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Reboco Caído nº28 versão digital

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Pag 1 REBOCO CAÍDO#28Editorial

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Vento frioPor Fabio da Silva Barbosa

aproveitando a depressão noturnaa melancolia solitária deste aposentofico observando o vento nas árvoresa chuva fina caindosó o nada a preencherleio algumas frases tortasescritas há algum tempono intuito de começar uma histórialembro da senhora dormindo na calçadaserá que arrumou um lugar seco para ficarvejo os galhos balançandodobrandoquantas pessoas agora por aíencarando essa noite friasem ter onde iruma voz grita alguma coisaquebrando o silêncioo que será que aconteceupassa um carroas árvores continuam a resistiros galhos balançam com mais forçalixo voando pela ruatomo mais um goleo vento continua a soprar pela cidade fria

Este número fiz na intenção que fosse oúltimo de 2015, encerrando o ciclo comemo-rativo de meia década do Reboco Caído.Mas, devido a falta de tempo e de grana,acabou ficando como o primeiro de 2016. Ofinal de ano foi bem corrido, mas produtivo.O e-mail de guerrilha ou informativo digital– Reboco Caído tá rolando, aconteceu aquarta edição da TARDE MULTICULTU-RAL SEM FRONTEIRAS (desta vez na CasaViva de Porto Alegre), tô na luta para lançarnovos livros, fazendo novos contatos, co-nhecendo novos espaços e possibilidades...experimentando, testando... Um monte decoisas, como sempre. A capa desta edição édo guerreiro Borges Kxias. Começamos comum dos meus contos, depois o release en-viado pela Devastadoras. Alguns escritosdepois temos materiais de colaboradores epoemas do Doomn, retirados do zine PoesiaCaótica. Temos também um da guerrilheiraGioconda Belli. E daí por diante.*Em memória de Milton Santana*Forte abraço para a galera da Toca do Samba,Casa Viva, Vida Torta e para Helena Ortiz. Tamojunto.

REBOCO CAÍDO #28 Pag 2

Por Fabio da Silva Barbosa

Polenta era um cara tranquilo. Não gosta-va de se incomodar. Dizia que religião epolítica não se discutem. “Isso sempreacaba em problema e problema não é co-migo”.Mesmo querendo, não conseguiu apren-der muita coisa no colégio. Arranjou umtrabalhinho qualquer que fosse pagar ofeijão com arroz dos filhos e da compa-nheira. “E vamos levantar as mãos para océu. Tem gente que não tem nem isso”.Sempre dava bom dia, boa tarde e boa noi-te. Falava com todos e evitava discordar.Quando havia manifestação que buscas-se alguma melhoria local, procurava nãose envolver. “Isso não adianta nada. Essepessoal gosta é de confusão.”Um dia foi mandado embora sem explica-rem o motivo. Tentou conversar, mas nãoconseguiu argumentar. Procurou emprego,mas estava difícil. Começou a fazer umacoisinha aqui e outra ali. “Deus vai nosajudar. Sempre agimos direito. Não podeser assim”Certo dia teve uma ideia. Iria pedir para acompanheira fazer umas comidinhas gos-tosas. Venderia pelo Centro. Montaria umabarraquinha. “Vou procurar o Fulano. Vo-tamos nele e nunca fomos incomodar. Eleé boa gente e vai entender. Conseguire-mos uma licença. Ele disse que precisan-do era só aparecer e que não esqueceriados amigos”.Foi algumas vezes ao gabinete. Sempreuma fila de gente esperando para falar. Oeleito em reunião. Passou pelo Centro eviu um bom lugar. Não podia continuar es-perando. “Enquanto tento falar com ele,vamos fazendo a freguesia. Logo consigoconversar e ele ajuda”.A empreitada foi um sucesso. Polenta ven-dia os comes e bebes, o dinheiro entrava e

os clientes gostavam”Continuou passando no gabinete. Conse-guiu falar com Fulano que sorridente aper-tou sua mão e prometeu. “Pode contar comi-go. Dê só o tempo das coisas andarem. En-quanto isso, vai vendendo sua comidinhapor lá”Polenta ficou eufórico. Não podia se conter.“Eu disse que tudo ia melhorar”.Um dia a fiscalização apareceu. Polenta ten-tou conversar. Tomaram tudo que tinha, seuganha pão, e nem quiseram escutar. “Mas odoutor Fulano tá vendo a licença pra mimtrabalhar.”Empurrão, grosserias e a promessa de queseria preso se continuasse a falar. Polentasubiu o morro triste, desanimado. No meiodo caminho se deparou com uma operaçãopolicial. A troca de tiros ecoava por todo olugar. “Ninguém entra e ninguém sai. Vai terde esperar os vagabundos caírem”.Polenta preocupado com a família no meiodo tiroteio. De repente viu uma mulher des-cendo a estradinha. Parecia… Não podiaser… E o que era aquilo que ela trazia nocolo? Polenta ficou sem palavras ao ver demais perto o bracinho pendurado, o sangueescorrendo… Nunca mais foi o mesmo. Da-quele momento em diante mudou o olhar.

Polenta

Betinho Massetti:“Morreram varios aqui na nossa quebra-da ontem até cadáver fui ver na calçadacheio de tiros tá embaçado até onde vaiessa onda de violência a vida não estávalendo mais nada ? E nossas crianças ?Qual o futuro pra se manter vivo terá queter Sorte? Seloco to de saco cheio.”Deise Santos:“Assassinatos em massa em periferias…E ainda falam em pacificação, inteligênciana segurança pública e justiça. Onde?Quando? Que vergonha!!”

Com esta formação as Devastadorasrealizaram diversos shows em Porto Alegree em cidades da região metropolitana,inclusive dividindo palco com a banda OlhoSeco, em evento realizado em Gravataí.Também participaram de duas coletâneas debandas independentes: Cacos de Vidro eManifesto Cultural 1 de Maio 2014.Em novembro de 2014 a banda finalmentecompletou sua formação com a chegada deManu (baixo) e realizou seu primeiro showno interior do estado, em evento beneficente,na cidade de Santa Maria. Em 2015 a bandaparticipou de vários eventos, sendo seu maisrecente show junto com a banda Karne Krua,em Gravataí. Atualmente as Devastadorasestão em estúdio gravando o seu primeirocd, que deve ser lançado no início de 2016.Como influencias, o quarteto possui bandasdo cenário punk nacional e também do hardcore do exterior, porém sua principal ins-piração para compor são as experiênciaspróprias, situações que vivenciam no coti-diano e que refletem a cruel realidade bra-sileira. São letras próprias e de protesto con-tra a opressão da população.Um som punk rock e hard core usado comoinstrumento de revolta para falar sobre arealidade de maneira crua e direta, um meiode expressão real e livre para externar a quemquiser ouvir sobre toda a injustiça cometidae a banalidade com que a vida humana étratada nessa sociedade.

Pag 3 REBOCO CAÍDO #28

A banda Devastadoras começou como umprojeto idealizado por Cami, a guitarrista.O nome vem de um termo jornalísticoempregado na abordagem de catástrofesnaturais e também usado para definirtragédias humanas.O projeto inicial da banda era formado porCami e Briane, que ensaiavam com voz eviolão. Logo mais, Tai, ex Repulse, passoua integrar a banda como baterista. Comesta formação, a banda fez seu primeiroensaio em setembro de 2012, no EstúdioNavarro, em Canoas/RS.Com a necessidade de um vocal comestilo agressivo e com a mesma afinidadecultural, Rosa, ex Infinity War, foi convi-dada a completar a formação da banda.Logo depois Briane deixa a banda pormotivos pessoais e Dani Pedra, bateristada Feminil Kaos, assume o baixo, porémtambém sai da banda após alguns ensaios.A banda seguiu ensaiando com Cami(guitarra),Tai(bateria) e Rosa(vocal) e emoutubro de 2013 realizou seu primeiroshow no Mutantes Bar, em Porto Alegre.Logo após o trio gravou um cd demo aovivo, intitulado Devastadoras BarulhoKonsciente, com cinco faixas.

Devastadoras: Barulho Konsciente!

Por Devastadoras

Pag 4REBOCO CAÍDO #28divagações e problematizações

Por Fabio da Silva Barbosa

Fico vendo as pessoas desesperadas, infe-lizes, amarguradas, mas sempre culpandoaos outros e nunca olhando para si mesmo.Reproduzem conceitos, padrões e estereó-tipos que mantém tudo exatamente comoestá. Do alto de seus preconceitos se dizemcristãos. Falando de união, julgam e opri-mem. Não admitem nenhum certo que nãoseja o seu, ao mesmo tempo em que falamdo direito de excluir, de usufruir privilégios,de manter tradições maléficas e peço-nhentas. Uma argumentação distorcida. Im-posição. Crendo na mentira e mentindo averdade, olhando apenas os ângulos quesão favoráveis. Acreditando na síndrome doarrebanhamento, vivem a esperar alguémque resolva seus problemas, que indique ocaminho para o céu. De preferência um ca-minho fácil. Tudo bem facinho. O importan-te é como os outros vão ver. Aparência sem-pre. O conteúdo sendo substituído pelaaparência, o profundo pelo superficial. A vai-dade cegando. A mentira reinando. É a eraartificial. Evolução do que? Tudo se con-vertendo em instrumentos de poder e se ga-rantindo na visão limitada do cidadão debem. Cidadão de bem ou que possui bens?Sempre foi considerado impossível imagi-nar o trem andando fora da linha. Mas “se-jamos realistas, exijamos o impossível”.Buscam uma segurança inalcançável, reali-dades irreais. E onde estamos no meio detudo isso? Estamos no meio disso tudo?Agimos e interagimos? Ou assistimos comoa um filme esquemão? Criam meninas paraserem princesas ao invés de guerreiras se-dentas por justiça e dignidade. Que caia anobreza! Falam de justiça, mas o que temossão os dentes das engrenagens a nos mas-tigar. Falam de escolhas, mas não temos op-ções de verdade. Você prefere merda moleou merda dura? O ter vale mais que o ser, o

objeto mais que a pessoa. Racional ou irra-cional? Matam-se pelo direito de ficaremtrancados em seus carros, casas, aparta-mentos, quadrados, cárceres. Buscam a li-bertação através da posse e acabam pos-suídos pelo que pensam possuir. Pensarse torna errado, um ato infantil, ignóbil. Onegócio é fazer de conta que pensa. En-cher a cuca do considerado relevante e sairpor aí vomitando bobagens. Como em umprograma sensacionalista de televisão. Es-cola, trabalho, cemitério. Escola, trabalho,cemitério. Se alimente de lixo e assista tele-visão. Se informe de desinformação. Que-rem te ver focado na ilusão. Voltemos as-sim a questão da ilusão. O que é impossí-vel? Continuar assim ou acreditar no queos iludidos chamam impossível. Impossí-vel é continuar assim e ilusão achar queesse é o único caminho possível. Esse ca-minho sempre foi e está cada vez mais im-possível. Consideremos e reconsideremos.Busquemos sempre novos rumos. O pro-cesso é contínuo.

divagações e problematizações IIPor Fabio da Silva Barbosa

Fico vendo as pessoas com medo. É medode andar, de se mover, de sair, de lutar, depensar, de questionar, de se libertar, de nãoser mais um. Medo de se conhecer, de serúnico… Medo de ser. Um medo implanta-do desde sempre, junto de mentiras, de ilu-sões. Medo de sonhar, de ver o real, de irpra rua, de se machucar, de se expor, deerrar… Medo + medo + medo + mentira +medo + mentira + falsidade + medo + faláci-as + medo + medo… + muito medo. O medode morrer trás uma vida morta. O medo dese ferir nos transforma em ferida exposta.Se afogando no mar do medo. Tempesta-des de pavor. Pânico total. O temor de tudo.Medo da natureza, da cidade, do inespera-do, do caos. Medo da mudança. Sufoca-dos pela rotina, injetam doses de confor-

Pag 5 REBOCO CAÍDO #28mismo e bundamolismo. Nada, nada, ná-degas. Desligar a tv e ir para a rua é muitoperigoso, diz o noticiário. Sair do compu-tador e existir fora do virtual é viver eviver é muito perigoso. Necessidade con-tínua de proteção. Empresas enriquecen-do com a proteção, vendendo seguran-ça. Abrem mão da liberdade para ter a fal-sa sensação de proteção. Pensar deixa in-seguro, então paremos de pensar. Pensarpara que? Deixem que pensem por vocês.Mas ninguém pergunta: Quem são essesprotetores? De quem ou de que eles teprotegem? Quem te protege dos proteto-res? O que eles realmente estão prote-gendo? Será que é realmente você? Aí secriam intelectuais que são contra pensar,libertários aprisionados, esquerdas dedireita, mentiras + mentiras + mentiras +mentiras… E ninguém sabe nada. Medopor toda parte. Muitos medos. A patolo-gia do medo. A sociedade do medo. Medo.Medo travestido de raiva, de racismo…preconceitos mil. Medo da coragem emedo do medo. Medo medonho. Medo,grades, cercas, arames, marginalidade,exclusão… Medo.

Preciso de material cortante, corda,comprimidos ou quem sabe uma

cervejaPor Fabio da Silva Barbosa

noites insonessombriassolitáriasamargura

perdido em labirintosde lembranças e pensamentosmomentos de sorrisosmomentos de tormentos

o suor frio que nos inundasem distinguir direito a temperatura

nos afundanos tortura

os poucos amigos que ainda restamnos aturamou ao menos tentamou ao menos pensamos que tentam

uma lufada de ar pestilentoo calafriotudo nubladotudo certo tudo errado

escorre como gosmasem explicarsem entendersem importar

lágrimas a suspirardo único olho que choraque é o meuque é agora

a flauta dos ventos a tocaro fim e o início a misturartudo ficando turvonão dá para continuar.

Três pontinhosPor Fabio da Silva Barbosa

Te chamam depretomestiçobastardopobremendigofeiofaveladopresuntoviadoNúmero de estatísticanão tem ninguém do seu ladoNão quero ser teleguiadoTá tudo errado

Pag 6REBOCO CAÍDO #28Roubam nossas chancespra depois dizer que temos de fazer algoque somos acomodadosVocê não conhece o outro ladoRoubam sua culturamodo de viverpalavreadopra impor a mentiratida pelos hipócritas como realidadeClassificam e rotulamporque assim é mais fácil venderQuerem te enganarquerem te prenderQuerem separarpra depois vencerNão sou isso aínão sou isso nãoA minha é outrarespiro em outra atmosferaTransformam homens em feraspra depois crucificarNão podem me pararNão podem prender/matarPodem até me esfolarque vou continuarporque minha vozvai além da minha gargantaNão sou uma pedraou apenas homem plantaPodem até atingir meu corpomas isso é muito poucopois o conteúdo estáonde você não pode verou tocarNão vão me enlatarcontinuarei a rolarvagarcaminhar

asteriscoPor Fabio da Silva Barbosa

tô aborrecidoboladãotenho esse direitonão vá dizer que não

meu irmãovocê sabe como étiro na caraou corrente no pé

a escravidão continuamas já não depende da cortodo mundo tá juntonesse museu de horror

continuam se especializandono discurso vaziomaquiando a verdadetransformando em mentira

a miséria e a fomebem ao ladodo bairro grã-finovão nos jogar para baixo

para baixo da terrapara baixo do tapetequerem te meter a mãoe enfiar o cacete

humilham e batemprendem e trancamquando não matamainda crianças

é morte por dentroé morte por forainvadem sua casapoluem a memória

poluem os riosfecham escolasreprimem a lutainventam a história

* **

Pag 7 REBOCO CAÍDO #28

Por Fabio da Silva Barbosa

Não ouvi quando chegaram, mas acordei comum forte barulho. Abri os olhos e continueideitada. Gritos desesperados.- Pelo amor de…- Solta ele.- Que isso?- Ele é trabalhador.- Para.- Socorro…- Não faz isso.- Ele é trabalhador.- Todo mundo pra trás! Ó o escândalo.- Quietinho! Quietinho!- Não adianta! Perdeu!Levantei rápido e fui cuidadosamente até ajanela. Fiquei de cantinho, escondida pela es-curidão do barraco. Avistei o carro branco,sem janelas, parado. Aquele carro era a verda-deira assombração do morro. Não tinha lobi-somem, vampiro, alma penada… Aquele erao terror. Quem entrava, nunca mais era visto.- Fica quieto, rapaz! Fazer barulho é pior.- Segura sua mulher aí, se não vai sobrar pratodo mundo. Tamo tentando ser legal.Ouvi choros desesperados. Passei por baixoda janela e me escondi no outro canto, bus-cando uma visão melhor do acontecimento.Tive de ficar mais afastada para fugir da luzque vinha da rua. Eram cinco homens arma-dos. Um deles segurava o filho de Dona Zizi-nha pelo pescoço com um braço e com a ou-tra mão apontava a arma para a cabeça dele.Os outros quatro apontavam para a famíliaparada na porta de casa.- Mamãe, que barulho é esse?Meu filho mais velho ameaçou levantar. Fizsinal de silêncio e gritei baixinho.- Fica aí. Não se mexe.Ele voltou a se embolar com os irmãos nacama de casal que dividíamos.Voltei a olhar para fora. Um dos homens jánão pontava a arma para Dona Zizinha, o mari-

O Carro da Linguiçado e as filhas. Circulava pela rua olhandoprincipalmente para minha janela. Me abai-xei. Ouvi meu filho prendendo o choro.Outro já se mexia. Fiz novo sinal de silên-cio. O barulho de choro aumentou na ruae pude ouvir Dona Zizinha gritando. Le-vantei só até a altura necessária e vi o ho-mem que segurava o filho dela ainda em-punhando a arma e arrastando o rapazna direção do carro. Abaixei de novo eengatinhei até a cama. Me abracei com ascrianças, ouvindo o desespero da famíliavizinha. Ouvimos o carro indo. Ainda poralgum tempo, choros e lamentos pela rua.Alvinho nunca mais foi visto.

Concurso públicoPor Francisco Bragança

Quero ser funcionário da poesiasó a poesia faz sentidoe sem cerimônia o desfaza poesia é uma provasó a faz quem sabe ser audaz

Quero ser funcionário da poesiana poesia se inscrevee passa por um processo de seleçãonão há aprovados ou reprovadoshá os que libertam as palavras da prisãodo coração

Quero ser funcionário da poesiaa poesia tem empregotambém tem cheiro, som e corquem escreve poesianão se aposenta nem da alegria e nem dador

Quero ser funcionário da poesianela sento praça, nela estou lotadoa poesia enriquece a calmaquem se faz da poesiacarimba e assina com a própria alma

Pag 8REBOCO CAÍDO #28

Por Panda Reis

O tema riqueza nunca teve o termo querealmente merecia ter, pois poucos parampara pensar sobre a riqueza das pessoas,das famílias e até de Estados. Na verdade,as pessoas não se importam com a origemdo dinheiro dos grandes capitalistas domundo atual, mesmo que os membros dasatuais elites tenham na origem de seu capitalmaneiras exploratórias antes mesmo delesvirem ao mundo. Poderosos políticos quedefendem leis cada vez mais austeras, quetendem a conter a dita crise financeira queassola o mundo, grandes empresários deempresas gigantescas detentoras de umaquantidade de mão de obra que fariaqualquer senhor de engenho morrer deinveja, detentores de mais valia absurda-mente cruel e funcional para suas empresas,dona de ideologias tão bem elaboradas quefaz um assalariado entregar outro assalaria-do em troca de benefícios monetários oude influência, privilégios (acho que já vi is-so no século XVIII, onde pares caçavampares...), banqueiros dominantes de um mo-nopólio financeiramente agiota, aondecontrolam linhas de créditos que de tãoinseridas na temporalidade capitalista atual,fazem o povo não notar os lucros astro-nômicos mesmo em tempo em que a criseafeta outros ramos.A riqueza, seja ela em metal ou papel, emsemente ou carne, seja agrícola ou terra,sempre seduziu as pessoas que controlame os controlados. Ela consegue moldar go-vernos, transformar ideologias e passearpor sistemas diversos desde antes mesmodo mercantilismo e das grande navegações.A concepção psicológica de riqueza veiojunto com a idéia de sedentarismo, juntocom a revolução agrícola e o sedentarismosapiens, quando nossos antepassados re-solveram cercar os animais, resolveram

cercar o vilarejo, combater quem não fossedesse espaço físico tão irreal como a própriapercepção de mundo que se tinha, quandoeles resolveram anexar as “riquezas” do vi-larejo vizinho, ai nasce não só a noção deriqueza, como a noção de acúmulo (antesmesmo do acúmulo primitivo de capital),nesse momento a corrida humana pelobélico, defesa e ataque surgem aliadas aum pensamento tão ganancioso como osatuais. Mais maneiras de repressão paramais coersão e mais acumulo de riqueza.Porém, essa riqueza não é temporal. A rique-za que se passou de geração para geração,que transformou famílias em verdadeiros“impérios”, vem de um momento mais atual,principalmente depois da invasão das Amé-ricas, do continente Africano e da Ásia, mo-mento em que europeus se jogaram comtanta sede gananciosa, que modificaram asideologias e criaram conceitos baseados emuma ciência racista e ideológica e costumesculturais tão elitistas e segregadores comotudo que surgiu das mão européias. A inva-são de terras que tinham donos e que forammeticulosamente exterminados pela espadaou pela pólvora, por doenças ou ideologiase teologias, tão nocivas como um tiro decanhão... Poceiros expulsos ou mortos,avanço de fronteiras, monopólios de traficode pessoas, exploração da mão de obra es-crava de seus descendentes, manutençãomonopólica de sistemas financeiros e po-líticos... isso gera riqueza e mantém a riquezanas mãos de poucos, nas mãos de descen-dentes dos que desde o início acumularamo que foi tomado de outros e justificado,legitimado pela força da espada, pólvora,do absolutismo e constituições liberais.A origem da riqueza do mundo é suja,violenta e desumana, porém a manutençãodessa riqueza pelos descendentes continuaainda mais suja de sangue e de contradiçõesque só uma espécie acumuladora como a

A REVOLUÇÃO ACUMULATIVA (HUMANA )

Pag 9 REBOCO CAÍDO #28nossa é capaz de aceitar e achar normal.A origem da riqueza e dos ricos semprefoi de roubos, explorações e assas-sinatos.

DescascadosPor Wilda Garden

Morte marte mente sortequem pode te desvendardo alto de tua cortede acéfalos a delirarSantos certos sinto tantoum século e um mantode sombra e nuvema ocultarcai quem quermal me querbem me quer

Intolerância y fascismoPreconceito y dorIgnorantes racistasDestruindo o amor

Intolerância!

Homofóbicos malditosAssassinando o amorSua intolerância maldita

Nem uma maisPor Doomn

Nem uma mais, deve sofrerNem uma mais, tem que chorarNem uma mais, se submeterNem uma mais, tem que sangrar

Nem uma mais, medo deve terNem uma mais, deve se rebaixarNem uma mais, deve temerNem uma mais, deve morrer

IntolerânciaPor Doomn

Está só causando…… sofrimento y dor

Meu corpo está fraco e a mente febril.Chego em casa e busco um canto para chorar.Não há cantos!Minhas lágrimas esperam sua chance de li-berdade.Meu corpo de inexistir em sua totalidade.Não há cantos!A agonia corre densa e transpassa o meu ros-to.Dizem que pareço febril e tento sorrir.Não há cantos!Com a mão frouxa tateio meu caderno.Rabisco em sua mente meus desgostos e fo-bias.Aqui há cantos, penso eu.Todos os cantos!

O cadeado da dorPor Solano Gualda

Tan soloparecías un combatiente desnudosaltando sobre arrecifes de sombrasYo desde mi puesto de observaciónen la llanurate veía esgrimir tus armasy violento hundirte en míAbría los ojosy todavía estabas como herreromartillando el yunque de la chispahasta que mi sexo explotó como granaday nos morimos los dos entre charneles deluna.

AnochePor Gioconda Belli

REBOCO CAÍDO #28 Pag 10

Por Fabio da Silva Barbosa

Estava cobrindo a luta de uma ocupaçãourbana para meu jornal. Em uma das visi-tas estavam uns ditos revolucionários quemarcaram uma festinha no lugar para afir-mar seu apoio. Levaram comidas e bebi-das, arrumaram a mesa no meio do pátio ecomeçaram a discursar. Algumas famíliasque habitavam o lugar ficaram olhandoaquele falatório que nada lhes dizia. Umalíngua esquisita, difícil de entender.

- ndhccjd mxjsks mkxjsksks…

O único banheiro existente ficava nessepequeno pátio e as pessoas tinham de pas-sar constrangidas no meio daquele montede gente estranha. Baratas voadoras cor-tavam o espaço com suas asas barulhen-tas.

- nhcchjxnmj ncbchd cjdko…

Um de cada vez, cada representante de ca-da facção revolucionária, se apresentavadiscursando longamente sobre cientificis-mo político, ideologias europeias de sécu-los atrás… e por aí tagarelavam enquantoos moradores do velho casarão tentavamusar o banheiro, dormir, ou simplesmenteesperavam aquilo acabar para começaremlogo a comer. As baratas continuavamvoando por toda parte. Bati algumas fotose torci para aquele discurso, que já conhe-cia de longa data, acabasse logo para con-versar com os moradores.

- nchetywetwu miodsopwk kkidookmkkdkdoow…

Como aquele discurso acadêmico estavalonge da realidade daquelas pessoas.Constrangedor. Os caras pensavam em

conduzir as massas, mas nem ao menos en-tendiam suas necessidades ou falavam de umjeito que pudessem entender. Seres de outroplaneta. E aquilo não acabava nunca. O de-sejo de arrebanhar era enorme. Quanto maisdemorava, mais vergonhoso era.

- jjsikld,op oieyetwsnkj….

Depois da própria eternidade se passar, emalgum momento a coisa acabou. A essa altu-ra já estava entretido com algumas conver-sas paralelas. Depois de comermos, beber-mos e assistirmos os tais revolucionários ten-tando interagir com a população local, elescomeçaram a se movimentar para irem embo-ra. Um deles me chamou.

- Vou ficar mais um pouco. - Respondi

- Como assim? – Arregalou os olhos com es-panto. – Vamos todos embora.

- Ficarei mais um pouco. – Insisti.

Foram embora incrédulos. Desse momento emdiante a conversa correu solta e moradoresque ainda não tinham chegado perto come-çaram a se aproximar. Entre eles, uma senho-ra que conheci dias antes veio me cumpri-mentar. Como já tinha acabado os comes ebebes, comuniquei que havia rolado uma co-midinha e perguntei o motivo de não ter vin-do antes. Ela chegou bem pertinho e falouem tom de segredo que tinha um pessoal deigreja falando e ela não gosta desse negócio.

Achei graça daquelas palavras e rimos jun-tos. Aquela senhora chegou bem perto daverdade. Até hoje, quando mostro as fotospara alguém, brinco de descobrir quem sãoos revolucionários e quem são os moradoresda ocupação. Não tem quem erre. Definitiva-mente, seres de outro planeta.

Os revolucionários e o povo

Batalhões de estranhosPor Fabio da Silva Barbosa

caminhando pelas ruas escurassem destinomão ou contraapenas ruas vazias

onde as pessoas estãotrancadas em suas casassubmersas no medo de vivermorrendo em frente a tv

cruzo apenascom os sem destinoos que não têm medo da vida ou da morteos que não têm nada a perder

desertos pavimentadosde solidão e mais nadaestão mantendo vivaa solidão e apatia

enquanto vamos juntandonossos pedaçose formandonossos batalhões de estranhos

Sem quererPor Fabio da Silva Barbosa

não vou ser educadonem usar palavras bonitasser guru de idiotaou contar anedota

quem precisa de aplausosé bom dar no pénão curto narcisomaria ou josé

não me cobre o que digonão sou um exemplosigo meu caminhonão tenho medo da contradição

meu irmãopalavrãonão quero ser super-homemou ter supervisão

mudo de opiniãoe daí?não tenho de dar satisfaçãonão vivo de ilusão

não quero estar certoestou sempre por pertoou longe do que não me serveagora aqui ali assim assado

para com issonão faço parte de panelasigo seguindo com o sangue bommeu irmão

minha irmãtamo junto também nessa lutasem disputao caminho se cruza

pra depois seguir em frentesem medo das encruzilhadas do coraçãosem razãoentão tá bom

jogos de podernão quero me integrar ou vencerquero mudarquero aprender

tem gente querendo aparecermas não consegue resistira corrupçãoeu não

tô foracorrendo com a mentesempre em frentediferente

aguardentedelinquente

dor de dente

vivendo entre serpentes