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PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATOLICA DE SÃO PAULO
THAIS PELUZO ABREU FALEIROS SOARES
Sentidos constituídos na educação em tempo integral
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
São Paulo
2012
PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATOLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
THAIS PELUZO ABREU FALEIROS SOARES
Sentidos constituídos na educação em tempo integral
MESTRADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
como exigência parcial para a obtenção do título
de Mestre em Educação: Psicologia da Educação,
pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, sob a orientação do Prof. Dr. Antonio
Carlos Caruso Ronca.
São Paulo
2012
FICHA CATALOGRÁFICA
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução
total ou parcial desta dissertação por processo de fotocopiadoras ou eletrônicos.
SOARES, Thais. Sentidos constituídos na educação em tempo integral. São Paulo:
2012.
Dissertação de mestrado: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Área de concentração: Psicologia da Educação
Orientador: Professor, Doutor Antonio Carlos Caruso Ronca
Palavras-chave: Educação Integral, Educação em Tempo Integral, Professores e
Diretores Pedagógicos.
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________________
_______________________________________________
_______________________________________________
FOLHA DE APROVAÇÃO
Este exemplar corresponde à redação final
da dissertação defendida por Thais Peluzo
Abreu Faleiros Soares e aprovada pela
comissão julgadora.
Data: ___/___/___
___________________________________________
Prof. Dr. Antônio Carlos Caruso Ronca
___________________________________________
Prof. Dra. Ana Mercês Bahia Bock
___________________________________________
Dra. Maria do Carmo Brant de Carvalho
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho às crianças brasileiras,
para quem sonho e luto por uma escola de
qualidade.
AGRADECIMENTOS
À minha mãe, pessoa que mais admiro neste mundo. Por me proporcionar excelentes
condições de estudo e nunca me deixar desistir de nada. Ternura, alegria e bom humor, estas
são as suas características que me encantam. Obrigada por estar sempre ao meu lado.
Ao meu amado marido, por me apoiar em todas as minhas decisões. Pelas noites em claro ao
meu lado ao longo desta jornada. Por ter sido pai e mãe dos nossos filhos nos meus momentos
de ausência. Por me acalmar com seus abraços. Por me encantar com sua presença a cada dia.
Aos meus queridos filhos, Gabriela e Renato, que com tão pouca idade tiveram que entender a
minha ausência. Filhos de ouro, que com seus sorrisos e carinhos me permitiram carregar as
energias para concretizar este trabalho. A Gabi e o Rê são as minhas maiores alegria, a razão
do meu viver. Obrigada por existirem em minha vida!
À Titi, que se admirou quando iniciei este trabalho, dizendo “se vai ser bom para você, então
faça”, mas que infelizmente não pôde me ver terminá-lo. Obrigada por tudo o que você fez
por mim!
Aos meus adorados irmãos, Fábio, Ana Flávia e Eduardo, por serem o meu porto seguro e aos
quais amo com toda a minha força.
Aos cunhados e cunhadas, Vanessa, Cleber, Thais, Olivia e João a quem considero como
irmãos.
Aos queridos sobrinhos, Guilherme, Henrique, Fernando, Thiago e Heitor, por estarem
sempre com um sorriso no rosto. Meus meninos a quem amo como filhos.
À minha sogra Moema e ao meu sogro Lauro, pelos quais tenho um carinho de filha, obrigada
por toda a ajuda.
À tia Lydinha pelas valiosas dicas ao longo deste trabalho.
À doce Bá Silvia, por gerenciar, estruturar e zelar pelo meu lar com tamanho carinho.
Ao Dede, pelas idas e vindas, corridas e paradas, que alegremente conduziu o volante com as
minhas “riquezas” a bordo.
À Sirlene por deixar o meu cantinho sempre brilhando.
À Margarida pelo carinho para com a minha família.
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Doutor Antonio Carlos Caruso Ronca, meu orientador, com quem aprendi muito
mais do que fazer ciência. Aprendi que a educação é vida. Obrigada pelo acolhimento e pela
confiança na realização deste trabalho.
Às professoras Ana Bock e Maria do Carmo Brant, pelas importantes contribuições no exame
de qualificação, que auxiliaram no avanço desta pesquisa.
Aos professores do Programa de Psicologia de Educação, por seus ensinamentos,
fundamentais para o meu crescimento acadêmico.
À Mestra Luiza Cesca e à Doutora Marly Benachio, por acreditarem, confiarem e
incentivarem meu crescimento profissional.
Às coordenadoras do Colégio Emilie de Villeneuve, em especial à Silvia Azevedo, exemplo
de educadora, de coordenadora parceira, a quem devo grande parte da minha formação
identitária profissional. À Sandra pela atenção e dedicação para com meus filhos e sobrinhos.
À Sonia por seus ensinamentos e acolhimento. À Silvana por sua valiosa contribuição com a
língua inglesa.
Às queridas amigas e irmãs Liliane e Milena, pela força que me deram ao longo desse
processo. Estiveram sempre junto me apoiando e me proporcionando momentos de
descontração. “Murreres” admiráveis!! Educadoras que honram o peso dessa missão.
À querida equipe de trabalho Maria Nazaré, Irmã Marinalva, Vânia, Cássia, Elienai, Antônio
Rosa, Carol, Fabiana e Lucy pelas calorosas e enriquecedoras discussões a respeito de nossa
atuação docente e principalmente por serem verdadeiros amigos.
Aos demais professores, alunos e colegas do Colégio Emilie de Villeneuve, por me apoiarem
e deixarem os meus dias mais alegres. Em especial, às queridas Andréia, Vivian, Kelly,
Solange, Eli, Ana Paula, Cláudia e Dani com quem compartilhei angústias e alegrias.
À Tânia Knittel e Sandra Riberi pela grande ajuda na formatação deste trabalho e
principalmente pela nossa amizade.
À Ângela pela excelente redação do resumo na língua inglesa.
Às queridas amigas Marina Fadul, Thais Emy, Danubia Carvalho e Gabriela Junqueira, irmãs
de longa data. Companheiras nas gargalhadas, mas também nos piores momentos. Obrigada
pela amizade e fidelidade.
À querida amiga Viviani Zumpano, que me incentivou a iniciar esta jornada.
À Magda pela importante contribuição com a revisão deste trabalho.
À Secretaria de Educação de Palmas-TO que me acolheu e viabilizou a realização das
entrevistas.
Ao CNPq, pela ajuda financeira para que esta pesquisa se concretizasse.
“Conte-me e eu esquecerei;
Ensina-me e eu me lembrarei;
Envolva-me e eu aprenderei”.
Benjamin Franklin (Retirado do PPP da ETI de Palmas)
Poesia escrita pela aluna Ana Clara Bernhard Nichele do 5º ano em 2011 – Escola de Tempo Integral C.C. –
Palmas/ TO
RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo desenvolver uma compreensão da dimensão subjetiva da
atuação docente na escola de tempo integral, conhecendo os aspectos subjetivos constituídos
por sujeitos que atuam diretamente nesse contexto. Para tanto, buscamos na fala dos sujeitos
os elementos que compõe as significações (sentidos) a respeito da escola de tempo integral. O
referencial teórico e metodológico utilizado como sustentação da argumentação é a psicologia
sócio-histórica, que tem como concepção a constituição dos fenômenos humanos no processo
social e histórico. Neste sentido, o homem é ativo, social e histórico. A pesquisa tem dois
sujeitos participantes por meio de entrevistas semiestruturadas, sendo uma professora e uma
diretora pedagógica de escola de tempo integral do ensino fundamental I da rede pública,
localizada na cidade de Palmas-TO. A análise das entrevistas permitiu a construção de núcleos
de significação, evidenciando os sentidos constituídos pelos sujeitos entrevistados.
Palavras-chave: Educação Integral, Educação em Tempo Integral, Professores e Diretores
Pedagógicos.
ABSTRACT
This study aims to develop an understanding of the subjective dimensions of teaching in a
full-time school, taking into account the subjective aspects created by those directly involved
in this context. It is through their words that we analyze the elements that comprise the
meanings (senses) of full-time school models. The theoretical and methodological framework
used to support these arguments is socio-historical psychology, which is the constitution of
the human phenomena in a social-historical process. To this end, making is active social and
historically. The research has two participating subjects, via semi-structured interviews, a
teacher and a pedagogical director in a full-time elementary public school, from the city of
Palmas, state of Tocantins. The analysis of the interview led to the construction of core
elements, manifesting the meaning created by the interviewed parties.
Keywords: Global Schooling, Full Time Schooling, Teacher and Pedagogical Directors
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CAICs – Centros de Atenção Integral à Criança
CEUs – Centro Educacionais Unificados
CIEPs – Centros Integrados de Educação Pública
CMEIS – Centros Municipais de Educação Infantil
EMTIs – Escolas Municipais em Tempo Integral
ETI – Escola em Tempo Integral
ETP – Escola em Tempo Parcial
FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização
dos Profissionais da Educação
FUNDEF – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério
IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
JA – Escola Integral de Jornada Ampliada
LDB – Lei de Diretrizes e Bases da educação nacional
MEC – Ministério da Educação e Cultura
ONGs – Organizações Não Governamentais
PCNs – Parâmetros Curriculares Nacionais
PDDE – Programa Dinheiro Direto na Escola
PDE – Plano de Desenvolvimento da Educação
PEE – Programa Especial de Educação
PME – Programa Mais Educação
PNE – Plano Nacional da Educação
PPP – Projeto Político Pedagógico
PROFIC – Programa de Formação Integral da Criança
PRONAICA – Programa Nacional de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente
PRONASCI – Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania
SARESP – Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar de São Paulo
SEB – Secretaria de Educação Básica
SECAD – Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade
SIN- Salas Integradas
SME – Secretaria Municipal de Educação
UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
UnB – Universidade de Brasília
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................15
CAPÍTULO I – INSERÇÃO NO CAMPO DA PESQUISA ..............................................17
1.1 Estudos Correlacionados da educação em tempo integral.................................................19
CAPÍTULO II – PROBLEMATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO EM TEMPO
INTEGRAL.............................................................................................................................24
2.1 Um breve histórico..............................................................................................................28
2.2 Políticas Públicas ...............................................................................................................41
2.3 Financiamento para a implementação da Educação Integral no Brasil..............................45
2.4 Dados Estatísticos ..............................................................................................................47
CAPÍTULO III – A PROPOSTA DA ESCOLA DE TEMPO INTEGRAL NO
MUNICÍPIO DE PALMAS ..................................................................................................55
3.1 O Estado do Tocantins e o município de Palmas ...............................................................55
3.2 A Educação no Tocantins e em Palmas ..............................................................................56
3.3 A educação nas Escolas de Tempo Integral padrão em Palmas..........................................57
CAPÍTULO IV - A DIMENSÃO SUBJETIVA DO TRABALHO NAS ESCOLAS EM
TEMPO INTEGRAL............................................................................................................63
CAPÍTULO V - PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS..........................................68
5.1 Quanto ao referencial teórico.............................................................................................68
5.2 Quanto à abordagem de pesquisa.......................................................................................69
5.3 Quanto ao instrumento.......................................................................................................71
5.4 Quanto ao município e aos sujeitos participantes da pesquisa...........................................72
5.4.1 – Sujeito I – Professora Renata......................................................................................74
5.4.2 – Sujeito II – Diretora Laura ..........................................................................................74
5.5 Quanto aos procedimentos..................................................................................................75
CAPÍTULO VI – ANÁLISE DAS ENTREVISTAS ............................................................79
6.1 Análise do sujeito I..............................................................................................................79
6.2 Análise do sujeito II............................................................................................................94
CAPÍTULO VII – CONCLUSÃO SOBRE OS SENTIDOS DOS SUJEITOS ..............106
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................................................110
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...............................................................................113
APÊNDICE............................................................................................................................122
Termo de consentimento........................................................................................................122
Roteiro de entrevista..............................................................................................................123
Autorização para publicação...................................................................................................124
ANEXOS................................................................................................................................125
Anexo 1...................................................................................................................................125
Anexo 2...................................................................................................................................136
15
INTRODUÇÃO
Ingressei em uma escola particular da cidade de São Paulo, quando recém-formada na
graduação em pedagogia, para colaborar com a implantação de Jornada Ampliada, bem como
lecionar, nesse contexto, para os alunos do 4º e 5º anos do Ensino Fundamental.
A Jornada Ampliada consiste em atividades que
...podem ser diárias, mas o comum é que sejam ofertadas duas ou três vezes por
semana, em turno oposto ao escolar regular durante 3 a 4 ou 5 horas. Nesses dias, os
alunos permanecem de 8 a 10 horas sob a responsabilidade das escolas, recebendo
cuidados e alimentação ao longo desse período. (CENPEC, 2011, p.38).
Esta vivência profissional no início da minha carreira docente trouxe consigo desafios
pautados no fato de os alunos ficarem em torno de dez horas diárias na escola e, portanto, na
necessidade de serem planejadas atividades diversificadas para o turno oposto ao escolar
regular. Eu me questionava quanto à maneira de manter a motivação dos estudantes no que
tange ao processo de aprendizagem, ao tempo diário de permanência na escola, assim como à
forma de utilização do tempo ampliado, equacionando o espaço escolar e a organização de
uma rotina diferenciada, apta a propiciar motivação e possibilidades de novas aprendizagens
aos alunos.
As ações pedagógicas foram se concretizando no dia a dia da sala de aula, com
contribuições teóricas das minhas leituras sobre a Escola de Tempo Integral e a Jornada
Ampliada, e os momentos de formação continuada propiciados pela escola.
São duas as formas de atendimento escolar com turno ampliado; a Jornada Ampliada e
a escola de Tempo Integral. A segunda opção envolve a
...intervenção escolar na organização do tempo, do currículo e do trabalho docente. As
atividades são diárias, acontecem no interior da própria escola em períodos que se
estendem por 8 ou 10 horas. Nas iniciativas que optaram por esta modalidade, as
atividades dedicadas ao currículo regular e ao ampliado são organizadas de forma que
os períodos em que são oferecidas se alternem, ao contrário do que acontece na
jornada ampliada. (CENPEC, 2011, p.38).
Tive a oportunidade de vivenciar a jornada ampliada na referida escola particular por
aproximadamente quatro anos. Desde então, o interesse e a paixão por uma educação que
possibilite desenvolver os aspectos multidimensionais do homem a partir de processos de
aprendizagens centrados na escola, com utilização de tempo e de espaços educativos
ampliados, me levaram a querer estudar e aprofundar esta temática.
16
Acredito que a escola de Tempo Integral possibilita ao professor desenvolver projetos
que extrapolem o currículo composto pelo conhecimento historicamente acumulado e valoriza
o interesse dos alunos quanto ao que se quer aprender, ou seja, o que para eles é significativo,
sendo permeado, portanto, por outros saberes. Desta forma, envolve o contexto social no qual
os estudantes estão inseridos, favorecendo assim a relação de parceria escola, família e
comunidade.
Foi por acreditar que a Educação em Tempo Integral pode ser um dos aspectos
favoráveis ao avanço na qualidade da educação pública brasileira que germinou meu interesse
em estudar tal proposta, mais precisamente em investigar as significações constituídas pelos
professores e diretores que atuam nesta perspectiva.
17
Capítulo I
Inserção no campo da pesquisa
O levantamento de pesquisas referentes à educação integral foi realizado a partir de
buscas em algumas bases de dados, dentre elas, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (INEP), bibliotecas de Universidades no Brasil, como
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Universidade de São Paulo (USP),
Universidade Estadual Paulista (UNESP), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
(PUC-SP), Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), além de alguns
endereços de busca como Google, Google Acadêmico e Sciello.
As consultas foram realizadas com as seguintes expressões: educação integral, escola
de tempo integral e educação em tempo integral. A seleção de trabalhos se deu por meio da
leitura dos resumos e de três critérios estabelecidos; ser uma pesquisa focada em educação em
tempo integral no ensino fundamental I, ter como sujeitos professores e/ou diretores inseridos
na proposta de educação em tempo integral e ter sido publicada após 2007, ano em que a
Portaria Interministerial n◦ 17, instituiu o Programa Mais Educação, com a parceria formal
dos Ministérios do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, da Cultura, do Esporte e da
Educação. Este Programa tem por finalidade induzir a ampliação da jornada escolar e a
organização curricular na perspectiva de educação integral.
Com essas leituras dos trabalhos acadêmicos selecionados nas referidas bases de dados
foi possível obter um panorama das pesquisas recentes referentes à educação em tempo
integral no ensino fundamental I. Ainda que pautadas em diferentes referenciais teóricos e
metodologias diversificadas de coleta e analise dos dados, foram identificadas algumas
características da educação em tempo integral: ampliação do tempo de permanência dos
alunos na escola, utilização de espaços educativos diversificados, replanejamento da proposta
curricular e necessidade de integração entre as atividades realizadas pelos alunos.
Foi observada, portanto, uma resignificação da escola para além da transmissão dos
conhecimentos historicamente acumulados.
18
O delineamento da presente pesquisa emerge a partir da identificação da ausência de
estudos que busquem na dimensão subjetiva de professores e diretores, a maneira como é
configurada essa resignificação da escola a partir da oferta de ampliação do tempo de
permanência dos alunos.
Ao analisarmos a proposta da educação em tempo integral, à luz da teoria sócio-
histórica podemos afirmar que ela é construída social e historicamente e que constituirá os
sentidos de professores e diretores pedagógicos.
No início do século XX, Vygotsky (1896-1934), propôs a teoria Sócio-histórica¹, na
qual o sujeito é considerado ativo na materialidade social e histórica, assim, constituindo a
sociedade e sendo por ela constituído numa relação dialética. Dessa forma, a teoria representa
uma superação das teorias naturalizantes a respeito da subjetividade.
No processo de humanização, os significados são produzidos coletivamente pelos
sujeitos ao mesmo tempo em que estes constituem os seus sentidos subjetivos². Assim,
afirmamos que a educação em tempo integral é composta por aspectos objetivos produzidos
coletivamente, como por exemplo, o ordenamento legal, as políticas públicas de incentivo à
implantação, mas também de aspectos subjetivos como os significados e os sentidos.
Assim, estudar os sentidos constituídos por diretores e professores que atuam na
escola de tempo integral é dar visibilidade à dimensão subjetiva da realidade, valorizando a
presença do sujeito ativo na construção e realização desta proposta.
Dessa forma, mesmo havendo um significado socialmente compartilhado a respeito da
escola de tempo integral, esse significado será configurado por cada sujeito de maneira
singular, ou seja, o sentido pode ser diferente para cada sujeito que nela atua.
Diante do exposto, esta pesquisa se propõe a investigar a dimensão subjetiva de
professores e diretores pedagógicos, buscando nos sentidos por eles constituídos como a
escola de tempo integral se configura.
___________________________
¹ Os pressuposto teóricos da teoria Sócio-histórica serão aprofundados no capítulo 3 deste trabalho.
² A expressão sentido subjetivo será utilizada, assim como Rey, para caracterizar os sentidos
constituídos pelos sujeitos como uma categoria de análise da Psicologia, uma vez que a palavra sentido é
utilizada de diversas maneiras na língua portuguesa.
19
1.1 – Estudos correlacionados de educação em tempo integral
Dorigão (2007) investigou ações de reprodução social presentes na escola de tempo
integral de Apucarana (PR), por meio da análise do discurso das professoras do ensino
fundamental I.
Alguns aspectos apresentados nos relatos das professoras chamaram a atenção para a
caracterização da escola de tempo integral do referido município. A implantação da proposta
integral foi marcada por bom planejamento teórico, porém falho na formação dos docentes
para a nova proposta. O desejo do dirigente municipal de implantar a proposta de educação
em tempo integral tem como contrapartida a dificuldade dos professores para se adaptarem à
nova rotina escolar.
“As professoras entrevistadas salientam que o projeto da escola de tempo integral
era muito bom, mas não se realizou na prática. A implantação desta modalidade de
ensino era o maior sonho do prefeito (...) mas aconteceu sem discussão e estrutura;
deveria ter começado com algumas escolas e ir implantando aos poucos”.
(DORIGÃO, 2007, p. 82).
Dorigão pontua a relação direta entre a falta de espaço físico adequado para a
realização de atividades mais livres e a desmotivação, o disciplinamento excessivo e a
insatisfação dos professores com a escola de tempo integral. Para as professoras entrevistadas
as escolas de tempo integral não oferecem espaços físicos para alterar os conteúdos
programáticos e as atividades de ensino.
Outro aspecto levantado por Dorigão foi a resistência das famílias e dos alunos à nova
proposta curricular. Segundo o autor houve rejeição por parte dos alunos e dos pais em aceitar
a proposta e falta de conhecimento dos professores para atuar neste novo contexto.
...houve muita rejeição por parte dos alunos; alguns não queriam frequentar a escola,
outros choravam no período da tarde. Os pais tornaram-se agressivos com as
professoras, que estavam perdidas, sem saber ao certo como realizar aquele processo.
Uma situação difícil de ser controlada, pois as crianças não estavam acostumadas a
ficar em sala de aula oito horas por dia e achavam muito cansativo. (DORIGÃO,
2007, p. 84).
A ampliação do tempo de permanência dos alunos na escola, segundo o autor,
possibilitou a retirada das crianças em condições de vulnerabilidade das ruas do município.
O autor aponta que nas escolas de tempo integral do referido município foram
identificados;
“diversos elementos que indicam ações de produção e reprodução social, porém o
dado mais emblemático desta pesquisa encontra-se na constatação, mediante análise
20
dos depoimentos, de que as professoras entrevistadas atuam com dedicação no
ensino fundamental, mas paradoxalmente, parecem não acreditar que o sistema de
ensino, do qual fazem parte, possa alterar as condições de vida das crianças,
tampouco promover um desenvolvimento social. O que se constata efetivamente é o
já citado processo de seleção e exclusão social, o qual contribui para a manutenção e
conservação das estruturas sociais”. (DORIGÃO, 2007, p. 101).
Santos (2007) analisou a proposta de implantação da escola pública de tempo integral
do município de Apucarana – PR, por meio da observação do trabalho realizado em uma
escola municipal, análise documental e entrevistas com 16 alunos, 1 diretor, 2 coordenadores
pedagógicos, 7 professores, 2 idealizadores do projeto e 10 pais.
Santos aponta a intenção positiva ao se implantar a escola de tempo integral, mas
pontua a carência de elementos básicos para a proposta. Segundo a autora, as condições
precárias geram sobrecarga aos professores, excesso de tempo em sala de aula por parte dos
alunos e objetivos não alcançados nos aspectos formativos. A autora exemplifica;
“Não se pode desenvolver com qualidade uma oficina de higiene pessoal, quando
não há banheiros em número compatível com o de alunos ou, ainda, oficina de
alimentação, quando não há utensílios suficientes para todos e nem espaço adequado
no refeitório para que possam sentar-se, e alimentar-se. Nesse caso, a extensão só
tem multiplicado os problemas vividos pela escola e refletido a carência dos lares de
algumas crianças”. (SANTOS, 2007, p. 104 e 105).
Santos cita algumas dificuldades para a atuação docente, tais como a desvalorização
profissional, as condições de trabalho e a necessidade de trabalhar em mais de uma escola
devido aos baixos salários. Estes fatores, segundo a autora, desencadeiam uma improvisação
do fazer pedagógico tornando-o inconsistente e, consequentemente, gerando nos alunos e
professores cansaço, irritação e pouca motivação para o trabalho.
O tempo de permanência do aluno na escola, nove horas diárias, foi pontuado como
exagerado, tanto nos aspectos físicos da criança, apresentando cansaço e irritação ao final do
dia, como, segundo relato dos professores, na ausência de tempo de convivência familiar; “...
dando a entender que a família está repassando a ela (escola) o seu papel.” (SANTOS, 2007, p.
106.)
Segundo a autora, a ausência de integração entre os turnos frequentados pelos alunos
torna o aprendizado fragmentado e não contribui para a formação integral do educando. A
ampliação do tempo nestas condições se configura como a necessidade de preenchimento
aleatório do mesmo e se apresenta descompromissada com a função primordial da escola, que
é ensinar.
21
“Do ponto de vista pedagógico, a educação integral propõe-se à formação do homem
completo, o que na prática inclui os conhecimentos ligados à cultura, artes, esporte,
saúde, trabalho e às novas tecnologias. Conflitantemente, a prática educativa na
realidade encontrada, revela que as atividades do “contraturno” ou
“extracurriculares” não apontam para uma concepção interdisciplinar, de maneira
que essas ações passam a ideia de preenchimento do tempo, desconectadas das
disciplinas básicas do núcleo comum, comprometendo a formação integral do
aluno.” (SANTOS, 2007, p. 108).
Uma vantagem da escola de tempo integral que foi abordada no estudo é a retirada do
menor com risco de vulnerabilidade na rua e garantia de três refeições diárias.
Barros (2008) investigou a percepção dos sujeitos (docentes, discentes, pais, gestor,
coordenador pedagógico e funcionários) envolvidos em uma escola de tempo integral do
município de Goianésia – GO em relação aos limites e possibilidades desta experiência para a
melhoria da prática social para a educação. A coleta de dados foi realizada por meio de
entrevistas semi-estruturadas com trinta e sete sujeitos, análise documental e observação.
Barros, identificou a visão dos professores regentes frente à escola de tempo integral
como uma “boa iniciativa”, mas que precisa melhorar em alguns aspectos, como, por exemplo,
a qualificação dos trabalhadores do polo (local onde os estudantes realizam as oficinas no
período contrário ao curricular regular). Já os professores do polo, consideram a experiência
de tempo integral essencial à realidade dos alunos, sendo a oportunidade para os mesmos
vivenciarem atividades acompanhadas durante o dia todo. A gestão considerou importante a
proposta de educação integral, mas pontuou a necessidade de mais integração entre escola e
polos. Alunos e pais demonstraram entusiasmo em ficar dez horas submetidos a atividades
educativas. Segundo a autora, o gostar da escola é um indicativo de qualidade.
O estudo realizado por Barros identificou a escola de tempo integral como uma
iniciativa importante. No entanto, reforçou a necessidade de discussão entre os sujeitos
envolvidos para sua implantação. A falta de integração entre a escola e os polos onde os
alunos realizam as oficinas é um entrave, na medida em que os sujeitos não assumem a
responsabilidade diante da educação, sendo as ocorrências com os alunos vistas como um
problema do “outro”.
“... o estudo apontou para a necessidade de haver um planejamento integrado, pois
professores da escola e dos polos planejam isoladamente. Há uma diferença
inclusive do tempo destinado para essa atividade, até porque os professores regentes
possuem em média três horas semanais para planejamento e os docentes dos polos
possuem oito horas por semana”. (BARROS, 2008, p.170).
Com base nos dados obtidos em documentos analisados, Barros pontuou que os alunos
da escola de tempo integral reprovam e evadem menos que os estudantes das escolas de
22
tempo parcial, inferindo que os estudantes de tempo integral possuem um melhor rendimento
do que os que estudam em tempo parcial.
Santos (2009) analisou as experiências de escola integral em andamento no Brasil e,
particularmente, de uma escola da Rede Municipal de Goiânia. A partir da pesquisa empírica
realizada pela autora, a improvisação na organização do tempo da escola integral revelou-se
como característica central. Os gestores a justificaram como sendo decorrente da carga horária
considerada excessiva e da ausência de um coordenador de turno responsável pelos alunos no
período intermediário e encarregado da articulação entre os dois turnos.
As dificuldades enfrentadas pela escola pesquisada no final de 2008 fizeram a
secretaria municipal propor ajustes para o ano de 2009, o que demonstrou a busca pelo
aprimoramento da proposta e consideração às sugestões do corpo docente.
As mudanças propostas para o ano seguinte se configuraram como ajustes necessários
à proposta de educação em tempo integral a partir das necessidades da comunidade escolar.
Foram elas: a redução da carga horária dos estudantes de dez horas diárias para oito horas e
quarenta e cinco minutos, a presença de um professor coordenador responsável pelo turno
intermediário, e a reorganização das atividades realizadas pelos estudantes de forma a se
desenvolver as atividades básicas e complementares ao longo do dia e não mais divididas em
turnos.
Valadares (2011) analisou e identificou as fases de iniciação, implantação e
institucionalização do Projeto Escolas de Tempo Integral como política pública da Rede
Pública Municipal de Goiânia. Ao realizar a análise documental identificou a ênfase dada
pelas políticas educacionais à implantação de escolas em tempo ampliado no Brasil como
sendo uma medida que levaria à melhoria da qualidade da educação embasada na
democratização, universalização do ensino fundamental e inclusão social.
A revisão nos documentos oficiais da SME demonstrou que a discussão da proposta
para implantação da educação em tempo integral se deu na esfera dos dirigentes da educação,
sem a participação, portanto, de pais, docentes e discentes. Neste sentido, a implantação da
educação em tempo integral trouxe mudanças no cotidiano escolar sem a devida preparação
dos atores sociais envolvidos na proposta.
A autora ressalta que a não participação dos diferentes sujeitos envolvidos na proposta
refletiu também nas alterações que deveriam ser realizadas nas estruturas físicas das escolas,
23
mais especificamente nas adaptações de ampliação dos espaços físicos para o
desenvolvimento das atividades motoras. Outros pontos que chamaram a atenção foram: a
improvisação de espaços para a alimentação das crianças, a contratação dos professores para
uma jornada de seis horas de trabalho e não para permanecerem o período todo na escola, e a
diminuição da convivência entre a criança e a família, não por uma opção, mas sim pela
proposta das EMTIs.
As pesquisas expostas, ao discutirem questões referentes aos professores e diretores
envolvidos na escola de tempo integral demonstram a falta de participação desses atores nas
discussões para a implantação das escolas de tempo integral.
A implantação da educação em tempo integral sem a participação de quem está
diariamente dentro da escola construindo a identidade da proposta, segundo as pesquisas,
ocasionam dificuldade por parte desses atores em se adaptarem à nova rotina. Também os
equívocos na implantação, no que tange à reestruturação dos espaços educativos, por vezes
precários e/ou insuficientes para o desenvolvimento de atividades diversificadas e ao excesso
de tempo de permanência dos alunos na escola, geram cansaço, irritação e improvisação no
fazer pedagógico.
Outros aspectos apontados nas pesquisas demonstram que na escola de tempo integral
também estão presentes a desvalorização profissional e os baixos salários.
24
Capítulo II
Problematização da Educação em Tempo Integral
A ideia e as ações educativas referentes à educação integral propõem uma atuação
escolar ampliada em suas tarefas sociais e culturais (CAVALIERE, 2010). As experiências que
citaremos no próximo item deste capítulo exemplificam investidas nesta direção e
demonstram que o conceito de educação integral, embora em alguns momentos da história
estivesse embasado por matrizes ideológicas diversas, manteve um panorama comum
caracterizado pela ideia de uma formação “mais completa possível” para o ser humano.
(BRASIL, MEC, 2009).
A dificuldade em conceituar a educação integral é consequência da falta de consenso
no sentido atribuído para a formação “mais completa possível”. No entanto, se configura
como sendo uma educação escolar ampliada em suas tarefas sociais e culturais e não apenas
de transmissão do conhecimento historicamente acumulado.
O termo “educação integral” é definido por Cavaliere (1996) como:
Uma experiência escolar multidimensional, que atue integradamente em espaços da
vida dos alunos relacionados ao seu bem-estar físico (saúde, alimentação, higiene); ao
seu desenvolvimento como ser social e cultural, e à sua capacidade como ser político.
Hoje para que uma escola alcance essa amplitude de objetivos precisa ser uma espécie
de escola-casa, uma espécie de escola-clube, uma espécie de escola universidade,
aberta à família e à comunidade. (CAVALIERE, A. M,1996)
Embora o conceito de educação integral definido por Cavaliere seja da década de 90, a
educação brasileira, apresenta investimentos na ampliação da jornada escolar, buscando
articular espaço, tempo e trabalho pedagógico, a fim de desenvolver uma educação integral,
desde os primórdios do processo de escolarização em nosso país. Tais investimentos, cada um
a seu tempo, resultaram em propostas inovadoras e precursoras de novas ideias para a
educação em tempo integral.
Consideramos que estender a jornada escolar significa ampliar o tempo que o aluno
permanece em atividades vinculadas à escola. Atualmente pretende-se considerar como
escola de Tempo Integral as instituições escolares que possuem o período de no mínimo sete
horas diárias de atividades escolares, conforme previsto na proposta de Emenda constitucional
25
134/07, que está tramitando no Congresso Nacional, e que tem como proposição a
universalização da jornada ampliada de 7 horas no ensino fundamental, em um período de dez
anos. A Câmara dos Deputados criou em 2010 uma comissão especial para o debate da
proposta da Emenda.
O tempo de permanência na escola é um dos fatores para a melhoria na qualidade da
educação brasileira, pois possibilita um maior envolvimento dos alunos nas atividades
escolares. No entanto, para que a aprendizagem ocorra é necessário pensar na otimização do
tempo usufruído pelos alunos a partir de uma proposta curricular redefinida e direcionada à
concepção de educação integral.
Anísio Teixeira, em sua obra “Educação não é privilégio”, que foi publicada em 1957,
afirmou a necessidade da ampliação do tempo escolar para a efetiva formação dos alunos na
educação básica.
(...) não se pode conseguir esta formação em uma escola por sessões, com os curtos
períodos letivos que hoje tem a escola brasileira. Precisamos restituir-lhe o dia
integral, enriquecer-lhe o programa com atividades práticas, dar-lhe amplas
oportunidades de formação de hábitos de vida real, organizando a escola como
miniatura da comunidade, com toda a gama de suas atividades de trabalho, de estudo,
de recreação e de arte. (TEIXEIRA, 1994, p. 63).
Espera-se que a educação em tempo integral, objetivando a formação integral do
indivíduo, seja permeada por atividades diferenciadas e adequadas a uma proposta curricular
integrada. Estender a carga horária, por si só, não garante uma educação integral. Se o tempo
escolar for ampliado, e para cumpri-lo aumentarmos a grade curricular sem objetivarmos os
processos de aprendizagens para uma formação multidimensional, corremos o risco de tornar
a escola cansativa e desmotivadora para nossos alunos.
O que se pretende ao aumentar o tempo de permanência na escola é possibilitar uma
maior quantidade e melhor qualidade das oportunidades de aprendizagens.
É necessário, portanto, um programa de atividades diversificadas e consistentes que
extrapolem os muros da escola. Para tanto, a ampliação do tempo escolar não pode estar
engessada em uma grade horária apenas ampliada ou duplicada, fadada a ser rotineira e
estática. (CAVALIERE, 2006)
Moll declara que;
… de nada adiantará esticar a corda do tempo: ela não redimensionará,
obrigatoriamente, esse espaço. E é, nesse contexto, que a educação integral emerge
26
como uma perspectiva capaz de re-significar os tempos e os espaços escolares.
(MOLL. J. 2009, p.18).
Estender a carga horária de permanência na escola exige também considerar a
necessidade e o direito que as crianças e os jovens têm de permanecer no ambiente doméstico.
A escola jamais substituirá a família, nem é o que se pretende. Cada instituição, família e
escola, exerce um papel diferenciado e complementar na formação das crianças e jovens e
precisa ter o seu tempo de permanência garantido.
Anísio Teixeira, em sua obra “Educação para a democracia”, publicada originalmente
em 1936, afirma:
A escola ampliou os seus deveres até participar de todos os deveres do lar,
assumindo a responsabilidade de dar às crianças todas as condições que lhe
asseguram ou lhe deviam assegurar na família, a continuidade e a integridade de
uma ação formadora completa. Educação e não instrução apenas. Condição de vida e
não condição de ensino somente. (TEIXEIRA, 1997, p.65).
Pensar a escola como instituição capaz de educar e não apenas de transmitir
conhecimento é adequá-la às exigências contemporâneas no que tange à formação integral ou
multidimensional do homem. Ao refletirmos a respeito do tempo escolar estendido, estando
ele a favor da educação integral, redefinimos este aspecto da escola para além da substituição
de uma família ausente, do tempo ocioso ou do risco da perda da criança para rua.
A ampliação do tempo escolar só faz sentido se considerar o conceito de Educação
Integral. O tempo estendido deve ser aproveitado com atividades que possibilitem maiores
oportunidades de aprendizagem e que estas propiciem a relação entre o conhecimento
apreendido e a vida de cada educando.
A escola se constitui como locus de um projeto educativo. Este projeto articula as
propostas e os programas de ação a partir da sua finalidade, que foi delimitada, planejada
executada e avaliada, portanto, é intencional.
A escola é o locus privilegiado para a ação educativa, mas não se limita ao seu espaço
físico. Neste sentido, é preciso considerar a existência de outros espaços educativos, que não a
escola.
O espaço escolar é central na oferta da escolaridade básica de direito de crianças e
adolescentes. A escola tem importância fundamental para que as novas gerações
possam dominar conhecimentos e habilidades para viver e se mover no mundo.
Porém, o espaço escolar não é mais suficiente para o conjunto de aprendizagens que
27
as novas gerações querem e de que precisam para enfrentar os novos desafios
constitutivos da sociedade contemporânea. (CENPEC, 2011, p. 36).
Os espaços educativos disponíveis fora do ambiente escolar, como: a rua, o bairro, o
município... disponibilizam aos estudantes múltiplas possibilidades educacionais. Ao circular
pelos diferentes espaços educativos, os estudantes se apropriam dos mesmos, estabelecem
novas aprendizagens e desfrutam de espaços diferenciados de convivência.
Sabemos que o planejamento da ação educativa está centrado na escola, mas a sua
execução não se limita a este espaço. Os conteúdos permeiam as diversas áreas do
conhecimento e devem partir de um significado social para que o educando os relacione com
a sua vida e dialogue com outros tempos e espaços. Assim ele amplia a sua visão e
compreensão do mundo, do qual é parte integrante e atuante.
Maurício (2009) apresenta algumas condicionantes para a implantação do horário
integral nas escolas públicas que são centrais para a efetivação positiva desta proposta.
A primeira delas desmistifica a ideia de que a escola com ampliação da jornada irá
tirar as crianças da rua, pois se este fosse o intento correríamos o risco de ter uma proposta de
enclausuramento, quando o que se espera é que a criança queira estar na escola por gostar
deste espaço, ainda que a escolarização seja obrigatória. Tirar as crianças da rua é uma
consequência do horário integral e não um fim em si mesmo.
A segunda condicionante é que a escola seja um laboratório de soluções. Para tanto, a
escola de tempo integral deve ser para alunos e professores, pois é na convivência diária e
com o tempo estendido que as condições coletivas e produtivas para o convívio da
comunidade escolar serão formuladas.
O terceiro ponto é o fato de a reprovação não ser coerente com a proposta da escola
integral, pois o tempo que o aluno passa na escola precisa ter como foco a aprendizagem e,
para isso, é necessário adotar situações metodológicas diversas a fim de que todos os alunos
atinjam os objetivos traçados. Assim, não basta aumentar o tempo de permanência na escola;
é preciso buscar processos de aprendizagens diferenciados que envolvam e motivem o aluno
para o conhecimento.
A impossibilidade de se conceber o fracasso escolar em uma escola de tempo integral
é apresentada por Maurício (2009), como:
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...a escola pública de horário integral tem como pressuposto a aprendizagem e não a
reprovação. Alguns professores poderiam interpretar esse aspecto como aprovação
automática, uma estratégia para maquiar resultados positivos. No caso da escola de
horário integral seria uma incompreensão de sua função. O aluno permanece o dia
inteiro nessa escola, esse é o seu espaço de aprendizagem formal, de sistematização
de seu conhecimento. Se não for na escola onde permanece o dia inteiro junto a
profissionais com o objetivo específico de mediar seu conhecimento, onde construí-
lo, sistematizá-lo, tirar suas dúvidas? O tempo que ele passa ali se destina, entre
outros objetivos, à disponibilidade para se adotarem situações de aprendizagens
alternativas, caso se reconheça que através de uma proposta primeira, o objetivo não
foi alcançado. Além disso, o conhecimento pode ser desenvolvido com recurso a
diversas linguagens, compreensão intrínseca a esta concepção de escola e, portanto
indispensável no projeto da escola de horário integral. (MAURÍCIO, 2009, p.57).
A quarta condicionante é que a escola pública de horário integral deve ser uma política
de Estado, necessita, portanto, de vontade política dos governantes, uma vez que implica a
disponibilidade de recursos humanos e materiais.
A última condicionante apontada por Maurício (2009), sugere a educação integral
como uma opção, tanto para alunos quanto para professores. Desta forma, ambos estarão
dispostos a vivenciar e dar identidade a essa escola. Para tanto, a implantação do horário
integral nas escolas, segundo a autora, deve ser paulatina.
Espera-se que a pesquisa em voga contribua para a melhoria na qualidade da educação
brasileira a partir da concepção de educação integral, abrangendo aspectos do tempo
estendido, dos espaços educativos para além dos muros escolares e da proposta curricular
como centro articulador das diversas áreas do conhecimento.
2.1 - Um breve histórico
Focalizamos este estudo a partir do século XX, com a proposta de percorrermos a
trajetória histórica da concepção de educação integral no Brasil. Traçamos o panorama de
investidas políticas brasileiras na direção da efetivação da educação integral.
O termo educação integral já foi utilizado no Brasil com concepções antagônicas. A
exemplo disto, tivemos o Movimento Integralista que se contrapõe à ideia da educação
integral, também difundida, com base na democratização do ensino.
Na década de 30, o Movimento Integralista no Brasil defendia uma concepção de
Educação Integral, com a proposta de envolver o Estado, a família e a religião, postos em
29
sintonia pela escola, em uma intensiva ação educativa. Visava à educação escolar das massas
para além da alfabetização, elevando o nível cultural da população, envolvendo os aspectos
físicos, intelectuais, cívicos e espirituais da formação do indivíduo. O lema era “Educação
integral para o homem integral” (CAVALIERE, 2010). Os valores da Educação Integralista
eram sacrifício, sofrimento, disciplina e obediência. A educação voltava-se para as
necessidades do Estado Integral e, para tanto, moldava-se o indivíduo a partir de uma
educação doutrinária, pois se entendia a formação como um processo de conversão a uma
verdade já estabelecida.
Neste sentido, observamos que enquanto se pensava a escola para além da
alfabetização, limitava-se a atividade cognitiva do indivíduo, de forma que a educação fosse
pensada, do ponto de vista teleológico, moldando-o aos interesses do Estado. Em outros
termos, enquanto se pensava em uma escola apta a ensinar mais do que ler, escrever e contar,
se restringia a formação do indivíduo às necessidades do Estado.
O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932 foi um documento elaborado
por 26 intelectuais da educação com o objetivo de propor uma renovação educacional do país.
Segundo Cavaliere (2010), nele o termo “educação integral” aparece três vezes, como ideia de
direito do indivíduo a uma educação pública que abranja diversas dimensões de sua formação.
O Manifesto, conforme afirma Cavaliere (2010), usa os termos “direito biológico de cada
indivíduo à sua educação integral”, “à formação integral das novas gerações” e à necessidade
de a escola “alargar os limites e o raio de ação”. Sugere a criação de instituições periescolares
e postescolares que atuem de forma educativa ou de assistência social.
Os Parques Infantis da Cidade de São Paulo – criados por Mário de Andrade em
1935/38, propunham oferecer às crianças pequenas uma educação não escolar, porém
complementar.
Em 1950, Anísio Teixeira idealizou e implantou o Centro Educacional Carneiro
Ribeiro, no bairro popular da Liberdade, na capital da Bahia, Salvador. O intuito desta
proposta era propiciar o desenvolvimento intelectual, cívico, artístico e recreativo das crianças
das classes populares, por meio do acesso à “Escola Parque”, que ocorria no contraturno
escolar com atividades diversificadas e diferenciadas da “Escola Classe”, que desenvolvia
atividades voltadas para o conhecimento historicamente acumulado. O centro era composto
por quatro escolas e uma escola parque. As funções da escola foram ampliadas por um
programa completo de leitura, aritmética e escrita, ciências físicas e sociais, artes industriais,
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desenho, música, dança, educação física, saúde e alimentação.
Este Centro Educacional em tempo integral serviria como modelo para futuros
projetos educacional. As crianças inseridas nesta proposta recebiam uma educação ativa e
integral, sendo-lhes ofertado desde a alimentação até a preparação para o trabalho e a
cidadania. Este modelo inovador implantado por Anísio Teixeira, além de ser divulgado pela
UNESCO em outros países, serviu também de inspiração para a construção do sistema
educacional da cidade de Brasília. (VALADARES, 2011)
No início da década de 60, sob a coordenação de Anísio Teixeira, foi criada uma
comissão, composta por Darcy Ribeiro, Cyro dos Anjos, dentre outros, que, inspirada no
modelo de educação integral do Centro Educacional Carneiro Ribeiro, planejou o Sistema
Educacional de Brasília com o objetivo de que este servisse de referência para todo o Brasil.
As escolas foram projetadas por Niemayer e tinham capacidade para atender cerca de
trinta mil habitantes, residentes nas quatro superquadras iniciais. Cada superquadra recebeu
uma “Escola-Classe” e um Jardim de Infância. Em uma das superquadras foi construída a
“Escola-Parque”, para receber no turno oposto os alunos das “Escolas-Classe”, oferecendo
atividades físicas, esportivas, artísticas e culturais.
No Sistema Educacional de Brasília o processo ensino-aprendizagem passou a focar o
interesse do aluno, substituindo os programas rígidos de conteúdo por projetos previamente
planejados, com diretrizes traçadas e executado no ambiente escolar. O estudante, em busca
de respostas para suas inquietações, passou a ser ativo no contexto escolar, modificando a sua
forma de agir e pensar.
As contribuições de Anísio Teixeira para a educação integral estão embasadas na
concepção de que educação é vida, que a escola deve suprir as capacidades educativas que
deixaram de ser assumidas por algumas instituições sociais e que a escola deve ser
democrática. A obra de Anísio Teixeira baseou-se em dois pilares: utopia e democracia. Ele
foi incansável na luta por uma educação pública brasileira de qualidade e laica que
contribuísse para o desenvolvimento e a modernização do Brasil. (CHAGAS; SILVA,
SOUZA, 2012).
Para Anísio Teixeira, a aprendizagem acontece a partir da ação, ou seja, é no processo
ativo que o homem se forma e se desenvolve, e não em um movimento exógeno de
aprendizagem formal. (CAVALIERE, 2010).
31
A Universidade de Brasília (UnB) e o Plano para a Educação Básica foram criados
pelo Sistema Educacional de Brasília.
A concepção de educação integral iniciada na década de 30 e que perdurou em
“ebulição” até o início da década de 60, encontrou no ano de 1964 uma estagnação em
decorrência da ditadura militar, voltando na década de 80 a ser posta em voga novamente no
Estado do Rio de Janeiro.
Na década de 80, no Rio de Janeiro, foi iniciado o Programa Especial de Educação
(PEE), propondo diferentes projetos educacionais para o Estado, com o objetivo de consolidar
um ensino público moderno, aparelhado e democrático. Um dos eixos educacionais do
Programa era instituir progressivamente os CIEPs – Centros Integrados de Educação Pública,
oferecendo às camadas populares educação em tempo integral. O governo considerou a
educação como prioridade política, objetivando oferecer uma escola pública de qualidade e
honesta para com o seu compromisso social.
Os CIEPs foram idealizados por Darcy Ribeiro e implantados no Rio de Janeiro em
1985 e 1994, durante os dois mandatos de Leonel Brizola. Inspirados na experiência de Anísio
Teixeira e arquitetados por Oscar Niemeyer, os CIEPs eram escolas de horário integral
atuantes nas áreas de educação, cultura e saúde e visavam a proporcionar uma escola pública
de qualidade para as camadas populares e aberta para a comunidade local.
No total foram construídos aproximadamente quinhentos prédios escolares,
preferencialmente em regiões que atendessem a população carente. A infraestrutura
possibilitava desenvolver o que se denominava de “Escola Integral em horário integral”.
O CIEP padrão era composto por três blocos: o bloco principal com três andares, onde
se localizavam as salas de aula, um centro médico, a cozinha, o refeitório e áreas de recreação.
O segundo bloco, conhecido como “Salão Polivalente”, era composto pelo ginásio coberto
com quadra, arquibancada e vestiários. E o terceiro bloco, em formato octogonal, abrigava a
biblioteca, e sobre ela as moradias para alunos residentes. Este padrão sofreu adaptações
conforme as dimensões dos terrenos destinados à construção dos CIEPs.
Os CIEPs, como “Escola Integral em horário integral”, propunham oferecer aos
estudantes alimentação completa, aulas diversificadas, estudo dirigido, esporte, lazer, material
escolar, assistência médica e dentária e higiene, garantindo inclusive o banho diário dos
alunos.
32
O CIEP se propõe como uma “escola-casa” que pretende respeitar os direitos das
crianças. Assumindo como verdadeiros alguns dos supostos fatores pelos quais os
estudantes não permanecem nas escolas ou não obtém rendimento adequado
(desnutrição, dificuldades para a aquisição de material escolar, doenças infecciosas,
deficiências de saúde – problemas dentários, visuais e auditivos), o CIEP se propõe
superar esses obstáculos mediante programas de alimentação, subsídio aos pais e
programas de atendimento médico-odontológico, de modo que os estudantes tenham
as melhores condições para aprender. (PARO, 1986, p. 20)
O tempo integral estava planejado para nove horas diárias de atividades, supondo sete
horas de atividades escolares e recreio e duas horas para refeições e higiene, com
acompanhamento de duas professoras por turma, além dos professores complementares. As
atividades iniciavam-se às oito horas da manhã e se estendiam até às dezessete horas. Os
professores responsáveis pela turma e os complementares, tais como, os professores de
estudos dirigidos, os videoeducadores, animadores culturais e professores de educação física
possuíam um tempo para estudar e planejar suas atividades, garantido ao longo das oito horas
da jornada de trabalho. Os professores eram contratados para uma jornada de quarenta horas
semanais.
Na proposta dos CIEPs toda a comunidade educativa envolvida se responsabilizava
pela formação integral dos estudantes. Os CIEPs abrangiam a responsabilidade social da
educação para além do corpo docente e, neste processo, co-responsabilizavam outros atores e
a comunidade local.
(...) o atual momento histórico aumenta a participação comunitária nas principais
instituições da sociedade, o que vai ao encontro da proposta democratizadora dos
CIEPs.(...). Partindo de uma concepção mais abrangente da função escolar, cada
CIEP trabalha no sentido de recuperar o papel político e social da escola, no
contexto de uma relação mais ampla com a comunidade. A escola se integra à
comunidade, contribuindo para a educação coletiva. (RIBEIRO, 1986, p.48).
A proposta pedagógica dos CIEPs era inovadora. O elemento fundamental desta
proposta era o respeito ao universo cultural do estudante e a valorização da sua realidade
concreta. Os professores, conforme a proposta, deveriam se esforçar para promover a
autoconfiança de seus alunos e, assim, aguçar a vontade de querer aprender cada vez mais.
Em consonância com esta proposta, valorizava-se a necessidade de cuidar das relações
afetivas presentes no contexto escolar; tais como, professor-aluno, aluno-aluno... Por meio do
desenvolvimento de projetos integrados e interdisciplinares pretendia-se construir e vivenciar
ações educativas que extrapolassem os muros da escola.
Não apenas as aulas planejadas pelos professores eram valorizadas, mas também o
tempo livre do aluno, como, por exemplo, o horário do recreio.
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...na dinâmica dos CIEPs, o recreio e as brincadeiras são considerados essenciais ao
processo ensino/aprendizagem. E existe sempre uma hora em que cada aluno se
torna dono absoluto de seu tempo, para fazer o que achar melhor dentro do espaço
escolar. (RIBEIRO, 1986, p.48).
Para enfrentar dois desafios presentes na educação básica brasileira, a alfabetização e a
diminuição da evasão escolar, o Programa Especial de Educação, planejou medidas para
serem aplicadas nos CIEPs com o objetivo de combater esta problemática, como, por exemplo,
a elaboração de um grande curso de alfabetização da 1ª à 8ª série e a produção de um material
didático específico para este curso.
Existia a intenção de que os CIEPs, a partir da experiência no Rio de Janeiro, se
disseminassem por toda a nação brasileira, integrando-os às escolas convencionais existentes.
(...) não se pretende que os CIEPs atendam a todos em curto espaço de tempo, mas
sim, a médio e longo prazos, fazer de sua experiência um padrão capaz de modificar
para melhor toda a rede regular de ensino.(...) O objetivo final é que, verificando a
viabilidade econômica, política e pedagógica dos CIEPs, os governantes se vejam
mobilizados pela própria população a criar as condições materiais e administrativas
para transformar todas as escolas públicas em CIEPs. (RIBEIRO, 1986, p.43).
Os governantes seguintes não garantiram a continuidade da proposta dos CIEPs,
alegando ser um investimento caro para suposta falta de verba. No entanto, em outros Estados
brasileiros, foram implantados outros projetos que também propunham a ampliação da
jornada escolar, como o PROFIC no Estado de São Paulo e os CAICs em vários Estados
brasileiros.
O Programa de Formação Integral da Criança (PROFIC), foi implementado no Estado
de São Paulo entre os anos de 1980 e 1990. Ele consiste basicamente no repasse de verbas
para as escolas da rede pública da prefeitura ou de entidades particulares conveniadas, que
atendem alunos selecionados da rede púbica para participar do Programa.
A proposta abrange, portanto, uma parcela selecionada a partir das características
socioeconômicas e/ou do desempenho acadêmico. Os estudantes atendidos no Programa
permanecem em aula no turno já matriculado e composto pelo currículo de base comum e, no
que seria o contraturno, os mesmos permanecem na escola ou se dirigem às entidades
conveniadas para fazer a refeição e realizar atividades complementares, tais como: atividades
artísticas, esportivas, de lazer, pré-profissionalizantes e de reforço escolar. (FERRETI et al,
1991)
Os Centros de Atenção Integral à Criança (CAICs), criados na década de 90 e
implantados em diversos Estados brasileiros, tinha o objetivo de desenvolver as ações
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propostas pelo PRONAICA, Programa Nacional de Atenção Integral à Criança e ao
Adolescente, lançado em âmbito nacional pelo MEC. (MAURÍCIO, 2002). O objetivo do
PRONAICA era promover a atenção integral às crianças e aos adolescentes, por meio de
ações de educação, saúde, assistência e promoção social e integração comunitária, a partir das
seguintes diretrizes:
a) a garantia do direito da criança ao pleno desenvolvimento de suas capacidades e
potencialidades;
b) a universalização do atendimento às necessidades básicas da criança e do
adolescente, embora priorizando medidas voltadas à população mais pobre e
sem assistência;
c) a oferta de serviços de qualidade para as crianças, em oposição a soluções
precárias e improvisadas, parciais, descontínuas e meramente assistencialistas;
d) a irradiação e a disseminação de novas tecnologias, adequadas à atenção
integral;
e) a intersetorialidade, a intercomplementaridade, a articulação de ações;
f) a descentralização das ações, pela ação compartilhada entre união, estados e
municípios e entre os diversos setores sociais e a comunidade, e o
compartilhamento de responsabilidades;
g) a flexibilidade em termos normativos, programáticos e gerenciais.
(BRASIL, 1993, p. 19)
Os Centros Educacionais Unificados - CEUs – foram implantados, por Decreto
Municipal, na cidade de São Paulo entre os anos 2000 e 2004, abrangendo principalmente a
periferia da capital, com o objetivo de desenvolver atividades educacionais, recreativas e
culturais, em um mesmo espaço físico, constituindo-os como um espaço de convivência
comunitária.
Os CEUs foram construídos para atender as crianças da educação infantil e do ensino
fundamental em tempo integral. A estrutura física dos CEUs foi projetada para esta proposta e
para atender a comunidade também nos finais de semana, com teatro, biblioteca, sala de
música e dança, duas orquestras, rádio comunitário, estúdios de produção e gravação
multimídia, escola de iniciação artística, ginásio coberto, quadras, pista de skate, tele centro,
padaria, centro comunitário e piscina.
Alguns municípios, como Belo Horizonte (MG), Apucarana (PR), Nova Iguaçu (RJ) e
Palmas (TO), entre outros, apresentam experiências diferenciadas de jornada ampliada, mas
embasadas nas propostas acima mencionadas.
A Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, em 2006, implantou o Programa Escola
Integrada coordenado pela Secretaria Municipal de Educação em parceria com Instituições de
Ensino Superior, ONGs, empresas municipais de processamento de dados e de transporte,
comerciantes, todos construindo uma rede responsável pela educação integral de crianças e
jovens, sendo, portanto, um programa intersetorial.
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O Programa tem como objetivo a formação integral dos estudantes, melhorando a
aprendizagem a partir de um processo que abranja as múltiplas dimensionalidades formativas
do sujeito e faça uso dos diferentes espaços públicos urbanos. Assim, transforma diferentes
espaços da cidade em espaços educativos, seguindo o conceito de Cidades Educadoras.
(CENPEC, 2011). O Programa amplia a jornada educativa para nove horas diárias por meio
da oferta de atividades diversificadas e articuladas ao Projeto Político Pedagógico (PPP).
Cada escola é responsável por tecer o seu próprio projeto político- pedagógico
territorializado a partir das possíveis redes socioeducativas locais. Com essa lógica,
novos fluxos de saber podem ser construídos a partir dos valores, conhecimentos,
experiências e recursos disponíveis em cada comunidade, em um intenso movimento
de dentro para fora e de fora para dentro da escola. Reconhecer outros espaços de
exercício da vida, do conhecer e do fazer tende a ampliar o repertório de crianças e
jovens, bem como favorecer a atuação cidadã. (MACEDO et al. 2012, p. 416)
De início o Programa foi implantado como uma experiência piloto em sete escolas
municipais. Atualmente cento e trinta escolas são atendidas pelo Programa e se pretende uma
expansão progressiva para toda a rede municipal.
O município de Apucarana/PR iniciou em 2001 o Programa de Educação Integral, que
foi regulamentado pela Lei Municipal nᵒ 90/01. A proposta tem o objetivo de elevar a
qualidade da educação municipal, ampliando os conhecimentos do educando e permitindo
uma visão globalizada e aprofundada dos conteúdos curriculares. (CENPEC, 2011). O
Programa é coordenado pela Secretaria de Desenvolvimento Humano e atende as trinta e sete
escolas municipais do ensino fundamental e vinte Centros Educacionais Infantis.
A proposta de Apucarana está embasada no conceito de educação integral, na qual o
educando é visto em uma dimensão de integralidade dos aspectos cognitivos, político-sociais,
ético-culturais e afetivos. Para tanto o Programa procura ir além do senso comum de uma
separação entre turno e contraturno, ou de tempo integral limitado à ampliação do tempo de
permanência dos alunos na escola.
...as atividades, para que possam compor o currículo das escolas apucaranenses,
possuem um caráter de integração interdisciplinar, e não de simples ocupação do
aluno enquanto permanece na escola. (SILVA, C. A. 2012, p. 375)
O Programa conta com a parceria da comunidade, de instituições de ensino superior,
clubes de serviço, associações, instituições militares, ONGs, família, voluntários e outros.
Com o intuito de garantir a sua efetividade, firmou-se quatro pactos com a sociedade
organizada: Pacto pela Educação, Pacto pela Responsabilidade Social, Pacto pela Vida e Pacto
por uma Cidade Saudável.
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A experiência de Apucarana serviu de referência e motivação para municípios como
Porecatu, Realeza, Mauá da Serra, Paranaguá, Telêmaco Borba, Cornélio Procópio,
Sertanópolis e Penápolis implantarem a educação integral.
O Bairro-Escola é um programa municipal de educação integral, implantado na cidade
de Nova Iguaçu/RJ em 2006 e universalizado em 2010 para todas as escolas do ensino
fundamental da rede municipal, abrangendo do 1ᵒ ao 9º ano. O Programa está embasado em
dois conceitos: “Cidade Educadora”, que parte da ideia de que a educação não ocorre apenas
na escola, mas em todos os espaços da comunidade; e “Educação Integral”, que promove o
desenvolvimento do educando em suas múltiplas dimensões, considerando o corpo, a mente e
a vida social. A proposta tem por objetivo integrar a criança com o lugar onde mora, reduzir as
desigualdades sociais e melhorar o rendimento escolar.
O Bairro-Escola configura-se, antes de tudo, como um sistema de conexões. Criado
para juntar o que está separado, encadeando os problemas para encontrar soluções
integradas, ele afirma-se como um movimento de conversão dos condicionamentos,
carências e precariedades em potencialidades e oportunidades. (SILVA, 2012, p.
381).
O Programa busca oferecer o desenvolvimento integral das crianças e dos adolescentes,
por meio da ampliação dos espaços educativos para além dos muros da escola, das
oportunidades educativas, incorporando à matriz curricular regular atividades complementares
de cultura, esporte, lazer, saúde e meio ambiente, e a participação de diversos atores socais
envolvidos no processo educativo, tais como os profissionais da educação e também equipes
de ONGs conveniadas ao Programa. Para tanto, ampliou-se a jornada escolar de quatro horas
para pelo menos sete horas diárias.
As atividades complementares ocorrem no contraturno e são associadas às orientações
dos Parâmetros Curriculares Nacionais, PCNs, e ao Projeto Político Pedagógico, PPP, de cada
escola. Podem ser desenvolvidas por monitores (oficineiros e voluntários) selecionados entre
moradores e integrantes das entidades parceiras.
O município de Palmas/TO implantou em 2005 o Programa de Educação Integral de
Palmas, com a elaboração do projeto pedagógico e arquitetônico para as escolas de tempo
integral. A proposta pedagógica consiste em uma matriz curricular integrada entre o núcleo
comum, composto pelo conhecimento historicamente acumulado, e o núcleo diversificado,
com atividades diferenciadas.
A proposta foi estruturada em cinco modalidades: Salas Integradas (SIN), Centros
37
Municipais de Educação Infantil (CMEIS), Escolas Municipais de Tempo Integral do Campo,
Escola Integral de Jornada Ampliada (JA) e Escola de Tempo Integral (ETI). Esta última
modalidade é objeto da presente pesquisa e será mais aprofundada nos próximos capítulos.
A primeira modalidade é o projeto das Salas Integradas, que propôs a adaptação das
escolas com a instalação de laboratórios de informática e laboratórios de línguas, e a
organização de espaços para práticas esportivas e culturais, objetivando atender os alunos no
contraturno com atividades extraescolares.
Inicialmente, para atender os estudantes, o projeto contava com convênios firmados
com federações e associações na área esportiva e cultural. Em 2008, o projeto Salas
Integradas foi associado ao Programa Mais Educação do Ministério da Educação.
Os Centros Municipais de Educação Infantil, segunda modalidade, foram implantados
em 2005 com a proposta de reformular os projetos pedagógicos e arquitetônicos da educação
infantil e ampliar as matrículas neste segmento da escolaridade.
As unidades antigas foram adaptadas e ampliadas em seus espaços para corresponder
ao novo projeto educacional. Também foram construídas novas unidades e, assim, ampliou-se
o número de salas de aulas para atender a educação infantil, tendo um salto de trinta e duas
salas de aulas precedentes ao projeto para cento e quatorze salas.
Os CMEIS atendem crianças de quatro meses a três anos e onze meses, por dez horas
diárias. Segundo dados da Secretaria Municipal, no período de 2005 a 2010 as matrículas em
creche integral passaram de 822 para 2.029.
A terceira modalidade é composta pelas Escolas Municipais de Tempo Integral do
Campo que foram implantadas em 2008 nas cinco unidades rurais existentes. Os espaços
educacionais foram ampliados com a construção de quadras cobertas, laboratórios e salas de
aula multiuso.
O atendimento nas ETIs do campo é em tempo integral. Assim, os alunos permanecem
em atividades escolares por sete horas e meia, de segunda a quinta-feira. Na sexta-feira os
professores se reúnem na escola para o planejamento semanal. Nesse dia, os alunos
permanecem em suas residências realizando atividades de leitura, tarefas de casa e projetos de
pesquisa. A ampliação do tempo de permanência dos estudantes nas escolas do campo reduziu
em mais de 50% os gastos com transporte e o tempo em que as crianças permaneciam no
38
interior dos veículos. (SOUZA, 2012).
A quarta modalidade é o projeto Escola Integral de Jornada Ampliada, que teve início
em 2008 e consiste na ampliação e adaptação dos espaços físicos das escolas de tempo parcial
para atendimento em tempo integral. A Secretaria da Educação propõe com este Projeto a
universalização da educação em tempo integral, ficando a critério da família a escolha da
jornada parcial ou integral.
A Escola de Tempo Integral Padrão é a quinta modalidade de educação integral
oferecida pelo Sistema Municipal de Ensino e, como anteriormente mencionado, é objeto da
presente pesquisa. O projeto consiste na construção de escolas que foram planejadas para
atenderem em tempo integral, com jornada de nove horas diárias de permanência dos
estudantes.
O currículo dessas unidades escolares oferece disciplinas correspondentes à base
nacional comum, intitulada pelo projeto de Núcleo Comum e disciplinas diversificadas na
área dos esportes e das artes, que compõe o Núcleo Diversificado. As informações detalhadas
desta modalidade encontram-se no Capítulo III.
Em 2007, por meio da Portaria Normativa Interministerial nᵒ 17/2007, foi instituído o
programa educacional brasileiro “Mais Educação”, que integra as ações do Plano de
Desenvolvimento da Educação, como uma estratégia do governo para induzir a ampliação da
jornada escolar e a organização curricular, na perspectiva de Educação Integral.
O Programa envolve os ministérios da Educação, Cultura, Esporte e do
Desenvolvimento social e combate à fome. A iniciativa foi coordenada pela Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD/MEC), em parceria com a
Secretaria de Educação Básica (SEB/MEC) e com as Secretarias Estaduais e Municipais de
Educação, e atualmente está sob a responsabilidade da Secretaria de Educação Básica.
A operacionalização do Programa Mais Educação é feita pelo Programa Dinheiro
Direto na Escola, do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (PDDE/FNDE), que
financia as ações desde 2008, desencadeando o processo de adesão das escolas e redes de
ensino.
O Programa Mais Educação inicialmente atendia as capitais, as áreas com
vulnerabilidade social e escolas de baixo Índice de Desenvolvimento na Educação Básica,
39
IDEB, escolas localizadas em municípios atendidos pelo Programa Nacional de Segurança
Pública com Cidadania (PRONASCI), do Ministério da Justiça e também municípios das
áreas de desmatamento da região da Amazônia.
Posteriormente passou a atender municípios com mais de 100 mil habitantes e, em
Estados de pouca densidade populacional, municípios com mais de 50 mil habitantes.
O programa é uma estratégia do governo, com base no Plano de Desenvolvimento da
Educação para fomentar a ampliação da jornada escolar de crianças, adolescentes e jovens, de
forma a ampliar os espaços, o tempo e as oportunidades educativas, por meio do apoio a
atividades socioeducativas no contraturno escolar. Ele é composto por dez macrocampos, tais
como, acompanhamento pedagógico, meio ambiente, esporte e lazer, direitos humanos,
cultura e artes, cultura digital, prevenção e promoção à saúde, comunicação e uso de mídias,
iniciação à investigação das ciências da natureza e educação econômica.
1. Acompanhamento pedagógico – Ensino fundamental: matemática, letramento,
ciências, história, geografia, línguas estrangeiras. Ensino médio, matemática,
leitura e produção de texto ou português, cinética química, reações químicas,
eletroquímica, química orgânica, física ótica, circuitos elétricos, calorimétrica,
célula animal, estrutura do DNA; coleta de sangue, história e geografia, filosofia e
sociologia.
2. Meio Ambiente – Com-Vidas, Agenda 21 na escola, educação para a
sustentabilidade, hora escolar e/ou comunitária.
3. Esporte e lazer – Recreação e lazer, voleibol, futebol, basquete, handebol, tênis de
mesa, judô, caratê, taekwondo, yoga, natação, xadrez tradicional, xadrez virtual,
atletismo, ginástica rítmica, corrida de orientação, ciclismo, tênis de campo.
Basquete de rua, Programa Segundo Tempo.
4. Direitos Humanos – Direitos humanos e ambiente escolar, aprendizagem e
convivência.
5. Cultura e Arte – Leitura, banda fanfarra, canto coral, hip-hop, dança, teatro, pintura,
grafite, desenho, escultura, percussão, capoeira, flauta doce, cineclube, práticas
circenses, mosaico.
6. Cultura digital – Software educacional, informática e tecnologia da informação,
40
ambiente de redes sociais.
7. Prevenção e promoção à saúde – Alimentação saudável, saúde bucal, práticas
corporais e educação do movimento, saúde sexual reprodutiva e prevenção às
DST/Aids, prevenção ao uso do tabaco e outras drogas, saúde ambiental,
promoção da cultura de paz, prevenção às violências e acidentes, estratégias de
promoção da saúde, prevenção à dengue, febre amarela, malária, hanseníase,
doença falciforme e outras (Articulação com o Programa Saúde na Escola –
MEC/MS)
8. Comunicação e uso de mídias – Jornal escolar, rádio escolar, histórias em
quadrinhos, fotografia, vídeo.
9. Iniciação a investigação das ciências da natureza – Laboratório, feiras e projetos
científicos.
10. Educação econômica – Direitos do consumidor, educação financeira,
empreendedorismo, cidadania fiscal.
O Programa considera a ampliação da jornada escolar um aspecto favorável para a
redução da desigualdade social. Para tanto, sugere alguns critérios para selecionar o público a
ser atendido.
- estudantes que estão em situação de risco, vulnerabilidade social e sem assistência;
- estudantes que congregam seus colegas – incentivadores e líderes positivos (âncoras);
- estudantes em defasagem série/idade;
- estudantes das séries finais da 1ª fase do ensino fundamental (4º e 5º anos), nas quais
há maior evasão na transição para a 2ª fase;
- estudantes das séries finais da 2ª fase do ensino fundamental (8ª e/ou 9º anos), nas
quais há um alto índice de abandono;
- estudantes de séries onde são detectados índices de evasão e/ou repetência.
A partir desses critérios acima citados, cada escola definirá quantos e quais alunos
participarão das atividades do Programa Mais Educação.
41
Atualmente há dois formatos de ampliação do tempo escolar no Brasil: um mais
centrado na escola, com investimento no interior das unidades escolares e de seus
profissionais, e outro que busca apoios e parcerias de agentes externos à escola.
2.2 – Políticas públicas
A trajetória da Educação em Tempo Integral constituída historicamente no Brasil foi
permeada e estimulada por políticas públicas implementadas, sobretudo a partir da
promulgação da Constituição Federal de 1988.
A Constituição Federal de 1988, no Capítulo III – Da Educação, Da Cultura e do
Desporto, Seção I – Da Educação assegura pelos artigos, 205, 206, 208 e 213 que embora a
educação seja um dever do estado e da família envolve a participação da sociedade para o
pleno desenvolvimento da pessoa, devendo ser igualitárias as condições de acesso e
permanência na escola e garantindo o atendimento aos portadores de deficiência e o
atendimento em creches e pré-escolas de 0 a 6 anos de idade. Garante o repasse de recursos
públicos às escolas públicas, comunitárias, confessionais ou filantrópicas.
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho.
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
Art. 208. O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de:
III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino;
IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças de 0 a 6 anos de idade.
Art. 213. Os recursos públicos serão destinados às escolas, podendo ser dirigidos a
escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que:
I – comprovem finalidade não lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em
educação. (BRASIL, 1988)
O artigo 227 da Constituição Federal de 1988 garante à criança, ao adolescente e ao
jovem o direito a uma vida digna e capaz de formá-lo integralmente, corresponsabilizando as
diversas instituições para o intento.
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao
adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a
salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade
e opressão. (BRASIL, 1988)
42
A Constituição Federal de 1988, conforme supracitado estabelece uma ampla rede de
proteção às crianças e aos adolescentes.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) apresentado na lei 8069 que foi
instituída no dia 13 de julho de 1990, garante a proteção integral às crianças e jovens
brasileiros.
No Título I – Das Disposições Preliminares, os artigos 3 e 4 garantem os recursos
necessários ao pleno desenvolvimento da criança e do adolescente.
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à
pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-
se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de
lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em
condições de liberdade e de dignidade.
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público
assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
(BRASIL, 1990)
O capítulo IV, artigo 53 do ECA, garante o acesso e a permanência de crianças e
jovens na escola.
Art.53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno
desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação
para o trabalho, assegurando-se-lhes: I – igualdade de condições para o acesso e
permanência na escola;
II – direito de ser respeitado por seus educadores;
III – direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias
escolares superiores;
IV – direito de organização e participação e entidades estudantis;
V – acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência.
Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo
pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais.
(BRASIL, 1990).
Os artigos 56, 57, 58 e 59 propõem um sistema integrado e articulado de atenção à
criança e ao adolescente associado ao desenvolvimento integral dos mesmos.
Art. 56. Os dirigentes de estabelecimentos de ensino fundamental comunicarão ao
Conselho Tutelar os casos de:
I – maus tratos envolvendo seus alunos;
II - reiteração de faltas injustificadas e de evasão escolar, esgotados os recursos
escolares;
III – elevados níveis de repetência
Art. 57. O poder público estimulará pesquisas, experiências e novas propostas
relativas a calendário, seriação, currículo, metodologia, didática e avaliação, com
vistas à inserção de crianças e adolescentes excluídos do ensino fundamental
obrigatório.
Art. 58- No processo educacional respeitar-se-ão os valores culturais, artísticos e
históricos próprios do contexto social da criança e do adolescente, garantindo-se a
estes a liberdade de criação e o acesso às fontes de cultura.
43
Art. 59 – Os municípios, com apoio dos estados e da União, estimularão e facilitarão
a destinação de recursos e espaços para programações culturais, esportivas e de lazer
voltadas para a infância e a juventude. (BRASIL, 1990).
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), formulada em 1996, 9394/96, no
Título V – Dos Níveis e das Modalidades de Educação e Ensino, Capítulo II – Da Educação
Básica, Seção III – Do Ensino Fundamental, em seu artigo 34 deixa clara a intenção da
extensão do horário escolar para o Ensino Fundamental:
Art. 34. A jornada escolar no ensino fundamental incluirá pelo menos quatro horas
de trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de
permanência na escola.
§ 1o São ressalvados os casos do ensino noturno e das formas alternativas de
organização autorizadas nesta lei.
§ 2o O ensino fundamental será ministrado progressivamente em tempo integral, a
critério dos sistemas de ensino. (LDB, 2010, p. 28)
Ao instituir a década da educação, as disposições transitórias da LDB discorrem;
§ 5º Serão conjugados todos os esforços objetivando a progressão das redes
escolares públicas urbanas de ensino fundamental para o regime de escolas de tempo
integral. (BRASIL, 1996)
No ano de 2001 o Governo Federal sanciona a lei 10.172, que aprova o Plano
Nacional de Educação com duração decenal. Dentre as diretrizes contidas neste documento
destaca-se a diretriz 2.2 do Ensino Fundamental que traz a questão da educação em tempo
integral como sendo iniciativas inovadoras e em expansão no Brasil.
A oferta qualitativa deverá; em decorrência, regularizar os percursos escolares,
permitindo que crianças e adolescentes permaneçam na escola o tempo necessário
para concluir este nível de ensino, eliminando mais celeremente o analfabetismo e
elevando gradativamente a escolaridade da população brasileira. A ampliação da
jornada escolar para turno integral tem dado bons resultados. O atendimento em
tempo integral, oportunizando orientação no cumprimento dos deveres escolares,
prática de esportes, desenvolvimento de atividades artísticas e alimentação adequada,
no mínimo em duas refeições, é um avanço significativo para diminuir as
desigualdades sociais e ampliar democraticamente as oportunidades de
aprendizagem.
O turno integral e as classes de aceleração são modalidades inovadoras na tentativa
de solucionar a universalização do ensino e minimizar a repetência.
A LDB, em seu art. 34, § 2º, preconiza a progressiva implantação do ensino em
tempo integral, a critério dos sistemas de ensino, para os alunos do ensino
fundamental. À medida que forem sendo implantadas as escolas de tempo integral,
mudanças significativas deverão ocorrer quanto à expansão da rede física,
atendimento diferenciado da alimentação escolar e disponibilidade de professores,
considerando a especificidade de horários.
Além do atendimento pedagógico, a escola tem responsabilidades sociais que
extrapolam o simples ensinar, especialmente para crianças carentes. Para garantir um
melhor equilíbrio e desempenho dos seus alunos, faz-se necessário ampliar o
atendimento social, sobretudo nos municípios de menor renda, com procedimentos
44
como renda mínima associada à educação, alimentação escolar, livro didático e
transporte escolar. (BRASIL – 2001)
Diante das diretrizes, o Plano Nacional da Educação, instituído em 2001, traça dois
objetivos e metas, 21 e 22, para a educação em tempo integral no Ensino Fundamental, a fim
de que sejam alcançados durante o decênio de vigência do mesmo.
21) Ampliar, progressivamente a jornada escolar visando a expandir a escola de
tempo integral, que abranja um período de pelo menos sete horas diárias, com
previsão de professores e funcionários em número suficiente.
22) Prover, nas escolas de tempo integral, preferencialmente para as crianças das
famílias de menor renda, no mínimo duas refeições, apoio às tarefas escolares, a
prática de esportes e atividades artísticas, nos moldes do Programa de Renda
Mínima Associado a Ações Socioeducativas. (BRASIL –2001)
O Ministério da Educação cria em 2004 a Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização e Diversidade, com objetivo de universalizar o acesso, a permanência e a
aprendizagem na escola pública.
Por meio da Diretoria de Educação Integral, Direitos Humanos e Cidadania, a proposta
de uma Educação Integral que articule os entes federados, as organizações da sociedade civil
e a comunidade educativa, cria o Programa Mais Educação. O Programa Mais Educação foi
institucionalizado em 27 de janeiro de 2010, por meio do Decreto nº 7.083.
A Portaria Interministerial número 17/2007, instituiu o Programa Mais Educação,
integrando as ações do Plano de Desenvolvimento da Educação como estratégia do Governo
Federal para induzir a ampliação da Jornada Escolar e a organização curricular na perspectiva
de Educação Integral.
O Programa Mais Educação tem como objetivo a implantação da educação integral,
por meio de atividades socioeducativas no contraturno escolar, ampliando o tempo, os espaços
educativos e as oportunidades formativas aos alunos da rede pública escolar.
A partir do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), o Programa Mais
Educação foi instituído com o intuito de que a Educação Integral seja uma experiência
inovadora, sustentável ao longo do tempo e de qualidade. Assim, espera-se que a educação
pública garanta, por meio da Educação Integral, não apenas o acesso a ela, mas também a
permanência e a aprendizagem. Os decretos 6253/2007 e 7083/2007 legitimam o tempo
integral na educação básica a partir da jornada escolar igual ou superior a sete horas diárias,
durante todo o ano letivo.
45
Considera-se educação básica em tempo integral a jornada escolar com duração
igual ou superior a sete horas diárias, durante todo o período letivo, compreendendo
o tempo total que um mesmo aluno permanece na escola ou em atividades escolares.
(BRASIL, 2007a)
O novo Plano Nacional da Educação (2011 – 2021) está em processo de aprovação no
Congresso. A meta 6 propõe a ampliação de 50% das escolas em tempo integral.
Como podemos perceber, percorremos uma trajetória legal e de experiências diversas
no sentido de implementar a educação integral desde o início do século XX. Em algumas
circunstâncias, a descontinuidade, por parte dos gestores públicos em relação às propostas
inovadoras de educação integral em tempo integral ou jornada ampliada foi um dos entraves
para melhorar a qualidade da educação brasileira, na medida em que esta retrocedeu ao
desconsiderar o que foi vivido e construído na política educacional da gestão anterior.
Menezes (2009) pontua a necessidade desta continuidade na política educacional, bem
como a importância da legislação para efetivar a educação em tempo integral.
...há de se evidenciar que a importância da efetivação de uma educação integral
integrada em tempo ampliado/integral, especificamente nos últimos tempos, vem se
expressando por meio da profusão de legislação específica. Entende-se, no entanto,
que há um longo caminho a percorrer para transformar o legal em real, o qual
depende, dentre outros aspectos, da vontade política, do financiamento público, da
participação e mobilização da sociedade e da assistência técnica e financeira, por
parte da União, às instâncias subnacionais com maiores dificuldades financeira.
(MENEZES, 2009, p.84).
Notamos que a educação em tempo integral vem sendo discutida no âmbito legislativo,
mas que executá-la nos entes federados permanece sendo um desafio e uma busca de
estratégias diversas para a implantação da proposta nas comunidades escolares.
2.3 Financiamentos para a implementação da Educação Integral no Brasil
Percorremos a trajetória legal no século XX e início do XXI, no entanto, a educação
em tempo integral só se efetiva a partir de uma sólida estrutura de recursos. Para tanto, na
última década o Congresso Nacional aprovou dois fundos direcionados ao financiamento da
educação pública do país, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF) e em substituição a esse o Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da
Educação (FUNDEB).
46
Em 1996, foi aprovada pelo Congresso Nacional a Lei 9424/1996, que instituiu o
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério (FUNDEF). A partir da criação deste fundo a maior parte dos gastos em educação
de Estados e municípios foi direcionada para o Ensino Fundamental e ampliou o
financiamento da educação em 15% dos impostos, como o IPI e o ICMS, além de estabelecer
um valor mínimo de gastos anual por aluno. (CENPEC, 2011, p. 75)
Para substituir o FUNDEF, o Congresso Nacional instituiu em 2007, no âmbito do
Plano de Desenvolvimento da Educação, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da
Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB).
Seu raio de abrangência é maior que o FUNDEF, pois engloba não apenas o ensino
fundamental, mas também a educação infantil, o ensino médio e a educação de jovens e
adultos.
O FUNDEB diferencia o repasse financeiro por matrícula escolar, articulada à
modalidade, à etapa da educação e à ampliação da jornada escolar. Sendo assim, o FUNDEB
atribui maiores percentuais de distribuição de recursos à educação em tempo integral ou à
jornada ampliada. Desta forma, as escolas que possuem estudantes que permanecem o
mínimo de sete horas diárias na escola, nos cinco dias da semana, recebem um percentual
diferenciado de financiamento para viabilizar a permanência destes alunos conforme a
proposta integral, variando entre 25% a 30% a mais de recursos financeiros para estas escolas.
Esta política de Estado tornou a educação em tempo integral mais viável em se colocar em
prática aos olhos dos secretários estaduais e municipais de educação. (MONLEVADE, 2009).
A renda provinda dos impostos, que pelo FUNDEF destinava 15% para a educação,
pelo FUNDEB passam a ser repassado 20% dos valores arrecadados em determinados
impostos para toda a educação básica.
O Programa Nacional de Alimentação Escolar, implantado em 2008, atribui um
financiamento diferenciado aos estudantes que fazem parte do Programa Mais Educação.
A operacionalização do Programa Mais Educação está atrelada ao Programa Dinheiro
Direto na Escola (PDDE), que provém do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
(FNDE). Este Programa foi criado em 1995 e o seu objetivo é prestar assistência financeira
suplementar às escolas públicas da educação básica e às escolas privadas de educação especial
que são mantidas por entidades sem fins lucrativos. (CENPEC, 2011)
47
As políticas públicas, relativas à indução da educação em tempo integral, como o
Programa Mais Educação e o financiamento por meio do FUNDEB, ambos datados de 2007,
possibilitaram de lá para cá uma progressiva e acelerada tendência de ampliação da jornada
escolar. (CAVALIERE E MAURÍCIO, 2011). Considerando a jornada de mais de cinco horas
diárias na escola, o Censo Escolar 2004 apontou que 3,3% dos alunos matriculados no ensino
básico, estão inseridos nessa proposta. Em 2007, a porcentagem passou para 7,9% e em 2009
para 8,69%.
2.4 Dados Estatísticos
Experiências de ampliação da jornada escolar no ensino fundamental em curso no
Brasil.
Os dados aqui apresentados foram fornecidos pelo Relatório “Educação Integral/
educação integrada e(m) tempo integral: concepções e práticas na educação brasileira”. Este
relatório foi elaborado por um grupo de universidades públicas federais, tais como:
Universidade Federal do Paraná, Universidade de Brasília, Universidade Federal de Estado do
Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidade do Estado do Rio de
Janeiro, Universidade Federal de Minas Gerais e a Universidade Luterana do Brasil, a partir
de solicitação da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, do
Ministério da Educação (SECAD/MEC), por meio da Diretoria de Educação Integral, Direitos
Humanos e Cidadania (DEIDHUC). (BRASIL, 2009).
O estudo quantitativo acima mencionado contatou os 5564 municípios de todas as
regiões brasileiras e mapeou as experiências de jornada ampliada, atualmente em curso nas
redes municipais de educação. Do total de municípios selecionados, 38% participaram de fato
da pesquisa, respondendo ao questionário, percentual considerado estatisticamente
representativo. E, destes, 23,7% (o que corresponde a 500 municípios), desenvolvem
experiências de jornada escolar ampliada, em uma ou mais escolas de cada um desses
municípios. No total foram registradas 800 experiências de jornada ampliada, pois alguns
48
municípios apresentam mais de uma experiência, o que demonstra um dinamismo das
políticas e dos projetos no setor.
Por meio deste estudo notou-se que o número de jornada ampliada no Brasil ainda é
restrito. No entanto, está em processo de expansão, sinalizando uma tendência para a
educação brasileira.
O relatório ressalta que a recente expansão da jornada ampliada em todas as regiões
brasileiras provavelmente esteja relacionada às novas políticas federais de indução da
ampliação da jornada. Os dados evidenciam o uso do FUNDEB para o financiamento de
24,1% das experiências. Nesta perspectiva, o relatório infere que nos próximos anos tenderá a
ocorrer um aumento na oferta de matrículas em tempo integral.
Desta forma, as ações prioritárias focalizariam investimentos a favor da redução das
desigualdades na implantação da jornada entre municípios, Estados, regiões e as duas etapas
do ensino fundamental, e na garantia da qualidade dos diferentes projetos de jornada ampliada
que atualmente são bastante diversos. Tais diferenças nos aspectos quantitativo e qualitativo
indicam a necessidade de serem criadas diretrizes nacionais que norteariam os programas de
jornada ampliada. Assim, seriam evitadas disparidades num mesmo programa, e seria mantida
a adequação às necessidades da comunidade onde o mesmo está inserido, o que contribuiria
para a uniformidade científica do ensino, visando à formação mais completa do cidadão
brasileiro, ou, nos termos do relatório, “à necessidade de se construir referenciais, numa
perspectiva de qualificação do ensino brasileiro, tendo em vista a formação integral de nossas
crianças e adolescentes”. (BRASIL, 2009).
Como citado anteriormente, o relatório demonstra a inexistência de um modelo único
entre as experiências de jornada ampliada. Alguns dados comprovam este fato, tais como:
multiplicidade de nomenclaturas, diversas combinações entre dias da semana e horas que
caracterizam a jornada ampliada, a diversificação das atividades desenvolvidas e dos locais de
realização.
As questões relacionadas à organização do tempo, dos espaços educativos e das
atividades desenvolvidas são os três aspectos fundamentais da educação integral. Para tanto,
apresentamos as tabelas extraídas do relatório de mapeamento das experiências de educação
em tempo integral nestes três aspectos.
49
A tabela a seguir apresenta as formas de experiências de jornada escolar: turno
contrário, mescladas com as aulas regulares, e ambas as formas, distribuídas por regiões do
Brasil.
TABELA 1: Formas como as experiências de jornada escolar ampliada são realizadas,
segundo a região geográfica - 2008.
Formas
Regiões
Total Norte Nordeste Centro-oeste Sudeste Sul
Nᵒ %
Turno contrário 14 152 34 300 141 641 80,1
Mescladas com as aulas
regulares
1 27 5 39 15 87 10,9
Ambas as formas 1 24 5 30 12 72 9,0
Total 16 203 44 369 168 800 100,0
Fonte: BRASIL. Ministério da educação e cultura/ SECAD
A organização do tempo na jornada escolar ampliada, conforme podemos constatar,
apresentou uma predominância de 80,1% de atividades desenvolvidas no contraturno, sendo,
portanto, no período contrário ao da oferta das disciplinas do currículo escolar formal. Apenas
10,9% das experiências realizam as atividades de forma mesclada com as aulas regulares e
9,0% realizam as duas formas de organização do tempo, utilizando tanto a forma mesclada
quanto o contraturno.
Os espaços educativos precisam ser repensados a partir da nova oferta de atividades
propostas com a ampliação da jornada escolar. O relatório apresenta dois quadros neste
sentido, um relacionado ao uso dos espaços dentro da escola e outro relacionado ao uso de
espaços públicos ou não, porém extraescolar, evidenciando a ampliação do território
educativo.
Uma estratégia para viabilizar a implantação da educação em tempo integral e
minimizar o problema quanto à disponibilização de espaços intraescolares é articulá-los aos
espaços extraescolares, fazendo uso de espaços públicos e/ou privados da cidade.
50
A tabela a seguir apresenta alguns espaços fora da escola que são usados para realizar
atividades relacionadas à ampliação do tempo escolar.
TABELA 2: Locais fora da escola em que são realizadas as experiências de jornada escolar
ampliada, segundo a região geográfica – 2008.
Locais
Regiões Nᵒ
reg.
(total)
%
exp.¹ Norte Nordeste Centro-
Oeste
Sudeste Sul
Campo de
futebol/quadras
3 70 14 106 46 239 29,9
Praças públicas/parques 3 44 6 63 25 141 17,6
Bibliotecas 1 21 2 51 14 89 11,1
Espaços outras
secretarias
3 23 4 40 18 88 11,0
Clubes 1 19 6 46 15 87 10,9
Associações
comunitárias
1 19 7 31 24 82 10,2
Igrejas - 14 3 22 9 48 6,0
Casas particulares - 15 2 16 6 39 4,9
Museus 2 8 1 18 4 33 4,1
ONGs 1 9 - 15 2 27 3,4
Outros - 37 9 59 35 140 17,5
Total 15 279 54 467 198 1013 -
¹ O cálculo do percentual tomou por referência o total de experiências de jornada escolar ampliada
detectadas pela pesquisa (800). Fonte: BRASIL. Ministério da educação e cultura/ SECAD
Com podemos observar há uma predominância nos uso de espaços destinados à
realização de esportes, como campo de futebol e quadras, que apresentaram um percentual de
29,9% das atividades realizadas fora do ambiente escolar. O uso de parques e praças públicas
também apresentou um percentual significativo de 17,6%.
51
A jornada ampliada pressupõe a realização de atividade que vão além das disciplinas
formais, como podemos observar na Tabela 3.
TABELA 3: Atividades desenvolvidas nas experiências de jornada escolar ampliada,
segundo a região geográfica -2008.
Atividades
Regiões Nᵒ reg.
(total)
% exp.¹
Norte Nordeste Centro-
Oeste
Sudeste Sul
Esportes 6 123 33 241 117 520 65,0
Aula de reforço 6 125 33 231 99 494 61,7
Música 7 80 27 222 121 457 57,1
Dança 3 93 22 200 114 432 54,0
Teatro 4 67 22 183 95 371 46,4
Informática 9 50 25 185 96 365 45,6
Oficinas temáticas 5 84 22 164 84 359 44,9
Artesanato 2 47 21 169 85 324 40,5
Tarefas de casa 2 58 21 173 68 322 40,2
Artes plásticas 4 48 17 160 77 306 38,2
Artes visuais 6 41 17 127 53 244 30,5
Capoeira 6 61 14 93 46 220 27,5
Línguas estrangeiras 1 12 14 68 47 142 17,8
Oficinas formação
trabalho
3 21 5 40 21 90 11,2
Rádio/jornal 1 24 4 32 14 75 9,4
Outras atividades 1 14 7 48 40 110 13,8
Total 66 948 304 2336 1177 4831 -
¹ O cálculo do percentual tomou por referência o total de experiências de jornada ampliada
detectadas pela pesquisa (800). Fonte: BRASIL. Ministério da educação e cultura/ SECAD
Os dados apresentados indicam uma diversidade de atividades oferecidas nas
experiências de jornada ampliada escolar. No entanto, a quantidade de atividades oferecidas
nas regiões Sudeste e Sul são bem superiores comparadas às demais regiões.
52
A atividade esportiva apresenta um percentual de 65%, o que revela a preferência do
desenvolvimento desta atividade em relação às outras. A aula de reforço, também com um
percentual elevado, 61,7, indica a utilização do tempo a mais para trabalhar as necessidades
dos alunos, no que tange ao domínio dos conteúdos, e assim se configurando como mais uma
oportunidade de contribuir com a qualidade do processo de aprendizagem dos estudantes.
Segundo o relatório, a categoria denominada “outras atividades”, revelou no banco de
dados o desenvolvimento de projetos relacionados ao meio ambiente e à literatura. Também
estiveram presentes nesta categoria alguns esportes que não estavam presentes no questionário,
como xadrez, tênis de mesa, futsal, tae-kwon-do, caratê e judô.
Um desafio que se faz presente atualmente é a integração do período regular com o
contraturno, de tal forma que os turnos frequentados pelo aluno, com a implantação da
jornada ampliada, possuam uma relação mútua, com foco único, qual seja, a formação integral
do estudante.
Segundo o relatório, é esta integração que evitará que se constituam duas “escolas
diferentes” em uma. O projeto político pedagógico, sendo o documento que organiza todas as
ações da escola, a partir de um diagnóstico da realidade local, de um compartilhamento de
princípios e de um planejamento coletivo de estratégias, precisa também integrar os projetos
da Jornada Ampliada.
A portaria que instituiu o Programa Mais Educação, em diferentes artigos, determina
que as ações e projetos relacionados ao Programa estejam integrados ao PPP das redes e das
escolas participantes. Este fato indica a indução por parte do governo federal em, além de
estimular a ampliação da jornada escolar, também cuidar para que esta esteja integrada ao PPP.
A Tabela 4 apresenta a relação de experiências de jornada escolar ampliada que estão
articuladas ao Projeto Político Pedagógico nas cinco regiões do Brasil.
53
TABELA 4: Relação das experiências de jornada escolar ampliada com o Projeto
Político Pedagógico das escolas, segundo a região geográfica -2008
Experiências
Regiões Total
Norte Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul Nᵒ %
Integram o PPP 10 154 39 289 119 611 76,4
Não integram o PPP 6 47 5 79 47 184 23,0
Não resposta - 2 - 1 2 5 0,6
Total 16 203 44 369 168 800 100,0
Fonte: BRASIL. Ministério da educação e cultura/ SECAD
Os dados demonstram um percentual de 76,4 das experiências de ampliação da
jornada escolar articuladas ao PPP, e 23% delas não integram o PPP.
Como podemos observar, a ampliação da jornada escolar no Brasil vem se
configurando em inúmeras escolas. No entanto, o relatório apontou a falta de normatização da
mesma, sendo um percentual de 51,2% das experiências, o que gera o risco de continuidade
dos projetos, vinculando-os ao governo e não como política do Estado.
O relatório descreve a presença atualmente da intersetorialidade na gestão da
Educação Integral e a participação da comunidade neste novo contexto, da seguinte forma:
(...) o surgimento de formas de gestão compartilhada das experiências, em uma
perspectiva de intersetorialidade – notando-se a presença de secretarias como as de
Cultura, Esporte, Assistência Social, como parceiras da secretaria de educação (...) a
existência de uma proporção significativa de parcerias com a comunidade sinaliza
um enraizamento da escola no entorno e pode revelar um maior envolvimento dos
sujeitos (pais, moradores e outros) com as experiências (...) (BRASIL, 2009)
.
A intersetorialidade expande o compromisso da Educação Integral para além da
política educacional, agregando-se a ela outras políticas, tais como: Assistência Social,
Cultura, Esporte, entre outras. Com a integração das políticas, a escola de Tempo Integral,
expande seus espaços de atuação, seus agentes e, consequentemente, as aprendizagens. A
Tabela 2 comprova a experiência da intersetorialidade quando apresenta um percentual de
11% de atividades realizadas em espaços de outras secretarias.
54
O relatório é finalizado com o parágrafo abaixo e é a partir desta conclusão que a
presente pesquisa elucida a sua relevância científica e social.
Esse panorama revela um momento de dinamismo no que se refere à educação de
tempo integral no Brasil, evidenciando a necessidade de políticas e ações que
subsidiem os projetos em andamento e estimulem novas experiências, contribuindo
para reduzir as desigualdades e para qualificar as ações, tendo em vista a garantia do
direito à educação numa perspectiva integral. Nesse cenário, ressalta-se a
necessidade de estudos que possam colaborar para melhor entender a referida
diversidade, identificando tendências predominantes, destacando especificidades,
divulgando resultados e avaliando impactos... (BRASIL, 2009)
55
CAPÍTULO III
A PROPOSTA DE ESCOLA DE TEMPO INTEGRAL NO MUNICÍPIO DE PALMAS
3.1 O ESTADO DO TOCANTINS E O MUNICÍPIO DE PALMAS
O Estado do Tocantins faz parte da Região Norte do país. Porém, como está situado a
sudoeste da região, é constituído como uma zona de transição geográfica, apresentando
características tanto do Cerrado quanto da Floresta Amazônica.
O clima é tropical, com duas estações bem definidas: uma seca e com muito sol, de
maio a setembro, e outra chuvosa, de outubro a abril. A temperatura média anual é de 26ᴼ C.
A economia se baseia no comércio, na criação de animais (como gado) e na agricultura
de arroz, milho, feijão, soja e melancia.
O Estado do Tocantins tem uma população de 1.383.445 habitantes e uma área de
277.620 km², com um total de 139 municípios.
A unidade federativa do Tocantins é a mais recente do Brasil. De início a região
pertencia ao Estado de Goiás, tendo como capital o município de Goiânia, localizado mais ao
sul do Estado. Com a construção de Brasília, a Região Sul se desenvolveu rapidamente e de
forma promissora, com novos empreendimentos relacionados à indústria e ao agronegócio,
diferentemente da região norte do Estado, que sofria com pouca produção e carência de
tecnologia para o cultivo agrícola.
O atraso de desenvolvimento da região norte de Goiás em relação à região sul gerou
nas autoridades e na população em geral o desejo e a iniciativa de buscar a emancipação
política, vindo a se constituir, em 1989, como um novo Estado brasileiro com o nome de
Tocantins, pela resolução nᵒ 28, de 29 de dezembro de 1989.
A capital do Estado, Palmas, é uma cidade planejada, localizada no centro do Estado, à
margem direita do rio Tocantins. Por ter sido planejada, apresenta avenidas largas e diversas
áreas verdes.
56
O nome da cidade é uma homenagem à Comarca de São João de Palma, sede do
primeiro movimento separatista da região, e também se deve à predominância de palmeiras na
vegetação da região.
O município de Palmas contém aproximadamente 228.332 habitantes, em uma área de
2.219 km².
3.2 – A EDUCAÇÃO NO TOCANTINS E EM PALMAS
O Observatório de Equidade aponta o baixo nível de escolarização da população
brasileira, apresentando uma média de aproximadamente 7,5 anos em jovens de 15 anos ou
mais. Na Região Norte, este número cai para 7,1. Quando se compara a população urbana e a
rural, apresenta uma discrepância ainda maior, sendo 8,0 anos de escolarização para a
população urbana e 4,8 para a população rural da Região Norte do país. A taxa de
analfabetismo de pessoas de 15 anos ou mais na Região Norte é de 10,6, sendo, portanto,
maior que a média brasileira, que é de 9,7. (BRASIL, 2011a).
A população em idade escolar na unidade federativa do Tocantins é de 386.809. E a
taxa de analfabetismo é de 3,6% entre crianças de 10 a 14 anos e de 13,1% entre as pessoas
com mais de quinze anos. (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2010).
Focando o nosso olhar no município de Palmas, conforme dados recentes do IBGE,
grande parte das escolas implantadas atende crianças matriculadas no ensino fundamental,
uma vez que o município possui 48,9% de escolas voltadas para o ensino fundamental, 35,2%
de escolas para a educação infantil e 15,9% para o ensino médio. Assim, 69,9% das matrículas
ocorrem no ensino fundamental, 9,1% na educação infantil e 21% no ensino médio. (IBGE,
2011). No total, são 13.095 crianças matriculadas no ensino fundamental I, distribuídas entre
as 37 escolas municipais existentes para esta fase escolar.
O índice de desenvolvimento da educação básica (IDEB) de Palmas para alunos até o
5º ano apresenta uma progressão. Em 2005 foi de 3.6, em 2007 de 4.4, e em 2009 o município
apresentou uma progressão de 5.6, atingindo a meta que havia sido projetada para 2015. O
IDEB 2011 obteve o índice 5.8. (INEP, 2011) Estes dados demonstram que iniciativas
recentes promovidas pelo governo atual de Palmas, como a Implantação de Escolas de Tempo
57
Integral, projeto iniciado em 2007, podem ter contribuído para elevar a qualidade da educação
pública.
3.3 – A EDUCAÇÃO NAS ESCOLAS DE TEMPO INTEGRAL PADRÃO EM PALMAS
Dentre as 37 escolas do ensino fundamental I, 14 são escolas de tempo integral da
zona urbana e rural, tendo sido adaptadas para este fim ou construídas como escolas padrão,
atendendo um total de 5.018 alunos nesta proposta de ampliação da jornada escolar.
Em 2005 foi instituído o Programa de Educação Integral de Palmas, estruturado em
cinco modalidades implantadas simultaneamente: salas integradas, com a ampliação da carga
horária dos alunos; jornada ampliada; escola de tempo integral; educação integral no campo e
educação integral nos centros de educação, conforme descritas no capítulo II. A implantação
destas modalidades exigiu uma proposta pedagógica e arquitetônica adequada ao intento.
Na região periférica da cidade o governo planejou e construiu novas edificações
adaptadas ao seu ideal de educação, ou seja, as escolas de tempo integral, enquanto na região
central as escolas passaram por reformas e adaptações para oferecer o turno em tempo integral
ou a jornada ampliada.
A pesquisa foi realizada em uma escola de tempo integral padrão que atende 754 alunos
matriculados no fundamental I.
As escolas de tempo integral padrão contam com uma estrutura arquitetônica planejada para
este fim. Esta é dividida em quatro grandes áreas:
Área externa:
- 01 Auditório, contendo: saguão de entrada, com 01 banheiro masculino, 01 feminino e 01
para deficientes; 01 sala de som; 01 sala de apresentações, com capacidade para 350 pessoas; e 02
camarins (01 masculino e 01 feminino).
- 01 Biblioteca, contendo: 01 sala de leitura, 01 sala de vídeo, 01 sala de recursos para
portadores de necessidades especiais e 02 banheiros.
Piso Inferior:
58
- 01 Diretoria com 01 banheiro;
- 01 Sala do Setor Financeiro com 01 banheiro;
- 01 Secretaria;
- 01 Enfermaria;
- 01 Sala de Cultura (Orquestra Sinfônica);
- 01 Sala de Artes Cênicas
- 02 Banheiros para os funcionários;
- 01 Sala de Supervisão Pedagógica do Núcleo Diversificado;
- 01 Sala de Coordenação de Cultura;
- 01 Refeitório com capacidade para 700 crianças;
- 01 “Ateliê de Costura”;
- 01 Sala de Informática para professores;
- 01 Sala de professores com banheiros masculinos e femininos;
- 01 Sala de descanso do professor;
- 01 Sala de orientação pedagógica;
- 01 Laboratório de Matemática;
- 01 Laboratório de Ciências;
- 01 Laboratório de Artes;
- 01 Laboratório de Línguas;
- 01 Laboratório de Informática;
- 06 Salas de aula;
- 01 Depósito de material de limpeza;
- 01 Depósito para figurinos;
- 01 Depósito de material de manutenção;
59
- 01 Cozinha completa com equipamentos industriais;
- 02 Banheiros na área do refeitório;
- 01 Área coberta com paisagismo para descanso;
- 01 Pátio coberto;
- 01 Mirante – Sala de Judô;
- Banheiros masculinos e femininos para os alunos.
Piso Superior:
- 19 Salas de aula;
- 01 Sala de coordenação pedagógica;
- Banheiros masculinos e femininos para os alunos.
Bloco de Esportes
- 01 Quadra coberta;
- 01 Campo de futebol society;
- 01 Campo de futebol de areia;
- 01 Pista de atletismo;
- 02 Piscinas;
- Banheiros e vestiários masculinos e femininos;
- 02 Salas de dança;
- 01 Sala de Xadrez;
- 01 Sala de coordenação de esportes;
- 01 Sala de material;
- 01 Consultório odontológico.
No que tange à questão pedagógica, instituiu-se uma matriz integrada entre o núcleo
comum e o núcleo diversificado, ficando a cargo do docente sensibilizar os alunos para a
interdependência entre as áreas do conhecimento. O tempo de permanência dos alunos é de
60
nove horas diárias no espaço escolar, sendo quatro horas cumpridas em sala de aula, com as
disciplinas compostas pelo Núcleo Comum, uma hora de almoço e quatro horas de atividades
do Núcleo Diversificado.
Para o ensino fundamental I, o Núcleo Comum é composto pelas disciplinas de Língua
Portuguesa, Matemática, História, Geografia, Ciências, Educação Física, Ensino Religioso,
Artes, Educação Ambiental, Produção e Pesquisa de Texto, e Filosofia.
A complementação curricular por meio do Núcleo Diversificado é composta pelas
seguintes disciplinas: Apoio à aprendizagem (Estudo dirigido), Linguagem e seus códigos
(Leitura e conto, Inglês e Informática), Matemática Lúdica (Experiência Matemática),
Educação Musical (Música), Artes Cênicas (Artes Cênicas) e, por fim, Atividades Esportivas,
Motricidade e Expressão Corporal (Dança, Natação, Xadrez e Artes Marciais).
Após o horário da Jornada Integral acima citada, as escolas de tempo integral
oferecem atividades extras curriculares, denominadas “Treinamento”, aos alunos que se
interessarem em aperfeiçoar determinadas habilidades nas disciplinas: dança (ballet, jazz,
contemporânea e popular), judô, xadrez, natação, música, canto coral, espanhol, caratê,
futebol, futsal, futebol de areia, tênis de mesa, atletismo e canoagem.
São oferecidas três refeições aos alunos: café da manhã, almoço e lanche da tarde. No
momento da alimentação, faz parte do processo educativo dar orientações sobre higiene, bons
hábitos e alimentação saudável.
A política pública de educação integral do município foi concebida de forma sistêmica,
descentralizada e com um eficiente gerenciamento do orçamento educacional que prioriza o
necessário investimento para garantia da qualidade do Programa Educação Integral. As
escolas contam com recursos do FUNDEB, do Tesouro Municipal e do PDDE – Programa
Dinheiro Direto na Escola. Para o FUNDEB, o valor anual por aluno matriculado em tempo
parcial é de R$ 1.917,33; e para o aluno matriculado em tempo integral é de R$ 2.399,66.
O estudo do CENPEC intitulado “Tendências para a Educação Integral” (2011)
apresenta duas tabelas, uma referente aos gastos e investimentos na educação municipal e a
outra explicitando as matrículas em regime de tempo integral, aqui representadas como
TABELA 5 e TABELA 6, respectivamente.
61
A TABELA 5 apresenta o fluxo de gastos anuais no período de 2005 a 2010,
abarcando a porcentagem gasta com manutenção e desenvolvimento do ensino, despesa
pessoal e investimentos na educação.
TABELA 5 – Gastos educacionais na rede municipal de Palmas
Ano Gasto Total (R$) MDE (25%) Manutenção e
desenvolvimento do ensino
Despesas/pessoal Investimento
2005 52.614.135,90 27,67% 61,06% 3,69%
2006 58.286.656,52 25,76% 61,01% 9,94%
2007 73.402.506,94 28,27% 63,20% 14,17%
2008 82.781.324,00 26,84% 62,37% 12,55%
2009 97.515.123,13 26,50% 59,47% 14,69%
2010 92.129.350,00 25,80% 62,95% 17,55%
Fonte: SIOPE/MEC e orçamento fiscal do município. (Caderno CENPEC, 2011)
A tabela evidencia um aumento na porcentagem de investimentos. Se compararmos a
porcentagem gasta em novos investimentos em educação em 2010 e 2005, teremos uma
diferença de aproximadamente 15%. Além de termos uma progressão na porcentagem de
investimentos, há também um aumento considerável no valor gasto. Quando comparamos os
mesmos anos já mencionados, temos um diferença de aproximadamente 38 milhões gastos a
mais em 2010 do que em 2005.
Os dados apresentados no estudo acima mencionado foram extraídos do Sistema de
Informação sobre Orçamentos Públicos em educação – Siope, e demonstram os investimentos
e os gastos com o pessoal, manutenção e desenvolvimento do ensino.
Os investimentos estão relacionados às construções das escolas de Tempo Integral
Padrão e às adaptações às escolas de tempo parcial, para atenderem em tempo integral. Assim,
verificamos, conforme demonstra a TABELA 6, um aumento nas matrículas em regime de
tempo integral.
62
TABELA 6 – Matrículas em regime integral em Palmas
Ano Creche Ensino Fundamental Total
2005 822 0 822
2006 910 0 910
2007 907 1150 2057
2008 1278 5282 6560
2009 1977 5877 7854
2010 2029 13.362 15.391
Fonte: SAI/SEMED – (Caderno CENPEC, 2011).
Direcionando o nosso olhar para a educação em tempo integral do ensino fundamental
I, que é o nosso objeto de estudo, podemos evidenciar que partimos de um contexto que não
existia no município em 2005 e que em apenas cinco anos passou a atender 13.362 crianças. É
uma progressão rápida e eficiente, mas que precisou de vontade política para se concretizar.
Em 2006, foi aprovado o Plano de Cargos, Carreiras e Remuneração dos profissionais
da Educação Básica do Município. Este novo plano de cargos trouxe algumas conquistas para
os professores, favorecendo e valorizando o trabalho por eles desempenhado. Os professores
receberam o pagamento de passivos da gestão anterior, concessão de aumento salarial, diário
de classe eletrônico, concessão de bolsa de estudos para graduação e pós-graduação, e
implantação da hora-atividade.
Além das conquistas acima citadas a Secretaria da Educação promove anualmente um
Seminário de Educação em Tempo Integral com convidados que possam contribuir para a
atuação docente e a formação continuada.
63
Capítulo IV
A dimensão subjetiva do trabalho na Educação em Tempo Integral
A teoria sócio-histórica é uma perspectiva teórica da psicologia, embasada na
postulação histórico-cultural de Vygotsky (1896-1934) no início do século XX, e representada
também por Alex N. Leontiev (1903- 1979) e Alexander Romanovich Luria (1902- 1977). A
proposta se tornou referência para a psicologia do desenvolvimento, a psicologia social e a
educação por propor uma superação das dicotomias resultantes de concepções objetivistas ou
subjetivistas, permitindo a relação entre subjetividade e objetividade, e entre indivíduo e
sociedade. (BOCK, 2001).
A psicologia sócio-histórica fundamentou-se nas produções de Marx e Engels e adotou
o materialismo histórico e dialético como filosofia, teoria e método, superando as perspectivas
mecanicistas e deterministas presentes nas demais abordagens da psicologia. A ciência até
aquele momento estava embasada no empirismo e no racionalismo, buscando a objetividade
do conhecimento e evidenciando as dicotomias mencionadas. Vygotsky não negou essas
perspectivas, mas apontou as fragilidades e os limites metodológicos, uma vez que as mesmas
dicotomizavam a condição humana e não possibilitavam a compreensão completa do
fenômeno psicológico. Os objetivistas consideravam o mundo material, mas anulavam o
sujeito como ser ativo; os subjetivistas, por outro lado, naturalizavam o humano, não
considerando a historicidade.
Para Vygotsky, o homem se constitui por meio da relação social e histórica, sendo,
portanto, resultado de sua cultura, de sua época e de sua ação para transformá-la. O sujeito é
objeto transformador de si mesmo, pois ao modificar a sua cultura e sociedade modifica,
consequentemente, a si mesmo. Para a psicologia sócio-histórica, o homem é, portanto, ativo,
social e histórico. Ativo porque atua na materialidade social e histórica, já que constitui e é
constituído pela sociedade na qual está inserido.
Freitas, (2002) afirma a concepção de sujeito na psicologia sócio-histórica;
Percebe os sujeitos como históricos, datados, concretos, marcados por uma cultura
como criadores de ideias e consciência que, ao produzirem e reproduzirem a
64
realidade social, são ao mesmo tempo produzidos e reproduzidos por ela. (FREITAS,
2002)
Assim, as condições biológicas do individuo sustentam o desenvolvimento sócio-
histórico, que lhe propiciará possibilidades, aptidões e valores historicamente conquistados
pela humanidade e que estão representados nas diversas manifestações culturais inseridas nas
sociedades. (BOCK 1999, 2001)
O conceito de historicidade para a psicologia sócio-histórica afirma que o homem é
constituído historicamente. Assim, o homem realiza atividades sociais para atender as suas
necessidades e produzir a sua existência. As ideias e conhecimentos produzidos pelos homens
refletem o momento histórico no qual foram concebidos. (BOCK, 2001) A historicidade é
uma categoria fundamental para a psicologia sócio-histórica, pois expressa a trajetória
humana. Assim, para conhecer algo é necessário entender o seu processo histórico. O sujeito,
portanto, é ativo, pois constrói e é construído pela realidade. (KAHHALE E ROSA, 2009)
Segundo Bock e Gonçalves, a historicidade é a base fundamental da psicologia sócio-
histórica;
A noção básica da psicologia sócio-histórica é a historicidade, o que significa ter
como ponto de partida a concepção de que todos os fenômenos humanos são
produzidos no processo histórico de constituição da vida social. Essa vida social se
constitui na materialidade das relações entre os homens e entre os homens e a
natureza, para a produção da sua existência. (BOCK E GONÇALVES, 2009, p. 116)
A psicologia sócio-histórica fundamenta a pesquisa qualitativa, na medida em que
considera o sujeito histórico, social e ativo. Voltando ao problema que referencia o
desenvolvimento desta pesquisa, falamos de sujeitos que constituem significações a respeito
da educação integral em tempo integral, a partir de um contexto histórico e social no qual
estão inseridos e no qual atuam modificando e sendo modificados pela realidade.
Ao analisar o discurso dos sujeitos envolvidos, buscamos não a razão de resultados,
mas a compreensão dos comportamentos a partir das perspectivas dos sujeitos. Estes
comportamentos não são frutos apenas da evolução biológica; são também produtos do
desenvolvimento histórico e cultural. Portanto, buscamos compreender o sujeito na relação
dialética entre essas duas linhas: a natural e a histórico-cultural. (FREITAS, 2002).
Freitas afirma a possibilidade da perspectiva de totalidade que o uso da teoria sócio-
histórica propicia à pesquisa qualitativa;
65
Os estudos qualitativos com o olhar da perspectiva sócio-histórica, ao valorizarem
os aspectos descritivos e as percepções pessoais, devem focalizar o particular como
instância da totalidade social, procurando compreender os sujeitos envolvidos e, por
seu intermédio, compreender também o contexto. Adota-se, assim, uma perspectiva
de totalidade que, de acordo com André (1995), leva em conta todos os componentes
da situação em suas interações e influências recíprocas. (FREITAS, 2002, p. 26)
Assim, com base nesta perspectiva de totalidade, investigamos a dimensão subjetiva
que é social e individual, ou seja, a dimensão subjetiva da realidade que se imbrica na
dimensão subjetiva do sujeito.
A subjetividade individual se constitui no processo de recepção e percepção da
realidade na qual o sujeito está inserido, em sua ação de processamento interno desse material
percebido e na devolução desse transformado em forma de discurso e ação. É, portanto, um
processo em permanente construção na interação do sujeito com os valores da sociedade e do
momento histórico em que ele está inserido.
Assim, González Rey afirma que;
O sujeito individual está inserido, de forma constante, em espaços da
subjetividade social, e sua condição de sujeito atualiza-se permanentemente
na tensão produzida a partir das contradições entre suas configurações
subjetivas individuais e os sentidos subjetivos produzidos em seu trânsito
pelas atividades compartilhadas nos diferentes espaços sociais. (REY, 2005,
p.25).
Essa relação indivíduo e meio, inserida em um contexto histórico e permeada por
objetividade e subjetividade, tanto no aspecto social como individual, é assim referenciada
por Bock:
A subjetividade individual representa a constituição da história de relações sociais
do sujeito concreto dentro de um sistema individual. O indivíduo, ao viver relações
sociais e experienciais determinadas em uma cultura que tem ideias e valores
próprios, vai se constituindo, ou seja, vai construindo sentido para as experiências
que vivencia. Este espaço pessoal dos sentidos que atribuímos ao mundo se
configura como a subjetividade individual. (BOCK ET AL, 2003; p. 93)
As categorias pensamento e linguagem são importantes para a compreensão da
dimensão subjetiva do sujeito. O pensamento engloba a memória, a cognição e o afeto e se
realiza, segundo Vigotsky, por meio da fala. A fala do sujeito reflete as vivências que se
processam em sua subjetividade, em um momento específico.
A linguagem é produzida social e historicamente. Os significados mediam o
pensamento e a linguagem, uma vez que estes são representações da realidade.
Assim, Aguiar pontua a relação pensamento e linguagem:
66
Para compreender a fala de alguém, não basta entender suas palavras; é preciso
compreender seu pensamento (que é sempre emocionado), é preciso apreender o
significado da fala. O significado é, sem dúvida, parte integrante da palavra, mas é
simultaneamente ato do pensamento, é um e outro ao mesmo tempo, porque é a
unidade do pensamento e da linguagem. (AGUIAR, 2001, p. 130)
A transição do pensamento para a fala do sujeito passa pelo processo de significação,
que é constituído pelas categorias significados e sentidos.
Os significados presentes nas palavras do sujeito são constituídos historicamente pela
sociedade. No entanto, os sentidos atribuídos a estes significados pelo indivíduo são pessoais.
Os significados, segundo Vigotsky, são produções históricas e sociais compartilhadas entre os
homens e mediam o processo de humanização. Os significados, por serem constituídos social
e historicamente, são de natureza objetiva. Ao se atribuir um sentido individual e pessoal ao
significado demonstramos a natureza subjetiva dos sentidos.
A categoria sentido permite compreender a constituição do sujeito, atrelando a sua
singularidade aos processos sociais e históricos.
A Educação Integral é composta de aspectos objetivos, como, por exemplo, a
legislação e os programas de incentivo do governo para fomentar a ampliação do tempo
escolar, mas também de aspectos subjetivos, como os sentidos e significados dos professores
e diretores pedagógicos responsáveis pela continuidade e ampliação do campo de atuação dos
Programas nesta área. Esta pesquisa pretende analisar a dimensão subjetiva da realidade e dar
visibilidade a presença do sujeito ativo, na figura dos diretores pedagógicos e professores para
a continuidade dos Programas de ampliação do tempo escolar.
O uso das categorias, significados e sentidos possibilitam a visibilidade da dimensão
subjetiva da realidade, já que são constituídos por momentos do processo de construção do
real e do sujeito. (AGUIAR, 2009, p. 60)
Os significados sociais são transformados em sentidos por meio de um processo
subjetivo a partir da leitura da realidade objetiva. A dimensão subjetiva da realidade é uma
síntese entre objetividade e subjetividade e se expressa nos sentidos.
Aguiar destaca que:
... falar de sentidos é falar de subjetividade, da dialética afeto/cognição, é falar de
um sujeito não diluído, de um sujeito histórico e singular ao mesmo tempo.
(AGUIAR, 2009, p. 65).
Os sentidos são constituídos pelo afeto e cognição, no decorrer da história do sujeito.
67
Segundo Aguiar (2009), as categorias sentidos e significados, na perspectiva da
psicologia sócio-histórica, retratam o humano sem que este esteja deslocado da realidade
social. Ao falarmos do humano compreendemos o sujeito e o mundo.
Desta forma, o significado socialmente compartilhado da atuação profissional dos
diretores pedagógicos e professores é percebido e vivenciado de forma singular para cada
sujeito, ou seja, o sentido é diferente para cada um destes profissionais. Os sentidos
representam de forma singular como os sujeitos vivenciam a experiência da educação em
tempo integral.
Ao analisarmos os sentidos dos sujeitos participantes, segundo as concepções da teoria
sócio-histórica, podemos afirmar que os mesmos são constituídos social e historicamente, o
que justifica o uso da abordagem teórica e metodológica desta pesquisa. Ao utilizarmos as
contribuições epistemológicas e metodológicas da psicologia sócio-histórica, daremos
visibilidade à dimensão subjetiva que constitui os sujeitos que atuam na realidade da
educação em tempo integral.
Cientes de que o resultado obtido é provisório, pois os sujeitos estão em permanente
transformação, descrevemos no capítulo V o processo de pesquisa.
68
CAPÍTULO V
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
5.1 Quanto ao referencial teórico
Como suporte para a sustentação teórica da argumentação, usamos a teoria da
psicologia sócio-histórica, a partir das contribuições de Bock, Aguiar, Furtado, Ozella e Rey,
para analisar os sentidos constituídos por diretores pedagógicos e professores das escolas de
tempo integral do município de Palmas - TO.
Como vimos no capítulo anterior, a psicologia sócio-histórica apresenta categorias que
a fundamentam como base epistemológica e também constituem base metodológica de
pesquisa.
Assim, buscamos na dimensão subjetiva do trabalho na educação em tempo integral os
sentidos constituídos pelos participantes desta pesquisa. O uso da psicologia sócio-histórica
como método permite dar visibilidade aos processos internos, observar o não observável.
A escolha deste referencial teórico e metodológico para a análise das entrevistas nos
permite a compreensão do fenômeno psicológico para entender o sujeito, mas este fenômeno
psicológico, que é individual, foi constituído com aspectos objetivos e subjetivos da sociedade
na qual o homem está inserido. Segundo Bock,
“Para a Sócio-Histórica, falar do fenômeno psicológico é obrigatoriamente falar da
sociedade. Falar da subjetividade humana é falar da objetividade em que vivem os
homens. A compreensão do “mundo interno” exige a compreensão do “mundo
externo”, pois são dois aspectos de um mesmo movimento, de um processo no qual
o homem atua e constrói/modifica o mundo e este, por sua vez, propicia os
elementos para a constituição psicológica do homem”. (BOCK, 2001, p.22)
Os capítulos I, II e III descritos neste trabalho apresentam significações a respeito da
educação em tempo integral, expressas por meio da legislação, de pesquisas, documentos,
dados estatísticos e trajetória histórica; enfim, significações que constituem os aspectos
subjetivos objetivados, uma gênese social que irá contribuir para a constituição dos sentidos
do sujeito, que, como já mencionado, é histórico e singular.
69
Aguiar afirma:
“É fundamental explicitarmos que os significados sociais, que serão internalizados e
transformados em sentidos, só existem enquanto tal porque os homens, na sua
atividade no mundo social e histórico, os constituíram e os constituem
permanentemente”. (AGUIAR ET AL, 2009, p. 63)
Assim, conforme contribuições de Vygotsky e Rey, para apreender os sentidos
primeiro precisamos compreender o que os determinaram. É por possibilitar uma visão de
totalidade - uma vez que engloba o social e o individual, a objetividade e a subjetividade, o
percurso histórico e cultural - que a teoria e metodologia de pesquisa da psicologia sócio-
histórica foi escolhida para embasar a pesquisa.
5.2 Quanto à abordagem da pesquisa
Este trabalho foi conduzido seguindo a abordagem qualitativa de pesquisa, pois temos
por objetivo descrever os núcleos de significação que surgiram a partir da análise das
entrevistas realizadas com os participantes, a fim de identificarmos os sentidos por estes
constituídos a respeito da educação em tempo integral.
A abordagem qualitativa tem por objetivo descrever um contexto, captar ocorrências a
partir de um determinado tempo e espaço. Estuda os problemas que não são quantificáveis,
focando o mundo das ações e das relações humanas. (CARVALHO, A.M. ET AL, 2000, p.
108)
Esta abordagem apresenta características que corroboram com o tema proposto nesta
pesquisa, uma vez que
... trabalha com valores, crenças, hábitos, atitudes, representações, opiniões e
adéqua-se a aprofundar a complexidade de fatos e processo particulares e específicos
a indivíduos e grupos. (PAULILO, 1999. p. 135)
... parte do pressuposto de que as pessoas agem em função de suas crenças,
percepções, sentimentos e valores e seu comportamento tem sempre um sentido, um
significado que não se dá a conhecer de modo imediato, precisando ser desvelado.
(ALVES, 1991, p. 54)
Gonzalez Rey apresenta a epistemologia qualitativa como uma proposta metodológica
de pesquisa qualitativa no campo da psicologia que defende o caráter construtivo
interpretativo do conhecimento. Assim, segundo o autor, o conhecimento não está posto, ele é
70
construído; portanto, é uma produção humana. Na pesquisa científica, ao se construir
conhecimento, cria-se também a “Zona de Sentido”, conceito que sintetiza os espaços de
inteligibilidade, que, portanto, não se esgotam na pesquisa; ao contrário, propiciam novos
estudos e aprofundamentos. Rey declara:
O conhecimento legitima-se na sua continuidade e na sua capacidade de gerar novas
zonas de inteligibilidade acerca do que é estudado e de articular essas zonas em
modelos cada vez mais úteis para a produção de novos conhecimentos. (REY, 2005,
p. 6)
A epistemologia qualitativa legitima a pesquisa com apenas um sujeito como possível
de construção do conhecimento científico. No entanto, é necessária a compreensão de que a
contribuição da pesquisa singular será teórica, possibilitando modelos de inteligibilidade.
Quanto a isso, Rey afirma:
A legitimação do singular como fonte do conhecimento implica, segundo já
assinalamos, considerar a pesquisa como produção teórica, entendendo por teórico a
construção permanente de modelos de inteligibilidade que lhe deem consistência a
um campo ou um problema na construção do conhecimento, ou seja, o teórico não se
reduz a teorias que constituem fontes de saber preexistentes em relação ao processo
de pesquisa, mas concerne, muito particularmente, aos processos de construção
intelectual que acompanham a pesquisa. O teórico expressa-se em um caminho que
tem, em seu centro, a atividade pensante e construtiva do pesquisador. (REY, 2005, p.
11)
A epistemologia qualitativa compreende a pesquisa como um processo de
comunicação, um processo dialógico, uma vez que o homem se comunica em todos os
espaços sociais em que vive. É por meio da comunicação que os sujeitos participantes da
pesquisa podem se expressar e dar visibilidade à dimensão subjetiva. A entrevista realizada na
pesquisa como instrumento de comunicação possibilita um espaço legitimado e permanente
de produção de informação. Os sujeitos se expressam, não por pressão, mas por uma
necessidade pessoal crescente no decorrer da pesquisa em meio às relações constituídas nesse
processo. Para Rey,
A comunicação é uma via privilegiada para conhecer as configurações e os
processos de sentido subjetivo que caracterizam os sujeitos individuais e que
permitem conhecer o modo como as diversas condições objetivas da vida social
afetam o homem. (REY, 2005, p. 13).
Assim, a presente pesquisa possui abordagem qualitativa por possibilitar uma
interpretação da realidade, a singularidade dos sujeitos participantes, a comunicação para a
produção de dados e o caráter construtivo e interpretativo do conhecimento.
71
5.3 Quanto ao instrumento
A escolha da entrevista como instrumento desta pesquisa, se deu pelo fato de a mesma
propiciar uma interação entre entrevistado e entrevistador. Segundo declara Cozby (2003), os
participantes são mais propensos a responder para uma pessoa real do que a responder a um
questionário enviado pelo correio.
Considerando que temos um total de dois participantes entrevistados, a pesquisa face a
face torna-se possível por contribuir com o levantamento das significações constituídas.
Segundo Szymanski (2008), a entrevista se justifica, pois
... a entrevista face a face é fundamentalmente uma situação de interação humana,
em que estão em jogo as percepções do outro e de si, expectativas, sentimentos,
preconceitos e interpretações para os protagonistas: entrevistador e entrevistado.
(SZYMANSKY, 2008, p. 12)
Para tanto, o primeiro contato realizado com a intenção de conseguir os sujeitos foi
uma solicitação enviada por email para a secretaria municipal de educação, explicando o
interesse em coletar os dados em escolas de tempo integral padrão. O projeto de pesquisa foi
encaminhado, também via email, para leitura e análise por parte da pessoa responsável pela
direção pedagógica do fundamental I da Secretaria da Educação e pelo secretário municipal
de educação, conforme previamente por eles solicitado. Tendo o projeto sido aprovado pelos
respectivos responsáveis acima citados, a Secretaria selecionou a escola de tempo integral
padrão e seus sujeitos, a diretora e uma professora.
Em data agendada, a pesquisadora esteve no município e pôde conhecer as escolas de
tempo integral, seu funcionamento e sua estrutura. Foi possível ler alguns documentos
norteadores, como o Projeto Político Pedagógico e o Planejamento Anual, assistir vídeos de
eventos realizados pelas escolas, como a Cantata de Natal e, é claro, realizar as entrevistas.
As entrevistas foram individuais, possibilitando uma maior liberdade para os sujeitos
falarem. Elas aconteceram na escola onde as profissionais atuam. Cada sujeito, ciente do
sigilo, da confidencialidade e do anonimato, assinou o Termo de Livre Consentimento
(Apêndice I), estando, portanto esclarecidos quanto aos objetivos da pesquisa e de sua
colaboração livre e voluntária.
72
A entrevista semiestruturada permite que os sujeitos falem a partir de temas
norteadores e não apenas para responder perguntas. Desta forma, a comunicação flui entre o
pesquisador e o sujeito. Quanto a isso, Rey postula que
A comunicação será a via em que os participantes de uma pesquisa se converterão
em sujeitos, implicando-se no problema pesquisado a partir de seus interesses,
desejos e contradições. (REY, 2005, p. 14)
É na comunicação entre pesquisador e sujeito que a fala carregada de história, de
cultura e de aspectos objetivos e subjetivos se concretiza. Assim, Aguiar afirma que
A fala, construída na relação com a história e a cultura, e expressa pelo sujeito,
corresponde à maneira como este é capaz e expressar/codificar, neste momento
específico, as vivências que se processam em sua subjetividade; cabe ao pesquisador
o esforço analítico de ultrapassar essa aparência (essas formas de significação) e ir
em busca das determinações (históricas e sociais), que se configuram no plano do
sujeito como motivações, necessidades, interesses (que são, portanto, individuais e
históricos), para chegar ao sentido atribuído/constituído pelo sujeito. (AGUIAR,
2001, p. 131)
Assim, foram realizadas entrevistas individuais semiestruturadas, gravadas e
posteriormente transcritas com a diretora pedagógica e uma professora, ambas responsáveis
por manter viva a proposta de educação integral em tempo integral na referida escola do
município de Palmas - TO.
5.4 Quanto ao município e aos sujeitos participantes da pesquisa
Diante do exposto e articulando a temática supracitada, selecionamos o município de
Palmas (TO) cuja experiência de educação integral é coordenada pela secretaria municipal e,
por ser referência em âmbito nacional na continuidade da proposta de educação integral,
realizada em tempo integral, como lócus para verificação do objeto de estudo.
O referido município foi selecionado a partir de uma pesquisa maior intitulada
“Perspectivas da Educação Integral”, realizada pelo CENPEC (2011) entre os anos de 2009 e
2010. Com base nesta pesquisa verificou-se que este município apresenta experiência com a
ampliação do tempo escolar. Não é o único município a desenvolver experiência nesta linha.
No entanto, outro critério para a seleção do município foi que a experiência de educação
integral realizada no mesmo estivesse articulada com a secretaria municipal.
73
O Programa de Ampliação do Tempo Escolar desenvolvido pelo município
selecionado possui algumas particularidades, desde à sua implantação até as atividades
práticas realizadas: configura-se como experiência bem sucedida e aponta para um
crescimento no número de alunos atendidos.
O ensino brasileiro, ao longo do século XX e no presente século, demonstrou
experiências diferenciadas, inovadoras e ousadas de educação em tempo integral, conforme já
citado em capítulos anteriores. Algumas experiências perduraram por um período de tempo;
outras, como as analisadas durante o estudo desenvolvido na presente pesquisa, permanecem
atuantes. Diante disso, algumas indagações permanecem presentes e direcionam o nosso olhar
e a escolha dos nossos sujeitos de investigação, quais sejam: O que motiva a continuidade
desses Programas? O que diferencia as escolas de tempo integral e parcial? Quais
investimentos são necessários à equipe docente para atuar neste contexto?
Por trás do Programa de Educação Integral implantado no referido município está
presente a figura de diretores pedagógicos e professores, que concretizam o ideal de educação
que se pretende para cada contexto ao qual foi implementado. Diretores e professores que
possuem uma história de vida que se entrelaça com sua trajetória profissional, desta forma se
constituem como educadores.
Focaremos a nossa pesquisa nas experiências pedagógicas de educação integral
implantadas no Ensino Fundamental I do município acima mencionado. Para tanto, a pesquisa
teve como sujeitos uma diretora pedagógica e uma professora do município selecionado.
Temos um total de dois sujeitos, um com o cargo de diretora pedagógica e outro com o
cargo de professora, ambos atuantes em uma escola municipal de tempo integral do ensino
fundamental I em Palmas - TO. A escolha dos mesmos parte da intenção de se compreender o
que movem seus ideais de educação integral.
Para preservar a identidade das entrevistadas, os nomes usados neste trabalho são
fictícios. Temos, assim, a professora Renata e a diretora Laura.
74
5.4.1 – Sujeito I: Professora Renata
A professora Renata graduou-se em Pedagogia em 2008 e no ano seguinte fez o curso
de especialização em psicopedagogia. O curso de Pedagogia era mais focado no trabalho com
adultos, atuando na área de orientação. Assim, a especialização contribuiu para a sua
formação, ampliando a sua possibilidade de atuar com crianças com maior propriedade.
Quando recém-formada, Renata trabalhou em uma cidade próxima à Palmas, porém
atuando em uma escola de tempo parcial. Em 2010 foi aprovada no concurso da prefeitura de
Palmas, ingressando então como professora regente do 4º ano do Ensino Fundamental I na
escola de tempo integral padrão, aqui denominada Escola A.
Renata trabalha quarenta horas semanais; portanto, oito horas por dia com uma única
turma de alunos, ou seja, o tempo é integral tanto para alunos quanto para professores. Ela é
responsável por dez disciplinas: Língua Portuguesa, Matemática, Pesquisa e Produção de
Texto, Arte, Ensino Religioso, Filosofia, Ciências Naturais, Estudo Monitorado, História e
Geografia (do Tocantins e Geral).
5.4.2 – Sujeito II – Diretora Laura
A diretora Laura graduou-se em Biologia. Atuou como professora e coordenadora
pedagógica em outras escolas da rede pública, mas sempre em escolas de tempo parcial. Fez
curso de gestão educacional para complementar seus conhecimentos como gestora.
Quando a escola de tempo integral foi implantada, Laura foi convidada para ser
coordenadora pedagógica. Desde então ela atua na referida escola, tendo participado da
elaboração do Projeto Político Pedagógico, da escolha dos mobiliários e da funcionalidade da
escola, de forma que as propostas projetadas pudessem se concretizar.
Após alguns anos, a diretora que atuava na escola foi convidada a assumir um novo
cargo, e Laura, por indicação do secretário da educação na época, assumiu o cargo de direção.
Ficou no cargo como convidada, até que no último processo seletivo para gestor escolar
realizado no município ela foi aprovada e tomou posse do cargo.
75
5.5 – Quanto aos procedimentos
Seguindo os procedimentos postulados por Aguiar e Ozella (2009) que apresentam os
passos para se chegar aos “núcleos de significação” como meio para revelar os sentidos
constituídos pelos sujeitos, analisamos as falas dos participantes.
Após a transcrição da entrevista, fizemos a leitura cuidadosa e flutuante do texto, a fim
de obtermos os pré-indicadores de cada sujeito, ou seja, os aspectos relevantes que
caracterizam a fala. Apresentamos mais adiante os pré-indicadores, mas antes vale ressaltar
que, no texto da análise de cada sujeito, sublinhamos para dar destaque os trechos dos
discursos onde os pré-indicadores estão contidos/constituídos, conforme evidenciamos no
exemplo abaixo:
Parte da entrevista
P: A primeira coisa que eu queria saber, como é que você chegou até aqui? Como você está
hoje, como professora de uma escola de tempo integral? Qual foi a sua trajetória
profissional?
R: Eu fiz a faculdade de Pedagogia aqui em Palmas e fiz uma especialização em
psicopedagogia. Isso porque o meu curso de pedagogia ele não foi voltado para ensino para
crianças, foi para adulto, inclusive para orientação. Terminei a faculdade em 2008, em 2009
em seguida eu fiz a especialização, que me ajudou muito para eu trabalhar com crianças,
entender a dificuldade das crianças para poder ajudá-las. Eu fiz um concurso. Antes eu tinha
trabalhado em uma cidade próxima. A gente tinha uma rotina bastante diferente porque lá não
era integral, era parcial. Logo depois eu passei num concurso da prefeitura em 2010. Então
faz um ano e meio que eu estou aqui. E tudo para mim foi novidade aqui, porque o tempo
parcial não funciona com a mesma dinâmica, né? O esforço é menor, não que seja menos
importante, eles são tão importante quanto esse daqui, mas é tudo completamente diferente, o
esforço é menor, assim a cobrança é maior, cobrança num bom sentido, né? Para que o aluno
aprenda mais, para que se aplique mais, que participe de tudo. E trabalhar com criança é
completamente diferente de trabalhar com adulto, né? A responsabilidade de trabalhar com
criança é muito da gente, e do adulto é parte dele e parte nossa, né? E essa foi a grande
diferença. E aqui a gente tenta trabalhar, eu trabalho, eu sou professora regente do 4º ano, eu
76
trabalho com dez disciplinas, e a gente tenta integrar uma na outra.
P: Dez disciplinas? Quais são elas?
R: Língua portuguesa, matemática, PPT, que é pesquisa e produção de texto, arte, ensino
religioso, filosofia, ciências naturais, história e geografia. Sendo que história e geografia,
além da geral, a gente aplica a história e geografia do Tocantins. Tem um livro à parte, uma
dinâmica à parte, a gente socializa o tempo todo com aquilo que eles vivem.
Chegamos a um total de 43 pré-indicadores conforme descrito abaixo:
1)Diferença entre integral e parcial; 2) Disciplinas; 3) Uma turma; 4) Reforço; 5) Inte-
gral abrange mais; 6) Fragmentação; 7) Tempo Integral; 8) Ajuda; 9) Espaço; 10) Pro-
jeto Político Pedagógico; 11) Atividades fora da escola; 12)Rotina diferentes; 13) Nú-
mero de alunos; 14) Metodologia; 15) Tumultuado; 16) Trocas; 17) Alunos reclamam
muito; 18) Ficar com a família; 19) Ideal; 20) Visão da criança; 21) Importância das
disciplinas; 22) Planejamento; 23) Integração; 24) Projetos; 25) Ensino Religioso; 26)
Dinheiro; 27) Envolvimento da família; 28) Preocupação dos pais; 29) Formação; 30)
Importância do trabalho ; 31) Apoio; 32) Muita coisa mudou; 33) Seis horas com os a-
lunos; 34) Mudar a comunidade através da escola; 35) Ganho para os alunos; 36) Con-
seguir que as crianças aprendam; 37) Estratégia de colocar a escola nessa comunidade;
38) Tudo o que queremos acontece; 39) Orgulho da educação daqui; 40) Comparação;
41) Vale a pena ser professor; 42) Salário; 43) Trajetória Profissional.
Tendo os pré-indicadores definidos por temas, passou-se à criação dos indicadores,
aglutinando-se as frases por meio do critério de semelhança, complementaridade e
contraposição. Assim, por exemplo, a partir dos comentários de Renata foi possível organizar
o seguinte quadro:
77
PRÉ-INDICADORES INDICADORES
1) Diferença entre integral e parcial; 5)
Integral abrange mais; 12) Rotina
diferente
1) Educação Integral ou educação
parcial.
2) Disciplinas; 6) Fragmentação 11)
Atividades fora da escola; 16) Trocas;
21) Importância das disciplinas; 25)
Ensino Religioso
2) Componentes curriculares e
atividades.
3) Uma turma; 13) Número de alunos;
15) Tumultuado
3) Quantidade de alunos
4) Reforço; 14) Metodologia; 23)
Integração; 24) Projetos
4)Propostas pedagógicas e
metodológicas diversificadas
7) Tempo Integral; 17) Alunos
Reclamam muito 18) Ficar com a
família; 19) Ideal 33) Seis horas com os
alunos;
5) Tempo de permanência dos alunos
na escola.
8) Ajuda 10) Projeto Político
Pedagógico ; 22) Planejamento
6) Planejamento pedagógico
9) Espaço; 20) Visão da criança 7) Espaços educativos
27)Envolvimento da família; 28)
Preocupação dos pais; 31) Apoio
8) Parceria escola-família
24) Formação 43) Trajetória
profissional
9) Formação Profissional
32) Muita coisa mudou; 34) Mudar a
comunidade através da escola; 37)
Estratégia de colocar a escola nesta
comunidade
10) A educação como aspecto
transformador.
25) Aprendizagem; 35) Ganho para os
alunos; Conseguir que as crianças
aprendam.
11) Processo de Aprendizagens
26) Dinheiro; 38) Tudo o que queremos
acontece
12) Financiamento para a educação
em tempo integral
39) Orgulho da educação daqui; 40)
Comparação; 41) Vale a pena ser
professor; 42)Salário
13) Valorização e reconhecimento
profissional.
Por fim, foram realizadas mais leituras e, seguindo os critérios de assimilaridade e
contraposição, foi possível construir os núcleos de significação. Segundo Aguiar e Ozella,
Os núcleos resultantes devem expressar os pontos centrais e fundamentais que
trazem implicações para o sujeito, que o envolvam emocionalmente, que revelem as
suas determinações constitutivas. (AGUIAR e OZELLA, 2006, P. 231).
O quadro abaixo demonstra a construção dos Núcleos de Significação a partir da aglutinação por
assimilaridade ou contraposição dos indicadores identificados nas palavras de Renata. Trechos da fala
de Renata nomearam os quatro núcleos de significação constituídos.
78
Inferência e sistematização dos núcleos de significação
INDICADORES NÚCLEOS DE SIGNIFICAÇÃO
1)Educação Integral ou educação parcial 1) “Integral abrange mais. Os alunos têm mais
conhecimento, mais vivência.” 3) Quantidade de alunos
2)Componentes curriculares e atividades 2) “Eu acho que fica muito fragmentado...
sempre conversando para conseguir
integrar”. 4) Propostas pedagógicas e
metodológicas diversificadas
6) Planejamento pedagógico
7) Espaços educativos
5) Tempo de permanência dos alunos na
escola
3) “Conseguir com que essas crianças
aprendam em meio a tudo isso que a gente
vive ... ainda bem que existe essa escola”. 8) Parceria escola-familia
10) A educação como aspecto
transformador.
11) Processos de aprendizagens
9) Formação Profissional 4)“Em Palmas, as pessoas falam que vale a
pena ser professor.” 12) Financiamento para a educação
em tempo integral
13) Valorização e reconhecimento
profissional
Esse procedimento foi repetido para a análise da entrevista com a diretora Laura. Assim,
buscou-se a apreensão dos sentidos constituídos por cada sujeito.
Para Aguiar e Ozella,
A apreensão dos sentidos não significa apreendermos uma resposta única, coerente,
absolutamente definida, completa, mas expressões do sujeito muitas vezes
contraditórias, parciais, que nos apresentam indicadores das formas de ser do sujeito,
de processos vividos por ele. (AGUIAR E OZELLA, 2006, P.228).
79
CAPÍTULO VI
ANÁLISE DAS ENTREVISTAS
6.1 – Análise do sujeito I: Professora Renata
Núcleo I – “Integral abrange mais. Tem mais conhecimento, mais vivências.”
A professora Renata relatou na entrevista a sua vivência na escola de tempo parcial e integral.
Em nossa conversa foi possível destacar alguns trechos, agrupados neste núcleo, que
evidenciam a diferenciação entre esses dois contextos escolares.
___________________________________________________________________________
“... a gente tinha uma rotina bastante diferente porque lá não era integral, era parcial”.
“... E tudo para mim foi novidade aqui, porque o tempo parcial não funciona com a mesma
dinâmica, o esforço é menor, não que seja menos importante, eles são tão importantes quanto
esses daqui, mas tudo é completamente diferente”.
“... a cobrança é maior, cobrança num bom sentido, para que o aluno aprenda mais, para que
se aplique mais, que participe de tudo”.
“... Integral (...) abrange mais, no sentido de aprendizagem, no sentido de trabalhar corpo e
mente; eu acho que desenvolve mais a criatividade da criança, com certeza ele aprende mais,
tem mais responsabilidade. Tem mais conhecimento, mais vivência. (...) É tempo integral
porque fica o tempo todo na escola, mas não é o tempo em si, é a aprendizagem que ocorre
nesse tempo que é importante”.
“... Eu não tenho como chegar no final do ano e dizer para a diretora que eu não tive tempo
para ajudar o aluno na aprendizagem. Na verdade eu tive tempo. (...) a gente tem tempo
mesmo, usa metodologia diferente, dinâmica diferente. Se precisa de ajuda a gente vai atrás
dessa ajuda, aqui a gente tem essa ajuda. Pessoal do reforço, pessoal da informática, pessoal
80
da educação física, (...) porque são comportamentos diferentes e as crianças têm
comportamentos diferentes”.
“(...) me assustou num primeiro momento porque é uma rotina que é diferente de tudo que eu
já tinha visto. (...) a gente nem conhecia a escola de tempo integral aqui no Tocantins. (...) foi
assustador porque eu cheguei aqui o ano passado e essa escola tinha mil quatrocentos e
poucos alunos. Num primeiro momento eu peguei uma sala de aula que tinha quarenta e três
alunos. Na escola anterior, quando eu tinha muito era trinta, vinte e cinco. (...) Esse ano a
gente tá trabalhando com um número adequado por turma, que é trinta e cinco alunos”.
“(...) a maioria de tudo o que nós queremos aqui acontece. E a gente fica apaixonada por
isso e ela (amiga de Renata) falando pra mim que lá a realidade é diferente (Renata comenta
a respeito de uma amiga que saiu da escola integral para trabalhar em uma escola de tempo
parcial), não é essa empolgação, esse desejo de ver acontecer, sabe? até o espaço físico
mesmo que não é legal, eu não trocaria não”.
“... dez disciplinas que eu dou: Língua Portuguesa, Matemática, PPT - que é pesquisa e
produção de texto, Arte, Ensino Religioso, Filosofia, Ciências Naturais, História e Geografia.
Sendo que História e Geografia, além da geral, a gente aplica a História e Geografia do
Tocantins. Tem um livro à parte, uma dinâmica à parte, a gente socializa o tempo todo com
aquilo que eles vivem”.
___________________________________________________________________________
Desses trechos do relato, é possível notar em Renata uma satisfação com o seu trabalhar
na escola de tempo integral. Essa satisfação é percebida por Renata quando ela compara o
trabalho docente e a aprendizagem dos alunos em uma escola de tempo parcial e em uma
escola de tempo integral.
Renata identifica uma cobrança maior no trabalho docente realizado na escola de tempo
integral quanto à responsabilidade em ensinar seus alunos, uma vez que tempo para isso ela
tem de sobra. Além de poder contar com a ajuda de diversos profissionais que atuam com as
mesmas crianças que ela, e que assim podem agregar conhecimentos e contribuir com uma
visão diferenciada a respeito do mesmo aluno.
Essa postura diferenciada no trabalho docente, no sentido de compromisso com a
aprendizagem e a quantidade de disciplinas que ministra, permite que Renata considere que o
81
aluno que frequenta a escola de tempo integral aprende mais do que aqueles que não têm essa
oportunidade. Para ela, a escola de tempo integral trabalha mente e corpo de seus estudantes e,
desse modo, propicia aos mesmos maior criatividade, responsabilidade, conhecimento e
vivências.
O único aspecto que Renata aponta negativamente quando compara o contexto escolar
em tempo parcial e integral está relacionado à quantidade de alunos por sala, porque
inicialmente ela teve uma elevada quantidade de alunos ao ingressar na escola de tempo
integral, o que dificultou a sua prática docente. No entanto, Renata, ainda assim, pontua que
havia espaço físico adequado para a quantidade de alunos e que o problema foi resolvido com
a abertura de mais uma escola de tempo integral nas proximidades da escola A.
Núcleo II – “Eu acho que fica muito fragmentado. (...) Sempre conversando para
conseguir integrar”.
Este núcleo agrupa os trechos que evidenciam uma contradição entre a integração e a
fragmentação do fazer pedagógico e da forma como este se converte em conhecimento para o
aluno. São eles:
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“A gente trabalha com uma turma. Cada professor regente de 1º ao 5º ano trabalha só com
uma turma. É o dia inteiro responsável por uma turma”.
“(...) eu trabalho com dez disciplinas e a gente tenta integrar uma na outra”.
“(...) eu tenho as aulas segmentadas, igual acontece em todas as escolas: português,
matemática, ciências, história e geografia. Eu dou mais português e matemática, que eu
considero mais importante para a aprendizagem. Às vezes eu não faço essa fragmentação
durante o dia. Hoje, por exemplo, eu estou na terceira aula e eu estou só com língua
portuguesa o tempo todo (...) pra não fragmentar, pra não perder o vínculo, porque eu
acredito que assim tem mais aprendizagem”.
“(...) de hora em hora têm as trocas, troca de disciplinas. Por exemplo, às vezes você está
aqui comigo no estudo monitorado aqui na sala do núcleo comum e logo depois vão para
natação, vai para outro bloco, tem o apoio que leva, daqui a pouco eles têm estudo
monitorado comigo novamente; eu volto para a sala de aula e eles voltam comigo pra lá. (...)
eu interpretava que isso atrapalhava e eu continuo achando que atrapalha (...) Você está aqui
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vendo no estudo monitorado matemática, por exemplo, aí daqui a pouco você vai para o
xadrez, é algo completamente diferente pra ele, eu não sei até que ponto isso é bom. (...) Até
agora isso acontece dessa forma. (...) Eu tenho lá português, o aluno sai do português e vai
para a educação física em outro bloco, outra realidade, outra situação, completamente
diferente, eu não sei se isso é benéfico ou não. Eu penso que não é totalmente benéfico, tinha
que ter uma outra forma, que eu não sei te dizer que forma seria essa ainda. Aí daqui a pouco
ele volta para a minha aula de novo, aí é matemática do estudo monitorado, aí a 4ª aula é
xadrez, volta pra lá de novo, eu acho que fica muito fragmentado, atrapalha a aprendizagem,
o entendimento deles; às vezes a gente tá discutindo, tá no meio da situação, o aluno sai e vai
para o bloco de esporte, depois volta de novo, e até que eu consiga engrenar isso de novo,
retomar o mesmo assunto demora. E eu acho que nesse período há uma perda, não sei até
que ponto isso é bom ou não. Porque também não é bom ficar muito tempo só com português
ou só com matemática (...) No horário das trocas fica esse barulho na escola, muito barulho e
eu acho que isso atrapalha bastante”.
“... mas essa criança não tem outra visão, a visão dela é isso aqui e pronto; às vezes a gente
sabe de coisas rotineiras aqui da região que eles não sabem”.
“... (atividades fora da escola) ... isso acontece na parte cultural, na parte que nós chamamos
de núcleo comum, que é a parte que eu trabalho, inclusive foi discutido hoje pra gente
chamar isso no PPP. Quando discutimos as ações do PPP, foi discutido isso, que a escola
está faltando essas ações. (...) por exemplo, eu trabalhar a geografia fora a escola nunca
aconteceu (...) até mesmo apresentar a cidade para eles. (...) eu tenho pensado nisso, mas
ainda não aconteceu. Isso foi discutido esse ano, na proposta do ano passado eu já estava na
escola e isso nem foi mencionado, mas esse ano eu acredito que a gente vai avançar nesse
sentido”.
“... eu conheço apenas mais uma escola que tem o mesmo espaço, e que eu considero bom,
talvez até ótimo (...) Com relação a esta escola é ótimo (...) a sala de aula tem um espaço
ótimo, eles não ficam aglomerados; (...) o espaço para a refeição eu acho legal: não tá
sobrando espaço, não tem nada ocioso, que não se use ou que se tem demais, ou que
prejudique eles”.
“A gente tem as reuniões pedagógicas (...) tem o planejamento anual, todos os professores
veem a melhor forma de aplicar os conteúdos, a metodologia, a dinâmica. (...) O
planejamento quinzenal acontece junto com a coordenadora e todos da série. No meu caso,
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que sou 4º ano, por exemplo, a gente se reúne na 5ª feira; a gente tem quatro horas na escola
pra isso, num dia específico, no outro dia a gente procura material, a gente socializa com os
colegas o que está sendo aplicado, todos os dias a gente tem algumas horas alternadas, no
caso de 5ª feira são quatro horas seguidas. E a gente socializa o que está sendo dado; por
exemplo, lá na educação física, o que está trabalhando, que movimentos está trabalhando, e
isso eu posso integrar com ciências, por exemplo. Lá na dança eu posso integrar com arte;
então, a gente está sempre conversando pra conseguir integrar”.
“(...) integrar por conteúdo. Inclusive as coordenadoras que dizem por projetos, mas a gente
vai integrando nas disciplinas os projetos. (...) Pelas necessidades das crianças. (...) Tinha
muitas crianças que não conseguiam ler e escrever com fluência; foi trabalhado o Projeto
Centopeia, que trabalha leitura e conto, tem até disciplina Leitura e Conto, é um trabalho
integrado com Produção de Texto e Língua Portuguesa. As três integradas. Às vezes a
professora de Leitura e Conto tem um projeto, a gente se reúne, pensa na melhor forma de se
aplicar este projeto, falando uma linguagem deles, usando o dia a dia, coisas práticas. (...) Aí
em Ensino Religioso eu continuo com o mesmo assunto; na Filosofia a gente vai socializar
esse assunto novamente, vai debater, ligado à valores”.
“Nós temos projetos como dia dos pais, dia das mães, tem o projeto macro da escola que é a
cantata de natal que as famílias participam, tem a festa das crianças, tem o dia pedagógico”.
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Esse núcleo de significação engendra três aspectos essências do fazer pedagógico: um
está relacionado ao que está posto para o professor, no caso a grade curricular; outro ao quê e
como ensinar, que está presente na fala de Renata pela importância do planejamento e na
busca pela integração das disciplinas; e por fim como o aluno recebe tudo isso, no que tange à
aprendizagem.
Renata aponta para a flexibilidade que lhe é permitida para transgredir quando
possível à grade curricular, a fim de propiciar uma maior integração entre as áreas do
conhecimento. Ela demonstra uma tentativa de não fragmentar o conteúdo por ela ministrado.
A grade curricular, por ser dividida em disciplinas, exige que os alunos se locomovam
de um espaço para outro, o que Renata denomina de TROCAS. Em sua opinião, essas trocas,
tanto de espaços físicos quanto de disciplinas, fragmentam o conhecimento, atrapalham a
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aprendizagem, trazem uma perda no que tange ao tempo de aprendizagem do aluno, além de
deixar um ambiente escolar barulhento.
É interessante que Renata reconhece a fragmentação nos assuntos abordados nas
disciplinas, mas busca a integração. Em alguns momentos ela evidencia a falta de
comunicação entre as disciplinas do núcleo comum e do núcleo diversificado. No entanto,
quando o assunto é planejamento, nota-se uma ênfase na troca de informações entre os
professores para superar a fragmentação, de tal forma que se integre sempre que possível os
conteúdos. Ainda na tentativa de superar a fragmentação, aparece sutilmente o trabalho com
projetos, com um foco na superação das dificuldades dos alunos ou como eventos. Assim,
Renata se mostra empenhada em buscar uma interdisciplinaridade, tanto no seu fazer
pedagógico quanto em seus planejamentos, mas seu discurso demonstra uma distância entre o
que se pretende fazer e o que de fato é feito.
Renata preocupa-se com a aprendizagem dos alunos, não apenas enquanto conteúdo,
mas, sobretudo, com o que é ofertado para além dos muros da escola. Assim, preocupa-se com
a formação limitada que o aluno pode ter da realidade que o cerca, se a escola não pensar
sobre esta questão e encontrar meios para superá-la. E ainda pontua que houve uma
progressão neste aspecto de um ano para outro, pois o que antes não era nem mencionado, ao
menos agora se pensa em incluir no Projeto Político Pedagógico a necessidade de aulas fora
dos muros da escola. Inclusive ela usa o termo “apresentar a cidade”, e assim expandir a visão
dos alunos para além da realidade escolar.
No entanto, em que pese a necessidade de sair da escola para explorar outros
ambientes educativos e ampliar os horizontes dos alunos, Renata comenta a ótima qualidade e
o bom uso de todos os espaços intraescolares.
Núcleo III – “Conseguir com que essas crianças aprendam em meio a tudo isso que a
gente vive, com essa comunidade que tem alto índice de criminalidade (...) ainda bem
que existe esta escola”.
Neste núcleo estão agrupadas as falas do sujeito, no que se refere à contribuição da
escola de tempo integral para a comunidade na qual foi implantada e ao papel da família nesse
contexto.
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“(...) essas crianças precisam também ficar com a família. As crianças chegam na escola as
sete e meia da manhã e saem daqui as sete horas da noite. Que tempo eles têm pra ficar com
a família? (...) Eu penso que o ideal seria até umas três da tarde. A gente trabalhar as
quarenta horas semanais como é a proposta, mas que a criança não ficasse em sala de aula”.
“(ideal de tempo) Seis horas. A vivência com a família facilita a aprendizagem. A vivência
que não tenha somente o espaço escolar, ela vai facilitar a aprendizagem”.
“(...) Se fosse seis horas com os alunos seria melhor, não modificando a minha obrigação de
trabalhar as quarenta horas semanais (...) agora, eu acho muito para os alunos”.
“Tem dias que a gente percebe que não tem condições mais naquele dia; dá quatro horas da
tarde, a gente recorre à dinâmica de brincar”.
“Se eu tivesse um filho, eu não colocaria em uma escola de tempo integral”.
“Eu não sei o que tirar porque tudo é importante. A gente não colocaria na escola uma
disciplina que não fosse importante para ele, todas são importantes; agora eu não sei até que
ponto isso é bom, ficar todo esse tempo na escola”.
“Nós temos projetos como dia dos pais, dia das mães, tem o projeto macro da escola que é a
cantata de natal que as famílias participam, tem a festa das crianças. Tem o dia pedagógico,
que é um dia reservado pra entregar as notas das crianças para os pais, os pais vêm e a gente
conversa um por um, por bimestre. Eu acho bastante positivo, principalmente esse dia de
entrega de notas, porque ali você fala sobre o comportamento do aluno, sobre a ajuda que
você precisa dos pais com relação à aprendizagem, para elogiar, para criticar; é a
oportunidade que a gente tem de trazer o pai para a escola. Agora, a gente não faz muita
reunião com pai porque não funciona, aqui a comunidade não vem. (...) Já tentamos muitas
vezes aqui, mas não acontece. Então, o dia pedagógico é a oportunidade porque ele vai pegar
a nota do aluno, vai pegar o uniforme, então eles se interessam por vir, então a gente
aproveita pra falar da aprendizagem”.
“(...) Já é a minha terceira turma que eu tenho; é raro você ver um pai vir oferecer ajuda,
perguntar como está o filho dele, vem é preocupado com a bolsa família, se o filho vai
receber a bolsa família. Eles estão preocupados se a criança vai entrar na escola porque
precisa ir cedo trabalhar e se está sem uniforme num determinado período da escola não
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entra. Se ele vem atrás do boletim, às vezes tá preocupado em manter a vaga do aluno, mas
não estão preocupados com a aprendizagem deles não, a preocupação é nossa mesmo”.
“(...) Eu sei que o futuro dessas crianças depende dessa aprendizagem, muito dessa
aprendizagem; não só dela, mas depende muito dela. (...) Eu faço com muita
responsabilidade, visando o objetivo que é a aprendizagem. Eu sei que se eu fizer de qualquer
forma, eu nem conseguiria fazer porque eu amo o que eu faço, não vai render frutos. (...) A
responsabilidade é quase toda minha. Até porque eu sei que quando ele chega em casa não
vai ter apoio, pelo que eu percebo não vai, dessa comunidade aqui não. Então, eu sei que o
meu trabalho é importante para eles, nesse momento é primordial, é tudo que eles têm”.
“Quando a escola veio pra cá, o que me falaram é que o intuito era mudar a comunidade
através da escola, e isso a gente percebe que aconteceu. Então, já é um ganho, e quando eles
estão aqui, não estão nas drogas, não estão trabalhando, que muitos até trabalham. Eles
estão vivenciando coisas que vão agregar conhecimentos e valores pra eles. (...) Quando a
gente pega as histórias mais feias, que vez por outra a gente ouve aqui, a gente pensa: ainda
bem que existe essa escola. Então, eu acredito que o ganho é na vida social, na vida afetiva, é
no sentido da aprendizagem em si, talvez numa garantia de futuro, eu digo talvez porque não
depende só da escola”.
“Conseguir que essas crianças aprendam em meio a tudo isso que a gente vive, com essa
comunidade que tem alto índice de criminalidade, com envolvimento com droga. (...) Mas o
maior desafio é que chega o final do ano, você olha para aquele rostinho e diz: esse aqui
superou”.
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Este núcleo de significação traz a relação tempo de permanência na escola e
participação familiar. Renata comenta que os alunos ficam em média 9 a 10 horas na escola e
que isso traz consequências para o processo de aprendizagem dos educandos e para a relação
familiar. Para ela, o ideal seria entre seis e sete horas de permanência.
O tempo de permanência escolar diário dos alunos proposto por Renata é por ela
percebido considerando diversos aspectos. Enquanto professora, sente necessidade de
dinâmicas recreativas, pois percebe que a partir de um determinado tempo em sala de aula,
que seria mais ou menos após sete horas de atividades dirigidas, “a criança não tem mais
condições”, ou seja, o cansaço físico e cognitivo interfere no rendimento dos alunos em sala
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de aula. Renata contrapõe sua sugestão para diminuir a carga horária quando considera a
dúvida quanto ao que extrair da carga horária das crianças, pois acredita que tudo o que eles
vivenciam atualmente na escola seja importante para a sua formação. Assim, notamos que por
um lado ela sugere a redução da carga horária, mas por outro não consegue discernir o quê,
em termos de componente curricular, poderia ser reduzido.
Outro aspecto é a relação família-criança e família-escola. Renata comenta a ausência
da família no cotidiano das crianças, tanto em assumir responsabilidades na sua formação
quanto na questão afetiva. Em seu relato ela evidencia que não colocaria seu filho na escola
de tempo integral, pois apesar de acreditar na proposta enquanto professora, não concorda
com a ausência da família na rotina da criança e percebe que este fato é também consequência
do excesso de tempo na escola. Renata considera a vivência familiar importante para o
desenvolvimento das crianças.
Neste sentido, ela se percebe como a única pessoa responsável pelo processo de
aprendizagem de seus alunos (“nesse momento é primordial, é tudo que eles têm”), deixando
transparecer um sentimento de solidão e da importância da sua figura. Apesar de não sentir a
preocupação das famílias quanto à aprendizagem das crianças, aproveita a “oportunidade”
dos eventos na escola, como o dia pedagógico, para buscar parceria com a família. Em sua
fala nota-se que a família está presente na escola apenas em datas festivas ou para receber
algo, como uniforme, material, bolsa família...
Renata demonstra que o interesse e a preocupação das famílias com relação à criança
estão focados no assistencialismo e não no processo de aprendizagem. Assim, entende que o
interesse da família na escola de tempo integral não prioriza a qualidade do processo ensino-
aprendizagem, e sim a garantia de um espaço seguro para seus filhos, a possibilidade da bolsa
família e a viabilidade de conciliar a maternidade e o trabalho.
Quando se refere ao motivo da implantação da escola no bairro e às mudanças que
ocorreram após a sua implantação, Renata coloca a escola como espaço redentor para as
crianças, um local que surgiu para tirá-las do convívio com as ruas, protegê-las das drogas e
da violência. Neste sentido, Renata coloca que a escola contribuiu para a comunidade, pois
possibilitou ganhos sociais, afetivos e cognitivos para as crianças.
Núcleo IV – “Em Palmas as pessoas falam que vale a pena ser professor. ”
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Este núcleo reúne trechos que indicam a satisfação da docência, vista pelo sujeito
como uma carreira profissional compensatória, reconhecida e valorizada.
___________________________________________________________________________
“Tivemos uma formação no início do ano para (...) os profissionais aqui de Palmas, que foi
muito válida. Fui conhecendo sobre leis, (...) sobre o aproveitamento do tempo na escola, o
que esperam de nós a comunidade, a prefeitura. E também teve um seminário das escolas de
tempo integral no mês de julho; me parece que foi bastante positivo também porque vieram
grandes palestrantes, trouxeram experiências de outros países, outros estados; foi um
seminário de três dias, foi muito bom e muito válido. A prefeitura investe em formação para a
gente, eu mesma fiz duas formações o ano passado, (...) foi uma parceria da universidade
federal com a prefeitura aqui de Palmas”.
“(...) A gente tá no caminho, temos que melhorar, claro que temos (...) eu tenho orgulho da
educação daqui, tem muito para ser feito, muito para melhorar, mas pra nós é motivo de
orgulho. Por que o ideal (...) vai acontecendo”.
“(...) Percebi que aqui é o melhor; até a questão salarial, valorização do profissional, isso
conta muito, não é o ideal, mas quando eu comparo...”
“Professor em Palmas é respeitado. A tendência da sociedade é valorizar quem não conhece.
Por exemplo, eu conheço superficialmente o que um advogado faz, mas na prática dele eu
não sei, da mesma forma um médico, e as pessoas valorizam esse profissional porque sabem
que ele é importante para a sociedade e pelo que ele ganha, a remuneração. Então, em
Palmas as pessoas falam que vale a pena ser professor aqui, porque vocês são bem vistos na
sociedade; isso é valor e a remuneração, que é o segundo melhor salário do país. O primeiro
é Brasília. (...) Então, eu penso que isso é valorização”.
“O ano passado quando eu fiz aquele curso, quando que isso acontecia? A não ser aqueles
cursos que eram dados na escola mesmo. (...) Eu achei tão prático, tão válido, que pra mim
foi lindo”.
___________________________________________________________________________
Renata aprecia a valorização da docência em Palmas. Ela atribui isso ao
reconhecimento profissional, às oportunidades de formação continuada, ao salário e à visão da
sociedade em relação ao professor.
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Ela compara a profissão de médico, advogado e professor, como sendo bem
remuneradas e importantes para a sociedade e, portanto, reconhecidas. Compara também a
remuneração dos professores de Palmas em relação aos outros municípios do país e enfatiza
que esta só está atrás do salário dos professores de Brasília.
Outro aspecto que a faz se sentir valorizada, como já mencionado é o investimento em
formação continuada por parte da prefeitura. Percebe-se que houve a preocupação em formar
os professores para assumir o cargo em escolas de tempo integral. Não uma formação apenas
preparatória, mas uma formação reflexiva a respeito da educação em tempo integral, pois
contou com a participação de diversos estudiosos que partilharam vivências de outros
municípios e de outros países. Além dessa formação, Renata citou também dois cursos que
realizou, devido à parceria entre a prefeitura de Palmas e a universidade federal, enfatizando a
importância para a sua carreira de ter tido esta oportunidade, e um avanço em termos de
ofertas de cursos provenientes da prefeitura. Este ponto fica evidente quando Renata comenta
por meio de uma pergunta: “quando que isso acontecia?”.
Renata sente orgulho em ser professora em Palmas, diz que tem o que melhorar, mas
valoriza o que já foi feito.
Síntese da Professora Renata
Analisando as palavras de Renata, buscamos os sentidos constituídos pela professora
com relação à educação em tempo integral. Falamos de aspectos objetivos e subjetivos,
considerando-os indissociáveis. Assim, Renata constrói as condições existentes dessa
realidade e é também por ela constituída, numa relação, portanto, dialética. Em seu relato é
possível perceber aspectos da história, do social e de sua individualidade.
Renata compara a educação em tempo integral e a educação em tempo parcial, uma
vez que teve a oportunidade de vivenciar como professora as duas realidades. No decorrer do
seu relato, ela diferencia estes dois contextos, tanto enquanto atuação docente como o reflexo
desta proposta para o aluno.
Embora desenvolvesse a mesma profissão em ambos os contextos, ao assumir o cargo
de professora na escola de tempo integral Renata percebeu uma dinâmica diferente do que
estava acostumada e sente este modelo de escola como uma novidade para a sua atuação
docente. Sente-se mais cobrada e mais responsável pelo seu compromisso de ensinar na
escola de tempo integral. Afirma que precisa cuidar do envolvimento e da participação dos
90
alunos nas atividades propostas. Assume uma quantidade maior de componentes curriculares
para ministrar e diz que é necessário ter “jogo de cintura” para ficar com uma turma o dia
todo.
Comenta a diferença nos espaços educativos entre as duas escolas, enfatizando que,
ainda que a quantidade de alunos seja numerosa, o espaço físico é adequado e o considera
ótimo.
Essas diferenças citadas por Renata a partir de sua experiência de vida corroboram
com Moll (2011), quando esta coloca as implicações em se ampliar o tempo de permanência
dos estudantes:
“A ampliação do tempo de permanência dos estudantes tem implicações diretas na
reorganização e/ou expansão do espaço físico, na jornada de trabalho dos
professores e outros profissionais da educação, nos investimentos financeiros
diferenciados para a garantia da qualidade necessária aos processos de mudança,
entre outros elementos” (MOLL, 2012, p. 28).
Renata vivencia, como podemos identificar na citação acima e em seu relato, as
implicações da educação em tempo integral. Sua jornada de trabalho é diferenciada da jornada
dos professores que atuam em tempo parcial: são quarenta horas semanais, o espaço físico foi
planejado e construído para este fim, e assim foi necessário investimento financeiro por parte
do governo para a implantação da proposta.
O processo ensino-aprendizagem também é diferenciado. Como professora, Renata se
cobra quanto ao conhecimento de seus alunos, sente-se responsável por ensinar e fazer com
que seus alunos aprendam porque tem tempo suficiente para isso.
Giolo (2012) ressalta as consequências do curto tempo de permanência dos alunos na
escola:
A restrição do tempo faz com que a escola absorva e ofereça conteúdos mínimos,
esqueléticos, caricatos, incapazes de manter sua ligação orgânica com o vasto campo
do saber acumulado e, portanto, incapazes de conferir sentido que mobilize, em seu
favor e em sua direção, o estudante e o professor. (GIOLO, 2012, p. 98)
Como Renata teve a experiência da docência em ambos os contextos, podemos afirmar,
analisando a sua fala e corroborando com Giolo, acima citado, que o curto tempo de permanência na
escola de tempo parcial pode ter influenciado os baixos índices de qualidade encontrados no
processo ensino-aprendizagem. Sabemos que em Palmas, por exemplo, o Ideb, antes do
investimento em educação em tempo integral, ou seja, em 2005, era 3.6 e em 2007, 4.4. Em
2009, contando com a experiência de educação em tempo integral, o índice passou para 5.4.
91
No Ideb 2011, a rede municipal de Palmas obteve o índice 5.8 para o 5º ano do ensino
fundamental.
Para Renata, a escola de tempo integral propicia aos estudantes mais vivências e mais
conhecimento, assim os alunos tornam-se mais criativos e responsáveis. A escola desenvolve
“corpo e mente” e se diferencia, portanto, da escola de tempo parcial. Estamos, então, falando
de uma escola que não está fazendo mais do mesmo, ou seja, de uma proposta que não apenas
amplia a carga horária, mas se preocupa em oferecer maiores oportunidades de aprendizagem.
Renata não concebe o fracasso escolar, pois não encontra justificativas para que ele
aconteça no contexto em que atua. Percebemos em sua fala a relação tempo e aprendizagem.
E nesse tempo, ainda visando à qualidade dos processos de aprendizagem, está presente a
possibilidade de flexibilizar a grade curricular no que tange às disciplinas por ela ministradas.
Como evidencia Giolo (2012), “o tempo integral (...) permite organizar as atividades escolares
segundo métodos adequados de ensinar e aprender”. Há tempo para ensinar, planejar,
experimentar novas metodologias; o tempo torna-se um aliado da educação, mas o excesso de
atividades dirigidas pode também limitar o convívio familiar, tão importante para o
desenvolvimento das crianças. Neste sentido, Renata sugere um equilíbrio: ofertarmos mais
tempo de permanência do aluno na escola do que o oferecido pelas escolas de tempo parcial,
mas não cairmos no outro extremo, que seria o exagero de permanência na escola. Assim,
propõe uma redução das nove horas diárias para seis a sete horas.
É interessante, ainda refletindo a respeito do uso do tempo, quando Renata demonstra
a saturação das crianças com a sala de aula após as dezesseis horas da tarde, e complementa
dizendo que precisa recorrer à dinâmica do brincar.
Quanto a isso Paro (2009), afirma:
Depois de todo o desenvolvimento da pedagogia, especialmente no Século XX,
ainda confinamos crianças em salas de aula por quatro ou cinco horas diárias,
ignorando aquilo que a psicologia da educação já nos ensinou há mais de setenta
anos, ou seja, que a forma individualizante do professor explicador é o pior dos
métodos para desenvolver a aprendizagem da criança desde o momento que nasce
até por volta de dez ou onze anos de idade. (PARO, 2009, p. 18).
Assim, notamos que embora a escola de tempo integral em que Renata atua ofereça mais
oportunidades de aprendizagem, conforme já mencionado, estas oportunidades precisam ser revistas
no aspecto metodológico. Renata afirma que as aulas são fragmentadas pela forma em que foi
composta a grade curricular e que há um prejuízo no processo de aprendizagem dos alunos propiciado
pelas “trocas” de disciplinas.
92
Assim, podemos perceber que a ampliação do tempo de permanência dos alunos na
escola pode favorecer a aprendizagem, se estiver imbricado à qualidade dos processos ensino-
aprendizagem. Quanto a isso, Giolo, (2012) afirma;
Mais do que os fatos ou meios vistos como milagrosos, o que garante o sucesso do
trabalho escolar é, entre outros elementos, a organização do tempo de forma a
permitir a ação metódica de professores e de alunos em direção ao conhecimento.
(GIOLO, 2012, p.100).
Nas palavras de Renata, a ação metodológica e o gerenciamento do tempo de
permanência dos alunos aparecem como dois desafios a serem refletidos: a fragmentação do
conhecimento e o excesso de tempo no espaço escolar. Temos de cuidar para não oferecermos
“tudo” em termos de quantidade de disciplinas e “nada” em relação ao aprofundamento do
conhecimento. Ela se refere ao desenvolvimento de projetos que poderiam contribuir para a
não fragmentação do conhecimento. No entanto, percebe-se que Projeto, para Renata, tanto
pode estar atrelado ao trabalho interdisciplinar e mais aprofundado em torno de um tema,
como também a eventos promovidos pela escola.
Renata relata a necessidade de se ampliar os espaços educativos para além do espaço
escolar, pois entende que a criança não pode ter o conhecimento restrito ao espaço escolar.
Para tanto, comenta: “a criança não tem outra visão, a visão dela é isso aqui e pronto”.
Ainda nesse sentido, percebe-se que este incômodo sentido por Renata, passou a ser pauta de
discussão em reuniões pedagógicas para que se insira ao Projeto Político Pedagógico a
ampliação dos espaços educativos. Quanto a isso, o CENPEC, publica em seu caderno
“Tendências para Educação Integral”:
A escola só estará compreendendo o aluno com o qual lida e o espaço em que ele
vive, se intensificar sua prática na vida do território, nele se enraizando. Cabe a ela
representar a cultura local, valorizá-la, disseminá-la propiciando o intercâmbio entre
ela e o que é disposto no mundo, para melhorar a vida do sujeito e de sua
comunidade. (...) Quando as atividades pedagógicas abarcam outros espaços, além
do escolar, criam-se ambientes educativos voltados para uma maior pluralidade
cultural, o que influencia a formação de atitudes para a tolerância, para o respeito ao
diferente, ao que é do outro. (CENPEC, 2011, p.54)
A ampliação dos espaços educativos é vista por Menezes (2009) como essencial na educação
em tempo integral, justamente para que a escola não impeça o convívio com a sociedade:
... o aumento do tempo escolar deve necessariamente se fazer associar a uma
ampliação do espaço escolar. A ampliação da jornada, quando limitada
exclusivamente ao espaço físico intraescolar, impede que os estudantes tenham
acesso a oportunidades de convivência com outros ambientes socioculturais
enriquecedores. (MENEZES, 2009. p. 81)
93
O Projeto Político Pedagógico parece estar em constante construção, sendo alterado conforme
as necessidades aparecem na prática pedagógica. O tempo para reuniões coletivas e planejamento de
aulas faz parte da rotina. Renata comenta que tem um tempo específico na semana onde o grupo
responsável pelo ano que atua se reúne para discutir o planejamento e buscar formas de
interdisciplinaridade. Nesse sentido, ao mesmo tempo em que Renata se incomoda com a
fragmentação do conhecimento, estão presentes em sua alocução tentativas para evitá-la.
A ausência da família no processo de aprendizagem dos alunos é relatada por Renata como
sendo um aspecto que interfere na qualidade da aprendizagem. Segundo ela, a família comparece
apenas em eventos ou para buscar materiais, garantir a bolsa família... Renata aponta como sendo a
única responsável pela aprendizagem das crianças e isso ela coloca como “importância primordial” na
vida das crianças, pois se ela não assumir esse papel, as crianças não terão o apoio de outra pessoa
(família) para ajudá-las. Ciente da ausência da família no processo, Renata continua buscando apoio e
para isso faz uso do Dia Pedagógico, dia em que os pais vão buscar o boletim, para poder falar do
processo de aprendizagem individualmente com cada pai/mãe.
A ausência da família no processo de aprendizagem e o excesso de tempo de permanência dos
alunos na escola fazem Renata projetar que, se tivesse filho, não o colocaria em uma escola de tempo
integral, mesmo optando por trabalhar em uma escola neste contexto e percebendo que ele oferece
mais oportunidades de aprendizagem. Ela justifica essa postura porque a escola de tempo integral tira
da família a oportunidade de um maior convívio com a criança. Para seus valores pessoais isso não se
aplica.
É interessante que, ao mesmo tempo em que Renata considera a escola com um tempo
excessivo, ela identifica o ambiente escolar importante para a vida das crianças, pois ao invés de
estarem nas ruas à mercê das drogas e da violência, estão na escola aprendendo e sendo protegidas.
Aqui percebemos um caráter redentor da escola, como sendo um espaço que protege as crianças da
sociedade ao seu redor.
Renata afirma que a escola cumpriu o seu papel, pois quando se pensou em implantar a escola
de tempo integral para a aquela comunidade, a intenção era modificar a realidade. Mais uma vez,
quando se refere à escola, esta é vista como a “salvação” para a comunidade. No entanto, quando
Renata projeta o futuro de seus alunos, ela percebe que a escola pode contribuir positivamente, mas
não é o único elemento responsável por garantir um futuro, no sentido de que se tornem cidadãos, que
trabalhem e contribuam para a sociedade.
Com relação à atividade docente, Renata considera-se bem remunerada, pois sabe que o salário
dos professores municipais de Palmas está abaixo apenas dos professores municipais de Brasília. Além
disso, percebe o reconhecimento da atividade docente por parte da sociedade e compara a sua
94
profissão a outras (medicina e direito) como estando no mesmo patamar de reconhecimento social.
Esta fala de Renata condiz com a implantação do Plano de Cargos, como já citado no capítulo III, pois
o mesmo trouxe benefícios interessantes para a carreira docente.
6.2 – Análise do sujeito II: Diretora Laura
Como já mencionado no capítulo anterior, Laura é formada em biologia, atuou como
professora, coordenadora e atualmente é diretora da escola de tempo integral. Após um
período fora do mercado de trabalho, reingressou como professora da rede municipal e depois
assumiu o cargo de coordenação e foi convidada para trabalhar na escola de tempo integral
logo após sua inauguração, inicialmente como coordenadora pedagógica e depois como
diretora.
Núcleo I: “Agregar valores que ele possa utilizar na sua vida”.
Neste núcleo agrupamos os trechos da entrevista com Laura que exemplificam o seu
entendimento a respeito do conceito educação integral em tempo integral.
__________________________________________________________________________________
“... a proposta da escola de tempo integral precisa ser conscientizada (...) para a família de que ela
não é só a ocupação de tempo do aluno”.
“A escola veio para agregar valores culturais para esse aluno, que vai além dos conteúdos, do
cognitivo, das disciplinas curriculares normais”.
“... a escola veio para melhorar a vida deles, porque realmente é uma parte social”.
“Educação integral vai além do conhecimento; é justamente dar a esse aluno, agregar valores pra
que ele possa utilizar na sua vida. Agregar valores culturais, saber apreciar uma boa música, saber se
expressar corporalmente na disciplina de teatro, é o aluno poder ter uma disciplina melhor através do
xadrez. Então, é agregar cultura à vida desses alunos e não só conhecimento, que ele possa utilizar
isso na vida dele, no progresso dele e ser uma pessoa melhor”.
“Educação integral pra mim é isso, é educação de valores; muitos desses valores são atendidos aqui
(...) até o afetivo”.
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“A escola de tempo integral, quando bem dimensionada, (...) bem estruturada, eu acho que ela tem
muito a oferecer; é um ganho que a minha concepção não tem volta, que é o caminho, precisa de
ajustes, precisa, mas é o caminho”.
“O tempo é necessário para que ele componha o aculturamento dele”.
“Eu acho que a educação teve um período que ela perdeu muito, ela perdeu muito dos valores, (...)
cresceu em tecnologia, (...) mas alguns pontos precisam ser revistos”.
“... estar vivenciando, ajudando a formular a escola de tempo integral (...) para um país como o nosso
é visar para uma educação melhor. Minha importância é procurar a melhoria da educação”.
“O ganho da educação em tempo integral é a melhoria na qualidade, é procurar cada vez mais
qualidade, experiência, é formação de valores (...) crescer enquanto pessoa, valorizar o outro,
valorizar o crescimento do ser humano”.
“... é uma geração nova, (...) muito inteligente, mas que está precisando ser direcionada”.
“... quem está na escola de tempo integral tem que crescer (...) porque é muito tempo dedicado à
educação. (...) Então é preciso que ela melhore de fato e de direito”.
“Ela veio muito na proposta (...) assistencialista e é um esforço que ela vai se transformar em uma
necessidade de ganho real para os alunos”.
__________________________________________________________________________________
Neste núcleo é possível notar como Laura construiu a sua concepção de educação integral a
partir da experiência profissional, tanto na escola de tempo integral quanto na escola de tempo parcial.
Para Laura, o grande desafio é mostrar à sociedade que a escola de tempo integral não se resume à
mera ocupação do tempo das crianças; ela é uma educação para a vida.
Em sua fala, Laura apresenta características da jornada em tempo integral que a aproximam da
concepção de educação integral. Para ela, a escola vai além da transmissão do conhecimento
historicamente acumulado, porque trabalha os valores e possibilita maiores experiências e vivências.
Evidencia, dessa forma, a comparação entre as experiências de jornada parcial e integral, sendo que a
segunda se configura como uma oferta de maior qualidade de educação, uma vez que o aluno,
dedicando tanto tempo à educação, precisa “crescer”. Assim, notamos que Laura não considera,
portanto, o fracasso escolar.
Dessa forma, “a escola de tempo integral, quando bem dimensionada e bem estruturada, é um
caminho sem volta”. Esta fala é interessante porque indiretamente compara também as experiências de
96
jornada parcial e integral e mostra que quem vivencia a jornada ampliada percebe a diferença no que
tange à qualidade de ensino desta proposta e a projeta como o futuro da educação.
Laura enfatiza a necessidade de trabalhar com os alunos os valores culturais e afetivos e a
possibilidade que a escola de tempo integral tem de abarcar esta questão. Liderar a equipe docente e
“direcionar” os alunos em prol de uma educação integral é o que a faz sentir que o seu trabalho é
importante, uma vez que visa à “melhoria da educação”.
Núcleo II: “As disciplinas se complementam (...) devem estar dentro de uma engrenagem”.
Este núcleo apresenta a proposta curricular da escola de tempo integral que atualmente é
ofertada e as sugestões de ajustes necessários a essa proposta, pautadas na vivência de Laura como
diretora da escola de tempo integral.
__________________________________________________________________________________
“As disciplinas curriculares funcionam nas quatro horas normais e as disciplinas complementares
funcionam no turno oposto”.
“A gente não chama de contraturno, porque na realidade (...) propõe que isso seja integralizado (...)
que seja interdisciplinar. Que não seja, agora é disciplina do núcleo comum, agora é disciplina do
núcleo diversificado”.
“São quatro horas de disciplinas normais e quatro horas de disciplinas do núcleo diversificado, que
devem estar dentro de uma engrenagem”.
“As aulas são interrompidas em três momentos: no café da manhã, no almoço e no lanche da tarde”.
“A gente precisa ter muito cuidado na otimização (...) do tempo real em sala de aula, porque se a
gente não tomar cuidado as quatro horas efetivas de aprendizagem mesmo, do núcleo comum, também
ficam prejudicadas”.
“Nós não temos intervalos. Eles chegam às oito horas, se acomodam na sala e já descem para o café
da manhã que dura em termos de quinze a vinte minutos e vão descendo escalonado. Aí continua
normalmente, depois começa o almoço às quinze para as onze (...) até (...) o meio dia. De meio dia a
uma eles descansam e quando dá umas três e meia (...) é o lanche da tarde, escalonado também. (...)
Termina todas as atividades às dezessete horas. Quem tem treinamento, são duas horas de
treinamento, das dezessete e quinze às dezenove e quinze, mas o treinamento é opcional”.
“Eu acho que não precisava de tanto tempo a mais”.
97
“Algumas disciplinas (...) deveriam ser obrigatórias (...) como as do núcleo comum, e ele faria uma
opção de mais três disciplinas do núcleo diversificado, para que completasse essa carga horária
dele”.
“O estudo monitorado eu acho necessário (...) é o momento pra fazer a tarefa, (...) tirar uma dúvida,
(...) fazer um trabalho”.
“Algumas disciplinas poderiam ser opcionais (...) faria uma inscrição depois ou no momento da
matrícula; a proposta é pra reduzir um pouco essa carga horária, ela é cansativa”.
“Oito horas pra uma criança na escola é muito tempo, eu acho que umas três horas a mais, duas
horas a mais já é uma escola de seis, sete horas (...) ela rouba um pouco da infância dele”.
“Todas as disciplinas têm nota, são avaliadas, porque faz parte do plano político pedagógico, da
proposta curricular, é matriz”.
“A escola é adequada para uma educação em tempo integral. (...) Cada disciplina tem um espaço
adequado”.
“Aqui não funciona (...) como as escolas de Belo Horizonte e Curitiba, (...) que utilizam espaços da
cidade como espaços educativos. Nós ainda não temos essa proposta”.
“Há na nossa cidade alguns espaços que poderiam estar sendo aproveitados para isso, mas o
deslocamento da comunidade também fica meio complicado. Mas eu acho que o ideal seria dessa
maneira, que cada escola tivesse adequação para a educação em tempo integral”.
“(para não ficar turno e contraturno) é um desafio grande (...) faz por meio de projeto (...) e também
do planejamento (...) o coordenador tenta entrosar”.
“Trabalhamos muito com diagnóstico para ver onde nós podemos avançar”.
“Essa escola foi totalmente construída com dinheiro, recursos do município, 100% do município. (...)
É uma escola totalmente subsidiada e não falta recursos de maneira nenhuma. (...) Mais Educação,
PDDE, Merenda, FUNDEB, é todos esses recursos”.
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Este núcleo exemplifica a rotina na escola de tempo integral e traz as implicações e sugestões
observadas e relatadas por Laura quanto à proposta curricular.
Laura explica que as disciplinas são organizadas em dois núcleos, o comum e o diversificado,
e afirma que elas devem estar dentro de uma “engrenagem”, a fim de promover uma
interdisciplinaridade que supere a visão turno e contraturno. No entanto, em sua fala aparecem pontos
98
que contradizem esta superação; por exemplo, quando Laura comenta que “são quatro horas normais
e quatro horas diversificadas”, podemos perceber que o termo mudou, mas a dicotomia continuou
presente. Observamos este mesmo fato quando Laura fala “se não tomarmos cuidado, as quatro horas
efetivas de aprendizagem, do núcleo comum, ficam prejudicadas”. Assim, para Laura, a aprendizagem
se restringe ao espaço da sala de aula e com as disciplinas da base curricular comum. Em uma
proposta interdisciplinar, não podemos separar o momento de aprendizagem e o de não aprendizagem,
pois ainda que com metodologias diferenciadas e espaços educativos diversificados, o conteúdo
perpassa as diversas áreas do conhecimento.
Laura revela que o trabalho com Projetos, os Planejamentos e a ação do coordenador
pedagógico visam à integração entre as disciplinas, mas que esta ainda é um desafio a ser superado.
Atualmente o “ponto de partida” para iniciar os trabalhos com projetos tem sido a partir de
diagnósticos realizados com alunos. Assim, podemos supor que a tentativa de interdisciplinaridade
surge mediante a necessidade pontual percebida em um determinado diagnóstico de caráter avaliativo
do processo de aprendizagem.
Os alunos entram na escola diariamente às oito da manhã e permanecem em atividades
relacionadas a uma “matriz curricular obrigatória” até as dezessete horas. Neste período, são
oferecidas três refeições; café da manhã, almoço e jantar, cada uma delas com duração de
aproximadamente vinte minutos. No intervalo entre o período da manhã e da tarde, ou seja, após o
almoço, os alunos permanecem no pátio ou assistem a um filme no auditório enquanto “desfrutam” do
momento de descanso. Após as dezessete horas, alguns alunos iniciam as disciplinas de “treinamento”,
para aprimorar determinada habilidade; estas, porém, são opcionais e têm duração de duas horas.
Laura afirma que este tempo de permanência dos alunos na escola é excessivo e os deixa
cansados. Assim, sugere que algumas disciplinas deveriam ser opcionais, sendo elas as que hoje
compõem o núcleo diversificado; exceto informática, música e estudo monitorado, que deveriam se
manter obrigatórias. Estas sugestões têm por finalidade a redução da carga horária dos alunos para
aproximadamente seis a sete horas por dia.
Quanto aos espaços educativos, Laura os considera adequados às disciplinas e revela que a
escola não faz, até o momento, uso de espaços educativos extraescolares, devido à dificuldade de
locomoção na comunidade. Embora perceba que a cidade possui espaços que poderiam ser
aproveitados de forma educativa, Laura acredita ser necessário um bom espaço intraescolar para
desempenhar com qualidade uma educação em tempo integral.
Para a construção e implantação da escola de tempo integral, Laura revela que a verba proveio
dos recursos municipais. Atualmente, para sua manutenção e operacionalização, a escola recebe verba
99
do Programa Mais Educação, do Programa Dinheiro Direto na Escola, do FUNDEB e recursos
específicos para a merenda.
Núcleo III: “Nós não estamos aqui para que você possa trabalhar”.
Os trechos presentes neste núcleo estão relacionados à percepção de Laura em relação ao
envolvimento das famílias na proposta da escola de tempo integral e os seus reflexos para os
estudantes.
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“O ponto de partida nosso para a família é que ela (a escola) não é só a ocupação do tempo do
aluno”.
“Tentar construir através de reuniões, da entrega de uniformes, entrega de livros, a conscientização
do acompanhamento”.
“Muitas vezes a gente telefona. (...) Vamos chamar a mãe”.
“Aos poucos a gente tá dizendo para as famílias, nós não estamos aqui para que você possa trabalhar.
Porque quando ela vem buscar vagas, o que você escuta é: eu preciso trabalhar”.
“Inclusive é um lugar de aprendizagem”.
“Ela quer alguém que possa tomar conta. (...) Está no assistencialismo. (...) Eu tô tranquilo, ele chega
em casa, toma banho, já fez as lições, já lanchou, tá tranquilo”.
“Um dos grandes equívocos é o assistencialismo”.
“Eu não queria vir. (...) Tia, tá doendo aqui. (...) Eu queria viajar com o meu pai ... tem muitos que
choram. (...) No contraturno daí começa a dor de barriga. (...) Sente a carência da família os mais
estruturados; os menos estruturados, não. (...) Estes quando tem feriado detestam, (...) aqui é onde
eles têm tudo, (...) comem bem”.
“A família de alguma maneira precisa vivenciar a responsabilidade dela. Mesmo que ele trabalhe. Eu
tenho crianças aqui que tem pai que vem buscar oito e meia da noite”.
“A criança não pode chegar aqui às sete e meia da manhã e sair às nove da noite. Tem a vivencia da
família”.
“Tem outros aqui que não abrem mão do tempo com o filho”.
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100
Laura percebe que as famílias buscam a escola de tempo integral pela oferta do
assistencialismo, sendo uma escola que ocupa o tempo da criança para que os pais possam trabalhar e
que permite a tranquilidade ao retornar para casa, pois seus filhos já fizeram a lição e lancharam.
A equipe docente tenta mudar esta visão equivocada das famílias e usa os espaços das reuniões
pedagógicas e da entrega de uniformes e materiais para conscientizá-las da necessidade do
acompanhamento e do objetivo da escola, que é a aprendizagem. Quando necessário, a escola entra em
contato com as famílias via telefone.
Laura distingue as crianças como vindas de famílias mais estruturadas e menos estruturadas.
As crianças provenientes de famílias bem estruturadas sentem falta do convívio familiar e, no período
da tarde, quando já estão saudosas, acabam chorando e tendo dores. Já as crianças, referidas por Laura
como provenientes de famílias mais desestruturadas, detestam os feriados e sentem falta da escola nos
dias em que não a frequentam, pois a escola oferece tudo.
Núcleo IV: “Os professores deveriam ser mais qualificados para serem melhores remunerados”.
Este núcleo reúne trechos da nossa conversa com Laura que demonstram a sua visão quanto à
valorização da equipe docente, às condições de trabalho na escola de tempo integral e à formação
continuada.
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“O primeiro desafio que eu acredito que tenha vencido foi a aceitabilidade pelo grupo de professores.
(...) Eles sempre imaginavam que iriam trabalhar mais, em tempo de hora/aula não se trabalha mais,
agora é um trabalho mais efetivo, é um tempo maior com o aluno, mas um tempo que não é além da
carga de trabalho (...) de oito horas”.
(A formação docente para a equipe assumir o cargo na educação em tempo integral) “teve o
seminário de educação integral, (...) o processo de conscientização, e agora as formações elas vão
acontecendo paulatinamente”.
“Todo ano tem um seminário, tem trazido propostas, estudos. No nosso dia pedagógico, também a
gente estuda a proposta, (...) são quatro dias”.
“Eu sou de um tempo que o professor era valorizado, não financeiramente, (...) mas enquanto
respeito”.
“Eu sou de uma época em que os professores davam aula de terno. Era igual professor universitário”.
“A nossa remuneração (...) não é uma remuneração ruim”.
101
“Eu acho que os professores deveriam ser mais qualificados para serem melhores remunerados (...) e
isso é o que faz com que eles sejam menos valorizados”.
“Nós poderíamos ter salários muito bons como vários países, mas para o professor extremamente
qualificado (...) e posteriormente valorizado”.
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Laura demonstra que a equipe de professores resistia em aceitar a proposta de educação em
tempo integral, por acharem que trabalhariam mais. No entanto, o tempo de trabalho do professor na
escola de tempo integral são as habituais quarenta horas semanais. Ela considera que é um tempo
maior com o aluno, se comparado com a escola de tempo parcial, mas não um tempo excessivo de
trabalho.
Os professores da escola de tempo integral participam de seminários anuais
específicos para esta proposta curricular, para contribuir com sua prática docente. Além disso,
contam com os quatro dias pedagógicos anuais para reverem e estudarem a proposta. Sendo
assim, Laura revela que há uma preocupação e um cuidado com a formação profissional para
atuar em uma escola de tempo integral.
Quanto à valorização profissional, Laura considera os professores da rede municipal
de Palmas bem remunerados. No entanto, comenta que falta qualificação para a atuação
docente. Para Laura, o professor deveria ser mais bem qualificado, para assim ser mais bem
remunerado e valorizado.
Laura remete ao passado como exemplo de valorização dos professores e atribui o uso
de terno para dar aula como sinônimo de respeito. Assim, faz deste argumento uma
comparação entre o professor universitário atual ao professor do ensino fundamental do
passado.
Síntese da diretora Laura
Como foi relatado, Laura é diretora de uma escola de tempo integral. Ela tem
formação como bióloga e, para complementá-la para o cargo que atua, participou de cursos
relacionados à gestão escolar. Quando se refere ao seu trabalho na escola de tempo integral,
sua fala revela sentidos e permite dar visibilidade à realidade deste contexto.
Laura demonstra as contribuições da educação em tempo integral para a proposta de
formação integral do aluno. Ela compara a escola do seu tempo enquanto aluna e a escola
102
atualmente, e comenta que o ganho da escola em tempo integral é resgatar o trabalho que a
escola deixou de fazer, que para ela é “agregar valores culturais, sociais e afetivos”.
D’Ambrosio (2012), relaciona a educação integral e a formação de valores:
A educação integral demanda que na escola sejam vivenciados sistemas de valores e
construção do conhecimento. O desafio do educador é acompanhar a transformação
dos alunos nesse vivenciamento. Propor e defender um sistema de valores
subordinado à ética maior de respeito, solidariedade e cooperação é a missão do
educador. (D’AMBROSIO, 2012, p. 116)
Assim, notamos que, para Laura, as disciplinas não devem se restringir à transmissão
do conhecimento historicamente acumulado; elas precisam formar para a vida, para uma
mudança de comportamento. “Agregar valores culturais, saber apreciar uma boa música, saber se
expressar corporalmente na disciplina de teatro; é o aluno poder ter uma disciplina melhor através do
xadrez. Então, é agregar cultura à vida desses alunos e não só conhecimento, para que ele possa
utilizar isso na vida dele, no progresso dele e ser uma pessoa melhor”.
Para Laura, esta proposta da educação integral em tempo integral se revela como “um
caminho sem volta”. Ou seja, uma vez experimentada e vivenciada por educandos e
educadores, não é possível voltarmos para uma escola que transmite conteúdos desconectados
da vida de seus alunos. A proposta é ainda percebida por Laura como um dos elementos
possíveis para melhorar a qualidade da educação brasileira, e é por participar deste intento que
Laura encontra a importância do trabalho que desempenha.
Henz (2012), afirma a relação educando e educadores construindo a educação integral
e integrada da seguinte forma:
A escola de turno-integral pode ser um espaço-tempo em que a educação também
torne-se integral e integrada, possibilitando a cada educando(a) e educador(a) os
desafios e as condições para descobrir-se, assumir-se e ser mais. Sim, com Freire
(1995b, p.96) acreditamos que “não podendo tudo, a prática educativa pode alguma
coisa”. (HENZ, 2012, p. 83)
É interessante notar que Laura apresenta a proposta de educação integral em tempo
integral de forma que as disciplinas estejam integradas. Assim, como Henz, Laura afirma: “A
gente não chama de contraturno, porque na realidade (...) propõe que isso seja integralizado
(...) que seja interdisciplinar”. No entanto, a prática que ela descreva contradiz a proposta de
educação integral em que acredita.
Assim, notamos que ao mesmo tempo em que fala de uma proposta interdisciplinar e
integrada, faz uso da nomenclatura núcleo comum e diversificado e revela que esta dicotomia
perpassa a prática educativa: “se a gente não tomar cuidado, as quatro horas efetivas de
103
aprendizagem mesmo, do núcleo comum, também ficam prejudicadas”. Nesta fala de Laura, a
aprendizagem se reduz ao espaço sala de aula e às disciplinas da base curricular comum.
Podemos supor que há apenas a mudança de nomenclatura “turno e contraturno” para “núcleo
comum e diversificado”, e que a integração atualmente se restringe a uma proposta, mas não
se configura como uma ação educativa.
Laura demonstra uma preocupação em tentar integrar o currículo por meio de projetos,
do planejamento e da figura da coordenadora pedagógica que assume essa responsabilidade.
Assim, afirma: “(para não ficar turno e contraturno) é um desafio grande, (...) faz por meio
de projeto (...) e também do planejamento (...) o coordenador tenta entrosar”. Realizar uma
proposta curricular integrada que supere a proposta de disciplinas estanques e esvaziadas
nelas mesmas é, na prática educativa, considerada um desafio.
Mamede (2012) exemplifica a dificuldade dos profissionais em realizar efetivamente
uma ação educativa integrada;
Os profissionais atuantes na busca de implementar a educação integral, por exemplo,
vivenciam e, mais do que isso, promovem eles mesmos, de maneira ainda
predominante, o tempo escolar repartido em dois turnos antagônicos: um dedicado
aos conteúdos escolares “rígidos” e o outro voltado a atividades “leves e prazerosas”,
incluindo esporte, cultura e lazer.
Não é difícil, contudo, situar as dificuldades e limitações na forma de compreender e
organizar o tempo escolar estendido, se considerarmos, pelo menos, dois fatores: um
deles diz respeito ao fato de que predomina na nossa história, na cultura escolar
brasileira, a jornada de apenas quatro horas, e, nela, certa concepção de ensino e de
aprendizagem, centrada, quase sempre, na rigidez e na qualificação de conteúdos
ministrados. A ampliação da jornada escolar impõe aos profissionais não somente a
necessidade de incluir atividades a mais, em horas diárias a mais, mas, além disso,
traz a urgência de rever o tempo escolar como um todo, situando-o em outras
concepções de educação, de ensino e de currículo. (MAMEDE, 2012, p. 233).
Assim, o discurso de Laura corrobora o de Mamede: mostra-se uma proposta escolar
ampliada em sua jornada e com uma oferta maior de atividades, demonstra uma nova
concepção de educação, mas parece que ainda há um caminho a percorrer no que se refere ao
ensino e ao currículo, para que a educação integral de forma integrada de fato aconteça.
Laura sugere uma redução da carga horária dos alunos e a possibilidade de oferecer
disciplinas opcionais no currículo: “Algumas disciplinas poderiam ser opcionais (...) faria
uma inscrição depois ou no momento da matrícula; a proposta é para reduzir um pouco essa
carga horária, ela é cansativa”. Nesta fala podemos destacar que as reflexões a respeito da
escola de tempo integral estão no âmbito do ensino e do currículo, o que nos permite supor
que o “caminho” acima mencionado já começou a ser percorrido.
104
O uso dos espaços educativos está centrado na escola e Laura, embora perceba que
existam espaços educativos na cidade que poderiam contribuir para a formação dos alunos,
não descarta a importância da estrutura física que a escola possui para realizar as atividades.
Neste sentido, demonstra que ir além do espaço intraescolar seria oferecer algo a mais, mas
isso demanda uma “logística” para a locomoção, que é atualmente um fator complicador. No
entanto, Laura comenta: “Aqui não funciona (...) como as escolas de Belo Horizonte e
Curitiba, (...) que utilizam espaços da cidade como espaços educativos. Nós ainda não temos
essa proposta”. O termo “ainda”, utilizado por Laura, mostra que há a percepção da
necessidade de se expandir os espaços educativos e que em algum momento essa proposta
será colocada em prática.
Quanto à relação escola-família, Laura mostra que a escola tem preenchido o tempo
das crianças, mas que as mesmas sentem falta do convívio familiar, principalmente as
crianças provenientes de uma família “estruturada”. Laura faz referência à questão da família
estruturada e não estruturada, mas não exemplifica o termo, apenas evidencia que o
comportamento das crianças e a aceitabilidade em permanecer o dia todo na escola está
diretamente relacionada ao vínculo que a criança estabelece com sua família. Assim, afirma;
“Eu não queria vir. (...) Tia, tá doendo aqui. (...) Eu queria viajar com o meu pai. Tem muitos
que choram. (...) No contraturno, daí começa a dor de barriga. (...) Sentem a carência da
família os mais estruturados, os menos estruturados, não. (...) Estes, quando tem feriado
detestam, (...) aqui é onde eles têm tudo, (...) comem bem”. Ainda no final deste trecho
podemos notar o caráter assistencialista que a escola assume perante as famílias. Laura
comenta que superar esta visão assistencialista é um desafio para os educadores, porque os
pais buscam a escola de tempo integral para este fim.
A valorização profissional e a remuneração são vistas por Laura como uma
consequência da qualificação. Laura percebe a qualidade dos professores como sendo
deficitária para a atuação docente, acredita que há uma falha na formação inicial e sente falta
do tempo em que o professor era respeitado tal qual um professor universitário: “Eu acho que
os professores deveriam ser mais qualificados para serem melhores remunerados (...) e isso é
o que faz com que eles sejam menos valorizados”. Laura ainda comenta que o professor de
Palmas é bem remunerado.
Para atuar na escola de tempo integral, Laura evidencia que há uma preocupação por
parte da secretaria municipal em formar este professor para esta atuação. É oferecido um
105
Seminário de Educação Integral anualmente, e na escola há quatro dias no ano em que a
equipe docente fica focada no estudo da proposta deste contexto.
106
CAPÍTULO VII
CONCLUSÕES SOBRE OS SENTIDOS DOS SUJEITOS
O objetivo desta pesquisa foi dar visibilidade aos sentidos subjetivos constituídos por
profissionais da educação em tempo integral, professor e diretor, buscando neles os aspectos
que a fundamentam. Para tal, entrevistamos dois sujeitos e construímos, mediante suas
entrevistas, núcleos de significação.
Estes núcleos possibilitam destacar questões constitutivas que perpassam o campo de
sentido acerca da educação em tempo integral, dentre elas as contribuições desta proposta, a
relação espaço, tempo e processos educativos, a relação família-escola e a atuação docente.
No início deste trabalho apresentamos, no capítulo II, as concepções histórico-sociais
da educação integral em tempo integral em nosso país. Ao darmos visibilidade aos
participantes desta pesquisa, enquanto sujeitos constitutivos da educação em tempo integral,
buscamos compreender os seus sentidos subjetivos a respeito desta proposta.
A educação em tempo integral é vista pelos sujeitos como uma educação mais
abrangente do que a educação em tempo parcial. O tempo a mais de permanência dos alunos
na escola pode favorecer a qualidade da educação, pois oferece mais oportunidades e
variedades de aprendizagem. Possibilita ampliar o universo cultural e social dos estudantes e
trabalhar valores, abarcando assim um saber que vai além do conhecimento historicamente
acumulado.
Padilha (2012) afirma:
A educação integral incorpora, mas não se confunde apenas com horário integral.
Isso porque ela procura associar o processo educacional a uma concepção de
conhecimento e de formação humana que garanta o acesso e a permanência da
criança na escola com qualidade sociocultural e socioambiental. (PADILHA, 2012, p.
190-191).
Podemos supor, analisando as falas de Laura e Renata, que o desafio está na
associação, sugerida por Padilha, entre o processo educacional e a concepção de
conhecimento e formação humana. O excesso de tempo de permanência dos alunos sentido
pelas participantes e a sugestão da redução da carga horária podem ser consequência de
107
oferecermos mais tempo e mais atividades, mas não de termos ainda modificado o processo
educacional.
As participantes tem clareza a respeito da necessidade de integração entre as
disciplinas oferecidas pela escola, mas na prática ela ainda é vista como um desafio. Alguns
documentos e ações, como o projeto político pedagógico, o planejamento, a ação do
coordenador pedagógico, reuniões semanais e o trabalho com projetos tentam superar a
fragmentação do conhecimento e oferecer aos alunos uma proposta curricular mais
interdisciplinar.
Paro (2009) declara:
Falamos sobre coisas óbvias como o fato de que o aluno só aprende se quiser, coisas
que não são vistas porque se adota uma concepção vulgar e falsa de educação que a
reduz a simples passagem de conhecimentos e informações. É por isso que a escola
fracassa, porque conhecimentos sozinhos, sem a integralidade da relação pedagógica,
não se consegue passar. Eles se passam mais facilmente quando estão mergulhados
na cultura a que eles se referem, e isso exige o conceito integral de educação.
(PARO, 2009, p. 19-20).
Laura e Renata não concebem o fracasso escolar na escola de tempo integral, pois é
um tempo grande dedicado à educação e cabe ao professor buscar estratégias para que o aluno
aprenda. No entanto, analisando a citação de Paro, podemos evidenciar que a escola de tempo
integral pode fracassar se oferecer mais do mesmo. É necessária uma proposta diferenciada,
uma atuação docente envolvida no processo para que a escola atinja o seu objetivo de oferecer
uma educação para a vida.
As escolas de tempo integral construídas em Palmas oferecem uma estrutura física
com oferta de recursos à disposição da equipe docente, conforme citado pelas participantes da
pesquisa. No entanto, a prática pedagógica ainda está restrita aos espaços intraescolares, mas
há a percepção da necessidade de extrapolar os muros da escola. O fato de pensarem em
utilizar outros espaços educativos é para que se amplie o universo cultural e social dos
estudantes, o que mostra que os sujeitos entendem que, mesmo contando com uma estrutura
escolar adequada para o tempo integral, o aluno não pode se limitar a este espaço.
Quanto a isso Padilha (2012), afirma;
É também característica da educação integral a valorização das redes de
aprendizagem, dos múltiplos espaços em que a educação acontece, o que viabiliza,
por exemplo, a abertura da escola à sua comunidade local e também ao que acontece
em todo o planeta. (PADILHA, 2012, p. 191).
108
Notamos que Renata e Laura, embora ainda não vivenciem esta situação, percebem a
necessidade de utilizar os espaços da cidade como espaços educativos, possibilitando que os
alunos circulem por ela. Padilha (2012) nos mostra que, mais do que viabilizar a circulação dos
alunos pela cidade, estamos falando de uma relação escola-comunidade, uma relação de ir e vir, onde
uma contribui com a outra.
As famílias, para Laura e Renata, buscam na escola de tempo integral a assistência, a
possibilidade de terem um espaço para deixar seus filhos em segurança e assim poderem
trabalhar. Não é, como podemos evidenciar pela fala dos sujeitos, a preocupação com a
qualidade do processo de aprendizagem que move as famílias a matricular seus filhos neste
contexto, e este é um desafio para os educadores, porque precisam buscar formas para
desconstruir a visão assistencialista para poder estabelecer a parceria escola-família de forma
a contribuir para a aprendizagem dos alunos. Podemos inferir que a abertura da escola para a
comunidade e o uso de espaços da cidade como espaços educativos podem contribuir para a
participação da família no processo de aprendizagem dos alunos, pois o conhecimento passa a
fazer sentido, tanto para a criança quanto para a comunidade, uma vez que será significativo e
permitirá uma relação entre o saber e a realidade.
Nas falas das participantes percebemos que elas se sentem valorizadas
profissionalmente. Ambas reconhecem que os professores do município recebem um bom
salário para a atuação docente. Vimos, em capítulos anteriores, que foi implantada em Palmas
uma proposta de plano de cargo e que esta trouxe benefícios para os professores. Há um
investimento por parte da secretaria em formar os professores para atuar na educação em
tempo integral, assim como a oferta de cursos vinculados à universidade para que a formação
continuada esteja à disposição do professor.
Os professores que atuam neste contexto possuem uma carga horária de 40 horas
semanais, e em que pese o fato de inicialmente eles acharem que trabalhariam mais, o que se
notou na pesquisa foi um maior envolvimento destes com a escola, uma vez que possuem
tempo disponível para planejar, preparar atividades e fazer reuniões. Podemos inferir, portanto,
que há uma melhor qualidade no processo ensino-aprendizagem. Assim, concordamos com
Giolo (2012) quando ele afirma a importância de o professor da escola de tempo integral
trabalhar em tempo integral;
A escola de tempo integral exige professor em tempo integral. O professor que
ministra as aulas em um turno precisa acompanhar ou, ao menos, orientar as
atividades realizadas no outro. Com isso, o professor terá dedicação exclusiva na
109
escola e, como forma de preencher sua carga horária, não precisará ministrar
disciplinas para as quais não tem formação ou, o que é mais dramático, dividir-se
entre duas ou três outras escolas. (GIOLO, 2012, p. 102).
As escolas de tempo integral em Palmas foram estrategicamente implantadas em
comunidades com maior risco de vulnerabilidade. Renata e Laura afirmam que a escola
cumpriu o seu papel de transformar a comunidade, mas não exemplificam que transformações
foram essas. Retomando as condicionantes da escola de tempo integral citadas por Maurício
(2009), e aqui apresentadas no capítulo II, podemos inferir que as crianças estão dentro da
escola e protegidas dos riscos que a comunidade oferece, mas não houve necessariamente
uma transformação da comunidade. Diminuiu-se o risco de vulnerabilidade das crianças, mas
para isso elas foram isoladas da realidade que as cerca.
110
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na medida em que esses programas nos defrontam com essas dimensões esquecidas
- a vida – corpo – espaço - tempo -, somos obrigados a dar conta de questões
inadiáveis: como os educandos vivem a vida, o corpo, os tempos-espaços; como os
tratamos no ordenamento escolar; como sujeitos de vida, corpo, tempos-espaços, a
que vivências são submetidos nos tempos-espaços escolares e extraescolares em
todos, tanto no turno como no turno extra, na totalidade de seu viver, na diversidade
de tempos-espaços. A proposta Escola Integrada nos alerta para a necessidade de
repensar essa totalidade-diversidade e de articulá-la pedagogicamente, para questões
que deveriam ser centrais nos cursos de formação de gestores escolares, de
licenciatura e da pedagogia, de políticas e de currículo. (ARROYO, 2012, p. 42).
O objetivo deste estudo foi refletir sobre os sentidos subjetivos constituídos por
diretores pedagógicos e professores acerca do trabalho na educação em tempo integral. Não
tivemos a pretensão de uma análise totalizante e conclusiva, mas buscamos na constituição
desses sentidos os elementos presentes na realidade da educação em tempo integral. Assim,
por meio da análise do discurso dos sujeitos sobre sua atuação neste contexto pudemos
perceber elementos que poderiam passar despercebidos nesta realidade. Elementos estes que
podem auxiliar e desencadear novos estudos acerca do tema.
A educação em tempo integral, quando comparada à educação em tempo parcial, é
percebida como um ganho em termos de qualidade no processo de aprendizagem dos alunos.
O tempo de permanência ampliado na escola propicia maior oportunidade e diversidade de
aprendizagem, pois oferece um currículo composto com as disciplinas da base nacional
comum e com disciplinas nas áreas de cultura, arte e esporte. Falamos, portanto, da oferta de
um currículo mais abrangente, que permite uma leitura do mundo em diferentes linguagens,
(verbal, matemática, artística, corporal, tecnológica), por conceber os processos de
aprendizagem de forma multidimensional.
No entanto, nos questionamos quanto às ações educativas em que os alunos estão
inseridos em sua rotina. A que vivências estão submetidos para darem conta da totalidade do
ser humano? Por que mantemos um modelo antigo composto pela base curricular nacional,
aqui intitulado “núcleo comum”, e acrescentamos disciplinas como “núcleo diversificado”, se
o que pretendemos é um núcleo único que trabalhe as diferentes linguagens na
interdisciplinaridade do conhecimento?
A experiência das escolas de tempo integral de Palmas mostra a necessidade de
superar o currículo fragmentado em disciplinas estanques e buscar a interdisciplinaridade. A
superação da dicotomia núcleo comum e núcleo diversificado significa romper com o
111
paradigma vigente de fragmentação do conhecimento e adotar um novo paradigma, buscando
a integração do conhecimento.
Neste novo paradigma o fracasso escolar não pode ser concebido, pois há tempo
disponível para ensinar e replanejar. Não estamos aqui dizendo que o tempo por si só seja
capaz de garantir a aprendizagem dos alunos, mas que, uma vez ampliado o tempo de
permanência, se possa buscar processos de ensino-aprendizagem diversificados em prol da
aprendizagem.
O trabalho docente em tempo integral é visto como um aspecto positivo para a
qualidade do processo ensino-aprendizagem, pois o professor tem mais tempo efetivo com os
alunos, e ainda conta com horários disponíveis para reuniões, planejamento e preparação de
materiais. Este tempo docente destinado a uma única turma em uma única escola contribui
para a qualidade do ensino. Assim, temos um professor que passa a se perceber como “peça”
fundamental para que seus alunos aprendam.
Com relação à família, em que pese a sua ausência ou a sua pouca participação no
processo de aprendizagem, ela não é determinante para a qualidade deste processo; pode
apenas contribuir ou não, mas a determinação está nos processos educacionais. A família,
mesmo buscando ainda na educação em tempo integral o assistencialismo, é sempre
convidada e/ou convocada a participar do processo de aprendizagem. Há uma tentativa
constante por parte da equipe docente de desconstruir a visão de que a escola está posta
apenas para ocupar o tempo. No entanto, a comunidade docente está ciente de que este é um
trabalho processual e que aos poucos esta visão equivocada será superada.
A escola é vista pela comunidade como um espaço seguro para seus filhos. Ainda
nessa perspectiva, as ETIs foram estrategicamente implantadas em comunidades com maior
risco de vulnerabilidade e são percebidas pela comunidade escolar como um espaço redentor,
capaz de proteger as crianças da criminalidade e das drogas, por tirá-las das ruas. No entanto,
o que queremos na Educação Integral é permitir o pertencimento da cidade a estas crianças.
Escola e comunidade devem estar abertas uma à outra, para que a criança consiga estabelecer
relações das aprendizagens com seu cotidiano e com suas experiências.
O espaço físico escolar adequado para atender os alunos em tempo integral é essencial
para a qualidade dos processos educacionais. Entretanto, quando o restringimos como único
espaço educativo, limitamos a visão dos estudantes para a realidade que os cerca. É necessário
112
pensar em estratégias para se utilizar espaços educativos extraescolares e, assim, propiciar aos
estudantes conhecimentos significativos que eles possam relacionar com suas vidas. Só assim,
poderemos pensar que temos uma educação para a vida, conforme nos diz Arroyo, uma
educação preocupada com a totalidade do viver de seus educandos.
A formação para a atuação em tempo integral é importantíssima e, por mais anos de
experiência que um docente possa ter, há aspectos desta educação (como já foi citado) que a
diferenciam da educação em tempo parcial. Por conseguinte, investir em seminários, em
momentos de formações na escola e também na parceria com universidades a fim de se
promover uma formação continuada, são maneiras de contribuir para a qualidade da educação
em tempo integral.
Esperamos que esta pesquisa possa colaborar com o delineamento de uma educação
em tempo integral que permita a ampliação do universo escolar por meio de processos de
aprendizagem multidimensional.
113
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122
APÊNDICE
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pesquisadora: Thais Peluzo Abreu Faleiros Soares Fones: (11) 2364-5292
e-mail: thaispeluzosoares@gmail.com (11) 8260-6235
Eu, ____________________________________________________________________
concordo de livre e espontânea vontade em participar como voluntário(a) da pesquisa
“Sentidos constituídos na educação em tempo integral”. Afirmo ter sido esclarecido de que
este estudo será conduzido com a aplicação de entrevista coletiva semiestruturada, sem
qualquer eventual despesa e garantido o sigilo dos dados.
Declaro que obtive todas as informações e esclarecimentos necessários quanto às dúvidas por
mim apresentadas.
Estou ciente de que:
1) Tenho a liberdade de desistir ou interromper a colaboração neste estudo no momento
em que desejar, sem necessidade de qualquer explicação;
2) A desistência não causará nenhum dano à minha saúde física ou mental.
3) Tenho a garantia de tomar conhecimento e obter informações quanto aos procedimen-
tos e métodos utilizados neste estudo, bem como dos resultados parciais e finais desta
pesquisa por meio do contado direto com o pesquisador responsável, abaixo identifi-
cado.
São Paulo, ____ de __________ de 2012.
___________________________________
Assinatura
___________________________________
Thais Peluzo Abreu Faleiros Soares
RG. Nº: 24716406-9
123
Roteiro de entrevista
01- Currículo Profissional
02- Educação Integral
03- Ampliação do tempo
04- Espaços Educativos
05- Processo de implantação
06- Políticas públicas e financiamento
07- Envolvimento das famílias
08- Formação docente
09- Importância do seu trabalho
10- O ideal de educação
124
125
ANEXOS
Anexo I
Transcrição da entrevista – professora Renata
P: A primeira coisa que eu queria saber é como é que você chegou até aqui? Como você está
hoje, como professora de uma escola de tempo integral? Qual foi a sua trajetória profissional?
R: Eu fiz a faculdade de Pedagogia aqui em Palmas e fiz uma especialização em
psicopedagogia. Isso porque o meu curso de pedagogia ele não foi voltado pra ensino pra
crianças, foi pra adulto, inclusive pra orientação. Terminei a faculdade em 2008, em 2009 em
seguida eu fiz a especialização, que me ajudou muito pra eu trabalhar com crianças, entender
a dificuldade das crianças pra poder ajudá-las. Eu fiz um concurso, antes eu tinha trabalhado
em uma cidade próxima; a gente tinha uma rotina bastante diferente porque lá não era integral,
era parcial. Logo depois eu passei num concurso da prefeitura, em 2010, e então faz um ano e
meio que eu estou aqui. E tudo pra mim foi novidade aqui, porque o tempo parcial não
funciona com a mesma dinâmica, né? O esforço é menor; não que seja menos importante, eles
são tão importantes quanto esse daqui, mas é tudo completamente diferente, o esforço é menor,
e assim a cobrança é maior, cobrança num bom sentido, né? Pra que o aluno aprenda mais, pra
que se aplique mais, que participe de tudo. E trabalhar com criança é completamente diferente
de trabalhar com adulto, né? A responsabilidade de trabalhar com criança é muito da gente, e
a do adulto é parte dele e parte nossa, né? E essa foi a grande diferença. E aqui a gente tenta
trabalhar; eu trabalho, eu sou professora regente do 4º ano, eu trabalho com dez disciplinas e a
gente tenta integrar uma na outra.
P: Dez disciplinas. Quais são elas?
R: Língua portuguesa, matemática, PPT (que é pesquisa e produção de texto), arte, ensino
religioso, filosofia, ciências naturais, história e geografia. Sendo que história e geografia, além
da geral, a gente aplica a história e a geografia do Tocantins. Tem um livro à parte, uma
dinâmica à parte, a gente socializa o tempo todo com aquilo que eles vivem.
P: Essas são as aulas que você dá? Pra quantas turmas?
R: Isso, as aulas que eu dou. Pra uma turma. A gente trabalha com uma turma. Cada professor
regente de 1º ao 5º ano trabalha só com uma turma. É o dia inteiro responsável por uma turma.
Quando não estão com outros professores do núcleo diversificado, que é natação, judô,
educação física e tantos outros.
P: E tem aquela hora de estudos?
R: Estudo monitorado. É um complemento da língua portuguesa e matemática. Não um
126
reforço, porque no ano passado até a gente teve que trabalhar mais reforço; o reforço é ara
quando você tem dificuldade no português ou na matemática. No caso, o estudo monitorado
envolve toda a turma, não apenas as crianças com dificuldade, envolve todo o grupo.
P: Então você entrou aqui por concurso?
R: Isso.
P: O que é pra você a proposta Educação Integral?
R: Quando a gente diz integral temos a tendência de achar que é tudo, que abrange tudo, né?
Mas na verdade esse tudo não existe, não tem como a gente fazer de uma vez só, é um
processo e a gente vai progredindo, vai entendendo melhor, mas assim. Integral? Integral,
assim, abrange mais no sentido de aprendizagem, no sentido de trabalhar o corpo, a mente né?
Eu acho que desenvolve mais a criatividade da criança, com certeza ela aprende mais, tem
mais responsabilidade. Tem mais conhecimento, mais vivência. Acho que integral seria isso.
É tempo integral porque fica o tempo todo na escola, mas não é o tempo em si, é a
aprendizagem que ocorre nesse tempo que é importante.
P: Era essa a minha próxima pergunta. Qual é a importância do tempo ampliado de
permanência desses alunos pra essa proposta de educação integral?
R: Olha é bastante importante, porque a gente tem, por exemplo, eu tenho, às vezes eu tenho
as aulas segmentadas, igual acontece em todas as escolas: português, matemática, ciências,
história e geografia. Eu dou mais português e matemática que é, eu considero mais importante
para a aprendizagem; às vezes eu não faço essa fragmentação durante o dia. Hoje, por
exemplo, eu estou na terceira aula e estou só com língua portuguesa o tempo todo Por que?
Pra não fragmentar, pra não perder o vínculo, porque eu acredito que assim tem mais
aprendizagem. Ah, então você tinha geografia e não deu essa aula, você tinha ciências e não
deu essa aula? Ela não vai ficar perdida, vai ocorrer depois duas aulas de geografia com o
mesmo aproveitamento, duas aulas seguidas de ciências e vai ter o mesmo aproveitamento.
Pra aproveitar melhor, eu não tenho como chegar no final do ano e dizer pra diretora que eu
não tive tempo pra ajudar o aluno na aprendizagem dele. Na verdade, eu tive tempo. E sempre
acontece. Todo o tempo, não, mas a gente consegue 98%, a gente tem tempo mesmo, usa
metodologia diferente, dinâmica diferente, né? Se precisa de ajuda, a gente vai atrás dessa
ajuda, aqui a gente tem essa ajuda, né? Pessoal do reforço, pessoal da informática, pessoal da
educação física, né? Porque são comportamentos diferentes e as crianças têm comportamentos
diferentes. Ajuda, a gente faz reunião pedagógica, debate as dificuldades, então dá pra ser
bem aproveitado. 100% não é, mas dá pra ser bem aproveitado.
P: A questão dos espaços, como é que é? Qual a importância desses espaços educativos que
127
foram construídos para essa proposta?
R: No caso dessa escola, eu conheço apenas mais uma que tem o mesmo espaço. E eu
considero bom, talvez até ótima a nível de Tocantins. Eu não conheço outras escolas em
outros Estados. Eu digo, conheço outras cidades também. Com relação a esta escola é ótimo:
nós temos... a sala de aula tem espaço ótimo, eles não ficam aglomerados; a questão da lousa,
ela fica... eles não ficam muito em cima nem muito distantes, o espaço pra refeição eu acho
legal, né? Não tá sobrando espaço, não tem nada ocioso, que não se use ou que se tem demais,
ou que prejudique eles. Durante o período que eles estão na escola, estão na responsabilidade
e eu acho isso favorável para que tudo ocorra bem.
P: As crianças fazem as atividades todas aqui ou há atividades que extrapolam os muros da
escola?
R: Isso acontece muito na parte cultural, na parte é... que nós chamamos de núcleo comum,
que é a parte que eu trabalho. Inclusive foi discutido hoje pra gente chamar isso no PPP.
Quando discutimos as ações do PPP foi discutido isso que essa escola está faltando nessas
ações, né? Porque a parte cultural acontece muito fora daqui, mas a parte... por exemplo, eu
trabalhar a geografia fora da escola nunca aconteceu; eu trabalhar ciências, que é muito
importante fora da escola, nunca aconteceu, né? Até mesmo apresentar a cidade pra eles;, a
gente tava pensando num projeto que é trabalhar com a dengue, por exemplo. Na escola não
só a teoria, mas já para a prática, né? Com todo um embasamento teórico, é lógico que é
necessário também, ou com discussões, com debates, participando desses debates... eu tenho
pensado nisso, mas ainda não aconteceu. Isso foi discutido esse ano. Na proposta do ano
passado eu já estava na escola e isso não foi nem mencionado, mas esse ano eu acredito que a
gente vai avançar nesses sentidos.
P: Como foi o processo de implantação da proposta de educação em tempo integral?
R: Eu cheguei dois anos depois.
P: E como foi pra você essa proposta, você que veio de uma outra realidade?
R: Foi. Eu vim de uma outra realidade e me assustou num primeiro momento, porque é uma
rotina que é diferente de tudo que eu já tinha visto. Porque a gente nem conhecia escola de
tempo integral aqui no Tocantins, né? Eu tenho um colega que veio de Minas que já conhecia
a de lá, que veio da Bahia que já conhecia a de lá, então pra eles foi natural, mas pra mim não.
Foi assustador porque eu cheguei aqui o ano passado e essa escola tinha mil, quatrocentos e
poucos alunos. Num primeiro momento eu peguei uma sala de aula que tinha quarenta e três
alunos. Na escola anterior, quando eu tinha muito era trinta, vinte cinco, trinta, vinte cinco,
trinta, e aqui eu tenho uma sala de aula dessa forma. Esse ano a gente tá trabalhando com um
128
número de alunos adequado por turma, que é trinta e cinco alunos. Mas me assustou nesse
sentido de que era muita gente eu não sabia como lidar, que metodologia aplicar, que
dinâmica usar, mas depois você vai acostumando, né? A gente tinha, mesmo com quarenta e
três alunos, a gente tinha um espaço legal na sala, só que eu não conseguia aplicar, eu pensava
em uma metodologia e não conseguia aplicar por causa do número de alunos e eu ficava
frustrada, e agente foi debatendo isso com a diretora, foi conversando. Não que as pessoas
tinham culpa; a comunidade tinha essa necessidade. Aí o governo do Estado abriu aqui na
região, aqui perto dessa escola, mais duas escolas de período integral também, e aí sim é tirou
o tumulto daqui, porque era bem tumultuado. Pra você ter uma ideia, são trezentos e poucos
alunos a menos na escola e isso reflete lá na aprendizagem deles.
P: O que te assustou então foi o número de alunos e não a proposta em si?
R: A dinâmica também. Principalmente quando se troca. Por exemplo, esse ano a primeira
fase está no vespertino e de manhã ...
P: Primeira fase é o quê?
R: Primeiro ao quinto ano. E à tarde então está o núcleo comum. Então, de manhã acontece as
trocas, de hora em hora tem as trocas, troca de disciplina. Por exemplo, às vezes você está
comigo no estudo monitorado aqui na sala, no núcleo comum, e logo depois eles vão pra
natação... vai pra outro bloco, tem o apoio que leva, e daqui a pouco eles têm estudo
monitorado comigo novamente, eu volto pra a sala de aula e eles voltam comigo pra lá. E
assim, pra ficar o dia inteiro com uma turma só você precisa ter jogo de cintura também, pra
que haja aprendizagem, que é o objetivo, porque se limita também não dá, e assim eu tenho
muito colegas dizendo eu não dou conta, que eu vou encher linguiça para poder passar o
tempo. Isso é frustrante, passar tempo também não é, e nem é pra isso. Mas, assim, o que me
assustou foi o número de alunos e essa rotina diferente, porque eu interpretava que isso
atrapalhava e eu continuo pensando que atrapalha, só que eu uso, por exemplo...
P: Mas o quê especificamente atrapalha?
R: As trocas. Você está aqui vendo no estudo monitorado a matemática, por exemplo, e daqui
a pouco você vai pra dança. Daí você volta pra português ai daqui a pouco você vai pro
xadrez. É algo completamente diferente pra ele, eu não sei até que ponto isso é bom.
P: Eu não entendi. Então, não é o núcleo comum num turno e o diversificado no outro?
R: Thais, até agora acontece dessa forma. O estudo monitorado, na segunda feira... um
exemplo: eu tenho uma aula de português que está no estudo monitorado, estudo monitorado
de português e matemática. Aí eu tenho lá português, o aluno sai de português e vai pra
educação física em outro bloco. É outra realidade, outra situação, completamente diferente.
129
Eu não se isso... até que ponto isso é benéfico ou não. Eu penso que não é totalmente benéfico,
tinha que ter uma outra forma que eu não sei te dizer que forma seria essa ainda. Aí, daqui a
pouco ele volta pra minha aula de novo, aí é matemática do estudo monitorado, aí a 4ª aula é
de xadrez, ele volta pra lá de novo e eu acho que fica muito fragmentado, atrapalha a
aprendizagem, o entendimento deles. Às vezes a gente tá discutindo, tá no meio de uma
situação, o aluno sai e vai para o bloco do esporte, depois volta de novo, e até que eu consiga
engrenar isso de novo, retomar o mesmo assunto, demora. E eu acho que nesse período há
uma perda, não sei até que ponto isso é bom ou não. Porque também não é bom ficar muito
tempo só com português ou só com matemática. Eu sei que não eu digo isso porque é algo
completamente diferente. Não sei se você observou que, no horário das trocas, fica esse
barulho na escola, muito barulho e eu acho que isso atrapalha bastante. As crianças muitas
vezes reclamam muito; agora não, porque o tempo tá ameno, mas agosto, setembro, outubro,
Tocantins é muito quente, eles dormem na sala, eles reclamam muito de dor de cabeça,
reclamam muito de probleminha no intestino, acho que por causa da quentura, do estresse,
eles ficam estressados. Tem dia que a gente percebe que não tem condições de continuar mais
naquele dia, dá quatro horas da tarde a gente recorre à dinâmica de brincar e...
P: Para você essa questão do tempo é demais?
R: Eu penso que sim. Se eu tivesse um filho eu não colocaria em uma escola de tempo
integral.
P: Não? O que seria o ideal de tempo pra uma escola com proposta de educação integral?
R: A meu ver essas crianças precisam também ficar com a família. As crianças chegam na
escola as sete e meia da manhã e sai daqui as sete horas da tarde. Que tempo ele tem pra ficar
com os pais? A meu ver, se eu pudesse escolher... e assim precisava até de um debate maior
sobre isso, até pra eu abrir mais pra novas perspectivas. Eu até falei com uma colega um dia
desses. Eu penso que o ideal seria até umas três da tarde. A gente trabalhar as quarenta horas
semanais como é a proposta, mas que a criança não ficasse em sala de aula.
P: Então você propõe quanto tempo de escola?
R: Seis horas. A vivência com a família, ela facilita a aprendizagem. A vivência que não tenha
somente o espaço escolar, ela vai facilitar a aprendizagem. Muitos deles, os pais deixam aqui
de manhã e eles ficam aqui até às sete horas da noite porque não tem ninguém pra ficar com
as crianças. Tudo bem, isso não é problema da escola, é problema da família, mas essa criança
não tem outra visão; a visão dela é isso aqui e pronto. Às vezes a gente sabe de coisas
rotineiras aqui da reunião que eles não sabem.
P: Pensando nessa sua proposta de seis horas, o que tirar de atividades para se adequar a este
130
tempo?
R: Eu não sei o que tirar porque tudo é importante, né? A gente não colocaria na escola uma
disciplina que não fosse importante para ele; todas são importantes, agora eu não sei até que
ponto isso é bom, ficar todo esse tempo na escola e só o conhecimento é que eles aprendem...
eu nem sei dizer o que tiraria porque tudo é importante.
P: Como é ter uma proposta curricular com dois núcleos, núcleo comum e diversificado? Que
estratégias vocês têm para a articulação entre esses dois núcleos?
R: A gente tem as reuniões pedagógicas, tem os planejamentos... o planejamento acontece,
com o planejamento anual todos os professores veem a melhor forma de aplicar os conteúdos,
a metodologia, a dinâmica, né? Como vai aplicar um joguinho, o que vai acontecer quando no
planejamento anual? No planejamento quinzenal acontece junto com a coordenadora e todos
os professores da série. No meu caso, que sou 4º ano, por exemplo, a gente se reúne na 5ª
feira; a gente tem quatro horas na escola para isso num dia específico; no outro dia, a gente
vem, procura material... é onde a gente socializa com os colegas o que está sendo aplicado.
Todos os dias a gente tem algumas horas alternadas; no caso da 5ª feira são quatro horas
seguidas. E agente socializa o que está sendo dado. Por exemplo, lá na educação física o que
está trabalhando, que movimentos está trabalhando, e isso eu posso integrar com ciências, por
exemplo, né? Lá na dança eu posso integrar com a arte, e então a gente está sempre
conversando pra conseguir integrar.
P: Por conteúdo ou por projetos?
R: Por conteúdo. Inclusive tem até coordenadoras que dizem que é por projetos, mas a gente
vai integrando nas disciplinas os projetos. Os projetos são construídos também em grupos,
grupos do 4º ano, grupos do 5º ano... às vezes a gente até pega do 5º ano e aplica no 4º ano se
for viável e vai passando.
P: E como é feita a escolha do tema dos projetos?
R: Pelas necessidades das crianças. Por exemplo, no ano passado a gente tinha muita
agressividade na escola e este ano diminuiu bastante, porque o pessoal da 2ª fase, que é do 6º
ao 9º ano, eles estão pela manhã no núcleo comum e no ano passado era à tarde. Então era
mais quente, eles ficavam mais agressivos, perdia-se até o controle muitas vezes. E eu
consegui que esses alunos ficassem na sala de aula pra então... Foi trabalhado um projeto
envolvendo isso, essa questão do respeito, da importância da aprendizagem, a importância do
tradicional. Deixando claro pra eles o que eles estudam aqui. Então o projeto é trabalhado
dessa forma com a linguagem adequada a cada nível. Foi trabalhado com o pessoal do 3º ao 9º
ano. Esse é um dos eventos. Tinha muitas crianças que não conseguiam ainda ler e escrever
131
com fluência... Foi trabalhado o projeto centopeia, que trabalha leitura e conto. Tem até
disciplina leitura e conto, que é um trabalho integrado, consequência e produção de texto e
língua portuguesa. As três integradas. Às vezes a professora de leitura e conto tem um projeto,
a gente se reúne, pensa na melhor forma de se aplicar este projeto, falando na linguagem deles,
usando o dia a dia, coisas práticas, né? É muito importante também - e a coordenadora cobra
muito isso - é usar os pré-requisitos do aluno. Eu vou abordar um assunto... por exemplo, hoje,
eu sempre levo pra sala de aula um livro com histórias pra eu abordar um assunto... por
exemplo, hoje eu levei um livro falando sobre respeito: eu conto a historinha, eu pergunto pra
eles o que eles entenderam, e ai eu vou dando o exemplo de dentro de casa com a mãe e com
o pai, e a gente valoriza muito isso do pré requisito, eu valorizo muito isso pra abordar um
assunto mais aprofundado. Ai, em ensino religioso, eu continuo com o mesmo assunto; na
filosofia a gente vai socializar esse assunto novamente, vai debater, ligado a valores. Inclusive
todo o nosso conteúdo em ensino religioso é em volta disso, dos valores. Até porque a
comunidade aqui é muito carente.
P: O ensino religioso é trabalhado de forma laica?
R: O ensino religioso é trabalhado de forma laica, nem menciona as religiões. Até porque o
intuito do ensino religioso deles é esse, mas não no 4º ano, que é a série que eu leciono.
P: Com relação ao financiamento e as políticas públicas voltadas para o ensino em tempo
integral, o que chega até o professor, o que você sabe a respeito?
R: Olha, é exposto aqui a prestação de contas, com quê é gasto o dinheiro que a escola recebe,
mas eu não sei te responder com clareza; só sei te dizer que isso é exposto pra nós, mas eu,
pra ser sincera não dou muita importância. Eu vejo por aí, mas eu nem leio... mas eu sei que
isso acontece.
P: Como é o envolvimento das famílias nessa proposta?
R: Nós temos projetos como dia dos pais, dia das mães, tem o projeto macro da escola, que é
a cantata de natal em que as famílias participam, tem a festa das crianças, né? Tem o dia
pedagógico, que é um dia reservado pra entregar as notas da criança para os pais verem, e a
gente conversa um por um, por bimestre. Eu acho bastante positivo, principalmente esse dia
de entrega de notas, porque ali você fala sobre o comportamento do aluno, sobre a ajuda que
você precisa dos pais com relação à aprendizagem, pra elogiar, para criticar, é a oportunidade
que a gente tem de trazer o pai para a escola. Agora, a gente não faz muita reunião com pai
porque não funciona aqui. A comunidade não vem, sabe? Já tentamos muitas vezes aqui, mas
não acontece; então, o dia pedagógico é a oportunidade, porque ele vai pegar a nota do aluno,
vai pegar o uniforme, né? Então eles se interessam mais por vir, então a gente aproveita pra
132
falar da aprendizagem.
P: Então você não vê o envolvimento da família pra educação, e sim pra pegar o uniforme?
R: Sim, Thais. Boa pergunta, porque isso não acontece... eu não digo que não acontece
sempre ou com todos, mas já é a terceira turma que eu tenho, e é raro você ver um pai vir
oferecer ajuda, perguntar como está o filho dele; vem é preocupado com a bolsa família, se o
filho vai receber a bolsa família... eles estão preocupados se a criança vai entrar, porque
precisa estar cedo na escola para ele ir trabalhar; se está sem o uniforme num determinado
período não entra na escola... se ele vem atrás do boletim às vezes é preocupado em manter a
vaga do aluno, mas não estão preocupados com a aprendizagem deles, não. A preocupação é
nossa mesma.
P: Como foi a formação docente pra vocês atuarem na educação em tempo integral, e se têm
formação continuada.
R: Eu vim em 2010. Entrei no meio do ano, porque eu assumi em agosto, né? Em 2011 nós
tivemos uma formação no início do ano para o pessoal da educação integral, formação assim
pros profissionais aqui de Palmas, que foi muito válida. Fui conhecendo sobre leis, fui
conhecendo sobre o aproveitamento desse tempo na escola integral. É o que esperam de nós a
comunidade, a prefeitura... e também teve um seminário das escolas de tempo integral no mês
de julho e me parece que foi bastante positivo também, porque vieram grandes palestrantes,
trouxeram experiências de outros países, de outros Estados, foi um seminário de três dias, foi
muito bom e muito válido. A prefeitura investe em formação pra gente. Eu mesma fiz duas
formações o ano passado, aplicação de metodologia diferenciada, as metodologias adequadas
pra cada idade, como lidar com as dificuldades de aprendizagem do aluno, como curso de
extensão. Foi uma parceria da universidade federal com a prefeitura aqui de Palmas. Eu não
sei como que acontece, porque alguns colegas eu sei que fez, mas como que acontece, essa
dinâmica eu não sei. Eu saí num sorteio, porque eu sei que não acontece para todos também.
P: Esta formação foi da prefeitura, mas e na escola, como é feita a formação? Tem esse
espaço de formação aqui?
R: Não, não, nada. Essa coisa a gente recebe nos planejamentos mesmo. Toda semana tem
planejamento. É planejamento quinzenal, porque quando eu vou preparar essas aulas pra
quinzena, aí eu tenho apoio da coordenadora com materiais, mas é algo assim muito rotineiro,
superficial... na verdade, eu não posso dizer que é superficial, mas o que acontece é aquele
momento mesmo.
P: E não é uma formação com contribuições teóricas, sugestões de textos... é mais uma
orientação para o semanário ou quinzenário?
133
R: Não, ela sempre traz material, mas não é nada assim que eu possa considerar que tenha
mudado alguma coisa ou que tenha... mas contribui muito, contribui muito. A minha
coordenadora, por exemplo, ela é muito experiente; ela tem mais de quinze anos na sala de
aula. Pra mim, que sou nova na função, tudo o que ela fala é muito válido. Agora, é pra eu
refletir; não vou sair mudando tudo, mas pra mim é muito válido. Mas não tem... o ano
passado nós pedimos uma palestra com uma psicóloga pra gente ver esta questão da dinâmica
psicológica, mesmo pra aplicar na aprendizagem. Isso aconteceu também, mas foi uma única
vez, foi uma tarde, e não teve nada diferente disso não.
P: Como você enxerga a importância do seu trabalho?
R: Eu tento fazer o melhor, porque eu sei que o futuro dessas crianças depende dessa
aprendizagem, muito dessa aprendizagem. Não é só dela, mas depende muito dela, e eu faço o
meu trabalho com prazer, então eu faço com muita responsabilidade, visando ao objetivo que
é a aprendizagem né? E eu sei que se eu fizer de qualquer forma eu nem conseguiria fazer,
porque eu amo o que eu faço. Se não vai render frutos... eu não consigo sair daqui e descansar
pensando naquele aluno que não avançou hoje, que eu não consegui fazer com que ele se
interessasse, porque são crianças de 9 e 10 anos que eu estou trabalhando, e então eu sei que
nesse momento com aquela clientela a responsabilidade é quase toda minha, né? Até porque
eu sei que quando ele chega em casa não vai ter um apoio, pelo que eu percebo não vai...
dessa comunidade aqui, não, e então eu sei que o meu trabalho é importante; para eles nesse
momento é primordial, é tudo que eles têm.
P: Quais são os seus sentimentos de trabalhar nessa proposta de educação em tempo integral?
R: Eu gosto, embora eu tenha certeza de que muita coisa precisa mudar e tem mudado. Sabe,
Thais, de 2010 para cá eu vi que muita coisa mudou. A nossa diretora eu... não tive nem muito
diálogo com ela, até porque a escola é muito grande, ela tem uma responsabilidade muito
grande, mas eu admiro muito o trabalho dela, ela faz com amor também e isso nos atinge num
bom sentido, né? Eu gosto muito, mesmo pensando e acreditando que se fossem 6 horas com
os alunos seria melhor, não modificando a minha obrigação de trabalhar 40 horas, e faço com
prazer e faço tranquila. Agora, eu acho muito pras alunos e eu já falei isso em reuniões aqui. E
eu não sei se isso, inclusive nesse seminário que fizeram com todas as escolas, que vieram
pessoas com experiências de fora... eles falaram e me surpreendeu que parece que na
Argentina aconteceu dessa forma, mas lá foi as famílias que quiseram assim, pra acompanhar
em casa, saber como está acontecendo, sabe? Mas falamos até da diferença, você pede um
auxílio pro pai com a aprendizagem do aluno, o pai realmente ajuda. Aqui não acontece isso;
não sei se ia fazer algum efeito ou se ia piorar. Eu não estou dizendo que a criança pobre não
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tem futuro ou que não se interessa, mas é o que eu vejo aqui.
P: Quais foram os ganhos dessa educação?
R: Quando a escola veio pra cá, o que me falaram é que o intuito era de mudar a comunidade
através da escola, e isso a gente percebe que aconteceu. Então, já é um ganho, e quando eles
estão aqui eles não estão nas drogas, eles não estão trabalhando - que muitos até trabalham -,
eles estão vivenciando coisas que vão agregar conhecimentos e valores pra eles. Talvez em
casa não tivesse isso e então a gente vê que quando a gente pega as histórias mais feias que
vez por outra a gente ouve aqui, a gente pensa: ainda bem que existe essa escola. Então eu
acredito que o ganho é na vida social, na vida afetiva, é no sentido da aprendizagem em si,
talvez numa garantia de futuro. Eu digo talvez porque não depende só da escola, né? E
também porque é até sair daqui. A gente não sabe como vai ser depois, mas é nesse sentido.
P: Quais foram os equívocos?
R: Thais, eu não sei dizer, mesmo sabendo que não vai tudo bem, mas eu não seu dizer quais
foram os equívocos, não.
P: E os desafios?
R: Conseguir que essas crianças aprendam em meio a tudo isso que a gente vive, com essa
comunidade que tem um alto índice de criminalidade, com envolvimento com droga, em
manter essas crianças aqui. Pra você ter uma ideia, Thais, eu não estou expondo ninguém, eu
sei que não estou, mas nós temos uma criança aqui que tem 9 anos e que está envolvida com
drogas. Até pra manter esse sujeito aqui não é fácil, e o maior desafio é fazer com que ele
aprenda, né? A gente vai trocando conhecimento, vai vendo até com eles mesmos, mas o
maior desafio é que chega no final do ano, você olha pra aquele rostinho e diz: “esse aqui
superou”. Aquela criança que tá lá no 4º ano e não sabe ler ainda... a gente não tem muitos
casos desses, mas temos, e fazer com que eles aprendam a ler e escrever corretamente...
corretamente não, mas pelo menos tentar melhorar pra prosseguir um pouco melhor, esses são
os desafios.
P: Você falou sobre a questão das drogas na comunidade. Esse foi um ganho também? Já tem
algum resultado?
R: Com certeza, a estratégia de colocar a escola nessa comunidade foi pra isso... não só para
isso, mas um dos motivos fortes foi esse. Eles perceberam que isso estava acontecendo. É um
outro projeto que a gente tem sempre trabalhado aqui... a gente aborda sempre essa questão. A
questão das drogas, da violência, né? A gente fala muito do valor que eles têm. Não é porque
são pobres que não têm valor; a questão de superação, exemplo de superação, é muito
trabalhado em todas essas questões.
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P: Se você tivesse a oportunidade de voltar a trabalhar em escola de tempo parcial ou
trabalhar na escola de tempo integral, qual você escolheria?
R: A de tempo integral, e eu tenho mais certeza disso depois que uma colega que trabalhava
num outro município passou num outro concurso no Estado e ela foi, e está numa escola de
tempo parcial. Ela disse que se arrepende muito de ter ido, porque ela é uma apaixonada
assim como eu pela educação; a proposta de ensino, ver como a coisa acontece, quando
acontece, porque tem coisas também que a gente não alcança e fica frustrado, né? Mas a
maioria de tudo que nós queremos aqui acontece, né? E a gente fica apaixonada por isso e ela
falando para mim que lá a realidade é diferente, não tem essa empolgação, esse desejo de ver
acontecer, sabe? Até do espaço físico mesmo que não é legal, eu não trocaria, não.
P: Qual é o seu ideal de educação?
R: Meu ideal de educação, socorro! Já pensei tanto nisso e não sei te responder agora, sei não,
Thais. Educação ideal? Todo intuito do educador é de ver o objetivo alcançado. E qual é o
objetivo? Aprendizagem. Não é 100% que ela vai acontecer, até porque é um processo e está
sempre acontecendo, né? Mas eu te digo que 90% do que eu desejo, eu desejo e tenho
realizado. Mas assim, uma educação ideal, um projeto de educação ideal, uma escola ideal,
acho que ela não existe e nem vai existir, até porque a gente tem sempre novos anseios, né?
Tudo precisa ser melhorado, tudo precisa ser aperfeiçoado, mas eu acho que a gente tá no
caminho, temos que melhorar, claro que temos, e quando eu digo aí fora que a gente precisa,
eu tenho orgulho da educação daqui. Tem muito pra ser feito, muito pra melhorar, mas pra nós
é motivo de orgulho. Porque o ideal é como se diz, vai acontecendo e a cada ano... Quando
nós fomos nesse seminário que eu mencionei tinha um pessoal da Bahia, tinha um pessoal de
Minas e tinha um pessoal, umas doutoras, que eram de Brasília, que tinham experiências no
exterior. Ai a gente volta pra aquilo que é muito nacional mesmo e acontece de forma
diferente, mas ainda assim, com toda a defasagem que a gente tem aqui, eu ainda percebi que
aqui é o melhor. Até a questão salarial, a valorização do profissional, isso conta muito. Não é
o ideal, mas quando eu comparo...
P: Você se sente valorizada? Tanto na remuneração quanto na satisfação profissional?
R: Professor em Palmas é respeitado, e a tendência da sociedade é valorizar. Quem não
conhece... por exemplo, eu conheço superficialmente o que um advogado faz, mas da prática
dele eu não sei; da mesma forma um médico, e as pessoas valorizam esse profissional porque
sabem que ele é importante pra sociedade, e pelo que ele ganha, a remuneração. Então, em
Palmas as pessoas falam que vale a pena ser professor aqui, porque vocês são bem vistos na
sociedade. Isso é valor e também a remuneração, porque é o segundo melhor salário do país.
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O primeiro é Brasília. Nós trabalhamos para o município, o nosso salário é menor que o do
Estado, porque eu não sei se você sabe, mas pelo menos aqui no nosso Estado a diferença é
bem grande. O estado paga bem melhor que o município, mas em Palmas está quase a mesma
coisa que no Estado. As progressões acontecem mais ou menos ao mesmo tempo. Então eu
penso que isso é valorização. Tem que melhorar muita coisa? Tem. |Nunca vai chegar a ficar
perfeito. No ano passado, quando eu fiz aquele curso, quando que isso acontecia? A não ser
aqueles cursos que eram dados na escola mesmo, num dia, às vezes falando de teorias que não
se aplicavam, sabe? E achei tão prático, tão válido, que pra mim foi lindo. Principalmente,
como eu te falei no início, porque eu fiz um curso que não era voltado pra sala de aula... então
pra mim foi bastante enriquecedor .
137
ANEXO II
Transcrição da entrevista – Diretora Laura
P: Como você chegou até aqui?
L: Olha, a minha trajetória é de professora; na realidade, sou professora. Sou formada em
biologia, mas assim, sempre apaixonada pela educação e com os desafios da educação. Tem
doze anos que eu estou em Palmas. Eu comecei como professora, fiquei muito tempo fora do
mercado de trabalho e vim conhecer a escola de tempo integral e os novos parâmetros
curriculares a partir daqui, porque eu estava há muito tempo fora do mercado de trabalho. Ai
depois, nessa área, logo depois eu comecei a assumir a coordenação pedagógica. É... a estudar
e fazer curso, e depois da coordenação pedagógica eu fui trabalhar no Estado e no município;
enfim, uma trajetória de professor, mas assim era muito pouco o tempo que estava como
professora, e logo depois eu assumia o cargo de coordenador pedagógico, apesar de não ser
pedagoga. Aí eu fiz o curso de gestão, depois de gestão educacional, e fui fazendo cursos
quando diante dessas propostas, e sempre estudando, procurando além, querendo uma solução
a mais para educação. Quando esta escola foi implementada, eu estava no município e fui
convidada para vir pra cá como coordenadora pedagógica. Eu ajudei tudo na implementação,
na estruturação. Até então eu estava em uma escola de tempo parcial, sempre em tempo
parcial, porque a primeira que foi lançada aqui depois dessa aqui foi a segunda. Aí ajudei a
complementar o projeto político pedagógico, a estruturar desde a parte do mobiliário, das
estruturas físicas, mas também estruturar a proposta, a proposta já estava pronta, e o
funcionamento, né? A funcionalidade da escola de tempo integral, se isso da certo se não dá,
por que não dá, os ajustes foram feitos a partir disso, e então fui revendo a proposta
pedagógica, o projeto político, os professores, e fiquei assim por dois anos na estruturação da
escola, fazendo com que ela fosse uma realidade, porque a proposta da escola de tempo
integral precisa ser conscientizada. Acho que o ponto de partida nosso para a família é que ela
não é só a ocupação de tempo do aluno. Eu acho que é o grande desafio da escola de tempo
integral. O primeiro desafio que eu acredito que tenha vencido foi a aceitabilidade dela pelo
grupo de professores, de profissionais da educação. Eles sempre imaginavam que iriam
trabalhar mais. Em tempo de hora/aula não se trabalha mais. Agora é um trabalho mais efetivo,
é um tempo maior com os alunos, mas é um tempo que não é além da carga de trabalho,
porque no nosso caso aqui, a maioria de nós não vai em casa almoçar, e então você fica na
escola, ou seja, por um período maior mesmo do que o tempo efetivo de uma carga normal de
trabalho de 8 horas, né? Mas eu acho que ainda o maior desafio, a meu ver, é a família se
138
conscientizar de que a escola veio pra agregar valores culturais pra esse aluno, que vai além
dos conteúdos, do cognitivo, das disciplinas curriculares normais; então, essa trajetória é o
que eu venho trabalhando o tempo todo. Assim, a minha busca é essa conscientização mesmo.
Ai, quando a gestora da escola foi convidada para um outro cargo, fui indicada pelo secretário.
O Dr. R. me convocou pra que eu ficasse... então eu fiquei um ano, passei pelo processo
seletivo de gestora, que foi o último que tivemos no município, uma escolha difícil do
projeto, tanto na parte do conhecimento, como na parte da comunidade escolar, da
comunidade local, e agora eu tomei posse como diretora da escola por dois anos. Mas ainda
com o mesmo desafio de conscientizar essas famílias de que a escola veio para melhorar a
vida deles, porque realmente é uma parte social, mas a gente precisa tentar dizer que vai além
da proposta.
P: Que não é um assistencialismo?
L: É, mas a comunidade ainda vê assim, e é pela necessidade deles que o meio vai interferir.
A gente vai mediando, mas a comunidade em si ainda é muito carente.
P: Quando falamos o termo educação integral, pra você significa o quê?
L: Educação integral vai além do conhecimento. É justamente dar a esse aluno, agregar
valores que ele possa utilizar na sua vida. Agregar valores culturais, saber apreciar uma boa
música, saber se expressar corporalmente na disciplina de teatro... É o aluno poder ter uma
disciplina melhor através do xadrez. Então, é agregar cultura à vida desses alunos e não só
conhecimento que ele possa utilizar na vida dele, no progresso dele, e ser uma pessoa melhor.
Educação integral para mim é isso, é educação de valores. Muitos desses valores são
atendidos aqui, grande parte são aqui até afetivos. Eu tive uma aluna que pediu um abraço,
pois ela nunca tinha ganhado um... é meio cruel, né? Então, a escola de tempo integral,
quando bem dimensionada, sabe assim, bem estruturada, eu acho que ela tem muito a oferecer.
É um ganho que, na minha concepção, não tem volta. É o caminho. Precisa de ajustes?
Precisa, mas é o caminho.
P: Como entra nessa proposta de educação integral a ampliação do tempo?
L: A ampliação do tempo funciona da seguinte maneira: as disciplinas curriculares funcionam
nas quatro horas normais e as disciplinas complementares funcionam no turno oposto. A gente
não chama de contraturno, porque na realidade a gente propõe que isso seja integralizado, que
seja interdisciplinar, que não seja agora a disciplina do núcleo comum, agora a disciplina do
núcleo diversificado: a dança, o xadrez, a informática, as disciplinas se complementam...
então são quatro horas de disciplinas normais e quatro horas de disciplinas do núcleo
diversificado, que devem estar dentro de uma engrenagem. A princípio foi difícil? Foi, mas
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isso já está bem melhor e tende a melhorar. Durante esse período as aulas são interrompidas
em três momentos no café da manhã, no almoço e no lanche da tarde, que são três refeições.
Então, a gente precisa ter muito cuidado com a otimização do tempo, do tempo real em sala
de aula, porque, se a gente não tomar cuidado, as quatro horas efetivas de aprendizagem
mesmo do núcleo comum também ficam prejudicadas, e nós não temos intervalos. Eles
chegam às oito horas, se acomodam na sala e já descem para o café da manhã que dura em
termos de quinze a vinte minutos, e vão descendo escalonado. Aí continua normalmente.
Depois começa o almoço às quinze pras onze e dura até mais ou menos meio-dia, de meio-dia
à uma eles descansam, e quando dá umas três e meia, no máximo quatro horas, é o lanche da
tarde, escalonado também, que dura em média uns vinte minutos, um pouco menos que o
almoço, e terminam todas as atividades do dia às dezessete horas. Quem tem o treinamento,
são duas horas de treinamento, das dezessete e quinze às dezenove e quinze horas, mas o
treinamento é opcional.
P: E o tempo a mais pra essa proposta de educação integral, qual é a relação? Como o tempo
a mais é um dos aspectos da educação integral? Você enxerga essa relação?
L: O tempo que ele fica a mais eu acho que é o tempo necessário para que ele componha o
aculturamento dele. Agora, sinceramente, eu acho que não precisava de tanto tempo a mais.
Não sei se eu consigo me explicar, mas eu acho, assim, que algumas disciplinas, no meu
modo de ver, deveriam ser obrigatórias, vamos dizer assim, como o núcleo comum, e ele faria
uma opção de mais três disciplinas do núcleo diversificado pra que complementassem essa
carga horária dele. Porque eu vejo assim... a dança, não é toda criança que tem aptidão pra
dança, pro teatro, não é toda criança que tem aptidão pro teatro. Enquanto que essas
disciplinas se tornam quase que obrigatórias porque elas são curriculares, certo? Então, eu
acho que deveria se manter algumas, como a informática, e que essas de dança, teatro, mesmo
até... não educação musical, porque hoje ela até já é curricular, mas o xadrez, algumas dessas
duas ou três deveriam ser opcionais, complementariam a hora dele. O estudo monitorado eu
acho necessário, pelo fato de que a criança que fica o dia inteiro aqui não leva lição pra casa, e
aí, pra essa criança, o estudo monitorado é o momento que eles têm pra fazer uma tarefa, pro
professor tirar uma dúvida pra ele fazer algum trabalho que ele tenha necessidade de fazer. Eu
acho que algumas disciplinas poderiam ser é opcionais, sabe? Assim ele faria a inscrição
depois, ou no momento da matrícula. A proposta é reduzir um pouco essa carga horária. Eela é
cansativa.
P: O que você acredita que seria um tempo interessante?
L: Ai, eu acho que oito horas pra uma criança numa escola é muito tempo. Eu acho que umas
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três horas a mais, duas horas a mais, já é uma escola de seis a sete horas. Eu acho que ela
rouba um pouco da infância dele, assim em termos de... Agora, se ele quisesse ficar pro
treinamento depois, eu entendo que tem pai que precisa que ele fique, aí ele seria inscrito
numa oficina a mais, como dança, música, e seria como se fosse um treinamento. Não assim
como disciplina obrigatória, curricular pra ele, porque todas as disciplinas têm nota, são
avaliadas porque fazem parte do plano político pedagógico, da proposta curricular. É matriz,
né?
P: Como você enxerga pra proposta de educação integral os espaços educativos?
L: Olha, nós temos os espaços aqui, fora dos muros da escola. Olha, a nossa escola é uma
escola adequada, entendeu? Ela é adequada pra uma educação em tempo integral, e então
todos os espaços educativos são propostos adequados pra ele. Aqui são todos adequados... pra
cada disciplina eles têm os espaços adequados. Outras escolas estão sendo adaptadas pra isso.
Aqui não funciona assim. Como as escolas de Belo Horizonte, Curitiba, que são escolas em
que eles utilizam alguns espaços da cidade como espaços educativos, nós ainda não temos
essa proposta, porque todas as escolas estão sendo adaptadas, pelo menos as municipais, pra
escola de tempo integral. Agora, há na nossa cidade alguns espaços que poderiam estar sendo
aproveitados pra isso, mas o deslocamento da comunidade também fica meio complicado.
Mas eu acho que o ideal seria mesmo, dessa maneira, que cada escola tivesse adequação para
a educação em tempo integral.
P: Você até comentou isso um pouco sobre a proposta integrada, na proposta curricular, como
vocês fazem pra que não fique turno e contraturno, para que não se tenha duas escolas em
uma.
L: É um desafio. Vou te dizer que é um desafio grande, mas a gente faz por meio de projetos,
a gente cria projetos que articulam e, também, através do planejamento, aí o professor...
porque é uma dificuldade. É um privilégio e é uma dificuldade. O nosso bloco de esporte,
onde fica a maioria das salas pra parte diferenciada do contraturno, que seria educação física,
música, dança, xadrez, natação, estão lá embaixo, lá no bloco esportivo. Quer dizer, o
planejamento é feito lá, a escola tem 175 funcionários. É muita gente, né? Fica aqui embaixo
estudo monitorado, teatro e informática... então, essas disciplinas ficam aqui. Então, o que
acontece no momento do planejamento o coordenador tenta entrosar ou vai lá embaixo. Olha,
eu tô trabalhando lateralidade. Em educação física já fizemos um projeto que chamamos de
bloco e conteúdo, um projeto muito bom, onde nós paramos a escola toda. Logo que
começamos, a maioria veio pra cá... a alfabetização tava lá embaixo, nós tínhamos alunos de
quatro categorias, não alfabetizados, semi alfabetizado, lia e não escrevia, escrevia e não lia, e
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alunos avançados. Então nós fizemos um diagnóstico, dividimos esta turma todinha, o
professor dentro de sala de aula em pequenos grupos, na quadra, em todo canto... para
alfabetizar foi muito bom. Então hoje, em um projeto a gente tenta entrosar: o professor de
educação física trabalha leitura, faz roda de leitura; o professor de teatro faz roda de leitura
para ajudar, o professor de xadrez alfabetiza lá na Matemática.
P: Então é um projeto que parte da necessidade a partir de um diagnóstico que foi feito?
L: Trabalhamos muito com diagnóstico pra ver onde nós podemos avançar, e é um desafio,
mas a gente tem melhorado muito. Tem muita coisa para melhorar, tem, eu sempre acho que
tem muita coisa para melhorar. Sempre precisa sair, buscar coisas novas.
P: Como as políticas públicas e o financiamentos contribuem para esta proposta de educação
em tempo integral?
L: Essa escola foi totalmente construída com dinheiro, recurso do município, 100% do
município. E hoje a escola é mantida, né? Como você pode ver, é uma escola totalmente
subsidiada e não faltam recursos de maneira alguma.
P: Parte do programa Mais Educação?
L: O Mais Educação, PDDE... É, todos esses recursos, Merenda, FUNDEB, todos esses
recursos, é o FUNDEB, o PDDE e o Mais Educação.
P: Como é o envolvimento da família?
L: Pequena ainda.
P: É?
L: É, É tentar construir através de reuniões. A gente já teve muitas, a entrega de uniformes,
entrega de livros, a conscientização do acompanhamento, essa foi a primeira... Daqui a pouco,
antes de terminar as provas, a gente faz outra. Vamos acompanhar, falar, falamos no dia do
planejamento. A gente sempre está buscando, muitos vezes a gente telefona, “ó mãe,
precisamos conversar”... hoje mesmo eu encontrei com uma professora. O que foi professora?
Não, é que esse aluno não está fazendo nada na sala. Vamos chamar a mãe. Aos poucos a
gente tá dizendo pras famílias, nós não estamos aqui pra que você possa trabalhar. Por que
quando ela vem buscar vagas, o que você escuta é: eu preciso trabalhar. A senhora tem que
arrumar uma vaga. Mãe, se eu tiver a vaga, é do filho da senhora. Mas eu não tenho. Mas é só
mais uma... Mas eu não tenho, eu não posso ter mais um aluno porque a senhora precisa
trabalhar. Inclusive eu sempre digo que é um local de aprendizagem.
P: A procura primeira dos pais...
L: É, ele quer alguém que possa tomar conta, e a gente está desconstruindo isso aos poucos.
Ele está no assistencialismo. Bom, agora tá lá eu to tranquilo. Ele chega em casa, ele toma
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banho, já fez as lições, já lanchou, tá tranquilo. Mas tá melhorando, tá melhorando.
P: Como foi a formação docente pra essa equipe assumir uma escola de tempo integral e
como vocês mantém essa formação como uma proposta continuada pra essa dinâmica da
escola?
L: Nós fizemos seminário, teve o seminário de educação integral, já tivemos três, e agora a
equipe participou através deste seminário. Então você tem o seminário, o processo de
conscientização, e agora as formações elas vão acontecendo paulatinamente; todo ano tem um
seminário, têm trazido propostas, estudos. No nosso dia pedagógico também a gente estuda a
proposta. Então, assim, todo ano nós temos as formações, é através de seminários, e tem as
formações iniciais e os dias de formação, que são os quatro dias pedagógicos em que a gente
estuda a proposta, o que precisa ser melhorado, e alguns grupos de estudos também que estão
estudando a proposta, revendo.
P: Esse seminário é organizado pela Secretaria?
L: Pela secretaria, pra todo o município.
P: E o que é específico pra esta escola? O que tem de formação para o professor no dia a dia?
L: A gente faz através dos dias pedagógicos. Nos dias pedagógicos, a gente sempre procura
trazer alguma proposta.
P: E quem organiza?
L: É organizado pela coordenação e pela direção.
P: E tem uma frequência pra acontecer?
L: É oficializado em calendário.
P: Como você enxerga a importância do seu trabalho?
L: O meu trabalho na escola é direcionar essa moçada. Sabe, o meu trabalho é um trabalho de
liderança, não só por ser diretora de uma escola de tempo integral. Eu acho que ele é
importante porque eu só viso à melhoria da educação. Eu acho que quem teve a formação que
eu tive, é... gostaria... então, nesse ínterim a educação cresceu muito, mas perdeu muito. Eu
acho que a educação teve um período que ela perdeu muito, ela perdeu muito dos valores, ela
cresceu em tecnologia, cresceu em muita coisa, mas eu acho que ela precisa... alguns pontos
precisam ser revistos. Então eu acho que eu me sinto importante porque eu gosto muito do
que eu faço. Sabe, então assim, pra a educação de tempo integral estar vivenciando, ajudando
a formular a escola de tempo integral a construir essa construção da escola de tempo integral
pra um país como o nosso é visar a uma educação melhor. Sabe, acho que a minha
importância é procurar a melhoria da educação.
P: Quais são os seus sentimentos?
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L: Eu amo o que eu faço. Eu estou aqui porque eu gosto do que eu faço. Nessa altura da
minha vida, é porque eu gosto mesmo, eu amo o que eu faço.
P: Quais são os ganhos dessa proposta de educação integral?
L: Fundamental, fundamental. Eu tava reunida com a minha equipe agora, eu ando muito pela
escola, eu vou em sala, eu entro e, independentemente, nós não podemos nos acomodar,
precisamos melhorar na qualidade. O ganho da educação em tempo integral é a melhoria na
qualidade, é procurar cada vez mais qualidade, experiência... é formação de valores, que a
nossa comunidade está precisando muito. Crescer enquanto pessoa, valorizar, valorizar o
outro, valorizar o crescimento do ser humano, tanto de valores - não digo só de valores morais,
né? hoje em dia é muito difícil - você vai conversar com uma pessoa e a pessoa está vinte e
quatro horas do dia com isso aqui (pegou o celular). Isso aqui é uma ferramenta, como essa.
Eu falo que eles precisam assistir jornal nacional; então são esses valores que precisam. É
uma geração nova, é uma geração muito inteligente, mas que está precisando ser direcionada,
e por isso que estou aqui até hoje e vou ficar muito tempo.
P: Quais são os equívocos?
L: Um dos grandes equívocos é o assistencialismo; o outro é a conscientização (inaudível) as
forças e as fraquezas, a conscientização profissional precisa muito conscientizar ainda. Quem
tá aqui, quem está na escola de tempo integral tem que crescer. Tem que crescer muito porque
é um tempo muito grande dedicado à educação, né? Então é preciso que ela melhore de fato e
de direito. Eu acho que ainda são muitas as fraquezas, o assistencialismo e a conscientização
da educação. Eu acredito nisso.
P: E os desafios?
L: O desafio é a conscientização maior, a valorização do profissional, a conscientização maior
dele. Outro grande desafio é a integralização da família e o outro desafio é adequar a proposta
a um tempo real, mas efetivo, porque eu fico muito preocupada com esse tempo todo e com a
otimização deles. São três grandes desafios.
P: Você sente necessidade por parte dos alunos do tempo em casa, do tempo doméstico?
L: Tem. “Professora eu não queria vir, eu não queria vir.” Por que você não queria vir? “Tia,
tá doendo aqui, tá doendo aqui.” “Eu queria viajar com o meu pai.” É, tem muitos que choram,
ou que tão assim no segundo, no terceiro, no contraturno, daí começa a dor de barriga, muitos
sentem dificuldade... é os pequenininhos, os maiores, não querem porque querem tempo livre
para estarem vivenciando a adolescência, mas que acabam não tendo. E os menores sentem a
carência da família. Grande parte, a gente nota que a carência da família dos mais estruturados
e os menos estruturados, não. Eles querem mais tempo. Quando tem feriado, eles detestam.
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Outros, não, mas a grande maioria já não gosta porque aqui é onde eles têm de tudo, é onde
eles comem bem, têm refeição balanceada, tudo isso, têm as atividades. Então, assim, eu acho
que uns sentem falta, mas eu particularmente acho que a família de alguma maneira precisa
vivenciar também a responsabilidade dela. Mesmo que ele trabalhe, né? Eu tenho criança aqui
que tem pai que vem buscar oito e meia da noite. Aí eu falo assim: “O senhor não virá
buscar.” “Mas eu trabalho, o que eu vou fazer?” Mas a criança não pode chegar aqui às sete e
meia da manhã e sair as nove da noite. Tem a vivencia da família. Mas eu acho que alguns
sentem e os outros não, justamente pelo fato de ser. Aqui ainda é um pouco melhor do que...
não sei se você foi lá no Caroline. Por outro lado, você vê outros que não abrem mão do
tempo do filho, de almoçar com o filho; então, são realidades diferentes. Ela veio muito na
proposta primeiramente assistencialista, e é um esforço que ela vai se transformar em uma
necessidade de ganho real para os alunos.
P: O que seria essa valorização? No sentido de remuneração ou no sentido de como as
pessoas olham para esse profissional?
L: Olha, eu sou de um tempo que o professor era valorizado, né? Não financeiramente, o
professor valorizado não financeiramente, eu digo valorizado enquanto respeito, é respeito
mesmo. Eu sou de uma época em que os professores davam aula de terno. Era igual os
professores universitários, né? Então eu vejo, assim, que a valorização, a nossa remuneração
hoje no nosso município, não é uma remuneração ruim. Mas eu sinceramente acho que os
professores deveriam ser mais qualificados para serem melhores remunerados. Eu acho que a
qualificação, me perdoem as faculdades, do professor não está boa... então isso é o que faz
com que ele seja menos valorizado, sabe? Nós poderíamos ter salários muito bons como em
vários países, mas para o professor extremamente qualificado, ele estuda muito pra chegar até
aqui, ele vai além e eu não vou aqui defender por que... mas eu acho que o professor precisa
ser mais qualificado... aí o posteriormente mais valorizado precisa de um piso maior, de uma
carga horária menor, e embora nós temos um terço da carga horária, a gente tem quatorze
horas de planejamento e ainda tem o período de docência livre, o tempo integral. Eu acho que
aqui é que se resolve os problemas, eu acho necessário os problemas, mas eu acho que o
profissional, eles que não me escutem, passam um pouquinho de informação e acham que
aquilo ali tem... eu acho que as faculdades precisariam de muito mais. Um profissional
qualificado.
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