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Relação entre Especialização Agrícola e Desenvolvimento Humano nos Municípios da Amazônia Brasileira
Relationship between Agricultural Specialization and Human Development in the
Municipalities of the Brazilian Amazon
Resumo
O objetivo deste artigo foi verificar a especialização agropecuária dos municípios da
Amazônia e comparar com o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM). Para
cumprir esse objetivo foi feita a análise fatorial para extração dos escores fatoriais de todos
os municípios nas principais atividades agropecuárias da Amazônia e em seguida a
classificação dos municípios conforme seu nível e grau de especialização nestas
atividades. A partir da análise dos resultados, foi possível verificar que há relação,
principalmente nas áreas onde o agronegócio é mais avançado, entre especialização
municipal na produção agrícola com desenvolvimento humano, porém, outras atividades
como gado e mandioca não possuem correlação com o desenvolvimento. A análise ainda
inferiu que as atividades agropecuárias se concentram na área de expansão agropecuária
da Amazônia.
Palavras-chave: desenvolvimento, agronegócios, Amazônia, análise fatorial;
Abstract
This article aimed to identify the agricultural specialization of the Amazon’s municipalities
and compare with the Municipal Human Development Index (IDHM). To accomplish this
goal, a factorial analysis was calculated to extract the factor scores for main agricultural
activities in the Amazon from all municipalities, then was possible to classify the
municipalities according to their level and degree of specialization in these activities. From
the analysis of the results, was possible to identify that there is a relationship – especially in
areas where agribusiness is more advanced – among municipal specialization in
agricultural production with human development, however, other activities such as livestock
and cassava have no correlation with development. The analysis also inferred that
agricultural activities are concentrated in the agricultural expansion area of the Amazon.
Keywords: development, agribusiness, Amazon, factorial analysis.
JEL: C38, Q10, O13
I. INTRODUÇÃO
A importância do setor agrícola é notória tanto no fornecimento de alimentos quanto
como insumos industriais. A definição das produções tem a ver com as capacidades de
cada território, fatores como o clima, o solo e a área para expansão, bem como a
existência de infraestrutura logística, influenciam na trajetória produtiva de uma região.
Somado a isso, fatores como as vantagens comparativas e os ganhos de eficiência tendem
a induzir uma região a se especializar numa atividade. Historicamente, o Brasil tem grande
peso nas atividades agrícolas, e desde os 1970, a Amazônia brasileira tem tido fortes
incentivos para participar do comercio de commodities, e algumas áreas amazônicas tem
se especializado em atividades rurais (CLEARY, 1993; JEPSON, 2006).
A Amazônia Legal brasileira é uma extensa área que cobre mais de 5 milhões de
hectares ao longo de nove estados (Acre, Amazonas, Amapá, Roraima, Pará, Rondônia,
Mato Grosso e parte do Maranhão). A importância desta região se reflete tanto na
diversidade da fauna e flora nas áreas preservadas (SOARES-FILHO et al., 2010), como
também na sua importância econômica, onde se destaca a atividade agropecuária, a
mineração e as grandes obras de infraestrutura para geração de energia (FEARNSIDE,
2006).
Tomando a produção agropecuária, destaca-se alguns estados em posição
estratégica em nível nacional devido a elevada produção existente. Mato Grosso é o maior
produtor nacional de soja, principal produto agropecuário nas exportações brasileiras, com
cerca de 28 milhões de toneladas na safra 2014/2015 (29,1% da produção total nacional)
(CONAB, 2016). Mato Grosso e Pará ainda detém juntos um grande rebanho bovino
(IBGE, 2016).
Tais commodities, aliadas a outras atividades desempenhadas na Amazônia (como
a produção de dendê e a extração vegetal, madeireira e não madeireira) refletem a
capacidade de exploração econômica da região, mas ao mesmo tempo em que elas se
expandem, levanta-se outras questões além da viabilidade econômica, como a questão
ambiental (FEARNSIDE, 2001; MARGULIS, 2003). A capacidade limitada de resiliência da
floresta Amazônica (HIROTA et al., 2011) traz à tona a responsabilidade do Brasil em
relação ao manejo adequado das áreas preservadas, criando uma contradição entre o
desenvolvimento impulsionado pelo agronegócio e a necessidade de preservação para o
desenvolvimento sustentável.
Este conflito entre desenvolvimento econômico, humano e ambiental na Amazônia
leva a diversas possibilidades de ocupação do território. Com a expansão das atividades
espera-se também o progresso social e econômico, mas questiona-se como está
atualmente distribuída a produção agrícola na Amazônia? Esta produção está relacionada
com o grau de desenvolvimento dos municípios?
O objetivo deste artigo foi identificar a especialização produtiva dos municípios da
Amazônia Brasileira no século XXI, analisando padrões de crescimento e mudança de
trajetórias produtivas e o desenvolvimento municipal, descrito pelo Índice de
Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM). A hipótese levantada é de que as atividades
agropecuárias das principais commodities apresentem uma especialização espacial no
território amazônico, favorecendo o desenvolvimento dos municípios.
2. ESPECIALIZAÇÃO E TRAJETÓRIA AGRÍCOLA DA AMAZÔNIA
A especialização produtiva remete a dedicação de uma região a uma atividade
econômica. Uma localidade tende a ser especializada em função de diversos fatores como
disponibilidade de recursos produtivos, tais como recursos naturais (terra e madeira),
trabalhadores bem formados e com experiência, ou disponibilidade logística como a
existência de portos e estradas. Os estudos sobre especialização econômica é um assunto
presente na origem dos estudos econômicos, exemplo disso é que Smith e Ricardo já
abordavam a temática junto às vantagens comparativas e divisão do trabalho.
Naturalmente há resultados contraditórios na especialização de uma região. Entre
as vantagens é que a unidade econômica pode dedicar-se a uma única atividade e elevar o
nível de atividade produtiva, tanto em quantidade quanto em qualidade, o que permite
produção em escala e redução de custos, isto é, obter ganhos de eficiência (CHAVAS,
2008; DIMITRI; EFFLAND; CONKLIN, 2005; KAULICH, 2012) Por outro lado, existem
desvantagens como ficar preso numa única atividade, pois, o território especializado
exposto às intempéries dos ciclos econômicos que afetem a atividade (CHAVAS, 2008;
KAULICH, 2012; LAGAKOS; WAUGH, 2013).
No início do século XXI a Amazônia Legal está estabelecida como uma grande
produtora de commodities agrícolas. Esta posição foi construída com a política de
integração da região ao território nacional que foi organizada pelo governo federal na
segunda metade do século passado que visava expandir o potencial produtivo, aumentar a
presença do Estado e reduzir alguns dos problemas socioeconômicos vivenciados em
outras regiões do país.
A trajetória socioeconômica existente na região amazônica foi organizada por volta
dos anos 1960, o contexto político e econômico que vivenciado no país era de uma
crescente sociedade urbana e industrial, naturalmente esse contingente de pessoas
haveria de ser alimentado e com áreas existentes ao norte dos centros mais dinâmicos o
movimento de expansão agrícola para essa região foi uma questão de estabelecimento de
estratégia.
Antes desse processo, a economia amazônica esteve bastante ligada ao
extrativismo e a propriedade comum, na primeira metade do século passado menos de 2%
das terras estava ocupada com lavouras e só metade delas possuía título de propriedade
(LOUREIRO E PINTO, 2005). Para mudar a trajetória da Amazônia o governo central teria
de implantar uma série de ações com o objetivo de interferir na estrutura econômica frugal
resistente por mais de quatro séculos.
A estratégia de desenvolvimento colocada em prática decorreria de três
justificativas principais: política, social e econômica. O âmbito político se fundamentou na
segurança nacional, cujas ações foram pensadas para fortalecer a presença de um
contingente brasileiro numa área com pouca densidade demográfica (MELLO, 2006).
Interligada às questões da proteção das fronteiras nacionais, está à tentativa de solucionar
os conflitos fundiários em outras regiões do país com a transferência de excedentes
populacionais para a Amazônia (MELLO, 2006). A questão econômica motiva as decisões
anteriores, uma vez que justifica a entrada de capital e a migração de pessoas para o norte
do Brasil.
Naturalmente, a quantidade de riquezas naturais como madeira e terras em
abundância seriam fundamentais no processo de integração da Amazônia à economia
nacional e mundial. Na perspectiva de incorporar esses potenciais elementos produtivos da
região ao sistema econômico brasileiro e internacional, o governo nacional criou condições
para que uma onda migratória de pessoas e capital se instalasse na região, sendo erigidos
condicionantes como o acesso à terra e a disponibilidade de recursos financeiros
consorciados a uma logística de escoamento produtivo, além da mão de obra que seria
deslocada para a nova fronteira econômica.
Projetos madeireiros, agropecuários, agroindustriais e energético-minerais seriam
aliados à criação de redes físicas viárias, energéticas e de comunicação num esforço para
integrar o território amazônico à economia nacional (FEARNSIDE, 2005; MELLO, 2006;
NEPSTAD et al., 2002). Entre os anos de 1960 e 1970, conglomerados econômicos
nacionais e estrangeiros adentraram na região em razão do oferecimento de inúmeras
vantagens fiscais e creditícias e do baixo preço da terra. Foram estabelecidos mecanismos
financeiros de desenvolvimento atuariam na Amazônia por meio de facilidades de obtenção
de crédito e incentivos fiscais.
As políticas de desenvolvimento atraíram especialmente atividades que requerem
grandes quantidades de terra, destinam-se à exploração de produtos primários ou
semielaborados, como a extração madeireira e as atividades agropecuárias. Esse
movimento teve em conta as pressões demográficas provenientes de outras regiões do
país somadas aos incentivos agropecuários fundamentados em baixos preços das terras,
suaves taxas de juros, investimentos e subsídios governamentais para a agricultura
(FEARNSIDE, 2005; KIRBY et al., 2006).
Este intenso processo de ocupação econômica promovida na Amazônia permitiu o
desenvolvimento das principais cadeias produtivas do agronegócio brasileiro na região. Em
2010 a Amazônia detinha 36,95% do rebanho bovino nacional, e 31,0% da área plantada
de soja no Brasil, sendo o Mato Grosso o estado líder (tanto na Amazônia como no Brasil)
em ambas as atividades. Os dados destas duas principais cadeias produtivas estão na
Tabela 1.
Tabela 1: Evolução da produção de soja e criação de gado no Brasil, Amazônia Legal,
Mato Grosso, Pará e Rondônia – 2000 e 2010.
Região
Soja (ha plantados)
Gado (cabeças)
2000 2010 2000 2010
Brasil 13.693.6
77
23.339.0
94
169.875.5
24
209.541.1
09
Amazônia Legal
3.157.95
7
7.235.94
6
47.224.17
0
77.434.35
2
Mato Grosso
2.906.64
8
6.227.04
4
18.924.53
2
28.757.43
8
Pará2.225 85.450
10.271.40
9
17.633.33
9
Rondônia
11.800 122.743 5.664.32011.842.07
3
Fonte: IBGE (2016).
O desafio desse trabalho é verificar se há municípios amazônicos especialistas em
atividades agropecuárias e relacionar tal resultado com a melhoria da qualidade de vida,
aqui explicitada pelo IDHM, a seção seguir demonstra o delineamento para testar a
hipótese de que há relação entre especialização e desenvolvimento.
3. METODOLOGIA
Para este trabalho, foram considerados todos os 771 municípios pertencentes a
Amazônia Legal brasileira, dos sete estados da região Norte, do Mato Grosso e parte do
Maranhão. Os dados utilizados para a determinação da especialização agropecuária e
extrativistas foram obtidos junto ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE,
2015). Foi selecionado um total de 13 variáveis, sendo elas: área total de soja (Sj¿); área
total de arroz (Ar¿); área total cana (Ca¿); área total milho (Mi¿); área total de abacaxi (Ab¿);
área total de café (Cf ¿); área total de dendê (Dd¿); área total de cacau (Cc¿); área total das
culturas permanentes – (excluindo café, dendê e cacau) – (Cp¿); área total de mandioca (
Md¿); extração de madeireira – soma de produção de lenha e de madeira em tora – (Em¿);
extração não madeireira – soma da produção de açaí e de castanha-do-pará – (Enm¿) e;
total de cabeças de bovinos (Bov¿). Foi selecionado os valores para as variáveis no ano de
2010. Em seguida os dados foram transformados em participação do município no total da
Amazônia. Os dados do índice de desenvolvimento humano dos municípios (IDHM) foram
obtidos pelo levantamento do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
(PNUD, 2016).
Em seguida, foi realizada análise fatorial para todos os municípios e variáveis para
cada ano. A análise foi confirmatória, selecionando que o número de fatores fosse igual ao
número de variáveis selecionadas. Após a rotação varimax, foi considerado as cargas
fatoriais para classificar cada variável em cada fator extraído, podendo neste momento
haver fatores que contenha mais de uma variável.
Os escores fatoriais para cada variável foram selecionados para determinar a
especialização de cada município. Para escores com relação negativa com o fator, foi
determinado que o município não possui nenhum grau de especialização. Para os demais,
foi obtido o percentual de especialização do município para o cada fator, sendo este uma
relação entre o escore do município a o valor do maio escore (Equação 1).
ESPif=Escore fatorial itf
Maior Escore fatorial tf(1)
ESPif = Especialização do município i no fator f.
Em seguida, foi realizado três classificações técnicas da especialização produtiva. A
especialização total do município (ESPT i) é a soma da especialização do município para
todos os fatores obtidos (Tabela 2). Como segunda classificação, se buscou verificar em
quantas atividades cada município é especialista – nível de especialização – (NESPi), com
a condição do ESPT i ser classificado como especializado ou muito especializado (Tabela
3).
Tabela 2: Classificação da Especialização Total (ESPT i ¿dos municípios da Amazônia.
Especialização total do município
ESPT i Classificação
0,0 ─┤0,3 Pouco especializado
0,3 ─┤1,0 Especializado
> 1,0 Muito especializado
Fonte: Elaborado pelos autores.
Tabela 3: Classificação do Nível de Especialização (NESPi ¿ dos municípios da Amazônia.
NESPi Condição
Simples
1 atividade contribui com mais de 70%
para a classificação da ESPT i,do
município e nenhuma das demais chegue
a 20%.
Duplo
2 atividades contribuem com mais de 70%
para a classificação da ESPT i,do
município – sendo que nenhuma destas
contribua com menos que 20%.
Múltiplo
3 ou mais atividades contribuem com mais
de 70% para a classificação da ESPT i,do
município – sendo que nenhuma destas
contribua com menos que 20%.
Fonte: Elaborado pelos autores.
Por fim, a terceira especialização se refere aqueles municípios com maior
participação das principais cadeias produtivas do agronegócio na Amazônia (soja e milho,
gado, café, cana e dendê), o milho ficou agregado ao fator da soja. Este último grupo não
apresenta todos os municípios produtores das commodities mencionadas, apenas aqueles
que, quando comparados aos demais municípios da Amazônia, apresentam grande
especialização na produção destes produtos agrícolas.
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Através da matriz de componentes rotacionada foi possível identificar a presença de
doze fatores, apenas as variáveis que representaram a produção soja e milho
permaneceram em um único fator. Todas as demais variáveis mantiveram-se separadas
em um fator próprio.
Como abordado, a intenção do estudo foi analisar qual a especialização produtiva
agropecuária dos municípios na Amazônia brasileira. Assim, a comunalidade, que seria
ponto essencial para seleção das variáveis, foi desconsiderada neste estudo pois o objetivo
não é preservar as variáveis para classificar os municípios através dos escores fatoriais
para cada produto agropecuário.
Com um total de 12 fatores, sendo apenas um composto por duas variáveis (soja e
milho), procedeu-se a verificação do grau de especialização dos municípios da Amazônia
na produção agropecuária (ESPif ). A especialização total (ESPT i) do município é a soma
de todos os escores fatoriais obtidos. Os resultados desta primeira classificação
encontram-se na Tabela 4.
Tabela 4: Grau de especialização dos municípios da Amazônia, 2010 – (ESPT i).
EstadoPouco
especializado
Especializado
Muito especializa
do
Acre 19 3 0
Amazon
as56 6 0
Amapá 16 0 0
Maranhã
o169 12 0
Mato
Grosso102 36 3
Pará 91 42 10
Rondôni
a34 17 1
Roraima 15 0 0
Tocantin
s137 1 1
TOTAL 639 117 15
Fonte: Resultados da pesquisa.
Os resultados obtidos com a especialização total demonstraram que a maior parte
dos municípios da Amazônia Legal brasileira, quando comparados entre si, possuem pouca
especialização na produção agropecuária em geral. Cerca de 82,87% (639 municípios)
obtiveram uma baixa especialização produtiva.
Esta realidade tende a ocorrer por diversos fatores. Grande parte dos municípios da
Amazônia detém uma produção rural menos desenvolvida quando comparados aos
principais produtores, especialmente àqueles produtores de commodities para exportação.
Ainda se soma o fato que a medida em que se adentra na Amazônia, reduz-se também a
área total explorada economicamente e a produtividade dos fatores. Tais razões
combinadas evidenciam que a grande parcela do agronegócio altamente desenvolvido na
Amazônia se concentra em um grupo reduzido de município.
Os municípios classificados como especializados ou muito especializados
representam os 17,13% restante (132 municípios). A Amazônia detém um expressivo
número de cabeças de gado e produção da principal commodity agrícola de exportação
nacional, a soja, concentrada principalmente na região do Cerrado mato-grossense,
Tocantins e Rondônia. Ainda se destaca por outras culturas locais, como o açaí e a
castanha-do-pará ou de grande consumo regional como a mandioca.
A concentração das principais atividades ligadas ao agronegócio brasileiro está
também nos estados que tiveram maior número de municípios especializados ou muito
especializados na atividade agrícola, como foi o caso de Mato Grosso (39 municípios),
Pará (52 municípios) e Rondônia (18 municípios). Tal situação demonstra que a maior
parte da produção agropecuária na Amazônia ainda se concentra nestes estados, embora
esteja se desenvolvendo em larga escala nos estados de Tocantins e Maranhão,
principalmente com a expansão da sojicultora em áreas de cerrados.
O próximo passo de análise consiste em verificar o nível de especialização dos
municípios da Amazônia classificados como especializados ou muito especializado. Foram
estabelecidas três condições: municípios simples são especializados em uma única
atividade agropecuária quando comparados aos demais. O município duplo apresenta duas
especializações agropecuárias. Por fim, municípios com múltiplas especializações
apresentam alta produção em três atividades ou mais. Os resultados obtidos estão
presentes na Tabela 5.
Tabela 5: Nível de especialização dos municípios da Amazônia que apresentaram maior
grau de especialização, 2010.
Estado Simples Duplo Múltiplo
Acre 0 2 1
Amazonas 1 4 1
Amapá 0 0 0
Maranhão 5 7 0
Mato
Grosso17 18 3
Pará 19 26 5
Rondônia 11 4 2
Roraima 0 0 0
Tocantins 2 0 0
TOTAL 55 61 12
Fonte: Resultados da pesquisa.
O total de municípios considerados para o nível de especialização foram os 132
selecionados a partir dos resultados da Tabela 4. Inicialmente cabe observar que 128
municípios apresentaram os requisitos descritos na Tabela 3, a fim de evitar que
municípios com pequenas atividades agropecuárias contribuíssem para classifica-lo com
um nível de especialização acima do que ele realmente apresenta.
Os resultados indicam que 55 municípios são especializados na produção de uma
única atividade agrícola (com exceção da soja o qual contém no mesmo fator a variável
milho). Com dupla especialização ficou a maior concentração de municípios (61). Estas
duas situações demonstram que o desempenho das atividades agropecuárias na
Amazônia leva a especialização por parte dos municípios em poucas atividades. Embora a
maior parte dos municípios ainda possuem uma atividade agropecuária em menor nível
produtivo quando comparados com os maiores produtores (como observado anteriormente
pela baixa especialização).
Os resultados demonstraram que é altamente complexo para um município ser
especialista em múltiplas atividades simultaneamente. Apenas 12 deles foram
apresentaram grande volume de produção em três ou mais atividades. Destaca-se que
apenas um destes obteve como uma das atividades o cultivo de soja e milho.
Em complexos agroindustriais muito desenvolvidos como o da soja, os municípios
apresentam uma grande especialidade nesta produção. As cadeias produtivas localmente
instaladas favorecem o fortalecimento destes setores, tornando uma vantagem competitiva
aos produtores rurais se integrarem nestes mercados altamente desenvolvidos.
O desenvolvimento do agronegócio leva ao alto desempenho e produtividade de
algumas atividades na Amazônia, mas ainda de forma concentrada em um grupo de
municípios. A Tabela 6 demonstra quantos municípios são especializados em cada
atividade analisada neste trabalho.
Tabela 6: Municípios especializados por atividade agropecuária.
Atividade Total de MunicípiosEspecialistas
Mandioca 28
Gado 26
Arroz 24
Atividade Madeireira 20
Café 16
Milho e Soja 15
Demais culturas permanentes 13
Açaí e Castanha-do-Pará 9
Cana-de-açúcar 9
Cacau 7
Dendê 4
Abacaxi 3
A pecuária é uma das principais atividades na Amazônia brasileira. O Mato Grosso
se consolida com o maior rebanho bovino do Brasil, enquanto que o Pará tem o quinto
maior rebanho e também o município com maior número de cabeças de gado (São Félix do
Xingu). Esta situação demonstra a predominância de municípios especialistas na criação
de bovinos.
Para a mandioca a situação é a predominância desta atividade nos estados região
Norte brasileira. Esta possui diversas utilizações na culinária, portanto é muito cultivada na
região e em diversos municípios para o abastecimento da demanda. As commodities
agrícolas, como o café, cana-de-açúcar, milho e a soja detém um menor número de
municípios altamente especializados. Tal situação está relacionada ao fato que nas
principais áreas produtoras na Amazônia alguns poucos municípios detém a maior parcela
da produção. No caso da soja em Mato Grosso, os 10 municípios com maior área plantada
em 2010 detinham mais de 35% da área total.
A predominância de algumas atividades em determinados municípios revela o fato
da divisão produtiva agrícola na Amazônia. Considerando apenas as principais atividades
ligadas ao agronegócio, foi possível identificar a quantidade de municípios especializados
em cada uma destas (Tabela 7).
Tabela 7: Especialização dos municípios* nos principais commodities agrícolas produzidas
na Amazônia, 2010.
EstadoSoja e Milho
Gado Café Cana DendêTotal
Estado
Maranhão 0 0 0 1 0 1
Mato Grosso 12 8 1 8 0 29
Pará 0 9 0 1 5 15
Rondônia 0 1 18 0 0 19
Total 12 18 19 10 5 64
Fonte: Resultados da pesquisa.
* Os estados do Acre, Amazonas, Amapá, Roraima e Tocantins não obtiveram municípios
especializados nas commodities selecionadas.
Mato Grosso é o estado que mais detém municípios especializados nas principais
cadeias produtivas do agronegócio na Amazônia. Destaca-se ainda que, apesar da
produção de soja e milho estar presente em maior número de municípios, possui
especialização em todas as demais ligadas ao agronegócio (com exceção do dendê).
Importante destacar que a soja somente se mostra altamente especializada em municípios
da região de cerrado, reforçando que esta cultura encontra barreiras de dificultam sua
expansão na Amazônia (CAMPOS, 2012). A criação de gado também é elevada, embora
alguns municípios se destacam nesta atividade – como Juara, Cáceres, e Alta Floresta –.
O cultivo de cana-de-açúcar também é destaque, reforçada pela cadeia produtiva de etanol
e açúcar no estado em Barra do Bugres, Campo Novo do Parecis e Nova Olímpia.
Rondônia é um estado no qual a fronteira agrícola vem se expandindo no século
XXI. A soja começa a se desenvolver no estado, enquanto que a produção de café ainda
permanece no estado. Por esta razão houve destaque para os municípios da região,
embora alguns destes detenham uma produção mais elevada (Cacoal e São Miguel do
Guaporé).
O Pará, como já salientado anteriormente, possui um expressivo destaque para a
criação de gado, contemplando alguns dos municípios com maior rebanho no país. Mas
cabe destacar ainda a produção do dendê, principalmente utilizado na indústria de
biodiesel. Esta atividade vem se expandindo no estado, presente principalmente na
mesorregião Nordeste Paraense – municípios de Tailândia, Acará, Moju, entre outros –.
Os demais estados não apresentaram municípios altamente especializados na
produção destas commodities agrícolas. Importante destacar que, embora Tocantins venha
elevando anualmente sua produção de soja, a produção municipal ainda é bem inferior aos
estados do Mato Grosso para serem considerados especialistas no mesmo nível.
Nos estados da Amazônia, como Amazonas, Acre, Roraima e Amapá, as atividades
agropecuárias são mais limitadas, predominando outras que não ligadas ao agronegócio
que se desenvolve nos principais estados produtores (Mato Grosso e Pará). Outros fatores
contribuem para a reduzida exploração agrícola, como a pressão ambiental para a
conservação da Amazônia, que ainda se mantém preservada em larga escala territorial. As
dificuldades logísticas e integração com o mercado nacional e internacional também são
barreiras para a expansão de certas atividades agrícolas, predominando outras como a
extração vegetal, a mandioca e a produção de outros frutos, inclusive a atividade
madeireira.
O questionamento que se levanta é se a produção agrícola pode favorecer o
desenvolvimento humano na região Amazônica. Com esta finalidade foi realizado uma
correlação entre os municípios de Mato Grosso e do Pará. No estado de Mato Grosso foi
obtido uma correlação positiva e (0,265; p < 0,01) entre a especialização produtiva
(municípios especializados e muito especializados, Tabela 4). Já no estado do Pará o
coeficiente obtido não foi significante.
Observa-se que dentre os 20 municípios com maior IDHM em 2010 no estado de
Mato Grosso, 12 deles são especializados na produção de soja e apenas 4 possuem
destaque na criação de gado. A dinâmica econômica da soja é fator que contribui para o
desenvolvimento pois a cadeia produtiva que acompanha esta commoditie favorece a
circulação e fluxo da renda. Os municípios que produzem grandes áreas de soja acabam
também por concentrar as indústrias e outros setores de apoio a esta atividade – antes e
depois da porteira (logística, crédito, beneficiamento, insumos) –, situação que contribui
ainda mais para o desenvolvimento além apenas da produção agrícola. Outros municípios
do estado de Mato Grosso que não possuem alta especialização agropecuária mas
possuem IDHM elevado estão relacionados a uma economia diferente da produção
agropecuária, como o caso de Cuiabá (capital do estado) e Várzea Grande, na região
metropolitana de Cuiabá.
A atividade pecuária por sua vez é uma atividade com menor dinâmica econômica
quando comparada com a agricultura, seja pelo investimento ou pela forma de exploração
da atividade, muitas vezes realizadas sem grandes investimentos (HECHT, 1985), uma das
razões pela qual o Pará não apresentou um coeficiente de correlação significativo entre
desenvolvimento e produção agropecuária. O impacto da atividade pecuária sobre o
desmatamento ainda é objeto de pesquisas no meio acadêmico, não estando claro ainda
seu impacto e sua relação com outras atividades (MENDONÇA; LOUREIRO; SACHSIDA,
2012).
Outras razões são as outras atividades que podem contribuir para o
desenvolvimento regional e não estão ligadas com a agropecuária, como a atividade
mineral e grandes projetos de infraestrutura (principalmente no campo energético).
5. CONCLUSÃO
O objetivo deste artigo foi identificar a especialização produtiva dos municípios da
Amazônia Brasileira. Foi estabelecida a hipótese de que os municípios que mais se
desenvolvem são aqueles que estão ligados as principais cadeias produtivas do
agronegócio. Os resultados obtidos permitiram confirmar que os municípios com maior
especialização produtiva estão localizados na fronteira de expansão agropecuária na
Amazônia, nos municípios do Mato Grosso, Pará, Rondônia e Maranhão, enquanto que
nos demais estados a produção ainda é pouco desenvolvida quando comparadas com o
desempenho das regiões especializadas. Tal situação evidencia que, embora a Amazônia
tenha um grande potencial produtivo, a produção do agronegócio concentra-se em alguns
poucos municípios.
Também foi possível verificar que o desenvolvimento das cadeias produtivas do
agronegócio atua favorecendo ainda mais a especialização produtiva. A maior parte dos
municípios possuem entre uma e duas atividades predominantes em seu território. Em
Rondônia se destaca a produção de café, o rebanho bovino no Pará e em Mato Grosso, e
ainda a soja e o milho como principal commoditie agrícola neste último. Esta situação leva
a uma segunda conclusão, na qual os municípios que concentram as atividades agrícolas
na Amazônia se especialização em apenas algumas poucas atividades agrícolas, e cada
qual possui uma tendência a não desenvolver em grande escala mais que duas destas
atividades.
O desenvolvimento medido pelo IDHM dos municípios demonstrou uma correlação
positiva (0,265), embora não muito elevada entre especialização produtiva agropecuária e
desenvolvimento no estado de Mato Grosso. Tal informação foi relevante com maior
intensidade na mesorregião Norte do estado, onde predomina o agronegócio mais
desenvolvido no complexo soja, que é o principal locomotor do desenvolvimento a partir da
produção agrícola.
Referências
CAMPOS, I. Limites e condicionantes à expansão da sojicultura na Amazônia. Novos Cadernos NAEA, v. 15, n. 2, p. 197–216, 2012.
CHAVAS, J. P. On the economics of agricultural production. Australian Journal of Agricultural and Resource Economics, v. 52, n. 4, p. 365–380, 2008.
CLEARY, D. After the Frontier: Problems with Political Economy in the Modern Brazilian
Amazon. Journal of Latin American Studies, v. 25, n. 2, p. 331–349, 1993.
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