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CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO
SENSU EM DISTÚRBIOS DE
APRENDIZAGEM
ROSA CRISTINA VAZ PEDROSO
MIGLIORINI
A APRENDIZAGEM DA LEITURA E
ESCRITA PARA O ALUNO COM
DEFICIÊNCIA MENTAL
SÃO PAULO
2009
CRDA - CENTRO DE REFERÊNCIA EM
DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO
SENSU EM DISTÚRBIOS DE
APRENDIZAGEM
ROSA CRISTINA VAZ PEDROSO
MIGLIORINI
A APRENDIZAGEM DA LEITURA E
ESCRITA PARA O ALUNO COM
DEFICIÊNCIA MENTAL
Monografia apresentada como parte dos
requisitos para aprovação no Curso de
Especialização Lato Sensu em Distúrbios
de Aprendizagem e submetida ao Centro
de Referência em Distúrbios de
Aprendizagem – CRDA, sob orientação do
Prof(a). Dr(a) Adriana de Souza Batista
Kida
Agradeço a Deus que me deu a vida;
A meus pais que me deram o suporte para a
educação e o aprendizado;
Ao meu esposo e minha filha que contribuem
para minha formação pessoal e que me dão
forças, incentivo e condições para
prosseguimento de meus estudos.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...................................................................................................................
06-07
OBJETIVO..........................................................................................................................
......08
REVISÃO DA
LITERATURA................................................................................................09
3.1. O APRENDIZADO DA LEITURA E DA ESCRITA
................................................09-12
3.2. O PROCESSO DE APRENDIZAGEM DE LEITURA⁄ESCRITA PARA O
PORTADOR DE DEFICIÊNCIA
MENTAL............................................................................................12-16
3.3. ASPECTOS ATUAIS SOBRE OS MÉTODOS DE ENSINO DA LEITURA E DA
ESCRITA AO ALUNO COM DEFICIÊNCIA
MENTAL.................................................16-19
CONCLUSÃO.....................................................................................................................
....20
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS...............................................................................21-26
RESUMO
Objetivou-se, através de uma revisão na literatura, discutir o conhecimento
relacionado ao aprendizado da leitura e da escrita pelo portador de deficiência mental.
Apresentaram-se no desenrolar deste estudo aspectos cruciais acerca das habilidades e
competências exigidas no aprendizado da leitura e da escrita, a perspectiva histórica
sobre a concepção da deficiência mental que tanto interferem no ensino e
alfabetização. Notou-se uma concepção atual que privilegia a estimulação do aluno no
sentido de avançar em sua capacidade de compreensão, por meio do incentivo ao
enfrentamento de impasses cognitivos vem rompendo barreiras na superação dos
limites intelectuais e mobilizando esforços na apropriação de saberes onde estão
inclusos os processos de leitura e escrita e, conforme encontrado na literatura, estudos
tem demonstrado que a criança em situação de deficiência mental possui capacidade
para o aprendizado, muitas vezes semelhante aquele observado na criança
caracterizada como típica. Mostra-se na literatura não apenas importante, mas
imprescindível a ocorrência de expectativas positivas dos familiares e professores que
atuam sobre o aprendizado dos alunos, proposta de atividades que favoreçam a
motivação e funcionalidade do conteúdo a ser trabalhado, gerando desafios capazes de
provocar conflitos cognitivos e, por conseguinte a construção da escrita. Concluiu-se
que à luz da literatura os educandos em situação de deficiência diferem quanto ao
ritmo e desenvolvimento da hipótese de escrita, o que mostra a necessidade de
respeitar o ritmo de cada aluno.
Palavras chave: aprendizagem, deficiência mental, leitura, escrita
INTRODUÇÃO
____________________________________________________________
____
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como propósito contribuir, por meio da apresentação de
uma revisão de literatura, com a divulgação do conhecimento relacionado ao
aprendizado da leitura e da escrita pelo portador de deficiência mental. Assim, a revisão
realizada visa oferecer um panorama histórico e uma análise crítica da problemática
relacionada à alfabetização do deficiente mental, conhecimento que permitirá ao leitor
refletir sobre alternativas pedagógicas possíveis, capazes de atender aos propósitos de
ensino aos estudantes com esta necessidade educacional especial.
Nesta pesquisa entendeu-se a Deficiência Mental como uma alteração do
funcionamento intelectual geral, significativamente abaixo da média, decorrente de
fatores intervenientes no período de desenvolvimento, com comprometimento de duas
ou mais áreas de conduta adaptativa - capacidade do indivíduo em responder
adequadamente às demandas da sociedade – relacionadas à comunicação, aos cuidados
pessoais, às habilidades sociais, ao desempenho na família e comunidade, à
independência na locomoção, saúde, e segurança, ao desempenho escolar, ao lazer e ao
trabalho (AAMR, 1992). A adoção deste referencial está em consonância com o
conceito adotado pela Política Nacional de Educação Especial: livro I/MEC/SEESP –
Brasília: a Secretaria, 1994
Ao considerar esta definição, concebendo-se que dificuldades de desempenho
escolar são manifestações presentes no quadro da deficiência mental, torna-se relevante
discutir os problemas enfrentados por estes escolares especiais no processo de
alfabetização. A escrita, grande marco do aprendizado acadêmico por ser um
instrumento indispensável aos demais níveis escolares, à apreensão de outros
conhecimentos e à inserção em uma sociedade letrada (ROCKWELL, 1985), é um
desafio ao aprendizado do deficiente mental se a considerarmos uma nova forma
representação do mundo e de expressão lingüística, extremamente abstrata e relacionada
aos processadores de alto nível - a metacognição.
A problemática da alfabetização do deficiente mental fica ainda mais
complicada quando se introduz a esta discussão a crença que alguns professores
possuem quanto às reais possibilidades de ensino do deficiente mental, considerados
alunos que se afastam dos padrões de normalidade construídos e veiculados na
sociedade, e para os quais, portanto, a escola brasileira não está preparada seja para o
acolhimento ou para o trabalho das potencialidades, mesmo em um momento histórico
em que se veiculam idéias de inclusão (MARQUES, 1994).
Assim, a literatura evidencia a presença de dois limitadores: um relacionado à
dificuldade de aprendizado da leitura e da escrita pelo deficiente mental quando
adotados os mesmos métodos de ensino e imposto o mesmo padrão de expectativa de
desempenho desejado para crianças típicas e o despreparo da escola e seus professores
para realizar um ensino que respeite as necessidades educacionais desta população.
A seguir, estes aspectos serão apresentados mais profundamente e discutidos,
sem desconsiderar uma discussão sobre as habilidades e competências exigidas no
aprendizado da leitura e da escrita, a perspectiva histórica sobre a concepção da
deficiência mental que tanto interferem no ensino e alfabetização da deficiência mental.
OBJETIVO
____________________________________________________________
2. OBJETIVO
2.1 Objetivo Geral
O presente trabalho tem como objetivo geral estudar, à luz da literatura
especializada, as possíveis causas das manifestações referentes a dificuldades no
aprendizado da leitura e da escrita por deficientes mentais e possíveis alternativas de
ensino destas capacidades aos alunos com esta necessidade educacional especial.
2.2 Objetivos Específicos
Dentre os objetivos específicos estabeleceu-se para o presente estudo:
1. A realização de levantamento bibliográfico relacionado à temática
definida em objetivo, selecionando, criticamente os textos que melhor abordam os
aspectos relacionados às dificuldades no aprendizado da leitura e da escrita, bem como
o ensino de deficientes mentais.
2. A construção da revisão crítica da literatura, discutindo os importantes
pontos relacionados ao aprendizado da leitura e da escrita pelo aluno portador de
deficiência mental.
3. REVISÃO DA LITERATURA
____________________________________________________________
____
3.1 O APRENDIZADO DA LEITURA E ESCRITA
Sabemos que o indivíduo que nasce em boas condições de saúde é capaz de
aprender desde o momento de sua concepção. Ao nascer aprende rapidamente a
sugar, a boca é o membro de seu corpo que vai permitir conhecer o mundo. Vivencia
o mundo através dos sentidos e constrói neste período sua representação mental do
mundo externo, representação esta que passa a ser progressivamente expressa ou
compreendida por meio das palavras faladas, colocando-o no jogo social da
comunicação. Compreendido o mecanismo desta simbolização do mundo por meio
dos fonemas, há ainda outro universo de representação a dominar: a representação
escrita. Assim, à medida que as relações entre a fala e os grafemas vão sendo
desvendadas a criança passa a dominar uma comunicação atemporal, capaz de
ampliar a capacidade humana de registro, transmissão e recuperação de idéias,
conceitos e informações (OLIVEIRA, 1996).
MOLL (1996) reafirma estas idéias ao pontuar que a linguagem oral é
produzida pela própria necessidade social do homem. É no contato com a
comunicação e a cultura que os fonemas produzidos pelo homem vão ganhando
sentido em seu contexto, assumindo seu papel de simbolização e dando significado a
objetos, experiências e fatos importantes nas relações estabelecidas. Assim,
progressivamente o homem vai agrupando todas as experiências sensoriais em torno
de um nome, que congrega os conceitos a serem expressos. Estes nomes têm a
possibilidade de, quando utilizados na comunicação, permitirem que o interlocutor
reconheça e acesse suas próprias experiências relacionadas ao tema e identifique os
conceitos sobre eles construídos. Neste sentido, a linguagem oral pode ser tida como
produto das relações culturais (VYGOTSKY, 1993). Da mesma maneira, a
linguagem escrita é resultado de uma produção social, é uma síntese do esforço
coletivo dos homens ao longo da história da humanidade (MOLL, 1998). É um
sistema simbólico que tem papel mediador na relação entre sujeito e objeto de
conhecimento, é um artefato cultural e instrumento que permite a ampliação da
capacidade humana de registro, transmissão e recuperação de idéias, conceitos e
informações, ampliando a capacidade de memória e comunicação (OLIVEIRA,
1996).
A literatura pressupõe que ao início da aprendizagem da leitura e escrita, a
criança concebe esta representação gráfica como um simbolismo de segunda ordem,
encarando-a como mera representação dos sons de fala (VYGOTSKY, 1993). Neste
sentido, concebe a escrita como secundária à linguagem oral, que é o referencial para
transcrição gráfica das unidades sonoras. Posteriormente, a linguagem oral cede
espaço enquanto intermediário entre a escrita e o que ela representa, e a criança passa
a enxergá-la como simbolismo de primeira ordem, ou seja, a simbolização da
realidade e não mais transcrição da fala. Este é um processo gradual e dependente do
desenvolvimento de funções psicológicas superiores e do desenvolvimento dos
signos na infância (BATISTA et al., 2001).Estudos sobre o aprendizado da leitura e
da escrita têm confirmado exatamente esta observação de Vygotsky e postulam os
seguintes estágios de alfabetização (MORTON, 1989; ELLIS, 1994; PINHEIRO,
1994):
1. Leitura logográfica: crianças adquirem um vocabulário visual de palavras, mas
tratam as palavras como se fossem desenhos e utilizam pistas contextuais em
detrimento à decodificação alfabética.
2. Escrita logográfica: crianças adquirem um restrito vocabulário visual de palavras,
mas não são influenciadas pela ordem de disposição das letras, exceto ao
considerarem a letra inicial. São capazes de reproduzi-lo graficamente atribuindo
significado a suas produções.
3. Escrita alfabética: crianças tornam-se capazes de fazer acesso à estrutura de sons
das palavras (fonologia), isolando os fonemas e mapeando-os nos grafemas
correspondentes. Contudo, para fazê-lo, devem conhecer as regras de relação fono-
grafêmica.
4. Leitura alfabética: Pode ser subdividida em dois outros estágios – a leitura
alfabética sem compreensão e com compreensão.
a) Leitura alfabética sem compreensão: Crianças convertem uma seqüência de letras
em fonemas, contudo, não são capazes de perceber o significado que subjaz a forma
fonológica que resulta desta decodificação.
b) Leitura alfabética com compreensão: Crianças decodificam tanto os fonemas
quanto acessam o significado da palavra, fazendo acesso ao sentido após traduzir
progressivamente a seqüência de grafemas em fonemas, integrando-as em sílabas e
posteriormente à palavras.
c) Leitura ortográfica: Crianças escrevem utilizando um sistema léxico-grafêmico (seu
vocabulário visual de palavras), o único que dá conta da estrutura morfológica que
constitui cada um destes estímulos.
Diante deste modelo, observam-se, então, três estratégias utilizadas ao logno do
aprendizado da leitura e da escrita: a estratégia logográfica, a fonológica e a lexical
(PINHEIRO, 1994; LEÓN e MARISCAL, 1999; CAPOVILLA e CAPOVILLA, 2000).
A estratégia logográfica implica no reconhecimento das palavras através de seus
desenhos e forma. Desta forma, os aspectos para a leitura não são as letras, mas pistas
não-alfabéticas, como o contexto, a cor da palavra e do fundo e o formato da palavra.
Neste caso, na ausência de tais pistas contextuais as palavras podem não ser
reconhecidas. Assim, a criança tende a reconhecer somente um pequeno conjunto de
palavras familiares, de alta freqüência na língua portuguesa, e quando encontra palavras
novas tende a advinhar seu significado cometendo trocas na leitura.
A estratégia fonológica caracteriza-se pela análise das palavras em seus
componentes (letras e fonemas) e a utilização, na codificação ou decodificação, das
regras de correspondência grafo-fonêmica. O aprendiz é capaz de traduzir
progressivamente a seqüência de grafemas em fonemas, na leitura, e de fonemas em
grafemas, na escrita, integrando estas unidades em sílabas e posteriormente em palavras,
permitindo a construção ou reconhecimento dos significantes. Dentre as principais
habilidades e competências envolvidas na leitura realizada por esta estratégia, destaca-
se, especialmente, o processamento fonológico.
O termo processamento fonológico refere-se às operações mentais em que o
leitor faz uso da estrutura fonológica ou de sons de uma dada língua ao nível oral para
aprender a decodificar a representação escrita desta língua (WAGNER, TORGENSEN e
RASHOTTE, 1994). São três as habilidades fonológicas envolvidas na leitura de
palavras através da recodificação fonológica: a codificação fonológica na memória de
trabalho, a consciência fonológica; necessária para o armazenamento temporário dos
sons que ouvimos e falamos; e a recuperação dos códigos fonológicos correspondentes
às letras ou grupos de letras na grafia da palavra, também conhecido como acesso ao
léxico (MANN, 1984; WAGNER e TORGENSEN, 1987; GERBER, 1996; RAMUS e
SZENKOVITS, 2008).
Contudo, ainda que o processamento fonológico permita o reconhecimento de
grande parte das palavras da língua (ortograficamente regulares), as palavras de
ortografia opaca que contém as regras ortográficas definidas pelo contexto fonêmico ou
irregularidades não seriam processadas adequadamente por esta estratégia, sendo
observáveis erros de regularização. Por esta razão é necessário o emprego de uma nova
estratégia leitora: a estratégia lexical.
Esta última estratégia é utilizada nas fases posteriores de aprendizado da leitura
e da escrita e implica na construção de unidades de reconhecimento nos níveis lexicais e
morfêmicos. As crianças tornam-se capazes de ler por reconhecimento de unidades
morfêmicas (menores unidades significativas da língua), ou seja, passando a fazer
acesso direto ao sistema semântico sem necessidade de reconhecimento por conversão
fonológica. Isto possibilita um pronto reconhecimento dos estímulos escritos,
aumentando a velocidade de decodificação e favorecendo a compreensão leitora.
Através deste modelo cognitivo, pode-se perceber a importância da
linguagem e da metalinguagem, ou seja, das habilidades de uso lingüístico e da
capacidade de refletir sobre a própria língua. GOMBERT (2003) pontua que as tarefas
de aprendizado da leitura e da escrita requerem o mais alto nível de abstração,
elaboração e controle do conteúdo lingüístico, ainda mais apurado que o uso
epilingüístico da linguagem na comunicação oral. Assim, destaca que é necessário que o
aprendiz empreenda esforços para colocar em ação as capacidades de controle
intencional de tratamentos lingüísticos requeridos para o domínio da linguagem escrita,
seja na codificação ou na decodificação.
Considerando que o transtorno da aquisição e desenvolvimento da linguagem é
uma das manifestações indicadas pelos critérios diagnósticos especificados pelo DSM
IV e pela Associação Americana de Retardo Mental (AAMR), pode-se compreender a
problemática envolvida para o desenvolvimento de altos níveis cognitivos necessários
ao processamento metalingüísticos implicados no aprendizado da leitura e da escrita.
Por esta razão, discutiremos no capítulo a seguir, os problemas enfrentados por
escolares com deficiência mental no curso da alfabetização.
3.2 O PROCESSO DE APRENDIZAGEM DE LEITURA ⁄ESCRITA PARA O
PORTADOR DE DEFICIÊNCIA MENTAL
A deficiência mental é uma das necessidades educacionais especiais
reconhecidas pela Lei 9.394/96, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que
menciona em seu texto: "O dever do estado com a educação escolar pública será
efetivado mediante a garantia de atendimento educacional especializado gratuito aos
alunos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino" (Art.
4º, LDB). Com este reconhecimento a deficiência mental que durante décadas manteve
práticas de ensino similares ao tradicional e desenvolvidas sob o conceito de ações
adaptativas caracterizadas pelo treino de seus alunos, classificados como treináveis e
educáveis limítrofes e dependentes vem sendo revista.
Atualmente, a concepção de que se faz necessária a estimulação do aluno no
sentido de avançar em sua capacidade de compreensão, por meio do incentivo ao
enfrentamento de impasses cognitivos vem rompendo barreiras na superação dos limites
intelectuais e mobilizando esforços na apropriação de saberes tais como o aprendizado
da leitura e da escrita (GOMES et. al, 2007).
Estudos têm demonstrado a capacidade dos portadores de deficiência mental
para este aprendizado. RUBIN e ALMEIDA (2003) ao acompanharem o desempenho
escolar de sete jovens e adultos portadores de deficiência mental nas áreas de língua
portuguesa encontraram uma evolução significativa quanto ao aprendizado da língua
portuguesa, destacando que estes escolares apresentam potencial para o
desenvolvimento e aprendizado de conceitos complexos tais como os relacionados à
leitura e à escrita. Pontuam que esta evolução é possível desde que lhes sejam
oferecidos programas de intervenção que respeitem e considerem suas características
individuais, especialmente, idade cronológica, potencialidades e necessidades de ajuda.
BONETI (1999) realizou um estudo de investigação das etapas de aprendizado
da leitura e da escrita por crianças portadoras de deficiência intelectual, de quatro a sete
anos, buscando compreender se estes escolares passam pelos mesmos conflitos
cognitivos e desenvolvem esquemas de interpretação de escrita semelhantes àqueles
desenvolvidos por escolares típicos. Os resultados permitiram concluir que o
comportamento da criança portadoras de deficiência intelectual, em muitos aspectos,
revelou-se semelhante ao comportamento da criança típica. Estes escolares com
necessidades educacionais especiais demonstraram os esquemas de interpretação da
linguagem escrita propostos por FERREIRO e TEBEROSKY (1986). Contudo, os
níveis de aprendizado atingidos e o ritmo de aprendizado mostraram-se relacionado ao
grau da deficiência. Sobre o aprendizado do conhecimento de letras existe um efeito
conjugado da idade cronológica da criança, estimulação leitora e deficiência intelectual.
Para a autora, a utilização de esquemas de interpretação da escrita sugere uma evolução
conceitual que pode ser associada a um progresso na capacidade operatória da criança,
fato que permite propor que o ensino deve privilegiar o ensino da leitura de maneira
construtiva, favorecendo o desenvolvimento destes esquemas.
Outros estudos também sugerem que a criança portadora de déficit intelectual
apresenta comportamentos similares aos da criança típica quanto ao aprendizado da
leitura e da escrita (KATIMS, 1994; FITZGERALD et al., 1991).
Reforçando os dados indicados na literatura, Ide (1993) pontua que a criança
inicia seu processo de aprendizado da leitura e da escrita com um bom conhecimento de
sua língua materna. No caso dos portadores de deficiência mental, especialmente de
grau leve a moderada, estes também trazem um saber lingüístico que utilizam em
situações rotineiras, no entanto, sem consciência. Assim, este saber lingüístico pode e
deve ser aproveitado no ensino da leitura e da escrita ao deficiente mental, no entanto,
observa que a prática pedagógica não tem considerado as etapas de aprendizado da
escrita, bem como a questão do sujeito ser capaz de construir seu próprio conhecimento
como enfatiza Piaget.
Considerando estes estudos e colocações, revela-se então necessária a apurada
avaliação do escolar com necessidades educacionais especiais e de suas potencialidades.
A partir da detecção do potencial lingüístico e dos fatores que podem comprometer sua
aprendizagem é possível adaptar um currículo para que as habilidades cognitivas e
lingüísticas deste educando possam vir a se desenvolver. É preciso diagnosticar qual a
fase de leitura e de escrita que o aluno se encontra, quais suas hipóteses, de modo a
traçar estratégias e impor impasses que favoreçam a evolução deste aprendizado.
Outro aspecto a ser considerado é o tempo de aprendizado. O ritmo de
aprendizado de escolares com necessidades educacionais especiais, segundo a literatura,
mostra-se mais lento em comparação a escolares típicos, mas pode atingir os mesmos
níveis dos observados para escolares típicos. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação
prevê dentre as adaptações curriculares possíveis a adequação da temporalidade para o
ensino. O respeito ao ritmo do aluno exige um olhar atento do educador, uma vez que
para estas adaptações torna-se necessário o constante planejamento das atividades
individualizadas ao grau de interesse e nível de conhecimento manifesto em cada etapa
da escolarização.
Diante do exposto pelo MEC (1997), existem princípios importantes a serem
considerados para os trabalhos com portadores de necessidades especiais, citando-se
três processos pedagógicos essenciais para a aprendizagem:
1. O conhecimento do processo de aprendizado dos alunos por seus professores, em
termos de suas capacidades, potencialidades, conhecimentos e interesses.
2. Os alunos precisam ser ajudados a atribuir um sentido pessoal às tarefas e atividades
de que participam.
3. As aulas devem ser organizadas de modo a estimular a participação e o esforço.
Aprender consiste em dar um sentido próprio à experiência. Requer a
compreensão do que estamos fazendo e o relacionamento com conhecimentos e
experiências anteriores. Desse modo, se não percebemos bem a finalidade de uma
atividade, torna-se mais difícil aprender.
As diferenças individuais entre os alunos é outra razão importante para sublinhar
a variedade. Ao proporcionar a oportunidade de participar em diferentes tipos de
aprendizagens, podemos ajudá-los a tomar maior consciência de si como alunos. O
nosso objetivo deve ser não somente ensinar fatos e conhecimentos básicos úteis e
interessantes, mas também permitir que se tornem alunos mais eficientes. Isso quer
dizer alunos mais autônomos, capazes de encontrar as informações de que precisam, de
saber quais as suas maneiras preferidas de aprender, e dispostos a confrontar-se com
novas situações e problemas.
Partidário destes conceitos, SCHNEIDER (2003) destaca que o processo de
alfabetização depende mais do professor do que da criança. O professor é visto como o
mediador do aprendizado e deve possibilitar e instigar o escolar através de impasses que
permitam à criança alcançar novas hipóteses na construção do conhecimento da escrita.
Quanto mais estimulador for o ambiente e o educador, maiores as oportunidades
ofertadas à criança que propiciarão a construção de sua própria escrita. Conforme a
criança avança no desenvolvimento da escrita, ela vai se interessando mais, se
envolvendo e tendo mais capacidade de entender as atividades. É preciso respeitar o
processo de desenvolvimento da escrita na criança, e respeitar também seu ritmo de
aprendizagem sabendo que cada um tem o seu momento, suas limitações e suas
habilidades que podem vir a se desenvolver no tempo oportuno.
Pudemos observar que os portadores de deficiência mental necessitam de
intervenções e algumas adaptações para conseguirem compreender e utilizar o processo
de leitura e escrita. Assim, discutiremos no capítulo a seguir aspectos relacionados aos
métodos atuais empregados na alfabetização dos portadores de deficiência mental.
seja de leitura e/ou de escrita.
3.3. ASPECTOS ATUAIS SOBRE OS MÉTODOS DE ENSINO DA LEITURA E
DA ESCRITA AO ALUNO COM DEFICIÊNCIA MENTAL
A motivação dos alunos para o aprendizado da leitura tem uma relação direta
com a dimensão desejante sobre este conhecimento e relaciona-se ao aspecto funcional
proposto nas atividades, bem como com o nível de exigência para realização das
mesmas.
Expectativas positivas dos familiares e professores atuam sobre o aprendizado
dos alunos. Essas expectativas se manifestam nas diversas situações de interações sócio-
familiares e escolares, uma vez que estas expectativas podem determinar um maior
número de experiências seja em contexto familiar ou escolar. Esta relação justifica-se
pela dependência das estimulações ofertadas por um determinado grupo social sobre o
desenvolvimento biológico, importantíssimas ao aprendizado desde o nascimento.
Neste sentido, VYGOTSKY (1995) acredita que a criança com deficiência deve
ser compreendida por seu meio sob uma perspectiva qualitativa e as relações sociais
estabelecidas devem considerá-la um indivíduo ativo, interativo e com potencial de
aprendizado.
Além da concepção e expectativas para o aprendizado, as atividades a serem
desenvolvidas devem considerar a importância da motivação e funcionalidade do
conteúdo a ser trabalhado.
FIGUEIREDO (2006) estudou a motivação de um grupo de alunos com
deficiência mental para realizar atividades de leitura e de escrita. A autora observou que
esses alunos apresentavam motivações diferentes segundo o tipo de atividade solicitada
pelo professor. Atividades como a escrita do próprio nome, a elaboração de bilhetes,
lista de compras, registros de contação de histórias, de visitas, passeios, festas e
acontecimentos, registro de palavras isoladas e de textos relacionados a gravuras.
Dentre estas atividades, a escrita do nome próprio e do bilhete foram as que propiciaram
maior motivação. Por outro lado, a escrita de histórias e lista de compras foram
atividades que obtiveram menor índice de motivação dos alunos.
A autora analisa que a escrita de bilhetes ou do próprio nome demonstrava uma
funcionalidade imediata vinculada ao prazer de dominar seu próprio nome e a
autonomia de poder comunicar um fato ou solicitar algo. Por outro lado, o grau de
dificuldade experimentado pelos alunos na escrita com base em história talvez responda
ao baixo índice de motivação e conclui que os alunos que identificam uma função social
sentem-se mais impelidos ao aprendizado.
É contemplando estes aspectos que estudiosos da alfabetização de deficientes
mentais são unânimes em dizer que os métodos pedagógicos devem estar
fundamentados na criação de impasses que possibilitem a criação de hipóteses sobre a
escrita e baseados na significação das atividades propostas.
IDE (1992) pontua que como não há uma concepção construtivista-interacionista
da aprendizagem, a alfabetização dos deficientes mentais deve ser realizada por um
conjunto de ações de intervenção pedagógica previamente planejadas a serem
implementadas. Nestas ações o professor passaria a ser o mediador entre o aluno e o
objeto do conhecimento, ou seja, da língua escrita, onde a criança recria
constantemente, por meio de atividades desafiadoras que provoquem no aluno conflitos
cognitivos, a construção da escrita. Este processo seria organizador e motivador a estes
escolares.
Alguns educadores, demonstrando uma concepção tradicional de ensino, optam
pela utilização de métodos sintéticos de alfabetização. Estes métodos utilizam
atividades de leitura baseadas na repetição, trabalhando de forma linear, ensinando
primeiramente as letras e seus nomes e/ou valores sonoros, em seguida as sílabas e
assim por diante.
Dentre as críticas ao emprego destes métodos para o ensino do deficiente mental
encontra-se FEIL (1991):
“A criança permanece horas e horas repetindo uma letra, ou uma
sílaba, até atingir a memorização. Ler, para estes métodos, significa
decodificar. Esses elementos (sons, sílabas e até mesmo palavras)
nada têm a ver com o sentido, e por outro lado, sabemos que o
indivíduo que não souber o sentido das palavras e só souber decifrar
não atingirá plenamente a leitura” (FEIL, 1991, p.41)
Por outro lado, ao considerar a perspectiva interacionista de ensino, em que se
adotam métodos analíticos de alfabetização, a leitura é vista como uma constante
atividade de busca de significado de um texto que está sendo trabalhado. Os educadores,
que se fundamentam nesta concepção sobre leitura, propõem atividades em sala de aula
com textos completos e contextualizados gerando maior motivação e compreensão das
funções da escrita por parte dos alunos.
Segundo este método, o professor necessita proporcionar aos alunos situações
onde possam ser expostos ao letramento: situações em que as crianças possam
estabelecer relações entre o que é falado e o que está escrito. Quadrinhos, parlendas e
canções proporcionam a criança a capacidade de saber o que está escrito sem mesmo
saber ler e tornam-se, progressivamente, capazes de localizar onde estão escritas
determinadas palavras; descobrem o sentido do texto apoiando-se em elementos como
figuras, conhecimentos prévios e características do gênero, com o apoio de imagens que
podem ser utilizadas tais como embalagens, folhetos, quadrinhos, fotos ou
logotipos. Por estas estratégias passam a atingir a funcionalidade da escrita.
Dados sobre a inclusão de alunos com deficiência mental na escola pública
(OLIVEIRA e PAIVA, 2003) revelam que a prática mais freqüentemente observada no
Ensino da Língua Portuguesa estava baseada na ausência de flexibilização do
curriculum e de ações pedagógicas individualizadas. As práticas de alfabetização
estavam relacionadas ao uso do método tradicional, centrado na memorização dos
padrões de letras em detrimento de uma prática desafiadora e contextualizada.
Deste modo, inicialmente, modificações na prática de alfabetização do deficiente
mental devem passar por uma reformulação na concepção dos professores quanto à
potencialidade desta população para o aprendizado da leitura e da escrita e de suas
possíveis dificuldades neste processo de construção (LIMA, 2002). Somente esta
compreensão pode direcionar o professor a encaminhar adequadamente, por meio da
adoção de metodologias e flexibilização curricular, o aprendizado da criança portadora
de deficiência mental propiciando que passe a ser sujeito na busca de seu conhecimento,
respeitando-se, assim, o desenvolvimento da escrita relatado por FERREIRO e
TEBEROSKY (1985).
Considerando esta premissa e os dados já apresentados sobre o aprendizado da
leitura por esta população especial, podemos pensar que o processo de aprendizagem da
leitura para alunos com deficiência mental, assemelha-se em muitos aspectos ao ensino
de estudantes ditos “típicos”. Assim, segundo FIGUEIREDO e GOMES (2007, p. 47),
“o letramento; a dimensão de vencer as dificuldades para ensinar a leitura a alunos com
deficiência mental passa pelo reconhecimento da inclusão como ferramenta para obter
resultados positivos. Observou-se nos estudos que a interação dos indivíduos com
deficiência mental em classes normais, possibilitou a construção de conhecimentos e
promoveu respostas satisfatórias por parte dos deficientes. Cabe então a escola, a
família e a sociedade repensar sobre estas atividades e procurar, com efeito, praticar a
igualdade nas relações sociais.
O domínio da linguagem escrita somente ocorre quando está presente, cultural e
socialmente, no mundo em que vivem os educandos especiais. Contudo, como em
qualquer situação de aprendizado cognitivo, a apropriação requer do sujeito
reconstrução, um processo ativo através do qual o sujeito reconstrói internamente um
conhecimento a partir da compreensão do seu modo de produção. Outro ponto
fundamental a ser considerado é a concepção de leitura como veículo que permite o
acesso à cultura e ao conhecimento. Enquanto a escrita organiza e estrutura a
informação, esta gera o conhecimento e constrói o pensamento lógico. Assim, a leitura e
a escrita se constituem no letramento, definido por Soares (2003, p. 47), como “(...)
estado ou condição de quem não apenas sabe ler e escrever, mas cultiva e exerce as
práticas sociais que usam a escrita”.
Por meio de estratégias, o aluno constrói seu conhecimento sobre o significado e
por meio da sucessão progressiva a palavras vai modificando suas hipóteses de escrita e
aprendendo, a seu tempo, o código (IDE, 1993).
Outro apontamento realizado por IDE (1993) diz respeito à impossibilidade de
domínio da decodificação e da codificação por limitações no desenvolvimento de
competências metalingüísticas, a perspectiva interacionista de ensino pode privilegiar
uma alfabetização funcional, baseada no reconhecimento do sentido das palavras mais
freqüentemente utilizadas no cotidiano deste escolar, visando sua autonomia no
reconhecimento de elementos indispensáveis para a realização de atividades diárias. É
este respeito às competências do escolar especial, desenvolvendo a estimulação segundo
o tempo e as necessidades e capacidades do aluno, que devem guiar o processo de
alfabetização dos deficientes mentais.
CONCLUSÃO
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4. CONCLUSÃO
O presente trabalho permitiu a reflexão sobre pontos importantes relacionado às
possíveis causas das manifestações referentes a dificuldades no aprendizado da leitura e
da escrita por deficientes mentais e possíveis alternativas de ensino destas capacidades
aos alunos com esta necessidade educacional especial.
Neste trabalho observou-se, por meio da literatura, a possibilidade de
aprendizado da leitura e da escrita por parte deste alunado especial. Contudo, os
trabalhos foram concordantes em indicar que os deficientes mentais diferem quanto ao
ritmo, ao desenvolvimento das hipóteses da escrita e que, portanto, devem ser
respeitados em seu tempo e forma de aprendizado, requerendo metodologias adequadas
e adaptadas as suas necessidades específicas.
Embora haja esta indicação, no entanto, as práticas indicam o desconhecimento
dos professores quanto a métodos ou adaptações curriculares possíveis. A literatura, por
sua vez, apresenta diretrizes de trabalho inseridas em propostas filosóficas de
alfabetização, mas escassas são as discussões sobre métodos e práticas de ensino e
alfabetização a esta população. Assim, considerando estes aspectos, torna-se
fundamental o desenvolvimento de metodologias especificamente desenvolvidas para
estes escolares, facilitando o processo de adaptação curricular a ser realizada pela escola
regular. Só este conhecimento permitirá o respeito às competências do escolar especial e
guiará a efetiva alfabetização dos deficientes mentais.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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