37
-V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA F í M V a tarde seguinte, quando meu marido voltou perguntei por Emilio. Nào o procurei, respondeu-me elle; tomei o conselho: se nào vier hoje, sim. Passou-se, pois, um dia sem ter noticias d'elle. No dia seguinte, nào tendo apparecido, meu marido foi lá. Serei franca comtigo, eu mesma lembrei isso a meu marido. Esperei anciosa a resposta. Meu marido vollou pela tarde. Tinha um certo ar triste. Perguntei o que havia. t-~ Nao sei. Fui encontrar o rapaz de cama. Disse-me que era uma ligeira constipaçào; mas eu creio que nào ó isso só... ²Que será então? perguntei eu, fitando um olhar em meu marido. ²Alguma cousa mais. 0 rapaz fallou-meem embarcar para o norte. Está Inste, distraindo, preoecupado. Ao mesmo tempo que manifesta a esperança de ver os pais, revela receios de não tornar a vèl-os. Tem idéas de morrer na viagem. Não sei que lhe aconteceu, mas foi alguma cousa. Talvez... Tomo III. JUMI0 de 1865.li **(.

-V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

-V.

CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA

F í M —

V

a tarde seguinte, quando meu marido voltou pergunteipor Emilio.

— Nào o procurei, respondeu-me elle; tomei oconselho: se nào vier hoje, sim.

Passou-se, pois, um dia sem ter noticias d'elle.No dia seguinte, nào tendo apparecido, meu marido

foi lá.Serei franca comtigo, eu mesma lembrei isso a meu marido.Esperei anciosa a resposta.Meu marido vollou pela tarde. Tinha um certo ar triste. Perguntei o quehavia.

t-~ Nao sei. Fui encontrar o rapaz de cama. Disse-me que era uma ligeiraconstipaçào; mas eu creio que nào ó isso só...

Que será então? perguntei eu, fitando um olhar em meu marido.Alguma cousa mais. 0 rapaz fallou-meem embarcar para o norte. Está

Inste, distraindo, preoecupado. Ao mesmo tempo que manifesta a esperançade ver os pais, revela receios de não tornar a vèl-os. Tem idéas de morrer naviagem. Não sei que lhe aconteceu, mas foi alguma cousa. Talvez...

Tomo III. — JUMI0 de 1865. li

**(.

Page 2: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

162 JORNAL DAS FAMÍLIAS.

Talvez?Talvez alguma perda de dinheiro.

Esta resposta transtornou o meu espirito. Tosso affirmar-te quo esta res-

posta entrou por muito nos acontecimentos posteriores.Depois de algum silencio perguntei :

Mas que pretende fazer?Abrir-me com elle. Perguntar o que e, c acudir-lhe sc fòr possível. Em

qualquer caso nao o deixarei partir. Que achas?Acho que sim.

Tudo o que ia acontecendo contribuía poderosamente para tornar a idéa

dc Emilio cada vez mais presente á minha memória, e, ó com dor que o con-

fesso, nào pensava já nelle sem pulsações do coração.

Na noite do dia seguinte estávamos reunidas algumas pessoas. Eu nao dava

orande vida á reunião. Estava triste e desconsolada. Estava com raiva dc mim

própria. Fazia-me algoz de Emilio e doia-mc a idéa de que elle padecesseainda mais por mim.

Mas, serião nove horas, quando meu marido appareceu trazendo Emilio

pelo braço.Houve um movimento geral de sorpresa.Realmente porque Emilio não apparecia alguns dias já todos começavão a

perguntar por elle; depois, porque o pobre moço vinha pallidodc cera.

Nào te direi o que se passou n'essa noite. Emilio parecia soffrer, não estava

alegre como dantes; ao contrario, era 11'aquella noite de uma taciturnidade,de uma tristeza que incominodava a todos, mas que me mortificava atrozmente,

- a mim que me fazia causa das suas dores.Pude fallar-lhe em uma oceasião, a alguma distancia das outras pessoas.

Desculpe-me, disse-lhe cu, se alguma palavra dura lhe disse. Compre-hende a minha posição, Ouvindo bruscamente o que me disse não pude pensarno que dizia. Sei que soffreu; peço-lhe que não soffra mais c esqueça...

Obrigado, murmurou elle.Meu marido fallou-me de projectos seus...De voltar á minha provincia, é verdade.Mas doente....Esta doença ha de passar.

E dizendo isto lançou-me um olhar tao sinistro que cu tive medo.Passar? passar como?

De algum modo. { -í — Não diga isso.,.

Oue me resta mais na terra?

Page 3: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

¦¦v--.1'," *'¦' -'...^¦.V.-.^.A';*' ¦ >'_-,.¦.'-?-•*"¦¦¦ **¦ -. '

16 OJORNAL DAS FAMÍLIAS.

E voltou os olhos para enxugar uma lagrima.-— Que é isso? disse eu. Está chorando?

As ultimas lagrimas.Ob! se soubesse como me faz soífrer! Não chore; eu lho peço. Peço-

lhe mais. Peço-lhe que viva.Ob!Ordeno-lhe.Ordena-me? E se eu não obedecer? Se ou não puder?... Acredita que se

possa viver com um espinho no coração?Isto que te escrevo é feio. A maneira por que elle fallava é que eraapako-

nada, dolorosa, commovente. Eu ouvia sem saber de mim. Approximavào-sealgumas pessoas. Quiz pôr termo á conversa e disse-lhe :

Ama-me? disse eu. Só o amor pôde ordenar? Pois é o amor que lheordena que viva!

Emilio fez um gesto de alegria. Levantei-me para ir fallar ás pessoas quese approxiinavào.Obrigado, murmurou-me elle aos ouvidos.

t Quando, no fim do serão, Emilio se despedio de mim, dizendo-mc, comuni olhar cm que a gratidão e o amor irradiavâo juntos : -Até amanhã! -não sei que sentimento de confusão e de amor, de remorso e de ternura seapoderou de mim.

Bem; Emilio está mais alegre, dizia-me meu marido.Eu olhei para elle sem saber o que responder.Depois retirei-me precipitadamente. Parecia-me que via iVellc a imagem da

minha consciência.No dia seguinte recebi de Emilio esta carta:« Eugenia. Obrigado. Torno-me ávida, e á senhora o devo. Obrigado! fez

de um cadáver um homem, faça agora de um homem um deos. Animo!animo! »

Li esta carta, reli, e... dir-fo-hei, Cariou? beijei-a. Beijei-a repetidasvezes com alma, com paixão, com delírio. Eu amava! eu amava!

Então houve.em mim a mesma luta, mas estava mudada a situação dosmeus sentimentos. Antes era o coração que fugia á razão, agora a razão fugiaao coraçào.

Era um crime, eu bem o via, betli o sentia; mas não sei qual era a minhaíatahdade, qual era a minha natureza, eu achava nas delicias do crime des-culpa ao meu erro, e procurava com isso legitimar a minha paixão*

Quando o meu marido se achava perto de mim eu me sentia melhor e maiscorajosa..,

Page 4: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

164 JORNAL DAS FAMÍLIAS.

Paro aqui d'esta vez. Sinto uma oppressão no peito. É a recordação dc to

dos estes acontecimentos..Até domingo.

VI,

Seguirão-se alguns dias ás scenas que eu te contei na minha carta passada.Activou-se entre mim e Emilio uma correspondência. No fim de quinze

dias eu só vivia do pensamento d1 elle.Ninguém dos que frequentavão a nossa casa, nem mesmo lu, pôde desço-

brir este amor. Éramos dous namorados discretos a ultimo ponto.É certo que muitas vezes me perguntavão porque é que eu me distrajiia

tanto e andava tào melancólica; isto chamava-me á vida real e eu mudava logo

de parecer.Meu marido sobretudo parecia soffrer com as minhas tristezas.

A sua solicitude, confesso, incommodava-me. Muitas vezes lhe respondia

mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quemeu não quizera ouvir d'estas interrogações.

Um dia voltando para casa á tarde chegou-se elle a mim e disse :Eugenia, tenho uma noticia a dar-te.Qual?

-— E que te ha de agradar muito.Vejamos qual é.E um passeio.

—* Aonde?A idéa foi minha. Já fui ao Emilio e elle applaudio muito. 0 passeio

deve ser domingo á Gavia; iremos d'aqui muito cedinho. Tudo isto, é precisonotar, não está decidido. Depende de ti. O que dizes? <

Approvo a idéa.Muito bem. A Carlota pôde ir.E deve ir, acerescentei eu; c algumas outras amigas.

Pouco depois recebias tu e outras um bilhete dc convite para o passeio.Lembras-te que lá fomos. 0 que nào sabes é que nesse passeio, a favor da

confusão e da distracção geral, houve entre mim e Emilio um dialogo que foi

para mim a primeira amargura de amor.Eugenia, dizia elle dando-me o braço; estás certa de que me amas?Estou.

Pois bem. 0 que te peço, nem sou eu que te peço, é o meu coração, éo leu coraeão que te pedem, um movimento nobre capaz de nos engrandecer

Page 5: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

- -f-1,~

JORNAL DAS FAMÍLIAS.. ÍC5

aos nossos próprios olhos. Náo haverá um recanto no mundo em que possa-mos viver, longe de todos e perto do céo? *

Fugir ?Sim!

¦— Oh! isso nunca !Não me amas.Amo, sim; é já um crime, nao quero ir além.Recusas a felicidade?Recuso adeshonra.Não me amas.Oh! meu Deos, como respondêl-o? Amo, sim; mas desejo ficar a seus

olhos a mesma mulher, amorosa é verdade, mas até certo ponto... pura.0 amor que calcula, não é amor.

Não respondi. Emilio disse estas palavras com uma expressão tal de desdéme com uma intenção de ferir-me que eu senti o coração bater-me apressado,e subir-me o sangue ao rosto. v

0 passeio acabou mal.Esta scena tornou Emilio frio para mim; eu soffria com isso ; procurei tor-

ríal-o ao estado anterior; mas não consegui.Um dia em que nos achávamos a sós, disse-lhe :

Emilio, se eu amanhã te acompanhasse, o que farias?Cumpria essa ordem divina.

Mas depois?Depois? perguntou Emilio com ar de quem estranhava a pergunta.Sim, depois, continuei eu; depois quando o tempo volvesse não me ha-

vias de olhar com desprezo?Desprezo? Náo vejo...Como não? Que le mereceria eu depois ?

—- Oh! esse sacrifício seria feito por minha causa, eu fôra cobarde se telançasse isso em rosto.

Dil-o-hias no teu intimo.Juro que nâo.Pois a meus olhos é assim ; eu nunca me perdoaria esse erro.

Emilio pôz o rosto nas mãos e pareceu chorar. Eu que até alli fallava eomesforço, fui a elle e tirei-lhe o rosto das mãos.

Que é isto? disse eu. Não vês que me fazes chorar tambefn?Elle olhou para mim com os olhos rasos de lagrimas. Eu tinha os meus

»

humidos.Adeos, disse elle repentinamente. Vou partir.

Page 6: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

1GG JORNAL DAS FAMÍLIAS.

E deu um passo para a porta.Se me promettes viver, disse-lhe, parte; se tens algiíma idéa sinistra,

lica.Não sei o que vio elle no meu olhar, mas tomando a mão que eu lhe esten-

dia beijou-a repetidas vezes (erão os primeiros beijos) e disse-me com fogo ;Fico, Eugenia!

Ouvimos um ruido fóra. Mandei ver. Era meu marido que chegava enfermo.Tinha tido um ataque no escriptorio. Tornara a si, mas achava-se mal. Al-

guns amigos o trouxerão dentro de um carro.Corri para a porta. Meu marido vinha pallido e desfeito. Mal podia andar

ajudado pelos amigos.Fiquei desesperada, não cuidei de mais cousa alguma. 0 medico que acom-

panhára meu marido mandou logo fazer algumas applicaçôes dc remédios.Eu estava impaciente; perguntava a todos se meu marido estava salvo.

Todos me tranquillisavão.Emilio mostrou-se pezaroso com o acontecimento. Foi a meu marido e aper-

tou-lhe a mão.

Quando Emilio quiz sahir, meu marido disse-lhe :Olhe, sei que não pôde estar aqui sempre; peço-lhe, porém, que venha,

se puder, todos os dias.Pois nâo, disse Emilio.

E sahio.Meu marido passou mal o resto cVaquelle dia e a noite. Eu não dormi. Pas-

sei a noite no quarto.No dia seguinte estava exhausta. Tantas commocòes diversas e uma vigília

tão longa deixárào-me prostrada : cedi a força maior. Mandei chamar a primaElvira e fui deitar-me.

Feche esta carta n'este ponto. Pouco falta para chegar ao termo da minhatriste narração.

Até domingo.

Vil

A moléstia de meu marido durou poucos dias. De dia para dia aggravava-?e.No fim de oito dias os médicos desenganárão o doente.

Quando eu recebi esta fatal nova fiquei como louca. Era meu marido, Car-lota, e apezar de tudo eu nâo podia esquecer que elle tinha sido o compa-nheiro da minha vida ea idéa salvadora nos desvios do meu espirito.

Page 7: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

JORNAL DAS FAMÍLIAS. 167

Emilio achou-me n'um estado de desespero. Procurou consolar-me. Eu

nào lhe oceultei que esta morte era uni golpe profundo para mim.

Uma noite estávamos juntos todos, eu, a prima Elvira, uma parenta de meu

marido e Emilio. Fazíamos companhia ao doente. Este, depois de uin longo

silencio, voltou-se para mim e disse-me :— Atua mão.

*

E apertando-mc a mão com uma energia suprema, voltou-se para a parede.Expirou.

. » • •

Passárão-se quatro mezes depois dos factos que te contei. Emilio acompa-

nhou-mc na dôr e foi dos mais assíduos em todas as ceremonias fúnebres quese fizerão ao meu finado marido.

Todavia, as visitas começarão a escassear. Era, parecia-me, por motivo de

uma delicadeza natural.No fim do prazo dc que tc fallei, soube, por boca de um dos amigos de

meu marido, que Emilio ia partir. Não pude crer. Escrevi-lhe uma carta.

Eu amava-o então, como cPantes, mais ainda, agora que estava livre.

Dizia a carta :« Emilio. Constou-me que ias partir. Será possivel? Eu mesma não posso

acreditar nos meus ouvidos! Bem sabes se eu tc amo. Não é tempo de coroar

os nossos votos; mas não faltará muito para que o mundo nos releve uma união

que o amor nos impõe. Vem tu mesmo responder-me por boca. Tua Eu-

gema. »Emilio veio cm pessoa. Asseverou-me que, sc ia partir, era por negocio de

pouco tempo, mas cpie voltaria logo. A viagem devia ter lugar d'alii a oito

dias.Pedi-lhe que jurasse o que dizia, e elle jurou.Deixei-o partir.D'ahi a quatro dias recebia eu a seguinte carta cPellc :

« Menti, Eugenia; vou partir já. Menti ainda, cu não volto. Não volto por-

que não posso. Uma união comtigo seria para mim o ideal da felicidade sc eu

nào fosse homem de hábitos oppostos ao casamento. Adcos. Desculpa-me, e

reza para que cu faça boa viagem. Adeos. Fmilio. »

Avalias facilmente como fiquei depois dc ler esta carta. Era um castello quese desmoronava. Em troca do meu amor, do meu primeiro amor, recebia

(1'este modo a ingratidão e o desprezo. Era justo : áquelle amor culpado não

podia ter bom lim; eu fui castigada pelas conseqüências mesmo do meu

crime.Mas, perguntava eu, como é que este homem, que parecia amar-me tanto,

;¦*.

Page 8: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

168 JORNAL DAS KAMI MAS.recusou aquella de cuja honestidade podia estai certo, visto que pôde opporuma resistência aos desejos de seu coração? Isto me pareceu um mysterio.Hoje vejo que não era; Emilio era um seduetor vulgar e só se differençavados oulros cm ter um pouco mais de habilidade que elles.

Tal é a minha historia. Imagina o qne soffri n'estes dous annos. Mas otempo é um grande medico : estou curada.

0 amor offendido e o remorso dc haver de algum modo traliido a confiançade meu esposo fizerão-me doer muito. Mas eu creio que caro paguei o meucrime e acho-me rehabilitada perante a minha consciência.

Achar-me-hei perante Deos?E tu? E o que me has de explicar amanhã; vinte e quatro hor^s depois de

partir esta carta eu serei comtigo.Adeos!

j.

Page 9: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

.a&JÉ^i $&

IM

Oh! frcsquidão amena, oh! grato asylo,Onde me ia acoutar dc acerbas mágoas,

Tu guardarás no seio os meus quixtmies,Tu cpntarás ás porvindouvas 'irasOs segredos de amor que inc escutasle.

A ) ¦ *

1

uem sahir em uma bella tarde de veráo da pittorescaVilla Viçosa de Camutá, e deixar-se levar em uma d'es-sas pequenas e velozes montarias por sobre as águascrystallinas do magestoso Tocantins; costear a villa,tendo á sua direita as ilhas innumeras, que, como co-rôas brilhantes, adornâo o tributário do gigante dosrios; e passar o porto da Aldêa, celebre por ter visto

em 1557 a partida aventurosa de Pedro Teixeira para o Peru, e sua volta deQuito em 1558; ficará preso por mágico encanto pouco alem, em um sitiodelicioso, de vastas praias de finíssima arèa. A nào ser sua alma despida desentimento, elle dará longo tempo á contemplação d'esse oásis, creado pelanatureza para essas existências poéticas, inimigas do tumultuar do mundo, eportanto felizes, que baixão dos céos para viverem vida plácida, e depois,cumprida sua modesta missão, voào para a eternidade, bemdizendoo Creador.

E esse lugar de ha muito chamado Pacajá, denominação que ainda temT. lli. 6"

Page 10: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

170 JORNAL DAS FAMÍLIAS.

hoje. Alli se despeja o rio do mesmo nome, partindo de mui longe, e rnistu-rando suas águas com o Taigipurú, abaixo da confluência do Anapú. Além dabelleza de suas praias vem dar maior valor a este sitio um bosque sombrio deannosos castanheiros e alegresmoutas de floridos cafezacs. As tribusdos Tupi-nainbás e dqs Pacajás povoarão essas terras no passado, deixando hoje á fero-cidade da conquista o silencio e asoidão! Porém poucos annos antes dare-volução que assolou as férteis terras do Pará com barbaria descommunal,existia uma familia no Pacajá, rica, não de bens, mas d'aquelles thesouros

que nos dá a felicidade da vida intima. Hoje, só fugitivas minas, cobertas dc

parasitas trepadeiras, nos mostraráó o lugar da casa onde houverào tantasventurase tão tráficos acontecimentos!

No anno da graça de 185. no Pacajá erguia-se elegante no meio das verde-claras palmas de assayzeiros uma casinha de construcção engenhosa, e demuita novidade para quem não percorreu ainda o interior do Pará. Suas ela-ras paredes, feitas de um tecido industrioso de talos da palmeira burilv, sus-tcntavâo a coberta de bussú, que bem aparada nas extremidades descansavana simples cornija com irreprovavel igualdade. Dissercis ao ver a architectura .leve e aérea d'esse pequeno edifício, que elle estava por momentos a elevar-seda terra, ea evaporar-se pelos topos dos castanheiros vizinhos. Tinha duasjanellas rasgadas em fôrma de meia ellipsc na parte superior, e uma portano centro, arremedando o gosto gothico. Uma alameda de mangueiras, plan-tadas em linha, partia da margem do rio, e ia morrer em frente de um pe-queno jardim arruado por assayzeiros, e que formava o páteo da casinha.Alguns jasmineiros de mistura corn arbusculos da fragrante flor general seavizinhavão ás janellas do engraçado edifício.

Pintava o fundo d'estc quadro vivo de paisagem um espesso bosque de cas-tanheiros e de gigantescos burityzeiros, ostentando as variegadas ramagenspor cima do tecto, e atrás da casinha que descrevemos.

O todo d'esta habitação, o bem eollocado dc suas differentes peças, o mo-vimento pausado e triste das palmas dos burityzeiros, dominando arredon- .dadas copas de arvores dc um verde eterno, convidava a alma para esse reco-Ihimento agradável, que ninguém deixará de ter senlido em alguma hora desua existência; e durante a qual gostamos de rever o nosso passado, colhendounia a uma recordações aerc-doces, e demorando-nos n ellas com saudosa me-lancolia. O cantor de Atala, eollocado n esse paraíso e inspirado por elle, teriaproduzido mais outro florão para a sua coroa de gloria.

Ao primeiro lançar d'olhos se conhecia que a mão da mulher havia orde-nado todas essas bellezas, porque só á mulher foi dado penetrar os arcanos

Page 11: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

1

JORNAL DAS FAMÍLIAS. 171da maravilhosa arte da producção do verdadeiro bello; porque só ella conhecea harmonia das cores, o encanto dos perfumes, o casamento das flores, todos *

esses pequenos detalhes, que reunidos enfeitão ávida. .......

Viviào ahi n'essa morada de paz dous entes que se estimavâo ternamente :Ida e sua mâi Loia. Esta, na tarde di existência, mostrava ainda algumaslinhas de belleza por entre as rugas da velhice. Descendente de antigos Tuxauas,e pertencendo a essa raça india indomável, havia deposto já todas as suaspaixões, e só conservava um sentimento que a prendia á terra — o amor ma-ternal. A mão do tempo com sua implacável esponja havia absorvido toda aseve creadora das douradas emoções da mocidade. Era urn velho tronco semfolhagem, já inclinado c adherente ao solo por uma só raiz, a sua Ida. A moça,na manha da vida, era ura botão de rosa que desabrochava.

Tão bella como a virgem de Raphael, tinha mais os atlractivos peculiaresd'essas (ilhas do Equador, tão vivazes, tão ardentes. Ella apresentava todos oscaracterísticos do mais perfeito typo da raça india com todas as suas delicio-sas curvas.

0 rosto oval, terminando na parte superior com a longa e expressiva frontedeixava ver duas sobrancelhas pretas, bem pronunciadas, que ião morrerquasi nas extremidades lateraes dos mais fascinantes olhos que tem sahidodas mãos do supremo artífice. Uma pequena boca com lábios de doce côr decarmim, que ia perder-se e confundir-se em inimitável nuança com a côr mo-reno-forte do semblante, a furto descobria dous fios de alvos e pequenos den-tes. Era o calix da flor de murucujácom seus estames exhalando embriãgantearoma.

Comprida e basta coma de preto brilhante, fugindo de siva coroa de jas-mins que lhecircumdava a cabeça, ia brincando em espalhados rolos pelo seiode virgem até tocar na delicada cintura. E todos os seus movimentos denun-ciavão perfeitíssimas fôrmas, obra prima que as vestes escondiâo. Era tão ai-rosa, tão flexível, tão requebrada como a verde varinha dos palmares, batidapor branda viraçào. Embalada em sua maquera de bordadas pennas, era supe-rior á voluptuosa moça do liarem em dourada ottomana.

A mâi e a filha tinhao visto a passagem dos annos com a rapidez que traza felicidade. Os mezes, os dias, erão velozes e fugazes para ellas, que os divi-diâo entre o trabalho e o prazer» Estavão identificadas com aquelle pequenoÉden, que lhes parecia animado e que tinha sido testemunha da vida, doscantares e das dansas de seus antepassados.

Loia comprazia-se vendo o crescimento de sua filha, o desenvolvimento deseu elegante corpo, e contava uma por uma as mudanças que trazia o tempo.

Page 12: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

\lí 3OBNAL DAS FAMILIAS.

Com a solicitude c apaixonado desvelo do lavrador ao pé da pequena arvore

que plantou, ella regou com extremos de mãi a fraca creatura em sua nieni-nice; cobrio-a com os abraços meigos, e protegeu-a com o seu corpo contra atormenta dos males do*mundo. Ao tempo em que sua lilha fortificou-se coma idade, ella principiou a colher os fructos que tào bem sabem ao coração demãi. Então não havia para ella gozo sobre a terra que se pudesse igualaraquelle que sentia quando via o semblante de Ida, rico de mocidade c de bei-leza, confundir-se com as flores, tomar as cores cPellas, quando nos brincosmostrava o encarnado nas faces, correndo após de marchetada borboleta.Lembrava-se ás vtezes de sua mocidade, dc seus brincos d'aqucllc tempo, evia-os todos reproduzidos por essa pequena creatura que tinha sido o fruetode sua casta união. Prolongada contemplação em extasis de prazer trazia-lhealguma vez o reconhecimento de uma ou mais semelhanças cPaquelle rostoangélico com o companheiro de sua vida, que a mão da morte lhe havia arran-cado. 0 presente era dourado e o porvir todo de esperanças.

Lota sonhava para sua filha uma existência igual á d'ella. Pedia a Deos (pielhe desse um protector na terra, tào bom, tào amante, como ella tinha achadouo pai d'essa menina, e que lhe desse, a ella Ida, uma filha, como a ella haviaDeos concedido. E íVcsscs sonhos, onde tào pouco se pedia, onde se desenhavaa felicidade pelo gozo passado de quem pedia, nào havia uma sombra de du-vida da bondade de Deos. Loia esperava ver realisados os seus sonhos de futurocom a fé do verdadeiro crente.

As1 vezes um amargo pensamento vinha misturar-se á doçura iPessa vida.Ella tinha o egoísmo materna], e sentia já a ferida que soffreria seu coraçào,quando a filha tivesse dc partir com alguém esse thesouro de amor que elladesejava possuir só.

Assim Ida tinha crescido debaixo da protecção extremosa de Loia, e haviaachado nella todo esse suavissimo carinho que só despende coração maternal.Desde que principiou na infância a ensaiar seus mal seguros passos por aquellejardim tão querido, tao cheio de memórias agradáveis, até a puberdade, ha-via-se acostumado a ver n'essa mulher devotada o seu gênio tutelar; e nellaconcentrava todo o seu pensamento, todos os seus votos. O mundo para ellaresumia-se n'aquelle pequeno espaço; o seu amor era dividido entre as florese sua mãi.

Chegou porém o dia cm que Ida julgou nao ser perfeitamente feliz. Vagosdesejos, sentimentos que ella mesma não sabia explicar em sua mente, lhetrazião a tristeza sobre o semblante ha pouco tâo alegre, É que vinha a épo-ca em que ella devia concorrer para a mais sublime harmonia das cousascreadas sobre a terra, a harmonia do homem e a mulher. A mocidade e a vida

Page 13: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

JORNAL DAS FAMILIAS. 475

arrancavão, senão todo, ao menos a mais bella parte do coração da gélidavelhice e da morte para harmornsar-se com outra mocidade e vida, reprodu-zindo-se.

Deos não quiz que bastasse para a íelicidade no mundo o amor mater-nal, e entretanto esse amor é tào puro, tão dedicado, tão cheio de heróicosmai i\rios. »v . . . . . . . . . . . • • • • • • • •j ... . . . • • • • . • • * • * * • * * * *

0 acaso arrastou um dia aquelles sítios um moço na flor dos annos. Vimy

(assim se chamava elle) tinha uma d'essas almas doces e impressionáveis quenão abrigão senão idéas de bem, e que são levadas para tudo o que é bello

por attracção irresistível. Até então a magestade das maltas, a soberba cor-rente do Amazonas, o gorgeio das aves multicòres havião prendido seus sen-tidos em suas emigra, òesde prazer. Nressa mesma oceasião o encanto d'aquellahabitação aprazível o convidara para seus gozos innocenles. De repente oroçar de um vestido pelos enlaçados ramos dos jasmineiros fez com que ellevolvesse os olhos para aquelle lugar. Longo tempo licou absorto em muda con-templaçâo para uma mulher que passava por entre os ramos. Nunca elle tinhavisto cousa tão bella, jamais havia fantasiado em seus sonhos tantas perfei-ções reunidas. Fascinado e sem poder reter seus movimentos, foi cahir de

joelhos aos pés d'essa mulher, que era Ida, exclamando como o condemnado :Tupana! Tupana ! tem compaixão de mim!

E ella, assustada, voltando-se para o moço, e como que locada pela mesmacorrente electrica, deixou cahir as flores colhidas, e só pôde responder-lhe :

Como és formoso!...Desde então elles se amarão, como se ama na madrugada da vida.

Quadra feliz é essa em que pela primeira vez amamos!Ainda puros, como são todas as obras sabidas da mão de Deos, com a alma

virgem, sem ter soffrido o toque profano dos vicios sociaes, nos entregamosa esse enleio seduetor, c gozamos, por uma vez na vida, de perfeitíssima ven-tura.

Como o escravo no primeiro dia de liberdade, a alma no primeiro uso quefaz de sua faculdade de affecçòes entra nesse sentimento com todo o vigor,com todas as suas faculdades. Cada uma doçura que colhemos promove umvoto de graças ao Omnipotcnte por nos haver creado e a ella...

Depois, com o correr dos annos, já não amamos senão o maior ou menornumero de cifras. Vem a affecção calculada, sem poesia, sem felicidade.

E portanto é táo forte esse primeiro movimento da alma, esse brilho defelicidade, penetra lauto a sensação, é tão pleno o gozo d'aquellas horas, quenunca nos desleinbramos de nosso primeiro amor.

Page 14: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

174 JORNAL DAS FAMÍLIAS.

Quem ha ahi que, curvado pelos annos no inverno da vida, não tenha vol-vido os olhos para a primavera cie seus passados dias, e que lá bem longe naescuridão do esquecimento não tenha enxergado a sua mimosa flor, — o seuprimeiro amor? . . . .,. . . .

Alguns mezes erão decorridos depois do encontro que acabamos denarrar. A habitação pittoresca do Pacajá conservava a mesma forma ri-sonha, com seu arvoredo sempre florente. O jardim somente ostentava maiorluxo no augmento de suas plantas e nos tecidos engenhosos de suas la-tadas, porque agora duas vontades, dous corações, intimamente ligados,ordenavào a sua cultura, e sentião melhor a influencia e poesia dos cam-pos.

Em uma tarde, n essa hora que medeia entre á luz e as trevas, intercalar dodia á noite, propicio a saudosas lembranças, se dirigia pela alameda de man-gueiras já por nós conhecida, procurando a casa de Ida, um homem de esta-tura elevada, que no semblante deixava entrever a agitação em que laboravaseu mal ferido peito.

A physionomia d'esse homem, com seus pequenos olhos encobertos por bas-tas sobrancelhas, traduzindo por todas as linhas de suas feições o que ha demais horrível nas paixões humanas, era repulsiva.

Chegando á porta da pequena habitação, antes de passar além, demorou-seum poueo e levou uma das mãos ao coração, parecendo querer reprimir pul-sações violentas de sentimento forte, e depois entrou na morada de paz e feli-cidade.

Antes de descrevermos a scena que ahi teve lugar, introduzindo o leitor nointimo de uma familia paraense, faremos uma diversão tocando em alguns deseus usos e costumes mais dominantes, espelhos onde se refiectem quasi sem-pre a indole e alma dos povos.

A' henefica influencia da vista d'essas mattas seculares que correm ao longodos innumeraveis rios, que em todo o sentido corião o solo do Pará; ao calmoe suave gozo da contemplação de tudo o que ha de mais bello na terra; vem-se associar, augmentando a nossa admiração e prendendo-nos mais, ahospita-lidade notável dos habitantes d'esse torrão privilegiado! Os corações se abremao peregrino solitário, os lábios formão innocentes sorrisos a cada palavra quesoltão. Parece que essa gente, geralmente feliz, quer c procura fazer a todosfelizes. A ambição é planta exótica no Pará : basta-lhes essa existência mo-desta e commoda que receberão das mãos de Deos. As portas de todas as habi-tações abrem-se alegremente para receberem a quem as procura. Alli encon-tra-se a voluptuosa maquera, impregnada das emanações odoriferas do louro

Page 15: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

r

JORNAL DAS FAMÍLIAS. 175

e da peperioca, c, o que vale mais que tudo, o gasalhado de irmãos. 0 cachimbo,corno svmbolo de paz e amizade, com dourados laquarys, a bonita cuia do pi-cante tacacá, voão dc mão em mão até o hospede nomeio da alegria e da feli-cidade. Quantas horas deleitosas correm rápidas n'esse doce embalar em chei-rosamaquera! Quantas dores d'alma se evapon5o com esse fumo dos douradoscachimbos! Pouco importunão a caprichosa fortuna, e seus desejos não trans-

põem um pequeno circulo que creárão suas cândidas almas : a vida no meiodas dansas e cantares; a mulher bella, escolhida para companheira de seusdias; o inseparável tchibuk de aromatico tabaco, são as suas aspirações naterra. Os amigos ardentes do progresso social não sympathisaráõ com essasexistências pacificas etão pouco exigentes; mas nós que fomos testemunha da

pura e inalterável felicidade que adeja em torno d'ellas, fazemos votos paraque bem tarde troquem o presente pelas anciedades, consumidores cuidados,ingrato trabalho, vicissítudes e incertezas de outro existir, que só acabão como derradeiro grão da ampulheta da vida. Gostamos d'esse povo que passeiapelo campo da vida, deixando os cardos e a cicuta, e colhendo só os saborososfructos e as flores.

Quando soar a hora do infallivel jugo das forças civilisadoras, quando hou-verem abandonado esses costumes simples que receberão dé seus maiores,esses usos, essas bebidas tão amadas hoje, e que têm lugar de honra nos pra-zeres domésticos, soltarão amargas lagrimas de saudade nomeio dos ouropeisdos sumptuosos salões.

Entre os sentimentos mais caros de seus corações tem a primazia o amor,e a este subordinão tudo. O Deos de bondade mandou-os ao mundo para colheros fructos nos campos sem trabalho, e para se amarem até que venha o somnoda campa. Sao seres felizes, aos quaes se pode applicar os inimitáveis cantosdo immortal autor de Island. Agora, depois d'este imperfeito esboço acercados habitantes do lugar onde se passavão os factos que narramos, voltamos ao

ponto em que éramos.Áquelle desconhecido, que tão agitado caminhava para a casa de Ida,

achava-se já na pequena sala d^ssa habitação, defronte da moça. Tinha-adiante de si, bella com todas as bellezas do mundo, e antevia um céo aberto

, se essa mulher o amasse. Porém a duvida em que estava sobre esse amor ar-

dentemente desejado esmagava-o com toda a sua força. Elle se sentia capaz

de tudo emprehender para chegar a esse supremo bem, ainda que fosse um

crime.— Ida! alguns annos têm corrido desde a ultima vez que entrei n esta casa

para ouvir a derradeira vontade de teu pai. Elle abençoou-nos, quando ajoe-

lhados junto ao leito de dôr e chamou-nos seus filhos. Eras então bem pe-

Page 16: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

176 JORNAL DAS FAMÍLIAS.quena, mas já n'essa idade ern que a razão começa a trabalhar, e conserva aslembranças do passado.

Assim fallou esse homem a Ida. Presentia que o coração da mulher o des-terrava, pelo rápido exame que havia feito logo que se dirigio á moça; espe-rava porém que o coração da filha se sujeitasse ao jugo que as palavras do paimoribundo talharão para cila. N'esse pequeno jogo do pensamento, n'essa ten--ativa qu9 lhe parecia de effeito infallivel, elle não contou com a violentapaixão que se havia apossado da alma da moça, e que sorria no horizonte comas mais lindas cores.

Ida tremeu com essas palavras, e deixou ver em todo o seu ser o choqueviolento que ellas produzião, como se um fantasma com sua mortalha, erguidoda terra, a tivesse invocado para o cumprimento de um voto esquecido! Nãoachou uma palavra para responder, e elle continuou :

Eu te considerei desde então como a mulher que devia partilhar minhafelicidade, ou os meus futuros trabalhos. Afastei-me .Lestes lugares forcado;e Deos sabe quantas vezes meus olhos sc voltarão para aqui com repassadadôr. Já eras bella, Ida! mas hoje excedes cm formosura á estrella cLalva!

Elle calou-se, e, contemplando a moça com ávidos olhos, esperou muitotempo que ella fallasse.

Aley-assú! nào prosigas... O que disseste mata-me.Foi só o que pôde Ida pronunciar na primeira hora de dôr de sua vida Atéentão tinha ella pisado sobre rosas, c nunca se havia lembrado .Lessa pro-messa imprudente de seu pai nas sombras da morte. Como a sensitiva ao pri-meiro toque da desveutura, cila murchava e cabia fulminadaTencionava oceultar a Aley-assú seu amor como uma jóia de valor e temia

por aqUelle que Seu coração havia escolhido. Sabia dos precedentes terríveis«Io Aley-assu, conhecia essa alma feroz, mas seu coração puro nào sabia fingir«essas palavras que soltara forão a expressão do sentimento intimo da alma'Aley-assu percebeu que não era amado, e que nunca o seria, porque Ida iaera de outro. Restava-lhe descobrir o nome d'esse homem que se vinha ai!-epor a elle para a mulher que sua vontade forte queria possuir, e continuou,empregando a dissimulação :Quando se falia pela primeira vez a uma mulher com a linguagem da

v . a, desculpo.,» , dou 0 _erdadciro sentjdo ,sHa! Ma_.to.„a ao te. estado de ca.™ eouae-me. Loito e _L ™nunca fo, araada um, muUlel. sobre , lm, A sfe com| ^

:i.;:::;rdele,le todas -à— "*-^ * ~-

Page 17: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

JORNAL DAS FAMÍLIAS. 177« Em meus trabalhos eu cobrava forças, lembrando-me de teu nome ; e nào

havia para mim outro descanso, outro prazer senáo sonhar comtigo. Um diavenci a distancia com o pensamento, o vim collocar-me. aqui junto a ti, efantasiei tudo o que de mais bello podia produzir a minha imaginação, ali-mentada pelo amor. Foi um sonho !... mas n'esse/sonho fui o mais venturosodos homens. Hoje estou perto de ti, vejo-te, fallo-te, c nào posso acostumar-me a tanta felicidade. Entretanto espero ainda por tão almos dias!

Oh! não, nào me é possivel ainda cumprir a ultima vontade de meupai, disse Ida na agonia do tormento.

Aley-assú não foi mais senhor da cólera que lhe assoberbava o peito, vendo-se repudiado, acostumado como era anão soffrer obstáculos a suas vontades;e, contando como certa a posse (Lessa mulher, que elle tinha guardado comoo usurario a seu thesouro,, vendo-a muitas vezes sem se mostrar, espiandotodos os seus passos até o dia, infeliz para elle, da chegada de Yimy de umade suas viagens, c quando forçadamente tinha-se afastado daquelles sítios.Chegou-se para mais perto de Ida, dominou-a com a vista, e fél-a tremer.Apertou-lhe com sua mão musculosa um dos puisosfe como um annel de ferroroxeou-lhe a epiderme.

Mulher! tenteei o teu coração por todos os lados. Fallei-te em amor,pintei essa existência dourada que te aguardava se a tua alma respondesse áminha, lembrei-te a promessa esquecida de teu pai, e que devia ser sagradapara ti. Foi tudo einbalde... Nào fu giras porém de mim tão facilmente comopensas, e serei tua sombra, e te possuirei apezar de tjido.

Esse homem no delírio soltou essas palavras, e sahio precipitadamente.Parou á margem do rio, e cruzando os braços sobre o largo peito, lançouvistas de ameaça para a casa que deixava.

Mulher frágil! quizeste lutar comigo, resistir a este amor que ferve-meno peito! Eu levo dentro cm mim o inferno, mas tu serás minha, ou te que-brarei como um vidro, e te esmagarei como a planta calcada por meus pés.

Forão as ultimas expressões mandadas por Aley-assú a essa familia feliz atéaquelle momento. Como o anjo máo elle veio turbar essa superfície clara e

plácida!Ida licou por algum tempo sem movimento com aquella ameaça, que foi

um frio de morte que coou pelas veias, parando-lbe as pulsações todas. De-

pois, lembrando-se de sua-mài, como o naufrago em demanda de uma taboade salvação na agonia, foi cahir nos braços d'ella exclamando :

Minha mãi!E Loia, recebendo a filha, lhe disse :

Minha filha! eu ouvi tudo. Desvcnturada! tu já amas...

Page 18: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

178 JORNAL DAS FAMÍLIAS.A fresca viração da noite e outros cuidados mais doces minorarão os re-

sultados de uma tão triste entrevista. Ida foi-se collocar em uma das ianellase não tirou os olhos do horizonte, procurando descobrir na obscuridade ai-gum objecto esperado.

Emquanto um homem se retirava desses sitios com o coração quebrado,outro os demandava com a alma nadando em prazer.

A lua ia já alta em horizonte claro por trás das ilhas de Coroatá c do Caçoai,que demorão defronte da Villa Viçosa de Camutá, imprimindo uma linha ar-gentada de luz, que se espargia docemente nas águas do Tocantins, dese-nharrdo a sombra dos delgados mastros das pintadas vigilengas que se balou-çavão faceiramente no largo rio; illuminando com pallida e suave claridadeas frescas e aprazíveis varandas das casas da rua da Praia, debruçadas sobreo mesmo rio que vem morrer debaixo d'ellas com sonoro murmúrio; e co-roando com a sua poética luz o modesto cruzeiro, e os picos das torrinhas dacapella das Mercês. Quem lançasse a vista nesse momento em direcção deEntr'-ilhas perceberia distinctamente, muito aquém, uma branca velinhaquea olho se avizinhava. Um homern^ sentado na popa, com o remo governava apequena canoa, e com um dos pés firmado sobre a escota graduava a velalatina á feição do vento e das direcçocs da proa. Erguia-se repetidas vezes, eattentava para o largo espaço da immensa bahia que se estendia ein frente, epelo gesto mostrava grande insofírimenlo. Caçava mais a escota, c tirando'oremo do governo ajudava a veloz carreira que levava com alguns golpes naagua. Com admirável habilidade manobrava a canoa, que com a obediênciado fiel corsel sob as rédeas de seu senhor tomava rapidamente o rumo. Sobreos brancos rolos de espuma ella se precipitava com graça, devorando o espaço.Parecia um ser animado, confidente dos segredos do homem, e tomando partenessa impaciência de quem a dirigia. Fendia as águas com sumido murmu-rar, como se temesse acordar olhos indiscretos em sua viagem nocturna.

Em pouco tempo o silencioso viajante chegou ao porto do Pacajá. Levouuma das mãos aos lábios, e imitou perfeitamente o canto do yapiu-hym 0*magoados gemidos de uma rola chegárào-lhe fogo de terra. D'ahi a pouco £pequena canoa gemia debaixo do peso de uma pessoa que da praia saltavapara ella com a agilidade da suassú.

Ida! disse o homem em voz cautelosa e baixa.Vimy! respondêrão-Ihe.

A canoa, jnovida por forte impulsão do remo, fez-se ao lár»o.

S

a

• . .• . . •Leitor! alguma vez experimentaste o seduetor enteio dc soiilaria contem-

Page 19: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

JORNAL DAS FAMÍLIAS. 179

plação do firmamento em noite clara e serena? Sentistc no intimo d'alma apoética emoção da pallida claridade da lua sobre as cidades, sobre os campos,sobre as águas? Certo que lerás gozado esse bem, porque elle se apossa denós mesmo sem ser procurado, produzido unicamente pela oceasião; masdescuidoso talvez lerás passado além sem dedicar-lhe mais que um momentode attenção. Assim são tratados alguns dos mais amenos dons do céo!

lia ahi pela ventura cousa mais magestosa do que esse infinito que se des-dobra sobre as nossas cabeças, brilhante de milhões de trêmulos luzeiros? Ha

prazer mais encantador, mais suave do que aquelle, produzido por esse qua-dro grandioso, despertando em nós acre-doce saudade por alguém ausente,

que, pela mysteriosa força das sympatlrias, esteja talvez n'essa mesma hora,n'esse instante elevando olhos repassados de tristeza para esse céo, paraessa lua?

Haverá sobre a terra coração de tigre, que, tendo pensado, creado, alimen-tado uma idéa de sangue e de morte, alçando as vistas para esse manto danoite recamado de maravilhas, illuminado pelo almo astro, não deponha teme-roso a vida do crime, a idéa da destruição, abalado pelas tremendas verdades— Deos e eternidade?

Espectaculo mágico ó este, que nunca deixa de produzir no homem sensa-

ções novas e elevadas! A alma é transportada pelo espaço sem fim ; o pensa-mento, inspirado pelas harmonias celestes, corre livre, fazendo esquecer avida material. E o ideal dominando soberanamente, apagando o sentimentodo corpo, elevando-nos da terra, e até dourando a lembrança da morte! Aalma sahe pura com a consciência cio seu próprio poder, regenerada pelo bap-tismo do grande principio fundamental de todas as crenças — Deos.

Debaixo pois iFessa influencia irresistível e encantadora, embalados emcasto c puro sentimento de amor, Ida e Vimy deixavao-se ir docemente peloespelhado rio, impellidos pela fresca briza da noite.

É tão delicioso correr por sobre prateadas águas em noite de luar, e a sóscom o ente que amamos; passear sem destino á mercê do caprichoso vento,e cercado do sublime mysterio das noites; entoar no enleio de gozos puros e

innocentes na vida do sentimento canções como as do bardo melancólico de

Albion!

OYr tho ffliíd waters of (he darc bine seao

Our Lhougtlis ns imíbounded ns our sduls are free*.

Elles n'essa hora lembravão-se só de Deos c do céo, e esquecião-se do

Livres, corramos sobro as ondas livres!

Page 20: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

180 JORNAL DAS FAMÍLIAS.mundo com as suas misérias. Suas almas fundirão-se om uma única, que tinhaa mesma vontade, o mesmo sentimento, o mesmo prazer.

Poderosos c elevados pela virtude ih paixão, não baixavào até a vida real.Nào! que erão elles muito acima d'esse charco immundo dc vicios, de hypo-crisia, dc ambição e de sangue que se chama — vida humana.

Tão puros como as maltas virgens que os cercavão, obedecião a essa lei docoração cm dòr ou em prazer, buscando a soidào c o recolhimento; o porquenão ha quem comprehenda tão bem a dòr e o prazer como a soidão!

Fralcrnisavão com a natureza, e com ella dividi-lo a felicidade que os co-bria com sua aurcola.

Ida! a minha vida data do dia em que pela primeira vez te, vi. Tudofloresceu em mim pela magia de teus olhos. Hoje sei melhor comprehender aexistência de nosso pai Tupana, sua bondade, e o amor devido a elle que teci-eou para mini tão bella como a madrugada cm nossos campos. Não achasque tudo toma nova fôrma quando estamos reunidos? Nào gostas das tormen-tas, do estampido dos trovões, quando somos juntos? Ida! não amarias mesmoa morte, a morte comigo?

Meu bem amado! o meu coração de mulher só tem sentimentos para tiAntes de ver-te, parecia-me nào comprohcnder o lim de minha creação ammham.ssão sobre a terra. Hoje conheço, com ineffavel gosto, que obedeço anosso pai Tupana amando-te.E ella já se havia esquecido do passado com o presente!O que elles mais disscrào, o que elles sentirão pôde adivinhar (piem nocalor dos annos já teve uma paixão tão plena como essa, o, tão feliz. Guando as

palavras não puderão mais dizer exactamente os movimentos ,1'alma ellescalarao-se. E o sdencio é a expressão mais eloqüente da suprema felicidadeou da suprema desventura.As horas andào mui vagarosas para o infortunado, e correu mui rápida,na fehcdade. força era que elles se arrancassem d'esse paraíso, e em brev,se vio a canoa procurando o porto do Pacajá.

Ida! repete-me pela ultima vez o ten juramento de amor, para quetenha a força de deixar-te! ' 'Vimy! eu te amo!

; Forão as ultimas palavras que trocarão. E a alma da moça se exhalod todan essas notas de melodia celeste.

S

rn

VI CIA TO II. ÜUAKTEContimiar-se-ha, -~-

Page 21: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

JOVENS INTERESSANTES

..^l^^x^/^^r^cv^»

o mez de Dezembro do anno dc 1860 recebeu o maispittoresco arrabalde da cidade do Kio de Janeiro maisunia familia em seu seio; compunha-se ella de pai,mai e uma filha, a qual, pela pallidez de seu rosto, bemmostrava que era em busca da saude que a abando-nára que seus pais buscavão os puros ares do aristo-cratieo Botafogo.

Foi no dia 50 do supracitado mez que D. Ülympia Maria Miló Pando eseu marido o Sr. José Maria Pando vierão fixar a sua residência numa lindachácara na Piaçava, com sua mimosa lilha a Sra. D. Almerinda.

Pouco depois de haverem percorrido a chácara e casa em que ião habitar,exclamou D. Almerinda :

Ai! meu Deos! virão aqui, tão longe, as minhas amigas conforme me

promettêrão?Hão de vir, minha (ilha, respondeu-lhe sua mãi; duvidas de sua ami*

zade? conto com ella para me ajudarem a distrahir-le, e ver se assim torna-mos a ver-te gorda e alegre como dantes.

Para que nossas amáveis leitoras possão comprelicnder este dialogo, é mister

que lhes expliquemos, (pie tendo o medico de D. Almerinda exigido, para o•

seu completo restabelecimento, a mudança dc ares, ella a isso sc não quizsujeitar sem previamente

fobtcr de suas amigas a promessa de que no pn-meiro domingo de cada mez viria uma d?entre ellas passar o dia em sua com-

Page 22: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

JORNAL DAS FAMÍLIAS,panhia; ao que de bom grado annuírão) promettendo-lhe outrosirn de queiria visital-a aquella que tivesse algum caso, anecdota, ou historia interes-sante para lhe contar, afim dc distrahil-a de suas dores. %

De posse cfessa promessa parlio para Botafogo, onde, como jà vistes pelasua exclamação, aguarda anciosa a chegada do primeiro domingo do mez deJaneiro de 1861, para abraçar uma de suas amigas e ter noticias das outras.

Eis-nos chegados ao primeiro domingo do mez dc Janeiro de i 861, e D. Alme-rinda está radiante de alegria, por ver que D. Rosinha, uma das que lhe haviãofeito a amigável promessa, veio visilal-n, e lhe noticiou que tinha para lhecontar a historia do casamento dc urn moço com uma boneca.

Depois de haverem conversado sobre differentes assumptos, pedioD. Olympia a D. Rosinha que. contasse á sua filha a historia que lhe pro-mettéra, ao que pressurosa se prestou, principiando assim :Existia na Toscana, n'um lugar próximo da capital, uma mulher chamadaRosaura, muito conhecida pela perfeição com que fazia bonecas, as quaesvestia com extrema elegância, apropriando a cada uma a vestimenta con-lorme o papel que lhe queria fazer representar.Sua casa ou mais apropriadamente dito, sua fabrica, era consideradacomo uma das maravilhas do paiz, e tinha-se em conta dc um grande favor o

poder-se assistir á exposição que annualmente fazia no dia de Santa RosaO motivo que levou Hosaura a fazer bonecas foi a extrema pobreza em quese achou depois da morte doseu marido, Roberto Ferrari, o qual despendeu Léo seu ultimo real com uma actriz de que se apaixonara, indo uma vez a Milão

u fei.a o papel de Leonor com a de sua mulher, sentio-se envergonhado<lo ha.,« tc,„,,_ »_„ la. conllccido (|M _. modas '>»ra b«m ,res8ms „, rompara5à0 Mm ffi Ja dama ic »tatar ,« » _„» m*. o comparai a algum ai ga„,e í tórtc 0 ,na, quiçá, ainda mais tosco e desengraeado •

O desgraçado Roberto, depois de haver esgotado seus últimos recursos becunianos e vendo-se desprezado nela aclriz „,„¦ [deveres de esposo e de ai en r «','

* ^ ^^ °$ *^i . «pai, cntitgou-sea um tao excess vo uso de bebidas.,ae em brcv, tem momUi de. mdo sco |i][io *

UeIl,em; "0b,'ra- 'M »'- ¦«**>

<l"c res.l™ esta aprendei ar "1

gens offereciáo* w^pies vanta-

Page 23: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

JORNAL DAS FAMÍLIAS. .__

Graças á sua infatigavel actividade e á perfeição de suas obras, pôde Ro-sátira sustentar-se e educar seu filho.

Havia já algum tempo que Rosaura notara ern Onofre urna tristeza profunda,da qual só parecia distralrl-o a exposição que sua mãi fazia no dia dc SantaRosa. N-esse dia examinava então cllc o vestuário das bonecas, sua elegância,c dizia suspirando : « Como tudo isto é bonito!!... » E acabada a exposiçãovoltava á sua melancolia habitual.

Na ultima.que fizera sua mãi, depois que completara seus 22 annos, haviauma boneca vestida dc seda azul, c ornada com brincos, collar, pulseiras eanneis, da qual não podia desprender os olhos. O desejo de poder sempreolhar para o objecto que o captivava levou-o a perguntar a sua mãi se essaboneca também seria vendida assim como as mais.

—- Sim, meu filho, lhe respondeu cila, esta já está promettida á rainhade Inglaterra, que me dá dez libras esterlinas por ella.

Ah! se eu tivesse essa somma ella não sahiria cPaqui, exclamou Onofremal sua mãi acabara de fallar.

Eo que farias, meu filho, se possuisses esse dinheiro?0 (pie faria? Mandaria as dez libras á rainha, para que me deixasse ficar

com a boneca.Rosaura achou tào pueril esse desejo que se poz a rir c não lhe res-

pondeu.Uni rapaz da vizinhança, coin quem Onofre era muito ligado, c a quem

elle confiara o segredo da affeiçào que consagrava ás bonecas, disse a Rosaura(pie evidentemente, se ella nào procurasse casar seu filho, elle se apaixonaria

por alguma tPaqucllas damas de panno que ella tão habilmente fazia.Rosaura assim prevenida tratou logo dc inspirar a seu filho o gosto pelo

estado conjugai, mas elle inalteravelmcnte lhe respondia :Nenhuma das nossas patrícias tem a elegância de vossas bonecas, e eu

nào me poderia ver ligado a uma mulher de saia grossa e andar pesado. Vósme fizestes conhecer o bello, é-rno pois impossível unir-me a um ente que nãoseja assim.

Em vão objeelou-llic sua mãi que entre ellas havião algumas muito gar*bosas e que sua prima Emilia era linda como um sorriso de Deos; elle foiinabalável.

A época em que se passou a scena que acabo de te traçar era próxima aodia de Santa Rosa, c portatlfo achava-se Rosaura bastante atarefada com os

preparativos necessários para esse grande dia, Deixo-a agora por um instante.)

para te contar um pequeno episódio que aconteceu no espaço que mediou

entre o dialogo de Onofre com sua mãi e o dia da exposição.

Page 24: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

184 JOItNAL DAS FAMÍLIAS.Chegou um dia ao lugar onde se passào os factos que te estou narrando o

grao-duquc da Toscana, com uma lilha joven, bella e graciosa, como sãoIodas as Italianas cm geral. Entre as pessoas que affluírào para assistir á en-trada cPesse grande personagem, achava-se o nosso amante das bonecas: oqual, vendo a lilha do dito duque apear-se do carro e dará mão a seu pai paraentrarem na casa que lhes era destinada, ficou maravilhado dc achar 11'essalinda creatura as graças que lauto o maravilhavào nas bonecas dc sua mài.

Voltou para casa ainda mais melancólico que do costume c intimamenteconvencido de que só a uma boneca devera dedicar o seu amor.

Chegou o dia da exposição, e cbenlre as bonecas de que ella se compunha,sobresahia uma, notável pela belleza de seu rosto, de seu vestuário c riquezade suas jóias, além dc ser de tamanho natural. Como é dc crer foi esla queattrahio as vistas do nosso Onofre, que cheio de interesse foi perguntar a suamãi se essa boneca tambem teria a sorte de ser vendida.. — Nào, meu lilho, lhe respondeu cila, esta é para ti que a mandei fazer,visto seres tão amante cPesses arremedos da natureza.

Foi cheio de inexprimivel júbilo, por tào inesperada dádiva, que Onofre,linda a exposição, vio collocar-se a sua boneca irurna sala reservada, ondeia todos os dias passar uma ou duas horas cm adoração diante do seu the-souro, ao qual nunca tocava com medo de amarrotar as rendas, ou tirar ocolorido das lisas faces. Fuma de suas contemplações senlio-se impellidopor uma força oceulta que o levou ao acto dc ajoelhar-se aos pés da adoradaboneca e confessar-lhe seu amor, como se viva fosse. Qual nào foi porém .suaadmiração ao ver que lhe respondia, dizendo-lhe que tambem partilhava esseamor.

Milagre! milagre! exclamou elle, a minha boneca falia-.Pôz-se de novo a contemplal-a, e depois, como ferido de uma idéa súbitaexclamou :

Nào podes ser boneca se fallas como nós!N'islo appareceu sua mãi, que estivera a espreita, e disse-lhe :Eutao, meu filho, queres casar com ella?

Sim, minha mài, lhe responde Onofre, mas dizei-nie a verdade, ellanao e boneca lPois não vês que é a tua prima Emilia, com quem queria que te easasses'-e que recusaste, nào querendo admittir que pudesse ler as graças, nem ves-tir-se com a elegância das minhas creaturas de panno''Pouco (empo depois do que acabo de narrar-te casava Onofre com Emiliae ainda hoje contmuào com o ollicio de sua prudente mài.

PAULI.XA 1'lllLADEÜ'IllA.

Page 25: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

ECONOMIA DOMESTICA

RECEITA PARA POLIR AS UNHAS E TORNAL-AS CÔR DE ROSA

Esfregão-se todos os dias, ao acabar de toucar-se, com uma esponja im-mergidaem uma mistura devermelhão e esmeril, e depois de bem enxugal-ashumedecem-se com um bocado dc oleo d'amcndoas amargas.

As unhas tem dous males que as perseguem. Um é a sequidáo que as fazestalar, outro é a fraqueza que as faz curvar. No primeiro caso basta applicar-lhes em cima ao deitar-se alguma substancia gordurosa, e no segundo faz-seuso da seguinte pommada :

POMMADA PÁIÍA A CONS.: KVA CAO DAS (MIASü

Tomai meia onça de oleo (Paroeira, unia oitava de sal, um bocado de colo-phonia, um bocado de pcdra-lmme c um bocado de cera virgem. Misturaitudo isto bem intimamente, e depois fazei uso d'cs(a pommada sempre quelordes vos deitar, que não tardareis em colher seus benéficos resultados.

.»»•>,* ) /vx

xvV J x

«

Page 26: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

POESIA

O MONARCHA E O POVO BRASILEIRO

T O P. O C CA SI A 0 D A Q C K S T AO AN C li O • 1! \\ A SM. I_ I II A

Ergueu-se a pátria briosaPela nação orgulhosaUltrajada com rancor;Guiada pela razãoRespondeu á imposiçãoDo estrangeiro impostor!

Escudada no direito0 mais forte, o mais perfeito,Ergueu a fronte, fallou!Um canto de liberdade,Uin grito de magestadeEm toda parte echoou!

Nação qu'é nobre, honrada!Qu'é vilmente insultada,

Page 27: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

JORNAL DAS FAMÍLIAS.

Cede á força, não se abate!Qú'em seus foros orgulhososNão conhece os poderososQue seus princi pios desate!

Gemeu a pátria offendida,Nunca infame em sua vida,Sempre nobre e sempre pura!Lançou ouro á vil paixão,Sentio nobre emulaçãoNos extremos da tortura!

187

Ao grito surdo e pesadoDo seu direito insultado,Levantou-se o povo inteiro!Homens da corte c choupanaSeguirão á voz soberanaDo monarcha brasileiro!

O povo, o rei, a nação,A gloria, a honra, a razào,Luzíráo com luz brilhante!Baqueou do imigo o insulto,O fallar altivo, estultoDa Inglaterra — gigante!

Brasileiros! a nossa pátria,A nossa terra de amores,O nosso solo natal,As nossas mattas tão bellas,'As nossas flores cheirosas,Nosso sol e nossas brizas,Nossos rios, nossos prados,Nossos principios eternos:Sorriem cheios de gloria,Pois que o povo brasileiro,O monarcha augusto e nobre,Uma idéa representão!Liberdade! Independência!

Page 28: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

18 JOHN AL DAS FAMÍLIAS

Povo c rei! as nossas leisSão astros bellos, acesos,Que brilháo no céo da pátria,N'essecéo tão puro e limpo,N'esse céo dc multicôres!Povo e rei! quando seus raiosNos bate na fronte em meio,A consciência se alegra,Entre flores perfumosas,No festim da independência!No sorrir da liberdade!

1805.

J. S. REIS MONTENEÜRO.

^

^v mil' "^ ítótti^^**. ">177''-'lj)^ ''^SiHH í? ( '* -**^^—tltSSfEBS^^— -"¦**— ^§wfcfcO^^\ \A T^Hinflv^-—-* -/

*"* />/> Of-j>l/A40fUl

Page 29: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

r--¦Jy ¦

_*•/-J^çyCV- /-»VYí >"VyV7....¦-.•-¦.

i ^^pppv-pnp--

7^--n i^cO-^-o......'"-^wàkà

¦ 7>VV ^ '-7.^ (^V^S^J> >' ^Vk,^ •, -/***3____í>»_*. ~kX• ,V -7- ^ ^ A A-wtó^rK-írC- ^_B_B_&iM>

fJ k^ •¦_-> -MIRINS ''¦*•* \%u fip

#fêlili^ 7 "# 7á' il 111 K. iMfl I^nv/jfo.vx skyvImíI^-^HYj^^V^kjv™ ¦- j v ii! i VAV <c jPSBbsr-lBB^ _á-^t_^í^^!S_a_M_l'm

J / '¦'»..-•

7 , 7 CM

JORNAL TN ni Ul

u unho de i8.65, 3oanno

Page 30: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

MODAS

DESCRIPÇÃO DO FIGURINO DE MODAS.

Primeiro vestuário. — Vestido de tafetá còr de malva com listrinbas pretas. Saialisa; corpinho chato, decolado c com mangas curtas: canelou de cassa por cima docorpinho; o canelou é de pregas ouças e enfeitado de entremeios bordados e forradoscom fita de tafetá còr de malva; fofos nas mangas. Cinto-cossolete de tafetá côr demalva, guarnecido com estreita guipure preta.

'

Segundo vestuário. —Vestido de Unos, côr havana, com paletózinho da mesma fa-zenda. A parte inferior da saia e do paletó recortada em largas ondulações guar-necidas com um franzido dc íita verde; a cava, a parte inferior das mangas c os bolsosdo paletó enfeitados com o mesmo franzido. Collarinho c punhos de panno de linho en-gommado. Chapéo de liló branco bordado de contas brancas, enfeitado com folhagem efilas verdes.

Vestiário de menina. — Vestido de popelina. Corpinho-casaquinha. Bordado comsoutache de seda preta ou branca com pequena franja cm baixo dos recortes, á roda dacasaquinha e dos bolsos. Almilha franzida de nanzoak,'com mangas compridas.

TRABALHOS

(

GORRO PARA HOMEM, N° 1.

Este gorro, de delicadíssimo desenho, faz-se de panno preto. Todas as partes som-breadas do nosso desenho são applicações de velludo épinglé roxo. É preciso copiar o de-senho com papel transparente, reproduzir esta cópia em um pedaço de carta que se re

Page 31: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

s^-.T-;-. ; '¦¦*ç»r^.-^.'!t.:.-..>?'sy.;".- ••'• " " . "" ¦••.-.:¦ ¦•.-.-,- .¦;• ¦ -- ¦ • --....-,

V1

. V'.:

y'<: '¦¦-.

190 JORNAL DAS FAMÍLIAS.

• corta, para. servir de molde. Por este molde cortão-se os pedaços dc velludo ápinglé.

Estando todos promptos copía-se o desenho todo; é preciso quairo desenhos como o

nosso modelo para a tira de panno. Pica-sc com uma agulha todo o desenho copiado;

põe-se sobre o panno, passa-se depois sobre todos os contornos picados unia bonequinha

feita com ourelas de panno bem apertadas, apolvilhada com pó branco. Tira-se o papele torna-se a passar os contornos leves qne sc vê sobre o panno com lápis branco, ou

pincel molhado em tinta branca. Nos lugares para isso marcados colla-sc com gommaarábia dissolvida em agua as applicações de velludo épinglê; deixão-se bem seccar, de-

pois circumdão-se com um cordãozinho de ouro ou de seda preta. Cose-se este cordão-

zinho, como a soutache, com retroz fino. As linhas direitas c cruzadas que sc ve sobreas borlas do nosso desenho fazem-se com o mesmo cordãozinho.

0 resto todo é de soutache de seda roxa; as contas são pretas. Borda-se da mesma

maneira o redondo cujo modelo também damos. Acabado o trabalho, acolchoa-se leve-

mente a tira e o redondo; forrão-se com tafetá roxo e prega-se a tira á roda do redondofranzindo um pouco c mui igualmente todo cm redor. Nomeio do redondo prega se

uma comprida borla dc seda roxa misturada de preto.

ALMOFADINHA PARA T01LETTE.

Este desenho para almofadinha pode fazer-se de diversos modos: quer cm ponto derelevo sobre cassa clara que se arma sobre um transparente de tafetá côr de rosa ouazul, com uma guarniçâo dc fofos de fita da mesma côr todo ao redor; quer sobre ca-chemira encarnada, com applicaçâo de folhas dc parreira fa velludo preto, os coulor-nos c as nervuras de cordãozinho de ouro, bem como as hastes e os ellos; as llores deliz de velludo branco e cordãozinho de ouro, c para cercadura uni rico cordão de sedaencarnado e ouro. Póde-se substituir com vantagem a flor de liz do meio por iniciaesentrelaçadas.

o

¦ *

FLORES DE PAPEL. PEONIA, 3N° 9,4.

Das ílores de ornato feitas eom papel c a peonia unia das que lição mais bonitas,Fazem-se muitas brancas, côr de rosa e encarnadas, para adornar salas de espera c sa-loes de baile. '

Eis como se faz a peonia :Cortâo-se 12 redondos, dos quaes o nü 1 representa a quarta parte; 10 servirão pára

a flor, e 2 para o botão aberto; franze-se com a pinça os 4 encaixes mais largos, e es-tampão-se com uma bola todos os outros. Toma-se depois um centro de peonia, cobre-se com massa, c eníião-se, desencontrando-os, os 10 redondos assim preparados. Cortão-sc 2 redondos ii° 2 (vide no verso da estampa), sempre quatro vezes maiores (pie omodelo; estampáo-se as pontas com a bola e eníião-se sob os outros, depois 5 grandesfolhas reforçadas por trás com um arame mn tanto forte.

Para o botão aberto faz-se como para a flor; divide-se porém em quatro o redondon° 2, estampa-se bem fundo e colla-sc á roda do botão; estampao-se também treslolhas

verdes, que colla-se igualmente, voltando-as para dentro.Para armar o ramo, faz-se dominar um pouco o botão. Para um ramo ordinário é

^ preciso uma flor, um botão aberto e um botão de massa; é necessária muita folhagemtle vários tamanhos.

MMAGÈRE, A° 9 1)0 VERSO. •A

A ménagère está representada- aberta; fechando-a ver-se-ba que a parte acabadaem ponta volta sobre a que está ouça.

Page 32: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

3.° Mo.

ixi

IiSS!indVBBS_ffllBSH~pnunnHi^SSiRR&fiwm&

.(«...<(«,

.««(((. is«.ishRSS5*5 _^*^ s^S __. ic

annb

HafraiiÉA-aatàvfó

*.»*

mu» \ » <hbbtmmmmmmymmm\

... . ___wilMni.ila«^s;^?4«^::_i::ssSH.»..))1. ss

i-iSIS;' ;:3S:3íSS;.a;'I5s;;!

RMÍi

ft-Mtòiit?.

¦rs&m

IS-il Sfcff ..**_

|a«aii*i*f •¦•'.«•«¦•¦¦¦••nlKii.fiiii.ir (lauilllianaj

|ili««tfiki«a*......m.*m.mmt 12*222It-M-ll

lisJS.• ~5r_f •?> .»

f ¦>..__¦ •»•««••¦¦••¦••••llIHIMIIItM¦••••••••«••'•¦•11*1•¦•••"

¦lt •¦••oataia,•HIIIM

liia*«t«aaaa»?Kliaaaaaaaaaal¦••Baaaaaaaaa.ÍHgU

ss;;

SiU

_~«Hti

¦n:::l15P

Iüi

V

?imm»«n'"i **a

iiM. Afoi/K ei Falcontr, Paris.

Page 33: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

5! Anno. •JORNAL DAS TAMlLIAS.. Junho à ffi!).

_l_ 12 Í34

Wsmw ¦HSSiSSSSMiw__T_»^>7)lB.15iw ¦ ¦ mm¦¦anflHmBBH

IWIKJI ¦Mil¦Mi

^:_i;SKK.S_'.ÍKjSS_SE_»S_SI!

BHj_:_if.iif.fiNSBE'tfi%iíf'ii___r^i

HMB_*._._.

_t.«_xNí__iSS;'«_.^

-X1**-.! r_BP_k*-" V***-.-! WÀfÀ7mwâmtmH-l-,---.^--. V------Í __L**/_|M_|

BBMH!I!_I.SB£SP^^8BBHMBBflBBHB

Milit ¦...

t-^-L _^_5___l _________¦___> \ *r _»_Z^L^__\ 9_____r^v__P

__tiinnB_.¦tf* »$£ Jfflrwfflft'-àüfií f_f/jjilk

S.SS»'Sf__XV.. ttlf*J|'OtiêkáA

BBs-isissan^s

«»:«ii;_!M»;a»»

li-MUfaM

BHIBMflBB-_-_-. '// ' f-m .A**» *-----l _-P-.«V -k*-*--. ------ •_» •-_->-• ¦ ¦_¦--, .... *- - - -ma-B-i--. -------- --aa----. • -> * '#-.-_•• ______ ________ V _«_. - * -_-¦-¦ _______ f _________II

V_B__I

¦¦SM

flHBB___L___.HBHflBNBr"

íft.SzmmmmmMmmmHLÉ»! X'. ""' z_"Z4 4-_;.s'.'_i._i..^lls^i^s__^riSI!5.I

BS_ttáBSBi__l*S

pn •;* ^___________j P>- - -^J mMWa BH *

lüHSi¦.«_-_tWfBl!9S;8raSg_ra_MKSp IÜ3S

rVATOMKB

BI|3lliIMITI

_»i¦

m

MglY rfil

k>3BB__r™

i r-_-_-iB<fli1 m

.¦.1 ly_a.:H^^//I*.¦ **¦X**-**

m.

¦. .-.¦¦ _••,i._>..._.Z..I.II,

,l«, a.,,.»<<>>..*.,......... .l.i.>...,«I.ft.t.¦•,1,1p..,..,

,«• «• _¦_£_//>.......'ff*/*.i

«,,.¦¦«¦.,,*.,.¦.IIMIII.....a.»¦•*...•-t,,il,__

,*.»•• 1,10*1

¦ >...,..¦!I.a.i.,1.I........|. ._.•••_»

ii*>fll"

!íín::i>««.«>.I..a..<.|,._->..M

_»i«ii*,;¦••«••••

BH

ííl_t_i

Sm ........

' ^-MmATS-TT-fsA *»^m_Yj/í___\

I¦ »-- •.•¦••_......>>iíl

niiiiizikãã,,....I...&^Jt,,..%B|,Z_fk*

ili«_¦_¦___01Hͧi!Í£Sl_____W_HS!

(i.fi.turtllltlkl.,.....nié- • ¦•..¦..

- » ¦ o • -• >

sI__:_.l«____ip^^«llil¦ o__ü¦ p

e

H___-_B_g>HBB!.H<-_9l_BBBtV_---__M S2fS_?-S__?S__f'__!__H!__n_a_«Bni—_..-_.———fungai

'¦•tiiiMir,,_1_IIBII«|II»«(r« *•¦¦¦¦•¦¦.«¦%_i*c__tiai««i[•¦¦.••-«•>¦¦¦T»¦¦¦¦•¦..,¦¦

--l ______* ^B iB.

iiiimtnf• -r« a ¦*->. nt-« M

..-__•*.•,._¦........w«_ ¦....««,«.>¦wlllll» ¦ÜBHtHi ttti-itii

il-Üfetí

¦ ¦¦#¦¦1 |l|¦sk # .»# .?.*_.. *_*m

¦•¦••¦•lllllllz... Ml_t

lll, •¦.,..*(¦«(¦Itl.l-I

¦¦-.«¦••,¦••MllltldiaI

:y-_»^» »r////^'B_B ¦_-.'.va.\>\^.,i

*_?m_|---.'__i^_i_iir;f^BB

a^H ^T- '?** ^VB*_r_r~.»B

.UIIUIIMI*¦•¦_-•¦¦••¦•..-¦¦¦-•.•¦¦D¦ ¦..-t-naia*.!¦¦¦«.. •..-¦-t,6E__l-«»«-»"

*^*»^^___ —'^^ ^^S ¦'¦**-'•*''"-.

9 IKIͦ

!5í»MS!¦¦

____?-:.".... •."•••!r:r:::::::__Ba*'«!!:2t:»HB»«_«^BiM_

.___¦

i5?::::MI^-,':

•*"_.... _« JKSB«K_Bri

SB-BBgllM^S-SI™'

.•*=BM.:__Bí*^'*"^r'::=?;SiiSiS'_i.M:

lIM-figlIii^IifeffiiiÉftHS^^siliSiiliillÉlfeiiaililIlSl^PK_"ÉHM^'!I1S1^

lSl:BlIIÍÍllIIIi_l!iÍlÍ-__l^Bfl__gin»rj:;HiU^^

^llS_lplÍi___ISiii_~-inp.sH-_n___BB--!*;r:.:8vJl'-8 "^sSB|||PiilliHÍ!=i!ii|||Íg^i!!iiíPMNbBSF"10"^SBB^MgjpjiijjHijJ

!í»Í1^»Í__-IÍ•asBO-n

_?-_.b_^bS^_1_IíS__íSSH_^B^H

S-SSiSÈíÉlIllllSI¦5MH_fBS|ifIiÍlli!jBMBaBBF"""""¦¦BOIBíJgffÊUMLWmMÈMSÈÊÍ.

•BI¦¦asor»-i-HB-i

¦&__K-^'_â___il_Í;PÍÉ___l^^:ÍPIliiÉiiipiiii_____9W*P¦________.>i'-*BBi5'*JPI IPIÍI IK4I IjK"I l__?S II__.. mmm_\

ISSíii BMuaiiiiiS!! BH___.ss^

ZiR- Aloiíje ei- Folmtr, Paris.

Page 34: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

JORNAL DAS FAMÍLIASJunho de 1865. r«*&&£K).

LU

íxOD-JCD>-.—I

O

Cx_o>N

CD

gfOc/3CP

*too

o>

SAO

O)

teCO

CfDl

|

<~3»-J

P-CP

oCOCD53

IoCPtoiD

O<!CDriCO

; :' •' y á ; Aluiu,

u ii I^HTTjf ij lí -JT mjT^BJ t-^-ii* li _*il '[IfiW lil H !í 11 * l^BJ .tMmi-*-lÍA 11 11 II llUBBi li I — ~í *~ -— t**- 4™ í— -~ ¦¦ t-** tj ": SCSr zz sj « _z! — _r_i ~ « ~ n. ~ ~ ™ .m n. 22 ~' ^ ~: tt" l tt «1 z_ji .zj ~ — ir~ ™ -~ — " ™ ¦¦ ¦*¦ —' — — — — .-!•».,_..._.._ _,., ., 1 _, „ .._, _ __. .»_, __, ii jt ]|| —¦•»»_«, — -¦ — — -¦ — — — ^--» — — — ~^~~~ gjj í^^^ — ^^j"'1*"-

PARA 0 RAMALHETE.s Verde claro, b Verde mais es curo. s Verde mais escuro, ga Verde muito escuro, a Fundo azul. I Côr de rosa.( retroz). b Cot de Granada.Uetroz),

@ Branco. 0 Pardo erverimhaio. 1 Tardo mais escuro, m Retroz encarnado cereja, ctaro. _d d° mais escuro. ¦ d! mais escuro.¦ d9, muito escuro.

0ICDj

O

8>

CPOPí ¦

o

O

0>

É2p> ,bo

wi—«

TI>

2-1 O

o 3o>

Sr °

>£2ct>,

0^— •co<n>CO

oté>

O

ÉS.00a>CO

1O

rr8

1coO,

Page 35: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

JORNAL DAS FAMÍLIAS. 191

Faz-se com qualquer fazenda : riscadilho com soutache de lã encarnada; tafetá côrde rosa com soutacbe de seda preta; cachemira azul com soutache de seda branca. Podeficar linda de mil modos, c sempre mui útil para guardar linha, rclroz, tesoura, agu-lhas e crochets. Acolchoa-sc levemente, c forra-se delineando no forro divisões paraos diversos objectos que se quer guardar.

«

EXPLICAÇÃO DA ESTAMPA DE BORDADOS.

N° 1. —Desenho para gorro. (Vide os trabalhos.)Nos 2 c o. — Collarinho e punhos para menina. Faz-se o bordado sobre fazenda du-

pia por cima de uma bainha pespontada. 0 desenho maior é de soutache dc algodãobranco, mui lino; o resto em ponto russo de retroz preto. 0 punho alto com duas or-deus de casas bastante largo para passar a mão; prega-se na extremidade de uniamanga estreita c de cotovello.

N° \. — A. M. Iniciaes entrelaçadas. Ponto à'armes e ponlo de relevo.Nüs 5 c 6. — C. M. Iniciaes entrelaçadas de dous modos differentes. Ponto de re-

levo.N° 7. — Leontina. Nome para canto de lenço. Ponto de relevo e ponto ü armes.IN0 8. — F. C. D. Iniciaes entrelaçadas. Cordãozinho.N° 9 — A. B. Iniciaes ornadas. Ponto de relevo e ponto dc recorte.N° 10. — Desenho com canto de guardaiiapo para chá. Recorte ponto de rose; hor-

dado ponto dc relevo.N° II. — D dobrado e A. Iniciaes entrelaçadas. Ponto de relevo eponto cl-armes.N° 12. — Tira recortada c bordado ponto de relevo.NÜS lo e 14. — Puiihò e collarinho direito. Ponto de relevo fino e ponto & armes.N° 15. — P. M. Iniciaes gothicas. Ponto de relevo.N° IG. — Celestina. Nome para canto dc lenço. Duplo eordãozinho; sobre o mais

grosso faz-se um ponto de pesponto com retroz encarnado ou preto.N:° 17. —* ll. M. Iniciaes entrelaçadas com uma coroa de visconde por cima. Ponto

Aurmes e ponto dc relevo.Nu 18. — Almofadinha. (Vide os trabalhos.)N"s 19 e 20. — Touca pára criança. Ponto de recorte e ilhós.Nü 21. — Julieta. Nome para canto de lenço. Recorte ponto de rose.N° 22. — Nadina. Nome para canto de lenço. Ponto de relevo.N° 2T). —L. D. Iniciaes ornadas. Ponto de relevo.N" 24. —Flor de papel,pconia. (Vide os trabalhos.)N" 25. — Escudo para eáiito de lenço com as iniciaes A. V. Cordãozinho, ponto de

relevo e ponto íVannes.N° 20. — N. C. Iniciaes gothicas. Ponto de relevo.IV' 27. — Tira recortada.N° 28. — ili. A. Iniciaes entrelaçadas. Ponto de relevo c ponto & armes.Nu 29. - Quarta parte de um lenço. Reira recortada, bordado ponto russo.

EXPLICAÇÃO DA ESTAMPA DE MOLDES.

Molde dc casaquinha com collete e abas para menina dc 7 annos.N° J. — Collete,N° 2. — Frente da casaquinha.N' 5. — Metade das costas.N° 4:. — Pequeno lado.N° 5. —Manga.

Page 36: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

192 JORNAL DAS FAMILIAS.Nus 6 e 7. — Moldes das pétalas da pconia. (Vide os trabalhos.)Nü 8. —¦ Alphabeto para roupa cie mesa c lençóes. Ponto de relevo.N° 9. —Ménagère. (Vide os trabalhos.) *

t

ESTAMPA DE FILET BORDADO.

Damos hoje ás nossas assignantes seis quadrados de varios desenhos, para bordarsobre filet em imitação de giiipure antiga. Ahi tornarão a achar os diversos pontos deconcerto-pamio-de-liiiho (reprise-toile), de recorte e de lance, que anteriormente ex-plicámos.

Lembrar-lhes-liemos que o filet deve ser engommado, depois alinhavado sobrepanno dc linho verde, envernizado, antes de levar o bordado. Um quadrozinho dc fiode arame, coberto de pantiinho verde, é muito commodo para armar um quadrado defilet. Cumpre ter cuidado de principiar sempre pelas partes mais carregadas, afim denao fazer pregas. Para o ponto de concerto é preciso que os fios passem mui regular-mente uns sob os outros, e que encliao perfeitamente cada quadrado do filet sem aper-tarem-se nem confundirem-se.

ESTAMPA DE TAPEÇARIA.E este desenho para cobrir um moclio de piano. Pode servir tambem para almofada

de sofá, tamborete para descansar os pés, meio de tapete para mesa, etc.A tira que acompanha o moclio póde-se fazer sobre talagarsa ordinária com as coresindicadas na lista; fica tambem mui lindo sobre talagarsa brasileira, e por conseguintesem fundo, com os quadrados pretos dc retroz preto, as cruzes de retroz encarnado,as linhas de retroz branco e os pontos de cordãozinho de ouro.

DESCRIPÇÃO DA ESTAMPA DE CIIAPÉOS.NM. - Chapéo de filo prelo bordado com contas de aço. Uma charpa dc filo icuálesla franzida no alto do chapéo, forma atrás um grosso bouíllonné, e cabe sobre o

pescoço com pontas guarnecidas de renda. Um alamar de aço lavrado está posto sobreum lranzuode filo acima da fronte e outro igual acima do bouíllonné; um poucoabaixo, do lado esquerdo, está collocada uma linda rosa musgosa com botões e tolha-gem, e pequena mosca azul. Ataduras dc tafetá preto.N» 2. -Chapéode escumijha còr de rosa franzida atrás; copa de escumilha còr dcos com ramalhetede rosas bravas brancas cahindo em ramos compridos no pescoçoÉÈíit rSCUmfa

C01'de r°Sa- No lntei'ÍOr' b0UÜl0mé dc «"» tór de rosa"eramalhete de rosas bravas.

rl,n" 5''"~

?iaPéode [franco bouillonné com compridos rastos de pequenas folhas1 p reira formando dupla grinalda no alto do chapéo; tufo (touffe) da mesmas fo!líks

™r' ' Ç° fl10 bmiC° C0M 'gUarnÍÇã0 dc fòfoscstreiLa, cou, abas

e d!ut í7doCEp!!! eSCUmÍlha VeidC C°m gl'°SS0 P0Uff ih Vellud° Piet0 "° iltó-

¦•An.*. - TV,. PORTÜC. DE S.MÂC IUÇON E COMP., ,;UA D^RUKTl., 1.

Page 37: -V. CONFISSÕES DE UMA VIUVA MOÇA - memoria.bn.brmemoria.bn.br/pdf/339776/per339776_1865_00006.pdf · mal, não já porque eu o odiasse, mas porque de todos era elle o único a quem

^yy- i

«4

n

u D DAS FAMILunho deiübb.ouanno20