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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
ROMPENDO CERCAS, CONSTRUINDO SABERES:
TRABALHO AGROECOLÓGICO, VIVÊNCIAS E (RE)SIGINIFICAÇÕES
NAS RELAÇÕES COM O LUGAR
Leonardo Victor de Sá Pinheiro
NATAL - RN
2019
i
Leonardo Victor de Sá Pinheiro
ROMPENDO CERCAS, CONSTRUINDO SABERES:
TRABALHO AGROECOLÓGICO, VIVÊNCIAS E (RE)SIGINIFICAÇÕES
NAS RELAÇÕES COM O LUGAR
Tese de doutorado apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Psicologia da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, como
requisito parcial à obtenção do título de Doutor
em Psicologia.
Orientador: Prof. Dr. José Queiroz Pinheiro
Coorientadora: Profa. Dra. Fernanda Fernandes Gurgel
NATAL - RN
2019
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes -
CCHLA
Pinheiro, Leonardo Victor de sá. Rompendo cercas, construindo saberes: trabalho agroecológico,
vivência e (re)significações nas relações com o lugar / Leonardo
Victor de Sá Pinheiro. - 2019.
231f.: il.
Tese (doutorado) - Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de
Pós-graduação em Psicologia. Natal, RN, 2019.
Orientador: Prof. Dr. José Queiroz Pinheiro.
Coorientadora: Prof.ª Dr.ª Fernanda Fernandes Gurgel.
1. Agroecologia - Tese. 2. Contexto Rural - Tese. 3. Relação
com o Lugar - Tese. 4. Psicologia Ambiental - Tese. 5. Relação
Pessoa-Ambiente - Tese. I. Pinheiro, José de Queiroz. II. Título.
RN/UF/BS-CCHLA CDU 661.15
ii
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
A tese intitulada “Rompendo cercas, construindo saberes: trabalho agroecológico, vivências e
(re)siginificações nas relações com o lugar”, elaborada por Leonardo Victor de Sá Pinheiro,
foi considerada APROVADA por todos os membros da Banca Examinadora e aceita pelo
Programa de Pós-Graduação em Psicologia, como requisito parcial à obtenção do título de
DOUTOR EM PSICOLOGIA.
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. José de Queiroz Pinheiro
(Orientador/Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN)
Profa. Dra. Fernanda Fernandes Gurgel
(Coorientadora/Faculdade de Ciências da Saúde do Trairi – FACISA/UFRN)
Prof. Dr. Washington José de Sousa
(Membro/Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN)
Prof. Dr. Gustavo Martineli Massola
(Membro/Universidade de São Paulo - USP)
Profª. Dra. Ana Paula Soares da Silva
(Membro/Universidade de São Paulo – USP/RP)
Prof. Dr. Tadeu Mattos Farias
(Membro/Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN)
iii
“Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de
hábito como coisa natural, pois em tempos de desordem
sangrenta, de confusão inconsciente, de humanidade
desumanizada, nada deve parecer natural, nada deve
parecer impossível de mudar”
Bertolt Brecht
iv
Ao meu filho, Miguel, e minha
esposa, Thyciane, pelo carinho e
compreensão das horas roubadas do
convívio de vocês.
v
AGRADECIMENTOS
Sempre achei os agradecimentos uma das partes mais difíceis de se escrever, especialmente
nesta tese. Talvez porque, ao longo desses quatro anos de doutorado, tantas pessoas
maravilhosas fizeram parte dessa trajetória, que corro o sério risco de esquecer alguém. Durante
esse tempo, apesar de saber que não seria fácil, poder contar com elas tornou tudo incrivelmente
mais leve e acolhedor.
Assim, não poderia iniciar meus agradecimentos de outra maneira que não fosse agradecendo
à Deus pela sua importância em toda minha vida. Nos momentos em que conversávamos
baixinho, sabia que, de maneira sublime, sempre estava presente ao meu lado para inspirar e
iluminar meus (des)caminhos. À Ele, meu muito obrigado!
Ao meu filho, Miguel, que no meio do período de doutorado chegou na minha vida para
preenchê-la de descobertas e emoções. Obrigado, filho, por me ensinar tanto e me levar com
você nessa jornada de descobrir o mundo. Essa caminhada ganhou muito mais sentido com
você ao meu lado. Vamos juntos. Sempre!
À minha esposa, Thyciane, por fazer do meu mundo uma vida linda de se viver. Diante de todas
as dificuldades que foram surgindo ao longo desses anos de doutorado, especialmente em
relação aos momentos de cansaço, trocas de fraldas e noites mal dormidas é impossível
descrever o quanto você me dava forças, energia e ajudava a seguir sempre em frente. Te amo!
Ao meu pai, Ernani (in memoriam), e minha mãe, Maria José, pelo amor e incentivo à
curiosidade. Obrigado pelos conselhos, dedicação e por estarem sempre ao meu lado. Por saber
que sempre posso contar e serem os exemplos a quem me inspirar. Com vocês aprendi o que
nenhuma universidade poderia me ensinar.
vi
As minhas irmãs, Eveline (in memoriam), Ana Paula e Cibelli, pelos bons momentos divididos,
pela demonstração de carinho e orgulho de minhas conquistas. Vocês são as melhores amigas
que um irmão poderia ter. Obrigado pela torcida e por se fazerem tão presentes em minha vida.
O amor recebido nos mais simples gestos expressos em sorrisos e abraços me davam impulso
para continuar.
As minhas sobrinhas, Ana Clara e Isabela, pela alegria e carinho com que sempre me recebiam
nas idas à Fortaleza. Estar com vocês era fundamental para “recarregar as baterias”. A gratidão
também se estende ao meu cunhado, Ricardo, pela tranquilidade e paciência de escutar meus
desabafos nas horas de dificuldades.
Além da minha família, agradeço ao Zé, pela serenidade e a forma acolhedora com que me
recebeu como “forasteiro” a desbravar esse novo mundo. Resumi-lo como orientador é pouco,
ainda mais diante de tantas palavras amigas e o imenso carinho com que ouviu e aconselhou
meus momentos de ansiedade e aflição. Obrigado pelo incentivo, confiança e pelo privilégio de
ter recebido sua orientação. Exemplo de sabedoria, pessoa e pesquisador, sua paciência e
compreensão foram fundamentais durante todo esse processo.
Por também fazer parte desta construção, agradeço à Fê, pela amizade, incentivo e apoio com
que acompanhou o desenvolvimento deste trabalho. Obrigado por ser essa pessoa incrível, por
mostrar caminhos e me ajudar a construir “pontes”. Sua disponibilidade e sensibilidade diante
dos desafios que surgiram foram essenciais. A atenção e dedicação ao ler o texto e discutir as
ideias de forma tão apaixonante trouxeram novos rumos e valiosas contribuições.
Também tenho muito a agradecer à Ana Paula, Gustavo, Washington e Tadeu, que aceitaram
fazer parte da banca desta tese. Obrigado pela disposição em ler, comentar e trazer
considerações tão valiosas ao desenvolvimento deste trabalho.
vii
Expresso também meus agradecimentos aos amigos(as) do GEPA (Grupo de Estudos Inter-
Relação Pessoa-Ambiente) - Gleice, Hellen, Claudinha, Dandara, Lorena, Cíntia, Alexandra,
Marina, Luana, Natálya, Luciana, Juliana’s, Larissa, Giselli, Pedro, Daniel, Cecília e July -
pelas reflexões enriquecedoras, pelas risadas descomprometidas e por fazerem parte de forma
tão especial da minha história em Natal. Sem a ajuda de vocês certamente não teria dado conta.
E por falar em amigos, tenho muito a agradecer a cada um dos amigos(as) do GEMI (Grupo de
Estudos Melancia Insurgente) - Raquel, Fernanda, Tadeu, Guilherme e Emerson - por me ajudar
no processo de (des)construção e amadurecimento como pesquisador e ser humano. Obrigado
pelos churrascos repletos de discussões calorosas que poderiam mudar o mundo, caso
lembrássemos delas no dia seguinte. É muito bom poder construir minha história com vocês.
Aos amigos(as) de Fortaleza, Natal e Piauí que, direta ou indiretamente, acompanharam o
processo de construção deste trabalho. Obrigado por estarem presentes nos bons momentos e
por emprestarem os ombros naqueles mais difíceis. A torcida de vocês foi fundamental!
Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Psicologia (PPgPsi), que com seus
conhecimentos transmitidos durante as disciplinas contribuíram de forma relevante para a
elaboração deste estudo. Às coordenadoras do PPgPsi, Izabel e Ilana, por fazerem deste
programa um lugar acolhedor, de afeto e muito orgulho. Também não posso deixar de agradecer
à Lizianne e ao Bruno, que sempre estavam disponíveis na secretaria para as mais variadas
dúvidas e por terem sido tão importantes durante esses anos.
Aos moradores do Assentamento Canto da Ilha de Cima, que gentilmente abriram as portas das
suas casas e me acolheram tão bem. Obrigado pelos ensinamentos, por compartilharem suas
histórias de vida e por terem colaborado de maneira única com a construção dessa tese. A todos
vocês, meu muito obrigado!
viii
Às organizações governamentais e não governamentais que também contribuíram por meio das
informações a respeito das ações Agroecológicas desenvolvidas no estado no Rio Grande do
Norte, em especial na cidade de São Miguel do Gostoso. Obrigado!
Por fim, agradeço à Universidade Federal do Piauí (UFPI) pelo apoio concedido com o
afastamento para qualificação e realização do doutorado. Espero poder retribuir aos alunos e à
instituição os conhecimentos adquiridos durante esses anos.
E foi assim. Das músicas que faziam viajar aos cheiros que permitiam lembrar. Do medo que
fazia chorar à ansiedade que impulsionava o caminhar. Foi cercado de momentos e pessoas tão
especiais que esta tese ganha importância que vai muito além das páginas escritas a seguir.
Foi bom! Foi bom do jeito que foi e do jeito que deveria ser.
Pelo amor e carinho recebido em um dos momentos mais incríveis da minha vida,
À todos(as) vocês, o meu muito, muito obrigado!
ix
Sumário
Resumo ............................................................................................................................... xii
Abstract ............................................................................................................................. xiii
Resumen ............................................................................................................................ xiv
Apresentação ...................................................................................................................... 15
Introdução .......................................................................................................................... 19
1. O que alimentamos quando nos alimentamos? ............................................................. 28
1.1. O veneno nosso de cada dia: a polêmica dos agrotóxicos ........................................................28
1.1.1. Precedentes históricos ..........................................................................................................28
1.1.2. O veneno do campo à mesa: onde vamos parar? ...................................................................36
1.2. A crise agroalimentar e a dinâmica capitalista .........................................................................40
1.3. Agroecologia: uma alternativa em expansão ...........................................................................45
2. A psicologia ambiental e o (vi)ver rural ........................................................................ 51
2.1. Da cidade ao campo: um olhar para as ruralidades ..................................................................51
2.2. A psicologia e o contexto rural ...............................................................................................62
2.3. Psicologia ambiental e ruralidades: uma aproximação em andamento ....................................69
3. As relações das pessoas com os ambientes..................................................................... 72
3.1. A relação com o lugar na Psicologia Ambiental ......................................................................73
3.2. A relação com o lugar em contextos rurais e áreas agrícolas ....................................................82
3.3. O vínculo ao lugar e a relação com a natureza: quem cuida, ama? ...........................................86
4. (Re)colhendo saberes e preparando a bagagem ............................................................ 91
4.1. Descobrindo caminhos: a aproximação do campo ...................................................................92
4.2. São Miguel do Gostoso: “onde o vento faz a curva” ................................................................94
4.3. Caminhando pelo assentamento Canto da Ilha de Cima: um lugar no mundo .........................100
4.4. Objetivos da investigação .....................................................................................................107
5. O caminho ao caminhar ............................................................................................... 111
x
5.1. O olhar de partida .................................................................................................................112
5.2. O processo de construção dos dados .....................................................................................115
5.2.1. Colocando as mãos na terra ...............................................................................................116
5.2.2. A conversa na varanda .......................................................................................................117
5.2.2.1 Com quem o “dedo de prosa” acontece ............................................................................118
5.2.2.2 O rumo da conversa .........................................................................................................119
5.3. Analisando as informações ...................................................................................................120
6. Raízes e trajetórias: descortinando as relações pessoa - ambiente ............................. 123
6.1. Rompendo cercas: por um lugar para chamar de “meu” ........................................................123
6.2. Vivendo na/da terra ..............................................................................................................129
6.3. “Somos todos uma família só” ..............................................................................................135
6.4. O Assentamento e suas distintas territorialidades ..................................................................140
6.5. Natureza como alimento para o corpo e alma ........................................................................145
6.6. Olhares do cotidiano: sociabilidades no lugar .......................................................................149
6.7. Da invisibilidade ao protagonismo feminino no lugar ...........................................................159
6.8. Transformações socioespaciais e a desapropriação do lugar ..................................................166
7. Considerações: caminhos e possibilidades .................................................................. 177
Referências ....................................................................................................................... 186
Apêndice A ....................................................................................................................... 203
Apêndice B ....................................................................................................................... 204
Apêndice C ....................................................................................................................... 206
Apêndice D ....................................................................................................................... 211
Apêndice E ....................................................................................................................... 230
Anexo A ............................................................................................................................ 231
xi
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Sede das 10 maiores empresas de agrotóxicos do mundo. ...................................... 34
Figura 2. Evolução do consumo de fertilizantes no Brasil, 1950 - 2016. ............................... 35
Figura 3. Modelo tripolar de apego ao lugar. ........................................................................ 83
Figura 4. Localização do município de São Miguel do Gostoso/RN. .................................... 95
Figura 5. Prática esportiva de natureza náutica. .................................................................... 96
Figura 6. Parques eólicos no litoral de São Miguel do Gostoso ............................................. 97
Figura 7. Feira livre de São Miguel do Gostoso. ................................................................... 99
Figura 8. Localização do assentamento Canto da Ilha de Cima/RN. ................................... 100
Figura 9. Produtores agroecológicos do assentamento. ....................................................... 103
Figura 10. Sede da associação de mulheres da ‘Vest Gostoso’. ........................................... 105
Figura 11. Mulheres da Associação Vest Gostoso .............................................................. 105
Figura 12. Parques eólicos ao redor do assentamento. ........................................................ 106
Figura 13. Área de plantação convencional. ....................................................................... 141
Figura 14. Área para prática esportiva e festa ..................................................................... 151
Figura 15. Réplica do Marco do Descobrimento. ................................................................ 155
Figura 16. Parque eólico ao redor do Assentamento Canto da Ilha. ..................................... 167
Figura 17. Incêndio no aerogerador da comunidade de Baixinho dos Franças. .................... 170
xii
Resumo
Nas últimas décadas, a utilização indiscriminada de agrotóxicos na produção de alimentos vem
causando crescente preocupação em diversas partes do mundo. Contrapondo-se ao
desenvolvimento hegemônico baseado na monocultura químico-dependente, a agroecologia
estimula o cultivo sem a utilização de substâncias químicas e com base nos princípios da
sustentabilidade, visando uma produção ambientalmente correta, socialmente justa e
economicamente viável. Assim, o padrão produtivo pode definir modificações expressivas no
contexto ambiental, podendo influenciar na relação do agricultor com a terra, tanto em termos
da elaboração de sua história, como na construção de laços identitários e na produção de
subjetividades. Nessa perspectiva, a relação com o lugar pode desempenhar um importante
papel na forma como o produtor rural pode ser emocionalmente ligado à sua terra e à
comunidade à qual pertence, servindo como relevante meio de compreensão das práticas de
cuidado e preservação da natureza. Diante disso, esta pesquisa tem como objetivo geral
investigar a natureza da relação com o lugar, a partir das vivências de produtores agroecológicos
de uma comunidade rural localizada na zoa rural do estado do Rio Grande do Norte. Para isso,
foi adotada uma abordagem qualitativa, de inspiração etnográfica, cujos dados foram
construídos por meio da realização de observação participante e entrevistas semiestruturadas.
O corpus construído foi analisado com base na análise de conteúdo temática, de lógica
interpretativista, utilizando-se o auxílio do software ATLAS.ti. Os resultados do estudo
demonstram diferentes aspectos da relação dos agricultores com o lugar, revelando um vínculo
multidimensional formado por variadas formas de relações dos participantes investigados.
Estes, por sua vez, passaram a ser caracterizados por tipos particulares de apropriações (social,
física, territorial, do trabalho e da natureza), que dependiam das trajetórias de vida, das
alterações no ambiente e das relações socioeconômicas e ambientais estabelecidas. Também
foram observados diferentes posicionamentos nas formas de ser, trabalhar e viver,
impulsionando novas formas de relação e (re)significação do lugar, materializadas no gostar de
morar e no desejo de permanecer morando no lugar. A pesquisa trata o tema além das fronteiras
disciplinares, apresentando a contribuição da Psicologia Ambiental para que novos olhares
sejam lançados na discussão sobre o contexto rural e novas reflexões sejam afloradas para um
desenvolvimento agrícola mais sustentável.
Palavras-chave: Agroecologia; Contexto Rural; Relação com o Lugar; Psicologia Ambiental;
Relação Pessoa-Ambiente.
xiii
Abstract
In recent decades, the indiscriminate use of pesticides in food production has been causing
growing concern in many parts of the world. In opposition to hegemonic development based
on chemical-dependent monoculture, agroecology stimulates the cultivation without the use of
chemical substances and based on the principles of sustainability, aiming at an environmentally
correct, socially just and economically viable production. Thus, the productive pattern can
define significant changes in the environmental context, and may influence the farmer's
relationship with the land, both in terms of the elaboration of its history, as well as in the
construction of identity ties and the production of subjectivities. In this perspective, the
relationship with the place can play an important role in the way the rural producer can be
emotionally connected to his land and the community to which he belongs, serving as a relevant
means of understanding the practices of care and preservation of nature. In view of this, this
research has a general objective to investigate the nature of the relationship with the place, from
the experiences of agroecological producers of a rural community located in the rural zone of
the state of Rio Grande do Norte. For this, a qualitative, ethnographic-inspired approach was
adopted, whose data were constructed through participant observation and semi-structured
interviews. The constructed corpus was analyzed based on the analysis of thematic content, of
interpretative logic, using the aid of the software ATLAS.ti. The results of the study
demonstrate different aspects of the farmers' relationship with the place, revealing a
multidimensional link formed by various forms of relations of the investigated participants.
These, in turn, came to be characterized by particular types of appropriations (social, physical,
territorial, labor and nature), which depended on the life trajectories, changes in the
environment and established socioeconomic and environmental relations. Different positions
were also observed in the ways of being, working and living, impelling new forms of relation
and (re) signification of the place, materialized in liking to live and in the desire to remain living
in the place. The research deals with the theme beyond the disciplinary boundaries, presenting
the contribution of Environmental Psychology so that new perspectives are thrown into the
discussion about the rural context and new reflections are raised towards a more sustainable
agricultural development.
Keywords: Agroecology; Rural Context; Relationship with the Place; Environmental
Psychology; Relationship between Person and Environment.
xiv
Resumen
En las últimas décadas, la utilización indiscriminada de agrotóxicos en la producción de
alimentos viene causando creciente preocupación en diversas partes del mundo. La
agroecología estimula el cultivo sin la utilización de sustancias químicas y con base en los
principios de la sostenibilidad, buscando una producción ambientalmente correcta, socialmente
justa y económicamente viable, contraponiéndose al desarrollo hegemónico basado en el
monocultivo químico dependiente. Así, el patrón productivo puede definir modificaciones
expresivas en el contexto ambiental, pudiendo influenciar en la relación del agricultor con la
tierra, tanto en términos de la elaboración de su historia, como en la construcción de lazos
identitarios y en la producción de subjetividades. En esta perspectiva, la relación con el lugar
puede desempeñar un importante papel en la forma como el productor rural puede ser
emocionalmente ligado a su tierra y a la comunidad a la que pertenece, sirviendo como relevante
medio de comprensión de las prácticas de cuidado y preservación de la naturaleza. En este
sentido, esta investigación tiene como objetivo general investigar la naturaleza de la relación
con el lugar, a partir de las vivencias de productores agroecológicos de una comunidad rural
ubicada en la zoa rural del estado del Rio Grande do Norte. Para ello, se adoptó un enfoque
cualitativo, de inspiración etnográfica, cuyos datos fueron construidos por medio de la
realización de observación participante y entrevistas semiestructuradas. El corpus construido
fue analizado con base en el análisis de contenido temático, de lógica interpretativista,
utilizando la ayuda del software ATLAS.ti. Los resultados del estudio demuestran diferentes
aspectos de la relación de los agricultores con el lugar, revelando un vínculo multidimensional
formado por variadas formas de relaciones de los participantes investigados. Estos, a su vez,
pasaron a ser caracterizados por tipos particulares de apropiaciones (social, física, territorial,
del trabajo y de la naturaleza), que dependían de las trayectorias de vida, de las alteraciones en
el ambiente y de las relaciones socioeconómicas y ambientales establecidas. También se
observaron diferentes posicionamientos en las formas de ser, trabajar y vivir, impulsando
nuevas formas de relación y (re)significación del lugar, materializadas en el gusto de vivir y en
el deseo de permanecer viviendo en el lugar. La investigación trata el tema más allá de las
fronteras disciplinarias, presentando la contribución de la Psicología Ambiental para que
nuevas miradas sean lanzadas en la discusión sobre el contexto rural y nuevas reflexiones sean
afloradas para un desarrollo agrícola más sostenible.
Palabras clave: Agroecología; Contexto rural; Relación con el lugar; Psicología Ambiental;
Relación Persona-Ambiente.
15
Apresentação
Potencialmente, a elaboração desta apresentação me faz pensar o quão se faz importante
uma reflexão das ações que motivaram a trajetória deste trabalho, além de guiar os desafios que
ainda estão por vir após o doutorado. Esta tese nasce e se desenvolve diante de um contínuo
processo de (des)construção, nascendo também, durante o seu desdobramento, um novo aluno,
professor, pesquisador, marido, pai e, porque não, um novo ser humano. Em meio a tantas
mudanças ocorridas nesses quatro anos, poder falar sobre os caminhos, contratempos, tropeços
e erguidas que fazem parte desta caminhada é, sem dúvida, uma oportunidade fascinante.
Recordar o passado não é algo simples, mesmo que não esteja lá tão distante. Ao trazer
de volta algumas lembranças, me dou conta que a curiosidade pelas questões ambientais entrou
na minha vida ainda durante a graduação em Administração, como bolsista de iniciação
científica, ao investigar as práticas socioambientais das indústrias do estado do Ceará. Além
disso, durante esse período, também tive a oportunidade de trabalhar em uma multinacional,
sendo um dos responsáveis pelo processo de treinamento e certificação ambiental ISO 14.001.
Ao relembrar tais fatos que ficaram guardados, percebo que foi através dessas experiências
vividas que a curiosidade e o interesse pelas relações humano-ambientais começaram a surgir.
Apesar disso, foi somente durante o mestrado em Administração que a Psicologia
Ambiental (PA) entrou na minha vida. Dentre as publicações utilizadas como referência para a
construção da dissertação, os artigos do, até então distante, professor Dr. José Pinheiro (Zé),
constituía boa parte delas. Na ocasião, investiguei o comportamento ecológico de futuros
gestores e a forma como a educação ambiental era inserida (quando era) nos cursos de
Administração. Para isso, adotei uma perspectiva essencialmente positivista, visando
contemplar o que, naquela época, me parecia o bastante.
16
Com o término do mestrado, a maturidade e experiência como professor despertou o
desejo em aprender novas formas de viver e experienciar a pesquisa científica, me fazendo
romper algumas barreiras pessoais e institucionais à procura de novos conhecimentos. Resolver
desbravar novos caminhos ao cursar o doutorado na área de Psicologia, e aprofundar os
conhecimentos em PA, seria um dos meus grandes desafios.
Para isso, navegar por territórios movediços foi preciso, mas não foi fácil, confesso! Por
vezes me encontrei/encontro permeado por questionamentos e conflitos paradigmáticos, crises
onto-epistemológicas e indecisões teóricas que ainda não sei ao certo quando (ou se um dia)
vou conseguir superar. Mas, afinal, também não é para isso que se objetiva uma formação de
doutorado? Poder entender que as certezas que nos acompanharam durante anos podem ser
revistas, atualizadas, transformadas e, quem sabe, rejeitadas. Por que não?
Os caminhos dessas reflexões levam, portanto, ao contexto de desenvolvimento deste
trabalho, que assume uma imensa diversidade de configurações na medida em que diferentes
saberes vão sendo descortinados. Ao ser provocado e instigado a analisar à questão alimentar
pelas lentes da PA, resolvo iniciar esse estudo com o direcionamento voltado para as empresas
e os consumidores de alimentos orgânicos. Por ser consumidor desse tipo de alimento,
acreditava, até então, que entender esse mercado promissor poderia ser a minha contribuição.
Nada mais natural, afinal, para um administrador formado pelos princípios de que o lucro é a
mola propulsora que movimenta e alimenta (nas suas mais variadas concepções) o mundo.
Por sorte, após as primeiras investidas teóricas e de campo, percebo que continuava a
olhar meu universo de pesquisa com as mesmas “lentes” de antes, tendo trocado somente a
“armação”. Por mais que eu mudasse de área e quisesse sair da tão conhecida “zona de
conforto”, ela, de alguma forma, ainda continuava lá. Assim, enquanto procurava motivos que
17
justificassem as razões da minha escolha, algumas inquietações se faziam cada vez mais
presentes, aumentando à medida em que aprofundava as leituras sobre o tema.
Em meio aos desconfortos encontrados, a forma “romantizada” e superficial de como
alguns estudos abordam os agricultores que transitam do cultivo convencional para o
agroecológico conduz para o entendimento de uma, quase que automática, consciência
ambiental. Somado a isso, o processo de “gourmetização” desse tipo de alimento acaba
priorizando a perspectiva do consumidor em detrimento do produtor, que perde cada vez mais
espaço nessas discussões.
Outro aspecto relevante que motivou a escrever esta tese é a “onda” de obras,
principalmente internacionais, sobre a relação das pessoas com os lugares. Quase sempre
abordada com moradores de áreas urbanas e através de perspectivas positivistas, a literatura da
área pouco tem investigado as populações rurais, suas particularidades e as implicações que o
trabalho pode acarretar na vinculação com o ambiente. Nesse sentido, tais provocações me
instigavam novas reflexões, que foram disparadoras e determinantes para a realização deste
estudo.
Ao permanecer por um período de alguns meses explorando a literatura que abordava,
mesmo que tangencialmente, essas questões, pude observar uma riqueza muito grande de
práticas em torno da agroecologia e da relação pessoa-ambiente que não poderiam ser deixadas
de lado. Assim, com o objetivo de “dar voz” a esses agricultores, protagonistas das suas próprias
histórias, resolvi investigar em maior profundidade como a transição para o cultivo
agroecológico pode se relacionar com o processo de (re)significação do lugar, influenciando a
forma como esses produtores realmente percebem e vivem no (e com o) ambiente.
Ao me deparar com uma realidade completamente nova, procuro “costurar” os
elementos que fazem sentido na construção desse tecido social, em que a relação, ou mais
18
precisamente a interação com o lugar se faz de fundamental relevância. Nesse contexto, a
análise das interações pessoa-ambiente aparece como uma espécie de “agulha” que costura o
“tecido” composto pelas relações voltadas ao trabalho agroecológico e o lugar. Sendo assim,
esta pesquisa vai se desenvolvendo e criando novos direcionamentos, cheiros, formas, cores e
sabores à medida que as conexões são costuradas em uma nova perspectiva de compreensão e
entendimento.
Diante do exposto, é nesse percurso de contínua transformação que acredito que a
realização deste estudo ocupa um importante lugar na contribuição dos estudos da Psicologia
Ambiental. Para isso, nos próximos capítulos, apresento uma análise das teorias e das narrativas
que coleto durante minha inserção no campo.
Neste momento, minha procura no percurso dessa trajetória, reconhecendo mundos que
nasciam a cada fase vivida, fazem entender os variados desafios vividos e, claro, os que ainda
estão por vir.
Boa Leitura!
19
Introdução
Há tempos que a forma de cultivo dos alimentos deixou de ser vista como processo de
interesse apenas do agricultor. Ao contrário, sua importância tem se mostrado cada vez mais
em evidência, sendo refletida no aumento da abordagem sobre os problemas associados à
produção, consumo, saúde e meio ambiente. Considerada uma das formas mais antigas de
intervenção do ser humano na natureza, os problemas relacionados à agricultura estão cada vez
mais em destaque nas discussões políticas, acadêmicas e corporativas, deixando de ser do
interesse apenas de agrônomos e ecologistas e ganhando espaço de discussão entre governos,
organizações e sociedade.
Nas últimas décadas, a utilização indiscriminada de agrotóxicos na produção de
alimentos vem causando crescente preocupação em diversas partes do mundo. A crítica ao
desenvolvimento hegemônico baseado na agricultura químico-dependente aumenta à medida
que pesquisas e informações demonstram efeitos nocivos da utilização de agrotóxicos à saúde
humana e ao ambiente, tratando, portanto, esses problemas como temas importantes a serem
investigados.
Contrapondo-se ao modelo de produção agrícola dominante e na tentativa de resgatar
um tempo em que ainda era possível ter à mesa alimentos naturais e de boa qualidade, um novo
mercado é impulsionado pela crescente demanda de consumidores que procuram alternativas
para uma alimentação mais saudável, sem agredir a natureza. Mostrando-se cada vez mais
estratégico e promissor, o cultivo agroecológico estimula a plantação sem a utilização de
agrotóxicos e com base nos princípios da sustentabilidade, visando uma produção
ambientalmente correta, socialmente justa e economicamente viável. Observa-se assim,
conforme Leff (2009), “uma forma de sobrevivência do passado no presente, a construção de
20
novas identidades e a construção de novas utopias que reorientam o mundo para alternativas
futuras” (p. 343).
É indiscutível que a sobrevivência humana está diretamente relacionada com meio
ambiente natural, fazendo-se necessário um equilíbrio entre a produção de alimentos, o
consumo e a capacidade de renovação da natureza. Esse equilíbrio, aparentemente óbvio, nem
sempre parece ser compreendido e traduzido em ações voltadas à conservação dos recursos
naturais, sendo ainda um desafio para os que estudam e/ou almejam uma agricultura mais
sustentável.
Atualmente, o Brasil ocupa a indesejável posição de maior consumidor de agrotóxicos
do mundo, ultrapassando a marca de 1 milhão de toneladas por ano, o que equivale a um
consumo médio de mais de 5 kg de veneno agrícola por habitante (INCA, 2015).
Paradoxalmente, ao mesmo tempo em que é o país que mais utiliza agrotóxicos em sua
plantação (Carneiro, Augusto, Rigotto, Friedrich, & Búrigo, 2015), revela-se como o país mais
promissor do mundo no cultivo agroecológico, tendo em vista a diversidade geográfica,
ambiental e climática das suas regiões. Essa dicotomia propõe uma reflexão sobre o conflito de
interesses existente entre as organizações produtoras e fornecedoras de substâncias químicas e
os impactos provocados à sociedade que, ao produzir e consumir alimentos contaminados,
caminham para um futuro incerto e nebuloso. Nessa perspectiva, Carson (1962/2010) enfatiza
que “pela primeira vez na história do mundo, agora todo ser humano está sujeito ao contato
com substâncias químicas perigosas, desde o instante em que é concebido até sua morte” (p.
29).
Ao buscar romper com bloqueios impostos pelo regime de cultivo hegemônico, a
agroecologia surge, portanto, como uma proposta alternativa para minimizar os problemas
ocasionados pela modernização da agricultura, buscando, dentre outras coisas, denunciar os
21
efeitos do agronegócio e conquistar uma maior autonomia dos agricultores. Para Zamberlam e
Froncheti (2012) “a questão agroecológica nos coloca novos desafios na relação, na inter-
relação e na dialogação não só entre o homem e a natureza, mas com todas as coisas existentes”
(p. 7). Ainda de acordo com os autores, é notório que o sistema sócio-econômico-político ligado
ao modo de produção capitalista da atualidade, ao predominar o modelo industrial de produção
agrícola e de desenvolvimento sustentável, é um dos principais responsáveis pela crise
socioambiental da agricultura, estendendo seus efeitos tanto para o campo como para as
cidades.
Desse modo, Castro Neto, Denusi, Rinaldi e Staduto (2010) acreditam que “as mudanças
exigidas para a preservação do meio ambiente relacionadas à produção agrícola deverão
privilegiar as relações do homem com o campo e o meio ambiente, trazendo benefícios à
comunidade rural” (p. 75). Diante da crescente necessidade de produção de alimentos, a
agricultura tem se mostrado um fator importante na modificação desses espaços naturais, tendo
o trabalhador rural um papel fundamental nessa transformação.
Nessa perspectiva, Fluck e Brandenburg (2016) e Fonini (2012) investigaram como a
introdução de um sistema agroecológico de cultivo influenciou na transformação das relações
com o ambiente e entre os habitantes de uma comunidade quilombola, destacando a relação
com a natureza, as práticas de conservação e preservação ambiental, bem como a contribuição
para um processo de ressignificação do rural. Os autores identificaram que os agricultores
passaram a ocupar papel central na constituição de um rural socioambiental, destacando uma
maior autonomia no papel das mulheres e uma ligação mais profunda nas relações humano-
ambientais.
Segundo Leite e Dimenstein (2013), esses atores sociais apresentam importante relação
com a terra, tanto em termos da elaboração de sua história - vivendo e trabalhando - como na
22
construção de laços identitários e na produção de subjetividades. Através do modelo
hegemônico de produção, a agricultura moderna passa a ser diretamente ligada aos problemas
ambientais, sendo seus agricultores conhecidos por serem poluidores significativos do ambiente
(Michel-Guillou & Moser, 2006). Tendo em vista a particular relação com a natureza e o papel
social da profissão, esses agricultores são alvos de múltiplas pressões internas e externas, o que
leva alguns a adotarem práticas de comportamentos pró-ecológicos na produção (Jollivet,
2001). Observa-se, assim, que o padrão produtivo pode definir modificações expressivas no
lugar de cultivo, influenciando na relação do agricultor com o ambiente.
De forma específica, o contexto rural pode apresentar particularidades ainda maiores no
entendimento dessa relação. Saforcada (2015, p. 45) afirma que “os seres humanos do ambiente
rural e do ambiente urbano percebem o tempo de forma diferente, possuem uma cosmovisão
diferente, possuem uma relação com a natureza diferente”. Assim, ao ser considerado como um
espaço plural, constituído por um processo dinâmico de constante reestruturação, o ambiente
rural passa a absorver diferentes modos de identificação e de afiliação com o território. Destaca-
se, segundo Wanderley (2001), a necessidade de se investigar os valores e as práticas sociais
da população rural, uma vez que estes podem intensificar ainda mais o sentimento de
pertencimento a um lugar e de identidade territorial.
O vínculo do agricultor com o campo foi abordado por Kunert (2012) ao enfatizar que
a relação com o lugar pode ser ainda mais forte em áreas agrícolas, já que estas funcionam como
um componente econômico e social integral para uma comunidade local, sendo, desse modo,
importante o laço e a fixação do homem à terra. Para o autor, tal relação é abordada como uma
espécie de apego ao lugar, que, por sua vez, pode “desempenhar um importante papel na forma
como o agricultor pode ser emocionalmente ligado à sua terra e à comunidade a que pertence”
(Kunert, 2012, p. 22). Nesse aspecto, Burholt e Naylor (2005) acreditam que a taxonomia do
23
apego ao lugar proporciona uma estrutura flexível para a diferenciação pela comunidade,
desempenhando, portanto, um papel relevante na auto-identidade e servindo como fonte vital
de significado emocional e experiencial do indivíduo.
Apesar do crescente interesse de pesquisas que investigam o vínculo ao lugar, ainda são
poucos os estudos que analisam essa ligação em contextos rurais (Raymond, Brown, & Weber,
2010; Takashi & Selfa, 2015; Walker & Ryan, 2008) e procuram compreender sua influência
no cuidado de conservação e prática agrícola (Gosling & Williams, 2010; Lokocz, Ryan, &
Sadler, 2011; Morgan et al., 2015; Mullendore, Ulrich-Schad, & Prokopy, 2015; Vaske &
Kobrin, 2001), não apresentando, portanto, esta associação de forma nítida e bem definida
(Lincoln & Ardoin, 2015; Scannell & Gifford, 2010b).
Embora haja poucas pesquisas que investiguem especificamente a perspectiva de
agricultores agroecológicos e sua relação com o lugar, estudos empíricos sugerem que os
vínculos relacionados ao lugar como, por exemplo, identidade, sentido e apego ao lugar, estão
envolvidos de alguma forma com práticas agrícolas sustentáveis, preservação e cuidado
ambiental (Anderson, Williams, & Ford, 2013; Lincoln & Ardoin, 2015). De acordo com
Lincoln e Ardoin (2015), as investigações existentes abordaram apenas tangencialmente as
práticas ambientais e socialmente benéficas realizadas pelos agricultores e a relação com o
lugar. Nesse sentido, a agricultura pode, portanto, “envolver uma complexa interface entre as
influências particulares, sociais, financeiras e ambientais” (Morgan, Hine, Bhullar, & Loi,
2015, p. 36), resultando em um conjunto único de desafios.
As pesquisas que investigam a relação das pessoas com os lugares adotam muitas vezes
um caráter estrutural, “negligenciando a natureza dinâmica dessas relações ao longo do tempo”
(Bailey, Devine-Wright & Batel, 2016, p.200). Assim, ao considerar que a forma de inserção
na relação com a terra pode ser diversificada (Leite, 2015), conhecer essas relações pode
24
proporcionar subsídios para entender as cognições e afetos dos produtores agroecológicos com
o campo e a natureza, que, direta e indiretamente, orientam suas práticas cotidianas, além de
poder contribuir para a elaboração de propostas para um desenvolvimento rural e agrícola mais
sustentável.
O presente estudo contribui para uma literatura emergente dentro da Psicologia
Ambiental (PA), investigando as múltiplas relações estabelecidas com o lugar, o contexto rural,
as formas de cultivo agrícola e os significados atribuídos ao uso da terra (Anderson, Williams,
& Ford, 2013; Lincoln & Ardoin, 2015). Somado a isso, diante da sua tradição de ciência e
profissão eminentemente urbana, procura-se também pluralizar o debate em torno de uma
Psicologia voltada para o contexto rural, uma vez que a área se volta quase que exclusivamente
para as grandes cidades (Landini, 2015). Da mesma forma, a Psicologia Ambiental (PA)
também se apresenta de maneira tímida nas reflexões e debates em relação ao meio rural, sendo
esse contexto ainda pouco explorado em seus estudos (Méndez, 2015).
No intuito de não reforçar o privilégio dado a temas do urbano em detrimento do rural,
faz-se necessária a realização de mais pesquisas e informações que comtemplem as
particularidades da agricultora familiar rural e sua relação com o ambiente, principalmente
diante das problemáticas da atualidade como, por exemplo, segurança alimentar, crise hídrica,
mudanças climáticas, transgenia, dentre outras. Ademais, a PA também pode contribuir para a
investigação das formas como esses trabalhadores compreendem, sentem e vivenciam as
questões ambientais (Itelson, Proshansky, Rivlin, & Winkel, 1974), introduzindo abordagens
que permitam direcionar para uma melhor compreensão da relação pessoa-ambiente.
Ao entender que as relações sociais e as subjetividades deixam de ser consideradas como
externalidades na construção de um novo contexto rural (Cruz-Souza, 2011), a PA procura se
aproximar, cada vez mais, desse campo de investigação, que apresenta particularidades e
25
saberes diferenciados do contexto urbano. No intuito de promover novos debates sobre as
relações pessoa-ambiente e as questões relacionadas à multidisciplinaridade da Agroecologia,
Bassani, Silveira e Ferraz (2006) propõem introduzir alguns temas da área nessas discussões,
tais como: percepção ambiental e apropriação do espaço. Segundo os autores, ao se sugerir
intervenções nas propriedades rurais, é importante analisar a estrutura familiar, a história de
ações/transformações nesta propriedade, as relações com os próximos
(vizinhança/comunidade), o apego ao lugar e a identidade construída pelos agricultores e suas
famílias.
Diante das transformações ocorridas no ambiente rural nas últimas décadas, cabe
questionar, como faz Brandemburg (2010, p.424), “qual a sociabilidade do rural reconstruído e
que relações emergem entre agricultores-natureza”? Ainda nesse direcionamento, diante da
proposição de alternativas produtivas para um novo rural, Silva e Tassara (2014) também
argumentam, de forma mais específica, que a PA passa a ser provocada a responder, dentre
outras questões, como agricultores “se implicam na contestação (ou na submissão) ao modelo
hegemônico global da relação ser humano – ambiente natural?” (p. 329). Tais questionamentos
originaram, em parte, o direcionamento desta pesquisa, que objetiva investigar a natureza da
relação com o lugar, a partir das vivências de produtores agroecológicos de uma comunidade
rural.
Com base na revisão da literatura, constatou-se que os estudos envolvendo os diferentes
modelos de produção agrícola e PA ainda são escassos, sendo reduzida a quantidade de
publicações sobre o tema. Grande parte das pesquisas nessa área estão concentradas em países
da América do Norte, Europa e Oceania, o que leva a crer que este é um campo vasto de
conhecimento no Brasil, considerando toda a diversidade cultural, social e geográfica do país.
Além disso, também são poucas as pesquisas que investigam a relação com o lugar dos
26
produtores rurais de alimentos agroecológicos, denotando, mais uma vez, a existência de
lacunas e a falta de um maior aprofundamento de estudos na área. A realização do presente
estudo possibilitará tratar esse tema além das fronteiras disciplinares, apresentando a
contribuição da PA para que novos olhares sejam lançados na discussão sobre a problemática
investigada.
Além desta seção introdutória, este trabalho está dividido em 7 capítulos, conforme
discriminado no sumário. No capítulo 1, realizo uma contextualização geral sobre o processo
histórico-político-cultural de modernização da agricultura, abordando, internacional e
nacionalmente, o estímulo à monocultura e a utilização de sementes transgênicas, bem como os
impactos sociais, econômicos e ambientais provocados. Em seguida, abordo como o
capitalismo e o imperialismo ecológico exercido pelas multinacionais estão presentes nas
diversas faces da crise agroalimentar, suas influências e consequências para a população do
campo e da cidade. Adicionalmente, é apresentado o processo de cultivo agroecológico, seus
desafios e perspectivas como uma das alternativas contra - hegemônicas ao modelo de produção
até então vigente.
No capítulo 2, abordo sobre o contexto rural brasileiro, a dicotomia campo-cidade, suas
particularidades e as distintas perspectivas de ruralidades. Posteriormente, contextualizo sobre
o caráter elitista, urbano e capitalista presente no nascimento e desenvolvimento da Psicologia,
abordando as principais razões que levaram ao distanciamento da área com o contexto rural. De
forma mais específica, também trato como a Psicologia Ambiental têm contribuído para os
estudos do meio rural, apresentando algumas contribuições já realizadas pela área. Quanto ao
capítulo 3, o foco é a discussão acerca do arcabouço teórico sobre a relação das pessoas com os
lugares, momento em que apresento as diferentes abordagens dos estudos sobre o tema, suas
definições e características. Em seguida, comento os estudos que fazem referência ao vínculo
27
com o lugar, seus impactos e consequências no comportamento em relação à natureza, assim
como a relação com o lugar em contextos rurais e áreas agrícolas.
No capítulo 4, trato do processo de escolha e aproximação do campo de pesquisa,
considerando as características histórico-geográficas, os aspectos econômicos, sociais e
ambientais do contexto analisado. Os objetivos (geral e específicos) também são apresentados
neste capítulo, bem como as questões de pesquisa que nortearam o desenvolvimento do estudo.
Quanto ao capítulo 5, este se refere à perspectiva epistemológica que serviu como fonte
inspiradora para a escolha dos procedimentos metodológicos, construção e análise dos dados,
que também são descritos nessa parte.
O capítulo 6 é composto pela apresentação e discussão dos principais achados da
pesquisa. Por fim, o capítulo 7 apresenta as considerações finais, contendo as contribuições que
foram encontradas no estudo, limitações e sugestões para pesquisas futuras.
28
1. O que alimentamos quando nos alimentamos?
O pensamento que criou a crise não
pode ser o mesmo que nos vai tirar
da crise, tem que ser outro.
(Albert Einstein)
Pensar em agricultura é pensar, em primeiro lugar, em sobrevivência. A necessidade vital
do alimento faz com que diversas características multidimensionais estejam associadas à sua
relação de produção e consumo, podendo ser compreendida, inclusive, como uma parte do
ambiente que durante a sua ingestão é incorporado ao corpo. Diante da sua relevância, compete,
então, no presente capítulo abordar o atual sistema agrícola dominante baseado na agricultura
químico-dependente, destacando o estímulo histórico à utilização de agrotóxicos e os impactos
sociais, econômicos e ambientais provocados à saúde humana e à natureza. Em seguida, será
tratado como o capitalismo e o imperialismo ecológico exercido pelas multinacionais estão
presentes nas diversas faces da crise agroalimentar, provocando impactos tanto no campo como
nas cidades. Por fim, será apresentado o processo de cultivo agroecológico, seus desafios e
perspectivas como uma das alternativas contra-hegemônica ao modelo de produção até então
vigente.
1.1. O veneno nosso de cada dia: a polêmica dos agrotóxicos
1.1.1. Precedentes históricos
A busca do ser humano por diferentes formas de cultivo agrícola vem sendo abordada
em diferentes momentos da história da humanidade. Considerada como um elemento de ruptura
para o surgimento de novas civilizações, o desenvolvimento da agricultura está fortemente
29
atrelado às diferentes formas de relacionamento do indivíduo com a natureza, exercendo grande
influência nas organizações sociais, políticas, econômicas e religiosas.
Ao estar intimamente ligada ao crescimento e desenvolvimento da humanidade desde
os primórdios da civilização humana, as formas de agricultura passaram a ter que se adaptar,
cada vez mais, às demandas da sociedade, o que impulsionou o surgimento das mais variadas
técnicas de cultivo. Nesse percurso, a agricultura passa a ser apropriada não somente para
subsistência, mas também como atividade produtiva do ser humano ao longo da construção da
sua história. Com isso, ainda que as civilizações maias, astecas e incas desenvolvessem suas
próprias técnicas agrícolas, já consideradas avançadas para a época, influenciando o surgimento
de diversas outras, foi por meio da utilização de agrotóxicos que o atual modelo de produção
dominante seguiu seu caminho.
Implantado pela indústria bélica e disseminado globalmente após a Segunda Guerra
Mundial, o uso de substâncias químicas nas lavouras é acompanhado pelo processo de
modernização da agricultura em diversas partes do mundo. Tendo seu ápice conhecido como
“Revolução Verde”, modelo caracterizado pelo uso intensivo de agrotóxicos e fertilizantes
sintéticos (herbicidas, fungicidas e inseticidas), a disseminação dos conhecimentos da química
agrícola passou a considerar desnecessário seguir o ritmo da natureza em prol dos interesses do
capital.
Após o fim da Segunda Guerra Mundial, indústrias químicas que abasteciam a indústria
bélica e empresas privadas ligadas ao ramo de petróleo e carros, como a Rockfeller e a Ford,
viram na agricultura uma boa oportunidade de reprodução do capital, diversificando seus
produtos ao investirem em técnicas de melhoramento genético de sementes e na construção e
adoção de maquinário pesado (tratores e colheitadeiras), que deveriam ser utilizados nas mais
diversas etapas da produção agrícola. Além desses fatores técnicos, intencionalmente
30
interligadas ao processo histórico mundial, variáveis sociais, políticas e econômicas também
estão relacionadas ao desenvolvimento e crescimento da Revolução Verde no mundo (Andrades
& Ganimi, 2007).
Para que se tenha uma ideia aproximada, no pós-guerra, o mundo se viu em um período
de tensões marcado pela bipolaridade da então conhecida Guerra Fria, na qual duas
superpotências - União Soviética e Estados Unidos - disputavam, ideológica e economicamente,
a soberania mundial. Diante deste cenário geopolítico conflituoso, a implantação da Revolução
Verde ganha ainda mais força, sendo estabelecida com o discurso ideológico de solucionar a
fome no mundo e sob o forte argumento de atender às demandas alimentares da sociedade
urbana, cada vez mais crescente (Albergoni & Pelaez, 2007; Andrades & Ganimi, 2007). Nesse
aspecto, Rosa (1998) destaca que nesse período “o problema da fome tornava-se cada vez mais
sério em diversas partes do mundo, e o governo americano e os grandes capitalistas temiam que
se tornasse elemento decisivo nas tensões sociais existentes em muitos países” (p. 19).
Desta maneira, tal “revolução” ganhava ainda mais espaço na discussão mundial,
estimulando fortemente o modo de produção baseado na monocultura, que preconiza o uso
intensivo de substâncias químicas, além de maximizar a produtividade e o lucro. Também
considerado como uma forma de penetração do capitalismo no campo, a Revolução Verde ficou
caracterizada pela geração e avanço da tecnologia na agricultura, sistematizado por meio dos
conhecidos pacotes tecnológicos, que criava uma relação de maior dependência para o
agricultor, obrigado a adquirir tais pacotes por intermédio das empresas transnacionais.
De fato, verificou-se um aumento considerável na produção de alimentos (Assis &
Romeiro, 2002; Nodari & Guerra, 2015). Entretanto, com o passar dos anos, foi observado que
tais medidas adotadas não conseguiram superar a fome no mundo, que se agravava
simultaneamente ao aumento da produtividade dos cultivos (Zamberlam & Fronchet, 2012).
31
Nessa perspectiva, Porto-Gonçalves (2015) argumenta que o problema da fome não é uma
consequência da escassez de alimentos no mundo, mas do modo como esses alimentos são
produzidos no sistema criado, uma vez que a monocultura pode ser considerada uma forma de
negação de todo o legado histórico da humanidade na medida em que não visa alimentar quem
produz, e sim à mercantilização do que é produzido. Tal disparidade de interesses também é
apontada por Andrades e Ganimi (2007) ao acreditarem que “existe oferta de alimentos nas
prateleiras dos supermercados, mas as pessoas não têm recursos para adquirirem” (p. 47).
No Brasil, a modernização da agricultura por meio da Revolução Verde ocorreu
principalmente durante as décadas de 1950 e 1960, predominando a discussão de duas visões
distintas para o aumento da produção de alimentos no país: uma que defendia o crescimento da
produtividade por meio da Reforma Agrária, pois, assim mais agricultores teriam terras para
produzir, evitando-se o êxodo rural e a concentração de terras nas mãos de grandes empresários;
e outra visão que acreditava que, para o aumento da produtividade, era necessário a compra dos
pacotes tecnológicos pelos agricultores, deixando, neste caso, de lado o problema fundiário
(Zamberlam & Fronchet, 2012). Sem nenhuma surpresa, foi mantida a visão de manter a
estrutura latifundiária no país, tendo sido, para tanto, adotada uma série de estratégias que
visava implantar os pacotes tecnológicos da Revolução Verde no meio rural brasileiro,
conforme apontam Zamberlam e Fronchet (2012, p. 40-41):
Envio de professores, técnicos e pesquisadores para o exterior a fim de serem treinados, e vinda de técnicos de centros internacionais para efetuarem treinamentos
no Brasil;
Estruturação da pesquisa agropecuária pública, onde eram testadas as inovações e novos produtos do pacote tecnológico da indústria multinacional;
Atração de empresas transnacionais para o Brasil a fim de produzirem insumos (químicos), máquinas e equipamentos, e de indústrias processadoras de matérias-
primas agrícolas. Neste período chegaram a Ford, Shell, Ciba-Geigy, ICI, Unilever,
DuPont, Bayer, Basf, Stauffer, Dow Química, Pfizer, Union Carbide, Hoeschst,
Monsanto, Rhodia, entre outras;
Estímulo ao surgimento do cooperativismo empresarial, com o apoio de recursos públicos para reunir os agricultores e motivá-los às novas práticas do pacote
32
tecnológico da Revolução Verde no uso de sementes híbridas, fertilizantes
sintéticos e os agrotóxicos;
Condicionamento de crédito destinado à monocultura, para aquisição de máquinas, adubos sintéticos e agrotóxicos;
Direcionamento dos currículos universitários e das escolas agrícolas na formação de agrônomos, veterinários, zootecnistas, engenheiros florestais, técnicos agrícolas
e extensionistas com o enfoque da Revolução Verde.
Tais atitudes acarretaram profundas mudanças no território nacional, que, ao contar com
o apoio do Estado, contribuíram para a união da indústria e agricultura na formação de novas
fronteiras agrícolas no país. Não obstante, a partir das décadas de 1970 e 1980, esse modelo
produtivo passou a apresentar sinais de esgotamento, especialmente diante dos limites de
crescimento da indústria de insumos químicos e os impactos ambientais provenientes do uso
dessas substâncias, em especial os agrotóxicos. Assim, começaram a surgir as primeiras
manifestações de cunho ecológico, contestando-se o padrão estabelecido pela lógica da
Revolução Verde e os subsídios das políticas governamentais promovidas pelo Estado
(Albergoni & Pelaez, 2007).
Tal modelo hegemônico de produção agrícola é considerado como uma das atividades
mais impactantes sobre o meio ambiente, provocando profundas consequências no espaço
geográfico mundial e brasileiro. Como decorrências desse processo de modernização da
agricultura, algumas implicações sociais e ambientais foram percebidas, iniciando-se uma série
de questionamentos que colocaram em destaque a fragilidade do modelo agrícola convencional,
enfatizando seu caráter incerto e nebuloso.
Dentre as principais consequências da implementação da Revolução Verde, pode-se
destacar: a mecanização do trabalho e a ampliação da exclusão e das desigualdades sociais; o
alto impacto sobre o meio ambiente por meio da contaminação do solo, ar e água; os efeitos
nocivos à saúde da população por contaminação e envenenamento; a extinção de espécies tanto
animais quanto vegetais; a diminuição das exportações para os países desenvolvidos em razão
33
das barreiras ambientais impostas ao uso de pesticidas; impactos socioculturais associados a
deterioração das relações sociais e de trabalho por meio do êxodo rural; intoxicações;
intensificação da exploração da mão-de-obra no campo, dentre outras (Andrades & Ganimi,
2007; Nodari & Guerra, 2015; Zamberlam & Fronchet, 2012). Diante de tais transformações,
Bauer e Mesquita (2008) acreditam que:
É possível afirmar que a “Revolução Verde” foi uma revolução silenciosa que
introduziu, no universo da agricultura familiar, uma nova realidade social, com a
substituição de parte do conhecimento tradicional por um científico e instrumental,
que até então não se legitimara, por falta de condições objetivas. De um lado, havia
convergência de interesses por parte dos agentes. De outro, instrumentos adequados
para a sua instituição (tecnologia, crédito e assistência técnica). Os agricultores, no
entanto, pareciam não perceber os impactos sociais e culturais que essa revolução
trazia. (p. 29)
Por mais silenciosa que essa revolução possa ter sido, não deixou de ser intensa,
especialmente para os produtores da agricultura familiar. A despeito dos impactos acarretados,
as empresas do ramo químico-farmacêutico viram na exploração comercial da biotecnologia,
baseada na utilização da engenharia genética, a oportunidade de superar os limites impostos
pela Revolução Verde.
O desenvolvimento de organismos geneticamente modificados (OGM) possibilitou a
expansão do capital das empresas do ramo agroquímico, que passaram a desenvolver sementes
ainda mais resistentes aos pesticidas já utilizados. As principais empresas de agrotóxicos do
mundo (Figura 1) representam, aproximadamente, 90% do mercado mundial e possuem como
uma das suas atividades, por “coincidência”, a produção de sementes.
34
Figura 1. Sede das 10 maiores empresas de agrotóxicos do mundo.
Fonte: Atlas do agronegócio (2018).
Por outro lado, mesmo sendo estabelecida com um discurso baseado em promessas de
redução do uso intensivo de agrotóxicos, o melhoramento genético de tais sementes, na
realidade, passou a demandar uma quantidade de veneno químico ainda maior para o controle
das pragas, o que fortalecia e aumentava novamente a dependência para as grandes
organizações produtoras desses insumos (Albergoni & Pelaez, 2007). Para se ter uma ideia
aproximada, na figura 2, a seguir, é possível observar o consumo de fertilizantes químicos nas
últimas décadas:
35
Figura 2. Evolução do consumo de fertilizantes no Brasil, 1950 - 2016.
Fonte: Atlas do agronegócio (2018).
Conhecida também pelo eufemismo de “defensivos agrícolas”, a utilização
indiscriminada dessas substâncias surge no Brasil e no mundo como uma espécie de “fórmula
mágica”, resolvendo não só os problemas ligados à agricultura, como também atendendo aos
interesses de grandes empresas da área. As indústrias de agrotóxicos concebem um mercado
que fatura bilhões por ano, estimulando o surgimento e o uso de novas substâncias químicas,
cada vez mais letais, com base no argumento do aumento da produtividade, produção e
competitividade agrícola. Soluções rápidas e práticas são promovidas por essas empresas,
deixando de lado, no entanto, suas consequências para a população e a natureza.
Apesar do ser humano ser o principal responsável pelos impactos que o uso de venenos
químicos pode acarretar, ele “também sofre as consequências dessas ações, tanto como ser
biológico, quanto como ser social” (Andrades & Ganimi, 2007, p. 52). É preciso reenfatizar
que a produção de alimentos com o uso indiscriminado de agrotóxicos reflete hoje diversas
consequências socioambientais, gerando intensas repercussões diante da má qualidade de vida
tanto para a sociedade como para os demais seres da natureza, conforme veremos a seguir.
36
1.1.2. O veneno do campo à mesa: onde vamos parar?
Considerada um dos principais setores da economia brasileira, a agricultura
convencional, conforme visto na seção anterior, passa a ser caracterizada pela exploração
intensiva da terra por meio da utilização frequente de fertilizantes químicos e agrotóxicos.
Resultado da relação complexa de interdependência entre o campo e a cidade (Silva & Tassara,
2014), os debates sobre a soberania da monocultura e a crise alimentar colocam em destaque as
formas como a agricultura se desenvolve no Brasil e no mundo, como apontam Fonini e Lima
(2013):
De um lado está a agricultura hegemônica, baseada em grandes áreas de terra,
produtora de commodities e dependente de insumos químicos. Do outro lado está a
agricultura não hegemônica, da qual faz parte a agricultura camponesa, de
agricultores familiares, quilombolas, caiçaras e outros grupos (p. 197).
O uso intensivo de substâncias químicas vem provocando impactos significativos na
produção agrícola, evidenciando problemas como, por exemplo, a perda da fertilidade do solo,
erosão, perda da biodiversidade, contaminação dos alimentos, intoxicações crônicas e agudas
dos trabalhadores rurais, além do aparecimento de novas pragas resistentes às substâncias
utilizadas (Santos & Melo, 2011; Severo & Pedrozo, 2008). Em relação a este último, o
desmatamento de grandes áreas destinadas ao cultivo de monoculturas acarretou no aumento
de pragas que, como explicam Andrades e Ganimi (2007), favorece ainda mais a utilização
intensiva de agrotóxicos para combater os problemas encontrados nas plantações.
Os efeitos deletérios dessas substâncias são muitas vezes mascarados pelos seus
principais interessados com a intensão de dissimular sua natureza prejudicial para a saúde do
ser humano e do meio ambiente. Discussões calorosas são realizadas por interessados de
37
diversas áreas que demonstram determinado ceticismo em relação à viabilidade de se deixar de
utilizar agrotóxicos nas plantações, alegando, veementemente, a impossibilidade de se produzir
alimentos em quantidades suficientes e de baixo custo para suprir as necessidades da população.
Sob o argumento de que “o agrotóxico é um mal necessário” é irônico pensar que para
algumas pessoas a única tentativa de solução para tais problemas seja bombardear a superfície
da Terra de inseticidas, desencadeando uma série de desastres e consequências para toda a vida.
O debate sobre a utilização dessas substâncias químicas é polarizado, tendo de um lado as
indústrias e comerciantes a favor desses “defensivos agrícolas” e do outro as pessoas engajadas
na posição de combate a esses venenos químicos.
O alerta em relação aos impactos do uso de agrotóxicos ganhou destaque no ano de
1962, quando Rachel Carson denunciou em seu livro, Primavera Silenciosa, os efeitos nocivos
dessas substâncias químicas no solo, ar, água, plantas, animais e seres humanos. Apresentando
uma riqueza de informações, a autora relata as principais consequências da utilização desses
produtos, ressaltando sua preocupação para que atitudes urgentes fossem adotadas. Mesmo
escrita há mais de 50 anos, a obra de Carson ainda permanece presente nas discussões atuais,
representando, portanto, um marco no despertar do ecologismo político mundial, além de
estimular e inspirar a criação de novas leis e órgãos de fiscalização para um maior controle
dessas substâncias.
Atualmente, ao ressaltar os riscos à saúde, em especial nas causas do câncer, o Instituto
Nacional de Câncer (INCA) destacou no ano de 2015 a relevância para o combate ao uso de
agrotóxicos, visando fortalecer as iniciativas de controle e regulação das substâncias químicas
e estimular alternativas agroecológicas de produção. De acordo com a investigação realizada
pelo Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxico (PARA) da Anvisa, diversos alimentos
pesquisados apresentavam quantidades significativas de substâncias químicas acima do limite
38
máximo permitido, além de resíduos de utilização de agrotóxicos não autorizados, em processo
de banimento ou até mesmo que nunca tiveram registro no Brasil (INCA, 2015). Diante da
grande quantidade de substâncias químicas presentes nos alimentos que, na maioria das vezes,
é desconhecida pelos consumidores, Beharrell e MacFie (1991) destacam que é cada vez mais
crescente a quantidade de pessoas que apresentam reações adversas devido à utilização de
produtos químicos artificiais utilizados na agricultura.
A liberação do uso de sementes transgênicas também foi um dos principais fatores que
levou a colocar o Brasil no primeiro lugar do ranking de consumo de agrotóxicos no mundo,
tendo em vista o uso de grandes quantidades destes produtos para o cultivo das sementes
geneticamente modificadas. Ademais, o país ainda concede isenção de impostos à indústria
produtora de agrotóxicos, que continua realizando pulverizações aéreas, ocasionando a
dispersão destas substâncias pelo ambiente e utilizando substâncias químicas já proibidas em
outros países (INCA, 2015; Kugler, 2012). Os países em desenvolvimento plantam mais
transgênicos do que os países industrializados, sendo, em sua maioria, cultivados por pequenos
agricultores que aumentam a sua dependência em relação às grandes corporações (Almeida,
Massarani, & Moreira, 2015), e fazem uso desses venenos sem o devido conhecimento e
utilização dos equipamentos de proteção necessários (Alencar, Mendonça, Oliveira, Jucksch,
& Cecon, 2013).
Bombardi (2011) afirma, com base nos dados do Sistema Nacional de Informações
Tóxico-Farmacológicas (Sinitox), que durante o período de onze anos, compreendidos entre
1999 a 2009, ocorreram cerca de 62 mil intoxicações por agrotóxicos de uso agrícola no Brasil.
Isso significa que tivemos aproximadamente 5.600 intoxicações por ano no país, representando
uma média de 15,5 casos de envenenamento por agrotóxicos por dia ou um caso a cada 90
minutos. Por mais expressivos que os números pareçam ser, a autora ainda destaca que eles
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estão muito aquém de representar o número real das intoxicações, tendo em vista a
indisponibilidade dos dados ou sua intermitência em alguns estados brasileiros.
Realizando um recorte regional com os mesmos dados do Sinitox, Teixeira, Ferraz,
Couto Filho, Nery e Casotti (2014) analisaram as intoxicações por agrotóxicos de uso agrícola
nos estados do Nordeste brasileiro. Os autores identificaram que Pernambuco foi o estado com
o maior número de registros de intoxicação (39,5%), sendo a tentativa de suicídio a principal
circunstância envolvida (69,8%). A maior parte dos casos evoluiu para a cura (69,8%), porém
7,1% tiveram como desfecho o óbito. Ainda segundo os autores, “o Brasil vivencia uma
potencial situação de risco em todo seu território, o que coloca o país em uma posição de
vulnerabilidade diante dos interesses da indústria de agrotóxicos” (p. 504).
Diante do exposto, percebe-se que a predominância da agricultura contemporânea se
posiciona num duplo papel de algoz e vítima da crise ecológica mundial, sendo uma das
principais atividades geradoras da degradação ambiental e, ao mesmo tempo, vulnerável aos
efeitos das mudanças climáticas e uso indiscriminado dos recursos naturais. Como decorrência
da utilização massiva de agrotóxicos nas lavouras, Pessoa e Alchieri (2013) enfatizam que nos
últimos anos o modelo predominante do desenvolvimento rural brasileiro está apresentando
sinais de esgotamento socioambiental, pois, além do desgaste dos recursos naturais, destaca-se
especificamente a degradação da fauna e flora e as consequências deletérias à saúde do
agricultor.
A racionalidade conservadora e instrumental presente nesse modo de produção agrícola
dominante contribui para a intensificação da mecanização e da agroquímica. Nessa perspectiva,
a utilização indiscriminada dos agrotóxicos acarreta também o enfraquecimento dos pequenos
agricultores com a desvalorização das suas práticas, a favelização da população rural nos
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centros urbanos e a construção de uma relação pessoa–natureza voltada para a degradação dos
recursos naturais (Silva & Tassara, 2014).
Resultado da internalização massiva do capitalismo no campo, a insustentabilidade do
agronegócio passa, portanto, a ser cada vez mais questionada. Nesse sentido, além dos efeitos
nocivos evidentes descritos na literatura científica nacional e internacional, as ações para o
enfrentamento do uso dessas substâncias instigam novas reflexões que fazem repensar o sistema
agroalimentar adotado mundialmente, seus desafios e perspectivas.
1.2. A crise agroalimentar e a dinâmica capitalista
É crescente a discussão em torno dos sistemas agroalimentares nos mais variados campos
disciplinares. Enfatizados principalmente após as crises financeiras e alimentares internacionais
de 2008, que trouxeram à tona a relevância da agricultura para a segurança alimentar (Fontoura
& Naves, 2016), tais discussões passaram a ocupar um relevante papel para o despertar de uma
visão mais crítica acerca dos fatores envolvidos no seu surgimento. Nesse sentido, a discussão
sobre a dinâmica capitalista se faz de fundamental importância para uma melhor compreensão
do contexto investigado neste estudo, contribuindo para entender e desvendar os reais objetivos
da modernização agrícola e os aspectos que desencadearam a crise agroalimentar em diversas
partes do mundo.
A história do capital e o desenvolvimento do regime agroalimentar podem ser
compreendidos como mutuamente condicionantes (McMichael, 2016). Os efeitos do
capitalismo na modernização agrícola e na sociedade foram destacados por Marx (1867/1998),
ao enfatizar que todo o avanço da agricultura capitalista pode significar, ao mesmo tempo, o
progresso na arte de despojar o solo e também o trabalhador. Nesse aspecto, Foster e Clark
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(2004) retomam o conceito de fissura metabólica, defendido por Marx, para ressaltar o
antagonismo existente entre a reprodução capitalista e a terra. Tal conceito foi desenvolvido em
um cenário de crescente alarme feito pelos químicos agrários e os agrônomos da Alemanha,
Grã-Bretanha, França e Estados Unidos, que sinalizaram a perda de certos nutrientes
(nitrogênio, fósforo e potássio) da terra, tendo em vista a exportação de comida e fibras do
campo para as cidades. Esses nutrientes, em vez de serem devolvidos à terra, como geralmente
acontece na produção agrícola tradicional, eram transportados por longas distâncias, o que
culminava como dejetos contaminadores nas grandes cidades.
Consequentemente, para Marx (1867/1998), “todo aumento da fertilidade da terra num
tempo dado significa esgotamento mais rápido das fontes duradouras dessa fertilidade” (p. 571).
Como problema fundamental decorrente do capitalismo e, consequentemente, da alienação da
terra e da natureza, Foster e Clark (2004) destacam que Marx acreditava que dentro do
capitalismo, o “crescimento da indústria agrícola em grande escala e do comércio de longa
distância tendia (e ainda tende) a intensificar e estender tal fissura metabólica” (p. 228). Ao
analisarem argumentos relacionados ao imperialismo ecológico – entendido como a exploração
dos recursos naturais de certos países por outros - os referidos autores também abordam outras
consequências como, por exemplo, os movimentos massivos de trabalho e população voltados
à extração e transferência de recursos, a transformação dos ecossistemas e a exploração das
vulnerabilidades ecológicas de certas sociedades.
“Deter a destruição causada pelo imperialismo ecológico é a única solução para este
problema global” (Foster & Clark, 2004, p. 237), fazendo-se necessário, portanto, transformar
as relações sócio-ecológicas de produção. Para isso, ainda de acordo com Foster e Clark (2004),
a compreensão de tal imperialismo se faz de fundamental relevância no processo de análise das
interações entre a sociedade e a natureza, conforme destacam:
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As forças imperialistas impõem regimes de produção sócio-ecológicos no
mundo, aprofundando assim a divisão antagônica entre o campo e a cidade, por
um lado, e entre o Norte e o Sul, por outro. Os ecossistemas agrários (de trabalho
e natureza) se reestruturam e reformam sistemática e racionalmente a fim de
intensificar não apenas a produção de comida e fibra, mas também de riqueza da
burguesia compradora e do capital monopolista (Foster & Clark, 2004, p. 235).
Nesse aspecto, Andrades e Ganimi (2007) realizaram uma análise de como o capitalismo
utilizou o espaço agrário para ampliar sua dominação, destacando os impactos ambientais e
sociais provocados pela Revolução Verde. Os autores apontam que as reais intenções das
grandes empresas durante o processo de modernização da agricultura estavam ligadas,
principalmente, à maximização do lucro, por meio da monopolização de fatias cada vez maiores
do mercado; e à aquisição de royalties, tendo em vista os pacotes tecnológicos adquiridos pelo
produtor. Logo, o agricultor tornava-se cada vez mais dependente e ligado às transnacionais,
uma vez que só conseguiria comprar tais pacotes por meio dessas empresas, fortalecendo uma
reprodução ainda mais ampliada do capital por meio da sua monopolização e territorialização,
além da sujeição do campo à sua lógica.
À vista disso, a indústria moderna, para Marx (1867/1998), atua de forma mais
revolucionária na agricultura do que em qualquer outro setor, destruindo o camponês ao
substituí-lo pelo trabalhador assalariado. Segundo o autor, quanto mais um país apoia o seu
desenvolvimento nessas indústrias, mais rápida é a destruição, uma vez que o emprego da
maquinaria na agricultura age de maneira intensa e sem oposição, tornando supérfluos esses
trabalhadores. Desse jeito, a produção capitalista “só desenvolve a técnica e a combinação do
processo social de produção, exaurindo as fontes originais de toda a riqueza: a terra e o
trabalhador” (Marx, 1894/1998, p. 571). Nas últimas décadas, a agricultura passa, portanto, a
se transformar com o processo de mundialização do capitalismo monopolista e,
consequentemente, do neoliberalismo, conforme aponta Oliveira (2015):
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A lógica neoliberal atua no sentido de tentar converter todo alimento produzido
em mercadoria, não para ser consumido pelos que o produziram, mas para ser
adquirido por quem tenha dinheiro, onde quer que esteja no mundo. (p. 240)
Assim sendo, a agricultura globalizada estrutura-se, conforme Oliveira (2015), por meio
de uma tríade relacionada a: 1) produção de commodities; 2) bolsas de mercadorias e de futuro;
e 3) formação das empresas monopolistas mundiais. O primeiro termo visa à transformação de
toda a produção do campo para a produção de commodities, fundamentalmente voltada ao
mercado mundial. O segundo termo, bolsas de mercadorias e futuro, funcionam como centro
regulador dos preços mundiais das commodities, sendo a Bolsa de Chicago uma das principais
responsáveis pela comercialização dos alimentos. O terceiro termo é composto pela formação
das empresas monopolistas mundiais, cuja composição se dá a partir das empresas estrangeiras
e nacionais com o objetivo de reter o controle da produção das commodities do campo. Dessa
maneira, segundo o autor, é por meio da territorialização dos monopólios e da monopolização
do território que essas empresas se articulam através do comando da produção agrícola.
Caracterizada pelo controle do processo produtivo no campo e da propriedade privada da
terra, a territorialização dos monopólios na agricultura capitalista mundializada está relacionada
ao fato de que o proprietário da terra, o proprietário do capital agrícola e o proprietário do
capital industrial podem ser a mesma pessoa física ou jurídica. Assim, aparece no processo
econômico como duas classes sociais distintas, tanto como proprietária de terra, como burguesia
capitalista, além de duas categorias sociais: uma agrícola e outra industrial. Por sua vez, a
monopolização do território se dá através de empresas que estabelecem alianças com aqueles
que efetivamente são responsáveis pela produção no campo. Ao exercer o controle através de
mecanismos de subordinação, as empresas monopolistas mundiais (multinacionais ou
nacionais) monitoram a circulação de mercadorias sem ter a necessid
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