View
519
Download
0
Category
Preview:
Citation preview
7
APRESENTAÇÃO
O presente trabalho trata de uma reflexão intitulada: “EDUCAÇÃO
AMBIENTAL: UMA CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DO AMBIENTALISMO
ATRAVÉS DAS CRÔNICAS ECOLÓGICAS DA AGAPAN DE RIO GRANDE –
RS”. Para realizá-lo, foi percorrido um caminho trabalhoso, intenso, mas,
instigante e compensador.
No capítulo 1; denominado de, “Caminhos e descaminhos de um
pesquisador: trajetória e emergência do tema de pesquisa”; procurei contar a
minha história enquanto pesquisador na área de História, e, posteriormente, na
Educação Ambiental. Também, foi retratada a emergência do presente tema de
pesquisa.
No capítulo 2; denominado de, “Metodologia e proposta da pesquisa:
Contribuições de um historiador para o campo da Educação Ambiental”;
procurei construir a minha orientação metodológica para análise das fontes.
Desenvolvemos um diálogo com alguns autores clássicos do campo do método
em História, Educação e Ciências Humanas. A proposta metodológica utilizada
no presente trabalho é a análise de conteúdo. Também, tratamos do conceito
central e uma breve abordagem histórica da crítica ambiental no Brasil. Nossa
proposta central é estudar as crônicas ecológicas e verificar se eram
mecanismos utilizados para tecer as mais variadas formas de crítica ambiental
ao projeto societário estatal-desenvolvimentista desenvolvido e gerenciado pelo
Estado brasileiro desde a Era Vargas, perpassando pelos Governos Militares.
No capítulo 3; denominado de, “Contexto de emergência do
ambientalismo e da AGAPAN”; procurei reconstruir o processo histórico
humano, de forma resumida. Também foi desenvolvida, uma análise acerca da
ideia de natureza que orienta a forma de ver, ler e interpretar a natureza
moderna e capitalista. Após esse diálogo, desenvolvemos uma breve síntese
das três frentes de crítica desenvolvidas contra o modo de vida moderno
capitalista. Depois discorremos uma análise sobre o contexto do surgimento do
movimento ecológico e suas influências ideológicas. Também, foram discutidos
acontecimentos que fizeram germinar os diferentes movimentos que de certa
8
forma influenciaram o movimento ambientalista e suas lutas. Logo depois, essa
breve abordagem do contexto internacional do surgimento do movimento
ecológico, tecemos uma descrição sobre o surgimento do ambientalismo no
Brasil. E, partir disso, a fundação AGAPAN em Porto Alegre e a abertura de
uma delegacia da mesma entidade em Rio Grande, desenvolvendo uma frente
de luta ambiental na localidade. A partir do fato citado, procuramos fazer uma
síntese do processo histórico local e descrição do ambiente de atuação dos
ecologistas da AGAPAN delegacia de Rio Grande.
No capítulo 4; denominado de, “Previsão das fontes e Plano preliminar
de Conteúdos” a intenção foi colocar, brevemente, o que já foi trabalhado e
estipular a estrutura da dissertação. Já que, o presente texto é uma proposta já
encaminhada de pesquisa, e está na etapa de escrita e de análise das
crônicas. A proposta é partir do presente texto para construir a versão final da
dissertação, tendo como referência as orientações da banca avaliadora. Por
isso optamos pela atual configuração, ou seja, um texto já encaminhado,
faltando apenas os capítulos que discorrerão sobre o diálogo da História com a
Educação Ambiental, o resultado da análise das crônicas ecológicas e a
conclusão.
9
1) CAMINHOS E DESCAMINHOS DE UM PESQUISADOR: TRAJETÓRIA
E EMERGÊNCIA DO TEMA DE PESQUISA
A minha trajetória acadêmica iniciou-se com a inserção na Universidade
Federal do Rio Grande (FURG). Em março 2003, ingressei no curso de História
bacharelado. Escolhemos esse curso por alguns motivos. No ano de 2002, fiz
curso pré-vestibular no “Teorema Mega”. E, lá tive dois professores de História
excelentes, que são o Ariel (História do Brasil) e a Luciana (História Geral). A
partir dessas aulas, comecei a gostar muito de História e aprofundar as leituras
na disciplina. Mas, me identifiquei mais com História do Brasil, justamente, pelo
perfil crítico do professor e pela curiosidade do processo vivenciado pela
redemocratização do país, que em uma das aulas, Ariel discutiu. E, também,
eu tinha vivenciado pela televisão diversas manifestações pelas “Diretas Já”,
em 1984 e, logo em seguida, as eleições indiretas e a morte de Tancredo
Neves, apesar de ter, somente, seis anos de idade. Vivenciei esse processo,
mas ainda não sabia muito bem o que significava.
Outro fator que despertava minha curiosidade era a notícia sobre a alta
dos combustíveis que passava na imprensa. Lembro bem do Jornal Nacional
anunciando o aumento dos combustíveis. Justamente, porque, depois de cada
aumento de preço dos combustíveis eu observava meu pai reclamando, que a
gasolina estava muito cara. Meu pai sempre dizia: “porque a gasolina é tão
cara, se temos aqui em Rio Grande uma refinaria?” Isso gerava sempre
polêmica, quando ele ia abastecer o carro da família, quem escutava suas
reclamações era o frentista. Isso, também, me chamava à atenção.
No primeiro ano do curso de História, fiz diversas amizades. Conquistei
grandes amigos e destaco uma pessoa, em especial, a Débora Cunha Dias. Eu
e Débora, desenvolvemos um elo muito forte de amizade, e, percorremos,
praticamente, toda graduação estudando juntos. Fazíamos todos os trabalhos
juntos e assim contribuímos muito um com outro nas nossas trajetórias
acadêmicas. Débora ingressou na universidade um semestre antes de mim, no
segundo período de 2002. Isso possibilitou a ela seis meses a mais de
experiência acadêmica que eu, e redeu a ela o ingresso na revista discente do
10
curso de História denominada de Plêiade. O corpo organizador da revista, no
ano de 2003, era formado pelos discentes: Débora Dias, André Laborde,
Maicon Bravo, Eduardo Ibsen e outros, orientados pelo professor José Carlos
Vieira Ruivo. Então, que Débora sugeriu meu nome para compor o corpo
organizador da Plêiade, eu aceitei. A partir disso, a revista me possibilitou a
começar escrever artigos e organizar eventos. Então, foi que escrevi o meu
primeiro artigo acadêmico sobre Eráclito de Éfeso e a dialética. Escolhemos
esse pensador por, nesse momento, nos identificarmos com o campo do
materialismo histórico, e, por, também, ter lido algumas das obras de Marx e
Engels, ou seja, O Manifesto do Partido Comunista e nos identificar com a
proposta política contida em tal obra.
No segundo semestre do ano de 2003, fiz a disciplina de Introdução à
Sociologia, com a professora Maira Baumgarten Correa. Essa disciplina
possibilitou a ler os clássicos da sociologia, e, dentre esses, estava Karl Marx.
E, dessa forma, em ritmo de curiosidade ler os Manuscritos Econômicos e
Filosóficos do mesmo autor. Também, li textos de comentadores das obras dos
fundadores do materialismo histórico, e, isso me possibilitou a adentrar ao
campo daquela corrente filosófica já no primeiro ano de curso.
Em 2004, o curso de História passou por uma reforma exigida pelo
Ministério da Educação (MEC). Essa reforma tinha por fundamento o aumento
da carga horária dos cursos de licenciatura e bacharelado. E, dentro desse
processo, surgiram duas disciplinas implementadas no curso de bacharelado,
que são: Seminários de Pesquisa e Práticas de Pesquisa. As propostas dessas
disciplinas seriam de proporcionar aos alunos do curso de bacharelado o
contato com as pesquisas dos professores do curso, ou seja, Seminários de
Pesquisa. E, da vivência da pesquisa propriamente dita, elaborando um projeto
para um orientador que tenha se identificado, ou seja, Práticas de Pesquisa.
Nesse mesmo contexto, fui selecionado para uma bolsa-trabalho no
Centro de Documentação Histórica (CDH – FURG). O ingresso no CDH nos
possibilitou o acesso aos mais diversos tipos de documentos. No CDH, eu
trabalhava com limpeza e restauração de documentação histórica. Dessa
11
forma, eu tinha acesso ao acervo de monografias do curso de História e isso
possibilitou ler alguns desses trabalhos. Foi, então que, li o trabalho intitulado
de: “O Grito da Ipiranga na cidade do Rio Grande: um histórico da Refinaria de
Petróleo Ipiranga”, cuja autora é Terezinha de Jesus Vargas dos Santos. No
decorrer da leitura do texto de Santos (2001, p. 127), percebemos que a autora
discorreu análise sobre os acontecimentos que são denominados de “Choques
do Petróleo” em 1973 e 1979. Os chamados Choques do Petróleo foram
aumentos dos preços que se sucederam no barril do petróleo, instituídos pela
Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) e que geraram uma
série de repercussões, inclusive o aumento dos preços dos derivados na
localidade. Então, foi que, tivemos a ideia de trabalhar com a história do
mercado petrolífero em Rio Grande.
Paralelo à reforma do curso de História, o processo pedagógico das
disciplinas Seminários de Pesquisa e Práticas de Pesquisa e o ingresso no
CDH – FURG; fizemos amizade eu e o professor Lauro Brito Vianna. O
professor Lauro Vianna ministrava as disciplinas de História Americana II e
História Contemporânea. Sua especialização era em História Econômica na
Universidade de São Paulo (USP) vinculado à Escola de Altos Estudos da
América Latina na França, orientado pelo prof. Dr. Emanuel Soares Veiga
Garcia e coorientado por Frèdéric Mauro, membro da Revista dos Annales.
Vianna trabalhou na sua tese de doutorado historia dos preços dos produtos
alimentícios comercializados no século XIX, e movimentação portuária em Rio
Grande (RS). Sob a influência de Vianna, construí um projeto sobre história dos
preços dos derivados do petróleo em Rio Grande no contexto dos “Choques do
Petróleo”.
O projeto de pesquisa tinha como tema estudar entre 1973 a 1979, a
repercussão da flutuação dos preços dos barris de petróleo nos combustíveis
derivados na cidade do Rio grande. Sendo assim, Rio Grande sediava uma
refinaria de petróleo, a Ipiranga. Outra questão que nos instigava era o fato de
Rio Grande ter a gasolina mais cara do Brasil a época, sendo que, sediava
uma refinaria de petróleo e um píer petrolífero no retroporto da cidade,
12
localizado na estrada que vai à Quarta Secção da Barra, no Distrito Industrial
de Rio Grande.
Para sair a campo, requisitei uma carta de recomendação da Comissão
do Curso de História (Comcur - História) e, munido desse documento e do
projeto de pesquisa fui até a Empresa de Petróleo Ipiranga. Chegando lá,
fomos recebidos pela assessora de comunicação da empresa e solicitamos um
favor a ela que, se possível, o acesso aos relatórios, estatísticas e tabelas dos
preços do barril de petróleo no mercado mundial e preços dos derivados em
Rio Grande. A assessora de imprensa da Ipiranga disse que precisava
consultar seu chefe. E, dessa forma, marcamos uma reunião com o superior da
assessora.
Em reunião com o diretor do departamento administrativo da Refinaria
Ipiranga, ele nos sugeriu abandonar a pesquisa, que a proposta não era
relevante para história da empresa e da cidade do Rio Grande. Ele nos propôs,
então, fazer uma história dos feitos e realizações da Ipiranga e nos disse que,
para esse tipo de história a empresa disponibilizaria um arquivo abundante de
fontes. Falou até em subsídio financeiro para a pesquisa, e, numa posterior
publicação de um livro que enaltecesse a Ipiranga e sua história de
realizações. “Fiquei desconfiado”!
Cheguei à conclusão que tinha sido ingênuo. Depois pensando no dito
do senhor diretor do departamento administrativo da Empresa Petróleo
Ipiranga, unidade de Rio Grande, e, revendo o projeto de pesquisa,
observamos que a proposta podia tornar público uma especulação de mercado
que existia, na época, entre a Petrobrás e a Ipiranga. Fato que tornava o preço
dos derivados do petróleo em Rio Grande os mais caros do Brasil. Evidência
negada pelo diretor do departamento administrativo da Ipiranga. Observando
que, nas décadas de 1970-80 em Rio Grande tínhamos preços dos
combustíveis mais caros, sendo que, sediávamos uma refinaria, e isso nos
instigava.
Emergiu-me a ideia que os dados contábeis, ou seja, a série de preços
dos combustíveis derivados e dos barris de petróleo, na qual precisávamos,
13
podia estar nos jornais locais. Foi que retornei a campo. Busquei os jornais na
biblioteca Rio-grandense1. Não encontrei nada. A partir disso, cogitamos a
possibilidade de ir ao Jornal Agora, por ser o único diário local em circulação na
época da pesquisa, 2004, e por conservar o acervo completo de jornais desde
a primeira edição até hoje. Teoricamente, isso nos possibilitaria uma sequência
que acompanhasse o movimento diário do mercado petrolífero mundial e do
mercado local dos combustíveis.
Então, foi que, chegando ao Jornal Agora, fui recebido pela assessora
de comunicação que me permitiu o acesso ao acervo do jornal. Dessa forma,
começamos a pesquisa. No processo de pesquisa, começamos a ler o jornal
desde a primeira edição, 20 de setembro de 1975. Isso nos permitiu
acompanhar o processo histórico do final do ano de 1975 até o ano de 1985.
Mesmo pesquisando no Jornal Agora, não obtive êxito no encontro de nossos
dados. Mas, não fiquei desesperado. Por outro lado, percebi que o Jornal
Agora estava destinando espaço a discutir os impactos socioambientais locais
e regionais. E, isso nos aguçou a curiosidade. Comecei a perceber e comentei
com Vianna que era publicada, no jornal, duas colunas, a primeira era
chamada de “Crônicas Ecológicas” e a segunda eram textos de um movimento
chamado de “Plana”. Vianna comentou que, seriam dois possíveis temas para
a monografia, mas que ainda preferia trabalhar no campo da história
econômica e movimentação portuária.
O fato acima citado gerou uma ideia, de coletar as crônicas ecológicas,
pois, poderíamos, futuramente, utilizá-las para algum tipo de escrito ou
trabalho. E, também, percebi que as crônicas eram escritas por ecologistas
vinculados à Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (AGAPAN).
Vi que era uma possibilidade de pesquisa na Educação Ambiental, mas não
tinha conhecimento da dimensão e do significado.
Logo após aquele processo, tomei conhecimento de uma disciplina que
era oferecida no curso de especialização em História do Rio Grande do Sul:
1 Biblioteca sediada na cidade do Rio Grande (RS).
14
Sociedade, Política e Cultura2. A disciplina chama-se História e Ambiente no
Rio Grande do Sul, ministrada pelo professor Daniel Porciuncula Prado,
atualmente, oferecida na graduação em História Bacharelado3. Na época
Daniel Prado, então, professor das disciplinas, História Antiga Oriental e
Clássica e História Medieval, pós-graduado em Educação Ambiental, produzia
alguns artigos na área de eco-história. E, dentre suas produções, está à
pesquisa de mestrado que foi desenvolvida acerca da percepção ambiental dos
trabalhadores da indústria do Rio Grande. O título da sua dissertação de
mestrado é: “Operariado e meio ambiente: um estudo de caso sobre os
trabalhadores da indústria de Rio Grande e sua percepção ambiental”. Essa
dissertação tratou da percepção sobre o meio ambiente entre os trabalhadores
da indústria do município de Rio Grande, com o enfoque sobre as indústrias
que geram resíduos tóxicos que são depositados no meio ambiente. Essa
dissertação foi o primeiro trabalho que li na área da Educação Ambiental.
Antes de iniciar a graduação, ganhei de uma ex-aluna do curso de
História, minha querida amiga Cristina, várias pastas de “Xerox” dos textos que
seriam lidos no curso. E, dentre, as fotocópias dos textos, estavam os “Xerox”
da bibliografia da disciplina de História e Ambiente no Rio Grande do Sul.
Nessa lista tinham cópias dos textos de Carlos Walter Porto Gonçalves – Os
(des)caminhos do Meio Ambiente, O que é Ecologia de Antônio Lago e José
Augusto Pádua e outros. Lendo a bibliografia da disciplina de História e
Ambiente no Rio Grande do Sul, comecei a tomar conhecimento do campo de
pesquisa da história com ênfase em meio ambiente.
Outro fato crucial para chegar ao tema de pesquisa da presente
qualificação/dissertação foi à aquisição do livro “História do Ambientalismo” 4
escrito por Augusto César Cunha Carneiro (AGAPAN). A obra permitiu-me
saber o significado das crônicas ecológicas. Carneiro nesta obra explicita uma
2 FURG – Universidade Federal do Rio Grande
3 Linha de pesquisa: Patrimônio Socioambiental - FURG – Universidade Federal do Rio
Grande. 4 CARNEIRO, Augusto Cunha. A história do ambientalismo / Augusto Cunha Carneiro. – Porto
Alegre: Editora Sagra Luzzatto, 2003.
15
corrente intelectual-militante que influenciou a práxis5 da AGAPAN no contexto
histórico da década de 1970 e posteriormente.
Entre as obras citadas por Carneiro, estavam as crônicas ecológicas de
Henrique Luiz Roessler. Essas crônicas são uma espécie de crítica ambiental,
formação de opinião pública e de educação ambiental, fato elucidado na tese
de doutorado de Daniel Prado, intitulada de: A figueira e o machado: uma
história das raízes do ambientalismo no sul do Brasil e a crítica ambiental de
Henrique Roessler. Então, a partir do livro de Carneiro, percebi que estava
diante de algo importante para o campo histórico-ambiental. Pois, já vínhamos
pesquisando através do livro “Os (des)caminhos do meio ambiente” de
Gonçalves, o surgimento do movimento ecológico e o seu significado político.
Nesse sentido, o acesso as Crônicas Ecológicas da AGAPAN nos proporcionou
a construção de uma nova proposta de pesquisa. Então, a partir disso, resolvi
escrever um novo projeto de pesquisa. Propus a investigação dos movimentos
ambientalistas a partir das crônicas ecológicas da AGAPAN publicadas no
Jornal Agora nas décadas de 1970-80.
O professor Lauro Vianna viu a pesquisa com desconfiança, em um
primeiro momento, mas aceitou o desafio. Ele disse que não era o seu campo
de atuação, mas que ia aceitar por causa da nossa trajetória de trabalho e
amizade. Pois, por dois anos fui seu bolsista de pesquisa no projeto: “O Porto
do Rio Grande no século XIX”. Foi, então, que decidi não “defender” o trabalho
em 2006, deixando-o para o próximo ano. Outro motivo que me fez adiar a
defesa da monografia foi que, com a reforma do curso de História, o quarto e
último ano, tínhamos disciplinas com carga de leitura muito grande e densa.
Elas eram: História Americana II, História Contemporânea, ambas com o
professor Lauro Vianna; História Brasileira II, com o professor Francisco das
Neves Alves; e, História Regional II com o professor Luis Henrique Torres,
disciplinas anuais. Então, optei por maior dedicação as disciplinas adiando o
trabalho de conclusão de curso. Isso para podermos desenvolver um bom
5 Por “práxis”, entendemos prática refletida, pensada. Conceito do campo do materialismo
histórico.
16
trabalho e que nos desse os frutos futuros, e isso estamos colhendo através da
presente qualificação/dissertação.
2006 foi um ano de transformações na minha trajetória de vida. Logo em
seguida do início das aulas, em março, reencontrei, depois de onze anos sem
ter contato, Isabela de Souza Fonseca. E, desse reencontro, ao longo de nove
meses de relacionamento, firmamos união estável. Porém, no mês de julho,
desconfiamos que Isabela, estava grávida. Ela teve a ideia de fazer o exame
chamado de “Beta HCG” para verificar a gravidez. E, eis que se confirmou a
hipótese. Nos primeiros momentos que recebi a notícia fiquei confuso,
inseguro, com medo, mas depois de “cair à ficha”, fiquei muito feliz, estava
sendo agraciado com o meu amado filho, Matheus Fonseca Estevam, hoje com
cinco anos de idade, a maior e melhor obra de arte da minha vida.
Então, a partir disso, em dezembro de 2006, tive que ingressar no
mercado de trabalho, para poder subsidiar o sustento da minha família. Fator
que, também, influenciou no adiamento da “defesa” da monografia. Foi então
que deixei um currículo na farmácia do SESI6 Cassino. Como já havia
trabalhado na empresa, no verão de 2005, fui indicado pela (ex) gerente e
farmacêutica Ivana Goulart, e, naquele momento, Supervisora da região de
Uruguaiana. A partir desse fato, ingressei na função de Auxiliar de Farmácia e
nela permaneci durante três anos, até o ano de 2009, com o fechamento da
rede de farmácias do SESI.
A partir desse fato, precisei ser muito determinado e organizado para
prosseguir meus estudos. Para isso, construí uma planilha de horários na qual
seguia a rigor. No início de março de 2007 fui transferido para a unidade de
farmácia do SESI do Supermercado Guanabara localizada na frente do
Hospital Pronto Socorro da Santa Casa (HPS). Isso repercutiu em ter que
utilizar transporte coletivo. Pois, a minha moradia localizava-se no “Parque
Guanabara nas imediações do balneário Cassino” 7.
6 Serviço Social da Indústria.
7 Rio Grande (RS)
17
Ao retomar minhas pesquisas para a construção da monografia, no ano
de 2007, optei por me organizar mediante planilha de horários, seguida a rigor,
pois eu tinha várias responsabilidades: família, trabalho e estudos. Ainda tinha
o fator “morar longe do trabalho”. Tornou-se mais trabalhoso, no sentido que eu
precisava utilizar dois ônibus para poder chegar ao trabalho e/ou retornar ao
lar. Procedíamos na pesquisa, de forma organizada, também por planilha de
coleta de dados, intercalando um dia coletando os dados e outro com as “idas
e lidas” na biblioteca do Hospital Universitário da Universidade Federal do Rio
Grande (HU – FURG). Coletei as fontes da pesquisa no acervo do Jornal Agora
e fichei os livros necessários na biblioteca do HU e em casa. Obedecendo a
mesma organização, construímos nosso trabalho de conclusão de curso em
História Bacharelado.
O trabalho intitulado: “Uma Contribuição ao Estudo do Movimento
Ecológico e sua Militância Escrita Através do Jornal Agora do Rio Grande/RS
nos Anos de 1978-79”, composto de Introdução, 4 capítulos e conclusão,
totalizando um número de 140 páginas. A banca avaliadora do trabalho era
composta pelos professores: Dr. Lauro de Brito Vianna (orientador), Dr.
Francisco das Neves Alves e Ms. Daniel Porciuncula Prado.
Dessa forma, minha trajetória de pesquisa é marcada pela organização,
persistência, fé; mas, também, pela abdicação de vida social e limitação da
vida familiar. Pois, precisava trabalhar e dar atenção à família, coisa que em
muitos momentos deixei a desejar. Mas, como fui agraciado com a condição
proletária de vida, tive que ser determinado e persistente para não ser mais um
a permanecer nas “fileiras do exército de mão de obra barata” e/ou não trilhar
um caminho ilícito para sobrevivência. Então, paguei um preço pela minha
escolha, mas, com certeza, valeu apena. Foi então que, no dia 2 de janeiro de
2008, fui coroado com o diploma de bacharel em História pela Fundação
Universidade Federal do Rio Grande, tendo em vista o recebimento do grau em
18
cerimônia de formatura, presidida no CIDEC - Sul8, promovida pela própria
universidade.
Logo após a descrita trajetória, em março de 2008, entrei em contato,
pela internet, com o programa de especialização lacto sensu em Educação
Ambiental do “SENAC EAD RS” 9. Passei por uma seleção através de proposta
de projeto e avaliação de currículo, e, fui aceito. Através dos estudos na
especialização tive contato, breve, com as teorias, temas e práticas discutidas
no campo da Educação Ambiental. Foram discutidos, através da
especialização, os blocos temáticos: Sociedade, Natureza e Desenvolvimento;
Princípios de Ecologia e conservação da Natureza; Meio Ambiente e
Cidadania; Educar para Sustentabilidade; e, Elaboração de Projetos.
Citarei, a partir de agora, os objetivos do curso de especialização em
Educação Ambiental do SENAC EAD RS. Os objetivos do bloco temático,
Sociedade, Natureza e Desenvolvimento10, foram: Perceber as múltiplas faces
da crise ambiental da atualidade, familiarizando-se com as inter-relações entre
as condições sociais, econômicas, culturais e políticas que a caracterizam.
Compreender a amplitude da crise ambiental, por meio de duas categorias
intimamente relacionadas: o espaço e o tempo. Compreender os problemas
ambientais globais como resultantes do modelo de desenvolvimento adotado
pelos diferentes países, percebendo como as desigualdades de acesso aos
recursos são um dos elementos de agravamento da crise ambiental.
Compreender a evolução do movimento ambientalista, bem como as diferentes
formas de manifestação que ele assumiu durante esse processo. Analisar as
tendências recentes do ambientalismo, compreendendo suas características e
fundamentos como uma nova perspectiva para avaliar as relações homem-
natureza. Compreender a construção do conceito de desenvolvimento
sustentável e suas implicações para as agendas políticas, nacional e
internacional. Compreender a evolução da Terra até o aparecimento do ser
8 Centro Integrado de Desenvolvimento do Ecossistema Costeiro do Extremo Sul -
Universidade Federal do Rio Grande. 9 Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial – Educação à Distância – Rio Grande de Sul
10 SENAC. Educação Ambiental: Temas, teorias e práticas. SENAC/DN, Rio de Janeiro, 2008.
(p. 1 a 62).
19
humano, percebendo as diferenças entre as dinâmicas natural e social.
Compreender as transformações nas relações sociedade-natureza, tomando a
Revolução Neolítica como ponto de partida. Conhecer o processo de
construção do conceito de natureza, a partir das descobertas científicas que
representaram rupturas importantes na relação homem/natureza. Conhecer as
condições históricas que favoreceram o surgimento da Revolução Industrial.
Entender que a Revolução Industrial contribuiu de modo determinante para a
construção de uma ideia de natureza. Compreender as transformações
recentes na evolução da sociedade. Entender como o progresso se tornou um
dos pilares da sociedade industrial e os pontos essenciais das críticas
formuladas a essa fundamentação. Compreender, as mudanças ocorridas em
relação à preocupação ambiental, no contexto da Organização das Nações
Unidas. Conhecer os atuais desdobramentos das medidas e dos programas
propostos pela Organização das Nações Unidas. Avaliar o conteúdo da Agenda
21 e as propostas de organização e participação da sociedade civil. Conhecer
e refletir sobre as propostas, diretrizes e experiências da Educação Ambiental.
Os objetivos do bloco temático, Princípios de Ecologia e conservação da
Natureza11, foram: Conhecer a origem e a evolução da Ecologia e sua relação
com a sociedade. Perceber a estreita relação entre a Ecologia, como área do
conhecimento científico, e as questões ambientais. Perceber a importância da
abordagem sistêmica e da visão holística para a compreensão das questões
relacionadas ao ambiente em que vivemos aos ecossistemas e ao uso que
fazemos dos recursos naturais. Compreender o conceito de ciências
ambientais, sua relação com as diversas áreas do conhecimento, sua estrutura
metodológica e seu campo de atuação. Identificar as etapas de formação da
Terra, destacando as características da evolução das diferentes formas de
vida, desde os primeiros organismos até o surgimento do Homo sapiens
sapiens. Conhecer as funções de alguns ciclos vitais, para compreender como
os elementos da natureza se integram de forma organizada, ordenada,
sucessiva, intermitente e dinâmica. Ressaltar a importância dos ciclos vitais
para a manutenção e a promoção dos processos naturais. Compreender o
11
(SENAC, 2008, p. 63 a 143).
20
ecossistema como uma unidade básica da natureza, suas relações internas e
externas. Reconhecer que o ecossistema é fundamental para a existência de
todos os seres vivos, inclusive para a espécie humana. Compreender o
conceito e as características da biodiversidade, destacando a importância de
sua preservação e de seu uso sustentável. Conhecer a riqueza ambiental do
nosso país, ressaltando a importância de sua conservação e de seu uso
sustentável para o meio ambiente, a cultura e a economia brasileira.
Apresentar o conceito de bioma, apontando os fatores ambientais que
possibilitam a sua constituição. Caracterizar os biomas brasileiros. Conhecer as
diferentes formas de preservação e conservação dos ecossistemas.
Caracterizar a situação da destruição dos ecossistemas brasileiros, mostrando
como os efeitos de degradação ambiental avançam de forma progressiva, em
todas as regiões do país.
Os objetivos do bloco temático, Meio Ambiente, desenvolvimento e
cidadania12, foram: Pensar as relações sociais e ecológicas que caracterizam a
presença humana no planeta, particularmente a relação entre população,
necessidades humanas, padrões culturais e modelo de desenvolvimento.
Problematizar os modos de uso do território, discutindo o ambiente urbano e
rural. Discutir os processos de urbanização e seus desafios na
contemporaneidade no contexto do debate sobre sustentabilidade urbana.
Compreender a importância da ampliação do conceito de qualidade de vida
para as atuais sociedades e sua relação com o direito a um meio ambiente
sustentável. Participar das discussões sobre a necessidade de criação de
indicadores que incluam as variáveis sociais e ambientais para medir
desenvolvimento humano e qualidade do meio ambiente, enriquecendo a
análise sobre a qualidade de vida e a riqueza de uma sociedade. Introduzir a
discussão sobre as medidas de sustentabilidade. Definir os conceitos de
capacidade de suporte, espaço ambiental, pegada ecológica e linha da
dignidade, bem como indicar sua aplicação na avaliação dos impactos das
sociedades humanas no planeta. Perceber a relação entre disponibilidade de
recursos naturais e o custo ambiental dos padrões sociais de produção e
12
(SENAC, 2008, p. 146 a 203).
21
consumo na perspectiva da sustentabilidade. Introduzir os conceitos de política
e democracia, conhecer as diversas formas de democracia e suas relações
com a participação e a prática da cidadania. Compreender como a temática
ambiental inova e amplia o debate em torno dos direitos e deveres dos
cidadãos e inaugura um novo espaço de responsabilidade ética. Compreender
o conceito de gestão ambiental, destacando os princípios que a orientam.
Compreender o conceito de consumo sustentável e sua importância para a
economia e para as sociedades contemporâneas. Analisar o papel dos
diferentes atores sociais na busca do consumo sustentável. Conhecer os
principais resultados (acordos, declarações e tratados) da Conferência Mundial
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, em
1992. Traçar um mapa das dificuldades encontradas na internalização da
preocupação ecológica pela agenda econômica internacional, bem como
apontar as oportunidades que abre a entrada da questão ecológica na pauta de
decisões. Chamar atenção para a complexa dinâmica de correlações de força
que caracteriza o cenário atual. Apresentar a noção de justiça ambiental,
conceito forjado no âmbito de lutas sociais por equidade socioambiental, como
um parâmetro para a construção de uma sociedade sustentável.
Os objetivos do bloco temático, Educar para sustentabilidade13, foram:
Compreender a importância da história e da cultura na definição dos modos de
ver, ler, narrar e estabelecer relações com a natureza. Relacionar a um mesmo
momento histórico a circulação de leituras diferenciadas da natureza.
Compreender como o Novo Mundo foi narrado pelos primeiros cronistas
europeus que chegaram ao continente americano. Identificar a importância da
natureza na composição dessas narrativas. Identificar narrativas díspares
sobre a natureza do Novo Mundo, advindas dos movimentos Ilustrado e
Romântico. Relacionar, em um mesmo momento histórico, diferentes leituras
da natureza. Relacionar as ações dos movimentos ecológicos com o ideário de
contestação social circulante em inúmeros outros movimentos sociais dos anos
1960 e 1970. Compreender os movimentos ecológicos como plurais e como
aglutinadores de sujeitos com diferentes propósitos, interesses e filiações
13
(SENAC, 2008, p. 205 a 243).
22
políticas. Compreender a emergência de princípios e valores educativo-
ambientais no interior dos movimentos ecológicos contestatórios. Identificar a
Educação Ambiental como um campo recente de saberes e práticas,
compreendendo-a como um campo contestado e em formação. Compreender o
processo de institucionalização da Educação Ambiental a partir dos eventos
ocorridos, dos documentos produzidos e da legislação específica.
Compreender as ideias que fundamentam o paradigma cartesiano, percebendo
como elas estão presentes na Educação Ambiental. Apresentar a hermenêutica
como perspectiva epistemológica interpretativa que assume, no debate com a
ciência moderna, o contraponto ao paradigma científico objetivista. Destacar as
consequências desta opção epistemológica para a Educação Ambiental e o
lugar do educador ambiental.
Os objetivos do bloco temático Elaboração de Projetos14 foram:
Conhecer as ideias que fundamentam a linha conservacionista da Educação
Ambiental. Compreender que a Educação Ambiental conservacionista induz a
uma relação excludente e a um convívio pouco solidário entre o ser humano e
a natureza, uma vez que defende o isolamento do homem da natureza como
melhor forma de preservá-la. Identificar alguns princípios de uma prática em
Educação Ambiental associada à vertente comportamental. Apontar alguns
caminhos para o desenvolvimento da sensibilidade ambiental nos alunos.
Compreender as diferenças entre a linha conservacionista, comportamentalista
e socioambiental da Educação Ambiental. Identificar os princípios que
aglutinam educações ambientais em uma vertente socioambiental.
Compreender que a vertente socioambiental incorpora valores relativos à
proteção socioambiental, ao mesmo tempo em que também considera as
questões socioeconômicas e culturais, tendo sua proposta voltada,
prioritariamente, para a construção da cidadania. Relacionar os vários aspectos
implicados na elaboração de um projeto em Educação Ambiental. Identificar as
seções que compõem um projeto. Compreender o processo de construção de
um projeto. Analisar projetos de Educação Ambiental. Identificar os conceitos
14
(SENAC, 2008, p. 245 a 290).
23
teórico-metodológicos da Educação Ambiental empregados nos projetos
analisados, relacionando-os aos resultados obtidos.
Depois de realizados os estudos e atividades dos blocos temáticos, foi-
me encarregado à construção de um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)
como requisito para obtenção do grau de especialista em Educação Ambiental.
Como campo de análise, escolhi as escolas do balneário Cassino: Silva Gama,
Wanda Rocha e Dolores Garcia. A escolha foi feita no sentido de que sou
morador do balneário Cassino e estudei em duas dessas escolas, Silva Gama
e Wanda Rocha; e, a outra escolha, no momento do desenvolvimento da
pesquisa, por estar residindo no Parque Guanabara, local onde fica a escola
Dolores Garcia.
Deste modo, como é previsto em projetos de Educação Ambiental, o
caminho percorrido para chegarmos ao tema gerador do nosso trabalho foi à
aplicação de um diagnóstico socioambiental realizado nas escolas do Balneário
Cassino e Parque Guanabara. A pesquisa nos permitiu constatar que, existiam
limitações na formação dos docentes dos Anos Iniciais das escolas. As lacunas
observadas são referentes aos temas, às teorias e às práticas de Educação
Ambiental. Em sua maioria, os professores não tiveram formação, em nível
médio Normal, de temas ligados à EA. Dessa forma, tal fato reduz, atualmente,
a capacidade de construção e implementação de projetos de educação
ambiental nas escolas do município, a época. Além disso, podemos detectar
através do discurso de alguns professores, principalmente, os da escola
Dolores Garcia, que a formação média Normal obtida por eles era limitada nas
abordagens relacionadas aos enfoques teórico-metodológicos voltados para
questão ambiental. Muitos deles informaram que só através de pós-graduação
obtiveram alguma formação em Educação Ambiental, e que esses temas não
eram tratados em nível de Magistério, ou seja, ensino médio através da escola
formadora desses profissionais. Além disso, investigamos por intermédios da
responsável pedagógica, Maria Lúcia Vanglon, do curso Normal do Instituto de
Educação Juvenal Muller, escola que oferece o curso de magistério em Rio
Grande, e detectamos a inexistência das abordagens e dos temas relacionados
aos enfoques, histórico, filosófico, sociológico e teórico-metodológico da
24
Educação Ambiental. Isso ocorre por que não existia um programa de estudos
e atividades ligado às Ciências Humanas (CH) com ênfase em EA no
Magistério. Conforme Maria Lúcia Vanglon, essas práticas pedagógicas eram
desenvolvidas pela disciplina de Ciências, ou seja, eram práticas de educação
ambiental conservacionista.
Através do cenário diagnosticado, observamos os limites referentes à
Educação Ambiental no curso Normal do Instituto Juvenal Muller, e,
consequentemente, de certo modo, na rede de ensino do município. Tal fato
prejudicava, em nível teórico e prático, o processo de construção e execução
de projetos de EA com enfoque socioambiental, nas turmas dos Anos Iniciais,
como foi detectado no diagnóstico realizado nas escolas. A partir do contexto
explicitado, da pesquisa de campo desenvolvida, e, partindo do tema gerador
visualizado, o projeto proposto visava contribuir com o processo de construção
e inclusão de um programa de estudos e atividades de educação ambiental
não formal, paralelo ao curso médio Normal do Instituto Estadual de Educação
Juvenal Muller.
Pensando em uma alternativa de solução do problema, construímos o
projeto de intervenção prática denominado de: EDUCAÇÃO AMBIENTAL: UM
PROGRAMA DE ESTUDOS E ATIVIDADES NÃO-FORMAIS PARA O CURSO
NORMAL DO INSTITUTO JUVENAL MULLER DO MUNICÍPIO DO RIO
GRANDE-RS.
A partir dos estudos e das atividades propostas, o programa também iria
subsidiar a construção de projetos de Educação Ambiental, de caráter social,
para os Anos Iniciais da rede de ensino do município, através do curso Normal
da escola Juvenal Muller. O curso de Magistério se constituiria como um núcleo
de Educação Ambiental. Identificamos, no momento, como público-alvo do
projeto em nível inicial, os alunos e os docentes do curso de magistério do
Instituto Juvenal Muller, e, indiretamente, os alunos da rede de ensino do
município. Em geral, o curso é frequentado por alunos do sexo biológico
feminino, e a faixa etária média gira em torno dos 16 anos. O número de
sujeitos diretamente atingidos por este projeto durante o ano de execução seria
de 381 discentes e 28 docentes, aproximadamente. Acreditávamos que o
número de sujeitos contemplados pelas atividades do programa iria aumentar a
25
partir da, então, continuidade do projeto. Esse seria estendido à rede de ensino
do município. O projeto é um programa de apoio aos estudos identificados com
a área das Ciências Humanas e suas Tecnologias, visando o entendimento das
relações sociedade e natureza sob a perspectiva histórica e crítica. Os estudos
e as atividades do programa teriam como eixo temático, o Meio Ambiente
(sociedade-natureza) sob o olhar das Ciências Humanas. Mas, o projeto
descrito acima, até hoje, não foi colocado em prática.
Defendemos o trabalho supracitado em 30 de junho de 2009, obtendo
nota máxima com louvor, sob a avaliação de uma banca estadual, que contava
com a coordenadora dos cursos de Pós Graduação do SENAC RS, Prof(a). Dr.
Márcia Paul Waquil; coordenadora dos cursos de especialização em Educação
Ambiental do SENAC RS, Prof(a). Ms. Ana Beatriz Coelho Delacoste e o
orientador Professor Ms. Daniel Araújo. Contamos, também, com a
coorientação informal do Professor Dr. Daniel Porciuncula Prado PPGEA-
FURG15.
Depois disso, fui convidado pelo professor Daniel Prado para assistir
como aluno ouvinte a disciplina Seminários Temáticos de Educação Ambiental.
A partir da disciplina, começamos a conversar sobre a possibilidade de
ingressar no mestrado em Educação Ambiental da Universidade Federal do Rio
Grande. A disciplina proporcionou a ter contato com parte das leituras feitas no
Programa de Pós Graduação em Educação Ambiental.
Paralelo ao trabalho no SESI farmácias, eu lia a bibliografia para seleção
do mestrado em Educação Ambiental e entrei em contato com a tese de
doutorado de Daniel Prado, defendida em 2008, cujo estudo abarcava fontes
semelhantes ao que utilizei na monografia de conclusão do bacharelado em
História, defendida em 2007. Então, verificando isso, decidi dar continuidade ao
estudo feito na graduação. Também, em 2009, eu estava conversando na
farmácia onde trabalhava com o representante de laboratório Edson
Menestrino. Em conversa, falávamos do meu TCC de graduação cujo tema era
“Crônicas Ecológicas” da AGAPAN. No decorrer da minha exposição, citei o
nome de Luiz Felipe Pinheiro Guerra, um dos cronistas que eu investigava no
15
Programa de Pós Graduação em Educação Ambiental da Universidade Federal do Rio Grande
26
trabalho. Menestrino disse que havia estudado no curso de Economia da
Universidade Federal do Rio Grande com o filho de Luiz Felipe Pinheiro
Guerra, o “Júnior”.
Então, depois de duas semanas da conversa, chegou à farmácia do
SESI da Rua General Neto um senhor que perguntou por Bread Soares
Estevam. Eu me apresentei ao senhor e ele disse: “Prazer, Luiz Felipe Pinheiro
Guerra”. Depois desse fato, começamos, eu e o senhor Luiz Felipe Pinheiro
Guerra (L. F. P. G.), uma trajetória de conversas que me possibilitou a
aprofundar os estudos sobre as Crônicas Ecológicas, a AGAPAN e o
Movimento Ambientalista em Rio Grande e no eixo sul e capital do Estado do
Rio Grande do Sul.
No final do ano de 2009 fiz seleção ao mestrado em Educação
Ambiental da FURG. Passei na prova com nota 6,5; na entrevista com nota 8,9;
e, a decepção de tirar nota zero no currículo. “Mas, ia um ‘porém’”. Meu
currículo não era “tão ruim”, mas quando fiz a inscrição, havia esquecido em
formatá-lo no modelo da Plataforma Lattes. Ainda consegui ficar em quinto
lugar da lista de espera, mas naquele ano não desistiu ninguém. No mesmo dia
da notícia acerca do currículo, fiz um cadastro na Plataforma Lattes, na qual
preenchi o formulário do currículo. Foi, então, que decidi investir na melhoria do
meu currículo. Passei o ano de 2010 fazendo cursos de qualificação e
escrevendo alguns artigos, apresentando comunicações em eventos,
construindo cursos para o Portal Buzzero.com e publicando artigos em jornais.
Nessa época, trabalhava na farmácia Mais Econômica (ME) e tinha uma
parceria de trabalho com o Portal Buzzero.com. Trabalhei 2 meses, na loja da
ME, no centro de Rio Grande e depois pedi transferência para a unidade do
Cassino ME, fator que me possibilitou maior tempo para dedicação à leitura e a
família.
Então, no final de 2010, prestei o processo seletivo, novamente, ao
mestrado em Educação Ambiental da FURG. Eis, então, o êxito. Até que em
fim. Consegui! Tirei nota 8,0 na prova; 5,6 no currículo; e, 9,7 na entrevista. No
dia 14 de março de 2011 iniciou as aulas do mestrado. Conquistei uma bolsa
de estudos da CAPES Demanda Social que possibilitou a me dedicar,
exclusivamente, aos estudos no mestrado. No primeiro semestre de 2011, me
27
matriculei em quatro disciplinas. São elas: Diálogos de Educação Ambiental,
Karl Marx e a Natureza, Metodologia de Pesquisa em Educação, e, Sociologia
e a Dialética do Meio Ambiente.
A experiência na disciplina de Diálogos de Educação Ambiental foi algo
inusitado. Tudo acontecia na disciplina, mas não entrarei em detalhes, pois não
é objeto de análise da presente qualificação/dissertação. Em um primeiro
momento, a disciplina foi ministrada pela professora Paula Henning e pelo
professor Vilmar Pereira. Nesse momento da disciplina, outros professores
fizeram algumas intervenções, fato que permitiu ter um conhecimento sobre
seus estudos. No segundo momento, a disciplina foi ministrada pela professora
Suzana Molon, que propôs o contato com autores do campo socioambiental
crítico. Logo após, assumiu o professor Alfredo Martin Gentini, que propôs uma
dinâmica diferente para disciplina. Ele propunha atividades coletivas e que
exercitavam a criatividade dos alunos envolvidos.
A disciplina de Marx e a Natureza ministrada pelos professores Carlos
Roberto Silva Machado e Francisco Quintanilha Veras Neto foi excelente. A
proposta das leituras dos comentaristas das obras de Marx e Engels, num
primeiro momento, e depois dos clássicos dos autores fundadores do
materialismo dialético, proporcionou aproximar dois dos maiores clássicos da
História da Filosofia ao campo ambiental. Particularmente, aproveitamos as
leituras para avançar nas discussões das contribuições dos precursores da
corrente marxista no campo histórico-ambiental-educativo. Já que, temos
influências do materialismo histórico e dialético na nossa caminhada enquanto
pesquisador na área da História.
A disciplina de Metodologia de Pesquisa em Educação, particularmente,
foi uma das que mais contribuiu para a presente qualificação/dissertação.
Disciplina ministrada pelas professoras Maria do Carmo Galliazzi e Elisabeth
Brandão Schimith. No sentido, de fazer refletir qual “arsenal teórico-
metodológico” iríamos utilizar. As discussões sempre pertinentes e com um
nível de aprofundamento excelente das leituras. A disciplina nos permitiu a
pensar em questões técnicas e teóricas, sem falar na interação com os alunos
do Programa de Pós Graduação em Educação em Ciências (PPGEC). Isso
permitiu outro olhar sobre os temas e metodologias propostas. A leitura do
28
livro, “Escrever é Preciso: Princípio da Pesquisa”, de autoria de Mário Osório
Marques, nos proporcionou a entender que a escrita é um processo de criação.
Dessa forma, a escrita de uma dissertação e/ou tese não deve ser um
processo, meramente, de reprodução de ideias e citações, e, sim um processo
criativo, de criação de novas visões a cerca de um tema de pesquisa.
Outra experiência peculiar foi à disciplina de Sociologia e a Dialética do
Meio Ambiente. Disciplina ministrada pelo professor Luis Fernando Minasi. A
disciplina, rica em diálogo, proporcionou entrar em contato com método
dialético materialista. Tivemos a possibilidade de aprofundarmos as leituras e
as discussões acerca da dialética materialista. A discussão foi rica e propositiva
através de um dialogo entre os envolvidos e as propostas de leituras utilizadas
que eram: Cheptulin, “A dialética materialista” e Kaprivine, “O que é
materialismo histórico”. Ao final da disciplina, foi proposto um exercício de
utilizar as categorias do método dialético materialista em um fenômeno
material. Atingi o objetivo e isso permitiu ter uma dimensão da proposta da
dialética materialista enquanto método de análise. Mas, em termos de trajetória
pessoal, no caso a qualificação/dissertação, pouco foi utilizado. Pois a nossa
proposta se dá no campo do método da Análise de Conteúdo.
No segundo semestre de 2011, me matriculei em 5 disciplinas. São elas:
Compreender a Legislação Ambiental para uma Educação Ambiental
Transformadora, Diálogos de Educação Ambiental 2, Ecologia Onírica,
Ecologia Virtual Criativa e Seminários Temáticos de Educação Ambiental.
Também, fiz na graduação em História a disciplina de História Ambiental16.
A disciplina de “Compreender a Legislação Ambiental para uma
Educação Ambiental Transformadora” ministrada pela professora Vanessa
Hernandez Caporlingua contribuiu com o meu processo de formação enquanto
pesquisador. A metodologia utilizada em sala de aula permitia um diálogo de
saberes. Paralelo, as aulas presenciais, utilizamos o ambiente virtual de
aprendizagem. Foram-nos propostos textos que eram discutidos através de
seminários. E, a partir disso, fazíamos resumos de duas páginas que
postávamos no ambiente virtual. Particularmente, a disciplina serviu para
16
Estudos dirigidos para a dissertação.
29
termos a dimensão de como se dá em âmbito jurídico a discussão do campo
ambiental.
A disciplina de Diálogos de Educação Ambiental 2 foi ministrada por três
professores. São eles: Luis Fernando Minasi, Francisco Quintanilha Veras Neto
e Vitor Hugo Guimarães Rodrigues. A proposta do professor Francisco
Quintanilha Veras Neto de discutir alguns textos através de seminários foi
proveitosa, por aprofundar temas relevantes para o campo ambiental, tais
como, agro-ecologia, movimento ambientalista, pensamento crítico e outros.
Também, elucidou discussões importantes para entender a crise ambiental, os
paradigmas atuais e as propostas temáticas dentro do campo ambiental. Da
bibliografia sugerida pelo professor Francisco Quintanilha Veras Neto,
utilizaremos para o presente trabalho os livros: “O Movimento Ambientalista e o
Pensamento Crítico: Uma Abordagem Política”, e, “Trajetória e Fundamentos
da Educação Ambiental”, ambos de autoria de Carlos Frederico Bernardo
Loureiro. Dentre outros livros recomendados e que serão utilizados numa
versão ampliada do presente trabalho, citamos: “Ecologia e Cidadania” de
autoria de Carlos Minc (ex-ministro do Meio Ambiente) e “A globalização da
natureza e a natureza da globalização” de Carlos Walter Porto Gonçalves.
A disciplina de Ecologia Onírica, particularmente, foi uma experiência
“relaxante”. Disciplina ministrada pelo professor Vitor Hugo Guimarães
Rodrigues, teve como proposta central discutir e praticar a “transgressão”.
Então, foram realizadas propostas/atividades diversas tais como: contar
experiências pessoais da nossa infância, realizar passeios ecológicos, discutir
temas importantes do campo ambiental, ir aos locais de convívio social fora da
universidade e, literalmente, dormir em sala de aula. Particularmente, curtimos
muito a experiência, pois é algo que rompe com um padrão instituído de aula
acadêmica. E, nos faz refletir sobre diversas atividades que nos são impostas
pelo mundo acadêmico.
A disciplina de Ecologia Virtual Criativa, particularmente, foi uma das
melhores experiências que tivemos no curso de mestrado em Educação
Ambiental. Disciplina ministrada pelo professor Alfredo Martin Gentini. A
proposta da disciplina, também, era dividida em dois momentos: presencial e à
distância. Influenciada pela filosofia da Análise Institucional, a disciplina
30
direcionou-se para a construção dos projetos de intervenção prática. A partir da
oficina de criação construímos um site e um blog: o Blog e o Portal Educador
Ecohistórico, visando à formação de opinião pública. As leituras da disciplina
fizeram-nos refletir sobre que tipo de práticas pode-se realizar através da
Educação Ambiental. Essa disciplina, não serviu diretamente para a construção
da qualificação/dissertação, mas, certamente, servirá para a nossa vida
pessoal e profissional.
A disciplina de Seminários Temáticos de Educação Ambiental foi um dos
momentos que mais contribuiu com a presente qualificação/dissertação de
mestrado. Disciplina ministrada pelo professor Daniel Porciuncula Prado. A
presente disciplina nos permitiu, pela segunda vez, a ter acesso a uma
discussão que elucida uma educação ambiental a partir do movimento
ambientalista. Para nós foi fundamental, pois nosso trabalho de
qualificação/dissertação analisa as crônicas ecológicas da AGAPAN, entidade
representativa dentro do movimento ambientalista. Outras atividades foram
propostas dentro da disciplina tais como: saídas de campo, vídeos educativos,
discussões em seminários e debates.
E, finalmente, a disciplina de História Ambiental na graduação em
História, assistida em caráter de leituras dirigidas foi fundamental para a
construção da nossa qualificação/dissertação. Disciplina ministrada pelo
professor Daniel Prado. Trabalha temas e conteúdos que elucidam uma
discussão que propomos nessa dissertação. A proposta aqui debatida vai ao
encontro de discutirmos através da História Ambiental as relações sociedade e
natureza no processo histórico, para construção de subsídios teórico-
metodológicos, para o campo da Educação Ambiental. E, para isso dialogamos
com diversos autores do campo histórico-educativo-ambiental, processo que se
desenvolveu através da disciplina supracitada.
Em História Ambiental foi proposto uma discussão acerca dos clássicos
da disciplina. Podemos citar os textos de: Donald Worster (Para Fazer História
Ambiental); José Augusto Drummond (A História Ambiental: Temas, fontes e
linhas de pesquisa); Daniel Porciuncula Prado (A Figueira e o Machado: uma
história das raízes do ambientalismo no Sul do Brasil e a crítica ambiental de
Henrique Roessler); José Luiz de Andrade Franco (A primeira Conferência
31
Brasileira de Proteção à Natureza e a questão da Identidade Nacional – artigo
publicado na Revista Varia História); Elmar Bones e Geraldo Hasse (Pioneiros
da Ecologia – Breve História do Movimento Ambientalista no Rio Grande do
Sul); e, José Augusto Pádua (Um Sopro de Destruição – Pensamento Político e
Crítica Ambiental no Brasil Escravista 1786-1888).
Então, dessa trajetória descrita até o momento, e da relação e diálogo
dos saberes da minha caminhada, tanto pessoal quanto profissional, e,
também, do dialogo com o orientador é que foi desenvolvida a presente
qualificação/dissertação que enfoca a análise de conteúdo das crônicas
ecológicas da AGAPAN no contexto socioambiental de Rio Grande (RS) no
período entre 1975 e 1985.
32
2) METODOLOGIA E PROPOSTA DA PESQUISA: CONTRIBUIÇÕES DE
UM HISTORIADOR PARA O CAMPO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL
A metodologia é um instrumento de trabalho do pesquisador. Ou seja, as
ferramentas para vencer as etapas da sua jornada de trabalho. Conforme Alves
(2003) é necessário elaborar um caminho, algumas etapas para o manuseio,
análise das fontes e construção dos resultados da pesquisa 17.
Nesse sentido, como parte da nossa empreitada, fizemos um
levantamento bibliográfico para discutir os capítulos da presente produção
textual. Após obter as fontes bibliográficas relacionadas à pesquisa,
“fichamos18” os textos, conforme o nosso interesse. Identificamos cada fonte
colocando suas referências bibliográficas. Procuramos organizar as fontes no
decorrer de nosso processo de pesquisa.
Paralelo ao processo de “pesquisa bibliográfica19”, procedemos com a
pesquisa e sistematização das crônicas ecológicas. Para isso, construímos
uma ficha de coleta dos textos que tinham alguns itens de referência, tais
como: fonte; local; ano; edição; dia; data; coluna; página; título; autor e código
(item que permite saber a ordem na qual estão organizados os textos). Essa
técnica nos permitiu uma coleta rápida e organizada das “crônicas ecológicas”.
As nossas fontes, ou seja, as crônicas ecológicas são discursos
elaborados por ativistas do movimento ecológico que faziam parte da AGAPAN
(Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural). Enquanto conceito de
“discurso”, utilizamos a definição de Cardoso e Vainfas (1997), eles dizem que:
17
ALVES, Magda. Como escrever teses e monografias/Magda Alves. – Rio de Janeiro: Elsevier, 2003. (p. 59) 18
Por fichamento, entendemos ler, grifar e sintetizar as ideias principais de um texto em uma ficha de leitura. Um fichamento deve conter as informações, dados e análises mais importantes sobre os assuntos tratados em um texto. Primeira etapa é a leitura atenta, ou seja, compreender o conteúdo e a intenção, e, identificar quais os tópicos que estão sendo tratados. A segunda leitura deve ser acompanhada da técnica do grifo, ou seja, grifa-se tudo aquilo que é importante, retira-se o excesso de um texto. A terceira leitura é feita no momento de construção das fichas. Enquanto vamos lendo o texto, vamos passando para a ficha as ideias grifadas e organizando-as mediante esquemas. Os esquemas servem para localizar os principais eixos temáticos. Eles, também, permitem uma ordenação e divisão em tópicos. 19
Segundo Magda Alves: Pesquisa bibliográfica - é aquela desenvolvida exclusivamente a
partir de fontes já elaboradas – livros, artigos científicos, publicações periódicas, as chamadas fontes de “papel”. Tem como vantagem cobrir uma ampla gama de fenômenos que o pesquisador não poderia contemplar diretamente. No entanto, deve-se ter o cuidado de, ao escolher tais fontes, certifica-se de que sejam seguras (ALVES, 2003, p. 59). .
33
O discurso pode ser definido de diferentes modos – como
sinônimo de fala (uso contingente da língua) em oposição à língua (sistema estruturado de signos); como unidade linguística maior do que a frase – torna-se então sinônimo de mensagem ou enunciado; como conjunto das regras de encadeamento das frases ou grupos de frases que compõem um enunciado; ou como enunciado visto a partir das
condições de produção – linguísticas e sociais – que o geraram20
.
Nesse sentido, entendemos que o discurso é uma mensagem e/ou
enunciado, manifestante/manifestado de/em um ambiente histórico específico e
fruto desse mesmo ambiente. Para entender o propósito dos discursos é
necessário que utilizemos uma metodologia apropriada para a empreitada que
contemple a análise tanto do texto quanto do contexto.
De acordo com Cardoso e Vainfas (1997):
O pressuposto essencial das metodologias propostas para a análise de textos em pesquisa histórica e o de que um documento é sempre portador de um discurso que, assim considerado, não pode ser visto como algo transparente. Ao debruçar-se sobre um documento, o historiador deve sempre atentar, portanto, para o modo através do qual se apresenta o conteúdo histórico que pretende examinar, quer se trate de uma simples informação, quer se trate de ideias. Especialmente no caso de pesquisas voltadas para a história das ideias, do pensamento político, das mentalidades e da cultura, o conteúdo histórico que se pretende resgatar depende muito da forma do texto: o vocabulário, os
enunciados, os tempos verbais etc. 21
.
Ainda citando Ciro Flamarion S. Cardoso e Ronaldo Vainfas (1997):
Fixemos, pois, uma primeira “profissão de fé”: considerar o conteúdo histórico do texto dependente de sua forma não implica, de nenhum modo, reduzir a historia ao texto, a exemplo do que fazem os autores estruturalistas ou pós-estruturalistas, que negam haver historia fora do discurso. Pelo contrario, trata-se, antes, de relacionar texto e contexto: buscar os nexos entre as ideias contidas nos discursos, as formas pelas quais elas se exprimem e o conjunto de determinações extratextuais que presidem a produção, a circulação e o consumo dos discursos. Em uma palavra, o historiador deve sempre, sem
negligenciar a forma do discurso, relaciona-lo ao social22
.
20
Domínios da historia: ensaios de teoria e metodologia/ Ciro Flamarion Cardoso, Ronaldo Vainfas (orgs.). - Rio de Janeiro: Campus, 1997. (p. 538) 21
(CARDOSO e VAINFAS, 1997, p. 539). 22
(CARDOSO e VAINFAS, 1997, p. 540).
34
Seguindo a linha de raciocínio, de acordo com Cardoso (1983): “[...] os
textos não são tratados apenas em seus conteúdos ou enunciados, mas
também [...], com apoio em alguma teoria [...] e [...] ideologias sociais. [...]
procura-se determinar em que condições sócio-históricas a produção do texto
pôde ocorrer” 23.
Nesse sentido, Cardoso e Vainfas (1999) dizem que, o texto é fruto do
contexto. Sem entender o contexto, seremos limitados à, assim, analisarmos,
interpretarmos e compreendermos a intenção da comunicação textual.
Complementando a afirmativa supracitada, conforme Cardoso e Vainfas
(1997):
Negar a redutibilidade da historia ao texto não significa, por outro lado, admitir que haja uma historia independente do texto. A história é sempre texto, ou mais amplamente, discurso, seja ele escrito, iconográfico, gestual etc., de sorte que somente através da decifração dos discursos que exprimem ou contem a historia poderá o historiador realizar o seu trabalho
24.
Ciro Flamarion S. Cardoso e Ronaldo Vainfas (1997) lançam as bases
da escolha da metodologia apropriada para uma analise de textos e/ou
discursos, quando eles falam que:
...nem a historia se reduz a estrutura do texto, nem tampouco esta deve ser desprezada para uma analise do conteúdo histórico-social dos discursos, [...] o modelo de Bardin contribui exatamente para resolver o problema da escolha das “unidades de registro e de contexto” em uma analise semântica. Tal escolha, afirma Bardin, deve ser pertinente “em relação às características do material e face aos objetivos da analise”
25.
Para empreendemos a análise das crônicas ecológicas, utilizaremos o
método e a técnica da análise de conteúdo desenvolvido por “Laurence
23
CARDOSO, Ciro Flamarion S. Cardoso. Uma Introdução à História. 3ª Ed. Brasiliense, São Paulo, 1983. (p. 54) 24
(CARDOSO e VAINFAS, 1997, p. 540 – 541). 25
(CARDOSO e VAINFAS, 1997, p. 541).
35
Bardin26” e discutido por Roque Moraes. Faremos uma interlocução com Morais
que explica o que é e como utilizar a análise de conteúdo.
De acordo com Roque Morais (1999):
A análise de conteúdo constitui uma metodologia de pesquisa usada para descrever e interpretar o conteúdo de toda classe de documentos e textos. Essa análise, conduzindo a descrições sistemáticas, qualitativas ou quantitativas, ajuda a reinterpretar as mensagens e a atingir uma compreensão de seus significados num
nível que vai além de uma leitura comum27
.
Como método de investigação, a análise de conteúdo compreende
procedimentos especiais para o processamento de dados científicos. É uma
ferramenta, um guia prático para a ação, sempre renovada em função dos
problemas cada vez mais diversificados que se propõe a investigar28.
Dessa forma, a “análise de conteúdo” 29 é uma técnica para ler,
interpretar e compreender os mais diversos tipos de conteúdo dos mais
variados tipos e classes de fontes e/ou textos. Moraes (1999) nos diz que, a
matéria-prima da análise de conteúdo é qualquer tipo de material que tem sua
origem na “comunicação” 30.
26
A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das comunicações. [...] Não se trata de um instrumento, mas de um leque de apetrechos; ou, com maior rigor, será um único instrumento, mas marcado por uma grande disparidade de formas e adaptável a um campo de aplicação muito vasto: as comunicações (BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Trad. Luís Antero Reto e Augusto Pinheiro. Lisboa: Edições 70, 2002. p. 31). 27
MORAES, Roque. Análise de conteúdo. Revista Educação, Porto Alegre, v. 22, n. 37, p. 7-
32, 1999.
28 (MORAES, 1999, p. 7 - 32.)
29 Qualquer análise de conteúdo visa, não o estudo da língua ou da linguagem, mas sim a
determinação mais ou menos parcial do que chamaremos as condições de produção dos textos, que são o seu objeto. O que tentamos caracterizar são estas condições de produção e não os próprios textos. O conjunto de produção, constitui o campo das determinações dos textos (BARDIN, 2002: 40).
30 A noção de comunicação recebeu grande atenção acadêmica a partir do século XIX, mas
somente durante o século XX que se colocou a Comunicação Social como um campo de estudos próprio (Mattelart; Mattelart, 2001) (Introdução à História da Comunicação/organizadores Pablo Laignier e Rafael Fortes. Rio de Janeiro: E-papers, 2009). Segundo Martino (2001, p: 23) “comunicar é simular a consciência de outrem, tornar comum (participar) um mesmo objeto mental (sensação, pensamento, desejo, afeto)” (Introdução à História da Comunicação/organizadores Pablo Laignier e Rafael Fortes. Rio de Janeiro: E-papers, 2009).
36
A análise de conteúdo, na sua corrente qualitativa, tem como ponto de
partida uma série de pressupostos, os quais, no exame de um texto, servem de
suporte para captar seu sentido simbólico. Este sentido nem sempre é
manifesto e o seu significado não é único. Poderá ser enfocado em função de
diferentes perspectivas31.
Reforçando o que Cardoso e Vainfas (1997) supracitaram, Moraes
(1999), também, vai falar na relação texto/contexto dizendo que: “a
compreensão do contexto evidencia-se como indispensável para entender o
texto. A mensagem da comunicação é simbólica. Para entender os significados
de um texto, portanto, é preciso levar o contexto em consideração” 32.
Outra informação relevante na hora do empreendimento da análise de
conteúdo, que Moraes (1999) expõem é que, é necessário considerar alguns
aspectos tais como: o autor do texto, o destinatário e a codificação e
transmissão da mensagem. Conforme Moraes (1999), “Embora os dados
estejam expressos diretamente no texto, o contexto precisa ser reconstruído
pelo pesquisador” 33.
Nesse sentido, de acordo com os pressupostos da análise de conteúdo
34, alguns objetivos precisam ser delineados a priori. A partir da análise de
conteúdo das crônicas ecológicas, temos como objetivo mapear as práticas
ambientalistas e as críticas ambientais da AGAPAN na cidade do Rio Grande
A troca de mensagens ou até mesmo a troca de mercadorias entre duas ou mais pessoas são exemplos de comunicação, se tomarmos o termo em sentido mais amplo. Segundo Sodré (1996, p: 11), “diz-se comunicação quando se quer fazer referência à ação de pôr em comum tudo aquilo que, social, política ou existencialmente, não deve permanecer isolado. Isso significa que o afastamento originário criado pela diferença entre os indivíduos, pela alteridade, atenua-se graças a um laço formado por recursos simbólicos de atração, mediação ou vinculação” (Introdução à História da Comunicação/organizadores Pablo Laignier e Rafael Fortes. Rio de Janeiro: E-papers, 2009). 31
(MORAES, 1999, p. 7 - 32.)
32 (MORAES, 1999, p. 7 - 32.)
33 (MORAES, 1999, p. 7 - 32.)
34 Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos,
sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (BARDIN, 2002: 42).
37
(RS). Sistematizaremos, a partir dos discursos ecológicos, problemas, conflitos
e alterações socioambientais recorrentes em Rio Grande no período de, mais
ou menos, 1975-85.
Então, para fins de análise das fontes, Roques Moraes expõem formas
de organizar o conteúdo dos textos. Conforme Moraes (1999):
Esta classificação se baseia numa definição original de Laswell, em que este caracteriza a comunicação a partir de seis questões: 1) Quem fala? 2) Para dizer o que? 3) A quem? 4) De que modo? 5) Com que finalidade? 6) Com que resultados? Utilizando esta definição podemos categorizar os objetivos da análise de conteúdo de acordo com a orientação que toma em relação a estas seis questões
35.
Segundo Moraes (1999) quando a pergunta é “quem fala?” visa
investigar quem emite a mensagem. Quando a pergunta é “para dizer o que?”,
o estudo se direciona para as características da mensagem. Quando a
pergunta é “a quem?” quem é o receptor da mensagem. Quando a pergunta da
pesquisa é “como?” o pesquisador se questionará sobre os objetivos da
“comunicação”. Quando a pergunta é “com que finalidade?” o analista procura
identificar e descrever os resultados da comunicação 36.
Nesse sentido, a análise de conteúdo obedece a cinco etapas que são
as seguintes: preparação das informações; transformação do conteúdo em
unidades; classificação das unidades em categorias, descrição e interpretação.
Denominada de preparação, esta fase da análise se caracteriza,
conforme Moraes (1999) por identificar as diferentes amostras de informação a
serem analisadas. Ou seja, recomenda-se, segundo Moraes (1999) uma leitura
de todos os materiais e decidir os objetivos da pesquisa.
Uma segunda etapa chamada de unitarização prevê, segundo Moraes
(1999), uma releitura cuidadosa dos materiais com a finalidade de definir as
unidades de análise. Essa etapa, também, pode ser chamada de “unidade de
registro” ou “unidade de significado”. Também, necessário que seja definido as
unidades de análise, ou seja, palavras, frases, temas, ou documentos em sua
35
(MORAES, 1999, p. 7 - 32.)
36 (MORAES, 1999, p. 7 - 32.)
38
forma integral. Identificar as unidades de análise estabelecendo alguns códigos
adicionais, associados ao sistema de codificação. Isolar cada uma das
unidades de análise. Moraes (1999) chama a atenção para importância da
transformação de dados brutos em unidades de análise que possibilita
representar um conjunto de informações a serem analisadas. Definir as
unidades de contexto, ou seja, é uma unidade mais ampla que serve de
referência para análise, fixando limites contextuais para interpretá-la.
Terceira etapa, da análise de conteúdo, chamada de categorização.
Conforme Moraes (1999): “é um procedimento de agrupar dados considerando
a parte comum existente entre eles. Classifica-se por semelhança ou analogia,
segundo critérios previamente estabelecidos ou definidos no processo. [...]” 37.
“A categorização é, portanto, uma operação de classificação dos elementos de uma mensagem seguindo determinados critérios. Ela facilita a análise da informação, mas deve fundamentar-se numa definição precisa do problema, dos objetivos e dos elementos utilizados na análise de conteúdo”
38.
Quarta etapa da análise de conteúdo é “descrição” 39. Caracteriza-se por
ser o primeiro momento da comunicação dos dados da pesquisa. Conforme
Moraes (1999), para cada uma das categorias será produzido um texto síntese.
Esse texto irá expressar o conjunto de significação presentes nas diversas
unidades de análise. O recomendável por Moraes é que se faça o uso de
“citações diretas” dos dados originais. Conforme Moraes (1999): “a organização
desta descrição será determinada pelo sistema de categorias construído ao longo
da análise” 40
.
37
(MORAES, 1999, p. 7 - 32.)
38(OLABUENAGA e ISPIZÚA 1989, Apud MORAES, 1999, p. 7 - 32.)
39...a descrição (a enumeração das características do texto, resumida após tratamento) é a
primeira etapa necessária e se a interpretação (a significação concedida a estas características) é a última fase, a influência é o procedimento intermediário, que vem permitir a passagem, explicita e controlada, de uma a outra (BARDIN, 2002: 39).
40 (MORAES, 1999, p. 7 - 32.)
39
A última etapa da análise de conteúdo é a interpretação. Conforme Moraes
(1999) a interpretação, está ligada ao movimento de procura de compreensão. De
acordo com Moraes (1999):
Toda leitura de um texto constitui-se numa interpretação. Entretanto, o analista de conteúdo exercita com maior profundidade este esforço de interpretação e o faz não só sobre conteúdos manifestos pelos autores, como também sobre os latentes, sejam eles ocultados consciente ou inconscientemente pelos autores
41.
Nesse sentido, conforme Roque Moraes (1999) podemos dizer que
existem duas vertentes. Uma das correntes relaciona-se a estudos com uma
fundamentação teórica claramente explicitada a priori, nosso caso. Pois,
trataremos de uma proposta de discutir “critica ambiental”, conceito de José
Augusto Pádua (2004), tendo como objetivo análise e compreensão das
crônicas ecológicas dentro daquela perspectiva. Na outra vertente a teoria
emerge das informações e das categorias. “Neste caso a própria construção da
teoria é uma interpretação. Teorização, interpretação e compreensão
constituem um movimento circular em que a cada retomada do ciclo se procura
atingir maior profundidade na análise” 42.
Ao optarmos por análise de conteúdo, traçaremos, eventualmente, as
possibilidades que podem emergir do nosso processo de pesquisa. Em análise
de conteúdo existem dois níveis de leitura dos textos e/ou discursos: nível
manifesto e nível latente. Em um primeiro momento, escolhemos o conceito de
crítica ambiental, como referência conceitual do presente trabalho, pois, é
coerente que transitemos por uma análise de nível manifesto, na qual iremos
analisar o que foi dito nas crônicas ecológicas. Futuramente, pretendemos
fazer uma análise de conteúdo visando à emergência teórica numa
investigação de nível latente. Por ora, transitaremos no campo do dito.
Partiremos de uma abordagem dedutivo-objetiva que visa lançar olhares
tendo como referência hipóteses propondo a testagem ou verificação do
conceito proposto a partir de Pádua (2004), ou seja, “crítica ambiental”.
41
(MORAES, 1999, p. 7 - 32.)
42 (MORAES, 1999, p. 7 - 32.)
40
Entendemos por crítica ambiental, diversas correntes de intelectuais e/ou
ativistas que escreviam textos que denunciam e retratam a degradação e/ou
situação socioambiental no contexto histórico brasileiro e/ou mundial.
Lançamos a hipótese de que, encontramos críticos ambientais desde o Brasil
Colônia até os dias atuais.
Em uma série de críticos ambientais, segundo José Augusto Pádua
(2004) podemos enumerar que:
Os principais nomes [do] período inicial foram Alexandre Rodrigues Ferreira (1756-1815), na Amazônia; Manuel Arruda da Câmara (1752-1811), em Pernambuco; Baltazar da Silva Lisboa; José Gregório de Moraes Navarro (?) e José Vieira Couto (1752-1827), em Minas Gerais; Antônio Rodrigues Veloso de Oliveira (1750-1824), no Maranhão e depois em São Paulo; João Severiano Maciel da Costa (1769-1833), no Rio de Janeiro; e José Bonifácio de Andrade e Silva (1763-1838), em São Paulo e depois no Rio de Janeiro
43.
Ainda citando Pádua (2004):
Nas décadas posteriores à morte de Bonifácio, o mesmo enfoque ilustrado, político e progressista continuou dominando a crítica ambiental brasileira. Em um trabalho publicado em 1987, “Natureza e Projeto Nacional”, eu já havia constatado a existência desse prosseguimento em intelectuais abolicionistas como Joaquim Nabuco (1849-1910) e André Rebouças (1838-1898). E também, ultrapassando os marcos cronológicos deste livro, em ensaístas da Primeira
República, como Euclídes da Cunha e Alberto Torres44
.
Visão complementada por Daniel Porciuncula Prado (2011) quando ele
afirma que:
A tradição de uma crítica ambiental brasileira, mesmo que longe de uma hegemonia dentro da intelectualidade, voltará à tona com Alberto Torres (1866-1917), quando em 1914 publica duas obras ‘onde
43
PÁDUA, José Augusto. Um sopro de destruição: pensamento político e crítica ambiental no Brasil escravagista, 1786 – 1888/José Augusto Pádua. – 2ª Ed. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Ed., 2004. (p. 16)
44 (PÁDUA, 2004, p. 16 – 17).
41
o tema da relação natureza projeto nacional encontrará um dos seus mais originais analistas
45.
Nesse sentido, podemos ilustrar as diversas vertentes de críticos
ambientais, utilizando-nos da figura do “rio” e seus “afluentes”. O conceito de
“crítica ambiental” é o “rio”, ponto de convergência entre todos os “afluentes”,
as correntes de “críticos ambientais”. Dentre o “rio” e seus “afluentes”
encontramos semelhanças, a crítica ambiental, mas, por outro lado, muito mais
lacunas e distâncias do que similaridade, ou seja, características dos discursos
em si mesmos. No que corresponde às diversas tradições de críticos
ambientais, nas palavras de Prado (2011), existe a possibilidade de ser,
“Alberto Torres: um possível afluente até Roessler” 46.
Roessler, em 1955, fundou a União Protetora da Natureza – UPN. A
partir de 1957, conforme Augusto César Cunha Carneiro (2003), Henrique Luiz
Roessler “começou a escrever crônicas semanais, publicadas no jornal de
maior circulação do estado, o Correio do Povo” 47.
De acordo com Carneiro (2003):
Henrique Luiz Roessler morreu em 1963. Por volta de 1965, um seguidor dele começou a escrever e publicar crônicas em defesa da Natureza, desde esse ano até 1975. O seguidor era Nicolau A. Campos, que [...] ajudou a fundar a AGAPAN – [...] -, a ONG que desencadeou por todo o país, pioneiramente, a luta ambientalista
48.
Dentre algumas influências no pensamento dos movimentos ecológicos,
de acordo com Carneiro (2003):
...Em 1962, nos Estados Unidos da América, houve Rachel Carson, com Primavera Silenciosa. Aqui no Sul do Brasil, desde 1939, tivemos Henrique Luís Roessler, com 303 crônicas jornalísticas, além uma atividade prática em defesa da Natureza. Depois, Balduino Rambo, com o livro Fisionomia do Rio Grande do Sul. Na Inglaterra,
45
PÁDUA, 1987 Apud: PRADO, Daniel Porciúncula. A figueira e o machado: uma história das raízes do ambientalismo no sul do Brasil e a crítica ambiental de Henrique Roessler / Daniel Porciúncula Prado, Editora FURG, Rio Grande, 2011. (p. 47)
46 (PRADO, 2011, p. 39).
47 CARNEIRO, Augusto Cunha. A história do ambientalismo / Augusto Cunha Carneiro. – Porto
Alegre: Editora Sagra Luzzatto, 2003. (p. 17) 48
(CARNEIRO, 2003, p. 17.)
42
em janeiro de 1972, cinco autores fizeram um Manifesto para a Sobrevivência, [...]. Finalmente em Porto Alegre, em 1976, José Lutzemberger lança outro manifesto, [...], com o nome: Fim do Futuro? – Manifesto Ecológico Brasileiro
49.
O próprio Augusto César Cunha Carneiro, também, lançou vários livros,
tais como: Manual de Educação Ambiental Paralela – Em Defesa dos Animais
Silvestres Aprisionados; A Visão dos Circunvizinhos na Aceitação ou Respeito
às Áreas Silvestres; Todo o Mundo é Ecologista; A Nossa Responsabilidade
Frente ao Grande Problema do Lixo; A Caiação das Árvores; e Queimadas.
Carneiro (2003) dizia que tais obras eram não políticas, e, ao contrário disso,
foram, justamente, para “contrariar e provar que ecologistas podem opinar
sobre política e ecossocialismo” 50 que tais livros foram escritos e publicados.
Até então, vemos que, o movimento ambientalista, nas suas diversas
vertentes, tem uma consistente produção intelectual. Podemos dizer que, os
movimentos ecológicos políticos surgem nos anos de 1960, mas as raízes de
uma crítica ambiental vieram de “longa duração” 51 na história brasileira.
Podemos verificar nas obras de José Augusto Pádua (2004) e Daniel
Porciuncula Prado (2011), que a construção de uma crítica ambiental tem seu
início no “Brasil Colônia, e, consequentemente, Império” 52, atingindo o período
republicano 53, perpetuando-se, em um primeiro momento, até os dias de hoje.
Claro que tais construções de crítica ambiental são fruto do seu próprio
contexto, não há continuísmo e nem linhagem, há mais lacunas e diferenças do
que semelhanças. Mas, que de certa maneira as gerações vindouras vão
sendo, de alguma forma, influenciadas pelos seus predecessores. Do Frei
Vicente de Salvador aos ecologistas da AGAPAN Rio Grande54, há a
construção de diversas modalidades de discursos ambientalistas. A crítica
ambiental, enquanto “rio” vem gerando diversos “afluentes”, ou seja, as
diversas correntes de críticos ambientais, que são focos de nossa análise.
49
(CARNEIRO, 2003, p. 21.) 50
(CARNEIRO, 2003, p. 15.) 51
Fernand Braudel 52
(PÁDUA, 1987 - 2004)
53 (Indícios nas obras de: PÁDUA, 2004. E, de: PRADO, 2011.)
54 Adelino Marques Mendes, Helton Bartholomeu Silva e Luiz Felipe Pinheiro Guerra.
43
3) CONTEXTO DE EMERGÊNCIA DO AMBIENTALISMO E DA AGAPAN
Com o desenvolvimento das sociedades humanas, ao longo do processo
histórico, observamos o surgimento de instituições como Estado, organizações
políticas, militares e religiosas, doutrinas ideológicas, modos de produção,
relações entre “bandos, castas, estamentos e classes sociais” 55, produção
científica e tecnológica, que por consequência geraram mutações sobre o meio
ambiente. Com o advento da cultura moderna século XV e a consolidação do
modo de produção capitalista séculos XVIII e XIX, através de suas várias
formas, desde o capitalismo comercial, sob a política econômica do
mercantilismo e/ou liberalismo até o atual capitalismo industrial e financeiro,
sob a política econômica estatal-desenvolvimentista e/ou neoliberal, acentuou,
vertiginosamente, as ações de transformação radical da natureza56.
Nesse sentido, a sociedade moderna e capitalista é calcada em um
modo peculiar da relação dos seres humanos com a natureza. A visão de
mundo moderna e capitalista, de um lado, vê a natureza como se fosse um
objeto, ou seja, um “baú” de recursos. Como se fosse uma fonte inesgotável de
matéria-prima. E, de outro lado, ela elege uma classe de seres humano, como
sendo, os senhores e os dominadores da natureza e do restante da
humanidade. Como se não houvesse nenhum limite nessa relação da
sociedade com a natureza. Conforme Gonçalves, isso tem implicações,
extremamente, graves na relação que os seres humanos estabelecem entre si
e com a natureza, gerando as bases da atual crise socioambiental57.
Dessa forma, a sociedade moderna e capitalista, vem sofrendo vários
tipos de análises críticas, que destacaríamos três correntes. A primeira
começou a ser feita pelos socialistas, anarquistas e comunistas. Essa crítica
apontou para a desigualdade social produzida pelo sistema. O segundo tipo de
crítica, foi feita pelos antropólogos. Eles questionavam e chamavam a atenção
para a expansão cultural ocidental europeia, que se autoproclama como
55
Respectivamente, pré-história, sociedades antiga, medieval e moderna. 56
Sociedade e Cultura no Rio Grande do Sul: ensaios históricos/ organizador Francisco das Neves Alves.- Rio Grande: Fundação Universidade Federal do Rio Grande, 2005 (Prado, Daniel. Por Uma eco-história a partir do ambiente do Rio Grande do Sul. op. cit. pg: 85). 57
Vídeo Educação Ambiental na História – SENAC – 2008. Depoimento de Carlos Walter Porto Gonçalves na Série Educador Ambiental e Teleconferências.
44
modelo de civilização, não respeitando outras formas de cultura. A “terceira
frente de crítica58” ganha expressão nos anos de 1960 a partir do
“ambientalismo59”. Esse movimento, não excluiu as outras formas de crítica, as
englobou, e, tenta superá-las. Sobretudo, a crítica do “movimento
ambientalista60” mostra que a sociedade moderna e capitalista tem limites na
sua relação com a natureza, não podendo ser generalizada. Gonçalves cita
como exemplo, a Europa e os Estados Unidos da América que consomem
oitenta por cento (80%) dos recursos naturais do planeta61. Como podemos
ver, é um modelo de desenvolvimento sustentado pelo uso abusivo e opulento
dos recursos naturais.
Nesse sentido, os anos 1960 marcaram a grande explosão do
movimento ambientalista. Dessa forma, o movimento, em suas manifestações
políticas pode ser analisado de diversas maneiras, tendo diversas influências,
e, dentre as quais destacamos duas: o grupo de pressão62 e o movimento
social63.
58
Porém, com suas raízes históricas no século XVIII, conforme Pádua (2004). 59
O ambientalismo ganhou contornos mais diversificados e principalmente políticos na década de 1960. O marco dessa ruptura foi o livro Primavera Silenciosa, de Rachel Carson. Rapidamente ele se tornou uma referência para o movimento ecológico, porque ia além da divisão clássica entre preservacionistas e conservacionistas e mostrava como o padrão de crescimento econômico provocava uma sequência de desastres ambientais. Foi nesse contexto que surgiu e expandiu-se um novo ambientalismo, apoiado em valores culturais, sociais, éticos e políticos, buscando a reformulação dos modelos de desenvolvimento vigentes. (SENAC, 2008, p: 11 – 18). 60
A década de 1960 assistirá, portanto, ao crescimento de movimentos que não criticam exclusivamente o modo de produção, mas, fundamentalmente, o modo de vida. E o cotidiano emerge aí como categoria central nesse questionamento. É claro que cotidiano e História não se excluem; todavia, há um deslocamento de ênfase: enquanto o movimento operário em sua vertente marxista dominante (social-democrata e leninista) insistia na “missão histórica do proletariado” que, uma vez vitorioso sobre a burguesia capitalista, resolveria então todos os problemas cotidianos, os movimentos que emergem na década de 1960 partem da situação concreta de vida dos jovens, das mulheres, das “minorias” étnicas, etc. para exigir a mudança dessas condições. É como se observássemos um deslocamento do plano temporal (História, futuro) para o espacial (o quadro de vida, o aqui e o agora) (Gonçalves, Carlos Walter Porto. Os (des)caminhos do meio ambiente. São Paulo: Contexto, 1993.).
61 Vídeo Educação Ambiental na História – SENAC – 2008. Depoimento de Carlos Walter Porto
Gonçalves na Série Educador Ambiental e Teleconferências. 62
O ambientalismo como grupo de pressão refere-se mais à prática empreendida pelos ambientalistas nos Estados Unidos. Nesse caso, o movimento atua dentro das instituições de governo, como o congresso americano, por exemplo, para fazer valer suas demandas ambientais. Simplificadamente, podemos dizer que essa forma constitui um lobby. (SENAC, 2008, p: 11 – 18). O lobby na perspectiva do ambientalismo, de acordo com PEREIRA (s/d): Nos anos 1980-1990, o caráter do movimento muda. Os ecologistas adotaram duas estratégias: ou faziam lobby, ou se organizavam em torno de um partido. José Lutzenberger teve uma atuação representativa com lobby, aproximando-se de políticos de diferentes
45
De acordo com SENAC (2008):
A principal diferença entre esses dois enfoques diz respeito a critica da ordem capitalista. Enquanto nos Estados Unidos as demandas de proteção ao meio ambiente não chegam a propor uma nova ordem, na Europa a ênfase à crítica ao modelo capitalista é muito mais contundente
64.
Nesse sentido, o foco desta análise é o movimento social, então é
importante destacarmos o contexto e as influências do movimento ecológico
político, aqui em questão.
De acordo com Carlos Walter Porto Gonçalves (1993):
A década de 1960 marca a emergência, no plano político, de uma série de movimentos sociais, dentre os quais o ecológico. Até então, o questionamento da ordem sócio-política e cultural estava por conta dos movimentos que – de diferentes maneiras – se reivindicavam socialistas (os social-democratas, os comunistas e mesmo os anarquistas). O movimento operário constituía o eixo em torno do qual se fazia a crítica teórica e prática da ordem instituída e o capitalismo aparecia como a causa de todos os males com que os homens se defrontavam. Toda uma cultura, cujas matrizes estão localizadas no século XIX, havia se desenvolvido no interior do movimento operário. No século XX, em alguns países do mundo, ocorrem revoluções que se proclamam socialistas e que vão tentar pôr em prática outros princípios de organização social. Ao mesmo tempo, no interior dos países capitalistas mais desenvolvidos, os trabalhadores conquistam uma série de direitos cujo atendimento, acreditava-se, seria impossível nos marcos daquela sociedade: jornada de trabalho de oito horas, semana de cinco dias, férias remuneradas de trinta dias, salário-desemprego, aposentadoria, assistência médica gratuita e educação pública, entre outros. O movimento operário começa, de certa forma, a se institucionalizar porque coube ao Estado gerir e administrar essas conquistas no interior dos países capitalistas, enquanto que nos Estados que se reivindicavam como socialistas os próprios trabalhadores vão perdendo, pouco a pouco, o controle das instituições criadas no período revolucionário, em virtude da crescente centralização e burocratização. É neste contexto, na década de 1960, que começam a emergir com feições autônomas uma série de
partidos. O lobby não implica a tomada de partido, pelo contrário, é a capacidade de influenciar quem dispõe de poder, independente de ideologia, ou afinidade partidária. Dessa maneira, Lutzenberger chegou a ser Secretário Especial de Meio Ambiente do governo Fernando Collor. (PEREIRA, Elenita Malta. A voz da primavera: As reivindicações do movimento ambientalista gaúcho (1971-1980). In: WWW.revistahistoriar.com, s/d.) 63
O ambientalismo como movimento social tem suas bases na Europa. Nesse continente, ele aparece como ator do processo político, oferecendo uma alternativa ao modelo de desenvolvimento capitalista, propondo uma nova ética e aproximando-se dos movimentos pacifistas e feministas (SENAC, 2008, p: 11 – 18). 64
(SENAC, 2008, p: 11 – 18).
46
movimentos, tais como os movimentos das mulheres, dos negros, os movimentos ecológicos, etc
65.
A década de 1960, período de diversas “manifestações de contestação
contracultural66”, marcou a emergência de uma série de movimentos sociais,
como os citados acima por Gonçalves. Nesse sentido, “problemas vinculados a
realidades específicas fizeram germinar esses movimentos ecléticos, como a
luta feminista, movimento pacifista, os direitos civis, a luta contra segregação
racial, a organização das minorias sexuais, o movimento estudantil...” 67. Nesse
sentido, desenharemos, a partir desse momento do texto, as influências dos
movimentos ambientalistas, de onde e porque emergiram e quais os fatos
desencadeadores de tais movimentos.
Neste contexto, a Guerra do Vietnã como acontecimento histórico
balizador do Ano de 1968 teve importante papel no surgimento do movimento
pacifista. A invasão vinha sendo desencadeada, algum tempo, primeiro pelos
franceses e depois pelos norte-americanos. A Guerra Fria desenhou as
diretrizes da Guerra do Vietnã. Tal guerra civil teve influência da bipolaridade,
sendo o Vietnã do Sul aliado dos EUA e o Vietnã do Norte aliado da URSS.
65
Gonçalves, Carlos Walter Porto. Os (des)caminhos do meio ambiente. São Paulo: Contexto, 1993. (p. 10)
66 Se o século 20, o mais movimentado da história, teve um ponto em torno das quais
transformações se concentraram como um exame, esse momento foi certamente 1968. No planeta todo, muitos estavam empolgados, outros horrorizados, com a perspectiva de questionar heranças antigas e sagradas: patriotismo, coragem militar, estrutura social e familiar, lealdades ideológicas e legados culturais. Os que se deixaram levar pelo entusiasmo daquele ano sentiam que, enquanto um mundo morria, outro estava nascendo. E queriam de toda forma estar entre os parteiros. O ano de 1968 é fruto da indignação das gerações nascidas após a Grande Guerra. Com a vitória da Tríplice Aliança, ou seja, das liberais democracias, os EUA tornaram-se referência após o armistício. No interior da Tríplice Aliança saiu duas superpotências que deram a dinâmica da Guerra Fria do pós-guerra mundial até a queda da URSS. Um fator importante para tal geração ser a locomotiva de dada dinâmica foi o que expõe o autor Reinaldo José Lopes. Ele diz que: Sua geração era a dos baby-boomers, jovens nascidos após o fim da Segunda Guerra, na maior explosão demográfica já ocorrida no Ocidente (o baby boom). Seus filhos- 75 milhões de pessoas só nos Estados Unidos- beneficiaram-se da prosperidade econômica nos Estados Unidos e na Europa Ocidental, tornando-se a geração mais bem educada e rica de seus países natais. Ainda, caracterizando o período, o Ano de 1968 significou uma ruptura de pensamento e o surgimento de um novo paradigma de ideias e concepção de mundo que irá influenciar os movimentos sociais de tal contexto, inclusive o ecológico. (LOPES, Reinaldo José. O Ano que Sacudiu o Mundo. Aventuras na História: para viajar no tempo. Abril: Edição 58, Maio de 2008. p. 24).
67 (GONÇALVES, 1993, Apud PRADO, 2011, p. 9.)
47
Desse modo, um acontecimento decisivo para contribuir com o
crescimento do movimento pacifista norte-americano, pode ser entendido
através da citação do autor Reinaldo Jose Lopes (2008), quando ele descreve
desta maneira:
Pode-se dizer que 1968 começou para valer nos Estados Unidos em 30 de janeiro. A data marca o Tet, o inicio do Ano Novo lunar vietnamita, escolhido pelos guerrilheiros comunistas vietcongues para o início de uma ofensiva suicida contra o Vietnã do Sul e seu aliado ocidental, os Estados Unidos. Com apenas 70 mil soldados (contra meio milhão de homens só entre as forças americanas), os vietcongues invadiram a embaixada americana, em Saigon e ocuparam dezenas de cidades em nome do Vietnã do Norte, controlado pelos comunistas - ao todo, os ataques vietcongues atingiram 36 cidades do sul do Vietnã entre 30 de janeiro de 1968 e junho do ano seguinte. A embaixada dos Estados Unidos foi retomada depois de um combate curto, mas bastante sangrento
68.
Ainda citando Lopes (2008):
Após a Ofensiva do Tet, os vietcongues perderam tantos homens que, na prática, deixaram de existir como força de combate independente. Não que isso tenha importado muito: a ofensiva foi, para os comunistas, uma vitória de propaganda estrondosa. A imprensa ocidental mostrou soldados americanos com aparência desorientada, morrendo aos montes, além de revelar imagens chocantes de guerrilheiros capturados e desarmados sendo mortos com tiros na cabeça. Foi o suficiente para que o movimento contra a guerra ganhasse força
69.
Do contexto descrito acima surgiu com muita expressão o movimento
pacifista norte-americano. Esse movimento mobilizou grande contingente de
jovens, principalmente, nas universidades norte-americanas. Invadiram prédios
e instalações que faziam pesquisa militar, visando fazer protesto contra as
68
(LOPES, 2008, p. 26) 69
(LOPES, 2008, p. 26)
48
forças armadas. Como diz Lopes (2008), “aqueles jovens preferiram serem
presos que servir o exército norte-americano em combate no Vietnã” 70.
Os Estados Unidos saíram da guerra em 1973 com a sua imagem muito
prejudicada em contexto mundial. Tal geração influenciada por ícones do Rock-
and-Rool questionavam o modo de vida norte-americano e lançavam as bases
para futuros movimentos sociais.
Paralelo ao movimento contra a guerra do Vietnã, o movimento negro
nos EUA tinha características pacifistas. Nesse sentido, tendo em vista o
contexto da Guerra do Vietnã tal manifestação dos negros norte-americanos
acabou aderindo às fileiras do “movimento contraguerra71”. O líder negro Martin
Luther King hesitou muito antes de abraçar tal causa. Como diz Reinaldo José
Lopes (2008), “depois de hesitar muito, o maior líder negro, Martin Luther King,
abraçara a luta contra a Guerra do Vietnã. A causa da dúvida era o medo que
os negros americanos fossem acusados de antipatrióticos” 72.
Surgiu, também, como importante balizador para o “Ano de 196873”, às
barricas na França no mês de maio. Tais manifestações pretendiam retirar do
poder Charles de Gaulle, o presidente francês. Reinaldo José Lopes (...) diz
que:
As manifestações no país começaram já em janeiro por motivos relativamente banais, ligados à falta de voz dos estudantes nas universidades e à exigência de dormitórios mistos na Universidade de Nanterre, no subúrbio de Paris. No entanto, a reação brutal da polícia
70
(LOPES, 2008, p. 27) 71
Existia um paradigma dentro do movimento negro e esse era estabelecido pela posição tomada pelos militantes de tal manifestação humana. De acordo com o autor Lopes: “Em 1965, King já tentara se engajar na luta pelo fim da Guerra do Vietnã, mas foi atacado por amigos e oposição, que não queriam que ele se metesse nessa briga. Mas, em 1968, King combinou a luta contra o racismo com o ativismo contra a guerra e as desigualdades sociais”. Nesse sentido, vimos o movimento negro combinado com o pacifismo anti-guerra na figura de Martin Luther King. (LOPES, 2008. p. 28 – 29).
72 (LOPES, 2008, p. 28).
73 James Green propõe que, “1968 foi um ano em que uma geração de estudantes e
trabalhadores nascidos durante e imediatamente após a Segunda Guerra desafiaram o status quo no mundo da Guerra Fria- particularmente as universidades, a polícia e o Exército (LOPES, 2008. p. 29)”.
49
aos protestos fez os universitários ficarem cada vez mais irredutíveis, sob a batuta de lideres como Daniel Cohn-Bendit, ou Dany, o vermelho (...)
74.
O que parecia ser uma manifestação banal desencadeou uma onda de
protestos que estavam questionando a sociedade e a cultura francesa. Nesse
sentido, tal influência teve papel imprescindível no surgimento do movimento
ecológico político. Lopes (2008) complementa a afirmação dizendo que, “Cohn-
Bendit e companhia, queriam mais do que apenas reivindicações políticas,
queriam que a conservadora sociedade francesa fosse renovada de cima a
baixo. Não é à toa que os rebeldes franceses de 1968 estão entre os melhores
criadores de slogans revolucionários da história” 75.
Outro fenômeno social que influenciou o surgimento do ecologismo foi à
chamada “Primavera de Praga”. Esse movimento foi uma tentativa de
democratizar o comunismo, e teve como mentor Alexander Dubcek. Conforme
Reinaldo José Lopes (2008):
Um dirigente tímido e afável tornou-se, em 5 de janeiro de 1968, primeiro-secretário do Partido Comunista da Tchecoslováquia. [...], ele ficaria conhecido como o arquiteto da Primavera de Praga - uma tentativa corajosa, mas ingênua, de criar uma sociedade comunista e democrática ao mesmo tempo, espécie de ‘desestalinização’ do sistema que predominava no país
76.
Ainda, de acordo com Reinaldo José Lopes (2008):
74
(LOPES, 2008, p. 30) 75
(LOPES, 2008, p. 30) 76
(LOPES, 2008, p. 34)
50
Essa liberalização incipiente gerou um apetite por mais reformas, e o primeiro-secretário se dispôs a responder a ele. ‘Dubcek decidira fazer uma reforma profunda na estrutura do país, com a intenção de remover todos os vestígios do autoritarismo que ele considerava uma aberração no sistema socialista
77.
Nesse sentido, Dubcek, o mentor da Primavera de Praga, propôs algo
mais radical e revolucionário para as reformas na Tchecoslováquia. Por outro
lado, ele acabou esbarrando nos dirigentes da URSS que ainda tinham
grandes influências do stalinismo.
Zdenek Nebrensky comentou em um post-scriptum no artigo de Reinaldo
José Lopes (2008), aquele disse que:
A Primavera de Praga pertence ao principal ponto de referência da história moderna tcheca. Muitos dos participantes do movimento político foram excluídos da sociedade. Eles estabeleceram milícias dissidentes, promoveram os direitos humanos e organizaram movimentos civis nos anos 70 e 80. Seus representantes estiveram envolvidos em diversas ações a partir daí, como o processo de democratização no começo dos anos 90. Mas eles ficaram sob o fogo e foram substituídos pela geração mais nova de recentes pragmáticos comunistas e tecnocratas. [...]. A Primavera de Praga de 1968 representa a parte integral do desenvolvimento da sociedade civil transnacional e da transformação da esfera pública no século 20
78.
Como podemos ver até o momento, o “movimento ecológico79” nasceu
em meio a uma ebulição de questionamentos, movimentos e propostas que
77
(LOPES, 2008, p. 34) 78
(LOPES, 2008, p. 35) 79
Para melhor se entender o ambientalismo, podemos dizer que, Ecologia se divide em quatro linhas de pensamento que se nomeiam por: Ecologia Natural (Ciências que estudam a natureza), Ecologia Social (estuda a relação seres humanos e natureza), Conservacionismo (de ação prática, visa à conservação das espécies vivas e dos ambientes naturais) e Ecologismo (constitui-se em um novo projeto de sociedade baseado na sustentabilidade econômica, justiça social e conservação ambiental). Essas são as correntes do pensamento que constitui o movimento ambientalista (LAGO, Antônio. O que é ecologia/ Antônio Lago, José Augusto Pádua. – São Paulo: Abril Cultural: Brasiliense, 1985. p. 13 – 43)
51
estavam sendo desencadeadas pelo mundo todo. O período de seu surgimento
é extremamente intenso, crise mundial, crise de valores culturais e
principalmente de sobrevivência das espécies habitantes da Terra, por causa
da larga produção de armamentos nucleares e a monstruosa industrialização
por parte das superpotências, as diversas manifestações contra o poder
vigente, o modelo de sociedade já não agradava a todas as facções e classes
sociais. Em fim, o ecologismo é fruto de um contexto em efervescência.
Conforme SENAC (2008):
...as inspirações ideológicas dos movimentos ecológicos podem ser analisadas como vinculadas aos movimentos de contracultura dos anos 1960 (movimentos pacifistas, hippies, feministas, punks, estudantis, beatniks, entre outros). Tais movimentos estiveram radicalmente envolvidos na crítica das sociedades industriais e dos costumes racionalizados da vida moderna. Foram acentuadamente enfatizados os limites do progresso enredado à exploração capitalista, que era vista em uma dupla conotação, ou seja, como exploração tanto dos recursos naturais como, também, do trabalho humano. O crescimento tanto do consumo de matérias-primas, como da própria população humana foram entendidos como desencadeadores de um colapso futuro das condições de vida no planeta. Estes discursos, divulgados amplamente pela contracultura ecológica foram considerados promotores da ideia de catástrofe ambiental, e como prognósticos de uma necessária inversão radical nos nossos estilos de vida e hábitos de consumo, pois a vida no planeta estaria em perigo
80.
Há um componente que unificou as lutas e os diferentes sujeitos que
gravitaram em torno dos movimentos ecológicos: o ideário contestador dos
modos de vida das sociedades modernas e capitalistas. Porém, muitos
interesses e expectativas divergentes estiveram em jogo nesse processo 81.
Segundo Carlos Walter Porto Gonçalves (1993):
80
(SENAC, 2008, p. 220 – 227.) 81
(SENAC, 2008, p: 220 – 227.)
52
O movimento ecológico tem essas raízes histórico-culturais. Talvez nenhum outro movimento social tenha levado tão a fundo essa ideia, na verdade essa prática, de questionamento das condições presentes de vida. Sob a chancela do movimento ecológico, veremos o desenvolvimento de lutas em torno de questões as mais diversas: extinção de espécies, desmatamento, uso de agrotóxicos, urbanização desenfreada, explosão demográfica, poluição do ar e água, contaminação de alimentos, erosão dos solos, diminuição das terras agricultáveis pela construção de grandes barragens, ameaça nuclear, guerra bacteriológica, corrida armamentista, tecnologias que afirmam a concentração do poder, entre outras
82.
No contexto internacional, temos a emergência de movimentos e ideias
contestatórias e contraculturais, porém, no Brasil das décadas de 1960/70, a
“ditadura militar83” “radicalizava a perseguição sobre os movimentos sociais,
mais particularmente sobre o sindical e estudantil” 84. Nesse contexto de
repressão e supressão “das liberdades de expressão e da livre organização,
viria a originar-se um movimento ecológico brasileiro” 85 tendo como influência
o movimento ecológico europeu.
De acordo com Carlos Walter Porto Gonçalves (1993):
No Brasil, o movimento ecológico emerge na década de 1970 em um contexto muito específico. Vivia-se sob uma ditadura que se abateu de maneira cruel sobre os diversos movimentos como o sindical e o estudantil. A nossa esquerda de então acreditava que o subdesenvolvimento do país se devia fundamentalmente à ação do imperialismo, que tinha como aliado interno a oligarquia latifundiária. Essa era a razão do atraso e da miséria em que vivia o povo brasileiro
82
(GONÇALVES, 1993, p. 12.)
83 A partir do governo do general Médici integrou-se plenamente nas novas regras
estabelecidas pelo arbítrio: o crescimento econômico acelerado, associado intimamente ao capital estrangeiro, o ufanismo, traduzido em várias medidas de pouco efeito (construção da estrada Transamazônica, estabelecimento do mar territorial de 200 milhas, etc.), e o predomínio impune da violência oficial contra as variadas oposições, sem excluir a agressão física e a brutalidade generalizada, em particular na luta contra os grupos de guerrilha urbana que então surgiram e que atuaram até 1973-74 (LOPEZ, Luiz Roberto. História do Brasil Contemporâneo. 5ª Ed. Porto Alegre, Mercado Aberto, 1990. p. 122 – 129.) 84
(GONÇALVES, 1993 Apud PRADO, 2011, p. 10.)
85 (GONÇALVES, 1993 Apud PRADO, 2011, p. 10.)
53
e, em decorrência, deveríamos nos bater por uma revolução anti-imperialista, de caráter popular, e com o apoio de setores da burguesia nacional. Assim, acreditava-se, estaria aberto o caminho para consolidar uma classe operária que pudesse empunhar a bandeira do socialismo
86.
Ledo engano, a burguesia nacional acabou se aliando a burguesia
internacional, e o Estado87, sob a égide dos militares e dos tecnoburocratas
civis, tomou pra si o papel gerenciador no processo de gestação de um projeto
societário estatal-desenvolvimentista, através de investimentos do capital
estrangeiro, da concentração de renda e o investimento nas empresas estatais
(Petrobrás e etc.).
Complementando esse raciocínio, citamos Carlos Walter Porto
Gonçalves, quando ele diz que:
86
(GONÇALVES, 1993, p. 13.) 87
O Estado brasileiro assumiu o projeto de industrialização e expandiu pelo território nacional seu programa “desenvolvimentista”. De acordo com Oliveira, “o papel do Estado é
„institucionalizar‟ as regras do jogo; [...]”. Conforme esse autor, a função do Estado era
“introduzir um novo modo de acumulação, qualitativa e quantitativamente distinto”. Dessa maneira, o Estado assumiu para si o papel de organizador, estabelecendo as condições para o desenvolvimento industrial. Nesse sentido, através da legislação trabalhista, fixava o salário-mínimo, e artificialmente criava um mercado de trabalho que possibilitou o acúmulo de capital, ou seja, a concentração de renda. A industrialização e a empresa capitalista tornaram-se o cerne do projeto do Estado brasileiro. O financiamento de tal projeto era subsidiado através do “preço social”, o preço de mercadorias fixado no mercado interno pelo aparato estatal-nacional a fim de gerar condições sustentáveis, manutenção, financiamento e expansão das empresas estatais capitalistas. O Estado assumiu o gerenciamento econômico e subsidiava o desenvolvimento infraestrutural para a acumulação e financiamento das empresas que se tornaram o centro da economia nacional. Era a chamada intervenção do Estado na economia, através da regulamentação e fixação de preços no mercado interno. Essa política permitia, assim, desenvolver as empresas industriais estatais brasileiras. O projeto dos distritos industriais desenvolveu-se com o auxílio desse mecanismo econômico, artificialmente instituído pelo Estado. Conforme Francisco de Oliveira, assiste-se à emergência e à ampliação das funções do Estado, num período que perdura até os anos Kubitschek e é retomado com os militares em 1964. Regulando o preço do trabalho, [...], investindo em infraestrutura, impondo o confisco cambial ao café para redistribuir os ganhos entre a classe capitalista, rebaixando o custo de capital na forma de subsídio cambial para as importações de equipamentos para as empresas industriais e na forma de subsídio cambial para as importações de equipamentos para as empresas industriais e na forma da expansão do crédito a taxas de juros negativas reais, investindo na produção (Volta Redonda e Petrobrás), o Estado operou continuamente transferindo recursos e ganhos para a empresa industrial, fazendo dela o centro do sistema (OLIVEIRA, Francisco de. A economia brasileira: crítica à razão dualista. Petrópolis: Vozes, 1988. p. 16)
54
A FIESP – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo foi a grande articuladora dessa aliança desde a década de 50. Acusando a esquerda de “nacionalismo demagógico-populista”, a FIESP vai rotular de “verdadeiro nacionalismo” aquele que propõe o desenvolvimento da nação abrindo, assim, as portas do país à penetração do capital estrangeiro para que venha a contribuir para o seu desenvolvimento. Verifica-se, portanto, um deslocamento da consideração da questão nacional do plano das condições sociais – como era colocado pela esquerda – para um plano técnico-econômico desenvolvimentista. A burguesia consegue atrair não só os investimentos estrangeiros como também o apoio da tecnoburocracia civil e, sobretudo, militar. A partir da Junta Militar de 1969 e do governo Médici, assiste-se à consolidação desse regime autoritário e desenvolvimentista que vai mostrar, contrariando a crença da esquerda até então, que ao imperialismo não interessava a não industrialização do país. Será justamente sob a égide do capital internacional que o Brasil alcançará o maior desenvolvimento industrial de sua História. Esse desenvolvimento se fazia ainda num país onde as elites dominantes não tinham por tradição respeito seja pela natureza, seja pelos que trabalham. A herança escravocrata da elite brasileira se manifestava numa visão extremamente preconceituosa em relação ao povo, que seria “despreparado”. Quanto ao latifúndio, bastava o desmatamento e a ampliação da área cultivada para se obter o aumento da produção e isto nos levou a uma tradição de pouco respeito pela conservação dos recursos naturais, a não ser nas letras dos hinos e nos símbolos de nacionalidades
88.
Ao final da década de 1970, as vivências de exilados políticos irão se
unificar com experiências brasileiras. E, a partir desse fenômeno destaca-se a
entidade AGAPAN do Estado do Rio Grande do Sul. Fundada89 por José
Lutzemberger, Nicolau Campos (discípulo de Henrique Luiz Roessler – União
Protetora da Natureza), Augusto Carneiro e outros, a “AGAPAN90” iniciou sua
88
(GONÇALVES, 1993, p. 13 – 14) 89
No Rio Grande do sul, em 1971 foi criada a Associação Gaúcha de Proteção à Natureza - AGAPAN, tendo como principais fundadores o Agrônomo José Lutzenberger, o Advogado Augusto Carneiro e o casal Juarez Romano-Hilda Zimmermann, entre outros. Citada por alguns autores como a principal entidade ambiental brasileira da década de 1970, a AGAPAN foi protagonista de diversas lutas pelo meio ambiente... (PEREIRA, Elenita Malta. A voz da primavera: As reivindicações do movimento ambientalista gaúcho (1971-1980). In: WWW.revistahistoriar.com, s/d. p. 9) 90
A questão filosófica da AGAPAN: Augusto Cunha Carneiro lembra a conferência inicial de Lutzenberger, [...], Por uma ética ecológica, como marco do debate em âmbito filosófico. Nela, o Agrônomo defende a metáfora de que a humanidade é como uma nave espacial, perdida na imensidão do espaço, e que o planeta Terra é como uma joia rara, pois não há outro igual no sistema solar ao qual pertence. Ele compara o cuidado do astronauta com sua cápsula espacial, e o cuidado dos humanos com o planeta que habitam. É necessário recordar que a época em que o artigo foi escrito, 1971, logo após a viagem do homem à Lua, em 1969, e o tema estava em voga, inclusive havia muita empolgação com a “conquista do espaço”. Para Lutzenberger, o homem deveria tentar chegar a sistemas de equilíbrio dinâmico, nas questões econômicas, tecnológicas e políticas, o que impediria o crescimento ilimitado do consumo e o
55
militância política denunciando a degradação por parte de uma empresa de
celulose, que instalou suas dependências as margens do Rio Guaíba na
grande Porto Alegre (RS) 91.
Por ocasião da fundação da AGAPAN, em 27 de abril de 1971, foi
editado um Programa de Luta, no qual consta que a entidade defenderia “a
natureza ameaçada”, nas formas de fauna, vegetação, solo, atmosfera, águas,
e luta pela salvação da humanidade da destruição, pela promoção da ecologia
como ciência da sobrevivência92.
De acordo com Elenita Malta Pereira (s/d):
...a AGAPAN promoveria o “combate” ao massacre de animais e à caça indiscriminada, às devastações das vegetações e às queimadas, ao uso exagerado dos meios mecânicos contra o solo e à toda erosão provocada ou facilitada, à poluição do ar causada pelas indústrias e veículos, à poluição dos cursos d’água pelos resíduos industriais e esgotos não tratados, do uso indiscriminado de inseticidas, fungicidas, herbicidas, raios ionizantes, sem a devida proteção às destruições desnecessárias de belezas paisagísticas. Pregava também
a luta por uma nova moral ecológica93
.
A seguir, a AGAPAN constituiu um núcleo na cidade do Rio Grande
fundado por Luiz Felipe Pinheiro Guerra, Helton Bartholomeu Silva, Adelino
Marques Mendes e outros ecologistas que no município se localizavam. A partir
desse fato, criou-se uma frente de luta ambiental na localidade. Com a criação
da delegacia local, localizada no Bairro Getúlio Vargas (BGV), AGAPAN
encabeçou as lutas ecológicas locais, além das regionais, e dentre alguns
mecanismo de denúncia e formação de opinião pública, surgiu uma prática de
crítica ambiental, as chamadas: Crônicas Ecológicas que foram influências pelo
modelo de crônica de Henrique Luiz Roessler.
Através das Crônicas Ecológicas, os ecologistas teciam as mais
variadas criticas ambientais, sobre os assuntos referentes à questão ambiental
esbanjamento dos recursos naturais. A moderação levaria a humanidade a gastar somente o que pudesse ser reposto. Mais uma vez utilizando metáforas, numa analogia econômica, ele decreta: “temos que aprender a viver dos juros de nosso capital, não podemos comer o capital. Se roermos a substância, acabaremos com nosso próprio futuro e tornaremos impossível a vida de nossos descendentes” (PEREIRA, s/d. p. 15). 91
(GONÇALVES, 1993, p. 16.) 92
(PEREIRA, s/d. p. 13.) 93
(PEREIRA, s/d. p. 13.)
56
da/na cidade e região. Em ritmo da presente análise, focou-se o estudo da
crítica ambiental ao Distrito Industrial de Rio Grande (DIRG) pelo motivo de
estarmos vivenciando algo semelhante nos últimos anos, ao acontecido na
década de 1970.
Sob a égide dos Governos Militares, anos de 1970, Rio Grande recebeu
incentivo financeiro para a ampliação de seu complexo portuário-industrial e
universitário. As obras feitas com a intenção de fomentar o crescimento
econômico se converteram na criação de um potente distrito industrial (Distrito
Industrial de Rio Grande - DIRG) na qual os impactos, social e ambiental, foram
de nocivas distorções na sociedade e na natureza da cidade do Rio Grande
(RS) e região.
O crescimento econômico além da modernização da economia, da
geração de empregos e renda, também, tem seus aspectos negativos. É
necessário muito cuidado com os ambientes naturais, Rio Grande está alocada
em uma zona estuarial costeira, com grande riqueza ecossistêmica 94.
De acordo com Vieira e Rangel (1983), a posição geográfica de Rio
Grande é de grande importância ecológica. O meio ambiente apresenta um
notável cenário de vida a partir da consideração da sua feição estuarial e
costeira95.
Ainda conforme Vieira e Rangel (1983):
Os ambientes estão profundamente ligados por condições naturais, favorecendo a presença de extraordinários ecossistemas. A vida que se desenvolve nos dois ambientes repousa nas trocas permanentes da matéria e energia. É na verdade uma parte da biosfera
em circuito constante e de certo modo fechado96
.
Da forma como foi desenvolvido, na década de 1970, o polo industrial,
se tornou terrível foco de poluição ambiental, com a emissão de resíduos
94
VIEIRA, Euripedes Falcão. Rio Grande geografia física, humana e econômica / Euripedes Falcão Vieira e Susana Regina Salum Rangel. Porto Alegre, Sagra, 1983. (p. 155) 95
(VIEIRA e RANGEL, 1983, p.155.) 96
(VIEIRA e RANGEL, 1983, p. 155.)
57
tecnogênicos, dentre eles, emissões de efluentes líquidos, emissões
atmosféricas e resíduos sólidos gerados pela produção industrial.
Na década de 1970, em Rio Grande, em interação direta ao rico
ecossistema costeiro, nas palavras de Vieira e Rangel (1983):
...algumas das principais fontes poluidoras já [operavam] em Rio Grande, liberando produtos tóxicos de elevado grau de nocividade: gás carbônico, óxido de carbono, bióxido de enxofre, diversos compostos químicos ausentes em estado natural, substâncias sólidas em suspensão no ar atmosférico, produtos liberados do refino de petróleo, mercúrio, chumbo, cádmio e o perigoso cancerígeno benzapireno. Em termos do processo de urbanização, funcionam como agentes principais da poluição: os transportes (rodoviários, ferroviários,
hidroviário-marítimos) e as empresas industriais97
.
Portanto, eis o contexto histórico da qual emergiu o movimento
ambientalista e a AGAPAN. Procuramos nesse capítulo fazer um apanhado,
breve, do contexto histórico das instituições criadas na história. Depois, discutir
a ideia de natureza moderna e capitalista. Lançamos olhares sobre as três
grandes frentes de críticas a sociedade moderna e capitalista no século XX. Na
sequência, elucidamos o surgimento dos movimentos de contracultura e o
contexto da qual emergem e suas influências no movimento ambientalista. E, a
partir disso, brevemente, procuramos evidenciar alguns aspectos, correntes e
influências do movimento ambientalista. Também, mostramos um pouco do
contexto nacional e o processo histórico da qual emergiu o movimento
ambientalista no Brasil até a fundação da Associação Gaúcha de Proteção ao
Ambiente Natural no Estado do Rio Grande do Sul.
97
(VIEIRA e RANGEL, 1983, p. 157)
58
4) PREVISÃO DAS FONTES E PLANO PRELIMINAR DE CONTEÚDOS
Para complementar o presente texto, utilizaremos como matéria-prima o
conjunto de textos escritos pela AGAPAN chamados, crônicas ecológicas,
entre os anos de 1975 a 1985, aproximadamente. Até agora, foram
encontradas 114 crônicas publicadas no diário local de nome Jornal Agora. E,
dessas 114 crônicas já foram na fase de “preparação das fontes” 19 crônicas
ecológicas que estão em anexo do presente texto.
A coleção completa do Jornal Agora se encontra à disposição no acervo
do próprio jornal, na cidade do Rio Grande (RS). Os assuntos abordados nas
crônicas envolvem crítica ao distrito industrial do município do Rio Grande
(RS), temas ambientais de repercussão global e local, retratos da poluição
industrial no município, práticas educativas, denúncias de impactos
socioambientais e propostas para soluções dos problemas.
Articulado com a fonte, crônica ecológica, existe ampla produção literária
que discorre sobre a problemática socioambiental. Nos, encontramos em
continuo processo de levantamento bibliográfico e análise das crônicas
ecológicas seguindo as orientações da metodologia da análise de conteúdo,
nesse momento estamos na etapa de preparação das fontes já evidenciando
alguns temas discutidos nas crônicas.
Os conteúdos a serem desenvolvidos por essa investigação apresentam
como proposta o esquema abaixo. Dessa forma, levando-se em consideração
as prováveis alterações que serão realizadas ao longo da construção do texto
da dissertação, de acordo com o desenvolvimento das respostas das fontes,
sob a observância, aquiescência, sugestões da orientação e banca de
qualificação.
Elaboração, estudo e reflexão sobre os conceitos teóricos e a metodologia
que nortearam o processo de pesquisa e a escrita da dissertação;
Discussão bibliográfica sobre o tema, ampliando-se a justificativa de
pertinência do assunto e da importância da atualidade deste debate;
59
Justificativa das fontes para a investigação e a posterior análise das
mesmas fontes, evidenciando através das crônicas a estruturação do
pensamento, da crítica e das práticas ambientais, os problemas de
degradação à época e os conflitos entre a “ideia de progresso” e o
ambientalismo.
A partir destes itens, podemos conceber o plano preliminar de conteúdos
em formato de capítulos, projetando a estruturação da futura dissertação:
Introdução- Exposição da trajetória do pesquisador à emergência do tema.
Capítulo I – Metodologia e Proposta da Pesquisa: Contribuições de um
Historiador para o campo da Educação Ambiental
Capítulo II- Contexto de Emergência do Ambientalismo e da AGAPAN
Capítulo III – Uma Contribuição ao Estudo da História Ambiental dentro do
campo da Educação Ambiental.
Capítulo IV - Discussão da problemática ambiental (práticas educativas,
denúncias e lutas) a partir das crônicas ecológicas da AGAPAN núcleo do
Rio Grande (RS).
Conclusão
Anexos (conjunto de crônicas ecológicas reproduzidas na íntegra).
60
BIBLIOGRAFIA
ALVES, Magda. Como escrever teses e monografias/Magda Alves. – Rio de
Janeiro: Elsevier, 2003.
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Trad. Luís Antero Reto e Augusto
Pinheiro. Lisboa: Edições 70, 2002.
CARDOSO, Ciro Flamarion S. Cardoso. Uma Introdução à História. 3ª Ed.
Brasiliense, São Paulo, 1983.
CARNEIRO, Augusto Cunha. A história do ambientalismo / Augusto Cunha
Carneiro. – Porto Alegre: Editora Sagra Luzzatto, 2003.
Domínios da historia: ensaios de teoria e metodologia/ Ciro Flamarion
Cardoso, Ronaldo Vainfas (orgs.). - Rio de Janeiro: Campus, 1997.
GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Os (des)caminhos do meio ambiente.
São Paulo: Contexto, 1993.
Introdução à História da Comunicação/organizadores Pablo Laignier e
Rafael Fortes. Rio de Janeiro: E-papers, 2009.
LAGO, Antônio. O que é ecologia/ Antônio Lago, José Augusto Pádua. – São
Paulo: Abril Cultural: Brasiliense, 1985.
LOPEZ, Luiz Roberto. História do Brasil Contemporâneo. 5ª Ed. Porto
Alegre, Mercado Aberto, 1990.
61
LOPES, Reinaldo José. O Ano que Sacudiu o Mundo. Aventuras na História:
para viajar no tempo. Abril: Edição 58, Maio de 2008.
MORAES, Roque. Análise de conteúdo. Revista Educação, Porto Alegre, v.
22, n. 37, p. 7-32, 1999.
OLIVEIRA, Francisco de. A economia brasileira: crítica à razão dualista.
Petrópolis: Vozes, 1988.
PÁDUA, José Augusto. Um sopro de destruição: pensamento político e
crítica ambiental no Brasil escravagista, 1786 – 1888/José Augusto Pádua.
– 2ª Ed. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004.
PRADO, Daniel Porciúncula. A figueira e o machado: uma história das
raízes do ambientalismo no sul do Brasil e a crítica ambiental de Henrique
Roessler / Daniel Porciúncula Prado, Editora FURG, Rio Grande, 2011.
PRADO, Daniel. Por Uma eco-história a partir do ambiente do Rio Grande
do Sul. In: Sociedade e Cultura no Rio Grande do Sul: ensaios históricos/
organizador Francisco das Neves Alves.- Rio Grande: Fundação Universidade
Federal do Rio Grande, 2005.
Vídeo Educação Ambiental na História – SENAC – 2008. Depoimento de
Carlos Walter Porto Gonçalves na Série Educador Ambiental e
Teleconferências.
VIEIRA, Euripedes Falcão. Rio Grande geografia física, humana e
econômica / Euripedes Falcão Vieira e Susana Regina Salum Rangel. Porto
Alegre, Sagra, 1983.
62
ANEXOS
Recommended