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Para os que defendem o filme Deus não está morto
Muitos são os que defendem o filme norte-americano Deus não está morto, protagonizado por Kevin
Sorbo, que faz um professor universitário, dizendo que ele é uma mensagem de fé e não um filme
tendencioso que somente vilaniza os ateus. Segundo os que falam a favor do filme, ele foi inspirado em
casos reais de professores ateus que perseguem estudantes cristãos no mundo acadêmico.
Certo, como existe de tudo nesta vida, não podemos negar que isto seja verdade. Mas se é verdade que há
ateus perseguindo cristãos nas universidades, também é verdade que ateus sofrem preconceitos por parte
dos cristãos nos Estados Unidos . Uma boa maneira de provar isso é assistindo a um canal ateu norte-
americano em que os que o apresentam (todos ex-cristãos) costumam receber telefonemas de pessoas que
os acusam de ter pacto com o diabo e dizem que eles irão queimar no fogo do inferno. O filme, muito
convenientemente, "esquece" de mostrar este outro lado da moeda: que a intolerância e o preconceito não
são atributos exclusivos dos ateus e que muitos, aliás, por serem oriundos de famílias muito cristãs, não
têm coragem de assumir sua posição. Não é preciso ir muito longe para verificar que os ateus são alvo de
preconceito. Pessoas ateias são vistas com reserva e muitos brasileiros admitem que não votariam em
candidatos ateus.
O filme, além de botar o professor universitário como um arrogante que quer impor sua descrença, tenta
explicar seu ateísmo colocando que ele se revoltou por que Deus se recusou a salvar sua mãe, que morreu
de câncer quando ele tinha doze anos. Ou seja, fica subentendido que todo ateu, no fundo, é apenas um
revoltado a quem Deus não atendeu. O filme não colocou que ele se tornou ateu por estudar mais a fundo
a Bíblia e observar suas contradições e a crueldade do Deus do Antigo Testamento ou fazer
questionamentos, perguntando-se por que, por exemplo, a gente não vê hoje os milagres que existem aos
milhares na Bíblia. Mas não interessa a um filme cristão que alguém veja essas coisas, não é? E,
enquanto o professor é um radical que quer impor o ateísmo à força, todos os cristãos são pessoas
sensatas e moderadas. Ninguém vê um cristão que quer impor à força sua crença, como vemos na vida
real.
Aliás, outros ateus que aparecem no filme são mostrados todos como pessoas arrogantes, insensíveis e de
mau-caráter, como o empresário interpretado por Dean Cain(de Superman), que abandona a mãe com
Alzheimer e a namorada que tem câncer. A namorada desse empresário, por sinal, começa o filme como
uma ateia arrogante e, após o câncer, torna-se cristã. Que fica parecendo? Que o câncer foi um castigo por
seu ateísmo.
Uma outra inverossimilhança do filme é que o professor de filosofia propõe que o aluno cristão que se
recusa a escrever que Deus está morto prove a existência de Deus. Como alguém provará que Deus existe
ou não após alguns debates? Há séculos, crentes e descrentes têm debatido esta questão e nunca foi
provado nada. E por que o professor quer tanto que as pessoas acreditem que Deus não existe? Está numa
guerra pessoal com Deus porque a mãe dele morreu de câncer? Se ele tem esse objetivo, com certeza, ele
precisa é de tratamento psicológico já que, se após tanto tempo, não aceitou que as pessoas morrem, é
porque não amadureceu psicologicamente para entender que a morte virá para todos nós um dia.
E como um professor, com anos de ensino nas costas, que, com certeza, tem bases teóricas , não é capaz
de vencer um calouro? Ele deveria observar Sam Harris (filósofo norte-americano) que, com argumentos
moderados e inteligentes, consegue mostrar toda a fragilidade da apologética cristã de William Lane
Craig. É incrível que um professor universitário não consiga vencer um calouro com argumentos.
Como se vê, o filme é um festival de absurdos. Colocar todos os ateus como vilões arrogantes e radicais
e os cristãos como bonzinhos e moderados é um grande pecado de inverossimilhança, que apresenta uma
visão distorcida do que realmente existe na sociedade. Muitos que são pelo filme dizem que só os ateus
para não gostar dele. Façamos uma pergunta: os índios não têm bons motivos para detestar os filmes de
faroeste que sempre botavam os índios como os vilões e os brancos como mocinhos? Uma vítima de
estupro não tem motivos para odiar um filme ou seriado com estupro romantizado? E, por sinal, muitos
cristãos que assistiram ao filme disseram que o filme não mostra a realidade, argumentando que ninguém
é mau só porque é ateu. Qualquer um sabe que crença ou descrença em Deus não define caráter.
Assim como os filmes de faroeste apresentaram uma visão irreal de um aspecto da história norte-
americana, esse filme apresenta uma visão irrealista e distorcida do caráter do ser humano. Ser cristão não
é sinônimo de ser bom.
O pior é ver tantas pessoas dizerem que filmes assim são um exemplo de como a fé move montanhas. Isto
mostra como grande parte das pessoas precisa desenvolver seu senso crítico.
Por que deixei de ser evangélica
“A fé que deveria ser vivenciada com mais sobriedade torna-se um remédio para todas as dores da vida, carregada de superstição e negando, muitas vezes, a nossa responsabilidade em relação à vida, a nossa necessidade de lutarmos por aquilo que acreditamos.”
Anônimo
“Quem estuda, sabe. Quem não estuda, acredita”
Rivanildo Menezes, do canal Originais gregos da Bíblia
Eu fui evangélica, principalmente por influência de minha mãe, que foi criada numa família evangélica. Lembro que assistia muito a programas evangélicos, em que pessoas davam depoimentos dizendo como “Jesus tinha transformado suas vidas.” Muitas diziam que estavam com suas famílias destruídas, com doenças terminais, mergulhadas em vícios, perversões sexuais e era realmente comovente ouvi-las falar de que forma elas tinham tido suas vidas restauradas e agora viviam “apenas para Cristo.”
Com o tempo, mãe me convenceu a frequentar e eu passei a ir à igreja presbiteriana Renascer e à Congregacional. Muitos eram os que davam depoimentos e os pastores davam maravilhosos sermões de como “Deus nos daria a vitória”, faria milagres em nossas vidas e tudo o mais. Também era bastante empolgante ouvir os que cantavam hinos, especialmente os de Aline Barros, Cassiane, Melissa e André Valadão.
Era comum que dissessem a esse ou aquele fiel que “Deus tinha grandes planos na sua vida” e uma vez um pregador, que havia sido presidiário e falava de como Cristo o resgatara da vida como traficante de drogas, acordando-o para a verdade e o amor e o curara de um câncer na região anal, apontou-me e
falou que seriam feitas maravilhas em minha vida. Mãe se empolgou bastante, dizendo-me que eu deveria ter fé para receber minha bênção.
Entretanto, com o tempo, fui vendo que havia coisas que não encaixavam. Primeiro: eu só via maravilhas ocorrendo nas vidas das pessoas que davam depoimentos nos programas evangélicos de televisão ou nas que iam dar testemunhos nos cultos. Nunca nada ocorreu na minha vida ou na de outra pessoa que eu conhecia. Há uma senhora, que conheceu minha mãe desde criança, cuja vida jamais mudou em nada. Ela anda com a Bíblia debaixo do braço (embora seja analfabeta), crê que houve um Dilúvio universal mas a vida dela é praticamente a mesma há anos. Aliás, o Jesus que resgatou muitos das drogas e álcool jamais resgatou o filho dela do alcoolismo. Além dessa senhora, muitas pessoas que frequentam esses cultos há anos nunca viram nada acontecer em suas vidas em vinte ou trinta anos. Em alguns casos, suas vidas pioraram. Várias se divorciaram, viram seus filhos se perderem para as drogas. Entretanto, elas nunca contestaram e falam que “Deus lhes dá forças.”
É frequente que os pastores, quando falamos sobre problemas familiares que enfrentamos, aconselhem-nos a orar para que “Jesus toque o coração daquela pessoa”, caso seja um marido violento, pai abusivo, filho problemático e por aí vai. Porém, muitas são as pessoas que oram há anos e os comportamentos daquelas pessoas que estão errados em nada mudam. Então, diz-se que “Deus não pode desrespeitar o livre arbítrio”. Como vemos, prometem uma coisa e a realidade é outra.
Os próprios pastores, que oram pelas famílias, têm suas famílias desestruturadas. São diversos os episódios de pastores que traem ou abandonam suas esposas, têm filhos drogados ou até abusam de fiéis. E, embora seja muito falado por fiéis que “Jesus restaura famílias” e até “cura” homossexuais, só vemos esses milagres mesmo em depoimentos. Uma evangélica que conheço me falou sobre um transexual que, segundo ela, tinha seios e até Aids a quem Jesus teria resgatado. Entretanto, como há pastores que têm filhos homossexuais ou até se revelam homossexuais? Houve o caso de um que a mulher o deixou por outra mulher. E muitos homossexuais dizem que há anos oram para que Deus os cure, sem que consigam se curar de sua “doença”, que é vista como uma abominação. Conheço a história de um rapaz transexual que me contou que a mãe dele, que frequenta a Assembleia de Deus, levou-o a um pastor que disse que ele tinha dez demônios dentro dele. Ele falou que foi horrível a experiência de ser exorcizado.
Falando-se em exorcismo, eles culpam o demônio por tudo e acham que tudo que não for conforme o que pregam é do demônio. Quando falei sobre um pai que maltratava a esposa e os filhos, duas fiéis me disseram que isso não era ele, mas o demônio. Ou seja, uma pessoa nunca é responsável por seus atos. Temos até a impressão que isso deveria servir de prova num tribunal quando
alguém cometesse um assassinato, já que ninguém age por si, mas sob “influência do demônio.” A mesma evangélica que me falou do transexual era contra ouvir rock. De acordo com ela, cada música de rock tinha um “diabo escondido” e essa era a razão pela qual o Cazuza teria morrido de Aids. Eu cheguei a contestar, falando que ele contraíra Aids porque tinha uma vida sexual irresponsável. Parece que ouvir música ou ler livros que não sejam do nicho evangélico é um pecado grave. Fui muito criticada por ler livros e assistir a filmes de terror e me aconselharam muito a deixar de ouvir Legião Urbana e Evanescence, como se essas músicas fossem amaldiçoadas. Muitos são os dizem que só leem a Bíblia. Mesmo assim, dá-se para notar que esses que só têm a Bíblia como livro não a conhecem bem, pois não conhecem suas contradições e não gostam quando damos exemplos da crueldade de Javé no Antigo Testamento.
Desenhos animados, Disney e musicas são alvo dos evangélicos, que falam que tudo é o demônio. Dizem que Walt Disney, cantores, artistas e atores famosos têm pacto com o demônio para fazer sucesso e muitos supostos ex-bruxos satanistas que dão depoimentos falam de como políticos e empresários fizeram pacto com o diabo para enriquecer e ter sucesso. Mas a Disney é o alvo preferido. Eles chegam a confundir o Hades (do desenho Hércules) com o Satanás. Um pastor falou que Pocahontas(outro desenho Disney) significaria “espírito do abismo”. Eu cheguei a explicar a ele que Pocahontas não é isso, pois foi uma personagem real da história norte-americana(qualquer um que pesquise no Google logo saberá) e o significado do nome é “pequena travessa”. O pastor porém falou no hábito dos índios de chamar os mortos e, quando falei que era cultural, ele explicou que o fato deles ignorarem não os salvaria do julgamento de Deus. Isso me pareceu injusto. Se eles não sabiam quem era Cristo, não podiam ser condenados só por ignorância. O próprio Sam Harris fala como é absurdo um criminoso que se converte à hora da morte e se salvar enquanto alguém, mesmo sendo bom, só por não ter aceitado Jesus, ser condenado.
Também só vemos pessoas possuídas e sendo exorcizadas nas igrejas evangélicas. Isso jamais é visto em igrejas católicas. Vemos muito os pastores orarem pela saúde dos fiéis, porém, nunca soube de um fiel( a não ser nos já falados testemunhos) que tenha se curado de câncer ou outra doença grave apenas por oração. Por que nunca vemos um pastor ir a esses hospitais com corredores cheios de doentes para curá-los? Jesus teria dito que quem cresse nEle faria maravilhas. Mas não vemos nenhum pastor ou pessoa cheia de fé curando alguém apenas pela fé. Não se sabe de nenhum paralítico que tenha voltado a andar, surdo ou mudo que tenha passado a ouvir ou falar ou pessoa que tenha se curado de esclerose múltipla, Alzheimer, Aids ou Parkinson. E o Jesus que curou cegos de nascença, por sinal, não cura ninguém de uma simples miopia. Eu digo isto porque orei por anos para me curar da minha.
Ainda lembro de ter ouvido um ex-evangélico dizendo que o Deus que cura cegos hoje não cura ninguém de uma catarata.
Fala-se em demasia de como Deus transforma o coração das pessoas. Todavia, eu pude ver que tantas pessoas, sendo evangélicas desde pequenas ou tendo se convertido, não são melhores do que as que não o são. Várias são preconceituosas, invejosas, superficiais e maledicentes, cheias de vaidades, achando que já foram salvas, que sabem de tudo. Converter-se não torna ninguém uma pessoa melhor. Mas, nos programas evangélicos, temos a impressão de que qualquer pessoa, que não seja evangélica, só anda no caminho errado. Comecei a contestar isso ao ver que muitos ateus, agnósticos, pessoas de outro credo ou que apenas não seguem nenhuma religião não são necessariamente pessoas que andam no caminho errado. A grande maioria tem uma boa vida familiar, trabalha, vive de forma honesta e não faz mal a ninguém. Só que dizer isso a evangélicos parece ofensivo. Eles respondem que de nada adianta nossa vida estar boa se não temos Jesus. Só o caminho deles é o correto.
Quando não vemos nenhuma promessa se realizar na nossa vida, logo surgem as justificativas, que nunca variam e são sempre superficiais: “tudo é só no tempo de Deus”; “isso é Deus testando sua fé”, “talvez o que você queira não esteja nos planos de Deus.” ou então: “as coisas são mais difíceis para as pessoas de Deus”. Eu aceitei isso por um tempo, embora algo dentro de mim me dissesse que isso não era satisfatório. Hoje, entendo que, se não sei, tais pessoas também não sabem. Elas agem como se tivessem ligação direta com Deus, porém vemos que não se aprofundam em nada, apenas vão logo dizendo verdades como se pudessem explicar tudo. Lembro bem de quando me irritei com uma cabeleireira quando ela falou que um amigo meu que tinha cometido suicídio estava no inferno. Eu odiei porque, se temos de entender o ato que uma pessoa comete na loucura da dor, que Deus, supostamente tão perfeito e acima das imperfeições humanas, seria tão insensível a ponto de condenar alguém eternamente por um ato impensado que ela cometeu contra si mesma?
Na verdade, o que esses pastores pregam acaba por prejudicar nosso discernimento. Ficamos presos numa ilusão de que um dia ocorrerão os milagres que “Deus prometeu”, vemos o tempo passando e, muitas vezes, por nos focalizarmos demais só nessas promessas, deixamos de fazer logo algo que poderia resolver nossas vidas. Sejamos francos: alguma vez, alguém viu sua vida mudar por milagre? Não, nenhuma mudança veio de repente, mas foi sempre o fruto de um processo longo e sofrido. E tudo isso contesta o que afirmam de que “as coisas virão no tempo de Deus”. Se não corrermos atrás de nada, nunca chegará o tempo de conseguirmos um emprego. Orar e não entregar currículos ou fazer concursos não adiantará de nada pois empregos não caem do céu, não vêm embrulhados em pacote. Nesses templos, eles
passam a imagem de Deus como a de um gênio da lâmpada ou a de um Papai Noel, que, na hora certa(que talvez nunca venha) aparecerá trazendo o tempo de bonanças. Errado. Sabemos bem que enfrentaremos problemas nossa vida inteira. Conseguir o que queremos também não traz felicidade. Muitos ex-crentes disseram que viram pessoas que morreram sem que nada mudasse em suas vidas. As coisas mais importantes em nossas vidas vêm após muito esforço.
Sair desta ilusão foi muito difícil e sofrido. Quando eu estava cansada de esperar milagres, ouvia mãe dizer que eu tinha que ter fé, que eu não estava acreditando nas bênçãos que viriam. Eu acabava me sentindo culpada por duvidar. Mas Nenhuma bênção veio. Nada do que aquele pregador disse que me aconteceria aconteceu. E, por ter dado ouvidos ao que me disseram, deixei de fazer coisas que poderiam ter melhorado antes minha vida. Disseram-me para esperar o “tempo de Deus”. Quando esse tempo chegará? Nunca. Sei que, se algo ocorrer na minha vida, terei sido eu que fiz com que acontecesse.
Esse Deus de milagres pregado nesses templos só muda a vida dos pastores, assim como os livros de autoajuda só ajudam as pessoas que os escrevem. Infelizmente, ainda vemos pessoas tolas que estão presas debaixo dessa redoma.
As sandices e crueldades ditas e feitas por pessoas religiosas
Sabemos muito bem que, independentemente da nossa crença, precisamos ter bom senso e avaliar bem
o que nos é dito acerca de supostos desígnios divinos de qualquer entidade, principalmente para não
sermos injustos diante das desgraças humanas. Seja você católico, evangélico, espírita ou umbandista,
se você possui bom senso, com certeza, não aprovará principalmente certas atitudes impetradas por
certas pessoas "em nome de Deus" e com certeza sabe que não possui conhecimentos acerca dos
mistérios do mundo para se dar a autoridade de dizer que tal coisa foi vontade de algum deus ou castigo
divino.
Infelizmente, temos visto muitas pessoas dizerem verdadeiras barbaridades e sandices para convencer
os incautos. Mas isso não é o pior. O pior é ver que muitos, achando-se talvez acima do bem e do mal,
cometem atrocidades que desafiam nosso senso de justiça e compaixão, como o caso de um casal norte-
americano em Manitowoc que espancou até à morte um menino de sete anos do qual tinha a guarda. E
por qual motivo? Somente porque o menino não recitou uns versículos bíblicos. O castigo foi horrível: o
menino foi obrigado a carregar um tronco de madeira pesadíssimo,foi agredido com socos e chutes e
enterrado vivo sob a neve. Chegaram a levá-lo ao hospital, mas ele não resistiu.
Quanto as coisas ditas pelos religiosos, devemos observá-las bem, com bastante atenção, especialmente
se o religioso for um pregador ou ministro religioso, que, afinal, é alguém que influencia mentes. E são
muitos os que dizem absurdos e mentiras que revoltam. Uma mentira que prejudicou a vida de uma
pessoa foi dita por um pastor à tia da esposa de um amigo. O filho dessa senhora tinha
mucoviscidose(fibrose cística) doença incurável e letal. Poucos portadores chegam à idade adulta. O
pastor tinha iludido a pobre mulher com a promessa de que seu filho seria curado, mas ele morreu
pouco tempo depois em consequência da doença. A mãe se afastou da igreja e o pastor, para chamá-la
de volta, disse que aquilo tinha sido vontade de Deus. O que podemos dizer disso? Que foi uma
picaretagem. Ele iludiu a mulher com promessas vazias e depois, para consolá-la, usou frases de efeito.
Um pregador que eu respeitava muito por ir contra a "teologia da prosperidade" - pregada por Edir
Macedo e tantos outros- é o pastor batista norte-americano Paul Washer, até que assisti a um dos seus
vídeos e fiquei chocada com coisas insensíveis ditas por ele. O respeitável pastor afirmou que a Aids era
castigo divino e uma pessoa o contestou, respondendo que não poderíamos dizer isso já que muitas
crianças contraem o vírus ainda no ventre das mães. Vejam a resposta dele: e quantas crianças Deus não
matou no Dilúvio e em Sodoma e Gomorra? O que podemos dizer do que ele (formado em Direito e
Teologia) afirmou? Que foi de uma insensibilidade enorme. Então, para conseguir o que se quer, vale
matar inocentes? Um Deus desses não seria melhor do que qualquer terrorista islâmico que mata
milhares de inocentes num atentado em nome de sua "guerra santa". Entretanto, com certeza, se
alguém disse algo assim, esse pastor falará que os terroristas não adoram o verdadeiro Deus. Assim
sendo,qualquer coisa que esse Deus faça, mesmo que prejudique inocentes, é válida e justa? Isso parece
a apologética cristã de William Lane Craig, já refutada por muitos filósofos. E as mulheres direitas que
pegaram Aids de seus maridos sem saber que eles tinham mulheres e até outros homens fora do
casamento? Elas receberam castigo divino? Reflitamos. Parece justo dizer a alguém que nasceu com o
vírus HIV que isso foi castigo divino? E Deus o teria castigado por quê? Pelo pecado do pai que teve
relações sexuais fora do casamento e contaminou a mãe, culpada apenas de confiar nele?
Esses absurdos não têm fim. Entre as muitas coisas ridículas que muitos já devem ter ouvido, há a de
que Xuxa teria feito pacto com o demônio para ter sucesso como apresentadora. Alguns até falam que
seu apelido seria junção de Exu com Xangô. Vejamos bem. Além de nunca ninguém ter provado que
Xuxa teria pacto satânico, está se incorrendo no velho preconceito de que as religiões africanas são
demoníacas. Já se falou muito que meninas que teriam a boneca da Xuxa teriam sido agredidas e até
mortas pela mesma. Estranho que isso nunca foi comprovado. Por que não houve uma profusão de
meninas atacadas pela boneca? Teria sido um caso digno do Jornal Nacional, capaz de fazer os
roteiristas de Brinquedo Assassino morrer de inveja.
Ainda há quem diz que o ator que fazia o boneco Fofão teria confessado ter pacto com Satanás e que,
quem quisesse comprovar, era só abrir o boneco. Ainda se fala que a Hello Kitty é diabólica e que
gnomos e duendes seriam entidades maléficas. Uma vez, minha mãe me falou sobre uma mulher que
havia se convertido que contara num depoimento que, numa época em que ela era mística, ela
colecionava duendes e que, uma noite, fora atacada. Então, ela se converteu e se desfez dos gnomos.
Vejamos bem. Gnomos e fadas são entidades do folclore europeu. Se devemos admitir que são
satânicos, o saci-pererê, a mula-sem-cabeça e o curupira(criaturas do nosso folclore) também o são. A
propósito, se alguém que conhece as carrancas, sabe que elas eram usadas porque se acreditava que
havia um negro d'água que derrubava os barcos. Usavam-se então tais carrancas para espantar o negro.
Porém, ouvi muito que elas permitiam que diabos viessem habitar nas nossas casas. Na época em que
fui evangélica, convenceram-me a destruir um broche de gnomo dado por uma tia, anéis em formato de
meia-lua e uma bruxa de pano. Hoje, eu me pergunto: por que ninguém é atacado por anões de jardim?
Já que gnomos são diabinhos, as pessoas que os têm deveriam ser atacadas por eles. Meu irmão tem
um gnomo há anos e nunca foi atacado por ele.
Quem lembra da tragédia do furacão Katrina sabe que muita gente morreu naquele triste episodio. E o
que a cantora Baby do Brasil disse? Que foi castigo divino porque na região em que ocorreu o desastre
(Nova Órleans) só há vodu. Com certeza, a tal cantora não percebeu que disse um contrassenso.
Tragédias assim ocorrem porque ocorrem e, quando acontecem, atingem tanto cristãos quanto
budistas, umbandistas, ateus ou xintoístas. Se uma enchente ocorre onde vivo, a casa do meu vizinho
não será poupada por ele ser evangélico. Acreditar em Deus não protege ninguém de nenhuma
tragédia, seja ela natural ou fruto de erro humano. E, falando-se em castigo divino, com certeza muitos
católicos se sentirão ofendidos(com toda a razão) se souberem do que disse uma mulher a respeito das
secas no Nordeste: "é castigo divino por causa da idolatria, porque não conhecem o Deus verdadeiro. E
a fome na África é castigo porque eles fazem feitiçaria." Quem disse isso deveria estudar História. O
Egito, terra bem seca, adorava muitos deuses e era bem avançada para a época. E sabia contornar as
agruras do clima quente e seco.
Aliás, hoje mesmo assisti ao vídeo de um senhor analisando as tragédias de Brumadinho e dos meninos
jogadores de futebol mortos em incêndio. Primeiro, ele expôs as afirmações de pessoas religiosas a
respeito dessas tragédias: "Deus sabe o que faz"; "essa foi a vontade de Deus". E que depois essas
pessoas iam rezar para pedir conforto. O senhor observou que se para essas pessoas foi Deus que
provocou essas tragédias, elas estavam indo orar para seu próprio algoz. Ao que isso equivale? A pedir a
quem nos deu um tiro para fazer uma cirurgia removendo a bala. Que irônico, não? Ele também
analisou afirmações ditas por quem acredita em karma, reforçando ser muito contraditório se dizer que
se deve ter piedade de quem passou por essa tragédia e, ao mesmo tempo, que elas tiveram que passar
por isso por causa de coisas ruins que teriam feito em outras vidas. O mais engraçado foi uma coisa que
ele disse: "todo mundo aprontou em outra vida lá na França, Itália, Inglaterra e vem pagar aqui,
justamente no Brasil." Isso até parece com o que já falei sobre as bombas em Hiroshima e Nagasaki.
Como tanta gente com o mesmo karma ruim estava ali, ao mesmo tempo e no mesmo lugar? Vamos
admitir que essas tragédias são fatos, resultantes de atos humanos que infelizmente atingem gente
inocente que nada fez para merecer. Se formos levar a lei do karma a extremos, teremos que admitir
que toda criança vítima de abuso sexual ou pessoas que sofrem estupro coletivo durante guerras
cometeram barbaridades em vidas anteriores, não? Que dizer dos mortos nas câmaras de gás, nas
crianças que morrem no Oriente Médio, das pessoas que estão sofrendo no Iêmen, Venezuela e tantos
países miseráveis, assolados por fome, miséria, falta de saúde e de segurança? Como se arruma tanta
gente com um karma tão pesado?
Quando eu estava no auge do desespero por não conseguir emprego e não ver se cumprirem as
promessas de que minha vida logo mudaria, minha mãe falava:"minha filha,você é uma pessoa muito
boa e Deus é por você." Hoje, vejo que tais palavras, embora ditas com a intenção de consolar, não
tinham comprovação. Ser bom não protege ninguém de nada, não coloca pessoa alguma sob um véu de
proteção. Por acaso, a menina Isabella Nardoni, o menino Bernardo Boldrini, o menino João Hélio(que
morreu ao ser arrastado de carro), a dentista Magali Moutinho eram pessoas ruins? Devia haver pessoas
maravilhosas nos campos de Auschiwitz. Mas lá morreram pessoas boas e ruins. A verdade é que
tragédias atingem todo mundo, acreditando ou não em Deus. E a vida não é mais fácil para quem
acredita. Dizem que tenho que acreditar porque senão será mais difícil eu conseguir as coisas. Será?
Vejamos a situação de quem está desempregado? Tanto o ateu quanto o que acredita têm que lutar por
emprego, pagar contas, correm o risco de ser assaltados, morrer de desastre, desenvolver câncer.
A única diferença é que o ateu, agnóstico ou deísta não vai atribuir as desgraças a uma vontade divina
nem procurará socorro divino nas horas de dificuldade. Ele entende que é o único que poderá fazer algo
a respeito da situação que possa estar enfrentando.
Pequenas inverossimilhanças
Com certeza, qualquer pessoa com um senso crítico minimamente apurado já observou pequenas
inverossimilhanças em desenhos animados, novelas, filmes, minisséries ou seriados.Estas
inverossimilhanças não chegam a comprometer seriamente a qualidade do trabalho, claro, mas não dá
para deixar de admitir que, se os autores houvessem sido mais cuidadosos, as histórias teriam sido
melhores. Obviamente, é fácil falar. Entretanto, temos de observar com cuidados nossas histórias nos
mínimos detalhes se quisermos que pareçam reais aos que vierem ler ou assistir àquilo que criamos. No
geral, a maioria das pessoas não presta tanta atenção a esses detalhes, que geralmente passam
despercebidos e devemos deixar claro que não se está dizendo a ninguém que pare de gostar de nada.
Cada um tem direito de gostar do que gosta. Porém, reparar nessas inverossimilhanças é até divertido,
pois nos mostra como precisamos prestar atenção a coisas como o histórico dos personagens, o
contexto social e ambiente em que estão inseridos e tudo o mais. Então, vamos falar de algumas coisas
sem sentido vistas em alguns programas:
1- Com certeza, poucos lembram do desenho Bravestarr, que passou nos anos 80 e era exibido pela
Globo. A trama era uma mistura de faroeste com ficção científica e se passava no século XXIV num
planeta chamado Novo Texas. O protagonista era um delegado índio que combatia criminosos e, como
He-man e She-ra, sempre tinha uma lição no fim de cada episódio. Num desses, chamado A caminhada,
um rapaz, que parece ter uns dezesseis anos e é filho de um ex-xerife, confessa que achava que disparar
armas era divertido mas que tinha aprendido que elas podiam machucar alguém, ouvindo do delegado
Bravestarr que armas podiam mais que machucar. Podiam matar. Qual a inverossimilhança? Vejamos, o
desenho é ambientado no Oeste e de origem norte-americana. Ninguém ignora que é comum que
pessoas tenham armas em casa nesse país, especialmente em áreas rurais. Não é incomum vermos
meninos de doze ou treze anos atirando muito bem e o normal é que os pais tenham sido seus
professores. No velho Oeste, um jovem de dezesseis anos saberia muito bem que uma arma de fogo
podia matar alguém. Ainda mais o filho de um ex-xerife que, com certeza, explicaria ao filho como
manusear uma arma. Está certo que esse deslize não chega a comprometer a história como um todo,
mas, para uma trama ambientada no faroeste, soa esquisito um adolescente não entender o poder
mortífero de uma arma.
2- Quem já assistiu a Dennis, o pimentinha, com certeza devia achar Henry, o pai de Dennis, muito mole
e incapaz de uma ação mais enérgica. Bem, houve um episódio no qual o avô paterno de Dennis diz ao
menino que Henry, assim como ele, também vivia aprontando. Fica subentendido que um dia Dennis
terá um filho igual a ele e que Henry explicará ao neto como o pimentinha aprontava. Façamos a
seguinte pergunta: alguém imagina Dennis ficando mole igual ao pai dele? Com certeza não. O normal é
que crianças ativas e travessas se tornem adultos enérgicos e agitados. E o pai de Dennis é muito quieto,
não tem nenhuma característica de quem foi uma criança travessa. Muitos que viram esse episódio se
perguntaram como um homem que foi uma criança tão agitada tenha ficado assim. Claro que isso não
torna o desenho menos divertido, mas percebemos bem que não seria possível na vida real.
3- Muitos lembram da bela novela Senhora do Destino, não? A novela foi ótima, porém apresentou um
lapso que chega a ser engraçado. Uma personagem, Daiane, moradora de favela, era totalmente
ingênua e ignorante acerca de coisas como a existência de crianças viciadas em crack. Ela fazia uma
tolice atrás da outra e um dia sua mãe e o namorado dela, um taxista, levaram-na para dar uma volta
para conhecer a realidade. E ela se chocou ao ver crianças viciadas em crack. Como uma menina que
nasceu e cresceu numa favela é tão boba? Hoje, qualquer criança, assistindo à televisão, sabe dessas
coisas e ninguém ignora que crianças de favela são mais espertas e têm mais vivência do que aquelas de
classe média alta.
Fazer uma menina de favela ingênua é tão sem sentido quanto fazer um índio não conhecer os
caminhos da floresta, não é mesmo? Embora este erro não tenha chegado a diminuir a qualidade da
novela, não dá para deixar de reconhecer que nenhuma criança ou adolescente que viva nesse ambiente
poderia ser inocente.
Enfim, é fácil observarmos erros nos trabalhos dos outros e difícil que percebamos os que nós mesmos
cometemos. E é exatamente por isso precisamos reler e revisar o que escrevemos, pois nós não
estamos livres de cometer deslizes como os comentados neste artigo.
A rivalidade entre personagens
Um desenho que fez muito sucesso nos anos 80 e que ainda hoje é lembrado com saudade por muitos adultos é Defensores da Terra, em que heróis como Flash Gordon, Mandrake, Lothar e Fantasma, com seus respectivos filhos, defendiam o planeta Terra de Ming, o impiedoso. Era um desenho bastante bom e que muitos hoje podem assistir pelo Youtube.Acompanhando os capítulos, há um que chama a atenção. Nele, os três filhos dos heróis, Rick Gordon, Jedda e LJ (Lothar Junior) pegam umas naves para competir e ver quem é o melhor. Seus pais lhes dão umas grandes broncas, reclamando de suas atitudes e dizendo que são uns tolos. No final do episódio, eles aprendem sobre união e que o mais importante é que aprendam a trabalhar juntos usando seus talentos.Bem, a mensagem final é realmente bastante educativa, mas há pontos a considerar, principalmente porque a bronca dos pais pareceu exagerada. O que eles estavam fazendo de errado ao competir para ver quem pilotava melhor? Vejamos a faixa etária dos garotos: todos pareciam ter cerca de dezesseis anos. Nesta idade, o espírito de competição é bastante normal. Adolescentes lutam por autoafirmação e para se destacar em algo e, ao competir, alguém pode lutar para fazer o seu melhor. Teria ficado mais bem colocado se os pais - que parecem ter esquecido que já tiveram essa idade nesse episódio e, portanto, competiam com seus amigos e outros jovens - lhes dissessem que competir era normal, porém que o mais importante era eles aprenderem a se unir nas horas necessárias.
Além disso, quantas histórias não têm como pontos fortes a rivalidade entre personagens? Que seria de Street Fighter sem a rivalidade dos amigos Ryu e Ken? Os dois eram os melhores amigos, mas competiam entre si. Outra história com personagens rivais é Yu yu hakusho, em que Kuwabara e Yusuke, dois delinquentes juvenis, começam como rivais mas depois se tornam detetives sobrenaturais e se unem para enfrentar demônios. Aliás, desde o começo, pode-se notar que Kuwabara e Yusuke, embora fossem rivais, tinham um grande respeito mútuo. De uma forte rivalidade, podem surgir respeito e amizade. Também podemos mencionar Dragon Ball, com Goku e Vegeta. Ambos são rivais e inimigos no começo, porém se tornaram aliados e se podia ver que um admirava o outro. E o famoso desenho das Tartarugas Ninja perderia metade de sua graça se não fossem as constantes brigas de Raphael e Leonardo. Um vivia a brigar e implicar com o outro e não era incomum que os quatro irmãos competissem entre si para ver quem era o melhor nas artes marciais. Como adolescentes, eles se desentendiam e queriam se afirmar. Entretanto, quando era para combater seu inimigo, uniam-se e esqueciam as diferenças entre eles.Enfim, rivalidade entre pessoas que fazem parte de uma mesma história, especialmente se forem adolescentes, pode fortalecer bastante a trama. Uma certa disputa é normal e - até certo ponto - saudável nessa faixa etária. No caso da história dos Defensores da Terra, os pais não precisavam ter ido tão longe na bronca, agindo como se os garotos tivessem feito algo errado porque, na verdade, não estavam.
Ninguém sabe a verdade
Sabemos muito bem que, para não falar coisas impróprias, devemos analisar bem uma situação antes de
fazer julgamentos superficiais e que soam impróprios para explicar o sofrimento e a maldade humana. E
muitas pessoas, especialmente as religiosas, ficam dizendo coisas que, analisadas a fundo, revelam-se
bastante inconvenientes do tipo: “Ah, foi Deus que quis assim” ou “ isso foi castigo de Deus.” Quando eu
analiso essas frases, provando o quanto, além de impróprias, podem ser ridículas, não estou
questionando a existência de Deus nem fazendo especulações sobre Ele, dizendo que Ele é um Papai
Noel. Aliás, no meu texto, Por que deixei de ser evangélica, deixo bem claro que uma das coisas que me
fizeram sair esta religião foi o monte de mensagens ilusórias que O colocavam como alguém que, no
tempo certo, iria nos cobrir de bênçãos e mudar nossa vida. E analisar bobagens ditas por religiosos não
prova que Deus não existe. Apenas que, independentemente do que acreditamos, precisamos ser
sensíveis ao sofrimento das pessoas antes de dizer coisas que, além de não explicarem nada, ainda
mostram um Deus cruel, mesquinho, vingativo e indiferente. Também vale salientar que dar
diagnósticos sem considerar as circunstâncias de cada caso é bastante errado, porque não podemos
esquecer que cada situação tem causas que não podem ser aplicadas a outros casos. Assim, não
podemos ir logo generalizando e dando opiniões sem avaliar um caso em suas particularidades.
Num dos meus textos, analisei o que disse o reverendo americano Paul Washer. Ele afirmou, com
bastante veemência, que a Aids era castigo de Deus, justificando sua afirmativa com os exemplos do
Dilúvio e de Sodoma e Gomorra. Vejamos bem. Dizer que Aids é castigo divino é algo muito sério. Como
ele pode afirmar isso com tanta certeza? Ele tem alguma ligação direta com Deus, como Moisés e
Abraão? A gente pode dizer que Aids é resultado de uma vida sexual descuidada, mas castigo divino?
Deus apareceu para ele dizendo isso? Ou algum anjo lhe fez a revelação? Da mesma forma,
perguntemo-nos: Baby do Brasil recebeu algum sinal divino que lhe mostrou que o furacão Katrina foi
castigo divino porque a região tem muitos praticantes de vodu? Converter-se a uma religião não torna
ninguém mais sábio ou dono da verdade e, mesmo que você acredite em Deus, tome cuidado ao colocar
o nome Dele para justificar tudo que acontece, ou você soará arrogante e cruel.
Eu posso dizer que o cigarro causa câncer ou que a Terra é redonda porque outras pessoas o disseram
antes de mim e há bases científicas que provam o que eu afirmar, mas não posso dizer algo como: “a
África é um continente amaldiçoado por Deus por causa da bruxaria que se pratica lá” ou que “o rock é
uma música satânica”. Ademais, quando damos diagnósticos baseando-nos em crenças, sejam religiosas
ou não, podemos ser bem preconceituosos. Para reforçar o que se afirma, usemos o exemplo de um
professor de História admirador de Hitler e suas teorias eugenistas – já citado por mim na crônica Certas
pessoas não deviam ensinar- que afirma que o Brasil é subdesenvolvido por causa da nossa mistura de
raças. Esse mesmo professor, ao avaliar a tragédia de Brumadinho, explicou a negligência das
autoridades que deviam cuidar da barragem com a seguinte afirmação: “isso é porque para lá iam os
piores tipos de pessoas, tudo criminoso, gente gananciosa, querendo enriquecer, já que lá havia muito
ouro. Lá, é tudo descendente de ladrão, de desonesto.” Quem é mineiro não deve gostar nada de ouvir
isso. Aliás, esse professor deveria saber que, para a Austrália,(país de Primeiro Mundo) a Inglaterra
também enviava os criminosos. Será que ele saberia explicar isso?
O problema de muita gente é falar antes de refletir ou conhecer uma situação e, quando vêm nos julgar
por analisarmos frases superficiais ditas por gente religiosa, vão logo afirmando que estamos tentando
entender Deus através de nosso limitado entendimento humano. Eu não posso entender Deus. Como
posso entender algo além do que nossa imaginação, razão e conhecimento possam conceber? O que
posso é ver que muitas das tentativas de explicar o mundo colocando o nome de Deus no meio podem
ser vazias e sem sentido. E que muitos dos problemas que ocorrem em nossas vidas, se avaliarmos bem,
têm explicações bem humanas e lógicas. Todavia, muitos vêm logo colocar comentários arrogantes e
vazios na minha escrivaninha, dizendo que meu problema é ver Deus como um Papai Noel e esperar que
Ele resolva tudo.
Quando uma senhora disse algo a mim do tipo: “fazemos nossos planos mas Deus tem coisa melhor
para a gente”, isso me forçou a analisar. Ela por acaso fala diretamente com Deus para poder dizer isso?
Além disso, o argumento dela se provou uma falácia, pois ela acabou com o livre arbítrio, mostrando
Deus como alguém que interfere em todos os aspectos de nossa vida pessoal. Foi algo dito para
consolar, no entanto soou arrogante e superficial. Muita gente, por causa de suas crenças, acha que
pode explicar tudo. Só que a gente nunca deve tentar explicar nada sem antes estudar profundamente o
que nos aparece. E que Deus é esse que interfere assim na minha vida e não interfere quando um louco
resolve atirar em crianças inocentes numa escola? Vale salientar que, nos Estados Unidos, há muitos
cristãos. Então, muitas das crianças que morrem alvejadas são cristãs. Morreram por castigo divino?
Entendamos que mostrar tolices ditas por gente religiosa não prova nada acerca da existência ou
inexistência de Deus. Prova apenas que nossas crenças não explicam tudo que existe e acontece e que
temos de tomar cuidado para não falar coisas superficiais e insensíveis.
Falaram uma vez a uma moça: “quem sabe você ficar solteira não é Deus lhe poupando. Tanto
casamento ruim no mundo, tanta gente que tem filhos ruins.” Mais uma frase de consolo que não prova
nada. Entre tantas outras mulheres que têm o azar de arrumar péssimos maridos, Deus vai se ocupar
dela? Então, é para ela se sentir privilegiada, especial? Se é para Deus poupá-la, então, seria justo exigir
que Ele poupasse um monte de crianças inocentes de sofrer abuso sexual, não? Para mim, já disseram:
“Não namore essa pessoa, minha filha, ore para Deus lhe mandar o homem certo.” Querer que Deus se
dê ao trabalho de me mandar uma pessoa certa em vez de ir namorando e vendo quem é ou não bom
para mim não é me achar importante demais? E depois, o certo não é que a gente vá conhecendo as
pessoas para adquirir sabedoria e veja com nossos próprios olhos o que nos serve? Não viver a vida para
aprender a se defender e esperar que “Deus nos mande a solução no tempo certo” é ficar num estado
de permanente infantilização, esperando que Deus resolva tudo para nós como um pai ou mãe que
atende a todos os desejos de uma criança mimada.
Uma das coisas que mais me disseram foi para não ir atrás de qualquer emprego, mas ficar fazendo
concursos públicos, porque “Deus tinha grandes planos para minha vida” e tinha coisas melhores
guardadas para mim, que me daria no tempo certo. Hoje, vejo que isso foi uma grande mentira, algo em
que me fizeram acreditar mas que não corresponde à realidade e até me impediu de fazer logo a coisa
certa em relação à minha vida. Com tanta gente lutando para arrumar emprego e o nosso país vivendo
uma crise que obriga muitas pessoas a arrumarem trabalhos e serviços muito abaixo do seu nível de
formação, vou ficar me achando especial e importante, acreditando que Deus vai, como um Papai Noel,
mandar um emprego à minha altura embrulhado em fita dourada?
Todo mundo precisa lutar por melhores condições de vida, ninguém pode ficar esperando que Deus
mande soluções milagrosas. Pensar assim até transforma o milagre em algo banal, corriqueiro. O Padre
Quevedo até salientou em um programa que não podemos dizer que qualquer bobagem é um milagre
porque isso significaria que o milagre, então, é uma bobagem.
Entre os motivos mais fortes para ter deixado a religião evangélica está o fato de que eu vi que esses
pastores não são diferentes de quem escreve livros de autoajuda. Eles prometem maravilhas, dizem que
temos “chuvas de bênçãos” para receber e que, no tempo certo, chegará a “vitória” que nos é
reservada. Tudo isso é maravilhoso, mas vazio e irreal. Assim como esses livros de autoajuda pregam
besteiras de que basta fazer afirmações positivas ou saber usar a lei da atração que conseguiremos o
que queremos, esses pastores – especialmente os do tipo de Edir Macedo – ficam dizendo apenas o que
esperamos ouvir e passando um retrato de Deus como o de um grande mágico que resolverá nossos
problemas, fará vir um tempo de abundância ou tudo o mais.
A vida mostra que é bem diferente. As coisas boas aparecem nas nossas vidas se nós fizermos com que
aconteçam, e as coisas ruins são resultado dos nossos erros, escolhas erradas ou mesmo de fatores que
podem estar além do nosso controle, como a crise econômica que nosso país atravessa. E esta crise é
fruto de corrupção e descaso, não vontade de Deus. Todos nós estamos sujeitos às desgraças, doenças
e a encontrar quem nos faça mal. Por não ter conseguido emprego na minha área, vi-me obrigada a
adaptar-me às circunstâncias e vou fazer curso profissionalizante na área de estética para poder
trabalhar, porque não quero mais esperar o tempo de passar em concurso ou de aparecer o emprego
certo.
Portanto, acho que já dei explicações suficientes que mostram que não estou fazendo especulações
sobre Deus nem que espero que Ele seja um mágico que me dará tudo que preciso. Aceitei que, se a
vida é dura para todos, não posso esperar que seja mais fácil para mim e que conhecer a verdade da
vida nos deixa mais preparados para enfrentar os problemas e até tomar as decisões certas.
As péssimas mães da ficção
Costumamos imaginar as mães como seres sábios e fontes inesgotáveis de compreensão e amor.
Porém, a vida real mostra que muitas mães estão bem longe de corresponder a esse ideal divinizado. Há
mães boas e más e mães são seres humanos, que podem dar conselhos errados e cometer muitos
equívocos na educação dos filhos. Algumas inclusive podem ser negligentes, omissas, permissivas ou
rígidas demais, maltratar seus filhos, desprezá-los e fazer tantas outras coisas que podem acabar com
suas vidas. E a literatura, o cinema e a televisão são pródigos em nos fornecer modelos de mães
bastante falhas e até monstruosas.
Um exemplo bem clássico é o da peça Medeia. Quem conhece a mitologia grega com certeza sabe da
história do tosão de ouro em que Jasão e os argonautas partem em busca da relíquia e o príncipe Jasão
é auxiliado por Medeia, princesa e feiticeira que se havia apaixonado pelo príncipe guerreiro. Aliás,
podemos dizer que, se não fossem os conhecimentos de feitiçaria de Medeia , - sobrinha de Circe -
Jasão não teria pego o tosão nem recuperado o seu reino. Ela vai com ele ao seu reino, casa e tem dois
filhos com ele. Entretanto, o ingrato Jasão a abandona para casar com outra. Medeia, para se vingar,
mata os próprios filhos para causar dor ao homem por quem tanto sacrificara. A peça Medeia é um
verdadeiro clássico que tem como tema a vingança.
A Bíblia também tem um ótimo exemplo de mãe que erra muito. Rebeca, esposa de Isaac e mãe de Esaú
e Jacó, tem clara preferência por este último, induzindo-o a enganar o pai para receber a bênção
destinada a Esaú e ajudando-o a fugir para escapar do gêmeo vingativo.
Quem leu o romance Dois irmãos de Milton Hatoum ou assistiu à ótima série produzida pela Globo, logo
percebe que a história dos gêmeos Yakub e Omar é uma clara referência à história bíblica de Esaú e
Jacó. Podemos ver bem como Zana, a mãe dos gêmeos, ama exageradamente o gêmeo transviado
Omar, acobertando descaradamente seus erros, dando desculpas para suas malandragens e
negligenciando seus outros filhos e até o seu marido, Halim. Embora ela se orgulhe de Yakub, aluno
brilhante, dá-lhe pouca atenção e sua atitude acaba provocando a lenta desagregação da família.
Uma mãe monstruosa é a de Preciosa, filme no qual a protagonista é uma jovem negra e obesa de
origem pobre que sofre todos os tipos de abusos possíveis. O pai a estupra e ela engravida dele duas
vezes. Sua mãe, além de conivente com o estupro, ainda a humilha, espanca, obriga a fazer o serviço da
casa e ainda a usa para obter benefícios indevidos da Previdência Social já que, além de nada fazer em
casa, não trabalha e não quer que a filha entre num programa educacional que lhe abrirá as portas para
um futuro, dizendo que Preciosa é burra demais. Uma cena tocante é a em que Preciosa conta como
deu à luz seu primeiro filho: ela relata à assistente social que foi no chão da cozinha enquanto a mãe lhe
chutava a cabeça.
Outra mãe que está longe de ser exemplar é Scarlett O'hara, de E o vento levou. Ela não dá atenção à
filha Bonnie, a ponto do pai, Rhett Butler, ocupar-se inteiramente da menina. Rhett chega a dizer que
uma gata é melhor mãe do que ela. Quem tiver lido o romance de Margaret Mitchell saberá que Scarlett
teve outros dois filhos antes de Bonnie, pois casou duas vezes antes de casar com Rhett. Ela despreza
seus dois filhos mais velhos, que morrem de medo dela.
Também se pode mencionar Fiona Cleary, de Os pássaros Feridos, romance australiano que inspirou
magnífica série protagonizada por Rachel Ward e Richard Clayderman. Embora tenha vários filhos, é
incapaz de lhes dar amor, mostrando gostar apenas do seu mais velho, Frank e trata Meggie, sua única
filha mulher, com total indiferença. Meggie passará grande parte de sua juventude lamentando a falta
de atenção de sua mãe e ambas só chegarão a um entendimento depois que Meggie, já adulta, conhece
um pouco do passado de sua mãe e do que a levou a se tornar uma mulher dura e amarga.
As novelas brasileiras também são cheias de mães que erram e se revelam incapazes de dar amor aos
filhos. Quem assistiu a Avenida Brasil há de concordar que Carminha é uma mãe bem monstruosa. Só se
importa com seu mais velho, Jorginho, e despreza de forma bem explícita sua caçula, Agatha,
humilhando-a e ridicularizando-a, fazendo piadas de mau gosto com o fato da filha estar acima do peso.
Com certeza, há diversas mães que estão longe de ser modelos de amor e compreensão na ficção e na
vida real. No caso da ficção, se elas fazem os filhos sofrerem, pelo menos podemos dizer que rendem
histórias complexas e fascinantes.
A importância de criar bons personagens
Não é fácil criar uma boa história, pois isto exige saber elaborar uma trama envolvente e verossímil, com
temas interessantes, um começo que atraia a atenção dos leitores e/ou espectadores e um
desenvolvimento que não seja nem rápido nem lento demais. Porém, o mais importante é criar bons
personagens, porque eles são a verdadeira alma da história e quem lê ou assiste precisa se interessar
pelo destino dos personagens. Como criar um bom personagem? Não há uma resposta única, mas é
bastante óbvio que isto dependerá e muito da habilidade, conhecimentos e esforço do escritor, o qual
precisará estar atento a inúmeros detalhes para construir um personagem com o qual nós nos
identifiquemos à medida que mergulhamos em seus dramas,lutas e desenvolvimento.
Ainda que não haja fórmulas para compor personagens que conquistem quem vai ler um livro ou assistir
a um filme, seriado ou novela, podemos ver que há atitudes que poderão nos ajudar, como:
1-fugir de estereótipos - recorrer a estereótipos como a donzela indefesa, o vilão que é apenas malvado,
a vilã sedutora ou o alívio cômico podem indicar falta de criatividade. Assim como o ser humano é
complexo na vida real, assim deve ser com os personagens. Quanto mais reais eles parecerem, mais
conseguiremos nos identificar com eles e suas histórias. Aliás, muita gente que tenta fugir do clichê da
donzela em perigo tem recorrido muito a outro modelo feminino que alguns já
têm começado a considerar clichê: o da personagem feminina forte, que luta, usa armas, pratica artes
marciais e tem que provar aos homens que é tão boa quanto eles. Temos a impressão que só há
mocinhas delicadas ou mulheres duronas. E não é assim. Nada contra uma mulher lutar artes marciais
ou usar espadas. Mas ser forte é muito mais que isso. Além disso, lembremos que tanto o homem
quanto a mulher têm seus lados frágeis. Outros estereótipos dos quais é bom fugir são o gordo cômico e
o negro que só serve como coadjuvante. Nestes tempos de representatividade, não vale mais reforçar
preconceitos contra gordos e negros, que são seres humanos como todo mundo.
2- O personagem tem que ter um perfil que combine com sua história - um personagem que passou por
determinadas experiências tem conhecimentos e uma determinada visão de mundo. Se um personagem
vive numa favela, ele não pode ser inocente. Da mesma forma, um personagem que vive no Rio de
Janeiro não pode falar como um sulista. Caso um personagem tenha passado um tempo na prisão, é
evidente que tem que ser uma pessoa endurecida, sem ilusões e que saiba se defender, até porque
muitos dos que estiveram presos precisaram brigar para conquistar respeito na prisão. Um personagem
cujo perfil é adequado à sua história é o guerreiro Guts, do mangá Berserk. O jovem nasceu em
condições difíceis,criado por mercenários, aprendeu a lutar para sobreviver entre batalhas renhidas, foi
obrigado a treinar extenuamente ainda muito criança, foi vendido pelo pai adotivo a um pedófilo que o
estuprou e teve de matar o homem que considerava o pai para não ser morto. Não era de se esperar
que ele fosse uma pessoa doce e inocente, não é? Ele é endurecido, confia apenas em sua espada e,
somente aos poucos, mostra que é muito mais sensível do que aparenta. Também podemos mencionar
o delinquente Ash, do mangá Banana Fish, que foi criado por um mafioso que o fez de brinquedo
sexual, marcando sua infância com traumas. O jovem tem um olhar de pessoa desiludida e solitária.
3 - O personagem precisa mudar - se um personagem passou por coisas como ser sequestrado e feito de
escravo sexual, ele não pode voltar a ser a pessoa que era antes de passar pelo que passou. Ele pode até
se tornar mais forte e maduro, mas nunca será quem era novamente. Caso ele fosse uma pessoa
infantil, imatura e superficial antes de ter sofrido todas essas violências, esta será uma boa forma de
fazê-lo se tornar uma pessoa mais madura, com uma outra visão de mundo. Os personagens têm de
amadurecer, evoluir e crescer para parecer reais. Hoje em dia, não faz mais sentido botar personagens
que não mudam. A natureza humana é dinâmica e mutável. Um bom exemplo de personagem que
muda e amadurece é o Urie, de Tokyo Ghoul re:. No começo da saga, o líder do esquadrão Quinx era
egoísta, arrogante e superficial, mais preocupado em conquistar um posto elevado do que exercer seu
papel de líder e orientar seus companheiros. Mas mudou consideravelmente após a morte de seu colega
Shirazu, que se sacrificou ao matar um poderoso oponente. Ver o seu colega morrendo em seus braços
fez Urie se tornar mais consciente da sua responsabilidade como líder e ter mais consideração por seus
colegas. Muitos fãs da saga o consideram o melhor exemplo de personagem cujo caráter muda
consideravelmente.
4 - criar personagens complexos - nós não somos só bons ou maus. Assim, um personagem, mesmo
sendo vilão, pode ter um lado bom que o humanize e, caso o autor queira que nós o entendamos, ele
pode mostrar sua história para que passemos a gostar dele. Don Vito Corleone, de O poderoso chefão,
podia ser um mafioso implacável, mas era um marido e pai exemplar e Shylock, o agiota de O mercador
de Veneza, embora fosse um usurário impiedoso, era comovente ao falar de como sofria preconceitos
por ser judeu. Ultimamente, tem crescido a popularidade dos anti-heróis, que são os personagens que
não se enquadram nos padrões sociais, seguindo um código próprio de conduta, como Scarlett O'hara,
de E o vento levou. Mimada, egoísta, arrogante e interesseira, poderia ser uma vilã, mas não há como
não nos encantarmos com sua luta para se reerguer da miséria e impedir que sua família morra de
fome. Ela pode ser egoísta, mas também é muito obstinada e inteligente.
5- perguntemo-nos se o personagem é realmente necessário - infelizmente, se certas tramas são muito
longas e possuem muitos personagens, sempre há o risco de haver personagens desnecessários, que
sentimos que não fazem falta. Um outro problema que pode surgir em tramas com personagens demais
é não aproveitar bem certos personagens. O que o escritor pode fazer? Tentar imaginar como seria a
trama sem o personagem. Será que tal personagem é fundamental?
Como podemos ver, criar bons personagens talvez seja a parte mais difícil de se escrever uma história.
Porém, se nossos leitores gostarem deles, sentiremos que foi recompensador ter investido tanto neles.
Não existem mimimis
“A vida avança, velho, e quem não avança com ela fica só, como você.”
Maximus Gorki
Hoje em dia, todo mundo adora falar que tudo é mimimi, frescura ou exagero. Se falarmos de bullying,
essas pessoas que usam o discurso do mimimi dirão que, no tempo delas, isso era coisa normal e
ninguém falava nada. Dirão que agora gays, negros e mulheres são cheios de besteiras e tudo o mais.
Façamos uma pergunta: será que essas pessoas que falam em mimimis são capazes de se colocar nos
lugares das pessoas que elas chamam de “frescas” ou “melindrosas”? Dizer que leis antibullying ou que
protegem as mulheres, negros, homossexuais e índios são exageros do politicamente correto não é
apenas insensível, é uma prova de que quem diz isso, provavelmente, não presta atenção ao mundo à
sua volta nem percebe que a vida evolui, anda para a frente.
Podemos falar que os negros são cheios de mimimis quando lembramos que, por um bom tempo, eles
foram escravos não só no Brasil mas em outros países? Existe frescura e exagero por parte dos negros
quando sabemos bem que, quando uma pessoa de pele negra entra num shopping, todos os seguranças
já ficam de olho em seus movimentos, como se esperassem que ela fosse furtar algo? E, se houver um
furto, suspeitarão logo dela. Ninguém também pode falar em mimimi quando se fala em bullying. Se
bullying fosse apenas “besteira de jovem”, não haveria tantos casos de depressão e suicídio. Bem, talvez
alguém diga que os jovens de hoje estão muito fracos e que, antes, não havia “essas frescuras”, pois
cada um que aprendesse a se defender. Mas a gente pode dizer que é bobagem ser injustamente
perseguido por um bando de valentões que se aproveitam de quem está em desvantagem, tratando
essa pessoa como se ela fosse alguém sem valor, servisse apenas para ser saco de pancadas?
Imaginemos como é alguém que sofre bullying e não entende por que o perseguem, sente-se sozinho,
ignorado por todos, como se suas dores e o fato de ser agredido, humilhado e perseguido sem motivo
não fosse importante. É frequente que lhe digam que isso é “normal”, que antes era só brincadeira e
que hoje as pessoas estão muito exageradas. Com frequência, as próprias famílias das vítimas de
bullying dizem que a culpa é delas, que não sabem se defender e que os outros as agridem porque elas
são bobas e passivas. Será que a questão do bullying é mesmo vitimização? Então, vejamos os casos de
Columbine, de tantos outros tiroteios em escolas e o de Suzano. Todos os atiradores haviam sofrido
bullying. Claro que nada justifica que vidas inocentes sejam ceifadas de maneira tão violenta. Mas o fato
dessas pessoas chegarem a atos tão extremos é uma prova do quanto o bullying causa danos
psicológicos que não podem ser ignorados.
No caso da Lei Maria da Penha, é mimimi? Então, mulher é mesmo para apanhar? Lutar por nossos
direitos não é mimimi, é reconhecer nossa dignidade como seres humanos. Não seria necessário que
houvesse leis que criminalizassem a homofobia e o racismo se não existissem o racismo e a homofobia
e se todas as pessoas entendessem que somos todos iguais no nosso direito de ser tratados com
dignidade. Antes, mulheres eram consideradas quase incapazes e hoje, mesmo com todos os avanços,
ainda enfrentam muitos preconceitos. Culpa-se a mulher que foi vítima de estupro, assédio sexual. Uma
mulher, muitas vezes, tem que provar que é tão boa quanto seus colegas homens se ocupa uma posição
importante. Seria ótimo que chegássemos ao ponto de nenhuma mulher mais precisar sentir que tem
de provar que pode ser tão boa quanto um homem na execução de uma tarefa. E que ninguém mais
visse negros como seres inferiores – um absurdo num país com tanta miscigenação racial – ou
homossexuais como abominação. Homossexualidade já foi considerada doença, é vista por muitos como
pecado grave e, em outros tempos, era um crime passível de condenação à morte em muitos países.
Nos países do Oriente Médio, eles são enforcados.
Seria ótimo que não separássemos mais as pessoas em negros, mulheres, índios, homens,
homossexuais, heterossexuais, crentes, descrentes e tantas outras categorias. O bom seria que todos
nós nos víssemos como seres humanos.
Não podemos decidir a vida dos nossos filhos
"Fruto quando amadurece,
cai das árvores no chão,
e filho depois que cresce
não é mais da gente não."
Jacinta Passos
"Vossos filhos não são vossos filhos.
São os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma.
Vêm através de vós, mas não de vós.
E embora vivam convosco, não vos pertencem."
Khalil Gibran
Sim, todos cometem erros, mesmo quando têm as melhores intenções. E os pais, como seres humanos,
irão cometer vários. Entre os erros que eles podem cometer, além do da superproteção, está o de tentar
decidir a vida dos seus filhos por eles, ditando-lhes seus caminhos. Muitos filhos, devido a isso, em vez
de viver suas vidas, acabam vivendo verdadeiras mentiras, pois sentem que fazem apenas o que seus
pais mandaram. Com certeza, os pais usarão todo tipo de argumento para forçar os filhos a fazer tal
curso superior, seguir tal profissão, não namorar aquela pessoa e o mais comum será o de querer o
melhor para os filhos. Certo, mas temos que entender que, obviamente, o melhor para uma pessoa não
é impedi-la de andar com as próprias pernas, de usar o próprio discernimento para decidir que caminho
tomar na vida. Ela é quem tem que saber o que lhe convém, não os pais. Os pais devem guiar os filhos
sim, mas só até um determinado estágio. Depois, os filhos terão que usar o que aprenderam para tomar
suas decisões. Não cabe aos pais decidir que os filhos devem fazer Medicina, assumir seus negócios ir
ou não para o exterior. Claro que haverá quem diga que os pais "sabem o que é melhor para os filhos".
Errado. Frequentemente, não sabemos nem o que é melhor para nós mesmos. Tomamos muitas
decisões equivocadas e fazemos escolhas erradas. Como saberemos o que é melhor para outro ser
humano, que vive outra realidade, tem outra visão de mundo, sentimentos, conhecimentos e
aspirações? Os filhos são pessoas separadas dos pais, indivíduos que precisam fazer suas escolhas.
Porém, não são poucos os pais que agem como se os filhos fossem suas extensões.
Cada época tem seus aspectos problemáticos e um dos aspectos problemáticos da nossa época é
vermos adultos inseguros, despreparados e medrosos, que agem como adolescentes. Se repararmos
bem, todos esses adultos foram superprotegidos, criados por pais que os impediram de tomar suas
decisões, usando as velhas desculpas de "você não sabe das coisas", "eu sei o que é melhor para você",
"faça isso que é o que lhe serve". E quantos, em vez de seguir a profissão que sonhavam, não fazem o
que os pais determinaram ou deixaram de casar com quem gostavam para casar com alguém que
correspondesse ao que os pais consideravam o cônjuge ideal? Isso não é guiar nem ensinar os filhos,
mas mutilar seus espíritos, criatividade e independência, impedindo-os de ser seres humanos livres,
autônomos, fortes e seguros. Eles terminam por agir como robôs, sem seguir seus impulsos ou sonhos,
mas os sonhos de outras pessoas. Dizer que os pais agem assim por amor é mentira. Fazem-no por
egoísmo, por considerar os filhos suas propriedades. E vários são os filhos que nem sequer casam
porque os pais interferem nas suas vidas, dizendo sempre que eles começam um relacionamento: "essa
pessoa não serve para você." Será que os pais queriam impedir que os filhos casassem com pessoas que
os fariam sofrer? Psicanalistas e terapeutas são unânimes em dizer que os pais que assim o fazem
querem os filhos junto a eles, pois isto lhes dá segurança. Todo mundo tem seu lado egoísta e, quando
pais tratam filhos adultos como crianças justificando-se com a afirmação de que "os filhos sempre serão
crianças para os pais", eles não estão fazendo isso pelos filhos, mas porque isso os faz se sentir bem.
Pensemos bem nos filhos que queremos deixar para o mundo. Queremos gerar seres fracos ou pessoas
capazes de andar por si mesmas? Dizer que se protege demais ou se toma decisões porque o filho é
inocente ou não conhece a vida é egoísmo. Um dia, você não estará mais aqui para protegê-lo das
maldades e perigos do mundo. Imaginemos se os pais de crianças indígenas as prendessem porque as
florestas são perigosas? O que eles acabariam fazendo? Transformariam os filhos em seres fracos e
incapazes de se defender. Não podemos usar o argumento de que o mundo é cheio de perigos para não
deixar que os filhos se desenvolvam. Eles precisam se arriscar, cometer erros, descobrir o que serve para
eles. Não estaremos aqui para sempre para fazer isso por eles. O que será de uma moça que, sempre
que quer namorar, a mãe diz que tal homem não serve para ela ou nenhum homem presta? A mãe vai
conseguir protegê-la de um mau casamento? Não, vai impedi-la de viver e experimentar a vida para
adquirir sabedoria e confiança na sua capacidade de tomar decisões. Da mesma forma, filhos que fazem
cursos ou seguem carreiras forçados pelos pais podem até ter sucesso no que farão, no entanto, serão
pessoas frustradas por não terem tido suas experiências. E, quando os pais dizem que têm que decidir
por eles porque eles são muito ingênuos e inexperientes, eles contribuem para que os filhos duvidem de
si mesmos.
Também não adianta dizer que não queremos que eles sofram. Todos nós vamos sofrer de alguma
forma. E tratar alguém como se fosse feito de cristal, prendendo-o junto a si, só causará um sofrimento
maior àquela pessoa que foi impedida de voar e seguir sua vida. Quando ela tiver que tomar suas
decisões, ela sofrerá mais por ter sido impedida de fazê-lo até então. Um dia, ela também verá que só
poderá contar consigo mesma. Como se sentirá ao se ver nessa situação alguém que foi podado, que
não permitiram que se desenvolvesse? Não podemos tratar um filho como se ele fosse especial. Assim
como as outras pessoas, ele terá de aprender a encontrar seu lugar nesse mundo. Aliás, ele é especial
para você, não para as pessoas lá fora. Ele terá que mostrar seu valor aos outros, fazer com que vejam
que é capaz, defender-se com suas habilidades. Você gostaria de pensar que você o impediu de
amadurecer? Como seriam os filhotes de águia se as mães não os deixassem sair do ninho com a
desculpa de que os ventos são perigosos e que eles não estão prontos para voar? Chegará o momento
em que eles terão que voar, e o mundo não vai querer saber se eles estão prontos ou não. O mundo não
se adapta às nossas exigências e gostos. Temos que nos adaptar ao mundo para vencer as dificuldades.
Fazer tudo pelos filhos chegando ao ponto de decidir suas vidas não é amor e proteção, mas opressão
disfarçada de zelo. Se você se sente bem tratando seus filhos como crianças numa idade em que eles
têm que fazer suas escolhas, pergunte-se se você gostaria que lhe tratassem assim.
Pessoas com várias faces
Vários anos atrás, li uma história cujo título era A menina que era duas. A protagonista se tratava de
uma menina que era bastante amável com a professora mas que tratava a mãe com extrema rudeza. A
própria mãe sentia que a menina gostava mais da professora do que dela. Após ler, fiquei pensando:
quanta gente não é assim? Trata os de fora com toda a amabilidade e maltrata os de sua família?
Conheço o caso de um professor que reclama que os filhos mal falam com ele em casa e diz que, lá fora,
todos o adoram. Mas a verdade é que ele maltrata a mulher e os filhos e, quando está no trabalho ou
encontra os amigos, transforma-se a ponto de ninguém de sua família reconhecê-lo. Vira o ser mais
adorável do mundo. Por que será que há tantas pessoas assim, que são incapazes de dizer uma palavra
carinhosa para os seus familiares e tratam tão bem os de fora? Bem, lá fora, elas se preocupam em
causar boa impressão mas, dentro de casa, mostram-se como são: rudes, insensíveis e egoístas.
Quantos não são os homens que são trabalhadores exemplares, membros respeitáveis da sociedade,
solidários com os amigos e frequentadores assíduos das igrejas que batem nas esposas e nos filhos? Da
mesma forma, há filhos que são amáveis com os professores e amigos e tiranizam os pais. E muitas
mulheres que parecem ser irrepreensíveis são verdadeiros monstros com os filhos. Em casa, pais que
maltratam os filhos costumam reclamar: lá fora, todos gostam de mim. Mas meus filhos não querem
nem conversa comigo. Por que será? Não dá para desconfiar de um pai ou mãe cujos filhos fazem de
tudo para evitar? Se fosse apenas um filho que agisse assim, o problema seria do filho mas, sendo todos
os filhos, há bons motivos para termos dúvidas se uma pessoa dessas é tão boa. Às vezes, o amor de
quem tem que conviver com pessoas tirânicas que parecem anjos fora do ambiente familiar morre.
Cheguei a essa conclusão ao ver a história de uma mulher que resolveu comemorar a morte do marido
fazendo uma festa. Podemos chamá-la de monstruosa? Temos de admitir que ela é sincera. Muitos são
os que não lamentam a morte dos seus cônjuges ou genitores, porém fingem tristeza para não causar
má impressão. O ambiente familiar pode ser um verdadeiro inferno. Então, não podemos julgar a
atitude dessa senhora.
Que dizer? Apenas que as aparências realmente podem nos enganar. Uma pessoa que pensamos ser a
mais simpática do mundo é assim apenas diante daqueles para quem quer causar boa impressão. A vida
social exige que usemos máscaras e essas pessoas sabem muito bem como usar as suas.
Será que foi o que tinha de ser?
Se alguém conheceu a história de Jacqueline Saburido, jovem venezuelana que se tornou um símbolo
das desgraças que podem acontecer quando se dirige alcoolizado, com certeza deve saber que esta
moça morreu este ano, em consequência de um câncer, com a idade precoce de quarenta anos. Antes
de morrer, Jacqui Saburido lutou durante praticamente vinte anos contra as limitações físicas
resultantes de um terrível acidente sofrido quando tinha apenas vinte anos numa época em que ela
estava vivendo nos Estados Unidos. Um motorista alcoolizado, jovem de dezoito anos, bateu em seu
carro. As duas amigas de Jacqui morreram no acidente, mas Jacqui, que até então levava a vida normal
de uma bonita jovem de vinte anos, estudante universitária cheia de planos e que pretendia casar, ter
filhos e trabalhar com seu pai, um empresário, teve seu destino alterado para sempre: a jovem, por
alguns segundos que, com certeza, pareceram uma eternidade, foi queimada viva. Levada ao hospital
com 60% do corpo queimado, sua sobrevivência era algo improvável. Entretanto, ela sobreviveu, com o
corpo e o rosto destruídos pelo horrível acidente. O motorista foi sentenciado a sete anos de prisão.
Jacqui Saburido, uma bela jovem, perdeu os dedos das mãos, o nariz, a pálpebra do olho esquerdo,
quase toda a visão e seu pai, corajosamente, deixou os negócios para se dedicar inteiramente à filha,
que, além das deformações, ficou com os movimentos limitados. Durante os anos seguintes, Jaqui se
tornou um exemplo de superação, fazendo campanhas alertando para os riscos de dirigir alcoolizado,
mostrando galhardia diante das limitações físicas e das mais de cem cirurgias plásticas que precisou
fazer e dando um exemplo de esperança. Entretanto, nos últimos anos, ela estava lutando contra um
câncer e sucumbiu em 20 de abril de 2019, sendo enterrada ao lado de sua mãe. Que podemos dizer do
fato dela ter sobrevivido ao acidente? Que sua sobrevivência foi uma misericórdia, um livramento
divino? E por que ela teria que sobreviver se passaria os vinte anos seguintes lutando contra as muitas
dores e dificuldades proporcionadas por sua nova condição, fruto de uma irresponsabilidade de
proporções inimagináveis que ceifou a vida de duas moças, provocou sofrimento às suas famílias e a
condenou a uma semivida? Houve um propósito para isso? As pessoas dizem muito que “Deus escreve
certo por linhas tortas” e que tudo que passamos é um teste para nossa fé.
Sejamos sinceros: parece justo que tal coisa tenha acontecido a essa jovem que nada fez além de estar
no lugar errado em hora imprópria? E, do mesmo jeito que poderia ter sido ela, poderia ter sido outra
pessoa que teria sua vida destruída pelo motorista irresponsável. Ele também poderia não ter atingido
ninguém, mas ter simplesmente batido contra um poste e morrido. Falar que o acidente dela teve um
propósito soa injusto. Ela precisou ter seu rosto e suas chances de ter uma vida normal e feliz destruídos
para alertar as pessoas contra dirigir alcoolizado? Também parece insensível agradecermos por
estarmos tão bem e nada ter acontecido conosco, não? Porque, se eu agradeço porque não sofri um
acidente que me deixou deformada, isso dá espaço para uma reflexão bastante cruel: a de que Deus,
possivelmente, escolheu que isso acontecesse com Jacqui Saburido, que era uma pessoa com direito a
ser feliz como qualquer outra. E, se ela estava mesmo destinada a morrer jovem por causa do câncer,
que pelo menos houvesse tido uma vida normal.
Com certeza, essa reflexão enfurecerá muita gente religiosa. Alguns dirão que Deus não é cruel, apenas
não somos capazes de entender os Seus propósitos porque nosso entendimento é limitado ou que isso
não foi culpa nem desejo de Deus, mas o resultado de não se saber usar o livre arbítrio. Certo, o
motorista que causou o acidente que destruiu a vida de Jacqui usou erradamente seu livre arbítrio, mas
ela, com suas amigas, não tinha feito nada de errado. Ela estava usando seu livre arbítrio para viver
normalmente sua vida. O argumento do livre arbítrio se mostra falho quando usamos a situação de uma
criança que está sendo abusada. O abusador está usando seu livre arbítrio para molestá-la, só que ela,
evidentemente, está sendo impedida de usar o seu. E falar que tudo que ocorre tem um propósito
também não soa satisfatório. Qual o propósito de tantas pessoas inocentes morrerem em atentados
terroristas, bombardeios, tiroteios promovidos por esses loucos que invadem escolas e outros lugares
de grande circulação? Houve um propósito para tantas crianças morrerem quando as bombas foram
lançadas em Hiroshima e Nagasaki ou para tantas pessoas serem atingidas pelo napalm no Vietnã ou
gente morrer nos atentados às torres gêmeas do World Trade Center? Aliás, muitos sobreviventes dos
atentados terroristas nunca se recuperaram totalmente da terrível experiência. Muitos morreram de
câncer por causa dos agentes químicos liberados na explosão, outros se tornaram alcóolatras, viciaram-
se em drogas ou cometeram suicídio. Houve um propósito para terem sobrevivido ao atentado, já que
teriam de morrer de qualquer forma? Certamente, haverá quem diga que Deus não os mandou se
viciarem em drogas, álcool nem os mandou cometer suicídio ou lhe causou câncer. O que podemos
concluir? Não dá para dizer se isso foi plano de Deus, que tenha precisado ocorrer. Aliás, se as
desgraças são plano de Deus, por que Ele escolheria que uma moça inocente como Jacqui Saburido teria
de sofrer? E por que ela teve de sobreviver para aguentar mais vinte anos numa vida incompleta,
dependendo de cuidados intensos para lidar com os movimentos limitados e a dor intensa? Ela devia
pensar muito no que sua vida poderia ter sido e não foi. A própria moça disse que reservada todos os
dias cinco minutos para chorar.
Não se está dizendo que não se deve admirar a força e o altruísmo de uma pessoa que soube tirar forças
da dor para fazer algo bom e alertar as pessoas, só que parece cruel pensar que algo assim tenha
precisado acontecer. Não é plausível e, sinceramente, soa muito desumano impor sofrimento assim a
alguém. Não podemos realmente concluir nada, pois não dá para tirar nenhuma conclusão usando
nossa razão. Só que vemos bem que nenhuma explicação religiosa soará convincente. Talvez não tenha
havido uma razão para que Jacqui tenha sido atingida pelo bêbado inconsequente. Foi tudo um infeliz
acaso.
O que é preciso
Um livro que deveria ser lido por todas as mulheres é o famoso Complexo de Cinderela, de 1980, de
Collette Dowling, autora americana que, motivada por problemas pessoais, resolveu analisar as vidas de
mulheres que, como ela, encontravam-se infelizes, estagnadas e sentindo que algo as impedia de viver
plenamente. O estudo levantou questões importantíssimas acerca de um fato crucial: o de que as
mulheres é que impedem o próprio desenvolvimento. Isso levou à criação de um belo livro, que mostra
como as mulheres ainda sonham em ser salvas e esperam que os homens as protejam e sejam os
responsáveis por sua felicidade. O sucesso do livro deu origem a um termo muito importante: o
Complexo de Cinderela, que se refere a mulheres que, consciente ou inconscientemente, fazem de tudo
para se manter dependentes e numa posição que as impede de ser responsáveis por suas vidas.
Com a leitura deste livro, aprendemos a olhar com outros olhos uma situação ainda muito comum: a de
mulheres que se mantêm presas a casamentos infelizes, alegando que fazem de tudo pelos filhos e que
aguentam a pressão em nome da estabilidade familiar. Vemos muito isso no nosso dia-a-dia. São
mulheres que, sejam como donas de casa, trabalhando fora ou até mesmo sustentando seus maridos ou
companheiros, que aguentam casamentos ou relações abusivas ou que, simplesmente, não levam a
nada. Quantas não suportam, com uma expressão resignada, maridos que as maltratam, bebem, batem
nelas e por aí vai? É comum que as vejamos como santas, que fazem isso para que suas famílias não se
esfacelem. Será que ficar ao lado de homens assim é tão heroico mesmo? Se as mulheres não
trabalham, podem usar a desculpa de que, como não podem sustentar a si mesmas. E se elas trabalham,
por que não deixam esses homens que não são capazes de construir com elas uma boa relação familiar?
Será que elas não criaram uma zona de conforto que lhes permite ficar na posição de não ter que
assumir responsabilidades ou na ilusão de que têm uma família? A desculpa de não ter qualificação para
trabalhar não convence, afinal, muitas são as que, com pouco estudo, têm coragem de largar seus
companheiros e, indo embora com seus filhos, refazer suas vidas, ainda que com todas as dificuldades,
trabalhando.
Houve o caso de uma mulher que antes, quando era mais fácil arrumar emprego e não se necessitava
tanto estudo e qualificação, dizia que não ia atrás de trabalhar porque não queria que os filhos ficassem
sozinhos em casa. Estranho que essa mesma mulher foi criada por uma que trabalhara a vida inteira e
tinha uma irmã com pouco estudo e cinco filhos que trabalhava em todo tipo de serviço. Ela também
poderia ter feito algum curso profissionalizante e não o fez. Chegaram a lhe arrumar emprego e ela não
quis, dizendo que o marido não iria gostar. Ela também dizia que não deixava o marido por não querer
que os filhos crescessem sem pai, pois o pai a abandonara. Assim, o que ela fez? Aguentou um
casamento infeliz, arrastando os filhos numa rotina doentia e se queixando de que era maltratada pelo
marido, que não provia suas necessidades afetivas e materiais como ela almejava. Será que ela agiu
assim pensando nos filhos ou preferiu aguentar um casamento infeliz para não ter que ir à luta? Ela
poderia ter ido atrás de aprender a fazer unha, penteados, costura e não quis nada, No livro Complexo
de Cinderela, Collette Dawling diz sem rodeios que a mulher que faz tudo para manter a família não é
heroína, é uma covarde que, por medo e desejo de ser dependente, permanece numa posição
confortável em vez de tentar romper o círculo vicioso. Ao mesmo tempo, ainda que o marido estivesse
errado, ela não o contrariava para não sofrer represálias. Se ela foi infeliz, podemos dizer que o marido
foi culpado por ter sido egoísta e castrador, mas ela contribuiu para isto não fazendo nada. E não fazer
nada diante do que está errado é ser cúmplice.
Além dos inúmeros exemplos na vida real, podemos falar também de casos na ficção, como o filme
neozelandês O amor e a fúria, em que uma família pobre, de origem maori, é um perfeito exemplo de
violência doméstica. O marido Jake, desempregado, usa todo o dinheiro do seguro desemprego para
beber com seus amigos e sua mulher, Betty, aparentemente, sustenta todo o peso de criar os cinco
filhos e levar adiante a situação. Tudo muda quando sua filha mais velha, Grace, começa a se revoltar
com o fato da mãe não fazer nada em relação aos problemas, que incluem um irmão delinquente. Betty
só toma uma atitude após ocorrer uma tragédia: Grace, após ser abusada por um amigo do pai, comete
suicídio e a mãe, ao ver que não pode continuar assim ou a família irá se destruir, resolve deixar Jake,
levando seus outros quatro filhos. O que podemos ver? Que Betty deixara tudo ir longe demais e que
não vale a pena ficar numa situação que não levará a nada.
Outros bons exemplos são o livro Tô pedindo trabalho, de Terezinha Alvarenga, no qual Tuca, menino de
favela, vê a mãe ser espancada pelo companheiro Bené, a quem sustenta. Bené, alcóolatra, não trabalha
e ainda quer abusar da irmã de Tuca, Divina. Tuca não consegue entender o porquê da mãe não deixar
um homem que não passa de um parasita e é violento, mas ela diz que um dia ele entenderá.
Quem leu o livro O feijão e o sonho, de Orígenes Lessa, talvez lembre de Maria Rosa, esposa do poeta
Campos Lara. Ela sempre se queixava de que o marido era um sonhador que não cuidava de prover as
necessidades da família. Porém, há uma passagem no livro em que ela pensa em deixa-lo. Será que a
infância miserável dos filhos foi culpa apenas dele? Ela foi tão heroica assim ficando com ele em vez de
partir e tentar recomeçar a vida? Lugar para ir não faltava, já que ela tinha a casa dos pais. É muito fácil
para uma mulher culpar o marido por tudo, fazendo-o de lixeira da história em vez de tentar analisar o
papel que ela tem numa relação doentia. Lembremos que uma relação é constituída de duas partes.
Culpar uma pessoa, o destino ou até a Deus por nossa infelicidade é bem mais fácil do que tomar uma
atitude e tentar aprender a cuidar de nós, não?
Podemos dizer que isso é totalmente culpa dessas mulheres? Não, isso é uma herança de nossa cultura
machista, que ainda valoriza muito a imagem de um homem como salvador e protetor que suprirá todas
as nossas necessidades. Entretanto, não dá para evoluirmos se não rompermos com essa ideia, que se
reflete em muitas fantasias femininas. Podemos ver mesmo como as mocinhas ainda suspiram por
príncipes encantados ao comprovar o sucesso de obras como Crepúsculo, em que Bella, menina comum
e sem graça, alcança sua realização ao cair nas graças de Edward. Aliás, em muitos filmes e seriados
românticos, não é incomum vermos uma protagonista que se acha feia e só aprende seu verdadeiro
valor quando um bonitão se apaixona por ela. Na vida real, apenas a pessoa pode descobrir seu
potencial. Ninguém mais pode fazer isso por nós.
A maneira errada como as moças continuam a ser educadas faz com que muitas só se sintam realizadas
se estiverem ao lado de alguém. A moça que não tem namorado é vista como esquisita e um fracasso.
Se ela não consegue homem, então, não é boa o suficiente. Isso leva muitas a aguentar namorados que
não as valorizam por pensarem que não são valiosas o bastante para conseguir alguém que as trate
melhor ou então, elas têm tanto medo de ficar sozinhas que suportam isso para dizer que têm alguém.
O que é preciso? Que as mulheres entendam que não podem mais ficar com aquela ideia de que ter um
relacionamento na vida delas é tudo. E que persistir em manter um casamento ruim em nome do amor
pelos filhos não é altruísmo, é comodismo, como bem mostra o livro de Collette Dowling, que é um tapa
na cara de muitas mulheres, revelando que elas, mais do que os homens, são as que fazem tudo para
ficar na posição de dependentes subalternas porque isso é cômodo. É cômodo, mas acaba por fazer com
que não apenas ela, mas também os filhos, sofram. Um dia, os filhos, analisando a situação que viveram
com mais frieza verão que não foram somente seus pais que os fizeram sofrer, mas que suas mães,
sendo passivas, obrigaram-nos a viver numa rotina abusiva.
O fraco argumento do tempo de Deus
Entre as muitas coisas que ouvimos nos templos evangélicos está o argumento de que tudo é no tempo certo de Deus, que podemos querer algo mas que, se for da vontade Dele que o tenhamos, só será no tempo que Ele quiser. Foi um argumento que ouvi por bastante tempo e que hoje vejo que prejudicou minha vida, especialmente nas questões práticas. Também vejo que esse argumento só dá a entender o seguinte: se Deus tem algo para nós que dará no tempo determinado, então, de nada adiantaria lutarmos pelo que queremos. Um bom exemplo que daremos aqui é o da busca por emprego, um pedido que podemos considerar bastante legítimo afinal, não ter emprego é algo terrível. Pedir por um emprego ou para passar num concurso público para ter a sonhada estabilidade é algo perfeitamente compreensível, não? E sabemos bem que a vida é incerta, pois não podemos prever o que acontecerá amanhã. Também não é segredo que, se não conseguirmos logo, será mais difícil conseguir amanhã. Uma pessoa, depois de uma certa idade, é considerada velha para arrumar o primeiro emprego. Quando eu queria muito um emprego e estava lutando para passar nos concursos públicos e, cansada de tentar só por um caminho, resolvi tentar ir atrás de outros, ouvi muito que eu não deveria ir, porque Deus me daria um emprego à minha altura no tempo certo. Quando eu falava que estava cansada de sentir o tempo passando e não conseguir emprego, diziam-me para ter fé, orar com mais força, colocar Deus na frente e que eu não tinha conseguido nada porque não tinha aceitado Jesus. Eu cheguei a dizer: “E quando Deus me dará esse emprego? Quando eu tiver cinquenta anos e já for muito velha para fazer certas coisas?”
Com o tempo, vi que tal argumento é totalmente desprovido de fundamento. Essa história de que tudo só vem no tempo de Deus derruba um outro argumento que os evangélicos usam com frequência: o do livre arbítrio. Se somos livres para tomar nossas decisões e cometer erros, então, em princípio, Deus não iria interferir no nosso tempo, até porque isso seria invadir a nossa liberdade. Outro problema é que, se Deus tem um emprego certo para que eu o tenha no tempo determinado, o que é um emprego? Uma mercadoria que vem com prazo de entrega para aparecer na sua casa ou um presente que você receberá em data especial como o Natal ou seu aniversário? Não, emprego é algo pelo que temos de lutar. E, na situação atual do Brasil, com tanta gente lutando por emprego, ficar esperando que Deus nos mande um no tempo certo soa irreal e até narcisista, como se fôssemos melhores que as outras pessoas.
Um caso que merece ser mencionado é o de um rapaz – pai de família – que já recusou propostas de trabalho porque diz que, no tempo determinado, Deus lhe dará um emprego com carteira assinada. Na verdade, conseguir um emprego ou qualquer coisa irá depender muito mais de nossa atitude. Se, por exemplo, tivermos que ir a qualquer lugar e dependermos
de ônibus, o que temos de fazer? Ir com antecedência ao ponto de ônibus para não perder nossa vez, senão iremos nos atrasar para chegar ao nosso destino ou perderemos a viagem. Por ficar acreditando nessa história de que, no tempo certo, virá o que se quer ou precisa, muita gente deixa de fazer algo que poderia resolver logo sua vida. E, sejamos sinceros, o tempo certo nunca vem para quem não faz nada. Ficar apenas orando para que um problema se resolva ou uma situação desagradável mude não fará com que as coisas sejam melhores para nós. Poderemos culpar Deus ou a vida por isso? Não, a culpa será apenas nossa. Como vemos, as mentiras pregadas nos templos evangélicos estão prejudicando muitas pessoas, fazendo com que fiquem com uma visão distorcida da realidade.
Outra coisa que me fez duvidar dessa história de tempo de Deus foi observar a realidade de países como Noruega, Dinamarca, Suécia e outros de população majoritariamente ateia mas altamente desenvolvidos. Nesses países, ninguém tem que orar e esperar o tempo de conseguir um emprego. Então, ao observar a realidade, não dá para desconfiar que a vida não é exatamente o que pregam nesses templos. E por que Deus demoraria a dar uma bênção a umas pessoas e concederia logo seus favores a outras? Ele por acaso faz acepção de pessoas? Ver a realidade desses países até me fez duvidar do que muitos me disseram: “as coisas são mais difíceis para quem não acredita em Deus.” Pelo que podemos ver, o nível de desenvolvimento de um país é bem mais determinante em conseguir um bom emprego do que o nível de fé de alguém, não?
Essa história de tempo certo favorece a ideia de um Deus injusto, que escolhe que uns serão felizes em vida e outros, não. Pensemos em tantas mulheres que sofrem com casamentos infelizes, acreditando que Deus, um dia, as libertará. Muitas só se libertam quando tomam coragem e deixam os maridos ou então quando eles morrem ( e não poderíamos dizer que a morte desses homens foi uma bênção de Deus. A morte vem para todos nós um dia) ou são assassinadas por eles. No caso das que se libertam quando os deixam, muitas só o fazem após muitos anos de casamento infeliz. Foi o tempo de Deus? Não, foi porque elas não tiveram coragem de fazê-lo antes. E, se algumas morreram antes dos seus maridos ou foram assassinadas por eles, esse tempo, supostamente, nunca chegou, não foi? Que dizer então? Que não foi então a vontade de Deus que elas se libertassem desses homens e morressem consumidas por uma vida infeliz ou assassinadas por homens covardes? Parece bem mais razoável aceitar que foi resultado delas não terem tido força para sair de uma situação ruim e recomeçar suas vidas do zero, porque, de certa forma, abandonar uma situação ruim exige que alguém abandone a zona de conforto e se confronte com algo novo, que traz um monte de incertezas, não?
Claro que um texto desses não propõe respostas às questões que nos inquietam nem pretendem dizer se Deus existe ou não. O que se propõe é que não aceitemos passivamente o que se diz nesses templos evangélicos como verdade absoluta nem que fiquemos parados apenas orando, esperando que um dia venha a solução para os problemas da nossa vida. E, falando em tempo, temos de reconhecer que, muitas vezes, não conseguimos o que queremos por não ter aproveitado logo as oportunidades que apareceram ou não soubemos fazer nossas escolhas por ignorância ou inexperiência.
As supostas mensagens demoníacas de desenhos animados
Quem já assistiu a vídeos no youtube, talvez já tenha assistido a alguns falando sobre o suposto pacto
demoníaco que os estúdios Disney teriam com o diabo. Esses adeptos de teorias conspiratórias dizem
que podemos perceber que os desenhos Disney são diabólicos principalmente ao ouvirmos coisas como
"a magia e o encanto Disney", visto que magia seria algo feito por magos ou bruxas, pessoas que teriam
ligação direta com o demônio. Outros desenhos que dizem ser demoníacos são Caverna do Dragão, He-
man, She-ra, Gasparzinho, Pica-pau, os Smurfs e tantos outros. Segundo muitos evangélicos, os
criadores dessas franquias fizeram pactos e tentam aliciar as crianças por estas serem as maiores
consumidoras desses produtos culturais.
Entre as teorias que cercam Caverna do Dragão, está a de que as crianças presas num universo
alternativo estariam mortas e no inferno e o universo sombrio dessa animação com certeza serve muito
para alimentar a imaginação de pessoas impressionáveis. Já Pica-pau, conforme outros que defendem
ser o desenho satânico, fornece evidências de ser malévolo por causa de episódios nos quais o Pica-pau
manda um duende ao inferno, outro no qual o personagem diz que é um diabo necessário e suas feições
se alteram.
Como vemos, muitos acreditam que tais desenhos sejam realmente diabólicos e alguns realmente nos
fazem desconfiar disso como As meninas superpoderosas e a Vaca e o frango, no qual aparecem figuras
vermelhas e com chifres e Dragon Ball Z, em que, na abertura do desenho, um carro tem um adesivo
com o número 666, a suposta marca da besta. Entretanto, temos que considerar que Dragon Ball Z é
uma animação nipônica e eles, inclusive, tem outra noção do que seja demônio.
Bem, após expor todas essas supostas animações diabólicas, vamos analisar. Falar que expressões como
"magia e encanto Disney" são uma evidência de que o estúdio seria ligado ao satanismo é um exagero.
E, se falar em magia é diabólico, então, consideremos que muitos dos clássicos da Disney são baseados
em contos de fadas antigos, que derivam do folclore. Sendo assim, Branca de Neve, João e Maria, a Bela
adormecida, a Bela e a Fera e outros contos que existiam muito antes dos estúdios de desenhos
animados seriam diabólicos, pois todos eles contêm bruxas, fadas, duendes e outras entidades
sobrenaturais. Desta forma, não deveríamos nem mesmo ler histórias como Peter Pan, Pinóquio ou
Rumpeltitskin para as crianças, pois a fada Sininho, as sereias, a Fada Azul ou o gnomo seriam demônios
e ler essas histórias atrairia maldições para nossos lares. Lembro de como fiquei imediatamente cativada
pela história da Pequena Sereia, que faz acordo com a bruxa do mar para se tornar humana, abrindo
mão de sua bela voz. Já que a história não tem final feliz, porque a sereiazinha não conquista o príncipe
e morre, poderíamos dizer que sua morte foi castigo por seu pacto?
Portanto, nada de ler contos de fadas. Todos seriam demoníacos. E também não deveríamos contar
histórias de mitologia ou do folclore para as crianças. Talvez a Iara e o saci-pererê - que sempre me
encantaram - sejam demônios maléficos. Pelo visto, todos os pais deveriam ler apenas as histórias
bíblicas para as crianças.
Analisando a lei do karma
Com certeza, é muito difícil falar sobre o sofrimento que experimentamos nesta vida. Ninguém está livre
de sofrer e sempre se tentam dar explicações que muitas vezes não convencem. Mas as religiões têm
tentado fazê-lo desde tempos imemoriais. O Cristianismo diz que sofremos porque somos herdeiros do
pecado, por termos nos afastado de Deus e isso teria trazido o sofrimento, a morte e outras coisas.
Segundo o Cristianismo, Cristo morreu por nossos pecados, para restabelecer nossa aliança com Deus e,
por isso, temos de carregar nossa cruz.
Bem, também há outras religiões que admitem a reencarnação, como o Hinduísmo e o Budismo, que
falam no karma. Karma é uma palavra de origem sânscrita que significa ação. Então, basicamente, a lei
do karma é o seguinte: temos de renascer e sofrer, em cada nova existência, os efeitos dos nossos atos.
O que fizermos de errado na nossa existência atual seria uma espécie de débitos em nossas contas para
com as leis espirituais. O que fizermos de bom seria como um crédito. Pelo karma, à medida que
evoluímos, também ganhamos o direito de ter uma vida melhor quando renascemos.
A ideia de karma e reencarnação se popularizou principalmente com o advento da doutrina espírita,
fundada por Allan Kardec, nome adotado por Hyppolite Leon Denizard Rivail, educador, tradutor e
educador francês nascido em 1804 e falecido em 1869 que era profundo estudioso de fenômenos
paranormais e se tornou o codificador do Espiritismo, deixando obras como O livro dos Espíritos, O livro
dos Médiuns e O Evangelho segundo o Espiritismo. Embora a ideia de reencarnação e karma já existisse
antes do Espiritismo, Kardec a popularizou.
Pela ideia de karma, temos de sofrer para nos aperfeiçoar, reparar o mal que fizemos em vidas
anteriores e conseguir nos tornar espíritos evoluídos. Entretanto, se a analisarmos bem, veremos que
há muitas coisas que deixam dúvidas. Vamos refletir algumas das questões separadamente:
1- Se tenho que sofrer nesta vida pelo que fiz de errado em outra, então, não seria certo eu lutar por
melhoras na minha vida, já que isso impediria que eu pagasse meu karma e me purificasse. Então, não é
para salvarmos crianças de pais que as maltratam fisicamente ou abusam delas já que, pela lei do
karma, elas teriam que passar por isso, não é? Não seria para uma pessoa pobre tentar subir na vida
mas se conformar com a pobreza. E pensando bem, todos os que foram escravos tiveram de sê-lo para
reparar o fato de que foram opressores em outra vida? Assim, coisas como ser escravo, apanhar do
marido ou sofrer abuso sexual são coisas boas? Todo este sofrimento é necessário?
2- No fundo, a lei do karma é olho por olho, dente por dente. Se uma pessoa me mata ou me faz um
grande mal nesta vida e não tenho como fazer justiça nesta existência, o Universo irá garantir que ela
sofra um mal na mesma medida. Um livro que transmite bem essa ideia é a psicografia Violetas na
janela. Nele, uma mulher que está vivendo numa colônia espiritual diz que tinha sido estuprada e morta
para pagar o fato de que tinha sido um mercador de escravas sexuais em outra vida. Assim, é a mesma
história de ter que carregar a cruz. Você sofre resignadamente esperando a felicidade na Vida Eterna
segundo os católicos e, para os que acreditam em reencarnação, você tem que pagar e se purificar nesta
vida para ter uma vida melhor quando renascer. Está vendo? No final, você acaba seguindo a seguinte
lei: tenho de ser bom e sofrer para conseguir uma felicidade futura. Assim, mesmo que você tenha que
ter pena de quem sofre, você deve acreditar que aquela pessoa merece estar passando por aquilo. Se
formos levar isso muito ao pé da letra, não é para tentar socorrer as crianças com fome na África. É o
karma delas, não? E veja: muitas pessoas não acham que um assassino deva ser condenado à morte.
Assim, não há pessoas com uma consciência mais elevada do que a de quem supostamente estabeleceu
as leis kármicas?
3- Se conseguimos uma vida melhor à medida que vamos reencarnando e nos tornando pessoas
melhores, então, todas as pessoas ricas seriam as melhores do mundo. E muitas pessoas ricas tem o
péssimo caráter. Isso nos levaria a acreditar que todas as crianças morrendo de fome na África têm o
mesmo karma. Como tantas pessoas diferentes podem ter um karma similar? E quem nasceu na
Noruega ou Suécia nasceu lá porque já é uma alma evoluída? Assim, reflitamos: se temos de acreditar
que quem nasceu na Noruega já evoluiu tanto para ganhar o direito de nascer branco, num país rico e
desenvolvido onde terá todas as chances de crescer e se realizar, não seria para todas as pessoas que
nascem nesses países serem altamente espiritualizadas? E são os países com os maiores percentuais de
população ateia. Comecei a questionar isso quando ainda estava frequentando o centro espírita.
4- Se não lembro do que fiz de mal noutra vida, não sei o que estou pagando. Não sei se fui ladrão,
assassino, se oprimi outras pessoas, tirei de quem passava fome. É o mesmo que uma pessoa que
cometeu um crime perder a memoria e mesmo assim ser condenada. De que servirá para ela se corrigir
se ela não lembra que cometeu o crime?
5- O karma só dá início a círculos repetitivos e no fundo tem um lado ruim. Consideremos o seguinte:
uma criança é abusada para pagar o que fez de mal na outra vida. Certo. Mas, ao mesmo tempo em que
a criança abusada purga o mal que fez, quem abusa dela cria karma ruim para si mesmo. Aí, onde está o
livre arbítrio? A pessoa que abusou da criança que tem que pagar seu karma foi destinada àquilo?
Alguém necessariamente tem que criar karma ruim para si para eu pagar o meu? Então, quem criou o
karma quer ver a humanidade sofrer indefinidamente? Parece justo que uma pessoa tenha que passar
por algo que a fará sofrer no futuro para que eu consiga finalmente pagar meus débitos?
6- Uma outra questão a ser levantada é que todos nós, por mais que supostamente sejamos evoluídos,
sempre iremos cometer erros. Até mesmo uma pessoa boa que todos acreditam incapaz de um gesto de
violência pode, num momento de raiva, cometer um ato extremo, como matar uma pessoa. Houve o
caso de um homem que todos acreditavam incapaz de qualquer ato brutal que, num momento de
loucura, apontou uma arma para a cabeça do padrasto do seu filho ao descobrir que o mesmo havia
abusado da criança durante um ano. Não o fez porque foi impedido. Então, se o tivesse feito, teria
criado karma ruim? E teria que pagar em outra vida?
7- Cada vez nascem mais pessoas. De onde vêm tantas almas? Aliás, muitas outras pessoas já
observaram esse fenômeno. Como pode haver reencarnação e a população humana ter crescido tanto
ao longo do tempo?
8- Vejamos bem a questão dos suicidas. Pela doutrina espírita, eles sofrerão no vale dos suicidas (quem
assistiu à novela A viagem deve ter ficado assombrado com as cenas do espírito de Alexandre nesse
vale) até chegar o momento de renascer e, ao reencarnarem, terão de sofrer com doenças ou outras
coisas. Isso explicaria muitas doenças congênitas. Mas cadê o livre-arbítrio. Quem, em sã consciência,
aceitaria nascer com alguma doença por causa de algo que fez contra si mesma quando enfrentava um
momento de extremo sofrimento? É justo uma pessoa sofra por ter machucado a si mesma? Qualquer
um que tenha um mínimo de compaixão não iria punir uma pessoa por ter tentado suicídio. Essas
pessoas precisam de acolhida, de alguém que as compreenda e estenda a mão, não de punição. Seria
justo que eu castigasse uma pessoa por ter cortado os pulsos ou ter feito outra coisa contra si mesma?
Então, imaginemos um doente terminal com câncer que pede para que lhe apliquem eutanásia. Pelas
leis espirituais, ele deveria aguentar o sofrimento em vez de querer abreviá-lo? Sofrer com as dores
finais era seu karma? Ele irá sofrer no mundo espiritual e depois em outra vida por não ter aceitado
pagar seu karma? Esta é mais uma pergunta para a qual não temos resposta.
Mas, se há livre-arbítrio, uma pessoa não é livre para decidir quando não aguenta mais as dores de uma
doença que tem destruído seu corpo? Quanto mais refletimos, mais vemos que há contradições
irrespondíveis.
Na Índia, país onde muitos acreditam em reencarnação, pessoas pertencentes a castas inferiores, como
os “dalit”, acreditam que devem aceitar resignadamente seu destino e agir bem até para ganharem o
direito de, em outra vida, conseguirem nascer pertencendo a uma casta melhor. Então, tem que se
suportar o sofrimento para merecer ser feliz no futuro.
Do mesmo jeito, o que os católicos dizem sobre termos que carregar a cruz insinua que não é para
lutarmos por nossa felicidade, mas para aceitarmos passivamente as injustiças, esperando uma justiça
divina e a felicidade após a morte. Acontece que isso é basear nossas vidas em algo incerto.
A única certeza de que temos é que um dia iremos morrer e não parece errado querer ser feliz durante
o tempo de nossa existência. Por que teríamos que sofre passivamente? Se há o livre-arbítrio, por que,
então, já nascemos destinados a pagar um determinado karma ou carregar uma cruz?
O medo da liberdade
Nós passamos a vida tentando entender o mundo e as outras pessoas, mas simplesmente esquecemos
de tentar entender a nós mesmos e as nossas atitudes. Se o fizéssemos, talvez conseguíssemos evitar
muitas coisas estúpidas que terminamos fazendo e das quais acabamos por nos arrepender. E muitos
dos nossos atos são motivados por medos inconscientes que nos fazem agir de forma irracional,
afastando-nos dos nossos objetivos e nos colocando numa situação que sentimos que não era para
estarmos.
Entre os medos inconscientes que nos movem está o medo da liberdade. Parece estranho, pois, se
alguém nos perguntar se queremos ser livres, todos nós diremos que sim. Porém, ao mesmo tempo em
que queremos ser livres, pode acontecer de, inconscientemente, termos medo de ser livres e
independentes. Caso observemos bem, podemos ver que muitas pessoas se queixam que são oprimidas
por cônjuges, pais, pelos empregadores mas, quando alguém lhes fala sobre agir para mudar sua
situação, essas pessoas logo darão um monte de desculpas para continuar do jeito que estão. Por que
será? Haverá uma resposta satisfatória? Podemos ver bem que isso existe sim. Quantas mulheres, como
observou a autora de Complexo de Cinderela, não preferem permanecer submissas aos maridos? E
vários filhos continuam com os pais dos quais reclamam que tentam controlar suas vidas. Por que
queremos a liberdade e temos medo dela? Bem, isso parece irracional, mas é real. Do mesmo jeito que
há os que têm medo de ser livres, há os que vivem na mediocridade por medo do sucesso.
Embora digamos que ser livre é a aspiração máxima do ser humano, é difícil ser livre, porque a liberdade
nos obriga a ser responsáveis por nós mesmos e pelas consequências das nossas escolhas. Quando você
escolhe ser dependente de outra pessoa, é mais fácil jogar nas costas dela a responsabilidade por sua
felicidade, seu bem-estar e culpa-la se as coisas não dão certo. E ser dependentes nos desobriga de
tomar decisões, de ir à luta, enfrentar os desafios de ser os autores de nossa existência.
No geral, optamos pelo mais fácil e não pelo melhor. Escolhemos nos queixar da vida em vez de lutar
para melhorar nossas condições, agarramo-nos a rotinas estafantes em lugar de procurar uma saída,
algo novo e que nos realize mais. E por quê? Porque, embora essas situações sejam ruins, elas nos dão
uma sensação de segurança, ainda que falsa. Recorrendo ao lugar comum, é a tal zona de conforto, na
qual preferimos ficar para não enfrentar as surpresas, o inesperado. Embora isso limite nossas vidas, dá-
nos uma sensação de segurança, ainda que nos custe levar uma vida pobre e vazia.
Preferimos não usar nossa liberdade, pois isso é arriscado e também porque somos ensinados a não
confiar nos nossos instintos, na nossa intuição. Isso nos leva a nos deixar levar por conselhos de pessoas
que, mesmo que tenham as melhores intenções, não vivem nossas vidas nem têm nossas aspirações e
sentimentos. Muitas delas nos dão conselhos baseando-se em seus valores. Está certo que muitos
valores não mudam, mas temos que levar em consideração que cada pessoa tem sua visão de mundo e
todos nós temos que ter nossas experiências para saber o que é bom para nós.
É lamentável que tenhamos medo de ser livres ao mesmo tempo que ansiemos tanto pela liberdade.
Porém, se quisermos ser seres completos, precisamos abraçar tanto o lado agradável quanto o lado
tortuoso de ser livres.
Ser livre não é fácil, mas nunca teremos uma vida de verdade se passarmos a vida tentando evitar o
difícil para viver numa eterna zona de conforto. E, como sabemos bem, o caminho fácil é enganoso. O
que parecia fácil, com o tempo, irá nos trazer frustrações e pensamentos amargos sobre como nossa
vida poderia ter sido se tivéssemos tido a coragem de assumir os riscos de ser livres.
É mas não deveria ser
Quando a gente reclama muito de certas coisas, as pessoas dizem: "É assim mesmo", como se essas
situações fossem normais e imutáveis e tivéssemos que aceitá-las. Eu penso nisso principalmente
quando falo de como os pais costumam pressionar os filhos (principalmente as filhas) primogênitos. No
geral - isso era pior no passado - os pais são muito mais duros com eles e mais brandos com os mais
novos. E, se os primogênitos se queixam, costumam ouvir: "Mas é assim mesmo, seus pais esperam
mais de você." Isso parece certo? Não soa pesado demais para um jovem (criança ou adolescente) sentir
que os pais têm tantas expectativas em relação a ele, que é um ser humano e, como tal, tem suas
próprias expectativas? Uma pessoa não deve existir para satisfazer às outras. Ela tem que ser quem é,
porque todo mundo tem defeitos. Uma pessoa não é para ser programada, ela tem que ser deixada livre
para se desenvolver e, um dia, traçar seu caminho. Não podemos mais ficar com essa desculpa de que
"é assim mesmo".
Ficar cobrando de um filho mais velho que seja um exemplo para os irmãos também é injusto. Quem
tem que dar bom exemplo são os pais, que são os educadores. Filho mais velho é filho como os demais,
um ser em formação que precisa que ouçam suas necessidades, orientem e estimulem a crescer. Filho
primogênito não tem que ser segundo pai ou mãe. Ele não tem maturidade emocional para isso,
especialmente se a diferença de idade em relação aos irmãos for pequena.
No caso da filha mais velha, a situação é mais crítica. Exige-se que cuide dos irmãos, cobra-se mais dela
que ajude nas tarefas domésticas e elas se sentem sobrecarregadas com isso. O tempo em que filha
mais velha tinha que ser uma segunda mãe já passou. Cada pessoa é uma. Ficar com essa desculpa de
"você é a mais velha, tem que ser responsável por seus irmãos", é injusto para com um ser que tem seus
sonhos e necessidades. Filho ou filha mais velha tem que ajudar em casa sim, mas não ficar
sobrecarregado com tarefas enquanto, muitas vezes, os outros só fazem o que querem principalmente
por saber que, se errarem, os pais irão reclamar apenas com os mais velhos por não terem "tomado
conta dos irmãos."
Aliás, os psicólogos, há muito tempo, já têm dito que isso é transferir responsabilidades. É tentar dar a
uma pessoa uma tarefa, uma missão que ela talvez não esteja suficientemente madura para fazer.
Imagine dizer a uma menina de sete anos: "Você é responsável por sua irmã, tem que ficar tomando
conta dela." Uma criança de sete anos não entende isso. Ela quer ser criança. Não está preparada para
assumir o papel de cuidar do bem-estar de outra. O problema é que, embora as coisas mudem, certas
tendências estão tão entranhadas na nossa cultura que muitos pais, ainda que inconscientemente,
reproduzem esses padrões injustos. Muitos inclusive, com o tempo, reconheceram isso. Houve até uma
mãe que disse: "É, eu só exigia da minha mais velha que ajudasse em casa. Depois, quando fui exigir dos
mais novos que começassem, eles não quiseram ajudar." Como podemos ver, os pais que viram que, por
cobrar demais apenas de um e mimar os outros, produziram seres preguiçosos e mimados, estão
sofrendo por seus erros. Muitos dos que reclamam que têm filhos que não arrumam a própria cama na
verdade estão colhendo o que plantaram: não ensinaram responsabilidade aos filhos mais novos.
Outro erro é dizer do mais velho(ou mais velha) que é o auxiliar dos pais. Isso não existe. Casa não é
empresa e pais não são patrões. Numa casa, é para todos ajudarem, até para ninguém ficar
sobrecarregado. Está certo que uma criança maior, por ser mais velha, tem mais habilidade para certas
tarefas, mas os pais não podem isentar os menores de ajudar. Eles têm que ser colocados para aprender
a ser solidários desde cedo, para não se escorar nos outros. Havia uma moça que, quando criança, tinha
a obrigação de limpar tudo que a irmã mais nova sujava e, quando reclamava das injustiças, ouvia que a
outra era pequena e ela era a mais velha e, por isso, devia limpar.
Essa atitude de exigir demais dos primogênitos até favorece que os mais novos se tornem egoístas,
mimados e mal-educados, pois os pais sempre desculpam os erros desses filhos com o argumento de
que os mais novos são pequenos.
Portanto, só nos resta dizer que, ainda que muita gente ache que o filho mais velho ocupa uma posição
privilegiada, para muitos ser o primeiro ou primeira é sinal de sobrecarga, cobranças e pressão. Vários
são os que reclamam que queriam ser filhos únicos. Na verdade, nada é fácil, mas ser filho mais velho
não deveria significar ser o que é mais cobrado.
O medo da liberdade
Nós passamos a vida tentando entender o mundo e as outras pessoas, mas simplesmente esquecemos
de tentar entender a nós mesmos e as nossas atitudes. Se o fizéssemos, talvez conseguíssemos evitar
muitas coisas estúpidas que terminamos fazendo e das quais acabamos por nos arrepender. E muitos
dos nossos atos são motivados por medos inconscientes que nos fazem agir de forma irracional,
afastando-nos dos nossos objetivos e nos colocando numa situação que sentimos que não era para
estarmos.
Entre os medos inconscientes que nos movem está o medo da liberdade. Parece estranho, pois, se
alguém nos perguntar se queremos ser livres, todos nós diremos que sim. Porém, ao mesmo tempo em
que queremos ser livres, pode acontecer de, inconscientemente, termos medo de ser livres e
independentes. Caso observemos bem, podemos ver que muitas pessoas se queixam que são oprimidas
por cônjuges, pais, pelos empregadores mas, quando alguém lhes fala sobre agir para mudar sua
situação, essas pessoas logo darão um monte de desculpas para continuar do jeito que estão. Por que
será? Haverá uma resposta satisfatória? Podemos ver bem que isso existe sim. Quantas mulheres, como
observou a autora de Complexo de Cinderela, não preferem permanecer submissas aos maridos? E
vários filhos continuam com os pais dos quais reclamam que tentam controlar suas vidas. Por que
queremos a liberdade e temos medo dela? Bem, isso parece irracional, mas é real. Do mesmo jeito que
há os que têm medo de ser livres, há os que vivem na mediocridade por medo do sucesso.
Embora digamos que ser livre é a aspiração máxima do ser humano, é difícil ser livre, porque a liberdade
nos obriga a ser responsáveis por nós mesmos e pelas consequências das nossas escolhas. Quando você
escolhe ser dependente de outra pessoa, é mais fácil jogar nas costas dela a responsabilidade por sua
felicidade, seu bem-estar e culpa-la se as coisas não dão certo. E ser dependentes nos desobriga de
tomar decisões, de ir à luta, enfrentar os desafios de ser os autores de nossa existência.
No geral, optamos pelo mais fácil e não pelo melhor. Escolhemos nos queixar da vida em vez de lutar
para melhorar nossas condições, agarramo-nos a rotinas estafantes em lugar de procurar uma saída,
algo novo e que nos realize mais. E por quê? Porque, embora essas situações sejam ruins, elas nos dão
uma sensação de segurança, ainda que falsa. Recorrendo ao lugar comum, é a tal zona de conforto, na
qual preferimos ficar para não enfrentar as surpresas, o inesperado. Embora isso limite nossas vidas, dá-
nos uma sensação de segurança, ainda que nos custe levar uma vida pobre e vazia.
Preferimos não usar nossa liberdade, pois isso é arriscado e também porque somos ensinados a não
confiar nos nossos instintos, na nossa intuição. Isso nos leva a nos deixar levar por conselhos de pessoas
que, mesmo que tenham as melhores intenções, não vivem nossas vidas nem têm nossas aspirações e
sentimentos. Muitas delas nos dão conselhos baseando-se em seus valores. Está certo que muitos
valores não mudam, mas temos que levar em consideração que cada pessoa tem sua visão de mundo e
todos nós temos que ter nossas experiências para saber o que é bom para nós.
É lamentável que tenhamos medo de ser livres ao mesmo tempo que ansiemos tanto pela liberdade.
Porém, se quisermos ser seres completos, precisamos abraçar tanto o lado agradável quanto o lado
tortuoso de ser livres.
Ser livre não é fácil, mas nunca teremos uma vida de verdade se passarmos a vida tentando evitar o
difícil para viver numa eterna zona de conforto. E, como sabemos bem, o caminho fácil é enganoso. O
que parecia fácil, com o tempo, irá nos trazer frustrações e pensamentos amargos sobre como nossa
vida poderia ter sido se tivéssemos tido a coragem de assumir os riscos de ser livres.
O problema das boas intenções
Todo mundo já ouviu o velho adágio de que o inferno tem boas intenções em demasia e, se
considerarmos bem, é um ditado bastante correto. Quantas coisas impróprias ou mesmo nefastas e
daninhas já não foram ditas e feitas com a desculpa de que se tinha a melhor das intenções? O
problema de se dizer que tem boas intenções é o seguinte: muitos, dizendo que só querem o nosso
bem, valem-se disso para agir de forma inconveniente, meter-se na vida dos outros ou dizer coisas que
não deviam. E, se repararmos bem, muitas das maiores monstruosidades que foram feitas se deve à
batida desculpa de que se tinha as melhores intenções. Basta pensarmos um pouco que a lista será
imensa. Os terroristas de 11 de setembro, com certeza, não estavam mal-intencionados. Acreditavam
que estavam lutando numa guerra santa em nome do seu deus Alá. Os padres do Tribunal da Santa
Inquisição acreditavam que estavam cumprindo um dever divino. Com certeza, podemos até dizer que
Hitler, Stalin, Mussolini e Mao-tse-tung estavam com os objetivos mais nobres em mente para realizar
seus objetivos, não? Hitler não alegava que queria restaurar a grandeza da nação alemã ?
Querer o melhor nunca devia ser usado como justificativa para certos atos pois, por mais nobres que
sejam nossos objetivos, agir de forma errada não trará nenhum benefício. Um bom exemplo que
podemos usar é o da superproteção. Os pais podem justificar o excesso de zelo com a surrada desculpa
de que querem proteger seus filhos dos perigos do mundo. Porém, querer proteger demais causará
danos maiores. Os filhos que foram excessivamente podados sentirão falta das experiências que nunca
viveram e se lamentarão por não terem podido andar sozinhos. Impedir alguém de se desenvolver
mutila seus espíritos. Como vemos bem, mesmo que os pais ajam assim querendo o bem dos filhos,
estão fazendo mal. Outro erro é o de impor caminhos. Obrigar nossos filhos a seguir uma carreira ou
fazer um curso para o qual ele não tem vocação, usando o argumento das boas intenções, só produzirá
um ser humano frustrado, que sentiu que viveu o sonho dos outros e não sua vida. Você, que é pai,
gostaria de pensar que causou esse mal ao seu filho? Pense bem.
Está certo que temos que ser complacentes e entender quando alguém não agiu por mal, no entanto, é
necessário que todos entendam que é preciso mais do que se ter boas intenções para que algo dê certo
ou, pelo menos, não resulte num desastre que causará mágoas a muitas pessoas.
Melhor saber do que acreditar
Prefiro saber a acreditar cegamente em qualquer coisa. Por quê? Porque, quando adquirimos
conhecimento, temos mais chance de tomar decisões acertadas, de não cometer atos errados achando
que estamos "agindo certo". A ignorância é tão perigosa quanto a perversidade. Podemos desculpar
uma pessoa que agiu de certa forma por ignorância, mas o fato de alguém não saber que algo poderia
fazer mal não diminuirá os efeitos daninhos do ato errado. Para reforçar o que afirmo, posso citar vários
casos de crenças que se provaram prejudiciais. Em muitos países, pratica-se a mutilação genital feminina
por causa da crença de que as mulheres possuem partes impuras entre as pernas que devem ser
extirpadas. Assim, pratica-se esse ato bárbaro acreditando-se que é a coisa certa a fazer. Vale lembrar
que, embora muitos pensem que é um costume de países muçulmanos, tal prática é mais antiga do que
a religião.
Na Idade Média, acreditava-se que cuidar do corpo era pecado e, devido a isso, não era costume tomar
banho. Considerava-se lavar o corpo um ato pecaminoso, indecente. E, ainda hoje, por causa da
ignorância e do preconceito, vemos gente acreditar tolamente que gatos pretos dão azar, corujas
atraem a morte ou que passar debaixo das escadas terá consequências desastrosas.
A ignorância leva pessoas a acreditarem em teorias malucas da conspiração, como a de que existem
grupos secretos controlando o mundo, que vacinas causam autismo, que a Terra seria plana, que certas
músicas seriam satânicas e muitas outras histórias sem fundamento.
Apesar do conhecimento ser útil, pois nos permite saber melhor o que será bom ou não para nós, em
essência, buscar o saber não é retratado de forma favorável em muitas mitologias. Na mitologia grega,
Prometeu, por levar o fogo e conhecimento aos homens , é acorrentado a um rochedo e um abutre
comerá seu fígado até que Hércules o salva. Na Bíblia, Adão e Eva são expulsos do paraíso após
comerem do fruto do conhecimento e adquirirem ciência do bem e do mal. No entanto, analisando
bem, o conhecimento, retratado na lenda bíblica com má vontade, proporciona ao ser humano maior
liberdade. É a partir da consciência do certo e do errado que as pessoas podem ponderar que caminho
seguir, o que precisam fazer. Em suma, o conhecimento não é negativo nem positivo. O que fará a
diferença será o que fizermos com nosso conhecimento, que pode ser usado para coisas negativas como
fabricar a bomba lançada em Hiroshima ou positivas, como a descoberta de vacinas contra a varíola ou
paralisia infantil.
Adquirir conhecimento é interminável. Sempre haverá mais coisas a saber e isso só mostra o quanto
podemos evoluir se assim o quisermos.
Uma análise profunda
“Não temos medo das perguntas difíceis, mas das respostas fáceis”
Kennedy Litaiff, do canal O mago do Realismo
Sempre que nos vemos atormentados por causa do sofrimento que passamos e questionamos a justiça
de Deus ou então quando analisamos as muitas contradições que vemos na Bíblia e doutrinas religiosas,
é frequente que as pessoas religiosas venham com todos os argumentos possíveis para que nos
convençamos de que a religião é a verdade incontestável e que não podemos questionar nada.
Entretanto, todos esses argumentos, se os submetermos a uma análise profunda, suscitarão mais
dúvidas que, se não nos respondem a nada, pelo menos nos mostram que não há respostas absolutas
para as questões que há séculos têm afligido a humanidade acerca da existência. Não há como explicar
de forma fácil por que há injustiças, pessoas passando fome, violência, preconceito e outros fatores que
nos levam inevitavelmente a perguntar se realmente existe uma Providência Divina para tudo.
Um texto como este não pretende responder nada. Seria demasiada pretensão e, se houvesse de fato
respostas, ele não estaria sendo escrito, porque não haveria razão para dúvidas. Porém, como as há,
temos de fazer perguntas para não nos limitarmos a aceitar respostas que, se bem observadas, soam
superficiais e mesmo desprovidas de sensibilidade para explicar a vida e o sofrimento. É necessário
refletir, não aceitar de pronto explicações que vêm logo dizendo que isso ou aquilo é a verdade.
Portanto, vamos analisar muitas coisas ditas pelos religiosos para justificar ou defender sua religião.
Cada análise será feita em um determinado contexto, até para evitar mal-entendidos como os
provocados quando apontamos as contradições bíblicas e logo surgem argumentos de que nossas
colocações estão fora do contexto ou que não estamos considerando o tempo em que tais passagens
foram escritas. Muitas dessas afirmações já foram analisadas em textos anteriores, mas aqui tudo será
feito de forma mais particular, até porque podemos observar bem que os religiosos costumam usar o
argumento que mais lhes serve, criando um Deus conveniente àquilo em que querem que acreditemos.
Ora usam o argumento de que foi vontade de Deus, ora de que foi o mau uso do nosso suposto livre
arbítrio. E, como cada caso é único, explicações generalizadas não servem para explicar tudo.
Assim, comecemos a análise:
1- Certa vez, ao me ouvir falar sobre um problema que eu passava, uma mulher me falou: É a sua cruz,
que você tem que aguentar para sua salvação. Analisemos. Se o que estou passando é uma cruz que
tenho que carregar para a minha salvação, onde está o meu livre arbítrio, já que ela supõe que, quando
nasci, fui logo designada para sofrer com o que estou sofrendo? Significa então que não sou livre para
determinar meu destino, que Deus determinou que eu passaria por tal caminho para merecer ser salva
e eu tenho que sofrer resignadamente para um dia merecer a Salvação. Além de acabar com a história
do livre arbítrio, leva-nos a outras perguntas. Deus determinou que crianças nasceriam filhas de pais que
as espancariam e abusariam delas enquanto outras nasceriam em lares onde seriam amadas? Essa é a
cruz que essas crianças teriam de carregar? Deus decidiu que uns nasceriam saudáveis e outros, com
deformidades ou outras doenças incapacitantes? Uns tiveram que nascer em lares pobres e sem
oportunidades e outros poderiam nascer com o futuro garantido? Infelizmente, isso só deixa margem
para duas possíveis conclusões: Deus faz acepção de pessoas ou então, simplesmente criou o mundo
para deixar tudo desgovernado. Claro que religiosos usarão toda a apologética possível para dizer que
nós é que não entendemos o propósito divino para o qual fomos criados. São os mistérios que não
entendemos. Só que a questão do propósito divino derruba o livre arbítrio, que os crentes
convenientemente usam para dizer que Deus não tem culpa de nada. Se houve um propósito para uma
criança nascer com espinha bífida ou tantas pessoas morrerem num naufrágio como o do Titanic,
significa que não somos livres para nada, pois Deus já estabeleceu tudo.
2- Já ouvi que “fazemos nossos planos mas Deus tem coisa melhor para nós.”
Ouvi esse argumento quando falei sobre planos frustrados. Vejamos. Esse argumento, além de ser outro
que mata o livre arbítrio, coloca Deus como um pai opressor que quer decidir o destino dos seus filhos.
Por que Deus iria querer que uma pessoa tivesse seus sonhos frustrados e, se Ele tem planos para nós
desde o início, por que nos fez dotados de vontade própria e com capacidade para agir? Além disso, isso
não tem procedência nem fundamento e dá margens para acreditarmos que Deus é um ser cruel e
repressor, um ditador. Você sonha trabalhar, escapar de um lar opressor, ter sua família e Deus quer
que você fique solteirona, não se realize profissionalmente e passe sua vida sujeita a pais que não lhe
deixem viver a vida? E se Deus não quer que você realize sonhos tão normais, por que Ele não impede
tantos de se tornarem traficantes, enriquecendo às custas das perdas de vidas e da destruição de lares?
Por que Deus interfere nos meus planos de ir em busca da minha felicidade e não interfere nos de um
político corrupto, que vai prejudicar o desenvolvimento de uma nação ou no de um maluco que entra
numa escola para atirar em crianças inocentes, ceifando suas vidas? Quer dizer que Deus interfere no
meu livre arbítrio, na minha vida pessoal, mas não na de quem está em situação de poder e o usará para
fazer o mal? Em tempo: Isabella Nardoni, Bernardo Boldrini, João Hélio e Jacqui Saburido tinham seus
sonhos. O que lhes aconteceu foi o melhor que Deus tinha para eles? E, se minha situação atual não me
faz feliz, não posso dizer que isso foi o melhor que Deus tinha para mim.
3- Uma vez, uma mulher disse: “Você está revoltada porque Deus levou sua mãe, mas veja como Ele é
bom e maravilhoso. Vinte anos atrás, Ele curou minha mãe de um câncer”. O que isso quis dizer? Que
Deus quis salvar a mãe dela, não a minha? E eu não estava revoltada pela morte da minha mãe, aceitei
que todos morrem. Isso não vai acontecer comigo um dia? Só não sei como. Morte não é castigo, é algo
pelo qual todos passaremos.
4- Quando oramos e não dá certo, além da velha desculpa de que foi falta de fé, poderão dizer que o
que queríamos não era a “vontade de Deus”. Então, em suma, por que orar e ter planos, projetos e
sonhos se Deus já traçou nosso destino? Somos robôs ou seres humanos com capacidade de
transformar o mundo em que vivemos? Estranho foi Deus não interferir nos planos de Hitler, não? Nem
nos de Mussolini, Stalin, Mao tse-tung e outros. Afinal, supomos que não seria da vontade de um Deus
justo que pessoas fossem oprimidas em seus direitos mais básicos. Vale salientar que Stalin perseguiu
padres na extinta União Soviética e houve muita perseguição religiosa.
5- Certa mulher falou que o Brasil era subdesenvolvido e havia corrupção porque as pessoas não se
voltavam para Jesus. Bastou eu falar sobre as nações mais desenvolvidas e menos corruptas serem as
com mais ateus que ela contra-argumentou: “de que adianta fazer as coisas sem ser em nome de
Deus?” O que adianta? Fazer o mal em nome de Deus, como os padres da Santa Inquisição? Quer dizer
que o bem que fizermos, se não for em nome de qualquer divindade, é inútil? E é melhor o Brasil estar
como está mas ser uma nação religiosa do que ser como a Noruega, uma nação cheia de ateus mas
desenvolvida e com pouca corrupção? Então, também não posso falar dos ateus que conseguem as
coisas sem colocar Deus na frente, porque isso não deve ser usado para rebater a tese de que as coisas
não dão certo para quem não coloca Deus acima de tudo.
6- Quando eu falei sobre não haver provas e registros de muitas passagens e histórias bíblicas, disseram
que era porque “Deus só deixava que soubéssemos o que Ele queria.” Ah, tudo bem. Assim, é para
acreditarmos que os hebreus passaram pelo Egito, que houve a Muralha de Jericó e que Davi matou
Golias, mas Deus não quer deixar nenhuma prova de que isso aconteceu. E devemos lembrar que o Deus
que interferia diretamente na vida das pessoas, abrindo o Mar Vermelho e matando os primogênitos do
Egito, hoje não pode ajudar os desempregados do Brasil. E esse Deus muda, não? Antes, Ele falava com
a gente e mostrava todos seus milagres, que hoje só ocorrem convenientemente para umas pessoas em
templos evangélicos ou lugares de romaria e peregrinação. Mesmo assim, provou-se que muitos eram
fraudes e outros até agora têm sua veracidade contestada.
7- “Deus testa mais quem Ele ama mais”. Que Deus é esse que tem tanta necessidade de nos testar? Ele
não é onisciente? E por que Ele testa tanto uns e não outros? Quer dizer que Ele não ama as pessoas
felizes? Falar que os “homens agradáveis a Deus se provam pelo cadinho da humilhação” deve nos fazer
questionar sim. Quer dizer, então, que Deus amou muito os escravos, não? Já que poucas coisas são tão
humilhantes como ser escravo. Outra coisa: aceitar que um dia os humilhados serão exaltados e os
exaltados sofrerão humilhação também mostra que as pessoas esperam, um dia, ser recompensadas. E
que os que as humilharam serão bem castigados. Nada mais olho por olho, dente por dente. É como
alguém que diz entre dentes: “Um dia, você vai ver.”
8- “Você é uma pessoa muito boa e Deus não vai lhe abandonar”. E quantas crianças não morrem à
míngua? Elas eram ruins? E, enquanto este texto está sendo escrito, pessoas estão morrendo de frio em
ruas, crianças estão sendo abusadas pelos que deveriam protegê-las, outras estão sofrendo bullying.
Cadê a proteção divina? Ah, falarão novamente que isso não é Deus, mas o ser humano. Bem, a
escravidão no Egito também não era uma consequência de ações humanas? E Deus não interferiu,
alterando até as leis da natureza, mandando sete pragas e convertendo água em sangue? Deus não
interferiu para que Josué e seus exércitos dizimassem os povos que ocupavam a Terra prometida?
Um texto como este não pretende esgotar o assunto, nem obrigar ninguém a acreditar em nada.
Pretende-se apenas refletir. Parece justo que uma pessoa se diga abençoada porque tem uma vida boa,
emprego e uma família amorosa enquanto outras estão passando por muito sofrimento e sem ter a
quem pedir ajuda? Tentar ser racional não é ser insensível. Procurar entender o mundo além de crenças
pode nos ajudar a tomar medidas mais adequadas para que possamos combater as injustiças. Um
mundo mais justo só será conquistado se soubermos o que fazer e quais as causas das injustiças.
Um sacrifício que não vale a pena
"Todas as famílias felizes se parecem entre si. As infelizes são infelizes cada uma à sua maneira."
Tolstoi
Sabemos muito bem que a convivência familiar não é fácil e que sempre haverá conflitos.Também não
ignoramos que, se antes não havia divórcios e separações como hoje, isso não se deve ao fato de que as
pessoas de antigamente eram mais maduras ou sabiam mais sobre o amor. Significa que, como havia a
ideia de que o casamento era indissolúvel, as pessoas não se separavam, desquitavam ou divorciavam
por causa do estigma negativo e pecaminoso que era atribuído a isso. E, com certeza, muitas pessoas
levaram vidas infelizes por isso, vendo-se forçadas a aguentar casamentos que já haviam perdido a
razão de ser. Quando algo perde sua razão der ser, não há mais por que levar adiante.
Entretanto, ainda hoje há casamentos que duram mesmo que a convivência tenha se tornado
impossível. Vejamos bem. Não estamos nos referindo aos conflitos naturais que existem e que pessoas
que se amam verdadeiramente devem trabalhar juntas para superar. Mesmo as famílias felizes têm
problemas. Aqui, está-se falando de quando se casa com uma pessoa tóxica, insuportável, daquelas que
submetem todos à sua volta a abusos físicos e/ou emocionais. Viver com tais pessoas é realmente
desgastante e todos os sobreviventes dessas relações, sejam cônjuges e/ou filhos, falam do quanto se
sentiam vivendo sob pressão constante.
Porém, há casos em que, mesmo quando o casamento se provou falido, um dos cônjuges - mais
frequentemente a mulher - tenta "segurar" o casamento, dizendo que é pelos filhos, pois a
desestruturação familiar afetaria as crianças. Soa como um sacrifício nobre, não? Entretanto, será que
vale a pena? Ainda que seja pelas crianças? Será que os filhos gostariam de imaginar que o seu pai ou
mãe abriu mão de uma vida mais feliz por causa deles?
Vale a pena você viver uma mentira, fazendo todos pensarem que vive um casamento feliz quando a sua
vida familiar vai se destruindo? Quando você mesmo(a) vai se destruindo na convivência com uma
pessoa que nunca irá mudar e forçando seus filhos a ver que você e o outro apenas se aguentam? No
final, os próprios filhos - que são os por quem você diz se sacrificar - irão sofrer mais, pois viverão uma
rotina que será um verdadeiro inferno. Quem é um cônjuge abusivo dificilmente não será um pai ou
mãe abusiva. Pense bem: ao dizer que se sacrifica por seus filhos, você pode estar fazendo com que
sofram mais. Isso é justo com eles? E pergunte a um filho se ele quer que você sacrifique sua vida e
felicidade por ele. O mais provável é que não. Caso você um dia cometa o erro de dizer a ele tudo que
sacrificou por ele, aguentando o cônjuge insuportável, sabe qual será a resposta mais provável? Será
essa: eu nunca lhe pedi que fizesse isso. Se uma pessoa não gosta que lhe joguem na cara o mais
insignificante favor, imagine como ela se sente se alguém lhe grita que desperdiçou sua vida por ela?
Apesar de admitirmos que pode ser que os pais os façam pelos filhos, também há a possibilidade - muito
comum - de não se deixar o cônjuge por comodismo, pois deixar um casamento, mesmo que ele seja
desastroso, implica uma mudança muito grande. Muitas são as pessoas que preferem não se arriscar e
fingir que está tudo bem. No caso das mulheres, especialmente pode haver a hipótese de que seu
padrão de vida irá cair e, como talvez ela dependa do marido, fique apavorada com a ideia de ter que de
repente se ver obrigada a se sustentar e aos filhos, ainda mais quando ela não tem tanto estudo e,
mesmo assim, tenha abandonado a carreira para se dedicar aos filhos. São várias as mulheres com curso
universitário que optaram por deixar de trabalhar para se dedicar às famílias e, por terem se
acomodado a uma rotina doméstica, sentem-se despreparadas para enfrentar a vida e assumir a
responsabilidade por seu sustento, mesmo que seus diplomas garantam que são qualificadas. Assim, é
mais "fácil" aguentar por longos anos um casamento que deixou há muito tempo de ser casamento,
vendo o tempo passando e se prendendo a uma rotina estagnada que se sente que não leva a nada para
um dia pensar nas chances desperdiçadas de ter tido uma vida mais realizada?
Pensemos bem. Filhos não devem ser usados como pretexto para abrir mão de nossos sonhos,
prendendo-nos a um cônjuge que nunca será um companheiro de verdade e que jamais proverá nossas
necessidades emocionais. E, para as crianças, viver nesse ambiente será nefasto. Elas terão sido privadas
de um lar saudável e amoroso porque você não teve coragem de tomar uma atitude. Quer fazer algo por
eles? Deixe o cônjuge, assuma a responsabilidade por seu destino e, ainda que a mudança traga
insegurança, qualquer coisa será melhor do que perder sua vida numa rotina que destruirá sua saúde
física e psicológica.
Não faz a menor diferença
Quem já leu minha crônica "O maior erro da minha vida", com certeza sabe que meu primeiro
namorado era evangélico e criado dentro de uma igreja. Estou falando disto porque, quando alguém
vem me dizer que devo procurar namorado na igreja e eu falo sobre ele, logo vem com a desculpa: "Ah,
mas isso é porque ele não era um verdadeiro homem de Deus, não era um evangélico de fato."
Engraçado que muitos ateus são melhores maridos ou namorados do que ele, não? Por que quero
mencionar este fato? Porque sinto vontade de refletir sobre os que comentam meus textos acerca de
religião e dizem que há ateus arrogantes e fanáticos, especialmente quando critico a arrogância de
religiosos que se acham sabedores de tudo e logo vão dando explicações superficiais acerca da vida e
dos sofrimentos que passamos por ela em vez de analisar. Também tenho vontade de falar sobre as
pessoas que usam a desculpa de que um religioso(de qualquer credo) é mau-caráter porque não é uma
pessoa "de Deus".
Vamos ser realistas. Se acreditar em Deus realmente influísse no caráter de alguém, todas as pessoas
religiosas seriam automaticamente boas e as que duvidam ou não creem na existência de Deus seriam
más e insensíveis. E a realidade mostra o quê? Que tanto há ateus quanto religiosos de bom caráter.
Caso alguém diga que há ateus de mau caráter e arrogantes, eu não vou negar. Não digo que não
existem ateus e agnósticos sem ética e valores morais, porque eles existem sim.
Há ateus e religiosos arrogantes sim, mas isso não é problema da crença ou falta dela. É questão da
personalidade individual de cada pessoa. O que podemos ver é que muda apenas o discurso. O crente
arrogante usará o discurso religioso, dizendo verdades como se Deus lhe mandasse mensagens por
celular. O ateu arrogante se baseará no argumento de que é intelectualmente superior e racional, tendo
superado todas as crenças religiosas.
Muitas das piores pessoas que conheço vivem na igreja. E são pessoas inconvenientes, intrometidas,
que pensam que sabem tudo. Algumas delas vivem rezando e, quando saem da igreja ou param de orar,
começam a praguejar, olhar para a roupa de tal pessoa, falar mal de fulano ou sicrano, dizer que aquela
pessoa um dia irá pagar. Há um senhor que torturou a família toda sua vida e hoje, que está velho, vive
rezando e diz à filha (que sempre foi uma de suas maiores vítimas) que ela tem um karma horrível e
ainda terá de passar por trinta reencarnações para pagar todo o mal que fez, que ele a aguenta para
expiar e que um dia ela pagará por não ver que ele só quer fazer o bem. Vejamos como ele é santo. Ele
vive diminuindo a moça, dizendo que ela é lenta, precisa da ajuda dele até para enxugar os pratos, é
limitada intelectualmente e joga na cara dela até quando faz algo como comprar umas mangas, fazendo
questão de dizer quanto gastou para comprar. Uma pessoa dessas é generosa? Uma tia dessa moça até
perguntou: o que você fará se, ao chegar ao Paraíso, encontrar seu pai? A moça respondeu: pegarei um
tobogã para o inferno. Que dizer?
Um religioso arrogante acha que está salvo porque vive rezando e que, na prática, é uma pessoa
venenosa e insuportável, só nos mostra que crença ou descrença em Deus não é o fator mais
importante para determinar o caráter de alguém. Infelizmente, damos demasiado valor a quem é
religioso e temos preconceitos contra quem não acredita. Ateus e agnósticos sofrem até para encontrar
trabalho e são vistos com desconfiança. Deveríamos olhar os atos de uma pessoa, não aquilo em que ela
acredita ou não.
Admitir a verdade
A verdade pode ser muito cruel, e talvez por isso frequentemente nós nos obrigamos a não admiti-la,
refugiando-nos numa felicidade ilusória, tomando o tônico Pollyanna* em vez de encará-la de frente.
Entretanto, é o melhor que temos a fazer, ou senão jamais iremos amadurecer ou deixar de viver uma
mentira que nos impede de aproveitar a vida. Quantas vezes, recusamo-nos a admitir que tal pessoa
não é quem pensávamos, que muitas das coisas em que acreditávamos não passavam de ilusões que
nos impediram de tomar as atitudes corretas em relação à nossa vida e que nós fomos cegos ou então
estávamos vendo o mundo com lentes cor-de-rosa em vez de enxergar o cinza de uma determinada
situação? Acontece que não enfrentar a realidade da vida não nos tornará pessoas melhores. Irá apenas
nos frustrar, fazendo com que nos agarremos a esperanças que talvez nunca se concretizem, numa
eterna expectativa de que, um dia, "aconteça alguma coisa."
A gente gosta de se iludir, de não ver os defeitos de determinada pessoa ou a inconveniência de uma
situação e um dia, quando caímos na real, de repente é como se nosso mundo ruísse. Certas coisas que
antes não percebíamos agora nos parecem tão evidentes que nos perguntamos como pudemos ser tão
tolos. Entretanto, isso é muito comum e nos leva a agir como perfeitos idiotas em diversas ocasiões. É o
caso da moça que continua com um namorado que não lhe dá a menor atenção em lugar de ver a
verdade, mandá-lo embora de sua vida e tentar recomeçar, passando a se dar valor e a abrir seu
coração para pessoas que a valorizem de verdade. É também o caso de quem se deixa enganar por esses
gurus e videntes quando a lógica já mostrou inúmeras vezes que todas as previsões dessas pessoas são
falhas e muitas delas se baseiam em meras especulações. Contudo, adoramos ser feitos de trouxas, de
nos iludir e pagamos para ouvir alguém dizer exatamente aquilo que queremos ouvir. Ouvimos frases de
efeitos do tipo: "você terá muito sucesso profissional"; "há algo ou alguém que está lhe impedindo de
alcançar sua realização pessoal."
Admitir a verdade sobre uma pessoa é por demais doloroso. Às vezes, até desconfiamos que aquela
pessoa não é quem gostaríamos que fosse. Todavia, encarar a realidade é difícil porque, de certa forma,
é como se você "perdesse" aquela pessoa, o que ela significava para você. Só que não dá para nos
iludirmos eternamente em sonhos infantis ou juvenis. Quando chega um determinado momento, temos
de entender que só nós mesmos podemos cuidar da nossa realização, que tal situação que se arrasta há
muito tempo precisa de um ponto final e que, já que não podemos esperar mais nada do mundo ou das
pessoas, então, só resta esperar de nós mesmos.
*Personagem do livro de Eleanor H.Porter, que costumava jogar o "jogo do contente", no qual uma
pessoa, por pior que seja a situação, deve procurar sempre ver o lado bom das coisas para se sentir feliz.
Pollyanna se tornou um símbolo de otimismo.
Pais narcisistas:quando os pais são nossos algozes
"Nem todos podem ser órfãos"
Jules Renard
Existem pais maravilhosos, que assim como deram a vida aos filhos, de bom grado dariam suas vidas por
eles. Naturalmente, os pais não são perfeitos e cometerão erros. Mas o que ninguém pode negar é que
os pais que verdadeiramente amam os seus descendentes farão o que estiver ao seu alcance para que
sejam felizes, tenham vidas melhores que as suas e realizem seus sonhos. Porém, também existem os
genitores que seria muito melhor que nunca tivessem tido filhos, pois poderíamos dizer qualquer coisa a
seu respeito, menos que são bons pais. Não vamos falar de pais que chegam a extremos como matar
seus filhos, como Alexandre Nardoni ou muitas dessas mães que jogam filhos no lixo ou preferem ficar
com os companheiros a ficar com os filhos. Aqui, falaremos daqueles pais cuja convivência é danosa e
mata devagar qualquer relação entre pais e filhos, gerando seres com graves problemas psicológicos e
baixa autoestima.
Os pais dos quais se falará neste artigo são os pais narcisistas, que vivem a diminuir seus filhos, sabotar
suas tentativas de independência ou de realização no campo sentimental, pessoal e profissional. Parece
incrível que haja pais assim, não? Entretanto, eles existem. E não é agradável falar sobre eles,
principalmente para os que têm a má sorte de ser seus filhos. Podemos compará-los à madrasta da
Branca de Neve, que não admitia que a enteada fosse mais bela que ela. Entretanto, na vida real, isso é
mais triste porque se trata de pais biológicos, seres dos quais esperamos amor, compreensão e
segurança. Mas isso será algo que nunca receberemos da parte de pais assim.
É muito difícil falar sobre pais e mães incapazes de dar amor mas capazes de destruir a vida dos filhos
porque gostamos de idealizar os pais como seres dotados de amor incondicional. Todavia, precisamos
admitir que nem todas as pessoas sabem amar e o fato de alguém se unir a outra pessoa e gerar filhos
não fará com que esse alguém automaticamente se transforme numa pessoa amorosa e compreensiva,
que entenda que ter filhos é fazer sacrifícios, ter trabalho e aprender diariamente a ter paciência, a lidar
com pessoas em formação que estão sob sua responsabilidade e a prepará-las para que tenham um
futuro feliz.
Infelizmente, o problema dos pais narcisistas ainda não é levado a sério até por educadores e vários
profissionais da área da psicologia, embora muitos psicólogos que tratam de pessoas sobreviventes da
relação doentia com narcisistas tenham notado em pessoas com complexo de Narciso que elas têm
alguns traços psicológicos que também pertencem aos psicopatas e sociopatas. O problema é que, se os
pais reclamam que seus filhos são ruins, logo receberão apoios de pessoas que dirão coisas como "É,
hoje em dia os filhos são todos uns ingratos. Fazemos tudo por eles e nos mordem assim que podem."
Já, quando os filhos reclamam dos maus-tratos psicológicos, o mais provável é que ouçam:"Mas é seu
pai, você tem que respeitar"; Sua mãe lhe ama, é porque é o jeito dela"; "Se seu pai é assim com você e
não com os outros, é porque ele ama mais você." e "Todos os pais amam os filhos."
Vamos ser realistas. Pais que amam os filhos não irão fazer de tudo para que eles se sintam inúteis. E os
pais narcisistas são especialistas nisso. Falam mal dos filhos para as pessoas de fora da casa, reclamando
do trabalho e desapontamento que dão, ridicularizam e humilham os filhos na frente de outras pessoas,
dizendo que não fazem nada direito, são idiotas, desajeitados, lentos e muitos outros defeitos que
devem fazer os filhos pensar que não deveriam existir, pois não passam de fontes de tristeza para os
pais. Pais e mães narcisistas ainda são bons em distorcer as verdades. Se você reclamar que eles são
injustos e cruéis, farão parecer que o defeito é seu, que eles o tratam assim porque você não presta,
levando-lhe a duvidar de sua sanidade mental ou integridade. Eles são ótimos atores, posando como
seres exemplares fora do lar. E muitos irão vê-los como sofredores incompreendidos.
Uma mãe narcisista falava da filha(na frente dela) para as vizinhas, dizendo que a menina era lenta
demais para aprender Matemática, não sabia arrumar uma cama e era desmazelada com as roupas. Um
outro exemplo triste é o de um pai que odiava o fato da filha saber línguas estrangeiras, pois ele não
falava nenhuma. Ele chegava a atrapalhar a menina quando ela praticava. Isso mesmo. Pais narcisistas
não querem que os filhos sejam melhores que eles. Querem que os filhos sejam uns fracassados para
eles poderem diminuí-los. Soa absurdo, não? Absurdo mas real. Um narcisista não quer que ninguém
seja melhor que ele em nada. Ele exalta os defeitos e fracassos dos outros, porém subestima seus êxitos
e sucessos.
Os pais narcisistas são perversos. Para eles, os filhos devem servi-los. E tudo que os filhos fizerem será
pouco. Entretanto, qualquer coisa que fizerem pelos filhos será cobrada de forma descarada. Eles amam
poder dizer que os filhos não servem para nada e não passam de pesos em suas vidas. A gente até se
pergunta: se uma pessoa dessas vive a reclamar que a vida dela é sacrificada e infeliz por sua causa, por
que ela foi casar e/ou ter filhos?
É comum que esses pais perversos escolham um filho para ser o alvo de suas perversidades. Este filho é
o bode expiatório. Um bom exemplo de filho bode expiatório é o Poil de Carotte, do romancista francês
Jules Renard. Sua mãe, a Sra. Lepic (inspirada na mãe do próprio escritor) apelidou-o de Poil de Carotte
(cabelo de cenoura) para zombar de seus cabelos ruivos. Ela era tão malvada que o diminuía na frente
dos irmãos e chegava ao ponto de esconder o penico para o filho não ter outra alternativa senão urinar
na cama para ela poder humilhá-lo e fazer sopa de fezes para dar ao menino. Um momento altamente
dramático desse livro é quando Poil de Carotte, após a mãe ter provocado um desentendimento entre o
pai e ele, proclama a frase: "Nem todos podem ser órfãos", mostrando bem o ódio que desenvolveu por
ela.
Outra mãe monstruosa, que muitos identificam como narcisista, é a Branca, da novela Por amor,
magnificamente interpretada por Suzana Vieira. Enquanto ela maltrata Milena e Leonardo, Marcelo é o
filho predileto. Muitos filhos de mães narcisistas disseram que a novela não exagera na caracterização
da personagem, que maltrata principalmente o Leonardo, que é o bode expiatório. Vale salientar que o
filho predileto é aquele com o qual o genitor narcisista se vê como um espelho.
Pais narcisistas promovem discórdia entre os membros da família, especialmente os irmãos. Eles
também querem que todos se adaptem a eles, como se seus gostos fossem ordens sagradas. Só eles
são bons, capazes, inteligentes e merecem aplausos. A convivência com eles é insuportável. A coisa mais
insignificante que fazem é enaltecida como se fosse um ato grandioso e mesmo o sucesso dos filhos não
merece crédito. Podemos ver bem que narcisistas só casam com pessoas a quem possam chamar de
inferiores, porque apenas assim elas poderão se sentir "por cima". Ter filhos fracassados ou cônjuges
medíocres é uma boa oportunidade para eles poderem dizer que eles, com tantas qualidades, estão
cercados de incompetentes idiotas que só lhes fazem passar desgosto e vergonha. O pai narcisista de
uma moça dizia que ela era incapaz de fazer amigos e, em cinco anos de faculdade, só arrumara como
amigo um pirado igual a ela. Essa moça disse várias vezes que, desde pequena, o pai adorava chamá-la
de tudo que era feio, desajeitado e dizer aos amigos de fora como ela era burra e lerda. Ele a apelidava
de Madame Min, Minnie Ranheta*, chamava-a de "nega anormal", por ser a mais morena dos filhos,
falava que não havia bruxa mais feia do que ela e que morria de pena dela, que não sabia botar água
num copo e era uma lástima. Para completar, ele só a chamava de "governanta" e "secretária" da casa.
Para esses filhos, a convivência com tais pais é danosa. É frequente que ouçam como consolo frases de
efeito como: "é assim mesmo, tenha paciência." Acontece que, quando vemos que há pais amorosos e
que tratam os filhos com tanto carinho, concluímos que não é assim mesmo. É errado e ou saímos de
junto desses pais ou eles nos destruirão por dentro. Para eles, nossa felicidade não é importante.
*personagem nariguda e rabugenta do desenho do Pica pau.
Uma conversa inesquecível
"Se alguém precisa de religião para ser bom, a pessoa não é boa, é um cão amestrado."
Chagdug Tulku Rinpoche
"Qual a lógica de um deus todo poderoso e onisciente,que teria criado seres humanos imperfeitos para
depois culpá-los pelos seus próprios erros?"
Gene Roddeberry
Nunca sabemos o que irá nos acontecer quando precisamos sair para resolver problemas. Podemos
conhecer pessoas incríveis ou aborrecidas. No dia 1.º de agosto, precisando sair para fazer uns
depósitos, conheci uma senhora no ponto de ônibus quando eu já tinha resolvido meus problemas e
pretendia ir para casa. Eu estava junto a ela e, pouco tempo depois, um morador de rua passou pedindo
dinheiro para ajudar a comprar um colchão. Eu dei dois reais e nós duas conversamos um pouco sobre o
acontecimento. Acabei contando uma história sobre um filme em que uma professora, mãe solteira,
comendo em um pequeno restaurante, conhece um homem com quem acaba casando para depois
descobrir que ele é um assassino da máfia. A mulher falou que temos que pedir muita sabedoria a Deus
para não cair nessas armadilhas. Falei que ela não tinha feito nada de errado. Só tinha sido gentil, já que
ofereceu um lugar para ele sentar pois ele estava procurando mesa e não podia saber quem ele era e
por fim revelei que não acredito no Deus bíblico. Ela, naturalmente, ficou escandalizada e perguntou o
que me levou a não acreditar. Eu falei que foi a própria leitura da Bíblia. Aí ela falou que foi porque li
mas não entendi. Decidi não falar nas muitas contradições e crueldade do Deus Javé e ela perguntou por
que estou viva, respirando, com saúde e em pé e eu perguntei: e quem está morto, ligado a aparelhos,
doente, numa cadeira de rodas ou preso a uma cama?
Olha o que ela respondeu: Minha filha, Jesus é a verdade, Ele morreu por nós. Se você entendesse a
Bíblia, saberia que Jesus morreu por nós.
Eu respondi: Eu não era nem nascida quando Ele morreu na cruz. Resposta: mas ele já sabia que você
iria nascer, Ele diz que o que nós pedirmos, Ele dá.
Pois eu falei que Jesus nunca me deu nada e que, nas piores horas, ou eu descobri como me virar
sozinha ou contei com a ajuda de outras pessoas. Ela falou: Você está blasfemando. Como pode confiar
no homem se o homem é mau?
A verdade é que eu podia falar muito que, ainda que o ser humano seja considerado mau, quando
estamos em momentos horríveis, ou só podemos contar com nós mesmos ou com outras pessoas.
Afinal, se o morador de rua iria ou não conseguir o colchão, isso se deveria a ajuda de seres humanos
cheios de defeitos como eu.
Eu contei que a Bíblia só mostra um Deus cruel, incompetente e insensível. Ela disse que eu precisava ler
a bíblia melhor, com a ajuda de alguém, porque não acreditou quando falei que li todo o Novo
Testamento e o Apocalipse três vezes, além de conhecer quase todo o Antigo.
Ela discordou fortemente quando falei que é estranho um Deus antes tão presente hoje não dar
nenhum sinal. Preferi não discorrer sobre a crueldade de Deus para com Jó ou as atrocidades de Josué
para conquistar a Terra Prometida e também não quis dizer que o Deus que fazia coisas como abrir o
Mar Vermelho não ajuda seu próprio povo em Israel no meio de tantas bombas e mortes. Aliás, por que
Israel precisa ter o melhor Exército do mundo se eles são o povo escolhido, não é? Foi o que apenas
pensei, pois argumentar só faria com que me aborrecesse.
Depois, eu perguntei a ela: Veja, por que Deus, sendo onipotente, não se revelou logo para todos os
povos? Dizem que os orixás são do demônio. Mas as religiões africanas são de outro povo, outra cultura.
Que culpa eles têm se não conheciam Deus? Veja, na Índia, muitos adoram ou a Shiva, Vishnu ou a um
Deus Ganesha, um deus com cara de elefante. Muitos lá nunca ouviram falar em Jesus Cristo.
Só que aí ela respondeu: mas Deus deu ao homem o livre arbítrio.
Eu respondi: a senhora não está entendendo. Estou falando que essas pessoas não tiveram como saber
quem era o Deus único e verdadeiro. A única coisa que fizeram foi não nascer no lugar certo.
De novo, ela falou no livre arbítrio. Mas acontece que, se essas pessoas não tiveram chance de conhecer
a Jesus, ninguém pode falar em livre arbítrio, pois tudo que fizeram foi nascer no lugar errado e não
tiveram chance de conhecê-lo. Se Ele tivesse se revelado logo para hindus, egípcios, chineses, persas e
povos nativos americanos, em vez de apenas para os hebreus e mesmo assim eles tivessem querido
adorar outros deuses, aí sim se poderia falar em livre arbítrio, porque eles teriam tido a chance de
escolher.
Ainda mencionei como os padres foram cruéis para com muitos índios na colonização das Américas e de
como um padre, ao dar a um índio a chance de se converter a Cristo antes de mandar executá-lo, ouviu:
“Se no Paraíso todos são como você, prefiro ir para o inferno. “
Horrorizada, ela disse que, se o índio soubesse como era o inferno, não teria dito aquilo. Pena que ela
não considerou que o índio falou daquela forma por causa da crueldade com que os padres cristãos o
haviam tratado e de como os colonizadores haviam chegado massacrando seu povo, invadindo suas
terras e destruindo sua cultura. Afinal, os padres e colonizadores falavam de um Deus de misericórdia e
amor e agiam com violência imperdoável, o que fez o índio não querer acreditar naquele Deus que lhe
era apresentado.
Olha o que ela falou: não sei como alguém pode se sentir sem ter Deus no coração. E você, tenho
certeza, não pode ser ateia. Ateu não tem amor no coração, é frio, insensível. Veja, você não ajudou
aquele homem dando dinheiro para ele comprar um colchão? Um ateu não faria isso.
Desisti, poderia dizer que Bill gates é ateu e é filantropo e Angelina Jolie, ateia, ajuda crianças com fome
na África. Infelizmente, ela, como muitas pessoas, considera que quem não acredita no Deus bíblico é
insensível e cruel e não possui bondade.
Depois, quando chegou a vez dela descer, ela se despediu e foi embora e eu fiquei apenas pensando em
como perdi meu tempo tentando me explicar.
Os melhores e piores pais da ficção
Neste Dia dos Pais, há muitas figuras paternas na ficção que merecem ser lembradas porque se
tornaram símbolos ou de pais maravilhosos ou de péssimos pais. Se há pais que realmente merecem
esse nome, também há os que podemos dizer que o são apenas no nome, pois não sabem dar amor,
proteção e são verdadeiros exemplos de maldade e comportamentos abusivos. Sendo assim, vamos
falar dos melhores e piores pais da ficção, não esquecendo de dizer que este texto é o resultado de uma
opinião pessoal e cada pessoa tem direito a discordar.
Portanto, vamos mencionar os melhores:
1- Tio Phil: o tio de Will Smith na série Um maluco no pedaço era um belo exemplo de pai amoroso e
preocupado com os seus rebentos Carl, Hillary e Ashley. O personagem, muito bem interpretado pelo
inesquecível James Avery, ainda tinha lugar para o sobrinho atrapalhado Will, interpretado pelo então
principiante Will Smith, orientando-o para a vida, dando broncas e tentando fazer com que o
tresloucado parente ganhasse juízo. Tio Phil não era perfeito, mas tinha sempre boas intenções, dava
broncas e castigos e vivia a ralhar com o sobrinho. Porém, quando Will precisava, ele não deixava de dar
um abraço e um ombro amigo, mostrando que realmente amava o jovem. Dois momentos memoráveis
de Tio Phil e Will Smith são o abraço que ele dá em Will no episódio A nova desculpa do papai, quando
Will desaba em prantos após ver seu pai abandoná-lo de novo e o episódio final, no qual ele revela que
sempre havia acreditado em Will e visto potencial nele quando ele ainda era um garoto que dava
trabalho;
2- Don Vito Corleone: o personagem de Marlon Brando, que na vida real era um péssimo pai, tornou-se
um símbolo de figura paterna no cinema. O mafioso implacável e astucioso era um marido exemplar e
pai carinhoso, que fazia de tudo para defender sua família. Se ele não era um exemplo de cidadão
honesto, ninguém podia negar que era um pai maravilhoso;
3- Rhett Buttler: o gentleman canalha interpretado por Clark Gable que não se importava com a Guerra
da Secessão e tinha reputação de canalha e sedutor se redimiu ao se apaixonar de verdade pela
mimada e egoísta Scarlett O’hara e ao se mostrar um pai totalmente devotado. Se Scarlett era uma mãe
negligente, Rhett vivia para a filha, mimando-a e fazendo tudo que ela queria. Podemos admitir que ele
errou ao estragar a filha de mimos, só que ninguém pode deixar de admitir que ele era um pai
extremamente amoroso. Tanto que a morte de Bonnie o destruiu por dentro e esfacelou o seu
casamento com Scarlett;
4- James Braddock; este foi uma pessoa que viveu de verdade. Boxeador americano descendente de
irlandeses, foi interpretado por Russell Crowe em A luta pela esperança. No filme, ambientado na época
da Depressão Americana, Braddock abandonou os ringues e tem que sustentar a família, composta por
sua esposa e três filhos, resolvendo voltar a lutar e se tornando um exemplo de superação e
perseverança. Ele chega a ficar sem comer para que a filha coma carne. A melhor cena do filme é aquela
em que Braddock faz seu primogênito, Jay, devolver ao açougue um pedaço de carne que o menino
tinha roubado para a família. Após a devolução, Jay confessa que roubara porque estava com medo de
que o pai, por não poder alimentar a família, tivesse que mandar os filhos longe. Braddock promete que
os filhos não irão para longe e o filho começa a chorar. Amorosamente, o pai abraça o filho, dizendo-lhe
que está tudo bem e que entende porque ele agira daquela forma. A cena em que o pai se mostra tão
compreensivo é realmente comovente.
Agora, falemos de alguns péssimos pais:
1- Leo: personagem abusivo interpretado por Jackson Antunes da novela A favorita, ele espancava a
esposa, chamava-a de inútil e também maltratava os filhos. Seu filho mais novo, Domenico, chegou a
perder a fala. No final, Catarina, a esposa submissa, cansou de apanhar e deu uma guinada na vida,
começando a trabalhar e abandonando-o no final da trama. No capítulo final, sua filha mais velha diz
que ninguém sentirá sua falta;
2- Jake: quem assistiu ao filme neozelandês O amor e a fúria tem de concordar que ele é um perfeito
exemplo de péssimo pai. Desempregado, usa o dinheiro do seguro-desemprego para beber com os
amigos, espanca a esposa, ignora os filhos, que o temem por causa de seu temperamento violento e faz
coisas que parecem inacreditáveis, como ir beber em um bar em vez de visitar o filho que está num
centro de detenção juvenil. Sua esposa, Betty, só toma uma atitude após o suicídio da filha mais velha,
Grace. Jake não vai ao funeral da filha, preferindo beber num bar e Betty resolve deixa-lo, revelando que
um dos seus amigos havia estuprado a filha e que toda a violência doméstica havia destruído não
apenas a menina, mas também a família. No final, ela vai embora, salvando o que ainda há para salvar;
3- Campos Lara: o protagonista do romance O feijão e o sonho de Orígenes Lessa não faz coisas como
maltratar os filhos ou espanca-los, porém peca pela negligência, deixando de prover suas necessidades
básicas e sendo totalmente ausente, ignorando-os enquanto vive com a cabeça nas nuvens. Maria Rosa,
sua esposa, tem de lutar como pode e se sente abandonada. Só mais tarde, quando os filhos estão
crescidos, ele se dá conta de como os privou de uma vida mais feliz e confortável;
4- Saulo: o personagem da novela Passione era péssimo em tudo. Mau marido e pai, envenenou o
próprio pai para conseguir assumir os negócios da família, era abusivo com a esposa e os filhos e chegou
a chutar seu filho mais velho quando este, sob efeito de drogas, pediu-lhe socorro. A cena mais forte
envolvendo este personagem é a em que o filho mais velho, diante da família, agarra-o pelo colarinho e
faz mil acusações, chamando-o de “pai de merda”. Se a expressão parece desrespeitosa, não dá para
negar que é fruto de muita mágoa e revolta.
Enfim, há mil exemplos de bons e péssimos pais na ficção e na vida real. Um texto como este pretende
apenas falar de alguns exemplos que merecem ser mencionados. Muitos mais nomes poderiam ser
citados, até porque a vida nunca deixa de nos brindar com boas histórias que valem uma reflexão.
Uma história machista?
Sabemos bem que livros didáticos de ensino de línguas (seja a nossa língua ou uma estrangeira) costumam apresentar fragmentos de textos para atividades de leitura. Portanto, muitas vezes, ao lermos uma história num desses livros, ficamos sem saber qual o seu final ou mesmo se a narrativa teve uma continuação. Foi o que houve com um texto contido num livro didático de português que li na casa da minha avó paterna, - que era professora de Português - muito tempo atrás. O livro tinha várias histórias e a grande maioria delas contava as aventuras de dois irmãos, Eva e Ivo. Numa dessas histórias, Ivo, que é escoteiro, está arrumando sua bagagem e Eva pergunta se dá para arrumar tudo. Eles conversam um pouco e, no final, quando Eva pergunta se ela também pode ser escoteira, ele diz que ela não deve ser boba, porque escotismo é para homem e não para meninas choronas. E ponto final. Não aparece nenhuma continuação mostrando se a menina brigou com o irmão para protestar que ela podia fazer essas coisas. Assim, não dá para saber se o autor das aventuras dos irmãos deu um jeito de mostrar que ela podia exercer atividades ao ar livre.Porém, numa coisa temos de concordar: a atitude do menino foi grosseira e mostrou ignorância para um escoteiro. Será que ele não sabia que o fundador do escotismo, Lord Stephenson Baden Powell, que fundou o escotismo em 1907, fundou também o das bandeirantes em 1909 junto com sua irmã, Agnes? Ele o fez quando soube que meninas também queriam ter a oportunidade de praticar atividades ao ar livre. Então, isso também é coisa para meninas. Por que ele acharia que sua irmã não poderia fazê-lo?A última frase do menino é dúbia. Quando ele diz que escotismo é para homens e não para meninas choronas, não sabemos se ele quer dizer que todas as meninas são choronas ou se apenas Eva é chorona. Se ele quer dizer que todas são choronas, isso é um traço de machismo, deixando claro que ele pensa que meninas se descontrolam fácil e não são capazes de atividades que exigem dinamismo, disposição para enfrentar as asperezas de acampar, capacidade de adaptação, de trabalho em grupo e disciplina. Caso ele se refira apenas à irmã, ele tem dela um mau conceito, acreditando que é uma menina fraca e sem forças. Ao se dizer "homem", e chamar a irmã de "menina chorona", ele ainda revela que se julga superior e mais maduro que a irmã por ser do sexo masculino e aparentemente não ser de chorar fácil. Ele já é um homem e ela, ainda uma criança, segundo sua concepção.A fala do menino mostra uma ideia negativa acerca do choro. Chorar sempre foi associado à fragilidade, a não saber lidar com as emoções e a crença de que mulheres choram mais que os homens. Vale salientar que chorar é considerado um traço de infantilidade e é comum que os pais reprimam as crianças quando elas choram, dizendo que "já são muito grandes para chorar". Homens adultos também tendem a reprimir o choro, embora chorar seja natural e revele nossos sentimentos,
que temos emoções e que estamos abalados. Bem, chorar é uma manifestação de emotividade, de abalo emocional e ainda prevalece entre nós, por causa da herança machista, que os homens são mais racionais que as mulheres.Infelizmente, eu não sei se a história tem uma continuação, porém, em outras que aparecem no livro didático contando as aventuras dos irmãos, Eva só aparece costurando roupas de boneca com sua avó ao passo que Ivo faz coisas como subir em árvores e mexer com ninhos de abelhas. Enfim, ela só é mostrada fazendo coisas bem "femininas", enquanto ele se aventura para conhecer o mundo.Com certeza, nenhum livro didático publicaria hoje essa história, que sugere ser bastante machista. Porém, se fosse eu que a tivesse escrito, eu com certeza teria feito Eva mostrando a Ivo que ser mulher não é ser fraca, passiva e chorona. E mencionaria o movimento das bandeirantes.
O velho argumento de querer o melhor para os filhos
Sempre se diz que os pais querem o melhor para os filhos, principalmente quando os nossos pais fazem
coisas como nos proibir de fazer algo, tentar ditar nossos caminhos ou impor gostos. Entretanto, esse
velho argumento não deve mais ser usado como uma desculpa para se intrometer na vida dos filhos,
superprotegê-los e impedi-los de saber, por eles mesmos, o que é o melhor para eles. E como eles irão
amadurecer quando os pais sempre lhes dizem o que fazer? Se eles querem fazer algo e ouvem que não
devem porque são muito inexperientes?
Os pais precisam entender o seguinte: a vida traz dificuldades. Tentar poupar nossos filhos o tempo
todo de sofrer, impedindo-os de conhecer a vida, só produzirá um sofrimento muito maior no futuro.
Tanto os filhos quanto os pais sofrerão. E que filhos os pais querem gerar para o futuro? Seres fortes e
capazes de cuidar de si mesmos? Ou eternas crianças que nunca poderão sair de uma redoma? O que
será do mundo com pessoas que nunca passarão de crianças perdidas e inseguras em corpo de adulto?
Não adianta querer poupá-los de sofrer dificuldades ou decepções, tratando-os como se eles não
pudessem sofrer como qualquer outra pessoa. O mundo não os poupará. Vocês também não podem
ficar a impedi-los de tentar conseguir as coisas por seus méritos, pois isso irá prejudicar o caráter deles.
Eles não aprenderão a dar valor ao esforço e talvez fiquem com uma falsa ideia de superioridade, que
pode ser tão prejudicial quanto a de inferioridade.
Vejamos o seguinte: precisamos conhecer a nós mesmos para sermos capazes de aprimorar nosso
caráter e desenvolver nossas aptidões. E temos de tomar nossas decisões para saber qual o nosso
caminho. Conhecer a nós mesmos exige que conheçamos o mundo. Então, temos de viver a vida,
interagir com as pessoas, passar pelas dificuldades que envolvem viver. A superproteção e o querer
determinar o caminho dos filhos só os impedirá de saber quem são, de amadurecer e aprender a se
defender dos perigos. Falar que o mundo é perigoso e as pessoas não são confiáveis não pode ser mais
usado como desculpa. Vejamos as crianças índias, africanas ou aborígines da Austrália. O que elas se
tornariam se os pais as mantivessem presas em vez de estimulá-las a explorar a floresta? A decisão, a
iniciativa, se não são qualidades inatas, devem ser estimuladas nas crianças para que aprendam a se
defender e se tornem confiantes. A selva é perigosa, mas as crianças selvagens não podiam ser
superprotegidas por causa disso. O melhor a fazer é ensinar nossos filhos a se defender, a ser
independentes.
Um bom exemplo de como a superproteção, o não querer que o filho sofra, pode causar um sofrimento
maior, está na novela Por amor. Nela, a Helena de Regina Duarte troca seu filho recém-nascido pelo
filho morto de sua filha Eduarda para que ela não sofra, pois perdeu o útero e não poderá mais ter
filhos. O que ela fez? Mostrou que via a filha como um ser feito de cristal, incapaz de enfrentar as dores
e decepções da vida - algo pelo qual todos nós passaremos - e manipulou os destinos de todo mundo,
causando sofrimento a Atílio, seu companheiro e levando a filha a viver uma mentira. Quando
descobriram a farsa, o sofrimento foi muito maior. Ela não tinha o direito de querer agir como Deus,
como se pudesse decidir a vida dos outros.
Superproteger os filhos é desrespeitar sua individualidade. Quantas vezes, os pais não fazem coisas
como forçar os filhos a exercer profissões que eles não querem ou fazer cursos para os quais não têm a
menor vocação, dizendo que querem o melhor para os filhos? Isso só os tornará infelizes. Sentirão que
os pais acham que eles não são capazes de tomar decisões, que precisam que lhe digam o que fazer.
Os pais precisam entender algo: amadurecer envolve deixar os filhos andar com as pernas, sujeitando-se
a cair e se machucar. Não viemos a esse mundo preparados para tudo, desconhecemos muita coisa.
Então, temos de descobrir. E os pais não podem impor decisões. Seria bom que fizessem como o pai da
parábola do filho pródigo, que, embora sabendo que o melhor para o filho era ficar, deixou-o ir. O filho
partiu, cometeu erros, sofreu e voltou para casa mais amadurecido, pois tinha descoberto, por ele
mesmo, o que era bom para ele. Se você sempre diz ao seu filho o que ele deve fazer, você devia pensar
o seguinte: eu não estou adestrado um animal, estou criando um ser humano para que, um dia, ele ache
seus caminhos.
Crianças mimadas e insuportáveis dos desenhos animados
Entre os muitos erros que os pais podem cometer na educação dos filhos está o de mimar em excesso e
tanto a vida real quanto a ficção são pródigas em mostrar os estragos que mimar demais causam na
formação do caráter e da personalidade. Vários desenhos animados clássicos têm bons exemplos de
crianças mimadas e mal-educadas e aqui serão analisados o Pica-pau, Mickey e Os jetsons . Em todos
eles, podemos ver bem como os pais são extremamente condescendentes para com as atitudes
malcriadas e egoístas dos seus filhos. Porém, em alguns, essas crianças terminam sendo exemplarmente
punidas, ou pelos pais ou pelas circunstâncias.
Analisemos o primeiro desenho, um episódio do Pica-pau chamado O pássaro que veio para jantar.
Neste episódio, o pica-pau vê um homem vendendo pica-paus de brinquedo e uma senhora milionária
descendo de sua limusine. Pensando que terá uma boa vida, o malandro pássaro se finge de brinquedo
e a mulher o leva à sua mansão, falando que o dará a seu pequeno Reginaldo. Ao chegar, no entanto, o
pica-pau tem uma surpresa nada promissora: o menino, um grandalhão gordo, feio e usando uma
roupa ridícula de marinheiro e exibindo uma expressão sádica, está se divertindo destruindo seus
brinquedos. E o faz com deleite no olhar. Nota-se aí uma crítica clara à maneira como muitas crianças
são criadas. Quando os pais dão tudo que querem, elas não valorizam o que possuem. Sendo rico,
Reginaldo pode destruir seus brinquedos à vontade, pois sabe que sua mãe, que o mima demais,
sempre dará novos. O menino, após algumas peripécias, fica furioso com o pica-pau e tenta pegá-lo,
destruindo vários objetos. A mãe, enlouquecida, procura pará-lo e, quando se pergunta o que fará com
ele, o pica-pau lhe dá uma escova, sugerindo que use a "psicologia infantil". No final, a mãe o surra
impiedosamente.
Um outro desenho, no qual a criança mimada é rica, foi feito em 1932 pelos Estúdios Disney, e se chama
A boa ação do Mickey. A época é a da Depressão norte-americana, as pessoas estão festejando o Natal
e nele Mickey, com pena de umas crianças pobres e querendo lhes dar uma festa de presente, vende
Pluto para um milionário - um porco antropomórfico - cujo filho único e mimado destrói todos os
brinquedos que lhe são oferecidos, chora fazendo birra e , ao ver o cachorro, grita que quer o animal.
Porém, após comprarem Pluto, o menino começa a maltratá-lo impiedosamente, causando um
verdadeiro caos na mansão. Cansado das atitudes do filho, o milionário manda o mordomo soltar o
cachorro e, quando o menino berra, ele o coloca sobre os joelhos, desce-lhe os calções e começa a lhe
dar fortíssimas palmadas.
Tanto o desenho do pica-pau quanto o de Mickey criticam o fato de que crianças ricas, por não
passarem dificuldades, não darem valor aos seus brinquedos, pensando que os pais sempre lhes darão o
que querem e não imporem limites. Uma atitude que contrasta com a do menino mimado em Mickey é
a das crianças pobres, que sentem uma alegria genuína quando Mickey lhes dá brinquedos. Quem tem
de lutar pelo que quer e não pode ter tudo que deseja dá mais valor ao alcançar o que almeja.
Um episódio de Os jetsons, desenho futurista que merece ser mencionado é O repetidor instantâneo,
pois mostra um menino insuportavelmente mimado. Embora ele não faça parte da história, porque só
aparece duas vezes, ensina-nos bem como o excesso de mimos e a falta de limites podem produzir
pessoas mal-educadas, rudes e sem limites. Na primeira vez que ele aparece, em um ônibus, usa seu
brinquedo, um ursinho, atirando-o contra George Jetson, apenas porque não simpatiza com o homem.
Ele diz à mãe: "mamãe, mamãe, eu detesto esse homem?" Qual a atitude da mãe? Na primeira vez,
apenas diz ao menino que não estrague o brinquedo dele e, na segunda, diz ao filho que use a bolsa dela
para bater no homem. Que atributos podemos usar para definir uma mãe dessas, que não ensina à
criança que ele deve respeitar as pessoas e não o pune por desrespeitar alguém que nada fizera contra
ele, ainda por cima dando a bolsa dela para que ele não estrague o brinquedo? Com certeza, ela não
tem muito caráter. Na vida real, esse menino seria castigado pela vida encontrando alguém que, não tão
paciente quanto George, talvez quebrasse o ursinho e dissesse à mãe que ela estava produzindo um
monstro. Lamentavelmente, mães e pais assim só assumem seus erros quando sofrem os efeitos. Talvez
o menino acabasse por agredi-la, pois ela não vê nada de mais nele agredir alguém só porque a pessoa
lhe parece antipática.
Que podemos concluir? As obras culturais podem servir de bons exemplos em nos mostrar que o mimo
excessivo jamais produzirá seres de caráter. Crianças mimadas se acham poderosas, melhores que os
demais, pensam que podem fazer tudo que querem e, frequentemente, precisam tomar um choque de
realidade para entender que precisam respeitar os direitos dos outros.
É muito fácil culpar as vítimasAssim como se costuma culpar as vítimas de estupro e de bullying, é comum que se diga dos filhos de pais opressores que eles foram fracos, que não tiveram coragem de lutar por sua independência e ir atrás de viver sua vida. Porém, precisamos entender que não estamos na situação de uma pessoa para que apenas ela leve a culpa. Vejamos principalmente que uma relação familiar envolver muita gente e somente uma pessoa não pode ser responsabilizada.Ser oprimido continuamente exige realmente que se lute contra tal situação, porém quem sofre muita opressão costuma ficar com a saúde mental fragilizada, pouca autoestima ou então, talvez por algum motivo preso no subconsciente, recusa-se a ver o problema como ele é. No caso de relação pais e filhos, a questão é bem mais complicada. Os pais são as primeiras pessoas com quem formamos relações sólidas. Nos nossos primeiros anos, dependemos completamente deles. São eles os que inicialmente nos transmitem valores e tendemos a acreditar neles. A mente humana é muito maleável, especialmente na infância e tudo que nossos pais disserem a nosso respeito será internalizado. Portanto, caso os pais tratem os filhos de um modo, isso refletirá na maneira como a criança se vê e entende o mundo. Do mesmo modo, temos de entender que a opressão paterna pode ser muito bem camuflada sob o manto da proteção, de que apenas "se quer o melhor para os filhos", de que "eu sei o que lhe serve, tenho mais experiência."Se uma criança ouve muito que ela é burra, incapaz, lenta ou que só dá trabalho e faz tudo errado, ela vai acreditar nisso e talvez até se comportar de acordo. Muitas crianças não estudam nem arrumam seus quartos porque aprenderam com os pais que são "preguiçosas e desinteressadas". Algumas agem de forma a chamar a atenção porque os pais lhes disseram que elas não sabem se portar e são inconvenientes. Claro que as palavras dos pais podem surtir o efeito contrário. Talvez a criança que ouça que é lerda demais para fazer algo direito se concentre demasiadamente nos estudos. Mas isso não será algo que ela fará para satisfazer a si mesma. Será uma tentativa de provar aos pais e a ela própria que não é estúpida. Muitos adultos perfeccionistas que vivem a traçar para si altas metas ouviram dos pais que nunca seriam ninguém na vida.Geralmente, pais opressores escolhem um filho ou filha para ser o alvo de todas suas críticas e exigências demasiadas. E, se os filhos oprimidos veem os pais paparicarem tanto o outro, tenderão a pensar que elas são as culpadas porque não são como o filho preferido. É a velha história de pensar que "meus pais não me amam porque não sou bonito, inteligente, esperto." Isso é danoso para a autoestima. Para a criança, ver que não é amada como esperava faz com que entre em choque com o que nos ensinam a acreditar: que todos os pais amam os filhos do jeito que eles são e que não fazem distinção entre os filhos. A criança quer ser amada e possivelmente pensará que tem que conquistar esse amor, tornar-se boa o suficiente para ser amada.Muito fácil dizer que a pessoa se deixa oprimir porque é boba. Mas a criação que recebemos cria padrões mentais que aprisionam nossa mente. Quando mais velhos, muitos comportamentos inexplicados que possuímos, se formos a um psicólogo, será revelado que tiveram origem lá atrás, na infância ou adolescência. Quantos adultos, quando decidem se tratar, vão desenterrando problemas de trinta anos atrás, seja o ambiente familiar ou bullying na escola? É um mito essa história de que "águas passadas não movem moinho." Movem talvez a nossa vida inteira. A gente muitas vezes apenas finge que superou, mas a mágoa fica
lá, como uma sujeira que varremos para debaixo do tapete ou um esqueleto que mantemos no armário. Se formos criados com padrões negativos, poderemos repeti-los no futuro ou tentar desesperadamente não ser como nossos pais. Filhos criados por pais opressores podem repetir esse comportamento ou então se tornar o extremo oposto, tornando-se permissivos. Como vemos, mágoas não tratadas irão repercutir na nossa vida inteira. Quantas mulheres que foram oprimidas não adotam o comportamento estranho de se manter presas a homens que não as valorizam, não conseguem casar ou trocam de parceiros tentando encontrar o "homem ideal"? Se forem a um profissional, entenderão que isso se deve a terem sido educadas por pais opressores.A opressão dos pais leva a muitos problemas: depressão, ansiedade, falta de autoestima, distúrbios alimentares como bulimia ou anorexia. Todas essas pessoas serão fracas? Com certeza não e, se são, não podemos culpá-las nem ficar pressionando. Quem está em tal situação tem que descobrir sua própria força, ver que aquele ambiente familiar não é normal nem saudável. O problema é que, muitas vezes, os filhos oprimidos não querem enxergar a verdade. A gente pode levar anos para se libertar desses pais, que não querem nos prender junto a eles nem decidir nossas vidas por amor. Eles o fazem apenas para satisfazer a si mesmos.
Vergonha de viver no Brasil
Senhor Presidente Jair Bolsonaro, que posso dizer da sua atitude diante das queimadas na Amazônia? O que tenho a dizer de suas gentis declarações a respeito da idade da mulher do Presidente da França? Primeiro, posso dizer que zombar do presidente da França porque a mulher dele é mais velha do que ele não foi apenas de uma extrema grosseria e inconveniência, foi também uma imensa falta de bom senso, uma atitude digna de alguém que, numa situação em que se tem que passar por cima das diferenças e pensar no bem estar de todos, no interesse comum, age como um garoto irresponsável, comprando briga com os dirigentes de outros países.Além de brigar inconvenientemente com a França e outros países como a Alemanha e a Noruega, o senhor ainda mostrou insensibilidade perante as queimadas que têm destruído a flora e matado tantos exemplares da bela fauna da nossa floresta. Meu coração dói ao pensar no sofrimento de animais indefesos que veem seu habitat ser destruído e nada podem fazer senão fugir. Mas o senhor, o que fez? Agiu com muita rapidez e sabedoria, primeiro dizendo que eram as ONGs para chamar atenção. Acusar alguém sem provas não é apenas irresponsável, é também antiético e o senhor deve lembrar que atribuir a alguém um crime é calúnia, crime contra a honra. Bem, o senhor deve ter aprendido muito com o ilustre estadista George W.Bush, que passou por cima do Direito Internacional e da ONU para iniciar uma guerra contra o Iraque e o Afeganistão, sendo capaz até de inventar que o primeiro tinha armas químicas. Talvez o senhor, como ele, ache que é alguém acima do bem e do mal. Quanto a mim, quem sou eu? Sou apenas uma insignificante brasileira que, como tantos outros, está se sentindo indignada e que ouviu que meu manifesto seria inútil, pois muitos
outros têm se manifestado. Porém, devo falar. Assim como muitos alemães não eram a favor do nazismo e da perseguição aos judeus, eu não sou a favor de muitas coisas erradas que estou vendo. O senhor é alguém que está no topo, eu sou só uma pessoa comum que quer trabalhar e que, há anos, tem se perguntado quando o Brasil será uma nação que dá a todos condições dignas de vida.Há muito tempo, acompanho suas ações e vi muito bem que o senhor não tem coerência. Primeiro o senhor disse que tinha gerado uma filha mulher ao fraquejar e, quando foi conveniente, para conseguir votos, fez questão de aparecer abraçado a ela, dizendo o quanto ela lhe era preciosa. Também vi sua atitude grosseira e desrespeitosa no impeachment de Dilma. Eu era a favor do impeachment, mas não gostei do fato do senhor ter elogiado o general Ustra, um notório torturador. Pior ainda foi sua grosseria para com Jean Wyllis, zombando da orientação sexual dele. Não aprovo o fato dele ter cuspido no senhor, embora reconheça que ele não suportou suas grosserias. E seus filhos ainda tentaram fazer parecer que o fato dele ter cuspido no senhor era um ato premeditado. Depois, foi provado que não. Mesmo assim, ainda há gente que o defende.Sua atitude de que os filmes devem passar por um “filtro cultural”, falando que o Estado não irá patrocinar produções tipo Bruna Surfistinha, além de ter um cheiro de censura, é de um simplismo exagerado. O senhor ainda é do tempo em que crianças eram inocentes? Neste exato momento em que manifesto minha indignação contra suas atitudes, um monte de crianças “inocentes” deve estar acessando a Internet para ver filmes pornográficos. Proibir o cinema nacional de produzir filmes pornô não fará com que crianças e adolescentes deixem de ver pornografia. Sejamos realistas! E filho homossexual não é falta de punição física! Conheço alguns homossexuais e muitos deles apanhavam dos pais quando estes desconfiavam que os filhos não estavam agindo como “um homem deve agir”. Pior é ver sua ministra, Damares, dizendo coisas como “menino veste azul e menina, rosa.” A sexualidade das pessoas é assunto pessoal delas, o governo não tem nada a ver com isso. Muita gente votou no senhor por causa da história do kit gay, não foi? Que ingenuidade! Homossexuais sempre existiram, independentemente de ideologia de gênero, kit gay e grupos LGBT. O senhor pensa que se deve ensinar a agir como homem? Caso a educação seja assunto do seu interesse, pense no mais importante, que é ver alunos do Ensino Médio com dificuldades de cálculo e leitura. Os países de Primeiro Mundo investem em educação, em dar aos alunos conteúdos atualizados, em formar professores capacitados. O governo deve pensar nisso, não se deve pensar em ensinar que meninos devem vestir azul e meninas, roupas cor-de-rosa. Entenda também uma coisa: o senhor, como Presidente, tem que guardar suas opiniões pessoais para o senhor. Se eu quero chamar alguém para trabalhar, eu me interesso se é competente e idôneo, não se acredita em Deus, se é homo ou heterossexual.Lamento ver que tanta gente votou no senhor, capaz de defender um torturador como Ustra. Será que leram o livro Brasil: nunca mais? Tortura é a pior coisa que acontece a um ser humano, tira a dignidade do torturado e do torturador. O senhor, ao elogiar um torturador, fez apologia de um crime hediondo. Porém, quando Fidel Castro morreu, disse que os que amam a democracia deveriam comemorar a chegada dele ao inferno. Que coerência, não? Só que, se eu falar contra o senhor, falarão que o PT roubou, que Fidel Castro foi torturador. Sim, isso é verdade. Entretanto, se Fidel Castro foi um ditador cruel, também houve uma ditadura militar no Brasil. Aliás, o senhor também deu mostras de muita sensibilidade ao se referir ao pai do Presidente da OAB, dando até a entender que sabe qual foi o fim que ele teve, não é?
Eu sinto vergonha de viver no Brasil, de ver que tantas pessoas, mesmo com todos os sinais de que o senhor dava de que não seria um bom presidente, preferiram escolhê-lo. Talvez o PT não fosse uma boa opção, todavia não posso dizer que um candidato que, em tantos anos como parlamentar, nunca apresentou um bom projeto de lei e sempre só se destacou por declarações polêmicas, grosseiras e provocativas fosse melhor. E, além de tudo isso, o senhor tem se mostrado despreparado, desprovido de capacidades diplomáticas, de habilidades em coordenar as diferenças de opinião em seu governo e de prontidão em agir num problema como o da Amazônia.Infelizmente, estamos numa situação de “salve-se quem puder.” Aqui, eu termino meu manifesto de indignação.
Ninguém pode viver para ser suporte dos outrosQuem tem que cuidar de sua felicidade e de seu bem-estar é você. Outra pessoa não pode viver para suprir suas necessidades e, se você não quer que aquela pessoa se vá para longe porque diz que sem ela, "você não é ninguém", isso não é amor. é dependência emocional. Ao que parece, você desenvolveu com aquela pessoa - pode ser filho, cônjuge ou qualquer outra - um amálgama, uma simbiose, um vínculo doentio. Aquela pessoa tem que viver seus sonhos, ir atrás da vida dela. Uma pessoa é um indivíduo, tem suas próprias metas. Manter alguém junto a você por não poder prescindir de sua companhia é egoísmo puro. Temos de ajudar os outros e ser solidários sim, mas não abdicar de nossas vidas e aspirações. E muitos egoístas que não admitem que os demais vivam suas vidas usam de artimanhas, chantagem emocional e pressão psicológica. Dão a entender que a pessoa que quer ter sua vida é que é egoísta. Vejamos bem uma coisa muito séria: abrir mão de nossas vidas pelos outros assim não fará de nós santos, fará de nós pessoas infelizes. Uma mulher que conheci que passou a maior parte da vida cuidando da avó diz que não valeu a pena. Segundo ela, ao fim de certo tempo, vemos que apenas renunciamos ao direito de ser feliz. Quando a avó morreu, ela sentiu que tinha perdido a parte mais importante da sua vida. Claro que não precisava desamparar a avó, mas ninguém precisa passar sua vida apenas para ser um apoio para os outros. E pensemos no quanto é frustrante para alguém ficar pensando que o tempo só está passando e que ela está vendo a vida passar por uma janela. Do mesmo jeito, podemos falar de filhas que deixam de casar ou de viver para cuidar dos pais. Houve o caso de uma que se enforcou porque os pais sequer queriam que ela namorasse e ela viveu só para cuidar deles. Quando morreram, que ela deve ter sentido? Dá apenas para deduzir - e é impossível dizer com certeza - que ela sentiu que tinha jogado sua vida no lixo e que ela não tinha uma vida própria, mas estava apenas amalgamada à vida dos outros. Por acaso a nossa felicidade é tão sem importância para que a sacrifiquemos assim? Temos de nos arriscar e viver nossas vidas. Obviamente, cometeremos erros. Porém, lembremos de algo: se dizem que não sabemos o que é melhor para nós, isto é verdade. Não o sabemos. E por isto mesmo é que temos de descobrir. Só que, com certeza, podemos dizer que o melhor para uma pessoa não é fazer com que sua vida seja apenas para ser uma muleta dos outros. Vejamos o filme Shirley Valetine, no qual uma dona-de-casa inglesa se sente frustrada ao pensar que tinha deixado de viver seus sonhos para ser apenas a
esposa e mãe. Ao deixar de ser apenas a esposa e mãe para ser novamente Shirley Valentine, ela se sentiu novamente viva, livre e apaixonada pela vida.
Não culpemos as vítimas de bullyingQuando criança, eu ouvi muito que eu sofria bullying porque a culpa era minha, que eu que devia aprender a me defender, me impor e deixar de ser "besta". Hoje, vejo que isso é muito fácil de se dizer e, além de ser fácil, superficial, cruel, insensível e injusto. Falar que a culpa é de quem sofre bullying insinua muitas coisas. Insinua que ela é que provocou a situação, ou seja, que, porque ela é fraca ou do jeito que é, por isso mexem com ela e a agridem. E essa é uma desculpa muito usada pelos agressores. Uma vez, eu vi num programa infantil os agressores de um menino dizerem a ele: "Você é esquisito, não gostamos de gente esquisita." No mangá Limit, Mizuki Konno, uma menina que faz bullying com suas amigas perseguindo uma colega, diz que a outra sofre bullying por ser do jeito que é. E quem me perseguia na escola dizia muito que era eu que os provocava, causava a raiva deles. Um até disse que, se eu parasse de provocá-lo, ele seria meu amigo. Sinceramente, se hoje eu encontrá-lo, não vou querer amizade com ele.Culpar a vítima também exime as autoridades escolares, pais dos agressores e os agressores de qualquer culpa, como se a segurança de uma criança injustamente atacada não fosse responsabilidade dos educadores. Que pai quer pensar que botou seu filho numa escola, esperando que lá ele faça amigos e aprenda, para imaginar que ele está sendo marginalizado por um motivo que talvez só exista na cabeça de quem o agride?Cabe-nos lembrar que quem faz bullying não escolhe aleatoriamente suas vítimas e sempre irá intimidá-las numa situação em que esteja em vantagem.Ninguém vai mexer com uma pessoa agressiva e que saiba se defender, não é? Os praticantes de bullying geralmente também atacam em grupos uma só pessoa. Quem faz bullying é covarde, nunca brigará com alguém sem ter certeza de que sairá vencedor.Escolher por dizer que a culpa é da pessoa agredida é minimizar o problema, transformando-o em algo que só diz respeito a quem faz e sofre bullying. Mas é um problema que diz respeito a todos, principalmente aos pais e professores, que devem entender que já passou o tempo de se dizer que isso é só "besteira de criança."
Superproteção é mutilação
Os pais superprotetores deveriam lembrar que, agindo assim, estão impedindo seus filhos de se desenvolver como seres humanos fortes. Superproteger um filho para que ele não sofra não vai impedi-lo de, no futuro, enfrentar sofrimentos maiores. Tratar filhos como crianças com a justificativa de que eles sempre serão crianças para você é egoísmo e os pais que o fazem fazem porque é cômodo para eles, não porque é o melhor para os filhos. Todo mundo tem de
passar pelas dificuldades da vida e você não pode ficar tratando seu filho como se ele fosse diferente das demais pessoas, tivesse de passar a vida debaixo de uma redoma protetora para não sofrer. Pensemos bem em épocas de guerra ou crises econômicas. Elas atingem todo mundo e as pessoas que sempre viveram com conforto e fartura sofrem mais, pois não são acostumadas a enfrentar dificuldades nem a lutar para sobreviver. Pais, que filhos vocês querem criar para o mundo? Seres fracos e inseguros ou pessoas capazes de vencer as dificuldades e de encontrar seus caminhos? Pensem bem, por favor. Um dia, seus filhos terão de achar seus caminhos sozinhos. Não os impeçam de viver suas vidas.Querem que eles vivam presos a vocês até o dia de vocês morrerem? Por acaso a vida deles irá parar após vocês não estarem mais aqui? Querem um dia carregar a culpa de ter impedido seus filhos de terem vivido suas vidas?
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