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ARTIGOS Movimentos migratórios na metrópole de São Paulo no século XXI: um estudo quali-quantitativo 1 Migration movements in the SãoPaulo metropolitan area in the 21st century: a qualitative and quantitative study Eda Terezinha de Oliveira Tassara I ; Elaine Pedreira Rabinovich II I Prof. Drª. Titular do Departamento de Psicologia Social do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo II Prof. Drª. do Mestrado em Família na Sociedade Contemporânea da Universidade Católica de Salvador Endereço para correspondência RESUMO Este estudo objetiva caracterizar a(s) figura(s) do migrante brasileiro que teve a cidade de São Paulo como ponto de chegada. Baseia-se na análise da capacidade estratégica de incorporação, adaptação e satisfação. Foram entrevistados 110 migrantes na área central paulistana por meio de um questionário sobre: fluxo em território nacional e intra- urbano; características e perfil; formas e tempos de permanência; redes de apoio; motivos e expectativas. As informações coletadas foram organizadas em um sistema de categorias semânticas e em um sistema de análise de cluster. Os resultados indicaram a diferenciação dos migrantes em dois grupos, segundo seu sentimento de satisfação ou de insatisfação quanto a viver em São Paulo, em função de idade e sonhos. ESTUDOS E PESQUISAS EM PSICOLOGIA, UERJ, RJ, v. 7, n. 3, p. 502-520, dez. 2007 502

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ARTIGOS

 

Movimentos migratórios na metrópole de São Paulo no século XXI: um estudo quali-quantitativo1

 

Migration movements in the SãoPaulo metropolitan area in the 21st century: a qualitative and quantitative study

 

 

Eda Terezinha de Oliveira Tassara I; Elaine Pedreira Rabinovich II

I Prof. Drª. Titular do Departamento de Psicologia Social do Instituto de Psicologia da Universidade de São PauloII Prof. Drª. do Mestrado em Família na Sociedade Contemporânea da Universidade Católica de Salvador

Endereço para correspondência

 

 

RESUMO

Este estudo objetiva caracterizar a(s) figura(s) do migrante brasileiro que teve a cidade de São Paulo como ponto de chegada. Baseia-se na análise da capacidade estratégica de incorporação, adaptação e satisfação. Foram entrevistados 110 migrantes na área central paulistana por meio de um questionário sobre: fluxo em território nacional e intra-urbano; características e perfil; formas e tempos de permanência; redes de apoio; motivos e expectativas. As informações coletadas foram organizadas em um sistema de categorias semânticas e em um sistema de análise de cluster. Os resultados indicaram a diferenciação dos migrantes em dois grupos, segundo seu sentimento de satisfação ou de insatisfação quanto a viver em São Paulo, em função de idade e sonhos. Graus de adaptação e satisfação parecem depender da compatibilidade de modelos identitários, que definem qualidades e níveis de aspiração. Esta compatibilidade seria expressão da capacidade estratégica do migrante em conseguir retirar, das condições materiais e não-materiais a ele acessíveis, elementos para direcionar suas ações na busca de consecução de suas metas.

Palavras-chave: Migrantes, Brasileiros, São Paulo.

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ABSTRACT

This research aims to characterize the figure(s) of the Brazilian migrants in which their arrival point was the city of São Paulo. The study is based on the strategic capacity analysis of incorporation, adaptation and satisfaction. 110 migrants were interviewed in the center area of São Paulo about: national and intra-urban fluxes; characteristics and profiles; forms and timing of permanence; support networks; motifs and expectations. The collected information was organized in semantic categories system and in a cluster system analysis. Results indicate the differentiation of the migrants in two groups related to age and dreams as to their feeling or not feeling satisfaction about living in the city. Adaptation and satisfaction degrees seem to depend on compatibility of identity models that define qualities and levels of aspiration. This compatibility would be an expression of the migrant’s strategic capacity to transform accessible elements of material and non material conditions to channel their actions in order to realize their goals.

Keywords: Migrants, Brazilian, São Paulo.

 

 

Serão aqui relatados os resultados de um estudo sobre migrantes brasileiros vindos, ao longo dos últimos anos do século XX e dos primeiros do século XXI, de diferentes partes do Brasil para a metrópole paulistana.

Este estudo foi realizado principalmente sob o enfoque da história narrativa. Ao longo do século XX, o exercício da ciência histórica configurou uma nova forma narrativa, a chamada história narrativa (DEVOTO, 2003). A história, sob tal configuração, apresentar-se-ia como uma ciência ideográfica, enfocando os tempos rápidos dos acontecimentos (BRAUDEL, 1966) em que o passado inscreve-se em desdobramentos temporais contidos na dinâmica da mudança histórica, em estreita relação entre passado e presente. Seu método privilegia a compreensão, ganhando, com isto, complexidade e riqueza de matizes.

No estudo dos fenômenos migratórios contemporâneos, contudo, a história narrativa não pode deixar de buscar aportes na história analítica (DEVOTO, 2003), de longo tempo (BRAUDEL, 1966), formulando explicações que atravessam espaços e cronologias. É em tal contexto que a história narrativa deve buscar compreender a inserção e interação dos (i/e)migrantes na sociedade em que se situam.

Os fluxos migratórios podem, inquestionavelmente, ser analisados como decorrentes da reordenação do sistema mundial de produção (TASSARA; DAMERGIAN, 1996; TASSARA, 2003), determinando correntes migratórias que se deslocam de forma pré-definida. Isto não significa, no entanto, uma plena autonomia frente ao processo decisório que direciona as escolhas de migrantes: estas são pré-configuradas pelo próprio sistema de produção e pelos símbolos que definem o pertencimento adequado dos sujeitos ao mundo, referendado pela ordem política hegemônica

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(AGAMBEN, 2003), configurando as forças psicossociais que os mobilizam (FERNANDES, 1969). Hoje, estas forças se espraiam pelo sistema-mundo (WALLERSTEIN, 1993).

As representações do migrante brasileiro que tem a cidade de São Paulo como ponto de chegada inter-relacionam elementos oriundos de suas figuras nos diferentes momentos de seu processo migratório, às quais correspondem diferentes momentos históricos de sua construção urbana. Tais elementos, refletindo características dos personagens emblemáticos de cada um dos referidos momentos históricos, transferem uma imprecisão para o(s) significado(s) hodierno(s) do termo migrante, obrigando à busca de uma definição (AGAMBEN, 2003), que faça jus à sua realidade contemporânea. Aos dos outrora migrantes, funcionários, comerciantes do mundo colonial, sucederam-se os traços dos estrangeiros e exilados, para depois se desenharem figuras do migrante situadas entre agentes de civilização e força de trabalho, e, no século XX, introduzirem-se ao mesmo as conotações de passageiros e turistas (DEVOTO, 2003).

Sob tal perspectiva, estudar o fenômeno contemporâneo da migração de brasileiros para São Paulo significa esclarecer se, e quais destes componentes ainda caracterizam a(s) figura(s) do migrante, de que forma, e apreender os novos e emergentes atributos que as configuram.

Por outro lado, é necessário, neste processo, evitar paralelos mecânicos e/ou drásticas distinções no campo social e político, sob pena de cristalizarem-se em estereótipos empobrecedores. Para evitá-los, deve-se preservar o objetivo maior da análise histórica – atentar para a complexidade dos processos, o que se pode obter através da história narrativa, baseada nos testemunhos dos sujeitos históricos, substrato da compreensão que se busca, inserindo-os no contexto da história analítica.

Tendo em vista esclarecer o que caracteriza a(s) figura(s) do migrante brasileiro que, contemporaneamente, tem a cidade de São Paulo como ponto de chegada, desenvolveu-se o presente projeto de pesquisa. O Brasil, em seus três primeiros séculos (migrações iniciais), construiu uma sociedade que tinha pouca clareza de sua identidade cultural, face à diversidade de sua composição histórico-étnica e um Estado que era fraco, em decorrência dos comprometimentos de suas elites políticas com a colônia. No entanto, a partir do século XIX e constituindo-se plenamente no século XX o Brasil consolidou-se como uma sociedade plural, complexa, heterogênea, diversa social e etnicamente, “herdeira de muitos passados”, como a América Latina (ARENDT, 1981). Ao longo deste último século, as idéias de nacionalismo, o esporte e a cultura popular, bem como as formas de sociabilidade nas novas áreas de expansão urbana transferem-se para a sociedade como um todo, cristalizando a idéia e a identidade de “brasileiro” - um povo diverso, definido tanto pelo seu nascimento nos territórios determinados pela geografia política do Brasil como pela sua opção em participar dessa sociedade, falando português, e inscrito na simbologia nacional brasileira, contextualizada prevalentemente pelas novas formas de sociabilidade urbana (DEVOTO, 2003).

Ao longo do tempo, a cidade de São Paulo construiu-se metrópole, estruturando-se sobre uma origem concernente às suas fundações e aos movimentos de pessoas que a configuraram e por ela foram se configurando, e cuja identidade reflete-se sob a forma de imagens – sua “alma”. Tais fundações e movimentos, no entanto, só podem ser compreendidos em espaços com marcos bem mais vastos que os dos limites da cidade e do Brasil. O fato é que hoje, conforme Calligaris (2005), São Paulo se afirma

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no território nacional como metrópole, uma cidade que ocupa um lugar específico na mente do brasileiro – um aglomerado de casas e gente que se tornou cenário preferido dos sonhos que alimentam desejos de conquista e variedade. São Paulo tornou-se a autêntica metrópole nacional cristalizada, pois, além de uma grande cidade, é vista como conseqüência não prevista do esforço humano espontâneo, como um produto do caráter plástico da capacidade adaptativa do homem e “dos anseios nacionais que orientam, no Brasil, essa capacidade na direção da conquista do futuro” (FERNANDES, 1969). Hoje consiste na integração dos vários Brasis em uma sociedade de massas, de caráter nacional, inserida no mundo global, onde o agente anônimo escreve sua história social. É assim que a metrópole se torna pólo de atração para o campo e a província, para os poucos conformados com seu destino, para os que sonham com mudanças e liberdade. É assim, também, que a metrópole se transforma em casa das frustrações e dos atalhos corruptos e/ou brutais de quem quer seu sonho realizado já, a qualquer custo.

Sonhos e devaneios necessitam encontrar-se com o mundo real para se concretizarem em conquistas. Para se tornarem realidade, necessitam de repertório adequado, que possibilite, ao seu portador, vislumbrar condições, apoiar-se nelas e transformá-las em meios para atingir suas aspirações, para satisfazer seus devaneios no presente ou aproximá-los da realização-satisfação em futuro próximo.

A busca da compreensão apóia-se na análise de um sistema atitudinal e perceptivo, aqui denominado capacidade estratégica de incorporação, adaptação e satisfação dos migrantes na nova vivência urbana. Compreendemos capacidade estratégica como o potencial do sujeito em se colocar na direção do que considera desejável (MOSER et al., 2005). Está relacionada, portanto, à sua capacidade de reinventar o cotidiano, a partir do seu próprio repertório e daquele adquirido a cada dia nas redes de relações e contatos, frente às ideologias do urbano, de forma correlacionada com a busca pessoal pela satisfação de sua aspiração. Esse sistema atitudinal, inscrito em contexto psicossocial, articula dimensões sociológicas, antropológicas e psicológicas, vindo a instrumentalizar a análise dos atributos de sujeitos migrantes concretos. Capacidade estratégica cumpre uma função operacional na investigação, na medida em que permite a identificação de potencialidades positivas e negativas, caracterizando os sujeitos pesquisados frente ao teor de sua incorporação e adaptação na cidade e de sua satisfação no que se refere aos motivos que o levaram a mudar de cidade.

Tal sistema perceptivo-atitudinal teria, por hipótese, influência sobre o maior ou menor sucesso na:

Incorporação – atributo que diz respeito à inserção econômica do migrante, por meio das relações de trabalho, estabelecidas na cidade, no plano formal ou informal, com emprego ou trabalho auto-empreendido (free lancer);

Adaptação – atributo referente às condições objetivas de conhecimento, localização e movimentação dentro do novo espaço geográfico, em função de suas necessidades (espacialização da identidade);

Satisfação – refere-se a “um sentimento resultante da percepção de um balanço positivo entre o nível de expectativa, as realizações concretas do ator ou a antecipação dessas realizações” (PASTORE, 1969, p. 13).

 

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A cidade e a migração contemporâneas

A configuração sócio-urbana contemporânea expressa-se a partir de uma transformação no cenário mundial, no que se refere a um padrão tecnológico-informacional instaurado no processo capitalista, gerando um “novo protagonismo metropolitano”. Pode-se então dizer de um novo sistema metropolitano que se caracteriza por articular reticularmente as metrópoles como cidades globais, ou seja, cada qual como um “ponto nodal”, que desempenha as funções necessárias à manutenção da coesão da rede mundial (MEYER; GROSTEIN; BIDERMAN, 2004, p. 22).

A metrópole se torna atrativa para os objetivos capitalistas, mediante atributos que assegurem “vantagens locacionais baseadas no seu bom funcionamento como máquina operacional e máquina social” (MEYER; GROSTEIN; BIDERMAN, 2004, p.23) e passa a definir-se como espaço de fluxos, sejam eles de capital, de tecnologia, populacionais, etc.

Outro fator que demarca a transformação da cidade moderna para o caráter urbano contemporâneo se dá na mudança do processo industrial para o de serviços. Este fator fomenta a pulverização espacial da ocupação periférica ou da população situada nas “franjas urbanas” (TASCHNER, 2001), constituídas principalmente no momento industrial de São Paulo, fomentando novas centralidades. Esta idéia do que se considera central tem fundamentos políticos e ideológicos e coincidirá com o centro de poder.

Com a modificação da lógica que estrutura a metrópole contemporânea, o centro político da antiga vila comercial paulistana torna-se anacrônico, mediante o deslocamento do ponto central da cidade, que é transposto para outros espaços desta, como centros financeiros empresariais.

Para tanto, é preciso considerar que o processo de periferização na cidade de São Paulo, a lógica centro-periferia que se veicula nas literaturas urbanas, requer diferenciar tal especificação em suas referências geométrica e social. A primeira está articulada a um eixo diametral circunscrito no território da cidade, partindo do ponto de origem da constituição urbana da cidade, conforme apresentado anteriormente. Contudo, não é possível afirmar que o acesso à área central seja definidor da classe social ou do acesso ao modelo urbano disseminado globalmente e instituído localmente. Esta situação se expressa na fisionomia da cidade, de forma a evidenciar uma miscigenação social das áreas da mesma, pois, num mesmo território, convivem as diversas classes sociais e o centro urbano geométrico é continente para o que se denomina de periferia social.

Em síntese, nesta lógica é possível verificar que a estrutura morfológica da cidade se compõe de modo a conter, em uma proximidade espacial, os modos de vida “qualificado” e “precarizado”, tanto no centro quanto na periferia geométrica.

O movimento populacional que se configura na região Metropolitana de São Paulo obedece a um “padrão radiocêntrico” de expansão da cidade, que gera um deslocamento da população das áreas mais centrais para regiões periféricas do município e para outros municípios.

O arrefecimento do processo de evasão populacional dos distritos centrais - seja como resultado de iniciativas do poder público nas três esferas; re-acomodação

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contemporânea do padrão radial-centrífugo de expansão da metrópole e da população; conseqüência da pressão dos movimentos sociais de luta por moradia, com destacada atuação nas regiões centrais, ou ainda como resultado de condicionamentos de vetores do mercado imobiliário - nos leva a apontar para a necessidade de identificar empiricamente os pólos, os fluxos e as interações, entre esses espaços centrais em redefinição e as “fronteiras urbanas” em permanente e conflituoso processo de expansão.

 

Essas considerações sugerem ainda:

1) A necessidade de interpretar a dinâmica migratória intra-municipal na escala metropolitana, entendendo-se as “fronteiras urbanas” como áreas de evidência e territórios privilegiados de observação e de conhecimento da dinâmica migratória da cidade de São Paulo;

2) A importância demográfica econômica e cultural atribuída à migração nordestina, constitutiva de parcelas da malha física e sócio-ambiental do município, implica na estruturação de densas redes de sobrevivência e sociabilidade.

 

Método

A pesquisa se iniciou com uma primeira incursão no campo empírico por meio da realização de entrevistas com migrantes recém chegados a São Paulo, residentes tanto no centro quanto na periferia da cidade, compondo um quadro de informações sobre características de indivíduos migrantes, as interações entre os mesmos, entre regiões da cidade, as redes sociais de apoio e suas eventuais inter-relações.

Como primeiro resultado desta primeira sondagem, apareceu uma influência de redes sociais, de oportunidade de trabalho no centro da cidade em relação à periferia e os baixos custos de moradia na periferia em relação ao centro, na distribuição espacial do migrante na cidade. A partir de tais informações empíricas, derivadas de uma re-conceituação teórica, constitui-se o método da investigação propriamente dito.

A coleta de informações foi realizada na região central do Município de São Paulo, no distrito administrativo de Santa Cecília. O período de realização da coleta de informações foi de outubro a novembro de 2004. A equipe mobilizada para a referida coleta envolveu doze pesquisadores.

 

Participantes

Foram realizadas 110 (cento e dez) entrevistas, com sujeitos-migrantes maiores de 16 anos, residentes há menos de seis anos tanto no Município de São Paulo quanto na sua Região Metropolitana, incluindo também migrantes chegados no instante da realização da entrevista, mas manifestando a intenção de permanecer em São Paulo.

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Instrumentos

Para a coleta de informações, foi utilizado um questionário guia, levantando informações sobre o movimento do migrante no território nacional, ponto de partida, local de nascimento e motivos determinantes da vinda; sobre características pessoais (sexo, idade); sobre o perfil do migrante (escolaridade, qualificação profissional e trabalho); foram também levantadas informações sobre fluxos de migrantes intra-urbanos (motivos de deslocamentos e distribuição espacial referentes ao local de destino, de trabalho e de moradia) neste território; foi ainda efetuado o levantamento de informações referentes às estimativas de formas e tempos de permanência e de redes de apoio e contato do migrante em São Paulo (existência e tipos de contatos, a quem recorreu quando chegou, com quem mora, etc); aprofundou-se também a investigação de características do perfil do migrante, referentes aos motivos e expectativas mobilizadores de movimentos de vinda, permanência ou retorno.

Foram constituídos três grupos focais, tendo como critério principal levantar informações que pudessem subsidiar o aprofundamento da análise dos dados obtidos das entrevistas, na direção da busca de elementos para a verificação de:

1) a localização no centro ou na periferia influencia os padrões de migrantes;

2) As redes sociais influenciam os padrões de migrantes.

 

Análise das questões abertas

As informações coletadas, referentes às questões abertas, foram organizadas em um conjunto de sete dimensões (categorias semânticas), totalizando 43 itens de respostas possíveis para cada um dos 110 sujeitos entrevistados. Estas dimensões foram construídas por meio do método de derivação empírica de categorias de análise (Hutt; Hutt, 1974). Este método foi utilizado abstraindo-se das narrativas oferecidas pelos sujeitos pesquisados, informações sobre os motivos de vinda à cidade, sobre o que imaginavam aqui encontrar e o presumível alcance de suas metas. Esta análise conduziu a sínteses consideradas pertinentes, cada uma delas representada por expressões e termos compatíveis com o significado da correspondente classe semântica. Assim, tais classes semânticas compuseram as seguintes dimensões de análise: meios de mobilidade social, referências a vínculos afetivos, expectativas em relação ponto de partida e de chegada, imagens (positivas e negativas) da cidade e personagens representativos do falante que serão apresentados a seguir.

O significado das dimensões configuradas a partir das questões abertas, definiu-se conforme abaixo:

a. Meios de mobilidade social

Diz respeito à busca dos meios para ascender socialmente ou, pelo menos, meios para manter a condição social já existente. Foram identificadas 4 possibilidades–

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síntese e mutuamente exclusivas de processos de manifestação de meios de mobilidade: a.1 Trabalho com maior renda - Quando o sujeito muda com a expectativa de encontrar trabalho que ofereça oportunidade de aumentar os ganhos. a.2 Trabalho para manter-se como está - qualquer alternativa de ocupação, desde que possa continuar mantendo a condição de renda alcançada no local de origem. a.3 Evolução na carreira profissional - busca de novas ocupações de trabalho consideradas de melhor qualificação e com possibilidade de maior renda e de aprimoramento profissional. a.4. Estudo superior - O sujeito considera o acesso ao grau superior em São Paulo como meio de ascensão sociocultural.

b. Referência ao vinculo afetivo

Diz respeito à indicação de uma relação afetiva como fator que influenciou a decisão de vinda.b.1. Referência explicita sobre manter o vinculo afetivo: O sujeito menciona diretamente como motivo da mudança manter um vínculo afetivo já existente. b.2. Referência explicita ao desejo de recuperação de um vinculo: motivo principal da vinda é recuperar o contato com pessoa afetivamente importante. b.3. Referência explicita sobre busca de vínculos afetivos: busca de encontro com pessoas existentes ou pessoas desconhecidas que compõem o universo imaginário. b.4. Referência explicita sobre conquistar vínculos afetivos: busca de um vinculo afetivo até então inexistente. b.5 Referências implícitas: Refere-se a todas as categorias acima (b.1 a b.4) inferidas de falas do entrevistado, indicando um certo vazio subjetivo, parecendo indicar que o modelo de papel social e de identidade do sujeito falante, ainda não tenha sido alcançado

c. Expectativa em relação ao eixo ponto de partida e ponto de chegada (São Paulo)

Refere-se à expectativa atinente à visão de futuro projetada pelo entrevistado. c.1. Ficar: desejo de se estabelecer em São Paulo. c.2. Voltar: desejo de voltar para o seu lugar de origem.

c.3. Ir e vir: quando o sujeito vem para São Paulo em busca de uma renda em determinados períodos do ano ou, eventualmente, para suprir a ausência de trabalho no local de origem. c.4. Indefinido: quando o sujeito não definiu o que pretende fazer (ficar ou voltar) ou não explicita uma clara posição sobre esta questão. c.5. Nada consta.

d. Sonhos

São ideais que aparecem nos conteúdos das falas dos entrevistados, expressando representações de modelos referentes ao que seja viver bem e ser feliz: d.1. Reconstrução da vida: quando o sujeito considera São Paulo um espaço privilegiado para construir ou reconstruir um ideal de vida almejado. d.2. Casar e trabalhar ou não deixar os filhos passarem fome: o sujeito considera que, com a mudança para São Paulo, conseguirá mudar o seu destino. d.3. Tornar-se independente do ponto de vista não material: quando o sujeito percebe o afastamento da proteção do grupo familiar e do seu local de origem, como possibilidade de obter conquistas pessoais. d.4. Tornar-se independente do ponto de vista material: quando o sujeito considera a capacidade pessoal de aferir renda como condição necessária para se tornar autônomo e independente da família. d.5. Enriquecer para voltar: quando o sujeito considera São Paulo uma cidade promissora para a realização de seus projetos de elevação de padrão de renda, o que não é possível no local de origem. d. 6. Nada consta. quando não há nenhuma menção sobre o tema.

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e. Imagens da cidade

Ao contar sobre a experiência vivida ao vir para e viver em São Paulo, o sujeito se expressa descrevendo cenas que são imagens por ele construídas, de pessoas que aqui moram, do ritmo, do convívio, do cotidiano da cidade. Consideramos duas polaridades de representações em duas dimensões: imagens positivas da cidade e imagens negativas da cidade. As imagens podem ser compreendidas no contexto do imaginário social referindo-se a “um conjunto de representações que, entremeadas e articuladas, correspondem sistematicamente e em linha ascendente, a desejos, expectativas, projetos, valores e hábitos”. (Ferrara, 2003, p. 45).

e. 1 Imagens positivas da cidade: e.1.1.Cidade do futuro – espírito de avanço: o sujeito atribui a São Paulo um caráter inovador, de progresso constante, onde se pode encontrar o que é considerado moderno, onde se pode acessar oportunidades (trabalhos diferentes, negócios e estudos) e desenvolver projetos pessoais, considerados como difíceis ou impossíveis de serem realizados no lugar de origem. e.1.2. Cidade que ensina: refere-se a uma percepção de que o lugar favorece a vivência de novas experiências e fornece o necessário ao enfrentamento de desafios que promovem o amadurecimento pessoal. O sujeito observa a multiplicidade de situações, de culturas, de estilos de vida, coexistentes na cidade. e.1.3. Cidade do trabalho: Nesta possibilidade, são vislumbradas oportunidades de trabalho em suas diferentes formas: negócio próprio, emprego, outras ocupações, bicos ou trabalhos temporários A oportunidade de trabalho assume o caráter mais relevante na construção de um imaginário sobre a cidade. e.1.4. Cidade boa de morar: O lugar é descrito como cidade bonita e que tem de tudo. O “tem de tudo” revela uma espécie de admiração pelo que tem de novo e diferente: “tudo que você imaginar, aqui tem”; como também admiração pelo caráter cosmopolita e multicultural, étnico, identificado pela produção cultural e os diferentes modos de vida e maneira de ser que a cidade comporta. e.1.5. Cidade da experiência e do trabalho: A experiência diz respeito, principalmente, à possibilidade de se encontrar em novas situações, novas pessoas, novos problemas considerados muito diferentes em relação ao local de origem. Entre as novas experiências aparece também como relevante às oportunidades de trabalho, formando assim uma espécie de síntese da forma de ver a cidade. Experiência e entre elas o trabalho são atributos intrinsecamente ligados às aspirações apresentadas em relação à decisão de mudar. e.1.6. Nada consta: Quando não ha menção sobre o tema.

e.2 Imagens negativas da cidade: e.2.1. Caótica: Diz respeito à dificuldade do sujeito em se situar e se locomover em São Paulo atribuída principalmente a seu tamanho e tipo de trânsito. e.2.2. Cheia de problemas: Quando o sujeito indica um problema ou um conjunto deles como existente na cidade, seja de cunho social, ambiental ou econômico: desemprego, criança abandonada, lugar em que só trabalha, não tem lazer, entre outros. e.2.3 Não acolhedora: quando o sujeito atribui sentidos repulsivos ao que encontra na paisagem da cidade: a cidade é fria, cinzenta, e é vista como apresentando dificuldades para o convívio com as pessoas. e.2.4. Cidade da desilusão ou da falsa ilusão: quando o sujeito relaciona o insucesso em alcançar seus objetivos com uma imagem inadequada que possuía da cidade, antes de vir para São Paulo. Os termos ilusão e desilusão com a cidade aparecem com muita freqüência nas narrativas. Um dos depoimentos ilustra esta representação: “São Paulo é como a Itapemirim (empresa de ônibus);traz os iludidos e leva os desiludidos”, e.2.5. Nada consta: quando não há menção sobre o tema.

f. Personagem

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A partir de uma inferência baseada em um conjunto de informações oferecidas pelos sujeitos sobre a sua forma urbana de ser, as informações podem se constituir em indicadores de identidades sociais e foram sintetizadas em quatro personagens-tipo mutuamente exclusivos. f.1. Trabalhador estóico: Diz respeito ao sujeito incansável, que enfrenta os problemas de viver na cidade de São Paulo, que não desiste apesar das dificuldades encontradas (principalmente em relação ao trabalho e a aquisição de bens). Acredita que foi, é, ou ainda será possível vencer, crescer, alcançar seus objetivos por meio de um trabalho intenso que demandará muito esforço e sacrifício. f.2. Conquistador: É um personagem-tipo que expressa vontade de vir para vencer; vencer pode ter a conotação de adquirir bens materiais ou poder ter contato com a rica diversidade e vida cultural da metrópole. Ilustram este personagem, depoimentos como: conhecer novos mundos, ter contato com o que há de moderno; desenvolver projetos pessoais: “ser jogador de futebol”, “abrir um negocio próprio”, etc. O conhecido epíteto “fazer a América” parece adequar-se à maneira de ser deste personagem. f.3. Acompanhante: É um personagem que não demonstra ter um desejo próprio, uma aspiração pessoal de mudança. O sujeito declara vir a São Paulo para acompanhar alguém. f.4. Pacato: Este personagem foi inferido a partir de um conjunto articulado de informações fornecidas por alguns dos sujeitos que não revelam participar pessoalmente de decisões sobre o deslocamento, nem se expressam sobre suas motivações e aspirações. As informações contidas nas entrevistas apresentam-se lacônicas, com respostas curtas, evasivas, sem definições ou reflexões sobre o que lhe é solicitado. As decisões de vir, ficar ou não ficar parecem depender de terceiros (parentes, amigos ou empregadores).

 

Descrição e análise das questões fechadas

As informações coletadas foram organizadas em um sistema composto pelo mapeamento de um conjunto de trinta e uma dimensões (categorias semânticas e variáveis) referentes às questões fechadas, totalizando 321 itens de respostas possíveis para cada um dos 110 sujeitos que foram entrevistados, conforme o mapeamento das questões fechadas.

Na formatação do sistema de análise dos dados, constituiu-se um espaço vetorial formado pelas trinta e oito dimensões investigativas, possibilitando o processamento de cálculo matemático analógico por agrupamento de tendências e o cálculo por aproximação do desenho. O Plano de Análise foi elaborado, visando-se realizar uma análise de clusters para se identificar a existência de padrões. Considerando-se tratar de variáveis categóricas nominais, as categorias de resposta foram transformadas em variáveis dicotômicas para representar a presença/ausência de atributo. Estabeleceu-se assim uma ordem a partir da qual distâncias poderiam ser examinadas.

A análise de cluster (PEREIRA, 2004) é uma técnica de processamento de dados que permite examinar relações de distâncias entre objetos no espaço multiplano (vetorial) de suas medidas. A cada objeto (sujeito entrevistado), no presente estudo, corresponde um vetor de coordenadas de posição em relação a cada variável estudada. Vetores de padrões semelhantes correspondem à proximidade de localização dos objetos no espaço multiplano, o que permite reconhecer aglomerados, clusters de vizinhança. As distâncias foram calculadas como Euclidianas (linha reta de ligação entre os pontos) e o método de aglomeração foi o hierárquico de aproximação de objetos e de centróides de clusters iniciais de objetos

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(“between groups-linkage”). O juízo para corte do número de clusters foi feito por inspeção de um dendrograma de aglomeração.

 

Resultados da análise

Na análise de cluster, o espaço “n-dimensional” delimitado pelas “n” variáveis utilizadas na análise, teve suas distâncias normalizadas para um valor máximo de 25 unidades abstratas; 20 destas unidades tiveram que ser percorridas, distinguindo-se 6 grupos aqui denominados clusters. Isto significa que o universo estudado é muito homogêneo e que os padrões que se podem reconhecer não sugerem diferenças altamente significantes, mas cujo valor reside em fundamentar empiricamente inferências instruídas por juízos externos. Comparando-se as medidas de um cluster qualquer com a dos outros e com o total geral, com estatísticas descritivas e com tabelas de contingências das variáveis estudadas pelos clusters identificados, pode-se verificar que há dois padrões distintos principais: o cluster 1 e o cluster 6, cujas características diferem conforme a interpretação dos dados realizada a seguir:

 

Cluster 1

O cluster 1 representa o migrante recém-chegado, ainda não adaptado, em busca de estratégias de sobrevivência; ele se mostra desiludido com São Paulo e sua permanência na metrópole é indefinida. Este cluster abrange 32 entrevistados, o que corresponde a 29% do total de casos. Este cluster apresenta um certo equilíbrio em relação à quantidade de homens e mulheres, sendo que 59,4% dos migrantes são do sexo masculino e 40,6% são do sexo feminino. Exceto um único mineiro, todos os entrevistados são originários de estados do nordeste brasileiro.

Em quase 80% dos casos a migração foi motivada pela procura de trabalho e de melhores oportunidades. Em 15% dos casos aparece a necessidade de acompanhar a família. A faixa etária predominante varia de 25-29 anos com 43,8% dos casos, seguidos pelos que estão na faixa etária dos 19-24 anos, representando 28,1% dos casos, ou seja, cerca de 72% dos migrantes agregados a esse cluster são jovens com idade que variam de 19 anos a 29 anos de idade.

Neste cluster predominam os recém-chegados, 46,9% dos entrevistados afirmaram estar a um mês na cidade ou na região metropolitana. Até um ano na cidade ou na região metropolitana temos 9,4% dos entrevistados; de 1 a 2 anos somam 12,5% dos casos; de 2 a 4 anos encontramos 18,7% dos casos; os demais entrevistados estão a mais de 4 anos na cidade e/ou região metropolitana.

Os entrevistados que afirmaram estar em São Paulo pela primeira vez, corresponde a 50% do total de sujeitos do cluster, sendo que os demais já haviam morado em São Paulo e retornado ao estado de origem. Para esses, o movimento de ir-e-vir tem se repetido há pelo menos uma década e, segundo eles, esta situação está associada tanto à baixa oferta de trabalho no local de origem quanto à expectativa de encontrar trabalho em São Paulo.

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Quanto ao local de destino em São Paulo, 37,5% dos entrevistados se instalaram na periferia da zona sul do município, 18,8% na região central e os demais em diversos pontos do município e da região metropolitana. O local de moradia no momento da pesquisa, salvo raras exceções, coincide com o local de destino na cidade e/ou região metropolitana.

Quanto à expectativa de permanência em São Paulo, apenas 12,5% dos entrevistados desse cluster afirmaram que pretendem ficar; 31,3% entrevistados afirmaram que pretendem retornar para o local de origem; 31,3% dos entrevistados não têm uma resposta definida sobre a questão e 12,5%, afirmaram que pretendem continuar nesse movimento e ir e vir de acordo com a sazonalidade da oferta de trabalho.

A maioria, 62,5% dos casos, ainda não completou o primeiro grau, somente 12,5% dos entrevistados possuem o segundo grau completo. No momento da entrevista, apenas 3 entrevistados declararam estar freqüentando a escola para concluir o primeiro grau.

A qualificação profissional da maior parte dos entrevistados é baixa, com 75% dos casos e, 37% destes trabalham na área de serviços, os mais diversos; 15,6% dos entrevistados trabalham na construção civil e o restante em diversas outras atividades. No momento da realização da pesquisa, cerca de 40% dos entrevistados declararam estar trabalhando; 31% afirmaram estar desempregados e o restante dos entrevistados não informaram com clareza sobre a situação de emprego/desemprego. A renda média individual está entre 1 e 3 salários mínimos.

Os migrantes que moram na região central de São Paulo somam 18,8%, sendo que 12,5% dos entrevistados trabalham no centro, isto é, a região de moradia e a região de trabalho são coincidentes. Para quem reside nas áreas periféricas o local de trabalho, na grande maioria dos casos, não coincide com o local de moradia. Ilustra bem esse fato o caso da periferia da zona sul da cidade onde moram 34,4% dos entrevistados e somente 9,4% destes trabalham nessa região.

Quanto à identificação da vinculação do migrante às redes sociais em São Paulo, verifica-se que a maior parte dos entrevistados já tinha algum tipo de contato em São Paulo antes da migração. Predominam as relações de parentesco para 84,4% dos entrevistados e de uma rede de amizade para 34,4% deles. Afirmaram não ter nenhum contato anterior 9,4% dos entrevistados deste cluster. Na chegada a São Paulo, 71,9% dos entrevistados recorreram aos parentes aqui estabelecidos e 12,5% afirmaram ter recorrido aos amigos que somados aos colegas/conhecidos totaliza 18,8% dos entrevistados. No momento da pesquisa, 65,6% dos entrevistados afirmaram morar com os parentes e 9,4% afirmaram morar com amigos. Os outros 9,3% entrevistados moram no trabalho e/ou alojamentos coletivos ou sozinhos.

Através da análise das entrevistas foi identificada a expectativa de mobilidade social com a migração para São Paulo. O “trabalho gerador de maior renda” aparece como o fator mais importante para a mobilidade social na opinião de 62,5% dos entrevistados. A manutenção do status quo, ou seja, “manter-se nas condições em que se encontra” ou evitar perdas com o fato de ter migrado é a preocupação para 18,8% dos entrevistados. Apenas 6,3% dos entrevistados se referem ao desenvolvimento profissional como um meio de mobilidade social.

A relação entre os vínculos afetivos dos sujeitos migrantes e a sua nova condição de vida em São Paulo foi detectada através de referências explícitas e implícitas na

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análise de seu discurso. Explicitaram “buscar novos vínculos” 28,1% dos entrevistados; “manter os vínculos” (especialmente os familiares) 9,4% dos entrevistados e, expressaram o desejo de “conquistar novos vínculos” (objeto imaginado – não tem o objeto concreto) 9,4% dos entrevistados. Expressaram implicitamente o desejo de “buscar novos vínculos” 6,3% dos entrevistados; em ”não perder vínculos já conquistados” 3,1% dos entrevistados e a “conquista de novos vínculos” (objeto imaginado) aparece para 3,1% dos entrevistados. Não expressaram referência explícita ou implícita ao vínculo afetivo e a sua nova condição de vida em São Paulo cerca de 37,5% dos entrevistados pertencentes a este cluster.

Ao serem questionados sobre o que buscavam em São Paulo, seus desejos e seus sonhos, 28,1% dos entrevistados afirmaram que tentariam “reconstruir suas vidas” na nova cidade; 18,8% desejavam “ganhar muito dinheiro para retornar ao local de origem” e 12,5% dos entrevistados tinham como expectativa “não deixar os seus filhos passarem fome”. Não foram capazes de expressar com clareza seus desejos e sonhos em relação à nova vida em São Paulo cerca de 31,3% dos entrevistados.

A imagem positiva que o migrante faz de São Paulo corresponde à “cidade do trabalho” para maioria dos entrevistados (37,5%); para 9,4% dos entrevistados São Paulo é uma “cidade bonita e boa para se morar”. A imagem de uma cidade “da experiência e do trabalho” aparece para 6,3% dos entrevistados. A maior parte dos entrevistados desse cluster (46,9%) não conseguiu formular com clareza uma imagem positiva de São Paulo.

A imagem negativa de São Paulo, para 34,4% dos entrevistados, refere-se a uma cidade “cheia de problemas” (o que inclui problemas estruturais e sociais) e para 28,1% dos entrevistados São Paulo é a “cidade da desilusão ou da falsa ilusão”. Parte significativa dos entrevistados (37,5%) não elaborou com precisão uma imagem negativa de São Paulo.

 

Cluster 6

O cluster 6 abrange 62 entrevistados correspondendo a 56% do total de casos e representa o migrante já estabelecido e mais adaptado, com estratégias de sobrevivência mais adequadas e se mostra mais confiante no seu futuro em São Paulo. Este cluster apresenta um certo desequilíbrio em relação à quantidade de homens e mulheres, sendo que 30,6% dos migrantes são do sexo masculino e 69,4% são do sexo feminino.

Em quase 70% dos casos a migração foi motivada pela procura de trabalho e de melhores oportunidades. Em 35,5% dos casos aparece a necessidade de acompanhar a família. A busca por melhores condições para estudar foi citada por 9,7% dos entrevistados. A maior parte dos entrevistados (61,4%) são originários de estados do nordeste. Da região sudeste se originam 15,6% dos entrevistados e da região norte, 3,6%. Os demais entrevistados são originários de diversos estados do país.

A faixa etária predominante varia de 19-24 anos com 41,9% dos casos, seguidos pelos que estão na faixa etária dos 25-29 anos, representando 22,6% dos casos, ou seja, cerca de 64,5% dos migrantes agregados a esse cluster são jovens com idade que variam de 19 anos a 29 anos de idade. O contingente de migrantes com até 18 anos de idade representa 17,7% dos entrevistados.

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Nesse cluster predominam os migrantes que estão a mais de um ano em São Paulo. A maioria está em São Paulo de 1 a 3 anos (44,7% dos entrevistados); seguidos pelos que estão de 3 a 5 anos na cidade (29% dos entrevistados). Do total dos entrevistados, 16,1% estão em São Paulo entre 5 a 6 anos. Os entrevistados que afirmaram estar em São Paulo pela primeira vez, corresponde a 74,2% do total de sujeitos deste cluster, sendo que os demais já haviam morado em São Paulo e retornado ao estado de origem. Para esses, como foi registrado no cluster 1, o movimento de ir-e-vir tem se repetido há pelo menos uma década e, segundo eles, esta situação está associada tanto a uma possível maior oferta de trabalho em São Paulo quanto à baixa oferta de trabalho no local de origem.

Quanto ao local de destino em São Paulo, 75,8% dos entrevistados se instalaram na área central de cidade, seguidos dos que se instalaram na região oeste (11,3%). Os demais se instalaram em diversos pontos do município e da região metropolitana. O local de moradia no momento da pesquisa, salvo raras exceções, coincide com o local de destino na cidade e/ou região metropolitana.

Quanto à expectativa de permanência em São Paulo, cerca de 16,1% dos entrevistados afirmaram que pretendem ficar; 22,6% dos entrevistados afirmaram que pretendem voltar para o local de origem; 31,3% dos entrevistados não têm uma resposta definida sobre a questão e apenas 1,6% dos entrevistados afirmaram que pretendem continuar nesse movimento e ir e vir de acordo com a sazonalidade da oferta de trabalho.

A maioria (87,1% dos casos) ainda não completou o primeiro grau. Apenas 6,5% dos entrevistados possuem o primeiro grau completo e 3,2%, possuem o segundo grau completo. No momento da entrevista, 50% dos entrevistados declararam estar freqüentando a escola para concluir o primeiro grau.

A maior parte dos entrevistados tem baixa qualificação profissional (85,5% dos casos) e a quase totalidades destes trabalham na área de serviços (os mais diversos). A maior parte (41,9%) dos entrevistados, declararam que são empregados domésticos. Os trabalhadores em serviços de restaurante somam 11,3% dos entrevistados e nos serviços de limpeza e conservação de edifícios, 11,3% dos entrevistados. No momento da realização da pesquisa, cerca de 74% dos entrevistados declararam estar trabalhando; e 23% afirmaram que estavam desempregados. A renda média individual está entre 1 e 3 salários mínimos.

Os migrantes que moram na região central da cidade somam 72,6%, sendo que 64,5% dos entrevistados trabalham no centro, isto é, as regiões de moradia e de trabalho são coincidentes. Na região oeste, onde moram 11,3% dos entrevistados e trabalham 9,7% deles, também coincidem a região de moradia com a região de trabalho. Para os outros entrevistados, situados nos mais diversos pontos de São Paulo e/ou região metropolitana, a região de moradia e de trabalho,de um modo geral, também coincidem.

Quanto às questões que identificam a vinculação às redes sociais do migrante em São Paulo, a maior parte dos entrevistados declarou que já tinha algum tipo de contato em São Paulo antes da mudança para a cidade. Predominam as relações de parentesco para 82,3% dos entrevistados e de uma rede de amizade para 45,2% deles. Afirmaram não ter nenhum contato anterior 3,2% dos entrevistados desse cluster.

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Na chegada a São Paulo, 85,5% dos entrevistados recorreram aos parentes aqui estabelecidos e 3,2% afirmaram ter recorrido aos amigos e/ou colegas/conhecidos. Recorreram ao empregador cerca de 11,3% dos entrevistados.

No momento da pesquisa, 67,7% dos entrevistados afirmaram morar com os parentes e 3,2% afirmaram morar com amigos/conhecidos. Moram com o empregador cerca de 11,3% dos entrevistados. Outros 4,8% dos entrevistados moram no trabalho e/ou alojamentos coletivos. Afirmaram que moram sozinhos cerca de 14,5% dos entrevistados.

Na pesquisa foi possível captar a imagem que o migrante faz de São Paulo. Quanto à imagem positiva, 29% dos entrevistados a classificou como sendo a “cidade do trabalho” e 24,2% dos entrevistados a consideraram uma “cidade bonita e boa para se morar”. A imagem de uma cidade “da experiência e do trabalho” aparece para 22,6% dos entrevistados e 4,8%, a consideraram como sendo a cidade “que ensina”. Apenas 16,1% dos entrevistados desse cluster, não conseguiram formular com clareza uma imagem positiva de São Paulo. Sobre a imagem negativa de São Paulo, 48,4% dos entrevistados a considerou como uma cidade “cheia de problemas” (o que inclui problemas estruturais e sociais) e para 12,9% dos entrevistados, São Paulo é a “cidade da desilusão ou da falsa ilusão”. Parte significativa dos entrevistados (33,9%) não elaborou uma imagem negativa de São Paulo.

Ao serem questionados sobre o que buscavam em São Paulo, seus desejos e seus sonhos, 54,8% dos entrevistados afirmaram que tentariam “reconstruir suas vidas” na nova cidade; 4,8% desejavam “ganhar muito dinheiro para retornar ao local de origem” e 8,1% dos entrevistados tinham como expectativa “tornar-se independente do ponto de vista material”.O desejo de 4,8% dos entrevistados é o de “casar e trabalhar”.Não foram capazes de expressar com clareza seus desejos e sonhos em relação à nova vida em São Paulo cerca de 24,2% dos entrevistados.

A relação entre os vínculos afetivos dos sujeitos migrantes e a sua nova condição de vida em São Paulo foi detectada através de referências explícitas e implícitas na análise de seu discurso. Explicitaram “buscar novos vínculos” 33,9% dos entrevistados; “manter os vínculos” (especialmente os familiares), 35,5% dos entrevistados e expressaram o desejo de “recuperar vínculos pela presença” (objeto concreto) 12,9% dos entrevistados. Fizeram referência explícita à “conquista de novos vínculos” (objeto imaginado – não tem o objeto concreto) cerca de 9,7% dos entrevistados. Expressaram implicitamente o desejo de ”não perder vínculos já conquistados” 1,6% dos entrevistados. Não expressaram referência explícita ou implícita ao vínculo afetivo e a sua nova condição de vida em São Paulo apenas 6,5% dos entrevistados pertencentes a este cluster.

Através da análise das entrevistas foram elencados os principais meios de mobilidade social reconhecidos pelos entrevistados. O fator mais importante, na opinião de 37,1% dos entrevistados, é o “trabalho gerador de maior renda”. A manutenção do status quo, ou seja, “manter-se nas condições em que se encontra” e evitando perdas com o fato de terem migrado, é a preocupação para 19,4% dos entrevistados. Fazem referência ao desenvolvimento profissional como um meio de mobilidade social 30,6% dos entrevistados.

 

Interpretação dos resultados

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Uma leitura crítica dos resultados derivados da análise efetuada permite agrupar a grande maioria dos testemunhos em torno de um dipolo caracterizado em função do que indicam sobre a incorporação, adaptação e satisfação de seus narradores em sua nova existência paulistana.

Assim é que seria possível afirmar que tais grupos não se distinguem no que se refere à sua incorporação no mundo econômico da cidade – a grande maioria pertence aos mesmos baixos estratos sócio-econômicos, inscrevendo-se de forma precária no mundo do trabalho (trabalho informal e/ou esporádico e não qualificado).

Esta homogeneização não se reflete, contudo, em um correspondente isomorfismo frente às respectivas adaptações na vida metropolitana. Nesse aspecto, os estilos caracterizadores dos dois grupos de sujeitos distinguem-se sobremaneira, refletindo-se nas imagens formadas sobre a cidade, em seus aspectos positivos e negativos e sobre a nova vida. Assim, pode-se vislumbrar que aos dois estilos corresponderiam climas subjetivos opostos, representados por meio de um teor diferenciado de satisfação – os satisfeitos e os insatisfeitos com a condição de migrantes.

Aprofundando-se na análise dos atributos distintivos destes dois grupos, verifica-se que os mesmos se diferenciam, em função da idade predominante de seus componentes (os mais felizes são percentualmente mais jovens) e em função da recorrência de seus sonhos (enquanto que para todos o sonho mais compartilhado seja o de re-construção de vida – em São Paulo ou no lugar de origem, os mais felizes referem-se menos a um desejo de retorno ao local de partida do que os insatisfeitos – para estes últimos, grande parte afirma ter já tomado a decisão de retornar) e dos personagens característicos neles prevalentes (entre os mais satisfeitos predominam os “conquistadores” e “estóicos”, e, entre os mais insatisfeitos, os “pacatos”).

Esse sistema de afirmações, empiricamente fundamentadas, aponta para a conclusão de uma baixa relevância de fatores incorporadores, portanto, econômicos, como diretamente determinadores dos graus de adaptação e satisfação. Esses dois últimos, além de se manifestarem de forma altamente inter-relacionada, parecem depender exclusivamente dos sonhos, das imagens, dos ideais, da compatibilidade entre os modelos identitários, conscientes ou não, que definem qualidades e níveis de aspiração, por sua vez determinantes do teor de adaptação / satisfação.

Esta compatibilidade seria expressão da capacidade estratégica do migrante em conseguir retirar das condições materiais e não materiais a ele acessíveis, elementos para direcionar suas ações na busca de consecução de metas de desejabilidade – inserir-se de maneira a aproximar-se das antigas, novas e emergentes formas hegemônicas de sociabilidade urbana: ter casa, constituir família, enriquecer, consumir, divertir-se, participar... ou seja, situam-se nas esferas psicossociais de decisão, configurando-se na ordem simbólica, cujo foco central é “subir na vida” ou, outrora, “fazer a América”.

Se o maior teor de satisfação parece concentrar-se nos mais jovens, o que se poderia explicar pela maior probabilidade de os mais jovens virem acompanhar seus familiares (redes) e/ou de terem se socializado já na era midiática, comprometida portanto com os modelos de sociabilidade urbana; e o maior teor de insatisfação parece situar-se entre os mais velhos (idade) e os mais recentes (tempo de chegada) em São Paulo, portanto, entre aqueles que tem alta probabilidade de não terem ainda se adaptado face ao tempo insuficiente para se familiarizarem, incorporarem-se e/ou inscreverem-se em redes; todos convergem para o compartilhar das metas que buscam – inserir-se na história social de acordo com o respeito ao paradigma da

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civilização ocidental contemporânea – comunicando-se à distância de forma presencial, uma vez que aspiram trocas e interações sociais desconhecidas e intensas, mas, não tem ainda acesso (total ou parcial) aos meios tecno-eletrónicos caracterizadores do substrato da globalização.

São órfãos do Estado brasileiro, ainda não constituído como welfare state, e dos meios técnicos que possibilitaram a globalização, da qual simbolicamente fazem parte. Esta constatação é fortalecida pela homogeneidade de seus discursos e pela sua sintonia com o paradigma primeiro-mundista.

No entanto, como brasileiros, situados, portanto, no hemisfério sul expressam o hibridismo cultural que, conforme Garcia Canclini (1989), caracterizaria a América Latina – ainda não entraram na modernidade mas já estão saindo dela, conquistando, impulsionados por forças psicossociais (FERNANDES, 1969), suas metas individuais de inclusão / inserção / participação no Brasil global. São manifestações de uma alternativa de mundialização.

 

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Endereço para correspondênciaEndereço eletrônico: [email protected]; [email protected].

Recebido em: 10/04/2007Aceito para publicação em: 25/09/2007

 

 

Notas 1 A pesquisa foi coordenada por Eda Terezinha de Oliveira Tassara, coordenadora do Laboratório de Psicologia Sócio-ambiental e Intervenção (LAPSI) do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IPUSP) e subvencionada pela FAPESP (02/00501-5) e pela Congregação das Irmãs missionárias de São Carlos Barromeu. Coordenação adjunta Ms. Leila Aparecida Bonfim. Pesquisadores: Fabíola Marono Zerbini, Hélia M. Santa Bárbara Pereira, Kátia De Bonis, Omar Ardans, Ricardo Burg Mlynarz, Tarcísio Alves Fragoso, Vanessa Louise Batista, Waldemar Brandt Filho. Estagiárias em pesquisa: Ana Amélia Prevatto, Bruna Lima, Lúcia Dezan, Lílian Clementoni. Como parte integrante do projeto total foram realizados um vídeo Trajetórias, sob a direção do Prof. Dr. Marcelo Tassara e um estudo qualitativo (in press).

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