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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
ANDREW MARTINS CARLIN
DA ESPERANÇA DE UM POVO ABANDONADO AO ESGOTAMENTO DE UM
LÍDER POLÍTICO:
JÂNIO QUADROS NAS PÁGINAS DA REVISTA O CRUZEIRO
(1960-1961)
CURITIBA 2015
ANDREW MARTINS CARLIN
DA ESPERANÇA DE UM POVO ABANDONADO AO ESGOTAMENTO DE UM
LÍDER POLÍTICO:
JÂNIO QUADROS NAS PÁGINAS DA REVISTA O CRUZEIRO
(1960-1961)
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de História – Faculdade de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Tuiuti do Paraná –, como requisito parcial para a obtenção do grau de licenciatura em história.
Orientadora: Professora Mestre Viviane Zeni
CURITIBA
2015
Aos dois homens mais inteligentes dos
quais já tive notícia: Leocadio Bueno Leal
e Christian Andrey Carlin.
AGRADECIMENTOS
Minha vontade aqui é de agradecer, citando nome por nome, todos aqueles que
me ajudam diariamente a ver esse caos chamado mundo como um lugar suportável, e
até mesmo como agradável em certos momentos. Mas, devido uma curta memória e,
sobretudo, por levar em conta os esforços que contribuíram diretamente com a
realização deste humilde trabalho, quero expressar aqui meus agradecimentos
especialmente a minha família e ao pessoal da Tuiuti.
Sem primeiro, segundo ou terceiro lugar, começo por agradecer ao corpo
docente que compôs o curso de História da Universidade Tuiuti do Paraná entre os
anos de 2012 e 2015; aproveito para manifestar meu carinho e admiração aos dois
acadêmicos mais dedicados – e modestos – com quem tive contato ao longo destes três
anos e meio: Professora Viviane Zeni e Professor Pedro Oscar Valandro.
Sou grato aos demais funcionários desta instituição que em algum momento se
esforçaram, mesmo que sem perceber, para que minha matricula, bolsa de estudos ou
grade curricular estivessem preparados mesmo quando me fugia à memória o
pagamento da mensalidade, renovação do PROUNI ou demais responsabilidades
referente à manutenção de meus estudos universitários; ressalto aqui a generosidade do
Sérgio do PROUNI que salvou a minha bolsa de estudos quando este distraído
acadêmico que vos escreve esqueceu-se de pagar suas dívidas.
Agradeço a todos meus colegas de curso que colaboraram imensamente com
meu amadurecimento em vários aspectos enquanto estivemos juntos.
Janaina e Amanda, obrigado.
Nesse momento tenho sérias dúvidas referente à minha gratidão a um certo
grupo de indivíduos. No entanto, forças terríveis – talvez as mesmas que derrubaram
Jânio Quadros – me forçam a cita-los aqui mesmo contra o meu gosto. Refiro-me a
Michel de Brito, Eduardo Santana, Leilon Moraes, Diego (também) de Brito e Eder
Figenio (espero de coração que tenha errado o sobrenome de alguém). Senhores,
obrigado por fazer deste anarquista uma pessoa melhor, ou não; e para que conte aos
altos, o animal ornitorrinco é um mamífero semiaquático da Austrália e Tasmânia, e
juntamente com as equidnas formam o grupo dos monotremados, os únicos mamíferos
ovíparos existentes. Sendo, portanto, do Reino Animal, Filo Vertebrado e por fim da
Classe Mamífero.
Por fim, para que eu possa enumerar as páginas deste trabalho e fazer meu
sumário, finalmente finalizando-o, agradeço aos meus pais, pois sem eles,
naturalmente, eu não existiria, mas acima disso por lutarem a todo o tempo por meus
estudos. Certa vez meu pai disse: “Andy, se for preciso, eu dou minha “vida”, para
pagar sua faculdade”. Amo vocês.
Agora sim...
Por fim, agradeço a minha melhor amiga e companheira que me faz muito
feliz e que sempre me incentivou a manter meus estudos em dia: Gecia Aline Garcia,
amo você.
Enfim... Sou grato a vocês que colaboraram com a realização deste humilde
trabalho que será o primeiro de muitos, pois o passado talvez não seja uma roupa que
não nos serve mais.
Uma das maiores burlas dos nossos tempos terá sido o prestígio da imprensa. Atrás do jornal, não vemos os escritores, compondo a sós os seus artigos. Vemos as massas que o vão ler e que, por compartilhar dessa ilusão, o repetirão como se fosse o seu próprio oráculo.
(Joaquim Nabuco)
RESUMO A ausência de significados políticos atribuídos à imagem pública de Jânio Quadros prevalece como fator comum ao se tratar da memória coletiva que diz respeito a esta personagem. Mesmo com uma presente atuação política em âmbito nacional, na qual se destacaram as comissões de inquéritos que associavam importantes nomes da política a grandes escândalos de corrupção; como também no âmbito internacional com a Política Externa Independente (PEI) ao incentivar relações comerciais com as grandes potências ocidentais e orientais em pleno estado de Guerra Fria, para muitos brasileiros, Jânio ainda é lembrado apenas como o “político da vassoura” que se promovia exclusivamente por meios de suas extravagâncias. Tal perspectiva está diretamente associada às representações que lhe foram atribuídas tanto por seus seguidores quanto pelos seus opositores. Neste sentido, destaca-se também o papel da mídia impressa neste processo de construção imagética, visto que o político foi alvo frequente dos periódicos correntes, sobretudo, das revistas ilustradas de variedades e por isso optou-se aqui por privilegiar a produção de O Cruzeiro enquanto pioneira deste ramo em diversos sentidos. Deste modo, o presente estudo propôs uma análise da imagem de Jânio Quadros a partir das publicações deste periódico entre 1960 e 1961, bem como uma discussão sobre o papel desempenhado pela mídia no campo da política. PALAVRAS CHAVES: Jânio Quadros, O Cruzeiro, Mídia Impressa, Fotojornalismo
LISTA DE FIGURAS FIGURA 1. Correio da Manhã, 18 de fevereiro de 1945 – n. 15428 – ano XLIV.......22
FIGURA 2. Ultima Hora, 9 de janeiro de 1952 – n. 177 – ano II.................................23
FIGURA 3. Tribuna da Imprensa. 5 de Agosto de 1954 – n. 1402 – ano VI...............25
FIGURA 4. Diário Carioca, 6 de Agosto de 1954 – n. 8001 – ano XXVI...................26
FIGURA 5. Correio da Manhã, 6 de Agosto de 1954 – n. 18823 – ano LIV...............27
FIGURA 6. Correio da Manhã, 6 de Agosto de 1954 – n. 18823 – ano LIV...............28
FIGURA 7. Tribuna da Imprensa. 5 de Agosto de 1954 – n. 1402 – ano VI...............29
FIGURA 8. Tribuna da Imprensa. 24 de Agosto de 1954 – n. 1418 – ano VI.............30
FIGURA 9. Ultima Hora, 24 de Agosto de 1954 – n. 979 – ano IV.............................31
FIGURA 10. Ultima Hora, 25 de Agosto de 1954 – n. 980 – ano IV...........................32
FIGURA 11. Ultima Hora, 25 de Agosto de 1954 – n. 980 – ano IV...........................33
FIGURA 12. Fotojornalismo de O Cruzeiro...............................................................39
FIGURA 13. Fotojornalismo de O Cruzeiro II.............................................................40
FIGURA 14. Foto do Deputado Barreto Pinto, publicado pela revista O Cruzeiro em
1946...............................................................................................................................42
FIGURA 15. Tribuna da Imprensa, 4 de janeiro de 1960 nº 3032 - ano XII................53
FIGURA 16. Tribuna da Imprensa, 5 de agosto de 1960 – n. 3209 – ano XII.............54
FIGURA 17. Tribuna da Imprensa, 11 de agosto de 1960 – n. 3214 - ano XII............54
FIGURA 18. Jornal Ultima Hora – n. 2676 – ano IX...................................................55
FIGURA 19. Jornal Ultima Hora – n. 3109 – ano X....................................................56
FIGURA 20. Manchete, 2 de janeiro de 1960 – n. 4022 - ano VII...............................56
FIGURA 21. Manchete, 2 de janeiro de 1960 – n. 4022 - ano VII...............................57
FIGURA 22. Manchete, 2 de janeiro de 1960 – n. 4022 - ano VII...............................57
FIGURA 23. Charge de Carlos Estevão. O Cruzeiro, 8 Out. 1960 – n. 52 – Ano
XXXII............................................................................................................................61
FIGURA 24. Charge de Appe. O Cruzeiro 19 dez. 1959..............................................61
FIGURA 25. O Cruzeiro, 6 de agosto de 1960 – n. 43 – ano XXXII...........................63
FIGURA 26. O Cruzeiro, 16 de Julho de 1960 - n. 40 - ano XXXII............................64
FIGURA 27. O Cruzeiro, 24 de Junho de 1962 – n. 37 – ano XXXIII.........................64
FIGURA 28. O Cruzeiro, 20 de agosto de 1960 – n. 45 - ano XXXII..........................65
FIGURA 29. O Cruzeiro, 20 de agosto de 1960 – n. 45 - ano XXXII..........................66
FIGURA 30. O Cruzeiro, 8 Out. 1960 – n. 52 – Ano XXXII.......................................67
FIGURA 31. O Cruzeiro, 8 Out. 1960 – n. 52 – Ano XXXII.......................................67
FIGURA 32. O Cruzeiro, 8 Out. 1960 – n. 52 – Ano XXXII.......................................68
FIGURA 33. O Cruzeiro, 15 de outubro de 1960 – n. 1 – ano XXXII.........................70
FIGURA 34. O Cruzeiro, 15 de outubro de 1960 – n. 1 – ano XXXII.........................71
FIGURA 35. O Cruzeiro, 25 de outubro de 1960 – n. 2 – ano XXXIII........................72
FIGURA 36. Ilustração impressa em toalha distribuída pela empresa Vulcan Material
Plásticos.........................................................................................................................73
FIGURA 37. O Cruzeiro, 12 de novembro de 1960, - n. 5 – ano XXXIII....................74
FIGURA 38. O Cruzeiro, 12 de novembro de 1960, - n. 5 – ano XXXIII....................74
FIGURA 39. O Cruzeiro, 5 de agosto de 1961 – n. 43 – ano XXXIII..........................75
FIGURA 40. O Cruzeiro, 12 de novembro de 1960, - n. 5 – ano XXXIII....................75
FIGURA 41. O Cruzeiro, 29 de Outubro de 1960 – n. 03 – ano XXXIII.....................77
FIGURA 42. O Cruzeiro, 19 de novembro de 1960 – n. 6 – ano XXXIII....................78
FIGURA 43. O Cruzeiro, 25 de março de 1961 – n. 24 – ano XXXIII........................79
FIGURA 44. O Cruzeiro, 1 de abril de 1960 – n. 25 – ano XXXIII.............................81
FIGURA 45. O Cruzeiro, 1 de abril de 1960 – n. 25 – ano XXXIII.............................81
FIGURA 46. O Cruzeiro, 1 de abril de 1960 – n. 25 – ano XXXIII.............................83
FIGURA 47. O Cruzeiro, 22 de abril de 1961 – n. 25 – ano XXXIII...........................84
FIGURA 48. O Cruzeiro, 15 de Julho de 1961 – n. 40 – ano XXXIII.........................84
FIGURA 49. O Cruzeiro, 9 de Setembro de 1961 – n.48 – ano XXXIII......................86
FIGURA 50. O Cruzeiro, 9 de Setembro de 1961 – n.48 – ano XXXIII......................87
FIGURA 51. O Cruzeiro, 9 de Setembro de 1961 – n.48 – ano XXXIII......................87
FIGURA 52. O Cruzeiro, 9 de Setembro de 1961 – n.48 – ano XXXIII......................88
FIGURA 53. O Cruzeiro, 7 de Outubro de 1961 – n. 52 – ano XXXIII......................89
FIGURA 54. O Cruzeiro, 7 de Outubro de 1961 – n. 52 – ano XXXIII......................90
FIGURA 55. O Cruzeiro, 11 de Novembro de 1961 – n. 5 – ano XXXIV..................91
FIGURA 56 O Cruzeiro, 4 de Novembro de 1961 – n. 4 – ano XXXIV.....................91
FIGURA 57. O Cruzeiro, 4 de Novembro de 1961 – n. 4 – ano XXXIV....................92
FIGURA 58. O Cruzeiro, 4 de Novembro de 1961 – n. 4 – ano XXXIV....................92
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................... 10
1. IMPRENSA, POLÍTICA E O CRUZEIRO NOS ANOS CINQUENTA .................................................................................................
14
1.1 A SUBJETIVIDADE POLÍTICA DA MÍDIA IMPRESSA BRASILEIRA E SUAS TRANSFORMAÇÕES NOS ANOS CINQUENTA
1.2 O CRUZEIRO: UM DIFERENCIAL ENTRE AS REVISTAS BRASILEIRAS ................................................................................................
35
2. JÂNIO QUADROS: A IMAGEM DE UM POLÍTICO ......................... 44 2.1 DE JÂNIO A JANUS: A CONSTRUÇÃO DE UMA IMAGEM (1947-1960) .....................................................................................................
2.2 O GOVERNO DE JÂNIO QUADROS: O CRUZEIRO APRESENTA O HOMEM COMO ELE É ..................................................................................
60
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................ 94 FONTES ......................................................................................................... 97 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................ 99
10
INTRODUÇÃO
Para alguns pesquisadores a memória coletiva, entendida como “o trabalho
que um determinado grupo social realiza, articulando e localizando as lembranças em
quadros sociais comuns” 1, funciona como uma “espécie de acervo de lembranças
compartilhadas”. Ao se tratar da memória coletiva existente sobre a personalidade
política de Jânio Quadros, construída durante seu mandato como presidente da
República no Brasil em 1961, pode-se perceber que este “acervo”, em certos
momentos, carece de sentidos políticos.
Por ser considerado pelos seus ex-opositores como um louco que se promovia
apenas através de sua demagogia, a imagem de Jânio Quadros na atualidade, é
frequentemente associada à proibição das rinhas de galo; à condecoração do
guerrilheiro Ernesto Che Guevara em pleno estado de Guerra Fria ou aos seus
extravagantes e acusadores discursos, acompanhados de ratos engaiolados e
sanduiches de mortadela durante a campanha presidencial. Enfim, a imagem de um
político polêmico que beirava o desequilíbrio psicológico ainda é muito presente
quando se trata de Jânio Quadros.
Por outro lado, sua meteórica ascensão política e a conquista gradual de um
eleitorado de números expressivos e compostos por grupos de interesses tão
diversificados demonstram que os significados políticos que envolveram a imagem de
Jânio não foram poucos e nem superficiais.
Desta maneira, é fácil notar que múltiplos são os sentidos atribuídos pelas
mais variadas construções imagéticas de Jânio Quadros. Em livros didáticos, artigos
científicos ou obras de outros gêneros, vários são os significados presentes nestas
produções que se misturam e dão forma a uma intrigante figura da história política
brasileira. Em um mesmo texto Quadros pode ser citado como um sensato e hábil
político sem deixar de configurar um demagogo que se promovia exclusivamente
através de seu personalismo. Ambígua e às vezes controversa, a confusa imagem de
Jânio Quadros, construída ao longo de sua carreira, foi um resultado de seus próprios 1 SCHMIDT, Maria Luisa Sandoval; MAHFOUD, Miguel. Halbwachs: memória coletiva e experiência. In: Psicologia USP v. 4 n. 1-2. São Paulo: USP, 1993. (Paginação Irregular) Disponível em: <www.scielo.com.br> Acesso em: 27 de Abr. 2015.
11
discursos somado aos de seus opositores e aos discursos da grande imprensa2, sendo
este último, mais especificadamente o discurso da revista O Cruzeiro, o objeto desta
pesquisa.
No Brasil, desde a primeira metade do século XIX a mídia impressa se
apresentou como um dos principais veículos de ligação entre o cotidiano nacional e o
universo político, construindo, assim, uma complexa relação entre imprensa e poder
que ainda persiste nos dias atuais. Atribuindo os mais diversos sentidos às mais
variadas situações que envolvem as relações sociais rotineiras, os periódicos sempre se
mostraram como agentes dinâmicos e subjetivos que se transfiguram e ganham
específicas características que se definem conforme o contexto sociocultural aos quais
estes pertencem. Nesse sentido, em um primeiro momento, esta pesquisa buscou
mostrar de que forma este importante veículo de informação se correlacionou com o
singular cenário político brasileiro dos Anos Dourados (1950-1959), objetivando
oferecer ao leitor uma breve discussão referente à força política dos periódicos
nacionais para preparar, dessa forma, o campo teórico-metodológico necessário para a
análise da construção imagética que a mídia impressa veiculou a respeito do
candidato/presidente Jânio Quadros.
No entanto, compreendendo a impossibilidade de abranger totalmente a mídia
impressa nacional, coube aqui eleger um representante deste veículo para o
desenvolvimento desta investigação. Dentro desta lógica e tendo em vista que JQ –
como era chamado pela imprensa periódica – foi alvo frequente dos jornais correntes
durante boa parte de sua trajetória no universo político e, sobretudo, das revistas
ilustradas de variedades, optou-se por privilegiar a produção editorial da revista O
Cruzeiro, líder de vendas desse formato no país entre 1940 e 1960. Assim, esta
pesquisa se voltou essencialmente para a análise da imagem propagada por tal
periódico a respeito do candidato/presidente Jânio Quadros (1960-1961).
2 Segundo, a historiadora Tania Regina de Luca, de forma genérica, o termo grande imprensa “designa o conjunto de títulos que, num dado contexto, compõe a porção mais significativa dos periódicos em termos de circulação, perenidade, aparelhamento técnico, organizacional e financeiro.” In: DE LUCA, Tania Regina. A Grande Imprensa no Brasil da Primeira Metade do Século XX. In: IX Congresso Internacional da Brazilian Studies Association (BRASA), Louisiana: Tulane University, 27 a 29 de mar. 2008, p. 1.
12
O interesse em eleger O Cruzeiro como fonte primária desta investigação –
tornando-a aqui uma referência da produção midiática daquela época – envolveu mais
que sua considerável presença no mercado editorial nas décadas de cinquenta e
sessenta. A revista, além de conquistar um grupo heterogêneo de leitores, contava com
diversos métodos de atração. Com um bom uso de charges e fotografias nas
apresentações de figuras políticas, este periódico tonou-se referência de humor, assim
como da produção fotojornalística daquele período: componentes significativos para a
pesquisa proposta.
Em vista disto, além da contextualização a respeito das relações entre mídia e
política, fez-se necessário, em um segundo momento, apontar quais as principais
características da revista O Cruzeiro que contribuíram para que esta se tornasse um
dos veículos de informação mais populares do país na segunda metade do século XX,
apresentando assim as suas particularidades.
Por conseguinte, entendendo que a apresentação deste personagem e a análise
de seus posicionamentos políticos, assim como o de seus opositores perante suas
ações, eram fundamentais para o cumprimento dos objetivos aqui propostos, o
segundo capítulo deste estudo monográfico iniciou com uma breve análise da
construção da imagem política de Jânio entre seu primeiro cargo como vereador de
São Paulo em 1947 até sua candidatura à Presidência da República em 1960.
Por fim, a análise das fontes primárias ordenou a última parte desta pesquisa.
Neste momento da investigação foram analisados cerca de 30 números da revista O
Cruzeiro, publicados entre janeiro de 1960 a outubro de 1961, que se encontram no
Acervo de Periódicos da Biblioteca Pública do Paraná. O trabalho com as fontes se
deu por meio de uma verificação detalhada do objeto e de uma organização
cronológica, que envolveu a análise de fotografias, charges e textos.
Esta pesquisa monográfica foi guiada por alguns historiadores que produziram
trabalhos sobre a mídia impressa brasileira, como por exemplo, Maria Helena Rolim
Capelato e Marialva Barbosa. Além disso, como suporte teórico, foram consideradas
as indicações do historiador Roger Chartier sobre práticas e representações culturais,
no qual buscou-se os subsídios necessários para discutir de que forma as
representações de mundo, oferecidas pela imprensa nacional, traduziam uma forma de
13
apropriação da realidade e ultrapassavam os limites impostos por uma manipulação
voluntária do real por parte destes veículos informativos, além de estar atravessadas
por noções de poder.
Nesse sentido, essa pesquisa monográfica se dividiu em dois capítulos. O
primeiro capítulo buscou evidenciar a subjetividade política da imprensa brasileira,
contextualizar a relação entre imprensa e política dos anos cinquenta e sessenta e
discutir os métodos de abordagem da revista O Cruzeiro. Já o segundo capítulo,
discutiu como se deu a construção da imagem de Jânio Quadros por meio de seus
discursos e de seus opositores, e por fim identificou qual a imagem do ex-presidente
projetada pela revista O Cruzeiro.
Por fim, esta pesquisa ao privilegiar as imagens construídas para Jânio
Quadros, buscou despertar novas indagações sobre esta personagem que se atreveu a
enfrentar o conservadorismo político em âmbito nacional ao criar comissões de
inquéritos, assim como a Lei Antitruste com o objetivo de combater a corrupção e
disciplinar as remessas de lucro para o exterior; e que no âmbito internacional
promoveu a projeção do Brasil após acordos firmados com vários países, sobretudo do
lado oriental, devido à criação da Política Externa Independente (PEI), uma das
dimensões mais avançadas de seu governo.
Mesmo adotando medidas que alteravam os rumos políticos da Nação, Jânio
Quadros não conseguiu preservar a imagem que alto-construiu, sendo lembrado por
muitos brasileiros como o político que ao invés de “varrer a bandalheira” foi
acometido por “forças terríveis” renunciando ao cargo de Presidente da República do
Brasil.
14
1 IMPRENSA, POLÍTICA E O CRUZEIRO NOS ANOS CINQUENTA.
1.1 A SUBJETIVIDADE POLÍTICA DA MÍDIA IMPRESSA BRASILEIRA E
SUAS TRANSFORMAÇÕES NOS ANOS CINQUENTA
De fato, se a imprensa diária, tal como acontece com outros grupos profissionais, tivesse de pendurar um letreiro, seus dizeres deveriam ser os seguintes: aqui homens são desmoralizados com maior rapidez possível, na maior escala possível e ao preço mais baixo possível.
(Soren Kierkegaard, 1848) 3
A forte crítica do filósofo dinamarquês Soren Kierkegaard, sobre a imprensa
diária do século XIX permite problematizar a ideia de que a mídia impressa oferece
imagens parciais, subjetivas e de que está sempre cercada de interesses que vão além
da exposição do mundo “tal qual ele é”, não pertence aos dias atuais.
No Brasil, os primeiros julgamentos acerca da forma como a imprensa se
apropriava dos fatos, ocorriam paralelamente aos alertas de Kierkegaard. Entre fins do
século XIX e início do século XX, por exemplo, Rui Barbosa criticou de forma
agressiva a mídia impressa brasileira chamando-a de “obra da mentira”. Acreditando
que os jornais eram responsáveis pela disseminação de uma “verdade absoluta”, o
polímata brasileiro sentiu-se decepcionado ao perceber as parcialidades da imprensa
que, para ele, era a “vista da nação”. Júlio de Mesquita, proprietário do jornal Estado
de São Paulo em 1890, que também acreditava na responsabilidade absoluta da mídia
impressa, denunciou os “males da imprensa” ao deparar-se com a subjetividade
política de alguns chargistas por se venderem ao governo vigente4.
No decorrer do século XX, a própria historiografia ofereceu forte resistência
sobre a possibilidade de se escrever história por meio dos jornais, reconhecendo nos
impressos uma série de empecilhos para uma análise objetiva e imparcial. Em um
momento em que a busca pela “verdade” das fontes era o objetivo do historiador, não é
3 In: RIBEIRO, Alex. Caso Escola Base: os abusos da imprensa. São Paulo: Ática, 1995, p. 5. 4 CAPELATO, Maria Helena. Imprensa e História do Brasil. São Paulo: Contexto, 1988, p. 59.
15
difícil decifrar os motivos que levaram a tamanha resistência no uso de jornais e
revistas na formação do conhecimento histórico. Afinal,
o historiador [...] devia valer-se de fontes marcadas pela objetividade, neutralidade, fidedignidade, credibilidade, além de suficiente distanciamento de seu próprio tempo. [...] Nesse contexto, os jornais pareciam pouco adequados para recuperação do passado, uma vez que essas ‘enciclopédias do cotidiano’ continham registros fragmentados do presente, realizados sob o influxo de interesses, compromissos e paixões. 5
A imprensa escrita passou a ser caracterizada enquanto fonte histórica apenas
nas décadas finais do século XX, por meio das alterações na prática historiográfica
proporcionadas pela terceira geração dos Annales, que reconheceu na mídia impressa
grande relevância para as perspectivas políticas e culturais da história. A historiadora
Tania Regina de Luca, ao escrever sobre esse processo, afirmou que,
[...] as renovações no estudo da História política, por sua vez, não poderiam dispensar a imprensa, que cotidianamente registra cada lance dos embates na arena do poder. Os questionamentos desse campo, imbricados com os aportes da História cultural, renderam frutos significativos. 6
Nesse sentido, muito dessa resistência, por parte da historiografia, em
reconhecer o valor da mídia impressa enquanto fonte para produção do conhecimento
histórico, deveu-se ao evidente caráter parcial dos jornais e revistas. Posicionamento
superado a partir do reconhecimento de que os impressos eram documentos detentores
de uma considerável importância para as interpretações do cotidiano, desde que
pautados pelas rígidas e bem definidas regras metodológicas que envolvem a produção
histórica.
Hoje, há um consenso na historiografia que reconhece na imprensa escrita um
“manancial dos mais férteis para o reconhecimento do passado” 7, mas não ignora a
subjetividade da mídia impressa que implica riscos para o historiador que deve abster-
se o máximo possível da abordagem tendenciosa de seu objeto de estudo.
5 PINSKY, Carla B. (org). Fontes Históricas. 2ºed. São Paulo: Contexto, 2008, p. 111-112. 6 Id. Ibid., p.128 7 CAPELATO, op. cit. p. 13.
16
A face distorcida dos impressos, citada por Kierkegaard, Rui Barbosa, Júlio
de Mesquita e rejeitada pela historiografia tradicional, não se perdeu com o tempo e
ainda permanece presente nos dias atuais, mas, diferentemente do que ocorria, não se
atribui mais à imprensa a função de um agente disseminador de uma “verdade
absoluta”.8 Apesar dos julgamentos ainda permanecerem pautados por modelos de
perfeição, hoje se reconhece a impossibilidade de uma abordagem ausente de qualquer
tipo de parcialidade por parte da mídia impressa, ao tempo que não se ignora os efeitos
de sua atuação, sobretudo no universo da política.
A história política do Brasil Republicano oferece exemplos relativamente
frequentes que demonstram as consequências da ação parcial da imprensa na política
brasileira. Atendo-se apenas ao início do regime e à primeira metade do século XX,
pôde-se verificar inúmeras situações em que a mídia foi de grande colaboração para
alguns desfechos na história brasileira.
Em 1889, por exemplo, “feita a Proclamação, coube imprensa o ‘dever
patriótico’ de explicar ao povo que não se tratava de uma ditadura militar”.9 Na
ocasião, “o Estado de São Paulo [...] informou que nesse governo composto por oito
membros apenas três eram militares, sendo mais republicano do que militar”.10
Tempos mais tarde, durante a crise política dos anos 20 mais uma vez, a atuação dos
jornais foi decisiva para o processo político que culminou na “revolução” de 1930:
A imprensa, que tivera um papel significativo na mudança do regime, traduzia os descontentamentos. Na maior parte dos jornais, os elogios e esperanças de outrora cederam lugar as críticas. Afirmava-se com frequência, que o projeto republicano não se concretizaria e diante disso, propunha-se a republicanização da República.11
Anos depois, durante o Estado Novo, “Vargas procurou conquistar os
representantes da imprensa de duas maneiras: reprimindo-os e adulando-os”. 12 Os
8 id. ibid., p. 61 9 id. ibid., p. 43. 10 id. ibid., p. 44. 11 CAPELATO, op. cit. p. 45. 12 id. ibid., p. 48.
17
jornais, na ditadura estadonovista, se tornaram uma importante ferramenta tanto para a
manutenção do regime, quanto para sua queda em 1945. 13
Nesse sentido, torna-se relevante pensar a imprensa não apenas como um
meio informativo subjetivo dotado de interesses quaisquer, e sim enquanto uma
complexa força política com interesses bem definidos. Para Maria Helena Capelato,
desde sua origem, a imprensa se impôs como força política e, por isso, no decorrer da
história, se tornou uma essencial ferramenta para os governantes. 14 Pontuando sobre o
mesmo assunto, a pesquisadora Bethânia Mariani, em seu estudo sobre a relação entre
a imprensa e o Partido Comunista do Brasil (PCB), chegou a comparar a mídia ao voto
de cabresto, devido a sua influência nas decisões políticas entre os anos de 1922 e
1989. Para a historiadora, “se o famoso ‘voto de cabresto’ era, e ainda é, responsável
pelo resultado de muitas eleições, é a mídia, [...], que muito contribui na função de
eleger os políticos e mantê-los ou não no poder”. 15
Já para a pesquisadora Maria de Carvalho Nastri, a mídia impressa detém “o
poder de dizer e de silenciar, de julgar e de eleger quem participa ativamente da
definição do conhecimento, assim como quem é excluído desse processo”, e
confirmou a subjetividade da imprensa ao afirmar que a mídia é partidária de uma
dada ideologia; o que significa que ela opta “por uma situação no mundo”, ou seja, a
imprensa é “parcial com o que se acredita ou com o que se optou por defender por um
motivo ou por outro”. 16
No campo da política isso surge de forma muito clara: ao mencionar ideais
partidários ou de candidatos políticos, a imprensa usa de estratégias que apresentam
seus entendimentos e articula “uma concepção que visualiza os leitores como sujeitos
quase passivos diante da notícia”, o que sugere que à imprensa cabe “o papel de
13 id. ibid., p. 48. 14 id. ibid., p.13. 15 MARIANI, Bethania. O PCB e a Imprensa: os comunistas no imaginário dos jornais (1922-1989). Rio de Janeiro: Revan, 1998, p. 18. 16 CARVALHO, Maria T. Nastri. A ideologia e a Mídia Impressa. In: Olhares sobre o ano de 1968 nas lentes da revista O Cruzeiro e Flama: uma abordagem da análise do discurso. 2008. 256 f. Tese (Doutorado em Linguística). Departamento de Linguística da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2001, p. 41.
18
induzi-los a pensar e, em consequência, atuar como atores políticos”. 17 Em outras
palavras, a imprensa “seleciona, ordena, estrutura e narra, de uma determinada forma,
aquilo que se elegeu como digno de chegar até o público” 18 e, por isso, ocupa uma
posição delicada e de essencial importância na produção da história política.
Mesmo considerando a existência de um movimento da imprensa em direção à
objetividade e imparcialidade, seguindo as orientações de Capelato, cabe aqui lembrar
que “o jornalismo não é ciência”, pois existem nele valores estéticos e subjetivos,
conduzindo o jornalista da atualidade a admitir as limitações de seu ofício e a
reconhecer a dimensão do seu papel. 19
Nesse sentido pode-se inferir que a impossibilidade de uma total neutralidade
na produção jornalística é reconhecida, e entende-se que essa não é uma limitação
exclusiva do jornalismo, pois vai além e aquém das páginas dos impressos. De acordo
com Roger Chartier, quaisquer representações sociais de mundo – o que inclui as
produzidas pela imprensa –, mesmo fundadas em uma razão, são sempre determinadas
por aqueles que as inventam, ou nas palavras do historiador:
As percepções sociais não são de forma alguma discursos neutros: produzem estratégias e práticas que tendem a impor uma autoridade à custa de outros, a elas menosprezados, a legitimar um projeto reformador ou a justificar, para os próprios indivíduos as suas escolhas e condutas. 20
Sendo assim, pode-se afirmar que, por mais que exista uma autonomia do
jornalista em busca da imparcialidade, sua produção sempre será determinada por sua
concepção mental de realidade, suas interpretações de mundo. Além disso, a
apropriação de uma produção está ligada a forma “como conferimos sentidos e
significações às coisas de nosso dia-a-dia”. 21 Exemplificando melhor, o jornalista, ao
17 BARBOSA, Marialva. História Cultural da Imprensa: Brasil, 1900-2000. Rio de Janeiro: Mauad X, 2007, p.181. 18 PINSKY, (org). op. cit., p.139. 19 CAPELATO. op. cit. p.61 20 CHARTIER, Roger. História Cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990, p. 17. 21 MONTEIRO, Júlio Altiere. Uma Análise da Obra de Roger Chartier Sobre a História da Leitura. In: XV Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste: estudos interdisciplinares da comunicação. São Paulo: Intercom. Disponível em: <http://www.intercom.org.br/>. Acesso em: 21 de março de 2015.
19
deparar-se com um fato base de sua matéria, apropria-se deste objeto e lhe confere um
sentido de acordo com as suas expectativas. A forma como um determinado fato irá se
apresentar nas páginas de um jornal ou de uma revista dependerá diretamente de como
o jornalista apropriou-se deste fato e lhe atribuiu valor, e mesmo que esteja
determinado a chegar a uma suposta imparcialidade, as suas concepções mentais da
realidade irão ser decisivas na forma como se apropriará e fará uso de seu objeto.
Dessa forma, o sentido que a imprensa dá a matéria está diretamente relacionado ao
cenário sociopolítico e cultural que ela está inserida.
A imprensa no Brasil dos anos cinquenta e sessenta não fugiu a esta regra e
apresentou-se como resultado do contexto histórico ao qual estava inserida, pois os
Anos Dourados (1950-1960) criaram uma “nova imprensa brasileira”. 22
Naquele momento, enquanto o Brasil se recuperava das marcas deixadas pela
Segunda Grande Guerra e consumia seus esforços para consolidar a democracia, a
sociedade assistia as transformações em diversos setores geradas pelas inovações
tecnológicas. A imprensa nacional, por sua vez, se modificava na mesma velocidade
que a indústria cultural crescia e se instalava definitivamente no país.
Neste período, mais precisamente em 18 de setembro de 1950, estreando o
veículo de comunicação que se tornaria o mais influente da cultura brasileira, foi ao ar
a primeira transmissão de televisão no país: a TV TUPI. Os impressos não ficaram para
trás e encabeçado pelo jornal Última Hora, de Samuel Wainer, reformularam seus
métodos de transmissão de informação. As transformações referiam-se aos novos
métodos de atração acometidos pela imprensa, que incluíam as diferentes formas de
diagramação, exploração de charges e o crescente uso das fotografias – estratégia de
considerável relevância na formação do que mais tarde se concretizaria sob a
denominação de fotojornalismo. Assim sendo percebe-se que:
[...] a partir da experiência da Ultima Hora vários jornais procuraram modernizar-se. Na segunda metade deste século, os artifícios de sedução do público se sofisticaram. A concorrência com os veículos de comunicação de massa eletrônicos obrigou os jornais a reestruturarem sua roupagem gráfico-editorial. 23
22 BARBOSA. op. cit., p. 149 23 CAPELATO. op. cit., p.16
20
As mudanças dentro das redações visavam, acima de tudo, legitimar o
jornalismo “como fala autorizada em relação à constituição do real”. 24 O objetivo dos
jornais consistia em aproximar o leitor e se apresentar como objeto confiável ao seu
público e, ao introduzirem novos padrões de abordagem, os jornais reforçaram sua
imagem enquanto agentes neutros, legitimando assim, sua função como “transmissores
fieis da realidade” para seus leitores. Ou seja, as transformações acima citadas
consolidaram o papel da mídia como agente responsável pela difusão de informação.
Ao buscar isenção de qualquer tipo de parcialidade, disfarçando suas intenções e
ganhando credibilidade, a mídia se tornou uma força política ainda mais contundente 25 e as gerações políticas entre 1950 e 1960 se depararam com uma imprensa melhor
equipada e mais eficaz.
A nova imagem obtida pela mídia impressa, com o auxílio de sua crescente
abrangência, fez dela um instrumento político ainda mais eficaz, construindo um
espaço de neutralidade absoluta para imprensa, conduzindo a percepção de que, a
imprensa brasileira, assim como sua relação com a política, se transformou naquele
específico momento dos anos cinquenta. Ao atualizarem novas técnicas editoriais e
colocarem em prática o discurso modernizador e desenvolvimentista dos Anos
Dourados, os jornais legitimaram sua fala e maquiaram sua subjetividade, afetando
diretamente a sua relação com a política. No entanto, esta relação se consolidava antes
mesmo de Juscelino Kubitschek subir ao poder e o exemplo mais emblemático da
atuação da imprensa no campo político pode ser constatado em 1954, quando do
suicídio do presidente Getúlio Vargas.
Em 1950, ao retornar à presidência do Brasil, por meios democráticos e sob
uma forte oposição, o então presidente Getúlio Vargas vislumbrou novamente nos
periódicos uma forma de manter a situação ao seu favor. Anos antes, a imprensa já
havia oferecido ao ex-ditador bons exemplos de sua capacidade ao quebrar a censura
imposta pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) e contribuir para a crise
que enfrentava o Estado Novo. Naquele momento, toda a contestação que o governo
24 BARBOSA. op. cit., p. 150. 25 id. ibid., p. 151-154.
21
sofria, por parte de profissionais liberais, estudantes, intelectuais, empresários e alguns
setores das Forças Armadas, acabou conquistando ainda mais força quando publicada,
em fevereiro de 1945, pelo jornal Correio da Manhã, uma entrevista criticando
fortemente o governo federal e a imagem de Vargas. Essa entrevista tornou-se um
marco do rompimento a censura imposta pelo DIP. 26
A influência da mídia foi de grande importância no desenrolar dos
acontecimentos que se seguiram. Se por um lado haviam impressos como O Jornal,
que veiculavam matérias de apoio ao Movimento Queremista27, por outro lado alguns
jornais de oposição chegaram a festejar a deposição do político por meio de expressões
que enfatizavam “o ressurgimento da luz” enquanto outros equipararam a queda do
ditador ao advento da República. 28
No entanto, em 1950, ao reassumir o cargo de Presidente da República,
Vargas garantiu o apoio da imprensa por meio de Samuel Wainer. Juntos, presidente e
jornalista, articularam a criação do jornal Última Hora com o objetivo de gerar uma
oposição à “conspiração do silêncio”, imposta pela imprensa após a sua deposição em
1945. 29 Samuel Wainer, anos mais tarde, ao relembrar como se deu a parceria com o
então presidente, escreveu sobre a visão que tinha de seu próprio jornal dentro naquele
período. Nas palavras do jornalista:
O Ultima Hora veio romper a tradição oligárquica da grande imprensa e dar início a um tipo de imprensa popular que não existia no Brasil. Até 1950, a opinião publica brasileira era dominada por meia dúzia de jornais, pertencentes a famílias tradicionais, há mais de meio século. 30
Embora o jornalista tenha recorrido a sua memória para conceder esta
entrevista, não se pode negar as inovações do Ultima Hora e a sua importância na
reforma de todo o setor jornalístico dos anos 50. O uso da cor nas manchetes, a nova
26 DELGADO, Marcio de Paiva. O ‘Golpismo Democrático’ Carlos Lacerda e o Jornal Tribuna da Imprensa na quebra da legalidade (1949-1946). (2006) 162 f. Dissertação (Mestrado em História). Instituto de Ciências Humanas, Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2006, p.40. 27 Movimento popular, representado principalmente pela classe trabalhadora, que desejava uma “Constituinte com Getúlio”, ou seja, a permanência de Vargas no poder. 28 CAPELATO. op. cit., p.50. 29 BARBOSA. op. cit., p.170. 30 WAINER, Samuel. apud. In: BARBOSA. id. ibid., p.171.
22
diagramação acompanhada de maiores espaços destinada à fotografia e a retomada das
caricaturas deram origem a mais completa inovação feita por um periódico carioca até
então31, transformações facilmente percebidas se comparado aos demais jornais
daquela época, como por exemplo o Correio da Manhã
FIGURA 1.
Correio da Manhã, 18 de fevereiro de 1945 – n. 15428 – ano XLIV.
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
31 BARBOSA. id. ibid., p. 173.
23
FIGURA 2 Ultima Hora, 9 de janeiro de 1952 – n. 177 – ano II.
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
A história do UH aponta que o jornal surgiu com o intuito de apoiar Vargas, e
seus novos métodos de atração serviram muito bem à causa do ex-ditador. Afinal,
Getúlio estava então em seu segundo governo, eleito com apoio das camadas populares, mas ignorado pela grande imprensa, que buscava minar seu governo através de um cerco de silêncio. A solução encontrada para furar o bloqueio foi criar um periódico que o apoiasse, tarefa delegada a Wainer, jornalista famoso e experimentado, que faria de seu jornal um veículo popular de qualidade, fato inédito no país. 32
32 LOUSADA Silvana. Agosto, Mês do Desgosto: a crise de 1954 nas fotografias de ‘Ultima Hora’. In: Encontro Nacional de História da Mídia: mídia alternativa e alternativas midiáticas. 11, 2011, Fortaleza. Anais... Rio Grande do Sul: UFRGS, p.15. Disponível em: < www.lume.ufrgs.br>. Acesso em: 14 out. 2014.
24
Mas para toda ação há uma reação e neste caso específico, Vargas teve uma
oposição política à altura representada pelo jornalista Carlos Lacerda que atuou
significativamente expressando os interesses da União Democrática Nacional (UDN),
ao combater o governo e seu porta voz: o jornal de Samuel Wainer. 33
Carlos Lacerda, integrante UDN, partido que expressava a união “das
principais forças políticas contrárias a Getúlio Vargas e defensora da democracia”,
conseguiu abrir, em 1949 – com o apoio de udenistas e de outros setores
conservadores – o jornal Tribuna da Imprensa, que se tornaria um dos mais
expressivos meios de oposição a Vargas. 34
As divergências e intensa oposição entre o Última Hora e Tribuna da
Imprensa, marcaram a produção jornalística, pois, conforme destacou Marialva
Barbosa, a disputa entre os dois jornais se intensificou
[...] na medida em que UH se afirm[ou] no mercado jornalístico como jornal de grande circulação. A partir daí, uma campanha sem tréguas, contra o UH e, sobretudo contra Getúlio Vargas, na esteira da Tribuna da Imprensa, é empreendida pelos mais importantes jornais do Rio de Janeiro que formam um bloco de poder contra Vargas nos últimos meses em que esteve à frente do Catete, na crise política de 1953-1954. 35
A imprensa carioca de modo geral, excluindo o Ultima Hora, produziu
inúmeras críticas ao segundo governo Vargas, destacando temas como a corrupção e a
moralidade. O momento crítico dessa situação, que conduziu a uma crise sem
proporções e resultou no suicídio de Vargas, teria Carlos Lacerda como um dos seus
protagonistas.
Em 1954, a oposição – estampada principalmente nas páginas da Tribuna da
Imprensa – já direcionava a visão de muitos brasileiros para as aparências mais fracas
do governo 36. Após o atentado da Rua Toneleros, uma tentativa de assassinato
direcionada a Carlos Lacerda que vitimou o major da Aeronáutica, Rubens Florentino
33CAPELATO. op. cit., p.60. 34 DELGADO op. cit., p.41. 35 BARBOSA. op. cit., p.181. 36 id. ibid., p.181
25
Vaz, na o presidente foi acusado duramente de ser o mandante, o governo de Varga
declinou, ainda mais, em sua crise.
Durante este episódio, a forma como a imprensa de oposição apresentou seu
discurso foi decisiva para a leitura negativa do governo naquele momento. Os jornais
deram um ritmo aos seus discursos que iniciava com comoção, passando a indignação
para finalizar com o apelo emergencial para que o caso fosse solucionado o mais
rápido possível. Ao generalizar a revolta da sociedade por meio de expressões como “o
povo”, “a multidão” e “cidade”, os periódicos impulsionaram as críticas que o governo
Vargas vinha sofrendo nos últimos anos.
FIGURA 3. Tribuna da Imprensa. 5 de Agosto de 1954 – n. 1402 – ano VI.
+ Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
26
FIGURA 4 Diário Carioca, 6 de Agosto de 1954 – n. 8001 – ano XXVI.
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
A estratégia utilizada pela mídia para legitimar a fidedignidade de seu relato
constituiu em mostrar “pela descrição pormenorizada, o repúdio da população ao
atentado e a coragem dos que se opõem ao governo” 37. Os jornais de oposição a
Getúlio Vargas reproduziram um discurso no qual a noção de população englobou,
sem discriminação, homens e mulheres, civis e militares, produzindo a ideia da criação
de um grupo que deixou suas diferenças de lado em prol de um país livre da violência
e da corrupção. 38
37 BARBOSA. op. cit., p. 182 38 id. ibid., p.183
27
FIGURA 5. Correio da Manhã, 6 de Agosto de 1954 – n. 18823 – ano LIV
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
28
FIGURA 6. Correio da Manhã, 6 de Agosto de 1954 – n. 18823 – ano LIV
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
Além do discurso, é possível perceber que os impressos fizeram bom uso
também da fotografia e da nova diagramação que proporcionavam manchetes melhor
elaboradas. As edições de jornais distribuídas nas semanas seguintes ao atentado
apresentavam manchetes acompanhadas de fotografias que preenchiam boa parte da
primeira página, além de enunciados em letras garrafais e bem distribuídas. O Tribuna
29
da Imprensa, por exemplo, apresentou seus jornais com palavras de ordem como
“renúncia” com fotografias de Vargas acompanhado de supostos envolvidos no crime.
FIGURA 7. Tribuna da Imprensa. 5 de Agosto de 1954 – n. 1402 – ano VI
. Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
Porém, 19 dias após o atentado da Rua Toneleros, o suicídio de Vargas, em
24 de agosto de 1954, fez com que os discursos que, em sua maioria, atacavam o ex-
presidente, se invertessem. A mídia impressa abriu mão das fortes críticas ao governo
e optou por prestar homenagens ao líder que se matara para se comprometer ainda
mais com a delicada situação. Porém, os jornais que apoiavam Getúlio – assim como
fizeram quando se apropriaram da morte de Rubens Vaz – exploraram até os últimos
30
estágios da comoção popular e os periódicos que expressavam uma posição explícita
contra o líder sofreram graves consequências: a Tribuna da Imprensa e O Globo, por
exemplo, foram alvos da fúria dos populares que se manifestaram por meio de
apedrejamentos e incêndios contra o patrimônio destes jornais. 39
O jornal de Carlos Lacerda buscou atenuar os ataques desejando “paz à alma
de Getúlio Vargas”, mas lembrou de que a morte do líder também significaria “paz na
terra, no Brasil e ao seu atribulado povo” 40, em uma clara alusão a reação de
populares que se comoveram com a trágica morte do presidente.
FIGURA 8. Tribuna da Imprensa. 24 de Agosto de 1954 – n. 1418 – ano VI.
(Fig. 8) Tribuna da Imprensa. 24 de Agosto de 1954 – n. 1418 – ano VI.
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
39 CAPELATO. op. cit., p.52. 40 SUICIDOU-SE Getúlio Vargas. In: Tribuna da Imprensa. Rio de Janeiro, p. 1, 24 ago. 1954. Disponível em: <bndigital.bn.br> Acesso em: 27 de mar. 2015.
31
Já o Ultima Hora enalteceu o líder ao tempo que apresentou um forte discurso
de comoção de “chefes e mães de famílias” que não podiam conter suas lágrimas. A
atuação do jornal naquele momento visou mostrar a empatia de seus idealizadores à
“dor de um povo humilde” que havia perdido seu “grande presidente”, 41 além de
publicar em primeira mão a carta-testamento do ex-líder. Mais uma vez a fotografia e
a diagramação chamam a atenção nas manchetes.
FIGURA 9. Ultima Hora, 24 de Agosto de 1954 – n. 979 – ano IV
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
41 O PRESIDENTE Cumpriu a Palavra : Só Morto Sairei do Catete. In Ultima Hora. Rio de Janeiro. p.1-2, 24 ago. 1954. Disponível em: <bndigital.bn.br> Acesso em: 27 de mar. 2015.
32
FIGURA 10. Ultima Hora, 25 de Agosto de 1954 – n. 980 – ano IV
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
33
FIGURA 11. Ultima Hora, 25 de Agosto de 1954 – n. 980 – ano IV
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
O suicídio de Vargas não implicou necessariamente no fim dos ataques dos
jornais de oposição aos associados ao ex-presidente. Por meio da Tribuna da
Imprensa, Calos Lacerda deu continuidade as suas críticas e de opôs ao governo
seguinte. O jornalista fez o que pôde para criar as condições necessárias para que
impedissem Juscelino Kubitschek de assumir a presidência, mas desta vez, “a oposição
lacerdista e da Banda de Música da UDN, presente durante todo o período, foi incapaz
de gerar crises institucionais, como já havia conseguido”. 42
42 DELGADO. op. cit., p. 101
34
De qualquer forma, as atuações dos jornais cariocas, durante os 19 dias que
envolveram o atentado da Rua Toneleros e o suicídio de Getúlio Vargas, podem ser
vistas como ricos exemplos da atuação política da mídia impressa, como também
auxiliam na percepção de como as novas técnicas de atração marcaram as redações da
década de 1950 e serviram aos propósitos dos jornais. O jogo de interesses, que
envolveu a rápida inversão dos discursos, mostrou como a imprensa brasileira se
portava em períodos de instabilidades políticas. O próprio jornal Tribuna da Imprensa,
por exemplo, que chegou a acusar diretamente Vargas de assassinato, após o suicídio
do presidente, prestou homenagem ao líder, visando a reconquistar o apoio popular.
Como num jogo de xadrez, os impressos obrigaram-se a mudar suas
estratégias conforme o imprevisível cenário político definia as suas jogadas. No caso
específico deste turbulento episódio da política brasileira, a imprensa se apresentou,
novamente, enquanto um forte agente político, mais atrativo e melhor equipado,
movido por um discurso parcial condicionado pelo o que seus idealizadores
acreditavam ou optaram por defender de acordo com seus interesses.
35
1.2 O CRUZEIRO: UM DIFERENCIAL ENTRE AS REVISTAS BRASILEIRAS
Jamais houvera em toda a América do Sul uma publicação com tal apuro gráfico. [...] O Cruzeiro inovava também no conteúdo editorial, abrangendo enorme diversidade de assuntos. Era impresso em ótimo papel e a diagramação obedecia a um critério de grande audácia e beleza, com lindas ilustrações, desenhos e fotografias.
(Accioly Netto, 1998) 43
As origens da revista O Cruzeiro, em 1928, se conectam diretamente com o
processo de modernização pelo qual o Brasil passou nos anos trinta. As inovações
inauguradas pela revista no universo da comunicação garantiram a O Cruzeiro uma
posição de destaque na história do jornalismo brasileiro. Sua qualidade gráfica –
superior ao de outras revistas que circulavam no país –, seu farto material fotográfico e
sua forma objetiva, dinâmica e ágil de fazer notícia, além de sua equipe composta por
renomados escritores, fizeram da revista um símbolo dos novos tempos que o país
usufruía no sentido das novas tecnologias de comunicação que surgiam.
O jornalismo brasileiro, que nasceu oficialmente em 1808, por meio de
impressos como O Correio Brasiliense e A Gazeta do Rio de Janeiro, inaugurou sua
primeira revista44, em 1812. Intitulada As Variedades ou Ensaios de Literatura, a
publicação – que contou apenas com dois números – não possuía interesse nos
acontecimentos da vida cotidiana e privilegiava temas eruditos voltados
principalmente à literatura. 45
Os primeiros formatos de impressos intitulados revistas que surgiram no
Brasil, além de não se interessarem pela vida social do país, não apresentavam muitas 43 In: NETTO, Accioly. O Império de Papel: os bastidores de O Cruzeiro. Porto Alegre: Sulina, 1998, p.37. 44 O termo “revista” foi utilizado pela primeira vez em Londres no ano de 1704, quando Daniel Defoe lançou a publicação intitulada A Weekly Review of the Affairs of France. No Brasil, passou a ser utilizado para denominar certas publicação periódica que se diferenciasse dos jornais. WERNECK, Humberto et al. A revista no Brasil. São Paulo: Abril. 2000, p. 16. 45 MOURA, Ranielle Leal. História das Revistas Brasileiras: informação e entretenimento. In: Encontro Nacional de História da Mídia. 8. 2009. Rio Grande do Sul. Anais... Rio Grande do Sul: UFRGS (Paginação Irregular). Disponível em: <www.ufrgs.com.br>. Acesso em: 03 mar. 2015.
36
ilustrações e mantinham um formato de caráter conservador. Situação que perdurou até
meados da década de 1860, “quando as revistas passaram a oferecer ao leitor notícias
de interesse social”, além da presença cada vez maior de imagens junto aos textos. 46
No entanto, o uso de ilustrações nas publicações do século XIX era despretensioso e as
imagens serviam ao simples propósito de comentar a informação. Por outro lado, ao
contrário das ilustrações, as charges, além de ganharem um formato padrão, se
tornaram uma importante ferramenta, sobretudo política, de destaque nas revistas do
século XIX. A Revista Ilustrada de Angelo Agostini, por exemplo, foi a principal
publicação a utilizar ilustrações, principalmente as charges, para criticar o poder
monárquico nacional. 47
Já no século XX, os novos aparatos técnicos proporcionados pelos avanços
tecnológicos garantiram a inserção da fotografia nas revistas e jornais, além de
impressões mais rápidas e eficazes,
[...] e foi em parte por conta dessas transformações que as revistas ilustradas proliferaram. Elas, que inicialmente tinham as charges como principal manifestação imagética, se transformariam, posteriormente, nos principais veículos de difusão das imagens fotográficas. Este foi o momento de revistas como: Semana Ilustrada, Revista da Semana, Kosmo, Fon-fon!, Ilustração Brasileira, Careta, Paratodos, dentre outras 48.
No entanto, partir da experiência de O Cruzeiro foi que as revistas ilustradas
se transformaram definitivamente no Brasil. Desde a sua inauguração, o impresso
preocupou-se em apresentar seu “luxo editorial” ao utilizar impressões em cores e em
folha de papel couche de primeira linha, oferecendo aos leitores uma qualidade jamais
vista até aquele momento. A própria forma como se deu a inauguração da revista
apresentou-se como novidade aos brasileiros:
Na tarde quente do dia 5 de dezembro de 1928, à hora em que as repartições públicas encerravam o expediente e pouco antes de o comércio fechar de o comércio fechar as portas, a Avenida Rio Branco foi inundada por uma chuva de papel picado. Parecia que de repente, por um espantoso milagre
46 id. ibid.. (Paginação Irregular). 47 id. ibid. (Paginação Irregular). 48 id. ibid. (Paginação Irregular).
37
meteorológico, estava nevando na mais importante via pública da Cidade Maravilhosa, com 40 graus à sombra. Ônibus e automóveis estacionaram. Uma sinfonia de buzina encheu o ar. E milhares de transeuntes, surpresos, começaram a apanhar no ar, nas calçadas ou sobre o asfalto escaldante os pedaços de papel , que nada mais eram do que pequenos folhetos impressos, atirados dos andares mais altos dos edifícios, e que diziam: ‘compre amanhã O Cruzeiro, em todas as bancas, a revista contemporânea dos arranha-céus.’ 49
Desde o seu primeiro número O Cruzeiro “trouxe a público a promessa de
colocar-se como a mais completa e mais moderna publicação do gênero produzida no
Brasil” 50. Promessa que foi, de fato, perseguida pela revista ao longo das três décadas
seguintes. Porém, importa aqui citar que, por mais que seu lançamento possa ser
considerado digno de uma passagem de cinema, o surgimento da revista não implicou
necessariamente em altos números de vendas ou em uma revolução no cenário da
imprensa local em um primeiro momento. Muito pelo contrário, devido ao alto
investimento e o baixo retorno financeiro das vendas, a década de trinta foi uma época
na qual O Cruzeiro esforçou-se quase exclusivamente para manter suas portas abertas.
As transformações que fizeram da revista a mais vendida no Brasil – e em alguns
países latino-americanos –, surgiram apenas a partir de 1943 quando o impresso
passou a se espelhar nas publicações internacionais deste formato, como a francesa Vu,
a estadunidense Life, e, mais tarde, na também francesa Paris Match. O Cruzeiro
atingiu seu ápice editorial nas décadas de 1940 e, sobretudo, 1950 – a década das
transformações nas editoras de todo o país.
Para o pesquisador André de Seguin des Hons, o diferencial de O Cruzeiro
nesse momento, [...] “foi a introdução de grandes reportagens e a renomada
importância conferida a fotografia, o que teria provocado uma revolução no cenário da
imprensa periódica local, ainda muito tradicionalista” 51. Segundo o autor, a
supremacia de O Cruzeiro em relação aos seus concorrentes nas décadas de 1940-
1950, foi impulsionada pelo fotojornalismo; pela abordagem diferenciada – que
49 NETTO. op. cit. p. 38 50 DES HONS, André de Seguin. apud. In: COSTA, Heloise; BURGI, Sérgio (Org.). As Origens do Fotojornalismo no Brasil: um olhar sobre O Cruzeiro (1940-1960). São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2012, p. 9. 51 COSTA, Heloise; BURGI, Sérgio (Org.). op. cit. p. 18
38
contava com muito sensacionalismo –; além da já citada abertura da revista para o
mundo, que importava novidades de revistas internacionais e se esforçava em garantir
as vendas em outros países do continente. 52
O fotojornalismo, gênero que atribui à fotografia a função de principal
elemento informativo da matéria jornalística, teve suas origens concomitantemente aos
avanços da indústria gráfica e editorial entre a segunda metade do século XIX e início
do século XX. Durante as duas primeiras décadas do século passado, a Alemanha
tornou-se o lugar determinante neste processo de estreitamento entre a fotografia e a
mídia impressa, sendo que, durante este período, o país contava com o maior número
de revistas ilustradas em todo o mundo. 53 A ascensão do Partido Nazista e,
consequentemente, a saída de profissionais do ramo para fora da Europa, contribuiu
para que o vasto conhecimento editorial e fotográfico alemão chegasse a outros lugares
e se disseminasse pelo mundo. Fato que colaborou diretamente na formação de
algumas revistas norte-americanas e europeias, que posteriormente serviram de
espelho para O Cruzeiro.
Para alguns pesquisadores, o uso da fotografia na divulgação de informação no
Brasil teve um início relativamente precoce. Porém, sua relação com o jornalismo
permaneceu distante até as últimas décadas do século XIX: o uso da fotografia, que
antes servia, quase exclusivamente, para divulgar ações relativas ao imperador, ganhou
a importante função de atribuir veracidade à fala dos jornais, conforme as inovações
técnicas de impressão chegavam à Nação.
Apenas em 1943, com as transformações editoriais de O Cruzeiro, que o
fotojornalismo passou a ser realizado efetivamente no país. A nova abordagem do
impresso, copiada de outras publicações internacionais do gênero e a chegada à revista
do experiente fotógrafo francês Jean Manzon, proporcionaram ao jornalismo brasileiro
novos conceitos editoriais que, estimulados por inovações tecnológicas, atribuíram à
fotografia o papel de protagonista nas reportagens. Nesse sentido, a fotografia, a partir
52 id. ibid. p.19 53 LEITE, Marcelo Eduardo. O Fotojornalismo na O Cruzeiro: uma aproximação. In: SBPJor: associação brasileira de pesquisadores em jornalismo. Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo. 9. 2011. Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: UFRJ, (Paginação Irregular). Disponível em: < https://bpjor.kamotini.kinghost.net >. Acesso em: 07 mar. 2015.
39
da experiência de O Cruzeiro, deixou de atuar apenas como um agente que atribuía
veracidade à reportagem para se tornar ponto de partida da matéria jornalística.
FIGURA 12.
Fotojornalismo de O Cruzeiro
Fonte: http://www.ccmj.org.br/
A preocupação da revista em privilegiar a fotografia em relação à matéria
escrita evidencia o formato jornalístico próprio da fotorreportagem, que consiste em
conduzir o leitor a se deparar primeiro com a imagem para buscar “uma
inteligibilidade imediata; depois, ocorre a leitura da legenda, a fim de completar sua
percepção primeira; por fim retorna à imagem e conclui a interpretação da cena”. 54 As
54 COSTA, Helouise, apud. In: id. ibid., (Paginação Irregular).
40
reportagens de O Cruzeiro a partir de 1943 revelam a vontade da revista em fazer seus
leitores seguirem esta sequência.
FIGURA 13. Fotojornalismo de O Cruzeiro II
Fonte: http://www.ccmj.org.br/
Já o sensacionalismo, também destacado por Hons, marcou a trajetória de O
Cruzeiro de maneira que em inúmeros episódios a revista optou pelo exagero e pela
fantasia para conquistar seus leitores e ampliar suas vendas.
A dupla formada pelo escritor David Nasser e pelo fotógrafo Jean Manzon,
merece certo destaque ao se tratar de sensacionalismo na trajetória de O Cruzeiro.
Sobre essas duas personalidades, o jornalista e ex-diretor da revista, Accioly Netto,
escreveu:
41
Esses dois personagens extraordinários, Manzon e Nasser, formaram em O Cruzeiro [...] uma dupla de grande fama, cuja filosofia podia ser resumida na seguinte frase: a verdade fica mais verdadeira quando exposta com razoável dose de fantasia. [...] eles buscavam sempre casos sensacionais que a imprensa daquela época abordava de forma insonsa. 55
Entre os inúmeros exemplos das aventuras da dupla, que poderiam ser citados
para elucidar o sensacionalismo da revista, destaca-se a fotografia do deputado Barreto
Pinto trajando cueca samba-canção. Intitulada Barreto Pinto Sem Máscara, a
reportagem sobre o político, getulista convicto que pautava seu mandato sob um forte
conservadorismo, enfatizava sua ligação com o presidente deposto “[...] afirmando que
o deputado era um agente da ditadura Vargas infiltrado no novo regime”. 56 Na
reportagem Barreto Pinto aparecia
em cenas posadas e quase sempre ridículas: na banheira falando ao telefone; na praia com uma bola no pescoço; ou fingindo dormir, no leito que teria pertencido a marquesa de Santos. O grande impacto da reportagem seriam as fotografias em que Barreto Pinto aparecia de ceroulas e casaca. Segundo Manzon, durante a sessão de fotos, ele argumentou que não seria necessário que o deputado vestisse o traje a rigor completo, pois as fotografias iriam retratá-lo apenas da cintura para cima. 57
Naturalmente, ao ver o resultado final da reportagem, o deputado abriu um
processo contra os repórteres e o diretor da revista. Porém, perdeu o caso sob a
alegação de que o político tinha consentido posar para as fotografias e por este motivo
as imagens teriam sido produzidas com o uso de flash. Entretanto, o que poderia
significar o fim da carreira para o político, acabou contribuindo para sua
popularização: Barreto Pinto ainda cumpriu dois mandatos políticos depois de seu
polêmico aparecimento em O Cruzeiro.
55 NETTO. op. cit. p. 109 56 COSTA, Heloise; BURGI, Sérgio (Org.). op. cit. p. 126-127 57 id. ibid. p.126
42
FIGURA 14. Foto do Deputado Barreto Pinto, publicado pela revista O Cruzeiro em 1946.
Fonte: http://www.ccmj.org.br/
.
Com seu “luxo editorial”, vendas internacionais, o aprimoramento do
fotojornalismo e seu sensacionalismo, O Cruzeiro se diferenciou e acabou se tornando
um ícone do jornalismo brasileiro. Hoje, este impresso é visto por muitos
pesquisadores como a mais famosa revista brasileira do século XX, e por ser “eclética,
destinada a ser lida por um público diversificado, de todas as classes sociais, incluindo
homens e mulheres” 58, a revista alcançou a tiragem de 850 mil exemplares em um
país com milhões de analfabetos. Em 1950, segundo Accioly Neto, “calculava-se –
imaginando que cada exemplar seria lido por cinco pessoas – que O Cruzeiro passaria
pelas mãos de nada menos que quatro milhões de leitores a cada semana” 59. Números
58 NETTO. op. cit. p. 115 59 id. ibid. p. 115
43
que podem servir de base para uma interpretação da forte influência da revista em
diversos setores da sociedade brasileira, inclusive na política. Portanto, independente
da imagem disseminada pelo O Cruzeiro sobre um determinado assunto, essa
construção imagética seria aceita, apropriada e propagada por muitos brasileiros.
44
2 JÂNIO QUADROS: A IMAGEM DE UM POLÍTICO
2.1 DE JÂNIO A JANUS: A CONSTRUÇÃO DE UMA IMAGEM (1947-1960)
[...] tenho uma preocupação dominante: fazer uma administração altamente moralizada; determinadas coisas que aconteceram no passado não sucederão comigo: quero uma administração justa, uma administração humana, uma administração progressista que, desenvolvendo as nossas riquezas, as leve às grandes multidões; uma administração cristã; como não estou numa camisa de meia de qualquer legenda, como tenho liberdade, autonomia de ação mais do que comum dos políticos, quero acreditar que meu governo possa merecer o respeito de todos e a colaboração patriótica [...]
(Trecho da primeira entrevista de Jânio Quadros
como Presidente da República) 60
No meio político, a imposição sistemática de representações acerca de um
personagem conduz à percepção de como as sensibilidades políticas são fruto de
inúmeras mensagens, apelos e dramatizações que mantêm ou modificam
cotidianamente os sentimentos coletivos.
Nesse sentido, a imagem construída para Jânio Quadros como um líder
independente de partidos políticos que se identificava com as multidões e representava
o combate à corrupção e a moralização dos usos e costumes indica que estes foram os
principais pontos, sustentados por ele e por seus seguidores, na projeção de uma
imagem pública, construída desde o seu primeiro cargo político como vereador da
cidade de São Paulo até sua candidatura à Presidência da República.
60 In: GUALAZZI, Eduardo Lobo B.; NETO, Jânio Quadros. Jânio Quadros: memorial à história do Brasil. São Paulo: Rideel, 1996, p. 87.
45
No ano de 1947, quando decidiu dedicar-se a política, Jânio Quadros deparou-
se com um momento propício para o surgimento de novas lideranças. Sua entrada no
universo político deu-se em um momento que novos ideais se afloravam e se
concretizavam com novas legendas, devido ao esgotamento da ditadura Vargas que
deu início à criação de novos partidos políticos. A era das novas legendas partidárias,
que marcou a política nacional em meados de 1940, era favorável para inserção de
personagens marcantes e de novas configurações socio-afetivas no campo do político,
facilitando, assim, a projeção de novas lideranças. Jânio, que era um modesto
advogado e professor, sem fortuna e tradição política, assumiu, naquele ano, o seu
primeiro cargo político como vereador da cidade de São Paulo.
Desde cedo, o então candidato enxergou na conquista do povo uma garantia de
estabilidade na política brasileira. Mesmo sendo membro ativo da União Democrática
Nacional (UDN), ao candidatar-se acabou por optar por outra agremiação política.
Com dificuldades em conseguir uma legenda para se candidatar, escolheu o Partido
Democrata Cristão (PDC) que, mesmo sendo uma organização de média expressão,
oferecia ao político maiores possibilidades de chegar às camadas populares. Para
Quadros “a UDN não teria possibilidade de dirigir-se aos interesses populares, uma
vez que era composta por integrantes de classes mais abastadas, e por ser um partido
mais intimista e sofisticado”.61
Em sua campanha para vereador, Jânio privilegiava as visitas aos bairros
periféricos da cidade e passava pelas feiras livres e “botequins dessas regiões” 62 com
o objetivo de conquistar seu eleitorado. Já naquele momento, “o que mais chamava a
atenção dos eleitores era a sua aparência desleixada para os padrões da época, pois
usava cabelos compridos e desalinhados, além de ser muito magro e esguio”.63 Com
base nesta afirmação, pode-se inferir que como Jânio não dispunha de um grande
apoio político, a conquista da simpatia daqueles que o acompanhavam foi de grande
valia para a sua vitória e a imagem de um político humilde foi um considerável fator
de apoio neste processo.
61 CHAIA, Vera. A Liderança Política de Jânio Quadros (1947-1990). Ibitinga: Humanidades, 1991, p. 18. 62 id. ibid. p. 19. 63 id. ibid. p. 19.
46
Medidas de caráter popular foram frequentes em seu mandato. Enquanto
vereador, Jânio se destacou como um dos parlamentares mais atuantes e combativos na
Assembleia Legislativa, e seu desempenho não se limitava as sessões regulares da
Câmara, pois também visitava os bairros da capital com o intuito de conhecer os
problemas cotidianos da cidade. 64 Por meio dessas visitas, denunciava as más
condições do tratamento de esgoto ou das calçadas, conhecia garagens, oficinas e
canteiros de obras nos quais contatava os operários com o objetivo de questionar suas
condições de trabalho. Durante esse período, apresentou cerca de 2000 projetos, dos
quais 159 conquistaram a adesão dos parlamentares e foram transformados em lei.
Estes projetos em sua essência “[...] visavam aumentar a arrecadação de impostos para
a Prefeitura, melhorar as condições de vida da cidade de São Paulo, defender o
consumidor paulistano e garantir melhorias nas condições de vida e de trabalho da
classe operária”65, contribuindo na disseminação da imagem de um político sempre
presente e preocupado com o bem estar da população e logo, capaz de realizar
transformações.
Jânio também se mostrava decidido em defender a ordem e a moralidade
pública e sempre envolveu-se em ações contundentes ao propor que a venda de certos
produtos fossem controlados ou até proibidos, como bebidas alcoólicas, remédios e
refrigerantes e denunciar alguns filmes e espetáculos circenses que, para ele,
atentavam contra a moralidade devido a alguns gestos e palavras inadequadas. Dizia
que estava empenhado em uma árdua luta para que a saúde paulistana, a organização
familiar e do Estado fossem asseguradas.
Em sua passagem da vereança para a Assembleia Legislativa de São Paulo,
onde atuou como deputado estadual (1951-1952), Quadros fez uso de mais uma forte
ferramenta que logo associou à sua imagem pública: o marketing político. Estratégia
“que envolvia um sistema de comunicação estruturado a partir da autovalorização, das
denúncias constantes de irregularidade administrativas e do uso sistemático da
imprensa” 66 e que lhe proporcionou um melhor desempenho na tarefa de atingir as
massas com seus discursos inflamados que, por sua vez, lhe rendiam cada vez mais 64 id. ibid. p. 22 65 id. ibid. p. 22 66 id. ibid. p. 37
47
apoio político. Não se pode esquecer que a linguagem política além de propor códigos
uniformes e reunir pessoas portadoras de uma mesma visão política, reúne também os
sujeitos reconhecidos em sua dignidade enquanto portadores de uma justa causa.
Como deputado, Jânio buscou ampliar suas bases eleitorais, passando dos
bairros periféricos aos demais municípios de São Paulo, sem deixar de insistir na
moralização da máquina administrativa e no bem estar dos mais humildes.
Neste período, como deputado estadual conseguiu que 40 projetos fossem
aprovados, sendo que muitas destas propostas expressavam a preocupação em garantir
os interesses das camadas mais populares do Estado. Dentre estes projetos destacaram-
se
[...] a abertura de cursos noturno para atender aos trabalhadores; ponto livre para motoristas de táxi, com a eliminação do monopólio de interesses particulares; construção de casas populares; direitos e vantagens para operadores de Raio-X; [...] criação da Casa do Ator na capital, para abrigar velhos artistas e incapacitados para exercer a profissão; [...] 67
Jânio mostrava-se um político ativo e através de seus discursos tanto na
Assembleia quanto por meio da imprensa, como o jornal A Hora, denunciava o que via
como as “incompetências” e “irresponsabilidades” do Poder Público e tecia críticas
que envolviam diversos setores da sociedade paulista. O político reclamava desde a
falta de fiscalização sob a má conservação de alimentos, às precárias condições vividas
por detentos de presídios de todo o Estado. Exigia maior policiamento, tanto na capital
quanto no interior e cobrava maior atenção em favor dos direitos dos trabalhadores
rurais. De modo geral, preocupava-se em garantir a imagem de um político
preocupado com bem estar social e que se distanciava da concepção negativa,
disseminada por ele e seus seguidores, da chamada “política tradicional” – concepção
usada para denegrir os demais políticos supostamente envolvidos em corrupção ou
pouco interessados em atender população.
A campanha de Jânio à prefeitura de São Paulo, em 1953, desta vez pelo PDC
coligado ao Partido Socialista Brasileiro (PSB), pode ser vista como uma verdadeira
demonstração de força de sua oratória e carisma. Com simples rimas, símbolos e
67 id. ibid. p.39
48
jargões, Jânio, contrariando as expectativas, chegou à prefeitura com a campanha
“tostão contra o milhão”.
Na ocasião, seu opositor Francisco Cardoso contava com um forte apoio
político sustentado em uma coligação de sete partidos, liderada pelo Partido Social
Progressista (PSP), além de um apoio financeiro estimado em 200 milhões de
cruzeiros, enquanto Quadros não tinha recursos nem para alugar salões para seus
comícios. Percebendo a desvantagem, JQ estabeleceu em sua campanha um discurso
que colocava de um lado os poderosos, os ricos; do outro, os fracos, os pobres e os
oprimidos 68, fazendo do marketing político sua maior estratégia eleitoral.
Naquele período foi criado, também, outro símbolo que marcaria o restante de
sua trajetória política: a vassoura que, por sua vez,
[...] caracterizava a limpeza que faria na administração municipal acabando com a corrupção, com as nomeações ilegais, com as ‘roubalheiras’, enfim realizando a varredura geral. A partir daí, o povo começou a comparecer aos seus comícios munidos de vassouras, que logo se multiplicaram em pequenos broches que eram utilizados pelos eleitores janistas. 69
O apelo popular de sua oratória e a vassoura deram a Jânio Quadros mais uma
vitória política, afinal, os bens simbólicos suscitam afetos individuais e coletivos e
contribuem para orientar ações e canalizar as energias do grupo. Seus discursos
conquistavam um número cada vez maior de eleitores e Jânio, agora desfrutando de
forte prestígio,
[...] denunciava o aumento do custo de vida, citando os preços do feijão e do arroz, além de apontar a crise nos transportes, na habitação, na saúde e na educação. Condenava também os apadrinhamentos, a corrupção e a atuação desses ‘maus políticos’ no governo de São Paulo e na política paulista de modo geral. 70
Pregando uma independência partidária de sua imagem, por meio de
entrevistas, desqualificava os partidos e afirmava que a “verdadeira liderança” era
aquela que ouvia os “clamores das multidões”, ao mesmo tempo em que se que se
68 id. ibid. p. 69. 69 id. ibid. p. 69. 70 id. ibid. p. 71.
49
coloca enquanto porta-voz dos interesses da sociedade71, assumindo este
posicionamento que o acompanhou o restante de sua carreira. Em certa ocasião,
quando era candidato à Presidência da República, ao conceder uma entrevista na
televisão afirmou:
‘Não tenho com os partidos que me apoiam nenhuma espécie de compromisso. Não porque os tenha recusado, mas porque não me foram pedidos ou sequer sugeridos. As ideias que sustento e que sustentarei na campanha são minhas [...]’. 72
Como prefeito, as prioridades que nortearam sua gestão demonstram que
permanecia a sua insistência em preservar a imagem autocriada de “homem simples,
humilde e acessível, porém obstinado, intransigente e capaz de dizer ‘não’” 73. Em seu
plano administrativo “[...] fixou certas normas para o bom funcionamento da
administração pública”.74 Neste, destacaram-se a nomeação de funcionários somente
via concurso público, a moralização do funcionamento da máquina administrativa,
enfatizando que não seriam admitidas a negligência, a incapacidade ou a
desonestidade; a exigência de que funcionários públicos cumprissem os horários
estabelecidos e fossem educados no tratamento com o povo. Além disso, o plano
também contemplava “propostas políticas no que diz respeito aos bairros periféricos,
procurando incorporar a periferia na cidade, por meio de melhoramentos nas condições
de vida desses bairros e, consequentemente, nas condições de vida dos trabalhadores” 75.
Com menos de dois anos de mandato na prefeitura de São Paulo, o PDC
lançou a candidatura de Jânio ao governo do Estado, com o lema Honestidade e
Trabalho, mantendo a vassoura como um bem simbólico de combate a corrupção na
administração pública 76. Ao ser eleito, Jânio manteve o discurso de quem praticava
um governo para todos, como também e as ideias de Liberdade e Direito que
71 QUADROS, Jânio. apud. In: CHAIA. id. ibid. p. 77 72 QUADROS, Jânio. apud. In: CHAIA. id. ibid. p.167 73 CHAIA. id. ibid. p. 79 74 id. ibid. p. 79 75 id. ibid. p. 79 76 id. ibid. p. 109
50
norteavam sua administração, pois se posicionava como o representante de um
governo
‘[...]dos grandes e também dos pequenos, dos ricos e também dos desfavorecidos, dos influentes e também dos humildes. Do governo que não furta, nem permite furtar, no níquel de centavos ou na fortuna dos milhões. Do governo que acredita na Liberdade e no Direito, sem que se confunda aquela com a licença, e este, com as conveniências das pessoas ou de grupos’ 77
A crença na Liberdade e no Direito não o eximiu de levantar com maior
contundência a bandeira do combate à corrupção, que continuou sendo a maior
expressão de sua imagem pública, a ponto de em um dado momento Quadros afixar
um cartaz na fachada do Palácio dos Campos Elíseos com a seguinte mensagem: “O
Governador cancelou as audiências por trinta dias, a fim de sair à rua para combater o
roubo e a corrupção”. 78
Esta breve narrativa da trajetória política de JQ, conduz a percepção de que
entre 1947 e 1961, ele esforçou-se em garantir que sua imagem fosse associada a atos
enérgicos na tentativa de mostrar-se como um político ativo em suas funções. Neste
momento, seus discursos inflamados, contra a corrupção e as injustiças sofridas pelas
massas, já haviam se tornado uma marca registrada do político. Jânio proferia
discursos de qualidades técnicas destacáveis e denotava traços insignes de oralidade
que evidenciavam seus fundamentos em técnicas de oratória. De acordo com Jefferson
Queler, muitos dos discursos de Jânio, “[...] eram pensados para transcender os limites
de plateias há muito em contato com a escrita e a imprensa, e atingir um público mais
pautado pelo uso de modos orais de expressão”, e, continua o autor, é de bom tom
lembrar que “[...] além de discursar frequentemente em praça pública, JQ tinha
77 QUADROS, Jânio. apud. In: QUELER, Jefferson José. Jânio Quadros, O Pai dos Pobres: tradição e paternalismo na projeção do líder. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais. Vol. 29 n. 84. USP, São Paulo, 2014, p. 120. Disponível em: <www.scielo.com.br>. Acesso em: 03 Mai. 2015. 78 id. ibid. p. 118
51
consciência de que podia estar em contato com um público ampliado por transmissões
televisivas ou radiofônicas.” 79
Cabe ressaltar aqui que, quando proferia seus discursos, Jânio apresentava-se
aos seus ouvintes, despenteado, barbudo e trajando gravatas desalinhadas, além de
ternos amarrotados que abrigavam nos seus bolsos sanduiches de mortadela. 80 No
entanto, esta “estratégia” não chegava a representar o maior de seus exageros. Em
certa ocasião como governador, na tentativa de dar continuidade à sua campanha pela
moralização pública, durante um baile de carnaval na cidade de Santos, em 1955, Jânio
[...] mandou prender um fotógrafo por ter tirado sua fotografia sem prévia autorização; exonerou um médico, funcionário estadual, por jogar confetes no governador; e tentou prender um comandante da 2º Região Militar por brincar com lança perfumes. Depois desse baile, proibiu o uso de short nos salões de Santos, por considerá-lo um atentado contra o pudor. 81
O processo de uma autoconstrução imagética, por parte de JQ, contou com
inúmeros outros curiosos episódios marcados pelos exageros do político. Certas
passagens, como as acima citadas, contribuíam para reforçar a ideia de que Jânio era
capaz de ultrapassar barreiras sociais bem delimitadas e atingir o pitoresco quando se
tratava de expor seus ideais, e foi esta figura emblemática que, em 1960, chegou à
disputa do cargo de Presidente da República.
A popularidade de JQ naquele contexto era significativa e, por este motivo,
ocorreram disputas entre os partidos para decidir quem ele representaria. O Partido
Trabalhista Nacional (PTN) foi quem oficializou sua candidatura, e seus líderes, com o
apoio de outras personalidades políticas, fundaram o Movimento Popular Jânio
Quadros (MPJQ), uma estrutura extrapartidária que tinha como objetivo desenvolver
nas ruas, uma campanha de propaganda da candidatura de Jânio. 82
79 QUELER, Jefferson José. Entre o Mito e a Propaganda Política: Jânio Quadros e sua imagem pública (1959-1961). 349 f. Tese (doutorado em História) – Departamento de História do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas, Campinas 2008, p. 103. 80 id. ibid. p. 14. 81 CHAIA. op. cit., p. 123. 82 Entre os fundadores do MPJQ destacavam-se figuras como o deputado Emílio Carlos (PTN), o senador Lino Matos (PTN) e o secretário do governo Jânio Quadros, Castilho Cabral. In: CHAIA, id. ibid. p.157
52
O então candidato conseguiu forte apoio partidário, mas sem uma unidade
política. Homologada pelo Partido Republicano (PR) e apoiada por uma coligação de
cinco partidos – que incluía a UDN, convencida por Carlos Lacerda que insistia que o
apoio a Jânio era a única maneira de o partido chegar ao poder – a campanha política
de Jânio Quadros à Presidência da República possibilitou que a vassoura janista
ultrapassasse as fronteiras paulista e ganhasse o país, mas sem ser associada a
nenhuma sigla partidária. Naquele momento,
[...] pairando acima dos partidos, fugindo ao esquema ‘esquerda e direita’, Jânio significava, para seus defensores, o encontro da ordem com o progresso, a revolução política sem violência ou ilegalidade. Seria ‘um governo ao mesmo tempo progressista e conservador, austero e audacioso, amado pelo povo e respeitado pelas elites [...] 83
Em sua campanha as alusões as suas conquistas políticas, enquanto prefeito e
governador de São Paulo, disseminaram inúmeras representações que inseriam Jânio
no patamar de político que se posicionava acima de qualquer legenda partidária, lutava
pelo direito de todos, acreditava no poder transformador do Estado e combatia como
ninguém a corrupção. Por meio desta estratégia, a campanha de JQ buscava
transformar práticas dispersas em práticas orientadas, para evitar assim desvios e
aumentar a sua força política. A música composta para sua campanha, que se tornou
marca de seu programa de governo, representava a imagem que ele havia tentado
construir para si mesmo: um representante do povo e, sobretudo, da moralidade
pública e administrativa.
Varre, varre vassourinha
Varre, varre a bandalheira E o povo já está cansado De sofrer dessa maneira Jânio Quadros esperança
Desse povo abandonado 84
Representantes da imprensa que optaram por acolher a candidatura de Jânio
tiveram um importante papel na garantia de uma boa imagem do político e de algumas
83 BEVENIDES, Maria Vitória. O Governo Jânio Quadros. São Paulo: Brasilense, 1981, p. 30-32. 84 CHAIA. op. cit., p. 175
53
de suas características, divulgando várias mensagens, como por exemplo: “ [...] Jânio é
um mito. É o messias que o Brasil espera. É uma estrela tão famosa quanto Pelé ou
Ângela Maria. E, diante dele, os partidos políticos ficam de cócoras”. 85
Uma das principais fontes de apoio à candidatura do messias tão famoso
quanto o Pelé ou Ângela Maria foi o jornal Tribuna da Imprensa, cujo proprietário era
Carlos Lacerda, integrante ativo da UDN, o mais expressivo partido entre as demais
legendas que formavam a coligação de apoio a Quadros.
Tentando garantir a imagem de um “político do povo”, durante a campanha de
Jânio Quadros, a TI trouxe a seus leitores diversas manchetes deste em contato com as
grandes massas, conforme pode-se perceber abaixo:
FIGURA 15. Tribuna da Imprensa, 4 de janeiro de 1960 nº 3032 - ano XII
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
85 P.N. de 16 fev.1959, apud. In: CHAIA. id. ibid., p. 157.
54
FIGURA 16. Tribuna da Imprensa, 5 de agosto de 1960 – n. 3209 – ano XII
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
FIGURA 17.
Tribuna da Imprensa, 11 de agosto de 1960 – n. 3214 - ano XII
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
A imagem construída por Jânio e seus seguidores não passou despercebida
pela oposição que, naturalmente, começou a disseminar uma imagem antagônica a esta
até agora tratada. Em fevereiro de 1959, por exemplo, com a especulação do nome de
Jânio como candidato à presidência apoiado pela UDN, o jornal Correio da Manhã,
representando os ideais do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), atacou duramente
Jânio por se associar aos maiores “inimigos” daquela organização partidária. No texto,
55
o deputado Sérgio Magalhães – indicado na reportagem como um dos líderes do PTB
– afirmou que o traço mais marcante da propaganda Jânio Quadros consistia no “seu
aspecto puramente teatral sem nenhuma base moral, ideológica e política”. 86
Em 1960, o jornal Ultima Hora, que apoiava o Marechal Henrique Teixeira
Lott, candidato do Partido Social Democrata (PSD) representou um dos principais
meios de oposição a Jânio. Entre as edições do UH daquele ano pôde-se encontrar
inúmeras críticas diretas ao político. O jornal destacava os comícios com baixo
público, as discordâncias entre Jânio e os partidos que o apoiavam, as viagens mal
sucedidas, entre outros comentários que pudesse abalar a popularidade do político.
Taxado como “entreguista” 87 e reacionário, em oposição ao nacionalismo do
Marechal Lott, no discurso do UH Jânio era retratado como um político de falsas
palavras e que fazia uso da demagogia para conquistar seu eleitorado. Além disso, o
periódico buscava desqualificar qualquer atitude do candidato, dentro ou fora da
política.
FIGURA 18. Jornal Ultima Hora – n. 2676 – ano IX.
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 201
86 CANDIDATURA Jânio é um Cavalo de Tróia para Liquidar com o Partido Trabalhista. In: Correio da Manhã. Rio de Janeiro, p. 9, 19 de fevereiro de 1959. Disponível em: <bndigital.bn.br> Acesso em: 27 de mar. 2015. 87 Expressão pejorativa que fazia referência a lideres políticos que assumiam uma política econômica de caráter liberal em contraposição as nacionalistas.
56
FIGURA 19. Jornal Ultima Hora – n. 3109 – ano X
Fonte: http://bndigital.bn.br/ acesso: 30 de mar. 2015
O discurso da oposição apresentava Jânio Quadros como um político de
muitas palavras, embora reconhecesse as suas capacidades como orador, não lhe
atribuía veracidade, pois para seus opositores Jânio não passava de um demagogo.
Nestes discursos suas ações ditas moralizantes foram vistas como autoritárias e
contrárias à imagem de um “político do povo”. Ademais, a oposição se empenhava,
sobretudo, em colocar Jânio contra uma de suas mais fortes bases eleitorais: a classe
trabalhadora. Se por um lado a coligação PSD-PTB apresentava seu candidato, o
Marechal Lott, como um político nacionalista e legítimo representante de tal grupo,
por outro, Jânio era retratado como “entreguista” e falso representante dos
trabalhadores.
Naquele momento o fotojornalismo novamente cumpriu uma importante
função de legitimação dos discursos. A revista Manchete, por exemplo, em 2 de
janeiro de 1960, com o intuito de apresentar os candidatos veiculou as seguintes
fotografias:
FIGURA 20. Manchete, 2 de janeiro de 1960 – n. 4022 - ano VII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
57
FIGURA 21 .Manchete, 2 de janeiro de 1960 – n. 4022 - ano VII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
FIGURA 22.
Manchete, 2 de janeiro de 1960 – n. 4022 - ano VII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
58
Na segunda imagem o candidato JQ aparecia em quatros poses, com olhares
aparentando sentimentos de dúvida e incerteza beirando o cômico. Em contrapartida, o
candidato Marechal Henrique Teixeira Lott aparecia em seu ambiente de trabalho
trajando o seu uniforme militar, sugerindo disciplina e apontando para uma única
direção. Segundo o historiador Jefferson José Queler, o conjunto formado pelo
trabalho de edição da revista representava dois candidatos de posturas opostas:
enquanto Jânio surgia como “inconstante e governado pelas emoções”, o Marechal
Lott passava a imagem de um líder “firme e decidido”, lembrando ainda que o controle
de si é um velho tema da política que se impõe como uma qualidade de essencial
importância para um líder. 88 De forma indireta ou direta, os ataques não paravam e
sempre se direcionavam no sentido oposto das supostas qualidades que Jânio tentou
cultivar como inerentes a sua imagem. Dessa forma, segundo Queler
[...] os adversários de Jânio apontavam o que seriam as ambiguidades dele. Acusam-no [sic] de assediar sexualmente funcionárias públicas e de frequentar o número 227 na rua Martins Fontes, onde participaria de farras noturnas com as jovens Alcira Peluça, judia brasileira, e Iracema Vitória, Uruguaia. Em tais circunstâncias, segundo Viriato de Castro, foram mobilizadas conhecidas imagens e caricaturas para depreciá-lo. Republicaram a célebre foto em que sua imagem é congelada sobre a tribuna da Câmara Municipal de São Paulo, com a barba crescida, descabelado e o olhar místico. Os insultos a ele dirigidos eram os mais diversos: mistificador, vassourinha, anormal, louco, tarado, desequilibrado, caricato, clown, [...] 89
Entre 1947 e 1960 os projetos políticos de Jânio estiveram ligados a melhorias
das condições de vida das camadas mais pobres da população, o combate à corrupção
e a independência partidária. Neste sentido seus seguidores se esforçaram em associar
sua imagem pública, sobretudo, à defesa do povo e da moralidade administrativa. Por
outro lado seus opositores que o associavam ao deus romano Janus90, tratavam-no “em
88 QUELER, Jefferson José. A Roupa nova do Presidente: a politização da imagem pública de Jânio Quadros. In: Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material. Vol. 19 nº 2, julho- dezembro. São Paulo: USP, 2011, (paginação irregular). Disponível em: <http://www.scielo.br>. Acesso em: 24 de fev. de 2015. 89 id. ibid. (paginação irregular). 90 Em várias críticas ao político Jânio Quadros, seus opositores para deprecia-lo atribuíram a sua imagem uma relação direta ao deus romano Janus que, segundo a mitologia, comandava o mês de janeiro (mês que nasceu o político) e possuiu duas faces, referência a suas ações ambíguas.
59
geral, como desequilibrado e por isso incapaz de governar”. Independente de qual
imagem efetivamente prevaleceu na memória coletiva, no decorrer de sua trajetória
política, percebe-se que várias representações com significados diferenciados, foram
atribuídos a imagem de Jânio e envolveram o eleitorado durante a campanha
presidencial.
Entre críticas e enaltecimentos, por parte da imprensa, ao candidato JQ, a
revista O Cruzeiro que apoiava o Marechal Lott, foi conveniente com o cenário
político que esboçava e quando em 10 de Outubro de 1960 Jânio Quadros venceu as
eleições, informou aos seus leitores as que “surpresas se sucediam”, pois mesmo nos
redutos lottistas, Jânio havia arrastado “multidões de eleitores” de forma “espetacular”. 91
91 DUARTE, Eurilo. Jânio Vem Pela Voz das Urnas. In: O Cruzeiro, Rio de Janeiro, p.122-124, 22 out. 1960.
60
2.2 O GOVERNO DE JÂNIO QUADROS: O CRUZEIRO APRESENTA O HOMEM
COMO ELE É
Estimulado o Poder Executivo pelo desassombro de um chefe disposto a revolucionar a máquina administrativa, transforma-lhe as deliberações em providências concretas que se refletem sobre classes e a opinião pública em extremados impactos emocionais [...] O Presidente Jânio Quadros encontrou meios para fortalecer a sua autoridade e usar velhos instrumentos de governo de uma forma nova e trepidante [...] como já acontecia com o Sr. Juscelino Kubitschek, amplia a mobilidade do Governo, nisso superando o antecessor, no esforço de encontrar-se com os problemas nacionais.
(Autor Desconhecido – O Cruzeiro, 2 de setembro
de 1961)
Até eu estou cansado de falar em Jânio, tentando explicar ao Brasil que um gênio pode se tornar louco, mas um louco jamais será um gênio. Os motivos que nos dá, através de seus ventríloquos, não convencem, depois da ressaca.
(David Nasser – O Cruzeiro, 11 de novembro de
1961)
De frio candidato a espetacular vitorioso, de competente político a louco.
Jânio Quadros conheceu os dois lados da moeda nas reportagens da revista O
Cruzeiro. Como já citado, não era o candidato preferido da revista, pelo contrário, nas
eleições presidenciais o impresso apoiou o Marechal Henrique Teixeira Lott, embora
não o criticasse de forma contundente, como fazia o Ultima Hora. De modo geral nas
páginas de O Cruzeiro, Jânio Quadros foi frequentemente apresentado como homem
simples e dedicado, todavia, não fugiu às críticas da revista, assim como às ácidas
charges de Carlos Estevão92 e, sobretudo, de Amilde Pedrosa, o Appe93
92 Carlos Estevão (1921-1972) foi um chargista, ilustrador e caricaturista pernambucano. Trabalhou para a Revista O Cruzeiro entre 1940 e 1970 onde destacou-se com as séries As aparências enganam, Perguntas Inocentes e Amigo da Onça. Em sua maioria as produções de Estevão retratavam situações
61
FIGURA 23.
Charge de Carlos Estevão. O Cruzeiro, 8 Out. 1960 – n. 52 – Ano XXXII
Fonte: Acervo de Periódicos da Biblioteca Pública do Paraná
FIGURA 24. Charge de Appe. O Cruzeiro 19 dez. 1959.
Fonte: http://www.memoriaviva.com.br/. Acesso em: 28 mar. 2015.
cômicas e inusitadas do cotidiano. Em relação a Jânio Quadros o chargista costumava fazer referência ao político por meio de ilustrações de espantalhos. 93 Amilde Pedrosa (1920-2006) foi um paginador, ilustrador e cartunista político acriano. Trabalhou em diversos jornais e revistas entre 1940 e 1972. Na revista O Cruzeiro, Appe se destacou, sobretudo, com suas charges políticas. Com traços simples, durante as campanhas eleitorais de 1960, Appe produziu diversas críticas políticas, sendo muitas delas direcionadas ao partido União Democrática Nacional (UDN).
62
Durante a campanha e após a eleição de JQ, a revista O Cruzeiro, ora
apresentava o candidato/presidente como desequilibrado, curioso, pitoresco, ora
mostrava uma figura política gentil, bem humorada, decidida, demonstrando certa
dubiedade de posicionamento sobre Quadros.
Na campanha eleitoral, por exemplo, entre os candidatos Jânio Quadros (PDC-
UDN) Teixeira Lott (PSD-PTB) e Adhemar de Barros (PSP), O Cruzeiro demonstrou,
clara preferência pelo representante pessedista.
Em janeiro de 1960, quando confirmadas e anunciadas as candidaturas para as
eleições, a revista publicou, em sua primeira edição do ano, uma apresentação dos
candidatos. A matéria intitulada Candidaturas Fortes, Regime Forte, com o subtítulo
Lott: Triunfo Sólido, Jânio: UDN Ainda Fria, apresentou Jânio Quadros como um
candidato sustentado por uma decadente coligação que não garantia um significativo
suporte partidário que o colocasse no centro das competições. Por outro lado, o
Marechal Henrique Teixeira Lott era apresentado como um forte concorrente com base
em uma sólida estrutura partidária, que contava com o apoio do atual Presidente
Juscelino Kubistchek.
No decorrer da cobertura das campanhas eleitorais, Jânio Quadros em relação
ao Marechal Lott, ocupou um segundo plano nas reportagens da O Cruzeiro. Embora,
em seus discursos, a revista não deixava de reconhecer em JQ um candidato de
prestígio popular. Em edição de 06 de fevereiro de 1960, o periódico afirmou que,
como o político dispunha de uma base partidária fraca, visto que a UDN disputava a
posição de no máximo segundo partido do país, Jânio via-se obrigado a firmar sua
campanha em sua popularidade. Mas, para a O Cruzeiro o apoio popular não seria
suficiente para garantir a vitória ao candidato da vassoura, pois, segundo a revista, as
forças políticas representadas pela coligação de apoio a Lott construiriam um “sistema
invencível”, contra o qual a investida de Jânio seria em vão. 94
Neste primeiro momento, em que se desenhavam as disputas eleitorais, o foco
de O Cruzeiro não pareceu estar necessariamente no candidato Jânio Quadros, e sim
nas crises internas de um dos partidos que o apoiavam: a União Democrática Nacional.
94 TESTE de Jânio. In: O Cruzeiro, Rio de Janeiro, p. 105-106, 6 fev. 1960.
63
Durante os primeiros meses da campanha, as discordâncias entre Jânio e as
lideranças da UDN, somadas aos explícitos desentendimentos entre Carlos Lacerda – o
principal articulador da campanha janista no partido – e o candidato natural udenista
para a disputa da presidência, Juraci Magalhães, possibilitaram que a revista, clara
opositora ao partido, explorasse ao máximo esta situação.
A análise de alguns dos números que circularam entre janeiro e agosto de
1960 indica que a revista estava mais preocupada em abalar as bases eleitorais da
UDN do que oferecer uma imagem concreta do possível Presidente da República que
concorria por este partido. Apresentada pela revista como uma oposição fracassada e
uma agremiação política liderada por reacionários, a UDN foi alvo frequente de
críticas e do humor ácido das charges de Amilde Pedrosa nas páginas de O Cruzeiro.
Representado por uma mulher gorda e extremamente dependente de Carlos Lacerda,
Appe retratou a UDN como um partido com muitas divergências internas, manipulador
e de ideais confusos.
FIGURA 25.
O Cruzeiro, 6 de agosto de 1960 – n. 43 – ano XXXII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
64
FIGURA 26. O Cruzeiro, 16 de Julho de 1960 - n. 40 - ano XXXII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
FIGURA 27. O Cruzeiro, 24 de Junho de 1962 – n. 37 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
Durante as campanhas eleitorais, considerar que o foco da revista estivesse
concentrado muito mais na UDN, do que propriamente em Jânio Quadros, não
65
significa que o candidato tenha escapado das críticas registrados nos traços de Appe
que, influenciadas pelo discurso de oposição, chegou a retratar Jânio como um louco.
Em agosto de 60, com a proximidade das eleições, Appe preencheu duas
páginas inteiras com uma charge na qual vários personagens políticos, que disputavam
naquele ano os cargos de Presidente ou de Governador, levavam presentes a um
personagem representando um eleitor, que por sua vez, exibia sua cédula de voto.
Jânio, em meio ao grande grupo aparecia despenteado, com a barba por fazer e a
gravata mal colocada, além de estar babando, em uma referência clara ao “político
desequilibrado”, frequentemente apontado por seus opositores. Por mais que, naquele
momento, O Cruzeiro não se preocupasse em oferecer uma imagem concreta de Jânio
Quadros, torna-se evidente que as excentricidades do político, destacadas pela
oposição, já eram notadas pela revista e transformadas em tema de algumas das
representações do político.
FIGURA 28. O Cruzeiro, 20 de agosto de 1960 – n. 45 - ano XXXII
95 Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
95 Brizola, 2) Plínio Coelho, 3) Eugênio Gudin, 4) Roberto Silveira, 5) Armando Falcão, 6) Benedito Valadares, 7) Magalhães Pinto, 8) Carvalho Pinto, 9) Lacerda, 10) Sérgio Magalhães, 11) Edna Lott, 12) Bias Fortes, 13) Amaral Peixoto, 14) JK, 15) Jango, 16) Tenório, 17) Tancredo, 18) Prestes, 19) Milton Campos, 20) Lott, 21) Mendes Moraes, 22) Café Filho, 23) Jânio, 24) Plínio Salgado, 25) 1) Adhemar de Barros, 26) Juracy Magalhães
66
FIGURA 29. O Cruzeiro, 20 de agosto de 1960 – n. 45 - ano XXXII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
Cabe aqui ressaltar que, Jânio teve um considerável espaço nas páginas de O
Cruzeiro para expor seus planos de governo, entre outros pontos relevantes de sua
campanha. Entretanto, a oposição da revista, por mais tênue que possa ser considerada,
torna-se evidente quando analisadas algumas fotografias do político que foram
veiculadas pelo periódico. Ao contrário das imagens reproduzidas do Marechal Lott,
algumas fotos de Jânio – que não eram a maioria – retratavam este em poses
desfavoráveis que, novamente, podiam ser associadas à imagem do “político
desequilibrado”.
FIGURA 30. O Cruzeiro, 8 Out. 1960 – n. 52 – Ano XXXII
67
Fonte: Acervo de Periódicos da Biblioteca Pública do Paraná
FIGURA 31.
O Cruzeiro, 8 Out. 1960 – n. 52 – Ano XXXII
Fonte: Acervo de Periódicos da Biblioteca Pública do Paraná
FIGURA 32. O Cruzeiro, 8 Out. 1960 – n. 52 – Ano XXXII
68
Fonte: Acervo de Periódicos da Biblioteca Pública do Paraná.
Quando se trata de representações produzidas pela imprensa, a fotografia
merece uma atenção especial. Vista pelo como leitor como um testemunho do real, a
imagem proporciona à reportagem um sentido de distanciamento e neutralidade. Sob
esta ótica, “o fotojornalismo é propagado pelas redações dos jornais, e geralmente
aceito pelo senso comum, como uma fonte de informação imparcial, uma leitura neutra
da realidade”, 96 sendo que a fotografia
[...] é uma forma de registro, não um espelho de verdades e mentiras. A matéria prima da imagem fotográfica é a aparência – selecionada, iluminada, maquilada, produzida, inventada, reinventada – objeto da representação. A fotografia se refere, a realidade externa dos fatos , das fantasias e das coisas do mundo, e nos mostra uma determinada versão iconográfica do objeto representando, uma outra realidade: a realidade fotográfica. 97
Assim, duas realidades surgem a partir do instante em que fotografia é batida.
A primeira realidade é a do momento em que a imagem foi produzida, o específico
96 CHIODETTO, Eder. Fotojornalismo: realidades construídas e ficções documentais. 182 f. Dissertação (mestrado em comunicação) – Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, São Paulo 2008, p. 45. 97 KOSSY, Boris. apud, in: CHIODETTO, id. ibid. p. 45
69
momento em que se é capturada uma fração mínima do real, em “uma interrupção
temporal do contínuo da vida, sequestrada do passado e do futuro imediato, subtraída
de todo o contexto, do som, do cheiro e delimitada pelo espaço reduzido do leitor”. 98
A segunda realidade refere-se ao produto final, quando a imagem torna-se autônoma à
primeira e é decodificada por outros atores distantes do flagrante que a originou.99
Naturalmente, o fotojornalismo de O Cruzeiro apresentou apenas a segunda
realidade aos seus leitores. O distanciamento da primeira permitiu que a revista
apontasse a foto como evidência incontestável que garantiria a veracidade de seu
discurso: o texto visual.
Novamente tal movimento por parte da imprensa está longe de constituir uma
ação neutra. Afinal, como já mencionado, mesmo considerando a existência de um
movimento da imprensa em direção à objetividade e imparcialidade, “o jornalismo não
é ciência”, pois existem nele valores estéticos e subjetivos. 100 Limitação que não
envolve apenas o este campo da comunicação, pois nem mesmo as produções
científicas são capazes de abster-se da parcialidade. Roger Chartier indica que “as
representações do mundo social [...] embora aspirem a universalidade de um
diagnóstico fundado na razão, são sempre determinadas pelos interesses dos grupos
que a forjam.”101 Nesse sentido, torna-se plausível ponderar que, ao reproduzir a
imagem de um político, os organizadores de O Cruzeiro – por mais discreta que possa
parecer a atuação destes – estavam preocupados em reproduzir estratégias e práticas
que tendessem a impor sua autoridade à custa de outros.
Na ocasião, as reportagens dedicadas a temas do universo político da revista O
Cruzeiro só passaram a destinar efetivamente suas atenções ao candidato udenista,
quando este, com as crises partidárias – supostamente – já solucionadas e uma
campanha eleitoral muito bem recepcionada pelos eleitores, mostrou-se, junto ao
Marechal Lott, um forte candidato.
Em uma atitude – classificada pela própria revista como uma demonstração
de sua imparcialidade – O Cruzeiro ofereceu aos dois principais candidatos um almoço
98 CHIODETTO, Eder. id. ibid., p 47 99 id. ibid. p. 45-47 100 CAPELATO. op. cit. p.61 101 CHARTIER, Roger. História Cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990, p. 13.
70
no qual ambos teriam a oportunidade de discursar e apresentar seus planos de governo.
Porém, o Marechal Lott não pôde comparecer ao encontro devido a um acidente que
havia sofrido durante um comício, fato que não impediu que a revista informasse aos
leitores sobre a situação do candidato. Com imagens do Marechal hospitalizado, O
Cruzeiro afirmou que o acidente que interrompera os últimos momentos da campanha
de Lott, significava perdas tanto para a revista quanto para os eleitores. Em referência
a fotografia, a curta matéria ainda lembrou, em tom de “brincadeira”, que Teixeira Lott
era sério, mesmo deitado. 102
FIGURA 33. O Cruzeiro, 15 de outubro de 1960 – n. 1 – ano XXXII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
Jânio por sua vez, não deixou de aproveitar a oportunidade e adotando um
tom de seriedade trocou elogios com a revista e posou ao lado de sua caricatura
idealizada por Appe. O Cruzeiro, apresentando um candidato sorridente, bem
arrumado e confiante expôs, na íntegra o discurso de Jânio classificando a fala do
político como a “mais bela de toda a campanha”. Discurso que, de acordo com a
revista, o “Brasil deveria ler em voz alta, como profissão de fé em seu destino
glorioso”. 103
FIGURA 34 O Cruzeiro, 15 de outubro de 1960 – n. 1 – ano XXXII
102 ACIDENTE. In: O Cruzeiro, Rio de Janeiro, p. 2, 15 out. 1960. 103 BRAGA, Badaró; AMÉRICO, Rubens; LUIZ, Walter. Jânio Falou pra o Continente na Tribuna de ‘O Cruzeiro’. In: O Cruzeiro, Rio de Janeiro, p. 154-158, 15 nov. 1960.
71
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
Diferente da explícita hostilidade registrada pelo Ultima Hora, a revista O
Cruzeiro, ao fim das campanhas, mesmo apoiando o Marechal Lott, mostrava-se
relativamente democrática ao apresentar Jânio como um candidato sério e classificá-lo
como um forte e confiante concorrente ao cargo de Presidente.
Quando Jânio Quadros venceu as eleições, conquistando uma votação recorde
de 48% do eleitorado, a revista se encarregou de apresentar aos seus leitores a imagem
de um político vencedor, publicando a biografia do recém-eleito Presidente da
República, acompanhada de fotografias de JQ junto ao povo104.
FIGURA 35. O Cruzeiro, 25 de outubro de 1960 – n. 2 – ano XXXIII
104 DUARTE, Eurilo. Jânio Vem pela Voz das Urnas. In: O Cruzeiro. Rio de Janeiro, p. 122-126, 25 out. 1960.
72
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
Enquanto a O Cruzeiro reconhecia os feitos do candidato da vassoura, a
ferrenha oposição representada pelo UH permaneceu com suas fortes críticas ao
declarar que a vitória estava relacionada à suposta demagogia do candidato,
divulgando, por exemplo, uma entrevista de Luiz Carlos Prestes, na qual o líder
comunista afirmou que Jânio se aproveitara do momento de fragilidade econômica do
país para conquistar seu eleitorado com falsas promessas. 105
As revistas O Cruzeiro e Manchete, ambas opositoras a Jânio, chegaram a
prestar homenagens ao recém-eleito Presidente, divulgando amplamente uma
ilustração impressa em uma toalha, que na ocasião era distribuída por todo país pela
empresa Vulcan Material Plásticos, uma das patrocinadoras da Campanha de Jânio. Na
imagem, Jânio aparecia bem vestido rodeado de diversas figuras vislumbradas como
“atributos da justiça, das artes, da educação, da agricultura, da indústria, da
infraestrutura e da construção civil” 106, indicativos da plataforma do governo Jânio
Quadros. Após a vitória nas urnas, O Cruzeiro, antes opositora, passou a trazer
anúncios claramente favoráveis ao político.
FIGURA 36
105 PRESTES, Luiz Carlos. Demagogia In: Ultima Hora, Rio de Janeiro, p.4, 13 out. 1960. 106 QUELER, Jefferson José. A Roupa nova do Presidente: a politização da imagem pública de Jânio Quadros. In: Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material. Vol. 19 nº 2, julho- dezembro. São Paulo: USP, 2011, p. ir. Disponível em: <http://www.scielo.br>. Acesso em: 24 de fev. de 2015.
73
Ilustração impressa em toalha distribuída pela empresa Vulcan Material Plásticos
Fonte: QUELER, Jefferson José. A Roupa nova do Presidente: a politização da imagem pública de Jânio Quadros. In: Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material. Vol. 19 nº 2, julho- dezembro. São Paulo: USP, 2011, p. ir. Disponível em: <http://www.scielo.br>. Acesso em: 24 de fev. de 2015.
A mudança de atitude de O Cruzeiro é significativa para refletir sobre como a
imprensa costuma lidar com as frequentes reviravoltas no universo da política. Como
num jogo de xadrez, os impressos obrigaram-se a mudar suas estratégias conforme o
imprevisível cenário político define as suas jogadas. A pesquisadora Maria de
Carvalho Nastri confirmou tal subjetividade da imprensa ao afirmar que a mídia é
partidária de uma dada ideologia; o que significa que ela opta “por uma situação no
mundo”. 107 Neste caso específico da revista O Cruzeiro é perceptível o movimento de
inversão de seus discursos em busca de uma posição mais confortável perante seu ao
público. Lógica que se torna ainda mais plausível ao lembrar que Jânio Quadros
venceu a eleição com uma votação recorde de cerca de 5,5 milhões de votos. Talvez a
preocupação da revista se concentrasse na quantidade de leitores que optaram pelo
107 CARVALHO, Maria T. Nastri. op. cit., p. 41.
74
candidato da vassoura, porém esta afirmação foge as propostas deste trabalho, embora
deixe um alerta àqueles que compartilham desta análise.
Após JQ vencer as eleições, O Cruzeiro se esforçou em apresenta-lo ao povo
brasileiro, sendo que a simplicidade do personagem, antes satirizada, tornou-se foco
das matérias associadas ao político. Entrevistando a mãe, o barbeiro e até mesmo, o
dentista de Jânio Quadros, a revista, complementando suas matérias com um acervo de
fotos de colegas e familiares do político, buscou apresentar Jânio como um homem
comum, dedicado aos seus ideais e, sobretudo, muito querido pelo povo.
FIGURA 37. O Cruzeiro, 12 de novembro de 1960, - n. 5 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
FIGURA 38.
O Cruzeiro, 12 de novembro de 1960, - n. 5 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
75
FIGURA 39. O Cruzeiro, 12 de novembro de 1960, - n. 5 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
FIGURA 40.
O Cruzeiro, 5 de agosto de 1961 – n. 43 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
76
A matéria redigida por Audálio Dantas e George Torok, torna-se um exemplo
de como a grande imprensa, e neste caso específico O Cruzeiro, busca influenciar os
leitores apontando um caminho a ser seguido a partir de interpretações propostas
acerca do real, com o objetivo de ampliar ou restringir as possibilidades de que o leitor
perceba os elementos inerentes à história vivida. Alterando os discursos anteriores,
nesta reportagem a proposta da revista constituiu em apresentar o lado humano de
Jânio Quadros por meio do depoimento de sua mãe, Dona Leonor. No texto, a
entrevista ressaltava lembranças do jovem rapaz que, nas palavras da Senhora Leonor,
era “inteligente sim e estudioso, como qualquer rapaz pobre e de responsabilidade”;
aluno de notas boas e que não deixava de assistir aula, apresentando o atual presidente
como uma pessoa de origem simples e que se dedicou muito para chegar onde havia
chegado. 108
A matéria contava também, com a já citada fotografia de Jânio durante o
período em que exercia o cargo de vereador pela cidade de São Paulo. Nesta, o então
presidente aparecia gesticulando durante um discurso, de olhos arregalados, barba por
fazer, cabelos por cortar, terno e gravata desalinhados, além de se encontrar em uma
posição cômica: prato cheio para a oposição. No entanto, na publicação de O Cruzeiro
a imagem ganhou outro sentido após a inserção da legenda: “com gesticulação viva,
palavra inflamada, roupa em desalinho, eis o Jânio Quadros Vereador em 1949, em
São Paulo. Agora está diferente: aparou a barba e endireitou a gravata” 109. Pode-se,
neste momento, inferir que esta publicação objetivou apresentar a trajetória de Jânio
até a Presidência de forma positiva para convencer os leitores de que o político da
vassoura mudou sua postura pública, antes desajeitada, para adotar uma compatível ao
novo cargo.
108 DANTAS, Audálio; TOROK, George. Meu Filho Presidente In: O Cruzeiro, Rio de Janeiro, 29 out. 1960. 109 id. ibid. p.07
77
FIGURA 41. O Cruzeiro, 29 de Outubro de 1960 – n. 03 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
O próprio chargista Appe que satirizava o candidato, diante do novo contexto
político passou a apresentar suas sátiras com um novo sentido. Em edição de 19 de
novembro de 1960, o chargista retratou Jânio deitado descansando em uma ilha,
enquanto sobrevoavam mísseis sobre sua cabeça representando os problemas que
enfrentaria em seu mandato, e que devido a confiança e tranquilidade com que
assumiu o governo, pareciam de fácil solução e, portanto, não o incomodavam.
78
FIGURA 42. O Cruzeiro, 19 de novembro de 1960 – n. 6 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
Amilde Pedrosa apresentava também, um Jânio Quadros ativo e repressor,
sobretudo após a adoção das primeiras medidas político-administrativas, quando
determinou a instalação de cinco comissões de inquérito110 para examinar as
irregularidades administrativas da gestão JK. A ação de caráter moralizante, que já
uma era marca do modo de governar de Jânio, não passou despercebida pelo chargista,
como se pode comprovar na ilustração a seguir:
110 Tais comissões “tinham ordem expressas para realizar devassas em órgãos públicos em nome do presidente da República. Alguns dos primeiros órgãos investigados foram a Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Bancários e a Comissão de Abastecimento e Preço. [...] Tais comissões, como se pode imaginar, descobriram delitos contábeis, superfaturamento, licitação fraudulentas, favoritismo”. Irregularidades que envolviam “deputados federais e/ou senadores de diversos partidos políticos”. In: FERREIRA, Jorge; GOMES, Ângela Castro. 1964: o golpe que derrubou um presidente, pôs fim ao regime democrático e instituiu a ditadura no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2014.
79
FIGURA 43. O Cruzeiro, 25 de março de 1961 – n. 24 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
Nos primeiros meses de atuação do Presidente, a revista trouxe uma matéria
sobre as novas vestimentas indianas que o político havia começado a usar enquanto
estava no Planalto. Para Jefferson José Queler o uso de slacks indianos estava
simbolicamente ligado à Política Externa Independente (PEI), adotada pelo governo
JQ. Ao invés de ter de optar entre o bloco capitalista ou comunista, como acontecia
nos demais países devido o estado de Guerra Fria, Jânio escolheu a ampliação dos
mercados para os produtos de terceiro mundo. Nesse sentido, para Queler, sua
vestimenta fazia alusão à defesa de relações comerciais com as regiões da Ásia, da
África e do Leste Europeu. 111
No entanto, a matéria de O Cruzeiro deu outro sentido a esta ação,
apresentando o “New Look do presidente” apenas como uma entre suas “inovações
111 QUELER, Jefferson José. A Roupa nova do Presidente: a politização da imagem pública de Jânio Quadros. In: Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material. Vol. 19 nº 2, julho- dezembro. São Paulo: USP, 2011, p. ir. Disponível em: <http://www.scielo.br>. Acesso em: 24 de fev. de 2015.
80
revolucionárias”, sendo que as outras criticadas eram: sua nova máquina de teletipo e o
seu obstinado uso do Palácio do Planalto. 112
Jânio Quadros que já havia convocado uma cadeia de rádios para pronunciar
um implacável discurso contra JK, explicar a população sobre a situação financeira
brasileira e retaliar a grave situação econômica que, para ele se configurava como uma
crise moral, administrativa e político-social, tomou algumas medidas para combater o
favoritismo e o compadrio que sugavam a nação. O então presidente instaurou a
chamada “verdade cambial” e desvalorizou o Cruzeiro em 100% diante do dólar, além
de cortar os subsídios ao trigo e à gasolina; medidas que atingiram o coração das
classes médias e trabalhadoras. 113
Não se contentando com tais medidas, enviou ao Congresso a Lei Antitruste
com o objetivo de controlar a remessa de lucros para o exterior e combater o
contrabando. Porém a Política Externa Independente (PEI) foi a linha que permitiu a
Jânio encontrar, mesmo que parcialmente, a simpatia das esquerdas como também a
antipatia dos grupos conservadores. Não se pode negar que, em pouco tempo o país se
projetou no exterior, “com acordos comerciais firmados com Bulgária, Hungria,
Romênia, Iugoslávia; revalidação de passaportes para a URSS, países do leste europeu,
China Popular, Tibete, Mongólia e Coréia do Norte, além da criação de embaixadas
em Dacar, Gana, Nigéria, entre outros países”. 114
A revista O Cruzeiro não ficou alheia a estas medidas e com o subtítulo:
Madrugador, JQ é dos primeiros a chegar ao Palácio do Planalto e logo ataca o
expediente, mostrou aos seus leitores um exímio burocrata ao divulgar imagens de um
pensativo presidente com a afirmativa: “em apenas 48 dias JQ tomou medidas que
alteraram a fisionomia do País”, elencando em seguida um conjunto medidas já havia
realizado, 115 que representavam, respectivamente, parte das ações que envolviam a
112 COUTINHO, Benedito. JQ Apresenta a Linha Planalto: uniforme indiano, Jânio New Look. In: O Cruzeiro. Rio de Janeiro, p. 6-11, 1 abr. 1961. 113 FERREIRA, Jorge. João Goulart: uma biografia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011. p.220 114 id. ibid. p, 220 115 COUTINHO, Benedito. JQ Apresenta a Linha Planalto: uniforme indiano, Jânio New Look. In: O Cruzeiro. Rio de Janeiro, p. 6-11, 1 abr. 1961.
81
Política Externa Independente (PEI), moralização da máquina administrativa e a
reforma econômica.
FIGURA 44. O Cruzeiro, 1 de abril de 1960 – n. 25 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
FIGURA 45. O Cruzeiro, 1 de abril de 1960 – n. 25 – ano XXXIII
82
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
Torna-se relevante neste momento outra observação de Jefferson Queler, a
qual com base nas indicações de Peter Burke, lembrou que “com o fim de muitos
regimes monárquicos na Europa, as convenções do retratismo real tiveram de adaptar-
se a temas como progresso, liberdade, modernidade, igualdade e fraternidade”, sendo
que uma das propostas para isso foi bem representada “em um quadro de Napoleão
produzido por Jacques David”, no qual “nota-se o célebre líder pintado em seu
escritório, ao lado de uma vela acesa e de um relógio marcando quatro horas e
quinze”. Assim, para o historiador, este modelo também teve sua “versão na
formulação da imagem pública de Jânio: em meio à descrença generalizada nos
políticos e na administração pública”, ele se apresentou e foi representado “como um
burocrata”. 116
Mesmo elogiando, a matéria não deixava de apresentar um político de certa
forma diferente, de ações únicas que, quando ressaltadas, pareciam ganhar um sentido
pitoresco. Afinal, não era comum ver o Presidente da República de slack indiano, 116 QUELER, Jefferson José. A Roupa nova do Presidente: a politização da imagem pública de Jânio Quadros. In: Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material. Vol. 19 nº 2, julho- dezembro. São Paulo: USP, 2011, p. ir. Disponível em: <http://www.scielo.br>. Acesso em: 24 de fev. de 2015.
83
cinza, azul ou caqui, andando pelo Planalto. Além disso, a sequências de fotografias
presentes nesta mesma edição, que ilustravam Jânio Quadros discursando sobre a
reforma cambial, reforçava a ideia de um político enérgico, mas por outro lado,
carregado de um sentido cômico. As observações, abaixo destas imagens, revelavam o
sentido jocoso que a matéria atribuiu ao novo look do político. Após a sequência de
fotos, tinha-se a seguinte afirmação: “Aqui estão seis atitudes do Presidente JQ ao
lançar a bomba da reforma cambial que abalou o país. Assunto de 40º para estes dias
que já não eram de pouco calor. O jeito é por um calção. Ou um uniforme indiano” 117
FIGURA 46.
O Cruzeiro, 1 de abril de 1960 – n. 25 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
No entanto, não foram somente elogios ou sátiras que marcaram a relação da
revista com o presidente, ao longo dos sete meses em que Jânio Quadros manteve-se
no poder, O Cruzeiro produziu algumas críticas ao seu governo.
117 COUTINHO, Benedito. JQ Apresenta a Linha Planalto: uniforme indiano, Jânio New Look. In: O Cruzeiro. Rio de Janeiro, p. 2, 1 abr. 1961.
84
Os fracos resultados proporcionados pela reforma cambial por exemplo,
conduziram a revista a afirmar que o reajuste era “inadaptável ou dificilmente
ajustável ao processo de desenvolvimento econômico brasileiro”, e salientar que a
popularidade de Jânio estava sendo abalada, pois o setor mais atingido pela reforma
eram as “camadas sociais mais numerosas” 118. As críticas vieram, também, por meio
das charges.
FIGURA 47. O Cruzeiro, 22 de abril de 1961 – n. 25 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
A Política Externa Independente, assumida por Jânio Quadros, na qual o
político, em pleno estado de Guerra Fria, não assumia uma posição em relação ao
bloco comunista ou capitalista, também foi alvo de críticas de algumas das charges de
Appe que o representou como confuso e indeciso.
FIGURA 48. O Cruzeiro, 15 de Julho de 1961 – n. 40 – ano XXXIII
118 PROBLEMA do Governo JQ agora: ganhar popularidade. O Cruzeiro, Rio de Janeiro, p. 111-115, 22 abr. 1961.
85
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
Mesmo com as diversas críticas, as referências ao governo JQ voltavam-se
mais para a crise que enfrentava. A medida que apresentava suas propostas, Jânio se
via cada vez mais isolado politicamente, pois não agradava nem a esquerda nem a
direita. O Cruzeiro, por sua vez, ao publicar a situação chamando-a de “crise”, aliviava
a situação para o Presidente e transferia a culpa ao Congresso. Na edição de 2 de
setembro de 1961, periódico publicou o seguinte texto:
Mais do que o conflito de gerações, o choque de estilos políticos parece ser a raiz de uma crise que se instala lentamente no País e que se pode identificar no contraste do comportamento do Presidente Jânio Quadros, reformador e até revolucionário, em face de um Congresso tímido e temeroso de transpor os limites conservadoristas [...] Estimulado o Poder Executivo pelo desassombro de um chefe disposto a revolucionar a maquina administrativa, transformar-lhe as deliberações em providências concretas que se refletem sobre classes e a opinião pública em extremados impactos emocionais, o Congresso, prisioneiro de normas rígidas, de critérios regimentais ultrapassados, é presa da inércia ditada pelos velhos caciques partidários, alguns hábeis e de espírito público, mas que ainda não acreditam no progressivo desprestígio da instituição legislativa, na medida em que se repelem e evitam a renovação de seus métodos. 119
119 CONFRONTO de estilos entre Jânio e o Congresso. In: O Cruzeiro. Rio de Janeiro, p.110-111, 2 set. 1961.
86
Em 25 de agosto de 1961, sem nenhum obstáculo instransponível para seu
governo que justificasse seu ato, Jânio renunciou ao cargo de Presidente da República,
em uma atitude que ainda intriga os especialistas no assunto. Na edição de 9 de
setembro, visto que as reportagens que compunham a revista eram realizadas com
semanas de antecedência, O Cruzeiro apresentou, em uma publicação extra120, uma
cobertura dramática do assunto. Com fotografias de Quadros emocionado em sua
despedida, a revista evidenciou a imagem de um político que se sacrificava em função
de objetivos maiores. Segunda a matéria:
Ao entrar no Viscount121, rumo São Paulo, o Sr. Jânio Quadros teve uma última declaração para o General Pedro Geraldo e para o Jornalista José Aparecido: - Deus é testemunha – disse – dos esforços que fiz para governar bem, sem ódio e nem rancores. Nesta hora penso nos humildes, é muito difícil ajuda-los.122
FIGURA 49.
O Cruzeiro, 9 de Setembro de 1961 – n.48 – ano XXXIII
120 Edição “extra”, pois já havia sido veiculado um número da revista naquela mesma data. 121 Modelo do avião. 122 LEMOS, Ubiratan. Renúncia e comícios. In: O Cruzeiro In: O Cruzeiro. Rio de Janeiro, p.39, 9 set. 1961.
87
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
FIGURA 50. O Cruzeiro, 9 de Setembro de 1961 – n.48 – ano XXXIII
88
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
FIGURA 51.
O Cruzeiro, 9 de Setembro de 1961 – n.48 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
FIGURA 52.
O Cruzeiro, 9 de Setembro de 1961 – n.48 – ano XXXIII
89
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
O Cruzeiro não apresentou apenas a seriedade da ação, e mais uma vez
reservou um espaço para o lado descontraído da situação. Na mesma publicação sobre
a renúncia, trouxe a reportagem intitulada As Duas Faces (Dramática e Pitoresca) de
um Episódio que Emocionou o Brasil Inteiro. Sem deixar perder de vista o apelo
emocional, o repórter Luiz Carlos Sarreto apresentou ao leitor uma sequência de
acontecimentos curiosos que se desenrolaram no decorrer do episódio. Alguns dos
acontecimentos relatados foram:
Jânio Quadros assinou o documento de sua renúncia com uma caneta esferográfica de 35 cruzeiros que, mais tarde, o seu secretário particular, Sr. José aparecido guardaria como ‘suvenir’. Antes de redigir o documento e a carta de sua renúncia, Jânio pediu ao Sr. Quintanilha Ribeiro que lhe trouxesse um exemplar da Constituição Federal; Frase de Jânio ao se despedir do Sr. José Aparecido: ‘José, meu bem, agora você poderá cuidar de sua ulcera’; 123
Durante o exercício do cargo de Presidente, O Cruzeiro embora criticasse,
buscou divulgar uma boa imagem de Jânio Quadros: um político dedicado, simples e
amado pelas massas. Mas não foi essa a última impressão que o periódico optou por
preservar. Nos meses que se seguiram, a revista, correspondendo aos frequentes
123 SARRETO, Luiz Carlos. As Duas Faces (Dramática e Pitoresca) de um Episódio que Emocionou o Brasil Inteiro. In: O Cruzeiro, Rio de Janeiro, p. 26, 9 set. 1961.
90
discursos de oposição ao político, deu um único sentido à imagem de Jânio: um louco
que decepcionara seus eleitores. Na matéria assinada por David Nasser, apresentou
uma série de relatos de devaneios do ex-presidente. Mesmo reconhecendo em Jânio
Quadros um desequilíbrio psicológico, para o repórter – em tom de descontração – o
culpado da crise nacional proporcionada pela renúncia, não era o político, e sim os 6
milhões de eleitores que votaram nele. A fotografia que acompanhava o texto,
fazendo jus ao conteúdo da matéria, mostrava JQ de olhos bem arregalados,
descabelado e com o colarinho da camisa aberto. Sob o título 6 Milhões de Loucos,
David Nasser escreveu:
Um funcionário revelou, certa vez, meio apavorado, que o encontrara de madrugada vagando pelos corredores do Palácio, metido num pijama, recitando não se sabe o quê, se Shakespeare ou Chico Anísio. Ria e chorava nos melhores pedações. Ora, amigos se vocês surpreendessem alguém de sua família a tais horas, falando assim, sem ser artista – talvez não o internassem, mas passariam a vigiá-lo. Ninguém fez isso na família brasileira. O homem continuou solto e, o que é pior, Presidente. 124
FIGURA 53.
O Cruzeiro, 7 de Outubro de 1961 – n. 52 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
124 NASSER, David. 6 Milhões de Loucos. In: O Cruzeiro, Rio de Janeiro, p.43-44, 20 set. 1961.
91
As charges de Appe também apresentavam os mesmos significados: a loucura
como justificativa à renúncia. O chargista retratou os pressupostos distúrbios de Jânio
ao ilustrar o “suicídio político” de 25 de agosto.
FIGURA 54.
O Cruzeiro, 7 de Outubro de 1961 – n. 52 – ano XXXIII
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
Em de novembro de 1961, a revista ampliou suas críticas dedicando um
considerável espaço entre as demais matérias, com o objetivo de atacar diretamente a
imagem do ex-presidente, acusando-o de “deserção” e “fuga”125, ou fazendo
comentários sobre problemas com alcoolismo. No mesmo mês, David Nasser chegou
até a assumir, com sarcasmo, mas sem perder o tom de “desabafo”, sua parcela de
culpa em ter indicado Jânio como uma boa opção aos eleitores quando este era
candidato à presidência. Nas palavras do jornalista, estes eleitores, não passavam “[...]
de homens e mulheres, velhos ou moços” que se sentiram “ludibriados por um
jornalista muito sem-vergonha” que havia lhes transmitido um “legítimo conto do
125 ARLINDO, Silva. São Paulo Condenou Jânio. In: O Cruzeiro, Rio de Janeiro, p. 4-8, 11 nov. 1961
92
vigário ao lhes aconselhar Jânio” “[...]que lhes faltou com a verdade, que procedeu em
desacordo com a ética, a decadência e ao bom senso. 126
Novamente o fotojornalismo cumpriu um importante papel ao concretizar o
posicionamento da revista perante Jânio Quadros, substituindo as imagens do exímio
burocrata assim como do humilde político, por fotografias em poses ridicularizadas ou
que evidenciassem sentimentos de dúvida e/ou arrependimento.
FIGURA 55.
O Cruzeiro, 11 de Novembro de 1961 – n. 5 – ano XXXIV
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
FIGURA 56
O Cruzeiro, 4 de Novembro de 1961 – n. 4 – ano XXXIV
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
126 NASSER, David. O Reio dos Mascates. In: O Cruzeiro, Rio de Janeiro, p.3- 4, 4 nov. 1961.
93
FIGURA 57. O Cruzeiro, 4 de Novembro de 1961 – n. 4 – ano XXXIV
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná
FIGURA 58.
O Cruzeiro, 4 de Novembro de 1961 – n. 4 – ano XXXIV
Fonte: Acervo de Periódicos, Biblioteca Pública do Paraná.
94
As imagens acima atestam que o discurso da revista se metamorfoseou
conforme os ditames do cenário político lhe apontavam uma direção estável perante a
opinião pública. Nesse sentido, quando lhe foi conveniente à revista, Jânio passou de
frágil candidato a espetacular vitorioso, de competente político a demagogo.
95
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir das discussões proporcionadas levantadas neste estudo, tornou-se
relevante pensar a mídia impressa acima das fronteiras que a apresentam apenas como
um meio informativo subjetivo dotado de interesses quaisquer. Foi observado no
decorrer desta pesquisa monográfica que diferentes análises, realizadas em diversos
campos do conhecimento sobre a imprensa, possibilitam o entendimento deste veículo
informativo enquanto uma complexa força política, uma vez que, a mídia impressa
exerce “o poder de dizer e de silenciar, de julgar e de eleger quem participa ativamente
da definição do conhecimento, assim como quem é excluído desse processo”. 127
Ao desenvolver uma estrutura teórico-metodológica que pautasse o
desenvolvimento da pesquisa, partiu-se do pressuposto que a manipulação da
informação por parte do jornalista não depende exclusivamente de suas ações
voluntárias. Afinal, como lembrou a historiadora Maria Helena Capelato, mesmo
considerando a existência de um movimento da imprensa em direção à objetividade e
imparcialidade, o jornalismo não é ciência, pois existem nele valores estéticos e
subjetivos que conduzem a admissão das limitações deste ofício. 128 Limitações que
não se aplicam apenas a este campo, pois vão além e aquém das páginas dos impressos
e possibilitam o entendimento de que quaisquer representações sociais de mundo –
produzidas pela imprensa ou não – mesmo fundadas em uma razão são sempre
determinadas por aqueles que as inventam.
Tornou-se relevante destacar também os novos métodos de atração
desenvolvidos pelos jornais que, com o objetivo de reforçar sua imagem como agentes
neutros passaram a oferecer diferentes formas de diagramação, exploração de charges
e o crescente uso das fotografias, legitimando assim, a sua função como transmissores
“fieis” da realidade para seus leitores.
Após estas considerações, desenvolvidas junto a alguns exemplos presentes na
história nacional, as principais características da revista O Cruzeiro foram
apresentadas. Neste momento, a partir da análise da história da revista, foram
127 CARVALHO, Maria T. Nastri. op. cit. p. 41. 128 CAPELATO. op. cit. p.61
96
apontados alguns itens que, acima de outros, contribuíram de forma decisiva para que
O Cruzeiro se destacasse no mercado editorial, como também auxiliaram na
construção da identidade da revista. Assim sendo, o sensacionalismo; a relação
estabelecida entre o periódico e o mercado internacional do gênero, e o fotojornalismo,
surgiram como principais itens que caracterizavam a abordagem de O Cruzeiro. Itens
também considerados como os responsáveis por garantir a popularidade do impresso.
Com o intuito de apontar como se deu a construção da imagem de Jânio
Quadros pela revista, levando em conta as exposições acima mencionadas, foram
apresentadas e discutidas as diversas faces do político, construídas tanto por JQ e seus
seguidores, quanto por seus opositores. Neste momento, pôde-se perceber que Jânio –
bem como seus seguidores – esforçou-se em garantir que sua imagem fosse associada
a atributos políticos como: o combate à corrupção, à ação em prol das camadas mais
pobres da sociedade, sobretudo a trabalhadora e à independência em relação aos
partidos políticos, enquanto a oposição o representava como um líder demagogo e
louco.
Em meio a discursos tão opostos, a revista O Cruzeiro optou pela habitual
subjetividade da imprensa periódica. Durante o período de campanhas, o impresso que
apoiava a indicação do marechal Henrique Teixeira Lott se opôs ao “candidato da
vassoura” desde o momento em que este lançou sua candidatura em janeiro de 1960.
No entanto, após a vitória nas urnas, a revista apresentou a seus leitores uma imagem
muito favorável aos interesses do novo presidente ao retratar Jânio como um político
simples e competente.
Durante o exercício de seu mandato como líder do Executivo, em certas
ocasiões, Jânio Quadros foi criticado pela revista, que não chegou a construir
efetivamente uma imagem negativa do político. Todavia, quando Jânio se viu sob forte
oposição do Congresso, O Cruzeiro posicionou-se claramente ao lado do Presidente.
Contudo, após a inesperada renúncia O Cruzeiro optou por atribuir outros
sentidos a imagem de Jânio Quadros, possivelmente influenciada por sua evidente
preferência pelo exagero e bom humor, demonstrados nos discursos de oposição ao
político. A partir de 25 de agosto a revista apresentou JQ como um personagem
97
psicologicamente desequilibrado e, sobretudo, como o demagogo que havia enganado
milhões de eleitores.
Esta investigação permitiu também a percepção do importante papel
desempenhado pelo fotojornalismo na construção da imagem de Jânio Quadros. Com
um grande acervo de fotografias, a revista O Cruzeiro apresentou JQ como um político
dotado de inúmeras qualidades, mas também, quando lhe foi apropriado, divulgou a
imagem do mesmo personagem como um político louco e cheio de vícios.
A oposição declarada, assim como o apoio a Jânio, tornaram-se apreciáveis
opções de posicionamento por parte de O Cruzeiro, quando estes eram favoráveis à
imprensa de modo geral. Nesse sentido, este trabalho conseguiu evidenciar o
comportamento subjetivo que a imprensa tem perante a política.
Enfim, espera-se que as discussões sobre os discursos da revista O Cruzeiro a
respeito da imagem de Jânio Quadros instiguem novas reflexões acerca do papel da
imprensa enquanto um agente construtor de consenso no que diz respeito às relações
sociais que configuram a sociedade.
98
FONTES
Tribuna da Imprensa. 5 de Agosto de 1954 – n. 1402 – ano VI
Diário Carioca, 6 de Agosto de 1954 – n. 8001 – ano XXVI
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Tribuna da Imprensa. 5 de Agosto de 1954 – n. 1402 – ano VI
Tribuna da Imprensa. 24 de Agosto de 1954 – n. 1418 – ano VI
Ultima Hora, 24 de Agosto de 1954 – n. 979 – ano IV
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Jornal Ultima Hora – n. 2676 – ano IX
Jornal Ultima Hora – n. 3109 – ano X
Manchete, 2 de janeiro de 1960 – n. 4022 - ano VII
O Cruzeiro, 2 de janeiro de 1960 – n. 32 – ano XII
O Cruzeiro, 24 de Junho de 1960 – n. 37 – ano XXXIII
O Cruzeiro, 16 de Julho de 1960 - n. 40 - ano XXXII
O Cruzeiro, 6 de agosto de 1960 – n. 43 – ano XXXII
O Cruzeiro, 20 de agosto de 1960 – n. 45 - ano XXXII
O Cruzeiro, de 8 outubro de 1960 – n. 52 – Ano XXXII
O Cruzeiro, 15 de outubro de 1960 – n. 1 – ano XXXII
O Cruzeiro, 15 de outubro de 1960 – n. 1 – ano XXXII
O Cruzeiro, 25 de outubro de 1960 – n. 2 – ano XXXIII
O Cruzeiro, 12 de novembro de 1960, - n. 5 – ano XXXIII
O Cruzeiro, 29 de Outubro de 1960 – n. 03 – ano XXXIII
O Cruzeiro, 19 de novembro de 1960 – n. 6 – ano XXXIII
O Cruzeiro, 25 de março de 1961 – n. 24 – ano XXXIII
O Cruzeiro, 1 de abril de 1960 – n. 25 – ano XXXIII
O Cruzeiro, 22 de abril de 1961 – n. 25 – ano XXXIII
O Cruzeiro, 03 de Junho de 1961 – n. 34 – ano XXXIII
99
O Cruzeiro, 15 de Julho de 1961 – n. 40 – ano XXXIII
O Cruzeiro, 5 de agosto de 1961 – n. 43 – ano XXXIII
O Cruzeiro, 9 de Setembro de 1961 – n.48 – ano XXXIII
O Cruzeiro, 7 de Outubro de 1961 – n. 52 – ano XXXIII
O Cruzeiro, 11 de Novembro de 1961 – n. 5 – ano XXXIV
O Cruzeiro, 4 de Novembro de 1961 – n. 4 – ano XXXIV
100
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