Reforma do sistema de protecção de crianças em perigo está parada

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Reforma do sistema de protecção de crianças em perigo está parada, Público, 30-11-2013

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8 | PORTUGAL | PÚBLICO, SÁB 30 NOV 2013

Reforma do sistema de protecçãode crianças em perigo está parada

Governo comprometeu-se a nomear, durante o mês de Junho, comissões para rever várias leis. E devia haver conclusões em seis meses. Associação para a Igualdade Parental e Direitos dos Filhos pede debate

PAULO PIMENTA

Comissões de protecção acompanharam 69 mil crianças em 2012. E havia mais de 8500 jovens a viver em instituições

O Governo anunciou a intenção de

rever vários aspectos da legislação

relacionada com a protecção de

crianças e jovens em perigo e com a

adopção, mas o processo está para-

do. A 30 de Maio foi publicada uma

resolução do Conselho de Ministros

na qual se dizia que, face às fragili-

dades identifi cadas no sistema, em

15 dias seriam nomeadas comissões,

com representantes de diferentes

ministérios, que deveriam, até ao

fi m deste mês de Novembro, apre-

sentar propostas de alteração ao

ministro da Segurança Social Pedro

Mota Soares. Seis meses passados,

nem as comissões foram constituí-

das, nem há mudanças à vista.

Em causa está, por exemplo, a

reformulação da forma como fun-

cionam as comissões de protecção

de crianças e jovens (CPCJ). E dos

poderes que estas estruturas não

judiciais, que integram represen-

tantes dos municípios, da Seguran-

ça Social e da sociedade civil, têm

para actuar.

Luís Villas Boas, presidente do

Grupo de Trabalho para a Agenda

Criança — um grupo criado em Maio

de 2012 que apresentou ao Governo

relatórios de análise e propostas de

mudança, o que deu origem à re-

solução do Conselho de Ministros

deste ano — defende, a título pesso-

al, que não faz sentido haver tantas

CPCJ. São 305 em todo o país e, em

2012, acompanharam 69 mil crian-

ças e jovens.

Villas Boas diz que muitas destas

CPCJ não têm “qualquer espécie de

capacidade e meios” para intervir.

“É impensável ter de pedir ao pai e

à mãe de uma criança autorização

para intervir em certos casos, se é

o pai ou a mãe a colocar a criança

em perigo. Os agressores têm de

concordar com uma intervenção?

Só em Portugal!”

O presidente do Refúgio Aboim

Ascensão, em Faro, nota, contudo,

que essa é a sua opinião pessoal e

não adianta propostas que constem

dos relatórios que a equipa a que

presidiu apresentou ao Governo.

Confi rma, contudo, que nenhuma

das comissões que o Executivo fi cou

de criar avançou. Mas aguarda “com

calma”. De Maio para cá, Marco An-

2012. Cerca de um terço estavam aco-

lhidas havia mais de quatro anos.

Villas Boas, por seu lado, diz que é

preciso criar “um sistema de acolhi-

mento precoce, temporário e cientí-

fi co, um conceito que nunca existiu

em Portugal”. E sublinha que, se se

está a assistir à chegada aos centros

de acolhimento de crianças com ca-

da vez mais idade, em situações par-

ticularmente difíceis, isso se deve ao

facto de o sistema não ter sido capaz

de actuar quando elas tinha poucos

meses ou anos de vida.

Do grupo liderado pelo presiden-

te do Refúgio Aboim Ascensão fazia

parte, entre outros, o procurador-

geral adjunto Maia Neto, que estava

convidado para um seminário, que

deveria acontecer na próxima se-

mana, organizado por três CPCJ de

Lisboa e pela Associação Portuguesa

pela Igualdade Parental e Direitos

dos Filhos (APIPDF). Esta semana

o seminário foi cancelado pela or-

ganização. “Tal situação prende-se

com as limitações em que a discus-

são pública poderia ser realizada,

já que ainda não foi nomeada pelo

Governo a composição das comis-

sões com vista ao debate sobre estas

matérias”, lê-se num comunicado

enviado às redacções.

Ao PÚBLICO, o presidente da

APIPDF, Ricardo Simões, acrescen-

ta que está preocupado com este

atraso. “O Governo tem de consti-

tuir as comissões e abrir a discussão

pública sobre estas matérias.” Não

é que não concorde com algumas

das linhas orientadoras que cons-

tam da resolução. Mas diz que são

demasiado latas, daí a importância

do debate alargado.

O PÚBLICO pediu ao Ministério da

Segurança Social informação sobre

este atraso, sem sucesso até ao fecho

desta edição.

Segurança SocialAndreia Sanches

tónio Costa, o secretário de Estado

da Segurança Social que acompa-

nhava mais de perto o processo, dei-

xou as suas funções, o que poderá

ajudar a explicar o atraso.

A resolução do Conselho de Mi-

nistros deixa antever uma reforma

do sistema. Diz que, com base nas

recomendações do Grupo de Tra-

balho para a Agenda Criança, se de-

ve ponderar uma “clarifi cação da

autonomia” e dos “mecanismos de

autoridade” das CPCJ, bem como a

redefi nição das “atribuições, com-

posição e órgãos” das mesmas e do

seu “redimensionamento”, seja ao

nível da “composição, da competên-

cia territorial”, como “das modali-

dades de funcionamento”.

Anuncia-se ainda a necessidade

de criar um Sistema Nacional de

Emergência Infantil. Villas Boas

defende que em cada distrito deve

haver uma unidade de emergência,

“tirando em Lisboa e Porto, onde

deve haver mais”, que garanta o aco-

lhimento de crianças a qualquer ho-

ra do dia ou da noite, por um curto

período de tempo.

É preciso diminuir “o acolhimento

prolongado”, é outra das afi rmações

do Conselho de Ministros. Em 2012,

havia 8557 crianças que tinham si-

do retiradas às famílias e viviam em

instituições de acolhimento (contra

12.245 em 2006), sendo que, destas,

2289 iniciaram o acolhimento em

Autoridade, atribuições e composição das comissões de protecção deverão ser revistas

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