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ARTIGO ORIGINAL: Peres, B., Alvim, I., Ferreira, I., Sena, J., Antunes, A., Santos, S. (2019) Quality of Life in Dementia: an exploratory study about the perception of elderly and their caregivers, Journal of Aging & Innovation, 8 (1): 97 - 116
JOURNAL OF AGING AND INNOVATION, ABRIL, 2019, 8 (1) ISSN: 2182-696X http://journalofagingandinnovation.org/ 97
Qualidade de Vida na Demência: Um estudo exploratório que avalia a perspetiva da pessoa e do seu cuidador
Quality of Life in Dementia: an exploratory study about the perception of elderly and their caregivers
Calidad de Vida en la Demencia: Un estudio exploratorio que evalúa la perspectiva de la persona y de su cuidador
Peres, Bruno 1; Alvim, Inês2; Ferreira, Inês3; Sena, João4; Antunes, Ana5; Santos, Sofia6
1-5 Faculdade de Motricidade Humana -Universidade de Lisboa, 6Faculdade de Motricidade Humana; UIDEF – Instituto da
Educação; Universidade de Lisboa
Corresponding Author: sofiasantos@fmh.ulisboa.pt
Resumo
A QdV tem vindo a conhecer um interesse crescente ao nível da reabilitação, especialmente no âmbito das populações
vulneráveis, onde se incluem os idosos com demência. O objetivo deste artigo é comparar a perceção da QdV entre idosos com
e sem síndrome demencial, e compreender as relações das suas perceções e dos seus cuidadores. A amostra foi constituída
por 74 participantes dos quais 60 correspondem a idosos com e sem síndrome demencial, entre os 64 e os 96 anos (81.8±8.11),
23 do género masculino e 37 do género feminino, e 14 aos respetivos cuidadores, que responderam à DEMQOL (escala de
avaliação da qualidade de vida). Todos os participantes com síndrome demencial apresentavam um valor médio de 22 no Mini
Mental State Examination (comprometimento cognitivo ligeiro). Os resultados apontaram para uma melhor perceção da QdV em
idosos sem demência em todos os domínios, verificando-se que os cuidadores dos sujeitos sem demência subestimam a QdV
dos sujeitos, enquanto os cuidadores dos idosos com demência sobrestimam a QdV dos seus familiares/clientes. A identificação
dos domínios que influenciam a QdV do idoso permite uma intervenção centrada na pessoa e na valorização do seu papel ativo,
para uma vida mais funcional e com mais qualidade.
Palavras-chave: Qualidade de Vida; Demência; DEMQOL; Sentimentos; Memória; Quotidiano;
Peres, B., Alvim, I., Ferreira, I., Sena, J., Antunes, A., Santos, S. (2019) Quality of Life in Dementia: an exploratory study about the perception of elderly and their caregivers, Journal of Aging & Innovation, 8 (1): 97 - 116
Artigo Original
ARTIGO ORIGINAL: Peres, B., Alvim, I., Ferreira, I., Sena, J., Antunes, A., Santos, S. (2019) Quality of Life in Dementia: an exploratory study about the perception of elderly and their caregivers, Journal of Aging & Innovation, 8 (1): 97 - 116
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Abstract: Quality of Life (QoL) has become increasingly relevant in rehabilitation field, especially among vulnerable populations,
including elderly people with dementia. This article aims to compare the QoL’ perception between elderly with and without
dementia syndrome as well as to understand the existing relationships between these elderly’s and their caregivers’ perceptions.
The sample consisted of 74 participants, of whom 60 corresponded to the elderly with and without dementia syndrome, between
64 and 96 years (81.8±8.11), 23 males and 37 females, and 14 to their caregivers. The scale of evaluation of the quality of life for
the elderly with and without dementia (DEMQOL) was applied in its double version. Mini-Mental State Examination (MMSE)
evaluated the cognitive capacity of the elderly which were mainly in mild level. Results points out to a better perception of QoL by
elderly without dementia in all domains. Caregivers of the participants without dementia tends to underestimate the QoL of their
family member, while caregivers of the elderly with dementia tend to overestimate. The identification of domains and predictors
of QoL of the elderly, will allow a person-centered intervention for a more functional and happy life.
Key-words: Quality of Life, Dementia; DEMQOL, feelings; memory, everyday;
Introdução
A concetualização e avaliação da qualidade de vida (QdV) tem conhecido um
interesse crescente nos mais diversos contextos (Cordner, Blass, Rabins & Black,
2010), com o foco a redirecionar-se para as populações mais vulneráveis como as
pessoas com demência (Banerjee et al., 2009). Os resultados de uma avaliação
validada e fiável da QdV tem repercussões na alocação de recursos e monitorização
dos programas e apoios disponibilizados (Buntinx & Schalock, 2010). A QdV define-
se como a forma como a pessoa perceciona a sua vida tendo em conta o contexto
onde se insere e os valores culturais que a influenciam (WHOQOL Group, 1994),
caracterizando-se por ser um constructo multidimensional, influenciado por diversos
fatores pessoais e contextuais (e.g.: espirituais, apoios - Renwick, Nourhaghighi,
Manns e Rudman, 2003).
Para Round, Sampson & Jones (2014) os modelos atuais de compreensão e
avaliação da QdV das populações vulneráveis carecem de mais investigação para a
sua validação, reforçando a necessidade de adaptação aos diferentes subgrupos
populacionais, pelo que os instrumentos devem considerar as características da
população-alvo, tais como as pessoas com maiores necessidades de apoio ao nível
das decisões sobre a sua própria vida, destacando as pessoas com demência.
A demência é uma das perturbações neurodegenerativas associadas ao
envelhecimento, com um aumento significativo nos últimos anos a nível nacional
(Santana, Farinha, Freitas, Rodrigues & Campos, 2015). A demência caracteriza-se
por uma deterioração das funções cognitivas (e.g.: limitações de memória podem
condicionar o reconhecimento de familiares), físicas e comportamentais (e.g.:
agitação, ansiedade, depressão) com consequências ao nível de maiores limitações
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funcionais nas atividades de vida diária e sociais (Landeiro et al., 2018), com
alterações na personalidade e na capacidade de autonomia (Moley, MCallister,
Venturato e Adam, 2007). As pessoas com demência tendem a apresentar
dificuldades ao nível da atenção, comunicação (expressiva e recetiva), memória e
funcionamento executivo comprometendo a compreensão dos conceitos (dadas as
limitações no armazenamento e processamento de informação), a orientação
temporal, a tomada de decisões e a funcionalidade diária (Moley et al., 2007; Smith et
al., 2005).
A abordagem atual da demência, baseado nos modelos concetuais de
reabilitação, centra-se na maximização e manutenção da QdV (Ettema, Dröes, Lange,
Mellenbergh, & Ribbe, 2005) cuja avaliação assume um papel-chave nos resultados
pessoais (Moniz-Cook et al., 2008) e que implica a perspetiva subjetiva e resultante
da experiência da pessoa (com demência) que caracterizará a satisfação em
diferentes domínios da vida diária (Ettema et al., 2005).
Perales, Cosco, Stephan, Haro & Brayne (2013) acrescentam a tendência atual
para a estratégia multipercetiva (informação por diferentes respondentes) com a dupla
versão nas escalas para a avaliação da QdV do idoso com demência: autorrelato e
relato por terceiros. No entanto, realça-se a tendência para resultados inferiores por
parte dos cuidadores (Smith et al., 2005), mais significativa nos cuidadores informais
dos idosos com demência, devido à maior sobrecarga (Chiao, Wu e Hsiao, 2015). A
perceção dos cuidadores pode ser limitada pela dificuldade em distinguir a sua própria
experiência da do paciente e poder ser mais positiva no caso dos cuidadores formais
como forma de validação das suas práticas (Clare, Quinn, Hoare, Whitaker & Woods,
2014).
Daí se infere a importância da perceção individual na avaliação da satisfação com
a vida e das evidências sobre a capacidade das pessoas com demência (ligeira e
moderada) poderem avaliarem a sua QdV (Smith et al., 2005; Woods et al., 2014). A
QdV deve ser avaliada pelo próprio que deve atribuir o significado e importância aos
eventos, à provisão e monitorização dos apoios, tornando-se parte ativa na sua
própria vida (Edelman, Fulton, Kiuhn & Chang, 2005).
Os diferentes estádios da demência, associados à deterioração das capacidades
cognitivas e funcionais, bem como a mudança de ambiente físico e social e a
progressão da perturbação, influenciam a QdV destas pessoas (Jing, Willis, Feng,
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2016). As evidências têm apontado os domínios do humor, capacidades funcionais,
interação social, capacidades cognitivas e saúde física como importantes na QdV
destas pessoas (Missotten, Dupuis & Adam, 2016; O’Rourke, Duggleby, Fraser e
Jerke, 2015). As pessoas com demência necessitam de se sentir envolvidas em
atividades que consideram significativas para a sua saúde e bem-estar (Renwick et
al., 2003) sentindo-se valorizados (Chung, 2004). A transição de domicílio para
ambientes institucionais, com alteração das suas rotinas diárias influencia
negativamente a QdV (Albert et al., 1996), verificando-se níveis superiores de QdV de
idosos com demência que vivem na comunidade vs. institucionalizados (Nikmat,
Hawthornem & Al-Mashoor 2015).
Inouye, Pedrazzani, Pavarini & Toyoda (2009) avaliaram a perceção da QdV de
indivíduos com síndrome demencial e dos respetivos cuidadores. Os 106
participantes, dos quais 53 tinham demência, e os respetivos cuidadores preencheram
a Escala de Avaliação da QdV na Doença de Alzheimer. Os sujeitos com síndrome
demencial sentem que têm menor disposição nas tarefas diárias ao contrário do seu
cuidador (que classifica a disposição como boa), o que também se verifica nos
domínios relacionados com a realização das tarefas diárias e do lazer. Ao nível do
humor, existe uma concordância entre respondentes, i.e.: idoso com demência e
cuidador, que o classificam como “bom”. No âmbito da memória existiu uma
discrepância significativa: os participantes com demência classificam a sua memória
como má e os cuidadores como boa. Na perceção da vida em geral, os idosos com
demência consideraram a sua como regular, enquanto os seus cuidadores a
classificam como boa (Inouye et al., 2009).
Missotten e colaboradores (2008) compararam a perceção da QdV de idosos com
e sem síndrome demencial, aplicando a Alzheimer's Disease-Related Quality Of Life
(ADRQOL). O grupo de idosos com síndrome demencial apresentou resultados
inferiores nos domínios: interação social, autoperceção/autoconsciência, sentimentos
e estado de espírito, atividades e resposta a estímulos, traduzindo-se numa
diminuição da sua QdV. Brod, Stewart e Sands (1999) avaliaram cinco cuidadores de
pessoas com demência, seis prestadores de serviços e seis pessoas com demência
ligeira, e os resultados apontaram para que o humor, sentimento de felicidade,
capacidade de tomar as próprias decisões, sentir-se amado e ausência de
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preocupações, frustração, ansiedade, tristeza, solidão, medo e irritabilidade são
fatores fundamentais para garantir uma boa QdV em sujeitos com demência.
Almeida e Crocco (2000) investigaram o acordo entre as perceções de idosos com
doença de Alzheimer (DA) e dos seus cuidadores, sobre as dificuldades cognitivas e
alterações no comportamento. Os 60 participantes (dos quais trinta tinham DA) e os
seus cuidadores responderam ao Questionário de Demência ampliado (QD-A). Os
participantes foram ainda avaliados pelo Mini Mental State Examination (MMSE). Os
idosos apresentam uma perceção limitada dos défices cognitivos e das alterações do
comportamento, i.e., com menores resultados no QD-A, ao invés dos seus cuidadores,
podendo ser justificado ou pelos idosos subestimarem as suas dificuldades
intelectuais e em atividades de vida diária, ou os seus cuidadores sobrestimarem as
dificuldades evidenciadas pelos idosos.
Trentini, Chachamovich, Figueiredo, Hirakata e Fleck (2006) averiguaram a
perceção de QdV de 54 idosos, os quais 27 tinham síndrome demencial) e respetivos
cuidadores através da WHOQOL-100, constatando-se que as diferenças significativas
entre os dois grupos, se verificaram ao nível dos domínios psicológico (sentimentos e
autoestima), relacionamento social e qualidade de vida em geral, nos quais os
cuidadores responderam em média perceções menores em comparação com as
perceções do próprio idoso.
Baseados na escassez de evidências e na necessidade de identificar as
similaridades e diferenças na perceção de qualidade de vida dos idosos a nível
nacional, com instrumentos elaborados para este subgrupo, este estudo apresenta
como objetivo a análise comparativa da perceção de QdV entre idosos com e sem
demência, e dos respetivos cuidadores, tentando identificar os pontos estratégicos
para melhores práticas e potenciar os resultados pessoais destes sujeitos.
Método
Amostra
A amostra do estudo envolveu um total de 74 participantes: 60 idosos (30 com
demência e 30 sem demência), entre os 64 e 96 anos (81.8±8.11), 23 do género
masculino e 37 do género feminino, e 14 cuidadores. Dos 30 idosos com diagnóstico
de síndrome demencial, e idades a variar entre 66 e 96 anos (83.3±7.47), 19 eram do
género masculino e 21 do género feminino, estando todos em regime institucional. No
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que diz respeito aos 30 participantes sem síndrome demencial, a idade variou entre
64 e 93 anos (80.4±8.59), sendo 16 do género feminino e 14 do género masculino. É
de notar que 11 dos 30 indivíduos sem síndrome demencial se encontravam em
regime domiciliário. Os cuidadores dos sujeitos com e sem demência correspondiam
aos técnicos de Reabilitação Psicomotora empregados nas instituições (3), sendo que
os restantes 11 cuidadores correspondiam a familiares dos próprios idosos sem
demência.
Para a seleção dos participantes, foram estabelecidos critérios de inclusão: idades
superiores a 60 anos e com capacidade de compreensão e resposta das questões a
aplicar; para o grupo com demência todos os participantes deveriam já ter, no seu
processo clínico, um diagnóstico de síndrome demencial (em qualquer estadio da
doença); e os seus respetivos cuidadores de idade igual ou superior a 18 anos. Como
critérios de exclusão estabeleceu-se que os participantes não poderiam ter
diagnóstico de dificuldades intelectual ou crise psiquiátrica. Para o estudo comparativo
foram selecionadas, aleatoriamente, pessoas com mais de 60 anos e sem qualquer
diagnóstico de síndrome demencial.
Todos os participantes da amostra com síndrome demencial apresentam uma
média de MMSE de 22, o que corresponde a um comprometimento cognitivo ligeiro
(Tombaugh & Mcintyre, 1992).
Instrumentos
A DEMQOL é uma escala originária do Reino Unido (Smith et al., 2005) para
avaliar a QdV em pessoas com demência, preferencialmente leve ou moderada (com
resultados obtidos no MMSE≥10), composta por duas partes: uma dedicada ao
autorrelato onde o respondente deve ser a própria pessoa com demência, e outra
dedicada à resposta por terceiros (DEMQOL-Proxy) onde um cuidador (formal ou
informal) deve responder de acordo com a sua perceção sobre a QdV da pessoa a
que presta apoio (Smith et al., 2005). A utilização destas duas versões, em conjunto,
é recomendada por fornecer perspetivas distintas, mas complementares sobre a QdV
de pessoas com demência (Smith et al, 2005). A DEMQOL é aplicada sobre a forma
de entrevista.
A DEMQOL na versão de autorrelato é constituída por 29 itens subdivididos em
três domínios: sentimentos, memória e quotidiano, mais uma pergunta final sobre a
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vida geral do indivíduo (Smith et al., 2005). A DEMQOL-Proxy é composta por 32 itens
divididos nos mesmos três domínios, e incluindo também a pergunta geral (Smith et
al., 205) A cotação é realizada por uma escala Likert de quatro opções: “muito”;
“algumas vezes”; “pouco”; “nada", em referência à última semana. Existem cinco itens
onde a cotação é invertida. Quanto mais elevados os resultados (112 e 124 para a
versão autorrelato e proxy respetivamente), melhor o nível de QdV percecionada
(Smith et al., 2005).
Ambas as versões foram submetidas a processos rigorosos iniciais para a
validação do conteúdo, resultante quer do acordo de peritos, quer de processos de
redução de itens retendo apenas os mais robustos e representativos do constructo. A
perspetiva da importância de ser a própria pessoa (com demência) a responder foi um
tópico central do desenvolvimento deste instrumento (Smith et al., 2005). A análise
fatorial exploratória utilizou a rotação varimax, o índice de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO)
e o teste de esfericidade de Bartlett, assumindo-se valores de eigenvalues superiores
a 1 e pesos fatoriais superiores a 40 (Smith et al., 2005). Na versão de autorrelato
foram eliminados 45 itens e na de terceiros 42 itens, obtendo-se a versão atual. A
correlação (de Spearman) entre a versão do autorrelato e do proxy foi igual ou inferior
a .40, revelando alguma disparidade nas perceções (Smith et al., 2005).
As duas versões apresentaram bons níveis de consistência interna com o alfa de
Cronbach no autorrelato de pessoas com demência ligeira ou moderada de .87 e nos
proxys de .87 (nível ligeiro), .89 (nível moderado) e .92 (nível severo) ; valores
elevados de estabilidade temporal cujos valores de correlação intraclasse (ICC)
variaram no autorrelate entre .84 (nível ligeiro) e .76 (nível moderado) e no proxy entre
.75, .67 e .84; e com valores fracos a moderados (.29>r<.55) quando confrontados
com outros instrumentos de QdV (Smith et al., 2005). Os resultados apresentaram
uma correlação moderada com a idade, mas sem diferenças significativas com o
género ou estatuto socioeconómico (Smith et al., 2005).
Procedimentos
O presente estudo, inserido num processo de investigação mais abrangente,
iniciou-se com o parecer positivo decorrente do pedido à Comissão de Ética da
Faculdade de Motricidade Humana, respeitando-se todos os princípios éticos
subjacentes a uma investigação deste caráter e dentro dos padrões exigidos pela
Declaração de Helsínquia. Seguidamente, foram contactadas as direções, via email,
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de duas instituições, solicitando a autorização para a concretização do estudo, tendo
sido enviado o consentimento informado, com a explicitação dos objetivos e de todas
as etapas a percorrer, garantindo-se o anonimato e a confidencialidade. As
instituições entraram em contacto com os participantes e com os respetivos
cuidadores que ao assinarem os consentimentos informados deram autorização para
a realização do estudo.
Depois de recolha dos consentimentos assinados, procedeu-se à aplicação da
DEMQOL, em forma de entrevista, em horários previamente acordados com os
respondentes, tentando interferir o menos possível na atividade profissional dos
cuidadores e nas atividades/apoios das pessoas com demência. A DEMQOL-proxy foi
distribuída aos cuidadores e posteriormente recolhidos. A aplicação da versão do
autorrelato variou entre quinze minutos a uma hora, dependendo das características
dos respondentes, e a versão dos cuidadores teve uma duração média de 15 minutos.
Para o tratamento dos dados recorrendo-se ao software IBM Statistical Package
of Social Sciences (SPSS), versão 25.
Apresentação dos Resultados
A análise dos dados envolveu, para além das medidas de estatística descritiva, a
comparação da perceção de QdV pelos próprios participantes (com e sem demência)
e respetivos cuidadores. Para este efeito, e baseados no número de participantes da
amostra ser superior a 30 (N=60), optaram-se pelas técnicas paramétricas para o
tratamento dos dados (Marôco, 2007). Desta forma, foram concretizados os testes t-
student para a comparação das perceções: idosos com e sem demência (tabela 1) e
dos cuidadores, de idosos com e sem demência (tabela 2), entre si. Ainda no âmbito
da compreensão das eventuais diferenças das perceções dos próprios idosos, e para
identificar a relação entre as informações obtidas por autorrelato e pelos cuidadores,
recorreu-se à técnica t-student para amostras emparelhadas (tabela 3) e ao teste de
coeficiente de correlação de Pearson (tabela 4) ao nível dos domínios e índice geral
de QdV.
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Tabela 1: Resultados obtidos na análise comparativa de idosos com e sem demência
Itens/ Domínio
Sem
Demência
Com
Demência p
Item 1: alegre 2.80±.87 2.43±.77 .09
Item 2: preocupado/ansioso 2.50±1.01 2.16±.87 .18
Item 3: aproveitar/desfrutar da vida 2.87±1.04 2.53±.97 .21
Item 4: frustrado 3.17±1.02 2.60±1.10 .04
Item 5: confiante 3.17±.91 2.97±.89 .39
Item 6_cheio de energia 3.03±.76 2.93±0.94 .65
Item 7_triste 2.57±.97 1.80±0.96 <.001
Item 8_sozinho 3.00±1.23 2.63±1.13 .23
Item 9_angustiado 3.17±1.12 2.37±1.07 .01
Item 10_animado 2.97±.76 2.57±90 .07
Item 11_irritado 3.03±.99 3.00±87 .89
Item 12_aborrecido 2.87±.86 2.40±1.04 .06
Item 13_incapaz de fazer o que quer 2.67±1.12 2.37±1.19 .32
Total_sentimentos 37.80±8.40 32.77±7.06 .02
Item 14_esquecer-se de coisas que
aconteceram recentemente 3.33±1.03 2.33±1.24 <.001
Item 15_esquecer-se de quem são as
pessoas 3.53±.94 2.60±1.30 <.001
Item 16_esquecer-se que dia é 3.60±.72 2.60±1.30 <.001
Item 17_pensamentos estarem confusos 3.43±.82 2.60±1.19 <.001
Item 18_dificuldade em tomar decisões 3.37±.96 2.67±1.21 .07
Item 19_fraca concentração 3.33±.96 2.77±1.17 .04
Total memória 20.60±4.34 15.57±5.14 <.001
Item 20_não ter companhia suficiente 3.50±.90 3.23±.97 .28
Item 21_relacionar-se com as pessoas
próximas de si 3.70±.65 3.37±.93 .11
Item 22_ter o afeto que deseja 3.33±1.03 2.90±1.09 .12
Item 23_as pessoas não o ouvirem 3.47±.90 3.07±1.17 .14
Item 24_fazer-se entender 3.40±.93 3.00±1.20 .16
Item 25_obter ajuda 3.60±.89 3.10±1.16 .07
Item 26_ir à casa de banho 3.50±.86 2.70±1.37 .01
Item 27_como se sente consigo próprio 3.07±1.14 2.57±1.13 .09
Item 28_saude em geral 2.87±1.11 1.97±1.22 <.001
Total_quotidiano 30.43±5.35 25.90±6.61 .01
Item 29_qualidade de vida em geral 3.03±.67 2.43±.73 <.001
DEMQOL_total 91.87±16.14 76.67±14.04 <.001
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De acordo com os resultados obtidos, e tal como esperado, o grupo de
participantes sem demência tende a apresentar valores médios superiores,
indicadores de perceções subjetivas mais positivas sobre a QdV, destacando-se a
existência de diferenças significativas em todos os domínios da escala, bem como no
índice total.
Tabela 2 - Resultados obtidos na análise comparativa dos cuidadores
Itens/Domínio Sem
Demência
Com
Demência p
Item 1_alegre 3.23±.68 2.97±.72 .15
Item 2_preocupado/ansioso 2.53±.92 2.53±.86 1
Item 3_frustrado 3.20±.81 2.83±.83 .09
Item 4_cheio de energia 2.77±.73 2.30±.84 .03
Item 5_triste 2.93±.782 2.63±.67 .12
Item 6_bem-disposto 3.17±.59 2.93±.58 .13
Item 7_angustiado 3.27±.78 3.03±.77 .25
Item 8_animado 3.20±.61 2.97±.56 .13
Item 9_irritado 3.17±.87 3.47±.57 .12
Item 10_aborrecido 2.97±.76 2.73±.69 .22
Item 11_com planos para o futuro 2.83±.95 2.33±.71 .03
Domínio_sentimentos 33.27±5.53 30.73±5.08 .07
item12_memória geral 2.37±1.03 2.33±.84 .89
item13_esquecer-se de coisas que
acontecem há muito tempo 2.77±1.04 2.57±.77 .40
Item 14_esquecer-se de coisas que
acontecem recentemente 2.60±1.10 2.43±.88 .52
Item 15_esquecer-se do nome das
pessoas 2.90±1.18 2.57±.77 .20
Item 16_esquecer-se do local onde está 3.30±1.18 2.93±.69 .15
Item 17_esquecer-se do dia que é 3.23±1.17 2.60±.86 .02
Item 18_pensamentos estarem
confusos 2.93±1.08 2.43±.73 .04
Item 19_dificuldade em tomar decisões 2.87±1.20 2.50±.73 .16
Item 20_fazer-se entender 3.10±1.06 2.63±.89 .07
Domínio_memória 26.07±9.04 23.0±5.56 .12
Item 21_manter-se limpo 1.13±.43 1.80±.81 ˂.001
Item 22_manter-se com boa aparência 1.23±.57 1.87±.78 ˂.001
Item 23_ter o que precisa das lojas 1.97±1.07 2.77±.97 ˂.001
Item 24_usar dinheiro para pagar coisas 2.13±1.17 3.17±.99 ˂.001
ARTIGO ORIGINAL: Peres, B., Alvim, I., Ferreira, I., Sena, J., Antunes, A., Santos, S. (2019) Quality of Life in Dementia: an exploratory study about the perception of elderly and their caregivers, Journal of Aging & Innovation, 8 (1): 97 - 116
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Item 25_cuidar das suas finanças 2.20±1.16 3.03±.93 ˂.001
Item 26_demorar mais tempo a fazer as
coisas 2.63±.93 2.77±.86 .57
Item 27_como relacionar-se com as
pessoas 2.83±1.05 2.90±.71 .78
Item 28_não ter companhia suficiente 2.80±.99 2.83±.70 .88
Item 29_não ser capaz de ajudar outras
pessoas 3.03±.93 2.83±.70 .35
Item 30_ não ter papel ativo nas tarefas 2.83±1.05 2.87±.63 .88
Item 31_a sua saúde física 1.77±.68 2.03±.56 .10
Domínio quotidiano 24.57±7.16 28.87±5.57 .01
Item 32_qualidade de vida em geral 2.93±.74 2.43±.77 .01
DEMQOL_TOTAL 86.83±17.41 85.03±12.10 .64
A análise dos resultados obtidos na perspetiva dos cuidadores parecem indiciar a
mesma tendência anterior, apesar de se destacar os valores inferiores por parte dos
cuidadores de idosos sem síndromes demenciais ao nível do domínio quotidiano, que
poderá ser influenciado pelo facto das questões avaliarem o nível de (menor)
preocupação que estes idosos apresentam na concretização de tarefas diárias, dado
saberem que existe um cuidador (e.g.: familiar) que assumirá este tipo de tarefas.
Tabela 3. Resultados da análise comparativa entre os idosos e respetivos cuidadores
Domínio Idosos sem
demência
P_idosos
s/demência AR vs C=
Idosos com
Demência
P_idosos
c/demência AR vs C=
M±s.d M±s.d p M±s.d M±s.d p
Sentimentos 37.80±8.40 33.27±5.53 <.001 32.77±7.06 30.73±5.08 .19
Memória 20.60±4.34 26.07±9.04 <.001 15.57±5.14 23.00±5.56 <.001
Quotidiano 30.43±5.35 24.57±7.16 <.001 25.90±6.61 28.87±5.52 .09
Índice de
QdV 3.03±.67 2.93±.74 .48 2.43±.73 2.43±.77 1
Total 91.87±16.14 86.83±17.41 .11 76.67±14.04 85.03±12.10 .02
Legenda: AR=autorrelato; C=Cuidadores
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De uma forma geral, os idosos sem síndromes demenciais parecem deter uma
perceção mais positiva sobre a sua própria QdV em comparação com a dos
cuidadores, observável pelos valores médios ligeiramente superiores em quase todos
os domínios, exceção feita ao nível do domínio da memória. As diferenças
significativas nos dois domínios parecem esbater-se no índice geral de QdV. Na
análise dos resultados dos idosos com demência e os seus cuidadores apenas o
domínio dos sentimentos parecer ter valores mais elevados na versão do autorrelato.
No entanto, apenas se constatam diferenças significativas no domínio da memória e
do índice geral de QdV.
Tabela 4- Resultados das correlações entre DEMQOL vs. DEMQOL_P
DEMQOL.P_
sentimentos
DEMQOL.P_
memória
DEMQOL_P_
quotidiano DEMQOL_P_total
DEMQOL_sentimentos .44 .33 .16 .42
DEMQOL_memória .30 .19 -.17 .14
DEMQOL_quotidiano .32 .18 -.58 .19
DEMQOL_total .45 .29 .002 .34
Finalmente, e no âmbito do coeficiente de correlação os valores apontam para
correlações fracas a moderadas, variando de .002 (índice total do autorrelato) e .58
(domínio quotidiano das duas versões), havendo mesmo dois domínios com valores
negativos e mais uma vez relacionados com o domínio do quotidiano na versão do
cuidador.
Discussão de Resultados
A presente investigação, além de comparar a perceção de QdV entre idosos com
e sem síndrome demencial, procura explorar as relações entre as suas perceções
com os seus respetivos cuidadores. Os resultados encontrados contribuem para
novas evidências a nível da avaliação de QdV deste subgrupo populacional,
contribuindo para a participação ativa dos idosos, para a identificação e relação com
as perspetivas de cuidadores que conhecem bem a pessoa em diferentes
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envolvimentos e para a reflexão sobre os pontos de vista resultantes de uma recolha
de diferentes respondentes.
De acordo com os resultados, o grupo de participantes sem demência apresenta
valores médios mais positivos em todos os domínios da escala bem como no índice
total de QdV quando comparado com o grupo de sujeitos com demência, tal como
expectável (Missotten et al., 2008). Esta tendência pode ser explicada pela diminuição
das capacidades funcionais e cognitivas características da demência, que influenciam
negativamente, de uma forma geral, a QdV destes sujeitos (Jing et al., 2016),
diminuindo a sua participação em atividades de vida diária e social.
O domínio dos sentimentos apresenta diferenças estatísticas significativas, entre
idosos com e sem demência, apresentando os primeiros valores indicadores de
menos alegria e satisfação, com mais sentimentos de frustração, tristeza e angústia.
Este facto pode ser interpretado pela ideia que a ausência de frustração e de tristeza
são indicadores fundamentais para uma boa QdV em indivíduos com e sem demência
(Brod et al., 1999), parecendo que os idosos sem síndrome demencial se encontram
mais bem-dispostos e satisfeitos com a vida. Não se verificaram, no entanto,
diferenças entre os dois grupos no que diz respeito a sentimentos positivos como
desfrutar da vida, confiança, energia e animação, parecendo indiciar que o facto de
alguns idosos terem síndrome demencial, não impede de os mesmos vivenciarem
sentimentos positivos.
O domínio da memória apresenta diferenças significativas entre os dois grupos,
destacando-se os itens sobre o esquecimento de memórias recentes, de pessoas e
do dia, bem como a existência de pensamentos confusos e fraca concentração. O
processo demencial resulta de perdas significativas ao nível da memória (Landeiro et
al., 2018) e da capacidade atencional, podendo, os idosos com demência, ter uma
perceção mais negativa, corroborando outros estudos (Inouy et al., 2009).
No domínio quotidiano verificam-se diferenças significativas em apenas dois
itens, relacionados com a preocupação em ir à casa de banho e com a saúde em
geral. Tal facto pode ser justificado pelo conjunto de limitações funcionais com
repercussões ao nível das atividades básicas e instrumentais da vida diária nos
sujeitos com demência (Landeiro et al., 2018). Em relação à preocupação acerca da
própria saúde, tendo por base o contexto experiencial, verificou-se que os sujeitos
com demência, associados a um comprometimento cognitivo ligeiro apresentam uma
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maior preocupação associada à própria saúde apresentando ainda consciência das
suas limitações cognitivas.
Os cuidadores de sujeitos sem demência apresentam valores médios superiores
aos dos cuidadores de sujeitos com demência (Chiao et al., 2015; Smith et al., 2005),
à exceção dos itens relacionados com a irritação e com o domínio do quotidiano na
sua generalidade. Nestes casos parecer existir uma relação inversa, indiciando que
no caso de idosos com demência, e talvez devido às suas faculdades cognitivas, a
irritação acaba por ser esquecida rapidamente, enquanto nas questões do quotidiano,
uma vez que, a maior parte são auxiliadas ou efetuadas pelos cuidadores, os idosos
não demonstram preocupação para desempenhar tais tarefas.
Verificou-se também, dentro do domínio dos sentimentos, diferenças
significativas nos itens relacionados com a energia e com os planos para o futuro, nos
quais os cuidadores dos sujeitos sem demência identificam melhores índices do que
os cuidadores dos sujeitos com demência. Estes resultados podem ser entendidos,
pelo facto dos segundos se poderem centrar nos estados de negação/outras
dificuldades dos respetivos idosos, ou nos seus diagnósticos secundários (e.g.:
depressão), admitindo que revelam menos sentimentos de energia, devido a tais
causas. Uma vez que os idosos com demência manifestam limitações funcionais com
repercussões na autonomia dos mesmos (Moley et al., 2007), os cuidadores destes
sujeitos tendem a apresentar uma perspetiva baseada nas suas incapacidades,
condicionando a ambição de realizarem o que pretendem no futuro. Além disso, os
idosos com síndromes demenciais mais avançadas baseiam a sua perspetiva de vida,
no passado, não demonstrando a consciência do presente, nem do próprio futuro
parecendo indicar que o facto de a orientação temporal e a tomada de decisão que
nestes casos se encontrarem em défice (Moley et al., 2007; Smith et al., 2005),
possam comprometer a visão para o futuro, reportando-se apenas no passado.
No domínio da memória os itens relacionados com o esquecimento do local e
com os pensamentos confusos, apresentam diferenças significativas, aferindo-se
valores mais elevados para o grupo dos cuidadores de pessoas sem demência, o que
se traduz numa menor preocupação relativamente a estes itens. Tal facto pode ser
explicado pelas maiores limitações ao nível da memória dos idosos com síndrome
demencial (Landeiro et al., 2018), que se expressam na ótica dos cuidadores numa
maior preocupação por parte do indivíduo com demência neste aspeto.
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O domínio do quotidiano apresenta diferenças significativas, ao nível dos itens
relacionados com a preocupação em manter-se limpo, ter uma boa aparência, ter o
que precisa das lojas, utilizar o dinheiro para pagar as suas despesas e cuidar das
suas finanças, entre os cuidadores de idosos com e sem demência, sendo que estes
últimos acreditam que os idosos apresentam menos preocupações nestas atividades.
Além disso, os cuidadores ao auxiliarem os sujeitos com demência na sua vida
quotidiana no sentido de colmatar as suas limitações, percecionam que as
preocupações recaem mais nos próprios no que propriamente nos indivíduos com
demência que recebem os cuidados.
Ao nível do grupo dos indivíduos sem síndrome demencial, verifica-se uma
melhor perceção do próprio nos domínios dos sentimentos e do quotidiano que se
traduz numa melhor perceção do índice geral de QdV em relação aos próprios
cuidadores. Todos os domínios neste grupo apresentam diferenças significativas
sendo que no que diz respeito ao domínio da memória se verifica uma menor perceção
da mesma nos sujeitos em relação aos seus cuidadores. Estes resultados vão ao
encontro de Trentini et al., (2006) que verificaram resultados inferiores por parte dos
cuidadores em relação aos idosos nestes domínios. Os resultados no domínio da
memória, podem ser entendidos pela experiência subjetiva individual, considerando-
se que os próprios cuidadores não têm a perceção das dificuldades do âmbito
cognitivo resultantes do envelhecimento uma vez que os idosos não apresentam
nenhum diagnóstico e porque não verificam nenhuma limitação funcional no
quotidiano dos mesmos.
Na análise dos resultados do grupo de idosos com demência e respetivos
cuidadores, verifica-se que apenas no domínio dos sentimentos se verifica uma
perceção mais positiva por parte dos idosos, sendo que os restantes domínios
apresentam valores mais positivos por parte dos cuidadores, apresentando o domínio
da memória diferenças significativas, bem como ao nível da perceção total da QdV, o
que não tem sido reportado em outros estudos (e.g.: Smith et al., 2005; Trentini et al.,
2006). Parece existir uma discrepância significativa, na medida em que os indivíduos
com demência classificam a sua memória com um valor inferior em comparação com
os cuidadores (Inouye et al., 2009). No que diz respeito à perceção da própria vida
em geral, os mesmos autores concluíram que os idosos com demência têm uma
menor disponibilidade para a atividade em comparação com a dos seus cuidadores
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(Almeida e Crocco, 2000). É de se referir, no entanto, que no caso dos idosos com
demência, o cuidador era formal o que pode ter influenciado a resposta (Clare et al.,
2014).
Finalmente, evidenciam-se correlações fracas a moderadas, mas positivas no
domínio dos sentimentos ao nível do autorrelato do idoso e do seu cuidador, onde se
verifica que quanto melhor a perceção dos sentimentos por parte dos idosos, melhor
também a perceção dos seus cuidadores (Inouye et al., 2009), o que se traduz numa
maior perceção da qualidade de vida no geral por ambos os respondentes.
Ao contrário do expectável, a correlação do domínio do quotidiano verificou-se
negativa, i.e., proporcionalmente inversa, uma vez que, os idosos não se sentem
preocupados com as questões do seu quotidiano (cujos itens no questionário remetem
para a contextualização temporal da semana passada), ao invés dos seus cuidadores
para quem os idosos parecem preocupar-se com estas questões, podendo estar a
interpretar a questão de acordo com a sua própria experiência e não se colocando no
papel do próprio idoso. Desta forma, este domínio carece de mais estudo e de uma
maior atenção, dado que, através da interpretação dos resultados, infere-se que os
cuidadores não se conseguem dissociar da sua perspetiva e encarar a do idoso (Clare
et al., 2014; Edelman et al., 2005), assim como, os idosos não conseguem orientar-
se, do ponto de vista temporal, para a semana anterior.
Conclusão
De uma forma geral, e com base nos resultados obtidos, é possível inferir, que
os idosos sem diagnóstico demencial tendem a apresentar uma melhor qualidade de
vida em todos aspetos referenciados - domínios sentimentos, memória, quotidiano e
índice de QdV em geral, ao contrário dos idosos com demência. Os cuidadores de
idosos sem demência parecem deter uma melhor perceção da QdV em geral dos
idosos, à exceção das questões relacionados com o domínio do quotidiano, cujas
respostas reportaram para níveis inferiores associados à vida quotidiana destes
idosos. Os cuidadores dos idosos com demência apenas demonstraram uma melhor
perceção no domínio quotidiano.
Os idosos sem síndrome demencial parecem evidenciar uma perceção mais
positiva ao nível dos domínios sentimentos e quotidiano, ao invés dos seus
cuidadores. Todavia, no que se refere aos aspetos da memória, estes idosos
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manifestam índices menores do que os seus respetivos cuidadores. Os autorrelatos
dos idosos com síndrome demencial tenderam para respostas mais positivas no
domínio dos sentimentos, ao contrário dos seus respetivos cuidadores, que por seu
turno, tenderam para perspetivas mais positivas nos domínios da memória,
quotidiano, e na QdV em geral. Todos os participantes com demência estavam em
situação de institucionalização o que pode, também, ter condicionado as respostas
(Nikmat et al., 2015).
No entanto, e tal como referido por Simões e Santos (2016) a disparidade de
respostas não tem que revelar necessariamente a inexistência de fiabilidade entre
respondentes, podendo ser entendidas como diferentes perceções e interpretações
das situações diárias decorrentes de vivências e sentimentos distintos, e até dos
diferentes papéis assumidos por ambos. A estratégia pluralista de recolha de
informação (Perales et a., 2013) é uma das estratégias a manter até novas evidências
mas robustas, não se podendo substituir um pelo outro (Simões e Santos, 2016)
apesar de se realçar o papel ativo que a própria pessoa deverá assumir em todo o
seu percurso (Ettema et al., 2005; Smith et al., 2005; Woods et al., 2014).
A amostra reduzida, estando a maioria dos participantes, em situação de
institucionalização e circunscrita a um espaço geográfico na área da grande Lisboa,
não se avaliando pessoas com demência com nível severo, a acentuada diferença
existente nas idades, pelo que se recomenda alguma cautela na interpretação dos
resultados, evitando-se a generalização dos mesmos. Neste sentido, recomenda-se
a continuação do aprofundamento de investigação na área, com amostras mais
representativas e significativas a nível nacional, e com a identificação de preditores
de QdV para este subgrupo populacional. A validação do instrumento e análise da
fiabilidade interrespondente contribuirão para uma avaliação fiável e válida, cujos
resultados poderão ser utilizados para a monitorização da eficácia dos planos e
programas de reabilitação. Fica também o reparo para a necessidade de se re-
analisar o domínio quotidiano. No entanto, há que reforçar a importância de se ouvir
a voz das próprias pessoas, com e sem demência, que devem assumir um papel
central no controlo das suas próprias vidas.
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