CELAM – Conselho Episcopal Latino Americano Seção Juventude - SEJ CIVILIZAÇÃO DO AMOR: TAREFA E ESPERANÇA ORIENTAÇÕES PARA A PASTORAL DA JUVENTUDE LATINO- AMERICANA EDITORA PAULINAS
1. CELAM Conselho Episcopal Latino Americano Seo Juventude -
SEJ CIVILIZAO DO AMOR: TAREFA E ESPERANA ORIENTAES PARA A PASTORAL
DA JUVENTUDE LATINO- AMERICANA EDITORA PAULINAS
2. Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) (Cmara
Brasileira do Livro, SP, Brasil Conselho Episcopal Latino-Americano
CELAM. Seo Juventude. Civilizao do amor: tarefa e esperana:
orientaes para a pastoral da juventude Latino-Americana / Seo
Juventude; [traduo Hilrio Dick]. So Paulo: Paulinas, 1997.
(Documentos da Igreja na Amrica) Bibliografia ISBN 85-7311-776-1
1.Amor 2.Igreja-Trabalho com jovens3.Teologia Pastoral
I.Ttulo.II.Srie 97-2429 CDD-253-7 ndices para catlogo sistemtico:
1. Jovens : Evangelizao: Cristianismo 253.7 2. Pastoral da
juventude: Cristianismo 253.7 Digitalizado por
www.pjsorocaba.com.br TMotta Ttulo original da obra CIVILIZACIN DEL
AMOR TAREA Y ESPERANZA CELAM Conselho Episcopal Latino-Americano /
Seo Juventude, 1995. Traduo Pe.Hilrio Dick Reviso e preparao dos
originais Jonas Pereira dos Santos Paulinas Av. Indianpolis, 2752
04062-003 So Paulo SP http://www.paulinas.org.br
[email protected] Telemarketing Fone: 0800-157412 Pia
Sociedade Filhas de So Paulo So Paulo 1997
3. A Pastoral da Juventude do Brasil faz chegar at voc, na
verso em portugus, este precioso livro Civilizao do amor: tarefa e
esperana, com orientaes para uma pastoral da juventude
latino-americana. So quatro grandes captulos o Marco da Realidade,
o Marco Doutrinal, o Marco Operacional e o Marco Celebrativo que
nos brindam com uma riqueza impressionante de elementos,
permitindo-nos reavaliar, reorganizar, reafirmar e redescobrir
nossas opes pastorais e pessoais. A PJ do Brasil, com a 11
Assemblia Nacional em julho de 1995, redefiniu sua misso e
organizao. Est em suas mos, de fato, o marco referencial da
Pastoral da Juventude Latino-Americana e Caribenha e que deve ser o
grande horizonte que orienta tambm a ao, a formao e a
espiritualidade da Pastoral da Juventude do Brasil. Convido voc a
mergulhar nessas pginas e descobrir a riqueza e a novidade da
experincia vivida pela pastoral da juventude deste nosso
continente: Ptria Grande, Amada Terra, Amerndia, Amerafro, Amrica
Jovem. Lembro, com saudade e reconhecimento, de Juan Ramn, Daniel
Bassano, Hilrio, Derry, Alejo, Germn, Pe.Horcio Penengo, na poca
assessor da Pastoral da Juventude Latino-Americana, representaram a
PJ das quatro regies do continente, trabajaran duro y nos regalaran
este maravilhoso documento1 . Que Deus os recompense por este
servio. E termino com uma prece: Esprito Santo de Deus, ilumine a
Pastoral da Juventude do Brasil e todas as pessoas que amam os
jovens, para que se convenam de que a Civilizao do Amor tarefa e
esperana a ser abraada por todos. Maria, me da juventude, d-nos tua
audcia e ternura neste bela e desafiante misso. Amm. Com carinho,
Pe.Vilson Basso,dehoniano Assessor Nacional da PJ do Brasil 1
Trabalharam duro e nos presentearam este maravilhoso documento.
Apresentao da edio brasileira
4. Foi com satisfao que aceitei o convite de escrever a
apresentao da edio brasileira deste livro, Civilizao do Amor,
tarefa e esperana. O livro fruto de uma evoluo importante do
trabalho pastoral da Igreja latino- americana com jovens. Tive o
privilgio de participar da articulao inicial da pastoral da
juventude latino-americana nos anos 80, como assessor nacional do
Brasil. A mola mestra da evoluo desse processo foi, e continua
sendo, o encontro anual de responsveis nacionais da pastoral da
juventude. A presena contnua de cerca de vinte pases fez dessa
pastoral talvez a mais dinmica e comprometida do continente. No era
um secretrio-executivo no CELAM fazendo tudo sozinho. Todos
assumiram a caminhada; todos participaram das decises mais
importantes. No incio, o desnvel de clareza do projeto e
metodologia de pastoral. Como em todo incio de caminhada, houve
tenses e conflitos. Depois de vrios anos afastados dos encontros
latino-americanos, fui convidado para assessorar o XI Encontro em
Porto Rico, em 1996. Foi uma surpresa agradvel perceber os
delegados de todos os pases participando em p de igualdade e
comungando o mesmo projeto pastoral. No havia mais as tenses e
conflitos anteriores. Gradualmente, todos haviam chegado ao mesmo
nvel de reflexo pastoral. Uma mstica comum uniu bispos, padres,
irms, leigos adultos e jovens em seu entusiasmo e esforo por
encontrar caminhos mais eficazes de evangelizao desse grupo social
que tem uma presena-chave no continente. Desde o incio, a Pastoral
da Juventude do Brasil deu uma contribuio importante. No conheo
outra pessoa na Amrica Latina que tenha feito uma caminhada to rica
e que tenha conseguido aprofundar sua reflexo sem sofrer quebras de
continuidade. No conheo tambm outro continente que tenha uma
experincia pastoral to significativa. Como expresso desse avano em
termos de clareza de um projeto consequente de pastoral da
juventude foi publicado, em 1987, o livro Pastoral da juventude,
sim civilizao do amor. Essa obra foi logo traduzida para o
portugus. Participei da equipe de redao desse livro. Foi um grande
sucesso e teve papel importante para solidificar os avanos feitos.
Mas a velocidade das mudanas culturais, polticas, econmicas,
sociais e religiosas criou a necessidade de uma nova edio. A
juventude de hoje no mais a juventude dos anos 80. Nasceu este
livro, Civilizao do amor, tarefa e esperana, como resposta pastoral
aos novos desafios. Os membros da equipe de redao so todos
conhecidos pelo seu nvel de reflexo e experincia de trabalho
pastoral com jovens. A bibliografia no final do livro deixa claro
que foram recolhidas as melhores experincias e reflexes no
continente. O livro apresenta algo que frequentemente falta aos
assessores e coordenadores de pastoral da juventude: uma viso
global. Muitos lderes se fixam em vises parciais e so pouco
eficientes porque lhes falta a viso do conjunto. Todos os temas
tratados no livro so importantes; no entanto, gostaria de chamar a
ateno para a riqueza de idias na anlise da realidade, as mudanas
culturais, a pedagogia, as etapas dos grupos e a assessoria.
Trata-se de uma leitura importante para quem quer fazer um trabalho
pastoral srio com jovens e caminhar com a Igreja da Amrica Latina.
A Pastoral da Juventude do Brasil deu uma contribuio importante
para essa caminhada, mas tambm tem muito a aprender. Hoje uma
crescente conscincia latino-americana integra nossa pastoral na
tarefa da construo da Ptria Grande. Somos o nico continente
catlico, e, a partir desta f, a juventude chamada a construir a
Civilizao do Amor, que tanto uma tarefa quanto uma esperana. Jorge
Boran Apresentao da edio brasileira
5. Na aurora do Terceiro Milnio, os jovens ocupam um lugar
especial no corao da Igreja. No exagerado dizer que na gerao jovem
de hoje se inscreve o futuro da humanidade. O que eles e elas so,
hoje, assim sero a Igreja e a sociedade do prximo milnio. o que
intui, certeiramente, o Santo Padre ao dar aos jovens e s jovens um
lugar to destacado em seu pontificado. Com eles celebra encontros e
jornadas. A eles dedica tempo, cartas e mensagens. E, quando se
encontra no meio da algaravia juvenil, o papa fala sua linguagem e
se faz muito sensvel a suas preocupaes e expectativas. Na Igreja da
Amrica e do Caribe, os jovens so opo preferencial. Muito se faz
para servi-los e h muitssimo ainda a ser feito. No em vo que a
populao jovem nos pases costuma aproximar-se de 25% do total. Este
nosso orgulho e nosso desafio: ser um continente jovem. Portanto,
com um futuro de esperana. Em seu servio s Conferncias Episcopais,
o CELAM tem procurado traduzir essa opo em encontros e publicaes
muito valorizadas. Entre as publicaes destaca-se o livro Pastoral
da juventude, sim civilizao do amor, com uma enorme difuso nos
diversos pases da Amrica Latina e do Caribe. Devido a seu impacto,
a Seo Juventude do CELAM, ouvido o parecer das Comisses Nacionais
de Pastoral da Juventude, decidiu reunir um grupo de especialistas
neste campo para atualiz-lo e transform-lo num obra ainda mais
completa. a que estamos apresentando agora. Seu ttulo semelhante ao
primeiro: Civilizao do amor, tarefa e esperana. Nela se poder
encontrar desde uma correta tipografia da juventude de nossos pases
at uma proposta de espiritualidade jovem que, sem dvida, ser de
grande ajuda. Dada a grande envergadura desta obra, desejo
agradecer explicitamente, em nome do CELAM, a todos que nela
colaboraram, sob a orientao do Pe. Hilrio Penengo, que acaba de
concluir sua misso na Seo Juventude. Todos eles so pastores e
leigos conhecidos por sua contribuio pastoral da juventude em seus
respectivos pases e na Amrica Latina. A cada um deles, nossa
gratido e bno. Estou certo de que essa gratido e bno aderiro,
alegres, todos os que utilizarem este livro. D.Jorge Enrique Jimnez
Carvajal Bispo de Zipaquir Secretrio-geral do CELAM Apresentao
6. H quase vinte anos o Conselho Episcopal Latino-Americano
(CELAM) criava a Seo Juventude. Iniciava-se, ento, um longo caminho
de animao e de servio evangelizao da juventude do continente. Os
esforos iniciais por conhecer os problemas e tendncias do mundo
jovem e fazer uma reflexo teolgica e pastoral que fornecesse
orientaes claras para implementar uma Pastoral da Juventude Orgnica
viram-se reforados a partir de 1983, quando comearam a se realizar
os Encontros Latino-Americanos de Responsveis Nacionais pela
Pastoral da Juventude. Com o tempo, estes Encontros foram se
tornando um espao privilegiado de comunho e participao para bispos,
sacerdotes e jovens que trabalham na Pastoral da Juventude da
Igreja Latino-Americana. A troca de experincias e a reflexo a que
esses Encontros deram ensejo permitiram a progressiva elaborao de
um proposta global de pastoral da juventude, construtora da
civilizao do amor; uma pedagogia para acompanhar os processos de
formao humana e crist dos jovens; uma metodologia adequada para o
trabalho de grupo; uma espiritualidade para o seguimento de Jesus e
uma organizao participativa que tm dinamizado a ao evangelizadora
das Comisses Episcopais de Pastoral da Juventude dos pases do
continente. Um dos frutos mais visveis desse processo foi a
publicao, em abril de 1987, do livro Pastoral da Juventude, sim
civilizao do amor. Sua redao, efetuada aps um longo e participativo
processo de recopilao e sistematizao de colaboraes e experincias,
favoreceu a formulao e difuso da proposta da Pastoral da Juventude
Latino-Americana, promoveu uma maior unidade de critrios e
impulsionou decisivamente o trabalho comum e a organizao. Traduzido
para o portugus e o francs, reeditado em sete pases, com uma
tiragem superior a 27 mil exemplares, conhecido popularmente como o
livro verde ou o livro laranja, em aluso cor da capa de algumas de
suas edies mais difundidas, passou a ser referncia obrigatria para
o trabalho da pastoral da juventude. A reflexo dos anos posteriores
continuou aprofundando aspectos apenas intudos ou pouco
desenvolvidos no livro anterior. Os processos de educao na f, a
cultura jovem, a assessoria, a espiritualidade e as pastorais
especficas de juventude foram, entre outros, alguns dos captulos
que amadureceram e consolidaram a reflexo e a proposta. Ultimamente
fez-se sentir, com fora cada vez maior, o reclamo dos agentes de
pastoral quanto necessidade de contar com uma edio atualizada, que
recolhesse as novas contribuies refletidas e servisse para apoiar o
trabalho de formao dos coordenadores, animadores e assessores e
para orientar melhor os mltiplos esforos da pastoral da juventude
que se realizaram no continente. A Seo Juventude acolheu essa
solicitao e encaminhou um proposta de trabalho inspirada nas mesmas
caractersticas de ampla participao, de coleta e de sistematizao das
contribuies e experincias com que se preparou a publicao anterior.
Os participantes do 10 Encontro Latino-Americano de Responsveis
Nacionais por Pastoral da Juventude, realizado em Mogi das Cruzes
(Brasil), de 8 a 15 de outubro de 1994, responderam favoravelmente
a uma consulta realizada pela Seo Juventude e propuseram uma lista
de nomes de pessoas capacitadas para a redao dos diferentes
captulos. Com essas propostas, a Seo integrou uma Comisso Redatora
de assessores leigos e sacerdotes, representativa das quatro
Regies, tendo sido convidados a participar o Pe. Daniel Bazzano,
diretor do Instituto Paulo VI de Montevidu (Uruguai); o Sr. Juan
Ramn Crdova, secretrio-executivo da Comisso Episcopal de Juventude
de El Salvador e assessor regional de Pastoral da Juventude do
Mxico e da Amrica Central; o Pe.Hilrio Dick SJ, do Instituto de
Pastoral da Juventude de Porto Alegre (Brasil); o Pe. Derry Healy,
ex-coordenador da Comisso Nacional de Pastoral da Juventude do
Chile; o Pe. Alejandro Londono SJ, da Casa de la Juventud de Santaf
de Bogot (Colmbia); o Pe. Germn Medina, assessor diocesano de
Pastoral da Juventude de Higuey (Repblica Dominicana), e o Pe.
Feliciano Rodrguez, assessor diocesano de Pastoral da Juventude de
Caguas (Porto Rico). Sob a coordenao do P. Horcio G. Penendo SDB,
secretrio-executivo da Seo Juventude, do CELAM, a Comisso Redatora
reuniu-se na sede do prprio Conselho Episcopal Latino-Americano em
Santaf de Bogot Prefcio
7. (Colmbia), de 23 a 30 de abril de 1995. Os participantes
apresentaram suas propostas de trabalho, chegou-se a um esquema
geral e cada um se dedicou redao do captulo que lhe havia sido
designado. As redaes formuladas foram imediatamente revisadas,
corrigidas, melhoradas e complementadas por todos, um longo
processo que se iniciou naquela semana e se completou vrias semanas
depois, at se chegar presente redao final. Durante esse perodo os
textos redigidos foram submetidos apreciao de outros agentes
pastorais nos diversos pases, com pedido de opinies, contribuies e
sugestes. O livro , portanto, um trabalho coletivo de muitas
pessoas. Este , talvez, seu maior mrito. No se trata de reflexes
tericas nem individuais, mas de experincias vividas, recolhidas,
partilhadas, organizadas e sistematizadas para serem oferecidas
como orientao para a ao pastoral. No , por conseguinte, um livro
terminado. Como se chegou at aqui, deve-se continuar caminhando,
buscando, aprofundando, abrindo horizontes e descobrindo dimenses
novas na sempre apaixonante tarefa da evangelizao dos jovens
latino-americanos. Sua apresentao encerra, de algum modo, o perodo
que vai de 1991 a 1995, da Seo Juventude do CELAM. Queremos
expressar um enorme agradecimento a todos os que, de uma forma ou
outra, redigindo, corrigindo, apoiando, estimulando e manifestando
suas expectativas pela publicao, tornaram possvel transformar esse
sonho em realidade. Oferecemo-lo com muito carinho a todos os
agentes da Pastoral da Juventude Latino-Americana e, em especial,
aos que, silenciosamente, em todos os rinces do continente, fazem
acontecer, dia a dia, a pastoral da juventude. Neles pensamos
permanentemente durante esses meses de trabalho. Eles so, na
verdade, os primeiros destinatrios do esforo que realizamos.
Acreditamos que ser uma contribuio para tornar mais efetiva a opo
preferencial pelo jovens e, especialmente, para apresentar uma
proposta evangelizadora sria, capaz de responder s exigncias das
mudanas culturais do mundo de hoje, entusiasmar os jovens no
seguimento de Jesus e tornar real a to desejada civilizao do amor.
P.Horcio G.Penendo SDB Secretrio-executivo SEJ-CELAM
8. Parte 1
9. Com a inteno de sermos fiis atitude do Deus de Jesus Cristo,
que, com olhar amoroso, est atento s necessidades de seu povo,
escuta seus clamores e dispe todas as coisas para a sua libertao,
queremos olhar a realidade dos povos do continente
latino-americano, e sobretudo do povo jovem, para escutar seus
gritos, reconhecer e compreender suas situaes de excluso e fazer o
possvel para que, com a ajuda do Esprito, se realiza a salvao.
Seguindo o exemplo de Jesus, necessrio abrir os olhos para
compreender, com razo compassiva, a vida dos povos. O simples olhar
da cincia no suficiente para explicar sua existncia. O esttico e
suas diferentes expresses, o potico, o mtico, o utpico, o pico e o
trgico so tambm vises vlidas que podem estar, talvez, mais prximas
das suas buscas de sentido e das suas experincias do sagrado e da
f, tanto dos jovens como dos povos em geral. preciso educar a viso
da realidade para que se possa descobrir nela o dom de Deus,
experimentar seu chamado a sermos acolhidos e amados, e a
encarnar-nos no mundo dos jovens pela solidariedade humana e
evanglica. O contato direto permite ver, ouvir, e se emocionar com
suas vidas, seus sinais, suas sensibilidades e seus sentidos.
Conhecer a realidade dos jovens a partir da perspectiva de Jesus
exige estabelecer uma relao de intimidade. Exige dialogar e agir
junto com eles. Somente assim ser possvel experimentar conhecer
suas necessidades reais e perceber suas verdadeiras alegrias e
amarguras. O desconhecimento da perspectiva dos outros, de suas
formas de ver e compreender o mundo, j gerou demasiada violncia na
histria. A vida no seguir sendo possvel pela via do extermnio de
quem pensa diferente. Deve-se comear por reconhecer e compreender
as diferenas e buscar sempre, razoavelmente, novas e melhores
condies de comunicao, compreenso, transformao, justia e vida. Ao
olhar a realidade da Amrica Latina e, nela, a realidade dos jovens,
sente-se o chamado ao mesmo compromisso apaixonado de Jesus, de
realizar sinais de vida que instaurem esperanas, possibilidades e
oportunidade de vida nova, superando os sinais de morte, de
decrepitude e da no-vida. A dupla dimenso morte-vida faz desejar e
tornar real, j, a pscoa para e com os jovens do continente. Santo
Domingo confirmou, tanto para a pedagogia como para a metodologia
da pastoral da juventude, caminhos que partem da vida, das
experincias e da realidade (SD 119). a epistemologia, o modo de
acercar-se da realidade e da verdade, vigente nas cincias, na
filosofia e na teologia atuais. Segui- los parece ser o nico modo
de nos situarmos na cultura atual e nas perspectivas de uma
pastoral da juventude que sintonize com a psicologia dos jovens.
Este foi, por outro lado, o modo habitual do agir de Jesus, que
aparece no Evangelho partindo da vida, dos problemas, das
necessidades e das aspiraes dos destinatrios de sua caridade
pastoral. O grande desafio da pastoral da juventude olhar o
contexto social, econmico, poltico, cultural e religioso de forma
global e no fragmentria (DP 15). No fcil nem se pode pretender
chegar certeza e verdade plenas. O que se pode, sim, tentar
conhecer, da melhor forma possvel, a realidade na qual se deve
intervir, para acertar nos diagnsticos e escolher as melhores
alternativas de ao pastoral. I
10. 1. O CONTEXTO LATINO-AMERICANO DE MUDANA A experincia de
mudana vivida pelos homens e pelas mulheres do continente e as mais
variadas anlises e estudos especializados realizados nos ltimos
anos estimulam a percepo e reafirmam a convico de que algo novo est
ocorrendo em nosso mundo. No se trata apenas de novas situaes
particulares ou de novo elementos que simplesmente se acrescentam
aos j existentes. Trata-se de grandes transformaes globais que
afetam profundamente a compreenso e as percepes que as pessoas tm
de si mesmas e de suas relaes com a natureza, com a sociedade e com
Deus. Est-se dando uma profunda mudana cultural. Os jovens da
Amrica Latina, na variedade de seus processos histricos e de suas
diversidades tnicas e culturais (SD 244), so particularmente
sensveis ao novo que est acontecendo. Eles so, ao mesmo tempo,
filhos e construtores dessa nova realidade cultural que apresenta
mltiplas e diversificadas manifestaes que condicionam suas vidas e
geram novas e variadas compreenses, relaes e formas de expresso.
Conhec-las e valoriz-las um grande desafio para a Igreja e para a
pastoral da juventude (SD 253), que o acolhem como um convite a
questionar suas prticas, revis-las e, sobretudo, a recriar, nesta
nova situao, a experincia da permanente novidade de Jesus Cristo, o
mesmo, ontem, hoje e sempre (Hb 13,8). 1.1 Algumas manifestaes da
mudana cultural. No se pretende, aqui, uma anlise completa dessa
nova situao cultural. Quer-se apenas assinalar algumas de suas
principais manifestaes, que devem ser particularmente consideradas
na pastoral da juventude. 1.1.1 Mudanas em relao natureza So
poucos, hoje, os que se espantam diante das descobertas cientficas
e do desenvolvimento tecnolgico. Entretanto, est-se dando uma
crescente tomada de conscincia dos limites da cincia e da
tecnologia, insuficientes quando tentam resolver, por si mesmas, os
problemas fundamentais da vida e da pessoa humana. A crescente
sensibilidade a esse problema expressa-se na busca de uma nova
relao com o meio ambiente que permita viver mais dignamente neste
terra que Deus entregou ao ser humano para que a trabalhasse e a
cuidasse. 1.1.2 Mudana em relao sociedade A interdependncia da vida
social manifesta-se principalmente no carter transnacional da
economia, dos meios de comunicao social e nos acelerados processos
de urbanizao. Essa influncia econmica e cultural do chamado
Primeiro Mundo marca a vida das sociedades e das pessoas. Molda
seus interesses, aspiraes e modelos de consumo. A crise das
ideologias e o fracasso dos projetos histricos de transformao
social vo dando lugar ao imprio do pragmatismo e da ideologia
neoliberal, com sua poltica de mercado. Ela se apresenta como a
aparentemente nica racionalidade social e como inquestionvel modo
de intercmbio. No sem dificuldades, os pases latino-americanos esto
em transio de regimes autoritrios para sistemas democrticos. Muitos
partidos sofreram importantes transformaes. Tambm surgiram outros,
novos. Mudou a poltica das alianas. O movimento sindical no tem a
mesma ressonncia de antes; busca implementar suas demandas atravs
do dilogo com empresrios e governos. Mudam os modos de fazer
poltica e o interesse que se tem por ela. No to claro, hoje, que o
Estado, os polticos ou simplesmente os grupos econmicos sejam os
nicos detentores do poder. Tambm tem poder, igualmente, quem domina
a tecnologia e a informao.
11. A prpria situao de pobreza tem hoje caractersticas novas. A
pobreza da maioria convive ao lado do desenvolvimento, do consumo e
da modernidade. Os setores populares, e seus modos histricos de
resolver os desafios fundamentais da existncia, parecem cada vez
menos unidos num projeto histrico de libertao. As idias e os
movimentos gestados nas dcadas passadas j no tm a fora
transformadora de ento nem constituem um elemento significativo de
seu iderio social. A sociedade manifesta-se cada vez mais
pluralista. Crescem a valorizao das diferenas e o chamado ao dilogo
num sociedade pluralista. Ao mesmo tempo, porm, esse pluralismo
estimula posturas subjetivistas. Em muitos casos gera atitudes de
sincretismo e de grande confuso. 1.1.3 Mudanas na relao com Deus
Apesar das propostas de diversas correntes materialistas que
vaticinaram o desaparecimento da religio e a morte de Deus,
persiste fortemente a busca de um sentido transcendente e absoluto
para a vida humana e a necessidade de encontrar valores, critrios e
normas ticas que a orientem. As principais ideologias j no parecem
ter a fora mobilizadora de antes. As principais perguntas pelo
sentido voltam a se fazer presentes. Essa busca est muito viva nas
diversas expresses da religiosidade popular, nas quais o povo
recria suas vivncias religiosas em meio s situaes que a vida
moderna impe. O povo resiste s condies adversas da vida moderna que
o marginaliza, recriando espaos de piedade peregrinaes, novenas,
devoo s almas, festas de padroeiro, devoo cotidiana etc. que
constituem verdadeiras formas de mstica popular muito profunda
diante do individualismo, da competio e da lgica mercantil da
dominao que pautam a modernizao das culturas oficiais.2 A
persistncia do sagrado verifica-se tambm no crescimento sintomtico
das seitas e das propostas que recorrem ao esoterismo e magia como
resposta busca de sentido. Coexistem, assim, diversas manifestaes e
ofertas religiosas. A Igreja Catlica aparece, entre elas, como uma
alternativa a mais, entre as muitas possveis. Olhando o conjunto
desses elementos, constata-se que se est diante de um novo tempo
histrico no continente latino-americano. J no se vivem as grandes
esperanas revolucionrias, de profundas mudanas sociais, que
caracterizaram a dcada de 60. No se vive, igualmente, um tempo de
confrontao violenta, de represso e de morte que caracterizou a
dcada de 70 e parte da de 80. Nem se vive tampouco o tempo de
recuperao da democracia que caracterizou a dcada de 80 e parte dos
anos 90. Muitos poderiam pensar que essa problemtica da histria
recente pouco interfere nos reais problemas e desafios enfrentados
pelos jovens de hoje. Contudo, os jovens de qualquer poca histrica
no criam a realidade na qual vivem. Mais ainda: as condies sociais,
econmicas, poltica e culturais so, para eles, uma realidade que
lhes dada, independentemente de sua vontade. Nessa realidade se
socializaram, foram construindo sua prpria identidade e sonharam um
futuro melhor. 1.2 Chaves de Leitura Duas chaves de leitura parecem
fundamentais para procurar uma melhor compreenso dos fenmenos que
esto acontecendo: o neoliberalismo, sua repercusso na sociedade e
na cultura, e a ps-modernidade, que impregna todos os ambientes no
complexo fenmeno da comunicao. 1.2.1 O neoliberalismo A sociedade
atual resultado de vrias dcadas de frustrada tentativas para sair
do subdesenvolvimento. Aps a queda do socialismo, o neoliberalismo
passou a ser, ao menos no momento, o nico modelo socioeconmico
vivel. Quando um modelo social no nico e tem que competir com os
demais, necessita suavizar-se e humanizar-se para no ser substitudo
por outras alternativas; porm, quando um modelo nico, no precisa
ser transigente. o que acontece com o neoliberalismo, que est se
desenvolvendo de forma quase selvagem na sociedade atual. 2
Cristian Parker. Lo espiritual de fines de siglo. Revista Mensaje
423, Santiago do Chile, 1993, p.511.
12. O neoliberalismo postula a preeminncia do mercado e da
livre concorrncia. Sustenta uma srie de polticas econmicas
desregulamentadoras, privatizantes e liberalizadoras das econmias
nacionais e dos protecionismos tradicionais dos pases do Terceiro
Mundo, impostas pelo organismos internacionais, dominados pelos
Estados Unidos. Essas polticas aplicam-se de modo diversos nos
diferentes espaos nacionais. Aludindo ao fim do socialismo e seus
anseios de uma sociedade sem explorados, o neoliberalismo afirma
que as utopias e os projetos de futuro terminaram: o que conta a ao
imediata. O mercado capitalista e a democracia liberal surgem como
os nicos com possibilidade histrica de realizao e de sucesso.
Fala-se do fim das ideologias. Legitimaram-se as propostas
neoliberais como as nicas e as melhores alternativas para a
economia mundial. O neoliberalismo significa, concretamente: No
econmico: as privatizaes e o fortalecimento do capital privado; a
desregularizao dos mercados; a orientao da economia em funo do
mercado internacional e o fomento das exportaes; a abertura ao
capital estrangeiro e a internacionalizao do mercado interno. Isso
traz, como consequncias, graves custos sociais como a queda do
salrio real, uma maior taxa de desemprego, uma brecha maior entre
os ricos e pobres e a multiplicao das situaes de pobreza extrema.
No poltico: a funo do Estado se reduz praticamente a ser garantidor
do equilbrio social e favorecedor da atuao do capital privado.
Reduz-se tambm o papel dos sindicatos e das organizaes populares.
Enfraquece-se a real participao do povo e da sociedade civil. A
absolutizao do mercado como critrio nico para regular a atividade
econmica nacional e internacional agudiza a subordinao dos pases
pobres aos pases hegemnicos. Os governos diminuem drasticamente o
gasto pblico e os investimentos em educao, sade e seguridade
social. Suas alianas visam, antes, assegurar os privilgios
econmicos e integrar-se nos processos internacionais do que
promover o verdadeiro desenvolvimento, o crescimento e o bem-estar
dos povos. No cultural: o consumo, a produo e a eficincia, o
pragmatismo e o mercado convertem-se nos valores sociais mximos. A
educao, orientada para a produtividade e a competio, conduz
inevitavelmente a um materialismo prtico no qual se desenvolvem o
individualismo, o utilitarismo e o hedonismo e do qual esto
ausentes as exigncias da justia social e do bem comum. No
religioso: o materialismo prtico eclipsa o sentido de Deus e da
prpria pessoa humana. Apesar disso, muitos querem, inclusive no
mbito catlico, legitimar esse sistema em bases religiosas. Nesses
esforos, h uma clara tendncia a suavizar o compromisso exigido por
Jesus e a acomod-lo aos postulados neoliberais, comungando com a
Nova Era, a chamada religio do neoliberalismo. O neoliberalismo
favorece ao mximo o desenvolvimento das empresas transnacionais,
que, para promover o consumo, privilegiam certos modelos de vida o
american way of life e tendem universalizar e uniformizar, pela
propaganda, uma cultura do espetculo, do ter e do parecer. As
culturas indgenas e autctones sentem-se esmagadas. Os processos, as
formas concretas e os ritmos com que se vai implementando o modelo
neoliberal dependem do lugar e da orientao que se d s economias
nacionais para se inserirem na economia mundial. Os pases
latino-americanos so considerados como centros industriais,
produtores de artigos manufaturados, exportadores de produtos
agrcolas e matrias-primas, com particular interesse na produo
petrolfera. Apesar de a maioria dos planos neoliberais proclamar
seus resultados positivos e os grandes indicadores econmicos, como
o crescimento do produto interno bruto, a queda da inflao, o
crescimento econmico, o aumento das exportaes e dos investimentos
de capital estrangeiro e os maiores nveis de consumo, serem
geralmente favorveis, na realidade no geraram melhores condies de
vida e, especialmente, no mudaram as formas de distribuio da
riqueza produzida, mantendo, e at mesmo acirrando, as condies de
pobreza.
13. A pobreza extrema de que se aproxima a camada mais fraca da
populao est produzindo uma excluso violenta das grandes maiorias,
no que se refere aos benefcios do esforo coletivo dos povos. A
deteriorao ecolgica tambm se faz sentir em todos os aspectos. Os
recursos materiais, a biodiversidade e as riquezas naturais so
sacrificados por planos economicamente rentveis a curto prazo para
as transnacionais, mas de consequncias desastrosas para o futuro.
No se teme sacrificar populaes inteiras e aniquil-las pela fome,
pelo desemprego e pela violncia, como sucedeu com muitas comunidade
negras, indgenas e camponesas. O neoliberalismo agride
violentamente os estilos de vida e as cosmovises dos povos latino-
americano. Influi de modo negativo especialmente nos jovens, sobre
os quais se concentram seus efeitos mais dramticos: profundas
carncias materiais e de vida digna, desemprego, ocupaes insalubres,
mal-remuneradas e sem previdncia social; crise do sistema
educacional, incapaz de uma absoro, maior evaso escolar e m
qualidade do ensino; inexistncia de espaos para as atividades
culturais e de lazer, discriminao dos jovens das camadas populares
como grupo social indesejado, a ponto de legitimar seu extermnio
fsico; a criminalizao de suas tentativas de organizao e expresso; e
a ausncia de projetos de participao social e de polticas
direcionados para essa camada da populao. 1.2.2 A ps-modernidade A
chamada era ps-moderna toma conscincia dos fracassos e dos limites
da modernidade. Sente que seus ideais humanistas e a absolutizao da
racionalidade tcnico-cientfica no engendraram o mundo igualitrio,
livre e fraterno que sonhava, e sim um mundo de dominantes e
dominados em que o projeto igualitrio fracassou. Isso gerou um
ambiente de desencanto que se expressa em vrios mbitos da vida
pessoal e coletiva. A modernidade esperava um futuro grandioso para
todos os homens, no qual existiria igualdade entre as naes e entre
os indivduos; confiava na abolio da guerra, da propriedade e dos
colonialismos; esperava a alfabetizao universal, o domnio da
natureza, a erradicao das doenas e o triunfo definitivo da cincia e
da tecnologia. O sculo XX demonstrou que esses grandes sonhos foram
dolorosamente frustadas. O mais importante agora procurar
sobreviver e faz-lo da melhor for Deus de cada uma possvel. Para as
grandes maiorias j no interessam as utopias. O que importa o que se
vive aqui e agora. Se no h progresso, se no importa para onde se
vai, o que vale ento aproveitar o momento. Se para a modernidade
importava produzir, para a ps-modernidade, importa consumir. O que
d prazer e o que se sente passam a ser critrio ltimo de verdade e a
motivao profunda do agir. A modernidade deu nfase especial ao valor
da vida e ao bem-estar coletivo. A ps-modernidade converte a vida
privada na medida de todas as coisas. OS problemas dos outros so
dos outros e devem ser enfrentado e solucionados por eles.
Predomina a lgica da vida privada: satisfazer os prprios desejos,
comportar-se segundo o estilo de cada um, crer no Deus de cada um.
A ps-modernidade nega a existncia de uma lei de carter universal.
Cr que a sociedade no se fundamenta num pacto social, mas em
pequenos acordos que possam ser estabelecidos entre partes que esto
sempre em conflito. Tudo pergunta. No h respostas. Se houver, sero
formuladas em termos de novas perguntas. A ps- modernidade uma
crise no interior da modernidade. Eis algumas de suas principais
caractersticas: Um neo-individualismo, entendido como afirmao
radical de auto determinao e como desconfiana do coletivo, do
solidrio, e de tudo o que sugira compromisso com os demais.
Reivindica a autonomia da pessoa humana. Valoriza a criatividade e
a subjetividade, tendendo a construir um pessoa sem sentido
histrico, autocentrada, preocupada to s com o presente e com sua
vida pessoal, facilmente inclinada a sucumbir na solido, no
isolamento e no anonimato. Uma nova forma de niilismo que destri
qualquer possvel fantasia utpica. Nega-se que a fora das utopias
possa chegar a mudar o mundo. a cultura do grande vazio e da
descrena, em que
14. nada tem fundamento suficiente para orientar globalmente a
existncia. Recupera a dimenso do pessoal, do ntimo e do privado em
face o pblico, mas reduz os horizontes, promove o imediatismo, a
ausncia de viso de longo prazo e a falta de entusiasmo para
trabalhar pela mudana da realidade. Leva a evitar os compromissos
permanentes e a no aderir a propostas de projetos histricos. Uma
maior permissividade na conduta moral, fruto do neo-individualismo
e consequncia da falta de pontos universais e de valores absolutos.
Antes, a famlia, a educao e a prpria religio impunham as normas de
conduta, as formas de pensamento, as evidncias coletivas e os
princpios de legitimao. Hoje h uma multiplicidade de mbitos de vida
e de comunicao em que todos se expressam livremente, sem que haja
um poder capaz de impor idias e condutas a todos. Promove-se uma
tica pessoal em funo da qual vale mais o convencimento que a norma;
Legitima-se a busca de felicidade no tempo presente; reafirma-se a
liberdade individual, a necessidade de ser, sentir e expressar-se
segundo a originalidade de cada um e o direito diferena. A busca da
salvao, contudo, situa-se no presente; debilitam-se e
relativizam-se as convices ticas; centra-se a ateno mais nos
direitos do que nos deveres; desencadeia-se a crise do amor e da
sexualidade e opera-se a perda do sentido de felicidade e do
compromisso. Um pensamento dbil em face das ideologias mais ou
menos radicais. Esse pensamento dbil quer pr abaixo um mundo que
tenha consistncia em si mesmo e uma conscincia capaz de descobrir,
conhecer e expressar o mundo real. Prefere antes experimentar as
coisas a discutir teorias; recupera o valor do cotidiano, o sentido
do simblico e do ritual. Aumenta, no entanto, a fragmentao da vida,
dificulta a elaborao de projetos globais e favorece a manipulao
pela publicidade, pela moda, pelos meios de comunicao de massa e
pelas imposies culturais. Como movimento cultural, o ps-modernismo
tem uma mensagem muito simples: vale-tudo. Essa mensagem no nem
conservadora, nem revolucionria nem progressista. Torna
irrelevantes as distines deste tipo... Todos podem participar dele.
Trata-se de um onde em que so possveis todos os tipos de movimentos
artsticos, polticos e culturais. Essas fortes correntes culturais,
econmicas e polticas, portadoras de uma concepo de sociedade
baseada na eficincia, promovem uma verdadeira cultura da morte.
Criam e consolidam autnticas estruturas de pecado contra a vida,
nas quais os jovens ficam envoltos e condicionados.3 Em meio a essa
realidade, contudo, os jovens tentam sobreviver com valores que
possuem. Lutam para encontrar um lugar na histria. uma juventude
cujo sentido existencial foi em grande parte destrudo pela cultura
da morte. Necessita, urgentemente, encontrar uma boa nova que lhe
devolva o desejo de viver e lhe abra as portas a uma cultura de
vida. 2. CONHECER A JUVENTUDE NO FCIL Hoje em dia, j no possvel
falar, simplesmente, de juventude. quase impossvel abarcar o
amplssimo aspecto da realidade e as variadssimas situaes em que os
jovens vivem, segundo suas razes e origens tnicas, suas influncias
culturais e suas condies polticas, sociais e econmicas. necessrio
admitir que conhecer e compreender o mundo dos jovens no tarefa
fcil. Os diferentes estudos realizados sobre a realidade juvenil
mostram claramente a grande diversidade de opinies existente entre
os pesquisadores. H muita impreciso sobre o prprio contedo do termo
e sobre o que se quer dizer quando se fala de jovens e de
juventude. Proliferam idias, opinies e julgamentos, por trs dos
quais muitas vezes se ocultam interesses que projetam nos jovens os
desejos e temores dos adultos, deformando a realidade juvenil e
promovendo aes pedaggicas corretivas de comportamentos considerados
mais ou menos anti-sociais. Por outro lado, no fcil concretizar e
expressar as motivaes e formas de comportamento de uma vida em
contnua evoluo: o jovem sempre uma incgnita. Um convite a deixar os
prprios 3 Cf. Joo Paulo II, encclica Evangelium vitae, 12.24.
15. esquema pr-fabricados e a abandonar-se ao incerto e ao
imprevisvel. Para poder dizer algo sobre os jovens, preciso ser,
estar e viver com eles. A sociedade atual mostra um enorme
interesse pelos adolescentes e jovens. Para eles se dirigem muitos
olhares. Embora se trate de tentativas parciais de abordar a
realidade deles, so teis na medida em que permitem maiores
delimitaes e precises. Em todo o caso, trata-se de perspectivas que
no pretendem ser exaustivas. Em toda aproximao realidade dos jovens
necessrio considerar as variveis que intervm e, muitas vezes,
determinam seu universo cultural. O uso da categoria juventude deve
considerar essa multiplicidade de diferenas. 2.1 A viso
biocronolgica Define a juventude em termo de idade. A juventude a
idade da pessoa em crescimento. Um perodo compreendido entre os
quinze e os vinte e cinco anos, no qual se toma conscincia de estar
vivendo uma realidade vital, distante da infncia mas ainda no
identificada com o mundo adulto. Trata-se de uma etapa de transio
marcada por grandes mudanas fisiolgicas, fruto do amadurecimento
hormonal. O resultado dessas transformaes a conscincia e a vivncia
do prprio ser corporal. A imagem do corpo e sua valorizao so
smbolos do eu e da personalidade. A significao do sexual passa para
o primeiro plano. Essa valorizao do corpo e da sexualidade
expressa-se numa srie de aspectos: psicolgicos, como a conscincia
de sua fora e de sua capacidade fsica; psicossociais, como o
cuidado extremo com a apresentao externa, e psico-biolgico-sexuais,
como a descoberta do sexo como estmulo-demanda. Quando se
absolutiza essa forma de olhar os jovens, corre-se o risco de
perder de vista os contrastes e as oposies, de unificar o que
diverso, de eliminar as diferenas e assim diluir e confundir a
marginalizao e a riqueza, o rural e o urbano, as diferenas sociais
e culturais, os estudante e o e o aluno que se evade da escola, o
homem e a mulher, o trabalhador e o desempregado, o pai a me
jovens, os filhos de mes solteiras e os filhos de famlias
constitudas etc. No se pode desconhecer, alm disso, que a
juventude, como grupo etrio, est sujeita a uma imagem social e a um
processo de construo das caractersticas que a definem como tal e
assinalam os limites e as possibilidades de suas prticas, de seu
ser e de seu dever-ser como membro de uma comunidade. Esses
elementos definidores criam expectativas de comportamento.
Delimitam-se as caractersticas consideradas prprias dessa idade
transitria e intermediria entre a infncia e a idade adulta. Elas
circulam atrves dos mais diversos espaos sociais. 2.2 A viso
psicolgica Identifica a juventude como o perodo conflitivo da vida
da pessoa, em que ela se v a si mesma com a vida nas mos, j no
estando na infncia mas ainda no sendo adulta, com uma vida afetiva,
moral, cultural e espiritual prprias que devem ser garantidas e
construdas mais plenamente. como um segundo nascimento. final e
comeo: final de uma forma de vida no ambiente protegido da famlia e
incio de algo novo, desconhecido, de um mundo que, muitas vezes,
apresenta-se ao mesmo tempo hostil e perigoso, atraente e
estimulante. a passagem do mundo interior da famlia para o mundo
exterior das responsabilidade e das decises pessoais. Supe
percorrer um caminho estreito, cheio de incertezas, temores e
esperanas que identifica o ser jovem. Um caminho do qual deve se
apropriar: passagem de um passado definido, que deve ser
abandonado, para um futuro por identificar e com o qual deve
identificar-se. uma etapa de busca e crescimento. De construo da
identidade e de construo de um novo lugar no mundo. No se trata de
um processo unvoco nem linear. Pelo contrrio, mltiplo e
contraditrio, fruto do tecido das relaes com diversas instncias
socializadoras, como a famlia, a Igreja, a escola, o grupo de
companheiros, a vizinhana, os partidos polticos, os meios de
comunicao, etc. A partir do jogo das inter-relaes que se d entre
essas instituies e os jovens, definem-se os papis, as exigncias de
comportamento, os limites e as possibilidades de seu agir , de seu
ser e de seu dever-ser. Tudo condicionado pela pertena dos jovens a
um grupo social e cultural determinado e pela biografia de cada
um.
16. um tempo de opes e de definio de vocaes. um caminho aberto,
onde se d a possibilidade de tentativa e erro. um tempo de
valorizao do subjetivo, dos sentimentos e da capacidade de agir
moralmente. Um tempo para configurar-se como pessoa, com direitos e
deveres no mundo adulto. Situam-se, aqui, muitos diagnsticos que
falam das feridas afetivas e dos desequilbrios psicolgicos e de
personalidade dos jovens. Por circunstncia muito variadas, de ordem
familiar, social ou econmica, muitos sofrem hoje uma carncia
generalizada de afeto e de relaes pessoais. Esto ss. Precisam de
amigos. Buscam um grupo ao qual possam pertencer e participar e
sentir-se protagonistas. Um refgio que os liberte da solido e os
faa sentir-se acolhidos e compreendidos. Joo Paulo II afirmou
recentemente este carter pessoal dos problemas vividos pela
juventude: O problema essencial da juventude profundamente pessoal.
A juventude o perodo da personalizao da vida humana. , tambm, o
perodo da comunho. Os jovens e as jovens sabem que tm de viver para
os demais e com os demais. Sabem que sua vida tem sentido na medida
em que se faz dom gratuito para o prximo.4 2.3 A viso sociolgica Do
ponto de vista da sociologia, a juventude um grupo social com uma
posio determinada dentro do conjunto da sociedade, caracterizado
por um modo peculiar de ver e entender a vida e o mundo, prprio de
quem deixou para trs a dependncia total de criana, mas no chegou
ainda responsabilidade prpria do adulto. uma etapa substantiva da
vida, com identidade e valores prprios, embora mediada pela posio
que a juventude ocupa em cada sociedade e influenciada pelo que
essa sociedade aceita ou impe. Da a variedade de seus
comportamentos, tanto de submisso aos patres sociais como de
protesto e rebelio contra toda tentativa de manipulao. Os modelos
econmicos inspirados no neoliberalismo aguaram a excluso e a
marginalizao dos povos-latinos americanos. Como consequncia, muitos
jovens so vtimas do empobrecimento e da marginalizao social, do
desemprego e do subemprego, de uma educao que no responde s
exigncias de suas vidas, do narco-trfico, da guerrilha e das
gangues. Muitos jovens vivem adormecidos pela propaganda dos meios
de comunicao de massa e alienados por imposies culturais e pelo
pragmatismo imediatista que tem gerado novos problemas em seu
amadurecimento afetivo (SD 112). H, contudo, adolescente e jovens
que reagem ao consumismo imperante e se sensibilizem diante das
debilidades do povo e da dor dos mais pobres. Buscam inserir-se na
sociedade, rejeitando a corrupo e gerando espaos de participao
genuinamente democrticos... Vo carregados de perguntas vitais.
Representam o desafio de articular um projeto de vida pessoal e
comunitrio que d sentido a suas vidas, logrando assim a realizao de
suas capacidades (SD 112). No conjunto da juventude, considerada
como corpo social, surgem setores determinados pela condies
socioeconmicas ou culturais e relacionados com os ambientes em que
vivem os jovens. importante consider-los detidamente porque o meio
especfico no qual se desenvolve a vida dos jovens, suas
necessidades, problemticas e interesses influem decisivamente na
definio da ao pastoral e das propostas de formao e espiritualidade
que se quer desenvolver. 2.3.1. Os jovens da roa e do campo So
jovens que vivem no campo, realizando tarefas agrcolas, ou em
povoados onde estudam e/ou trabalham. Sua relao fundamental se d
com a terra, gerando caractersticas culturais particulares e um
especial forma de viver e entender a relao com a vida, a terra e a
religio. Apesar da importncia que o trabalho de campo e seus
produtos tm para as economias latino-americanas, as estruturas
tradicionais do setor e os condicionamentos da sociedade os impedem
de intervir, muitas vezes, como grupo social coerente no processo
de desenvolvimento. Em muitos casos, a terra deixou de ser a me
para tornar-se fonte de dor e de morte. Algumas caractersticas
desse setor so: 4 Cf. Joo Paulo II, No limiar da esperana
17. O perodo juvenil no mundo campons muito breve. Os jovens
assumem, desde cedo, responsabilidade prprias do mundo adulto,
tanto pelo trabalho como pelo casamento e pela nova famlia.
Diferentemente dos que vivem em zonas urbanas, esses jovens tm
poucas possibilidades para expressar-se e progredir. Quando as tm,
so muitas vezes manipulados e/ou alienados por agentes externos s
suas comunidades. As organizaes sociais e polticas do campo so, com
frequncia, fortemente reprimidas, o que dificulta seu funcionamento
e sua ao em defesa dos direitos e da melhoria das condies de vida.
A no propriedade da terra, o alto custo dos insumos agrcolas, o
baixo preo que se paga pela produo e a falta de polticas
governamentais para o desenvolvimento do campo obrigam-se a
abandonar a terra e migrar para as cidades em busca de melhores
oportunidades. Surgem, assim, grandes setores de sem-terra, com
todas as consequncias que esse fenmeno gera. Embora tenha aumentado
a escolaridade, grande nmero de jovens no tem possibilidades ainda
de ingressar no ensino mdio. Muito poucos conseguem chegar
universidade. Os programas educativos oferecidos os mundo do campo
e da roa no respondem, em geral, a seus valores culturais nem s
suas necessidades bsicas de desenvolvimento. Muito poucos so
bilngues. A famlia continua sendo salvaguarda e potencial bsico
para o desenvolvimento e o crescimento dos jovens do campo e da
roa. A situao social geral, contudo, incide de tal forma que, pouco
a pouco, tambm a famlia do campo e da roa vai se desagregando e
sofrendo as consequncias da migrao. As comunidades do campo e da
roa mantm vivos valores humanos, profundos, como a hospitalidade e
a solidariedade. A religiosidade popular e um esprito cristo
enraizado do-lhes uma sabedoria e uma espiritualidade que se
caracterizam pela confiana em Deus, pela honestidade, pela
valorizao e pela compreenso dos sofrimentos prprios e , sobretudo,
dos sofrimentos dos outros. Os jovens do campo e da roa esto
abertos ao comunitrio e ao cooperativo. Sua experincia e valorizao
da pobreza e do sacrifcio fazem-nos capazes de tentar novas formas
de empresas comunitrias, guiadas por critrios realmente humanos e
no meramente economicistas. Em maior escala que outros, alguns
setores jovens do capo e da roa so pressionados e muitas vezes
utilizados pelo movimentos guerrilheiros, pelos que se dedicam ao
cultivo da droga e ao narcotrfico e pelo Exrcito. 2.3.2. Os jovens
estudantes Os jovens estudantes do 1 e do 2 grau no recebem, em
geral, uma ateno especializada e diferenciada. Trata-se de um grupo
no qual coexistem quem ainda adolescente e quem j ingressou na
etapa juvenil. Sua caracterizao provm de sua localizao no ambiente
escolar, que continua sendo, apesar de tudo, um dos meios onde se
congrega, normalmente, maior quantidade de jovens. Algumas
caractersticas desse setor so: Valorizam a escola como espao de
encontro, formao, socializao e desenvolvimento pessoal. Muitos
deles, contudo, no sabem para que estudam. Fazem-no por obrigao,
para ocupar o tempo, encontrar-se com seu amigos ou por costume.
Muitos estudam procurando chegar a ter coisas, profissionalizar-se,
ganhar dinheiro ou vencer na vida. So poucos os que,
conscientemente, buscam a escola como espao para a cultura, a
humanizao, a cincia e o conhecimento. Apesar do avano das cincias
pedaggicas, os mtodos utilizados no respondem, muitas vezes, os
dinamismos reais da vida dos jovens. Continua-se ensinando em
relaes verticais, e o mtodo de repetio deixa pouco espao para a
criatividade e a iniciativa. O sistema de aprovao promove a
competio e impulsiona a querer ser mais que os outros. A educao
continua sendo considerada por muitos como um processo de acumulao
de conhecimentos. Descuidam-se outros aspectos importantes da
formao integral, como a educao dos sentimentos, o
18. desenvolvimento da sensibilidade e do sentido tico. Nas
aulas, promovem-se prticas e valores relacionados com o
neoliberalismo vigente. O sistema educacional ainda se mantm vivo
alheio realidade. No prepara para a vida e os compromissos na
sociedade. Ao terminar seus estudos, muitos se sentem frustrados.
Descobrem que no lhes serviro nem para conseguir um trabalho ou
assegurar o futuro. A crise econmica faz com que os estudantes se
vinculem cada vez mais ao mundo do trabalho, para colaborar
economicamente com suas famlias ou para manter-se nos estudos. O
tempo limitado para dedicar-se ao estudo leva a um rendimento
acadmico menor e a menor formao. Nos primeiros anos das aberturas
democrticas, e por influncia do esprito ps-moderno, os estudantes
aparecem como grupo aptico, desorganizado e com pouca capacidade de
ao, at na estrutura acadmica. Apesar de tudo, buscam espaos para
serem protagonistas, aceitando propostas fceis como a violncia, as
gangues, as drogas e o lcool, ou as respostas construtivas como os
grupos de estudo, o encontro, o esporte, a ao social ou a
participao no movimento estudantil. Nesse grau de ensino
normalmente se abrem ao sentido crtico, inquietude social e s
primeiras experincias da participao ativa. As atividades solidrias
ou comunitrias e o encontro com situaes de maior pobreza movem-nos
a querer novos modelos de educao e novas formas de sociedade. Tm
uma forte influncia, imposta ou herdada, da vida de f de seus pais.
Tm, por isso mesmo, uma atitude de inconscincia e inrcia ou de
rejeio e questionamento religio. O sentido da f se faz mais vivo,
porm, quando os motiva para o compromisso e a solidariedade e
quando lhes apresentada como resposta s suas buscas de uma
religiosidade alegre, espontnea e juvenil. 2.3.3. Os jovens
operrios/trabalhadores So jovens das famlias populares de operrios,
trabalhadores, empregados, subempregos, desempregados e artesos.
Seu nmero aumenta cada vez mais como consequncia das novas situaes
de pobreza geradas pela aplicao de polticas neoliberais. A maior
parte deles tem dificuldades para encontrar trabalho. Quando o
encontram, vem-se forados muitas vezes a ser mo-de-obra barata e no
especializada. Inseguros diante das transformaes que a tecnologia
impe ai trabalho industrial, esto continuamente expostos
possibilidade de desemprego. So economicamente frgeis e
frequentemente no tm possibilidades para uma realizao vocacional
verdadeira. Algumas caractersticas desse setor so: Faltam empregos.
Os que existem so instveis. As exigncias de experincia e garantias
que lhes fazem para dar-lhes uma oportunidade de trabalho esto, na
maioria da vezes, muito alm de suas possibilidades. Isso os condena
a ficar desempregados ou subempregados e permite que s uma minoria
consiga um trabalho estvel e bem-remunerado. Vivem uma situao
crtica pelo baixo nvel salarial e pela instabilidade do trabalho.
Seu trabalho menos considerado que o capital. Muito deles
especialmente as mulheres so explorados de diversas formas, com
tratamentos desiguais e desumanizantes. Os sofrimentos, a represso
e o sentido de luta deram aos operrios e trabalhadores um esprito
popular autntico na ao pela verdade e pela justia, embora, em
alguns casos, a politizao distora a finalidade de suas organizaes.
Tentam viver num esprito solidrio e de luta por seus direitos.
Faz-lo, no entanto, torna-se cada vez mais perigoso. As leis
trabalhistas so aplicadas arbitrariamente e as organizaes sindicais
so mal-vistas limitadas ou reprimidas. Apesar das dificuldades, os
sindicatos ainda so um expresso viva e vlida do Movimento Popular.
Com frequncia so utilizados pelos partidos polticos, mais para suas
finalidades e estratgias do que para defender seus direitos e
responder s suas necessidades. Muitos se prestam a esse jogo com a
esperana de sair de sua situao e superar seus problemas
econmicos.
19. Cansados das difceis circunstncias de sua semana de
trabalho, procuram esquecer sua situao de excludos e divertem-se em
busca de algo diferente que nem sempre conseguem identificar.
2.3.4. Os jovens universitrios Os jovens universitrios so os que tm
mais possibilidades de viver sua juventude. Tm um campo de ao vital
e relacional no qual podem desenvolver aes prprias sua condio de
jovens, como assembleias, participao no movimento estudantil,
participao nos conselhos das Universidades e muitas outras formas
que o meio lhes proporciona. Algumas caractersticas desse setor so:
O crescimento dos espaos fsicos e o sistema aberto, implantado nas
Universidades nas ltimas dcadas, permitiram o acesso ao ensino
superior a jovens provenientes dos setores mdios da sociedade e,
tambm, embora em menor medida, os jovens dos setores populares. O
ingresso cada vez mais marcado, contudo, pela competio, pelos altos
custos e pelas exigncias dos programas de excelncia acadmica.
Muitos jovens universitrios vivem marcados pela insegurana. Seu
futuro profissional incerto. Com muito esforo, conseguem obter o
diploma universitrio. Mesmo com o diploma, no conseguem emprego nem
colocao profissional na sociedade. No so poucos os formados que se
vem obrigados a realizar trabalhos diferentes e, muitas vezes, at
mais bem remunerados que as prprias profisses. A realidade
universitria leva-os a enfrentar, frequentemente, de maneiras muito
diferentes e com maior ou menor grau de conscincia, a relao entre f
e cincia. Nos ltimos anos, vem-se percebendo uma abertura maior aos
valores espirituais e religiosos e a todo tipo de experincias
especialmente orientais e mgicas em busca do transcendente.
Entretanto, nem sempre h oportunidades para a formao e
aprofundamento dos critrios ticos. Por isso, a vida de muitos
jovens universitrios est desarticulada. Agem de maneira diferente
na Universidade do que com sua famlia, seu namorado(a), seus amigos
e a Igreja. O ambiente universitrio e os nveis de formao adquiridos
provocam em muitos jovens uma certa atitude de rejeio de seus
ambientes e classes de origem. O servio profissional no percebido
como ligado comunidade; nem a atividade profissional a um modo de
vida sem busca de lucro. A grande maioria dos universitrios
trabalha e estuda. Isso dificulta sua vida universitria plena e sua
participao como protagonistas nas atividades, na tomada de decises
e nas aes de extenso e pesquisa da Universidade. Muitas organizaes
acadmicas e polticas de universitrios que tiveram, por certo tempo,
importante protagonismo esto atualmente desarticuladas e sem
capacidade de ao. necessrio encontrar formas novas e novos canais
de participao. Existe apatia, igualmente, pelas atividades polticas
e partidrias. So consideradas manipuladoras e falsas. H ceticismo
quanto s propostas de desenvolvimento e de participao comunitria.
Alguns cristos so reconhecidos pelos valores evanglicos que so
capazes de testemunhar e pela fora das opes da Igreja
latino-americana pelos pobres, a luta pela justia e pelos direitos
humanos, a defesa da vida, a promoo social e a transformao das
estruturas e situaes injustas. Mas no devem se considerar os nicos
que tm esse tipo de compromisso. 2.3.5. Os jovens indgenas A
cultura latino-americana deve boa parte de suas caractersticas s
culturas indgenas que foram conhecidas quando do descobrimento e da
conquista do continente. Sua sobrevivncia constitui um desafio para
a evangelizao, no somente porque no contato com a religio dominante
a catlica deu- se uma forma peculiar de mestiagem religiosa, mas
porque o esmagamento socioeconmico que esses povos suportam est
exigindo uma conscientizao libertadora que no pode esquecer o
componente religioso de suas etnias.
20. Algumas caractersticas desse setor so: Os povos originrios
tm um sentido de unidade familiar e tribal, caracterizando-os por
sua solidariedade e pelos valores comunitrios. Isso os leva a lutar
contra a desagregao e o individualismo que a sociedade neoliberal
lhes impe. Os jovens participam dessa luta de todos os povos. Seu
sentido religioso expressa sua relao transcendente com Deus a
partir das prprias vidas e da relao que tm com a natureza das
coisas. Da, valores to genunos como a contemplao, a piedade, a
sabedoria popular, as festas e a arte expressarem suas ntimas e
mais fecundas vivncias espirituais. A maioria dos povos, despojados
de suas terras, marginalizados e vivendo em situaes inumanas,
aparece com os mais pobres entre os pobres da Amrica Latina. Sendo
os primeiros habitantes e donos destas terras, devem ser
reconhecidos seus direitos a uma justa demarcao e a um espao vital
que no s garanta sua sobrevivncia, mas permita, sobretudo,
conservar sua identidade como grupo humano, como povo e nao. Seu
patrimnio cultural e sua participao social do vigor renovado ao
continente. H um crescente despertar para os valores autctones e
para o respeito originalidade das culturas e comunidades indgenas.
Esse sinal de esperana, contudo, v-se ameaado pela influncia dos
modelos culturais das sociedades nacionais, majoritrias e
dominantes, cujas formas de vida, critrios e escalas de valores
geralmente atentam contra essas culturas. A defesa da identidade e
da cultura de seus povos, a integrao com outras culturas e outros
desenvolvimentos sociais e sua prpria articulao so alguns dos
grandes desafios que esto sendo colocados nas mos da juventude
indgena. 2.3.6. Os jovens afro-americanos Constituem uma parte
considervel da populao juvenil do continente. So um grupo tnico
cuja identidade se estabelece em relao s suas razes africanas e sua
insero no continente americano. Tm sido vtimas da escravido e de um
longo processo de marginalizao histrica, social e econmica, bem
como de uma ateno evangelizadora deficiente. Algumas caractersticas
desse setor so: Sua histria marcada pelo desenraizamento do
continente africano, de sua cultura, de sua terra e de sua famlia.
Trezentos anos de escravido deixaram uma profunda marca de
ressentimento e negatividade em seu estilo de vida e em sua maneira
de ser. O racismo e os preconceitos sociais continuam sendo muito
reais. Isso pode ser constatado no trabalho, ao se perceber que a
maioria da populao negra trabalha em ocupaes manuais com remunerao
muito baixa; na discriminao que os impede de viver como pessoas
iguais s demais e na forma como so tratados por muitos meios de
comunicao, que os apresentam como seres inferiores e perigosos.
cada vez maior o nmero de jovens e pessoas que optam por uma
reafirmao de sua identidade cultural e de suas razes africanas.
Assumem sua negritude e lutam para resgatar, recriar e vivenciar
elementos valiosos de sua cultura. Ao mesmo tempo, a manipulao
sociocultural da estrutura dominante lava-os a no assumir a sua
cultura, a envergonhar-se de sua origem e a assumir formas de
comportamento prprias de outros grupos culturais. cada vez maior o
nmero de jovens e pessoas que optam por uma afirmao de sua
identidade cultural e de suas razes africanas. Assumem sua
negritude e lutam para resgatar, recriar e vivenciar elementos
valiosos de sua cultura. Ao mesmo tempo, a manipulao sociocultural,
a envergonhar-se de sua origem e a assumir formas de comportamento
prprio de outros grupos culturais.
21. Assim como os jovens indgenas, a defesa da identidade e da
cultura de seus povos, a integrao com outras culturas e outros
desenvolvimentos sociais e sua prpria articulao so alguns dos
grandes desafios que esto nas mos dos jovens afro-americanos.
2.3.7. Os jovens em situaes crticas Trata-se d setor de jovens que
se encontram em situaes sociais conflitivas ou em desvantagem
social, no lhes permitindo um pleno desenvolvimento como pessoas.
So consequncia das contradies da prpria sociedade que, na vida
diria, contradiz o significado original do que a juventude etapa de
aprendizagem, de opes, de estudos, de incorporao na vida social e
produtiva, de idade do dinamismo, da alegria e da esperana e mostra
um contexto de pobreza, desigualdade, marginalidade e desumanizao.
o que se vem chamando de cultura da morte. Ao falar em situaes
crticas, deve-se ter em conta que a crise da juventude uma crise
generalizada. Todo o setor juvenil vive uma situao de desvantagem
simplesmente pelo fato de ser jovem e viver num contexto social
conflitivo. uma crise diversificada que, tendo uma mesma raiz,
expressa-se em diferentes manifestaes e condutas, como a
toxicomania, a delinquncia, a prostituio etc. uma crise
individualizada. Cada jovem vive sua prpria histria de sofrimento
diferentemente das demais pessoas. As situaes de crise que a
juventude vive no seno reflexo das crises que a sociedade vive.
Podem ser entendidas como as tenses ou problemticas agudas do setor
juvenil em suas distintas ordens ou como momentos de ruptura com o
estabelecido, mas com infinitas possibilidades de mudana e de
transformao. Alguns elementos para uma descrio dos jovens em
situaes crticas podem ser os seguintes: So os que vivem ou convivem
em situaes de injustia, misria, intolerncia, desintegrao familiar e
desamor que os levam a situaes-limite toxicomania, alcoolismo,
prostituio, abuso sexual, violncia, infrao lei, suicdio, uso
inadequado da sexualidade, infeco por HIV, etc e a atentar contra a
sua prpria vida e a vida dos que os rodeiam. So os mais vulnerveis
ao envolvimento em alguma situao crtica, por dificuldades pessoais
como a baixa auto-estima, a insegurana, a solido, a timidez, a
ansiedade, o ressentimento e a pouca capacidade de questionar,
analisar e tomar decises. So os que, no encontrando espao em
instituies fundamentais como a sociedade, o Estado, a Igreja, a
escola, a famlia porque lhes negaram os direitos primordiais para
se desenvolver e crescer como pessoas -, optam por alternativas que
os levam a situaes limites. So os que, vtimas da manipulao e da
alienao dos meios de comunicao de massa, criam para si mesmo falsas
necessidades que buscam satisfazer de maneira equivocada, a partir
de uma percepo distorcida da realidade, assumindo atitudes e
comportamentos que os levam a perder a sua identidade. Os jovens em
situaes crticas no so um grupo especfico fcil de delimitar
socialmente. Nem sempre se encontram os grupos com caractersticas
comuns. A classificao apresentada a seguir ajuda a localizar o tipo
de problemtica e a maneira de atend-los. a) Os jovens dependentes
das drogas A toxicomania includo o lcool um problema crescente
entre a juventude. A toxicomania entendida como um problema de
sade; a pessoa torna-se dependente dos efeitos fsicos e psicolgicos
produzidos por uma substncia alheia a seu organismo. O abuso de
tais substncia tem efeitos nocivos para sua vida individual,
familiar e social. A toxicomania tem entre suas causas, a
personalidade fraca dos adolescentes e sua baixa auto- estima; a
influncia do meio ambiente; as relaes com outros jovens
consumidores; os interesses econmicos de quem produz, processa e
trafica; a desorganizao familiar e a falta de educao que previna
contra os danos causados pela s substncia txicas.
22. H diferentes tipos jovens consumidores de drogas; os que
somente as experimentam por curiosidade ou por presso do grupo, os
que as usam de maneira frequente, porm mantendo certo controle; e
os que j esto numa etapa em que necessitam da droga para poder
viver. Caracteristicamente, os jovens dependentes tm problemas
afetivos, so manipuladores, abandonam a escola, evitam a autoridade
e rejeitam o cumprimento de normas sociais, como compromissos
familiares, profissionais e polticos. Alguns negam a prpria doena;
outros a reconhecem e solicitam apoio para se reabilitar. A
toxicomania tende a aumentar nas grandes cidades. A idade em que se
inicia o consumo cada vez menor, o que significa que muitos esto
comeando a se drogar ainda crianas. b) Os jovens que delinquem A
delinquncia de adolescentes e jovens pode ter diferentes causas. A
principal a pobreza, que os leva a delinquir para buscar
subsistncia e ajudar a economia familiar. Tambm pode ser produzida
por fatores de personalidade, pela dinmica disfuncional da famlia,
pelo meio ambiente crimingeno e pela resposta de alguns jovens
represso ou ao fato de se sentirem vtimas da explorao. Deve-se
distinguir os jovens que tm alguma conduta anti-social ou
delituosa, imprudente ou pouco grave, daqueles que adotam um estilo
de vida totalmente fora das regras sociais ou que j fazem parte da
delinquncia organizada. So situaes diferentes. A maioria dos jovens
delinquentes reproduz o modo de vida da sociedade a que pertencem.
Reagem com a mesma violncia, desonestidade e corrupo que imperam na
sociedade e com as quais esta os agride. Alguns viveram situaes
dramticas. No tiveram uma socializao adequada e tm um baixo nvel de
controle dos impulsos e de tolerncia frustrao. A introjeo de normas
e limites muito deficiente. Os delinquentes no surgem de um momento
para o outro. Surgem como consequncia de um processo em que as
pessoas ou grupos vo se afastando progressivamente de um
comportamento socialmente aceitvel. So jovens muito sensveis crtica
e provao ou desaprovao de quem os rodeia. Por serem estigmatizados
pela sociedade, costumam isolar-se. Suas relaes so superficiais.
Eliminados os estigmas sociais, desaparece o sentimento de culpa e
aumenta a possibilidade de reintegrao sociedade, buscando-se uma
atividade produtiva honesta e estabelecendo-se relaes de confiana.
Quando tm problemas com a lei ou esto presos, atemorizam-se,
deprimem-se e procuram mudar. Muitas vezes, porm, sua prpria
realidade impede a transformao e os leva a problemas ainda maiores.
Por causa das deficincias do sistema judicirio, muitos tm de
suportar abusos de autoridades e a violao de seus direitos.
Normalmente, recebem mais castigos que medidas de orientao e de
reintegrao social. c) Os jovens na prostituio As jovens entram na
prostituio geralmente por razes econmicas. Como na situao anterior,
tambm aqui a pobreza leva a essa forma de atividade como meio de
consecuo dos recursos necessrios subsistncia. Influem, igualmente,
os conflitos familiares, especialmente os relacionados com a figura
do pai ou de algum familiar. J casos em que a prpria famlia as
obriga a se prostituir. Agem sob presso de mfias que primeiro as
atraem e seduzem, e depois as exploram at deixa-las enredadas em
obrigaes e servios. Caracteristicamente, so mulheres que se
valorizam pouco. Desde pequenas tiveram problemas afetivos ou foram
vtimas de abusos sexuais, de maus-tratos fsicos ou psicolgicos.
Normalmente so desconfiadas. Tm dificuldades para manter relaes
conjugais estveis. So inseguras e necessitam de algum que as
proteja. Quando engravidam, costumam proporcionar boa ateno a seus
filhos, embora s vezes os abandonem. Reproduzem os padres de educao
e relacionamento que receberam. Envolvem-se facilmente no consumo e
no trfico de drogas e so muito sensveis ao reconhecimento que
recebem da sociedade. Nas grandes cidades est aumentando a
prostituio masculina, homossexual e infantil que, assim como a
prostituio feminina, consiste no oferecimento de satisfaes sexuais
em troca de dinheiro. Acarreta graves consequncias a quem a exerce,
porque perde o sentido de sua vida e o
23. valor de sua dignidade. Ficam sujeitos explorao e ao abuso,
alm de correrem graves riscos de sade e de segurana. Alguns dos que
vivem essa situao aceitam-na e no tm dificuldades para
apresentar-se socialmente como homossexuais. A grande maioria,
contudo, sofre por ter de expor-se assim numa sociedade que no
reconhece e castiga a homossexualidade como uma conduta moralmente
desviada. Nos ltimos anos tm surgido numerosos movimentos de
homossexuais e lsbicas exigindo respeito sua condio, proteo a seus
direitos humanos e maior participao scio-poltica. Como prprio das
minorias ativas, alguns de seus posicionamentos tm sido assumidos
pelo pensamento social. Por isso encontram-se, especialmente entre
os jovens, expresses a favor de uma cultura que seja mais tolerante
com os homossexuais. Esses debates sacodem igualmente a Igreja e
repercutem na postura que esta toma para atender pastoralmente a
esse setor, tendo em conta que se trata de um grupo normalmente
sensvel ao transcendente e a espiritual. d) Os jovens soropositivos
e doentes de AIDS Trata-se de um grupo em crescimento, j que a
sndrome da imunodeficincia adquirida uma doena que avana em ritmo
acelerado, particularmente entre os jovens e os adultos em idade
produtiva. A doena tem duas fases. Na primeira, chamada
soropositividade assintomtica, a pessoa que incorreu em alguma
conduta de risco infectou-se com o vrus da imunodeficincia humana,
porm no desenvolve a doena, embora possa transmiti-la. Na segunda
fase, aparecem os diferentes sintomas e sinais, e a doena se
manifesta plenamente at levar morte. Num primeiro momento,
procurou-se identificar esses setores com a populao homossexual,
com as prostitutas e drogados. Os estudos, no entanto, confirmaram
que no se trata de uma doena exclusiva de quem vive em situaes
sociais crticas. Qualquer pessoa pode vir a contra-la, na medida em
que se desenvolva comportamentos de risco como contatos sexuais com
troca de fluxos, promiscuidade, uso compartilhado de seringas de
drogas intravenosas, via perineal, transfuses de sangue, etc.
Muitas pessoas e, principalmente, muitos jovens, mesmo sem sab-lo,
esto contagiados. Quem j se sabe contaminado costuma sucumbir ao
desespero e angstia. Os que esto na etapa de manifestao da doena
sofrem de corpo e alma. Desesperam-se porque sabem que por ora no h
cura possvel, os remdios que atenuam o processo so muito caros e os
servios de sade, insuficientes. Sofrem igualmente porque comeam a
experimentar a rejeio e a separao de suas prprias famlias, de seus
amigos e comunidades. A AIDS abriu espaos para a discusso e para
que se suscitassem grandes desafios de natureza psicossocial,
pastoral e moral, relacionados, entre outros, com o uso de
preservativos, a fidelidade, a castidade, os exames de laboratrio
para a deteco do HIV, o tratamento dos doentes, o apoio familiar,
os direitos dos doentes, as polticas sociais de sade e a dotao
oramentria, a educao, a preveno, a ateno pastoral, os grupos
religiosos que, diante desta situao, procuram se aproximar da
populao contaminada, etc. e) Os jovens com deficincias Trata-se de
um setor socialmente desarticulado, mas numerosamente
significativo. So jovens que sofrem algum tipo de invalidez e que
tm srios problemas fsicos, psicolgicos e sociais, como paralisia
cerebral, sndrome de Down, psicoses e outras doenas mentais,
deficincia visual ou auditiva, paralisia, etc. Muitos sofrem essa
situao de desvantagem social desde o nascimento ou desde a infncia.
Outros foram acometidos mais recentemente, como o caso daqueles
gravemente vitimados por intoxicao com drogas ou pela violncia e
pela guerra. Alguns esto sob cuidados de suas famlias. Outros
permanecem em hospitais ou centros especializados. H quem viva e
morra relegado solido e ao abandono. Sofrem por suas prprias doenas
e limitaes permanentes, pela constante necessidade de receber
servios reabilitadores de sade, pela insatisfao existencial, pelo
estado psicolgico de depresso, angstia familiar, pela dificuldade
de serem reconhecidos e ajudados socialmente e pelos problemas
econmicos que sua situao e recuperao acarreta. particularmente
preocupante sua difcil integrao sociedade, de maneira produtiva e
auto- suficiente. O sistema econmico neoliberal exclui os
improdutivos, obrigando-os a ser
24. dependentes, a se tornar um fardo para as suas famlias e a
viver sujeitos assistncia e at mesmo mendicncia. Requerem uma ateno
especializada em matria educativa, legal, de sade, econmic,
trabalhista profissional e, evidentemente, pastoral. Neste campo,
as experincias que existem so, na maioria do tipo assistencial. No
promovem a auto-suficincia nem a participao social e o compromisso
com os deficientes. Junto aos deficientes, suscita-se o desafio de
acompanhar tambm os que os atendem e suprem suas necessidades
familiares, amigos, profissionais, agentes de pastoral, homens e
mulheres de boa vontade com um alto esprito de entrega, mas que, ao
mesmo tempo, precisam satisfazer suas prprias necessidades e
resolver seus prprios problemas para poder ajudar aos necessitados.
f) Outras possveis situaes crticas Com uma situao social to difcil
e com uma juventude to vulnervel, bem provvel que existam outras
situaes crticas que obstaculizem seu pleno desenvolvimento e promoo
humana. Analisando a realidade da juventude e acompanhando de perto
os grupos de jovens, ser possvel descobrir novas situaes crticas
que, sem deixar de lado a viso e a ao integral e de conjunto, podem
ser atendidas pastoralmente. o caso das mes solteiras, das vtimas
de abuso sexual, dos casais novos em crise, dos jovens
encarcerados, etc. 2.4 A nova viso cultural-simblica A viso
cultural simblica no desconhece as contribuies das vises anteriores
para compreender os jovens. Pelo contrrio, integra-as e lhes d um
sentido novo. Busca responder aos questionamentos que surgem
sobretudo quando se olham as aceleradas e profunda mudanas
culturais que estamos vivendo. No se deve esquecer que a juventude
surge, historicamente, como um fenmeno prprio da cultura emergente,
a partir dos processos de urbanizao. Desde o comeo a juventude
aparece pouco homognea. Diferentes formas culturais correspondem a
uma variada gama de condies juvenis que evoluem em ritmos prprios.
Por isso, pode-se falar de um universo cultural dos jovens,
definido por uma enorme variedade de formas de viver a vida e de
encontrar sentido para a existncia. Nele se d um processo mltiplo e
contraditrio de formas, fruto do tecido de relaes que os jovens vo
estabelecendo com as diversas instncias socializadoras. Esse
universo se compe de culturas jovens ou espao sociais de
confluncia, de encontro, de identificao, de liberdade entre iguais,
que expressam traos semelhantes, como uso do espao, gostos, formas
expressivas e de significao, linguagens, etc. Apesar das diferenas,
todas se caracterizam pela contestao cultura tradicional. Pem em
xeque e reelaboram as propostas das diferentes instituies.
Constituem fontes de resistncia contra toda ordem imposta e de
rejeio ao cdigo dominante. Ultimamente, esto-se compreendendo mais
como ambientes, atmosfera,sensibilidades, comunidades culturais
geradoras de significao, nas quais coexistem elementos de diferente
natureza, sociais, polticos e econmicos. Para entender essa nova
sensibilidade dos jovens, necessrio retomar a referncia
ps-modernidade, que est gerando um fenmeno cultural de polaridades
em tenso: de uma cultura do uno, est-se passando para uma cultura
do plural; do definido para o ambguo; do linear para a rede. Nesse
sentido amplo, as culturas juvenis referem-se maneira como as
experincias sociais dos jovens se expressam coletivamente mediante
a construo de estilos de vida diferentes, localizados
fundamentalmente no tempo livre ou em espaos intersticiais da vida
institucional. Num sentido mais restrito, so microsociedades com
graus significativos de autonomia em relao s instituies adultas. Os
jovens de hoje criaram verdadeiros movimentos culturais que
conjugam fatores institucionais com fatores de ordem subjetiva.
Recentes estudos apontam alguns traos das sensibilidades dessas
culturas juvenis. So diversas, no-homogneas e contra-culturais; tm
a ver com atmosferas ou ambientes geradores de significado que no
coexistem nem constituem em perodo cronolgico nem um setor. Alguns
desses ambientes so a irracionalidade, expressa no delrio, na droga
e nas seitas; a rebelio expressa no antiautoritarismo, na no-escola
e na evaso; a intimidade, expressa no afetivo-sexual e nas
25. novas formas de ser famlia, como as comunidades; a
identidade no consumo, expressa nas modas; e a paz. Expressa no
antibelicismo e no no guerra. Sua caracterstica comum a
mutabilidade permanente, a instabilidade, o nomadismo e o estar de
passagem. No obstante seu carter nmade, podem esboar-se modas ou
horizontes comuns de gostos que fazem com que se tornem familiares
uns aos outros e, ao mesmo tempo, os diferenciam. Os jovens vivem e
apreciam modas que no obedecem a um princpio ordenador da
realidade, mas possibilidade de correspondncia. O gosto a
correspondncia, mais ou menos conflitiva, de objetos culturais e
valores. A moda uma forma de expressar publicamente sentidos
compartilhados culturalmente. Na comunicao ou no mbito dinmico de
circulao de sentidos partilhados, os jovens tomam objetos culturais
de alto consumo (vdeos, msicas, roupas...) e os ressignificam.
Neste contexto, aparece o ldico como um dos eixos e conceitos
explicativos das identidades juvenis. O ldico entendido como o
territrio dos estados de disponibilidade e abandono nos quais os
jovens se situam. So estados que escapam a toda intencionalidade
utilitria. Levam-nos a uma forte experincia de ser jovem, cuja raiz
est na liberdade do jogo. Um jogo sem regras, nas atividades livres
do prazer, na festa, na criao artstica, nos sonhos e na prtica do
imaginrio. Recupera-se, assim, a dimenso esttica da vida, que
permite um acesso totalidade da realidade a partir de um ngulo que
no o da racionalidade iluminista. Trata-se de uma compreenso do
mundo a partir das formas sensveis. A partir do gosto, da relao
mediada por smbolos e do universo dos desejos. A partir dessa
dimenso tomam sentido, para as culturas juvenis, todos os demais
assuntos e temas. Ao observar essas culturas juvenis, no se pode
deixar de perceber as notveis diferenas entre os jovens das grandes
cidades, os jovens dos pequenos povoados ou dos jovens que vivem no
campo. Em todos esses casos, necessrio um especial discernimento
das riquezas de sua cultura juvenil. A viso sociolgica, que
considera a juventude como corpo social, permitiu reconhecer
diferentes setores, condicionados por distintas caractersticas
socioeconmicas e culturais. Pela caminhada da Pastoral da Juventude
Latino-Americana e pelo papel decisivo que os fatores
socioeconmicos desempenham no passado, presente e no futuro do
continente, deu-se uma nfase especial apresentao da situao social
dos jovens em seus respectivos setores. No se deve desconhecer,
contudo, o papel dessas novas comunidades culturais ou de sentido,
as novas sensibilidades a partir das quais os jovens se apropriam e
ressignificam sentidos e modos de ver e de viver. necessrio
explorar melhor as novas sensibilidades que se constituem em novas
pistas para conhecer e amar os jovens. Essa tentativa de olhar de
forma mais ampla o juvenil leva a reconhecer a importncia da pessoa
de cada jovem, do contexto socioeconmico a partir do qual eles
constroem suas identidades e das novas comunidades culturais ou
sensibilidades que impregnam todos os ambientes e setores. Uma
pastoral da juventude que queira responder realmente s necessidades
dos jovens no pode desconhecer nenhuma dessas dimenses. Ao olhar os
jovens hoje, a Igreja percebe que eles no so somente destinatrios
da evangelizao. Cada gerao aporta uma sensibilidade prpria sua
vivncia crist, possui a capacidade de descobrir novas dimenses da f
e revela sinais de vida ainda suficientemente explicitados na
experincia crist (P1169). 3. CONHECER A JUVENTUDE NO FCIL A f na
presena e na ao libertadora de Deus e de seu Esprito na histria
leva a reconhecer os sinais de vida que se manifestam na grande
diversidade de realidades nas quais vivem os jovens do continente.
Nesses sinais de vida celebra-se a juventude como um dom especial
de Deus para toda a humanidade. Atravs de caminhos muito
diferentes, os jovens buscam respostas sua necessidade de Deus e s
suas perguntas pelo sentido. De fato, a imensa maioria diz crer em
Deus, e um nmero significativo est comprometido com o conhecimento
e o seguimento de Jesus. Defendem decididamente seu direito de ser
sujeitos e protagonistas de toda proposta que tenha relao com suas
vidas. O valor da pessoa e de sua prpria subjetividade um trao
muito significativo que marca a identidade geracional dos jovens de
hoje.
26. A mentalidade tcnico-racionalista, adquirida na
escolaridade, torna-os menos expostos resignao e ao fatalismo. No
se sentem obrigados a repetir modelos pelo simples argumento do
costume ou da tradio. A convico pessoal tem carter de critrio ltimo
para a deciso de suas opes de vida. Desejam menos distncia, menos
formalismo e maior espontaneidade no trato entre pais e filhos,
entre professores e alunos, entre leigos e sacerdotes e, em geral,
em todas as suas relaes. Agrada-lhes conhecer-se a si mesmos e
partilhar suas inquietaes e intimidades com seus iguais. Mantm a
mais democrtica relao entre os sexos que j houve na histria. Tm
muitas ocasies para participar das experincias geracionais que
renem outros jovens de diferentes classes sociais. Vivem a
felicidade do momento presente com um sentido de gratuidade, e no
como consequncia de merecimentos ou sacrifcios. Tm um forte sentido
e grande admirao pela celebrao e pela festa. A par dessas, h tambm
situaes do mundo juvenil ameaadas por sinais de morte, que se deve
ser anotados e combatidos no trabalho pastoral que se realiza com
os jovens. o No mundo de hoje, o sentido da vida tornou-se plural.
Existe um amplo campo de sentidos da vida. Supe-se que cada um
possa escolher como, por que e para que viver, com autonomia e
independncia pessoal. Contudo, o mercado de sentidos manobra muitos
jovens e frequentemente disfara de escolha a manipulao publicitria
que se faz com eles. As diversas e contrapostas ofertas de estilo
de vida debilitam as certeza de muitos jovens, confundem-nos e, no
poucas vezes, levam-nos a experimentar graves contradies internas.
Essa confuso agride sua sade espiritual, pois produz sentimentos de
diviso e rupturas em sua identidade pessoal. o Muitos jovens se
sentem distantes do mundo adulto da participao social e poltica e
das figuras de autoridade. Em muitos casos, essa atitude esconde um
desinteresse por crescer e amadurecer. No so poucos os que sentem a
tentao de permanecer como esto e renunciar ao esforo e ao desafio
de superar-se, melhorar e assumir novas responsabilidades. o Na
medida em que os jovens se socializam, so impelidos a considerar os
demais rivais. Incorporam desconfiana e temor para a relao com os
outros. So cada vez mais escassas as possibilidades que tm de fazer
experincias de solidariedade e cooperao, embora se sintam
naturalmente inclinados a tanto. o A dificuldade de ingressar na
educao superior e, portanto de entrar com relativo xito no mercado
de trabalho faz com que muitos jovens incorporem uma espcie de
desiluso pelas ofertas e possibilidades que a sociedade tem para
eles. So e se sentem excludos. o A cultura ps-moderna tende a
desencadear um falso sentido de espontaneidade e da
responsabilidade moral. Na prtica, isso se traduz num imaturo
sentimento de inocncia pessoal em face do mal cometido e do bem
omitido. necessrio ajudar a superar essa falsa conscincia moral. o
A sociedade de consumo multiplica os produtos e, para assegurar seu
mercado, exacerba a capacidade de consumir. Um modo de consegui-lo
fazer com que nenhum produto satisfaa efetivamente as necessidades
mais profundas de quem o adquire. Manipula os consumidores para que
vivam num nvel superficial, sem contato com as genunas motivaes.
Isso leva, principalmente os jovens, a uma espcie de incapacidade
para vivenciar e para interiorizar. Essa incapacidade faz recorrer
permanentemente a estmulos e a novidades para se chegar a sentir
que se est vivo. o polo oposto da espontaneidade e da vital
expresso da alegria de viver. o A convico de que a felicidade pode
ser uma experincia do presente, e no somente algo que se alcanar
apenas no futuro, encheu a vida de muitos jovens de uma nova luz. A
experincia demonstra, no entanto, que a felicidade completa s se
desfruta quando acompanhada da capacidade de comprometer as
energias em tarefas de longo alcance, com horizonte amplo e projeo
social. Uma viso apenas de curto alcance torna estril a capacidade
de gozar e a esgota.
27. Todas essas situaes convidam a estarmos atentos, a discenir
e a no permitir que se debilite o sentido de Deus, de sua ao e
presena que convida a apostar, sempre, na vida. Contra a morte. 4.
OS JOVENS E A IGREJA No obstante a tendncia privatizao do religioso
e a criao de campos religiosos prprios, longe do modelo
institucional, os jovens latino-americano estabeleceram um dilogo
com a Igreja especialmente atrves da Pastoral da Juventude. Ela j
tem um longo caminho percorrido que deve ser valorizado e avaliado
em todos os seus dinamismos e limitaes. Um momento forte desse
dilogo foi o Primeiro Congresso Latino-Americano de Jovens,
realizado em Cochabamba (Bolvia), de 18 de dezembro de 1991 a 5 de
janeiro de 1992. Ali os jovens manifestaram sua conscincia sobre as
riquezas do continente. Ao mesmo tempo, contudo, denunciaram sua
situao de empobrecimento, manipulao, marginalizao e at extermnio,
como consequncia de um processo histrico que violentou nossas
culturas, direitos e dignidade humana5 e os fez dependentes
econmica, poltica, cultural e socialmente. Definiram-se como jovens
com rostos muito concretos, de classe popular, urbanos, rurais,
trabalhadores, estudantes, desocupados, mineiros, pescadores... com
um caminho comum de lutas e conquistas... porm necessitados de uma
identidade latino-americana que nos d oportunidades e formas de
protagonismos6 , unidos pela f em Jesus Cristo numa busca de
perspectivas comuns para enfrentar a opresso e a marginalizao
porque seguimos crendo num Deus que nos faz transmitir vida a
partir da pobreza7 . Disseram querer que a Igreja, especialmente a
hierarquia, se faa pobre com os pobres, tenha contato com o povo
que sofre, seja servidora e, atravs de sua ao, assuma a luta do
povo pela libertao, inserindo-se na dinmica social; que ela seja
proftica, denunciando a dependncia e a pobreza no continente e os
abusos econmicos e polticos, chamando por seu nome a cada injustia8
. Junto com a denncia clara da injustia, consideram necessrio o
anncio de critrios e meios para a construo da sociedade fraterna,
alternativa falsa liberdade que o neoliberalismo propaga e falta de
liberdade que fez o socialismo real fracassar. Essa atitude deve
brotar da reconciliao da Igreja com o passado e do pedido de perdo
pelas sombras que projetou, valorizando tambm as luzes geradas na
vida da Amrica Latina9 . Propuseram uma Igreja comunidade de
comunidades, fraterna, dialogante, compreensiva, igualitria e sem
distines, organizada com unidade de critrios e de planos pastorais
feitos de forma participativa com pastores amigos dos jovens, em
atitude de escuta e de servio, com leigos responsveis em sua
vocao... Uma Igreja que priorize a formao de pequenas comunidades
encarnadas no ambiente cultural dos povos... onde a mulher seja
reconhecida e valorizada como dinamizadora do corpo eclesial e
social10 . Os bispos, por sua vez, reunidos na IV Conferncia Geral
do Episcopado Latino-Americano em Santo Domingo, constataram que so
cada vez mais os adolescentes e jovens que se renem em grupos,
movimentos e comunidades eclesiais para rezar e realizar distintos
servios de ao missionria e apostlica (SD 112). Reconheceram que os
jovens catlicos, organizados em grupos, pedem aos pastores
acompanhamento espiritual e apoio em suas atividades. Necessitam,
sobretudo, em cada pas, de linhas pastorais claras que contribuam
para uma pastoral Juvenil orgnica (SD 113). A Igreja continua tendo
um grave problema de comunicao com os jovens. Muitas vezes
desconhece suas linguagens, suas sensibilidades, suas lgicas e seus
cdigos. A rap