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UNIVERSIDADE DO PLANALTO CATARINENSE
PROGRAMA DE PS-GRADUAO STRICTO SENSU EM AMBIENTE E SADE
FERNANDA XAVIER DE SOUZA
QUALIDADE DE VIDA URBANA E SUA RELAO COM OS PRINCPIOS
FUNDAMENTAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA CIDADANIA
LAGES
2017
1
FERNANDA XAVIER DE SOUZA
QUALIDADE DE VIDA URBANA E SUA RELAO COM OS PRINCPIOS
FUNDAMENTAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA CIDADANIA
Dissertao apresentada como requisito para
obteno do ttulo de Mestre no Programa de Ps-
Graduao em Ambiente e Sade da Universidade
do Planalto Catarinense UNIPLAC.
Orientadora: Dra. Marina Patrcio de Arruda
Linha de pesquisa: Ambiente, sade e sociedade.
LAGES
2017
2
3
4
Aos meu pais, com todo o meu amor, respeito,
admirao e orgulho.
5
AGRADECIMENTOS
A jornada como docente no Curso de Direito, na Universidade do Planalto Catarinense -
UNIPLAC, conduziu o meu caminhar a este Mestrado, na busca de conhecimento e qualificao e
desde o princpio, inmeras pessoas especiais fizeram parte deste universo complexo, especial e
gratificante, o qual est findando.
Nestes dois anos de caminhada acadmica, quantas dvidas... A vontade de desistir que por
vezes assombrava, perguntas interiores que ressoavam e indagavam se cada um dos esforos
empenhados resultaria na retirada de benefcios e na concluso com xito do Mestrado.
De todo o trajeto trilhado, de todas as idas e vindas, das incontveis subidas dos lances de
escada at a sala de aula, dos livros lidos, dos trabalhos elaborados, dos seminrios apresentados, o
que efetivamente marcou foram aqueles que sempre estiveram comigo, apoiando, incentivando,
torcendo, intercedendo.
Santssima Trindade: Pai, Filho e Esprito Santo, o meu agradecer por ter conduzido meu
viver, dando-me a sade do corpo e da alma para aguentar firme nestes dias em que foram
conciliados trabalho e estudo. Santssima Trindade o nome que batiza a Igreja da Comunidade
do Bairro Petrpolis, bairro no qual foram colhidos os dados da presente pesquisa, bairro que resido
e Igreja esta aonde foi realizado o encontro do grupo focal, local no qual, h 20 anos, dedico parte
da minha vida cantando nas missas. Como no agradecer, como no emocionar!
Maria Santssima, que foi e sempre ser minha intercessora, estando presente nas horas
de desnimo, sendo acalanto, calmaria e repouso!
Aos meus pais: impossvel escrever sobre vocs, sem que meus olhos fiquem marejados e
o corao acelerado. Pessoas simples, de pouco estudo, mas de muito trabalho e carter, que
moldaram minha vida e encaminharam meu destino, incentivando a estudar, sempre dispostos a
abdicarem de si, para que a ns filhas, fosse proporcionado o melhor. Analisando nossa jornada
quanto orgulho eu sinto: sem terem concluindo nem o ensino mdio, trabalhando diuturnamente,
formaram as trs filhas em cursos de nvel superior. Poderia escrever vrias dissertaes sobre as
pessoas incrveis e sobre o amor desmedido, imensurvel e eterno que sinto por vocs! Muito
obrigada!
s minhas irms Claudia e Renata: como no agradecer aquelas que alm do mesmo
sangue, so o meu corao pulsando fora de mim, a quem eu desejo o melhor que a vida pode
ofertar, as pessoas que no futuro estaro comigo, assim como tiveram em todos os momentos da
minha vida e no diferente nestes dois anos de Mestrado. Somos extremamente privilegiadas por
termos nascido na famlia que nascemos, por sermos irms, por estarmos hoje e sempre unidas na
6
mesma frequncia, as batidas dos nossos coraes. Muito obrigada por tudo, somos e sempre
seremos o trio mais lindo deste planeta!
Jos Aref Bakri, um dos primeiros incentivadores desta jornada discente, me permitindo
cursar as aulas tericas. Sem o seu sim, nada disso teria iniciado e, consequentemente, hoje o
trmino no existiria. Obrigada por nossas inmeras conversas, pela pessoa inteligente, iluminada e
especial, que ultrapassa a relao entre cliente e advogada e a quem considero um amigo. Muito
obrigada!
s minhas amigas Raphaela, Faline, Camila, Karin, Iara e Danyelle: vocs so a segunda
famlia que Deus me concedeu. Com cada uma aprendi a ser uma pessoa melhor e, acima de tudo
compreendi o que significa a palavra amizade. Somos companheiras, amigas, parceiras,
cmplices de todos os momentos e horas e, desde o incio do Mestrado e sei que especialmente no
dia da defesa da banca, vocs, mais uma vez, estaro comigo. Obrigada por tudo!
Aos meus amigos de f, Pe. Fernando, Pe. Marcelo e Seminarista Wellington: a Igreja de
Jesus nos uniu numa grande misso em prol da evangelizao. Entretanto, nos tornamos amigos,
irmos de vida, sempre juntos, imbudos do esprito fraternal e, assim, o que dizer sobre nossos
dias: apenas que amigos como vocs tornam a vida mais fcil de ser encarada. Muito obrigada por
cada orao, por estarem comigo nos dias de aflio!
s minhas amigas, Samara, Rosy, Daiane, Marcia, Rosangela e Claudirene: companheiras
e amigas de todos os dias, h quase 10 anos. Vocs acompanharam diariamente os malabarismos
que efetuei para conseguir concluir este Mestrado e sempre estiveram ao meu lado, rindo das
minhas histrias malucas e engraadas e apoiando nos momentos de desespero. Obrigada de
corao!
Aos colegas da turma de Mestrado: formamos um grupo especial, divertido, inteligente,
interdisciplinar, mas acima de tudo, unido. Muitssimo obrigada por ter conhecido cada um vocs e
por termos atravessado essa misso to importante juntos.
Aos integrantes do quarteto fantstico: Dayane, Julio e Paulo, meus colegas de sala de aula
do mestrado, que dentre aquele seleto grupo to especial, vocs se destacaram entre os especiais e
nos tornamos um grupo inseparvel e imbatvel. Levarei para sempre comigo as risadas infinitas, o
apoio incondicional que demos um ao outro, os trabalhos em conjunto, a vontade de desistir de um
de ns revoltado, que sempre era afastada pelos outros trs. Nossa amizade ultrapassou a sala de
aula e prova disso o casamento da Dayane, aonde celebramos todos juntos este momento.
Obrigada por cada dia que passamos juntos!
Aos coordenadores do Curso de Direito, da Universidade do Planalto Catarinense-
UNIPLAC, Jos Ezequiel Carneiro e Pablo Adriano Antunes pelo apoio e compreenso nestes dois
anos, sempre acomodando minhas aulas a perodos de modo a no coincidir com as aulas do
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Mestrado e entendendo quando, em alguns semestres abdiquei da sala de aula para poder chegar a
esta concluso. Muito obrigada!
Aos meus amigos, Camila, Aline, Gregory, Giovanni, Marco Antonio, Marcia e Gerson,
professores do Curso de Direito da Universidade do Planalto Catarinense-UNIPLAC, os quais, alm
de colegas de profisso, tornaram-se amigos de vida e os quais sempre estiveram comigo nestes
anos de estudo. Obrigada por cada palavra!
Aos meus alunos do passado, do presente e do futuro, do Curso de Direito, da
Universidade do Planalto Catarinense-UNIPLAC. A docncia uma das maiores alegrias da minha
vida e sem cada aluno, esta profisso to intrigante e ao mesmo tempo to gratificante no existiria.
A cada entrada em sala de aula, renovo meu conhecimento no Direito, mas em especial renovo meu
nimo, meu humor e minha vontade de viver. S quem vive uma sala de aula, em nvel superior,
sabe do sentimento que tentei traduzir neste agradecimento aos meus alunos. Obrigada por fazerem
meu corao pulsar de maneira to entusiasmada!
Aos professores e funcionrios do Programa de Ps-Graduao em Ambiente e Sade, pelo
conhecimento transmitido, pela pacincia, pelo amor a este ofcio! Que vocs sejam
recompensados(as) por tamanha dedicao! Muito obrigada!
minha orientadora, Prof. Dra. Marina Patrcia de Arruda, que com esse jeito calmo, voz
tranquila, olhar paciente, conduziu meus passos, sanou minhas dvidas, acalantou minhas angstias
e conduziu meu caminhar na delimitao de cada pedacinho desta dissertao. Professora doutora
profissionalmente falando, mas doutora na vida, atuando ao meu lado, muitas das vezes, no como
professora, mas como amiga! Sem sua pacincia, serenidade e tranquilidade este trabalho no teria
sido gestado. Obrigada de corao, a levarei sempre guardada no meu corao!
Aos participantes do grupo focal, os quais quando do recebimento da carta-convite
disseram seu sim e compareceram na totalidade ao encontro, possibilitando o recolhimento dos
dados e, a consequente concluso desta obra. Vocs foram elementares, imprescindveis e
indispensveis. Serei sempre grata por sua disponibilidade!
Aos professores doutores, membros da banca avaliadora, obrigada pelo aceite do convite e
pelas contribuies na lapidao desta dissertao!
Encerro esta etapa com extrema gratido, extravasando alegria, infinitamente emocionada
por ter chegado at este momento. Recordarei sempre que nunca estive sozinha, pois fui
acompanhada das melhores pessoas, vocs aqui lembrados e todos aqueles que mesmo no citados,
mas que por qualquer motivo, direta ou indiretamente fazem parte desta conquista, o meu
agradecimento!
Meu corao transborda de felicidade ao concluir esta dissertao!
Muito obrigada!
8
Cubra-me com seu manto de amor, guarda-me na paz
desse olhar, cura-me as feridas e a dor me faz
suportar. Que as pedras do meu caminho meus ps
suportem pisar, mesmo ferido de espinhos me ajude a
passar. Se ficaram mgoas em mim, Me tira do meu
corao e aqueles que eu fiz sofrer peo perdo. Se eu
curvar meu corpo na dor, me alivia o peso da cruz,
interceda por mim minha me, junto a Jesus.
Nossa Senhora me d a mo, cuida do meu corao, da
minha vida, do meu destino. Nossa Senhora me d a
mo, cuida do meu corao, da minha vida, do meu
destino, do meu caminho, cuida de mim!
Sempre que o meu pranto rolar, ponha sobre mim suas
mos, aumenta minha f e acalma o meu corao.
Grande a procisso a pedir a misericrdia o perdo,
a cura do corpo e pra alma a salvao. Pobres
pecadores oh me, to necessitados de vs, Santa Me
de Deus, tem piedade de ns. De joelhos aos vossos
ps, estendei a ns vossas mos, rogai por todos ns
vossos filhos, meus irmos.
(Roberto Carlos)
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RESUMO
A qualidade de vida, tema de grande discusso no tocante a conceituao e mensurao, inclui
questes que perpassam o aspecto sade, felicidade, satisfao pessoal em suas vertentes
profissional e amorosa, condies e estilos de vida, religiosidade, dentre outros aspectos que so
levantados e discutidos ao longo dessa construo. A temtica tratou da qualidade de vida,
centrando-se na qualidade de vida urbana, assunto de grande relevncia tendo por objetivo geral
compreender alguns indicadores de qualidade de vida urbana e sua relao com os princpios
fundamentais da dignidade da pessoa humana e da cidadania. A pesquisa desenvolveu-se no bairro
Petrpolis, no Municpio de Lages/SC, deu-se na abordagem qualitativa, com a coleta de dados,
obtidos em duas etapas, quais sejam, num primeiro momento mediante o levantamento de dados,
delimitando-se assim, o local e os sujeitos da pesquisa. Posteriormente realizou-se grupo focal,
sendo que o roteiro foi formulado com base nos objetivos especficos da pesquisa e de outros
instrumentos mensuradores da temtica. Os resultados obtidos, destacam o entendimento da
populao estudada acerca do que consideram qualidade de vida, interligando-se tal percepo aos
direitos sociais vitais, mas tambm a critrios subjetivos, como a felicidade e a vida em
comunidade, podendo-se auferir que a qualidade de vida se apresenta como um direito fundamental
inerente dignidade da pessoa humana e sua cidadania.
Palavras-chave: Qualidade de vida; Qualidade de vida urbana; Dignidade da pessoa humana;
Cidadania.
10
SUMMARY
Quality of life, a topic of great discussion regarding conceptualization and measurement, includes
questions that pervade the health, happiness, personal satisfaction in its professional and loving
aspects, conditions and lifestyles, religiosity, among other aspects that are raised and Discussed
throughout this construction. The theme dealt with the quality of life, focusing on the quality of
urban life, a subject of great relevance with the general objective of understanding some indicators
of urban quality of life and its relation with the fundamental principles of the dignity of the human
person and citizenship. The research was developed in the Petrpolis district, in the municipality of
Lages / SC, it was the qualitative approach, with the data collection, obtained in two stages, which
are, at first, through the collection of data, thus delimiting , The site and the subjects of the research.
Subsequently a focal group was held, and the script was formulated based on the specific objectives
of the research and other instruments that measure the subject. The results obtained highlight the
understanding of the population studied about what they consider to be quality of life,
interconnecting such perception with vital social rights, but also with subjective criteria such as
happiness and community life, and it can be seen that quality Of life is presented as a fundamental
right inherent in the dignity of the human person and his citizenship.
Keywords: Quality of life; Urban quality of life; Dignity of human person; Citizenship.
11
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Mapa Estado Santa Catarina (destaque Municpio de Lages) .............................. 47
Figura 2 Foto Bairro Petrpolis........................................................................................... 48
Figura 3 Foto Igreja Catlica Bairro Petrpolis................................................................... 74
12
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 ndice de Qualidade de Vida Urbana Municpios Brasileiros (instrumento)....... 50
Quadro 2 Indicadores de qualidade de vida apontados pelo grupo focal............................ 68
13
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Indicadores qualidade de vida urbana desta pesquisa........................................... 51
Tabela 2 Participantes convidados para o grupo focal, com nome fictcio utilizado na
discusso dos dados................................................................................................................ 55
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LISTA DE SIGLAS E ABREVIAES
CEP Comit de tica em Pesquisa
DNIT Departamento Nacional de Infraestrutura
FMI Fundo Monetrio Internacional
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
IDH ndice de Desenvolvimento Humano
IQVU ndice de Qualidade de Vida Urbana
IVS ndice de Vulnerabilidade Social
OMS Organizao Mundial da Sade
PIB Produto Interno Bruto
PNUD Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento
SUS Sistema nico de Sade
TCLE Termo de Consentimento Livre Esclarecido
UNESCO United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization
UNIPLAC Universidade do Planalto Catarinense
15
SUMRIO
INTRODUO ..................................................................................................................... 16
1 REVISO DA LITERATURA .......................................................................................... 21
1.1 Qualidade de vida ........................................................................................................ 22
1.1.1 Qualidade de vida urbana ...................................................................................... 29
1.2 Dos princpios fundamentais da Repblica Federativa do Brasil ........................... 33
1.2.1 Da dignidade da pessoa humana .............................................................................. 36
1.2.2 Da cidadania ............................................................................................................ 40
2 PRESSUPOSTOS TERICOS E METODOLGICOS DO ESTUDO ........................ 45
2.1 Tipo de pesquisa .......................................................................................................... 46
2.2 Local da pesquisa ......................................................................................................... 47
2.3 Sujeitos da pesquisa ..................................................................................................... 49
2.4 Instrumentos de pesquisa e coleta de dados .............................................................. 49
2.5 Aspectos ticos ............................................................................................................. 52
2.5.1 Critrios de incluso e excluso dos participantes ................................................... 53
2.6 Anlise de dados .......................................................................................................... 53
3 RESULTADOS E DISCUSSO ........................................................................................ 55
3.1 Indicadores de qualidade de vida urbana: com a palavra, os moradores .............. 56
3.2 Da cidadania e da dignidade da pessoa humana ...................................................... 69
3.3 Qualidade de vida urbana e sua relao com os princpios fundamentais da
dignidade da pessoa humana e cidadania ..................................................................... 77
6 CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................. 87
REFERNCIAS ..................................................................................................................... 90
APNDICE ........................................................................................................................... 102
APNDICE A Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - TCLE ................... 103
APNDICE B Parecer Consubstanciado CEP .......................................................... 106
APNDICE C Roteiro Grupo Focal ........................................................................... 109
ANEXOS ............................................................................................................................... 110
ANEXO A ARTIGO: Qualidade de vida urbana e sua relao com os princpios
fundamentais da dignidade da pessoa humana e da cidadania .................................. 111
16
INTRODUO
O tema escolhido para o desenvolvimento desta dissertao, qualidade de vida
urbana e sua relao com os princpios fundamentais da dignidade da pessoa humana e da
cidadania1, encontra-se no centro atual de discusses e na busca de uma definio e de
instrumentos de mensurao.
A motivao para o desenvolvimento de referido tema, se deu em virtude da
pesquisadora ser advogada e h seis anos ser docente do Curso de Direito, da Universidade do
Planalto Catarinense (UNIPLAC), podendo desta maneira, interligar, na vertente da
interdisciplinaridade o Direito e o Ambiente e Sade.
Como advogada e professora de um curso de Direito, a inquietao em torno da
discusso sobre a qualidade de vida e sua interligao com os princpios da dignidade da
pessoa humana e cidadania, levaram-me a referido dilogo na pesquisa, enredo de tamanha
relevncia dentro do Estado Democrtico e Social de Direito vivido no Brasil.
A qualidade de vida, por si s, apresenta imprecises tericas e metodolgicas o que
complica a investigao, o dilogo entre as diferentes reas que trabalham com o tema,
impactando especialmente esta dificuldade na aplicao do conhecimento produzido na
melhoria da qualidade de vida da populao (PEREIRA; TEIXEIRA; SANTOS, 2012).
Vista dessa forma, a temtica no se refere a algo indito ou contemporneo, pois h
muito, estudiosos tm questionado sobre o fato da qualidade de vida encontrar-se atrelada
apenas questo da sade, o que hoje, veementemente afirma-se que a mesma extrapola os
limites apenas desta acepo, adentrando em outras reas, sendo a mesma vetustamente
interdisciplinar (FLECK et al. apud PEREIRA; TEIXEIRA; SANTOS, 2012).
Questes sobre o conceito de qualidade de vida tem sido foco de discusso desde os
primeiros filsofos (LOW G. apud PASKULIN et al., 2010, p. 102), sendo que at os dias
de hoje, esse construto considerado um conceito complexo, interpretado de diferentes
modos e utilizado em vrias disciplinas (PASKULIN et al., 2010, p. 102).
Nesse sentido, convm destacar que a definio de qualidade de vida no etrea e
nem esttica, nas ltimas dcadas foram desenvolvidos inmeros indicadores para
operacionalizar tal conceituao, estando o ndice de Desenvolvimento Humano (IDH) entre
os instrumentos de mbito universal, o qual critica a medida do desenvolvimento apenas pelo
1 A Repblica Federativa do Brasil, formada pela unio indissolvel dos Estado e Municpios e do Distrito
Federal, constitui-se em Estado Democrtico de Direito e tem como fundamentos: I a soberania; II a
cidadania; III a dignidade da pessoa humana; [...]
17
Produto Interno Bruto (PIB) que mede valores qualitativos como nvel de renda, sade e
educao e longevidade, buscando comparar as sociedades onde o ndice adotado
(MINAYO, 2003).
A qualidade de vida apresenta-se como tema de grande proeminncia atravessando e
retomando diuturnamente o levantamento das acepes sobre sua conceituao, mensurao,
classificao e avaliao, interligando as diversas reas do conhecimento, tendo em vista sua
tramitao pelos diversos saberes, diante da complexidade, ambiguidade e hermenuticas
variadas atinentes ao tema em comento (GIMENES, 2013).
Assim a qualidade de vida uma noo eminentemente humana, subjetiva e
polissmica relacionando-se ao bem-estar que o ser humano individualmente considera e na
coletividade encontra na vida familiar, amorosa, social e ambiental. Sob o aspecto
sociolgico, a qualidade de vida pode ser visionada como o prottipo que uma sociedade
determina e se organiza para obter, por meio de polticas pblicas e sociais que deem
movimento e promovam o desenvolvimento humano, as liberdades individuais e coletivas e
as mudanas positivas no modo, no estilo de vida e nas condies sociais (MINAYO, 2003).
Falar em qualidade de vida implica trazer questes que perpassam o aspecto sade,
adentrando em outras esferas, que de acordo com critrios de avaliao, esto diretamente
articuladas vida de qualquer ser humano, como felicidade, satisfao pessoal em suas
vertentes profissional e amorosa, condies e estilos de vida, religiosidade, dentre outros
aspectos que so levantados e mensurados nesta busca incessante pela qualificao e
quantificao do tema discutido (ALMEIDA; GUTIERREZ, s.d.).
Qualidade de vida uma ideia largamente difundida na sociedade, correndo risco de
uma banalizao pelo seu uso ambguo, indiscriminado ou oportunista como
acontece, por exemplo, em textos que prometem elevar a qualidade de vida do
indivduo lanando mo de estatsticas muitas vezes irreais para comprovar suas
afirmaes. De um lado, existe a explorao oportunista de um conceito o que
resulta na sua depreciao e, de outro, o reconhecimento de que esse conceito
exprime uma meta sobre a ser perseguida, que resulta na preservao de seu
significado e valor (ALMEIDA; GUTIERREZ, s.d., p. 154).
Tem-se que a qualidade de vida uma expresso amplamente utilizada no cotidiano,
sendo costumeiro ouvir-se falar acerca das mudanas nos estilos de vida, tudo com vistas e
em busca por um aumento de sua quantificao, multiplicando-se as propagandas dos mais
diversos produtos e servios na tentativa de conquistar o consumidor em prol da melhoria da
qualidade de vida (GIMENES, 2013).
18
Importa registrar que a qualidade de vida vem sendo discutida h longos anos, sendo
utilizada por diversas reas do conhecimento, apontado por alguns estudiosos que a mesma
perfilaria nas reas socioeconmica, psicolgica, mdica e geral, devendo-se interligar todas
estas, bem como o mbito cultural e humanstico de cada ser humano, para que ento se possa
averiguar a qualidade de vida e mensur-la de forma mais ntida, lmpida e clarividente
(DAY; JANKEN apud PEREIRA; TEXEIRA; SANTOS, 2012).
Do exposto, colhe-se que apesar de haver inmeras definies no existe uma
conceituao de qualidade de vida que seja amplamente aceita. Todavia, clarividente resta
que esta definio no inclui apenas fatores relacionados sade, como bem-estar fsico,
funcional, emocional e mental, mas tambm outros elementos importantes da vida das pessoas
como trabalho, famlia, amigos, e outras circunstncias do cotidiano, no podendo se
desperceber a viso pessoal de quem pretende se investigar (GILL; FEISNTEIN, 1994 apud
PEREIRA; TEIXEIRA; SANTOS, 2012).
A partir da dcada de 60 associou-se qualidade de vida a noo de sustentabilidade
do desenvolvimento humano alm de incorporar a questo da equidade na distribuio de
bens e direitos (SOUZA, 1984). E assim foram incorporados aspectos imateriais e intangveis
da vida humana, colocando-se como contraponto materialidade das avaliaes do
desenvolvimento at ento, restritas a indicadores econmicos (CARMO, 1993). Com o
aumento da discusso sobre conscincia ecolgica provocada pelo agravamento da
degradao ambiental urbana e vrios problemas ambientais globais, esse conceito tambm se
vinculou qualidade ambiental (GUIMARES, 2003).
Assim, como vertente surge o termo qualidade de vida urbana o qual tambm
abrange a qualidade de vida e qualidade ambiental e comea a fundamentar o objeto do
presente estudo.
Alguns estudos sobre as cidades como de Belo Horizonte e Curitiba foram
desenvolvidos pelo ndice de Qualidade de Vida Urbana (IQVU) e pelo ndice de
Vulnerabilidade Social (IVS) calculados a partir de indicadores georreferenciados (NAHAS,
2001).
Todavia, de todos os aspectos debatidos acerca de como se avalia a qualidade de vida
ou mesmo a qualidade de vida urbana, dificilmente as articulam como direito fundamental,
estando, apenas de forma intrnseca adstrita a outras reas.
Tratando acerca dos direitos fundamentais os mesmos realizam diversas funes
dentro da ordem jurdica, assegurando aos indivduos o direito de defesa frente a atuao
19
abusiva do prprio Estado, bem como podem assegurar ao indivduo o direito de participao
(PAULO; ALEXANDRINO, 2008).
Ainda, salienta-se, que a qualidade de vida apesar de toda a busca incessante por sua
conceituao e quantificao, destaca-se a ausncia de sua coligao com o princpio da
dignidade da pessoa humana e cidadania, princpios expressos na Carta Magna de 1988, os
quais apresentam-se como fundamentos da Repblica Federativa do Brasil e que so fontes
basilares do sistema jurdico ptrio.
Registre-se ainda, que a qualidade de vida se interliga particularmente aos direitos de
cidadania, a qual, conjuntamente com o princpio da dignidade da pessoa humana, constituem
alicerces da Repblica Federativa do Brasil, expressa, taxativamente, na Constituio Federal
de 1988.
Convm destacar ainda para o delineamento desse estudo, que a Constituio de
1988, fez a opo legislativa de incluir a dignidade da pessoa humana e a cidadania como
fundamentos da Repblica Federativa do Brasil, os quais foram inseridos expressamente no
artigo 1., sendo que se pode aperceber que o objetivo da Constituio brasileira foi fazer com
que a pessoa seja considerada fundamento e fim da sociedade apresentando-se, o Estado como
um meio e no um fim e que deve ter por funo, dentre outras, a preservao da dignidade do
ser humano (TAVARES, 2006).
O princpio fundamental da cidadania materializa-se tanto na ideia de capacidade
eleitoral ativa, ser eleitor e passiva ser eleito, como na previso de instrumentos de
participao do indivduo nos negcios do Estado, sendo que assim, a conceituao de
cidadania no fica adstrita apenas a direitos polticos, mas em uma viso muito mais
abrangente e que engloba, tambm, os direitos e deveres fundamentais (LENZA, 2013).
Desta feita, o projeto de pesquisa aqui apresentado visa investigar desdobramentos
da qualidade de vida urbana face aos princpios fundamentais da dignidade da pessoa humana,
da cidadania e alguns indicadores que facilitem a compreenso da vida da pessoa humana no
bairro Petrpolis, no Municpio de Lages/SC.
Assim, este estudo caracterizou-se apresentando o seguinte problema de pesquisa:
Como a qualidade de vida urbana est relacionada aos princpios fundamentais da dignidade
da pessoa humana e cidadania?
O objetivo geral do trabalho buscou compreender alguns indicadores de qualidade de
vida urbana e sua relao com os princpios fundamentais da dignidade da pessoa humana e
da cidadania e como objetivos especficos apresentou-se: discutir indicadores atinentes
qualidade de vida urbana; abordar os princpios fundamentais da dignidade da pessoa
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humana e cidadania e; investigar a qualidade de vida urbana de um bairro de periferia2 e sua
relao com os princpios fundamentais da dignidade da pessoa humana e cidadania.
Essa dissertao se desenvolveu junto a Linha de Pesquisa: Ambiente, Sade e
Sociedade do Programa de Ps-Graduao em Ambiente e Sade pela UNIPLAC. Ressalta-
se que as discusses aqui colocadas tambm retroalimentaram as reflexes do Grupo de
Estudo e Pesquisa em Educao, Sade e Qualidade de Vida (GEPESVIDA).
O presente trabalho est estruturado em trs captulos, tratando o primeiro da reviso
de literatura sobre o tema, o seguinte sobre os pressupostos metodolgicos e o terceiro
tratar sobre a discusso e os resultados.
2 O termo refere-se s zonas de uma cidade que esto em torno do centro histrico; os subrbios de uma cidade
ou, ainda, os municpios que circundam um ncleo metropolitano central (DICIONRIO INFORMAL).
21
CAPTULO I
REVISAO DA LITERATURA
QUALIDADE DE VIDA URBANA E SUA RELAO COM OS PRINCPIOS
FUNDAMENTAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E CIDADANIA
A reviso de literatura consiste em uma anlise e sntese das informaes constantes
em estudos com relevncia, publicados acerca de um determinado tema, com vistas a se
resumir o conhecimento construdo em torno da temtica e a se chegar a uma concluso sobre
referido assunto de interesse (MANCINI; SAMPAIO, 2006).
Serve para posicionar o leitor do trabalho e o prprio pesquisador acerca dos
avanos, retrocessos ou reas envoltas em penumbra. Fornece informaes para
contextualizar a extenso e significncia do problema que se maneja [...] (MOREIRA, 2004,
p. 23).
Desta forma, a reviso de literatura o meio pelo qual se procura, analisa e descreve-
se um tema, visando se dar uma resposta a um problema sugerido. Tem-se que a palavra
literatura engloba todo material escrito sobre o assunto estudado (UNESP, 2015), como
livros, artigos de peridicos, artigos de jornais, registros histricos, relatrios
governamentais [...] e outros tipos (UNESP, 2015, n.p.).
Neste norte, pode-se afirmar que a reviso de literatura corresponde a um tipo de
texto que agrupa e discute o conhecimento produzido sobre a rea de estudo, sendo que a
elaborao de um trabalho cientfico tem como ncleo os objetivos de pesquisa. Assim sendo,
os objetivos que acabam por determinar o caminho a ser percorrido pelo pesquisador, razo
pela qual, estando os mesmos delineados, necessrio se faz ter como base os avanos, bem
como as limitaes dos estudos, anteriormente elaborados sobre o tema (MOREIRA, 2004).
A reviso de literatura imprescindvel para a elaborao de um trabalho cientfico
(ECHER, 2001, p. 06).
Destarte, tendo por referncia os objetivos especficos da presente pesquisa, alhures
citados, na sequncia, apresenta-se uma reviso de literatura acerca do enredo da pesquisa,
sendo eles: qualidade de vida, qualidade de vida urbana e dos princpios fundamentais da
cidadania e da dignidade da pessoa humana insertos na Constituio da Repblica Federativa
do Brasil de 1988.
22
1.1 Qualidade de vida
A conceituao de qualidade de vida diferente de ser humano para ser humano e
com o passar da vida de cada um, tende a se modificar, existindo, entretanto, consenso que
so variados e inmeros os fatores que determinam a qualidade de vida de uma pessoa ou
comunidade (NAHAS, 2010).
Qualidade de vida uma expresso usada cotidianamente (GIMENES, 2013), mas
tem-se que a preocupao com o estilo de vida h muito se discute, surgindo com Scrates por
volta do ano 400 a.C. (ANDUJAR apud PEDROSO; PILATTI, 2010).
Assim, tem-se que a preocupao com a qualidade de vida tornou-se crescente nas
ltimas dcadas (PEDROSO; PILATTI, 2010) apresentando-se no sentido mais amplo, de no
apenas se verificar a diminuio da mortalidade ou o aumento da expectativa de vida
(ALMEIDA; GUTIERREZ, s.d.).
Todavia, tem-se que efetivamente, a expresso em comento, foi utilizada pela
primeira vez pelo Presidente dos Estados Unidos poca, Lyndon Johnson, em 1964 (FLECK
et al., 1999), ocasio em que afirmou que os objetivos no podem ser medidos atravs do
balano dos bancos. Eles s podem ser medidos atravs da qualidade de vida que
proporcionam s pessoas (FLECK et al., 1999, p. 20).
(...) Presidente do Estados Unidos na ocasio, este afirma, que os objetivos de uma
nao no podem ser mensurados atravs do balano bancrio, mas sim, da
qualidade de vida proporcionada s pessoas (FLECK et al., 1999). Desde ento,
pesquisadores das mais variadas reas de conhecimento tem concentrado seus
estudos nessa rea (PEDROSO; PILATTI, 2010, p. 1).
Tem-se que uma das maiores conquistas da humanidade, na atualidade o
prolongamento da vida do ser humano, entretanto, este aumento no se divide de forma
isonmica nos diversos pases e blocos socioeconmicos (LIMA-COSTA; VERAS, 2003),
razo pela qual viver mais no satisfaz aos desejos do ser humano se este no puder usufruir,
com qualidade, tal acrscimo de perspectiva de vida (FLECK et al. apud PEREIRA;
ALVAREZ; TRAEBERT, 2011).
Assim, o assunto qualidade de vida um dos temas mais difundidos e debatidos na
atualidade, sendo que na imprensa leiga e em vrias situaes de propagandas relacionada a
produtos e servios em que se promete a melhoria da qualidade de vida, bem como em
publicaes cientficas, frequentemente, se verifica meno avaliao da qualidade de vida
(MONTEIRO et al., 2010).
23
muito comum ouvir pessoas comentando sobre mudanas em seus estilos de vida
na busca por um aumento de sua qualidade de vida. Proliferam as propagandas dos
mais diversos produtos que tentam seduzir seus consumidores com a promessa de
aprimoramento da qualidade de vida. Diversas profisses relacionadas sade se
especializaram, atualmente, na busca pela qualidade de vida de seus clientes (...)
(GIMENES, 2013, p. 292).
O aumento da expectativa de vida tem crescido nas ltimas dcadas, razo pela qual
a qualidade de vida transformou-se numa busca contnua, ultrapassando os aspectos sociais,
culturais, econmicos e at mesmo a prpria cronologia de vida do ser humano (PEREIRA;
ALVAREZ; TRAEBERT, 2011).
Pode-se observar que a qualidade de vida conquistou contemporaneamente uma
hegemonia discursiva tanto na linguagem tcnica quanto na linguagem cotidiana
(GIMENES, 2013, p. 292), sendo que (...) um construto multidimensional e subjetivo, de
difcil definio e sistematizao, o que torna complexa sua operacionalizao (PUCCI et al.,
2012, p. 167).
No tocante a conceituao do termo qualidade de vida diversos estudos no Brasil e
ao redor dele debatem acerca de tal delimitao, por vezes confundindo com estilo, condies
e situaes de vida, bem como discutindo-se acerca dos instrumentos de avaliao mais
pertinentes (PIMENTA et al., 2008) e apesar ou justamente em decorrncia de sua ampla
disperso discursiva, o termo qualidade de vida apresenta grande indeterminao em seu
significado (GIMENES, 2013, p. 292).
Nestes termos tem-se que a construo do conceito de qualidade de vida visionada
como uma formulao complexa, com diferentes hermenuticas e com aplicao em vrias
disciplinas, sendo o seu uso interdisciplinar, talvez, um dos aspectos que levam a falta de
consenso acerca de sua delimitao conceitual (PASKULIN et al., 2010).
Tem-se assim que a definio, no uso cotidiano, apresenta-se tanto de forma global
enfatizando a satisfao geral com a vida, como focando componentes especficos prximos
ao conceito geral (ALMEIDA; GUTIERREZ, s.d., p. 151).
Deve-se observar que a qualidade de vida um construto de difcil definio e
mensurao, tendo em vista que diversas variantes como aspectos culturais, ticos, religiosos
e pessoais influenciam a sua percepo e suas consequncias (PASKULIN et al., 2010).
Apesar das intensas discusses sobre o assunto, a definio de qualidade de vida
ainda no uniforme (PIMENTA et al., 2008, p. 55), no havendo um consenso sobre o que
se constitui e na tentativa de uma conceituao, perpassa por uma variante de domnios, como
meio-ambiente, recursos econmicos, relacionamentos, tempo para o trabalho e lazer, se
24
identificando duas vertentes na conceituao de qualidade de vida: um conceito genrico e
outro interligado sade (CAMPOS; RODRIGUES NETO, 2008).
Todavia, em que pese as diversas definies para a terminologia qualidade de vida,
existe consenso entre os estudiosos do tema que para se fazer a sua avaliao, imperioso que
se faa uma anlise multidimensional e, mesmo que no haja concordncia acerca das
dimenses que constroem tal conceito de qualidade de vida, as que so citadas
frequentemente so a fsica, a psicolgica, a social e a espiritual (PASKULIN et al., 2010).
Nestes termos indubitvel o seguinte questionamento: Mas afinal o que
qualidade de vida? (MONTEIRO et. al., 2010, p. 568).
Qualidade de vida uma noo eminentemente humana, que tem sido aproximada
ao grau de satisfao encontrado na vida familiar, amorosa, social e ambiental e prpria
esttica existencial (MINAYO; HARTZ; BUSS, 2000, p. 8).
O tema em apreo pode ser conceitualmente definido com viso do agente sobre sua
posio de vida no mbito social e cultural, considerando seus anseios, expectativas, padres
e preocupaes, estando, assim, relacionada com o bem-estar pessoal, englobando aspectos
diversos como o estado de sade, lazer, satisfao pessoal, hbitos e estilo de vida (PUCCI et
al., 2012).
Desta forma, a temtica em comento insere desde fatores relacionados sade, como
questes relativas ao bem-estar fsico, funcional, emocional e mental, abrangendo inclusive
outros aspectos essenciais da vida do ser humano como trabalho, famlia, amigos e outras
reas do dia-a-dia (ALMEIDA; GUTIERREZ, s.d.).
Observa-se ainda, que o termo qualidade de vida apresenta uma face de
subjetividade, tendo em vista que a mesma pode ser visionada como a percepo da pessoa
acerca do seu estado de sade, bem como sobre aspectos no interligados questo mdica,
mas relativas ao seu contexto de vida, ou seja, como o cidado mensura sua situao
particular em cada uma das esferas relacionadas qualidade de vida (SEIDL; ZANNON,
2004, p. 582), perfilando sua delimitao conceitual na seara de questes subjetivas e
objetivas (MONTEIRO et al., 2010).
A qualidade de vida se estabelece tambm a partir de parmetros objetivos e
subjetivos. Os parmetros subjetivos seriam o bem-estar, a felicidade e realizao
pessoal, entre outros, e os objetivos estariam relacionados satisfao das
necessidades bsicas e daquelas criadas em uma dada estrutura social. Os
parmetros objetivos tem a vantagem de no estarem sujeitos ao vis do observador,
enquanto os subjetivos possibilitam que as pessoas emitam juzos sobre temas que
envolvem suas vidas (PASKULIN et al., 2010, p. 102).
25
Registre-se que alguns estudos inserem tambm como elemento integrante da
definio de qualidade de vida a relao entre espiritualidade e religiosidade, fazendo com
que alguns estudiosos demonstrem essa associao de modo positivo no sentido de bem-estar,
satisfao, estabilidade no casamento e, outros observam o carter negativo desta
religiosidade associando-a com ansiedade, depresso, suicdio e comportamentos de risco
(PANZINI et al., 2011).
Ainda, tem-se que a temtica qualidade de vida abrange muitas significaes, que
refletem conhecimentos, experincias e valores de indivduos e coletividades que a ele se
reportam nos mais variados perodos e momentos histricos, sendo assim uma construo
social (MINAYO; HARTZ; BUSS, 2000) e devido a sua complexidade e utilizao
interdisciplinar a falta de consenso em relao a sua delimitao conceitual torna-se profunda
(FARQHAR apud PEREIRA; TEIXEIRA; SANTOS, 2012).
Desta feita as definies acerca da conceituao da qualidade de vida aparecem na
doutrina especfica de forma global, salientando a questo da satisfao geral com a vida, bem
como dividida em componentes que, na totalidade, indicariam uma aproximao do conceito
geral (FARQHAR apud PEREIRA; TEIXEIRA; SANTOS, 2012).
Tem-se ainda que a popularizao do termo qualidade de vida foi a gnese para as
ramificaes de sua abordagem, surgindo biparties que mantem as caractersticas gerais da
qualidade de vida, mas outras recaem em reas especficas, sendo as principais as
relacionadas sade e a qualidade de vida no trabalho (PEDROSO; PILATTI, 2010).
A terminologia qualidade de vida inclui em sua composio valores imateriais, como
amor, liberdade, solidariedade, insero social, realizao pessoal e felicidade (MINAYO;
HARTZ; BUSS, 2000), pois referidos aspectos, os quais expressam sentimento e valores
complexos de serem compreendidos, no podem ser questionados quanto sua relevncia
(ALMEIDA; GUTIERREZ, s.d.).
considerada como a percepo do indivduo de sua posio na vida no contexto
da cultura e sistema de valores nos quais vive e em relao aos seus objetivos, expectativas,
padres e preocupaes (WHOQOL apud PEREIRA; TEIXEIRA; SANTOS, 2012, p. 241).
Na delimitao efetuada pela Organizao Mundial da Sade (OMS) a qualidade de
vida est assim delineada: (...) a percepo do indivduo sobre a sua posio na vida, no
contexto da cultura e dos sistemas de valores nos quais ele vive, e em relao a seus objetivos,
expectativas, padres e preocupaes (WHOQOL GROUP apud FLECK et al., 1999, p. 20).
Neste condo o grupo World Health Organization Quality of Life Assessment
delimitou qualidade de vida baseando-se na percepo do indivduo sobre sua posio na
26
vida, podendo-se observar que nesta conceituao adotada pela OMS encontra-se a
preocupao com o aspecto subjetivo da qualidade de vida, relacionando tambm questes
individuais aos contextos cultural, social e ambiental em que o indivduo est inserido
(PASKULIN et al., 2010).
Ainda se visiona que a noo de qualidade de vida encontra-se inserida num campo
semntico polissmico, estando de um lado interligada a modos, condies e estilos de vida
(CASTELLANOS apud MINAYO; HARTZ; BUSS, 2000) e de outro insere ideias de
desenvolvimento sustentvel e ecologia humana, relacionando-se tambm a face democrtica,
do desenvolvimento e dos direitos humanos e sociais (MINAYO; HARTZ; BUSS, 2000).
Em conformidade com Day e Jankey apud Pereira, Teixeira e Santos (2012),
classifica-se a qualidade de vida com vistas em quatro abordagens, sendo ela a econmica,
psicolgica, biomdica e geral ou holstica.
Nestes termos, em suma, tem-se que na primeira vertente a econmica os indicadores
sociais so o primeiro elemento, sendo que a percepo psicolgica interage com os fatores
que tratam das relaes subjetivas de um indivduo s suas vivncias. No concernente a
abordagem mdica esta leva em conta o aspecto de se oferecer melhorias nas condies de
vida dos enfermos, encerrando-se com as abordagens de carter geral ou holstico as quais se
sustentam na premissa segundo a qual a qualidade de vida multidimensional, ou seja, varia
de indivduo para indivduo de acordo com sua realidade (DAY; JANKEY apud PEREIRA;
TEIXEIRA; SANTOS, 2012).
Destarte, quanto mais aprimorada a democracia, mais ampla a noo de qualidade
de vida, o grau de bem-estar da sociedade e de igual acesso a bens materiais e culturais
(MATOS apud MINAYO; HARTZ; BUSS, 2000, p. 08).
Diante da complexidade da temtica instrumentos diferentes devem ser utilizados
para a avaliao da qualidade de vida e do estado de sade (PIMENTA et. al., 2008, p. 55).
Nestes moldes, com vistas a diminuio em torno da complexidade do termo
qualidade de vida e de sua relatividade em face das variadas culturas e realidades sociais,
vrios instrumentos tem sido construdos (MINAYO; HARTZ; BUSS, 2000).
Assim, inmeras so as formas de avaliao da qualidade de vida no havendo
medidas como padro-ouro (FARQHAR apud PEREIRA; TEIXEIRA; SANTOS, 2012, p.
246), sendo um dos aspectos mais importantes nos diversos usos discursivos da expresso
qualidade de vida a existncia de diversos instrumentos que se propem-se a medi-la
(GIMENES, 2013, p. 309).
27
Desta forma, diversas so as formas de avaliao da qualidade de vida no havendo
anlises pontuais que expressam o estado da arte, havendo alguns instrumentos capazes se
serem trocados pela simples avaliao de cada pessoa sobre seu estado na vida e, alguns
outros acabam sendo utilizados, diante da ausncia de clarividncia acerca do conceito da
temtica em apreo (ALMEIDA; GUTIERREZ, s.d.).
Neste condo a sistematizao da qualidade de vida pode ser visionada por sua
avaliao e variados instrumentos foram criados com o propsito para avaliar diferentes
povos, sendo a maioria criada em pases de alta renda e adaptados para outras realidades
(PUCCI et. al., 2012).
Importa ressaltar que os primeiros instrumentos de mensurao da qualidade de vida
nasceram na dcada de 70 aonde a maioria dos referidos meios de avaliao consistiam na
medida de sentimentos, autovalorizao ou condutas, por intermdio de entrevistas e
questionrios e, a partir da dcada de 80, houve uma majorao na edificao de instrumentos
de avaliao, sendo que podem ser genricos, quando tratam de uma imensa gama de
dimenses que constituem a qualidade de vida ou especficos, quando se concentram em
apenas um aspecto em particular (BELASCO; SESSO apud PEDROSO; PILATTI, 2010).
Ainda se registre que os instrumentos para avaliao da qualidade de vida
normalmente so tradues que apresentam falhas ao serem aplicados em culturas diferentes
e, por esta razo, h a necessidade de valid-los novamente (...) (ALMEIDA; GUTIERREZ,
s.d., p. 155).
Nesta perspectiva a OMS desenvolveu um instrumento para mensurar a qualidade de
vida, o qual foi nomeado de WHOQOL-100 que em sua formulao contou com a
participao de 15 centros de diferentes pases, numa viso, assim, transcultural e,
recentemente desenvolveu o mdulo WHOQOL-OLD que a partir do instrumento citado
anteriormente e seguindo a mesma ttica metodolgica realiza uma avaliao especfica para
idosos (PASKULIN et al., 2010).
O WHOQOL foi desenvolvido pelo grupo chamado World Health Organization
Quality of Life, foi traduzido e validado para o Brasil por um grupo de
pesquisadores na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e tem por objetivos
avaliar a qualidade de vida geral das pessoas em diferentes culturas (ALMEIDA;
GUTIERREZ, s.d., p. 156).
Tambm insta mencionar que o ndice de Desenvolvimento Humano (IDH) uma
das formas mais tradicionais de se avaliar qualidade de vida em grandes populaes
(PEREIRA; TEIXEIRA; SANTOS, 2012, p. 246).
28
O IDH foi desenvolvido pelo Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento
(PNUD) e elaborado com o propsito de discusso sobre desenvolvimento de questes de
cunho eminentemente econmico, como nvel de renda, produto interno bruto e nvel de
emprego, bem como para aspectos sociais e culturais (MINAYO; HARTZ; BUSS, 2000).
Em relao a avaliao da qualidade de vida existem outros instrumentos como
Sickness Impact Prolife (SIP), Nottingham Health Prolife (NHP), McMaster Health Index
Questionnaire (MHIQ), Rand Health Insurance Study (Rand HIS), The Medical Outcomes
Study 36-Item Short Form Health Survey (SF-36) (...), entre outros (CAMPOS;
RODRIGUES NETO, 2008, p. 235).
(...) Os instrumentos variam de acordo com a abordagem e objetivos do estudo.
Instrumentos especficos como o Medical Outcomes Study Questionaire 36-Item
Short Form Health Survey (SF-36) para avaliao da qualidade de vida relacionada
sade e do WHOQOL para avaliao da qualidade de vida geral so tentativas de
padronizao das medidas permitindo comparao entre estudos e culturas.
Publicaes sobre novos instrumentos de avaliao especficos para populaes ou
pessoas acometidas por quadros patolgicos especficos so crescentes na literatura
especializada (ALMEIDA; GUTIERREZ, s.d., p. 155).
Alm disso, ressalta-se que as metodologias de mensurao da qualidade de vida
podem operar-se tanto no carter qualitativo como quantitativo, sendo que no primeiro
mtodo so usadas tcnicas de biografias ou histrias de vida com o fim de se manter afastada
respostas no originais e no caso dos estudos quantitativos os mesmos so construdos no
aspecto multidimensional (PIMENTA et al., 2008).
Destarte, referidos instrumentos de avaliao so capazes de mensurar de forma
individual e especfica algumas questes interligadas a qualidade de vida, possibilitando
maior capacidade de verificao de melhora ou no do referido tema em estudo, sendo que
sua principal propriedade especfica a sensibilidade de mensurar as modificaes em
decorrncia da histria natural ou aps determinada interveno, podendo, ainda, serem
especficos para uma determinada populao, enfermidade ou situao (CAMPOS;
RODRIGUES NETO, 2008).
Delineados os pressupostos tericos do conceito de qualidade de vida e os
instrumentos de sua mensurao, bem como as imprecises em torno do tema, passa-se a
anlise de uma de suas ramificaes: qualidade de vida de urbana.
29
1.1.1 Qualidade de vida urbana
No final do sculo passado, diversos pases da Amrica Latina, incluindo o Brasil,
tiveram o agravamento de vrios problemas urbanos, em face do crescimento desordenado e
rpido de suas cidades, levando, por consequncia ao comprometimento da qualidade de vida
urbana (MORAES; CANAS; CAMBRAIA, 2014).
Assim, a preocupao com a qualidade de vida urbana ganhou o debate poltico e
cientfico a partir dcada de 70, tendo em vista o desordenado crescimento das cidades,
aumento da desigualdade na distribuio de bens e servios, das condies de vida da
populao e ainda pela degradao ambiental (NAHAS et al., s.d.).
Registre-se que entre a dcada de 70 e 80 o debate sobre a temtica qualidade de vida
urbana foi tomando forma, impulsionada pelo processo de expanso das cidades em mbito
mundial, em especial nos pases em desenvolvimento, sendo que o emprego da referida
expresso em destaque o resultado do enfoque nas consequncias do desenvolvimento das
cidades e seus problemas socioambientais surgindo a discusso do conceito entre os termos
qualidade de vida e qualidade ambiental (NAHAS et al., s.d.).
Ressalta-se que a qualidade ambiental e a qualidade de vida so terminologias de
difcil definio, sendo que se indaga qual o critrio utilizado para se definir uma positiva
qualidade de vida ou ambiental, aonde muitas vezes a qualidade de um ambiente fsico pode
ser avaliada como boa em atendimento a normas estabelecidas, mas os elementos em razo da
ordem social podem ser negativos ao grupo de pessoas as quais esto inseridas naquele
referido ambiente visto como positivo (MAZETTO, 2000).
No final nos anos 80 e iniciando-se a dcada seguinte torna-se mais grave a situao
social, em especial nos pases em desenvolvimento com o aumento da criminalidade, excluso
social e pobreza, problemas em habitao, transporte, infra-estrutura urbana, acesso servios
e degradao ambiental. Nesse ambiente a gnese da qualidade de vida urbana se solidifica e
gradualmente vai se expressando e aparecendo nos indicadores sociais elaborados (NAHAS et
al., s.d.).
No tocante a conceituao da terminologia qualidade de vida urbana o mesmo vem
sendo arquitetado a partir de outros conceitos como bem-estar social, qualidade de vida,
qualidade ambiental, pobreza, desigualdades sociais, excluso social, vulnerabilidade social,
desenvolvimento sustentvel e sustentabilidade, estando assim, sua histria interligada
histria dos indicadores construdos com base nestas abordagens (NAHAS et al., s.d.).
30
Deve-se levar em conta tambm, a populao a qual partcipe de um conjunto de
estratgias que objetivam enfrentar situaes presentes e futuras, sendo que em qualquer
momento em que se encontrar a situao um estado dinmico em que so assumidos
compromissos entre indivduos e grupos, incluindo-se a qualidade de vida, a qual, em seu
mago, pode ser definida pela satisfao em viver (FORATTINI, 1991).
Tem-se que os problemas ambientais no esto adstritos apenas aos reflexos da ao
do homem na natureza, colocando em risco sua prpria existncia enquanto espcime, estando
interligados tambm pelo espao edificado pelo homem, nesse mundo artificial sobre a
superfcie da Terra, representado especialmente pelas cidades, lugares em que as questes
sociais e no apenas os fatores fsicos atuam de forma decisiva na qualidade de vida humana
(MAZETTO, 2000).
(...) A cidade define-se em funo das necessidades reais de seus habitantes e no
mais em termos de funes (ROCHA et al., 2000, p. 65) sendo que a cidade pode ser
definida como uma estrutura geogrfica em que se vive e trabalha, bem como pode ser
entendida como uma entidade administrativa ou uma estrutura social e comunitria,
interagindo variados sistemas em que se busca um equilbrio urbano em meio a conflitos de
poder e de relaes (DUHL apud WESTPHAL, 2000).
A Geografia se apresenta como uma das cincias ocupadas com o estudo da questo
ambiental, principalmente os fatores que atingem diretamente a qualidade de vida do
homem, como salienta Ajara: Ao aproximar a noo de meio ambiente ao prprio
conceito de espao geogrfico, estar-se- no apenas superando as dicotomias,
frequentemente postas em anlises ambientais, entre ecologia/economia,
sociedade/natureza, meio fsico-bitico/organizao scio-econmicas, como
tambm atrelando questo ambiental o dinamismo prprio ao contnuo momento
de criao/(re)criao de espaos (AJARA apud MAZETTO, 2000, p. 21-22).
Ainda pode-se afirmar que o ambiente urbano apresenta as seguintes caractersticas:
(...) afastamento e ausncia de contato com o meio natural; concentrao e elevada densidade
populacional em espao limitado e predominncia de atividade industrial e de prestao de
servio (FORATTINI, 1991, p. 77).
Interligado ao conceito de planejamento das cidades encontra-se o conceito de
qualidade de vida, o qual, conforme j se mencionou de extrema subjetividade, pois depende
do nvel de satisfao dos indivduos, decorrente de um conjunto de fatores, variando assim,
de pessoa para pessoa, bem como de lugar para lugar, eis que o modo de vida, os recursos, as
circunstncias de trabalho esto intimamente ligadas as condies de sade, sendo portanto, a
a qualidade de vida um conceito de diferentes significaes remetendo todo este conjunto de
31
situaes para a importncia do espao e do contexto socioespacial, como variveis tambm
responsveis pela qualidade de vida, quer seja ela meio rural, mas especialmente, no meio
urbano (TORRES et al., 2013).
Ainda de se mencionar que a qualidade de vida urbana no carter coletivo
determinada pela estrutura social, a qual resultante das condies do meio que se desenvolve
esta sociedade, sendo que so diversos os indicadores destinados sua avaliao
(FORATTINI, 1991) e (...) que mesmo para os elementos fsicos do ambiente, no tarefa
fcil estabelecer padres de qualidade ambiental (MAZETTO, 2000, p. 23).
Importa afirmar ainda, que a anlise dos diferenciais intra-urbanos solidifica uma
ao de avaliao sistemtica da qualidade de vida no meio urbano, com vistas a um maior
aprofundamento das vertentes de aes fundamentais j usadas no desenvolvimento das
cidades, sendo um que cria e organiza a parte estrutural para que ela tenha um bom
funcionamento e outro com vistas a dar, a cada habitante, acesso a uma vida com qualidade
(ROCHA et al., 2000).
A Organizao Mundial da Sade (OMS) lanou o projeto Cidades Saudveis para
incentivar ao nvel local o planejamento de aes para a promoo da sade das populaes e
da sustentabilidade das cidades (TORRES et al., 2013, p. 95), podendo-se conceituar cidades
saudveis como sendo (...) o nome que se d a um projeto de desenvolvimento social, que
tem a sade e suas mltiplas determinaes como centro de atenes (WESTPHAL, 2000, p.
42).
A importncia que a sade e a qualidade de vida assumem na sociedade atual, face
s mudanas que se tem verificado nas ltimas dcadas, nomeadamente no que se
refere aos estilos de vida e ateno que hoje dada aos tempos livres e ao lazer,
bem como procura do equilbrio psquico e social, levou a que a manifestao do
interesse no desenvolvimento de uma poltica que refletisse estas preocupaes ao
nvel da governao local se materializasse na adeso do MVC, em 1997, ao
movimento das Cidades Saudveis da OMS (TORRES et al., 2013, p. 97).
Em razo da evoluo do conceito de qualidade de vida urbana, pode-se afirmar que
a mesma requer, na atualidade, a insero de trs elementos fundamentais, quais sejam, a
equidade no acesso da populao em relao a bens e recursos urbanos, sendo o segundo
elemento a qualidade ambiental relacionada ao meio urbano e pr fim a produo de
elementos para o debate acerca da sustentabilidade do desenvolvimento humano (NAHAS et
al., s.d.).
(...) Para alcanar a sustentabilidade do planeta e propiciar a governana e a
transparncia, devemos reduzir a defasagem de conhecimentos sobre as aes locais, por um
32
lado, e por outro, seus efeitos mundiais sendo esta a meta de um programa destinado a
promover o Entendimento Global (UNESCO, 2016, n.p.).
O conceito de desenvolvimento sustentvel tem sido bastante discutido e utilizado
com enfoques muito diferentes, inclusive, com o intuito de ratificar posies,
poltico-ideolgicas que defendem os interesses capitalistas (...) com todas as
desigualdades e com o injusto processo de excluso crescente que a caracteriza
(PELICIONI, 1998, p. 25).
A expresso ganha repercusso poltica adjetivando-se o termo desenvolvimento, o
qual decorrente da percepo de uma crise ambiental em mbito mundial, que percorreu um
longo caminho at o momento atual, cuja origem remonta a dcada de 1950, quando, pela
primeira vez, a humanidade visiona a existncia de um risco ambiental global: a poluio
nuclear (NASCIMENTO, 2012).
Registre-se ainda que a terminologia desenvolvimento sustentvel carrega consigo
um conjunto de paradigmas, sendo utilizado em 1987 no Relatrio Brundtland da
Organizao das Naes Unidas (TORRESI; PARDINI; FERREIRA, 2010).
O termo ambientalismo ingressa nos anos 90 constituindo-se como um ator
relevante, que embora carregue consigo as marcas do seu processo de afirmao, assume
carter ampliado, baseado num esforo cada vez mais claramente planejado de dilogo com
outros atores sociais (JACOBI, 2006, p. 201).
O relatrio acima citado estabeleceu que desenvolvimento sustentvel o
desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das
geraes futuras satisfazerem as suas prprias necessidades (TORRESI; PARDINI;
FERREIRA, 2010, n.p.).
Desta forma o planeta est chegando num ponto cada vez mais crtico, observando-
se que no pode ser mantida a lgica prevalecente de aumento constante do consumo. J se
verificam os seus impactos no plano ecolgico global (JACOBI, 2006, p. 183).
Assim, a percepo de que a sustentabilidade est em torno apenas da emisso de
gases para a atmosfera est equivocada, tendo em vista que este um dos principais
problemas, mas no o nico, sendo esta a discusso acerca da temtica ocorrida em dezembro
de 2009 em Copenhague (COP-15) (TORRESI; PARDINI; FERREIRA, 2010).
Importa mencionar que as dimenses do desenvolvimento sustentvel so trs, a
econmica, a ambiental e a social (NASCIMENTO, 2012) e que a conservao do meio
ambiente deve estar inserida em uma poltica de desenvolvimento do pas, mas importante
33
enfatizar que ela no pode ser apenas de uma pessoa ou um governo. O meio ambiente deve
ser um cuidado de todos com tudo (TORRESI; PARDINI; FERREIRA, 2010, n.p.).
Assim, com base nos estudos sobre as cidades foram desenvolvidos o IQVU e o IVS
calculados a partir de indicadores georreferenciados (NAHAS, 2001).
Nesta vertente tem-se que a questo do planejamento urbano apresenta vrias faces,
com o fim de se atender a diversos propsitos, sendo que com base na proposta de cidades
saudveis apresentada pela OMS, a compreenso de um planejamento urbano deve possuir
como principiologia aes entre vrios setores, gesto participativa da populao, eis que
planejar o espao urbano tomar decises baseadas na realidade, bem como uma poltica
que almeja a melhora da qualidade de vida dos habitantes, razo pela qual a importncia
popular (MORAES; CANAS; CAMBRAIA, 2014).
Dessa forma, verifica-se a grande busca pelos pesquisadores atuais acerca da
conceituao, mensurao e de indicadores capazes de possibilitar a definio da qualidade de
vida, em especial, aqui neste estudo, da qualidade de vida urbana, o que se discutir nesta
dissertao, em momento oportuno.
1.2 Dos princpios fundamentais da Repblica Federativa do Brasil
Princpios gerais so aquelas premissas sobre as quais se apoiam as cincias
(GONALVES, 2015a, p. 95, grifos no original), espcie normativa. Trata-se de norma
que estabelece um fim a ser atingido (DIDIER JR., 2016, p. 49), razo pela qual se (...)
fixou preceitos fundamentais que do forma e carter aos sistemas processuais os princpios
(AMENDOEIRA JR., 2012, p. 71).
Registre-se que a palavra princpio apresenta inmeros significados, sendo
exemplos os seguintes: a) origem, comeo; b) fundamento, razo, causa primria, base; c)
local em que algo tem origem; d) doutrinas fundamentais ou opinies predominantes
(COELHO, 2016, p. 92), sendo que o conhecimento cientfico no prescinde de sua
existncia e exige que os estudiosos os respeitem e obedeam (GONALVES, 2015b, p.
91).
Conforme Furlan et al., (2007, p. 77) o art. 1., III da Constituio Federal erigiu a
dignidade da pessoa humana como princpio fundamental. Impe-se, agora, que se precise
qual o significado de princpio fundamental: (...) princpios constitucionais que explicitam
as valoraes polticas fundamentais do legislador constituinte (CANOTILHO apud
FURLAN et al., 2007, p. 77).
34
Ressalte-se que na Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988, seu
artigo 1. deixou explcito o regime republicado, da espcie federalista e enumerou os
denominados chamados fundamentos do Estado brasileiro: soberania, cidadania, dignidade
da pessoa humana, valores sociais do livre trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo
poltico (ARAUJO; NUNES JNIOR, 2009, grifou-se).
Desta forma, a Magna Carta, Ttulo I, composto de quatro artigos os quais cuidam
dos princpios fundamentais do Estado brasileiro, sendo que esta expresso, princpios
fundamentais, so assim tratados pelo legislador nos primeiros artigos do cnone
constitucional para de imediato estabelecer a forma de Estado e governo, regime poltico
democrtico calcado na soberania popular, bem como a separao de funes entre os
poderes, os valores e os fins gerais do ordenamento constitucional (PAULO;
ALEXANDRINO, 2008).
Considerando os escopos sociais e polticos do processo e do direito em geral, alm
de seu compromisso com a moral e a tica, atribui-se extraordinria relevncia a
certos princpios que no se prendem tcnica ou dogmtica jurdicas, mas trazem
em si serssimas conotaes ticas, sociais e polticas e valem como algo externo ao
sistema processual, servindo-lhe de sustentculo legitimador (CINTRA;
GRINOVER; DINAMARCO, 2015, p. 74).
(...) Princpio causa primeira e inicial, fundamento mesmo do conhecimento
humano (SILVA NETO, 2013, p. 299), (...) so normas que fornecem coerncia e ordem a
um conjunto de elementos, sistematizando-o (WAMBIER; ALMEIDA; TALAMINI, 2003,
p. 69) e deriva do latim principium trazendo consigo a ideia de origem, comeo, base, ponto
de partida, razo pela qual, os princpios fundamentais se encontram no incio da Constituio
da Repblica Federativa do Brasil de 1988, mais especificamente no Ttulo I, entre os artigos
1. e 4. (LENZA, 2015).
Analisando os princpios insculpidos na Constituio Federal de 1988, enfatiza
Bastos (2001, p. 161):
Em resumo, so os princpios constitucionais aqueles valores albergados pelo Texto
Maior a fim de dar sistematizao ao documento constitucional, de servir como
critrio de interpretao e finalmente, o que mais importante, espraiar os seus
valores, pulveriz-los sobre todo o mundo jurdico. Os princpios constitucionais so
aqueles que guardam os valores fundamentais da ordem jurdica. Isso s possvel
na medida em que estes no objetivam regular situaes especficas, mas sim
desejam lanar a sua fora sobre todo o mundo jurdico. Alcanam os princpios essa
meta proporo que perdem o seu carter de preciso de contedo, isto ,
conforme vo perdendo densidade semntica, eles ascendem a uma posio que lhes
permite sobressair, pairando sobre uma rea muito ampla do que uma norma
estabelecedora de preceitos. Portanto, o que o princpio perde em carga normativa
35
ganha como fora valorativa a espraiar-se por cima de um sem-nmero de outras
normas.
A doutrina defende que os princpios constitucionais podem encontrar-se
positivados ou no-positivados no Texto Supremo, sendo, ainda, informadores da ordem
poltica ou jurdica (HOLTHE, 2009, p. 79).
Assim, a magnitude dada na contemporaneidade aos princpios a marca da
revoluo dentro da teoria constitucional, enterrando definitivamente um Estado de Direito
fundamentado exclusivamente em uma produo jurdica advinda do Poder Legislativo, de
mbito apenas positivista para dar abertura a um direito principiolgico, sedimentado nos
princpios constitucionais, os quais possuem como uma das funes minorar a distncia entre
a norma e a Justia (AGRA, 2012).
Nestes termos, conforme alhures citado, tem-se que o artigo 1. da Constituio de
1988, estabeleceu a forma do Estado brasileiro, federao, a forma de seu governo, repblica,
o regime de governo, a democracia participativa estabelecida na soberania popular e
enumerou tambm em quatro incisos os valores maiores que norteiam o Estado brasileiro,
denominando-os de fundamentos da Repblica Federativa do Brasil para que tal expresso
transmita a ideia de que estes servem como alicerces da ordenao poltico-jurdica da nao
brasileira (PAULO; ALEXANDRINO, 2008).
Registre-se assim, que referido artigo, incisos I a V, enumeram os fundamentos da
Repblica Federativa do Brasil, os quais so a soberania, cidadania, dignidade da pessoa
humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e pluralismo poltico (LENZA, 2012).
Desta feita visiona-se que na abertura do texto constitucional de 1988 o constituinte
destacou os denominados princpios fundamentais, ou em conformidade com Canotilho
tratam-se dos princpios estruturantes da Constituio, sendo referidos princpios responsveis
pela organizao da ordem poltica do Estado brasileiro, no se tratando de diretrizes, mas sim
de normas jurdicas, as quais so dotadas de vinculao aos rgos encarregados pela
atividade de aplicao e criao do direito (FERNANDES, 2011).
Do exposto, colhe-se que a expresso fundamental, resultante desta busca de
interligao com a qualidade de vida, a mesma revela a essencialidade dos direitos sem os
quais o homem no conviveria, viveria ou sobreviveria (VASCONCELOS, 2011).
Importa ressaltar que no trabalho em apreo, cuidar-se- da anlise dos princpios da
dignidade da pessoa humana e da cidadania, os quais sero analisados na sequncia.
36
1.2.1 Da dignidade da pessoa humana
Destaca-se dentre os princpios fundamentais do Estado brasileiro, insculpidos no
artigo 1. da Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988, a dignidade da pessoa
humana, de valor jurdico de maior hierarquia axiolgica dentro do ordenamento
constitucional, ao lado, apenas, do direito vida (HOLTHE, 2009).
Registre-se por oportuno, que o tema em apreo, dignidade da pessoa humana,
desde longa data assunto de dilogos filosficos, jurdicos e religiosos, no sendo, portanto,
um assunto recente, apenas da ps-modernidade (FURLAN et. al., 2007).
A etimologia da palavra provm do latim dignitas, significando tudo aquilo que
merece respeito, considerao, estima. Na antiguidade (...) estava ligado ao mrito, que
poderia ser aferido pelo dinheiro, ttulo de nobreza, capacidade intelectual, etc (AGRA,
2012, p. 123).
A dignidade da pessoa humana pode ser considerada como sobreprincpio
constitucional, do qual todos os princpios e regras relativas aos direitos fundamentais seriam
derivao, ainda que com intensidade varivel (DIDIER JR., 2016, p. 76).
O tema em apreo trata-se da (...) regra matriz dos direitos fundamentais (...)
(LENZA, 2012, p. 1265) estando positivamente inscrita no inciso III do artigo 1. da
Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988, sendo que falar em dignidade da
pessoa humana no uma novidade na Histria da humanidade. Estudos indicam que j na
China Imperial, sculo IV a.C., confucionistas afirmavam que cada ser humano nasce com
uma dignidade que lhe prpria, sendo-lhe atribuda por ato da divindade (FERNANDES,
2011, p. 228).
Ainda pode-se verificar que a dignidade da pessoa humana encontra sua gnese
histrica interligada ao Cristianismo, fundamentando-se no fato de que o homem foi criado
imagem e semelhana de Deus, razo pela qual o Cristianismo antigo apesar de no
reconhecer os direitos fundamentais como na atualidade, os quais encontram-se insculpidos
aos textos legislativos, j visionava o homem como privilgio da sua condio racional e pelo
fato de ser dotado de livre-arbtrio (SILVA NETO, 2013).
(...) Nas diversas tradies que se seguiram, inclusive crists, o homem tomado
como um ser especial, dotado de uma natureza mpar perante todos os demais seres, razo
pela qual no pode ser instrumentalizado, tratado como objeto, nem mesmo por outros seres
humanos (FERNANDES, 2011, p. 228).
37
Assim apesar de possuir origens no pensamento clssico e no iderio cristo, apenas
ao longo do sculo XX e principalmente a partir da 2. Guerra Mundial, a dignidade da pessoa
humana passou a ser positivada nos textos constitucionais, notadamente aps ter sido
consagrada no art. 1. da Declarao Universal da ONU de 1948 (HOLTHE, 2009, p. 81).
Assim sendo a prpria dignidade da pessoa humana, inscrita no art. 1, III, da CF,
no uma criao constitucional, pois ela um desses conceitos a priori, um dado
preexistente a toda experincia especulativa, tal como a prpria pessoa humana
(VASCONCELOS, 2011, p. 18).
A tendncia em acolher o ser humano como valor supremo, centro e fim do direito
est presente nos ordenamentos jurdicos desde o sculo passado at os dias de hoje. Esta
propenso fica demonstrada na adoo do princpio da dignidade da pessoa humana, em nvel
constitucional (...) (MATTAR, 2010, p. 1).
A Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988 trouxe de forma
clarividente a importncia da dignidade da pessoa humana, tendo em vista que referido
cnone constitucional foi promulgado na ps-ditadura na nao brasileira, somando a este
perodo o sentimento de solidariedade entre os povos (KUMAGAI; MARTA, 2010).
Neste diapaso colhe-se que a dignidade da pessoa humana se trata de fundamento da
Repblica Federativa do Brasil, consagrando, desde logo, que o Estado brasileiro uma
organizao centrada no ser humano e no em qualquer outro referencial, estando a razo para
tal fundamento galgada no fato de que o Brasil no se funda na propriedade, em classes, em
corporaes e muito menos no prprio Estado, mas sim e apenas na pessoa humana (PAULO;
ALEXANDRINO, 2008).
A concepo empregada na Constituio de 1988 parte do pressuposto de que todos
os homens possuem a mesma natureza, sendo dotados, assim, de idntico valor, independente
de sua posio social, econmica, cultural ou racial, devendo, portanto, ter sua dignidade
assegurada (AGRA, 2012, p. 124).
Consequentemente verifica-se que a Constituio Brasileira de 1988, fez a opo de
incluir a dignidade da pessoa humana no no rol dos direitos fundamentais, os quais
encontram-se inscritos no artigo 5. do referido cnone legislativo, mas escolheu inserir
referido tema como um dos fundamentos do Estado brasileiro, consagrando-o no inciso III do
artigo 1., querendo significar tal opo legislativa que a pessoa seja o fundamento e fim da
sociedade (TAVARES, 2006).
Weber (2013, p. 198-199) discorre acerca da temtica em comento:
38
(...) Estabelecer a dignidade da pessoa humana como fundamento de uma
Constituio, tal como o faz a brasileira, significa dizer que ela se constitui no
referencial terico e base de sustentao de toda a estrutura jurdica e social. Ela
um princpio sobre o qual se ergue a ordem constitucional. Significa, portanto que
no pode ser violada e que, ao mesmo tempo, deve ser protegida e promovida.
Nestes termos, colocada a dignidade da pessoa humana como fundamento da
Repblica Federativa do Brasil, tal princpio tornou-se valor-fonte e mximo do Estado
brasileiro, reconhecendo que o Estado existe em razo da pessoa, e no ao inverso, sendo o
ser humano fim mximo e no meio da atividade desenvolvida pelo Estado (FURLAN et al.,
2007).
Imperioso frisar que existe uma relao de mtua dependncia entre o princpio da
dignidade da pessoa e os direitos fundamentais, tendo em vista que no mesmo sentido que
estes foram gerados como uma exigncia da dignidade em proporcionar o desenvolvimento da
pessoa humana, tem-se que apenas por intermdio da existncia desses direitos que a
dignidade poder ser respeitada, protegida, promovida (NOVELINO, 2012).
(...) Os direitos fundamentais, sobretudo os sociais, so, nesse caso, a expresso do
contedo da dignidade humana e a sua realizao efetiva nas instituies sociais. ,
portanto, a partir da dignidade, como fundamento constitucional que se justifica e
at mesmo impe o reconhecimento do direito ao mnimo existencial (WEBER,
2013, p. 199).
Nesta concepo a Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988
reconheceu a pessoa humana em sua existncia e eminncia, transformando a dignidade da
pessoa humana num valor mximo da ordem jurdica vigente, no momento em que a declara
um dos fundamentos do Estado brasileiro (VASCONCELOS, 2011).
Desta feita, o ser humano, por intermdio da Constituio da Repblica Federativa
do Brasil de 1988 tornou-se o centro do ordenamento jurdico brasileiro, nas esferas
constitucional, poltica, econmica e social, existindo o Estado para o cidado e para garantir
sua mais ampla proteo (FURLAN et al., 2007).
Assim, no instante em que a Constituio Federal a inclui como fundamento
porque, consequentemente a constitui num valor supremo, fundante da Repblica, do Pas, da
Democracia e do Direito, no sendo apenas um princpio aplicvel a ordem jurdica, mas
tambm aplicvel na ordem poltica, social, econmica e cultural, resultando da sua natureza
de valor supremo, porque encontra-se na base de toda a vida nacional (VASCONCELOS,
2011).
39
Com efeito, a doutrina ptria considera o referido princpio como valor supremo do
Estado Democrtico de Direito (HOLTHE, 2009, p. 81) estando o ser humano na Carta
Magna considerado o centro do universo jurdico constitucional e como prioridade que
justifica o prprio Direito (MATTAR, 2010).
Assim, este reconhecimento e valorizao da dignidade da pessoa humana trata-se de
uma conquista histrica, mas tambm uma edificao da prpria razo, indicando um dever
ser, uma qualidade inerente do ser pessoa, significando estabelecer uma inviolabilidade do
prprio ser humano, o qual o protagonista de toda a estrutura jurdica e social vigente
(WEBER, 2013).
Como fundamento da nao brasileira a dignidade da pessoa humana retrata a
indispensabilidade de se colocar no centro das atenes o ser humano, consagrando sua
dignidade e pugnando pela humanizao do sistema constitucional (SILVA NETO, 2013).
A Repblica brasileira tem como objetivos a construo de uma sociedade livre,
justa e solidria e a garantia do desenvolvimento nacional, considerados tambm
como princpios fundamentais do Estado brasileiro, assim como a dignidade da
pessoa. Podemos entender que o deve ser do Estado brasileiro o crescimento
econmico e social, mas valorizando a pessoa e sua livre iniciativa e, por que no
dizer, considerando a pessoa como o principal sujeito do desenvolvimento
(CAVALCANTI, 2008, p. 213).
De todo o exposto observa-se que a dignidade da pessoa humana representa um
conjunto de direitos que so inerentes ao ser humano, sem os quais o homem se transformaria
em coisa, res, sendo que direito como a vida, lazer, sade, educao, trabalho e cultura devem
ser proporcionados pelo Estado, os quais fortalecem os direitos da pessoa humana e so o
ncleo originador da ordem jurdica (AGRA, 2012).
Ressalta-se, todavia, que a realidade tem destacado a dificuldade imensa em
concretizar a dignidade da pessoa humana no plano dos fatos, seja por uma questo cultural,
seja pela carncia de recursos em alguns pases, que embora formalmente comprometidos
com os direitos humanos, no conseguem efetiv-los, sendo que so vrios os mbitos do
referido princpio adentrando na esfera da pessoa como valor em si mesmo, bem como na
satisfao de suas carncias bsicas como alimentao, trabalho, moradia, sade, educao,
cultura (MENDES; COELHO; BRANCO, 2009).
Nesta conotao, colhe-se que a dignidade da pessoa humana opera como uma
clusula de advertncia, ou seja, move-se no sentido de que apesar de ser o texto
constitucional que disciplinar as relaes de poder, o que realmente interessa colocar a
servio do homem tudo aquilo que realizado pelo Estado (SILVA NETO, 2013).
40
Assim sendo, constitui-se num valor que promove a realizao dos direitos
fundamentais do homem, o que representa sua dignificao, revelando ser um valor supremo
que humaniza, sendo que o legislador brasileiro concedeu dignidade da pessoa humana a
qualidade de norma que sustenta todo o ordenamento constitucional, informando as
prerrogativas e as garantias fundamentais da cidadania (MATTAR, 2010).
Do exposto verifica-se que o princpio da dignidade da pessoa humana, apresenta-se
como a maior conquista, nos ltimos anos do Direito brasileiro (GAGLIANO; PAMPLONA
FILHO, 2015), devendo-se ressaltar que (...) no um direito concedido pelo ordenamento
jurdico, mas um atributo inerente a todos os seres humanos (...) (ABUJAMRA; RAMOS,
2009, p. 19).
1.2.2 Da cidadania
Consubstanciada na ideologia de capacidade eleitoral ativa, ser eleitor, e passiva, ser
eleito, bem como na previso de instrumentos de participao do cidado nos negcios do
Estado, o conceito de cidadania no se encontra adstrito a direitos polticos, englobando
tambm os direitos e deveres fundamentais (LENZA, 2015).
Tem-se, assim, que a cidadania no se restringe ao voto, o qual apenas uma etapa
do processo de cidadania, pois cada vez que um cidado se posiciona em face da atuao do
Estado, realiza um exerccio de cidadania (AGRA, 2012).
A cidadania, enquanto conceito decorrente do princpio do Estado Democrtico de
Direito, consiste na participao poltica do indivduo nos negcios do Estado e at mesmo
em outras reas de interesse pblico (NOVELINO, 2012, p. 379).
Cidadania provm do latim civita, assim como Poltica vem do grego plis, ambas
significando cidade. Conferida a um indivduo, a primeira serve para classific-lo na
esfera pblica. Quanto ao conceito de Poltica, refere-se produo e distribuio do
poder (Gallo, 1997). Esses dois conceitos relacionam-se ao de Democracia, pois
dizem respeito forma como os homens organizam-se em sociedade e participam
das instncias que regulam a vida social (ZANELLA, 2008, p. 85).
Ao elevar o tema em apreo como um fundamento da Repblica Federativa do Brasil
o legislador emprega a cidadania em sentido amplo e no apenas no carter tcnico-jurdico,
no se satisfazendo com a simples misso de direitos polticos ativos e passivos aos
brasileiros, sendo necessrio que o Estado atue concretamente, com o fim de incentivar e
propiciar condies efetiva participao poltica dos indivduos, fazendo valer seus direitos,
41
exigindo dos representantes eleitos a honradez dos compromissos assumidos em campanha
eleitoral, ou seja, assegurando condies materiais para a interligao do cidado na
sociedade (PAULO; ALEXANDRINO, 2008).
Historicamente, o conceito de cidadania nos leva anlise da polis grega,
especialmente de Atenas, onde ela alcanou grande desenvolvimento (AGRA, 2012, p. 122).
Registre-se que a cidadania se refere participao do indivduo na conduo dos
interesses do Estado, sofrendo sua conceituao, uma gradativa ampliao ao decorrer do
tempo, em especial, a partir da Segunda Guerra Mundial, pois antes ser cidado estava restrito
ao fato de votar e ser votado (FERNANDES, 2011).
A cidadania tem assumido historicamente vrias formas em funo dos diferentes
contextos culturais. O conceito de cidadania, enquanto direito a ter direitos, tem se prestado a
diversas interpretaes (VIEIRA, 2002, p. 22).
Desta forma, entende-se na contemporaneidade que a cidadania se expressa de outras
formas por intermdio dos direitos e garantias fundamentais, no sendo, portanto, algo
esttico, mas uma construo, um caminhar de participao ativa na formao da vontade
poltica e de confirmao dos direitos e garantias fundamentais (FERNANDES, 2011).
Assim o tradicional conceito de cidadania vem sendo gradativamente ampliado (...).
Ao lado dos direitos polticos, compreendem-se em seu contedo os direitos e garantias
fundamentais referentes atuao do indivduo m sua condio de cidado (NOVELINO,
2012, p. 379).
Sobre o conceito de cidadania, Vieira (2002, p. 27) esclarece:
A Repblica Moderna no inventou o conceito de cidadania, que, na verdade, se
origina na Repblica Antiga. A cidadania em Roma, por exemplo, um estatuto
unitrio pelo qual todos os cidados so iguais em direitos. Direitos de estado civil,
de residncia, de sufrgio, de matrimnio, de herana, de acesso justia, enfim,
todos os direitos individuais que permitem acesso ao direito civil. Ser cidado ,
portanto, ser membro de pleno direito da cidade, seus direitos civis so plenamente
direitos individuais. Mas ser cidado tambm ter acesso deciso poltica, ser um
possvel governante, um homem poltico. Esse tem direito no apenas a eleger
representantes, mas a participar diretamente na conduo dos negcios da cidade.
Sabe-se que o esforo de reconstruo, melhor dito, de construo da democracia no
Brasil ganhou mpeto aps o fim da ditadura militar, em 1985. Uma das marcas desse esforo
a voga que assumiu a palavra cidadania (CARVALHO, 2003, p. 07).
Melo (1999) destaca que a nova ordem constitucional implantada em 1988 buscava
instaurar o processo de redemocratizao no Brasil. Para tanto, estabeleceu uma srie de
direitos e garantias fundamentais que viriam a criar uma nova concepo de cidadania e
42
exerccio democrtico. Portanto, seu exerccio compreende uma variedade de direitos que se
opem ao dos poderes pblicos que tragam prejuzo para a sociedade.
Cidadania: o vnculo poltico, prprio do nacional, que o permite participar dos
caminhos polticos do Estado. Cidado o nacional no gozo dos direitos polticos
(VASCONCELOS, 2011, p. 183), contudo (...) no h mais espao para o aco
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