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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
Fabiana Vanini
RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR NO ACIDENTE DE
TRABALHO
CURITIBA
2010
3
Fabiana Vanini
RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR NO ACIDENTE DE
TRABALHO
Monografia apresentada ao Curso de Direito
da Faculdade de Ciências Jurídicas da
Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito
parcial para a obtenção do título de bacharel
em direito.
Orientador: Professor Renato Luiz de Avelar
Bandini.
CURITIBA
2010
4
TERMO DE APROVAÇÃO
Fabiana Vanini
RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR NO ACIDENTE DE
TRABALHO
Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de bacharel no curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.
Curitiba, de de 2010.
________________________________________________
Curso de Direito da Universidade do Paraná
Orientador: Prof. Renato Luiz de Avelar Bandini Universidade Tuiuti do Paraná
5
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Renato Luiz de Avelar Bandini, meu orientador,
por todo o apoio e incentivo dispensados
durante a realização desta pesquisa;
A todos os demais professores e colegas
que colaboraram direta e indiretamente
para a conclusão deste trabalho.
6
DEDICATÓRIA
Primeiramente, a Deus que me deu o dom da vida, agraciando-me com este
momento tão especial.
Aos meus pais, que sempre estiveram ao meu lado nos momentos fáceis e difíceis,
sempre incentivando, apoiando, mostrando-se presentes e por muitas vezes,
abdicando de momentos de lazer, de sono e tranqüilidade em meu proveito.
Aos meus irmãos, Fábio e Fernanda, que sempre estiveram ao meu lado nesta
caminhada, incentivando-me nos estudos.
Aos meus avós, presentes ou não, que certamente vibram comigo neste momento
de vitória.
Aos meus filhos, Felipe e Rafael, pela paciência, de me acompanharem
primeiramente na barriga durante a gravidez, que depois de um dia de trabalho, a
noite a faculdade, onde às vezes as aulas foram cansativas, e depois quando
nasceram, que por muitas vezes aguardavam a mamãe chegar em casa para dar
um cheirinho e depois dormir. E ainda, nesta fase de redigir a monografia, que
inúmeras foram as vezes que queriam escrever, ler meus livros, rabiscar, e não
entendiam, por que a mamãe não podia dar atenção que eles mereciam, porém
tenho a certeza de que quando crescerem irão compreender.
Ao meu noivo Julio, que esteve comigo em muitos momentos difíceis, sempre me
apoiando e me dando palavras de incentivos aos estudos, ouvindo minhas lamúrias,
e a tão esperada conclusão deste estudo.
Agradeço, enfim, a todos aqueles que participaram da minha vida acadêmica e que
de forma direta ou indireta contribuíram para que este sonho se tornasse possível.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................9 1.0 EMPREGADOR ..................................................................................................10 1.1 CONCEITO ..........................................................................................................10 1.2 EMPRESA ...........................................................................................................11 1.3 SUCESSÃO DE EMPREGADORES ...................................................................12 1.3.1 Espécies de sucessões ....................................................................................13 1.3.1.1 Situações tipo de sucessões..........................................................................13 1.3.1.2 Situações tipo: novas de sucessão ...............................................................14 1.3.2 Requisitos da sucessão trabalhista ..................................................................14 1.3.2.1 Transferência de unidade econômico jurídica ...............................................14 1.3.2.2 Continuidade na prestação laborativa ...........................................................17 1.3.3 Efeitos da sucessão trabalhista ........................................................................17 1.3.3.1 Posição jurídica do sucessor empresarial .....................................................17 1.3.3.2 Posição jurídica do empregador sucedido ....................................................18 1.3.4 Cláusula de não-responsabilidade ..................................................................19 2.0 O ACIDENTE DE TRABALHO ...........................................................................21 2.1 HISTÓRICO DAS LEIS ACIDENTÁRIAS ............................................................21 2.2 CONCEITO DE ACIDENTE DE TRABALHO ......................................................23 2.3 REQUISITOS ......................................................................................................24 2.3.1 Causalidade ......................................................................................................24 2.3.2 Prejudicialidade ................................................................................................25 2.3.3 Nexo causal ou etiológico .................................................................................25 2.4 ESPÉCIES LEGAIS DE ACIDENTE DE TRABALHO .........................................25 2.4.1 Acidente tipo .....................................................................................................26 2.5 DOENÇAS OCUPACIONAIS ..............................................................................29 2.5.1 Conceito ...........................................................................................................29 2.5.2 Modalidades de doenças ocupacionais ...........................................................30 2.5.3 Doença profissional ..........................................................................................31 2.5.4 Doença de trabalho ..........................................................................................32 2.5.5 Doenças provenientes de contaminação acidental ..........................................34 2.5.6 Outras hipóteses ..............................................................................................34 2.6 NATUREZA JURÍDICA ........................................................................................36 2.7 NORMAS DE SEGURANÇA DE TRABALHO .....................................................38 2.7.1 Organização Internacional do Trabalho ...........................................................40 2.7.1.1 Convenções da OIT e sua eficácia jurídica ...................................................41 2.7.1.2 A saúde do trabalhador e suas principais convenções .................................41 2.7.2 Princípios Constitucionais e Normas Infraconstitucionais vinculados ao acidente de trabalho ..................................................................................................43 2.7.2.1 Proteção a saúde sob enfoque constitucional................................................45 3.0 RESPONSABILIDADE NA REPARAÇÃO POR ACIDENTE DO TRABALHO..48 3.1 RESPONSABILIDADE CIVIL – ASPECTOS HISTÓRICOS................................48 3.1.2 Conceito Responsabilidade Civil ......................................................................50 3.1.3 Abuso de direito como fundamento da obrigação de indenizar .......................51 3.1.4 O ilícito como fato gerador ...............................................................................52
8
3.1.5 Teoria da graduação da culpa ..........................................................................53 3.2 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL .....................................................54 3.2.1Responsabilidade Civil subjetiva e objetiva........................................................55 3.2.1.2 Risco Proveito ...............................................................................................62 3.2.1.3 Risco Profissional ..........................................................................................62 3.2.1.4 Risco de Autoridade ......................................................................................63 3.2.1.5 Risco excepcional ..........................................................................................64 3.2.1.6 Risco Criado ..................................................................................................64 3.2.1.7 Risco integral .................................................................................................65 3.3 RESPONSABILIDADE CRIMINAL ......................................................................66 3.4 CAUSAS EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL .............................67 3.5 DANOS DECORRENTES DO ACIDENTE DO TRABALHO ...............................70 3.5.1 Danos materiais ................................................................................................71 3.5.1.2 Dano emergente ............................................................................................72 3.5.1.3 Lucro cessante ..............................................................................................73 3.5.2 Danos morais ...................................................................................................74 3.5.2.1 Aferição dos danos morais ............................................................................76 3.5.2.2 Valor da indenização .....................................................................................77 3.5.3 Dano estético ....................................................................................................79 3.5.3.1 Cumulação com danos morais ......................................................................79 3.5.3.2 Requisitos para responsabilidade indenizatória ............................................81 3.6 A INTERPRETAÇÃO DO ART. 7, INCISO XXVIII DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988......................................................................................................................82 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................84 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..........................................................................86
9
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como finalidade apresentar um estudo sobre a
relevância e a complexidade de um tema atual que é a Responsabilidade Civil do
Empregador no Acidente de Trabalho. Este estudo se aterá, mais propriamente, à
Responsabilidade Civil, consagrada em definitivo no direito brasileiro pelo Código
Civil de 2002 e na Constituição Federal de 1988.
O Código Civil de 1916 era essencialmente subjetivista, pois todo seu
sistema estava fundado na cláusula geral do art. 159. O novo código de 2002, fez
uma profunda modificação nessa disciplina, para ajustar-se à evolução ocorrida na
área da Responsabilidade Civil ao longo do século XX.
Embora o novo código tenha mantido a Responsabilidade Subjetiva, ampliou
a opção pela Responsabilidade Objetiva, tendo em vista as tão extensas e
profundas cláusulas gerais que a consagram, tais como o abuso de direito elencado
no art. 187, o exercício de atividade de risco ou perigosa, elencado no parágrafo
único do art., 927, danos causados por produtos, no art. 933, sobrando muito pouco
para a Responsabilidade Subjetiva.
Antes do atual código, outros diplomas legais já haviam inovado no aspecto
objetivo da Responsabilidade Civil. Nestas leis especiais a teoria da
Responsabilidade Objetiva está expressa de forma evidente, verificando-se assim, a
vasta legislação sobre acidente de trabalho. Com isso, a teoria da responsabilidade
sem culpa foi ganhando espaço primeiramente em casos específicos, sendo assim,
o atual código civil sofreu grande influência, pois proporcionou o entendimento de
que a teoria da responsabilidade objetiva efetivamente incorporou-se ao direito
pátrio.
10
1. O EMPREGADOR 1.1 CONCEITO
Ao analisarmos o artigo 2˚, “caput”, da CLT, vemos que o mesmo nos traz
um conceito de empregador, o qual para nosso estudo do tema se faz necessária
análise, vejamos:
Art. 2˚ - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação de serviço.1
Argumenta DELGADO que “Tratando-se de conceito estritamente relacional,
a caracterização da figura do empregador importa na simples apreensão e
identificação dos elementos fático jurídicos da relação de emprego, aduzindo-se que
o tipo legal do empregador estará cumprido por aquele que se postar no pólo
passivo da relação empregatícia formada”.2
Segundo entendimento firmado pelo doutrinador colacionado acima, o termo
“empresa”, expresso no artigo 2˚da CLT estaria tecnicamente equivocado, tendo em
vista que, para a caracterização do empregador, bastaria a análise da existência ou
não do vínculo empregatício havido entre as partes.
O artigo 3˚ da CLT, trata por sua vez do vínculo empregatício:
Art.3˚- Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.
1 BRASIL. Decreto lei n°5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a consolidação das leis do trabalho. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm. Acesso em 15 de março de 2010. 2 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 6. Ed. São Paulo: LTr, 2007, p.393.
11
Sendo assim, seguindo esta linha de pensamento, para efeitos conceituais,
será considerado empregador quando, em havendo subordinação, não
eventualidade e salário, indiferentemente da pessoa que a contrata, seja ela física
ou jurídica.
1.2. EMPRESA
Segundo MARTINS, empresa pode ser definida como:
“A empresa é a atividade organizada para a produção ou circulação de bens e serviços para o mercado, com fito de lucro. O essencial em qualquer empresa, por natureza, é que ela é criada com a finalidade de se obter lucro na atividade. Normalmente, o empresário não tem por objetivo criar empresa que não tenha por finalidade o lucro. A exceção à regra, são as associações beneficentes, as cooperativas, os clubes, etc. Lógico também que a empresa pode ter por finalidade a obtenção de outros fins, mas o principal é o de alcançar o lucro; mas também é possível dizer que a finalidade principal da empresa não é o lucro, pois este constitui o resultado da atividade empresarial.”3
Ainda, para efeitos de conceituação à luz do direito comercial, REQUIÃO
expõe:
[...] é o complexo de bens materiais e imateriais e relações jurídicas que se reúnem como um todo unitário, em função dinâmica e finalidade econômica fixadas por seus titulares. É a organização dos fatores de produção (bens, relações, direitos e obrigações) a serviço de um fim econômico previamente definido.”4
Não obstante o empregador não seja a empresa, esta e o estabelecimento
comercial possuem grande significado no direito do trabalho, pois em diversas
oportunidades, como na caracterização do grupo econômico, ou mesmo da
sucessão de empresas, o complexo de bens materiais e imateriais acentuam a
integração objetiva da relação de emprego.
3 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 176. 4 REQUIÃO, Rubens. Curso de direito Comercial. 1° Volume, 22ª ed., São Paulo: Saraiva, p.57.
12
Em termos de conceito, não importando sua classificação para o estudo do
direito do trabalho, as empresas poderão ser nacionais ou estrangeiras, locais ou
regionais, públicas (devem seguir normas específicas para contratação) ou privadas,
unipessoais ou coletivas, nacionais ou multinacionais.
1.3. SUCESSÃO DE EMPREGADORES
Os artigos 10 e 448 da CLT tratam do tema proposto, que assim dispõem,
sucessivamente:
“Art. 10 – Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados.5 “Art.448 – A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados.6
A sucessão de empregadores é conceituada por DELGADO, da seguinte
forma:
“Consiste no instituto jus trabalhista em virtude do qual se opera, no contexto da transferência de titularidade de empresa ou estabelecimento, uma completa transmissão de créditos e assunção de dívidas trabalhistas entre alienante e adquirente envolvidos.”7
SAAD, de forma mais prática explica:
“A sucessão de empregador – a rigor – concretiza-se quando há uma substituição de sujeito na mesma relação jurídica. A vende a B seu estabelecimento comercial ou industrial. B substitui A na relação jurídico laboral em que o outro pólo (ou sujeito) é o empregado. A norma do art. 10 (como a do art. 448 da CLT) é de ordem pública, e por isso, sobrepõe-se a qualquer disposição contratual ou acordo de vontades. Destarte, quando A vende a B seu estabelecimento e declara que permanece responsável por todas as obrigações de natureza trabalhista, os empregados ignorarão tal ajuste para exigir de B (o novo empregador) o que lhes for devido por lei. Aquela obrigação é válida entre as duas partes – A e B, apenas; os empregados ficam alheios.”8
5 VADE MECUM RT – 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p.758 6Ibidem. p. 788.
7 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 6.ed.São Paulo:LTr,2007,p.409. 8 SAAD, Eduardo Gabriel, et all. CLT Comentada. 41.ed.São Paulo: LTr, 2008,p.91.
13
Cabe salientar que na esfera trabalhista, onde os princípios da continuidade
e em especial o da proteção imperam, as disposições contratuais firmadas entre o
alienante e adquirente não surtirão efeito, especialmente por se tratarem de
disposições inter partis, não atingindo os direitos dos trabalhadores.
1.3.1 Espécies de sucessões
DELGADO explica que:
“A sucessão trabalhista verifica-se segundo fórmulas variadas de modificações empresariais. Distintas, são, pois, as situações tipo de sucessão de empregadores, todas submetendo-se à regência dos arts.10 e 448 da CLT. O essencial para a CLT é que as modificações intra ou interempresariais não afetem os contratos de trabalho dos respectivos empregados.”9
Assim, cabe a análise das situações tipo existentes na CLT, que prevê a
sucessão de empregadores.
1.3.1.1 Situações tipo tradicionais de Sucessão
A primeira situação tipo a ser analisada, trata-se de “alteração na estrutura
formal da pessoa jurídica que contrata empregaticiamente a força de trabalho”.10
Trata da incorporação, cisão, fusão, da modificação da modalidade
societária, englobando-se inclusive, a modificação de firma individual para empresa
societária.
A segunda trata da “substituição do antigo titular passivo da relação
empregatícia (o empregador) por outra pessoa física ou jurídica.”11
9 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 6.ed.São Paulo: LTr, 2007, p. 411. 10 Idem, p.410. 11 Ibidem.
14
Neste caso, ocorre a mudança da pessoa jurídica que anteriormente dirigia o
negócio, enquanto naquela, esta pessoa jurídica era aumentada, diminuída, mas
não substituída.
1.3.1.2 Situações tipo: Novas de Sucessão
A nova interpretação dada aos dispositivos da CLT, transcritos, garantem
que “qualquer mudança intra ou interempresarial não poderá afetar os contratos de
trabalho.”12
Seguindo a linha de pensamento moderno, a sucessão trabalhista ocorreria
com a transmissão de parte significativa do estabelecimento ou da empresa de
modo a afetar significativamente os contratos de trabalho.
1.3.2 Requisitos da sucessão trabalhista
Conforme MARANHÃO expõe, a sucessão trabalhista envolve, via de regra,
dois requisitos:
a)“que uma unidade econômico jurídica seja transferida de um para outro titular; b) que não haja solução de continuidade na prestação de serviços pelo obreiro.”13
1.3.2.1 Transferência de unidade econômico jurídica
A princípio, ou transferência diz respeito ao controle da sociedade ou ao
conjunto desta, que se transfere como um todo.
12 Idem. p.412. 13 Ibidem
15
Sendo assim, ocorre a sucessão trabalhista quando ingressa na relação um
outro sujeito passivo, seja ele controlador de parte ou de todo o estabelecimento.
Segundo DELGADO, não ocorre sucessão de empregadores quando:
“no caso de venda de máquinas ou coisas singulares. A sucessão pressupõe a transferência de uma para outra titular de uma organização produtiva, ainda que parte de um estabelecimento destacável como unidade econômica”14
É indiferente, em princípio, o título jurídico utilizado para efetuar a
transferência.
“Qualquer título jurídico hábil a operar transferência de universalidades no
Direito brasileiro (logo, compra e venda, arrendamento, etc.) é compatível com a
sucessão de empregadores.”15
Para o direito do trabalho há três situações interessantes: a primeira diz
respeito a sucessão ocorrida na empresa concessionária de serviço público. A
segunda aos efeitos do arrendamento, e a terceira na aquisição de acervos
empresariais em hasta pública.
Na primeira, DELGADO explica:
“[...] prepondera entendimento de que, assumindo a nova empresa concessionário o acervo da anterior ou mantendo parte das relações jurídicas contratadas pela concessionária precedente, submete-se às regras imperativas dos dois preceitos celetistas, impositivos de obrigações e direitos trabalhistas prévios.”16
Na segunda hipótese, não há qualquer óbice ao reconhecimento da
sucessão trabalhista, tendo em vista, especialmente, que o título utilizado para a
transferência do estabelecimento, é indiferente.
14 Idem.p.414. 15 Ibidem. 16 Ibidem.
16
Portanto, quando se fala em aquisição em hasta pública, o tema é
extremamente controvertido.
O autor SAAD defende:
“Falência e arrematação de bens. Ausência de responsabilidade trabalhista do arrematante: Conforme o art. 141, da atual Lei de Falência, Lei n.11.101, de 9.2.05, na falência, quando ocorrer a alienação conjunta ou separada de ativos, inclusive da empresa ou de suas filiais (a) todos os credores observada a ordem de preferência definida no art. 83, desta Lei, sub-rogam-se no produto da realização do ativo e (b) o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidente de trabalho.”17
O Tribunal Superior do Trabalho já decidiu:
“Inexiste a sucessão trabalhista, quando o acervo da empresa falida é adquirido em hasta pública e repassado, sem qualquer ônus sobre ele incidente, para um terceiro adquirente.” 18
DELGADO, de outro lado, defende:
“As demais situações em que se transfere a titularidade do estabelecimento ou empresa, preservando-se as relações de trabalho contratadas. Mas o título jurídico enfocado é tido como excepcional – submetido ao interesse de materializar a coisa julgada a que se refere -, sendo hábil, portanto, a neutralizar a regra geral jus trabalhista. Esclareça-se, contudo, que ainda assim emerge como relevante ao efeito elisivo aqui mencionado a previsão nos editais de hasta pública da ruptura propiciada pela aquisição do patrimônio a ser arrematado.”19
Sendo assim, conclui-se de que o tema é controvertido, sendo necessário a
análise do edital de venda antes de se fazer uma conclusão precipitada.
17 SAAD, Eduardo Gabriel, et all; CLT comentada. 41.ed.São Paulo:LTr,2008, p.91. 18 Trata-se de texto de ementa do Acórdão TST, 2.T., Processo RR-2.859/86; rel. Ministro Barata Silva; DJ n. 238/86. 19 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 6.ed.São Paulo: LTr, 2007, p.415
17
1.3.2.2 Continuidade na prestação laborativa
Este requisito não é necessariamente obrigatório, mas é muito importante
para a análise de diversas situações jurídicas.
DELGADO leciona:
“É que a presença do segundo requisito (ao lado, é claro, do primeiro já examinado), torna inquestionável a incidência do tipo legal celetista. Verificando-se a continuidade laborativa em cenário de transferência de interempresarial haverá, indubitavelmente, sucessão de empregadores com respeito ao novo titular da empresa ou estabelecimento. STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 6. ed.RT: São Paulo, 2004,p.147”20
Todavia, a falta de continuidade da prestação laborativa, faz com que se
faça uma análise mais cuidadosa do tipo de transferência ocorrida.
1.3.3 Efeitos da sucessão trabalhista
Duas são as análises necessárias para dimensionar os efeitos da sucessão
trabalhista: aqueles contraídos pelo novo empregador e aqueles existentes pela
empresa sucedida.
1.3.3.1 Posição jurídica do sucessor empresarial
Para efeitos trabalhistas, a empresa sucessora, assume os direitos e
obrigações da sucedida, por força de disposição legal. Opera-se, portanto, a
automática assunção dos contratos trabalhistas pelo novo empregador.
20 Idem. p.416
18
Os efeitos processuais são explicados por MARTINS:
“A empresa sucessora assume as obrigações trabalhistas da empresa sucedida e a sua posição no processo. Podem os bens da sucessora ser penhorados no processo, pois o empregador é a empresa, independentemente da mudança na sua estrutura ou na sua propriedade.”21
DELGADO vai além, explicando que:
“Trata-se, assim, de efeitos jurídicos plenos, envolvendo tempo de serviço, parcelas contratuais do antigo período, pleitos novos com relação ao período iniciado com a sua transferência, etc.”22
1.3.3.2 Posição Jurídica do empregador sucedido
Segundo DELGADO, “a figura sucessória trabalhista provoca a automática
transferência de direitos e obrigações contratuais, por força de lei, do antigo titular
do empreendimento para o novo titular, ou seja, do antigo empregador para seu
sucessor. Opera-se, desse modo, a imediata e automática assunção dos contratos
trabalhistas pelo novo titular da organização empresarial ou de sua parcela
transferida.
O novo titular passa a responder, imediatamente, pelas repercussões
presentes, futuras e passadas dos contratos de trabalho que lhe forem transferidos.
Direitos e obrigações empregatícias transferem-se, imperativamente, por
determinação legal, em virtude de transferência interempresarial operada. Ativos e
passivos trabalhistas – toda a história do contrato – transferem-se em sua totalidade
ao novo empregador. Trata-se, assim, de efeitos jurídicos plenos, envolvendo tempo
de serviço, parcelas contratuais do antigo período, pleitos novos com relação ao
período iniciado com a transferência etc.”23
21 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p.191. 22 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr,2007, p.422. 23 http://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_59/Mauricio_Delgado.pdf
19
Apesar do tema não ser pacífico, DELGADO expõe a sua visão:
“Contudo, a jurisprudência também tem inferido do texto genérico e impreciso dos arts. 10 e 448 da CLT a existência de responsabilidade subsidiária do antigo empregador pelos valores resultantes dos respectivos contratos de trabalho, desde que a modificação ou transferência empresariais tenham sido aptas a afetar (arts.10 e 448) os contratos de trabalho. Ou seja, as situações de sucessão trabalhista propiciadoras de um comprometimento das garantias empresariais deferidas aos contratos de trabalho seriam, sim, aptas provocar a incidência da responsabilização subsidiária da empresa sucedida.”24
A jurisprudência também segue esta mesma linha de raciocínio:
Ementa: O sucessor é responsável pelos contratos de natureza trabalhista mantidos com a empresa sucedida e pelos efeitos decorrentes dos vínculos, sejam eles passados, presentes ou futuros, entre os quais se incluem os direitos adquiridos decorrentes de vínculos empregatícios extintos antes que se concretizasse o negócio jurídico determinante da alteração na titularidade da empresa.(RO 15963/96, Ac. 5ª T.) Marcos Bueno Torres - TRT - MG - DJE - 17/5/1997
Portanto, pode-se dizer que a jurisprudência tem ampliado as possibilidades
de responsabilização subsidiária do antigo titular do empreendimento, além das
situações de fraude.
1.3.4 Cláusula de Não-Responsabilidade
No meio empresarial é comum a estipulação de cláusula de não
responsabilidade no ato da aquisição de estabelecimentos comerciais em sua
universalidade, prevendo-se que o adquirente responderá na esfera trabalhista
somente a contar da transferência efetiva do estabelecimento.
Para efeitos jus trabalhistas, referida cláusula não opera qualquer direito.
DELGADO assevera:
“Tais cláusulas restritivas da responsabilização trabalhista não tem qualquer valor para o Direito do Trabalho. À medida que o instituto sucessório é criado e regulado por normas jurídicas imperativas, torna-se irrelevante para o Direito do Trabalho a existência de cláusulas contratuais firmadas no âmbito dos empregadores envolvidos
24 Idem, p.423.
20
sustentando, por exemplo, que o alienante responderá por todos os débitos trabalhistas, até a data da transferência, sem responsabilização do adquirente. À luz da CLT, tais débitos transferem-se, sim, imperativamente ao adquirente.”25
Ressalta-se que apesar de não surtirem efeitos perante as relações
trabalhistas, ainda sim as cláusulas mostram-se importantes para efeitos civis e
comerciais, entre o adquirente e o alienante.
Tanto é verdade que aquelas garantias contratuais podem assegurar ao
adquirente o ressarcimento, através de ação de regresso, dos prejuízos advindos do
período anterior a aquisição.
25 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 6. ed. SãoPaulo:LTr, 2007, p.422.
21
2. O ACIDENTE DE TRABALHO
2.1. HISTÓRICO DAS LEIS ACIDENTÁRIAS
A partir do século XIX, com o incremento da industrialização, deu causa a
ocorrência mais significativa de acidentes em decorrência da atividade desenvolvida
pelo obreiro, fazendo com que a Alemanha fosse pioneira na elaboração de uma lei
específica para tratar dos acidentes de trabalho.
No início do século XX, no Brasil, diversos projetos versavam sobre a
instituição de uma lei específica para tratar do tema, advindo daí o Decreto
Legislativo nº.3.724 de 15 de janeiro de 1919, considerada a primeira Lei acidentária
brasileira.
COSTA descreveu essa lei como “significou a emancipação da infortunística
do cordão umbilical que a mantinha de alguma forma presa ao direito comum,
reforçando sua autonomia do direito trabalhista específico, não obstante as
resistências dos saudosistas da monarquia.”26
Quando da edição da segunda lei acidentária, o Decreto nº 24.637 de 10 de
julho de 1934, o conceito de acidente passou a englobar também as doenças
profissionais atípicas, determinando o pagamento de seguro ou depósito junto ao
Banco do Brasil ou Caixa Econômica Federal para garantir o pagamento das
indenizações.
Com a edição da terceira lei acidentária, o Decreto-Lei nº 7.036, de 10 de
novembro de 1944, passou a incorporar as concausas e o acidente in itinere,
determinando ainda que o empregador proporcionasse o máximo de segurança aos
seus funcionários, tendo em vista que muito mais valia a prevenção do que o
26 COSTA, Hertz J. Acidentes do Trabalho na Atualidade. Porto Alegre: Síntese, 2003, p. 44.
22
pagamento de indenizações posteriores, que não compensavam a perda do ente
querido.
Com o Decreto-lei nº 293 de 28 de fevereiro de 1967, se deu a quarta lei
acidentária, que foi na realidade um verdadeiro retrocesso, foi baixado por força de
Ato Institucional, atribuindo ao seguro de acidente caráter exclusivamente privado,
permitindo ao então INPS concorrer com as sociedades seguradoras.
A quinta lei acidentária foi promulgada em 14 de setembro de 1967, de nº
5.316, restaurando diversos dispositivos do Decreto-lei 7.036, transferindo
novamente ao INPS o monopólio do seguro de acidente de trabalho, criando plano
específico de benefícios previdenciários acidentários.
Em 19 de setembro de 1976, ocorreu uma nova mudança sobre o assunto,
quando foi promulgada a sexta Lei nº 6.367, mantendo as mesmas diretrizes da lei
anterior, aprimorando os conceitos de acidente de trabalho e concausas. Trouxe
uma inovação, acrescentou a doença proveniente da contaminação acidental do
pessoal da área médica como situação equiparada a acidente do trabalho.
A sétima lei acidentária, que está em vigor atualmente, é a Lei nº 8.213 de
24 de julho de 1991, disciplina os temas referentes ao acidente do trabalho nos
artigos 19 a 23, regulamentados pelo Decreto nº 3.048 de 06 de maio de 1999. Esta
lei em seu artigo 19 amplia o conceito da Lei 6.367/76, quando traz a expressão
“Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da
empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art.
11 desta Lei...” O referido inciso VII trata dos segurados especiais: o produtor, o
parceiro, o meeiro e o arrendatário rural, o garimpeiro, o pescador artesanal e o
assemelhado, que exerçam suas atividades individualmente ou em regime de
economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus
23
respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a ele
equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar.
2.2.CONCEITO DE ACIDENTE DE TRABALHO
Apresentam-se muitos conceitos para se definir acidente de trabalho,
destaca-se o de PEDROTTI:
“Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, ou pelo exercício do trabalho dos segurados especiais, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, a perda ou redução da capacidade para o trabalho permanente ou temporário.”27
Nos ensinamentos do médico BRANDIMILLER, assim ele descreve:
“No sentido genérico, acidente é o evento em si, a ocorrência de determinado fato em virtude da conjugação aleatória de circunstâncias causais. No sentido estrito, caracteriza-se também pela instantaneidade: a ocorrência é súbita a lesão imediata. Os acidentes ocasionam lesões traumáticas denominadas ferimentos, externos ou internos, podendo também resultar em efeitos tóxicos infecciosos ou mesmo exclusivamente psíquicos. O acidente comporta causas e conseqüências, contudo não pode ser definido, genericamente, nem pelas causas nem pelas conseqüências. As circunstâncias causais permitem classificar os acidentes em espécies: acidente do trabalho, acidentes de trânsito, etc. As conseqüências também classificam os acidentes: acidentes com ou sem danos pessoais, acidentes com ou sem danos materiais, acidente grave, acidente fatal, etc.”28
DINIZ o vê como o “evento danoso que resulta do exercício do trabalho,
provocando no empregado, direta ou indiretamente, lesão corporal, perturbação
funcional ou doença que determine morte, perda total ou parcial, permanente ou
temporária, da capacidade par o trabalho.”29
27 PEDROTTI, Irineu Antônio. Acidentes do Trabalho. 3.ed.São Paulo: Universitária, 1998, p.202. 28 BRANDIMILLER, Primo A. Perícia Judicial em acidentes e doenças do trabalho. 1996, p. 145/146. 29DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 7. ed.São Paulo: Saraiva, 2003, p.433.
24
Nas palavras de TORTORELLO:
“[...] acidente sofrido pelo trabalhador, a serviço da empresa, e que ocorre pelo exercício do trabalho, provocando lesão corporal, perturbação funcional ou doença que cause a morte, a perda ou a redução permanente ou temporária da capacidade para o trabalho.”30
A lesão é caracterizada por dano físico-anatômico ou mesmo psíquico. A
perturbação funcional implica dano fisiológico ou psíquico nem sempre aparente,
relacionada com órgãos ou funções específicas. Já a doença se caracteriza pelo
estado mórbido de perturbação da saúde física ou mental, com sintomas específicos
em cada caso.
Analisando todas as conceituações trazidas, para que seja considerado
acidente de trabalho, há a necessidade, em sua essência, da demonstração do fato,
dano e nexo de causalidade.
2.3. REQUISITOS
Conforme visto anteriormente neste estudo, o acidente de trabalho assenta-
se em três requisitos, quais sejam, causalidade, prejudicialidade e nexo causal.
2.3.1.Causalidade
A definição de causalidade é trazida por PEDROTTI:
“Porque o acidente é um acontecimento, um evento que não é provocado, ao menos em princípio, mas que acontece normalmente por acaso e, assim, não há dolo.”31
30TORTORELLO, Jayme Aparecido. Acidentes do Trabalho: teoria e prática. 2.ed. São Paulo:Saraiva, 1999, p.9. 31 PEDROTTI, Irineu Antônio. Acidentes do Trabalho. 3.ed. São Paulo: Universitária, 1998, p. 203.
25
2.3.2. Prejudicialidade
Sobre a prejudicialidade, PEDROTTI destaca:
“Porque provoca lesão corporal ou perturbação funcional que pode causar a morte, ou a perda, ou a redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.”32
2.3.3. Nexo causal ou etiológico
Neste tópico, PEDROTTI justifica:
“Consiste na relação de causa e efeito entre o trabalho e acidente típico (ou doença profissional ou do trabalho equiparada ao acidente do trabalho). A ligação entre ambos, id est, o fato de que o trabalho é a causa do infortúnio.”33
2.4. ESPÉCIES LEGAIS DE ACIDENTE DE TRABALHO
Conforme explicitado anteriormente, a legislação brasileira não prevê de
forma específica o acidente de trabalho em legislação própria. Ele é encontrado, a
despeito do entendimento de diversos autores, juntamente com a legislação
previdenciária.
BRANDÃO, ao analisar o tema, discorre:
“A análise do texto legal possibilita que seja classificado o infortúnio laboral em espécies distintas: a) Acidente tipo; b) Doenças ocupacionais, que compreendem: - doenças profissionais; - doenças do trabalho; - doenças provenientes de contaminação acidental; c) acidentes por equiparação, ocorridos no ambiente e no horário de trabalho: - doenças provocadas por concausas; - lesões provocadas por terceiros; - danos provocados por agressão injusta, sabotagem ou terrorismo; - ofensas físicas intencionais, por causa ligada ao trabalho; - acidentes causados por culpa de terceiro; - lesões provenientes de pessoa privada no uso da razão; - acidentes provocados por força maior; d) acidentes por equiparação, ocorridos fora do ambiente e do horário de trabalho;
32 Idem. 33 Idem.
26
- na execução de ordem ou na realização de serviço sob autoridade do empregador; - na prestação de serviço para evitar prejuízo ou proporcionar proveito; - em viagem de serviço; - acidente de percurso; - nos períodos de refeição e descanso; - períodos em que estiver satisfazendo as necessidades biológicas.”34
Deste modo, verifica-se que existem diversas modalidades de acidente de
trabalho, todos devidamente tratados na Lei de Benefícios Previdenciários.
2.4.1 – Acidente tipo
O acidente do trabalho típico, decorre de um fato súbito, violento e fortuito,
com resultado imediato.
A lei 8.213 em seu artigo 19, traz o conceito de acidente tipo, vejamos:
“art.19- acidente tipo é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, perda ou redução da capacidade, permanente ou temporária, para o trabalho.”35
Este dispositivo permanece praticamente inalterado desde a edição do
Decreto lei nº7.036 de 10 de novembro de 1944, definindo o critério de acidente pelo
efeito e não pela lesão.
MONTEIRO, assim leciona:
“Trata-se de um evento único, subitâneo, imprevisto, bem configurado no espaço e no tempo e de conseqüências geralmente imediatas, não sendo essencial a violência, podendo ocorrer sem provocar alarde ou impacto, ocasionando, meses ou anos depois de sua ocorrência, danos graves e até fatais, exigindo-se, apenas, o nexo de causalidade e lesividade.”36
34 BRANDÃO, Cláudio. Acidente do trabalho e responsabilidade civil do empregador. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006, p. 119/120. 35 BRASIL. Lei Ordinária nº8.214, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil.htm. acesso em 27 de abril de 2010. 36 MONTEIRO, Antônio Lopes; BERTAGNI, Roberto Fleury de Souza. Acidentes do trabalho e doenças ocupacionais. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 10.
27
BRANDMILLER vai além, esmiuçando o tema:
“No sentido genérico, acidente é o evento em si, a ocorrência de determinado fato em virtude da conjugação aleatória de circunstâncias causais. No sentido estrito, caracteriza-se também pela instantaneidade: a ocorrência e súbita e a lesão imediata. Os acidentes ocasionam lesões traumáticas denominadas ferimentos, externos ou internos, podendo também resultar em efeitos tóxicos, infecciosos ou mesmo exclusivamente psíquicos. O acidente comporta causas e conseqüências, contudo não pode ser definido, genericamente, nem pelas causas nem pelas conseqüências. As circunstâncias causais permitem classificar os acidentes em espécies: acidentes de trabalho, acidentes de trânsito, etc. As conseqüências também classificam os acidentes: acidentes com ou sem danos pessoais, acidentes com ou sem danos materiais, acidente grave, acidente fatal, etc. Embora o termo dano pessoal seja juridicamente mais amplo, em infortunística refere-se às conseqüências físicas ou psíquicas decorrentes do acidente. O acidente do trabalho considerado pela regulamentação legal Seguro de Acidentes do Trabalho é, portanto, toda ocorrência causa, fortuita e imprevista e atende conjugadamente os seguintes requisitos: quanto à causa: o acidente que provocou lesão corporal ou perturbação funcional causando a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.”37
Geralmente, o fato gerador do acidente típico mostra-se como evento súbito,
inesperado, externo ao trabalhador e fortuito no sentido de que não foi provocado
pela vítima.
Segundo o entendimento de BRANDÃO, pode-se concluir por acidente tipo o
seguinte:
“É assim, um evento, em regra, súbito, ocorrido durante a realização do trabalho por conta alheia, que acarreta danos físicos ou psíquicos à pessoa do empregado, capazes de gerar a morte ou a perda, temporária ou permanente, de sua capacidade laboral.”38
Pode-se falar ainda como acidente puro ocorrido durante as atividades
normais do empregado, que acarreta danos a sua saúde, seja ela física ou psíquica.
Para que seja caracterizado o acidente de trabalho típico, se faz necessário
a presença de alguns requisitos, a lesão corporal ou mesmo a perturbação funcional,
sem os quais, não haverá acidente de trabalho.
37 BRANDIMILLER, Primo A. Perícia Judicial em acidentes e doenças do trabalho. 1996, p. 145-146. 38 BRANDÃO, Claúdio. Acidente do trabalho e responsabilidade civil do empregador. 2 ed. São Paulo: LTr, 2006, p. 123.
28
OLIVEIRA, em seu ensinamento, escreve:
“É da essência do conceito de acidente do trabalho que haja lesão corporal ou perturbação física ou mental do trabalhador, não haverá, tecnicamente, acidente de trabalho. [...]. No entanto, nem sempre a perturbação funcional é percebida de imediato, podendo haver manifestação tardia com real demonstração do nexo etiológico com o acidente ocorrido.”39
Ao discorrer sobre o assunto, o mesmo autor, relata que é necessária a
morte, a perda ou redução da capacidade laborativa:
“Além da lesão ou perturbação funcional, é necessário, para completar o conceito de acidente do trabalho, que o evento acarrete a morte, ou a perda ou a redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho. A incapacidade temporária não significa necessariamente afastamento do trabalho, pode ser mesmo apenas o tempo para realizar um pequeno curativo ou da visita a um hospital, [...]”40
Portanto, é necessário a comprovação do prejuízo havido sem o qual não
ocorrerá acidente de trabalho.
Segundo OLIVEIRA poder-se-ia admitir, ainda a existência da causa direta,
que “[...] o nexo fica caracterizado quando o acidente ocorre pelo exercício do
trabalho a serviço da empresa. Nota-se uma vinculação imediata entre a execução
das tarefas e o acidente ou doença que afetou o empregado.”41
E ainda, OLIVEIRA afirma que pode-se considerar causalidade indireta, nos
seguintes termos:
“Na causalidade indireta o fato gerador do acidente não está ligado à execução do serviço num sentido estrito, mas para oferecer maior proteção ao empregado, [...] podem ser enquadrados na causalidade indireta e agressão praticada por terceiro contra o empregado no local de trabalho; os acidentes decorrentes de desabamento, incêndio, casos fortuitos ou de força maior; os acidentes de trajeto, no deslocamento da residência para o trabalho ou deste para aquele e etc.”42
39 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por acidente do trabalho ou doença ocupacional. 3.eEd.São Paulo: LTr, 2007, p. 45. 40Idem. 41 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional. 3. ed. São Paulo: LTr, 2007, p.132. 42Ibidem, p.133.
29
E ainda, levanta uma terceira hipótese, como sendo a concausa, onde “o
acidente continua ligado ao trabalho, mas ocorre por múltiplos fatores, conjugando
causas relacionadas ao trabalho, com outras extra laborais.”43
Com o Decreto nº 6.042/2007, que alterou as disposições da Lei nº
8.213/91, foi acrescentado o nexo epidemiológico como uma das modalidades de
acidente do trabalho.
O artigo 337, § 3º da referida Lei estabelece:
“O acidente do trabalho será caracterizado tecnicamente pela perícia médica do INSS, mediante a identificação do nexo entre o trabalho e agravo. Considera-se estabelecido o nexo entre o trabalho e o agravo quando se verificar nexo técnico epidemiológico entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade, elencada na Classificação Internacional de Doenças (CID) em conformidade com o disposto na Lista B do Anexo II deste Regulamento.”
Segundo as alterações trazidas, quando constatado que a atividade do
empregado possui uma grande quantidade de ocorrência de determinada doença,
restará comprovado o nexo de causalidade e por derradeiro, o acidente de trabalho.
2.5 DOENÇAS OCUPACIONAIS
2.5.1 Conceito
A Norma Técnica atual, baixada pela Ordem de Serviço da Diretoria de
Seguro Social n. 606, de 5 de agosto de 1998, prevê:
“Entendemos Lesões por Esforços Repetitivos – LER como uma síndrome clínica caracterizada por dor crônica, acompanhada ou não por alterações objetivas e que se manifesta principalmente no pescoço, cintura escapular e/ou membros superiores em decorrência do trabalho.
43 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional. 3. ed. São Paulo: LTr, 2007, p.45.§
30
O termo LER é genérico, e o médico deve sempre procurar determinar o diagnóstico específico. Como se refere a diversas patologias distintas, torna-se difícil estabelecer o tempo necessário para uma lesão persistente passar a ser considerada como crônica. Além disse, até que a mesma patologia pode se instalar e evoluir de forma diferente dependendo dos fatores etiológicos. Com todas essas limitações, o que se pode dizer é que as lesões causadas por esforços repetitivos são patologias, manifestações ou síndromes patológicas que se instalam insidiosamente em determinados segmentos do corpo, em conseqüência de trabalho realizado de forma inadequada. Assim, o nexo é a parte indissociável do diagnóstico que se fundamenta numa boa anamnese ocupacional e em relatórios de profissionais que conhecem a situação de trabalho, permitindo a correlação do quadro clínico com a atividade ocupacional efetivamente desempenhada pelo trabalhador, donde a proposta da nova terminologia Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho – DORT”44
Para COSTA, são:
“[...] afecções, perturbações funcionais, lesões agudas ou crônicas de que podem se vitimar os trabalhadores, por força da atividade, de um trabalho ou profissão, na manipulação de materiais empregados ou por influência das condições e processos especiais de industrialização, produzindo dano físico ou psíquico, que os incapacita para a atividade laboral.”45
DINIZ destaca ser uma “deficiência sofrida pelo operário, em razão de sua
profissão, que o obriga a estar em contato com substâncias que debilitam o seu
organismo ou exercer a sua tarefa, que envolve o fato insalubre.”46
2.5.2. Modalidades de doenças ocupacionais
Existe, de forma mais específica, a subdivisão da doença ocupacional em
a)doenças profissionais, b)doenças do trabalho, e também c)doenças provenientes
da contaminação acidental.
O artigo 20 da Lei n. 8.213/91 estabelece:
“Art.20. Consideram-se acidentes do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:
44 MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL E ASSISTÊNCIA SOCIAL – LER: Lesões por esforços repetitivos – Normas Técnicas para avaliação da incapacidade, 1993, p.7. 45 COSTA, Hertz J. Acidentes do Trabalho na atualidade. Porto Alegre: Síntese, 2003, p. 76. 46 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: responsabilidade civil. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, v.17, p. 433.
31
I – doença profissional, assim entendida a produzida e desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social; II – doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I. III – a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua atividade.”47
Essas subdivisões mostram-se importantes pela especificidade trazidas
pelos mais diferentes conceitos legais.
2.5.3.Doença profissional
Conhecida como acidente de trabalho típico, que decorre de um fato súbito,
violento e fortuito, com resultado imediato.
A doença profissional, segundo OLIVEIRA é:
“Aquela peculiar a determinada atividade ou profissão, também chamada de doença profissional típica, tecnopatia ou ergopatia. O exercício de determinada profissão pode produzir ou desencadear certas patologias, sendo que, nessa hipótese, o nexo causal da doença com a atividade é presumido.”48
RUSSOMANO destaca que, para a caracterização das doenças, exige-se a
presença de algumas características patogênicas, tais como:
“a) aparecimento dos sintomas de forma idêntica em vários trabalhadores que se dedica à mesma profissão, no mesmo estabelecimento ou em estabelecimentos distintos; b) ficar evidenciado que a doença tem como causa a atividade desenvolvida pelo trabalhador na empresa, seja pelas condições de serviço (subsolo, por exemplo), seja pelos métodos (levantamento de peso pela força muscular), seja pelos materiais utilizados (tóxicos).”49
47 BRASIL. Lei Ordinária n. 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os planos de benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Disponível em HTTP://www.planalto.gov.br/ccvivil_03/Leis/L8213cons.htm. Acesso em 02 de maio 2010. 48 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por acidente do trabalho ou doença ocupacional. 3. ed. São Paulo: LTr, 2007, p.47. 49 RUSSOMANO, Mozart Victor. Comentários à lei de acidentes do trabalho. 3.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1970, v.I, p. 26/27.
32
É necessário, então, que alguns requisitos sejam devidamente
demonstrados, conforme elencados acima.
2.5.4. Doença do trabalho
Esta modalidade é aquela considerada como acidente de trabalho atípico,
decorrente de doença profissional ou doença de trabalho. Contém as características
de progressividade e a mediatidade do resultado. Esta espécie de acidente ocorre
quando o meio ambiente onde o trabalhador exerce suas funções, colabora para o
evento nocivo ou danoso à saúde do trabalhador. É provocada por uma ação
persistente e envolvente das condições agressivas do trabalho sobre o organismo,
reclamando um certo espaço de tempo para fazer eclodir o quadro de incapacidade
laborativa.
THEODORO JÚNIOR conceitua como “doenças comuns, que, no entanto,
numa determinada hipótese foram, excepcionalmente, geradas pelas condições
momentâneas do trabalho.”50
A doença profissional apresenta-se como um processo mais ou menos
rápido, que tende a se agravar, dependendo das circunstâncias. As doenças
profissionais ou tecnopatias têm no trabalho a sua causa única, eficiente, por sua
própria natureza, como por exemplo, a insalubridade. São doenças típicas de
algumas atividades laborativas. Como exemplo, citam-se os trabalhadores têxteis
que adquirem pneumoconioses, provocadas por poeiras ou substâncias muito finas,
comportando-se como um corpo estranho, provocam fibrose (cicatrizes) que podem
50 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Acidentes do Trabalho e Responsabilidade Civil Comum. São Paulo: Saraiva, 1987, p.7.
33
comprometer todo o parênquima pulmonar, reduzindo a capacidade de se expandir
dos pulmões e as trocas gasosas.
Outra doença ocupacional (ou profissional) muito comum entre
trabalhadores, é a perda auditiva provocada por ruído industrial, que é um tipo de
surdez irreversível e progressiva que afeta o ouvido interno das pessoas expostas a
ruídos em níveis elevados por longos períodos. O trabalhador em contato direto com
a sílica, invariavelmente apresentará silicose. A leucopenia é outro caso. Nos dias
atuais, a tenossinovite é o tipo de doença mais evidente de doença ocupacional,
também conhecida como doença dos digitadores, pianistas, montadores. Estas têm
nexo presumido em lei.
As mesopatias ou doenças do meio profissional, se não decorrência direta
da atividade laborativa, são adquiridas em razão das condições em que o trabalho é
realizado (pneumopatias, tuberculose, bronquites, sinusite, etc.,). As condições
excepcionais ou especiais do trabalho determinam a quebra da resistência orgânica
com sua conseqüente eclosão ou a exacerbação do quadro mórbido, e até mesmo o
seu agravamento. Estas não têm nexo etiológico presumido com o trabalho,
segundo a lei, sendo aquele determinável conforme prova pericial, testemunhal e até
mesmo indiciária, em muitos casos.
Para que se caracterize, é importante a análise de todas as situações
laborais em que era o empregado exposto, segundo entendimento de BRANDÃO:
“Na caracterização da enfermidade do trabalho e da prova pericial com o exame de todas as condições em que o labor era executado revela-se de importância fundamental. Isso porque os males que se incluem no seu conceito são passíveis de serem confundidos com doenças comuns, que não guardam correspondência com o serviço nem mesmo causadas ou agravadas pela execução, destacando-se, na sua caracterização, o período de tempo em que ocorreu a exposição ao agente agressivo.”51
51 BRANDÃO, Cláudio. Acidente do trabalho e responsabilidade civil do empregador. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006, p.163.
34
Nesse contexto, a análise das condições de trabalho do empregado,
mostram-se imprescindíveis.
2.5.5. Doenças provenientes de contaminação acidental
O legislador, atento para a hipótese de o empregado adquirir
acidentalmente, infecção ou doença na execução da atividade, foi esclarecido o seu
conceito para que também fosse alcançado no caso de contaminação ocasional.
Uma extensão do conceito de acidente de trabalho, são as doenças
provenientes de contaminação acidental de pessoal de área médica, no exercício de
sua atividade. Como exemplo, uma enfermeira que aplica uma injeção num paciente
portador de vírus HIV, e por uma infelicidade, acaba se machucando com a seringa,
contraindo para si o vírus.
BRANDÃO esclarece que:
“É a situação de contágio, infecção ou de doença adquirida pelo empregado de forma imprevista, casual, fortuita durante a execução de suas tarefas, no local e em horário de trabalho ou outra circunstância amparada pelo legislador, que amplia o conceito de infortúnio (trajeto, durante as refeições, nos intervalos, dentre outros).”52
Porém, mesmo em se tratando de caso fortuito ou força maior, será
considerado acidente de trabalho.
2.5.6. Outras hipóteses
Uma outra modalidade de acidente de trabalho, equiparada a infortúnio do
trabalho, traduz uma extensão do conceito de acidente do trabalho. São várias as
52
Ibidem, p.165.
35
hipóteses53 que se enquadram neste conceito extensivo de acidente de trabalho. É
assim considerado o acidente que, ligado ao trabalho, embora não tenha sido a
causa única, haja contribuído diretamente a morte, ou a perda ou redução da
capacidade para o trabalho, em conseqüência de ato de sabotagem ou de terrorismo
praticado por terceiro, inclusive companheiro de trabalho; ofensa física intencional,
inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada com o trabalho; ato de
imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro, inclusive companheiro de
trabalho; ato de pessoa privada do uso da razão; desabamento, inundação ou
incêndio; outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior.
Uma última hipótese, tem-se o “acidente sofrido pelo empregado ainda que
fora do local e horário de trabalho, caracterizado na execução de ordem ou na
realização de serviço sob a autoridade da empresa; na prestação espontânea de
qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito; em
viagem a serviço da empresa, seja qual for o meio de locomoção utilizado, inclusive
veículo de propriedade do empregado; ou no percurso da residência para o trabalho
ou desta para aquela.”54
O acidente de trajeto, ou in itinere, caracteriza-se se o trabalhador vier a
acidentar-se quando a caminho ou na volta do trabalho, no itinerário habitual ou
rotineiro da refeição ou do período de descanso.
Ao dirigir-se para o trabalho, já se encontra à disposição do empregador, e o
vir do operário é exigência da própria atividade laborativa, ficando, por isso mesmo,
coberto pela tutela infortunística. Quer por razoável inteligência da lei, quer por
empregado de boa analogia, nem mesmo o trabalhador rural vítima de acidente de
53 Segundo a lei 6.367/76, em seu art. 2º, incisos II a V. 54A Lei 8.213/91, que dispõe sobre os planos de benefícios da previdência social e dá outras providências, em seu art. 21, elenca as mesmas hipóteses para a extensão do conceito de acidente de trabalho.
36
percurso ficará fora do alcance da proteção acidentária. O desvio voluntário de
conduta descaracteriza o acidente in itinere.
Se o trabalhador, por conta própria deixa a rotina de todos os dias, o
caminho costumeiro, já não se pode mais dizer que o acidente é de percurso, ou in
itinere.
Ligeiro desvio no percurso, quando o obreiro entra em um estabelecimento
comercial para aquisição de um bem, não rompe o nexo entre acidente e o retorno
do trabalho para casa.
O desvio relevante, capaz de interromper tal liame, é aquele acentuado,
quando o trabalhador passou horas bebendo com amigos ou quando foge do
percurso usual.
Conforme o art. 20, § 1º, da Lei de Benefícios da Previdência Social55, não
são consideradas doenças do trabalho, a doença degenerativa, a inerente a grupo
etário, a que não produza incapacidade laborativa e a doença endêmica adquirida
por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de
que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do
trabalho.56
2.6. NATUREZA JURÍDICA
Quanto à natureza jurídica, o acidente do trabalho está inserido no contexto
do Direito Público e no Direito Privado. O Direito Público disciplina os interesses
55 BRASIL. Lei 8.213, 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os planos de benefícios da previdência social e da outras providências. Senado. Disponível em: http://www.senado.gov.br/netacgi/nph-brs.exe?sect1=NJURLEGBRAS_SEMICONE&s1=@docn=000003337&I=20&u=/legbras/&p=1&r=1&f=G&d=NJUR>. Acesso em: 07 de maio de 2010. 56 As doenças endêmicas são aquelas que existem constantemente em determinadas regiões e atacam número maior ou menor de indivíduos, dependendo das circunstâncias.
37
gerais da coletividade e se caracteriza pela imperatividade de suas normas, que não
podem nunca ser afastadas por convenção dos particulares. Neste sentido,
considerando-se que as leis de acidente do trabalho no Brasil têm caráter
imperativo, assim como as Normas de Segurança do Trabalho (NR´s), as leis
previdenciárias e seus Decretos regulamentadores, o empregador não pode se
eximir de cumpri-las. O acidente de trabalho tem natureza nos ramos que integram o
Direito Público e que são: Direito Constitucional, Administrativo, Penal, tributário,
Processual, Previdenciário e Trabalhista, ou seja, em quase todos os ramos do
Direito Público.
O conceito de acidente do trabalho, compreendendo suas espécies, forma-
se a partir do núcleo civilista, pois a infortunística antecede o Direito do Trabalho.
Muito antes do Direito do Trabalho ser instituído, já existiam acidentes do trabalho,
cujos efeitos eram regulados pelo Direito Civil. Neste prisma, integrando o Direito
Civil o ramo do Direito Privado, pode-se dizer que o acidente do trabalho tem
natureza no Direito Privado, pois o Direito Civil regulamenta os fatos e atos jurídicos,
a responsabilidade civil, o direito das obrigações e os contratos de seguro.
O acidente do trabalho tem natureza no Código Civil, no entanto, é regulado
pelas leis de natureza previdenciária, que pertencem ao ramo do Direito Público,
pois como já afirmado anteriormente, não é possível modificá-las pela vontade dos
particulares. Elas são impostas pelo Estado com o objetivo de regular as relações
sociais e proteger a parte frágil da relação de trabalho.
Além da indenização material pelo acidente sofrido, considerada como
direito do empregado, há casos em que o evento acarreta uma ofensa à honra e à
intimidade da pessoa.
38
Para compreender-se a temática, cita-se como exemplo, o caso de um
trabalhador jovem, que teve o seu braço amputado em decorrência de acidente do
trabalho, causado por imprudência do empregador que o colocou para operar uma
prensa, sem qualquer orientação técnica proveniente de treinamento. Esse
trabalhador além de sofrer prejuízo material na sua vida profissional, sofrerá um
grande abalo na personalidade e ficará marcado pela dor moral.
2.7.NORMAS DE SEGURANÇA DO TRABALHO
As normas regulamentadoras que dizem respeito à segurança e medicina do
trabalho são atos obrigatórios exigidos das empresas privadas e públicas, bem como
dos órgãos públicos de administração, órgãos do poder legislativo e judiciário que
possuam empregados que sejam registrados de acordo com a Consolidação das
Leis de Trabalho (CLT). Estas normas aplicam-se às empresas, entidades,
trabalhadores avulsos, aos sindicatos, enfim a todos os tipos de trabalho exercidos
por uma pessoa em benefício de outrem.
Um dos vários motivos que desencadearam a necessidade de melhoria de
condições de trabalho dos obreiros, foi o militarismo existente na época.
SÜSSEKIND destaca:
“[...] motivos até mesmo de natureza militar, em virtude dos grandes contingentes de trabalhadores serem declarados inaptos para o serviço militar, diante da precariedade do seu estado de saúde, motivado pelas deficientes condições de trabalho e de vida, provocando deterioração das forças armadas e de parte importante da população.”57
57 SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito Internacional do Trabalho. 3.ed.São Paulo: LTr, 2000, p.295.
39
BRANDÃO corrobora com este pensamento, vejamos:
“As precárias condições de vida da classe trabalhadora, que originaram a questão social, propiciaram o incremento das discussões em torno do tema, em virtude de representarem uma grave ameaça à estabilidade das instituições liberais, comprometendo o processo de desenvolvimento econômico, aliado ao apoio da igreja, a partir da formulação da doutrina social baseada na tese do bem comum, de São Tomás de Aquino, ao lado da doutrina clássica do direito natural e da dignidade do trabalho como elemento essencial para a vida humana.”58
E ainda , a CLT em seu artigo 157, estabelece:
“Art. 157 – Cabe às empresas: I – Cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho; II – instruir os empregados, através de ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais; III –adotar as medidas que lhes sejam determinadas pelo órgão regional competente; IV – facilitar o exercício da fiscalização pela autoridade competente.”59
Apesar do Estado possuir uma postura não intervencionista, diante de todo o
emaranhado de situações criadas, aos poucos essa estrutura foi-se alterando face a
necessidade diante da comoção social, deu-se a criação da OIT, conforme relata
OLIVEIRA:
“As manifestações dos operários e as reivindicações estabelecidas em diversos congressos de trabalhadores, durante a Primeira Grande Guerra, levaram a conferência da Paz de 1919, da Sociedade das Nações, a criar pelo Tratado de Versalhes a Organização Internacional do Trabalho – OIT , com o propósito de dar às questões trabalhistas um tratamento uniformizado, com fundamento na justiça social.”60
Desde sua criação, a OIT vem realizando trabalhos para proteger a saúde
do empregado.
58 BRANDÃO, Cláudio. Acidente do trabalho e responsabilidade civil do empregador. 2.ed.São Paulo: LTr, 2006, p.38. 59VADE MECUM RT – 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p.768 60 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção jurídica à saúde do trabalhador. 3.ed. São Paulo: LTr, 2001, p. 63.
40
2.7.1. Organização Internacional do Trabalho
Segundo pesquisa realizada no site da OIT, em seu link Conheça a OIT, a
sua criação deu-se da seguinte maneira:
“A OIT foi criada pela Conferência de Paz após a Primeira Guerra Mundial. A sua Constituição converteu-se na Parte XIII do Tratado de Versalhes. Em 1944, à luz dos efeitos da Grande Depressão a da Segunda Guerra Mundial, a OIT adotou a Declaração da Filadélfia como anexo da sua Constituição. A Declaração antecipou e serviu de modelo para a Carta das Nações Unidas e para a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Em 1969, em seu 50º aniversário, a Organização foi agraciada com o Prêmio Nobel da Paz. Em seu discurso, o presidente do Comitê do Prêmio Nobel afirmou que a OIT era "uma das raras criações institucionais das quais a raça humana podia orgulhar-se". Em 1998, foi adotada a Declaração da OIT sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho e seu Seguimento. O documento é uma reafirmação universal da obrigação de respeitar, promover e tornar realidade os princípios refletidos nas Convenções fundamentais da OIT, ainda que não tenham sido ratificados pelos Estados Membros. Desde 1999, a OIT trabalha pela manutenção de seus valores e objetivos em prol de uma agenda social que viabilize a continuidade do processo de globalização através de um equilíbrio entre objetivos de eficiência econômica e de equidade social.”61
PIOVESAN ressalta a finalidade da criação da OIT, que “foi a de
universalizar a justiça social nos aspectos relacionados ao trabalhador, sendo visto
como um dos primeiros marcos do processo de internacionalização dos direitos
humanos, além de representar o fim da época em que o Direito Internacional se
restringia, em regra, ao tratamento das relações entre Estados, no âmbito
estritamente governamental.”62
Segundo SÜSSEKIND, a OIT merece destaque pela sua atuação, pois:
“[...] a atividade da OIT também é marcada pela adoção de programas mundiais em temas de grande importância na atualidade e deve ser analisada, no que toca à proteção ao trabalho, a elaboração, em 1976, do Programa Internacional para melhorar as Condições de Trabalho e Meio Ambiente de Trabalho – PIACT, com objetivos amplos e variados, dentre os quais se destacam a prevenção ao acidente de trabalho e a adaptação do meio ambiente do trabalho às capacidades físicas e mentais dos
61 Texto retirado do site: http://www.oitbrasil.org.br/inst/hist/index.php. Acesso em 10 de maio de 2010. 62 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 5. ed. São Paulo: Max Limonad, 2002, p.125.
41
trabalhadores, as formas de organização racional de trabalho, a ergonomia e às condições do meio onde vive o trabalhador (habitação, alimentação, saúde, educação, os serviços sociais, lazer, etc.)”63
Sendo assim, resta claro que a atuação da OIT tem sido de grande valia,
para garantir a segurança e saúde do trabalhador.
2.7.1.1 Convenções da OIT e sua eficácia Jurídica
Segundo OLIVEIRA, para que a Convenção da OIT passe a ter eficácia
jurídica no Direito Brasileiro, deve-se seguir um processo de integração no
Ordenamento Jurídico, ele explica de forma geral este processo:
“A OIT realiza conferências com a participação de quatro delegados de cada Estado-Membro, sendo dois representantes do governo, um dos empregados e outro dos empregadores, reunidos em assembléia geral. Nessas assembléias são votadas as convenções e as recomendações. As convenções adotadas pela OIT devem ser apresentadas ao órgão competente de cada Estado-Membro para fins de apreciação, sendo que, no caso do Brasil, essa competência é exclusiva do Congresso Nacional. Se for ratificada, a Convenção tem força normativa e passa a integrar o direito positivo do Estado – Membro.”64
Após todo o processo de incorporação das Convenções no Sistema Jurídico
Brasileiro, esses passam a fazer efeito nas normas Nacionais.
2.7.1.2 A saúde do trabalhador e suas principais convenções
Para o estudo do tema proposto, vale destacar algumas convenções de
maior destaque.
A Convenção nº 148, adotada na 63ª, reunião da Conferência Internacional
do Trabalho, realizada no ano de 1977, aprovada pelo Brasil pelo Decreto
63SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito Internacional do Trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2000, p. 295. 64 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção Jurídica à Saúde do Trabalhador. 3. Ed. São Paulo: LTr, 2001, p.84.
42
Legislativo nº 56/81, ratificada em 14 de janeiro de 1982 e entrou em vigor um ano
após, em 14 de janeiro de 1983. Foi então promulgada pelo Decreto nº 93.413/86.
O tema tratado foi resumido por OLIVEIRA como:
“[...] tem o propósito de prevenir e limitar os riscos profissionais no local de trabalho, provenientes da contaminação do ar, do ruído e vibrações. Para proteger os trabalhadores contra tais riscos, a legislação deverá adotar as medidas técnicas adequadas.”65
Resta evidente que a própria Convenção prevê a possibilidade do
empregado buscar informações sobre os riscos que está exposto, com as instruções
adequadas para se proteger ou para a prevenção e limitação dos riscos.
A 67ª Conferência Internacional do Trabalho, realizada em Genebra no ano
de 1981 adotou a Convenção nº155. Foi aprovada pelo Brasil pelo Decreto
Legislativo nº 2/92, ratificada em 18 de maio de 1993, e promulgada pelo Decreto
nº1.254/94.
E ainda, OLIVEIRA, destaca aspectos importantes:
“A Convenção determina que o país deve instituir uma política nacional em matéria de segurança, saúde dos trabalhadores e o meio ambiente de trabalho. Há três exigências para essa política: primeiramente, há que ser coerente; e em segundo lugar, deve ser colocada em prática e finalmente deve ser examinada periodicamente.”66
Pela avaliação de SÜSSEKIND que “[...] é da citada Convenção a regra que
assegurou ao empregado o direito de por motivos razoáveis, interromper o trabalho
que acarretar perigo iminente ou representar gravidade para a sua vida.”67
65 Ibidem, p.90. 66 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção Jurídica à Saúde do Trabalhador. 3 ed.São Paulo: LTr, 2001, p.91. 67 SÜSSEKIND, Arnaldo. Convenções da OIT. São Paulo: LTr, 1998, p. 393.
43
2.7.2. Princípios Constitucionais e Normas Infraconstitucionais Vinculados ao
Acidente de Trabalho
Vários princípios constitucionais estão contemplados nas normas sobre o
acidente do trabalho. A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988,
garante o direito à vida, liberdade, igualdade, segurança e propriedade, sem
qualquer distinção;68garante o direito à indenização por dano material, moral ou à
imagem;69garante a inviolabilidade do direito à intimidade, da vida privada, da honra
e da imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação;70atribui como direito social a educação, a saúde, o
trabalho, a segurança e a previdência social;71trata da redução de riscos inerentes
ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança;72determina que o
empregador deve pagar seguro contra Acidente do Trabalho, quando incorrer em
dolo ou culpa, sem excluir a indenização a que está obrigado;73consagra
solenemente que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo mediante
políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros
agravos e de todos e dever do Estado ao acesso universal e igualitário às ações e
serviços para a sua promoção, proteção e recuperação;74 atribui competência ao
SUS – Sistema Único de Saúde, nos termos da lei a executar ações de vigilância
sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador, assim como
68 Artigo 5º, caput, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 69 Artigo 5º, inciso V, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 70 Artigo 5º, inciso X, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 71 Artigo 6º, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 72 Artigo7º, inciso XXII, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 73 Artigo7º, inciso XXVIII, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 74 Artigo 196, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
44
ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde; colaborar do meio
ambiente, nele compreendido o do trabalho.75
O acidente do trabalho ocorre e se aplica na esfera do direito privado
quando o vínculo laboral se dá entre trabalhadores e empresas privadas, e na esfera
do direito público quando o ente público tem empregados regidos pela Consolidação
das Leis do Trabalho. Quando os funcionários são regidos por Estatuto, a legislação
é diferenciada.
O acidente do trabalho está vinculado a várias normas infraconstitucionais,
entre as quais destacamos a que atribui às empresas a responsabilidade pela
alocação e o uso de medidas de proteção coletiva e individuais e de segurança e
saúde dos trabalhadores;76a que determina o cumprimento da Convenção 155 da
OIT, sobre segurança e saúde dos trabalhadores e o meio ambiente;77a que cria o
Programa de Prevenção de Riscos e Acidentes;78 a que determina o cumprimento e
a execução das Convenções da OIT sobre proteção aos trabalhadores contra riscos
devidos à contaminação do ar, ao ruído e às vibrações no local de trabalho;79
As empresas, a partir da ótica legislativa, têm o dever de observar as
recomendações técnicas a respeito da segurança, higiene e medicina do trabalho. O
Código Civil de 1916 obriga à reparação do dano por parte do agente que, por
omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a
outrem.80O Código Civil de 2001, da mesma forma, determina àquele que, por ação
ou omissão voluntário, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a
75 Artigo 200, incisos II, III, VIII, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 76 Lei 8.213/91, artigo 19. 77 Decreto 1.254/94 78 Portaria 25/94 79 Decreto 93.413/86. 80 Art. 159, Código Civil Brasileiro de 1916.
45
outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito, deve repará-lo.81 O
Código Penal atribui pena de detenção de três meses a um ano a quem expuser a
vida ou saúde de outrem a perigo.82
A Consolidação das Leis Trabalhistas - CLT83prevê o dever do empregador
pagar adicional de insalubridade nos percentuais de 10%, 20% e 40% sobre o
salário mínimo legal, conforme o grau de insalubridade a que o trabalhador está
exposto, podendo ser mínimo, médio ou máximo. Prevê, ainda, um adicional de 30%
sobre o salário percebido pelos empregados que se encontram em atividades de
risco.
Na CLT, o legislador trata da segurança e medicina do trabalho e dedica
exclusivamente às empresas as normas de proteção.84 As normas de proteção são:
cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho, instruir o
empregador, através de ordens de serviço, quanto às preocupações a tomar no
exercício da fiscalização pela autoridade competente.
2.7.2.1 Proteção à saúde sob enfoque constitucional
Diante do acima declinado, a proteção à saúde do empregado é objeto de
vários dispositivos Constitucionais, que abordam o tema, seja de forma direta ou
indireta.
Conforme já explicitado no item acima o artigo 7º da Carta Magna possui
diversos incisos tratando do tema.
81 Art. 186 e 927, Código Civil Brasileiro de 2002 82 Art. 132, Código Penal. 83 Decreto Lei nº5.452, de 1º de maio de 1943, em seus artigos 192 e 193. 84 Capítulo V do Título II da CLT, precisamente nos artigos 157 e 159. VADE MECUM RT – 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p.768
46
E ainda, o artigo 201, §10, da Constituição Federal determina:
“art. 201- A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: [...] § 10, Lei disciplinará a cobertura do risco de acidente do trabalho, a ser atendida concorrentemente pelo regime geral de previdência social e pelo setor privado.”85
Cabe aqui apontar a observação de SÜSSEKIND, “para que o alcance maior
do direito à proteção não reside tão somente na redução dos riscos decorrentes do
trabalho, mas na sua total eliminação, mediante a remoção ou neutralização das
causas.”86
MACHADO leciona:
[...] a eliminação do risco já está contida implicitamente na norma e, portanto, não comporta restrição em norma infraconstitucional. Mas quando não for possível a eliminação do risco devido às limitações fáticas, deve-se reafirmar o direito do trabalhador a não suportar o risco supostamente inerente ao trabalho, na maioria das vezes artificialmente produzido por máquinas barulhentas, ambientes insalubres e organizações do trabalho opressivas. [...] o direito do trabalho, garantido em norma de direito fundamental, vinculativa do legislador e o Judiciário, a prestar serviços em ambiente de trabalho em condições que preservem a sua saúde (física e mental) e garantam a sua segurança física.”87
De forma muito significativa, o disposto no inciso XXVIII prevê a
responsabilidade civil do empregador no caso de dolo ou culpa, presumindo-se daí a
responsabilidade subjetiva.
Para LAGO JÚNIOR, “a responsabilidade civil decorrente do acidente do
acidente do trabalho progrediu sempre no sentido de não deixar o trabalhador [...]
vítima do infortúnio laboral, entregue à própria sorte.”88
85 VADE MECUM RT – 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p.74 86 SÜSSEKIND, Arnaldo, et AL. Comentários à Constituição. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1990, v.1, p.439. 87
MACHADO, Sidnei. O direito à proteção ao meio ambiente de trabalho no Brasil. São Paulo: LTr, 2001, p.86/87. 88 LAGO JÚNIOR, Antônio. A Responsabilidade Civil decorrente do Acidente do Trabalho. In: LEÃO, Adroaldo. PAMPLONA FILHO, Rodolfo Mário (Coord.). Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 49.
47
O §10 do artigo 201 relaciona-se claramente com o inciso XXVIII, pois prevê
o custeio do acidente do trabalho por parte da previdência social, segundo
entendimento de BRANDÃO:
“Significa, em outras palavras, a autorização dada, no plano constitucional, para o afastamento da exclusividade da cobertura dos danos porventura ocasionados pelo infortúnio laboral, que passarão também a ser cobertos por meio de seguros privados, a ser regulamentado em sede de leio ordinária, o que representa o triunfo da tese privatista em detrimento da cobertura proporcionada pelo Poder Público, cujas conseqüências podem ser danosas para a coletividade, a exemplo do que já ocorre com os planos de saúde.”89
Percebe-se que o ordenamento jurídico brasileiro prevê a segurança do
trabalhador, protegendo-o e infringindo sanções a todos aqueles que violarem estes
preceitos constitucionais e infraconstitucionais.
89 BRANDÃO, Cláudio. Acidente do Trabalho e Responsabilidade Civil do Empregador. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006, p. 103.
48
3. RESPONSABILIDADE NA REPARAÇÃO DE DANOS POR ACIDENTE DO
TRABALHO
3.1. RESPONSABILIDADE CIVIL – ASPECTOS HISTÓRICOS
Como já afirmado neste estudo, o acidente de trabalho provoca reflexos nas
esferas constitucional, penal, tributária, processual, previdenciária, trabalhista e civil.
LISBOA conceitua responsabilidade como dever jurídico de recomposição
do dano sofrido, imposto ao causador direto ou indireto. Tem como função garantir o
direito do lesado e servir como sanção civil.90
Historicamente, o direito traz referências à responsabilidade, tais como o
Código de Hamurabi (1800 a.C), em que há uma noção primária de repressão ao
dano – vingança privada. Da mesma forma, o Código de Manu e o antigo direito
Hebreu.
No entanto, é o Direito Romano que permitiu a criação do substracto
essencial na formação dos sistemas atuais de responsabilidade. A Lei da XII Tábuas
(450 a.C) contém vestígios de vingança privada, marcada pela intervenção do poder
público, no propósito de discipliná-la de uma certa forma.
Segundo PEREIRA, [...] Nesta fase, não há diferença entre responsabilidade
civil e penal. Esta equivalência do mal com o mal (Lei de Talião) esboça a
perspectiva de uma composição entre a vítima e o ofensor, uma vez que ao membro
quebrado se faça o mesmo no causador do dano, na falta de acordo. A vítima
poderia receber, ao invés de imposição de igual sofrimento ao agente, uma
90 LISBOA, Roberto Senise. Manual elementar de direito civil: obrigações e responsabilidade civil. 2. ed. rev. e atual. em conformidade com o novo Código Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.v.2,p.182.
49
importância em dinheiro ou outros bens [...] não era um princípio determinante da
responsabilidade civil, senão a cogitação de casos concretos.91
Segundo ALVES citando o autor Caio Mário, a Lex Aquilia de Damno
estabeleceu as bases da responsabilidade extracontratual. Introduziu o terceiro
capítulo – damnum iniuria datum – estendendo o conceito do dano a uma coisa
corpórea ao que atingia uma coisa incorpórea. Neste capítulo do Direito Romano,
considerava-se um dano qualquer coisa alheia, animada ou inanimada. Na Lei
Aquilia havia a idéia de culpa, pois para que se configurasse o damnum iniuria
datum, era necessário determinar três elementos: a) damnum, ou lesão da coisa; b)
iniuria, ou ato contrário a direito; c) culpa, quando o dano resultava de ato positivo do
agente praticado com dolo ou culpa.92
No último estágio do Direito Romano, além dos prejuízos materiais, também
apareciam os prejuízos morais.
LISBOA ensina que inicialmente, portanto, prevalecia a vingança privada,
coletiva ou não, pelo exercício da autotutela. A ela se seguiu a autocomposição com
a Lei das XII Tábuas e, posteriormente, a arbitragem privada e pública. Consagrou-
se o processo como instrumento de solução dos litígios, mediante a nomeação de
um juiz privado (compromisso) ou a submissão da lide a um juiz público.93
No Código Civil Francês – Código de Napoleão de 1804, foi enunciado um
“princípio geral”, obrigando a reparar todos os danos que uma pessoa causar a outra
91
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p.2. 92ALVES, José Carlos Moreira in PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p.5. 93 LISBOA,Roberto Senise. Manual elementar de direito civil: obrigações e responsabilidade civil. 2. ed. ver. e atual. em conformidade como o novo código civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. v.2, p.180.
50
por sua culpa. A partir de sua interpretação, a doutrina passou a desenvolver a
responsabilidade civil fora do princípio subjetivo da culpa.94
No Brasil, a responsabilidade civil passou por três fases antes de ser
codificada. Na primeira fase, as Ordenações do Reino determinavam a aplicação
como subsidiário do direito pátrio o direito romano, através da Lei da Boa Razão, de
18 de agosto de 1769. A segunda fase, com o Código Criminal de 1830, esboça no
instituto da “satisfação”, a idéia de ressarcimento pelos danos causados. Na terceira
fase, houve a separação dos conceitos de responsabilidade civil e criminal, através
do pensamento de autores como Teixeira de Freitas e Carlos de Carvalho, que
consideravam o instituto da responsabilidade civil completamente independente da
criminal.
O Código Civil de 1916 consagrou a teoria da culpa, no art. 159, sendo
alterado em janeiro de 2003, quando passou a vigorar o Código Civil de 2002, o qual
altera o instituto da responsabilidade civil no tocante ao acidente de trabalho. Em
seu art. 927, parágrafo único, instituirá a responsabilidade objetiva – sem prova de
culpa, quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar,
por sua natureza, risco para o direito de outrem.
3.1.2 – Conceito de responsabilidade civil
MARTON, citado por Aguiar Dias, define a responsabilidade “como a
situação de quem, tendo violado uma norma qualquer, se vê exposto às
conseqüências desagradáveis decorrentes dessa violação, traduzidas em medidas
94
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2000. P.6.
51
que a autoridade encarregada de velar pela observação do preceito lhe
imponha[...]95
O núcleo da responsabilidade civil no ordenamento jurídico pátrio é
encontrado especificamente nos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil Brasileiro de
2002, que assim dispõem, respectivamente:
“art.186 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ilícito. Art.187 – Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Art. 927 – Aquele que, por ato ilícito (arts.186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único- haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”96
Asseveram Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri, que “a
responsabilidade civil opera a partir do ato ilícito com o nascimento da obrigação de
indenizar, tendo por finalidade tornar o indemne o lesado, colocar a vítima na
situação em que estaria sem a ocorrência do fato danoso.”97
Diante disso, vale a análise em separado do abuso de direito e do ato ilícito
como obrigações de indenizar.
3.1.3. Abuso de direito como fundamento da obrigação de indenizar
Segundo STOCCO, a adoção do abuso de direito como um dos
fundamentos da obrigação de indenizar, para o ordenamento jurídico, foi uma
grande conquista, vejamos:
95
DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. 1995, v.1,p.3. 96
VADE MECUM RT – 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.Arts.186 e187, p.180 e art.927,p.223 97 DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo Código Civil, v.13, 2004, p.48.
52
“Reitera-se que a adoção do abuso do direito como fundamento da obrigação de indenizar, equiparado que foi ao ato ilícito, constitui um ato de coragem e o resgate de uma omissão antiga. É, sem dúvida, uma das maiores conquistas do Direito Brasileiro.”98
Existem, contudo, discussões acerca da aplicação subjetiva ou objetiva do
abuso de direito como fato causador da obrigação de indenizar.
O mesmo autor, ainda, citando Cláudio Soares Levada, obtempera:
“A doutrina tem sido massiva em vislumbrar na nova norma modalidade de ilícito objetivo, isto é, a ser aferido em razão das conseqüências do ato em si, sem preocupações com a intenção de o agente causar ou não dano deliberado à vítima. Trata-se de mero exame a eventual desvio de finalidade da lei (social ou econômica), ou ainda aos deveres impostos pela chamada boa-fé objetiva, como os de lealdade ou colaboração. Não é preciso, repita-se, intenção de causar dano por parte do ofensor.”99
E continua:
“No entanto, o parágrafo 2º do art. 1.228 do CC de 2002 parece desdizer grande parte dessa objetividade ao prever quanto ao direito de exercício da propriedade, que são defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.”100
Por outro lado, STOCCO defende a seguinte corrente:
“No campo da culpabilidade, se o ato for praticado com a intenção deliberada de prejudicar, de causar dano ou de obter vantagem ilícita – ainda que para isso possa o terceiro ser prejudicado – ressuma claro que a obrigação de responder por este ato mostra-se evidente. O dolo, ainda que eventual – quando o agente assume o risco de produzir o resultado -, emprenha obrigação. Não importa, ainda, que o dolo seja específico ou genérico. Mas no plano da culpa (strictu sensu), em sede de abuso do direito, quer parecer que a chamada ‘graduação da culpa’ assume importância.”101
3.1.4. – O ilícito como fato gerador
O cometimento de ato ilícito, conforme determinação do artigo 186 do
Código Civil, já citado, gera também o dever de indenizar.
98
STOCCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6 ed. São Paulo: RT, 2004, p.124. 99 Ibidem. p.127 100 Idem 101 Idem.
53
STOCCO ensina:
“Isso significa que, em suas interações na sociedade, ao alcançar direito de terceiro, ou ferir valores básicos da coletividade, o agente deve arcar com as conseqüências, sem o que impossível seria a própria vida em sociedade. Nasce, assim, então, a teoria da responsabilidade, que se espraia por dois campos distintos, consoante os bens jurídicos ofendidos e o respectivo vulto na escala de valores do direito posto: o civil e o penal.”102
Vislumbra-se que o ato ilícito adentra na esfera de responsabilização penal,
ao configurar como fato típico e antijurídico, bem como na esfera civil, ao causar o
dano a outrem.
Segundo STOCCO:
“Esse comportamento gera, para o autor, a responsabilidade civil. Que traz, como conseqüência, a imputação do resultado à sua consciência, traduzindo-se, na prática, pela reparação do dano ocasionado, conseguida, normalmente, pela sujeição do patrimônio do agente, salvo quando possível a execução específica. Por outras palavras, é ilícito figurando como fonte geradora de responsabilidade.”103
Portanto, na ocorrência do ato ilícito, gera na esfera civil o dever de
indenizar, além da tutela penal a ser invocada, nos casos especificados norma
penal.
3.1.5. Teoria da graduação da culpa
O Código Civil Brasileiro de 2002, em seu artigo 944, parágrafo único,
demonstra a importância da graduação da culpa:
“art. 944- A indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo único: se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização.”104
102
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6. ed. São Paulo: RT, 2004, p. 129. 103 Idem. 104VADE MECUM RT – 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p.225
54
Tanto é verdade que CAHALI escreveu:
“a) a determinação da responsabilidade do agente não prescindo do dolo, ao qual se equiparam a culpa grave, a má-fé, a malícia,enfim, a Bösswilligkeit dos alemães: em outros, será suficiente a simples culpa, ainda que levíssima, havendo mesmo aqueles em que o dever de indenizar exsurge objetivamente, em função da simples causalidade; b) a presença do elemento subjetivo do dolo ou da culpa determina o agravamento da responsabilidade, com a adição de um plus à indenização ressarcitória.”105
Nesse sentido, STOCCO finaliza:
“Casos haverá, ainda, em que a maior gravidade da culpa (em sentido lato) do agente irá refletir-se no agravamento de sua responsabilidade indenizatória, de modo a influir na determinação do quantum debeatur. Impõe-se concluir, portanto, que em sede de abuso do direito a culpa levíssima mostra-se irrelevante para efeito de responsabilização, ou seja, não é suficiente para induzir responsabilidade, sabido que, no conceito de culpa, em sentido amplo, o erro que ganha relevo será apenas aquele inescusável que não pode ser relevado.”106
Para a configuração da responsabilidade civil, as três graduações de culpa
mostram-se de extrema importância, em especial no que tange ao quantum a ser
fixado pelo Magistrado.
3.2. ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL
Na esfera civil, a discussão da responsabilidade gira em torno de duas
correntes: a doutrina tradicional da culpa (responsabilidade subjetiva) e a teoria
objetivista do risco (responsabilidade objetiva).
Para o estudo do tema proposto, cabe destacar as diferentes espécies de
responsabilidade civil.
105 CAHALI, Yussef Said. Indenização segundo a gravidade da culpa. Revista da Escola Paulista da Magistratura, São Paulo, n.1, p.22, set.-dez. 1996. 106
STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6. ed.São Paulo: RT, 2004, p. 128.
55
3.2.1.Responsabilidade Civil Subjetiva e Objetiva
A responsabilidade civil, segundo PEREIRA107, consiste na reparalidade
abstrata do dano em relação a um sujeito passivo da relação jurídica que se forma.
Reparação e sujeito passivo compõem o binômio da responsabilidade civil, que
então se enuncia como o princípio que subordina a reparação à sua incidência na
pessoa do causador do dano.
Historicamente, segundo o referido Autor108, a responsabilidade subjetiva,
que traz em seu âmago a necessidade da prova da culpa, sempre conquistou o
maior número de adeptos, tanto na doutrina como na jurisprudência. O que
caracteriza a teoria da responsabilidade subjetiva é a figura do ato ilícito,
identificando na sua estrutura, nos seus efeitos e nos seus elementos.
A responsabilidade objetiva, ao contrário, deriva da teoria do risco, e para
PEREIRA109, “teve origem no século XIX, no campo do direito criminal. No século
XX, implanta-se no direito francês, entendendo-se o dano como uma realidade
objetiva, não há mister recorrer elemento vontade, quando se cogita definir a
responsabilidade civil. Assim á mister recorrer elemento vontade, quando se cogita
definir a responsabilidade civil. Assim como os franceses aderiram à teoria do risco,
à época, alguns juristas alemães e italianos.”
O autor aponta que a revolução industrial do século XIX percutiu
enormemente na responsabilidade civil, gerando a multiplicação dos acidentes,
materiais ou corporais, geradas pelo desenvolvimento prodigioso dos maquinismos.
107PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 15. 108 Ibidem. p.32 109Ibidem. p.11
56
Cita outro jurista francês, CARBONNIER110, para o qual:
[...] a responsabilidade objetiva não importa em nenhum julgamento de valor sobre os atos do responsável. Basta que o dano se relacione materialmente com estes atos, porque aquele que exerce uma atividade deve-lhe assumir os riscos.”111
No Brasil, segundo PEREIRA, o professor Alvino Lima, em 1938, em sua
tese apresentada à Faculdade de Direito de São Paulo, faz a defesa da teoria do
risco, argumentando que tem raízes profundas nos mais elevados princípios de
justiça e equidade. Com base no direito comparado, proclama que o princípio da
responsabilidade sem culpa está concretizado em vários dispositivos dos Código
Civis modernos, como na legislação especial.
E continua:
“Mas admite que nenhuma das duas correntes, subjetivista e objetivista, poderá levar os extremos de suas conclusões, porque se a sociedade é uma realidade moral, como afirma George Tasitch, não é menos verdade que o Direito não se alimenta só da moral, mas recebe também uma boa parte de suas soluções da Economia, repousando a idéia do útil, pois, Aldo respeito à ordem jurídica, tende a realizar a ordem social.”112
Outros autores defenderam e ainda defendem a tese da responsabilidade
objetiva, tais como Wilson Melo da Silva, que, na sua obra “Responsabilidade sem
Culpa” sustenta:
“[...] a insuficiência do conceito tradicional da culpa e os processos técnicos de sua ampliação. Defende a socialização do direito como um dos pressupostos da responsabilidade objetiva, pois introduz, no direito, um critério mais equitativo da distribuição da justiça. Considerando que o dano deixa de ser apenas da pessoa para se tornar um dano à própria coletividade, substitui o princípio da responsabilidade civil pelo da socialização dos riscos, provendo a um melhor entendimento entre os homens e a uma garantia maior de harmonia, de segurança e de paz social para todos.”
Este conceito, segundo Caio Mario da Silva Pereira, entendido como de
seguridade social ampla, não se filiando à concepção da teoria do risco na
responsabilidade civil.
110 Em sua obra “Droit Civil, vol.IV, Obligations, n.86, p.292”. 111 In Ibidem, p.19 112
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p.21.
57
O Código Civil brasileiro de 1916 em seu art. 159, guarda fidelidade temática
à teoria da culpa, em que o pressuposto da obrigação de indenizar, ou de reparar o
dano, tem conexão direta com o comportamento culposo ou doloso do agente.
“Art. 159 – Todo aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar.”113
Inobstante o que rezava o art. 159 do Código Civil, outras leis brasileiras
revelam um entendimento coordenado com a teoria objetiva do risco, tais como: a
legislação especial de acidente do trabalho, a lei que regula os transportes em geral
(aeronáutica114, estradas de ferro115), lei dos planos de benefício da previdência
social116, a responsabilidade civil dos bancos, a responsabilidade pelo fato das
coisas;
O Código de Defesa do Consumidor117 é outro instrumento legal que abraça
a teoria objetiva, enunciando em diversos dispositivos, a responsabilidade civil
independente de prova de culpa do causador do dano.
A lei especial de acidentes do trabalho, subordinado à teoria do risco,
estabelece que, em ocorrendo o acidente, o empregado tem direito a ser indenizado
por qualquer dano à sua pessoa ocorrido no trabalho ou por ocasião dele. O
empregado terá de provar a ocorrência do acidente e a relação de emprego. A lei
assegura o direito à indenização, salvo se o evento teve como causa o dolo do
próprio acidentado ou sua desobediência às ordens expressas do empregador, ou
113 Código Civil Brasileiro de 1916. 114 Lei nº7.565/86 115Lei nº 2.681, de 07,12.1912 – Estradas de ferro, estatui que as estradas de ferro responderão por todos os danos que a exploração de suas linhas causar aos proprietários marginais, bem como aos passageiros que utilizarem este meio de transporte. Os Tribunais, segundo Caio Mario da Silva Pereira, estenderam o princípio da responsabilidade das estradas de ferro às companhias de carros urbanos, considerando a natureza similar do meio de transporte. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2000.p. 276 116 Lei nº8.213/91 117
Lei nº8.078/90
58
ainda, à verificação de força maior não proveniente de fenômenos naturais
determinados ou agravados pelas instalações do estabelecimento ou pela natureza
do serviço.
O parâmetro indenizatório consta de tabela instituída na própria lei, tendo em
vista a lesão e o seu efeito, em função da incapacidade total ou parcial para o
trabalho.
Para satisfazer à exigência legal, a empresa é obrigada a efetuar o seguro
coletivo, caso em que à seguradora é transferido o encargo de efetuar a
indenização.
Além da indenização prevista na Lei especial de acidentes do trabalho
(indenização infortunística), o trabalhador (ou seus herdeiros – sucessores, em
casos de morte) tem garantido constitucionalmente o direito de cobrar indenização
civil por danos materiais e morais.118
Apesar da teoria subjetiva da responsabilidade ter sido predominante até os
dias atuais, a ampliação cada vez maior da consciência objetiva, no que concerne à
responsabilidade civil, é uma realidade. Um caso de responsabilidade objetiva é o
daquele que em legítima defesa ou estado de necessidade, ou no exercício regular
de um direito, danifica coisa alheia. Para o autor PEREIRA, “o limite reside em que o
causador do dano não exceda a razoabilidade que atesta a relevância social de seu
direito. Não se cogita de culpa, mas haverá obrigação de indenizar.”119
Através da técnica da hermenêutica, segundo PEREIRA, buscou-se,
historicamente, uma solução transacional ou intermediária para esta dualidade, no
tocante à responsabilidade. Uma das formas é através da “culpa presumida”, na qual
118Este princípio está inserido na Constituição da República Federativa do Brasil, art. 7º, inciso XXVIII que prevê como direito dos trabalhadores urbanos e rurais seguro contra acidentes do trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa. 119
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2000.p.277.
59
“não perde a culpa a condição de suporte de responsabilidade civil, embora aí já se
deparem indícios de sua degradação como elemento etiológico fundamental da
reparação, e aflorem fatores de consideração da vítima como centro de estrutura
ressarcitória, para atentar diretamente para as condições do lesado e a necessidade
de ser indenizado.”120Analogamente, pode ser comparado à inversão do ônus da
prova no Código de Defesa do Consumidor.
A diferença da concepção subjetiva tradicional é no que concerne ao ônus
da prova.
“Dentro da teoria clássica da culpa, a vítima tem de se demonstrar a existência dos elementos fundamentais de sua pretensão, sobressaindo o comportamento culposo do demandado. Presume-se o comportamento culposo causador do dano, cabendo-lhe demonstrar a ausência de culpa, para se eximir do dever de indenizar. Foi um modo de afirmar a responsabilidade civil, sem a necessidade de provar o lesado a conduta culposa do agente, mas sem repetir o pressuposto subjetivo da doutrina tradicional.”121
Neste caso, o dever de ressarcir é afastado, caso o acusado demonstre que
o dano foi causado pelo comportamento da própria vítima.
Outra forma de aproximação à responsabilidade objetiva, com o intuito de
dilargar a responsabilidade civil, segundo PEREIRA, é a transmudação da
responsabilidade aquiliana (extra-contratual) em contratual. “Dá-se ênfase a uma
situação em que ocorre um dano, que se enquadraria na culpa aquiliana, mas que
se desfigura como tal e se apresenta como oriunda de um contrato, o que a faz
incidir no conceito de culpa contratual.”
A posição doutrinária de PEREIRA é no sentido da convivência das duas
doutrinas: tanto a da culpa (subjetiva) como a do risco (objetiva). “A culpa exprimiria
a noção básica e o princípio geral definidor da responsabilidade, aplicando-se a
doutrina do risco nos casos especialmente previstos, ou quando a lesão provém de
120 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p.263. 121
Ibidem, p. 266.
60
situação criada por quem explora profissão ou atividade que expôs o lesado ao risco
do dano que sofreu.”122
“O conceito de risco que melhor se adapta às condições de vida social é o que se fixa no fato de que, se alguém põe em funcionamento uma qualquer atividade, responde pelos eventos danosos que esta atividade gera para os indivíduos, independentemente de determinar se em cada caso, isoladamente, o dano é devido à imprudência, à negligência, a um erro de consulta, e assim se configura a teoria do risco criado.”123 “Os defensores da doutrina subjetiva atacam a teoria da responsabilidade sem culpa ao argumento de que, em razão da demasiada atenção à vítima, acaba por negar o princípio da justiça social, impondo cegamente o dever de reparar, e levando-o a equiparar o comportamento jurídico e o injurídico do agente.”124
E continua:
“É a convivência dos dois conceitos – subjetivo e objetivo- que deve inspirar a manutenção de preceitos que atendam às duas tendências, não obstante as reservas que os objetivistas fazem a esta convivência.”125
Para PEREIRA, esta convivência dos dois conceitos é aconselhável no
plano teórico e igualmente no direito positivo.
Com relação à responsabilidade civil do Estado, a Constituição Federal de
1988, em seu artigo 37, inciso XXI, parágrafo 6, estabelece que ”o estado responde
pelos danos causados ao particular, com direito de regresso contra o servidor, se
este houver procedido culposamente”126. Adota, portanto, a teoria do risco integral,
ou objetiva, pois o Estado, por si só, não tem manifestação psicológica; esta é uma
característica humana.
A desigualdade econômica a força de pressão do empregador, a menor
disponibilidade de provas por parte do empregado, em muitos casos, levam à
improcedência da ação de indenização. Por outro lado, nem sempre é possível
vincular o acidente a uma possível culpa do empregador, porém causado direta ou
122PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2000.p.269. 123
Ibidem, p.270. 124
Ibidem, p.271. 125 Ibidem, p.273. 126 VADE MECUM RT – 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p.34
61
indiretamente pelo desgaste do material ou até pelas condições físicas do
empregador, cuja exaustão na jornada de trabalho e na monotonia da atividade
proporciona acidente.
Em muitos casos, a aplicação da teoria subjetiva deixa a vítima sem
reparação, contrariando o princípio ideal de justiça, embora exista o amparo da
legislação brasileira. No entanto, há necessidade de haver menos distância entre o
legal e o justo.
O Projeto de Código Civil de 1975127, que deu origem ao Código Civil de
2002128, já previa que a responsabilidade objetiva se dará nos casos especificados
em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para o direito de outrem. Desta forma, tem-se pela
interpretação, que a responsabilidade objetiva é a exceção a regra.
No entanto, presume-se, pela referida leitura, que como praticamente quase
todas as atividades de trabalhadores vinculados a um contrato de trabalho, geram
riscos para os próprios trabalhadores, a responsabilidade decorrente dessa relação,
passa a ser objetiva com o Código Civil Brasileiro de 2002.
Conforme verifica-se pelos apontamentos, o risco da atividade é que
determina a aplicação da responsabilidade civil objetiva. Contudo, esse risco pode
dar-se de várias formas diferentes, conforme será analisado.
127 Projeto 634-B 128 Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002.
62
3.2.1.2 – Risco Proveito
Baseia-se na afirmação de que o responsável pela obrigação “é aquele que
tira proveito da atividade danosa, com base no princípio de que, onde está o ganho,
aí reside o encargo.”129
LIMA, considerando uma conquista a responsabilidade civil objetiva ressalta:
[...]nas suas múltiplas atividades, são os criadores de riscos, na busca de proveitos individuais. Se destas atividades colhem os seus autores todos os proventos, ou pelo menos agem para conseguí-los, é justo e racional que suportem os encargos, que carreguem com o ônus, que respondam pelos riscos disseminados [...]. Não é justo, nem racional nem tampouco equitativo e humano, que a vítima, que não colhe os proveitos da atividade criadora dos riscos e que para tais riscos não concorreu, suporte os azares da atividade alheia. A questão da responsabilidade, que é mera questão de reparação dos danos, de proteção do direito lesado, de equilíbrio social, deve, pois, ser resolvida atendendo-se somente àquele critério objetivo;quem guarda os benefícios que o acaso da sua atividade lhe proporciona deve, inversamente, suportar os males decorrentes desta mesma atividade.”130
Em tirando proveito o empregador do trabalho exercido pelo empregado,
restará devidamente evidenciada a sua responsabilidade, independente da
demonstração da culpa.
3.2.1.3 – Risco Profissional
Compreende o dever de indenizar a partir dos danos ocorridos na atividade
laboral desenvolvida, conforme ensina BRANDÃO, ao relatar que “a teoria do risco
profissional compreende o dever de indenizar a partir do prejuízo ocasionado no
desempenho de atividade laborativa ou profissão. Foi concebida especificamente
129 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p.146. 130
LIMA, Alvino. Culpa e Risco. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 119.
63
para fundamentar os casos de acidentes de trabalho, ocorridos sem culpa do
empregador.”131
Arremata CAVALIERI FILHO:
“A responsabilidade fundada na culpa levava, quase sempre, à improcedência da ação acidentária. A desigualdade econômica, a força de pressão do empregador, a dificuldade do empregado de produzir provas, sem se falar nos casos em que o acidente decorria das próprias condições físicas do trabalhador, quer pela sua exaustão, quer pela monotonia da atividade, tudo isso acaba por dar lugar a um grande número de acidentes não indenizados, de sorte que a teoria do risco profissional veio afastar esses inconvenientes.”132
Dessa forma, com base no próprio Princípio da Proteção, o empregado resta
devidamente abrigado pela Lei, que garantirá uma indenização independente da
comprovação da culpa.
3.2.1.4- Risco de autoridade
Este risco é vinculado à ordem direta do empregador ao empregado, que
acaba acidentando-se em decorrência do comando, segundo Antônio Carlos Araújo
de Oliveira: “fundada na idéia de que, se o empregado se acidenta, ao cumprir
ordem do empregador, foi vítima do ato patronal subordinante. O que marca o
infortunado é sua obediência às ordens recebidas do empregador.”133
Ela é calçada na “mera condição de subordinação do empregado ao
empregador, pelo contrato de trabalho.”134
131 BRANDÃO, Cláudio. Acidente do Trabalho e Responsabilidade Civil do Empregador. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006, p. 222. 132 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p.146. 133 OLIVEIRA, Antônio Carlos Araújo de. A Responsabilidade Civil do Empregador pelo Acidente do Trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p.48. 134 FERNANDES, Aníbal. Os Acidentes do Trabalho: do sacrifício do trabalho à prevenção e à reparação. 3. ed. São Paulo: LTr, 2003, p.52.
64
3.2.1.5 Risco excepcional
Embasada nas atividades de grande risco, como energia nuclear ou alta
tensão.
CAVALIERI FILHO destaca que “a reparação é devida sempre que o dano e
conseqüência de um risco excepcional, que escapa a atividade comum da vítima,
ainda que estranho ao trabalho que normalmente exerça.”135
BRANDÃO exemplifica:
“Essa teoria atribui o dever de indenizar a partir da constatação de que algumas atividades acarretam excepcional risco, o que pode ser exemplificado com as atividades de energia elétrica de alta tensão, exploração de energia nuclear, transporte de explosivos, material radioativo, etc.”136
Em sendo desenvolvida atividade que, por si, gera risco à saúde do
empregado, aí residirá o dever de indenizar.
3.2.1.6 – Risco Criado
Segundo BRANDÃO, “nessa modalidade, o dever de indenizar é gerado
quando, em razão de atividade ou profissão, o perigo é criado, [...].”137
Sua diferenciação das demais teorias do risco é a seguinte, segundo
BRANDÃO:
“Não se cogita do fato de ser o dano correlativo de um proveito ou vantagem para o agente e não há, por conseguinte, subordinação do dever de reparar ao pressuposto da vantagem. É suficiente a análise da atividade em si, independentemente do resultado que venha a proporcionar para quem a desenvolve.”138
135 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p.146/147. 136 BRANDÃO, Cláudio. Acidente do trabalho e responsabilidade civil do empregador. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006, p. 223. 137 Ibidem. 138 Ibidem.
65
Pode ser considerada uma ampliação do risco proveito, e ao caracterizá-la,
QUEIROGA explica:
“Se, em decorrência dessa atividade, alguém vem a sofrer um dano, surge a obrigação de reparar, ainda que sua conduta seja isenta de culpa. [...] se o fato decorreu, objetivamente, da ação, imputa-se a responsabilidade ao autor, ainda que este não tenha agido culposamente.”139
Sendo assim, nessa situação, pouco importa se houve o proveito econômico
ou não do empregador, mas simplesmente a existência da atividade com finalidade
lucrativa, que restará caracterizado o dever de indenizar.
3.2.1.7 Risco integral
VENOSA assim define:
“[...]modalidade extremada que justifica o dever de indenizar até mesmo quando não existe nexo causal. O dever de indenizar estará presente tão só perante o dano, ainda que com culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior,[...]”140
BRANDÃO exemplifica:
[...]embora reconheça o caráter excepcional dessa forma de responsabilidade, aplicável somente em determinadas situações, a exemplo da cobertura proporcionada pelo seguro obrigatório de veículos automotores, [...]. Pode também ser mencionada, como exemplo, a indenização por acidente do trabalho a cargo da Previdência Social, que é devida mesmo quando resultarem presentes as causas excludentes do nexo de causalidade; a concessão do auxílio – doença acidentário, na hipótese de afastamento do empregado a partir do décimo sexto dia, em virtude de acidente laboral é encargo suportado pela Previdência.”141
139
QUEIROGA. Antônio Elias de. Responsabilidade Civil e o Novo Código Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p.12. 140
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 284. 141 BRANDÃO, Cláudio. Acidente do trabalho e responsabilidade civil do empregador. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006, p. 225.
66
A teoria do risco integral abrange as mais diversas situações de
responsabilidade. Haverá o dever de indenizar mesmo na inexistência do nexo
causal, culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior.
3.3. RESPONSABILIDADE CRIMINAL
Há diferenças conceituais entre a responsabilidade civil e a penal. Nesta, o
delinqüente infringe a norma de direito público que perturba a ordem social, e não
importa se houve prejuízo ou não para a vítima (por exemplo, uma tentativa de
homicídio em que a vítima escapa incólume). Na responsabilidade civil, o interesse
lesado é privado, a norma infringida pode ou não ser de ordem pública e deve,
necessariamente, haver um prejuízo, mensurável ou não.
O acidente do trabalho está vinculado ao Direito Penal, pois o empregador
tem obrigação com a verdade dos fatos, com a proteção e com a orientação do seu
empregado.
Tanto a ação (determinação para a execução de um trabalho), como a
omissão (de informação, orientação e de socorro), podem gerar imputações
criminais.
No campo criminal, dependendo das circunstâncias do caso concreto,
poderá o empregador ser responsabilizado, desde que tenha incorrido em dolo ou
culpa.
Por outro lado, o descumprimento pela empresa das normas de segurança e
saúde no trabalho, nos termos do art. 19, parágrafo 2º da Lei 8.213/91, constitui
contravenção penal punível com pena de multa.
67
De acordo com o Código Penal, em seu art. 18 diz-se o crime doloso,
quando o agente quis o resultado, ou assumiu o risco de produzi-lo. Culposo,
quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.
Dos crimes contra a pessoa, o Código Penal tipifica vários crimes, sendo os
crimes contra a vida homicídio simples142, homicídio culposo143, lesão corporal144,
lesão corporal de natureza grave145, lesão corporal seguida de morte146, lesão
corporal culposa147, e finalmente, a exposição da vida ou da saúde de outrem a
perigo direto e iminente.148
3.4. CAUSAS EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL
O Código Civil Brasileiro elenca algumas causas que são excludentes a
responsabilidade civil, entre as quais, caso fortuito ou força maior, culpa exclusiva da
vítima, estado de necessidade, erro escusável, estrito cumprimento do dever legal,
entre outras. Estas causas são fundadas na teoria subjetiva da responsabilidade.
Sob o enfoque da teoria objetiva, não poderiam ser aplicadas, pois se presume que,
estando o trabalhador a serviço do empregador, e sofrendo acidente do trabalho,
não se discute de quem foi a culpa, bastando provar o nexo causal entre relação
142 Art. 121 do código penal: matar alguém, a pena é de reclusão, de 6 a 20 anos. 143 Art. 121, parágrafo 3º do código penal: se o homicídio é culposo, a pena é de detenção de 1 a 3 anos. 144 Art. 129 do código penal: ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem, a pena é de detenção de 3 meses a 1 ano. 145Art. 129, parágrafo 1º do código penal: se resulta: I- incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias; II- perigo de vida; III – debilidade permanente de membro, sentido ou função; IV – aceleração do parto, a pena é de reclusão de um a cinco anos; se, de acordo com o art. 129, parágrafo 2º resultar: I- incapacidade permanente para o trabalho; II – enfermidade incurável; III – perda ou inutilização de membro, sentido ou função; IV – deformidade permanente; V – aborto, a pena é de reclusão de 2 a 8 anos. 146 Art. 129, parágrafo 3º do Código Penal: se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo, a pena é de reclusão de 4 a 12 anos. 147 Art.129, parágrafo 6º do código penal: se a lesão é culposa, a pena é de detenção de 2 meses a 1 ano. 148 Art. 132 do código penal: expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente, a pena é de detenção, de 3 meses a 1 ano, se o fato não constituir crime mais grave.
68
contratual e acidente do trabalho. Veja-se quais são as hipóteses elencadas pela
legislação e excludentes da responsabilidade.
Na hipótese de caso fortuito ou força maior, previsão contida no art. 1.058 do
Código Civil Brasileiro de 1916 e art. 393 do Código Civil Brasileiro de 2002, não há
como responsabilizar ninguém, porque está ausente o liame de causalidade entre o
agente e o dano. Utiliza-se esta expressão para o fato necessário, cujos efeitos não
eram possíveis evitar ou impedir. Ocorre, portanto, caso fortuito ou força maior,
quando há ocorrência de fato imprevisível ou inevitável, excluindo-se a possibilidade
de argüição de culpa, ou responsabilidade pelo fato do serviço. Como exemplo, cita-
se o fato de um trabalhador se machucar no trabalho em decorrência de um incêndio
ou enxurrada.
Na hipótese de culpa exclusiva da vítima, caracteriza-se a situação em que o
lesionado é o único responsável pelo evento danoso. Em tal circunstância, fica
excluída a causalidade entre o ato do agente e o dano ocorrido, porque foi ato do
agente causador do dano.
Outra hipótese é a atenuação da responsabilidade por culpa concorrente,
quando a vítima concorre com o agente para a consecução do dano. Procura-se
avaliar qual foi o grau de participação de cada um e, com base nele, estipular a
parcela de responsabilidade tanto do agente quando da vítima.
Na hipótese de estado de necessidade, este fica caracterizado quando se
ofende a vítima a fim de evitar perigo eminente – ou seja, há um conflito de
interesses, mas se considera que o do agente era mais valioso do que o da vítima.
Ante a lesão de um direito seu, o agente ofende direito alheio.
A justiça pelas próprias mãos é vedada em nosso ordenamento jurídico, no
entanto, é permitido a possibilidade de repetir, através da força, a agressão, ou a
69
possibilidade de agressão, através da legítima defesa. A legislação civil não define a
legítima defesa, somente o direito penal, o qual a define como sendo defesa de
agressão provocada por outrem, ameaça de dano atual ou iminente (a reação não
pode ser posterior, mas imediata) e reação proporcional à agressão (não pode haver
reação mais grave do que agressão).
A legítima defesa pode servir como instrumento de defesa na proteção dos
bens materiais e morais, como a honra, a imagem e a personalidade. A legítima
defesa se aplica tanto às pessoas físicas quanto às jurídicas, dado que ambas têm
patrimônio físico e moral a defender.
Finalmente, como causa excludente de responsabilidade civil tem-se o fato
de terceiro. Terceiro é “[...] qualquer pessoa além da vítima ou do responsável.”149 O
art. 1.521 do Código Civil de 1916 elenca as hipóteses de responsabilidade de
terceiros, entre os quais destacamos, no âmbito da relação de emprego os
elencados no inciso III – “o patrão, amo ou comitente, por seus empregados,
serviçais e prepostos, no exercício do trabalho lhes competir, ou por ocasião dele.”
O art. 1.522 do mesmo diploma legal estabelece que a responsabilidade
abrange as pessoas jurídicas que exercerem exploração industrial.”150 Ainda, em
face da Súmula 341 do STF – “é presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato
culposo do empregado ou preposto”, a responsabilidade do empregador é
presumida.
O agente, no acidente do trabalho, segundo PEREIRA, é “responsável
aparente”, e pode ser total ou parcialmente responsável pelo ocorrido. Sua atuação,
para excluir validamente a responsabilidade civil, deve ser semelhante à força maior.
149DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. 10. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p.218. 150 O equivalente do art. 1.521 no CCB de 2002 é o artigo 932; o art. 1.522 não possui equivalente no CCB de 2002.
70
O Código de Processo Penal estabelece, em seu art. 65, que faz coisa
julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado
de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no
exercício regular de direito.
No art. 66 do Código de Processo Penal, há determinação para que, não
obstante a sentença absolutória do juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta
quando não tiver sido, categoricamente, reconhecido a inexistência material do fato.
E, finalmente, no art. 67, inciso III do referido Código, declara que não há
impedimento para a propositura da ação civil em caso de sentença absolutória
decidir que o fato imputado não constitui crime.
3.5. DANOS DECORRENTES DO ACIDENTE DO TRABALHO
Conforme já demonstrado, o dano é pressuposto indispensável para o
deferimento de qualquer indenização decorrente do acidente do trabalho.
O autor PEREIRA afirma que “o dano é elemento ou requisito essencial na
etiologia da responsabilidade civil”.151
Na mesma linha de entendimento, STOCCO relata que, “se não houver
prova do dano, falta fundamento para a indenização. Não se admite o dano incerto,
improvável ou eventual, o dano condicional e nem mesmo o dano hipotético.”152
Sendo assim, verifica-se que os danos são pressupostos indispensáveis ao
deferimento da indenização, conforme ressalta OLIVEIRA: “O acidente do trabalho
151 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. 2002, p.37 152 STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. RT: São Paulo, 2004, p. 181.
71
ou as situações equiparáveis pode provocar danos de natureza material, moral e/ou
estética.”153
3.5.1. Danos materiais
THEODORO JÚNIOR conceitua da seguinte forma:
“O dano material é prejuízo financeiro efetivo sofrido pela vítima, causando por conseqüência uma diminuição do seu patrimônio, avaliável monetariamente. O dinheiro é a forma e o padrão natural de dimensioná-lo e o instrumento idôneo para bem repará-lo.”154
DINIZ enfatiza que:
“O dano patrimonial vem a ser a lesão concreta, que afeta um interesse relativo ao patrimônio da vítima, consistente na perda ou deterioração, total ou parcial, dos bens materiais que lhe pertencem, sendo suscetível de avaliação pecuniária e de indenização pelo responsável.”155
O artigo 402 do Código Civil Brasileiro, tem-se:
“Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.”156
Como é expressamente determinado pelo Código Civil, existem duas sub-
espécies de danos materiais, os danos emergentes e lucros cessantes, como
salienta OLIVEIRA:
O Código Civil estabelece no art. 402 que o ressarcimento dos danos abrange parcelas de duas naturezas: o que efetivamente o lesado perdeu e o que razoavelmente deixou de ganhar. Na apuração do que a vítima efetivamente perdeu temos os chamados danos emergentes ou danos positivos; na avaliação do que deixou de ganhar estaremos diante dos lucros cessantes ou danos negativos.”157
153
OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional. 3 ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 200. 154
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários ao novo Código Civil. V.III, 2002, p. 62. 155
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. V.7, 2007, p.62. 156
VADE MECUM RT – 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p.193 157 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional. 3 ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 201.
72
Nessa situação, pouco importa se houve o proveito econômico ou não do
empregador, mas simplesmente a existência da atividade com finalidade lucrativa,
que restará caracterizado o dever de indenizar.
E ainda, o magistrado do TRT/SP, decidiu nesse sentido:
“DANOS MORAIS E MATERIAIS - DOENÇA OCUPACIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO DO BENEFÍCIO RECEBIDO DO INSS. POSSIBILIDADE DE OPÇÃO DO EMPREGADO PELA INDENIZAÇÃO DO DANO MATERIAL DE FORMA INTEGRAL. A aposentadoria não implica em impossibilidade de trabalho futuro. Incabível qualquer dedução de benefício recebido do INSS com a indenização por dano material e/ou moral em decorrência de acidente do trabalho/doença ocupacional. Institutos de natureza jurídica e destinação diversas. Exegese do artigo 7o, XXVIII, da Constituição Federal e do artigo 121 da Lei 8.213/91. Entendimento pacificado na Doutrina e na Jurisprudência do STJ. Súmula 229 do STF e Enunciado 48 da 1a Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho. Nos termos do artigo 950 do Código Civil, cabe ao prejudicado optar entre o recebimento da indenização por dano material de forma integral ou através de pensão mensal.”158
3.5.1.1. Dano emergente
OLIVEIRA conceitua da seguinte forma:
“O dano emergente é aquele prejuízo imediato e mensurável que surge em razão do acidente do trabalho, causando uma diminuição do patrimônio do acidentado. É o prejuízo mais visível porque representa dispêndios necessários e concretos cujos valores são apuráveis nos próprios documentos de pagamento, [...].”159
O mesmo autor cita como exemplo:
“[...] tais como: despesas hospitalares, honorários médicos, medicamentos, aparelhos ortopédicos, sessões de fisioterapia, salários para acompanhantes no caso de a vítima necessitar de assistência permanente de outra pessoa ou, nos casos de óbito, os gastos com funeral, luto, jazigo, remoção do corpo, etc.”160
158
TRT/SP - 00669200605902008 - RO - Ac. 1aT 20090443556 - Rel. Lizete Belido Barreto Rocha - DOE 07/07/2009 159 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional. 3 ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 201. 160
Idem.
73
Os artigos 948 e 949 do Código Civil, traz um rol exemplificativo, sem excluir
as demais indenizações que podem ser comprovadas:
“art. 948- No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações: I – no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família; Art. 949 – No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até o fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido.”161
Dano emergente, portanto, divide-se em aquele em que se comprovam as
despesas, e o lucro cessante, onde é apurado o quanto o acidentado deixou de
ganhar.
3.5.1.2 Lucro cessante
OLIVEIRA entende que:
“Além das perdas efetivas dos danos emergentes, a vítima pode também ficar privada dos ganhos futuros, ainda que temporariamente. Para que a reparação do prejuízo seja completa, o art. 402 do Código Civil determina o cômputo dos lucros cessantes, considerando-se como tais aquelas parcelas cujo recebimento, dentro da razoabilidade, seria correto esperar. Assim, como ponto de equilíbrio, não pode ser considerada a mera probabilidade de alguma renda, nem se exige, por outro lado, certeza absoluta dos ganhos.”162
Portanto, existe, um critério de razoabilidade que deve ser seguido, pautado
no bom senso e pela expectativa do que efetivamente deveria ocorrer.
161
VADE MECUM RT – 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p.225. 162 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional. 3 ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 202.
74
ALVES pontua que “o credor haveria de lucrar aquilo que o bom senso diz
que lucraria. Há aí uma presunção de que os fatos se desenrolariam dentro do seu
curso normal, tendo-se em vista os antecedentes.”163
Para tanto, a recomendação de CAVALIERI é importante:
“Deve o juiz mentalmente eliminar o ato ilícito e indagar se aquilo que está sendo pleiteado a título de lucro cessante seria a conseqüência do normal desenrolar dos fatos; se aquele lucro poderia ser razoavelmente esperado, caso não tivesse ocorrido o ato ilícito.”164
STOCCO, citando Pontes de Miranda, de forma muito sábia, ressalta ainda
que “para que ocorra o direito aos lucros cessantes, a título de perdas e danos,
deve-se comprovar haver, com certeza, algo a ganhar, uma vez que só se perde o
que se deixa de lucrar.”165
3.5.2 – Danos Morais
O artigo 5, incisos V e X da Constituição Federal de 1988, abrange o dano
moral:
“art. 5 – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: ... V- é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo além da indenização por dano material, moral ou à imagem; ... X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”166
163 ALVES, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas conseqüências. 1972, p. 190. 164 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 2005, p. 98. 165 STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6. ed. RT: São Paulo, 2004, p.121. 166 VADE MECUM RT – 4. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p.18
75
Também o é pelo artigo 186 do Código Civil:
“art. 186 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”167
Apesar dos dispositivos legais serem abrangentes, pode-se entender o dano
moral como a ofensa a um direito de personalidade.
São vários os conceitos trazidos pelos nossos doutrinadores para dano
moral.
PAMPLONA FILHO entende ser o “[...] prejuízo ou lesão de interesses e
bens, cujo conteúdo não é pecuniário, nem comercialmente redutível a dinheiro,
como é o caso dos direitos da personalidade ou dos atributos da pessoa.”168
FLORINDO entende como “aquele decorrente de lesão à honra, à dor
sentimento ou física, aquele que afeta a paz interior do ser humano, enfim, ofensa
que cause um mal, com fortes abalos na personalidade do indivíduo.”169
CAHALI, em rol exemplificativo, destaca vários eventos que podem causar o
dano moral:
“Tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado, qualifica-se, em linha de princípio, como dano moral; não há como enumerá-lo exaustivamente, evidenciando-se na dor, na angústia, no sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente querido falecido; no desprestígio, na desconsideração social, no descrédito à reputação, na humilhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, na depressão ou no desgaste psicológico, nas situações de constrangimento moral.”170
O Tribunal do Trabalho de São Paulo, assim vem decidindo:
“ACIDENTE CAUSADO POR COLEGA DE TRABALHO. DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR. Com amparo no art. 932, III, do Código Civil, o empregador responde objetivamente pelo dano causado por trabalhador que no exercício das funções provoca acidente vitimando um colega. Não o beneficia a alegação de culpa exclusiva de terceiro para
167
Ibidem. p.180 168 PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Dano Moral na relação de emprego. São Paulo: LTr, 1998, p. 02. 169 FLORINDO, Valdir. O dano moral e o direito do trabalho. 4. ed. São Paulo: LTr, 2002, p. 53. 170
CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 2005, p. 22-23.
76
esquivar-se da indenização devida ao acidentado, pois sua responsabilidade independe de culpa. DANOS MATERIAIS INDEVIDOS. Empregado que apesar de sofrer lesão definitiva e parcial em dois dedos da mão, constatada por perícia técnica, volta ao trabalho e continua a exercer a mesma função, sem notícia de redução da capacidade laboral. Em regra, a análise da incapacidade para o labor deve levar em conta a atividade desempenhada pelo obreiro no momento do acidente, conforme prevê o art. 950 do Código Civil. Também não podem ser esquecidas as perspectivas de ascensão profissional e a idade do empregado as quais, no caso dos autos, não favoreceram o reclamante.”171
Na ocorrência de qualquer uma das situações que infrinjam um dos direitos
da personalidade, haverá direito a reparação pelo dano causado.
3.5.2.1 Aferição dos danos morais
GODINHO utiliza os seguintes critérios:
“Em síntese, os critérios orientadores do órgão judicante no exame da ocorrência do dano moral são os seguintes: a) no tocante ao ato ofensivo em si: sua natureza (se é um tipo civil apenas ou, ao contrário, um tipo penal, por exemplo; a forma como se deu o ato, etc.); sua gravidade (a natureza já induz à conclusão sobre a gravidade, embora esta possa derivar também de outros fatores, como, por exemplo, a permanência no tempo dos efeitos da ofensa); o tipo de bem jurídico tutelado que a ofensa atinge (honra, intimidade, vida privada, por exemplo); b) no tocante à relação do ato com a comunidade: a repercussão do ato (seja quanto à intensidade da repercussão – profunda, leve, etc. – seja quanto à sua abrangência: larga, restrita, etc.); c) no tocante à pessoa do ofendido: a intensidade de seu sofrimento ou desgaste; a posição familiar, comunitária ou política do ofendido, seu nível de escolaridade; d) no tocante à pessoa do ofensor: sua posição socioeconômica (tratando-se de empregador pessoa física, evidentemente deve-se tomar também em consideração os aspectos individuais do ofensor); a ocorrência (ou não) de práticas reiteradas de ofensas da mesma natureza e gravidade; a intensidade do dolo e culpa do praticante do ato ou por ele responsável; e) a existência (ou não) de retratação espontânea e cabal pelo ofensor e a extensão da reparação alcançada por esse meio pelo ofendido. Registre-se, a propósito, que a retratação não necessariamente exclui a responsabilidade pela reparação, embora atenue o valor reparatório a ser fixado.”172
171 TRT/SP - 01843200620202005 - RO - Ac. 5aT 20090386510 - Rel. José Ruffolo - DOE 05/06/2009 172 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 624-625.
77
Mostram-se, portanto, demasiadamente específicos e complexos os
requisitos para aferição dos danos morais.
3.5.2.2. Valor da indenização
O critério de fixação para o pagamento dos danos materiais, não pode ser
utilizado para o valor referente aos danos morais, especialmente porque aqueles
pautam-se em requisitos objetivos, e estes subjetivos.
OLIVEIRA descreve:
“O pagamento da indenização dos danos morais, no entanto, não obedece ao mesmo critério aplicado aos danos materiais. Em vez de estabelecer um valor mensal na forma de pensionamento, os danos morais devem ser arbitrados para pagamento imediato, em parcela única como forma rápida de amenizar o sofrimento e propiciar alguma melhoria de vida para a vítima, considerando as suas condições pessoais.”173
Nesse sentido, o magistrado, do Tribunal de Alçada de Minas Gerais,
observou que:
“Em matéria de dano moral, o valor da indenização há de ser suficiente tanto para facilitar a que o ofendido obtenha lenitivos para sua dor, não pela quantificação em termos materiais, como, também, porque, mercê da indenização respectiva, poderá cercar-se de condições de sobrevivência mais compatíveis com sua dignidade de pessoa humana, tornando-a mais apta ao enfrentamento diuturno de sua deficiência. Além disse, tal condenação tem o efeito pedagógico, no sentido de tornar a sociedade efetivamente mais humana, colocando-a sob a égide dos princípios éticos impedientes e dissuasivos de condutas quais a que teve a ré.”174
O magistrado do TRT/SP assim decidiu:
“INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL. ACIDENTE DO TRABALHO. ACIDENTE TÍPICO. AMPUTAÇÃO PARCIAL DE DEDO DA MÃO DIREITA. SEQUELA IRREVERSÍVEL. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE. (Arts. 159, 1518, 1521, inciso III, 1522, 1539, do vetusto Código Civil e Art. 5o, V e X e art. 7o, XXII e XXVIII, da CF; Art.186 e 944 e 950 CC do atual Código Civil 1. Se o laudo médico concluiu que em razão da mutilação, pela perda de parte do dedo indicador da mão direita (amputação da falange distas do segundo quirodáctilo), o reclamante sofreu limitação na sua capacidade para o trabalho, e que o acidente ocorreu pela
173
OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional. 3 ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 215. 174 Cf. MINAS GERAIS. TAMG. 1. Câm. Civ.. Ap. Civel 213.381-9, Rel Juiz Páris Pena, julgada em 11 de junho de 1996.
78
inexistência de proteção adequada na máquina operada, presentes estão o elementos do nexo causal do acidente e a da responsabilidade pela reparação por dano moral. 2. A obrigação de reparar os danos moral, estético, material, espécies do gênero dano pessoal, decorrente de acidente de trabalho, encontra-se prevista na Constituição Federal, art. 5o, V e X e art. 7o, XII e XXVII e, ainda, nos arts. 186 e 950 do Código Civil, (arts. 159, 1518, 1521, inciso III, 1522, 1539, do vetusto Código Civil), observados os elementos: a ofensa a uma norma preexistente ou erro de conduta, um dano e o nexo de causalidade. PENSÃO MENSAL VITALICIA. ACIDENTE DE TRABALHO. PERDA DA PROFFISSIONALIDADE. INOCORRENCIA. PENSÃO INDEVIDA. A pensão mensal vitalícia, prevista no artigo 950 do Código Civil, só é devida quando da lesão resultar defeito pelo qual o trabalhador não possa exercer o seu oficio ou profissão ou equivalente e correlata. O mote é indenizar a perda da profissionalidade, da carreira e de outras chances. Isto porque, o Código Civil, no instituto da responsabilidade civil, é regido pelo princípio da restitutio in integrum. Os art. 1.539 e 950 do CC, estabelecem duas possibilidades de pensionamento no caso de acidente com lesão: (a) se o defeito impede o exercício do mesmo ofício ou profissão, a pensão corresponderá à importância deste mesmo trabalho, equivalente ao valor do salário que o trabalhador recebia até o advento do acidente do trabalho; (b) se defeito não impede o exercício do mesmo ofício ou profissão,apenas traz dificuldades para o mesmo trabalho, com mera redução da capacidade laboral, a pensão abrangerá apenas o valor da depreciação, apurável pela aplicação de um percentual representativo da incapacidade sobre o valor do salário. É indevido o pensionamento se não houve incapacidade para exercício das funções que o trabalhador vinha exercendo ou de funções equivalentes ou correlatas.”175
Sobre este tema o magistrado do TRT do Mato Grosso assim decidiu:
“DOENÇA DO TRABALHO. DIMINUIÇÃO DA CAPACIDADE AUDITIVA. NEXO CAUSAL. CULPA. As provas carreadas aos autos demonstram que o Reclamante estava submetido a ruídos excessivos, por tempo superior ao permitido pela legislação, e a diminuição auditiva foi causada por trauma sonoro, fazendo-se presente, assim, o nexo causal e a culpa da Reclamada. Nego Provimento. DANO MORAL. PROVA. É dispensável a produção de prova da repercussão do acidente de trabalho no patrimônio moral do trabalhador, pois tal dano decorre da própria ofensa, de forma que provada a doença do trabalho, está configurado o dano moral. Contudo, o laudo pericial concluiu que a perda auditiva sofrida pelo Autor não impede sua comunicação normal com interlocutores, afetando apenas as freqüências altas. Recurso a que se da parcial provimento para reduzir o valor da indenização para R$ 30.000,00 (trinta mil reais). DANO MATERIAL. PENSÃO MENSÃO. PERCENTUAL DA CAPACIDADE LABORATIVA. PAGAMENTO MÊS A MÊS. Se o Reclamante teve sua capacidade laborativa diminuída, a ponto de não poder exercer a profissão praticada na Reclamada ao longo de 26 anos, faz jus a indenização prevista no art. 1.539 do Código Civil de 1916. Contudo, se não está totalmente incapaz para o trabalho a pensão mensal deve ser fixada proporcionalmente a redução da capacidade laborativa. Além do que a Reclamada é empresa com notória capacidade econômica e capital sólido, não justificando o pagamento em parcela única, tampouco a constituição de capital, razão pela qual substituo este pela inclusão do beneficiário em folha de pagamento, nos termos do art. 475-Q, § 2º do CPC. Recurso a que se dá parcial provimento para reduzir a pensão mensal do Reclamante para 50% do valor de seu salário. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. PENSÃO MENSAL. TEMPO
175
TRT/SP - 00526200506902002 - RO - Ac. 6aT 20090291993 - Rel. Ivete Ribeiro - DOE 05/05/2009
79
FINAL DO PAGAMENTO DA PENSÃO. De acordo com o princípio da reparação integral, a vítima deve receber a pensão mensal enquanto viver, pois se 'não fosse o acidente, poderia trabalhar e auferir rendimentos enquanto viva estivesse,' (Oliveira, Sebastião Gerado de. ob. cit. p. 250). Dessa forma, a pensão mensal deferida deverá ser paga ao Reclamante enquanto este viver e não limitada a 70 anos como registrado na r. sentença de origem. Dou provimento.”176
Após a verificação dos requisitos elencados pela Doutrina e Jurisprudência,
deve o julgador fixar, de forma moderada, fixar a justa indenização.
3.5.3. Dano estético
DINIZ conceitua dano estético como sendo:
“[...] toda alteração morfológica do indivíduo, que, além do aleijão, abrange as deformidades ou deformações, marcas e defeitos, ainda que mínimos, e que impliquem sob qualquer aspecto um afeamento da vítima, consistindo numa simples lesão desgastante ou num permanente motivo de exposição ao ridículo ou de complexo de inferioridade, exercendo ou não influência sobre a capacidade laborativa.”177
DIAS entende como:
“[...] consiste na penosa sensação de ofensa, na humilhação perante terceiros, na dor sofrida, enfim, nos efeitos puramente psíquicos e sensoriais experimentados pela vítima do dano, em conseqüência deste, seja provocada pela recordação do defeito ou da lesão, quando não tenha deixado resíduo mais concreto, seja pela atitude de repugnância ou de reação ridícula tomada pelas pessoas que o defrontam.”178
Verifica-se, portanto, que havendo a ofensa a beleza da pessoa humana,
será indenizável através do dano estético.
3.5.3.1. Cumulação com danos morais
Existe uma discussão acerca da cumulação ou não dos danos morais com
danos estéticos.
176
TRT/MT23. RO - 01301.2006.007.23.00-3. Publicado em: 19/06/08. 2ª Turma. Relator: DESEMBARGADORA LEILA CALVO 177 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 2002, p. 73 178
DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994, p. 743.
80
A sua cumulação é defendida por OLIVEIRA, vejamos:
“No entanto, mesmo estando o dano estético compreendido no gênero dano moral, a doutrina e a jurisprudência evoluíram para deferir indenizações distintas quando esses danos forem passíveis de apuração em separado, com causas inconfundíveis. O dano estético está vinculado ao sofrimento pela deformação com seqüelas permanentes, facilmente percebidas, enquanto o dano moral está ligado ao sofrimento e todas as demais conseqüências nefastas provocadas pelo acidente.”179
Em acórdãos unânimes da 3ª Turma do STJ, tem sido proclamado que: "Se há um dano material e outro moral, que podem existir autonomamente, se ambos dão margem à indenização, não se percebe por que isso não deva ocorrer quando os dois se tenham como presentes, ainda que oriundos do mesmo fato. De determinado ato ilícito decorrendo lesão material, esta haverá de ser indenizada. Sendo apenas de natureza moral, igualmente devido o ressarcimento. Quando reunidas, a reparação há de referir-se a ambas. Não há por que cingir-se a uma delas, deixando a outra sem indenização"180
Tanto é verdade que o Superior Tribunal de Justiça recentemente, aprovou a
súmula 387, vejamos:
“Súmula 387 – STJ: É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral.” Re. Min. Fernando Gonçalves, em 26/08/2009.”181
Vejamos a notícia dada pelo site do STJ em 31/08/2009:
“Segunda Seção edita súmula sobre acúmulo de danos estéticos e morais “É possível a acumulação das indenizações de dano estético e moral.” Esse é o teor da Súmula 387, aprovada pela Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo o entendimento firmado, cabe a acumulação de ambos os danos quando, ainda que decorrentes do mesmo fato, é possível a identificação separada de cada um deles. Em um dos recursos que serviu de base para a edição da Súmula 387, o STJ avaliou um pedido de indenização decorrente de acidente de carro em transporte coletivo. Um passageiro perdeu uma das orelhas na colisão e, em conseqüência das lesões sofridas, ficou afastado das atividades profissionais. Segundo o STJ, presente no caso o dano moral e estético, deve o passageiro ser indenizado de forma ampla. Em outro recurso, um empregado sofreu acidente de trabalho e perdeu o antebraço numa máquina de dobra de tecidos. A defesa da empresa condenada a pagar a indenização alegou que o dano estético era uma subcategoria de dano moral, por isso, eram inacumuláveis. “O dano estético subsume-se no dano moral, pelo que não cabe dupla indenização”, alegava. O STJ, no entanto, já seguia o entendimento de que é permitido cumular valores autônomos, um fixado a título de dano moral e outro a título de dano
179 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional. 3. ed. São Paulo: LTr, 2007, p.220. 180
REsp 6.852-RS e REsp 4.236, Rel. Min. EDUARDO RIBEIRO, in Lex-JSTJ 29/190 181 www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=93425
81
estético, derivados do mesmo fato, quando forem passíveis de apuração separada, com causas inconfundíveis. O relator da nova súmula é o ministro Fernando Gonçalves.”182
Resta claro e evidente que os Tribunais, manifestado pelo entendimento do
Superior Tribunal de Justiça, que são cumuláveis as indenizações por danos
estéticos e danos morais.
3.5.3.2 Requisitos para responsabilidade indenizatória
Alguns requisitos, também chamados de requisitos clássicos, já elencados
neste trabalho, são indispensáveis para a caracterização da responsabilidade civil,
ou mesmo o dever de indenizar.
DELGADO explica que “há requisitos essenciais para a responsabilização
empresarial. Sem a conjugação unitária de tais requisitos, não há que se falar
responsabilidade do empregador por qualquer das indenizações acima referidas.”183
E continua, enumerando quais são esses requisitos: “Tais requisitos, em
princípio, são: dano, nexo causal; culpa empresarial.”184
Portanto, para que haja responsabilização, deve-se preencher estes
requisitos.
182 Idem. 183 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 6 ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 624 - 619 184
Idem.
82
3.6. A INTERPRETAÇÃO DO ART. 7, INCISO XXVIII DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL DE 1988.
O art. 7, inciso XXVIII da Constituição Federal, como já afirmado
anteriormente, institui o direito à reparação de danos por acidente do trabalho,
através da caracterização de dolo ou culpa do empregador. A responsabilidade
contida neste inciso, para muitos autores, é entendida como subjetiva; no entanto,
através da interpretação hermenêutica, pode ser entendida como objetiva. A culpa
pode ser presumida, e quem explora um negócio é responsável pelos danos que
seus empregados forem acometidos.
O Código Civil de 2002, em seu artigo 927, parágrafo único, estabelece que
a responsabilidade objetiva se dará nos casos especificados em lei, ou quando a
atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza,
risco para o direito de outrem. Apesar do Código Civil brasileiro de 1916 guarda
fidelidade temática à teoria da culpa, em que o pressuposto da obrigação de
indenizar, ou de reparar o dano, tem conexão direta com o comportamento culposo
ou doloso do agente, através do art. 159, as presunções de culpa também fazem
parte do seu conteúdo, através como em súmulas editadas pelo Supremo Tribunal
Federal e Superior Tribunal de Justiça.185
Pelas razões já declinadas neste trabalho, entende-se que a Constituição
deve tratar a todos de forma igualitária, ou seja, formalmente, não pode haver
distinção entre trabalhadores da iniciativa privada e trabalhadores do serviço público.
Trabalhadores que exercem funções perigosas e altamente nocivas à saúde e à
vida, não são apenas aqueles que exercem atividades nucleares.
185
Súmula 341 e 492 do STF e Súmulas 130 e 132 do STJ.
83
A Constituição deve garantir a todos os cidadãos direitos, sem distinção de
qualquer natureza. O art. 7, inciso XXVIII deve ser interpretado de tal forma que não
atente as diferenças entre trabalhadores da iniciativa privada e trabalhadores do
serviço público.
Invoca-se, pois, a Política Jurídica, que tem como postulados: 1) a
elaboração do Direito, no que se refere à criatividade da norma ou a simples
correção e ajuste do direito vigente; 2) ganho de um mínimo de adesão social que a
faça obedecida e portanto materialmente eficaz, matizada pelo sentimento e idéia do
ético, do legítimo e do útil; 3) as estratégias político jurídicas deverão estar atreladas
à construção de territórios éticos, num claro compromisso com as necessidades
sociais.
A Política Jurídica considera seu compromisso com o justo, o ético, o
legítimo e o necessário (útil), considera as tendências indesejáveis e propõe as
correções adequadas para mudanças de rumo do Direito.
Esta necessidade de interpretação hermenêutica do art. 7, inciso XXVIII, da
Constituição Federal do Brasil, no sentido de que a culpa é presumida quando o
empregado sofre acidente do trabalho, é justa, ética, legítima e necessária, pois
interpretar de forma diferente o referido inciso favorece o sentimento de injustiça e
discriminação.
Urge interpretar a Constituição adequadamente, aplicando-se os princípios
da igualdade e proporcionalidade, para evitar injustiças. A lei deve atender aos
anseios do povo, pois não é estática, é dinâmica. Com o tempo, suas letras, muitas
vezes, tornam-se obsoletas, e não mais alcançam sua função social. Daí espera-se
a perspicácia dos magistrados, que devem interpretá-las com o intuito de distribuir
justiça.
84
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa teve como objetivo verificar a Responsabilidade Civil do
Empregador no Acidente de Trabalho, numa análise legal, doutrinária e
jurisprudencial, o conceito e a extensão do acidente, os danos que com sua
ocorrência podem ser proporcionados ao empregado, os requisitos caracterizadores
da responsabilidade civil e, em especial, como configura-se atualmente a
responsabilidade civil do empregador nos acidentes de trabalho.
A escolha pelo tema abordado justificou-se pelos altos índices de ocorrência
que os acidentes de trabalho ainda ocupam no contexto nacional, e, sobretudo, pela
grande dificuldade que os empregados, vítimas de tais acidentes, enfrentam para
demonstrar a culpabilidade do empregador.
No que se refere ao instituto de Responsabilidade Civil, o Código Civil de
2002, resumiu os pontos mais importantes reclamados pela doutrina e consagrados
pela jurisprudência, em relação à indenização, pelo dano moral, a aplicação da
teoria do risco, e acolhimento do abuso de direito, em nada seguindo do que
determinado pelas inovações, em matéria civil, trazidas pela Constituição Federal de
1988.
Sendo assim, deixou de contemplar matéria tão conflituosa, que se destina à
fixação do valor a ser pago a título de indenização por danos morais, ou indicação
de parâmetros que buscassem a solução desta questão.
Houve um alcance legislativo que já se aplicava, que é o caso da
responsabilidade civil objetiva, supostas em diversas situações, como para relativas
aos direitos do consumidor, entretanto, não apresentou qualquer inovação, nada de
novo às relações jurídicas já praticadas.
85
Com a inclusão da chamada Responsabilidade Civil pelo risco da atividade
em lei (parágrafo único do art. 927 do Código Civil), é de se concluir que o acidente
do trabalho, submergindo empregados na execução de suas funções agregadas
diretamente a atividades consideradas como insalubres ou perigosas, provoca a
responsabilidade objetiva do empregador em reparar os danos daí decorrentes. Isto
porque as condições de trabalhos em situação de risco são reconhecidas pela
própria legislação trabalhista.
Na mesma linha, o infortúnio laboral, que acontece com o empregado nas
atividades econômicas de maior grau de risco, gerará a responsabilidade objetiva do
empregador em reparar os danos. Sendo assim, a situação de risco é
evidentemente reconhecida em lei, no caso a legislação da Seguridade Social. Nas
duas hipóteses, estamos diante da responsabilidade objetiva do empregador pelo
risco da atividade econômica que desenvolve.
Portanto, o que se buscou na presente pesquisa, foi a demonstração no
entendimento majoritário quanto a Responsabilidade Civil do empregador no
acidente de trabalho, que pelo Código Civil de 2002 é objetivo, e que mesmo em
alguns momentos sendo um tema divergente, todos os dias surgem novas
situações, mudando os julgados acerca da matéria.
86
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