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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS
PROGRAMA DE PÓS- GRADUAÇÃO
SAÚDE COLETIVA
Estudo sobre as práticas e perfil do Apoio Matricial no Sistema Único de Saúde de
Campinas (SP): uma análise preliminar
Mônica Martins de Oliveira
Cristiane Pereira de Castro
Márcia de Rosalmeida Dantas
Gastão Wagner de Sousa Campos
Campinas – SP
2013
Coletivo de Estudos e Apoio Paideia
Unicamp
Estudo sobre as práticas e perfil do Apoio Matricial no Sistema Único de Saúde de
Campinas (SP): uma análise preliminar.
Exploratory study of Matrix Support practices and profile in Campinas (São Paulo)
Brazilian National Health System: a preliminary analysis
Título resumido: Estudo sobre o Apoio Matricial em Campinas (SP): análise preliminar
Resumo
Este estudo descreve e analisa o Apoio Matricial desenvolvido nas instituições do
Sistema Único de Saúde de Campinas (SP), identificando o perfil dos profissionais que
utilizam a estratégia do Apoio Matricial no seu cotidiano e aspectos relacionados a sua
prática junto às equipes apoiadas. Por Apoio Matricial entende-se uma estratégia de
cogestão para o trabalho em rede, valorizando-se a concepção ampliada do processo
saúde/doença, a interdisciplinaridade, o diálogo e a interação entre profissionais que
trabalhem em equipes ou em redes e sistemas de saúde (Campos, 1999; 2000; Campos
& Domitti, 2007; Figueiredo & Onocko Campos, 2009). Tal estudo integra um projeto
de pesquisa temático, em andamento, intitulado Estudo da Estratégia de Apoio Paidéia:
investigação sobre apoio institucional e apoio matricial (Núcleos de Apoio á Saúde da
Família – NASF) no SUS e representa a análise preliminar da fase exploratória da
pesquisa. Esta fase iniciou-se com a identificação dos profissionais que desenvolvem
Apoio Matricial, em parceria com as coordenações dos distritos de saúde, de forma a
incluir toda a rede assistencial que compõe o SUS Campinas. Foram considerados como
critérios de inclusão, o próprio profissional afirmar realizar Apoio Matricial às equipes
de Atenção Básica ou terem sido apontados pelos gestores locais em planilha específica
preenchida junto com os pesquisadores. Também incluímos como critério o fato de
utilizarem instrumentos de matriciamento no processo de trabalho. O instrumento
escolhido para a coleta dos dados foi um questionários elaborado especificamente para
esta pesquisa, composto por questões abertas, fechadas e mistas. A análise dos dados
obtidos até o presente momento se iniciou com a tabulação das respostas, seguida de sua
análise descritiva, realizada a partir do cálculo das frequências absolutas e relativas das
respostas agrupadas por categorias. Os dados obtidos foram organizados segundo eixos
temáticos: perfil dos profissionais e prática de apoio. Dos dados que emergiram pode-se
considerar que os profissionais que realizam Apoio Matricial modificou as relações
interprofissionais, aumentando o coeficiente de troca e de cooperação entre
profissionais em várias áreas, com grande ênfase na Saúde Mental. Observou-se ainda
que as ferramentas com que realizam Apoio matricial estão de acordo com o
preconizado pelo Ministério da Saúde em seus cadernos sobre o assunto e coincidem
com o proposto pela Teoria Paidéia. O Apoio Matricial traz uma proposta interessante e
inovadora, que vem acontecendo no município de Campinas a partir de várias áreas e
sua prática se dá de forma complexa, o que justifica a necessidade de investigações
sobre o tema.
Descritores: Políticas, planejamento e administração em saúde; Apoio Matricial; Gestão
em saúde; Prática Profissional; SUS (BR)
Introdução
A metodologia Paidéia de cogestão das instituições e do cuidado em saúde,
desenvolvida por Gastão Wagner de Sousa Campos e colaboradores, ao longo dos
últimos vinte e cinco anos vem sendo utilizada em políticas e práticas de saúde no
Brasil. Suas primeiras aplicações no Sistema Único de Saúde foram no município de
Campinas/SP, durante a década de noventa. Serviços de saúde mental, de atenção básica
e da área hospitalar sofreram mudanças organizacionais orientadas por esse referencial,
implantando novos arranjos e dispositivos de gestão e do processo trabalho,
especialmente os denominados “Apoio Institucional” e “Apoio Matricial”. Nos anos
seguintes, várias cidades incorporaram modos de realizar o Apoio Institucional e
Matricial, valorizando os conceitos de Clínica Ampliada e Compartilhada. Dentre essas,
podemos destacar Belo Horizonte/MG, Quixadá/CE, Sobral/CE, Recife/PE,
Aracaju/SE, Rio de Janeiro/RJ, Viamão/RS.
Os conceitos de Apoio Matricial e Equipe de Referência foram desenvolvidos
dentro da linha de pesquisa voltada para a reforma das organizações e do trabalho em
saúde denominada de “Política, modelo de atenção e de gestão: investigação teórica e
metodológica”, apoiada pelo CNPq (1996-2001).
No discurso oficial do Ministério da Saúde, a incorporação de alguns elementos
da concepção Paidéia e de suas aplicações metodológicas – Apoio Matricial e Apoio
Institucional – ocorreu a partir de 2003, particularmente com a política denominada de
HUMANIZA/SUS e quando foi iniciado um processo de formulação e implantação do
Apoio Institucional aos estados e municípios.
No que se refere ao Apoio Matricial, essa incorporação se deu oficialmente em
2008, após um longo período de debate, com a publicação da política de Núcleos de
Apoio à Saúde da Família (NASF). O programa e seus manuais de orientação basearam-
se na estratégia do Apoio Matricial (Portaria GM nº 154, de 24 de janeiro de 2008,
republicada em 4 de março de 2008).
Por Apoio Matricial entende-se uma estratégia de cogestão para o trabalho
interprofissional e em rede, valorizando-se a concepção ampliada do processo
saúde/doença, a interdisciplinaridade, o diálogo e a interação entre profissionais que
trabalhem em equipes ou em redes e sistemas de saúde (Campos, 1999; 2000; Campos
& Domitti, 2007; Figueiredo & Onocko Campos, 2009).
O Apoio Matricial em saúde objetiva assegurar retaguarda especializada a
equipes e profissionais encarregados da atenção a problemas de saúde. Porém o realiza
de maneira personalizada e interativa. Opera com o conceito de núcleo e de campo.
Assim, um especialista com determinado núcleo apoia especialistas com outro núcleo
de formação, objetivando a ampliação da eficácia de sua atuação (Campos, 2000).
Trata-se de uma metodologia de trabalho complementar àquela prevista em sistemas
hierarquizados, a saber: mecanismos de referência e contrarreferência, protocolos e
centros de regulação. O Apoio Matricial pretende oferecer tanto retaguarda assistencial
quanto suporte técnico-pedagógico às equipes de referência. Depende da personalização
da relação entre equipes de saúde, da ampliação dos cenários onde se realiza a atenção
especializada e da construção compartilhada de diretrizes clínicas e sanitárias entre os
componentes de uma Equipe de Referência e os especialistas que oferecem Apoio
Matricial. Essas diretrizes devem prever critérios para acionar o apoio e definir o
espectro de responsabilidade tanto dos diferentes integrantes da equipe de referência
quanto dos apoiadores matriciais.
A Equipe ou Profissional de Referência são aqueles que têm a responsabilidade
pela condução de um caso individual, familiar ou comunitário. Objetiva ampliar as
possibilidades de construção de vínculo entre profissionais e usuários. O termo
responsabilidade de condução refere-se à tarefa de encarregar-se da atenção ao longo do
tempo, ou seja, de maneira longitudinal, à semelhança do preconizado para equipes de
Saúde da Família na Atenção Básica. Segundo essa concepção, a Equipe de Referência
é a menor unidade de poder em uma organização. A Equipe de Referência tem sempre
uma composição interdisciplinar. É uma forma de articular a lógica interdisciplinar com
o poder organizacional.
Apoio Matricial e Equipe de Referência são, ao mesmo tempo, arranjos
organizacionais e uma metodologia para a gestão do trabalho interdisciplinar em saúde,
objetivando ampliar as possibilidades de realizar-se clínica ampliada e integração
dialógica entre distintas especialidades e profissões.
Justificativa
A relevância do estudo do Apoio Matricial deve-se ao seu caráter inovador
enquanto estratégia potente para a transformação das práticas de trabalho, no que se
refere à democratização das relações interprofissionais e à qualificação do cuidado
prestado aos usuários, contribuindo para o fortalecimento do Sistema Único de Saúde.
A escolha do município de Campinas justifica-se pela complexidade de seu
sistema de saúde, que atualmente conta com uma extensa rede de serviços, instâncias de
gestão e controle social, e pelo seu pioneirismo na implantação do SUS, sobretudo na
constituição da Atenção Básica, iniciada na década de 70. Além disso, o município foi o
primeiro a experimentar a utilização da metodologia Paideia para cogestão no SUS. Já
na década de noventa, o Método Paidéia subsidiou as mudanças institucionais no
Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira, reforçaram e ampliaram a reforma psiquiátrica
campineira e à incorporação do referencial do Apoio Matricial na saúde mental. A partir
de 2001, a Secretaria Municipal de Saúde passou a incorporar o referencial Paidéia na
organização e gestão de diversas instâncias do SUS-Campinas (Domitti, 2006).
Embora nos últimos anos diversas mudanças tenham ocorrido na gestão da
Secretaria Municipal de Saúde de Campinas, o referencial Paidéia e o Apoio Matricial
se mantêm ,em alguma medida, incorporados no discurso e nas práticas de profissionais
e gestores, o que justifica a necessidade de uma análise desse contexto.
Objetivo Geral
Neste estudo pretende-se descrever e analisar o Apoio Matricial desenvolvido
nas instituições públicas de saúde do Sistema Único de Saúde de Campinas (SP),
identificando o perfil dos profissionais que utilizam a estratégia do Apoio Matricial no
seu cotidiano e aspectos relacionados à sua prática junto às equipes apoiadas.
Referencial teórico
Na tese de livre-docência, intitulada “Um Método para Análise e Cogestão de
Coletivos – A Constituição do Sujeito, a Produção de Valor de Uso e a Democracia nas
Instituições: O Método da Roda”, Campos (2000) realizou uma crítica à racionalidade
gerencial hegemônica e indicou um método que busca favorecer a democratização da
gestão nas organizações, através da formação de coletivos organizados voltados para a
produção de bens ou serviços, e do incentivo à participação dos sujeitos na gestão da
organização e de seus processos de trabalho. Para tanto, o método parte de uma
articulação de saberes e práticas dos campos da saúde coletiva, da clínica, da política, da
administração e planejamento, da psicanálise, da análise institucional e da pedagogia
(Campos, 2000; Cunha & Campos, 2001).
O termo Paidéia é de origem grega. Designa um dos três componentes essenciais
da democracia ateniense, a saber: Cidadania, direitos das pessoas; Ágora, espaço para
compartilhar poder; e ainda o conceito de Paidéia, educação integral.
O Método Paidéia (ou da Roda) realiza uma adaptação dessa tríade. Busca-se o
Efeito Paidéia: que é o trabalho realizado para ampliar a capacidade das pessoas para
lidar com informações, interpretá-las, compreender a si mesmo, aos outros e ao
contexto. Em consequência, pretende contribuir para o desenvolvimento da capacidade
de tomar decisões, lidar com conflitos, estabelecer compromissos e contratos;
ampliando, enfim, a possibilidade de ação dessas pessoas sobre todas estas relações.
A concepção Paidéia aplica-se à política, gestão, pedagogia, saúde coletiva e
clínica. As estratégias metodológicas Paidéia buscam compreender e interferir em
afetos, no conhecimento e em relações de poder. A política trata de modos para operar
com o poder; a pedagogia, com o conhecimento; as terapias da subjetividade, com o
afeto. Estes campos disciplinares, contudo, separam essas três dimensões, quando na
realidade elas atuam de forma conjugada e simultânea.
A concepção Paidéia preconiza a reforma das organizações de saúde com base
na cogestão, ou seja, o estabelecimento deliberado de relações dialógicas, com
compartilhamento de conhecimentos e de poder.
O Apoio é uma aplicação metodológica da concepção Paideia. Pode ser utilizado
na gestão (Apoio Institucional) ou para lidar de outra forma com as relações
interprofissionais (Apoio Matricial). Além desses eixos de aplicação, o Apoio Paidéia
também tem sido utilizado nas relações clínicas e como estratégia metodológica para
Pesquisas do tipo Intervenção (Furlan, 2008; Massuda, 2010; Castro, 2011; Cesar,
2011); e também como recurso pedagógico para a formação em saúde (Furlan &
Amaral, 2008; Cunha, 2009; Figueiredo, 2012; Furlan, 2012).
Método
O presente estudo integra um projeto de pesquisa temático, em andamento,
intitulado Estudo da Estratégia de Apoio Paidéia: investigação sobre apoio institucional
e apoio matricial (Núcleos de Apoio á Saúde da Família – NASF) no SUS, aprovado
pelo Comitê de Ética da Faculdade de Ciências Médicas, sob parecer de número
293.405. Todos os participantes do grupo pesquisado assinaram o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido, autorizando a utilização do material produzido na
pesquisa, resguardado o sigilo.
Representa a análise preliminar da fase exploratória da pesquisa, na qual se
buscou agregar dados quantitativos que possam subsidiar e complementar as fases
subsequentes.
A fase exploratória iniciou-se com a identificação dos profissionais que
desenvolvem Apoio Matricial, tendo em vista que não foi possível encontrar nenhum
registro oficial da Secretaria Municipal de Saúde ou dos próprios distritos de saúde com
estes dados. Optamos por desenvolver uma estratégia para a coleta destas informações,
em parceria com as coordenações distritais, de forma a incluir toda a rede assistencial
que compõe o SUS Campinas.
Neste sentido, foram considerados como sujeitos da pesquisa os profissionais
que compõem o SUS Campinas e desenvolvem Apoio Matricial. Foram utilizados como
critérios de inclusão, o próprio profissional afirmar realizar Apoio Matricial às equipes
de Atenção Básica ou terem sido apontados pelos gestores locais em planilha específica
preenchida junto com os pesquisadores. Também incluímos como critério o fato de
empregarem instrumentos de matriciamento em seu processo de trabalho.
O instrumento escolhido para a coleta dos dados foi um questionário elaborado
especificamente para esta pesquisa, o que é considerado por Minayo et al. (2005) uma
ferramenta útil para a objetivação da realidade. Tal instrumento é composto por
questões abertas, fechadas e mistas. Além dos itens de identificação do respondente, o
questionário aborda temas referentes à formação em Saúde Coletiva, tanto na
graduação, como na pós-graduação, analisa também a experiência profissional prévia ao
Apoio Matricial; estuda o tipo de Apoio Matricial desenvolvido, a forma de seleção para
exercício dessa função, as características do cargo ocupado e do trabalho que
desenvolvido durante a prática de Apoio Matricial; investiga as oportunidades de
formação em Apoio Matricial oferecidas pela gestão municipal e também a importância
que os profissionais atribuem à formação recebida em Saúde Coletiva. Algumas
questões mistas contêm subitens que se destinam ao detalhamento da resposta desejada.
A adequação do questionário foi avaliada em um pré-teste, no qual o
instrumento foi aplicado a cinco profissionais do Apoio Matricial de Campinas (os
cinco primeiros). Após este momento, a composição do questionário foi readequada
quanto à linguagem, facilidade de compreensão do objetivo da pergunta e capacidade
das perguntas para atender aos objetivos propostos pela pesquisa.
A forma de aplicação dos questionários proposta para esta pesquisa foi a de
autopreenchimento, na presença dos entrevistadores, na medida do possível, para que os
respondentes que tivessem algum tipo de dúvida sobre o questionário pudessem pedir
ajuda ou esclarecimentos.
A análise dos dados obtidos até o presente momento se iniciou com a tabulação
das respostas, seguida de sua análise descritiva, realizada a partir do cálculo das
frequências absolutas e relativas das respostas decompostas em categorias. Foi utilizado
o programa Microsoft Excel, pacote Office 2000. Os dados foram sumarizados em
tabelas e gráficos com a distribuição dos valores.
Resultados e discussão
Respeitando os critérios de inclusão apresentados, foram indicados 258
profissionais que realizam atividades de Apoio Matricial no SUS Campinas. Deste total,
124 profissionais que desenvolvem regularmente as ações de Apoio Matricial aceitaram
participar da pesquisa, preenchendo o questionário. Houve perdas amostrais, em
decorrência dos profissionais estarem de férias, afastadas em licença maternidade ou por
se recusarem a participar da pesquisa. No total, dez profissionais indicados não
responderam ao questionário.
Ao todo, foram indicados 78 serviços que compõe a rede assistencial dos cinco
distritos de saúde e que utilizam a estratégia de Apoio Matricial em seus processos de
trabalho. Em 63% destes serviços foi realizada a aplicação dos questionários com os
sujeitos da pesquisa.
No intuito de atender aos objetivos propostos, os dados apresentados abaixo
foram organizados segundo eixos temáticos: perfil dos profissionais e prática de apoio.
Perfil dos profissionais
Do total de profissionais que respondeu ao questionário, a maioria, 85% são do
sexo feminino, sendo que apenas 15% são do sexo masculino, indicando que o trabalho
em saúde e, principalmente o Apoio Matricial são funções predominantemente
femininas no SUS Campinas. Os respondentes apresentam-se distribuídos da seguinte
forma em relação à faixa etária: 5 pessoas estão na faixa entre 20 e 25 anos de idade, 31
pessoas na faixa entre 31e 35 anos, 21 pessoas entre 31 e 35 anos, 20 pessoas entre 36 e
40 anos, 25 pessoas entre 41 e 50 anos e 22 pessoas com 50 anos ou mais. Quanto à
idade, mais da metade (72 pessoas) está concentrada na faixa etária entre 26 e 36 anos,
mas há também a presença importante de pessoas com mais de 41 anos.
Sobre a distribuição do serviço de saúde a partir do qual esses profissionais
desenvolvem ações de Apoio Matricial, podemos perceber que apenas 5 pessoas (4%)
as desenvolve a partir do NASF, 9 pessoas (7%) a partir das Policlínicas, que
caracterizam centros de especialidade, 12 pessoas (10%) a partir do Centro de
Referência em Reabilitação, 7 pessoas (6%) dos Centros de Convivência, 2 pessoas
(2%) do CTA – Centro de Testagem e Aconselhamento, que é referência para
DST/AIDS, 1 pessoa de centro de especialidades, 4 pessoas (3%) do Laboratório
Municipal de Análises Clínicas, sendo que a maior concentração está localizada nos
dispositivos de Saúde Mental, nos CAPS ( 34 pessoas, 27%) e nas equipes de Saúde
Mental dos Centros de Saúde (47 pessoas, 38%). Algumas pessoas, entretanto,
desenvolvem atividades de Apoio Matricial a partir de dois serviços
concomitantemente: do NASF e do Centro de Saúde (1 pessoa), do Centro de
Referência em Reabilitação (1 pessoa) e à partir do CAPS e Centro de Saúde (1 pessoa).
Não causou surpresa encontrar-se que a maior parte das pessoas que realiza apoio
matricial não o realiza a partir de NASF; isto porque Campinas foi pioneira no
desenvolvimento dessa estratégia e quando, em 2010, o Ministério da Saúde passou a
implementar os NASFs, no SUS local, várias equipes, a partir de distintos serviços, já
realizavam apoio matricial a equipes da atenção básica. Esta particularidade será
investigada com mais cuidado nas próximas etapas do projeto.
Esta elevada concentração de atividades de Apoio Matricial na área da Saúde
Mental também fica evidente na tabela a seguir, com a distribuição por áreas em que o
Apoio Matricial é desenvolvido.
Áreas em que desenvolve Apoio Matricial Total %
Saúde Mental 81 65%
Reabilitação 12 10%
Coleta laboratorial 4 3%
Gestão da clínica 5 2%
Saúde da Mulher 1 2%
Assitência Farmacêutica 2 2%
Abordagem DST 2 2%
Saúde Bucal 2 2%
Saúde da Criança 2 2%
Doenças Crônicas 1 1%
Dermatologia 1 1%
Ortopedia 1 1%
Reumatologia e reabilitação 1 1%
Serviço Social 1 1%
Cardiologia 1 1%
Hematologia 1 1%
Nutrição 1 1%
Neurologia 1 1%
Otorrinolaringologia 1 1%
Práticas Integrativas e Saúde Mental 1 1%
Saúde Mental e Reabilitação 1 1%
Tabela 1: Distribuição das áreas em que se desenvolve Apoio Matricial
O predomínio do Apoio Matricial na Saúde Mental pode ser atribuído à importância
do matriciamento em Saúde Mental de Campinas, pensado como estratégia para cuidado
dos problemas de saúde mental menos graves, em geral detectados pelas equipes da
atenção básica. É importante pontuar que o momento de crise da gestão pública
municipal, com reflexos no sistema local de saúde e na parceria com o Serviço de Saúde
Cândido Ferreira na saúde mental, tem repercutido negativamente no desenvolvimento
das Atividades de Apoio Matricial e no reconhecimento identitário dos profissionais
apoiadores.
O apoio matricial à atenção básica começou, em Campinas, por meio da
organização de equipes de saúde mental na atenção básica, depois essa modalidade de
prática se estendeu para outros pontos da rede. Com o tempo, o Serviço de Saúde
Cândido Ferreira ganhou quase que o monopólio das práticas de Saúde Mental no SUS
e, por extensão, no Apoio Matricial de Campinas, conforme fica demonstrado quando se
analisa a distribuição dos vínculos profissionais daqueles que realizam atividades de
Apoio Matricial: 52 pessoas (42%) são contratadas pela instituição filantrópica Cândido
Ferreira, ficando logo atrás da própria municipalidade, que é a contratante de 56% (70
pessoas) dos profissionais do Apoio Matricial. O restante, 2%, refere-se às residentes de
psiquiatria que participaram da pesquisa, mas possuem outro tipo de vinculação.
A questão do duplo vínculo também foi investigada e, foi possível constatar que
apenas 37% dos participantes exercem outra atividade profissional no momento,
indicando que a duplicidade de vínculo não é a regra para a maioria, 63% das pessoas.
Uma importante forma de se identificar o projeto político e a aposta de um
município no Apoio Matricial se dá mediante a análise do processo seletivo proposto
para a contratação dos profissionais. Em Campinas, foi possível observar que a gestão
reconhece ser importante que o candidato apresente conhecimento na área da Saúde
Coletiva, mas que não há processos específicos de seleção para o Apoio Matricial.
Esta percepção baseia-se no fato de que 107 pessoas (86%) referem que o processo
seletivo incluía questões sobre saúde pública/saúde coletiva, mas apenas 41 pessoas
(33%) afirmaram que o processo incluía questões sobre Apoio Matricial. A ausência
destas questões conflita com o fato dos contratantes terem clareza de que o profissional
iria desenvolver atividades de Apoio Matricial, já que 53% dos respondentes foram
informados que o cargo incluía tais ações.
Também se mostra incoerente o fato de que no processo seletivo não era exigida
experiência prévia com Apoio Matricial ou Saúde Coletiva. Na nossa pesquisa, 78% dos
participantes referiram que não houve tal exigência na seleção.
Se a gestão local está empenhada na proposta da efetivação e do fortalecimento do
Apoio Matricial, mas não exige conhecimentos teóricos ou experiência prática nesta
área para os profissionais contratados para estas atividades, seria de se esperar que fosse
oferecido pela Secretaria Municipal de Saúde algum tipo de formação ou capacitação
neste tema para os ingressantes. Entretanto, não parece ser isso que ocorre em
Campinas, dado que a maioria, 78% dos profissionais, respondeu que não recebeu
nenhum tipo de formação e, os 22% que receberam alguma formação, identificam que a
formação ocorreu no período de implantação do Paidéia no Município (ano de 2003).
Quando se analisa a formação destes profissionais, percebe-se que apesar de não
receberem nenhum tipo de investimento formal do município neste sentido, eles têm
procurado por iniciativa própria alcançar o aprimoramento de seus conhecimentos e de
sua prática mediante participação em cursos de pós-graduação, já que 91% (113
pessoas) referiu possuir esta modalidade de formação. Entretanto, a busca pela pós-
graduação distribui-se entre os cursos em saúde coletiva e aqueles voltados para a
própria especialidade e nem sempre estão vinculados ao tema do Apoio Matricial.
Prática de apoio
A principal forma de ingresso nas atividades de Apoio ocorreu por meio de alguma
forma de pactuação na própria equipe onde trabalhavam (64%), indicando que se
privilegiou decisões tomadas em espaços de co-gestão, o que é consistente com a
proposta do Apoio Matricial como prática dialógica voltada para democratização das
relações interprofissionais.
Todavia, a análise das horas dedicadas ao Apoio Matricial em relação ao total de
horas para que se foi contratado, revela um dado alarmante. Os regimes de trabalho
distribuem-se entre 12 e 36 horas semanais, sendo que a maioria dos profissionais
realiza 36 horas semanais (56 pessoas) ou 30 horas semanais (46 pessoas). Deste total
de horas, 61 pessoas (49%) dedicam até 4 horas ao Apoio Matricial e 30 pessoas (24%)
dedicam de 5 a 10 horas por semana para ao Apoio, o que corresponde a menos de um
terço (10%) da carga horária total.
Este dado oferece indicativos sobre a concepção de Apoio Matricial que os
profissionais possuem, pois a maioria só contabilizou como hora dedicada ao Apoio as
reuniões de equipe e as ações educativas junto às esquipes apoiadas. De forma geral,
ações de assistência direta aos usuários, como atendimentos individuais ou realização de
grupos não foram computadas pelos profissionais como atividades de Apoio.
Contudo, seria preciso investigar mais aprofundadamente o sentido desta
informação, pois seria relevante entender se isto ocorre porque os profissionais
realmente não consideram que o Apoio Matricial envolve a assistência direta ou se não
a incluíram porque a realizam dentro da lógica ambulatorial, de forma pouco dialógica e
com pouca co-responsabilização da equipe, o que contradiz a proposta do Apoio.
Também foram levantados outros dados sobre as características da prática do Apoio
Matricial, dentre elas, há quanto tempo realizam o Apoio, qual é a composição das
equipes de Apoio, o número de equipes que cada profissional apoia, as formas de
acionar o Apoio Matricial, os modos de construção dos critérios para os casos que serão
levados para discussão com o apoiador e, por fim, as ferramentas que utilizam no
matriciamento.
Sobre o tempo em que realizam o Apoio, 32 pessoas referiram que o fazem há
menos de 6 meses, e 31 pessoas entre 25-60 meses, o que compõe a maioria dos
entrevistados. Entretanto, 14 pessoas o fazem de 7 a 12 meses, 16 pessoas de 13 a 24
meses, 16 pessoas de 61 a 120 meses e 14 pessoas há mais de 120 meses. Nota-se que
estes dois últimos grupos provavelmente referem-se ao período da implantação Paideia
quando se institucionalizou a estratégia do Apoio Matricial na cidade.
A maioria das equipes de Apoio Matricial é composta por até 3 pessoas (61%), mas
apresentam arranjos variáveis: 19 pessoas (19%) realizam sozinhas as atividades de
Apoio, 38 pessoas (31%) realizam em duplas, 19 pessoas (15%) em 3 pessoas. Equipes
maiores também foram citadas, sendo que 14 pessoas (11%) afirmaram realizar Apoio
na companhia de 4 pessoas; 7 profissionais (6%) realizam em grupo de 5 pessoas e 22
profissionais (18%) participam de equipes de Apoio compostas por 6 pessoas ou mais.
De um modo geral, as equipes de Apoio Matricial em Campinas apresentam
composição reduzida, o que faz jus ao modo de organização do matriciamento em
Saúde Mental, que é a área prevalente de Apoio no Município, mas se diferenciam da
recomendação do Ministério da Saúde para os NASF.
A mesma consideração parece se aplicar ao número de equipes Apoiadas por cada
profissional, pois a maioria deles (63%) apoia menos de oito equipes de referência,
sendo que 52 profissionais (42%) apoiam de 1 a 3 equipes de referência e 32
profissionais (26%), de 4 a 8 equipes de referência. Além disso, 21 profissionais (17%)
referiram apoiar um distrito de saúde, 11 profissionais (9%) oferecem apoio a mais de
um distrito de saúde, 4 profissionais (3%) apoiam entre 9 e 18 equipes, o que seria
equivalente a um distrito ou dois e 4 profissionais; (3%) não conseguiram definir o
número de equipes apoiadas.
Os principais modos de acionar o apoio parecem estar vinculados a processos
dialógicos de co-gestão, pois 38% referiu que a agenda do apoio é construída mediante
pactuação entre Apoio Matricial e Equipe de Referência e ainda inclui a possibilidade
de solicitação de apoio eventual pelas equipes; 17% indicou também indicou que a
construção de agenda é pactudada entre Apoio Matricial e Equipe de Referência, mas
sem a possibilidade de solicitação de apoio eventual; 18% marcou que o Apoio é
acionado somente mediante solicitação de Apoio eventual e 14% afirmou que a
construção da agenda é influenciada por diversas instâncias, envolvendo equipe de
referência, equipe de Apoio e a gestão.
Contudo, apenas 55% dos profissionais indicaram a existência de critérios para
seleção dos casos que demandam discussão com Apoio Matricial. Destes 55% que
reconheceram a existência de critérios, 35% referiu que a construção deles ocorre de
forma compartilhada, entre a equipe de Apoio e a equipe de referência; 15% disseram
que a construção envolveu a equipe de Apoio Matricial e a gestão local; 20 % afirmou
que foram construídos pela equipe de referência de forma independente; 4 % acredita
que foram construídos pelos apoiadores somente, 6% alegam que foi a gestão
independentemente que construiu os critérios e 2% não souberam dizer como os
critérios foram construídos.
No gráfico abaixo, é possível visualizar as principais ferramentas utilizadas pelos
profissionais do Apoio Matricial.
Gráfico 1: Distribuição dos respondentes sobre as ferramentas utilizadas no
Apoio matricial
O gráfico indica que os profissionais de Apoio Matricial laçam mão de diversas
ferramentas para o desenvolvimento de suas atividades, contemplando quase a
totalidade dos instrumentos recomendados pelo guia prático de matriciamento em saúde
mental (Brasil, 2011), excetuando-se apenas pela construção do genograma e do
ecomapa que não apareceram nas respostas. A discussão de casos, a construção de
Projetos Terapêuticos Singulares e as Intervenções conjuntas com as equipes emergem
como ferramentas privilegiadas. Contudo, é curioso notar que a assistência direta aos
usuários foi marcada como ferramenta de apoio, mas não foi considerada enquanto tal
no momento da computação dos profissionais sobre as horas que dedicam ao Apoio, o
que reforça a necessidade de investigações de caráter qualitativo sobre esta questão.
Referências
BRASIL, Ministério da Saúde. Portaria NASF Nº 154, Brasília, 2008.
BRASIL, Ministério da Saúde. CHIAVERINI, D. H. (org.) Guia prático de
matriciamento em Saúde Mental. Centro de Estudo e Pesquisa em Saúde Coletiva:
Brasília, 2011.
CAMPOS, GWS. Um método para análise e co-gestão de coletivos. São Paulo:
Hucitec, 2000. 236p.
CAMPOS, GWS. Saúde pública e saúde coletiva: campo e núcleo de saberes e práticas.
In: Ciência & Saúde Coletiva, v.5, n.2: p.219-230, 2000.
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