhecimento dos fatos ver-
dadeiros exigia tempo, pesquisa e
competência especializada. Hoje as
coisas estão meridianamente claras,
ao alcance do simples homem da
rua e só aqueles cujos interesses se.£.-..-_-_ ~stsnr\r,rsnr\r\<l ninrli niiorpm lf".-
VtStílli di i ícayavj^o, autua 4**» -i 11
sistir na conservação dos fossiliza-
dos quadros ideológicos.
A Argentina já reconheceu a
China popular. É preciso que nós
tomemos a dianteira pelo menos na
iniciativa de organizar uma missão
comercial que consiga abrir para os
produtos brasileiros aquele fabuloso
mercado de quase um bilhão de
consumidores. O que o Brasil preci-
sa mesmo de verdade é de negócios
da china, seja lá com quem for. Até
com a China.
POLITIKA
I . •
rRp ___¦g= j^k^:^J^b**V s^^IK,
Hélio
Duque
e 18 minutos, hoje ele tem de
trabalhar 2 horas e 29 minutos.
Dessa maneira, o pobre do
trabalhador Antonio Bispo já
não sabe o que fazer. Não
podemos esquecer que ele tem
de pagar, também, condução
de ida e volta para a fábrica,
aluguel de casa, luz, gâs,
além de outras despesas mínimas,
indispensáveis para a sua
sobrevivência. Ou subvivência?
Essa-a situação de milhões de
Antonios anônimos por esse
Brasil afora. No
entender do professor Pompeu
Accioly Borges, o trabalho
da FAO serviu para mostrar
números alarmantes sobre
uma situação de fato:
Os estudos feitos, na capital
paulista, realmente me
impressionaram bastante.
É claro que o problema
existente não é apenas pela
falta relativa dos alimentos
mas, principalmente, devido
à política de contenção
salarial que reduziu o salário
real do trabalhador paulista
em 40 por cento no último
quadriênio e forçou o número
de pessoas de sua família a
trabalhar fora de casa.
Embora não tenha havido
pesquisa semelhante na Guanabara
e em outros Estados, a FAO
supõe que, pelo menos nas
favelas, onde está concentrada
a camada mais pobre da
população, haja carências
alimentares provocadas pela
alta exagerada de preços,
em confronto com os aumentos
irrisórios de salários".
r
O Censo de 1970 provou que da
população economicamente ativa
brasileira, cerca de 29
milhões, apenas 9 por cento
recebem salário superior a
500 cruzeiros mensais. Agora
é a FAO, organismo da ONU que
trata em todo o mundo do
problema da fome, que traça um
quadro dos mais chocantes sobre
o poder aquisitivo do brasileiro,
mais particularmente do
trabalhador de salário-mínimo,
a grande e imensa maioria.
Segundo o professor Pompeu
Accioly Borges, consultor da
FAO no Brasil, em recente
pescjuisa realizada no Qrande
São Paulo, chegou-se a uma
conclusão alarmante. Nessa
pesquisa, realizada na área
mais desenvolvida do nosso país'
e que tem o mais avançado
sistema industrial da América
èo Sul, não dá para se entender
como ó que vive o brasileiro
de salário-mínimo.
Eis os dados: Antonio Bispo,
43 anos, salário-mínimo, uma
mulher, cinco filhos já não sabe
a opção que lhe resta. Em 1965,
para comprar um quilo de feijão
trabalhava 1 hora e 35 minutos
por dia. Hoje, ele precisa
de pelo menos 3 horas e 19
minutos para poder comprar
a mesma quantidade. Um quilo
de carne custava 4 horas e
24 minutos. Hoje custa 6
horas e 2 minutos de trabalho
duro. Há cjnco anos, por um
litro de leite, Antonio Bispo
trabalhava 34 minutos, hoje
para beber a mesma quantidade
ele tem de trabalhar 52
minutos. Para adquirir um
quilo de pão trabalhava 1 hora
realidade
É a FAO que
diz: 1939,
um brasileiro consumia 136
gramas de carne
por dia. Hoje,
aquêle que
consegue comprar,
consome, apenas, 74 gramas.
*313
POLITIKA
SALÁRIO
MÍNIMO
É JEJUM
Somente graças
a verdadeiras
reformas agrárias e mutações
de estrutura, podem
os povos
subdesenvolvidos absover a
nova revolução tecnológica.
realidade
A dura vida dos trabalhadores nega os slogans
Indiscutivelmente, o brasileiro
está comendo pior de ano para ano.
E o próprio organismo da ONU,
através o seu consultor brasileiro
atesta:"Antes
da guerra, o brasileiro
consumia 136 gramas por dia de
carne. Atualmente, aqueles que
conseguem comprar carne conso-
mem apenas; 74 gramas. A mesma
coisa acontece com o leite: das 250
gramas de leite que consumia diaria-
mente, o brasileiro bebe agora
apenas 1.54 gramas".
Há alguns meses, o jornalista
Luiz Carlos Sarmento, escrevendo
sobre o assunto, dizia que, diaria-
mente, bombardeado pelos veículos
de comunicação de que a renda per
capita do brasileiro aumentou em
não sei quantos por cento em pro-
porção ao ano passado, os Antonios
e Joões ficam admirados desse cres-
cimento que em instante algum
chega a servir para mudar suas
subvidas.
Dessa maneira, o dia a dia, que
não tem nada de colorido na dura
vida do trabalhador brasileiro, nega
o que a propaganda excessiva tenta
institucionalizar.
É o professor Pompeu Accioly
Borges quem afirma:"É
fácil verificar que o produto
nacional bruto tem aumentado a
partir de 1949 ao ritmo de quase 5
por cento ao ano, ou seja 2 por cen-
to per capita, índice que, se bem
não de todo satisfatório, resulta
expressivo nos contextos do mundo
subdesenvolvido. Mas trata-se, é
bom notar, de uma taxa média em
torno da qual variação é enorme.
Algumas áreas do país acusam um
crescimento que não alcança a
metade do indicado. O produto
agrícola, por exemplo, se expandiu
4 por cento ao ano, superando
amplamente o coeficiente de
aumento da população rural, que
foi de 1,6 por cento ao ano, duram
te o período 1950/60. Mas eu per-
gunto: como conciliar o aumento
verificado de 2,4 por cento ao ano
do produto agrícola per capita com
a lastimável situação da estrutura
agrária do Brasil? Que fatores dinâ-
micos foram capazes de elevar, na
proporção assinalada, a produtivida-
de^ média do agricultor brasileiro?
Não é fácil de se responder, princi-
palmente porque não merecem
muita fé as estatísticas agrícolas
brasileiras. Uma análise superficial
talvez poderia cingir-se à comprova-
Çao de uma melhora aüment na
população, como um todo, mas
convém atentar para as distorções
da realidade brasileira que podem
jer motivadas pela mera utilização
das médias globais".
Demonstrando ser um grande co-
nhecedor da realidade nacional, o
consultor da FAO assim se refere ao
quadro das estatísticas oficiais:
"Os números nem sempre são
corretos. Todos nós sabemos que
existem ainda no país regiões alta-
mente subdesenvolvidas, cujos redu-
zidos níveis de renda obrigam suas
populações a um severo regime de
subconsumo alimentar. No Norte-
Nordeste, por exemplo, algumas
pesquisas revelaram na dieta alimen-
tar diária um déficit da ordem de
30 por cento do valor calórico (em
relação ao normal) e de 50 por cen-
to no total de proteínas, com a
particularidade de que a ingestão de
proteínas animais não atinge sequer
a metade da quota recomendada
pela FAO".
Observem que essa pesquisa
foi
realizada dentro de um centro
urbano. Obviamente, os resultados
de uma pesquisa na área rural seria
bem mais chocante, já que as dife-
renças de rendas entre as popula-
ções urbana e rural a cada momento
mais se acentuam. Ainda há pouco
fiz uma visita às vastas áreas da re-
gião nordestina e fiquei espantado
com o quadro que me foi dado
observar. É a fome crônica diziman-
do populações.
Sobre esse aspecto, a posição do
professor Pompeu Accioly Borges é
esta:
"A visão microscópica da catás-
trofe da fome assume contornos pa-
téticos, quando se atenta para
as
disparidades-enormes, chocantes, e
o que é pior,
crescentes entre o que
ocorre no meio rural de certas
regiões privilegiadas, o chamado
mundo desenvolvido, e o que se
passa nas regiões subdesenvolvidas,
onde se concentram 2/3 da popula-
ção mundial. Esta última só dispõe
de 1/3 da produção mundial de ali-
mentos e sua exígua renda per capi-
ta que raramente excede 100 dóla-
res anuais, não lhes permite adqui-
ri-los nos países ricos que se vêem
muitas vezes a braços com a crise de
superprodução agrícola, chegando
ao absurdo de destruir alimentos.
Sim, é estarrecedor: destruir alimen-
tos. Por três vezes em 25 anos de
existência, a FAO trajou de investi-
gar como a população
mundial se
alimenta. A última pesquisa foi rea-
lizada em 1963 e a situação não
mudou nada nesses últimos anos.
Ficou provado ser de todo insufi-
ciente não apenas a quantidade mas
também a qualidade do que come a
maior parte da população de países
subdesenvolvidos".
Pelo resultado dessa pesquisa,
que já remonta há nove anos, pode-
mos constatar facilmente que meta-
de da população do mundo vive
num processo de fome crônica ou
no de subnutrição, sofrendo muitos
de ambos os processos. Segundo o
consultor da FAO no Brasil, na
época da pesquisa, dessa metade,
1,5 bilhão de seres humanos, cerca
de 500 milhões podiam ser classifi-
cados como famintos.
E o quadro nesses nove anos evo-
luiu para pior, já que é sabido que
as situações àlimentares se refletem,
sobretudo, nos níveis de renda.
Presentemente, estima-se que 70
por cento da população mundial
vive nas regiões consideradas subde-
senvolvidas, auferindo não mais do
que 20 por cento do total da renda
mundial.
Numa projeção já feita para o
ano 2.000, pode-se desde já avaliar
que a população do mundo desen-
volvido crescerá em números redon-
dos em 150 por cento, necessitan-
do-se, por conseguinte, que a pro-
dução de alimentos triplique ou
quadruplique.
Serão isso possível? Qual o cami-
nho que resta para os povos
subde-
senvolvidos? O cientista Pompeu
Accioly Borges enxerga assim esse
problema:
"Só há uma saída: a espetacular
revolução tecnológica que teve
início no mundo agrícola há cinco
anos, batizada com o nome sugesti-
vo de Revolução Verde. Pouco ou
quase nada se tem feito no Brasil
dessa revolução, capaz de alterar
profundamente o panorama
alimen-
tar dos países subdesenvolvidos,
inclusive o nosso. A Revolução
Verde deflagrou-se com a descober-
ta no México, de sementes híbridas
de trigo de alto rendimento. Tais se-
mentes podem ser plantadas
em
qualquer estação do ano e produ-
zem três boas colheitas. A abundân-
cia de alimentos provocada pela
Revolução Verde provocará uma
situação nada fácil de se resolver:
como alimentar aqueles que têm
fome, mas não comem porque care-
cem de terra, trabalho e dinheiro?
Como tornar acessível aos pequenos
agricultores o uso de novas técnicas
que exigem, além de conhecimentos
agrônomos, pesados investimentos
de irrigação e fertilizantes?
Nessa inquirição do professor
Accioly Borges está todo um
quadro de relação injusta, que sem
a posse da terra torna-se-ia inviável.
Pensar-se nos postulados sadios de
uma autêntica revolução agrária. E
o seu ponto de vista a respeito desse
ângulo do problema é claro:
-*• "Somente
através de verdadei-
ras reformas agrárias e de substan-
ciais mudanças de estruturas, pode-
rão os povos subdesenvolvidos
absorver a nova e revolucionária
tecnologia agrícola. Caso contrário,
estarão em situação humilhante de
simples freqüentadores do mercado
mundial, sem dinheiro para com-
prar os maravilhosos produtos que
se oferecem nas suas prateleiras ou
sem o mínimo de condições para
utilizá-los. E mais: terão que con-
formar-se em produzir alimentos
com técnicas primitivas e por isso
mesmo caros e não competitivos
nos mercados mundiais".
Aí está uma radiografia nada oti-
mista de um problema que vivemos
em nosso país, assim como vivem as
demais nações subdesenvolvidas, e
que só tende a agravar-se se nada
for feito com profundidade para
combatê-lo. A fome crônica, provo-
cada por uma série interminável de
fatos. E que num país como o
nosso, o grande latifúndio improdu-
tivo serve para dar-lhe uma dimen-
são ainda maior.
Fica evidenciado que sem uma
firme determinação de se alterar o
quadro de relações injustas no
nosso mundo rural, as intenções de
modernização da nossa agricultura
não passarão jamais de simples
intenções . . .
De concreto, nada resultará. Ou
melhor, resultará para os milhões de
Antonios Bispos anônimos desse
país a necessidade, para sobrevi-
verem nesse ano de 72, de trabalhar
mais do que o dobro de 1965.
¦
e
¦
POLITIKA
12baciadas almas
Uilherliana
Gilberto Freyre declarou que nâo participará de nenhuma comissão
da Arena para elaborar o programa do partido, porque não deseja ser, no
fim da vida (que desejamos longa), o que nunca foi: um homem de
partidos. E fez o elogio da disponibilidade intelectual.
Os amigos de Gilberto, entretanto,
acham que a razão é outra. Gilberto entende que os nossos políticos
precisam é do Mobral e não de um cientista social.
Sá eles
om nós
om %M*ral x^1 Vira
Lanusse esteve entre nós,
por três dias. Veio tentar
uma melhoria nas relações
brasi lei ro-argenti nas. Antes
dele chegaram seus assesso-res econômicos para conver-
sar com Delfim Neto e seus
assessores. Os -argentinos
querem mais vantagens, não
se contentaram com o mi-
Jhão de toneladas de trigo
que compramos a 17 dóia-
res a tonelada, quando era
oferecido no mercado inter-
nacional a 14. As promessas
que eles fizeram de levantar
os embargos alfandegários à
importação de aço brasilei-
ro, principalmente tubos de
aço sem costura, não foram
cumpridas. A sobretaxa
continua a vigorar. Os ar-
gentinos, querem agora quenós levantemos nossa sobre-
taxa às suas maçãs. Ano pas-sado importamos 25 mi-
Ihões de dólares de maçãs.
Não se sabe se conseguiram,
mas a verdade é que estão
tentando.
Este comércio Brasil-
Argentina faz lembrar aque-
le coronel do interior que
gritou num comício "só
eles
em nós. E nós não vamos
neles? "
A grande
imprensa
A visita de Nixon à China deu mar-
gem a que nossa imprensa mostrasse
do quanto é capaz. Jornais do Rio e
de SSo Paulo (com exceção do Esta-
dio) Jisseram as maiores sandices, al-
guns, inclusive, censurando aberta-
mente o tresloucado gesto do presi»
dente americano. "Mundo censura
Nixon", disse uma manchete de "O
Globo", baseada em telegrama de
Formosa. Isto nos faz lembrar man-
chete de "A voz de Guaratinguetá"
noticiando acidente de uma nave es-
pae ial russa, não tripulada: "Engenho
soviético espatijp-se contra solo lu-
nar. Ainda bem.
Definirão
No Clube dos Reporte-res Políticos, procurava-seuma definição para os
membros da ARENA. Um
jornalista, decano da crôni-ca política, entendido das
coisas de Deus e dos ho-
mens, encerrou a conversa:- "O
arenista é aquele
que teve a nobre coragemde se submeter às hierar-
quias, alienando pecamino-sas convicções pessoais".
O luso e a
III («XILAP
Antônio Inácio, português
bem sucedido no ramo dos secos
e molhados, possuindo uma ca-
deia de supermercados na Gua-
nabara, compareceu semana pas-
sada à reunião da Federação do
Comércio Varejista, para ouvir as
explicações do presidente Mo-
zart Amaral sobre a participação
da entidade na III Conferência
Nacional das Classes Produtoras- CONCLAP.
Mozart falou, falou explican-
do que não poderia dar os 30 mil
cruzeiros pedidos para o conda-
ve. Apenas seriam dados 5 mil.- Mas que pô de CONCLAP é
esta? O governo só inventa epi-
sas para f. . . a gente. É
CONCLAP, COFAP, SUNAB.
Eü não dou nada para a criação
dessa pô que só serve para atra-
palhar.Mozart Amaral teve que ex-
plicar tudo novamente.
1'elrobrás
Para os que se surpreen-
dem com a vertiginosa as-
cenção da Petrobrás, que-remos apenas lembrar o
que Inácio Rangel dizia, al-
guns anos atrás: "Vocês
precisam saber que a Pe-
trobrás não é uma empresa
de economia mista, mas
uma empresa de economia
mística". Não deu outra
coisa.
Ileaeionários
se enennlram
A Mediei o
que é dele
Nelson Rodrigues desço-
briu Oliveira Bastos jantan-do no restaurante
"O bigo-
de dç meu tio", que leva a
assinatura de seu filho Jo-
fre Rodrigues/ Ergueu os
braços, efusivo:—"Eu
pensei que você fosse de
família" e abraçaram-se.
Bastos aproveitou a dica:"Escuta,
Nelson, eu querouma entrevista tua expli-
cando por que tu és reacio-
há rio". Sem pestanejar,Nelson Rodrigues respon-
deu: "Pra
você eu dou a
entrevista; mas só pra vo-
cê, porque eu sei que você
também é reacionário".
Os dois "reacionários"
estão preparando o texto.
Aguardemos.
O pastor
generoso
0 cardeal Eugênio Sales, ilus-
tre e abençoado coleguinha se-
manai, em seu artigo no "Jornal
do Brasil", escreveu:— Quando vejo,, em certos lo-
cais e até em calçadas da cidade,
a noite se iluminar com velas,
penso na fome de tantos que se-
riam atendidos se, em vez de
queimar a oferenda com tanta
profusão, fosse seu valor encami-
nhado ao atendimento de nossos
irmãos".
Nós também, generoso pastor.Quando vemos, ali na Avenida
Chile, a catedral bilionária levan-
tar-se faraônica sobre a fome dos
que passam para o trabalho onde
vão disputar o minguado salário
mínimo pensamos em quantasfamílias não seriam desagregadas
e degradadas pela miséria se, em
vez de mais uma basílica para ali-
mentar a vaidade das pompaseclesiásticas, fosse seu valor en-
caminhado ao atendimeto dos ir-
mãos em Cristo de todos nós: do
cardeal e dos redatores de POLI-
TIKA.
Quando POLITIKA apareceu,
o jornal francês "Combat",
que
já foi de combate mesmo, regis-
trou o fato como um sintoma de
abertura do regime brasileiro.
Nós estávamos tão ocupados em
lançar o jornal que nem observa-
mos o fato.
Com cinco meses nas bancas,
somos entretanto obrigados a re-
conhecer que já houve momen-
tos, depois de 1964, em que a
edição deste jornal teria sido, se-
não impossível, extremamente
difícil. Com esta confissão que-remos fazer justiça ao presidenteMediei. O Brasil de hoje melho-
rou muito de clima. E Mediei
tem sido, em cada mudança para
melhor, a fonte primeira de ins-
Má notíeia
dá euforia
Não aceitar essa evidência é
Uma burrice que só pode atrapa-
lhar o processo. E não procla-má-la é dar provas de sectarismo
ou miopia.
Informações
memórias "Do
sindicato.-presidente Cofé Ff-me ero imprescindi-
Em suooo Catete1; o ex-àlho conto comovel o leitura diária dos jornais. Evitoumuitas loucura, apenas brando emconta o que os jornais lhe diziam."Ocorreu-me,
de uma feita, estranhar
que o Ministro da Fazenda, Prof. Eu-gênio Gudin, apusesse a sua concor-dáncia a um pedido de reintegraçãode dois fiscais do Imposto de Consu-mo, demitidos a bem do serviço pú-blico como petjmimitVH**. Haviam"achacado"
a praça do Recife, semreservas e sem temor das provas daconcussão revoltante. Gudin, homemíntegro, vexou-se com a revelação
que lhe fiz. E agradeceu-me a adver-tencia, pois na verdade fora ele envol-vido pelas informações favoráveis doprocesso em causa, e, assim, atraídopara uma decisão que os critérios dasua formação moral repudiavam. -"Presidente,
i inacreditável: todas asinformações eram favoráveis — una-nimente favoráveis*. - à pretensãodesses dois canalhas..."
O episódio revela duas coisas. A li-berdade de imprensa é um bem poli-tico, insubstituível. Terá sido esta aúnica vez em que o professorGudin -
que é uma pessoa honra-da - baseado em laudos técnicos, co-locou-se contra o interesse público?Terá recuado a tempo, nas outras ve-zes?
Uma agência de notícias na-
cional, não muito acreditada nos
meios jornalísticos, distribuiu
noticiário, piocedante de Brasi-
lia, dando conte de que o PDR
estava fadado ao insucesso. Um
procer do partido em organiza-
ção, ao ler o
de que o partido sairá". Ao ser
do porquê dessa sua
esta agência afirma
é porquevte o contrário'
ao
tango
Um dos dogmas da nova
teoria política difundidano país diz que a democra-
cia é função do desenvolvi-mento econômico. Embo-
ra haja quem pregue (nodeserto) que um dos pon-tos de estrangulamento donosso desenvolvimento po-dera ter origem justamentena falta de institucionaliza-
ção política, o certo é queas aberturas continuamfechadas aguardando me-lhores índices econômicos.
Digamos que, daqui há
dez anos, a nossa renda percapita seja de 900 dólares;
que tenhamos um telefone
para cada grupo de 15 pes-soas (e não de 65 pessoascomo agora); um quilôme-tro de estrada de ferro
para cada 66 quilômetros
quadrados do território na-
cional; menos de 15% de
analfabetos (em vtn dos
39% de agora); e um alto
padrão de vida do povo.Digamos que, daqui há 10
anos, estejamos exibindo
esses números. Estaremos
em plena democracia?
Os dados que citamossão da Argentina. Pela teo-ria exposta, ainda vamoslevar 10 anos para chegar à"democr.acia"
argentina.Já se vê que essa teoria de-ve mudar de rumo, imedia-t a me nte. Para evitar obeco. E o tango político.
POLI TI K A
IMIIJTIKA nota dez
Carmen Rodrigues Caó nunca tinha ligado para o POLITIKA. O pai, nosso compa-nheiro fcpitácio Caó, é quem lê, recorta e guarda. Mas logo que as auias reiniciaram, a
professora de português, no Colégio estadual, pediu um trabalho de casa versandosobre a visita de Nixon è China. Carmen pediu ajuda ao pai e o pai limitou-se aaconselhar que ela lesse os três últimos números de POLITIKA. Resultado: três diasdepois o trabalho de Carmen recebia nota 10 e era escolhido para leitura em voz alta,na classe.
Agora, a Carmen é leitora cativa do POLITIKA. Não aumentamos a nossa tiragem,mas diminuímos consideravelmente a média de idade de nossos leitores.
bacia
das almas
Editorial-I
"O Brasil não aceita
nem o imperialismo econô-
mico dos Estados Unidos,
nem a ditadura ideológica
do comunismo; mas pro-
cura um modelo democrá-
tico brasileiro, uma demo-
cracia suada, construída
com o nosso próprio esfor-
ço
(General Ariel Pacca,
comandante da IV Região
Militar).
Delfins
à mesa
Contam as colunas sociais que"em
seu bonito apartamento da
Av. Atlântica, o sr. e a sra. José
Pedroso receberam para um jan-
tar balck-tie, com as jnesas ten-
do como centro orquídeas bran-
cas e delfins azuis".
0 empresariado brasileiro está
ficando mesmo refinado. Já quenão pode sentar-se à mesa do mi-
nistro Delfim Neto para jantarinteresses, contenta-se
jantandoem mesas decoradas com delfins.
Moral da história: quem não
tem ministro, caça com flores.
Jornal
da família
Exatamente às 15,30 de
segunda-feira passada, o sr.
Raimundo de Azeredo
Santos, pai do Teófilo de
Azeredo Santos, passava
tranqüilamente na Avenida
Rio Branco lendo POLI TI-
KA. Fernando Aguinaga
comentou: — "ê
o jornal
da família".
Editorial-2
Nossa democracia há
de ser responsável, com li-
perdade, integração e par-
Jtcipação de todos os brasi-
•eiros. 0 País não aceita a
reeleição do presidente da
Hepública, dos
governado-res
ou dos prefeitos, por-
9ue isso, sem uma estrutu-
? democrática
consolida-aa' significa
ditadura".
(General Ariel Pacca, co-
mandante da IV Região
Os consumidos
Estão pichando o show de
Caetano e Gil, no Municipal di-
zendo que os preços dos ingres-
sos foram muito altos. Não vejo
razão para a queimação, mesmo
porque a lotação foi esgotada al-
guns dias antes do espetáculo.
Depois, o negócio é o seguinte:
nenhum dos dois jamais foi enga-
jado, muito menos pretendeu
ser; ambos são integrantes efeti-
vos da sociedade de consumo,
sendo consumidos por ela, o que
lhes trás um grande lucro, em
termos capitalistas; qualquer
objeto — figurativamente, ami-
gos, figurativamente! - nesta so-
ciedade tem seu preço, que varia,
proporcionalmente, em razão da
procura.
Ora, tal engajamento, que
pretenderam criar, existiu, ape-
nas, até certo período, do que se
utilizou a máquina para transfor-
mar a imagem de contestadores
numa imagem de participantes, o
que jamais ocorreu, em verdade.
Logo, Caetano e Gil estão cer-
tíssimos em cobrar ingressos,
considerados caros, mesmo por-
que eles não pretenderam fazer
um concerto popular, embora o
denominassem assim, pois se tal
quisessem, teriam procurado o
Maracanãzinho ou uma praça pú-
blica e nunca o Teatro Munici-
pai.
O que é óbvio.
Mosca branca
"O governador
Ernani Sátiro,
da Paraíba, vai doar um busto de
Camões para o Jardim dos Poe-
tas da Academia Brasileira de Le-
tras".
A notícia dos jornais diz ape-
nas isto. Falta esclarecer se Ca-
mões é paraibano ou se a Paraíba
está tão rica que pode dar-se ao
luxo de andar busteando jardins
acadêmicos.
O rosto, está na cara: nos jar-
dins do tesouro paraibano já bro-
tou a candidatura do romancista
Ernani Sátiro à Academia Ah,
esta nossa cultura chapa branca!
Cristo
espetacular
'—
| |
i
O drama da paixão de
Cristo, encenado no inte-
rior de Pernambuco (Fa-
zenda Nova), está se atas-
tando cada vez mais da
paixão e se aproximando,
como diria o falecido Sér-
gio Porto, do perigoso ter-
reno da galhofa. Como
atores convidados, partici-
parão do espetáculo, este
ano, Denner, Carlos Impe-
rial, Toni Tornado, Aríete
Salles, Erasmo Carlos, etc.,
etc. Com este acompanha-
mento, Cristo teria morri-
do de rir, antes de chegar à
cruz. No rumo em que vai,
ninguém se espantará se o
"drama da paixão", de
Pernambuco, incluir, nos
próximos espetáculos, qua-
dros com o desfile de fan-
tasias do Municipal e a ba-
teria da Mocidade Inde-
pendente. Isto, se não con-
vocarem, antes, a Banda de
Ipanema.
A diferença
O senador José Sarney levantou
uma tese interessante. A de que ne-
nhum país permite que o seu redime
político seja contestado. A tese e ver-
dadeira. Só um regime suicida permi-
tiria que forças políticas internas pie-
gassem, abertamente, a sua
queda.
Em se tratando de regimes políticos,
ao lado de cá ou de lá da cortina,
toda contestação será sempre subver-
siva. Concordamos.
O problema que se coloca, para
nós, não é este. Toda atividade sub-
versiva deve ser reprimida. Acontece
Jue
alguns países não consideram o
ebate de idéias e de opções políticas
um crime de subversão. A diferença
entre uma democracia e uma ditadura
não é tão sutil quanto se pensa, lima
democracia não pode permitir que
seu regime seja contestado. Mas uma
didatura não permite sequer que as
posições conquistadas dentro do regi-
mé sejam discutidas, t por isso que as
ditaduras se transformam, mais cedo
ou mais tarde, no paraíso das oligai-
quias.
Bradeseo
violento
O Sindicato dos Bancários da
Guanabara não brinca em servi-
ço. Edita um jornalzinho
"Ban-
cário" que fala grosso, em defesa
da classe. E como é bem escrito!
Do último número, comentando
estranho episódio ocorrido no
Bradeseo, diz o "Bancário":
"Não paira a menor dúvida de'
que hoje os Argos estão em pie-
na decadência: a inteligência que
elucida fez forfait, e a verdade
dos fatos é apurada na base do
safanão e do confessa! Isto vem
a propósito de um companheiro
deste Banco (Bradeseo), que se-
guiu algemado da filial da Pri-
meiro de Março até a agência
Vise. de Inhaúma, por mera sus-
peita de ter participado de um
desfalque de Cr$ 500.000,00,
ocorrido naquela filial. Protes-
tamos contra esta violação dos
direitos humanos, inconcebível
num país que se diz em pleno
desenvolvimento, mas que nesses
momentos bem pode ser compa-
rado a uma senzala. O compa-
nheiro que sofreu o vexame já
está trabalhando, tão sem funda-
mento foi a suspeita com que o
olharam. Todavia, banqueiros
transgridem no duro decisões na
Justiça sem serem incomodados.
Nunca levaram porrada, como
diria Fernando Pessoa".
Coineideneia
Em Mariana, Minas, os
comerciantes criaram "O
Dia dos Devedores": 1o.
de abril.
Mas logo primeiro de
Abril?
Um gênio
Esse Delfim é um gênio. Du-
rante a sua viagem, que abran-
geu inúmeros países, toda vez
que ele se encontrava com um
funcionário do Itamarati per-
guntava sobre o custo de vida,
no local. E ouvia, comoespe-
rava, terríveis lamentações. É
que a queda do dólar (diplo-
mata, é claro, recebe em dóla-
res) afetou profundamente o
orçamento do pessoal da"carrière".
Em Tóquio, por
exemplo, um primeiro secre-
tário está tendo dificuldades
para pagar um apartamento
de sala, dois quartos. Pois a
todos, o Delfim prometia que
tão logo chegasse ao Brasil
iria estudar o problema e re-
colocar a renda do pessoal no
mesmo nível em que estava
antes da queda do dólar. Uma
espécie de Piano Marshall pa-
ra o Itamarati . A notícia já se
espalhou por todos os conti-
nentes, mercê das facilidades
diplomáticas de comunicação.
Mas, ao que se diz, não che-
gou ainda aos ouvidos do mi-
nistro Mário Gibson.
Excesso e
escassez
O doutor Eugene Scheimann,
especialista em sexologia, disse à
revista "Fórum"
(Estados Uni-
dos) que "o
melhor tratamento
contra os ataques cardiácos e
contra a tensão nervosa é o ato
sexual". E mais:
a) "Muitos dos ataques car-
diácos que milhões de homens
sofreram nestes últimos anos te-
riam podido ser evitados por um
procedimento tão barato quanto
agradável: mais sexo".
b) "0 coito ativa o funciona-
mento da glândula tiróide, con-
some colestérol e calorias, asse-
gura a disponibilidade de cada
músculo e fortalece o coração ao
fazê-lo bombear maior quantida-
de de sangue durante um curto
período e assegurando-lhe depois
o devido repouso. Uma noite de
grande atividade sexual é o me-
lhor tranqüilizante".
E a gente ficava pensando que
os políticos brasileiros morriam
do coração por excesso de traba-
lho, quando é exatamente por
falta.
Boletim
Gaspar Regueira Costa,
secretário de finanças da
Prefeitura do Recife, já
não engana ninguém a res-
peito da situação do erário
municipal. Quando a recei-
ta melhora, ele fica horas
mordendo o dedo polegar.
Quando o dinheiro é ne-
nhum e os fornecedores
apertam, ele morde furio-
samente a caixa de fósfo-
ros. Diz um cronista social
do "Diário
de Pernam-
buco" que o prefeito Au-
gusto Lucena, toda as ma-
nhãs, telefona para seu se-
cretário e pergunta:
"Co-
mo é, você hoje está mor-
dendo o dedo ou a caixa
de fósforo"? Se o secretá-
rio de finanças morde o
dedo, o prefeito sai de ter-
no claro e circula a pé pelo
centro da cidade; se o se-
cretário morde a caixa de
fósforo, o prefeito veste
um terno escuro, e se es-
conde no seu gabinete.
Eis uma dupla sutil co-
mo uma Fenemê.
¦¦
I promoção/
O Brasil saiu da posição de
perplexidade e agora comanda
a fixação da imagem que mais
lhe convém, no exterior. Lá.
Imagem quer dizer Cadastro.
Santana
Junior
*',
A GUERRILHA
BOA IMAGEMDA_á I
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WêflF
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Para um país que se desenvolve,
imagem é cadastro. Por isso as
autoridades financeiras foram
as primeiras a alertar o
governo para o desprestígio
(e o prejuízo) que as notícias
divulgadas no exterior sobre
o nosso regime estavam
acarretando. O governo, como é
sabido, teve uma reação inicial
inadequada: sob o pretexto de
que essas notícias eram
espalhadas por políticos
cassados, interessados em
deformar a imagem do regime,
procurou localizar,
aqui dentro, supostos cúmplices
dessa manobra. Talvez tenha
encontrado.
O certo ô que espalhadas por
inimigos do regime ou não, as
notícias e os comentários da
imprensa européia e americana
estavam prejudicando o país,
mesmo no plano das relações
puramente comerciais. Como o
mais aceso da campanha
coincidiu com a expulsão de
prisioneiros políticos trocados
por diplomatas seqüestrados,
não é de admirar que esses
prisioneiros, chegando ao
exterior, tenham contado coisas
verdadeiras e coisas falsas
a respeito do tratamento
recebido em nossas prisões.
As próprias notícias de
conflitos entre índios e colonos
repercutia, na Europa e nos
Estados Unidos, como um atestado
da "desumanidade do regime".
Aos poucos o governo foi
compreendendo que era preciso
agir com mais inteligência,
cuidando de "exportar" uma
imagem melhor do país e do
regime. Publicações européias e
americanas (sobretudo francesas,
inglesas) começaram a programar"suplementos"
sobre a nossa
realidade econômica e como
eram, evidentemente, pagos por
nós, a dourar essa realidade.
Foi assim que surgiu, lá fora,
o "milagre
brasileiro".
Um outro dado importante dessa
reversão de espectativas foi o
convite formulado (e aceito) a
cientistas sociais e jornalistas
para que viessem
testemunhar o tratamento
dispensado aos índios. Hoje,
ninguém fala mais em massacre
de índios e a simples informação
de que o ator Marion Brando
pretende liderar uma campanha
para impedir que os nossos
silvícolas sejam impiedosamente
assassinados foi recebida, pelo
governo, com um riso irônico.
E praticamente desapareceram as
denúncias de torturas em presos
políticos. A imagem do país,
portanto, melhorou, lá fora.
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Vitorino FreireEdmundo de Macedo Soares, Haroldo Costa, Luiz Fernando Freire e Vilar de Queirós
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•<
POLITIKA
A GUERRILHA
DA BOA IMAGEM
A Editora Crown está dando de
graça, no exter ior, o retratomais
atualizado das oportunidades
de se ganhar dinheiro, aqui.
15promoção
/
Suplementos especiais custam caro e inserem
desconfiança no interior da mensagem dirigida0 QUE FAZER
A imagem de um país e de um
regime não pode, evidentemente,
ser mantida por suplementos"especiais".
Isto custa muito caro
e, no fim das contas, insere sempre
um elemento de desconfiança no
interior da mensagem programada.A partir de determinado
momento é necessário que a nossa
boa imagem seja projetada apenas
pelo clima de distensão política(que é evidente) e pela
performance de nossa economia.
Mesmo assim, é indispensável queo comportamento da economiachegue ao exterior por canaisadequados, que inspirem confiançae não por editais ou matéria pagaoficial.
Uma editora, no Brasil, pareceter achado o caminho para ajudaro governo a manter em bom nívela imagem do país, lá fora. Trata-seda Crown — EditoresInternacionais. Apesar do nome, éuma firma só de brasileiros,liderada por Haroldo Costa, LuizFernando Freire e HenriqueBrando (com um ConselhoConsultivo composto por VitorinoFreire, Heitor Lopes de Sousa,Herculano Borges da Fonseca eCarlos Alfredo Bemardes)especializada, em vender, noexterior, a boa imagem do Brasil eem atrair, para o nosso país, novosinvestimentos. 0 fato de ser umafirma comercial, com finslucrativos, não a impede derealizar, implicitamente, umtrabalho cujo significadoconsideramos eminentementepolítico. Vejamos como.
**0 PLANO EDITORIAL
A Crown é uma editora docontexto. Ou, se preferirem, umaeditora a serviço do grandecapitalismo, no Brasil. NãoProcurem no seu plano editorialuma obra de cultura humanista,"teraria
por exemplo. Aliás, nãoProcurem os livros da Crown em"vrana nenhuma. Eu mesmo mePergunto se a CROWN edita livros.
^ formato diz que sim. Eles
mesmos dizem que são livros. Osautores dizem que são livros. Mas,
^ra mim a Crown é uma•ransportadora
de mensagens. Ela™w uma linha de montagem demalas diretas. E o novo
capitalismo brasileiro está usandoessas malas diretas.
Como? Vejam como. A Crownapanha uma grande autoridadeintelectual e lhe encomenda umtrabalho de profundidade (umesgotar de assunto) sobredeterminado aspecto da vidaeconômica ou financeira do país.Paga-lhe regiamente. A seguir,
procura os empresáriosinteressados na atividade que otrabalho aborda e lhes oferece umescaninho da mala direta.Ninguém, obviamente, viaja de
graça. Mas, em compensação,ninguém faz essa viageminutilmente. É, na verdade, umaviagem de negócios. O dinheiro
pago pelos empresários é quefinancia o livro (a mala direta) e
garante uma ampla distribuição
gratuita, sobretudo no exterior, deseus exemplares. Para ser maisobjetivo: 10 mil exemplares sãodistribuídos de graça àsembaixadas e consulados, aosescritórios e representações doBrasil, no exterior, aos grandescapitães da indústria estrangeira,
aos organismos internacionais de
crédito, aos escritórios de
planejamento, aos principaistécnicos em investimentos, aos
grandes jornalistas econômicos, e
assim por diante. Os livros,
impressos em off set, contêm de
500 a 800 páginas e são
simplesmente luxuosos. Do
formato à impressão e paginação,esses livros já constituem uma
propaganda do nível a que chegou
a indústria gráfica em nosso
país- Embora não seja disso queos |jVros tratam.
OS LIVROS
O primeiro desses livros, editado
em 1971, foi o de Herculano
Borges da Fonseca: "AS
INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS
DO BRASIL". Um perfil dos
organismos governamentais ou
particulares que comandam as
finanças no Brasil. Como chegar
até eles, a destinação de cada um,
sua legislação, sua regulamentação,
seu funcionamento. E um amplo
painel histórico das nossas
instituições financeiras. Para dar
maior autenticidade à mensagem,
veio com prefácio de Emane
Galveas, presidente do Banco
Central. O livro, não é preciso
dizer, tornou-se presençaobrigatória em todos os grandesescritórios de negócios do mundo.
Agora, a Crown acaba de lançar,com o mesmo luxo, com a mesmaespetaculosidade (coquetel para500 personalidades, no lateClube), o livro do GeneralEdmundo Macedo Soares:"INSTITUIÇÕES
DE INDÚSTRIAE COMÉRCIO DO BRASIL". Umtrabalho de oito meses de
pesquisas. Uma história e umlevantamento completos não só do
que já temos, em matéria deindústria e comércio, como e
principalmente, do que poderemoster. Um catálago de oportunidades.A visão de uma nova terra da
promissão
' para o capitalismo
internacional. E dando as garantiasdo governo, um prefácio doministro da Indústria e Comércio,Marcos Pratini de Moraes.
O RECADO DE VILAR
No momento a Crown preparaum novo volume. Sobre comércioexterior. A chave do milagrebrasileiro. Em 1964, um grupo detrabalho do Ministério doPlanejamento, chefiado porBenedito Moreira (hoje dirigindo aCacex), apurou que o Brasilcomandava o seu comércioexterior fazendo uso de 200 leisconflitivas sobre a matéria. Trintaórgãos federais carimbavam papéise cobravam emolumentos paraliberar exportações. Na verdade,era proibido exportar. As duzentasleis foram reduzidas a uma só e sóum órgão libera, hoje, asexportações. Com a taxa decâmbio flexível e com asimplificação burocrática, o Brasil
uiuoyuiu UMI CÁ L íaUl ÜII IOI IU
sucesso em matéria deexportações. Mas ainda considera
pouco. Novos mercados e novasmercadorias estão em exame.Novas facilidades. Novas garantias.Quem receber o livro da Crownterá uma visão completa do que é
preciso fazer para exportar e para
importar. E não terá nenhumadúvida sobre o caráter oficial dotexto quando descobrir que o livroterá sido escrito pelo ministroVilar de Queirós e prefaciado peloministro Delfim Neto.
AS LÍNGUAS
Era pensamento da CROWNcontinuar editando os seus livrosem Português e Inglês. Quando o
ministro da Fazenda soube disso,
deu um conselho: "Incluam
também o texto em francês". Seria
uma despesa a mais. Delfim tinha
um objetivo, logo explicado porum de seus assessores:
"É que o
ministro precisa que o livro de
vocês seja lido pelo Mercado
Comum Europeu". É por isso queos livros (as malas diretas) da
Crown são trilingües. Como o
capitalismo internacional.
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POLITIKA
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POLITIKA
Sebastião
Nery
17Erasmo, o pastor, na caçada ao bode preto.
Quando a Câmara Fede-
ral reabriu, em março de
1970, senadores e depu-
tados foram ao Alvorada
para uma visita de cortesia
ao presidente Mediei. Cha-
gas Freitas, então depu-
tado, foi apresentado pela
primeira vez ao Presidente,
que lhe disse:
Deputado, preciso
conversar com o senhor.
Depois o chamarei.
Chagas ficou pálido co-
mo uma vela de óculos.
Puxou pelo braço o depu-
tado Rubem Medina (MDB
da Guanabara) e um depu-
tado da ARENA de São
Paulo, que tinham ouvido
a conversa, e lhes pergun-
tou, todo perturbado:
-Vocês imaginam o queseja?
A sucessão carioca,
evidentemente - disse Me-
dina.
Mas o deputado paulistaresolveu fazer uma brinca-
deira com Chagas:
Não é nada disso e euestou bem informado. Suasituação não está boa. Não
quer dizer que você vai sercassado. A ARENA do Rio
já foi avisada de que em hi-
pótese alguma o governa-dor será você. Problemasde organização do direto-rio, excessivo controle do
partido. O presidente não
quer uma solução tipo PSP
para a Guanabara.
Chagas saiu do Alvoradaem pânico. No dia seguin-te, voltou para o Rio echamou seu staff para umareunião em casa: ErasmoMartins Pedro, WaldomiroTeixeira, Rossini Lopes,presidente da Assembléiada Guanabara, e outros.Contou a história e suspi-rou, olhando para o teto,Por cima do aro dos ócu-los:
-Preciso tomar provi-
oência urgente. Já tinhamme avisado que, se eu não
GUANABARA¦«¦** a^->^. - ¦/^^NJMkpjfe*.
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" om ''*¦
- Ú«BV ^a T"m
Chagas, da magia negra ao Palácio Guanabara.
fizer trabalhos seguros, o
azar superará as possibili-dades. Só uma força supe-
rior para enfrentar os "ser-
viços" que estão fazendo
contra mim.
Erasmo, evangélico, sor-riu mole e não disse nada.
Rossini resolveu o pro-blema:
Sou "cambono"
(acólito, coroinha, ajudan-
te de sessões de Umbanda)
de "Seu
7 da Lira". Dona
Cacilda sabe de tudo e tem
força para desmanchar
qualquer situação ruim.
Saíram, Chagas entrou
no Gálaxie no. 2 da As-
sembléia Legislativa (chapa
oficial azul e branco, do
presidente Rossini) e toca-
ram para o terreiro de"Seu
7", em Santíssimo. A
cuiuiüvd tinha.oito carros,
os demais particulares.
Chegaram exatamente à
meia noite e trinta, no
meio da sessão. Chagas fi-
cou no carro, Rossini en-
trou sozinho, falou com
Dona Cacilda. Ela inter-
rompeu a sessão, recebeu
Chagas reservadamente,
para ele não ser visto pela
gente toda que estava lá."Seu
7" fez uma cara de
horror:»
A situação é negra.
Há muita gente convocan-
do espíritos maus contra o
senhor. Preciso fazer, e fa-
zer logo, um trabalho pesa-do com 3 bodes pretos.Cabra nem carneiro não
servem. Só bode.
Onde encontrar, naque-
Ia hora, 3 bodes pretos?
Os 9 carros saíram em di-
reção a Campo Grande. Pa-
raram à beira da estrada,
cabra tinha muita, mas bo-
de nenhum. Chagas ficou
com Erasmo dentro do Ga-
laxie oficial e Rossini saiu
comandando o pelotão dos
caçadores de bode preto,todos agachados dentro do
mato. De repente, dentro
da noite, vinda lá do mata-
gal, ouviu-se a voz de co-
mando de Rossini, gritan-do como um possesso:
- Vamos berrar que eles
aparecem! Todo mundo
berrando!
E começaram
berrar:
todos a
— B é é é é, Bé é é é, bé
ééé.
Pelo berro ou pela sorte,
às 4 da manhã três bodes
pretos tinham sido captu-
rados entre Santíssimo e
Campo Grande. Chagas,
aflito, suava como um cão
de caça. E Erasmo, todo
encabulado, pensava certa-
mente na palavra de Deus,
sagrada na Bíblia, quedes-
de o Antigo Testamento
proibiu adorar bodes e be-
zerros, mesmo quando de
ouro.
Voltaram. "Seu
7"
abriu os três bodes a facão,
pegou as vísceras e passou,
ensagüentadas, no corpo
inteiro de Chagas, da cabe-
ça aos pés. A roupa branca
de Chagas parecia véu de
verônica. Foi um banho de
sangue.
Um ano depois, Chagas
tomava posse no governo
da Guanabara. Nunca mais
sobrou um bode entre San-
tíssimo e Campo Grande.
O embaixador Vianna
Moog, fiecionista de mão
cheia, conversava há pouco
com Negrão de Lima:
Governador, o senhor
precisa ficar atento. Em 73
vamos ter eleições presi-
denciais e pode convir ao
País a solução civil. Não
esqueça que o senhor tem
uma estrela de primeira
grandeza.
Eu sei, embaixador,
que tenho tido uma grandeestrela. Só que a minha é
uma só e preciso quatro.
O presidente Castelo
Branco ia passando, de ma-
nhã bem cedo, pelo Túnel
Novo, com Luís Viana Fi-
Iho. De repente, um cami-
folklore
polítiko
nhão que vinha em frente
se desgoverna, passa para o
outro lado da pista, amea-
ça o carro do Presidente e
se arrebenta na parede do
túnel.
O susto foi terrível. Cas-telo, depois de elogiar a
perícia de seu motorista,
que os havia salvo com es-
petacular golpe de direção,
perguntou a Luís Viana:
Em que o senhor pen-
sou?No Alkmim.
Que não poderia assu-
mir. Fechou a cara e cor-
tou o papo.
O vereador índio do
Brasil era um desastrado
verbal. Quis que a antiga
Prefeitura do Distrito Fe-
deral comprasse um casal
de gôndolas para encher a
Lagoa Rodrigo de Freitas
de dezenas de gondolinhas.
Mas isso não foi nada.
Estava inflamado na tribu-
na, quando alguém o des-
mentiu. Ficou indignado:
Se não estou falando
a verdade, quero que a
cópula desta casa caia so-
bre a minha cabeça.
E no Dia da Enfermeira,
com as galerias superlota-
das de cândidas meninas
de avental branco:
As enfermeiras, essas
espetaculares abnegadas,
que fazem maravilhas em-
baixo dos lençóis...
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Seu 7 da Lira, o fazedor de governadores místicos.
POLITIKA
18religião
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Não se nega a necessidade de
o homem viver ritos e sinais
para a realidade inatingível.
Mas, quando o sinal nada é a
não ser sinal, fica alienante.
PauloMartinechenNeto
I RUMOS
*¦•
1111 IÉMéL^: '
tJSfàDA
WmNO
IGREJA
BRASIL•-..Vv';"..
Evidentemente, movimentos como
os Cursilhos, inovações
litúrgicas, adaptações externas
ao mundo moderno (principalmente
a figura externa do padre
com batina identificado na
mentalidade popular com a
Igreja), grupos de jovens e
decadência das antigas
associações e irmandades
religiosas são elementos
bastante secundários na
renovação da Igreja.
A insistência destes movimentos
como dados de uma Igreja Nova
está a demonstrar a distância
muito grande de uma verdadeira
encarnação no mundo e
superficial idade de reflexão
sobre a verdadeira missão que
lhe cabe no momento brasileiro.
O fato de padres e militantes
leigos entusiasmarem-se com
meios e métodos de mentalização
e prenderem-se a movimentos
estáticos, fechados em si, diz
bem alto ser pequena a reflexão
sobre a realidade e
fundamentação teológica
de sua ação.
Uma radiografia rápida da ação
da Igreja em alguns setores
dentro de grande euforia,
em outros sob grande angústia,
dará uma visão da importância
que teria a Igreja ao presente
brasileiro e mostrará
descaminhos empreendidos com
heroísmo e sinceridade. Talvez
novas perspectivas possam surgir.
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1
POLITIKA
RUMOS
VA IGREJA
NO BRASIL
A defasagem que existe entrea reflexão teológica e a ação
pastoral demonstra que poucassão as possibilidades de umaigreja atuante e orientadora.
19religião
Não existe abertura para o mundo: o homem é
pisado e nõo possui condições de vida dignaUM RETRATO
Tome-se uma paróquia importan-
te e renovada do Grande Rio. Po-
dia-se analisar qualquer uma de
qualquer parte do Brasil e as con-
clusões não divergiriam, a não ser
em número.Cinco
ou seis padres jovens, en-
tusiastas, trabalhando 15 horas por
dia;Dezenas
de militantes leigos in-
sendos ativamente na ação eclesial;Igreja moderna, funcional, com
sistema de som perfeito, reunindo
semanalmente milhares de fiéis.
Onde são absorvidas essas forças
e horas de trabalho? Que objetivos
possuem?*Ação
ritual:missas
batismos
casamentos
confissões*Ação
evangelizadora:cursos de batismocursos de noivos
-cursilhos
grupos de jovense outros encontros e cursos
*Ação social:
ambulatórios
distribuição de alimentos.
Analisando esses dados, sentimosestar tudo centralizado na execuçãode ritos, pois os cursos realizadosvisam levar as pessoas a vivenciaremos ritos. Deseja-se levar todos paradentro do edifício-igreja para amissa, para a comunhão, para umaliturgia bonita com cânticos e parti-cipação de todos nesta festa sacrade cunho mágico. Junto com o ritoinsiste-se numa vivência pessoal boadentro de uma moral estática, per-sonalista.
Não existe abertura para o mun-^o, para a piobiemática aiuai em
que o homem, mesmo o que estáali rezando, é pisado e não possuicondições de vida em toda sua dig-nidade. Quanto muito abre-se paraum assistencialismo supletório einsignificante.
Ninguém nega a necessidade de onomem viver ritos e sinais para umarealidade inatingível, sensivelmen-
Je. Porém,
quando o sinal é realiza-ao pelo sinal, torna-se alienante.
A INSERÇÃO NO MUN-ONDE
DO?
Texto conciliar (Gaudim etSpes, no. 30):
"A transforma-
ção profunda e rápida das coi-
sas pede com mais urgência
que ninguém, desatento ao
curso dos acontecimentos ou
entorpecido pela inércia, se
contente com uma ética pura-mente individualista. Cum-
prem-se cada vez melhor os de-
veres de justiça e caridade, se
cada um, contribuindo para o
bem comum segundo suas ca-
pae idades e as necessidades
dos outros promover e ajudar
também as instituições públi-cas e particulares que estão a
serviço de um aprimoramento
das condições de vida dos ho-
mens. Alguns há que, procla-mando opiniões largas e «gene-
rosas, na prática vivem sempre
sem cuidado algum com as ne-
cessidades da sociedade."
Diante deste texto, outros e re-
flexões teológicas de Metz,
Moltmann sobre uma teologia poli-tica e diante de uma pastoral exces-
sivamente ritualista que anotamos
acima, nos perguntamos:*Onde
a preocupação real e con-
creta da Igreja pelos problemas de
justiça social, exigência de um cris-
tianismo autêntico?Onde
a ação da igreja frente a
uma distribuição de renda per capi-
ta com extremos impressionante-
mente distantes?*Onde
sentimos não um assisten-
ciai ismo exterior e superficial, mas
na verdadeira promoção humana?Onde
uma igreja inserida no
mundo com a autenticidade da
mensagem de Cristo?
Por outro lado, um grupo bem
pequeno vivendo angustiado, sem
possuir soluções a propor, e angus-
tiado por sentir ser pequeno o nú-
mero a procurar por elas e perden-
do se em questiúncu!3s superficiais.
São alguns centros de catequese, ai-
gum bispo, padre, leigos.
Todos viram o documento do
bispo de São Félix, Mato Grosso,
Dom Pedro Casaldáliga:
UMA IGREJA DA AMAZÔNIA
EM CONFLITO COM O LATIFÚN-
DIO E A MARGINALIZAÇÃO SO-
CIAL! . m
Quem se interessou por ele.
Quem o assumiu?
Comprovando esse retrato que
apresentamos está o relatório da
Rand Corporation para o Departa-
mento de Estado norte-americano
(JB 4/3/72, pág. 9) que diz:
/ '_ ___B___flB_K-• w4| fllj.
_____ ^S^abU HPV^* * ''
"V*: "^ ____________fl
___________] _w_i -t-^A
Tristão de Atayde.
É a horaila revisão
na Igreja"A
maioria dos dirigentes ca-
tólicos considera cada vez mais
fatual que o papel básico da
Igreja é tentar orientar os valo-
res da nova sociedade, ao invés
de dirigir o proressn de mu-
dança social e política.,..
Dentro desse contexto, deve-se
dar ênfase à atividade pastoral.
A ação da Igreja se concentra-
rá na criação de consciência
social, política e econômica,
compatível com a doutrina
cristã. 0 simples fato de que a
Igreja é uma instituição reli-
giosa debilita o potencial de
efetividade política dos religio-
sos radicais. Debates sobre a
organização interna da Igreja e
os problemas da liturgia absor-
vem energias que poderiam ser
dedicadas à ação política dire-
ta. O debate interno também
debilita a já incerta unidade de
organização. As relações com
o Estado, particularmente
quando estão envolvidos as-
pectos de financiamentos e
apoio estatal para instituições
eclesiásticas, constituem uma
limitação prática da autono-
mia dos dirigentes eclesiásti-
cos. Essa limitação é mais
importante que a tradição do
patronato e mais complicada
de que se pode mencionar na
maioria dos conceitos de sepa-
ração Igreja-Estado. Econô- ****.
mica e culturalmente e, por-
tanto, politicamente, os inte-
resses da Igreja e do Estado
são intrinsecamente relaciona-
dos, embora possam separar-se
situações específicas . . .
PERSPECTIVAS
Há alguns anos Tristão de Atay-
de, no Jornal do Brasil, dizia que
três obras eram fundamentais para a
Igreja no Brasil:
O Desafio da Secularização, de
Michel Schooyans;
O Cristo do Povo, de Márcio Mo-
reira Alves;
Memento dos Vivos, de Cândido
Mendes.
Na verdade, a reflexão feita nes-
tas obras, a análise e ações propôs-tas precisam ser revistas para a hora
atual; no entanto, possuem uma li-
nha de abertura que serviria muito
bem para uma análise e mesmo exa-
me de consciência.
Além dessas obras muito mais
fundamentais são as reflexões teoló-
gicas vindas do exterior e as criadas
aqui dentro do país por teólogos
novos e de visão ampla.
Porém a defasagem existente
entre a reflexão teológica e a ação
pastoral, essa última constituindo a
imagem da Igreja perante o mundo,
demonstra pequenas possibilidades
de uma Igreja atuante e inserida no
mundo. Por isso a insistência na
crítica ao Cursilho, a inovações li-
túrgicas de ordem superficial, a gru-
pos de jovens. São movimentos que
a fecham em si mesma dando-lhe
características de ghetto. ^E nunca foi, nunca poderá ser
essa a missão da Igreja.
¦ Zweig ficou quase
sufocado I
pelo cheiro e
pela cor das
frutas tropicais, no mercado iu|urilo
eu vi d°
Recife, onde confessou o
Marroqu|m
^ temor pelo futuro do mundo.
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| peregrinapao por
I igrejas, do portico e
I antigo e
I tem
I dado tantas aos
I pintores
I a caminhada no Mercado, onde o
I escritor se considerou quase
;' >, mmm I sufocado pelo cheiro e pela cor
I des frutas tropicais.
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I ^we'9 deu-me uma esplendida
'
¦^fc-W'^^E I
entrevista sobre o Recife e a
marcha dos negbcios politicos
I mundiais. ("Temo por tudo o que
I estd para vir" —
observou-me a
I respeito da Europa) e prometeu
I vo'tar 80 Brasil, com
' '^A I
vagar.
real mente, e para sempre.
'**%£*+„. J&
I Esta reportagem, com as suas cartas,
^ recordar
I da associacao do
I brasileira, urn
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6poca europftia que
¦¦lHHBS^MHHHHHHHHHHIHHHIIIHHHHHHIHIHIHHB[[HMiMP'$Mp| desaparecendo. Visa, ainda, a mostrar
Stefan Zweig e a mulher mortos na cama.l que o seu livro encantador sobre o
I Brasil —
encantador pela simpatia
I que ele derramou em todas as
I pftginas, encantador pela honestidade
B i^Hl COm que 0 ^®Z' enCantador aP®sar
H ^k B H I da tantos
flBJH B| V H I naquela explosao de
^1 MMbvI K Wl I amor apenaserros cronologicossem
H K Hflm Jp ^HV
I importfincia - visa a demonstrar,
I enfim, que Zweig nao procurara
I lucro f£cil com o seu "Brasil,
m mm I pais do futuro". Mas pos nele
I precisamente aquilo que externava em
mm m I cartas intimas sobre o mundo
SIVI ^k m^m I que o distraiu alguns meses de suas
K mam I inauietacoes mdrbidas, mas aue nao
™ ~
I pode salv£-lo da trag6dia final.
I Sou be que, em Londres, viviam
JB J|B m^pT I
parentes de Stefen Zweig e, de fato,
^pH I em uma rua
AH aUp' - Uj^m #¦ I de Hampstead, descobri o dr.Manfred
I Altemann, cunhado do escritor. Em
V I m 4f^B ¦ ^ni^H I seu poder e no de sua esposa
I encontrej as cartas fntimas que
I ambos cederam com primazia de
I publicapao, para todo mundo.
I Esses cartas a outras referentes a
# . - ... I assuntos generalizados, datadas de
"Assim,
julgo melhor terminar fntimos e fncinantes, para pela primeira vez, e veio a se I
y^jas partes do mundo, comporao
tempo uma vida que dediquei explicer os 6ltimos anos de sue torner depots um apaixonado dela,
futuramente um volume especial da
exdusivamenH ao trabalho vida e tamMm os motivos que o das coisas e dos homens, com um corresponddncia do escritor. 0 dr.
espiritual, comtderando empurraram inapelavelmente para a amor tao especial e tao doce Altemann 6 irmao da segunda
liberdade Humana e a minha pr6pria morte. Recordo-me com muita e romantico que era quase esposa de Zweig, que o acompanhou
como o maipr bem da terra. Deixo um exetideo de Zweig. Iniciava infantil. 0 escritor judeu na sua trag6dia de Petr6polis.
adeus afetuoso a todos os meus jomalismo no Recife, com seguia para aquele rumoroso Estas cartas de Zweig no seu
amigosT^r funpaodeentrevistar todas Congrassodos PenClubede ^a^nasuapJngente
Esta 6 o treeho final do as personelidades que chegavam Buenos Aires, em 1935, onde melancolia, explicam o seu gesto
testamento 4e Stefan Zweig, que em ao Brasil, principelmente por sinal empenhou-se em fatal
- i seguida matOu-se, juntamente com da Europa. Recife era o primeiro violenta altercapao com
sua mulher, em Ptetr6polis. porto de escala a oferecia Marinetti a outros valentes
As cartas que traduzo explica sugestoes especiais para um campefies do fascismo
morte de Stefan Zweig. Sao primeiro contato com a vida internacional. Zweig desceu a
cartas que ele escreveu do brasileira. terra comigo e outro repdrter, ^
r> i Brasil para Londres. Documentos Zweig desceu em terra do Brasil, e iniciamos uma larga r
Zweig ficou quase
sufocado
pelo cheiro e
pela cor das
frutas tropicais, no mercado
do Recife, onde confessou o
temor pelo futuro do mundo.
Murilo
Marroquim
| peregrinação por velhas
I igrejas, atravá do poético e
I antigo bairro de São José, e
I até chegamos
I à beira do Capibaribe, tem
1 dado tantas sugestões aos
I pintores do Recife. E
I a caminhada no Mercado, onde o
I escritor se considerou quase
^BflKb' >, 11 sufocado pelo cheiro e pela cor
I das frutas tropicais.
¦ I Zweig deu*me uma esplêndida
> «|Pt[
*-^w7%íi I entrevista sobre o Recife e a
.. marcha dos negócios políticos
lhi6KaML-^L. 'V-*? jjff
I mundiais. ("Temo por tudo o que
I está para vir" —
observou-me a
I respeito da Europa) e prometeu
I vo,tar 30 Brasil, com mais
^^%íp»
I vagar.
^0^0 I Voltou, realmente, e para sempre.
_.. I Esta reportagem, com as suas cartas,
^| visa exatamente a recordar um pouco
I da associação do homem com a terra
brasileira, um expoente de uma
^II época européia que está
HHHBHHBMK''^'"yí'Vt| desaparecendo. Visa, ainda, a mostrar
Stefan Zweig e a mulher mortos na camaX que o seu livro encantador sobre o
I Brasil —
encantador pela simpatia
Ique ele derramou em todas as
páginas, encantador pela honestidade
que o encantador apesar
tantos
naquela
apenas erros cronólogicos sem
importância -
a
enfim, que Zweig não procurara
lucro com o seu
país do Mas pos
precisamente aquilo
cartas íntimas sobre o mundo
que alguns meses
inquietações mórbidas, mas aue não
pode salvá-lo da tragédia final.
Soube em
parentes de Stefan a, de fato,
de Hempstead, descobri o
Altemann, cunhado do escritor,
seu poder e no de sua
encontrei as cartas íntimas
ambos cederam com
publicação, para todo mundo.
Essas cartas outras
assuntos generalizados, datadas
várias partes do mundo, comporão
futuramente volume especial
correspondência do escritor.
Altemann da segunda
esposa de o
ne sua tragédia de Petrópolis.
Estas cartas de Zweig, no seu
desalento e na sua pungente
melancolia, explicam o seu gesto
fatal.
O HOMEM
MORREU F
AMOR A P
íntimos a fascinantes, para
explicar os últimos anos de sue
vide e também os motivos que o
empurraram inapelavei mente para a
morte. Recordo-me com muita
exetidão de Zweig. Iniciava o
jornalismo no Recife, com a
função de entrevistar todas
as personalidades que chegavam
ao Brasil, principalmente
da Europa. Recife era o primeiro
porto de escala e oferecia
sugestões especiais para um
primeiro contato com a vida
brasileira.
Zweig desceu em terra do Brasil,
pele primeira vez, e veio a se
tornar depois um apaixonado dela,
das coisas e dos homens, com um
amor tão especial e tão doce
e romântico que era quase
infantil. O escritor judeu
seguie para aquele rumoroso
Congresso dos Pen Clube de
Buenos Aires, em 1935, onde
por sinal empenhou-se em
violenta altercação com
Marinetti e outros valentes
campeões do fascismo
internacional. Zweig desceu à
terra comigo e outro repórter,
e iniciamos uma larga
"Assim,
julgo melhor terminar a
tempo uma vida que dediquei
exclusivamente ao trabalho
espiritual, considerando a
liberdade humana e a minha própria
como o maior bem da terra. Deixo um
adeus afetupo a todos os meus
amigos". M
Este é o trilho final do
testamenlÉpe Stefan Zweig, que em
seguida mflÉMi-ee, juntamente com
sua mulher, em Petrópolis.
As cartas que traduzo explica a
morte de Stefan Zweig. São
cartas que ele escreveu do
Brasil para Londres. Documentos
r \
POLITIKA
o HOMEM QUE
MORREU POR
AMOR A PAZ
Não devemos esquecer que
vivemos a maior catástrofe da
história e que
é um milagre que
a vida continue em meio disto:
uma miserável vida individual"
POLITIKA
eu vi
Guerra é
apenas um
intervalo
(Sem data) -
"Você não pode
imaginar como eu me tornei indi-
ferente a todas as coisas materiais e
quão longe a minha antiga casa está
dos meus pensamentos e como eu
me resignei a nunca mais ver os
meus livros.
Concluindo, minha autobiogra-
fia disse adeus a todo o passado.
Para mim, uma coisa é importante:
concentrar-me, depois de muitos
meses de trabalho e de depressão de
guerra. Perdi todo o prazer pelas di-
versões e há meses que não vou a
um cinema; levo uma espécie de vi-
da de monge.
Mas não me importaria de viver
para sempre uma vida assim tão re-
tirada, esquecendo o mundo^ e es-
quecido por ele. Para você, esta
guerra é o que outra guerra foi para
mim - um intervalo
— e justamente
os seus temores e dificuldades lhe
farão amar a sua vida ainda mais,
depois.
De mim mesmo, já não posso
viver uma vida provisória, devo sa-
ber que não necessito mudar de
vida e, na verdade, não me queixa-
ria, se nossa forma imitada de vida,
aqui, continuasse por muitos meses.
Não preciso ter aborrecimentos e
estou satisfeito de ter deixado New
York. Aqui posso trabalhar melhor,
a vida é mais fácil, mais primitiva e
possui o seu grande encanto
(Sem data) — "Posso
realmente
confirmar que nós temos aqui, em
nosso pequno bangalô, absoluta-
mente a fôrma de vida que desejei
depois daqueles tempos cansativos
de New York. Tenho, como sala de
trabalho, um grande terraço cober-
to, em frente de belas montanhas.
A vizinhança é muito primitiva e
portanto pitoresca. A gente pobre^
daqui é mais simpática do que você
imagina.' Nossa criada negra é silen-
ciosa, diligente, limpa e agradável
para todos nós, á medida que apren-
de coisas que nunca vira antes em
sua vida.
Para eles, batatas são quase um
luxo e o peixe um animal desço-
nhecido. Leva as nossas latas vasias
de peixe para sua casa e as usa
como copos. Não obstante, ela é
'mPa e é a civilização imatura e a
humanidade o que eu tanto admiro
neste país.
Ouanto lamento
que não tenha
eit0 muito mais
pelo Brasil, quan-
* ~-rfc . ...... +-Zt"~~ -it ¦**"*' '5"
\ .- ¦¦¦VliSL
Para êles, as batatas são um luxo
e peixe
é um animal desconhecido.
do aqui estive, há cinco anos. Você
não tem idéia da fantástica prospe-
ridade deste país. Quando aqui esti-
ve, antes, uma casa que custava 100
libras está, agora, valendo 500 e
mesmo 1.000 libras."
(Dezembro de 1941) —
"Em
nossa monótona e tranqüila existên-
cia houve hoje um pequeno excita-
mento: a esposa do nosso jardineiro
(ele está fora durante todo o dia, na
fábrica) que vive numa pequena
casa por trás do nosso bangalô, deu
à luz hoje um filho, e Manfred teria
muito que aprender: como as coisas
primitivas acontecem aqui, coisas
que são tão complicadas, em nosso
mundo...
Em uma pequena sala
— a meta-
de do meu estúdio em Bath — havia
durante o grande momento: o mari-
do, a irmã, a filha desta, a parteira,
e um cachorro, de modo que afinal
de contas nem havia sala. E tudo,
até o menor conforto, como água
corrente, faltava naquele pequeno
espaço.
E, não obstante, um rapaz more-
no veio ao mundo, uma criança
muito •tranqüila, que até agora inda
não fez barulho. Lotte estava muito
excitada, o que não acontecia com
o marido da jardineira: este, imedia
tamente depois escorregou sorratei-
ro para o café da esquina...
Em face da pobreza, aqui, pode-
mos aprender, com espanto, como
tantas coisas da nossa vida são su-
pérfluas. Seria muito singular retor-
narmos às nossas idéias da Europa e
da América do Norte depois de to-
da esta experiência —
cuja grande
vantagem reside em que ninguém
mais temerá ficar pobre. Num tal
país, pode-se viver com muito pou-
co, desde que se esqueça o antigo
nível."
(31-12-1941) - . .e agora
como alguém pode saber o que
acontecerá nos próximos seis
meses? Sou, como você sabe,
muito cético sobre se depois desta
guerra alguém ainda terá alguma
coisa pela qual viver, pois o tempo
dos nossos pais e avós foi-se para
sempre, e ninguém pode estar certo
de possuir alguma segurança, para
quando ficar velho.
Eu não tenho visto os meus pró-
prios livros e não sei quando eles
serão publicados em Portugal e na
Suécia. Tudo se torna mais e mais
complicado; agora tenho que enviar
meus manuscritos por via aérea e
temo que a taxa postal valha mais
do que aquilo que ela envia*
Não devemos esquecer que vive-
mos a maior catástofre da história e
que é um milagre que a vida conti-
nue em meio disto —
uma pobre,
miserável e insignificante vida indi-
vidual. * •
Mas, nós vivemos, nós espera-
mos, e aqui neste pequeno lugar, te-
mos pelo menos o favor de uma es-
plêndida natureza. Teremos, todos
nós, ainda grandes aborrecimentos e
dificuldades, antes que possamos
calmamente e com felicidade, olhar
mais uma vez para dentro dos nos-
sos próprios olhos.
Eu estou preparado para tudo e
você também, mas a questão para
mim está em saber se, depois da
guerra, eu terei força e senso bas-
tante para gozar a vida. Você, com
sua filha, os terá, e esta idéia me
torna feliz."
(Sem data) —
"Estamos encanta-
dos com nossa estada aqui —
é a
vida dos nossos pais e dos nossos
avós, com um povo tão extrema-
mente simpático e limpo, mesmo na
sua grande pobreza.
A alimentação ainda não é artifi
ciai e o padeiro faz o seu pão e os
seus (excelentes) bolos, ele próprio.
Nossos gastos de vida são um
terço' do que despendíamos nos
Estados Unidos. Outros podem
achar Petrópolis fora de estação,
um lugar temerosamente morto,
mas para
mim que não quero outra
coisa senão trabalhar e ler quieta-
mente, gozar os passeios nas suas
belas cercanias, esta é a vida perfei-
ta.
— Você não pode imaginar a va-
riedade de tipos e as características
da vida brasileira: eu absorvo isto
enormemente, depois da monotonia
das ruas norte-americanas. Querida
Hannah, você compreenderá que
nos tornaremos mais e mais céticos
contra a "civilização",
vendo os glo-
riosos resultados dela; e esta vida
pacífica, mais primitiva
e mais natu-
ral possui uma atração tranqüila e
nova.
0 único ponto fraco são os
livros, mas eu trouxe Shakespeare,
Goethe e Homero, e com estes e
alguns outros que posso tomar em-
prestado, qualquer pessoa pode
viver por muito tempo.
... Esta guerra assume propor-
ções que todas as provisões e todos
os temores são fúteis. Cada pensa-
mento sobre os tempos de pós-guer-
ra e em torno das conseqüências
dos antigos enganos, é perdido."
(10-12-1941) -
".. . Sob a im-
pressão da declaração de guerra do
Japão, que talvez nos isole ainda
mais de vocês. Ainda não está certo
se o Brasil declarará guerra ao
Japão, também, mas de qualquer
maneira, a vida aqui não está tão
influenciada pela guerra, pois o país
é auto-suficiente."
•OI
U
POUTlKAl
koluna do
Paskoal ¦
Paschoal
Carlos
Magno
Carlos Lacerda
EU, LACERDA E GETÚLI0
Em 26 de junho de 1950, re-
cebo em Atenas um telegrama de
Carlos Lacerda: — "Estamos
to-
dos à sua espera
Durante algum tempo fui uma
espécie de seu irmão mais velho.
Lutei por sua candidatura a ve-
reador. Durante meses, de pés
descalços, saltávamos, ele e eu,
de meu carro, para noites intei•
ras colar cartazes seus em muros,
andaimes. Era eu quem ia pedir
auxílio a Peixoto de Castro, aos
irmãos Mendes de Campos, Pau•
Io Bittencourt, para todas as des-
pesas. Sempre tive por ele, em-
bora algumas diferenças, a mais
alta admiração. Poucas vezes
convivi com homem tão inteli-
gente, possuindo tamanha densi-
dade intelectual, memória sur-
preendente e manejando um
idioma imprevisto, rico, flexível,
arcoirisado, conciso, contunden-
te.
Em 1944, chamaram-me ao
Rio como Correio Diplomático.
Aproveito minha curta têmpora-
da para realizar no Teatro Fenix
o "Curso
de Férias de Teatro
Durante semanas, à noite, e em
manhãs de domingo, toda uma
ronda de figuras ilustres do tea-
tro, literatura, arte, discutem
teatro sob todos os seus aspec-
tos. A platéia intervém. E a pri-
meira vez no Brasil que, depois
de uma palestra, o público, cada
vez mais numeroso, podia inter-
vir, dar sua palavra, participar do
debate, criando um clima polf
mico e sadio.
Quando Raimundo Magalhães
Júnior falou sobre "Teatro
•
Censura", a discussão incendiou
a platéia. Era uma acusação dire-
ta, frontal, às autoridades, ao Mi-
nistério da Justiça policialesco,
que não permitia ninguém pen-
sar alto, respirar. Sou chamado
ao gabinete do prefeito Henrique
Dodsworth: -
"0 Fenix não
poderá ser mais cedido ao Curso,
porque se torna dia a dia um
foco de agitação oposicionista. O
teatro é o pretexto".
Havia a última reunião do
Curso: o julgamento do
"Hamlet". Barbara Heliodora
leria um estudo sobre o príncipe
dinamarquês. Em seguida,
Ziembinsky, Carlos Lacerda,
Sadi Cabral, Luíza Barreto Leite
o discutiriam. Fiz ver ao prefeito
que na noite inaugural do curso
eu falara da injustiça do nosso
negro não ter direito a represen-
tar qualquer peça, de qualquer
época, permitindo-se-lhe somen-
te a participação como moleque
de recados, naqueles textos que
exigiam um ator negro. Os bran-
cos besuntavam o rosto de car-
vão e os viviam. Uma grande ova-
ção da platéia sublinhou minhas
palavras. Um negro, Agnaldo Ca-
margo, se levanta: —
"Eu sou um
desses atores exilados num país
que diz não ter preconceitos de
cor". Outro, Abdias Nascimento^
da sua poltrona, ratifica essa afir-
mação. Ê um instante de beleza,
que empresta ao Fenix o fulgor
do Santa Isabel, de Recife, com
Castro Alves, Joaquim Nabuco,
Tobias Barreto, agora defenden-
do, com um atraso de mais de
cem anos, um direito ainda rou-
bado aos negros.
O prefeito autoriza finalmente
a última reunião do Curso. Car-
los Lacerda subjuga o auditório.
Fascina. Sua voz clara conduz as
palavras a uma platéia heterogê-
nea, onde há muita gente que o
classifica de maneira aviltante,
considerando-se sua inimiga. ^
E
ganha uma das maiores ovações
dessa manhã.
Trabalhávamos juntos no
"Correio da Manhã" em 1949.
Ele agredia o prefeito Mendes de
Morais com aquela violência que
é só dele, feita de lava, tempesta-
de, represa partida. Inauguro a
temporada do Teatro Experi-
mental de Ópera no República.
Verdadeira multidão acorre ao
teatro. Orlanda, que toma conta
da bilheteria, me manda um re-
cado: - "O
prefeito está na sala,
entrou democraticamente na fila
e adquiriu um dos últimos bilhe-
tes. Estava na letra Z." A notícia
me surpreendeu. Num dos inter-
valos, Barreto Pinto pede a pala-
vra e me saúda. Vão me buscar
atrás das cortinas, e me trazem
de cara inchada, para receber os
aplausos de centenas de especta-
dores que ficam de pé, batendo
palmas, palmas.
Houve, por um instante, um
movimento de cabeças que se
voltavam. Quem seria? Em tan-
tos anos de luta não me lembra-
va de nenhum homem público
participar de uma manifestação
artística espontaneamente. Esse
homem era o prefeito Mendes de
Morais, que não era meu amigo,
nem do Teatro Experimental de
Ópera, nem do Teatro do Estu-
dante do Brasil, pois nos negara
o parque da cidade para nossa
concentração e que nesse instan-
te podia verificar o equivoco
praticado contra um movimento
sadio, belo. Para ele, pois, os
aplausos da noite.
Os jornais veiculam a noticia
com estardalhaço. Carlos Lacer-
da dois dias após me censura se-
riamente pelas colunas do nosso
"Correio". Paulo Bittencourt me
telefona de Poços de Caldas,
onde se encontra, para lamentar
o ataque. Afastei-me de Carlos
Lacerda sem uma palavra de
queixa. Nunca mais o vi a não
ser no enterro e na missa de
minha mãe, cinco meses depois,
quando Letícia e ele me abraça-
ram comovidos.
Um anos depois, esse Savana-
rola tocado de gênio me escreve
o bilhete rápido: - "Estamos
to-
dos à sua espera". Era minha
candidatura a vereador.
Dias após a estréia do Teatro
do Estudante do Brasil, Getúlio
me recebia no Catete. Cumpri-
mentou-me pelo êxito que fora o
espetáculo "shakespeariano".
Agora, era continuar. Confessei-
lhe que precisava de sua ajuda
para solucionar compromissos
assumidos com a encenação de
"Romeu e Julieta".
Quanto precisas?
25 contos, presidente.
Vai até o Vergara. Pede-lhe
que te dê um papel de memoran-
dum. E faz teu pedido. Mas não
vás pedir 25, pede logo 50 con-
tos.
Como eu o ouvisse surpreso,
explicou:
Tu não sabes que esse pa-
pel, até chegar às minhas mãos,
vai rolar por ai e os técnicos vão
cortar-te a verba de todo jeito?
Acabarás recebendo o que pedis-
te. Faz teu pedido pelo dobro,
para que recebas o que precisas.
Eu tenho experiência.
Cumpri a ordem recebida.
Aproximadamente dois meses
depois recebia num dos guichês
do Tesouro, na antiga Caixa de
Amortização, 25 contos de réis.
¦
DUQUE DE CAXIAS
INAimim OBRAS
Dentro do programa administrativo da Prefeitura de
Ou que de Caxias, caracterizado por realizações sempre
voltadas para o desenvolvimento do Município e o bem
•estar social do povo, o prefeito-general Carlos Marciano
de Medeiros deu prosseguimento, sábado último, ao inten-
ao programa de inaugurações de diversos empreendi men-
tos marcantes e indispensáveis ao progresso de cidade flu-
minense.
As inaugurações fazem parte de um programa prepara-
do a longo prazo e marcam as' comemorações do 8o. ani-
versário da Revolução de 31 de março de 1964. O general
Carlos Marciano de Medeiros iniciou a sua jornada de sé-
bado último com a inauguração dos ^melhoramentos
que
permitiram uma significativa ampliação do Ginásio Expe-
dicionário Aquino de Araújo, hoje um dos principais esta-
belecimentos de ensino de Duque de Caxias.
O Ginásio Expedicionário Aquino de Araújo fora fecha-
do em 1957 pelo Ministério da Educação e agora, com os
melhoramentos da administração Carlos Marciano de Me-
deiros, ganhou capacidade para 2.400 alunos, com funcio-
namento em três turnos, bibliotecas, sala de ciências, audi-
tôrio, completando uma área coberta de 540 metros qua-
drados. Em agradecimento à mensagem da menine Matil-
de, de 12 anos, aluna do 2o. ano ginasiat, o prefeito Carlos
Marciano de Medeiros, salientou que a recuperação do
Ginásio Expedicionário Aquino Araújo, representava o
cumprimento do dever de sua administração para com os
seus mun fcipes.
Após as solenidades no Ginásio, o general Carlos Mar-
ciano de Medeiros e sua comitiva de auxiliares dirigiram-se
às ruas São João Batista e da Pedra, no centro da cidade,
onde foi cortada a fita de inauguração da pavimentação
asfáltica daqueles importantes logradouros de Duque de
Caxias e que irão permitir um fácil acesso entre as zonas
Norte e Sul da cidade. A seguir foi inaugurada a pavimen-
tação asfáltica das ruas Presidente Duarte e Jorge Peçanha,
no bairro de Lafaiete. Completando a maratona, a comiti-
va do general Carlos de Medeiros inaugurou, já no final da
tarde, a iluminação a vapor de mercúrio da Avenida Presi-
dente Kennedy, no trecho entre o viaduto Francisco Cor-
rêa e o rio Sarapuí, em Gramacho. Outras obras serão
entregues à população ainda no correr do mês de março,
dentro do programa comemorativo de Duque de Caxias
pelo 8o. aniversário da Revolução.
^,, ; :
wL H
O general Carlos Marciano de Medeiros, ladeado do Se
cretário de Obras, Edgard Prado Lopes, quando inaugurav
a iluminação a vapor de mercúrio na avenida Presioen
Kennedy.
1
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A Editoria ^f
POLITIKA
ai ^Ea^ai•.¦:-;^ ilnp' •___ ^***\****e
^m\\****__\ ***~*\\a*\\^ta\
*^^^—
23korreio
Dilson Ribeiro
"Encontro POLITIKA em todo lugar99
GRIMALDI RIBEIRO
(deputado do Rio Grande
do Norte, vice-líder da
ARENA) :-"POLITIKA,
surpreendentemente paramim, é lido em todo lugar
no Brasil. Por onde viajo
sempre encontro o jornal.Há pouco, estava eu na
convenção da ARENA do
Rio Grande do Norte,
quando chegou um amigo
meu, José Braz, grande fa-
zendeiro e líder políticodo município de Acari,
que fica lá no Seridó, bem
no interior do Estado, e
| me disse: - "Deputado, li
uma história muito boa so-
bre o senhor". -"Onde"?
,-"EM POLITIKA,
com K". - "E chega lá em
Acari? - "Toda semana".
Isto está acontecendo no
meu Estado e por toda
parte onde passo. Confesso
que não acreditava. Paramim, a penetração nacio-nal do jornal é uma surpre-sa completa".
rio POLITIKA (com K
mesmo), que tem chegado
com regularidade a Natal,
é uma novidade no jorna-lismo brasileiro pelo des-
compromisso das análises e
reavaliação da história po-lítica nacional. Um de seus
editores, o jornalista Se-
bastião Nery, mantém uma
coluna que ele chama de"Folklore
Politiko". Da
sua coluna são estas histó-
rias de Vargas, que trans-
crevo".*Em
duas palavras, San-
derson, você sintetizou,
muito competentemente,
os objetivos fundamentais
de POLITIKA : -o des-
compromisso das análises e
a reavaliação da história
política nacional. O jornalnasceu exatamente paraisso: para analisar sem pre-conceito, descompromissa-
damente e para reestudar,
reavaliando o processo po-litico brasileiro. Você pôso dedo no fundo do olho
da gente. E continue trans-
crevendo o que quiser.
CINTIA MARIA FIO-
RAVANTI (Marília, SãoPaulo) :-"Por incrível
que pareça, eu lhes escrevo
esta com respeito, apesar
de não concordar nem um
pouco com suas idéias a
respeito do Cursilho. Es-
crevo com respeito porque
foi justamente lá dentro
que apredi a respeitar a.
opinião dos outros, mesmo
que ela vá contra a verdade
e contra a minha opinião.
é uma pena, verdadeira-
mente, que o senhor Se-
bastião Nery tenha se pro-
posto a escrever semelhan-
te artigo sem estar abaliza-
do para tal. Nota-se de Ion-
ge que ele não fez o Cursi-
lho. E, sem rancor, eu
acho que o Cursilho lhe fa-
ria muito bem".
*De fato, dona Cintia, o
Nery não fez o Cursilho e
isto ele disse na matéria. O
que ele publicou (e foi
também dito) era o depoi-
mento de um professoruniversitário que fez o
Cursilho. Por isso mesmofizemos questão de publi-car, no último número, o
21, com o mesmo desta-
que, o depoimento do Pa-
dre Paulo Martinecheu,
que fez do Cursilho. Curió-
so, não é, dona Cintia? OPadre (que, como a senho-ra, fez o Cursilho) não sóconcordou com tudo queo Nery escreveu, como foi
ainda mais severo nas cr iti-
cas, provando que o Cursi-lho é um movimento me-
dieval dentro da Igreja, em
pleno século XX. E agora,
dona Cintia? Acreditar naopinião da senhora, comseus ingênuos e leigos 20
anos, ou na do Padre, for-
mado em teologia por umdos mais importantes cen-tros de estudos eclesiásti-
cos do País, que é o Semi-nário dos Franciscanos dePetrópolis? A senhora es-creveu em nome da Verda-de. Muito bem. Entre a suaverdade de leiga e tão jo-
vem ("Tenho 20 anos") e
a Verdade eclesiática, pro-fissional e experimentada
do Padre, ficamos com o
Padre. Até porque, dona
Cintia, quem inventou os
padres não foi POLITIKA.
Foi o Cristo, quando dis-
se: - "Tu és Pedro e sobre
esta pedra edificarei a mi-nha Igreja e as portas doinferno não prevalecerãocontra ela". Quem sabe,dona Cintia, se o Cursilhonão é uma nova porta doinferno em escultura espa-nhola?
JOSÉ ALBERTO
DIETRICH FILHO (jorna-lista, Curitiba) : -
"Enbo-
ra não seja puxa-saco de-
clarado, devo dizer-lhes
que POLITIKA tem sido
meu livro de cabeceira".
* Pode ficar certo, José
Alberto, que vamos cuidar,
sempre mais, para você
dormir em paz.
Ivsfailo ulo Kio dt* Janeiro
PREFEITURA MUNICIPAL
DE DUQUE DE CAXIAS
«UnhiiH-lt' do l*r«-í<»ho-IH visão «h- lt<-ln<ò<'» Pública»
NOTA OFICIAL
Em aditamento à Nota Oficial de 4 de março, a Divisão de Relações Públicas, torna público que as obras
a serem entregues no próximo sábado, 18 do corrente, obedecerão à ordem e ao horário abaixo indicados:
1o. — Arborização da Avenida Brigadeiro Lima e Silva, às 16:00 horas;
2o. — Pavimentação a paralelepípedos da Rua Wenceslau Brás, em Imbariê, às 17:00 horas;
3o. - Arborização e iluminação pública da Rua Primeiro de Maio, às 18:30 horas;
4o. — Construção, Urbanização e iluminação da Praça Marcílio Dias, no Parque Felicidade, às 19:00
horas.
O Governo Municipal sentir-se-à honrado com o prestígio do comparecimento das autoridades militares e
civis, das classes sociais, políticas e empresariais, e do povo em geral às inaugurações programadas.
DR. JOSÉ CARNEIRO
Diretor de Relações Públicas
ct Fritz
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ES^VOm^GEaM: VAMOS \ \? XTç9^M^&j5o anos mA^
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EDI-TORA LTDA. POUTIKA r"sr SEBESTANTÔNIO CALEGARI R. Clarisse índio do Brasil, 30Humor Guanabara
"«' Diretora Direção: E52£nnPHILOMENA GEBRAN OLIVEIRA BASTOS COENTRO
Endereço: SEBASTIÃO NERY Fotos POLITIKAé composto em máquinasAv. Rio Branco, 133 - grupo 1601 Editor TRIBUNA DA IMPRENSA, eletrônicas IBM e impresso naGUANABARA JORGE FRANÇA O JORNAL e O CRUZEIRO. Gráfica Editora "Jornal
do Commercio"
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