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Professor Firmino Carlos
(21) 99255-4612
firmino.adv@gmail.com
Face: Firmino Carlos
Continuação aquisição da propriedade imóvel e materiais seguintes.
Queridos todos! Vamos lá:
Da Acessão Art. 1.248 NCC
Como o nome está dizendo, acessão é acréscimo. É algo que incorpora
ao imóvel. Você é o proprietário de um imóvel e tem essa propriedade
aumentada com uma acessão e você adquire a propriedade dessa acessão. O
Código enumera 5 modalidades de acessão. Portanto, você pode adquirir a
propriedade imóvel:
pela formação de ilhas;
pelo aluvião; fatos
pela avulsão; naturais
pelo abandono do álvio e
através de plantações e construções feitas no seu imóvel por 3ºs.
(fato humano)
As 4 primeiras hipóteses são aquisições que decorrem, geralmente,
de fatos naturais. Já nas plantações e construções, a aquisição se dá por fato
humano.
Das Ilhas – Art. 1.249, NCC
É um fenômeno natural, o curso da água pode forma em seu leito uma
ilha. Claro que isso só se admite em caráter permanente, não se trata de um
ajuntamento de materiais sólidos, que depois são novamente carregados pela
corrente. E aí se pergunta: A quem pertencerá a ilha que se forma no curso
de um rio? A 1ª preocupação é saber se o rio é público ou particular. O rio
público é aquele cujas águas são navegáveis.
Todo rio navegável é um rio público, portanto, suas águas não
pertencem a ninguém. Já os rios particulares são aqueles não navegáveis e
que constam em terrenos particulares. As ilhas que se formam nos rios
públicos também são públicas, pertencerão à União. Já as ilhas que se formam
nos rios particulares pertencerão ao proprietário do imóvel onde o rio corta.
Então, se eu tenho uma fazenda cortada por um rio não navegável, e
nesse rio forma-se uma ilha, ela passará a me pertencer, porque o rio corta a
minha fazenda.
As coisas começam a se complicar quando as margens do rio
pertencem a proprietários diferentes. Uma margem pertence a A e a outra
pertence a B.
Por exemplo:
A Ilha pertencente a A Pertence a A Linha
Imaginária
B Pertence a B Ilha pertencente a B
A solução é dividir o rio por uma linha imaginária. As ilhas que se
formam inteiramente numa das metades pertencerão ao proprietário
marginal. Para resolver o problema da ilha que vem cortada pela linha divisória,
se estabelece um condomínio legal ou necessário (imposto por lei), cada
proprietário ficará com a parte da ilha que couber na sua metade; e aí se
aplicam as regras comuns de condomínio.
Uma outra situação complicada que o Código também responde é a
seguinte
A B C D Linha Imaginária
E F G H ilha
Há vários proprietários cujos imóveis dão frente para a ilha. Como
dividir esta ilha? Vai se estabelecer um condomínio e cada proprietário
marginal (proprietário de margem) terá a propriedade da parte da ilha, que
ficar na metade do rio correspondente, e na projeção da testada de seus
lotes. Aí se aplica a chamada: projeção das testadas.
Essa matéria está disciplinada numa lei especial, chamada CÓDIGO
DE ÁGUAS – Dec. 24.643/34, que é uma lei antiquíssima, de 1934, cujo autor
do projeto foi o famoso prof. Alfredo Valadão, pai do também famoso jurista
Haroldo Valadão. O prof. Alfredo Valadão era diplomata, embaixador do
Brasil e foi autor do projeto, que resultou no Código de Águas, que é
considerado, podemos nos orgulhar disso, dos melhores do mundo, por isso
sobrevive desde 1934. Foi tão bem efeito o Código de Águas, que está
resistindo até hoje. E lá tem todo um capítulo disciplinando a formação de
ilhas. Aí os alunos perguntam: por que se repete isso no Código Civil? O Código
Civil estabelece apenas os princípios gerais e o Código de águas desce a
maiores detalhes.
Da Aluvião – Art. 1.250, NCC
É o 2º modo de adquirir a propriedade por acessão. O aluvião é um
fenômeno lento, imperceptível, que as vezes leva décadas para se perceber.
E consiste no depósito progressivo de materiais sólidos feitos por um rio num
ponto de sua margem.
As águas do rio vai carregando arei, galhos de árvores, folhas,
detritos etc. Num determinado ponto do rio, geralmente numa curva, esse
material vai sendo depositado. No início nem se percebe, é preciso muito
tempo para que se comece a formar ali uma prainha e depois este acréscimo
se consolida chamado aluvião.
A quem pertencerá este acréscimo? Aí há uma diferença fundamental
entre a formação de ilhas e o aluvião; é que na formação de ilhas é necessário
saber se o rio é público ou particular, porque, como já foi dito, as ilhas
formadas nos rios públicos também são públicas. Mas o aluvião sempre
pertencerá ao proprietário marginal, ainda que se forme no Amazonas, no São
Francisco, no Paraná ou em qualquer outro rio público.
Isso é uma armadilha para prova, por exemplo: A quem pertencerá o
aluvião formado pelo rio São Francisco, que é público? Pertencerá ao
proprietário da margem onde ele se formou. E se ele se formar diante de
várias propriedades? Aplica-se o mesmo princípio das ilhas: a projeção das
testadas.
A B C D aluvião
E mais uma vez se estabelece um condomínio legal ou necessário.
Tanto quanto a formação de ilhas quanto o aluvião é um modo
originário de adquirir a propriedade gratuito. Até porque no aluvião você não
tem a menor possibilidade de saber a quem pertencia os materiais que
formaram o aluvião, o mesmo em relação as ilhas.
Da Avulsão – Art. 1.251, NCC
É o 3º modo de adquirir a propriedade imóvel por acessão.
Qual seria a diferença entre o aluvião e a avulsão? Ambos são
fenômenos naturais, ambos constituem acessão. É que o aluvião é um
fenômeno lento, progressivo, quase imperceptível, levando as vezes, décadas
e décadas até que se perceba, enquanto a avulsão é um fenômeno brutal, que
logo se percebe instantaneamente. A avulsão é representada pelo
arrancamento de um pedaço da margem do rio, que caprichosamente vai
aderir a uma outra propriedade, as vezes a quilômetros de distância na
frente. É evidente que isso só acontece nos grandes rios caudalosos.
O NCC, a todo momento, se refere a palavra “prédio”, significando
terreno. Na linguagem comum, prédio é sinônimo de edifício, e terreno baldio
para o leigo jamais será um prédio. Em direito prédio é um imóvel – vem do
direito romano – predium – solo). O solo é o predium, portanto, para o NCC,
quando ele se refere a prédio, estejam certos, tanto pode ser um terreno
baldio quanto um edifício de 40 andares. Ambos são prédio para o direito.
Mas isso é difícil explicar para o leigo. Para os romanos e para nós o solo é o
prédio, o edifício é uma acessão ao prédio.
Então, a avulsão é um fenômeno repentino, brutal, instantâneo. Há
outras enormes diferenças entre o aluvião e a avulsão. No caso da avulsão
também tanto faz se o rio é público ou particular. Se o rio Amazonas arranca
um pedaço de uma margem e vai se depositar em outra, o proprietário do
terreno onde esse pedaço aderiu vai adquirir a propriedade sobre ele, mesmo
que o rio seja público. Portanto, só na formação de ilhas é que vocês terão
que ver se o rio é público ou particular. No aluvião e na avulsão na precisa se
preocupar com isso.
Mas há outra diferença enorme: é que no aluvião não há o menor
hipótese de se identificar de onde teria vindo os materiais que o formaram,
por isso não há como se falar em indenização. Mas na avulsão é possível, e até
é relativamente fácil, identificar de onde veio, fica a cicatriz na margem, a
sequela, os sinais do arrancamento. E, como se não bastasse, é possível que
neste pedaço de terra haja outros bens. Ex.: Nas grandes pororocas, no
Amazonas, muitas vezes são arrancados pedaços de terra que vai junto boi,
um curral, uma casa etc. Neste caso, o proprietário que puder identificar os
seus bens, poderá exigir daquele o qual os bens aderiram a sua devolução ou
a sua indenização se ele não quiser devolver.
O NCC dispõe que se o proprietário que recebe o pedaço de terra não
quiser pagar a indenização, terá que consentir na sua remoção. (parágrafo
único do art. 1.251).
O proprietário prejudicado pela avulsão tem 1 ano para reclamar esta
devolução ou indenização. Esse prazo é decadencial. Ou seja, se passar 1 ano
da avulsão, o proprietário beneficiado pela avulsão pode dormir tranquilo
porque nunca mais poderá ser incomodado para devolver os bens. (art. 1.251).
Portanto, a aquisição na avulsão pode ser gratuita como onerosa, pois o
proprietário beneficiado poderá ter que indenizar aquele que ficou
prejudicado.
Então, o aluvião é sempre gratuito, pois não há como saber quem era
o proprietário anterior, mas a avulsão pode ser gratuita ou onerosa.
Do Álveo abandonado – Art. 1.252, NCC
É o 4º modo de adquirir a propriedade por acessão.
Se o rio corre por um terreno particular o proprietário do terreno
passa a ser proprietário do álveo abandonado, mesmo que o rio seja público.
Então, se o rio secar ou mudar de rumo, os proprietários dos
terrenos marginais adquirirão o álveo. Se são proprietários diferentes das
margens, divide-se o álveo ao meio e cada proprietário ficará com a metade
do álveo que corresponder a sua margem. Esse abandono do álveo pode se dar
por fenômenos naturais, como a seca, terremotos, movimentos geográficos
que mudam o curso do rio, como pode se dar por obra humana, como uma
barragem.
Essas hipóteses de acessão estudadas até aqui não são muito
frequentes e não tem um grande significado econômico. Porém, o 5º modo de
aquisição da propriedade por acessão – plantações e construções – podem ter
grande valor econômico e acontecem com muito maior frequência. É o caso de
pessoas que constroem em imóveis alheios e aí precisa se saber a quem
pertencem essa acessão.
É de maior importância prática o conhecimento da aquisição da
propriedade de imóvel por plantações ou por construções.
1º - quando o sujeito constrói em terreno próprio, mas usando sementes ou
materiais de construção alheios, ex.: no meu próprio terreno eu planto
milharal do terreno do meu vizinho; ex.: construo casa no meu terreno,
usando tijolos e material e cimento do meu vizinho ou de terceiro.
Pergunta-se, então:
A quem pertence a plantação, ou a casa construída? Já que o proprietário da
plantação ou da construção é um, e o proprietário das sementes ou do material
de construção é outro. Essa não é a hipótese mais frequente. Mais frequente
é a outra: quando alguém planta ou constrói em terreno alheio, usando
sementes e material próprios. A pergunta é a mesma: a quem pertencerá a
plantação ou a construção, se o que não lhe pertence estiver abandonado; tem
apenas que indenizar pelo seu valor. Isto porque não haveria nenhum
interesse social ou econômico em devolver as sementes ou o material de
construção, cabendo assim a indenização. Mas, se aquele que plantou ou
construiu em seu próprio terreno, usando de má-fé sementes ou materiais
alheios, ou que não têm dono, mas não é ele o dono, que não estão abandonados,
ele terá que indenizar pelo seu valor. E pagar perdas e danos.
Uma vez um aluno perguntou por um exemplo de perdas e danos, e eu
dei a ele o exemplo de ter usado em seu próprio terreno sementes ou
materiais de construção alheios, usando de má-fé, porque essas sementes ou
materiais não existem mais no mercado. Aí, então, além de pagar a
indenização das sementes e materiais alheios, há que se pagar por perdas e
danos, porque, não existindo mais no mercado, o proprietário das sementes
ou materiais de construção não teria condições de repô-los.
Essa é a grande diferença entre boa-fé ou má-fé na construção ou
plantação em terreno próprio, usando sementes ou materiais alheios. Em
ambos há que se indenizar pelo valor, mas na má-fé há que se responder por
perdas e danos, que será apurado caso a caso, diante da situação concreta.
Como vocês vêem, essa hipótese é fácil de ser resolvida, e também não
é muito frequente. Mais frequente e desafiadora é a 2ª hipótese, quando
alguém planta ou constrói em terreno alheio. Mais uma vez a solução
dependerá da boa-fé ou da má-fé de quem plantou ou construiu em terreno
alheio.
Pelo princípio de que o acessório segue o principal, é óbvio que, se eu
construí ou plantei em terreno alheio, perqueri a propriedade da plantação ou
da construção que passarão a pertencer ao proprietário do solo, porque nunca
o legislador permitirá que o solo pertença a um e a acessão a outro, que
gerará, certamente, terríveis conflitos. Então, a regra geral é essa: quem
planta ou constrói em terreno alheio, mesmo que com suas sementes e seu
material, perde a propriedade do que plantou ou construiu para o proprietário
do solo. Agora, se eu construí ou plantei em solo alheio, de boa-fé, pensando
que aquele solo me pertence ou que não pertence a ninguém, eu perderei a
propriedade, mas poderei reclamar a indenização do valor das sementes ou
do valor dos materiais da construção, portanto aquele que plantou ou
construiu de boa-fé em terreno alheio recuperará o valor das sementes ou da
construção. O código não fala claramente. Uma corrente mais tradicional
entendia que só seriam indenizáveis apenas o material usado na construção e,
por analogia, as sementes, mas a corrente mais moderna entendia que só
seriam indenizáveis o material de construção, por analogia, as sementes, mas
a corrente mais moderna entende que o espírito da lei foi indenizar tudo o
que se dispendeu para a construção, incluindo aí a mão-de-obra sem a qual não
se faria a construção, mas o código não dá uma resposta muito clara a esse
respeito.
E, se o proprietário do solo não tiver recursos para pagar essa
indenização? Já houve caso de se alienar o imóvel para se pagar a indenização
o que pode realmente parecer injusto, mas não há outra solução possível.
Agora, se quem plantou ou construiu em terreno alheio de má-fé,
perderá a propriedade da plantação ou da construção, sem direito a qualquer
indenização. Portanto a plantação e a construção passarão gratuitamente a
propriedade de proprietário do solo, confirmando aquilo que eu tenho lhes
dito: a lei protege aquele que age de boa-fé e pune o que age de má-fé. Muitos
perguntarão se esta solução não traduziria um enriquecimento sem causa, ou
seja o proprietário do solo estaria adquirindo uma plantação ou uma
construção sem nada dispender. Não é um enriquecimento sem causa justa,
porque a causa justa é a má-fé de quem assim procedeu, portanto quem planta
e constrói em terreno alheio, sabendo que o terreno é alheio, e me perdoem
a comparação aparentemente grosseira, é o mesmo que, como diz o jargão,
fazer filho em mulher alheia; portanto, se eu plantar ou construir em terreno,
sabendo que e alheio, eu perco não só a propriedade do que plantei ou construí,
como também perco qualquer indenização do que dispendi.
O código passado parava aí, mas ainda havia uma outra hipótese; é
quando tanto o plantador ou construtor quanto o proprietário do solo estavam
ambos de má-fé. Parece estranho à primeira vista. E quando é que o
proprietário do terreno está de má-fé? É quando , percebendo o início do que
estão plantando ou construindo em seu terreno, nada faz para obstar a
plantação ou construção, deixando que tudo se conclua sem nada pagar, por
exemplo: o proprietário de um terreno baldio que passa pela frente da sua
moradia, percebe que um estranho começa a pontuar em seu terreno uma
construção, e já começa a empilhar tijolos e materiais de construção. No dia
seguinte, o proprietário passa de novo pelo seu terreno e verifica que o
estranho já empilha sacos de cimento e começa a fazer buracos para
construção, certamente para assentamento dos alicerces. No dia seguinte,
verifica que a obra prossegue. O que faria um homem comum? Certamente
interpelaria esse estranho e perguntaria o que ele estava fazendo em seu
terreno, e lhe diria: pare com essa obra porque este terreno é meu, e, se não
parar, providenciarei o interdito possessório, para impedir a continuação
desse esbulho. Mas, ao contrário, que faz esse proprietário? NADA FAZ.
Ainda passa a acompanhar a obra e a fazer algumas sugestões: acabamento
em mármore, sugere construção de piscina, e deixaria a obra acabar, para,
então, apresentar-se como proprietário do terreno, e ficaria também com a
propriedade de tudo o que foi construído, sem nada pagar. Neste caso,
compensam-se as más-fés; e qual seria a solução? A propriedade da
construção passa para o proprietário do terreno, mas este terá que indenizar
o construtor das despesas dos materiais, como se fosse uma compensação da
má-fé (só os materiais ou só as sementes como indenização).
Só que o código passado parava aí, e não cuidava de uma hipótese muito
mais comum, e, que por isso mesmo, gerava grande perplexidade. É quando
alguém constrói ou planta, invadindo o terreno alheio, parcialmente, porque o
código passado só tratava, quando a plantação ou construção era feita
totalmente em terreno alheio.
O legislador do passado esqueceu esta outra hipótese. Eu construo no
meu terreno, mas um pedaço da casa invadiu o terreno vizinho. Uma quina da
casa ou a plantação se estendeu à propriedade vizinha, ultrapassando a linha
divisa, mas nem a construção nem a plantação ocuparam área totalmente no
terreno vizinho, apenas uma parte dele. Nada havia no código. Apenas a
jurisprudência exigia a demolição do construído ou a destruição do plantado.
Se, por acaso, acontecesse de um pedaço da casa invadir o meu terreno, eu
entrava com uma ação de demolição da parte invadida, ou eu impedia a
continuação da obra com uma ação de nunciação de obra nova, ou seja, se a
obra ainda não estivesse concluída, eu faria uma ação de nunciação de obra
nova, visando a suspender a obra; e, se estivesse concluída, faria uma ação
demolitória, visando à demolição. Mas nem sempre essa é a melhor solução,
nem social nem economicamente, ao contrário, é uma solução que quase
sempre não satisfaz a qualquer das partes. NÃO É SOCIALMENTE ÚTIL.
O novo código, em boa hora, enfrentou essa questão e, na minha,
opinião, deu uma solução bastante razoável. Eu chamo a atenção de vocês
para esta solução que resolverá diversos conflitos.
1ª preocupação: verificar se a invasão do terreno alheio foi inferior a 1/20
(um vigésimo) da área do terreno alheio - o código trata de pequena invasão
- Art. 1258 CC/02. Se quem invadiu o terreno alheio, mas não ultrapassou
um vigésimo, está de boa-fé; ele adquire a propriedade da parte invadida, e
indenizará o proprietário pelo valor proporcional dessa área e a
desvalorização do valor remanescente, ou seja, ele indenizará o proprietário
vizinho pelo valor da parte invadida.
Assim, se a invasão foi de 10% ( dez por cento ), com o valor do terreno,
tem-se o valor dessa área, com regra de três, e, além disso, indenizará a
desvalorização remanescente, porque é claro que a área remanescente
diminuirá um pouco de valor venal. Agora, ele adquirirá a propriedade da área
invadida, se a construção exceder o valor do terreno, o que normalmente
acontece. E vejam o tratamento social. Socialmente, esta área é melhor, passa
a pertencer a quem de boa-fé construiu nela, porque de que adiantaria demolir
um pedaço da casa, o que inviabilizaria, na maioria das vezes, até inviabilizar
a manutenção da construção. Então é uma solução que me parece socialmente
justa. Agora, se quem invadiu o imóvel do vizinho, em menos de um vigésimo
e usou de má-fé, pagará em décuplo esta indenização, ou seja, ele adquirirá a
área invadida, mas ele pagará a indenização em décuplo. Olhem a pesada
sanção que se comina a quem agiu de má-fé. Aí está a invasão em terreno
alheio inferior a um vigésimo do terreno; se foi de boa-fé, ele ficará com a
parte invadida, mas pagará por ela o valor, e pagará a desvalorização
remanescente; e se for de má-fé, pagará o décuplo do valor e ficará com a
parte invadida.
2ª preocupação: a invasão do terreno alheio foi superior a um vigésimo, de
grande monta. Aí é o art. 1259 CC/02. Aí já é um problema diferente. Mesmo
de boa-fé, quem invadiu adquirirá a propriedade do solo invadido, mas agora
pagará perdas e danos, ou seja, pagará o valor do solo invadido mais perdas e
danos, e essas perdas e danos correspondem à desvalorização maior do
próprio imóvel a dez vezes a sua inviabilidade econômica. Muitas vezes o
proprietário vizinho não pode mais construir em seu terreno, porque não lhe
sobra mais área suficiente. Então, aí, não basta indenizar a desvalorização; aí
entram perdas e danos que, é claro, serão apuradas com perícia. Aí é
interessante, porque, mesmo de boa-fé, o invasor pagará por perdas e danos.
E se fosse de má-fé? O legislador nunca iguala boa-fé com má-fé. A solução
é draconiana. Quem construiu mais de um vigésimo de má-fé terá que demolir
o que construiu. Não adquirirá a propriedade. Aí o vizinho poderá exigir a
demolição do que invadiu o seu terreno.
Vejam, então, que o legislador deu respostas a todas as hipóteses.
Podemos, até, não concordar com as soluções adotadas. Mas, pelo menos,
agora não há mais omissão. Agora o juiz tem no código as soluções para esses
problemas. Caberia a pergunta: por que, mesmo sendo invasor de boa-fé,
pagará perdas e danos. O legislador entendeu que, se você foi negligente em
não obedecer convenientemente a divisa, numa pequena invasão isto pode ter
resultado de uma confusão dos marcos.
Com isso, meus amigos, encerramos, minuciosamente, o estudo dos
modos de adquirir a propriedade imóvel.
AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE MÓVEL
Nós já dissemos que o código trata de maneira diferente a aquisição
da propriedade imóvel e da propriedade móvel. A aquisição da propriedade
imóvel é cercada de muito maior cuidado, muito maior controle, maior rigidez
das solenidades. Por isso, o código separa os modos, maneiras de aquisição.
O primeiro deles é a USUCAPIÃO, que é comum, ou seja, pela
usucapião tanto se pode adquirir a propriedade móvel quanto a propriedade
imóvel, e os requisitos são, rigorosamente, os mesmos, a não ser quanto ao
tempo.
A aquisição da propriedade móvel pela usucapião também depende da
posse contínua da coisa móvel, e de uma posse mansa e pacífica, e também
exercida “animus domini”. São, portanto, os mesmíssimos requisitos exigidos
para os imóveis, ou seja:
. posse contínua;
. posse mansa e pacífica;
. exercida com animus domini.
A única diferença é o prazo, que é muito menor, em se tratando de
coisa móvel, enquanto que, para os imóveis, a usucapião extraordinária do
possuidor de má-fé exige, hoje, 15 (quinze) anos, ou 10 (dez) anos, se o
possuidor de má-fé instalou no imóvel a sua morada habitual, ou o tornou
produtivo, em se tratando de imóvel; mesmo possuidor de má-fé, pode
adquirir a propriedade com apenas 5 (cinco) anos; e, se estiver de boa-fé, com
apenas 3 (três) anos. Eis a diferença significativa – de 15 (quinze) anos e 10
(dez) anos, passa-se para 5 (cinco) anos e 3 (três) anos. No mais, todos os
comentários que fiz para os imóveis se aplicam para os móveis.
O segundo modo de adquirir a propriedade móvel é a OCUPAÇÃO. É o
modo de adquirir a propriedade das coisas móveis que nunca pertenceram a
ninguém ou estão abandonadas, ou seja, a res nullius e a res derelicta:
- res nullius = coisa de ninguém
- res derelicta = coisa abandonada.
“Res nullius” são aquelas coisas móveis que nunca tiveram proprietário,
exemplo: concha marinha que o mar atira na praia, um animal selvagem, são
coisas que nunca pertenceram a ninguém – res nullius.
Já, coisas abandonadas são aquelas que já pertenceram a alguém, já
tiveram dono, mas que não mais se interessou em mantê-las em seu
patrimônio, preferiu então renunciar à propriedade, abandonando essas
coisas. Elas passam a ser “res derelicta” - coisas abandonadas - que não se
confundem com coisas extraviadas que são suscetíveis de ocupação. As coisas
extraviadas continuam tendo proprietário. O proprietário não tinha a
intenção de demitir-se da propriedade, portanto a coisa extraviada continua
a pertencer ao seu titular, por isso não são suscetíveis à ocupação.
A ocupação é privativa da “res nullius” e da “res derelicta”, ou seja, das
coisas móveis que nunca pertenceram a alguém, que nunca foram abandonadas.
Qualquer pessoa pode, então, assenhorear-se, apropriar-se dessas coisas.
Acrescentá-las ao seu patrimônio através da ocupação. Então, se eu vou
caminhando pela praia e vejo essa concha que o mar atirou na areia, eu me
abaixo e pego a concha, porque gostei do seu formato e das suas cores, levo
para minha casa para enfeitar um móvel, eu acabei de ocupar essa concha, e
adquirir a sua propriedade. Ela, que antes desse ato jurídico, não pertencia a
alguém, passou agora a pertencer a mim. Esse ato jurídico se chama,
tecnicamente, ocupação. Na linguagem comum, a palavra ocupação tem outro
significado, e muito mais usado para imóveis, quando é exatamente o oposto.
A ocupação só se verifica, em relação aos móveis. Não há aquisição de
propriedade imóvel por ocupação.
A ocupação é um ato jurídico “stricto sensu” e material. É um ato
jurídico, e, não, um negócio jurídico, porque o resultado da manifestação da
vontade do agente já está previsto em lei, e esse resultado é a aquisição da
propriedade. Toda vez que a vontade manda produzir resultados já previstos
em lei, isso é um ato jurídico e, não, um, negócio jurídico, portanto a ocupação
é um exemplo típico de ato jurídico e material, e, não, participativo, porque,
na ocupação, a lei não exige que o ocupante leve ao conhecimento de terceiros
a sua vontade, ou seja, eu posso abaixar-me, pegar a concha, levar para casa,
adquirindo-lhe a propriedade, não tendo que comunicar isso a quem quer que
seja. Eu não estou proibido de fazê-lo, mas também não estou obrigado a
fazê-lo. Isso é que se chama ato jurídico material. Já o ato jurídico
participativo é aquele que se pratica com a intenção de comunicá-lo a
terceiro, de levá-lo ao conhecimento de terceiro, por exemplo: a citação do
réu, de uma interpelação de devedor. Também a ocupação traduz um modo
originário e gratuito de adquirir a propriedade móvel:
Originário - porque a propriedade não é transferida ao ocupante por um
proprietário anterior, porque proprietário anterior não existe, nesse
momento. Se a coisa nunca pertenceu a alguém, é evidente que nunca poderia
ter havido um proprietário anterior, um titular da propriedade anterior, para
transferi-la ao adquirente. Se ela estava abandonada, no momento em que ela
foi abandonada, passa a não ter mais proprietário, então é um modo originário
de adquirir a propriedade;
Gratuito - porque é óbvio que quem está ocupando uma coisa que nunca
pertenceu a alguém e está abandonada não tem algum preço a pagar, nenhuma
contraprestação a pagar por ela, até porque não teria a quem pagar.
Então, a ocupação é um ato jurídico material, e uma forma originária e
gratuita de adquirir a propriedade móvel. Ela não exige nenhuma outra
solenidade; basta que eu pegue a coisa móvel e leve para casa, acrescentando-
a ao meu patrimônio, incorporando ao patrimônio.
Mas nem todas as coisas que não têm dono são passíveis de ocupação,
são objeto de ocupação. Há coisas que eu não posso ocupar, por exemplo:
poços minerais... determinadas coisas móveis que, por interesse científico,
cultural, ou até por segurança nacional, não podem pertencer a particulares.
Então, se na floresta eu encontrar um fóssil, eu não posso, simplesmente,
pegá-lo e levá-lo para casa; eu terei que entregá-lo a uma autoridade pública,
dado o interesse cultural de que essa coisa se reveste. Por isso é que o código
diz: quem se assenhorear de coisa sem dono, tão logo lhe adquire a
propriedade, não sendo essa ocupação defesa por lei. É o Art. 1263 CC/02.
Isso quer dizer que há coisas que não pertencem a alguém, mas que também
não podem ser ocupadas.
O que preocupa o aluno é saber se a coisa está abandonada ou
extraviada. Como saber? Porque, se ela está abandonada, eu posso ocupá-la.
Se ela está extraviada, eu não posso ocupá-la, ao contrário, eu tenho que
diligenciar e descobrir o proprietário e devolvê-la.
RESPOSTA: é de Ihering. Ele disse que só há um meio de se chegar a uma
conclusão; é pela experiência comum , dos fatos da vida. Aquilo que Ihering
chamou de situação de normalidade da coisa perante o meio em está inserida.
É aí que Ihering dá aquele famoso exemplo do viajante que segue por uma
estrada, e passa diante de um campo de feno, arado; e, pela margem da
estrada, um molho de feno amarrado, mas sem alguma placa indicando quem é
o proprietário, sem ninguém ao lado para guardar. Diz Ihering que o homem
normal não toca nesse molho de feno; ele sabe que não está extraviado, nem
está abandonado. Ele vê que, se ele está diante de um campo arado, ele
pertence ao proprietário do campo, que deve ter acabado de colhê-lo, e deve
estar aguardando transporte; então ele percebe que aquele molho de feno
está em situação de normalidade. É normal que, diante de um campo de feno
arado, se encontrem molhos de feno amarrado, defronte dele.
Continua Ihering: o homem continua a caminhar no campo, e passa
diante de uma casa em construção e vê, na margem da estrada, um monte de
tijolos, sem nenhum cartaz dizendo a quem pertencem aqueles tijolos; não há
alguém ao seu lado, dizendo para guardá-lo. O homem normal continua o seu
caminho sem tocar nos tijolos; ele sabe que eles não estão nem abandonados
nem extraviados; eles estão em situação de normalidade; ele sabe que, diante
da obra de uma casa em construção, é normal montes de tijolos. A presunção
é que os tijolos pertencerão a quem estiver efetuando a construção.
E, aí, diz Ihering, o homem continua a caminhar, e percebe, logo
adiante, um reflexo luminoso na margem da estrada. Curioso, se aproxima e
percebe que é uma cigarreira de prata. Esse homem, que não tocou no feno,
não tocou nos tijolos. Imediatamente, ele vai se abaixar, vai pegar a
cigarreira, e vai procurar o seu proprietário, porque o homem normal sabe que
aquela cigarreira não está em situação de normalidade, porque cigarreira de
prata, repetindo Ihering, não é para estar jogada na estrada, e, sim, para ser
guardada em uma gaveta, ou no bolso do seu proprietário. Se ela está na
margem da estrada é porque ela está extraviada. Aí ele percebe que a
cigarreira de prata está extraviada. O homem continua a caminhar na estrada
e percebe algumas mangas no chão caídas de uma árvore de um terreno
particular. Ora, essas mangas pertencem, em princípio, ao proprietário da
mangueira. Mas, como elas estão caídas na estrada, e o proprietário, ao que
tudo indica, não se interessou em colhê-las, esse homem normal não tem
dúvidas em recolhê-las, e levá-las para casa, porque o homem percebe que as
mangas do chão estão abandonadas, por causa do seu pequeno valor. O
proprietário delas não se deu ao trabalho de recolhê-las. Então, o homem
normal pode ocupar as mangas, e vai procurar o proprietário das cigarreiras.
São exemplos de Ihering.
De vez em quando, os jornais publicam: “MST OCUPOU MAIS UMA
FAZENDA”. O termo não é ocupou , porque ocupar ele quereria dizer que ele
adquiriu a propriedade da coisa abandonada, ou que nunca pertenceu a alguém.
Aí seria invadiu, ou esbulhou; na linguagem popular a palavra ocupar tem esse
outro sentido, e se refere mais a imóvel, ocupar uma casa, ocupar um terreno,
e não no sentido de adquirir a propriedade, e, sim, no sentido de adquirir a
posse. Você pode ocupar um terreno; aí você não está adquirindo a
propriedade, você está adquirindo a posse, porque você não adquire a
propriedade; com ocupação você está adquirindo é a posse.
Então, quanto à ocupação, nós já examinamos o seu significado e as suas
conseqüências na aquisição da propriedade.
Vejam como o direito dá significado jurídico a todos os atos humanos.
O leigo não vislumbraria o ato jurídico no fato corriqueiro de um sujeito
andando na praia, abaixar-se, pegar uma concha e colocá-la no bolso. Já o
advogado diria: eis a ocupação; eis a aquisição por ocupação de uma
propriedade móvel.
Em um ônibus, alguém pegar uma carteira perdida: “Olha! Uma
descoberta!”. Num supermercado, a dona de casa escolhe e pega um tomate
do balcão: “Olha! A concentração de um débito; a obrigação de dar coisa
incerta”. A dona de casa diz: “Eu não estou comprando tomates; estou
concentrando débitos na obrigação de dar coisa incerta”. Há uma linguagem
jurídica própria para os atos humanos. Passa um cachorrinho: “Olha! Lá vai um
semovente”.kkkkkkkkkkkkkkkk rindo alto.
Vimos, até aqui, dois modos de adquirir a propriedade móvel:
- pela usucapião
- pela ocupação.
O terceiro é do ACHADO DO TESOURO. E, aí, há uma outra mudança:
no código passado, era do TESOURO. Beviláqua usou a forma arcaica
portuguesa da palavra tesouro. Dirão vocês: “Tesouro não é uma coisa
abandonada?” Por que tratar diferente? Por que se fala na ocupação na
descoberta e se separa na hipótese de quando se fala do achado do tesouro
É porque o tesouro, meus amigos, não é uma coisa qualquer. O código dá uma
definição de tesouro. O que é um tesouro que pode ser objeto de achado? É
o depósito antigo de coisas preciosas.
É o 1º requisito: tesouro é composto de coisas preciosas, e antigas. Antiga
pode ser 500 (quinhentos), 100 (cem) anos; não é fixado; isso faz parte da
experiência comum. Então, é o depósito antigo de coisas preciosas.
O 2º requisito é que esteja oculto, pelo menos tem que estar demonstrado
que a intenção do dono é escondê-lo. Por isso é que, normalmente, todo
tesouro é encontrado escondido, enterrado, ou no fundo de cavernas.
O outro requisito é que não seja possível identificar o dono; não haja notícia
do dono; não haja memória do dono; não haja notícia de propriedade. Isso é
que é tesouro. Então, um depósito, antigo, de coisas preciosas, oculto, de cujo
dono não haja memória. Se for possível identificar o dono, ou seus herdeiros,
será uma coisa extraviada, terá de ser devolvida. Só será tesouro suscetível
de apropriação, se não for possível, ou não houver a memória do dono. E aí? O
que vai acontecer com quem achar um tesouro? Aí o código dá as regras:
-> Se quem achar um tesouro, em imóvel alheio, o fizer casualmente, por
exemplo: eu fui passar as férias na fazenda de um amigo, numa extensa
área rural. Quando eu estou lá, sem ter algo para fazer durante um mês,
eu resolvo peregrinar pela fazenda. Em uma de minhas andanças, eu me
vejo em uma gruta, até então desconhecida. Entro, e, lá, descubro um
tesouro, ou seja, eu encontrei um tesouro, em terreno alheio, e,
casualmente. É claro que, se encontro tesouro no próprio terreno, não
resta a menor dúvida quanto ao destino de tesouro: divide-se metade para
quem achou o tesouro, metade para o dono do solo. Agora, se quem achou
o tesouro é um empregado do dono do solo, ou alguém incumbido por ele
de procurar o tesouro, aí, é claro que o tesouro pertencerá, inteiramente,
ao proprietário do solo, porque quem achou estava se diligenciando para
esse fim, a mando do proprietário do solo. É o caso, por exemplo:
-> O proprietário de uma fazenda teve uma indicação, porque achou um
pergaminho que indicava que havia um tesouro naquele terreno, lá
enterrado. Então, ele contrata 10 (dez) homens para cavar o terreno todo
para encontrar o tesouro, e um deles encontra. Ele não pode reclamar
metade do tesouro, porque não o encontrou casualmente, ele encontrou
porque ele estava contratado pelo proprietário do solo para encontrá-lo.
É por isso que o artigo anterior fala “casualmente”. Da mesma maneira, se
eu não estava autorizado pelo proprietário a procurar o tesouro, se eu
entrei no terreno alheio sem o conhecimento do proprietário, e, lá, eu acho
o tesouro, ele pertencerá inteiramente ao proprietário do solo.
Nota 1: o “casualmente” quer dizer: sem oposição do proprietário, porque,
se há oposição do proprietário ou sem o conhecimento do proprietário, o
tesouro pertencerá integralmente ao proprietário do solo.
Nota 2: o caso concreto vai depender sempre do juiz. O novo código permite
ao juiz esta maior discricionariedade. Diante do caso concreto, com as regras
da experiência comum, o juiz decidirá se aquilo foi um achado casual, sem
oposição do proprietário, ou se, ao contrário, o descobridor infringiu a
confiança do proprietário, entrou sorrateiramente no imóvel.
Finalmente, a última hipótese, quando o tesouro é encontrado em um
terreno aforado. Aí, se o tesouro é encontrado casualmente, em um terreno
aforado, o tesouro pertencerá metade a quem o encontrou e metade ao
foreiro, e, não, ao proprietário. É uma regra diferente. Se o terreno é
aforado, e alguém ali encontrou um tesouro, casualmente, a metade do
tesouro será do descobridor, e a outra metade é do foreiro, e, não, para o
proprietário do terreno.
Quanto à questão do fundo do mar, vou acabar com desenho animado,
com infância de vocês kkkkkkkk, na realidade, não são tesouros, porque
resultam de naufrágios, não houve a intenção de ocultar, até porque o fundo
do mar tem legislação própria; quando é no fundo do mar, pertence à União;
quando é em mar territorial, então seria metade do descobridor, e metade da
União. Quando em mar livre, ai é de quem descobriu.
O outro modo de adquirir a propriedade móvel é a TRADIÇÃO. É
importantíssimo! Acho até que é o modo mais comum de todos. A tradição é
o modo de se adquirir a propriedade móvel por ato intervivos:
- compra e venda
- permuta
- dação em pagamento
- doação
- alienação (onerosa ou gratuita).
É a tradição que transfere a propriedade, ou seja, o comprador de uma coisa
móvel adquire a propriedade com a tradição desta coisa, ao passo que no
imóvel, como vocês já viram, não basta esta tradição, é preciso o registro do
título. Essa é a grande diferença:
Aquisição de bem móvel por ato intervivos: basta a tradição;
Aquisição de bem imóvel por ato intervivos: além da tradição, é preciso o
registro do título.
Há várias espécies de tradição, transferindo a propriedade. A primeira
é a TRADIÇÃO REAL. Outros preferem chamar de TRADIÇÃO FISICA.
É a coisa que é transferida fisicamente às mãos do adquirente. É a coisa de
pequeno volume, de pequena massa corporal, por exemplo: este código. Se eu
vender este código aqui à nossa colega, eu transferirei a propriedade
simplesmente entregando em suas mãos, e ela pode tomá-lo em suas mãos. O
tamanho e o peso do código permitem isso.
Assim, para as coisas pequenas em massa e volume, costuma-se fazer a
tradição física, real, e, quando eu passo a coisa para as mãos do adquirente,
com esse simples condão, eu estou transferindo a propriedade, não precisa
mais nada. Não precisa uma declaração formal, não precisa de um registro. O
puro gesto de entregar a coisa ao adquirente faz com que ele adquira a
propriedade.
Mas também pode ser uma TRADIÇÃO FICTA, simbólica, e, quando o
transmitente pratica um ato que denote, de maneira inequívoca, a intenção de
transferir a coisa não é transferência, uma entrega real, física, mas pratica-
se um ato, uma conduta que denote, inequivocamente, a intenção de entregar
a coisa e transferir a propriedade; por exemplo: a entrega das chaves do
automóvel vendido que se encontra em outro local. Reparem, eu estou
vendendo, aqui nesta sala o meu carro que está no estacionamento, a metros,
ou, até, a quilômetros daqui; por outro lado, eu também não sei como entregar
um carro nas mãos do adquirente, então o que faz o transmitente: entrega as
chaves e diz: “Olha, está lá na garagem”; é um gesto inequívoco, eu não preciso
entregar o próprio carro, ou as chaves da casa, embora a casa não seja móvel.
É imóvel, mas também mostra que essa tradição não transfere propriedade
com imóvel, mas, sendo coisa móvel, transfere. Então, a chave do carro
transfere a propriedade do carro, mas a chave da casa, não.
Também colocar a coisa à disposição do adquirente é uma tradição
ficta. Vou dar outro exemplo: eu vendi o carro que está na garagem de minha
casa, e vendi aqui nesta sala. As chaves estão na ignição do carro, ou no quadro
das chaves da garagem, eu não tenho as chaves comigo. Então, eu pego um
cartão e escrevo, dizendo assim: “Senhor porteiro, o portador está
autorizado a levar o meu carro, que eu acabei de vender nesta data”; e
entrego o cartão. Isso é tradição ficta, porque eu já coloquei a coisa à
disposição do adquirente. É um gesto inequívoco de transferir a coisa. Estou
autorizando a pessoa a apanhar a coisa e carregá-la. Então, não é preciso nem
eu pegar as chaves e entregá-las. Basta um bilhete dirigido a quem tem a
guarda das chaves, autorizando entregá-las. Agora, tem que ser um gesto
inequívoco, de transferir a propriedade.
A tradição também pode-se dar pelo CONSTITUTO POSSESSÓRIO.
É o que diz o Art. 1267, § único., por exemplo: eu vendo um automóvel e
combino com o comprador de continuar usando mais uns dias, mas transfiro
desde logo a propriedade. É o que se chama tradição pelo constituto
possessório.
É claro que essa tradição nenhum efeito produzirá, se depois o negócio
vier a ser desfeito, e vier a anular-se; a tradição se tornará ineficaz, não mais
será transmitida a propriedade (o pagamento é apenas uma obrigação da
compra e venda). Tem nada a ver com tradição. Muita gente pensa que a
compra e venda só se aperfeiçoa quando se entrega a coisa vendida, e se paga
o preço. Não é nem uma coisa nem outra. A compra e venda se aperfeiçoa no
momento do consenso. A entrega da coisa e o pagamento do preço são atos
da execução do contrato, e não do nascimento do contrato. Quando o
vendedor entrega a coisa ao comprador, ele não está fazendo nascer o
contrato de compra e venda, ao contrário, ele está fazendo a execução do
contrato de compra e venda; da mesma forma, quando o comprador paga o
preço, ele não está fazendo nascer o contrato de compra e venda, ao
contrário, quando o comprador paga o preço, ele está executando contrato de
compra e venda, porque contrato de compra e venda, assim como contrato de
doação, e o contrato de permuta, eles nascem no momento do consentimento,
ou seja, eles nascem no momento da aceitação da proposta.
Finalmente, os últimos modos de adquirir a propriedade móvel são:
- a especificação;
- a confusão;
- a comistão;
- a adjunção.
Vou fazer uma revelação: a figura da comistão, que existe desde os
romanos, e que estava lá no código de Beviláqua, e que sempre se chamou
comistão, por passe de mágica, passou a se chamar comissão, mas é um erro
material; continua sendo comistão. Risquem do código:
Comissão ---- NÂO
Comistão ---- SIM
Quando você está trabalhando uma matéria prima de espécie nova, ex.:
você está trabalhando a argila, e resulta daí a cerâmica ou um vidro; você está
trabalhando a areia e resulta daí um cristal. Isto é uma especificação: você
parte de uma matéria prima, e chega a uma espécie nova. É evidente que, se
a matéria prima é sua, a espécie nova também será. O problema é quando eu
construo a cerâmica com a argila do vizinho: o proprietário da cerâmica ou é
o proprietário da argila? O problema é o mesmo que quando eu construo
imóvel no terreno do vizinho. O assunto é resolvido pelo Art. 1269 CC/02,
que privilegia o trabalho o trabalho do especificador, valorizando o trabalho
humano: a arte, a técnica, o engenho, vejam que a matéria prima só em parte
era do especificador. Então, a cerâmica é do especificador, se não puder se
reduzir à forma original. Agora, toda a matéria-prima é alheia. Aí o
especificador tem que indenizar pelo valor da matéria-prima, se agiu de boa-
fé. Agora, se agiu de má-fé e for impraticável retornar à forma original, a
propriedade passará para o proprietário da matéria prima. Se eu sabia e usei
o barro do vizinho, a peça será dele.
Chamo a atenção de vocês para o § 2º do Art. 1270 CC/02, que
trata especificamente da pintura em relação à tela; ou a escultura em relação
à matéria prima; ou o escrito em relação ao papel. A quem pertencerá o
quadro pintado, a estátua esculpida, o escrito: aos proprietários da tela, do
mármore, do papel? É um problema seriíssimo, porque entra o trabalho
intelectual.
Exemplo clássico: um grande pintor, de férias, passeando nas matas do hotel
fazenda onde está hospedado, encontra uma tela em branco, jogada; ele pega
sua maleta, limpa a tela e, por alguns dias, pinta o quadro da bela paisagem. O
quadro vale uma fortuna. A quem pertence? Aí tem regra própria, porque a
especificação tem valor muito superior à matéria-prima: o quadro é do pintor,
e este terá que indenizar o dono do hotel, por ser dono da tela matéria-prima,
mas é uma exceção.
CONFUSÃO
O termo CONFUSÃO tem dois sentidos, em Direito:
1. confusão no direito das obrigações;
2. confusão nos direitos reais.
A confusão no direito das obrigações é quando as qualidades de credor
e devedor se fundem em uma mesma pessoa, ou seja, a mesma pessoa passa a
ser credora e devedora dela mesma. Eu passo a dever a mim mesmo. Isso é
uma confusão da obrigação. E o resultado jurídico da confusão da obrigação
é a extinção da obrigação sem o pagamento, porque não haveria qualquer
interesse econômico em alguém pagar-se a si mesmo. Em nada alteraria o seu
patrimônio, e o direito não se compadece com atos inúteis. É óbvio que a
confusão das obrigações só surge por um fato subsequente ao nascimento da
obrigação. É óbvio, pois eu não posso, ao longo do dia, pegar um papel e
escrever que “eu pagarei a mim mesmo R$ 1.000,00, ao final do dia”. A
confusão ocorre sempre depois que a obrigação já nasceu.
Exemplo: X emprestou a seu filho R$ 10.000,00, sendo este filho seu único e
universal herdeiro. Antes do vencimento do mútuo, o pai morre. No momento
em que o credor pai morreu, operou-se a confusão. O filho herdou o crédito
que o pai tinha para com ele, filho. É lógico que ocorreu a confusão do direito
das obrigações, pois é claro que ele não vai pagar os dez mil a ele mesmo, logo
extingue-se a obrigação sem pagamento.
Outro exemplo: o Banco A é credor do Banco B de 1 milhão. Antes do
vencimento, o Banco A incorpora o Banco B, assumindo o seu ativo e o seu
passivo; só que no passivo do Banco B está a dívida de 1 milhão com o Banco
A; então, o Banco A passou a dever a ele mesmo; também se resolve a
obrigação sem o pagamento. Para aquele 1º exemplo, lembro que, quando
minha filha me pede 10 mil emprestados, eu digo: “Filha, se eu jamais vou ver
a cor desse dinheiro, porque você jamais terá a intenção de pagá-lo, por ser
minha única herdeira, e, como você é advogada, o que você me pede não é um
empréstimo, é uma doação.” A não ser que eu fosse judeu, como aquele do
caso Jacob, que emprestou ao seu filho herdeiro Isaac, porque judeu não doa,
nem dá, nem ao filho herdeiro, e o fez com 10% de juro, e, quando soube que
o filho não ia suportar os juros, morreu de enfarte. É pura brincadeira. Que
me desculpem os judeus, pois eu não tenho qualquer tipo de preconceito racial,
nem religioso, nem de cor, nem qualquer preconceito discriminatório.
Também, quando dou aula sobre pagamento de terceiro não
interessado, o exemplo que dou é o meu. É quando o terceiro interessado não
tem obrigação de pagar, nem autorização pelo credor para pagar, mesmo
assim resolve pagar. É quando eu recebo em casa conta do Cantão, para pagar:
“quanto é, minha filha, não quero Cantão na minha porta. E ocorre sempre que
pai paga obrigação de filho maior. Então, a confusão do direito das obrigações
ocorre, quando as qualidades de devedor e credor se fundem em uma mesma
pessoa, passando o devedor a ser credor dele mesmo pela mesma obrigação,
e a confusão ocorre sempre depois de ocorrida a obrigação de um fato
superveniente à obrigação. Já no direito real, a confusão tem outro sentido.
Ocorre a confusão à luz dos direitos reais, quando dois líquidos se misturam,
não podendo mais ser separados; exemplo: água e álcool. É claro que, se a água
e o álcool pertencem a uma mesma pessoa, a confusão da mistura água e álcool
também pertencerá à mesma pessoa. O problema é quando a água e o álcool
não pertencem à mesma pessoa. E o que será a comistão?
A COMISTÃO é o mesmo que a confusão, só que, ao invés de ser a
mistura de 2 líquidos que não mais podem ser separados, é a mistura de dois
sólidos que não mais podem ser separados, como o bronze. O bronze é uma
comistão, porque é a mistura do níquel com o cobre. Uma vez fundidos, nunca
mais se separam.
E ADJUNÇÃO? É quando dois sólidos se misturam, não mais podendo
se separar, mas sendo possível distingui-los, exemplo: camadas distintas de
minerais, como gelatina, com camadas coloridas.
REGRA GERAL: as coisas pertencentes a diversos donos: a) confundidas,
b) misturadas, ou c) adjuntadas, sem o consentimento deles, continuam a
pertencer-lhes, sendo possível separá-las, sem deterioração - art. 1272
CC/02.
1ª REGRA: não sendo possível a separação das coisas, ou exigindo dispêndio
excessivo, subsiste indiviso o todo, cabendo a cada um dos donos quinhão
proporcional ao valor da coisa com que entrou para a mistura ou agregado -
Art. 1272, § 1º CC/02.
2ª REGRA: Se uma das coisas puder considerar-se principal, o dono sê-lo-á
do todo, indenizando os outros – Art. 1272, § 2º CC/02.
3ª REGRA: Se a confusão, comistão ou adjunção se operou de má-fé, à outra
parte caberá escolher entre: 1) adquirir a propriedade do todo, pagando o
que não for seu, abatida a indenização que lhe for devida, ou 2) renunciar ao
que lhe pertencer, caso em que será indenizado - Art. 1273 CC/02.
4ª REGRA: Aplicam-se as regras acima, mesmo que a união de matérias de
natureza diversa - Art. 1274 CC/02.
Este assunto ocorre pouco, mas vocês têm, na norma, com os Artigos
1272 até 1274 do CC/02, toda a aplicação técnica da lei, com clareza, a
solução técnica.
PERDA DA PROPRIEDADE
Como a propriedade é um direito, é importante saber como se perde
esse direito. Para perder a propriedade, os modos são os mesmos, quer
propriedade móvel, quer propriedade imóvel (embora diferentes na
aquisição).
ALIENAÇÃO - CUIDADO !!! Nem alienar é sinônimo de vender, nem
adquirir é sinônimo de comprar, embora vender seja uma forma de alienar,
mas doar também o é. Isto porque tanto a alienação quanto a aquisição podem
ser onerosas ou gratuitas:
VENDER
ONEROSA
COMPRAR
ALIENAR
ADQUIRIR
DOAR
GRATUITA
HERDAR
ALIENAÇÃO ONEROSA - É quando você transfere uma coisa ou direito a
terceiro, mediante uma contraprestação, exemplo: compra e venda; o
alienante transfere mediante contraprestação, ao vender; e o adquirente
também mediante contraprestação, compra. Então, na compra e venda, o
vendedor faz uma alienação onerosa, e o comprador faz uma aquisição
onerosa; já na
ALIENAÇÃO GRATUITA E NA AQUISIÇÃO GRATUITA - a
transferência se dá sem contraprestação, então o doador faz uma doação
gratuita, e o donatário adquire, gratuitamente, a coisa doada.
Então, perde-se a propriedade (móvel ou imóvel) por alienação, quer
seja onerosa ou gratuita. Por uma questão de hermenêutica, quando o código
não discrimina, você não poderá fazê-lo. Então, o Art. 1275, I CC/02 diz
alienação, não diz se gratuita ou onerosa, então é para ambas as formas.
A alienação é a forma de se perder a propriedade por ato intervivos.
Aí se incluem compra e venda, doação, permuta, dação em pagamento, em
todas essas hipóteses perde-se a propriedade por alienação. São chamados
atos translativos da propriedade. Isso tanto se aplica para bens móveis
quanto para imóveis. O que varia é a forma. Se se tratar de imóveis de valores
superiores a 30 salários mínimos, essa alienação tem que ser por instrumento
público, sob pena de nulidade; quer seja coisa móvel ou imóvel, com valor
inferior a 30 salários mínimos, a alienação pode ser feita de qualquer forma
– universal.
O segundo modo de perder a propriedade é pela: RENÚNCIA ;
E o terceiro é por: ABANDONO.
Vamos examiná-los em conjunto. Muita gente confunde renúncia com
abandono. O leigo não saberia distinguir: quando eu estou renunciando a
minha propriedade de quando eu estou abandonando a minha propriedade,
porque em ambos os casos o resultado é a perda da propriedade, e em ambos
os casos eu tive a intenção deste resultado: desfazer-me da propriedade,
emitir-me da propriedade.
Se eu levar ao conhecimento de vocês a minha intenção de desfazer-me do
livro da estante, estarei renunciando a minha propriedade.
Já no abandono o proprietário se demite da propriedade sem comunicar
a terceiros a sua intenção. É um ato puramente material.
Diferença:
RENÚNCIA - É ato participativo (com conhecimento a terceiros);
ABANDONO - não se destina ao conhecimento de terceiros.
Muita gente acha muito estranho: “Pode-se renunciar à propriedade
de um imóvel?” Sim ! Claro que pode! Mas não é simples. Tem-se que dirigir
ao oficial do registro de imóveis um requerimento expresso, dizendo isso:
“Fulano de tal, proprietário do imóvel da rua tal, nº tal, objeto da matrícula
nº tal, vem pela presente manifestar/apresentar sua renúncia à propriedade
tal”.
Você só tem que fazer isso. Venho comunicar minha renúncia, estou
renunciando a essa propriedade. E sabe o que vai acontecer ? O imóvel se
declara vago e é arrecadado, em três anos, se não me engano, pelo Município
onde se encontra situado. Se não estiver na posse de terceiro, três anos
depois ele será arrecadado pelo Município, passará a integrar o patrimônio do
município onde estiver situado.
É o que diz o Art. 1276 CC/02. Vejam o p. único do Art. 1275
CC/02. Só pode ser renunciado o imóvel que estiver registrado no Registro
de Imóveis.
Já o abandono, não! O imóvel não precisa estar registrado, porque o
proprietário não comunica isso.
Na prática, há uma dificuldade em identificar se um imóvel está
abandonado, porque o proprietário não colocou uma placa, dizendo: “abandonei
este imóvel”, ou: “este imóvel está abandonado”; você, simplesmente, se
desinteressa da propriedade, porque o abandono é um ato material. E aí há
alguns indícios que levam o homem comum à convicção de que o imóvel foi
abandonado. O fato de não mais pagar os impostos é um indício claro. Em
segundo lugar, deixar que o imóvel se deteriore, cresça o mato, se torne
terreno baldio, ou a construção ali existente se deteriore (se ele tem cônjuge,
ele só renuncia à meação dele). É evidente que é só a meação dele, como
ocorre na doação, ele só doa a meação dele. Já, se ele não tem herdeiros, ele
renuncia ao terreno todo.
Foi explicado também que a alienação não significa necessariamente
venda. A venda é uma modalidade de alienação, talvez até a mais frequente,
mas não é a única, já que a doação e a permuta, assim como a dação em
pagamento são exemplos também de alienação.
A alienação decorre do poder ou da faculdade de dispor da coisa.
Quando falamos sobre a propriedade e as suas faculdades, dizemos que são
3 as faculdades do proprietário: as de usar a coisa; tirar dela as suas
utilidades econômicas, ou seja, gozar da coisa e dispor da coisa. E, como o
proprietário dispõe da coisa, é óbvio que ele poderá aliená-la; é evidente que
há exceções a essa regra. Há coisas que são inalienáveis das quais o
proprietário não pode dispor.
Mas a regra geral é, ao contrário, a disponibilidade que permite ao
proprietário alienar a coisa. A alienação, portanto, é o 1º modo de se perder
a propriedade. O 2º é a renúncia que é um ato jurídico participativo em que
o proprietário resolve demitir-se do direito de propriedade comunicando sua
vontade a terceiros.
Quando se trata de imóvel, essa renúncia tem que ser levada ao
conhecimento do Oficial do Registro de Imóveis para o competente
cancelamento da matrícula. Renunciada a propriedade sobre o imóvel, o
Município onde ele se situa depois poderá arrecadá-lo para incorporá-lo ao
seu patrimônio.
O 3º modo de se perder a propriedade é o abandono, que se distingui
da renúncia, porque o abandono seria um ato jurídico material, e não se
destina ao conhecimento de terceiros. O proprietário que abandona a coisa
que lhe pertence, não está interessado de que o fato chegue a conhecimento
de outro.
O 4º modo é o perecimento da coisa, perde-se, portanto, o objeto da
propriedade, e como não há direito sem objeto, perecida a coisa sobre a qual
se exerce a propriedade, perde-se o próprio direito. Esse perecimento da
coisa pode se dar pela sua destruição física. Pode se dar porque ela está em
local conhecido, mas em que não possa mais ser alcançada, como as coisas que
caem, por exemplo.
Pode se dar porque a coisa é posta fora do comércio, como é o caso
de um terreno à beira mar, que seja coberto definitivamente pelo avanço das
águas, o terreno passa a ficar submerso, e por isso perde-se a propriedade.
Finalmente, o 5º modo é a desapropriação, que é um dos exemplos
mais típicos de um fato do príncipe, um ato de Estado, de poder, no qual
sacrifica-se um direito individual em prol do interesse coletivo, do bem
comum. Essa desapropriação, entretanto, se faz mediante justa indenização
do expropriado para compensar o MINUS patrimonial que a desapropriação
representa.
A desapropriação não se confunde com a requisição, porque na
desapropriação, o poder expropriante só pode se imitir na posse da coisa
expropriada após o depósito da indenização que pretende pagar. Enquanto que
na requisição, dispensa-se esse depósito, mas por isso mesmo é que a
requisição só se admite no Código Civil passado em tempo de guerra, nesse
NCC de eminente perigo social.
Uma dificuldade prática é saber quando o proprietário abandonou a
coisa que lhe pertence. Essa é sempre uma dificuldade prática, porque no
abandono o proprietário não comunica sua intenção a terceiros, ao contrário
da renúncia. É a experiência comum dos fatos da vida que nos ensina que
podemos considerar que um proprietário abandonou a coisa.
O § 2º do art. 1.276, CC, nos dá um critério para aferir essa
intenção do abandono. “PRESUMIR-SE-Á DE MODO ABSOLUTO A
INTENÇÃO A QUE SE REFERE ESTE ARTIGO (que é o artigo que trata do
abandono), QUANDO CESSADOS OS ATOS DE POSSE, DEIXAR O
PROPRIETÁRIO DE SATISFAZER OS ÔNUS FISCAIS.” Cessados os atos
de posse, ou seja, o proprietário não mais exerce a posse, não pratica,
portanto, qualquer ato de posse que denote a sua intenção de se valer da
propriedade, porque, como eu já disse, a posse é a otimização econômica da
propriedade, é através da posse que o proprietário tira da coisa as suas
utilidades econômicos.
Ora, se o proprietário não pratica mais nenhum ato de posse, ele não
está tirando da coisa qualquer proveito econômico, e se ainda por cima, deixa
de satisfazer os ônus fiscais, cessa o pagamento dos tributos, taxas que
recaem sobre a coisa, aí então, se presume o abandono.
Com isso encerramos o estudo da perda da propriedade. Observamos
que há casos de perda, em que a propriedade se transmite de um proprietário
anterior a um novo, como é o caso da alienação. Há casos em que essa
propriedade, ao se perder, não se transfere automaticamente havendo outro
titular, como no caso do abandono, em que a coisa fica DERELICTA, podendo
depois ser objeto de ocupação de 3º. Então, no abandono não há uma
transferência da propriedade, mas tão somente uma perda. Enquanto que na
alienação, perde-se a propriedade, mas ela é transferida ao adquirente, ao
alienatário.
Feitos estes comentários, complementando a aula anterior, podemos
tratar dos direitos de vizinhança, que constitui um tema sempre provocante
e muito ventilado em provas.
Direitos de vizinhança
Como o nome está dizendo direitos ou, como preferem alguns, deveres
de vizinhança, eu tenho a impressão de que a expressão deveres de vizinhança
traduziria melhor o instituto do que direitos de vizinhança, mas como o nome
está dizendo, são relações jurídicas que disciplinam a vizinhança, quer dizer,
são direitos que se concedem a proprietários ou possuidores de imóveis
vizinhos.
A sua criação pela lei decorre do fato de que a experiência nos
confirma de que a vizinhança é sempre turbulenta, conflituosa. A proximidade
física das pessoas traz extraordinários benefícios, mas também perigosas
ameaças, porque cada um é uma individualidade, sentimentos diferentes
ideais diferentes, e essas diferenças individuais costumam acentuar-se com
a proximidade física que muitas vezes elas explodem em conflitos.
Então, a ordem jurídica percebeu que a vizinhança poderia
reconjuntar um fator de desequilíbrio social, fator gerador de turbulência,
violência, daí a necessidade de criar certas condutas obrigatórias que
mitiguem o risco desses conflitos, e este é o objetivo desse direito de
vizinhança, tornar mais civilizada a relação de vizinhança, mais amena.
São condutas que se tornam obrigatórias para os vizinhos. Conta-se
que, uma vez perguntaram ao Rei Salomão, que passou a história da
humanidade como protótipo da sabedoria, perguntou-se então ao sábio Rei
Salomão, qual seria o pior castigo que se poderia dar a uma pessoa? E ele
imediatamente respondeu: DAR-LHE UM MAU VIZINHO, porque o vizinho
temos que tolerar a cada dia, o parente podemos passar meses ou anos sem
ver, mas o vizinho temos que ver e conviver diariamente. Portanto, não há
nada mais estressante do que a convivência diária com um mau vizinho.
Por que o Código Civil se preocupou tanto em estabelecer regras de
vizinhança, que para muitos leigos seria apenas normas sociais, de boa
educação, pertencendo, portanto, ao mundo das relações sociais? Porque o
legislador percebeu a importância dessas regras para se manter a paz social,
e essa é a função precípua do direito: assegurar a paz social.
Se todos os brasileiros conhecessem esses direitos e deveres de
vizinhança, muitos dos conflitos que hoje deságuam nas delegacias policiais,
nos hospitais e, as vezes, até nos cemitérios, seriam evitados.
Observação importantíssima para efeito de concurso, de prova...etc
blá blá blá, porque já foi perguntado pelo menos 3 vezes nos últimos 5 anos,
é quanto a NATUREZA JURÍDICA DOS DIREITOS DE VIZINHANÇA.
Seriam direitos pessoais, portanto, obrigacionais? Ou, ao contrário, seriam
direitos reais? Qual a natureza jurídica do direito de vizinhança?
Muitos candidatos seduzidos pelo fato da matéria estar disciplinada
no Livros dos Direitos das Coisas, portanto, entre os direitos reais, muitos
candidatos, com uma visão simplista do problema, respondem que são direitos
reais, sem o quê não seriam tratados no Livro dos Direitos das Coisas, e sim,
no Livro dos Direitos das Obrigações. Então, eles acham até que a banca foi
extremamente benevolente ao fazer uma pergunta tão fácil de responder,
porque muitos abrem o Código Civil e ao encontrar a disciplina dos Direitos
de vizinhança no Livro do Direito das Coisas, respondem logo que se trata de
Direitos Reais.
E, ao contrário do que imaginavam de receber a nota máxima da
pergunta, recebem um redondo e traumatizante zero, porque os direitos de
vizinhança são, sem a menor dúvida, relações obrigacionais, pessoais, e não
reais.
Agora, como relações obrigacionais constituem obrigações PROPTER
REM. Portanto, a natureza jurídica dos direitos de vizinhança é de obrigação
PROPTER REM, que são aquelas obrigações que recaem sobre uma coisa,
constituindo uma zona intermediária entre os direitos pessoais e os direitos
reais. É uma situação híbrida, essas obrigações propter rem, é como se
tivessem um pé no mundo dos direitos pessoais e o outro no mundo dos
direitos reais. E por quê? Porque são relações obrigacionais, mas que nascem
da propriedade ou da posse de uma coisa, e só subsistem enquanto o devedor
ou o credor forem os proprietários da coisa ou possuidores dela.
Essas obrigações estão, portanto, umbilicalmente ligadas à
propriedade ou à uma coisa, e por isso, os romanos chamavam PROPTER REM,
obrigações sobre a coisa, que aderem a coisa.
A obrigação de contribuir que recai sobre os ombros dos condôminos
é um exemplo também perfeito de uma obrigação PROPTER REM. Essa
obrigação de contribuir, a que chamamos de cota condominial, é uma obrigação
assumida pelos condôminos entre si, e que decorre do fato de serem todos
coproprietários de uma coisa. E só serão devedores da cota condominial
enquanto se mantiverem proprietários da coisa. Alienando os seus quinhões,
esses condôminos automaticamente deixam de ser devedores dessa
obrigação, que se transferirá ao adquirente da fração.
A cota condominial é o 1º exemplo sempre lembrado de uma obrigação
PROPTER REM. E o 2º é exatamente os direitos de vizinhança, que são
relações obrigacionais que nascem da propriedade ou da posse de imóveis
vizinhos.
Devedores e credores dessas obrigações são exatamente os
proprietários ou possuidores de imóveis vizinhos. Uma vez alienado o imóvel
por um dos proprietários, ele não mais será devedor dessas obrigações
perante o antigo vizinho, ele só será devedor e credor enquanto for vizinho.
Os direitos de vizinhança traduzem obrigações propter rem. Por
que então estão no Livro dos Direitos Reais? Não teria sido um erro
topográfico do legislador? O legislador teria se enganado, se distraído,
levando para o Livro dos Direitos Reais uma relação que é tipicamente
pessoal?
Não, é que o legislador achou que como essas obrigações visam
normatizar as condutas de proprietários ou possuidores vizinhos elas devem
então ser disciplinadas no capítulo da propriedade. Seria uma consequência
da propriedade. Então é uma questão prática, o legislador achou mais
adequado tratar da matéria no capítulo que versa sobre o Direito de
propriedade, que faz nascer essas obrigações.
Portanto, esses direitos de vizinhança transcendem os aspectos
puramente sociais, de conduta social, ética, de educação, de convívio educado
entre as pessoas, para se inserirem também no mundo jurídico. Portanto, é
uma matéria que interessa tanto ao direito quanto a própria ordem social.
O 1º desses direitos de vizinhança, é um dos mais importantes, é o
direito que se assegura a qualquer proprietário ou possuidor de imóvel de
exigir que cessem as interferências vindas de imóveis vizinhos e que coloquem
em risco a sua saúde, o seu sossego ou a sua segurança.
Portanto, quem é proprietário ou possuidor de um imóvel tem
automaticamente o direito de exigir não ser prejudicado pelo vizinho quanto
ao seu sossego, ou a sua saúde, ou a sua segurança, e por isso, o proprietário
ou possuidor que esteja sendo afetado pelo uso anormal do imóvel vizinho
poderá se valer do judiciário para fazer cessar essas interferências nocivas.
O Código passado, ao redigir esse dispositivo, fez de maneira muito
infeliz, e muitos dos equívocos da redação passada, foram corrigidos.
Em 1º lugar, no Código passado falava, no mesmo capítulo, em uso nocivo
e em mau uso da propriedade vizinha. Usava-se, portanto, 2 qualificações: uso
nocivo e, em outro local, falava-se em mau uso, e a doutrina discutia se mau
uso era sinônimo de uso nocivo. Não se entendia porque no Título do capítulo
falava-se em uso nocivo da propriedade, e depois no caput, em mau uso.
O NCC aboliu tanto a expressão uso nocivo quanto mau uso, que sempre
suscitaram profundas divergências de interpretação. Agora, fala-se em uso
normal e uso anormal.
Uso anormal será todo aquele que põe em risco a segurança, a saúde ou
o sossego do vizinho, seja ele qual for.
Uso normal é o que não causa dano ou prejuízo aos vizinhos, não afeta
esses valores fundamentais que são a segurança, o sossego e a saúde.
É claro que o Código não poderia ser casuístico, definindo de maneira
objetiva o que seria o uso anormal, isso competirá ao juiz, usando os critérios
da experiência comum e alguns princípios que o próprio Código Civil enumera,
e que veremos mais adiante.
Não há uma definição, e nem poderia haver no Código, do que seria o
uso anormal, isso seria impossível. Por mais criativo e imaginativo que fosse o
legislador, ele não conseguiria elencar todas as hipóteses em que o uso de uma
propriedade pudesse causar danos aos vizinhos.
É mais um exemplo de cláusula aberta. Quer dizer, quando o Código
Civil fala em uso anormal da propriedade vizinha isso é uma cláusula aberta,
significa dizer que caberá ao juiz, com sua experiência comum dos fatos da
vida, fechar esse conceito, diante do caso concreto, decidir se aquele uso já
ultrapassou os limites da normalidade.
Eu tenho dito, reiteradas vezes, que o NCC aumentou e muito a
discricionariedade dos juízes ao adotar essa técnica moderna alemã das
cláusulas abertas, iniciando assim, a era do Pós-Positivismo, deixando para
trás o positivismo estrito em que o legislador procurava manietar o juiz,
estabelecendo limites rígidos a sua atuação.
O NCC, ao contrário, deixa as mãos dos juízes mais livres para que
possam compor realmente os conflitos de interesse. Ex.: claro: coíbe-se o uso
anormal, e cabe ao juiz decidir se de fato esse uso é anormal.
Esse era o 1º equívoco: usar 2 expressões diferentes no mesmo artigo
– MAU USO e USO NOCIVO (art. 554, CC/16). Agora unificou-se, o mau uso
e o uso nocivo são agora uso anormal.
Outro equívoco imperdoável é que o Código passado falava em
proprietário ou inquilino de um prédio. Ora, inquilino é o locatário, portanto,
aquele que participa de um contrato de locação. A palavra inquilino, desde os
romanos - inquilinus - representava aquele que recebia de outrem a posse
direta de uma coisa para usá-la e gozá-la.
Numa interpretação literal, portanto, só poderiam manejar os direitos
de vizinhança, os proprietários ou locatários de prédios; o comodatário, para
citar um exemplo, não poderia se valer desse direito. O usufrutuário também
não, assim como o usuário ou o titular do direito real de habitação, porque
nenhum deles é proprietário e nenhum deles é inquilino.
É evidente que essa não era a intenção da lei, por isso a doutrina
interpretava o dispositivo, e isso era pacífico, entendendo que era uma figura
clássica de metonímia.
E aqui estaria outro exemplo, quando o Código falou inquilino, ele usou
uma das espécies do gênero possuidor, quer dizer. Ele não quis se referir
necessária e exclusivamente ao locatário, quis se referir aos possuidores que
não são proprietários da coisa, mas têm a posse.
Mas isso era uma regra de interpretação. Agora o NCC corrigiu, agora
diz “o proprietário ou possuidor”, agora não é mais preciso saber o que é
metonímia para interpretar o dispositivo, porque agora o legislador usou o
gênero, como também usou no art. 2º, não fala mais “todo homem”, par evitar
a dúvida colocou “toda pessoa”, usou o gênero. O NCC afastou as metonímias,
preferiu ficar com o gênero.
Outra questão interessante é que o NCC usa pela 1ª vez a palavra
interferências, que é mais abrangente. Interferências significa influência de
1 prédio sobre o outro. Tudo o que se faz num prédio, todos os
comportamentos que se tem na utilização de um prédio que possam se refletir
no vizinho.
Agora acabou essa discussão, porque fala-se apenas em uso anormal e
fala-se em interferências, como sendo qualquer comportamento que influa no
imóvel vizinho.
E finalmente, uma última observação, essa expressão propriedade
vizinha, no Código passado também se falava em propriedade vizinha. Numa
interpretação literal, e isso mostra mais uma vez o perigo da interpretação
literal, que nem sempre nos dá a verdadeira intenção da lei, nela só poderiam
reclamar contra essas interferências prejudiciais aqueles que fizessem
divisa com o prédio que estava sendo mal utilizado.
Então, eu só poderia reclamar contra o proprietário ou possuidor do
imóvel que fizesse divisa com o meu, chamado imóveis lindeiros, que vem de
linde, que é sinônimo de divisa, as lindes do Império Romano eram as suas
fronteiras.
Essa também não é a intenção da lei, nunca foi, então mais uma vez
entra a interpretação teleológica, que é muito melhor que a literal. Quando o
legislador falou em imóveis vizinhos, ele quis falar aqueles que podem influir
nos outros. Então, eu posso considerar imóvel vizinho, para efeito dos direitos
de vizinhança, um que esteja a 5 km do meu, separado por vários imóveis. Ex.:
uma fábrica cuja chaminé despeja fumaça tóxica, e é carregada pelo vento e
chega até uma casa a 5 km de distância. Para efeito de interferência
prejudicial, esta fábrica é um imóvel vizinho ao proprietário que está
sofrendo essas emanações.
Então, quando o Código dispõe, no art. 1.277, em propriedade vizinha,
não interpretem literalmente, como sendo aquela que faz divisa, e sim como
aquela que pode interferir no outro imóvel. O barulho excessivo pode ser
produzido numa casa afastada da minha por 5 ou 6 outros imóveis, mas desde
que o barulho chegue até a minha, ele está interferindo no meu sossego.
Assim, esmiuçamos a redação deste art. 1.277, porque uma
interpretação literal pode nos levar a uma conclusão completamente
diferente daquela que o legislador quis alcançar. Então, esse conceito de
imóvel vizinho não é medido geograficamente, e sim pela possibilidade de
interferência.
Outra questão é que o legislador referiu-se a 3 valores fundamentais,
que devem ser preservados: a SEGURANÇA, o SOSSEGO e a SAÚDE dos
vizinhos. Ora, se o legislador usou 3 palavras, é porque elas têm sentido
diferentes, senão usava só uma. O Código não é um dicionário para mostrar
erudição vocabular. O Código não usa palavras como sinônimos só para mostrar
erudição, se ele falou segurança, sossego e saúde são valores diferentes.
A SEGURANÇA está mais ligada à ideia de integridade física. Ex.: o
proprietário de um prédio descobre que no imóvel vizinho, o proprietário dele
guarda, numa casa ali existente, uma enorme quantidade de dinamite, de
explosivos, ou seja, o imóvel vizinho é um vulcão prestes a entrar em erupção.
Pode explodir a qualquer momento, e é claro que os efeitos da explosão
poderão atingir o imóvel vizinho. Então, ele tem o direito de exigir a remoção
desses explosivos.
Ou então, o proprietário do prédio percebe que na casa vizinha, de
madrugada, frequentemente, reúnem-se pessoas estranhíssimas, que chegam
todas envoltas em capas pretas, portando metralhadoras. A experiência
mostra que aquilo é estranho, então eu posso exigir que cessem aquelas
reuniões. Ou ainda, que no imóvel vizinho instalou-se um stand de tiro ao
alvo, que as balas podem se desgarrar alvo e atingir alguém no meu imóvel.
Esses são vários exemplos de interferências que colocam em risco a
segurança do vizinho, está ligada a integridade física. A própria fumaça é uma
interferência. Os conceitos se interpenetram.
O SOSSEGO diz respeito mais intimamente a direito de repouso, é uma
interferência que impede o repouso dos vizinhos, o sono. Isso está mais ligado
a produção de ruídos. Tudo isso se interpenetra, porque o ruído pode afetar
a SEGURANÇA e a SAÚDE. Mas a questão do sossego, está mais ligado a um
comportamento do vizinho que impeça o sono dos demais, por isso quase todas
as ações ligadas a questão do sossego dizem respeito a ruídos excessivos.
Hoje, há muitas ações contra templos religiosos que se valem de
autofalante para divulgar suas pregações. Danceterias, boates, fábricas que
têm apito.
Eu já fiz uma ação contra o barulho de uma torre de refrigeração de
um supermercado, é um caso concreto, porque no térreo do edifício há um
supermercado, que tem uma enorme torre de ventilação para manter os
alimentos refrigerados, e que funciona 24 h por dia, de dia é suportável, mas
de noite, os vizinhos diziam que não podiam dormir. Então, eles exigiam, nesta
ação, que o supermercado ou tirasse a torre de refrigeração, ou adotasse
medidas que fizessem cessar o barulho que ela produzia.
Não é só barulho, eu já tive um caso (não é mentira não kkk trago prova
material) que era contra um holofote. Era uma luz que se projetava para um
anúncio da parede de 1 edifício, que dava direto num quarto de dormir de um
dos apartamentos. Vejam que pode ser tudo que prejudique o sossego, o sono,
o repouso a que todos nós temos direito.
E finalmente, a SAÚDE, o nome está dizendo, são aquelas
interferências que podem causar doenças, patologias clínicas, fumaça tóxica
que causa doenças respiratórias, alergias. É claro que o barulho excessivo
também causa doenças, claro que este elenco não é taxativo, o juiz tem que
ver se a interferência pode afetar de qualquer maneira a dignidade da pessoa.
Como a todo direito corresponde uma ação que o assegura, o
proprietário ou possuidor de um prédio tem o direito de impedir as
interferências do vizinho que coloca em risco a sua SEGURANÇA, SOSSEGO
e SAÚDE, tem que haver uma ação própria para se obter essa finalidade, essa
ação é a conhecida ação de dano infeto, que é de índole possessória, porque
ela também protege a posse e não apenas a propriedade, porque é o
proprietário ou o possuidor, um inquilino pode propor com uma ação de dano
infeto contra o vizinho, proprietário do prédio, por estar colocando em risco
o seu sossego, assim como o comodatário, o usuário, o usufrutuário.
Então, a ação de dano infeto tem índole possessória, porque ela pode
ser manejada para defender a posse pelo possuidor, e não necessariamente
pelo proprietário, o DOMINUS, por isso que a doutrina inclui esta ação no rol
das ações de índole possessória, embora, obviamente não seja um interdito
possessório.
Esse risco a segurança também é frequentemente representado pela
ruína do prédio vizinho. Quer dizer, é muito frequente que o imóvel vizinho, a
construção vizinha se deteriore, não esteja sendo conservada pelo
proprietário ou possuidor, ameaça a ruir e, ao ruir, pode afetar meu próprio
imóvel. Então, também se incluem entre esse direitos de vizinhança, o direito
de exigir que o vizinho realize as obras de conservação no seu imóvel. Isso
também é muito comum com encostas, muros, divisórias, taludes que ameaçam
ruir com as chuvas.
Essa ação é muito frequente entre os proprietários ou possuidores de
imóveis, um mais alto e outro mais baixo. Onde o imóvel superior pela má
conservação ameaça ruir sobre o inferior, então, o proprietário do prédio
inferior tem o direito de exigir as obras de conservação para evitar essa
ruína, inclusive, também podendo exigir caução para prevenir a reparação dos
danos se a ruína ocorrer antes da reforma. Tudo isso se obtém em sede de
ação de dano infeto.
Claro que a doutrina se incumbiu de criar alguns princípios que deveriam
nortear o juiz para decidir uma ação de dano infeto, que aliás era uma ação
que todo juiz temia, era sempre uma ação difícil de julgar. Primeiro pela falta
desses critérios e segundo porque o juiz se via envolvido pela animosidade,
pelo acirramento de ânimos dos vizinhos. Mas eram contribuições
doutrinárias.
Agora não, agora o parágrafo único do art. 1.277 trouxe para o texto
da lei, ou seja, positivou esses princípios que antes eram meramente
doutrinários. Agora o juiz tem critérios legais para aferir se a interferência
é nociva ou não.
O primeiro critério que a doutrina sempre recomendou é o da
RAZOABILIDADE. Aliás, vivemos a era da razoabilidade, esta talvez seja
hoje um dos mais importantes princípios a nortear os comportamentos sociais.
Então, o juiz tem que ver se essa interferência do vizinho se enquadra
dentro da razoabilidade. Ex.: um autor reclama das festas do vizinho que o
impedem de dormir. O juiz pergunta, então quantas festas o vizinho faz por
ano? E ele responde: quatro, por que tenho 3 filhos. São aniversários dos
filhos e o meu aniversário ou da minha mulher. Está absolutamente dentro da
razoabilidade. Agora, se ele fizer 1 por semana o ano inteiro, isso já está além
da razoabilidade. É claro que a lei não pode estabelecer 4, 6, 8, isso é mais
uma cláusula aberta, para isso é que o juiz julgar com a experiência comum da
vida.
Ex2.: uma fumaça que quase sufocou o vizinho. Mas foi numa festa de
São João, 1 vez por ano, é razoável. Agora, todo dia o vizinho junta as folhas
e toca fogo, fazendo fumaça, não é razoável. Mas uma fogueira de São João,
1 vez por ano, é mais do que razoável.
O segundo critério é o da TOLERABILIDADE, que se associa ao 1º, um
decorre do outro. Quer dizer, as pessoas têm que ter um nível de tolerância
dos comportamentos vizinhos. Quem vive principalmente numa cidade, em
regime condominial, por exemplo, tem que tolerar certos comportamentos do
vizinho. Ex.: bate-boca entre marido e mulher de vez em quando, a descarga
do vaso sanitário da madrugada do vizinho, que parece o Niágara despejando
água às 3 h da manhã, durante o dia você nem percebe, mas às 3 h da manhã,
você acorda com o barulho da descarga. A máquina do elevador que às 2 h da
manhã é acionada por 1 vizinho notívago.
Sirene de polícia, de ambulância, freada de carro, a vida urbana nos
obriga a criar um nível de tolerabilidade a ruídos, a incômodos para mim, quem
não quiser sentir esses efeitos, vá morar num monastério medieval, nos Alpes,
lá há um silêncio sepulcral, ou vá aspirar a paz do cemitério. Isso não significa
dizer que temos que tolerar qualquer ruído, mas há um nível de tolerância, que
é um durante o dia, é outro durante a noite.
Aliás, criou-se entre os brasileiros leigos, uma ideia absolutamente
equivocada de que a famosa “Lei do Silêncio” só se aplica à noite. Esta lei não
existe, há toda uma legislação sobre Meio Ambiente, mas não há uma lei do
silêncio. Quantas vezes já se ouviu que não se pode reclamar do barulho,
porque ainda são 7 h da noite, por exemplo, as pessoas acham que é só a partir
de 10 h que a Lei do Silêncio se aplica. Nunca houve isso. Então, quer dizer
que você pode perfurar o tímpano do vizinho porque ainda é meio dia. Isso
nunca existiu.
O que há é que a legislação sobre ruído diminui a tolerabilidade a partir
de 10 h da noite. Então, até 10 h admite-se 85 decibéis, à noite são 60 ou 50
decibéis. Então, isso é uma ilusão dos leigos de que a “Lei do Silêncio” é só
para noite.
O que deve ser levado em conta pelo juiz é o nível de tolerabilidade,
ele terá que, durante a ação, interferir no caso de ter que haver mais
tolerância, que dá para aguentar. Assim, pessoas que moram principalmente
numa cidade em condomínio edilício têm que ter nível de tolerância.
O outro critério, também muito lembrado pela doutrina, é o da
ANTERIORIDADE. Quer dizer, vamos ver quem chegou 1º, o que não significa
que quem chegou 1º pode matar os vizinhos. Ex.: uma fábrica que faz muito
barulho, só que a fábrica já estava aqui, o sujeito fez a casa ao lado da
fábrica, e sabia que ia ter de suportar esse barulho.
O aeroporto de Congonhas, os vizinhos pediram seu fechamento, só que
mostrou-se que quando o aeroporto foi instalado, era um deserto, as casas é
que depois chegaram até a margem da pista.
Então, o princípio da anterioridade a doutrina também recomendava
que fosse examinado pelo juiz. Se você chegou sabendo que naquele local há
barulho, fumaça etc, você tem que ter um nível de tolerabilidade maior, já
devia estar psicologicamente preparado para esses incômodos.
O outro critério era o da VOCAÇÃO ECONÔMICA DO LUGAR,
dependendo do zoneamento urbano, ou seja, há bairros que são
tradicionalmente de vida noturna, restaurantes, bares, danceterias, como o
Baixo Leblon, Baixo Gávea etc. Quem compra um apartamento de 1º andar
dando para rua no Baixo Leblon, tem que saber que não vai dormir bem, vai
ouvir barulho de motocicleta, gritaria, risos. Agora, quem compra um
apartamento no Alto da Gávea tem direito a esperar silêncio, porque ali não é
um bairro com vocação comercial, e sim residencial.
Então, o zoneamento também vai influir nisso, a vocação econômica do
lugar, há bairros que tem vocação comercial, outros industriais como São
Cristóvão hoje. Quem compra um apartamento em São Cristóvão tem que ter
um nível de tolerabilidade para atividade industrial maior.
E, finalmente, o INTERESSE COLETIVO, é preciso saber se essas
interferências se justificam no interesse coletivo. Tudo isso era doutrina,
embora a jurisprudência acolhesse pacificamente.
Agora não, vamos ler o parágrafo único do art. 1.277, vocês vão ver que
esse parágrafo único nada mais é, senão a positivação desses princípios
doutrinários.
Então, agora os juízes têm previsão legal para aferir essas
interferências, e proibi-las ou autorizá-las. Agora é o legislador e não mais o
doutrinador que fornece ao juiz os critérios para ele julgar uma ação de dano
infeto.
E como se não bastasse, o art. 1.278 consagrou o último princípio
doutrinário, que é o da prevalência do interesse coletivo. Ou seja, o juiz pode
autorizar a continuação das interferências, ainda que prejudiciais, mas se o
interesse público prevalecer. É o sacrifício mais uma vez do direito individual
em benefício do interesse coletivo. Isso, aliás, é um dos princípios do NCC,
estamos vivendo uma época socializadora do direito, em que cada vez mais
vamos abandonando a proteção dos interesses individuais para priorizar os
interesses coletivos. Isso é uma tônica moderna do direito, a socialização do
direito.
A função social do direito é um dos paradigmas do NCC. Ex.: o juiz se
convence que a fábrica realmente está produzindo fumaça que causa alergia
aos vizinhos, doenças respiratórias, mas fechar a fábrica significa
desemprego para 1.000 pessoas e respectivas famílias, cessação de
recolhimento de impostos, uma série de consequências sociais muito graves,
como o desemprego, que na época de hoje é uma das maiores ameaças ao
equilíbrio social.
Então, se o juiz perceber ou entender que o interesse coletivo
recomenda a manutenção daquelas interferências, ele as autorizará. Mas,
dispõe o Código: “mediante indenização cabal dos vizinhos prejudicados”. Essa
regra tem sido criticada pelos ecologistas ortodoxos que têm um verdadeiro
horror à figura do poluidor pagador. Quer dizer, a Lei de Proteção ao Meio
Ambiente criou a figura do poluidor pagador, ou seja, em certos casos admite-
se a poluição, desde que se indenize, daí chamar de poluidor pagador. Ou seja,
eu poluo, mas pago, indenizo. Os ecologistas acham que não se deve admitir
isso, não se deve admitir nenhum poluidor, ainda que indenize o dano. E aqui
se mantém essa ideia do poluidor pagador, o proprietário ou possuidor de um
imóvel pode interferir na saúde, no sossego dos vizinhos, se isso for
recomendado pelo interesse coletivo, mas desde que indenize.
Os vizinhos que são obrigados a tolerar essas interferências, eles
poderão também exigir adoção de providências técnicas capazes de minorar
esses efeitos, está no Código também. Se os vizinhos provarem que já há
recursos técnicos capazes de mitigar esses efeitos, eles poderão exigir que,
além da indenização, sejam adotadas essas providências.
Um exemplo conhecido e concreto que ocorreu no Rio de Janeiro, há
alguns anos, quando houve uma ação coletiva movida pelos moradores de um
bairro em Duque de Caxias que sofriam das emanações vindas da Refinaria de
Duque de Caxias, da Petrobrás. A prova pericial provou que 80% dos
moradores sofriam de doenças respiratórias ou alérgicas provenientes da
fumaça, e porque a perícia mostrou também, que caprichosamente, naquele
local, o vento sopra quase sempre na mesma direção, e levava essa fumaça,
quase que diariamente, para esse bairro. Não havia a menor dúvida que a
Reduc estava colocando em risco a saúde dos moradores deste bairro, a prova
era inequívoca. E, por isso, o MP, numa ação coletiva, pedia o fechamento da
Reduc. O prefeito de Duque de Caxias procurou o juiz, e disse que se ele
fechasse a Reduc, o prefeito iria levar a chave da cidade, porque esta também
fecharia, porque ela gerava milhares e milhares de emprego de moradores do
Município, e isso seria uma crise social sem precedentes, além do que, a
receita do Município também se reduziria substancialmente, porque grande
parte dela era representada pelos impostos gerados pela atividade da Reduc.
O juiz viu-se diante de um terrível dilema, de um lado a saúde de quase
5 mil pessoas, eram os moradores do bairro que estavam evidentemente
prejudicados por aquela atividade, e de outro, o interesse coletivo.
A solução, como sempre, foi conciliatória. A perícia determinada pelo
juízo mostrou que havia meios de reduzir essas emanações e a sua toxidade,
instalando filtros nessas chaminés, equipamentos caríssimos na época,
sofisticados, que tinham que ser importados, mas o juiz então condenou a
Petrobrás a instalar esses filtros, e concedeu um prazo de 5 anos, de acordo
com a perícia, para que essas obras se concluíssem, e hoje já estão todas
concluídas, e o problema não desapareceu inteiramente, mas já está dentro
do nível de tolerabilidade.
Tudo isso está no Código Civil, que antes não estava. Agora está
expresso no art. 1.279.
Vejamos quais são os outros direitos de vizinhança. O 2º direito de
vizinhança tratado no NCC diz respeito às ÁRVORES LIMÍTROFES. Como o
nome está dizendo, são aquelas que nascem sobre a linha divisória, servem de
divisa ou de limite entre 2 imóveis, entre 2 prédios.
Quando o Código fala árvores, não está se referindo necessariamente
a uma mangueira, aquela visão clássica de um tronco, é qualquer vegetal que
sirva de divisão, pode ser uma cerca viva.
Os vegetais são usados, principalmente, na zona rural como divisa entre
2 prédios. A árvore limítrofe não se confunde com aquela que nasce em um
dos terrenos ou imóveis, e estende os seus galhos e as suas raízes ao imóvel
vizinho, isso é outra coisa. Aqui estamos nos referindo agora a uma árvore
que está exatamente sobre a linha divisória, ou que é usada para marcar a
divisa entre 2 prédios.
A lei estabelece sobre essas árvores limítrofes um condomínio legal,
necessário. Portanto, as árvores limítrofes pertencem em condomínio aos
proprietários vizinhos, e aí se aplicam todas as regras do condomínio, nenhum
deles poderá abatê-la sem a autorização do outro.
Os frutos naturais produzidos terão que ser repartidos igualmente
entre os condôminos, as despesas de conservação da árvore também terão
que ser suportadas igualmente pelos condôminos. Isso é o que se chama de
condomínio necessário. Por que necessário? Porque ele é imposto por lei,
queiram ou não os condôminos. Isso se aplica também às cercas vivas.
Outra situação muito frequente é quando a árvore nasce em um dos
imóveis, mas estende galhos e raízes ao vizinho. O Código também trata disso,
que é também fonte geradora de conflito entre vizinhos.
É evidente que a árvore é uma acessão natural do solo e como toda
acessão, segue a sorte do principal. Se a árvore nasce em solo particular
pertence ao proprietário do solo, isso é inequívoco. Então, a árvore que nasce
no meu terreno, a mim pertence, como acessão do solo.
Mas quando ela invade o imóvel vizinho com seus galhos ou raízes,
porque os vegetais estão se lixando para essas divisões jurídicas de
propriedade etc, isso gera sempre problemas e, por isso, o Código estabeleceu
algumas regras.
Ex.: os frutos pendentes, aqueles que ainda estão presos aos galhos,
mesmo já estando no espaço aéreo do vizinho, continua a pertencer ao
proprietário da árvore, porque eu já falei que a propriedade do solo estende-
se ao subsolo e ao espaço aéreo, até o limite da sua utilidade. Esses frutos já
estão indiscutivelmente no imóvel vizinho, mas como estão presos ao galho,
ainda continuam a pertencer ao proprietário da árvore. Portanto, o vizinho
não pode colhê-los sem a autorização do proprietário da árvore, não pode com
um bambu cutucá-los para fazê-los cair, nem pode colocar uma escada para
colhê-los. No momento, entretanto, que por força natural, esses frutos caem
sobre o solo do vizinho, passam a pertencer ao proprietário vizinho. Há uma
mudança do regime jurídico. Caídos ao solo, deixam de ser propriedade do
proprietário da árvore e passam a ser propriedade do vizinho, e isso para
evitar que o proprietário da árvore quisesse entrar no terreno do vizinho para
recolher os frutos que ali caíram, o que certamente seria repelido até com
violência.
Então, para impedir que o proprietário da árvore, dizendo-se
proprietário dos frutos que caíram no imóvel vizinho, entrasse no imóvel para
recolhê-los, o legislador prudentemente, disse que caído esses frutos ao solo,
por força natural, passam a pertencer ao vizinho.
Também se assegura ao vizinho o DIREITO POTESTATIVO de cerrar
os galhos e as raízes na linha perpendicular à divisa, e por isso ele não precisa
de autorização do dono da árvore, isso é um direito potestativo. O dono da
árvore não pode impedir isso, é um direito do vizinho cortar esses galhos e
essas raízes.
Um outro direito de vizinhança é a PASSAGEM FORÇADA. É um
direito de vizinhança que se confere aos proprietários ou possuidores de
imóveis encravados. O imóvel encravado é que não tem passagem direta para
rua, fonte ou porto. Quer dizer, se você não consegue chegar diretamente à
rua ou a uma fonte, ou ao porto, o seu imóvel encravado. E aí, o proprietário
ou possuidor desse imóvel tem o direito de constranger os vizinhos a tolerar
a sua passagem pelos imóveis vizinhos para chegar à rua, ou ao porto, ou à
fonte, daí chamar-se passagem forçada.
O NCC criou um novo direito de vizinhança, que não havia no anterior,
e muito semelhante a passagem forçada, criou a figura da PASSAGEM
FORÇADA DE CABOS E TUBULAÇÕES (art. 1.286 e 1.287), isso é fruto
da tecnologia moderna que não havia em 1.896. Ou seja, o homem moderno,
principalmente urbano, depende hoje tanto do ar e da água, quanto dos cabos
e tubulações, que levam à sua casa, água, energia, Internet, telefone. Nossas
casas hoje são um cipoal de cabos e tubulações, que nos conduzem energia,
luz, gás, telefone. E aí, tem surgido um problema sério. Muitas vezes, para
esses cabos e tubulações chegarem à uma casa, têm necessariamente que
passar por imóveis vizinhos, e isso vinha gerando sérios problemas entre
vizinhos, às vezes um vizinho não permitia que pelo seu terreno passasse um
cabo ou uma tubulação para chegar ao vizinho.
Já houve muitos conflitos por causa disso. Agora é a mesma coisa. o
proprietário do imóvel tem o direito de exigir, não é pedir, mas é exigir que
o vizinho tolere a passagem de cabos e tubulações, obviamente, quando
provado que é necessário passar pelo vizinho.
A indenização é devida quando se estabelecer, mas o proprietário
vizinho pode renunciar a ela.
Tanto a passagem forçada, quanto a passagem de cabos confere ao
beneficiário posse sobre essas passagens, ele é possuidor da passagem. Por
isso, se o proprietário vizinho obstar essa passagem forçada, fizer um muro,
uma cancela, uma porteira; cabe ação possessória, seja de reintegração de
posse, se o vizinho obstar inteiramente a passagem, fizer um muro no meio
da passagem, ou cabe ação de manutenção de posse, se apenas houver uma
turbação, uma dificuldade para o uso da passagem.
Então, a defesa da posse da passagem forçada e da passagem de cabos
e tubulações se fará pela via interdital. E o beneficiário, que é o proprietário
encravado, ele tem condição de possuidor dessa passagem.
Condomínio
O Condomínio etimologicamente já diz o que é; condomínio é.domínio
conjunto. O condomínio é uma exceção ao princípio fundamental da
propriedade e ao princípio da exclusividade. A propriedade nasceu para ser
exclusiva. Essa é a vocação natural da proprietário, porque isso corresponde
a natureza humana.
Os romanos já estabeleciam que se uma coisa pertence a um, não pode
pertencer a outro. Os romanos diziam que a propriedade de um sobre uma
coisa, exclui a de outro sobre a mesma coisa. Estabelece o princípio da
exclusividade. É um princípio fundamental, mas que não pode ser absoluto,
porque há situações que se torna inevitável essa divisão da propriedade entre
várias pessoas e sobre a mesma coisa, e, quando isso acontece surge a figura
do Condomínio.
O condomínio corresponde a composse em relação a posse, ou seja, a
composse está para a posse, como o condomínio para a propriedade
A composse é quando mais de uma pessoa exerce a posse sobre uma coisa
ao mesmo tempo e o condomínio quando duas ou mais pessoas exercem a
propriedade de uma coisa ao mesmo tempo.
O condomínio é uma situação anômala, antinatural, que contraria a
natureza humana. O legislador se preocupou em estabelecer regras de
conduta para os condôminos – direitos e deveres, pelos quais estão
subsumidos a fim de reduzir o risco de conflitos entre os condôminos.
O Novo Código Civil disciplina 3 modalidades de Condomínio, ao passo que
no Código Civil/1916 só disciplina 2 (o condomínio legal ou necessário e o
condomínio, que não possuía adjetivação, que hoje, se chama condomínio
voluntário).
As 3 modalidades ou espécies de Condomínio que o Novo Código Civil
disciplina são:
Condomínio necessário (é aquele imposto por lei independente da vontade das
partes, daí chamar-se necessário ou legal – ex: Condomínio que se estabelece
sobre as árvores limítrofes, sobre os muros divisórios, sobre as paredes
divisórias);
Condomínio voluntário ( antigamente, também chamado de tradicional ou civil,
porque era disciplinado pelo Código Civil) e o
Condomínio edilício (aquele que no passado se chamava condomínio especial ou
em planos horizontais, que era disciplinado na Lei 4.591/64 e não constava no
Código Civil/1916).
O condomínio especial tinha uma disciplina própria na Lei 4.591. Por isso,
essa Lei 4.591 era chamada de Lei de Condomínios e Incorporações, que se
dividia em 2 capítulos; no Capítulo I – disciplinava um condomínio já
constituído, em funcionamento, disciplinava os comportamentos e deveres dos
condôminos já estando o condomínio instalado; já no Capítulo II – disciplinava
do condomínio na sua fase de gestação, de formação, a que chamamos de
incorporação.
O Novo Código Civil incorporou para o seu texto, o Capítulo I da Lei
4.591, isto é, a disciplina do Condomínio já instalado, mas não trouxe o
Capítulo II, que trata das incorporações, com isso, continuou a Lei 4.591 em
vigor.
A Lei 4.591, está revogado apenas o Capítulo primeiro, pois o segundo
ainda está em vigor, não foi mexido.
Condomínio Necessário
Esse Condomínio não gera o menor problema, por isso o Código Civil só o
disciplina em 2 ou 3 artigos. É um condomínio que se estabelece sobre as
árvores limítrofes, ou sobre as paredes e muros divisórios. Aí, é evidente que
a árvore, ou o muro ou a parede, pertencerão em partes iguais aos
confinantes. Se a árvore é limítrofe, ela é em condomínio com o vizinho. Por
isso, ambos terão que contribuir para a sua conservação. Caso contrário, se
um dos condôminos quiser, poderá derrubar a árvore, o muro ou a parede, sem
o consentimento do outro. Os frutos naturais produzidos por essa árvore
terão que ser repartidos. Se há uma parede, os 2 condôminos terão que
contribuir igualmente para a sua manutenção, também não poderão derrubá-
la sem o consentimento do outro.
Condomínio Voluntário
Esse Condomínio o que o caracteriza é que nele a coisa pertence, toda
ela, aos condôminos que terão sobre ela, uma fração, um quinhão, uma porção,
não há, portanto, parte dessa coisa que pertença com exclusividade a um dos
condôminos. Essa é a principal diferença entre o condomínio voluntário e
condomínio edilício.
No condomínio voluntário só há coisa comum, enquanto no condomínio
edilício, coexistem partes da coisa que são comuns, pertencendo a todos os
condôminos e partes que são exclusivas de cada condômino.
Ex: de condomínio edilício: Entrada dos edifícios, mas sua sala é de
propriedade exclusiva; já no condomínio voluntário, isso não existe, toda coisa
pertence aos condôminos na proporção de seus quinhões. Esses quinhões não
precisam se iguais e é perfeitamente possível que os condôminos tenham
quinhões diferentes, uns maiores, outros menores. Mas, no silêncio do título
constitutivo do Condomínio a presunção é que as frações sejam iguais, mas
isso no silêncio do título constitutivo, porque ao contrário poderá estabelecer
essas diversidades de frações.
Duas regras fundamentais regem o condomínio voluntário:
A 1ª regra é que cada condômino poderá exercer sobre a coisa, todos os
poderes inerentes à propriedade, desde que não impeçam os demais
condôminos de fazerem o mesmo, porque na prática, é difícil que um
condômino saiba distinguir a linha divisória entre o seu direito de propriedade
e o do outro condômino, pois, na verdade, todos são proprietários.
A 2ª regra é que todos os condôminos são obrigados a contribuir para
as despesas de administração e a conservação da coisa comum na proporção
dos seus quinhões. Não estamos falando de apto, mas de condomínio
voluntário, porque apto já é condomínio edilício. Isso é uma obrigação de
contribuir que tem a natureza propter rem. Esse é um dos exemplos mais
perfeitos de obrigação propter rem – que é a do condômino com o condomínio
voluntário, onde o condômino tem que contribuir para a conservação da coisa
comum.
Como consequência lógica, se os condôminos têm a obrigação de
contribuir na proporção de seus quinhões para a conservação e a
administração, também tem o direito de partilhar, na proporção de seus
quinhões, os frutos, os produtos eventualmente, retirados da coisa comum.
Quem tem o ônus deve recolher os bônus. Então, se a coisa comum, produz
utilidades econômicas, como por exemplo, frutos naturais ou civis, ou
produtos, eles também terão que ser partilhados entre os condôminos, na
proporção de seus quinhões.
Se os condôminos por questão de urgência, tiver que fazer obra ou
despesa de conservação poderá depois regredir contra os demais para
reclamar-lhes as contribuições correspondentes. E do mesmo modo, o
condômino poderá exigir de um que recolheu com exclusividade, os frutos ou
os produtos, poderá qualquer condômino exigir a sua parte.
Outra característica fundamental do condomínio voluntário e por isso,
ele se chama voluntário, é que ele é por natureza divisível, significa dizer, a
qualquer tempo, independente de alegação de motivo, qualquer condômino,
poderá retirar-se do condomínio. Ninguém pode ser compelido a permanecer
ligado ou preso a um Condomínio voluntário contra a sua vontade, daí chamar-
se voluntário.
A regra geral é que o Condomínio Voluntário seja divisível, permitindo a
qualquer condômino, a qualquer tempo, retirar-se do condomínio, ou alienando
a sua fração, ou requerendo a extinção do Condomínio. Mas, nada impede que
se insira no título constitutivo do Condomínio uma Cláusula de Indivisibilidade,
que impede que qualquer condômino se retire do Condomínio. Só que esta
Cláusula de indivisibilidade só poderá ser instituída pela unanimidade dos
condôminos e não valerá por mais de 5 anos. Isso para permitir que a cada 5
anos os condôminos revejam a sua conveniência, de se manter ou não no
condomínio. Nada impede, é claro, a renovação dessa cláusula, por quantas
vezes os condôminos quiserem, mas a cada 5 anos todos terão que se reunir
para decidir se lhes convém manter a indivisibilidade. Basta que um decida em
contrário para a cláusula de indivisibilidade cessar.
Se ignorando a lei, os condôminos instituírem essa Cláusula de
Indivisibilidade por 10 anos, se entenderá como de 5 anos, e após 5 anos,
poderá ser expressamente renovada ou desaparecerá. O prazo que
ultrapassar 5 anos, considerar-se como cláusula não escrita. Essa regra é
importante, porque pelo menos a cada quinquênio, os condôminos poderão
decidir se lhes convém ou não manter a regra excepcional da indivisibilidade.
Se esse condomínio for instituído por doação ou por legado, o instituidor
também pode incluir uma Cláusula de Indivisibilidade, mas que também não
valerá por mais de 5 anos, a não ser que terminados os 5 anos, os condôminos
resolvam, renovar.
Então, o condomínio mesmo instituído por ato inter vivos ou decorrente
da morte, ele será sempre voluntário.
Portanto, num Condomínio Voluntário, não há uma obrigatoriedade de
uma eleição formal do administrador, o que já é uma diferença com o
condomínio edilício, em que o administrador se chama síndico, e a de ser
obrigatoriamente eleito, em Assembleia, expressamente convocada para esse
fim. Essa é uma diferença importante, porque no condomínio voluntário,
qualquer condômino que comece a praticar atos de administração sem
oposição dos demais, considera-se tacitamente escolhido como administrador
e é evidente que o administrador fica obrigado a prestar contas aos demais,
porque ele é um Representante Legal dos Condôminos, podendo praticar todos
os atos necessários a administração e conservação da coisa comum; ele atua
como mandatários dos demais condôminos, como representante dos demais
condôminos.
Questão polêmica e turbulenta no Condomínio Voluntário é quando um
dos condôminos resolver alienar o seu quinhão, porque é um direito seu, que
não pode ser obstado, e ele só não poderá alienar se estiver vigorando cláusula
de indivisibilidade, porque aí ele terá que esperar os 5 anos acabarem para só
então, não concordar com a renovação da cláusula e oferecer o seu quinhão a
venda. Mas, não havendo cláusula de indivisibilidade, a qualquer tempo o
condômino pode oferecer o seu quinhão para a alienação, por causa do direito
de propriedade.
O Novo Código Civil disciplinou sobre o direito real de preferência para
todos os condôminos, ou seja, os condôminos só poderão alienar o seu quinhão
onerosamente oferecendo aos demais condôminos. E os demais condôminos
terão então, preferência e igualdade de condições como terceiros para
adquirir o quinhão retirante.
Qual a razão de ser do direito de preferência ? É direito dos condôminos
não querer que um estranho ingresse no condomínio, que possa trazer
turbulência, abalar a harmonia dos condôminos; é um direito dos condôminos
não querer que um estranho venha participar dessa comunhão. Com o direito
de preferência os condôminos podem impedir isso, adquirindo o quinhão do
retirante.
E por que é um direito real de preferência ? Porque se o condômino
alienar onerosamente o seu quinhão a terceiro sem oferecê-lo aos demais
condôminos, este só poderão depositando o preço da venda anulá-la e
adjudicá-la compulsoriamente, o quinhão alienado. Não se trata, portanto, de
um mero direito pessoal, que se resolveria em perdas e danos em caso de
inadimplemento. É algo muito sério, porque o condômino se alienar
onerosamente o seu quinhão sem oferecer a preferência dos demais
condôminos, essa alienação pode ser anulada pelos demais condôminos. E isso
ocorrendo, ele terá que responder pela evicção perante o adquirente. É
evidente que essa preferência é em igualdade de condições.
Os condôminos não podem exigir que o retirante faça um preço menor a
ele, do que poderia obter de um estranho, por isso esse direito de preferência
tem que ser oferecido de maneira inequívoca, com a indicação precisa do
preço que o condômino pretende obter, a forma do pagamento e todas as
demais informações que permitam aos condôminos decidir se lhes convém ou
não a aquisição.
Uma questão interessante é se vários condôminos, se interessarem em
adquirir o quinhão do retirante. Ex: Imaginemos que sejam 20 condôminos de
uma Fazenda e um deles, resolva alienar o seu quinhão. Interessante, aqui não
prevalece a regra democrática da vontade da maioria – são 20 condôminos e
1 resolve retirar-se alienando o seu quinhão, os 19 não podem dizer que não
admitem que ele aliene o seu quinhão e se retire do condomínio – mesmo por
19 a 1, eles não podem decidir que o condomínio se manterá intacto, a não ser
é claro que haja cláusula de indivisibilidade. O condomínio retirante dirá que
não é uma democracia, onde 19 vence 1, mas onde 1 vence 19, vai prevalecer a
vontade individual deste se retirar do condomínio. É um direito potestativo
de qualquer condômino alienar o seu quinhão, retirando-se do condomínio, a
não ser que esteja em vigência cláusula de indivisibilidade.
Ex2: Se são 20 condôminos, e desses 20, 5 decidam exercer a
preferência, estão interessados em adquirir o quinhão do retirante nas
condições ofertadas. O Código resolve a questão: a 1a solução – seria os 5
condôminos adquirirem o quinhão do retirante em condomínio, ou seja, se
constituiria num novo condomínio dentro daquele anterior, isto é, aquele
quinhão do retirante passaria a pertencer 1/5 a cada um desses 5 condôminos
interessados na preferência. E essa fração de 1/5, se acresceria as frações
anteriormente retidas pelo condômino; a 2a solução – se os 5 condôminos só
se interessarem na aquisição com exclusividade, isto é, não quererem
partilhar o quinhão do retirante com os outros 5 condôminos interessados, o
1o critério de preferência diz que terá nesse caso preferência, o condômino
que tiver feito na coisa comum investimentos maiores, benfeitorias ou
acessões, em outras palavras, quem acresceu mais a coisa comum, valorizou
mais, terá a preferência sobre os demais – esse critério é puramente
econômico e o 2o critério – e se os 5 fizeram benfeitorias de valor igual ou
não fizeram benfeitorias nenhuma, aí o Código diz que terá preferência o
condômino que tiver quinhão maior – critério pela área e o 3o critério – e se
os quinhões forem iguais ? O CC/1916 daria como solução o sorteio.
Sorteio é o método rigorosamente previsto no Código, não é nenhum
atentado a dignidade da justiça.
Ex: A divisão de bens não havendo acordos entre os condôminos. O juiz
chamava os condôminos assim – os 5 são interessados e nenhum deles fez
benfeitorias, os quinhões são iguais – então, escrevia o nome de cada um no
papel, amassa, põe no chapéu e manda o escrivão tirar um papel e o nome que
sair a preferência será dele – isso no CC/1916.
Porém, o Novo Código Civil acabou com isso. O Novo Código Civil criou um
novo critério, que aí liquida. Faz-se uma licitação entre os interessados. Se
os 5 querem, não há investimentos maiores de nenhum deles e os quinhões são
iguais – então digam quanto cada um quer dar pela quinhão e ganhará o que
oferecer o maior lance. Isso é muito melhor, inclusive por retirante, porque
este vai obter o melhor aproveitamento econômico.
O Novo Código Civil eliminou esse método do sorteio entre os
condôminos e criou um método que me parece economicamente melhor,
principalmente para o retirante.
Se os outros condôminos não quiserem adquirir o quinhão do retirante e
também os estranhos não desejam ingressar nesse condomínio, só resta ao
retirante pedir a extinção do condomínio. Se não conseguir alienar aos demais
condôminos e nem aos estranhos, só resta extinguir o condomínio.
Há 2 maneiras clássicas de se extinguir o condomínio voluntário: a 1ª
maneira clássica é pela divisão da coisa comum, ou seja, divide-se a coisa entre
os condôminos, cada um receberá um pedaço da coisa que passará a lhe
pertencer com absoluta exclusividade, mas é evidente que essa solução só
será possível se a coisa comum admitir divisão física ou jurídica. Às vezes, é
possível dividir fisicamente, mas não é possível dividir juridicamente, porque
o Código de Obras não permite.
Ex: Uma casa que pertence a 5 condôminos que a receberam de herança.
Como eu vou partilhar uma casa em 5 pedaços, para que cada um passe a
exercer a propriedade exclusiva – um ficaria com o banheiro, ou outro com a
sala, outro com os quartos, ... Mesmo que fosse um terreno, às vezes, não se
pode dividir porque cada um ficaria com uma metragem inferior à mínima que
o Código de Obras admite, porque também há regras que impede a
pulverização do solo urbano. Você não pode ter um imóvel exclusivo que meça
2 x 4 m. o Município não vai permitir.
Ex2: Terreno de 12 x 15 m fisicamente é possível dividir por 12 pessoas,
mas juridicamente não daria, porque cada pedaço ficaria com uma metragem
inferior à mínima que o Código de Obras não permite.
Mas, existe uma ação própria para exercer esse direito, que se chama
ação de divisão de coisa comum que está rigorosamente disciplinado no Código
de Processo – como a cada direito corresponde a uma ação que o assegura, se
um condômino tem o direito de requerer a extinção do condomínio pela divisão
da coisa comum, se os outros não concordarem, se não se chegarem a uma
solução amigável, o condômino proporá ação de divisão, o juiz nomeia um
agrimensor ou um topógrafo, ou um perito, que proporá o plano da divisão.
Mas, essa divisão nem sempre é em partes iguais – porque essa divisão leva
em conta também os aspectos econômicos, como por exemplo, quem ficou
com maior área, ficou também com uma área de penhasco, de pouco valor
econômico. Para isso, é que funciona o perito que apresenta um plano de
divisão, em que considera também os aspectos econômicos.
Ex: Fazenda que possui área com um pântano, havia áreas montanhosas
com rochas e havia também uma vale extremamente fértil com água e é claro
que, quem ficar com o vale ficará com uma área menor, porque
economicamente equivale a maior área, mas que não tem tanta utilidade
econômica.
Por isso, é divisão não é fácil e às vezes, se exige uma ação própria para
a interferência de um perito.
Quando não é possível a divisão seja fisicamente, seja juridicamente, a
2ª maneira clássica de extinguir o condomínio voluntário é pela alienação da
coisa comum e para isso existe também uma ação própria – ação de alienação
de coisa comum. O condômino retirante então, propõe contra os demais, ação
de alienação. A coisa será avaliada pelo juiz, isto é, o juiz manda avaliar a
coisa e esta é levada à praça (se, coisa imóvel) ou a leilão (se, coisa móvel), a
não ser é claro, se os condôminos aceitem uma oferta particular, sendo todos
maiores e capazes. Mas, não havendo acordo entre eles, a coisa tem que ser
levada a alienação judicial. Isso, porque se presume que na alienação judicial,
se obterá o melhor preço. E aí, o dinheiro que é o mais divisível de todos os
bens, divide-se o dinheiro entre os condôminos na proporção de seus quinhões.
Também, o Novo Código Civil permite que qualquer condômino abandone
seu quinhão em benefício dos demais condôminos, se não quiser suportar as
despesas de conservação. Então, impossibilitado de suportas essas despesas
ou não se interessando mais, o condômino pode abandonar o seu quinhão em
benefício dos demais condôminos, onde o seu quinhão se incorporará aos
demais quinhões dos demais condôminos. Se o retirante abandonar o seu
quinhão em favor de um, será uma renúncia translativa e não abdicativa.
Outra característica do condomínio voluntário é que ele não é muito
solene. Ao contrário, é tudo mais ou menos deixado ao informalismo, como por
exemplo, não é necessário eleger um administrador, não há nenhuma
obrigatoriedade de uma convenção de condôminos, não há necessidade de
assembleias obrigatórias anuais, não é preciso lavrar ata. Isso é uma
diferença marcante em relação ao condomínio edilício, que é todo cercado de
solenidades e burocracias, com exigências de convenção registrada no
Registro de Imóveis, realização obrigatória de uma assembleia geral por ano,
eleição formal de síndico, prestação de contas, aprovação de orçamentos,
lavratura de atas de assembleia. Enquanto, o condomínio edilício é um rosário
de solenidades e formalidades obrigatórias, o condomínio voluntário é
extremamente informal e a razão dele ser assim é porque na prática o
condomínio voluntário não se compõe de muitos condôminos, embora não haja
limite de número de condôminos.
O condomínio voluntário, normalmente se estabelece com poucos
condôminos, que geralmente são parentes, porque receberam a coisa em
herança ou amigos que se juntaram, ou amigos que se juntaram para comprar
uma coisa. Por isso, não se sente essa necessidade de formalizar o condomínio
voluntário, porque são poucos em geral os condôminos ligados por laço
afetivos ou familiares, já o condomínio edilício se fosse deixado ao Deus dará
virava uma catástrofe. Há condomínios com 1.000 condôminos, que a quota de
cada um somada dá o orçamento de alguns Municípios brasileiro.
Ex: O síndico do Condomínio Golden Green da Barra da Tijuca manipula
um orçamento maior que muito Prefeitos dos Municípios brasileiros . então, é
evidente que se não houvesse um controle rígido, viraria um caus. Embora, já
seja um caus com todo esse controle, imagine sem controle, não dá para reunir
1.000 condôminos para decidir se vai ser possível determinada coisa.
Ao contrário do que ocorre no condomínio voluntário, em que essa
administração é muito informal, basta lhes dizer que o administrador do
condomínio voluntário não precisa nem ser formalmente eleito pelos demais.
O Código Civil diz que aquele condômino, do condomínio voluntário, que
começar a praticar atos de administração, sem oposição dos demais
condôminos, considera-se tacitamente escolhido como administrador, quer
dizer não é nem necessária uma eleição formal do administrador do
condomínio voluntário. Também não há necessidade desse administrador
prestar contas aos demais, a não ser que os demais as peçam.
No que tange benfeitorias, necessárias o sindico não precisa pedir
permissão, mas úteis e voluptuárias sim.
Também não é preciso haver reeleição, o administrador pode ir se
mantendo na administração até que os demais condôminos manifestem seu
desagrado e o destituam. Então vocês vejam que no condomínio voluntário há
muita informalidade. O motivo é que no condomínio voluntário não há um
grande número de condôminos e, geralmente esses condôminos, ou são
parentes, porque o condomínio voluntário estabeleceu-se causa mortis na
herança, ou são amigos que se reuniram para adquirir uma coisa comum.
Já no condomínio edilício a administração é extremamente formal,
solene. O condomínio edilício é organizado, no que tange a sua administração,
como um mini estado moderno, ele tem os seus poderes, tem o poder
executivo, tem o poder legislativo, que é a assembleia, tem até o poder
judiciário, que aplica multa, julga recursos. A assembleia exerce a função de
poder judiciário e de poder legislativo. A assembleia elabora a convenção, o
regimento interno.
Quem administra o condomínio edilício recebe o nome de síndico, sendo
ele o representante legal do condomínio edilício, o que significa dizer que é o
síndico que emite vontade em nome dos demais condôminos para exercer ou
proteger os seus direitos. O síndico é que praticará os atos judiciais ou
extrajudiciais necessários à defesa dos interesses dos direitos dos
condôminos. Isso para evitar que todos os condôminos pudessem manifestar
sua vontade. Ex.: para contratar um porteiro, todos os condôminos teriam que
assinar sua carteira de trabalho, o que seria impossível. Então, para evitar
isso, elege-se o síndico que representará os demais condôminos.
O síndico tem, portanto, os poderes de administração e de
representação. A lei 4.591 autorizava o síndico a delegar os poderes de
administração a 3ºs e era frequentíssimo que o síndico delegasse esses
poderes a uma empresa especializada em administração de imóveis,
devidamente autorizado pela assembleia, isso é óbvio.
Mas a lei anterior não admitia em hipótese alguma que o síndico
delegasse a 3ºs os poderes de representação. Ou seja, o síndico só poderia
delegar os poderes de administração, devidamente autorizado pela
assembleia, e podia então contratar uma administradora, que passava a
exercer toda a administração.
Essa administradora é que contrata os empregados, paga as taxas, em
suma, não é o síndico que faz isso, embora nada impeça que o faça; há síndicos
aposentados que tem tempo para resolver as questões do condomínio sem
precisar delegar a administração. Mas nos grandes edifícios isso é muito raro.
Mas os poderes de representação jamais podiam ser delegados, o síndico
seria o único representante legal do condomínio.
Só que agora o NCC, em surpreendente disposição que muda
completamente o perfil do condomínio, admite que o síndico possa também
delegar as funções de representação do condomínio, mas desde que
autorizado expressamente pela assembleia especialmente convocada para
isso. Então, agora o síndico pode não ter trabalho nenhum, porque ele pode
delegar as funções de administração a uma administradora e também de
representação. Portanto, um representante da administradora pode agora
comparecer a uma audiência representando o condomínio.
Além do síndico, é possível haver subsíndico, como também a lei prevê
a possibilidade de conselhos que auxiliem o síndico, como: o conselho
consultivo, ou conselho fiscal. Há uma diferença, a lei anterior exigia
obrigatoriamente pelo menos um conselho consultivo ou fiscal. O condomínio
tinha que ter um conselho, que podia acumular as funções de consultivo e
fiscal. Mas tinha que haver um conselho.
Agora é facultativo ter um conselho (consultivo ou fiscal). Agora pode
haver condomínio só com o síndico, sem nenhum conselho consultivo ou fiscal.
O que se exige é que haja, pelo menos uma vez por ano, uma assembleia geral
para aprovar as contas do síndico; eleger o novo síndico; do conselheiro, se
houver; aprovar o orçamento para o ano seguinte.
Além desta assembleia geral ordinária é evidente que o condomínio
poderá realizar quantas assembleias extraordinárias quiser. Se o condomínio
quiser realizar uma por semana, ninguém tem nada com isso. E essas
assembleias serão convocadas pelo síndico ou pelos conselhos, se houver, ou
por um número determinados de condôminos. Isso também terá que estar
previsto na convenção. Não havendo, a lei diz que os condôminos poderão
convocar essas assembleias.
Se o síndico não convocar essa assembleia, ¼ dos condôminos poderá
fazê-lo (art. 1.355).
Por que se criou essa regra? Porque o síndico poderia não ter interesse
em convocar assembleia se perceber que ela poderia lhe ser hostil, contrária,
para destituí-lo. Então é evidente que o síndico não teria interesse de
convocar essa assembleia. Por isso a lei atribui a ¼ dos condôminos a
faculdade de convocar assembleia diante da recusa do síndico.
O NCC trata da extinção do condomínio edilício nos artigos 1.357 e
1.358. Neste ponto há uma diferença importantíssima entre o condomínio
edilício e o condomínio voluntário. Como foi dito na aula passada, o condomínio
voluntário tem como característica a sua divisibilidade, qualquer condômino a
qualquer tempo pode requerer a extinção do condomínio voluntário, se os
demais não quiserem adquirir o seu quinhão.
O condômino que quiser se retirar do condomínio voluntário não pode
ser obstado pelos demais e, se os demais não quiserem adquirir o seu quinhão,
ele requererá a extinção do condomínio, ou pela divisão da coisa comum, se
isso for física ou juridicamente possível; ou pela alienação da coisa comum, se
a coisa for indivisível. Isso é um direito potestativo de qualquer condômino,
daí se dizer que o que caracteriza o condomínio voluntário é a sua
divisibilidade. Tanto que eu lhes expliquei que é possível que os condôminos
impeçam essa divisão, mas a cláusula especial expressa que impede a extinção
do condomínio voluntário só pode ser estabelecida para valer pelo prazo
máximo de 5 anos, isso para permitir que a cada 5 anos os condôminos do
condomínio voluntário possam exercer o seu direito de extinguir o condomínio.
Essa cláusula pode ser renovada quantas vezes os condôminos quiserem, mas
a cada 5 anos todos os condôminos terão que decidir se lhes convém ou não
manter a indivisibilidade, e basta que um condômino não queira renovar essa
cláusula para que ela desapareça e a partir daí qualquer um poderá requerer
a extinção do condomínio.
Bom...agradeço a todos, de forma coletiva e individualizada, por
compartilhar comigo mais uma etapa da vida de vocês....desejo a cada um que
sejam bons, justos, afetuosos...mergulhem fundo, sonhe alto, acreditem em
uma Deus verdadeiro, e façam parte de vocês.
Qualquer coisa, estou aqui...com muito respeito e carinho um Bjs e um
sorriso.
Firmino.
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