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N E D A Núcleo de Estudos de Direito Aeronáutico
OVERBOOKING
SBDA. 08/12/00
...recentemente passou a vigorar o "Termo de Compromisso"
assumido pelas empresas aéreas de compensarem seus passageiros,
que tenham sido vítimas de "overbooking" (negativa de transporte de
passageiro com reserva confirmada). Em outro documento, o SNEA
(Sindicato Nacional da Empresas Aéreas) comenta o compromisso.
José Gabriel Assis de Almeida , 13/12/00
Penso que uma das questões mais interessantos sobre o
overbooking é saber se ele está ou não excluído dos atos abrangidos
pela responsabilidade especial do CBAer e da Convenção de
Varsóvia. Para uns, o overbooking está excluído, pois trata-se de
comportamento prévio ao início da execução do contrato de
transporte. Para outros, não está excluído, pois o overbooking
somente se verifica com o início da execução do contrato de
transporte. Independentemente desta discussão, chamo a atenção para
acórdão do STJ, de 03/10/2000, 4a Turma, Rel. Min Cesar Asfor
Rocha, REsp 250.655-SP United Airlines x Alfonso de Castro
Gonzales, onde o STJ indica que tendo o passageiro sido preterido no
embarque, mas tendo aceite hospedagem, refeições e ainda crédito de
viagem no valor de US$ 800,00 não havia mais nada a reclamar. Ou
seja, tendo o passageiro transigido no momento, não pode se
arrepender depois. Creio que este acórdão é importante pois
consolida a idéia da convenção sobre o overbooking, ou seja, uma
vez paga a indenização, nada mais se pode reclamar.
Bernardo de Mello Franco ,13/12/00
No meu entendimento o overbooking não está abrangido pela
Convenção de Varsóvia
Sylvio Mario Brasil , 13/12/00
Sempre defendi que a prática do "overbooking" até pode ter
explicação sob o aspecto comercial. Porém, juridicamente é uma
verdadeira excrescência, vez que, salvo nos casos de troca de
aeronave por motivo de força maior, trata-se de descumprimento
contratual gravemente culposo, ou mesmo doloso, por parte do
transportador. A punição (preterimento de embarque) é justamente
daquele passageiro que se apresentou para a viagem. Äquele que não
foi, pouco ou nada acontece. Quanto ä previsão legal, parece-me que
a lei especial (doméstica ou internacional) não cuidou do assunto sob
o ponto de vista da resp. civil. Demais, o "overbooking" costuma
ocorrer antes do início da execução do contrato de transporte, melhor
dizendo, antes da operação de embarque, na definição do art. 233 do
CBA. Dizer que todo "overbooking" se transforma em atraso, a fim
de vê-lo previsto na lei especial, parece-me um esforço siderúrgico
para defender o indefensável. Assim, penso que o "overbooking" não
é regido pelo CBA/Varsóvia, mas pelo CDC, no capítulo que trata da
impropriedade do serviço. O CBA apenas estabelece sanções
meramente administrativas (art. 302, inc. III, alínea p) ao
transportador que descumprir o contrato, sem contudo tratar da
respectiva reparação dos danos que vier a causar. É a posição que
venho defendendo já há algum tempo, embora reconheça que ainda
há muito a discutir..
Fernando de Oliveira Pontes,13/12/00 .
De acordo com o CBA em vigor, em seu artigo 233 e parágrafos, a
execução do contrato de transporte inicia-se quando o passageiro, já
despachado no aeroporto, transpõe a linha que delimita a área pública
e entra na respectiva aeronave, ou seja, já superada a fase do possível
overbooking. Dessa forma concordo que o overbooking está
excluido, ... deveria ser regulado pelo Código Civil como
descumprimento de contrato, e não pelo CBA..
Simone Di Ciero , 14/12/00
...tenho que dar o braço a torcer de que o overbooking realmente
não está regulado pelo CBA
Helio de Castro Farias, 14/12/00
Sobre o início da execução do contrato de transporte ...manifesto
opinião de o conceito expresso no parágrafo primeiro do art. 233 do
CBAer vigente deve ser entendido não restrito à área do aeroporto de
embarque pois o check-in é válido mesmo se efetuado fora do
aeroporto como, por exemplo, em portarias de hoteis, shopping
center, estações rodoviárias, ferroviárias, terminais marítimos e
outros locais estabelecidos pelo transportador. Entretanto, esse fato
não caracteriza o início do contrato de transporte aéreo "ex-vi legis"
pois somente quando o passageiro transpõe o limite da área destinada
ao público em geral é que, salvo melhor entendimento, se caracteriza
o início do contrato de transporte aéreo.
Sylvio Mario Brasil, 15/12/00
(Pontes, esta)...é exatamente a minha opinião! O CBA, salvo raras
exeções, cuidou da responsabilidade civil em relação a passageiro
desde o momento do embarque ...até o desembarque e não previu a
questão da responsabilidade, expressa ou implicitamente, do
"overbooking". Assim, penso que se aplica o CDC e não o CC, pois
se trata de descumprimento parcial de obrigação em relação de
consumo. Mas isso é para especialistas ... esclarecerem. Porém,
reforço minha impressão de que, mesmo ocorrendo antes do início da
execução do contrato de transporte, caso a lei aeronáutica previsse
reparação/providências em decorrência de preterição de embarque,
aplicar-se-ia o CBA e não o CDC ou CC. É o que ocorre com o
atraso ou cancelamento da viagem no aeroporto de partida. Via de
regra, acontece antes do início da operaçào de embarque; porém,
como há previsão legal no CBA, aplica-se esta lei.
Ricardo Alvarenga, 15/12/00
A propósito dos assuntos "overbooking" e aplicação do Código de
Defesa do Consumidor aos negócios da aviação, gostaria de lhes
(lembrar) o artigo de minha autoria intitulado "O Direito do
Consumidor e o Transporte Aéreo", publicado... na Revista Brasileira
de Direito Aeroespacial, n. 77, de 1999
Hélio de Castro Farias, 16/12/00
O equacionamento do problema overbooking passa
obrigatoriamente pelo noshow, conforme artigo que assinei na
Revista Brasileira de Direito Aeroespacial (# 72 de 1997) Sem
solução econômica para o noshow o overbooking resistirá a qualquer
Código..
José Wilson Bastos de Souza Massa, 16/12/00.
Concordo ...A tolerância do noshow não acarreta em conforto ao
passageiro, e sim, alimenta a insegurança do overbooking. Entendo
que o tratamento dado tenha que ser o mesmo praticado pelo
transporte rodoviário interestadual : não avisou com um mínimo de
24h de antecedência, perde o direito à passagem. A argumentação
lógica para a prática do overbooking é muito frágil, tornando-a difícil
de ser aceita. Em outras mensagens sobre o mesmo assunto,
verifiquei a observação que também aceito, de que o overbooking
não é coberto pelo CBA, em razão do contrato de transporte aéreo
somente se inicia após a transposição da linha de embarque, que
separa o passageiro do público em geral. Porém, existem situações de
overbooking, que a empresa aérea somente verifica quando o
passageiro se encontra dentro da aeronave. Ou seja, o overbooking é
constatado dentro do período de cumprimento do contrato áereo. Por
isto, lanço a pergunta: neste caso o que vale , a corbetura do CBA ; a
do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil; ou a
cobertura é concorrente? Entendo que a cobertura é concorrente, pois
o CDC e o Código Civil oferecem maiores ao passageiro e o CBA é
que trata especificamente da matéria. Portanto, as duas abrangências
são possíveis.
Thais Fernandes Kaloubek , 18/03/2002
Preciso fazer minha monografia de final de curso - estou no 4o ano,
UniFMU - e meu tema é sobre OVERBOOKING. Estou com
dificuldades em achar doutrina. Por favor, quem puder fazer alguma
indicação bibliográfica eu agradeço.
Alfredo Lincoln Faria Waknin, 30/03/2002
Thais, minha monografia versou sobre a responsabilidade civil das
empresas aéreas, mas não dissertei somente sobre "overbooking".
Extravio de bagagens, atrasos nos vôos e principalmente os acidentes
aéreos também foram mencionados. Encontrei excelente material nas
revistas da SBDA ( www.sbda.org.br ) Também no site do DAC,
pode-se ver gráficos de multas aplicadas às cias. aéreas, e um manual
tipo "o que fazer em caso de..."( www.dac.gov.br) Quanto aos
acidentes, só de curiosidade, pode-se consultar o
www.airdisaster.com.. e curiosidades sobre aviação, temos o site
oavião.com.br. O livro "Curso de Direito Aeronáutico " de Luis Ivani
de Amorim Araújo, ed. Forense, não tem como não fazer parte da sua
bibliografia.
José Gabriel Assis de Almeida , 31/03/02
[...]Thais, com o perdão da imodestia, sugiro que V. dê uma olhada
no meu livro [ALMEIDA, José Gabriel Assis de. Jurisprudência
brasileira sobre transporte aéreo. Rio de Janeiro: Renovar, 2000],
onde são repertoriadas e comentadas diversas decisões judiciais sobre
"overbooking.
Agnes Marta Pimentel Altmann, 31/03/03
Que dizem os defensores das cias. aéreas sobre os casos não indenizáveis a título de
overbooking? Qual o limite de tempo de espera mínimo "tolerável" para que passageiro
não tenha direito à indenização pela aflição (subjetiva) com o desrespeito sofrido... eu
inclusive já passei por esse dano moral sem ter sido ressarcida !
Sylvio Mário Brasil, 31/03/03
Com relação ao questionamento posto pela dra. Agnes Marta, com quem me
solidarizo, porque vítima contumaz das insaciáveis companhias aéreas, entendo que,
para efeito de indenização, o tempo da aflição seja de 4h, seja o mesmo estipulado para
atraso. Mas, talvez haja regra no direito marítimo que seja mais condescendente com
seus usuários.
Agnes Marta Pimentel Altmann, 01/04/03 Obrigada Dr. Sylvio, por sua solidariedade. Considero que o legislador é muito
'bonzinho' com as cias. aéreas, a ver pelo abusivo overbooking a tolerância de tempo
mínimo para que só depois de 4hs de aflição é que o passageiro tem direito à
indenização...(quando dá sorte de receber); resta agora saber qual o valor. Quanto vale
uma aflição de mais de 4hs de humilhação por overbooking, e sem direito de ver a cara
do dono da empresa?...
Paulo Neves Soto, 01/04/03 Quanto ao overbooking existe um documento firmado entre DAC e as antigas 4
grandes empresas brasileiras - TAM, Varig, Vasp e Transbrasil -, denominado "Plano de
contigências", o qual determina alguns requisitos para um pedido de reparação mas
predetermina valores fixos de acordo com o vôo, vale a pena checar o site do DAC e
verificar o mesmo.
Além de tal compromisso privado, há tb. uma norma regulamentar da Comunidade
Európeia que fixa valores e medidas para o mesmo problema: Regulamento 295/91.
Não se exige tempo para aplicação da reparaçao tanto no pacto nacional quanto no
regulamento internacional, o mero fato do overbooking, quebra do contrato, já gera
direito de compensação
Fernando Cruz, 02/04/03
O "overbooking" surgiu por culpa dos usuários (comerciais). Foi - e ainda é - uma
prática nefasta por parte de agentes de viagens e executivos, que tentam garantir lugares
em vários horários e empresas, com o objetivo de atender seus clientes ou
compromissos com o máximo de opções. As empresas perceberam que "todos os vôos
que deveriam sair lotados" acabavam decolando com ± 90% (10% eram reservas
"frias"). Passaram então a vender 10% a mais, como auto-proteção para garantir a
ocupação de suas aeronaves. Vez por outra ocorre uma zebra e o balcão recebe 101%,
102% e as vezes até mais - o chamado "overbook". No entanto, a origem do mal não é a
"auto defesa", mas a "esperteza" dos que fazem mais reservas do que precisam. No outro
lado da moeda, temos alguns empresários de aviação que tb querem "garantir" 100% de
aproveitamento de seus vôos, gerando "overbooking" acima da média e causando muito
desconforto para os usuários. Aqui o legislador precisa ser bastante responsável, para
punir os dois lados que extrapolam seus limites de responsabilidade, visando
desestimular tanto um como outro. Um dos melhores modelos em prática é justamente
ocitado pelo Dr. Paulo Soto (295/91 - modelo europeu).
Bernardo de Mello Franco, 02.04.03
Com referência ao assunto overbooking, gostaria de informar que desde 1999, os mais
importantes órgãos de defesa do consumidor do Brasil, como Procon/SP, DPDC –
Ministério da Justiça, Idec, Brasilcom, bem como a Procuradoria da República, através
de sua Câmara de Defesa do Consumidor, em conjunto com o SNEA, JURCAIB e
representantes das empresas nacionais, trabalham no sentido de minimizar os efeitos do
overbooking. Com esse objetivo, e já deve ser do conhecimento de V. Sas., foi firmado
um Termo de Compromisso originado de um procedimento instaurado pela Promotoria
de Defesa do Consumidor de São Paulo, onde existia o compromisso das companhias
aéreas de oferecerem compensações aos passageiros. Esse termo inicial, que vigorava
nacionalmente por tempo determinado, com o objetivo de adaptar as companhias e os
usuários a um sistema de compensações, minimizou, em muito, a incidência de
reclamações por overbooking. Tanto que ao longo de sua vigência, o Procon/SP não
registrou qualquer queixa sobre esse assunto. Contudo, por questões alheias à vontade
das companhias aéreas ele não foi renovado. Mas a iniciativa daquele grupo, acabou por
gerar no final do ano passado, perante a Promotoria de Defesa do Consumidor de São
Paulo, um novo Termo de Compromisso sobre overbooking para o Estado de São Paulo,
que está sendo assinado por grande parte das companhias aéreas nacionais e
internacionais, onde elas se comprometem, dentro de uma lista de itens, oferecer
compensações aos passageiros no caso da sua ocorrência. Isso demonstra
definitivamente, que as companhias aéreas, diante da inevitável ocorrência de
overbooking, que em muitas vezes não significa "a busca incansável pelo lucro", mais
sim problemas com no show, acomodação de rotas, cancelamento de vôos por
problemas climáticos e outros, estão atentas a esse problema. Mais ainda, querem
oferecer o melhor serviço e a compensação adequada ao passageiro, evitando eventuais
transtornos. Essa cultura existe nos EUA há mais de 20 anos e só agora pôde ser
desenvolvida aqui.[...]
Nota da SBDA: O documento mencionado é o "Termo de Compromisso de Ajustamento
nº 55/2002" de 07/11/2002, da Promotoria de Justiça do Consumidor do Ministério
Público do Estado de São Paulo.
José Wilson Massa, 02/04/03 Sempre que colocam este assunto em pauta, vem a minha mente a seguinte questão :
por que tal prática (overbooking) não é verificada no transporte rodoviário ? Será que os
usuários deste meio de transporte são menos "espertos" ? Ou será que a ganância do
operador aéreo foi determinante para o surgimento de tal prática ?
Agnes Marta Pimentel Altmann, 03/04/04
1. Obrigada. Muito animador pelo menos contornar problemas "jurídicos" sai menos
caro para todos. Empresas aéreas e passageiros só têm a lucrar mais com isso.
2. Do mesmo modo como no caso de overbooking precisa haver mais rigor nas
compensações/punições por ser prática propositada, não vejo porque nos caso dos
atrasos até por razões de segurança não devam ser do mesmo modo tratados com mais
seriedade. já que implica aflição do mesmo modo. Falhas são imprevisiveis mas
poderiam serem diagnosticadas com antecipação para evitar os prolongados sofrimentos
de espera em aeroportos chatos.
Sylvio Mário Brasil, 03/04/03
Muito esclarecedores e oportunos os pronunciamentos do Dr. Bernardo e do Dr.
Fernando. Gostei! Realmente, as empresas, juntamente com o DAC e vários órgãos de
defesa do consumidor, têm tentado minorar os efeitos da denegação de embarque,
provocada pela prática do "overbooking", que, ao menos comercialmente falando, se
justifica pela enorme quantidade de "no shows" que acorrem diariamente. Só para se ter
uma idéia de grandeza, nos primeiros 15 dias (!!!) de março de 2001, última estatística
que obtive, em apenas uma das grandes empresas nacionais, registraram-se os seguintes
índices de "no show": . Março 2001 (1º a 15º dia) -- média geral de 17,8%
. Total: doméstico 45.853 equivaentes a 347 B-737-300 lotados
. Total: intl. 20.622 = 77 MD-11lotados
. Total geral: 66.475 = 226MD-11 lotados
. Prejuízo acumulado: U$D 9.455.700,00
. Ex. prático: num determinado vôo internacional para os EUA
. 356 passageiros reservados e apenas 79 embarcados!
Como se vê, os números assustam e os prejuízos se acumulam. Com bem disse o Dr.
Fernando Cruz, a culpa dessa prática não é só das empresas aéreas. Porém, devemos
reconhecer que a maior aberração jurídica do "overbooking", que o torna extremamente
injusto, é que o punido é justamente o usuário que compareceu ao embarque, e não o
outro cretino, que fez 18 reservas em companhias e horários diversos, desistiu de viajar
para assistir à final do Big Brother, mas não teve a educação de cancelar sua reserva.
Acho, e apenas acho, que o problema não ocorre no transporte rodoviário, porque se o
sujeito não aparecer, sem cancelamento tempestivo, ele perde o direito de remarcar a
viagem, o que não acontece no transporte áereo.
Bernardo de Mello Franco, 03.04.03
Em resposta à indagação do Advogado José Wilson Massa, sobre a não ocorrência de
overbooking no transporte rodoviário, a resposta é simples. No transporte rodoviário,
caso o passageiro não compareça para embarque na data marcada, ele perde a sua
passagem já comprada. Por isso as empresas de ônibus não têm a necessidade, no caso
específico de falta do passageiro, de "vender" mais passagens. Soma-se a isto o fato de
que raramente o transporte rodoviário comporta reserva e contigências especiais. O
passageiro compra para poder viajar. No transporte aéreo, o passageiro pode ter reserva
e não voar.
Nilson Rodrigues de Oliveira, 04/04/03
Não acho que seja prática propositada a ocorrência de overbooking; também não acho
que os acordos celebrados para minimizar os transtornos sejam destinados a contornar
problemas jurídicos. Penso que eles visam trazer uma solução rápida e justa, que
satisfaça o passageiro vitimado pelo overbooking. A inexistência destes acordo gera
sobrecarga ao Judiciário, prolongando ainda mais o tempo para tomada de decisões
importantes para a sociedade. Os acordos trazem celeridade. Quanto ao overbooking,
penso ser um fenômeno mundial. Ele ocorre em função das regras específicas que
regem o transporte aéreo. Alguém já ouviu ou leu reportagem de passageiros indo ao
PROCON ou procurando o Judiciário contra empresas de transporte rodoviário? Eu não
tenho conhecimento de tal existência! O fato é que a erradicação do overbooking passa
por mudanças na legislação que subsidia o passageiro. Seria necessário engessá-lo ao
compromisso de embarcar em determinado vôo, exatamente como se obrigou ao fazer a
reserva. Uma modificação desta natureza poria fim ao "no show", conseqüêntemente, o
fim do overbooking e redução nas tarifas aéreas. O transporte rodoviário não passa por
tais problemas em função da perda do direito ao transporte, por parte do passageiro, no
caso de sua ausência na hora pactuada, conseqüêntemente, a remuneração da empresa
pelo lugar desocupado. Tal mudança, com incorporação de procedimentos próprios de
outro sistema de transporte, no caso o rodoviário, é evidentemente polêmica, haja vista
os tratados e convenções internacionais, o custo do transporte aéreo, o público usuário
ser mais exigente quanto aos direitos, bem como, estar concentrado na camada social
mais abastada. Enfim, é uma utopia, mas penso ser o caminho. Penso que a relação
entre pessoas, ainda que pessoa física com uma empresa, deva estar regida pelo
equilibrio. Se o passageiro tem direito a "no show", acho justo que a empresa tenha
direito ao "overbooking". Que se reduza o direito do passageiro, para aí sim, condenar
as empresas. A situação como está, conforme citou o Dr. Sylvio - demonstrou os
prejuízos financeiro de uma Cia. Aérea - não é boa para nenhuma das partes.
Jose Wilson Massa, 05/04/03
Este é meu raciocínio também . É muito claro . Por ser tão simples , é complexa a sua
implementação. Recentemente , tomei conhecimento de um fato que me ajudou a
entender muitas coisas em relação às empresas aéreas . A IATA estabelece seis níveis
para classificar o grau de qualidade de atendimento. tal classificação vai de "A" à "F",
sendo o primeiro um padrão de excelência e o segundo, o pior atendimento . Pasmei ao
saber que para a IATA , as empresas podem trabalhar em "C", ou seja, um pouco acima
da média . Embora parte da indústra procura estar mantendo excelência de serviços , no
transporte aéreo , isto não é levado em conta . Ter qualidade média está bom . Creio que
esta mentalidade é que dá suporte a raciocínios do tipo :"só existe o overbooking, em
razão do 'no show'"; "estes passageiros somente querem se dar bem, por isto existe o
overbooking". Tais construções mentais evidenciam que no transporte aéreo não há foco
no cliente, pois não há a necessidade de lhe dar o melhor tratamento. Mudemos nossas
mentalidades, enquanto há tempo para corrigirmos a realidade instaurada...
José Gabriel Assis de Almeida , 06/04/03
Ainda sobre o overbooking, três pontos que são relevantes:
O primeiro é que se os passageiros não comparecem ao embarque ("no show") é porque
a tarifa do transporte lhes dá essa faculdade. Ou seja, o transporte tem diferenciadas
tarifas. Há a tarifa plena, pela qual o passageiro tem o direito de viajar em qualquer dia,
desde que haja disponibilidades, não sofrendo qualquer sanção se não cumprir a reserva
realizada. Há outras tarifas, mais baratas, pelas quais, em caso de no show o passageiro
terá de pagar uma multa para alterar a reserva ou poderá até perder o vôo (há diversas
decisões judiciais nesse sentido). Assim, por um lado, o no show não é provocado por
todos os passageiros. E, por outro, consoante a tarifa escolhida, ele torna-se num
"direito" do passageiro. Portanto, incabível a "retaliação" via overbooking.
O segundo ponto é que o overbooking - por se tratar de ato anterior às operações de
embarque - escapa ao sistema de responsabilidade objetiva com indenização limitada do
CBAer. Assim neste caso, a responsabilidade do transportador é pelo regime ordinário.
O terceiro ponto é que não há prazo para que haja nasça o direito à indenização pelo
overbooking. Há uma tradição, a meu ver descabida, de que o transportador não tem de
indenizar se o reembarque ocorrer em menos de 4 horas. Esta tradição tem origem no
art. 230. No entanto, este art. 230 apenas limita-se a impor obrigações ao transportador
em caso de atraso superior a 4 horas. O que não significa que uma demora inferior a 4
horas não seja atraso e - se tiver dado causa a prejuízos comprovados - seja indenizável.
Sylvio Mário Brasil , 08/04/03
Há muitos anos atrás, nem sei ao certo quando, fiz um parecer interno sobre o tema.
Obviamente, as coisas mudaram, [...] Seguem alguns trechos desse parecer. [...]
"OVERBOOKING
Cabe, preliminarmente, esclarecer que pela prática do "overbooking" sujeita-se o
transportador, além da responsabilidade civil e de várias sanções previstas no Código de
Defesa do Consumidor, Código Brasileiro de Aeronáutica e no Código Civil, às multas
administrativas impostas pela Autoridade Aeronáutica, de conformidade com o previsto
no Código Brasileiro de Aeronáutica.
Na verdade, o "overbooking" é, inegavelmente, um instrumento hábil para garantir uma
razoável ocupação da aeronave, em contraprestação excessivo ao excessivo número de
"no show". Porém, esta é uma razão comercial, mas, não há, para o passageiro preterido,
que pagou e compareceu normalmente para embarque, explicação que possa justificar
tal atitude por parte da empresa aérea.
Proceder à confirmação da reserva para embarque acima da capacidade real da aeronave
é, sob o aspecto estritamente jurídico, além de uma aberração, é uma temeridade. (...).
(...) (...)
Com relação à responsabilidade civil do transportador aéreo, vale ressaltar que o
"overbooking", não obstante mantenha estrito relacionamento com o transporte aéreo,
não está sob a égide do Direito Aeronáutico, uma vez que não houve o início da
execução do contrato de transporte, além do que não está previsto na lei especial. Caso
sejam, eventualmente, condenadas, as empresas não poderão beneficiar-se da limitação
de responsabilidade consagrada na legislação aeronáutica. Assim, as empresas de
transporte aéreo, consciente e temerariamente, assumem os riscos e as conseqüências do
"overbooking", porém, vale frisar, que a lei aplicável será, como se disse, o Código de
Defesa do Consumidor e/ou o Código Civil.(...) Ainda que se possa admitir, apenas para
efeito de raciocínio, que se aplicam os dispositivos limitadores da lei aeronáutica aos
casos de preterição de embarque em virtude de excesso de passageiros com reserva
confirmada, não poderiam as empresas aéreas usufruir do benefício da limitação de
responsabilidade, de vez que, estariam atuando com culpa grave, equiparada ao dolo, ou
seja, temerariamente e com consciência de que, praticando o "overbooking", assumem o
risco de causar algum dano ao passageiro.
Nesse caso, o montante das indenizações pleiteadas judicialmente sob esse fundamento
é imprevisível, quer nos EUA quer no Brasil ou em qualquer outro país. Desde que o
passageiro possa comprovar os danos (de qualquer natureza) diretamente ocasionados
pelo não-embarque, fará jus à reparação integral de tais danos, sem prejuízo dos
famigerados danos morais, agora plenamente admitidos pelos nossos tribunais. Esse
risco, no entanto, a Empresa deveria saber que assume.
Demais disso, a nova Lei do Consumidor foi implacável com práticas ilegais como essa
em exame, considerada descumprimento doloso de obrigação contraída com o
consumidor. Com isso, a simples denegação de embarque pode violar inúmeros
dispositivos do CDC, alguns ora transcritos a título de ilustração:
a) art. 4º, "d" e inciso IV - garantia de serviços com padrões adequados de qualidade e
desempenho;
b) art. 6º, incisos IV, VI e X - proteção contra publicidade enganosa e abusiva, práticas
ilegais e cláusulas abusivas; efetiva reparação de danos patrimoniais e morais; adequada
e eficaz prestação dos serviços públicos;
c) art. 20 - pode o consumidor exigir: reexecução do serviço ou restituição da quantia
paga e perdas e danos ou abatimento proporcional;
d) art. 22 - as concessionárias de serviço público são obrigadas a fornecer serviços
adequados, eficientes, seguros e contínuos;
e) art. 30 - a oferta integra para todos os fins o contrato, podendo o consu-midor exigir:
cumprimento forçado da obrigação ou restituição quantia paga com perdas e danos;
f) art. 39 - é vedado deixar de estipular prazo para cumprir a obrigação ou deixar a
fixação a seu critério exclusivo;
g) art. 46 - os contratos não obrigarão o consumidor se não lhes for dado tomar prévio
conhecimento de seu conteúdo;
h) são nulas as cláusulas: incompatíveis com a boa-fé e eqüidade; opção de exclusiva do
fornecedor de concluir o contrato; autorizem modificação unilateral do con-trato;
i) art. 56 - sanções administrativas previstas: multa; cassação do registro co-mercial;
suspensão ou revogação da concessão (no caso de violação de lei ou do contrato);
interdição administrativa, etc.
j) art. 67 - sanções penais: fazer ou promover publicidade enganosa ou abusi-va:
detenção de três meses a um ano e multa.
l) circunstâncias agravantes dos crimes tipificados: quando ocasionar danos individuais
ou coletivos; dissimular-se a natureza ilícita do procedimento; quando praticados em
operações que envolvam serviço público essencial.
Além do mais, o próprio Código Brasileiro de Aeronáutica, em seu art. 302, inc. III,
alínea "p", estabelece multa administrativa, de até R$ 36.000, 00 em caso de o
transportador:
"deixar de transportar passageiro com reserva confirmada ou, de qualquer forma,
descumprir o contrato de transporte."
Se tal prática vier a se tornar reiterada, a Lei prevê a suspensão ou, até mesmo, a
cassação da concessão da autorização ou da permissão (art. 299, CBA).
De outro lado, poderá a empresa servir-se do disposto nos artigos 231 do CBA e 11 da
Portaria 957/GM5/89, para, extrajudicialmente, e a fim de evitar ações judiciais,
oferecer, caso o passageiro desista de viajar em vôo de congênere, o reembolso do preço
do trecho pago e não-utilizado, os gastos razoáveis, devidamente comprovados,
incorridos pelos passageiros com alimentação, transporte, quando for o caso,
alojamento, co-municação, etc. Concordando o passageiro em viajar em outro dia, ou
ainda ao aceitar receber o pagamento do "Denied Boarding Compensation" (DBC), terá
ocorrido uma novação, que implica na extinção da obrigação original pela criação de
direito novo, que se põe em substituição ao antigo, que foi extinto. Ou, em outras
palavras, a conversão imediata de uma obrigação em outra. Nesse caso, a obrigação de
transportar anteriormente assumida resta substituída pela nova situação. Vale salientar
que, para efeito de salvaguardar os interesses da Empresa em eventual ação judicial, é
absolutamente necessária a assinatura de respectivo recibo de quitação, conforme
modelo já sugerido. (...)
Por tudo, para concluir, acredito que o overbooking possa ter conseqüências jurídicas
drásticas e, como se disse, imprevisíveis, pelo que deve ser muito bem avaliado e
planejado, a fim de que seus efeitos sejam minorados.[...]"
José Wilson Massa , 08/04/03
[...] seu parecer, achei-o de uma coerência jurídica perfeita, pois, ao buscar o
embasamento legal, visou à justiça ao passageiro [...] e não à positividade. Perdoem-me
os defensores do "overbooking", mas o seu parecer é irrefutável.
Renée Baptista Ferraz, 04/07/03
Alguém saberia me dizer se o Termo de Compromisso de Ajustamento, firmado entre
empresas aéreas nacionais e órgãos competentes, a fim de regulamentar os processos de
indenização de embarques rejeitados em razão do excesso de passageiros, foi renovado
ou ainda está em vigência aquele que entrou em vigor em dezembro de 2000, com prazo
de um ano? O documento que possuo, disponibilizado pelo próprio Neda, é o Termo de
Compromisso de Ajustamento nº 55/2002" de 07/11/2002 (da Promotoria de Justiça do
Consumidor do Ministério Público do Estado de São Paulo), entretanto este acordo foi
estabelecido entre empresas estrangeiras operando no Brasil e órgãos representando os
interesses dos consumidores, não incluindo nenhuma empresa nacional. Caso o antigo
termo tenha sido renovado, como posso obter tal documento?
Bernardo de Mello Franco, 07.07.03
As principais companhias aéreas brasileiras também aderiram a esse termo paulista,
mas apenas utilizaram um outro instrumento, idêntico. O antigo termo, que tinha um
espectro nacional, não está mais formalmente em vigor. Contudo, algumas companhias
ainda o utilizam, sem que haja nenhum interesse dos demais órgãos de defesa do
consumidor em "reativá-lo".
Renée Baptista Ferraz , 15/07/03
Você saberia me dizer qual o motivo de desinteresse dos órgãos de defesa do
consumidor em não renovar/reativar o referido Termo de Compromisso? Em relação às
companhias brasileiras, qual seria este instrumento idêntico utilizado, algum acordo
formal? Como posso obter cópia deste documento (ou a referência, para que possa
consultá-lo)?
Bernardo de Mello Franco, 15/07/03
Todo o grupo ligado às companhias aéreas que participou da elaboração do primeiro
termo e tentou até o fim que o mesmo fosse renovado por mais 2 anos, fez essa mesma
pergunta na época. Não tenho uma resposta. Contudo, posso dizer que, após a
apresentação do primeiro balanço da implementação do termo, onde todas as
companhias aéreas demonstraram uma redução no overbooking, mais as informações do
Procon/SP, de que no período não foi registrada nenhuma reclamação por esse motivo,
os trabalhos ficaram adormecidos. Deve ser somado ainda a tudo isso, o fato de que
ocorreram mudanças políticas nas chefias dos órgãos e instituições ligadas aos
consumidores. Ao mesmo tempo, foi “ressucitado” o procedimento do MP de São
Paulo, onde existia a possibilidade de ser ajuizada uma Ação Civil Pública contra as
companhias aéreas, que originou esse termo paulista.
Giselle Kodani, 16/07/03
[...] sugiro que entre em contato diretamente com a Promotoria de Justiça do
Consumidor, aqui em São Paulo, nos telefones (11) 3119-9069/9061. Caso a Sra. tenha
o nome do Promotor de Justiça que firmou o compromisso de ajustamento de conduta, a
localização do processo ficará bem mais fácil. Ademais, tanto os inquéritos civis como
os procedimentos preparatórios de inquérito civil são, em regra, públicos, podendo
serem consultados e, eventualmente, retiradas cópias dos autos.
(Volta)
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