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Trabalho de conclusão do curso de Jornalismo, autoria de Juliny Barreto.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE COMUNICAÇÃO, TURISMO E ARTES
Departamento de Comunicação
Curso de Comunicação Social
Habilitação Jornalismo
Juliny Guimarães Barbosa Sá Barreto
#VEMPRARUA:
A apropriação do Instagram na cobertura jornalística das manifestações civis de junho de
2013
João Pessoa
2014
Juliny Guimarães Barbosa Sá Barreto
#VEMPRARUA:
A apropriação do Instagram na cobertura jornalística das manifestações civis de junho de
2013
Monografia apresentada ao Curso de
Comunicação Social da Universidade
Federal da Paraíba, como requisito final
para a obtenção do grau de Bacharel em
Comunicação Social, habilitação em
Jornalismo.
Orientadora: Profa. Mestra Cândida Maria Nobre de Almeida Moraes
João Pessoa
2014
Juliny Guimarães Barbosa Sá Barreto
#VEMPRARUA:
A apropriação do Instagram na cobertura jornalística das manifestações civis de junho de
2013
Monografia apresentada ao Curso de
Comunicação Social da Universidade
Federal da Paraíba, como requisito final
para a obtenção do grau de Bacharel em
Comunicação Social, habilitação em
Jornalismo.
Aprovada em:______/______/ 2014
BANCA EXAMINADORA
-----------------------------------------------------------------------
Profa. Mestra Cândida Nobre
Orientadora
---------------------------------------------------------------------------
Profa. Dra. Suelly Maux
Examinadora
---------------------------------------------------------------------------
Prof. Mestre Ricardo Oliveira
Examinador
Dedico esta conquista à Iva de Almeida Sá Barreto, minha amada avó (In Memorian).
“A minha inspiração são os intelectuais polemistas que jamais se furtaram do papel de
intervenção na sociedade, correndo riscos de errar e acertar”.
(RODRIGO SAVASONI)
AGRADECIMENTOS
Ao Deus amado e supremo que prometeu e cumpriu a promessa, me concedendo
capacidade e inteligência para realizar o meu sonho.
Aos pais mais preciosos que eu poderia ter: Jussara e Cláudio, por todo esforço, cada
lágrima e oração, mas especialmente por me amarem. Essa conquista é de vocês!
Obrigada!
Aos meus irmãos, Matheus e Cláudia, pelos sorrisos e abraços que tanto me motivaram.
Ao meu querido esposo, Cacá Barbosa, pelo presente do seu amor e pela doação de sua
paciência, inteligência e generosidade na construção deste trabalho. Eu te amo!
À minha especial família Guimarães Sá Barreto, em destaque aos meus tios Rêivan e Rusty
Sá Barreto, pelo carinho e apoio incondicional. Eles já sabiam que eu chegaria aqui antes
de todos.
À minha vózinha linda, Iva Barreto (in memorian), que tanto vibrou com a minha
aprovação no vestibular, mas partiu antes que eu concluísse o sonho que, tenho certeza, era
dela também. Pra sempre vou te amar, minha vó!
A todos os geniais mestres que me conduziram durante esses quatro anos de sonho,
realização e muito aprendizado. Em especial à Suelly Maux pela competência e afago.
Minha grande inspiração!
À extraordinária Cândida Nobre, por me permitir o presente de ser sua aluna e encerrar
este ciclo da minha jornada sendo minha orientadora. Muito obrigada!
BARRETO, Juliny Guimarães Barbosa Sá. #VEMPRARUA: A apropriação do Instagramna cobertura jornalística das manifestações civis de junho de 2013. Monografia (Bacharelado de Comunicação, habilitação em Jornalismo). 71 páginas.
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo analisar o Instagram enquanto fenômeno midiáticointerativo, considerando a apropriação de veículos do jornalismo impresso na cobertura deeventos históricos, através de uma plataforma social online, predominantemente baseadaem imagens e palavras-chaves (hashtags). Para tanto, iniciamos com a contextualizaçãodesta nova forma de produção de conteúdo jornalístico compreendendo a assimilação dacibercultura na vida cotidiana da sociedade, a importância da imagem na notícia e aevolução do jornalismo diante das mudanças tecnológicas contemporâneas. Paraproblematizar nossa pesquisa, selecionamos os perfis do Instagram criados pelos jornaisimpressos Folha de São Paulo/SP e Jornal do Commércio/PE, durante a primeira semanadas manifestações civis, que em junho de 2013 mobilizaram milhares de brasileiros on eoffline. Ao final, constatamos que embora sejam veículos com o mesmo fim noticioso,existem claras distinções na atuação dos dois jornais diante de uma plataforma instantânea,que envolve mobilidade, produção de imagem, jornalismo colaborativo e interação.
PALAVRAS-CHAVE: Cibercultura, Instagram, Jornalismo Online, Redes Sociais,
Ciberativismo.
Barreto, Juliny Guimarães Barbosa Sá. # VEMPRARUA: The ownership of the news coverage of the Instagram civil demonstrations June 2013. Monograph (Bachelor of Communication, major in Journalism).71 pages.
ABSTRACT
This study aims to analyze the Instagram while interactive media phenomenon, consideringthe ownership of vehicles of print journalism in coverage of historical events through anonline social platform, predominantly based on images and keywords (hashtags). For this,we started with the contextualization of this new way of producing journalistic contentcomprising the assimilation of cyberculture in the day life of society, the importance ofimage in the news and the evolution of journalism in the face of contemporarytechnological changes. To discuss our research, we selected the profiles created by thenewspapers Folha de São Paulo / SP and Jornal do Commercio / PE at instagram during thefirst week of civil manifestations, which in June 2013 mobilized thousands of Braziliansonline and offline. In the end, we found that although vehicles with the same order news,there are clear distinctions in the performance of the two newspapers before an instantplatform that involving mobility, image production, journalism and collaborativeinteraction.
KEYWORDS: Cyberculture, Instagram, Online Journalism, Social Networking,
cyberactivism.
LISTA DE IMAGENS
Figura 1 - Layout dos dois perfis estudados, capturado em 08 jun. 2014............................50Figura 2 – Dia 17: Primeira postagem do perfil do Jornal do Commércio dia 17. jun de 2014 (Captura de tela via WebStagram)..............................................................................53Figura 3 - Dia 17: Quatro temáticas de imagens publicadas pelo Jornal do Commércio (Captura de tela via WebStagram).......................................................................................54Figura 4 – Dia 17: Primeira postagem do perfil da Folha de São Paulo dia 17. jun de 2014 (Captura de tela via WebStagram).......................................................................................54Figura 5 – Dia 17: Duas temáticas de imagens publicadas pela Folha de São Paulo (Captura de tela via WebStagram).......................................................................................55Figura 6 – Dia 18: Quatro temáticas de imagens publicadas pelo Jornal do Commércio/PE (Captura de tela via WebStagram).......................................................................................56Figura 7 - Dia 18: Duas temáticas de imagens publicadas pelo Jornal Folha de São Paulo/SP (Captura de tela via WebStagram)........................................................................56Figura 8 - Dia 19: Três imagens publicadas pelo Jornal do Commércio/PE (Captura de tela via WebStagram)..................................................................................................................57Figura 9 - Dia 19: Prevalência de comentários da publicação da Folha de São Paulo (Captura de tela via WebStagram).......................................................................................58Figura 10 - Dia 20: Recorde de publicações do Jornal do Commércio, com 48 imagens (Captura de tela via Iconosquare).........................................................................................59Figura 11- Dia 21: Quatro temáticas de imagens publicadas pelo Jornal do Commércio/PE (Captura de tela via WebStagram).......................................................................................60Figura 12 - Gráfico com as temáticas das postagens dos dois perfis analisados.................62Figura 13 - Ausência de legenda que complemente a imagem (Captura de tela WebStagram)........................................................................................................................63Figura 14 - Comentários resposdidos pelo Jornal do Commércio/PE (Captura de tela WebStagram)........................................................................................................................65Figura 15 - Gráfico com as características de comentários nos perfis analisados...............65
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO..............................................................................................................10
2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS................................................................12
3. CIBERCULTURA..........................................................................................................14
4. JORNALISMO ONLINE...............................................................................................19
4.1 O PERFIL DO WEBJORNALISTA................................................................................20
4.2 AS FASES EVOLUTIVAS DO JORNALISMO ONLINE...........................................23
5. JORNALISMO MÓVEL...............................................................................................25
6. JORNALISMO COLABORATIVO.............................................................................29
7. REDES SOCIAIS E JORNALISMO...........................................................................33
8. INSTAGRAM.................................................................................................................36
8.1 FUNCIONALIDADES..................................................................................................37
9. IMAGEM ENQUANTO NOTÍCIA..............................................................................39
10. CIBERATIVISMO.......................................................................................................42
10.1 DAS TELAS PARA AS RUAS: CASES DE CIBERATIVISMO..............................43
10.2 MANIFESTAÇÕES CIVIS #VEMPRARUA.............................................................46
11. ANÁLISE......................................................................................................................50
11.1 FOLHA DE SÃO PAULO E JORNAL DO COMMÉRCIO: UM PEQUENO
HISTÓRICO.........................................................................................................................51
11.1.1 Folha de São Paulo/SP............................................................................................51
11.1.2 Jornal do Commércio/PE.......................................................................................52
11.2 #VEMPRARUA EM PAUTA NO INSTAGRAM......................................................53
11.2.1 A produção de conteúdo.........................................................................................60
11.2.2 Interação: entre comentários e likes......................................................................64
12. CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................66
REFERÊNCIAS.................................................................................................................68
10
1 INTRODUÇÃO
O discurso de que as empresas do século XXI precisam necessariamente estar nas
redes sociais tem sido amplamente difundido quase como uma imposição.
Seduzidas por pesquisas que revelam o crescente número de usuários dessas redes,
especialmente no compartilhamento e pesquisa de opiniões sobre marcas e produtos,
algumas empresas aderem a estas plataformas de relacionamento online, sem ao menos
saberem o que fazer com elas, motivadas apenas pelo fato de que se seus clientes estão lá,
elas também precisam estar.
Nas empresas de comunicação esse cenário não parece muito diferente, basta uma
nova plataforma ganhar relevância entre os usuários para que os produtos jornalísticos se
apressem a fim de garantir o seu lugar à rede.
Com um olhar sobre as novas tendências do jornalismo na internet, a presente
pesquisa propõe entender a atuação de veículos impressos, neste caso específico na rede
social Instagram, enquanto plataforma midiática interativa. Partindo de uma análise
comparativa do processo de produção noticiosa realizada por dois veículos impressos,
Jornal do Commércio/PE e Folha de São Paulo/SP, o estudo busca contribuir para uma
melhor compreensão da cibercultura na produção jornalística, identificando suas
características principais, contribuições, possíveis erros e acertos.
Até o presente momento existem alguns estudos que pensam a construção do
jornalismo online como Ferrari (2010), em Recuero (2009) e Torres (2011) mais
especificamente na atuação do jornalismo nas redes sociais, o jornalismo através de
dispositivos móveis em Silva (2013), ou ainda abordando a comunicação móvel de forma
mais abrangente como em Lemos (2009), porém o problema central que motivou esta
pesquisa foi compreender como o jornalismo impresso se apropria de uma plataforma
essencialmente baseada em imagens, como o Instagram, para noticiar fatos históricos,
como as manifestações civis ocorridas em junho de 2013 em vários estados do Brasil,
utilizando hashtags (palavras-chave) e o mínimo de texto.
O estudo teve uma abordagem realizada através de pesquisa bibliográfica sobre as
temáticas que cercam a questão, além de uma análise qualitativa e comparativa entre os
dois perfis dos jornais selecionados, visando a observação do uso, as escolha das imagens
publicadas e a interatividade com os leitores/usuários.
A seleção dos perfis dos veículos impressos, Jornal do Commércio/PE e Folha de
São Paulo/SP se justifica pela distinção inicialmente observada entre eles, no uso da
11
mesma plataforma. Já o período de análise, de 17 a 22 de junho de 2013, apoia-se no fato
de se tratar da primeira semana de um acontecimento histórico para o Brasil, em que civis
foram às ruas em manifestações simultâneas em diversos estados do país.
Para cumprir o objetivo proposto, resgatamos o surgimento e o desenvolvimento da
cibercultura, além da inserção da internet à prática jornalística, sua influência na forma de
se produzir notícia, interagir com os leitores e resgatar informações e dados, gerando uma
significativa mudança no perfil do jornalista. Buscamos compreender a importância da
imagem enquanto notícia, a utilização das redes sociais e do leitor/usuário na colaboração
ativa e direta na produção jornalística. Apresentamos um histórico dos veículos
selecionados para a análise e as características da plataforma Instagram. E por se tratar da
cobertura online de um fato social, que também partiu das redes para as ruas, de forma
descentralizada e simultânea, apresentamos alguns exemplos de manifestações semelhantes
ao redor do mundo e as suas estruturas enquanto ciberativismo.
Dada à fluidez e rapidez com que ocorrem as mudanças no campo de atuação de
nosso objeto de estudo, destacamos o desafio que permeia a presente pesquisa,
considerando o momento a qual foi desenvolvida e ressaltando a importância de novas
pesquisas para uma melhor e mais profunda compreensão do uso das plataformas sociais
online pelo jornalismo impresso.
12
2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A autora Santaella (2001) descreve a pesquisa como sendo a busca de
conhecimentos por pesquisadores vivos, destacando a própria ciência como algo vivo, que
não se debruça sobre o que já se sabe, mas sim busca, através da pesquisa, compreender o
desconhecido, o novo.
Para Santaella (2001, p.147) os tipos de pesquisas podem ser classificados de
acordo com sua natureza e objetivo, podendo sua natureza ser dividida em trabalhos
científicos originais e não-originais, e seu objetivo classificado em exploratório, descritivo
e explicativo. O objetivo exploratório se concentra no aprimoramento dos conhecimentos e
referenciais do objeto de estudo, servindo como base para as pesquisas. O descritivo não
sofre influência direta do autor, servindo apenas como análise descritiva e classificativa
dos fatos. Já o objetivo explicativo se fundamenta em analisar e revelar os porquês dos
fenômenos. Ao que se refere ao objeto de estudo, a pesquisa pode ser bibliográfica, de
laboratório ou de campo.
Para o desenvolvimento do presente trabalho, a metodologia aplicada foi de
objetivo exploratório e explicativo, estruturando-se através da apropriação crítica da
bibliografia existente; analítica, baseando-se no estudo dos casos selecionados para
desenvolvimento de uma análise interpretativa, resultando em conclusões qualitativas,
considerando o que é proposto ao veículo enquanto produtor de conteúdo noticioso; e
quantitativas em análise aos dados numéricos obtidos na delimitação dos objetos de estudo.
Por se tratar o Instagram, de uma comunicação mediada pela tecnologia digital,
com bases metodológicas ainda incipientes no Brasil, também nos fundamentamos na obra
“Métodos de Pesquisa Para Internet”, que serviu de subsídio para um estudo ainda em
formação:
Procuramos destacar sempre que não existem fórmulas prontas para fazerpesquisa: cada problema, cada método, cada amostragem e tratamento dos dadosdeve ser encarada como uma construção única, que pode servir de ensinamento einspiração, mas nunca como um receituário pronto a ser seguido.(FRAGOSO; RECUERO; AMARAL. 2011.p. 19).
No processo de construção da pesquisa, inicialmente selecionamos o corpus de
análise, no caso, os perfis da plataforma Instagram administrados pelos jornais impressos
Folha de São Paulo/SP e Jornal do Commércio/PE. Em um segundo momento, definimos
de forma empírica, o recorte de um momento histórico na cobertura das publicações no ano
de 2013: a primeira semana das manifestações civis ocorridas entre 17 a 22 de junho.
13
Como etapa seguinte, nos concentramos na comparação entre os perfis do Jornal do
Commércio/PE e da Folha de São Paulo/SP no Instagram, considerando as características
das postagens e a interação gerada por tais publicações junto aos leitores/usuários. E para
uma melhor visualização e captura de imagens ilustrativas, utilizamos sites1 que permitem
acessar o conteúdo do Instagram em computadores desktop.
Por serem raras as publicações que tratam do jornalismo no Instagram, a análise
bibliográfica se fundamentou em obras que permeiam a temática, ainda que não
diretamente, com o objetivo de compreender, através dos estudos já realizados, a
apropriação dos meios de jornalismo impresso à plataforma Instagram, enquanto canal
social midiático e interativo.
Objetivando contribuir para uma parcial conclusão, permitindo a esta pesquisa
servir como indicação para futuros aprofundamentos resgatamos conceitos e visões sobre a
cibercultura através dos estudos dos autores Lévy (1999) e Lemos (2010; 2014). E com o
suporte de autores como Ferrari (2010) e Recuero (2009), analisamos a apropriação de
plataformas sociais online pelo jornalismo impresso. Além de nos debruçarmos sobre
questões como o potencial da imagem enquanto notícia, o jornalismo colaborativo e a
sociedade hiperconectada, a interação em rede entre produtores de conteúdo e sua
audiência, a importância das redes sociais na cobertura e documentação de fatos históricos
e as diferentes abordagens de um mesmo produto a uma mesma plataforma.
1 http://iconosquare.com/ http://web.stagram.com/
14
3 CIBERCULTURA
A evolução da economia mundial, aliada às inovações tecnológicas e científicas,
propiciou a popularização dos computadores domésticos, dando início a uma
informatização da sociedade, entre as décadas de 1980 e 1990, modificando, de forma
complexa, e sem possibilidade de reversão, não apenas determinadas áreas de atuação, mas
a sociedade como um todo.
Seja nas relações profissionais ou na vida cotidiana, em situações triviais como, por
exemplo, enviar e receber notícias de alguém que esteja distante, até algumas décadas
atrás, era necessário todo um processo que se iniciava com a escrita da mensagem,
passando pela postagem, o período de viagem até que finalmente o ciclo fosse concluído
com a entrega da correspondência ao destinatário, dando início a um novo ciclo para que a
mensagem fosse respondida e a comunicação fosse estabelecida. Tempo bem diferente do
que se gasta atualmente para enviar e responder uma mensagem, através de uma rede
social, ou sistemas de mensagens curtas instantâneas SMS (short message service) ou
ainda através de e-mail – já pouco usual, quando se trata de comunicação rápida e
corriqueira – independente se o destinatário está numa sala vizinha ou do outro lado do
mundo.
No processo evolutivo da história, o homem sempre construiu e adaptou técnicas
que o possibilitassem uma melhor atuação diante da realidade natural. Por isso, os
impactos destas tecnologias não podem ser ignorados em outros setores da sociedade.
Novos paradigmas políticos, culturais, econômicos e sociais passaram a integrar a chamada
sociedade da informação, através do surgimento de um ciberespaço, que nos apresentou
uma cultura baseada em rede.
A cibercultura se apresenta como fenômeno paradoxal que desafia a reflexãoteórica, em escala nacional e internacional. Entrelaçada às principaiscaracterísticas da pós-modernidade, ela retém, em seu bojo, aspectos da tradiçãoe da modernidade; reescreve e reescalona a mundialização mercantil da cultura eda informação, ao lhes dar ambiência cibericônica, hipertextual e interativa;vigora como condição sine qua non – embora normalmente pouco notada – daglobalização econômica e financeira; reconfigura e multiplica, radicalmente, osconflitos sociais e as lutas políticas; enraíza-se, cada vez mais na vida cotidiana,particularmente nas megalópoles, metrópoles e cidades médias desenvolvidas,mesmo em contextos e setores nos quais inexiste informatização socialsignificativa ou em atividades, processos e circunstâncias que não exigem autilização direta de objetos infotecnológicos (TRIVINHO, 2009, p.15).
15
A Cibercultura foi inicialmente anunciada por William Gibson, em 1984, no livro
de ficção científica Neuromancer como representação de um espaço virtual composto por
máquinas e usuários conectados através de uma rede.
Para Lemos (2010) a Cibercultura parte do princípio da re-mixagem, um “conjunto
de práticas sociais e comunicacionais de combinações, colagens, cut-up de informação a
partir das tecnologias digitais”, iniciado no pós-modernismo, difundido através da
globalização “em sinergia com a microinformática e o surgimento das redes telemáticas
mundiais” (LEMOS, 2010, p.21) e baseado em três pilares:
1) A liberação do polo de emissão, permitindo aos usuários a liberdade de não
apenas ler, mas também escrever, tornando-os potenciais produtores; 2) O princípio de
conexão em rede, a formação de comunidades de nicho, formando novas potências; 3) A
reconfiguração de formatos midiáticos e práticas, que não representa eliminação, mas
manutenção de dois sistemas em funcionamento, o sistema de massa (somente
consumidor) e o pós-massivo (consumidor e produtor).
Jambeiro (2009, p.21), por sua vez, faz as seguintes enunciações como sendo as
principais características que nos ajudam a compreender a cibercultura: 1) A formação e
desenvolvimento de redes digitais virtuais que interligam grupos e pessoas,
independentemente de tempo e espaço; 2) A reorganização interativa dos processos
políticos, sociais, econômicos, culturais e institucionais - com base em tecnologias
avançadas de informações e comunicações; 3) A reconfiguração da vida cotidiana dos
indivíduos, grupos sociais, governos, empresas e entidades em geral, por efeito da
consolidação e crescente expansão de redes digitais.
Em “A Sociedade em Rede: do Conhecimento à Política”, Castells (2005, p.18)
atenta que estamos diante de uma nova forma de organização social baseada em rede, onde
a tecnologia está para a sociedade contemporânea assim como a eletricidade ou o motor
elétrico estiveram para a sociedade industrial. “As redes de comunicação digital são a
coluna vertebral da sociedade em rede, tal como as redes de potência (ou redes energéticas)
eram as infraestruturas sobre as quais a sociedade industrial foi construída, como
demonstrou o historiador Thomas Hughes”.
Porém, o autor destaca que não é a tecnologia que determina a sociedade, pelo
contrário, a sociedade é que, de acordo com os seus interesses, necessidades e valores
forma a tecnologia, através dos seus usos.
Em “Cibercultura”, o francês Lévy (1999) destaca a diferença entre uma sociedade
condicionada e determinada por suas técnicas, para ele “a emergência do ciberespaço
16
acompanha, traduz e favorece uma evolução geral da civilização”, tornando a sociedade
condicionada às novas tecnologias, porém as novas técnicas não podem ser tidas como
algo determinante na formação da sociedade atual.
Como didática, o autor faz uso de alguns exemplos, como a criação do estribo,
enquanto dispositivo material, que permitiu um desenvolvimento de uma nova forma de
cavalaria, influenciando diretamente nas estruturas políticas e sociais do feudalismo. No
entanto a criação do estribo não pode ser determinada como a causa de todo o sistema
feudal, mas sim uma técnica que possibilitou aos cavaleiros atacar em cima de seus
cavalos, vestidos com suas armaduras, o que condicionou indiretamente todo o sistema
feudal europeu.
Assim como a criação da agricultura irrigada para o “despotismo oriental” na
Mesopotâmia, no Egito e na China, e a prensa de Gutenberg para a crise do catolicismo, o
desenvolvimento da moderna ciência europeia, o crescimento dos ideais iluministas e a
força crescente da opinião popular no século XVIII.
Dizer que a técnica condiciona significa dizer que abre algumas possibilidades,que algumas opções culturais ou sociais não poderiam ser pensadas a sério sem asua presença. Mas muitas possibilidades são abertas, e nem todas aproveitadas.As mesmas técnicas podem integrar-se a conjuntos culturais bastante diferentes.A agricultura irrigada em grande escala talvez tenha favorecido o “despotismooriental” na Mesopotâmia, no Egito e na China mas, por um lado, essas sãocivilizações bastante diferentes e, por outro, a agricultura irrigada por vezesencontrou um lugar em formas sócio-políticas cooperativas ( no Magrebmedieval, por exemplo). (...) Se para uma filosofia mecanicista intransigente, umefeito é determinado por suas causas e poderia ser deduzido a partir delas, osimples bom senso sugere que os fenômenos culturais e sociais não obedecem aesse esquema. (LÉVY, 1999, p.26)
Embora o conhecimento e a informação não sejam novidades desta geração e
sempre estiveram presentes nas sociedades conhecidas historicamente. Notavelmente o
mundo atual está muito mais baseado em uma comunicação mediada por computadores,
possibilitando maior acesso e fluxo de informações.
A novidade se estende na organização social de redes mais flexíveis e adaptáveis,
apoiadas na microeletrônica, nos computadores e na comunicação digital, diferente do
passado, em que as redes restringiam-se à vida privada, enquanto outros segmentos da
sociedade possuíam uma organização vertical e centralizada.
Em termos históricos, as redes eram algo do domínio da vida privada, enquanto omundo da produção, do poder e da guerra estava ocupado por organizaçõesgrandes e verticais, como os estados, as igrejas, os exércitos e as empresas queconseguiam dominar vastos pólos de recursos com um objectivo definido por umautoridade central. As redes de tecnologias digitais permitem a existência de
17
redes que ultrapassem os seus limites históricos. E podem, ao mesmo tempo, serflexíveis e adaptáveis graças à sua capacidade de descentralizar a suaperformance ao longo de uma rede de componentes autónomos, enquanto semantêm capazes de coordenar toda esta actividade descentralizada com apossibilidade de partilhar a tomada de decisões (CASTELLS, 2005, p. 18).
A hiperconexão das redes apresentou à sociedade contemporânea uma estrutura de
rede horizontal, onde qualquer indivíduo se torna um potencial produtor e disseminador de
conteúdo, sem que isso precise passar por filtros ou instituições que autorizem ou
endossem suas publicações. Além disto, o poder de alcance e unificação é outra
característica das redes contemporâneas, destacada por Castells (2005).
A comunicação em rede transcende fronteiras, a sociedade em rede é global, ébaseada em redes globais. Então, a sua lógica chega a países de todo o planeta edifunde-se através do poder integrado nas redes globais de capital, bens,serviços, comunicação, informação, ciência e tecnologia. Aquilo a quechamamos globalização é outra maneira de nos referirmos à sociedade em rede,ainda que de forma mais descritiva e menos analítica do que o conceito desociedade em rede implica (CASTELLS, 2005, p. 18).
Entretanto, apesar de influenciar diretamente toda a sociedade global, tal tecnologia
não chegou igualmente para todos os indivíduos, tornando esse sistema de rede ao mesmo
tempo inclusivo e exclusivo. Já que unifica diferentes povos, facilita o acesso a outras
culturas, porém não contempla a todos de forma igualitária. Além disto, apesar de sua
estrutura democrática e horizontal, em suas práticas a rede possui uma organização
hierárquica, permitindo que um determinado nó (usuário) possua um maior grau de
influência, reputação e autoridade, de acordo com o número de conexões que possui seu
potencial de propagação, entre outros fatores.
As redes são selectivas de acordo com os seus programas específicos, e porqueconseguem, simultaneamente, comunicar e não comunicar, a sociedade em rededifunde-se por todo o mundo, mas não inclui todas as pessoas. De facto, nesteinício de século, ela exclui a maior parte da humanidade, embora toda ahumanidade seja afectada pela sua lógica, e pelas relações de poder queinteragem nas redes globais da organização social (CASTELLS, 2005. p. 18).
Considerando que para ter acesso à rede são necessários computadores ou aparelhos
móveis, como smartphones, notebooks e tablets, e ainda uma conexão à internet, nem
todas as camadas da sociedade têm acesso à tecnologia, ainda que tais aparatos tenham se
popularizado, com preços mais acessíveis.
Certamente, todas as regiões do mundo não participam da computação socialcom tanta intensidade. Um estudo europeu de 2008 indica que os asiáticos estãoem primeiro lugar com mais de 50% dos internautas implicados em pelo menos
18
uma atividade de computação social. Os Estados Unidos seguem com 30% deutilizadores, enquanto os europeus contam apenas com 20%. Mas éevidentemente a tendência geral que importa (LEMOS; LÉVY, 2010, p.12-13).
Essa segregação, além das previsões apocalípticas que davam conta da extinção de
outros meios pela substituição da internet, discussões sobre o futuro da escrita, entre outras
foram apenas algumas das vertentes negativas levantadas no surgimento da cultura
cibernética.
Ao discorrer sobre o cenário de estranhamento pelo qual a nova expressão cultural
foi recebida pela sociedade, Lévy (1999) pondera alertando que nem tudo que advém das
redes digitais é positivo, porém, uma abertura para a compreensão do novo era necessária,
sobretudo para que fosse possível o entendimento das implicações culturais advindas da
cibercultura.
Passadas quase duas décadas da primeira publicação do autor, seus pensamentos
permanecem atuais, considerando que as inovações na cultura em rede são constantes,
especialmente em atividades como o jornalismo que precisa acompanhar a sociedade em
suas permanentes transformações.
4 JORNALISMO ONLINE
19
Desde a invenção de Gutenberg até a reconfiguração das redações com a chegada
dos computadores e outras plataformas digitais, o jornalismo tem conhecido um profundo
processo de mudanças e adaptações, ainda presente aos dias atuais.
Como bem afirmou Ferrari (2010, p.23), “a internet chegou para ficar, não é uma
moda passageira e não haverá retrocesso. Jamais os usuários de e-mail voltarão a escrever
cartas e deslocar-se até o correio para postá-las.” Sendo assim, cabe aos profissionais da
notícia o desafio contínuo de acompanhar as inovações que a comunicação em rede nos
apresenta, a cada momento.
Para além da substituição das velhas máquinas de escrever, a implantação da
informática, sobretudo da internet, nas redações modificou a produção diária da notícia.
Diante do ambiente informacional, a inovação suscitou grandes desafios e debates acerca
de questões essenciais como apuração de informação, ética e credibilidade, já que todo
usuário da rede tornou-se, potencialmente, um produtor de conteúdo. Além das alterações
estruturais que extinguiram funções e instituíram um novo perfil profissional, agora
multimídia.
Dividindo opiniões, tais transformações passaram por um processo gradual, já que
exigia dos profissionais um aprendizado técnico. Para os mais céticos, as novas tecnologias
romperam com um processo mais denso da construção da notícia exigiram uma maior
agilidade, eliminaram uma subjetiva soberania na produção e proporcionaram aos leitores
uma maior abertura de interação, inclusive tornando-os por vezes os próprios produtores
do conteúdo.
Além disso, alterou-se a noção de espaço e tempo, já que com a comunicação em
rede passou a ser possível trabalhar até mesmo de casa, a qualquer hora, sem receber a
mais por isto. E uma nova polivalência passou a ser exigida: o profissional a partir de então
não apenas é responsável por produzir a matéria para o periódico do dia seguinte, mas
também escrever para o portal online do jornal, desenvolver pautas, buscar fontes, produzir
e editar fotos e vídeos, e em alguns casos também produzir conteúdo para as redes sociais
da empresa.
As transformações técnicas e econômicas que atingem as organizações da mídiajornalística ao longo do tempo transformam não apenas a sua organizaçãoinstitucional, suas rotinas de produção e o perfil dos jornalistas, como também anatureza do jornalismo e com isso a identidade sócio-profissional do jornalista.[...] pela necessidade de fornecer o máximo de informações precisas num tempocada vez mais comprimido, o jornalista afasta-se da sua condição de mediador
20
crítico, daquele que relata, explica, interpreta e analisa questões de interessepúblico para a sociedade, contribuindo para a formação da opinião pública. Opadrão que parece se delinear é o de um jornalismo basicamente informativo,prestador de serviços, adaptado a lógica capitalista da corporação, um mediadorde retórica técnico-objetivista (LIMA; BEZERRA, 2010, p. 9).
Para os otimistas, as reconfigurações nas redações potencializaram a produção
jornalística, facilitando a execução das tarefas e favoreceram o ambiente de trabalho.
Baldessar (2001) transcreve um artigo publicado em 1987, pela Revista Imprensa, que
demonstra o encantamento dos profissionais diante do novo, com a chegada da
informatização no jornal O Globo.
Uma louca sinfonia de gritos, gargalhadas, telefones, campainhas reverberavamimpunemente (...) as Olivetti e Remington que não sofriam de arritmia eramdisputadas no tapa (...) e o impiedoso papel carbono tingia mesas, paletós,mangas de camisa, dedos, mãos e rostos menos atentos (...) montanhas de laudasse formavam para qualquer lado que se olhasse (...) hoje as persianasamarrotadas foram substituídas por um moderno sistema de iluminação queinclui um requinte inimaginável: calhas especialmente desenhadas, cujos focosde luz só iluminam as mesas dos terminais, sem reflexos nos olhos ou nas telas(...) um sistema de ar condicionado central acabou com o clima tropical quesufocava (...) e a sinfonia das pretinhas deu lugar a um silêncio cibernético,propiciado pelos 140 terminais e suas 138 teclas (...) e a limpeza, nada demontanhas de papel (BALDESSAR, 2001, p.2).
Mas apesar das transformações estruturais, demonstradas com entusiasmo pela
publicação de Imprensa, por ser o jornalismo uma atividade sujeita à subjetividade de
quem a produz, a chegada do novo acabou por influenciar diretamente também a relação
profissional versus produto final.
4.1 O PERFIL DO WEBJORNALISTA
A internet não apenas transformou o fazer jornalístico, mas também o perfil dos
profissionais da notícia. As redações digitais conectaram os jornalistas ao mundo,
facilitando a coleta de dados, através de informações locais e mundiais em tempo real, com
acesso rápido a referências e arquivos antigos, além de apresentar novas possibilidades de
propagação da notícia através dos aparelhos móveis e plataformas sociais online.
O jornalismo contemporâneo cada vez mais se alimenta de plataformas móveistanto para a produção quanto para a difusão de conteúdo digital. Essa tendênciaestá sendo chamada de jornalismo móvel e se caracteriza pelo uso de dispositivosportáteis digitais como celulares, smartphones, PDAs, pendrive, notebooks,câmeras e gravadores digitais e a utilização de conexões sem fio como WiFi,WiMAX, Bluetooth, GPRS, GPS e outro (SILVA, 2007).
21
Aroso e Correia (2007) atentam para as alterações não só nas diferentes formas de
fazer jornalismo, mas também na transformação no perfil do jornalista, diante das novas
tecnologias nas redações. Citando Pavlik (2001), Aroso e Correia destacam as três
principais mutações no papel do jornalista: 1) O jornalista deixou de ser apenas um
contador de fatos; 2) A expansão e modificação do papel do jornalista como intérprete dos
acontecimentos; 3) O papel central na ligação entre os jornalistas online e a comunidade.
Tais transformações começam – ou deveriam começar – desde a formação dos
profissionais já que no cenário atual uma base teórica sólida e uma boa redação já não
bastam, os profissionais passaram de redatores de notícias, para assumir o papel de
produtores de conteúdo, que não apenas escrevem, mas também pesquisam, filmam,
gravam, editam, fotografam e publicam. Para tanto, necessitam de uma mínima formação
técnica, que vai desde realizar uma simples busca na internet a ir a campo e produzir uma
matéria, com texto, imagem e vídeo.
Embora alguns autores insistam em supervalorizar a teoria, em detrimento da
técnica, e vice e versa, tal dicotomia parece ainda mais descabida nos tempos atuais. Para o
autor Pena a separação é algo superado, já que teoria e prática precisam caminhar juntas.
Minha principal crítica era com relação às próprias perguntas que permearam odebate sobre o ensino de jornalismo, pois não acredito na dicotomia proposta. Oscurrículos dos cursos devem articular teoria e prática e não separá-las em blocosmonoteístas, sem intercâmbio. O aluno não pode ser um mero reprodutor detécnicas, mas também não pode desconhecer as ferramentas que irá utilizar naprofissão. A reflexão acadêmica é fundamental para o desenvolvimento dopensamento crítico, mas deve estar associada à própria produção discente,antenada com sua realidade (PENA, 2002).
Não existe o mais importante, pois as duas formações são essenciais. Em tempos de
cibercultura, para um jornalista já não basta possuir um pensamento crítico e uma boa
redação, se estas habilidades não estiverem aliadas a conhecimentos técnicos que o
permitem produzir para múltiplas plataformas.
Com o advento da internet, a saturação da informação trouxe aos mais céticos uma
discussão sobre um possível fim do jornalismo, enquanto outros, mais otimistas, passaram
a salientar a importância do papel do jornalismo na filtragem neutra e socialmente
responsável do que se é publicado como notícia.
A figura de gatekeeper – aquele que determina o que é notícia – e agenda-setter –
determina a retomada e a permanência de determinados temas nos noticiários – passou a
22
não ser mais exclusividade do jornalismo. Com a extinção da hierarquia da produção de
notícia, não são raras as vezes em que as notícias publicadas ou veiculadas em meios
tradicionais são pautadas ou produzidas pela audiência.
Lemos e Lévy (2010) destacam que até pouco tempo a decisão de tornar alguma
informação pública partia dos clássicos centros editores, que muitas vezes, trabalhando em
um país livre e realizando seu trabalho eticamente, exerciam uma espécie de soft censura,
seja por falta de espaço disponível para determinada notícia ou ainda, na defesa de
interesses espúrios.
Já nos dias atuais as redes possibilitaram que o indivíduo comum tivesse
possibilidade de expressão e publicasse livremente na web, seja como pessoa física ou
instituição, possibilitando ao cibercidadão uma pluralidade de proposições.
Na web, pensamentos são expostos por aqueles que as produzem e as pensam enão por jornalistas obrigados a simplificar ou mesmo caricaturar por falta detempo ou de competência. O novo médium é então particularmente favorável auma superação do espaço público clássico e à liberação do polo da emissão,controlado na economia política clássica por grandes empresas monopolistas. Aprincipal vantagem da Internet (composta tanto por funções massivas como pós-massivas) em relação às mídias da democracia midiática (função unicamentemassiva) da segunda metade do século XX (imprensa, rádio e televisão) é que elapermite a todos se expressarem sem precisar passar pelo poder do jornalista oude outro mediador (LEMOS; LÉVY, 2010, p. 88).
Os autores destacam que o interessante não está na total substituição do sistema
massivo pelo pós-massivo, mas em garantir a amplitude da diversidade proposta pelas
funções do novo sistema, além de proporcionar um enriquecimento da paisagem midiática
contemporânea: “Quem ganha com isso é o cidadão e o que cresce é a liberdade de
produzir, consumir e distribuir informação.” (LEMOS; LÉVY, 2010, p. 89)
O que nos leva a crer que hoje, mais do que guardiões da notícia, os jornalistas se
tornaram intérpretes do fluxo informativo disponível na rede, com a função de moderar,
selecionar, sintetizar, hierarquizar e até personalizar os fatos que se tornarão notícia para
cada audiência de acordo com as suas necessidades.
4.2 AS FASES EVOLUTIVAS DO JORNALISMO ONLINE
23
Também denominada de jornalismo eletrônico, jornalismo digital, jornalismo
cibernético, webjornalismo, jornalismo multimedia, ciberperiodismo e ciberjornalismo a
produção de notícia em ambiente virtual, neste trabalho tratada como jornalismo online,
deu-se inicialmente como meras reproduções do conteúdo produzido e publicado nos
jornais impressos.
O pioneiro foi o norte-americano The Wall Street Journal, que em março de1995 lançou o Personal Journal, veículo entendido pela mídia como sendo “oprimeiro jornal com tiragem de um exemplar”. O princípio básico desse jornalera enviar textos personalizados a telas de computadores. A escolha do conteúdoe a sua formatação seriam feitos pelo próprio assinante, conforme suaspreferências de leituras – depois de escolher suas áreas de interesse, elereceberia, por meio de uma mensagem eletrônica, um portfólio pessoal comnotícias sobre tudo aquilo que escolheu. (FERRARI, 2010, p.24)
Para fins de categorização alguns autores passaram a classificar o jornalismo online
através de fases que, embora não sejam datadas com clareza, fazem alusões às
categorizações e evoluções da própria web. Na primeira fase, iniciada antes da criação web,
os sites de jornalismo eram apenas expositivos e seguiam o modelo transpositivo, ou seja,
apenas replicavam em suas páginas online parte do conteúdo publicado no jornal impresso,
com apenas uma atualização diária. A interação com os leitores era mínima, através de e-
mails ou boletins disponibilizados através de sistemas de distribuição de texto em rede,
como o Gopher2, seguindo o princípio de produção massificada de um para muitos.
Em sua segunda fase, os sites continuavam como versões das publicações
impressas, mas já arriscavam um melhor aproveitamento das potencialidades do meio
digital, explorando características como o uso de links com chamadas para outras matérias
publicadas, além da criação de um espaço para publicações de fatos que ocorriam entre
uma edição e outra, na maioria das vezes chamado de “Plantão” ou “Últimas Notícias”. Na
interação com os leitores, além da utilização do e-mail, fóruns de debates para formatação
de pautas começaram a surgir timidamente.
A fase atual, chamada de Jornalismo 2.0 em alusão ao conceito de Web 2.0, termo
creditado a Tim O´Reilly, entusiasta de movimentos de apoio a código e softwares livres.
Neste atual estágio o usuário abandona a condição de leitor não-participativo, que apenas
absorvia o conteúdo publicado, para assumir a posição de um usuário cada vez mais ativo.
Agora ele não só interage em espaços destinados a comentários, suscitando fóruns de
2 Protocolo de redes de computador, desenvolvido em 1991, pela universidade norte americana Minnesota, com o objetivo de distribuir, procurar e exibir documentos na internet. Perdeu sua popularidade com a chegada do WWW e após ter seu acesso comercializado pela Minnesota.
24
debates, no mesmo ambiente da notícia, como também colabora na produção das notícias,
sendo, em alguns casos, ele mesmo o repórter, colaborando com a produção da notícia
através do envio de fotos, vídeos e informações a redação.
Muito dessa atuação se dá à popularização dos computadores e do acesso à internet.
Mas, principalmente à modernização e a acessibilidade popular dos aparelhos de celulares,
que possibilitam a produção e disseminação rápidas de arquivos audiovisuais, através da
web. Segundo a Anatel, Agência Nacional de Telecomunicações, o Brasil fechou o ano de
2013 com 271,1 milhões de linhas de telefonia móvel ativas, foram 3,55% a mais do que
no ano de 2012, o que significa que em apenas um ano 9,92 milhões de novos celulares
foram habilitados no Brasil3.
Ribas (2005) definiu o jornalismo online em três momentos. Iniciando pelo que
chamou de Fase Linear, em que os jornais eram disponibilizados em sites estáticos
exatamente como iam para bancas, em formato de Portable Document Format (PDF), sem
nenhuma interação entre os textos. Nas redações não existiam profissionais com
conhecimentos específicos para atuar na web, nem iniciativa de modificar as dinâmicas de
trabalho na produção de conteúdo próprio para a internet.
O segundo momento, Ribas (2005) denominou de Fase Hipertextual Básico. Os
sites continuavam a reproduzir o conteúdo do jornal impresso, mas agora já
disponibilizavam alguns links para conteúdo externo, permitindo uma conexão entre
diferentes textos, além de iniciar novas formas de interação com enquetes e chats. Na Fase
Hipertextual Avançado, a autora destaca uma mudança no conteúdo, agora produzido
especificamente pensando para a ambiência virtual. Com recursos próprios, como o uso de
imagens e audiovisuais. Nessa terceira fase se encontram sites e portais de grandes
empresas da comunicação, porém, ainda hoje existem sites de pequenas publicações que
permanecem na primeira fase, devido à falta de recursos para maiores investimentos.
5 JORNALISMO MÓVEL
3Dados disponíveis em: < http://www.ebc.com.br/noticias/brasil/2014/01/brasil-fecha-2013-com-crescimento-de-355-no-numero-de-linhas-de-celular>. Acessados em: 14 maio. 2013
25
Ao tratar de mobilidade, o teórico Lemos (2009) destaca que a cibercultura apenas
potencializou a discussão sobre mídia e espacialidade, já que, segundo o autor, as mídias
de massa sempre exerceram a função de definir, através da produção social, nosso lugar e
identidade no mundo em relação a outros lugares e identidades, além de organizar as
instituições, cidades e sociedade, de forma geral, no que se refere ao espaço habitado.
A questão do espaço sempre esteve muito entrelaçada à cibercultura, especialmente
na fase de sua criação, em que a internet se baseava especialmente no upload de
informações do espaço físico para esse novo espaço eletrônico, formando para alguns
entusiastas um novo espaço, agora virtual e fora do “mundo real”, definição que segundo
Lemos (2009) se configurou equivocada, já que para ele não há nada fora do mundo real.
O teórico defende que as mídias locativas tratam-se apenas de “dispositivos,
sensores e redes digitais sem fio e seus respectivos bancos de dados atentos a lugares e
contextos” (LEMOS, 2009, p.3) que suscitam duas dimensões fundamentais da
cibercultura: localização e mobilidade. Para Lemos (2009), o uso de sensores, dispositivos
e redes sem fio transformam o que antes eram espaços físicos do “mundo real” em
ambientes informacionais.
Entretanto, é inegável que o atual estágio da cibercultura, tratado por Lemos (2009)
pela metáfora de Download, mas também denominado por outros autores como “Internet
das coisas” (ou IoT, sigla da expressão em inglês Internet of Things, em português,
“Internet das Coisas”) causou impacto direto no cotidiano da sociedade, unindo o mundo
físico ao mundo digital e possibilitando a interação dos indivíduos não apenas entre si, mas
também com os objetos que os cercam. No contexto da “Internet das Coisas” os objetos
conectados, são tratados como “coisas”, mas que na prática podem ser desde pessoas que
interagem entre si através da web ou sensores que rastreiam um animal numa fazendo ou
avisam o nível de água de um reservatório, também conectados em rede.
Pesquisas atuais4 realizadas pela consultoria IDC (International Data Corporation)
revelam que o mercado de tecnologias que seguem o princípio da “Internet das coisas” irá
movimentar nos próximos três anos cerca de U$ 7,3 trilhões. Além disso, outro grupo de
consultoria, o Gartner, estima que em apenas seis anos, já existirão de 26 a 30 bilhões de
dispositivos conectados, não apenas ligados à comunicação, mas máquinas inteligentes
como carros com sensores de manutenção, trânsito seguro e direção autônoma. E embora
4 Dados publicados em 18 de junho, disponível em < http://cio.com.br/tecnologia/2014/06/18/como-a-internet-das-coisas-muda-o-cotidiano-das-pessoas-e-empresas/mobile_view/>. Acesso em: 20 jun.2014
26
os números pareçam surpreendentes, o cenário atual já demonstra sua potencial afirmação,
já que, nos dias de hoje, não é incomum ver uma pessoa rodeada de pelo menos quatro ou
cinco aparelhos, dentre eles smartvs, tablets, notebooks, smartphones e computadores
desktop todos conectados à rede.
Com o advento de novas ferramentas e plataformas de produção e publicação, a
relação espaço-tempo na atividade diária jornalística assumiu uma dualidade. Afinal,
embora a tecnologia possibilite que o jornalista realize entrevistas via internet ou por
telefone, sem que precise ir até o local do fato, o espaço físico das redações, aos poucos,
perdeu sua soberania na produção da notícia, e a realização do trabalho jornalístico em
ambientes externos e em tempo real, através de publicação instantânea via web, passou a
ser cada vez mais utilizada pelos veículos de comunicação.
Para o autor e pesquisador Silva (2013), a relação entre o jornalismo e a mobilidade
é não apenas histórica como crescente, aderindo, ao longo do seu percurso, as novas
tecnologias móveis digitais que vão surgindo, o que favorece a prática jornalística, seja na
apuração, produção e distribuição da notícia.
As dimensões da mobilidade (física, informacional, social) fazem parte daconstituição simbólica e histórica da humanidade. Com o surgimento dojornalismo, o desenvolvimento tecnológico e a aproximação com a modernidadeessa construção empírica e imaginativa foi ampliada. E, nos tempos atuais, amobilidade ganha um novo sentido de caráter paradigmático (SILVA, 2013,p.32).
O jornalismo móvel já tem sido utilizado por alguns veículos para a cobertura de
eventos e matérias de campo, através de uma redação itinerária que utiliza celulares
smartphones, notebooks, câmeras digitais e modem com tecnologia 3G para a distribuição
do conteúdo in loco, antes mesmo da equipe de reportagem retornar à redação.
Para o autor esse conjunto de novos fatores, diretamente ligados à hibridação de
diferentes e novas técnicas, impactou inevitavelmente desde o perfil profissional, passando
pela forma de apresentação do conteúdo, até os meios de distribuição ou circulação da
produção jornalística, com “interferência no sentido de redimensionamento das funções
exercidas, da dinâmica das narrativas construídas sob a égide da mobilidade e o surgimento
de novos meios e modos de emissão ou de distribuição das notícias de forma expandida.”
(SILVA, 2013, p.35).
Este jornalismo hiperconectado emerge diante de um processo de convergência e
integração jornalística, apresentado por Silva sob dois aspectos:
27
De um lado temos as potencialidades abertas pelas tecnologias móveis digitaiscom a mobilidade ampliada criando capacidades de transitar imagens e todoobjeto digital de forma instantânea e ubíqua e, por outro lado, a justaposição denovas rotinas que extrapolam as habitualmente estabelecidas exigindo um perfilprofissional diferenciado e “renegociação” com os processos consolidados nacultura jornalística, inclusive dos critérios de noticiabilidade, que passam aconsiderar de forma mais efetiva e flexível à mobilidade como um valor naconstrução da notícia em termos de indução de aspectos de hiperlocalismo e deimediatismo (SILVA, 2013, p.36).
Quanto ao aspecto de novidade, Silva (2013) ressalta que apesar da atmosfera de
inovação, as tecnologias móveis sempre estiveram presentes na trajetória do jornalismo,
desde os novos processos apresentados com a chegada da prensa de Johannes Gutenberg,
no século XV, até a criação do telégrafo no século XIX, primeira tecnologia global, que
reconfigurou o processo de reportagem. Sendo assim, é importante compreender que as
atuais tecnologias que regem o jornalismo contemporâneo não se configuram exatamente
em uma transformação inédita na linha do tempo da prática jornalística, já que as
evoluções sempre existiram.
Ratificando esta ideia, Silva (2013) destaca em suas pesquisas que na história do
jornalismo diversas tecnologias foram sendo integradas a atividade com o objetivo de dar
mais velocidade ao processo de produção do repórter em campo, especialmente em
situações de coberturas de guerra e conflito.
Contextualmente, a introdução de tecnologias no jornalismo não é nova. Anovidade está no modo como se processa a informação através da capacidade dedigitalização, compartilhamento, armazenamento e distribuição. (...) Estasmudanças se intensificam mais ainda na atualidade diante da introdução dasplataformas móveis no contexto jornalístico com sua capacidade de expandir ocomponente mobilidade para a produção e consumo de notícia de forma remotae em movimento. De forma prospectiva, tanto o produtor quanto o consumidorda notícia podem se encontrar em estado de movimento, no seu aspecto físico einformacional, propiciado pelas tecnologias móveis digitais conectadas emsituação ubíqua e pervasiva (SILVA, 2009. p. 72-73).
No Brasil, algumas experiências já foram realizadas por veículos, como no jornal
Extra, do Rio de Janeiro, através de um espaço chamado “repórter 3G” e no portal da Rede
Globo, que na seção “eu-repórter”, incorporou ao seu conteúdo jornalístico conteúdo
produzido e enviado pela audiência. O jornal A Tarde da Bahia, desenvolveu em 2009, sob
o slogan “Aqui você fica sabendo primeiro”, o “Mobi A Tarde”5 um sistema de canais de
alerta, em que o leitor recebe através de mensagens de textos com notícia e informações de
serviço. Seguindo a mesma fórmula, o “Mob NE 10” 6, do Jornal do Commércio/PE
também é um sistema de assinatura de notícias móveis que conta com 24 canais
5 http://mobiatarde.atarde.uol.com.br/6 http://www2.uol.com.br/JC/sites/mobne10/
28
específicos, a escolha do leitor que paga em ambos os serviços, uma taxa de 0,10 centavos,
além de tributos por cada torpedo recebido.
Para Barbosa e Seixas (2013), os dispositivos móveis já podem ser considerados a
quarta tela, em referência à sequência de importância que o cinema, a televisão e o
computador exercem na sociedade. Segundo as autoras, estes novos aparatos tecnológicos
possuem “sua própria gramática, práticas de produção, dinâmicas de consumo e modelos
de negócio específicos” (BARBOSA; SEIXAS, 2013, p.57) e permitem ao jornalismo
novas possibilidades, entre elas uma maior interação com os leitores/usuários na
participação direta da construção da notícia.
6 JORNALISMO COLABORATIVO
Para melhor compreendermos a atual participação dos leitores enquanto “cidadãos-
repórteres” faz-se necessário um retrocesso à gênese do jornalismo considerando a
29
importância que a participação do leitor sempre exerceu na construção da notícia, ao longo
da história.
Até meados do século XIX, o lugar que era ocupado pelos generais responsáveis
por relatar as guerras, com a participação de fontes populares para testemunhar seus bravos
atos ou opinar sobre as estratégias das tropas inimigas, o jornalista assumiu, na passagem
para o século XX, a tarefa de ser o relator dos acontecimentos da sociedade. Atribuiu-se ao
jornalista o papel do observador “inocente” e imparcial à realidade, que noticiava os fatos
não mais para uma minoria de leitores ligados aos acontecimentos, mas para uma
quantidade maior, formada por indivíduos de diferentes interesses. Entretanto, a
participação da opinião pública continuou tendo o seu espaço nos textos, na através de
testemunhos que misturavam-se às palavras do jornalista complementando os relatos em
texto corrido.
Os diálogos com o leitor, portanto, eram travados no espaço da notícia, não haviasido cristalizado o distanciamento do repórter na terceira pessoa discursiva e nafigura da objetividade jornalística. O diálogo direto com o leitor vai se perdercom a cristalização do paradigma da objetividade, que traz para dentro do jornala impessoalidade do jornalista e a figura da fonte, em seu lugar determinado pelaaspa, pela citação jornalística. No século XX o leitor é desterrado da notícia paraum outro espaço, a seção de cartas, onde poderá ser flagrado em uma miríade desituações. (MAROCCO, 2006, p.5)
Referindo-se ao cenário apresentado pelo sociólogo norte-americano William
Sunmer, que analisava o jornalismo praticado nos Estados Unidos no século XIX, Marocco
(2006) considera o leitor de jornal um ser muito mais emocional do que racional, já que na
maioria das vezes estes eram coagidos através de fórmulas, relatos preconceituosos e
mecanismos de controle social desenvolvido pelos veículos de imprensa. Na época, o
jornalismo seguia fórmulas simplórias, onde os folhetins baseavam-se em publicações
sobre amor e romance para interessar às mulheres e temas relacionados a esporte e política
para atrair a atenção dos homens. Os leitores eram tidos como indivíduos desprovidos de
senso crítico, que detinham pouco tempo para refletir as notícias antes de assimilá-las
como verdade, por isso, segundo Marocco (2006), cabia à imprensa em conjunto com o
governo impor limites com a importante missão de manter a rotina e a tradição da
sociedade.
Nos dias atuais, com a popularização da internet, redes sociais e abertura de polo de
emissão, esse poder conservador da imprensa tem passado por transformações
significativas. Atualmente, as possibilidades de interação entre leitores e jornais
30
aumentaram consideravelmente, seja através de comentários, chats e enquetes
disponibilizados pelos próprios veículos em seus portais e redes sociais ou em ambientes
independentes como blogs e grupos de discussão. É o que Lemos e Lévy (2010) trataram
como “liberação da palavra”, que trouxe significativas consequências para a esfera pública
e a constituição da opinião.
A transformação da esfera midiática pela liberação da palavra se dá com osurgimento de funções comunicativas pós-massivas que permitem a qualquerpessoa, e não apenas empresas de comunicação, consumir, produzir e distribuirinformação sob qualquer formato em tempo real para qualquer lugar do mundosem ter que movimentar grandes volumes financeiros de pedir concessão a quemquer que seja. Isso retira das mídias de massa o monopólio na formação daopinião pública e da circulação da informação. Surgem novas mediações e novosagentes, criando tensões políticas que atingem o centro da pólis em sua dimensãonacional e global ( LEMOS; LÉVY, 2010, p.25).
Em “Cultura e artes do pós-humano”, Santaella (2004) atribuiu a relação dos
usuários com as telas, através dos computadores, telecomandos, gravadores de vídeos e
câmeras caseiras à mudança do indivíduo que antes era exclusivamente um consumidor
automático, para um indivíduo mais autônomo, capaz de discriminar e fazer as suas
próprias escolhas. Aliada à apropriação das telas, destacamos a popularização da internet e
dos meios de difusão de conteúdo nessa transformação do leitor em um potencial
colaborador e produtor de conteúdo jornalístico. Primo e Träsel (2006) complementam
essas atribuições elencando a “filosofia hacker”, a insatisfação com os veículos
jornalísticos e uma herança do jornalismo alternativo como possíveis propulsores para o
surgimento do jornalismo colaborativo.
No passado existia uma limitação mais evidente entre quem produzia e quem
consumia a notícia, fosse ela mediada pela televisão, pelo rádio ou pelo jornal impresso.
Com a “apropriação das telas” (SANTAELLA, 2004) essa limitação se tornou cada vez
mais tênue. Por isso não são raras as vezes em que a imagem ou a notícia que estampa os
noticiários recebe os créditos do indivíduo comum, que estava no local certo e na hora
exata, munido de ferramentas que o possibilitaram fazer o papel que seria do repórter.
O barateamento progressivo dos custos de aparelhos smartphones, computadores,
tablets e notebooks e a multiplicação dos serviços de conexão à internet, além da criação
de plataformas como blogs e redes sociais de fácil utilização e acesso gratuito, favoreceram
a interação da audiência no processo de interação, participação e debate das notícias
jornalísticas.
31
Quanto à “filosofia hacker” Primo e Träsel (2006) a definem como o espírito da
época, citando o autor Francisco Santos, em seu artigo “Peripécias de agosto: alguns
episódios da cena hacker”. Os autores explicam que esse comportamento transgressor
Busca um modelo alternativo àquele industrial, sedimentado em torno desegredos industriais, direitos reservados e sistemas produtivos rigidamentehierárquicos. Tal direcionamento defende que o conhecimento deva ser visto nãocomo mercadoria, mas como um bem coletivo que, portanto, precisa ser semprecompartilhado (PRIMO; TRÄSEL 2006).
Já em relação ao descontentamento dos leitores com os meios jornalísticos, devido
à linha editorial adotada, uma determinada matéria ou demais fatores, a possibilidade de
uma participação mais efetiva proporcionou aos leitores uma maior expressão.
A insatisfação com a qualidade do jornalismo entre a audiência — e entre ospróprios jornalistas — não é novidade. Ativistas à direita e à esquerdatradicionalmente denunciam a suposta parcialidade e comprometimento da mídiacom interesses comerciais. Leitores especialistas em determinado campo, poroutro lado, irritam-se com as imprecisões ou erros flagrantes contidos emreportagens. Até agora, estes grupos tinham apenas o instrumento das cartas,telefones ou publicações caseiras para expressar suas opiniões ou publicarmatérias como pensam que estas devam ser. Hoje, podem empreender esforçosindividuais ou coletivos para produzir suas próprias informações (PRIMO;TRASEL 2006).
Produções como o Ohmy News7, criado em 22 de fevereiro de 2000 em meio ao
processo de redemocratização da Coréia do Sul, são exemplos desta mídia colaborativa. O
site, considerado por alguns pesquisadores como o primeiro grande veículo de jornalismo
colaborativo8, incomodou os veículos de jornalismo tradicional e as instituições políticas
por ir contra ao modelo adotado pelos órgãos de publicação, que até então ditavam os
padrões de noticiabilidade e agora eram obrigados a dividir sua audiência com um sistema
democrático, interativo e de produção inversa, partindo da base.
Embora tenha como característica principal a participação do indivíduo comum na
produção jornalística, além de uma ligação cronológica, propomos uma distinção entre a
interação veículo/leitor e o jornalismo colaborativo, também chamado de jornalismo
participativo, jornalismo cidadão, webjornalismo colaborativo e Open Source9. Para o
jornalismo colaborativo, feito em blogs, redes sociais e alguns fóruns, a participação do
7 http://english.ohmynews.com/8 Citamos também, como exemplos de jornalismo colaborativo, o Wikinews, projeto criado em 2004, inspirado no sistema "wiki" e disponível em 27 idiomas; Slashdot, criado em 2007 e disponível apenas em língua inglesa; Examiner, criado em 2008 e conta com mais de 100 mil colaboradores; e no Brasil o Overmundo, criado em 2006, que tem como objetivo dar espaço a produção cultural brasileira que não tem espaço nos meios tradicionais.9 Uma alusão ao processo de abertura de código.
32
não-jornalista é quase ilimitada, na maioria dos casos, não existe uma moderação ou edição
por parte de um jornalista que represente o veículo. Enquanto na interação, seja pela
limitação de espaço ou pela interferência do veículo em editar e selecionar essa
participação do leitor é moderada, não raramente sendo descartada por interesses diversos
ou, no caso de comentários e enquetes, costumeiramente não recebem um feedback dos
veículos, limitando-se a monólogos que se perdem no limbo da rede.
Entendemos o jornalismo colaborativo como aquele que não existiria sem a
participação do não-jornalista, enquanto a interação, ainda que seja relevante para o
jornalismo tradicional, não chega a ser fundamental para que a produção jornalística
aconteça, já que esta conta com o trabalho de agências e profissionais de jornalismo para
sua execução.
7 REDES SOCIAIS E JORNALISMO
Em meados da década de 1990, com a inserção da internet nas redações, o
jornalismo passou a incorporar novas formas de produção, como as edições em tempo real,
que ressaltaram ainda mais a questão do imediatismo, além de submeter novas atribuições
aos profissionais na produção da notícia.
33
Como nova mídia, a internet é responsável pela instituição de novas rotinas deprodução noticiosa. Na verdade, elas se enquadram num contexto maior deredefinição do status profissional do jornalista. Foi assim durante o surgimentodo repórter fotográfico, do rádio-repórter e do repórter cinematográfico. Emtodos esses casos, como mencionado, as características da mídia emergente vãose incorporar às rotinas de produção e difusão da informação (PEREIRA;MORAIS, 2003, p.7).
Com a eclosão das plataformas de redes sociais, um novo desafio foi, aos poucos,
sendo imposto às empresas de jornalismo. Na tentativa de não perder a atenção de seus
leitores, que já estavam cada vez mais conectados, os produtos noticiosos foram
compelidos a se apropriar de tais plataformas, adaptando seus conteúdos a diferentes
formas de produção. Recuero (2009) destaca três dos mais relevantes papéis das redes
sociais no fazer jornalístico: o de fonte produtora de informação, de filtro de informações e
espaços de reverberação dessas informações.
As redes sociais podem produzir, filtrar e reverberar informações que poderiamser consideradas relevantes para seus grupos, baseada em percepções específicasde seus membros, que ativamente engajam-se na busca pelo capital social. Aomesmo tempo em que fazem esse trabalho, as redes podem constituir-se emfocos complementares ao jornalismo, a partir do gatewatching, mas nãopossuem, necessariamente, um compromisso com o social. Assim, as redessociais poderiam apontar a relevância de notícias, ampliando seu alcance,comentando-as e mesmo apontando outras fontes. As redes sociais podemtambém conceder valor para as informações a partir dessa circulação, criandocapital social não apenas para a própria rede, mas igualmente para os atores einstituições envolvidos. Neste sentido, as redes não estão necessariamenteproduzindo notícias, mas produzindo elementos que podem ser noticiados.(RECUERO, 2009, p.13).
Para Rodrigues (2010) as redes sociais trouxeram à tona novos paradigmas na
comunicação que atravessam e obrigam o jornalismo a repensar seu caminho, e reencontrar
seu posicionamento em uma sociedade hiperconectada.
O número de utilizadores de redes como o Twitter e o Facebook permiteequacionar questões fundamentais no jornalismo como o relacionamento com asfontes, a ampliação, valorização e distribuição de conteúdos, a fidelização dosleitores e a velocidade informativa. (RODRIGUES, 2010)
Dentro da perspectiva de compartilhamento rápido e instantâneo, o Twitter, criado
em julho de 2006, mas com popularização no ano seguinte, foi responsável pelas primeiras
investidas do jornalismo em plataformas sociais online, antes disso já existiam os blogs
que demandavam produções mais elaboradas, com textos longos e informação
aprofundada.
Já no Twitter, por ser tratar de uma plataforma de publicações curtas e fluxo
contínuo de produção uma maior mobilidade do conteúdo noticioso, devido à versatilidade
34
da plataforma que permite a publicação e a interatividade, por intermédio de um aparelho
de telefonia móvel com conexão a internet. Porém, apesar de permitir narrativas em tempo
real, para alguns veículos jornalísticos, o Twitter fundamentou-se muito mais como
propagador de links, alavancando os acessos dos portais, do que propriamente um meio de
produção noticiosa.
Criada por desenvolvedores americanos que pretendiam lançar uma espécie de
sistema de SMS (short message service ou serviço de mensagens curtas) provocando os
usuários com a pergunta “o que você está fazendo?” a plataforma ficou conhecida por sua
dinâmica de microblogging, onde os usuários publicam imagens, links e mensagens de até
140 caracteres. E como nas demais redes sociais, permite que os usuários possam conectar-
se a outros usuários, selecionando quais publicações desejam seguir.
Sua estrutura possibilita outras formas de interação, como o envio de mensagens
privada e o recurso de bloqueio de usuários que não se deseja seguir ou ser seguido. O
Twitter também foi a plataforma pioneira a usar um sistema de curadoria através de
palavras-chave, que agrupa mensagens através de hashtags, formadas por termos
acompanhados pelo símbolo # (jogo da velha), as hashtags mais utilizadas são elencadas
em tempo real no menu Trending Topics, em tradução literal seria tópicos tendência, que
ficam disponíveis na barra lateral do microblog, e determinam o assunto de maior
repercussão naquele momento.
Torres (2011) alerta que o uso de novas tecnologias com intuito de maximizar o
alcance do jornalismo e a qualidade da notícia produzida nesses meios requer prudência e
capacitação. E ressalta que o modismo do uso de redes sociais no jornalismo tem levado
muitos veículos a fazerem mau uso das redes, seja por não compreenderem e explorarem
suas potencialidades, seja cometendo erros crassos.
Exemplo [de apropriação indevida de redes sociais] é o uso massivo do Twitterpara a cobertura ou criação de pautas. Qualquer veículo deve ter uma na redesocial de microblogs para transmitir notícias de última hora ou realizar umacobertura frenética e em tempo real, porém sem jamais se esquecer dapublicação de uma reportagem mais completa posteriormente. Ele [o Twitter]seria capaz de demonstrar uma instantaneidade na divulgação de certos eventosinformando o mais rápido possível o público, pilares fundamentais do jornalismoe que não podem ser esquecidos no digital. (TORRES, 2011)
O autor ainda classifica negativo o uso do Twitter como fonte, referindo-se a
veículos que substituem fontes “reais” por postagens de usuários, como complemento de
matérias. Já que, para Torres (2011), não há uma certificação de confiabilidade da
35
identidade dos usuários que fazem uso da rede. Da mesma forma, o autor critica a
utilização de postagens de personalidades como base fundamental para matérias,
classificando este tipo de jornalismo simplório demais.
Um jornalismo que apenas está no mundo online não é um jornalismo digital,assim como um jornalismo que apenas utiliza as ferramentas das mídias sociaissem qualquer aplicação funcional ou planejamento não é um jornalismo pensadopara os usuários. Não devemos confundir mecanismos com estratégia. Deturparconceitos não refaz seu significado. O jornalismo digital deve usar o maiornúmero possível de meios para chegar ao público, porém com qualidadeeditorial, e não apenas de forma quantitativa e exibicionista (TORRES, 2011).
A plataforma Facebook, criada pelo americano Mark Zuckerberg em 2004,
rapidamente conquistou internautas em todo o mundo, em 2012 já eram um bilhão de
usuários10. A rede agrega em um único espaço grande parte das possibilidades de interação
já conhecidas das redes sociais, como o compartilhamento instantâneo de textos, imagens e
vídeos, além de recursos como: participar de grupos e páginas de interesse do usuário,
agregar “amigos” à sua rede, acompanhar suas postagens e interagir, através de
comentários e “likes”, no Brasil também chamado de “curtidas”.11
Diante de tantos recursos, não demorou muito para que a rede passasse de espaço
particular de interação entre amigos e fosse apropriada por empresas, dentre elas as
jornalísticas, como um canal de potencialidade e difusão de conteúdo.
No jornalismo a utilização do Facebook não foge muito da lógica do Twitter. Os
veículos utilizam as fanpages, páginas dedicadas a fãs ou seguidores de terminado assunto,
empresa ou pessoa, para divulgar links de matérias, vídeos, fotos e notícias de ultima hora,
além de receberem interação dos leitores, através de comentários. Muito embora essa
interação nem sempre seja correspondida por parte dos veículos, através de resposta, um
dos inúmeros desafios propostos à utilização das redes sociais pelo jornalismo.
No Instagram, por se tratar essencialmente de uma plataforma imagética, seu uso no
jornalismo enquanto meio de informação ainda é um universo a ser explorado. Sua adesão
avança timidamente entre as publicações tradicionais, cercada de questionamentos e
incertezas.
O jornalismo moderno vive hoje uma profunda e tardia crise. As novasconfigurações digitais, plataformas, ferramentas, fixas, móveis, deprocessamento e circulação de notícias colocam-nos diante de novos desafios aomesmo tempo em que abalam fortemente a instituição jornalística nos modos em
10 Dados da Veja: http://veja.abril.com.br/noticia/vida-digital/facebook-uma-rede-de-1-bilhao-de-usuarios11 Neste trabalho adotaremos a versão em inglês, por já ter se tornado termo usual entre os usuários.
36
que ela foi construída ao longo dos últimos 160 anos. E é nesse ambiente que seinstala a crise (HENN, 2011, p.2).
Embora as redes sociais tenham sido criadas para uso pessoal, com a proposta de
compartilhar o cotidiano dos usuários com sua rede de contatos, é notável que as principais
plataformas têm sido adotadas por empresas, incluindo as de comunicação, com diferentes
intenções, entre elas divulgar seus produtos e serviços. Porém, para este estudo nos
limitaremos a analisar a rede Instagram enquanto plataforma de disseminação de conteúdo
jornalístico.
8 INSTAGRAM
Criado como aplicativo gratuito de aparelhos móveis smartphones, o Instagram
acabou conquistando status de rede social ao possibilitar que seus usuários, ao realizar
registros fotográficos com seus dispositivos móveis, aplicassem filtros e efeitos,
compartilhassem, em tempo real através da internet, no próprio no perfil do aplicativo e em
outras redes sociais como Facebook, Twitter, Foursquare e Tumblr, além de comentar e
curtir as imagens publicadas pelos seus amigos.
37
Projetado e desenvolvido pelo norte-americano Kevin Systrom e pelo brasileiro
Mike Krieger, em 06 de outubro de 2010, a primeira versão do Instagram era inicialmente
de uso exclusivo de dispositivos móveis Apple iOS (iPhones, iPad, iPod), sendo somente
lançado para dispositivos com sistema Android em abril de 2012.
A ideia inicial do Instagram surgiu da simplificação de outro aplicativo, o Burbn,
uma rede social que reunia diversas funções, entre elas permitir que o usuário
compartilhasse sua localização, além de fotos, vídeos e mensagens. Projeto não muito
diferente do que se tornou hoje o Instagram, que no começo com as simplificações foi
lançado baseado apenas em fotografias, em formato quadrado, que remetem câmeras como
Kodak Instamatic e Polaroid.
Ainda em 2010, no mês de novembro, o portal americano de notícias "Business
Insider"12 declarou que o Instagram estaria em crescente ascensão conquistando uma série
de investimentos avaliados em US$ 20 milhões. Não demorou muito para que a equipe de
desenvolvedores do aplicativo duplicasse, fazendo-o alcançar com menos de três meses de
mercado a marca de 1 milhão de usuários. Um ano depois, o aplicativo figurava na lista
dos favoritos de 2011 elencados pela Apple, sendo considerado o aplicativo do ano entre
os mais baixados em seu serviço download. Em abril de 2012, o Instagram foi vendido por
1 bilhão de dólares para a empresa Facebook. Em junho de 2013, o aplicativo já reunia 130
milhões 13de usuários e atualizou suas funções permitindo agora a produção de vídeos, com
até 15 segundos de duração.
8.1 FUNCIONALIDADES
Para instalar o aplicativo do Instagram em um aparelho móvel o usuário precisa ir à
central aplicativos para downloads em seu sistema operacional, seja ele iOS, com a Apple
Store ou o Android, com a Play Store. Com o aplicativo instalado, o usuário realiza um
cadastro rápido, e pode começar a adicionar amigos à sua rede, através do botão “seguir”.
Esta ação permite que o usuário receba em seu perfil as atualizações de seus amigos,
podendo interagir com comentários, “likes” ao clicar no ícone em formato de coração e
12 Fonte: http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2012/04/entenda-curta-historia-do-instagram-comprado-pelo-facebook.html13 Disponível em: < http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2013/06/facebook-lanca-video-no-instagram-1.html>. Acesso em: 28 jun.2014
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com auxílio de aplicativos auxiliares, republicar a postagem de outro usuário, ação
denominada “regram”. Para os usuários que optarem por uma maior privacidade ao
conteúdo disponibilizado em seu perfil, é possível configurar sua conta, para que uma
autorização prévia seja feita antes que novos perfis passem a segui-lo.
Por ser agregado ao Facebook e ao Gmail14, o usuário pode visualizar quais de seus
amigos possuem ambos os serviços. Além disso, o aplicativo possui a funcionalidade
“Explorar” que permite a busca por usuários, hashtags e as fotos classificadas como mais
populares no momento, através de likes e comentários.
Para publicar na rede, o usuário pode tirar uma foto instantânea com a câmera do
dispositivo móvel ou utilizar alguma imagem já disponível na galeria de seu aparelho. São
disponibilizadas mais de 20 possibilidades de filtros e efeitos, dos mais básicos aos mais
elaborados como recortar a imagem ou ofuscar parte da imagem, resaltando apenas um
determinado ponto da foto, acrescentar legendas, localização através do mecanismo de
busca do Foursquare15 e compartilhar com os contatos através do Facebook, Flickr16,
Twitter, Tumblr17.
Além de imagens estáticas, em junho de 2013 o Instagram estendeu seu suporte
para a publicação de vídeos curtos, com duração máxima de 15 segundos e 13 opções de
filtros desenvolvidos para a nova função.
Outra funcionalidade já utilizada no Twitter, mas que se popularizou com o
Instagram, foi o uso das hashtags, palavras-chave precedidas pelo símbolo “#”. Através
deste comando, as palavras tornam-se links e funcionam como agregador de publicações,
possibilitando o acompanhamento e disseminação de um tema específico.
14 Serviço de email do Google.15 Rede social e de microblog que permite ao usuário indicar onde se encontra e procurar por contatos que estejam próximo a esse local. Disponível em:< http://pt.wikipedia.org/wiki/Foursquare>.Acesso em: 28 jun.2014.16 Site de hospedagem e partilha de imagens fotográficas e arquivos gráficos que permitir novas maneiras de organizar arquivos de fotos e vídeos. Disponível em:< http://pt.wikipedia.org/wiki/Flickr >, Acesso em: 28 jun.201417Plataforma de blog que permite aos usuários publicarem textos, imagens, vídeos, links, citações e áudio. Disponível em:< http://pt.wikipedia.org/wiki/Tumblr >, Acesso em: 28 jun.2014
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9 IMAGEM ENQUANTO NOTÍCIA
Criada como expressão artística, a fotografia configurou-se em uma melhor
aproximação do real frente aos retratos obtidos através da pintura. Seus primeiros
experimentos, ainda com instrumentos artesanais, são datados de 1828, e os relatados
destacam o francês Joseph Nicéphore Niépce como o primeiro a fazer um registro de
obtenção de imagem através da luz, ainda em preto e branco.
40
Após a criação das primeiras câmeras fotográficas industriais, em 1839, a fotografia
passou a ser utilizada pelos folhetins noticiosos, com o intuito de chamar a atenção dos
leitores e possibilitar uma visão mais ampla do mundo, já que antes da utilização de
fotografias no jornalismo, ao cidadão comum só era possível visualizar e tomar
conhecimento dos fatos que aconteciam próximo de seu campo de visão, na rua, bairro ou
cidade em que morava.
Porém, a fotografia não exerceu um papel fundamental apenas para noticiar fatos
jornalísticos atuais, em seu livro “Sobre Fotografia”, Sontag (2004) destaca que, desde a
sua invenção até os dias de hoje, praticamente tudo na história foi registrado em imagens
fotográficas, o que possibilitou as novas gerações um olhar ao passado. Para SONTAG
(2004, p.13), ao nos apresentar um novo código visual, a fotografia modificou e ampliou “a
nossa ideia sobre o que vale a pena olhar e sobre o que temos direito de olhar”.
Exaltando o poder documental e testemunhal da fotografia, a autora destaca a
potencialidade da imagem estática enquanto captação de mundo, comparando-a com as
imagens audiovisuais, da televisão e do cinema.
Filmes e programas de televisão iluminam paredes, reluzem e se apagam; mas,com fotos, a imagem é também um objeto, leve, de produção barata, fácil detransportar, de acumular, de armazenar.(…) As fotos são, de fato, experiênciacapturada, e a câmera é o braço ideal da consciência, em sua disposiçãoaquisitiva. Fotografar é apropriar-se da coisa fotografada. Significa pôr a simesmo em determinada relação com o mundo, semelhante ao conhecimento - e,portanto, ao poder. (SONTAG, 2004, p.13-14)
Para SONTAG (2004), no quesito memória, as fotografias se sobressaem às
imagens em movimento por serem um nítido registro do tempo, e não uma passagem
fluida. Já o fluxo de imagens da televisão, a cada nova inserção, acaba por cancelar a
imagem anterior. Enquanto na fotografia, por se tratar de um recorte privilegiado e
materializado em um objeto, há a possibilidade das pessoas guardarem e olharem sempre
que desejarem. A autora exemplifica o poder das imagens históricas, citando a fotografia
símbolo da Guerra do Vietnã, feita pelo fotógrafo Huynh Cong 'Nick' Ut, da Associated
Presque, que não apenas percorreu o mundo, mas comoveu a todos se perpetuando até os
dias de hoje, quarenta e dois anos depois.
Fotos como a que esteve na primeira página de muitos jornais do mundo em1972 - uma criança sulvietnamita nua, que acabará de ser atingida por napalmamericano, correndo por uma estrada em direção a câmera, com braços abertos,gritando de dor - provavelmente contribuíram mais para aumentar o repúdio
41
público contra a guerra do que cem horas de barbaridades exibidas pelatelevisão. (SONTAG, 2004, p.28)
Enquanto elemento noticiosa a fotografia, ainda que atualmente não mais de forma
tangível, assume um caráter indicial, já que comprova a ocorrência do fato ali registrado,
fornecendo testemunhos e tornando-se um elemento comprobatório. No fotojornalismo,
quase sempre a imagem é feita sem o consentimento do elemento fotografado, é o que
SONTAG (2004, p.14) classifica de “apropriar-se da coisa fotografada”, não permitindo
reação, posicionamento e intervenção. Características fundamentais para um
fotojornalismo que, segundo Sontag, busca registrar o real e reproduzi-lo em imagens que
conservem intactas suas evidências.
Em “A fotografia entre documento e expressão”, Santos (2014) critica a ideia de
fotografia como registro fiel da realidade, para ela, na relação entre documentação e
expressão, a fotografia está muito mais próxima de uma transformação e atualização do
real, ou ainda da “criação de um novo real fotográfico” (SANTOS, 2014, p.2), do que a
reprodução da fiel realidade. Já que a fotografia-documento, assim como qualquer outra
produção documental está sujeita à intencionalidade e subjetividade de quem a produz, que
filtra e altera a imagem a ser capturada desde o momento em que escolhe para onde
apontar sua câmera.
Entende-se como o fotojornalismo o registro de um determinado momento que se
deseja noticiar.
“Quando se fala de fotojornalismo fala-se de fotos de acontecimentos ou
problemáticas de ‘interesse jornalístico’ (ou seja, que têm suficiente valor
noticioso para interessarem ao grande público), mesmo quando não reguladas
pelos critérios dominantes de newsmaking18.” (SOUSA, 2011, p. 13-14).
Na primeira fase do jornalismo online, os portais de notícias raramente utilizavam
imagens, já que o formato das imagens era pesado para a conexão e os padrões de
armazenamento da época, dificultando o acesso em computadores domésticos, também
não existiam ainda softwares específicos para publicações com imagens e os profissionais
ainda estavam se adaptando aos novos recursos da web.
Atualmente, seja no impresso ou no digital, a fotografia exerce um papel de
conteúdo tão importante quanto o texto escrito. Porém, para pensadores mais críticos as
influências da fotografia publicitária e as intervenções de programas de edição tornaram o18 Teoria que pressupõe que as notícias são como são porque a rotina industrial de produção assim as determina. Disponível em < http://teoriadojornalismouniube.blogspot.com.br/2010/11/teoria-do-newsmaking.html>. Acesso em: 14. Jun.2014
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fotojornalismo mais distante de seu propósito inicial, tornando cada vez mais difícil
delimitar o que exatamente é uma fotografia jornalística diante de uma sociedade cada vez
mais imagética e consumista. Porém, seguindo a corrente otimista, Sontag (2004) defende
o princípio do real da imagem, ainda que a fotografia passe por manipulações tecnológicas
ou não, propositais ou não. Opinião compartilhada por Sousa (2011) que destaca essa
diversidade de estilos fotográficos como um fator favorável ao jornalismo.
As várias tendências e estilos conviventes na expressão fotojornalística acabampor enriquecer o fotojornalismo, ao multiplicarem os pontos de vista através dosquais a realidade significante pode ser abordada. Mesmo quando se fabrica umarealidade visual virtual, a imagem obtida pode ter valor informativo ouexplicativo acrescentado. O consumidor da fotografia terá é de ser informadosobre o facto de estar perante uma manipulação imagética, sobretudo quandoesta não for evidente. Há que considerar, por isso, que, ocasionalmente, oficcional imaginado pode ter mais potencial de geração de conhecimento sobre oreal do que as abordagens visuais icônicas da realidade (SOUSA, 2011, p.18).
A relação entre experiência e informação é outro aspecto levantado pelos
estudiosos no fotojornalismo contemporâneo. Citando Bejamim (1993), Rosa (2013)
destaca que mesmo diante de tantas formas de compartilhamento de imagens noticiosas
estamos mais pobres quanto a experiências comunicáveis, sentenciada pelo jornalismo
atual a segundo plano, em detrimento da informação.
Rosa (2013) reconhece que um determinado fato não precisa necessariamente afetar
uma comunidade de leitores para acontecer, já que muitos fatos acontecem e não são
noticiados. Porém, quando se trata de acontecimentos jornalísticos a autora destaca que o
impacto é necessário. Seja na manchete da notícia ou, como estamos tratando no momento,
através de uma imagem. A autora conclui definindo que “(...) não há acontecimento
jornalístico sem um sujeito que seja afetado” (ROSA, 2013, p. 55) ainda que não caiba ao
jornalismo o mito de presenciar e noticiar tudo.
10 CIBERATIVISMO
Diferentes formas de organização social em favor de uma causa única sempre
existiram, mas com o advento da comunicação mediada pela internet essas militâncias
conquistaram uma atuação ainda mais abrangente, com mobilizações virais e globais.
Entende-se por ciberativismo, um desdobramento do ativismo, formado por grupos
politicamente motivados que encontraram na internet um espaço e um meio de atuação.
Para Malini e Antoun (2013), autores do livro “A internet e a rua: ciberativismo e
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mobilização nas redes sociais”, o início do ciberativismo pode ser datado em 1984, ano em
que a rede global de computadores foi nomeada Protocolo Internet. Segundo os autores, a
data remete ao surgimento do ciberespaço, onde o ciberativismo desponta como sinônimo
de ações e mobilizações coletivas coordenadas através da comunicação por meio da rede
interativa.
Já no Brasil o início do ciberativismo ocorreu em meados dos anos 1990, com a
popularização dos computadores domésticos e acesso à internet. Desde então, para os
grupos de militância política, o auxílio de hackers 19e o uso da internet assumiram um papel
importante no vazamento e difusão de informações sobre questões sociais de regimes
políticos fechados, críticas a poderes econômicos e militares, alcançando cada vez mais
pessoas e servindo também como base para articulações de movimentos feministas,
estudantis, entre outros.
O aparecimento do ciberativismo – numa versão hacker e comunitária – rompecom o próprio ativismo social que se realizava até então no campo dacomunicação social. Na época, a “guerrilha midiática” acontecia com a produçãode contrainformação usando o meio da radiodifusão (rádio, especialmente). Coma invenção do ciberespaço, a guerra de informação ocorre de modo subterrâneo,entre aqueles que possuem centrais de comunicação mediadas por computador.Em síntese: os hackers de narrativas fazem dos grupos de discussão umaestrutura de mídia que permite a toda informação vazar nas mais distintascomunidades virtuais; ao mesmo tempo, que peritos em programaçãocomputacional – os hackers de código – não param de inventar linhas decomando que tornam a Internet mais livre, num período em que a ideologiaproprietária em torno dos direitos autorais se intensifica entre osdesenvolvedores de tecnologia. (MALINI; ANTOUN, 2013, p.20-21)
Porém, embora tenha sido muito difundido através de lutas revolucionárias e
quedas de regimes ditatoriais, o ciberativismo não se limita apenas a confrontos políticos,
atualmente a web oferece inúmeros canais e ferramentas que possibilitam abraçar uma
causa, apenas com um clique. Desde doar 20 mudas de árvores para a restauração da Mata
Atlântica, a participar ou criar 21 petições online ou votar e opinar 22sobre projetos de lei
que tramitam no Congresso Nacional.
Mas, embora o ciberativismo faça uso da internet para uma conscientização em
massa, muitos destes movimentos não se limitam à tela do computador, chegam as ruas e
tomam proporções globais.
19 Pessoa com grandes conhecimentos de informática e programação, que se dedica a encontrar falha em sistemas e redes computacionais. Fonte: Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, consultado em 20 jun.2014.20 http://www.clickarvore.com.br//index.php21 http://www.avaaz.org/po/22 http://www.votenaweb.com.br/
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10.1 DAS TELAS PARA AS RUAS: CASOS DE CIBERATIVISMO
A revolução digital possibilitou “(...) uma mobilização global político-afetiva nas
ruas e nas redes” (MALINI; ANTOUN, 2013, p.14), dando origem a manifestações em
rede mais horizontais, com causas cada vez mais transnacionais e de mobilização que
ultrapassa fronteiras políticas, culturais e geográficas.
Em 2009, o Movimento Verde ou Mar Verde, ocorrido no Irã em protesto à
suspeita eleição fraudada do presidente Mahmoud Ahmadinejad, que derrotou o candidato
reformista, Mir Hussein Mussavi, foi um dos primeiros grandes movimentos ciberativistas
que destacou o uso das redes sociais, em especial a plataforma Twitter. Iniciadas em 13 de
junho de 2009, as manifestações propagaram-se via web e chegaram às ruas não apenas da
capital Teerã e de outras cidades do Irã, mas também a outros países.
Medidas enérgicas, como o bloqueio ao acesso da plataforma Facebook, do envio
de mensagens SMS (Short Message Service) e da utilização das redes de celulares, além da
proibição da permanência de jornalistas estrangeiros foram tomadas pelas autoridades para
tentar camuflar os fatos que ocorriam no país, entretanto, manifestantes exibiam
exaustivamente para o mundo, através de mensagens do Twitter e vídeos postados na
plataforma audiovisual YouTube, a sucessão de protestos e os violentos confrontos com a
polícia local.
Igualmente ao que aconteceu, em dezembro de 2010, no movimento que ficou
conhecido como Primavera Árabe, ocorrido no Oriente Médio e Norte da África. As
manifestações envolveram a Tunísia e o Egito, causaram guerras civis na Líbia e na Síria,
grandes tensões na Argélia, Bahrein, Djibuti, Iraque, Jordânia, Omã e Iêmen, além de
protestos de menor proporção no Kuwait, Líbano, Mauritânia, Marrocos, Arábia Saudita,
Sudão e Saara Ocidental.
O movimento teve início com o protesto suicida de um jovem tunisiano, que ateou
fogo ao próprio corpo em autoimolação ao regime ditatorial do presidente Zine el Abidine
Ben Ali, há 23 anos no poder, além das péssimas condições de vida da população e gerou
uma onda de revoluções e manifestações civis, apoiadas pelo exército.
Segundo a Dubai School of Government, instituição de pesquisa da cidade mais
populosa dos Emirados Árabes Unidos, o uso das redes sociais foi fundamental para a
articulação e realização da Primavera Árabe. Na Tunísia, onde as manifestações se
45
iniciaram, o Facebook teve 200 mil23 novos cadastro nos primeiros dois meses de
manifestações.
Informações, vídeos e imagens publicados na rede por civis anônimos alcançavam
o mundo e eram amplamente utilizadas pela imprensa mundial, já que o acesso a
informações oficiais era cada vez mais restrito. Jornalistas locais também passaram a
utilizar as redes sociais como forma de narrar instantaneamente os acontecimentos, como a
jornalista egípcia Mona Eltahawy que após revelar ter sido presa e violentada pela Força de
Segurança Central do Egito, passou a ser seguida por mais de 100 mil pessoas em seu
perfil no Twitter. E embora a maioria dos governos tenha bloqueado alguns serviços da
web, na tentativa de conter os protestos, os manifestantes burlavam as ações encontrando
outras formas de enviar à rede, através do celular, vídeos e mensagens de textos.
Considerada a maior grande onda democrática do mundo árabe no século XXI, a
Primavera Árabe resultou na derrubada de três chefes de estado e a renúncia de reeleição
de outros líderes.
Em 2011, após uma passeata ocorrida em 15 de maio, teve início na Espanha, o
movimento 15M. Protestando contra as políticas implementadas pelo governo espanhol
para combater a crise econômica no país, milhares de pessoas se mobilizaram com meses
de antecedência, e saíram às ruas em passeatas simultâneas em várias cidades da Espanha.
Na capital Madrid, após a manifestação, um pequeno grupo acampou na praça
“Puerta del Sol”, principal da cidade, com o objetivo de forçar o governo a dar alguma
resposta ao movimento, que respondeu despejando os manifestantes da praça na manhã
seguinte. Mas, o ato de truculência do governo, no sentido de dissipar a manifestação, teve
resultado contrário. Milhares de pessoas começaram a ocupar a praça em solidariedade aos
manifestantes expulsos e lá permaneceram por três semanas, em um acampamento que
crescia e se organizava a cada dia, ocupando quase toda a praça com espaços para ações e
debates.
Com o passar dos dias a manifestação se espalhou pelas redes sociais e ganhou
mais adeptos, tornando-se manchete em toda imprensa nacional e internacional, inclusive
ofuscando as notícias sobre as eleições locais e regionais que aconteceriam naquele mesmo
mês. Em mais uma tentativa de desarticular o movimento, o governo despejou o
acampamento e desocupou a praça, mas os manifestantes mantiveram um ponto de
informação no local e se espalharam pelos bairros de Madrid e por todas as cidades da
23 Dados disponíveis em:< http://operamundi.uol.com.br/conteudo/noticias/18943/redes+sociais+foram+o+combustivel+para+as+revolucoes+no+mundo+arabe.shtml>. Acesso em: 29 jun.2014.
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Espanha. O movimento foi adotado inclusive por cidadãos espanhóis residentes em outras
localidades, que se uniram em protesto diante das embaixadas espanholas em países como
França, Argentina, Bélgica, Grécia, entre outros. Com isso, o 15M se tornou referência de
novas lutas globais e descentralizadas, que começam nas redes sociais e se ganham as ruas
com movimentos que vão além da ocupação do espaço público, já que organizava suas
atividades e assembléias nos bairros e marchas em várias cidades do país.
Também em 2011, os Estados Unidos da América tornou-se notícia com o
movimento que ficou conhecido como Occupy Wall Street (OWS) e resultou em uma série
de protestos que começou lutando contra a indevida relação de influência das empresas no
governo americano, mas seguiu acrescentando à pauta de protestos problemas como a
desigualdade econômica e social do país e a ganância e corrupção atribuída ao governo
americano.
O movimento começou com a ocupação do centro financeiro de Nova York, em 11
de setembro e seguiu com uma sequência de protestos que envolveram não apenas ações
online, com a utilização das redes sociais, como ações offline em diversas cidades
americanas. Nos meses seguintes, manifestantes de diferentes idades, classes sociais e
etnias foram as ruas de Los Angeles, Portland, Boston, Chicago e São Francisco, além de
cidades da Europa e ao redor do mundo para manifestarem sua insatisfação. Igualmente ao
que aconteceu no 15M, da Espanha, manifestantes acamparam na praça Zuccotti, no centro
de Manhattan, como plataforma de apoio para as ações. No entanto, com ordem judicial
expedida a pedido do prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, uma ação policial
desmontou o acampamento alegando ser a serviço da higiene e segurança do local.
Além das motivações sociais, todos estes movimentos tiveram em comum a forma
de mobilização, através da comunicação mediada por computadores e aparelhos móveis de
acesso à internet. Com uma forte presença de jovens, mas também de famílias inteiras, os
protestos utilizando redes sociais marcaram uma nova realidade de mobilização com três
características marcantes: 1) a ausência de uma liderança chefiada por instituições ou
organização específica; 2) motivações por temas específicos, mas com abertura para pautas
múltiplas e flexíveis; 3) desestruturação de competências e papéis normativos.
Reformulações que inspiraram as manifestações do movimento #VEMPRARUA, também
a favor de melhorias dos serviços públicos e combate à corrupção no Brasil.
10.2 MANIFESTAÇÕES CIVIS #VEMPRARUA
47
Em “A cultura da participação”, Shirky (2011) relata um caso ocorrido em 2003
quando a Coréia do Sul proibiu o livre comércio de carne norte-americana no país, após
notícias de contaminação da carne bovina produzida nos Estados Unidos, pela doença que
ficou conhecida como “doença da vaca louca” (encefalopatia espongiforme bovina). Por se
tratar do terceiro maior mercado de exportação dos EUA, tal proibição enfraqueceu a
relação entre os dois países, até que cinco anos depois, em junho de 2008, os presidentes
da Coréia do Sul Lee Myung-bak e dos EUA George W. Bush, firmaram um acordo em
que a Coréia voltaria a consumir a carne bovina dos Estados Unidos.
A população, contrária ao acordo, foi às ruas em protesto. Vigílias foram realizadas
no Cheonggyecheon, uma área de recreação na capital Seul, onde os manifestantes
permaneceram por dias. A manifestação reuniu famílias inteiras, mães com seus bebês,
porém o que chamou atenção é que não se tratava de um ato organizado por grupos
políticos ou trabalhadores, as manifestações reuniram especialmente jovens e muitas
garotas adolescentes que nem ao menos tinha idade para votar. Quando uma das “garotas
velas”, como ficaram conhecidas, foi questionada por que estava ali, ela respondeu que a
sua motivação era uma famosa banda de garotos sul coreanos.
Porém, se engana quem pensa que a “Dong Bang Shin Ki” havia recrutado suas fãs
para defenderem a causa, pelo contrário, na verdade os músicos nunca chegaram a incitar
qualquer espécie de envolvimento público ou político por parte de seus fãs, mas através de
um fórum produzido e administrado pelos fãs, no site oficial da banda, as garotas ficaram
sabendo da decisão política e se organizaram para irem às ruas protestar.
O website da DBSK forneceu um local e uma razão para que a juventudecoreana se reunisse às centenas de milhares. Agora, as conversas efêmeras queacontecem no pátio da escola e na cantina adquirem dois aspectos antesreservados aos profissionais de mídia: acessibilidade e permanência.Acessibilidade significa que outras pessoas podem ler o que alguém escreve, epermanência se refere à duração de determinado texto escrito. Tanto aacessibilidade quanto a permanência aumentam quando as pessoas se conectam àinternet, e a Coréia do Sul é a nação mais conectada do mundo. O residentemédio de Seul tem acesso a redes de comunicação melhores, mais rápidas emuito mais disponíveis, tanto em seus computadores como em seus telefonescelulares, do que um cidadão médio de Londres, Paris ou Nova York (SHIRKY,2011, p.34).
Para Shirky (2011) nem a mídia tradicional, muito menos a equipe de comunicação
da banda DBSK jamais imaginariam questionar as jovens leitores/fãs sobre o que
pensavam a respeito da política governamental de importação de alimentos. Porém, a força
que essas meninas, unidas por um fator comum -a banda- mas, sobretudo em torno de uma
48
rede de relacionamento fez com que as manifestações ganhassem o apoio popular e
chegassem até o governo. Este, inicialmente, tentou conter os manifestantes através de
repressões violentas, que logo foram cessadas, ao ponto do presidente obrigar todo o seu
ministério a pedir demissão, negociar restrições adicionais a toda a carne bovina importada
dos Estados Unidos e ir à TV, em rede nacional, desculpar-se, não apenas pela forma
truculenta que a polícia tratou os manifestantes, mas também por ter tomado a decisão de
reabrir o mercado da carne bovina norte-americana sem uma prévia consulta popular.
No Brasil, as manifestações civis ocorridas em 2013 tiveram início na cidade de
São Paulo, em 6 de junho. Motivada inicialmente pela indignação dos usuários frente ao
aumento das tarifas de ônibus na capital paulista, as vozes de protesto se proliferaram nas
redes sociais, alcançando e mobilizando todo o país, agora em protesto a tantos outros
problemas do país que incluía educação, segurança, saúde, entre tantas outras pautas.
Embora não tivesse um foco específico, assim como a manifestação coreana, e demais
protestos já citados neste trabalho, como Primavera Árabe e Occupy Wall Street, o
movimento civil de 2013 levou às ruas brasileiras muitos jovens e famílias, convocados
pelas redes sociais, como Facebook e Twitter, sem a presença de uma liderança definida,
nem envolvimento partidário ou sindical, como destaca Silveira (2013) ao descrever as
manifestações contemporâneas:
Sem grandes líderes, sem carros de som, organizadas por microarticuladores,com o apoio de coletivos culturais, radicais, ambientais, nerds, hackers, rappers,jovens da periferia, entre tantos outros mobilizadores, os protestos desafiam acompreensão daqueles que debochavam dos “militantes de sofá”, “agitadores doTwitter”. Pois então, estamos assistindo um movimento distribuído em que os“sofás” desceram para as ruas (SILVEIRA, 2013. p.9).
Os protestos civis de junho de 2013 apresentaram ao Brasil uma mobilização
diferente das que já haviam ocorrido na história do país, mas não tiveram um título
específico, como os movimentos “Diretas Já”, de 1983 e 1984 e “Caras-pintadas”, de 1992.
Denominadas de “Manifestações dos 20 centavos”, “Manifestações de Junho”, “Jornadas
de junho”, neste trabalho as manifestações civis de junho de 2013 serão tratadas como
#VEMPRARUA, slogan publicitários de uma campanha da Fiat, que se tornou uma das
hashtags mais usadas para denominar as manifestações nas redes sociais, e nesta pesquisa,
faz uma alusão ao ato de ir para as ruas, com smartphones nas mãos e registrar a história
através de imagens e relatos, em plataformas como o Instagram.
49
Em 17 de junho, cerca de 250 mil24 pessoas – alguns portais noticiaram 300 mil –
foram às ruas nas principais capitais e cidades do interior do país. Desta vez a pauta não
era somente o transporte público, mas os gastos com a realização da Copa do Mundo no
Brasil e questões relacionadas à saúde, educação, segurança e corrupção. Na semana de 17
a 22 de junho ocorreram manifestações diárias em diversos estados do Brasil, além de
outros países, como Portugal, Canadá e Alemanha.
Munidos de cartazes e smartphones, os manifestantes não só foram às ruas fazer
história com suas caras pintadas e palavras de ordem, como também ajudaram a registrar
esse capítulo do país, publicando em seus blogs (diários virtuais online) e redes sociais
cada momento das manifestações. Relatos de manifestantes, registros fotográficos e
audiovisuais realizados por civis eram disseminados nas redes sociais, através de aparelhos
móveis smartphones conectados à internet. E em alguns casos, estas publicações “não
oficiais” divergiam das versões, tidas oficiais, publicadas nos tradicionais meios de massa,
que em alguns momentos, pareciam querer desqualificar o movimento, provavelmente para
atender a uma determinada ideologia editorial.
Em resposta às manifestações o Governo brasileiro tomou algumas medidas25, tais
como redução de tarifa de transporte em 17 cidades, dentre elas Rio de Janeiro e São
Paulo, o cancelamento de verba pública de R$43 milhões para a Copa das Confederações e
Copa Mundial de Futebol.
Um levantamento26 da agência digital Today, divulgado pelo portal da revista
Exame, mostrou que apenas no dia 17 de junho, os protestos geraram 548.944 publicações
nas principais redes sociais, dentre elas o Twitter, que por se tratar de uma plataforma de
notícias curtas, teve 88% destas publicações, somando quase 484 mil postagens, enquanto
no Facebook foram 60 mil mensagens referentes às manifestações no Brasil. As hashtags
mais utilizadas nas redes sociais foram #VEMPRARUA, com 715,61627 mil postagens
somente no Instagram e #ogiganteacordou, também slogan publicitário, este referente ao
whisky Johnnie Walker, com 481,16028 mil menções no Instagram, além de #protestosp,
#mudabrasil e #semviolencia.
24 http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/geral/noticia/2013/06/grafico-os-numeros-dos-protestos-4173629.html. Acesso em: 04 fev.2014.25 http://g1.globo.com/brasil/linha-tempo-manifestacoes-2013/platb/26 http://exame.abril.com.br/tecnologia/noticias/protestos-geram-mais-de-550-mil-publicacoes-em-redes-sociais27 http://web.stagram.com/search/vemprarua28 http://web.stagram.com/search/ogiganteacordou
50
11 #VEMPRARUA NO INSTAGRAM: um jornalismo de imagens e hashtags
As manifestações do movimento #VEMPRARUA, saíram das redes online e se
propagaram no ambiente offline, tomando as ruas em um evento grandioso, tanto para
história do país quanto para a comunicação. Em meio a um cenário social inédito, rodeado
por novas formas de produção e propagação de conteúdo, via web, se viu diante do desafio
de uma cobertura extraordinária e histórica que atendesse aos anseios de uma audiência
cada vez mais conectada e ágil.
Durante a primeira semana das manifestações, que ocorreu de 17 a 22 de junho de
2013, os veículos de imprensa escrita, televisiva e radiofônica estiveram nas ruas,
51
produzindo matérias, cobrindo passeatas, questionando manifestantes, autoridades e, claro,
registrando imagens que viajaram o mundo. Mas como será que esta cobertura jornalística
se deu através das redes sociais, em especial no aplicativo Instagram, aqui tratado como
plataforma móvel de produção e propagação de conteúdo online que tem, entre suas
principais características, a instantaneidade?
Para melhor realizarmos este estudo exploratório, selecionamos dois veículos de
jornalismo impresso de atuação no Instagram: Folha de São Paulo/SP e Jornal do
Commércio/PE.
Elementos da
Imagem:
01 – Número
de
publicações.
02 – Números
de perfis seguidores
03 - Números de perfis que são seguidos
04 – Descrição dos perfis.
05 – Publicações da Folha.
Figura 1 - Layout dos dois perfis estudados, capturado em 08 jun. 2014.Fonte: Print capturado dos perfis @folhadespaulo e @jc_imagem
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06- Publicações do Jornal do Commércio.
11.1 FOLHA DE SÃO PAULO E JORNAL DO COMMÉRCIO: UM PEQUENO
HISTÓRICO
Fundados no século XX, com apenas dois anos de diferença entre si, os jornais
impressos Folha de São Paulo, do estado de São Paulo e Jornal do Commércio, de
Pernambuco são semelhantes não apenas na relevância que conquistaram em âmbito
nacional, mas também por serem considerados dois dos principais jornais na utilização dos
recursos disponíveis na internet. Entretanto, apresentam distinções marcantes, não apenas
por estarem localizados em diferentes regiões do país, mas por adotarem diferentes perfis
tanto nas versões impressas, quanto nas plataformas online.
11.1.1 Folha de São Paulo/SP
Responsável pela maior circulação do Brasil, de acordo com dados apresentados
pelo Instituto Verificador de Circulação (IVC)29, o jornal Folha de São Paulo foi fundado
em 1921. Em 9 de julho de 1995, o jornal passou a atuar na internet com a “Folha Web”.
Um projeto de baixíssimo investimento, que não contava com muitos atrativos
tecnológicos e se limitava a reproduzir integralmente o conteúdo veiculado no jornal
impresso das editorias de Ciências e Tecnologia, além da coluna semanal NetVox e
informações institucionais do jornal, sem atualizações nos finais de semana. Em abril do
ano seguinte, o site transformou-se no “Universo Online”, hoje denominado UOL e
incorporou ao portal o site da Folha de São Paulo30.
Nas redes sociais está presente no Facebook, através de uma fanpage31 que reúne
mais de 4,3 milhões32 de leitores, e publica diariamente, de hora em hora, com divulgação
do link do conteúdo publicado em seu site. No Twitter, o periódico possui uma conta
geral, @folha_com, com mais de um milhão de seguidores, além de contas de menor
acesso, específicas de algumas editorias. As publicações são feitas minuto a minuto, com
links e chamadas que convidam os seguidores a acessarem o site e ler a matéria na íntegra.
29 Dados de pesquisa realizada em 2013, disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2013/01/1219600-circulacao-de-jornais-cresce-no-pais-folha-assume-a-lideranca.shtml . Acesso em: 04 fev. 2014.30 http://www.folha.uol.com.br/31 http://www.facebook.com/folhadesp32 Números coletados na fanpage da Folha no Facebook, em e 08 Jun. 2014.
53
Já o perfil no Instagram33 teve sua primeira imagem publicada em 17 de agosto de 2011 e
hoje já soma mais de 3 mil publicações, acompanhadas por cerca de 27 mil seguidores.
11.1.2 Jornal do Commércio/PE
Criado em 3 de abril de 1919 e premiado em importantes eventos destinados ao
setor, como: Prêmio Esso Regional Nordeste e Vladimir Herzog, além de premiações
internacionais, tais quais: Prêmio Desertificação: Uma Ameaça Global, conferido pela
ONU, o da International Library of Photography e vários reconhecimentos no News Page
Design, que elege as melhores capas de jornais do mundo.
O Jornal do Commércio de Pernambuco integra o Sistema Jornal do Commércio,
do qual fazem parte o jornal impresso, o portal NE10, a Rádio Jornal AM780, a TV Jornal
(afiliada do SBT), a rádio JC News FM 90,3 e a agência de fotografia JC Imagens.
Em seu site34 são publicadas além das notícias que estampam as manchetes do
impresso, informações em tempo real, com recursos de áudio e vídeo, além de colunas
escritas exclusivamente para o site e a versão impressa, em arquivo digital, disponível para
os assinantes.
Nas redes sociais, o Jornal do Commércio/PE atua no Facebook, através da
fanpage35, onde publica, para os mais de 227 mil seguidores36, links das principais
publicações do portal JC Online. Já no Instagram, o jornal mantém dois perfis, um
destinado ao caderno Cidades37, criado em maio de 2013, mas inativo desde julho do
mesmo ano, com apenas 141 seguidores e 51 imagens publicadas, e o perfil tido como
“oficial”38, administrado pela agência JC Imagem, em atividade desde agosto de 2011,
onde já foram publicadas mais de 5 mil fotos, seguidas por 6.94539 leitores/usuários.
11.2 #VEMPRARUA EM PAUTA NO INSTAGRAM
No perfil do Instagram administrado pela agência de imagens do Jornal do
Commércio/PE, a segunda-feira, 17 de junho de 2013, primeiro dia da semana que as
33 http://www.instagram.com/folhadespaulo34 http://jconline.ne10.uol.com.br35 http://www.facebook.com/JCJornaldoCommercio36 Números coletados na fanpage do Jornal do Commércio no Facebook, em 8. jun. 2014.37 http://www.instagram.com/jc_cidades38 http://www.instagram.com/jc_imagem39 Números coletados em e 8. Jun de 2014.
54
manifestações #VEMPRARUA aconteceram em diversas cidades do Brasil, começou às
7h28 da manhã, não muito diferente dos dias comuns. A primeira publicação trouxe a capa
do jornal do dia com a manchete “Entre shows e críticas”, referindo-se à Copa das
Confederações que ocorria no Brasil naquele período. A publicação foi acompanhada pelas
hashtags #brasil #jornaldocommercio #pernambuco #jcimagem #frontpage e #capa e gerou
48 likes, porém sem nenhuma interação dos usuários/leitores através de comentários.
Figura 2 – Dia 17: Primeira postagem do perfil do Jornal do Commércio dia 17. jun de 2014 Fonte: captura de tela via WebStagram.
Durante o dia, a sequência de 25 imagens publicadas demonstrava que não se
tratava de uma segunda-feira comum para o país, embora a prevalência de publicações
tenha sido para os acontecimentos esportivos. Foram 13 referências à Copa das
Confederações, 02 com bastidores da redação, registrando a visita de profissionais da
empresa de fotografia Canon, 01 charge com a ilustração do técnico da Seleção brasileira
de futebol, também referente à Copa das Confederações, e 09 imagens registrando as
manifestações do movimento #VEMPRARUA, com as hashtags #vempraruarecife
#ogiganteacordou #revoltadovinagre #protestope #occupyrecife #passelivre #changebrazil.
Destas imagens, 06 eram regram, ou seja, republicações de imagens inicialmente postadas
por leitores e pelo perfil @jc_cidades, pertencente à editoria Cidades do próprio Jornal do
Commércio/PE.
Das imagens postadas no dia, a última gerou maior relevância em número de likes.
Publicada às 23h32, a foto montagem de uma multidão nas ruas e a frase “jogaram Mentos
55
na geração Coca-cola”, fazendo alusão ao efeito explosivo causado na mistura desses dois
ingredientes, registrou 339 likes e 02 comentários favoráveis à publicação: “Eh massa ver
um jornal divulgar a luta real!!” (sic), disse um dos leitores/usuários.
Com uma atuação consideravelmente menor, comparada a do Jornal do
Commércio/PE, a cobertura do perfil da Folha de São Paulo/SP começou às 2h48 da
manhã, com a capa da versão impressa do dia, acompanhada das hashtags #frontpage
#primeirapagina #newspaper #folhasp #journalism #jornalismo #sampa #saopaulo.
Figura 3 - Dia 17: Quatro temáticas de imagens publicadas pelo Jornal do Commércio.Fonte: captura de tela via WebStagram.
Figura 4 – Dia 17: Primeira postagem do perfil da Folha de São Paulo dia 17. jun de 2014 Fonte: captura de tela via WebStagram.
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Na manchete, uma referência às manifestações que já ocorriam em São Paulo, há
alguns dias: “Governo de SP pede e terá reunião com manifestantes hoje”, gerando 185
likes e 03 comentários, sendo 02 negativos ao discurso do jornal e 01 positivo, referindo-se
a uma coluna opinativa do jornal.
No mesmo dia 17, o perfil da Folha de São Paulo/SP publicou mais 04 imagens,
sendo 01 com os bastidores da redação, retratando parte da equipe preparada com máscaras
e capacetes para a cobertura das manifestações. A imagem gerou 935 likes e 18
comentários, 6 neutros40, 3 positivos e 08 deles com teor negativo, questionando a ironia da
imagem: “Depois dessa, folha de S.Paulo perdeu moral comigo! Estamos falando de um
assunto sério, não há nada de engraçado nisso! #imprensalixo” (sic), comentou uma
usuária/leitora.
As
outras 03 imagens foram fotos aéreas com dois pontos de São Paulo, a Av. Faria Lima e o
Largo do Batata e um ponto do Rio, a Av. Rio Branco todos tomados por manifestantes, as
03 fotografias juntas somaram 4.466 likes e 73 comentários.
A terça-feira, dia 18, começou às 7h23 da manhã no Instagram do Jornal do
Commércio/PE, com a primeira postagem que trazia mais uma vez a capa do jornal
impresso do dia e a chamada “Protestos se espalham”, motivando 97 likes e 01 comentário
estrangeiro, atestando a chamada de capa: “Os apoyamos por Turquía! #occupyrecife”(sic).
Ao final do dia foram 04 imagens publicadas, sendo 01 charge referente à Copa das
Confederações, 01 com o recorte da seção “Repórter JC” da edição impressa, em que um
leitor critica o acesso dos torcedores à Arena Pernambuco, local dos jogos da Copa das
Confederações e 02 fotomontagens mostrando diferentes ambientes da Arena Pernambuco,
40 Entendendo “comentários neutros” aqueles que não fazem referência direta a cobertura realizada pelos jornais.
Figura 5 – Dia 17: Duas temáticas de imagens publicadas pela Folha de São Paulo Fonte: captura de tela via WebStagram.
57
como a sala de coletiva e o centro de imprensa, totalizando 05 fotos publicadas, mas
nenhuma imagem com referência direta às manifestações #VEMPRARUA.
O perfil da Folha de São Paulo/SP na terça-feira, dia 18 de junho, limitou-se a
postar apenas 02 imagens, sendo 01 mostrando os bastidores da redação, com o registro da
equipe da editoria de cotidiano reunida e 01 com a capa da edição impressa do dia.
A publicação causou polêmica pela manchete: “Milhares vão às ruas ‘contra tudo’;
grupos atingem palácios”, com 653 likes e 29 comentários que se dividiam entre positivos
e negativos. “‘Contra tudo’ bem irônico esse. Que na verdade quer dizer contra nada. O
povo quer o fim de toda a palhaçada feita por governo, mídia vendida e grandes
corporações... quando voces vão deixar isso claro no discurso de vocês?”(sic), disse uma
das leitoras/usuárias contrariando opiniões positivas, como esta: “#folhasp está de parabéns
nesta cobertura! Jornalismo de primeira linha!”(sic).
Figura 6 – Dia 18: Quatro temáticas de imagens publicadas pelo Jornal do Commércio/PE Fonte: captura de tela via WebStagram.
Figura 7 - Dia 18: Duas temáticas de imagens publicadas pelo Jornal Folha de São Paulo/SP Fonte: captura de tela via WebStagram.
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As publicações do dia 19, terceiro dia de manifestações simultâneas no país,
começaram para o Jornal do Commércio/PE com a capa do dia e a manchete “Saques e
violência em meio a apelos de paz”, que resultou em 63 likes e 03 comentários, sendo um
deles feito pelo próprio perfil do jornal com as hashtags #vempraruarecife
#ogiganteacordou #revoltadovinagre #protestope #occupyrecife #passelivre #changebrazil
e 02 opiniões referentes ao momento histórico e os atos de vandalismo: “Porque será que
acredito haver uma grande quantidade de 'vândalos contratados?” (sic); “Nao ofuscou o
grito histórico... O retrato do Pais é a sociedade quem faz....”(sic), diziam as
leitoras/usuárias.
As demais imagens do dia, no total 03 postagens, resumiram-se em 01 charge, que
fazia referência às manifestações com a descrição: “Democracia Representativa”, 01
regram com a imagem de um dos fotógrafos do jornal na cobertura da Copa das
Confederações e 01 imagem conclamando a participação dos leitores/usuários na produção
e envio de imagens das manifestações, através da hashtag #InstaJCnasRuas.
A iniciativa caracteriza o interesse, por parte do Jornal do Commércio/PE, em
promover o jornalismo colaborativo, inclusive, com a criação de um caderno especial em
sua versão impressa para publicar, com os devidos créditos, as melhores imagens enviadas.
Para o perfil da Folha de São Paulo/SP, a quarta-feira, 19 de junho de 2013, se
resumiu a 02 publicações. Ambas registrando 02 capas da versão impressa do jornal, sendo
01 da edição nacional e 01 da edição distribuída no estado de São Paulo.
A manchete de capa da edição nacional trazia o seguinte destaque “Ato em SP tem
ataque à prefeitura, à mídia, saques a lojas e depredação”, já a edição local trouxe a
chamada “Ato em SP tem ataque à prefeitura, saque e vandalismo; PM tarda a agir”, sendo
Figura 8 - Dia 19: Três imagens publicadas pelo Jornal do Commércio/PE Fonte: captura de tela via WebStagram.
59
esta última a que gerou maior interação dos leitores/usuários com 204 likes e 41
comentários, registrando o maior índice de rejeição com todos os comentários negativos a
postagem, como mostra a Figura 10.
Figura 09 - Dia 19: Publicações do perfil da Folha de São PauloFonte: captura de tela via WebStagram.
60
A
A quinta-feira, dia 20 de junho, marcou o recorde de publicações na cobertura do
Jornal do Commércio/PE no Instagram. Ao todo foram 48 imagens, a começar pela capa da
versão impressa com a chamada “Nas ruas e em paz”, além de 01 charge, 01 imagem
referente à Copa das Confederações e 02 publicações iguais, em horários diferentes, com a
imagem de convite à iniciativa colaborativa #InstaJCnasRuas e as demais 44 imagens
referentes às manifestações #VEMPRARUA, destacadas na Figura 10, em que a maioria é
creditada à Arnaldo Carvalho, fotógrafo e editor do Jornal do Commércio/PE.
No total, as publicações geraram 8.976 likes e 174 comentários, sendo a imagem de
uma manifestante entregando rosas brancas a uma policial a que maior repercutiu com 548
interações em likes e 27 em comentários, todos em elogio a imagem.
Figura 10 - Dia 19: Prevalência de comentários da publicação da Folha de São PauloFonte: captura de tela via WebStagram.
61
Em contrapartida, mesmo se tratando de um jornal de cobertura e circulação
nacional (e internacional) a quinta-feira, dia 20 de junho, para o perfil da Folha de São
Paulo/SP novamente se resumiu na capa do impresso do dia, que trazia em sua chamada
“PROTESTOS DE RUA DERRUBAM TARIFA”, assim, em letras garrafais. A
publicação gerou 601 likes e 17 comentários, 04 deles questionando o discurso do jornal.
“Uai, mas ontem não era só vandalismo, violência ?!? Folha malandra! #falhadesp” (sic);
“A Folha vai mudar o discurso agora?”(sic), diziam os leitores/usuários.
Na sexta-feira, dia 21 de junho, o perfil do Jornal do Commércio/PE publicou 06
imagens, sendo a primeira 01 fotomontagem que mostrava a multidão de manifestantes no
centro do Recife, seguida pela capa do jornal impresso do dia que trazia na manchete
“Guerra e paz”, 01 charge referente às manifestações, 02 fotografias do caderno especial
com 12 páginas, onde foram publicadas as imagens publicadas pelos leitores/usuários
através da hashtag #InstaJCnasRuas e 01 regram41 mostrando a manifestação nas ruas de
Serra Talhada, interior de Pernambuco.
41 Republicações de imagens publicadas por outros perfis, na maioria das vezes pertencentes a leitores.
Figura 9 - Dia 20: Recorde de publicações do Jornal do Commércio, com 48 imagens Fonte: captura de tela via WebStagram.
62
No perfil da Folha de São Paulo/SP, mais uma vez as publicações do dia se
resumiram as capa do jornal impresso, com a edição nacional que trouxe a chamada
“Protestos violentos se espalham no país; um manifestante morre”, gerando 192 interações
através de likes e 09 comentários; e a edição de São Paulo com a manchete “Protestos
violentos se espalham e confrontos atingem 13 capitais”, somando 270 interações através
de likes e 22 comentários.
O dia 22 de junho no perfil do Jornal do Commércio/PE resumiu-se em 03
publicações, 01 charge em crítica ao discurso da presidente Dilma Rousseff sobre as
manifestações, a capa do jornal impresso e 01 imagem referente à festa de São João.
Empatando a charge e a imagem do São João com 175 likes cada.
Enquanto a Folha de São Paulo/SP, novamente publicou as capas das versões
nacional e local do jornal, ambas com a mesma manchete “Dilma promete ouvir ‘voz das
ruas’ e proibir ‘arruaça’”, sendo a edição de São Paulo a que mais gerou interação com 270
likes e 22 comentários.
11.2.1 A produção de conteúdo
A adesão da comunicação instantânea para a cobertura jornalística, em especial
pelo uso de aparelhos de tecnologia móvel, tem sido um dos caminhos para coberturas
jornalísticas, que buscam, entre outras características, a velocidade na produção e
transmissão da notícia.
Em 28 de outubro de 2012 um ciclone natural, batizado de furacão Sandy, atingiu
países como Canadá, República Dominicana, Cuba, Haiti, Bahamas e parte da costa leste
Figura 12- Dia 21: Quatro temáticas de imagens publicadas pelo Jornal doCommércio/PE . Fonte: captura de tela via WebStagram.
63
dos Estados Unidos, entre as cidades afetadas: Nova Iorque e Nova Jersey. A tragédia que
matou mais de 180 pessoas e deixou outras milhares desabrigadas, marcou também o uso
das redes sociais não apenas na comunicação entre amigos e familiares que buscavam
notícia de pessoas que estavam nas áreas atingidas, como também na transmissão de
informações e cobertura jornalística através do Twitter, Google Maps42, LiveStream43 e o
estreante em coberturas do tipo, Instagram.
Na ocasião, a Revista americana Time convocou cinco fotógrafos profissionais e,
abrindo mão do padrão técnico veiculado à fotografia profissional, os enviou para uma
experiência diferente baseada na velocidade da distribuição. Substituiu os aparatos
fotográficos profissionais, tradicionais às grandes coberturas jornalísticas, por cinco
aparelhos smartphones. Separados em diferentes pontos da costa americana, os fotógrafos
produziram imagens impactantes que retrataram os efeitos causados pela tempestade e não
apenas estamparam a capa da revista impressa, mas também foram responsáveis pelo
maior recorde de acessos no portal da revista, inclusive, conquistando em 48 horas novos
12 mil seguidores 44para o perfil da Time, no Instagram.
Mesmo ciente das limitações da câmera de um aparelho móvel, como o iPhone,
usado nesta cobertura, Ben Lowy, autor da foto que estampou a capa da Time, diz que
“não é o equipamento que determina a qualidade da fotografia, mas a mente do
fotógrafo”45. Para Lowy, que já registrou, através das lentes de smartphones, momentos
dramáticos na Líbia, Afeganistão e Iraque, apesar do aparelho não possibilitar o controle
da velocidade do obturador e a profundidade de campo é uma excelente opção para
coberturas mais “duras”. Gerando mais de 800 mil fotos46, através da hashtag #sandy,
o tornado também significou um recorde para o Instagram, que até então não havia
registrado, em tão pouco tempo, um número tão grande de imagens sobre um mesmo
evento.
42 Serviço de mapeamento do Google, que durante o furacão Sandy ofereceu link exclusivo com as áreas maisameaçadas, rotas de acesso e fuga e transmissão de previsões do trajeto realizado pelo furacão, em temporeal. 43 Aplicativo para Android e Iphone de transmissão de vídeo ao vivo que criou uma página exclusiva para asproduções realizadas durante a passagem do furacão Sandy.44 Dados disponíveis em: < http://www.midiassociais.net/2012/11/revista-time-usa-iphones-e-instagram-para-fazer-cobertura-do-furacao-sandy/2012/> . Acesso em 14. Jun 2014.45 Declaração disponível em: < http://macworldbrasil.com.br/noticias/2012/11/07/foto-do-furacao-sandy-feita-com-iphone-4s-vira-capa-da-revista-time/>. Acesso em: 14. Jun 2014.46 Dado disponível em < http://www.midiassociais.net/2012/11/revista-time-usa-iphones-e-instagram-para-fazer-cobertura-do-furacao-sandy/2012/>. Acesso em 14. Jun 2014
64
No Brasil, as manifestações civis de junho de 2013 também registraram números
volumosos no Instagram. Somente na primeira semana foram mais de 540 mil 47fotos
publicadas na rede usando a hashtag #VEMPRARUA. Nas ruas, não se via apenas um mar
de pessoas e cartazes, eram milhares de aparelhos de telefonia móvel que registravam, em
imagem e vídeo, e instantaneamente publicavam, através das redes sociais na web, todos os
momentos da manifestação. E por não haver uma organização que direcionasse essa
produção de conteúdo, junto às milhares de postagens multiplicavam-se também as
diferentes hashtags usadas como referência aos protestos, o que dificultou não apenas uma
nomenclatura oficial para o evento, como também um mapeamento das publicações na
web.
Diante deste cenário, os perfis dos jornais Folha de São Paulo/SP e Jornal do
Commércio/PE assumiram posturas diferentes na apropriação da plataforma Instagram
para a cobertura das manifestações, demonstrando não haver uma proposta clara dos
veículos sobre a utilização destes novos meios.
Analisando as publicações foi possível notar que o Jornal do Commércio/PE
buscou noticiar os protestos do Recife e de algumas cidades pelo interior de Pernambuco,
chegando a publicar 45 imagens em um único dia, incentivando a participação dos
leitores/usuários na produção de imagens e republicando estas produções em seu perfil, e
também em um caderno especial na versão impressa. Enquanto o perfil da Folha de São
Paulo/SP que, apesar de ser um jornal produzido na capital paulista, possui uma edição
47 Dado disponível em < http://www.tudocelular.com/curiosidade/noticias/n28935/instagram-meio-milhao-fotos-manifestacoes.html>. Acesso em 14. Jun 2014
Figura 13 - Gráfico com as temáticas das postagens dos dois perfis analisados
65
nacional com distribuição ao redor do mundo, pareceu negligenciar as potencialidades da
plataforma, publicando durante os sete dias, de uma semana histórica para o país, o total de
14 imagens sendo 09 delas capas da versão impressa do jornal e apenas 03 fotografias
referentes às manifestações.
Quanto as hashtags mais utilizadas na semana, o perfil do Jornal do Commércio/PE
fez uso de palavras-chave alusivas às manifestações, como #vemprarua #vempraruarecife
#ogiganteacordou #occupybrazil #occupyrecife e #passelivre mais usadas, já o perfil da
Folha de São Paulo, optou por utilizar hashtags apenas nas publicações de capas do jornal,
como #primeirapagina #folhasp #newspaper #sampa #folhadespaulo #jornalismo
#frontpage e #saopaulo, enquanto as 03 publicações com imagens referidas às
manifestações não tiveram nenhuma palavra-chave, impossibilitando inclusive um maior
acesso ao perfil, já que a hashtags servem como mecanismo de busca.
Figura 10 - Ausência de legenda que complemente a imagem Fonte: captura de tela via WebStagram.
Figura 14 – Tabela com os números dos perfis analisados
66
Em relação ao conteúdo textual, nos dois perfis é notável a ausência de textos. Mesmo o
Instagram sendo uma plataforma baseada em imagens, a rede, ao contrário do Twitter, não
limita o número de caracteres em suas postagens o que permitiria uma melhor apresentação
da imagem, enquanto notícia, através do uso de legendas. Durante a análise pudemos
observar que em alguns momentos, como na Figura 13, a ausência de legenda acaba por
dificultar a compreensão da imagem, abrindo espaço para que os leitores/usuários façam
suas especulações sobre o que teria ocorrido no momento do registro.
Diferente da cobertura realizada pela revista Time, não podemos afirmar que as fotos
publicadas nos perfis da Folha de São Paulo/SP e do Jornal do Commércio/PE no
Instagram foram produzidas utilizando a capacidade móvel do aplicativo, através de
smartphones e publicação instantânea, o que nos faz refletir as afirmações de Torres (2011)
quanto à utilização de novas tecnologias apenas como modismo, sem uma devida
prudência e, no caso específico, uma melhor capacitação para uma melhor compreensão
das plataformas e exploração de suas potencialidades.
Barbosa e Seixas (2013) também defendem que os novos dispositivos midiáticos
possuem características de produção próprias, que devem ser repeitadas na apropriação
enquanto plataforma de notícia. Citando a teoria da Difusão de inovações, formalizada por
Everett Rogers em 1962, e atualizada trinta e três anos depois pelo próprio, as autoras
destacam que “(...) a novidade de uma inovação envolve novo conhecimento, mas pode ser
também expressada em termos de persuasão ou uma decisão para adotar determinada
inovação (BARBOSA; SEIXAS, 2013, p.55)”. Exatamente como nos referimos no início
deste trabalho, quando empresas criam um perfil em uma rede social seguindo uma
tendência ou para estar onde seu público esta. Para as autoras, no cenário atual do
jornalismo a teoria da Difusão pode ser aplicada para entendermos não apenas a
apropriação de novas tecnologias na produção da notícia, como para caracterizar um novo
ciclo de inovação ainda emergente no jornalismo.
11.2.2 Interação: entre comentários e likes
Ao analisarmos os dois perfis, percebemos a iniciativa de interação por parte dos
leitores/usuários através do espaço destinado aos comentários, através de elogios e críticas,
seja referente ao assunto da imagem publicada ou sobre a atuação do jornal, embora a
incidência de interação seja muito maior através dos likes.
67
Diferente do que acontecia na era pré-redes sociais, onde esta interação era
individual e particular, seja através de cartas, telefone ou e-mails, no Instagram a
participação dos leitores/usuários além de ser aberta e acessível à leitura de todos, na
maioria das vezes acaba tornando o espaço de comentários em um fórum de debates, onde
os leitores/usuários conversam entre si, e em alguns casos até mesmo complementam a
notícia com novas informações. É o que Lemos e Lévy (2010) trataram por "liberação da
palavra", característica da cibercultura que permitiu uma transformação sobre o que
entendemos como pólo de emissão, possibilitando uma maior interação entre produtores e
sua audiência.
Durante a pesquisa também foi possível observar que não há uma moderação
absoluta, no sentido de censurar comentários negativos (e às vezes até ofensivo) à
publicação. Porém, como veremos na Figura 14, o perfil do Jornal do Commércio/PE
demonstrou ter uma maior preocupação em responder alguns comentários, enquanto no
perfil da Folha de São Paulo/SP não houve nenhum diálogo no período observado.
Quanto à característica dos comentários, observamos uma maior incidência de
opiniões negativas no perfil da Folha de São Paulo/SP, contabilizando 124, de um total de
286, sendo 141 comentários neutros e 21 positivos. No perfil do Jornal do Commércio/PE
Figura 11 - Comentários resposdidos pelo Jornal do Commércio/PE (Captura de tela WebStagram)Fonte: captura de tela via WebStagram.
68
foram contabilizadas apenas 05 opiniões negativas de um total de 298 comentários, sendo
264 neutros e 29 positivos.
Porcentagens demonstradas no gráfico da Figura 16 que considera como
comentários positivos e negativos aqueles referentes às coberturas realizadas pelos perfis, e
neutras as demais opiniões que não fazem referência direta a produção jornalística, mas ao
fato noticiado, elementos da imagem, entre outros.
12 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho realizou um estudo inicial e exploratório sobre o uso da
plataforma Instagram pelo jornalismo impresso, considerando especificamente a cobertura
de um momento histórico no país: as manifestações civis de junho de 2013. Por se tratar de
uma temática corrente, com bibliografia ainda incipiente, o referencial teórico que amparou
nossas reflexões foi constituído por contribuições de estudos da cibercultura, do campo do
jornalismo online e móvel, entre outros.
Compreendendo o caráter de serviço social e, sobretudo, documental da atividade
jornalística entendemos que, diante de um evento de tamanha proporção e grau de
importância, era papel dos veículos jornalísticos realizar uma cobertura o mais completa
possível. Utilizando todos os recursos disponíveis, dentre eles, ferramentas como o
Instagram, não apenas para testar e pôr em prática suas potencialidades, inovando num
modelo de cobertura jornalística online, como também, contribuindo de forma significativa
na construção de um relato histórico através de registros em imagem, inclusive com a
colaboração dos leitores/usuários.
No entanto, como destacou Lévy (1999, p.26) referindo-se a novas técnicas,
observamos que nem sempre as possibilidades que são abertas com as novas tecnologias
são aproveitadas em sua totalidade, seja por desconhecimento ou mal preparo. O que nos
faz questionar a presença de alguns veículos em plataformas como o Instagram, pois
concordamos com Torres (2011) quando ele diz que não podemos confundir mecanismos
com estratégias, ou seja, a utilização de ferramentas de mídias sociais por um jornalista,
Figura 12 - Gráfico com as características de comentários nos perfis analisadosFonte: captura de tela via WebStagram.
69
sem que haja qualquer aplicação funcional ou planejamento passa a não ser um jornalismo
pensado para os usuários de tais ferramentas.
Torres (2011) ainda destaca que é louvável que o jornalismo faça uso do maior
número de meios para chegar ao seu público, porém sem negligenciar a qualidade editorial,
utilizando plataformas online apenas de forma quantitativa (estar por estar) ou
exibicionista. Uma vez que devido a grande oferta de informação, os usuários de redes
sociais buscam cada vez mais conteúdo relevante, especialmente quando se trata de um
perfil não-amigo, como os pertencentes a empresas ou serviços.
Barbosa e Seixas (2013, p. 57) também contribuíram para a parcial conclusão
desta pesquisa ao destacarem que esses novos meios possuem suas próprias características
de produção, dinâmica de consumo e modelo de negócios, que na prática parece ser
ignorado por alguns veículos que insistem em tratar as plataformas online como meras
vitrines de anúncio, esquecendo-se da essência social das redes, que suscita
relacionamento, ainda que, como apontou Recuero (2009, p.13), o jornalismo não possua
um compromisso social nas redes, ou seja, não estão lá para fazer “amigos”, é necessário
que haja uma mínima adequação.
Nos registros analisados não fica claro se as fotos publicadas nos dois perfis foram
postadas diretamente do local da imagem, mas a dinâmica de postagens do Jornal do
Commércio/PE, especialmente durante o dia 20 de junho em que 45 imagens foram
publicadas, foi a que mais se assemelhou a uma cobertura instantânea e móvel. Já o perfil
da Folha de São Paulo/SP se mostrou aquém na cobertura da semana analisada, não apenas
negligenciando as potencialidades da plataforma, como ignorando a interação com sua
audiência. O que contraria a tendência que Santaella (2004) tratou de “apropriação das
telas”, que desfaz a antiga distinção que limitava quem produzia e quem consumia a
notícia de forma acentuada.
Acreditamos que, ainda que a Folha de São Paulo/SP não tivesse como mobilizar
uma numerosa equipe munida de aparatos tecnológicos para cobrir e registrar tudo que
acontecia simultaneamente, nos quatro cantos do país, o veículo perdeu a oportunidade de
abrir espaço para que seus leitores fizessem essa cobertura colaborativa, uma vez que,
durante as manifestações os civis foram às ruas não apenas com cartazes e caras pintadas,
mas munidos de celulares smartphones que registraram as imagens mais emblemáticas do
70
manifesto, a maioria publicada em tempo real no Instagram, considerado a "janela das
manifestações"48.
A apropriação de aparatos tecnológicos e plataformas sociais online pelo jornalismo
tem sido constante foco de pesquisas e estudos, fomentados pela emergência de novos
fenômenos comunicacionais na produção da notícia. Fenômenos estes que geram
questionamentos reais, que necessitam de observação e compreensão das implicações
trazidas pelas novas tecnologias de comunicação. Porém, como destaca Lévy (2010)
referindo-se à ciberdemocracia em seu livro “O futuro da internet”, o estudo aqui
apresentado sobre o uso do Instagram pelos jornais Folha de São Paulo/SP e Jornal do
Commércio/PE não é algo definitivo, mas sim um instante de num movimento longo que
certamente não está concluindo e nem perto do seu fim.
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