2
EDITORIAL Quando estamos diante de situações dinâmicas a flexibilidade é a solução. Ou seja, lidar com cenários mais estáveis num time-frame bem definido exige outra abordagem. A questão é: qual o momento certo para cada tipo de abordagem, como lidar conscientemente com esse contexto e quais elementos devem ser observados? É necessário balancear previsibilidade versus flexibilidade. Modelos híbridos é o tema de capa desta edição. O artigo apresenta uma visão geral da importância do assunto, porque é uma tendência, exemplifica e sugere uma estratégia para desenvolver modelos que misturam práticas tradicionais e ágeis para obter melhor resultado em projetos. O assunto também é abordado por outro artigo que apresenta uma resenha da matéria publicada pela MIT Sloan Management Review – O que os Gerentes de Projetos de Sucesso fazem –, na qual esses autores mostram o resultado de uma pesquisa que revela ser uma prática desses gestores de sucesso: misturar estilos de abordagens para conduzir o projeto ao sucesso. Além disso, para lidar com essa dinâmica atual do ambiente tais gerentes de projetos exercem quatro papéis críticos para conduzir seus projetos e liderar suas equipes. Contudo, vale destacar alguns pontos de reflexão sobre o assunto. Adaptar exige perspicácia e visão sistêmica, porque validar uma abordagem corporativa que permite fazer adaptações a cada perfil de projeto é assumir que pode haver várias empresas dentro de uma mesma empresa, com instâncias de projetos cujas abordagens são próprias, porém obedientes teoricamente a uma mesma hierarquia corporativa. Isso é sem dúvida um desafio organizacional e faz sentido quando se busca ter alta competi- tividade no mercado, até porque são equipes e contextos diferentes em cada projeto. Talvez a justificativa para esse comportamento venha do sentimento de achar que a repetitividade proporciona alto desem- penho não é mais o mesmo, especialmente em projetos, porque a prática tem mostrado que nunca é exatamente a mesma situação, então a repetição de abordagem nem sempre é válida para o próximo projeto, exigindo análises e adaptações ao novo contexto. Apesar de o mercado atual impor flexibili- dade às corporações devido à instabilidade do ambiente, os projetos por definição possuem fronteiras de atuação e recursos limitados, mesmo que imprecisos, então é possível mapear os limites do projeto. Isso só depende do time-frame em que ele será observado, ou seja, é estável em algum momento. Então um mesmo projeto pode ser considerado uma operação estável ou dinâmica dependendo do momento, como se estivéssemos visualizando o cenário do projeto com zoom-in ou zoom-out usando uma lente de tempo, o que justificaria também o uso de modelos híbridos. O cerne da questão é a previsibilidade porque a aplicação ou não da flexibilidade depende da previsibilida- de. Então instabilidade é o foco da gestão nesse caso, que surge com a mudança em fatores ligados ao projeto, mas depois que a mudança ocorreu a gestão só consegue “apagar o incêndio” provocado por ela. O foco pre- cisa estar no que precede a mudança, essencialmente no movimento de pessoas e do tempo. Então observar esses dois pontos pode auxiliar o gestor a identificar quando a situação tende a ser estável ou dinâmica. Numa analogia despretensiosa, apenas para simular possíveis situações e comportamentos que po- Zózimo Diretor Executivo da Revista Mundo PM HÍBRIDO É A RESPOSTA. deriam ser vivenciadas num contexto de projeto, considere uma partida de futebol e uma de tênis. Poderíamos imaginar um clube de futebol, uma empresa que estabelece seu modo de atuar con- tratando um técnico e um time de jogadores, ou seja, cria uma equipe de trabalho, e a cada partida de futebol a estratégia de jogo é adaptada ao per- l do elenco que entra em campo, ou seja, muda as pessoas então muda a abordagem, e durante a dinâmica do jogo isso pode ocorrer várias vezes. Porém o tempo é bem definido (90 minutos nesse caso) e no limite, e as fronteiras início e fim são fixas (nesse caso o prazo do campeonato), o que caracte- riza uma situação estável também, dependendo do momento analisado. Numa equipe de projeto que vivenciasse tal tipo de situação seria justificável que fosse regida por uma abordagem tradicional quando o foco de análise fosse o campeonato (pre- visibilidade), ou regida por uma abordagem ágil se o foco estivesse no jogo (flexibilidade). Utilizar modelos híbridos é um grande avanço, mas quando aplicar cada abordagem exige reflexão, porque não somente uma análise sobre estabilidade dos objetivos do projeto deve ser feita, mas adicio- nalmente uma análise prévia da movimentação sob o ponto de vista temporal e das pessoas envolvidas no projeto (equipe e stakeholders ), tentando identi- car as movimentações nesses pontos. Em outras palavras, a flexibilidade ou rigidez da metodologia a ser aplicada num projeto está também fortemen- te associada às pessoas e também ao momento relativo do projeto, porque esses são fatores que originam mudanças e impactam a estabilidade dele. Normalmente a flexibilidade será demanda- da em situações instáveis, sobre os objetivos, as pessoas ou o cenário. E a rigidez da abordagem tradicional é mais aplicada às situações em que a previsibilidade do momento permite. Porém, cabe ressaltar que esse exemplo de situação, num time de futebol, foi abordado justamente para observar que a flexibilidade não está associada somente à imprevisibilidade do futuro, mas também à insta- bilidade do momento. Assim como a abordagem tradicional normalmente está associada à previsi- bilidade do curto prazo, pode também ser aplicada É FUTEBOL OU TÊNIS QUE ESTAMOS JOGANDO? 04 mundopm.com.br - Ago & Set / 2015

É Futebol ou tênis que estamos jogando? híbrido É a …Sérgio E. Gouvêa da Costa Revisores André Barcaui Eduardo Espínola Farhad Abdollahyan J. Angelo Valle João Alberto Vianna

  • Upload
    others

  • View
    0

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: É Futebol ou tênis que estamos jogando? híbrido É a …Sérgio E. Gouvêa da Costa Revisores André Barcaui Eduardo Espínola Farhad Abdollahyan J. Angelo Valle João Alberto Vianna

eDitOriaL

Quando estamos diante de situações dinâmicas a fl exibilidade é a solução. Ou seja, lidar com cenários mais estáveis num time-frame bem defi nido exige outra abordagem. A questão é: qual o momento certo para cada tipo de abordagem, como lidar conscientemente com esse contexto e quais elementos devem ser observados? É necessário balancear previsibilidade versus fl exibilidade.

Modelos híbridos é o tema de capa desta edição. O artigo apresenta uma visão geral da importância do assunto, porque é uma tendência, exemplifi ca e sugere uma estratégia para desenvolver modelos que misturam práticas tradicionais e ágeis para obter melhor resultado em projetos. O assunto também é abordado por outro artigo que apresenta uma resenha da matéria publicada pela MIT Sloan Management Review – O que os Gerentes de Projetos de Sucesso fazem –, na qual esses autores mostram o resultado de uma pesquisa que revela ser uma prática desses gestores de sucesso: misturar estilos de abordagens para conduzir o projeto ao sucesso. Além disso, para lidar com essa dinâmica atual do ambiente tais gerentes de projetos exercem quatro papéis críticos para conduzir seus projetos e liderar suas equipes.

Contudo, vale destacar alguns pontos de refl exão sobre o assunto. Adaptar exige perspicácia e visão sistêmica, porque validar uma abordagem corporativa que permite fazer adaptações a cada perfi l de projeto é assumir que pode haver várias empresas dentro de uma mesma empresa, com instâncias de projetos cujas abordagens são próprias, porém obedientes teoricamente a uma mesma hierarquia corporativa. Isso é sem dúvida um desafi o organizacional e faz sentido quando se busca ter alta competi-tividade no mercado, até porque são equipes e contextos diferentes em cada projeto. Talvez a justifi cativa para esse comportamento venha do sentimento de achar que a repetitividade proporciona alto desem-penho não é mais o mesmo, especialmente em projetos, porque a prática tem mostrado que nunca é exatamente a mesma situação, então a repetição de abordagem nem sempre é válida para o próximo projeto, exigindo análises e adaptações ao novo contexto. Apesar de o mercado atual impor fl exibili-dade às corporações devido à instabilidade do ambiente, os projetos por defi nição possuem fronteiras de atuação e recursos limitados, mesmo que imprecisos, então é possível mapear os limites do projeto. Isso só depende do time-frame em que ele será observado, ou seja, é estável em algum momento. Então um mesmo projeto pode ser considerado uma operação estável ou dinâmica dependendo do momento, como se estivéssemos visualizando o cenário do projeto com zoom-in ou zoom-out usando uma lente de tempo, o que justifi caria também o uso de modelos híbridos.

O cerne da questão é a previsibilidade porque a aplicação ou não da fl exibilidade depende da previsibilida-de. Então instabilidade é o foco da gestão nesse caso, que surge com a mudança em fatores ligados ao projeto, mas depois que a mudança ocorreu a gestão só consegue “apagar o incêndio” provocado por ela. O foco pre-cisa estar no que precede a mudança, essencialmente no movimento de pessoas e do tempo. Então observar esses dois pontos pode auxiliar o gestor a identifi car quando a situação tende a ser estável ou dinâmica.

Numa analogia despretensiosa, apenas para simular possíveis situações e comportamentos que po-

Zózimo Diretor Executivo da Revista Mundo PM

híbrido É a resposta.

deriam ser vivenciadas num contexto de projeto, considere uma partida de futebol e uma de tênis. Poderíamos imaginar um clube de futebol, uma empresa que estabelece seu modo de atuar con-tratando um técnico e um time de jogadores, ou seja, cria uma equipe de trabalho, e a cada partida de futebol a estratégia de jogo é adaptada ao per-fi l do elenco que entra em campo, ou seja, muda as pessoas então muda a abordagem, e durante a dinâmica do jogo isso pode ocorrer várias vezes. Porém o tempo é bem defi nido (90 minutos nesse caso) e no limite, e as fronteiras início e fi m são fi xas (nesse caso o prazo do campeonato), o que caracte-riza uma situação estável também, dependendo do momento analisado. Numa equipe de projeto que vivenciasse tal tipo de situação seria justifi cável que fosse regida por uma abordagem tradicional quando o foco de análise fosse o campeonato (pre-visibilidade), ou regida por uma abordagem ágil se o foco estivesse no jogo (fl exibilidade).

Utilizar modelos híbridos é um grande avanço, mas quando aplicar cada abordagem exige refl exão, porque não somente uma análise sobre estabilidade dos objetivos do projeto deve ser feita, mas adicio-nalmente uma análise prévia da movimentação sob o ponto de vista temporal e das pessoas envolvidas no projeto (equipe e stakeholders), tentando identi-fi car as movimentações nesses pontos. Em outras palavras, a fl exibilidade ou rigidez da metodologia a ser aplicada num projeto está também fortemen-te associada às pessoas e também ao momento relativo do projeto, porque esses são fatores que originam mudanças e impactam a estabilidade dele. Normalmente a fl exibilidade será demanda-da em situações instáveis, sobre os objetivos, as pessoas ou o cenário. E a rigidez da abordagem tradicional é mais aplicada às situações em que a previsibilidade do momento permite. Porém, cabe ressaltar que esse exemplo de situação, num time de futebol, foi abordado justamente para observar que a fl exibilidade não está associada somente à imprevisibilidade do futuro, mas também à insta-bilidade do momento. Assim como a abordagem tradicional normalmente está associada à previsi-bilidade do curto prazo, pode também ser aplicada

É Futebol ou tênisque estamos jogando?

04 mundopm.com.br - Ago & Set / 2015

Page 2: É Futebol ou tênis que estamos jogando? híbrido É a …Sérgio E. Gouvêa da Costa Revisores André Barcaui Eduardo Espínola Farhad Abdollahyan J. Angelo Valle João Alberto Vianna

Editor e Diretor ExecutivoOsmar Zózimo de Souza [email protected]

Colaboradores desta EdiçãoAlexander LauferÁlvaro Camargo Américo Pinto

Antonio Carlos SoaresCarlos Bicheiro

Daniel Capaldo AmaralEdivandro ConfortoEdward J. Hoffman

Eric RebentischFarhad Abdollahyan

Felipe BarretoGuilherme Fontenele

Helio Rodrigues CostaJeffrey S. RussellJulio Schwartz

Lian MisselLuciano Cerqueira Passos

Maurini Elizardo Brito Rafael Masteguin

Raphael O. Albergarias LopesRenato SabinoRobert Toomey

Roberto de VasconcellosW. Scott CameronWantuir Felippe

Projeto Gráfi co e DiagramaçãoBlu Design e Comunicação

Revisão EditorialTexto Finito

ArtigosRedação Mundo PM

[email protected]

Conselho EditorialAmérico Pinto

Antônio C. A. MaximianoDaniel Leroy

Darci Santos do PradoDarli Rodrigues Vieira

Eduardo Linhares QualhariniHeitor Coutinho

Marly Monteiro de CarvalhoNorman de Paula A. Filho Paul Campbell Dinsmore

Ricardo Viana VargasRoberto Sbragia

Sérgio E. Gouvêa da Costa

Revisores André Barcaui

Eduardo EspínolaFarhad Abdollahyan

J. Angelo Valle João Alberto Vianna Tavares

João Carlos BoyadjianJosé B. de Souza Filho

Lee LambertLélio Varella

Margareth CarneiroMario Henrique Trentim

Mauro SotillePeter Berndt de S. Mello

Roberto PonsRaphael Albergarias

Sérgio MarangoniSilvio A. C. Wille

Contato ComercialTelefone: (41) 3029-9397

Fax: 3029-9353R. Fernando Simas, 705/72

Bigorrilho - CEP 80.430-190 Curitiba-PR

[email protected]@[email protected]

Blog da Revistablog.mundopm.com.br

Facebook da Revistafacebook.com/mundopm

ISSN: 1807-8095A revista Mundo PM

é uma publicação bimestral da Editora Mundo

DistribuiçãoFernando Chinaglia Distribuidora S.A.

Rua Teodoro da Silva, 907CEP 20563-900

Rio de Janeiro - RJ

O conteúdo dos artigos é de responsabilidade dos autores.

Softwares distribuídos via CD-ROM e encartes com a

revista são de propriedade e responsabilidade de seusfabricantes, assim como

suporte e os direitos autorais.

Errataswww.mundopm.com.br/erratas

a ações de longo prazo, desde que o limite do tempo esteja bem de-terminado. Enfi m, essa ótica de análise sobre tempo e pessoas pode auxiliar quanto ao uso correto dos modelos híbridos.

Outra variável que também tem grande impacto no equilíbrio en-tre o uso das abordagens é o julgamento do gestor, que levará a uma decisão mais acertada. Numa partida de tênis, ao contrário de fute-bol, o tempo é variável e as pessoas são fi xas. Além disso, a decisão é totalmente individual e tem base em resultados obtidos durante o jogo. O tenista julga a cada momento e confronta com sua estratégia de jogo que foi estabelecida previamente. Nesse caso o gestor nor-malmente estabelece uma abordagem inicial rígida e bem detalhada, porque conhece o adversário e espera um comportamento previsível, porém julga o cenário a cada momento e muda se necessário. Uma si-tuação que exige dele ser um líder e gestor, exercer esses papéis, fazer escolhas e adaptar sua abordagem com base no resultado prático. É uma decisão individual, mas se baseia num histórico de aprendizado. Enfi m, aplicar modelos híbridos também demanda tais habilidades.

Essencialmente as pessoas ainda são os elos de uma organização, especialmente em estruturas temporárias como projeto. Seja qual for a abordagem a sensatez talvez seja a palavra certa para guiar as de-cisões de projeto, especialmente quando se deseja fazer adaptações ao contexto. Porém, o “propósito de existência” prevalece no mundo corporativo, porque justifi ca a razão entre esforço e retribuição. E as-sim pode auxiliar nas refl exões dos gestores sobre a caminhada em prol dos resultados do projeto, estabelecendo valores que justifi cam os meios. De fato as pessoas precisam ser compreendidas e conside-radas em qualquer tipo de planejamento de atividades em grupo, mas o senso de equipe deve ser mais forte que o individual, assim como o propósito corporativo prevalecer sobre o da equipe ou do proje-to, senão não estamos falando de gestão corporativa. Realmente os gestores precisam estar autoconvencidos de que as pessoas são a ga-rantia de um bom resultado.