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O Texto Literário Prof. Ewerton Rezer Gindri

O Texto LiteráRio

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O Texto Literário

Prof. Ewerton Rezer Gindri

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Nossa mãe, o que é aquelevestido, naquele prego?

Minhas filhas, é o vestidode uma dona que passou.

Passou quando, nossa mãe?Era nossa conhecida?

Minhas filhas, boca presa.Vosso pai evém chegando.

Nossa mãe, dizei depressaque vestido é esse vestido.

Minhas filhas, mas o corpoficou frio e não o veste.

O vestido, nesse prego,está morto, sossegado.

Nossa mãe, esse vestidotanta renda, esse segredo!

Minhas filhas, escutaipalavras de minha boca.

Era uma dona de longe, vosso pai enamorou-se.

E ficou tão transtornado,se perdeu tanto de nós, 

se afastou de toda vida,se fechou, se devorou,

chorou no prato de carne,bebeu, brigou, me bateu,

me deixou com vosso berço,foi para a dona de longe,

mas a dona não ligou.Em vão o pai implorou.

Dava apólice, fazenda, dava carro, dava ouro, beberia seu sobejo,lamberia seu sapato.

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Mas a dona nem ligou.Então vosso pai, irado,

me pediu que lhe pedisse,a essa dona tão perversa,

que tivesse paciênciae fosse dormir com ele...

Nossa mãe, por que chorais?Nosso lenço vos cedemos.

Minhas filhas, vosso paichega ao pátio.  Disfarcemos.

Nossa mãe, não escutamospisar de pé no degrau.

Minhas filhas, procureiaquela mulher do demo.

E lhe roguei que aplacassede meu marido a vontade.

Eu não amo teu marido,me falou ela se rindo.

Mas posso ficar com elese a senhora fizer gosto,

só pra lhe satisfazer,não por mim, não quero homem.

Olhei para vosso pai, os olhos dele pediam.

Olhei para a dona ruim, os olhos dela gozavam.

O seu vestido de renda, de colo mui devassado, 

mais mostrava que escondiaas partes da pecadora.

Eu fiz meu pelo-sinal,me curvei... disse que sim.

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Sai pensando na morte,mas a morte não chegava.

Andei pelas cinco ruas, passei ponte, passei rio, 

visitei vossos parentes, não comia, não falava,

tive uma febre terçã,mas a morte não chegava.

Fiquei fora de perigo,fiquei de cabeça branca,

perdi meus dentes, meus olhos, costurei, lavei, fiz doce,

minhas mãos se escalavraram,meus anéis se dispersaram,

minha corrente de ouropagou conta de farmácia.

Vosso pais sumiu no mundo.O mundo é grande e pequeno.

Um dia a dona soberbame aparece já sem nada,

pobre, desfeita, mofina,com sua trouxa na mão.

Dona, me disse baixinho,não te dou vosso marido,

que não sei onde ele anda.Mas te dou este vestido, última peça de luxoque guardei como lembrança

daquele dia de cobra,da maior humilhação.

Eu não tinha amor por ele,ao depois amor pegou.

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Mas então ele enjoadoconfessou que só gostava

de mim como eu era dantes.Me joguei a suas plantas,

fiz toda sorte de dengo,no chão rocei minha cara,

me puxei pelos cabelos,me lancei na correnteza,

me cortei de canivete,me atirei no sumidouro,

bebi fel e gasolina,rezei duzentas novenas,

dona, de nada valeu:vosso marido sumiu.

Aqui trago minha roupaque recorda meu malfeito

de ofender dona casadapisando no seu orgulho.

Recebei esse vestidoe me dai vosso perdão.

Olhei para a cara dela,quede os olhos cintilantes?

quede graça de sorriso,quede colo de camélia?

quede aquela cinturinhadelgada como jeitosa?

quede pezinhos calçadoscom sandálias de cetim?

Olhei muito para ela, boca não disse palavra.

Peguei o vestido, pusnesse prego da parede.

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Ela se foi de mansinhoe já na ponta da estrada

vosso pai aparecia.Olhou pra mim em silêncio,

mal reparou no vestidoe disse apenas: — Mulher,

põe mais um prato na mesa.Eu fiz, ele se assentou,

comeu, limpou o suor,era sempre o mesmo homem,

comia meio de ladoe nem estava mais velho.

O barulho da comidana boca, me acalentava,

me dava uma grande paz,um sentimento esquisito

de que tudo foi um sonho, vestido não há... nem nada.

Minhas filhas, eis que ouçovosso pai subindo a escada.

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Análise

• Escrito em versos de sete sílabas, de acordo com a tradição popular;

• Mostra a mais funda raiz brasileira e,

• Ao mesmo tempo, abre-se ao que há de universal nas pequenas tragédias humanas.

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[O fantasma convoca Hamlet] Horácio. Ele acena para que vás com ele... Como se participar algoquisesse a ti somente.

Marcelo. Olha com que ação cortejadora ele te sinaliza um chão mais afastado! Mas não vás com ele! Horácio. Não, de forma alguma! Hamlet. Ele não fala, então o seguirei.Horácio. Não o faça, milorde! Hamlet. Por quê, que devo eu temer? Eu não dou a minha vida o preço de um alfinete, e quanto a minh'alma, que pode ele fazer a ela, sendo coisa imortal como ele mesmo? Ele me acena que siga novamente, eu o seguirei. Horácio. E se ele te tentar rumo ao dilúvio, milorde, ou ao temível cume do despenhadeiro que se projeta sobre sua base para dentro do mar, e lá assumir alguma outra forma horrível que possa privar-te de tua soberania da razão, e arrastá-lo à loucura? Pensa nisto: o lugar em si põe brinquedos de desespero, sem mais motivo, em todo cérebro que olha tantas braças mar adentro e o ouve rugir lá embaixo.

Hamlet. Ele me acena ainda. Vai adiante, Eu te seguirei.

Marcelo. Tu não irás, milorde. Hamlet. Afastai vossas mãos.Horácio. Sê obediente, tu não irás! Hamlet. Meu destino dá um grito, e faz cada pequena artéria neste corpo tão tesa quanto o nervo do leão de Neméia. Ainda sou chamado. Liberai-me, senhores! Pelos céus, Eu farei um fantasma daquele que me prender! Eu digo, p'ra longe! Vai adiante, eu te seguirei. [Saem o fantasma e Hamlet]

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Ponto de partida: a linguagem

“É muito comum relacionarmos a linguagem literária com norma culta e com registro formal. As duas aproximações são equivocadas, ou, pelo menos, parciais.”

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“Comecei a namorar o pai do meu filho e fiquei grávida aos 16 anos. A gente ficou um ano juntos, só que não deu certo porque a gente era muito novo. Depois de um tempo, conheci meu segundo ex-marido num site de relacionamento. Achei que era o príncipe encantado. Quando ele me traiu a primeira vez, faltava um mês para o meu casamento. E o pior! Ele me traiu com uma segunda pessoa, depois do meu casamento. Eu dizia: ‘se você me contar, eu te perdôo’, mas ele não me contou”.

“Com a minha mãe foi assim, com a minha avó também, e comigo não ia ser diferente. A mulher sempre foi mais sentimento, mas o homem sente mesmo desejo quando vê o corpo de uma mulher. A partir do momento que ele vem e me conta a verdade, está perdoado. Isso pra mim não é traição. Ele não deixa de me amar porque esteve com outra”.

“Acho que quando você tem uma vida sexualmente ativa, as chances de traição diminuem bastante”, disse o amigo.

“Todo dia ele chegava e eu estava de espartilho, com o jantar preparado em cima da mesa. Todo dia era uma coisa diferente, e nem por isso deixou de acontecer”.

Leiamos este outro texto.

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“...o sinal estético é aquele...em que a evocação semântica não se consome na referência ao denotatum, mas se enriquece continuamente toda vez que fruímos a maneira insubstituível pela qual se incorpora ao material com que se estrutura; o significado reflete-se continuamente sobre o significante e se enriquece com novos ecos.”

(Eco, U.)

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“Não é de metrificar ou não que diferem o historiador e o poeta...a diferença está em que um narra acontecimentos e o outro, fatos quais podiam acontecer. Por isso, a Poesia encerra mais filosofia e elevação do que a história; aquela enuncia verdades gerais; esta relata fatos particulares.”

(Aristóteles)

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Triângulo de Ogden e Richards

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Exemplo: rosa

Significante = /ro za/Significado = Referente = amor, delicadeza, perfume,

mulher, etc.

Os primeiros significante e significado tornam-se significante de um outro

significado, o SIGNIFICADO POÉTICO.

(D’Onofrio, S.)

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“Cada palavra poética constitui assim um objeto inesperado, uma caixa de Pandora, de onde escapam todas as virtualidades da linguagem.”

(Barthes, R.)

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Plurifuncionalidade do texto literárioSegundo Salvatore D’Onofrio.

• Função estética: arte da palavra e expressão do belo;

• Função lúdica: provoca prazer;

• Função cognitiva: forma de conhecimento de uma realidade objetiva ou psicológica;

• Função catártica: purificação de sentimentos;

• Função pragmática: pregação de uma ideologia.

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“A literatura nos mostra o homem com uma veracidade que as ciências talvez não têm. Ela é o documento espontâneo da vida em trânsito. É o depoimento vivo, natural, autêntico...”

(Cecília Meireles)