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RECORTES DO CAPÍTULO: História da arte interdisciplinar e procedimento
artístico, do livro CARAMELLA, Elaine. História da Arte – fundamentos
semióticos. São Paulo: EDUSC, 1998.
Ao nos aproximarmos da Catedral Santa Maria Del Fiori, percebemos
que a cúpula de Brunelleschi possibilita novos redimensionamentos da luz, ao
introduzir novos materiais e técnicas que gerarão procedimentos artísticos até
então novos. Construída na escala da cidade, a cúpula, como já observou
Alberti, é tão ampla, que é capaz de abraçar toda a Toscana, pois sua sombra,
com o girar do sol, cobre toda a cidade.
As suas nervuras convergem para um ponto, o qual representativo do
infinito, faz com que a estrutura arquitetônica seja a própria estrutura do
espaço.
No entender de Alberti, Brunelleschi integrou as estruturas que
ajudavam na construção à própria construção, fazendo com que aquilo que
tinha caráter de meio ou ferramenta se identificasse com a própria construção.
A cúpula que sobressai sobre a Igreja Maria del Fiori nada tem a ver
com a estrutura da própria igreja, ela é autônoma e tipologicamente nova.
Brunelleschi opera nesse sentido uma bricolagem de planos. Sua ação é de
fragmentação e, ao assim fazer, a igreja apresenta-se como colagem de
fragmentos superpostos.
A cúpula não é apenas um jogo volumétrico que se revela ao externo.
Internamente, uma segunda calota é construída, formada pela escadaria e por
quatro tribunas que durante a construção eram usadas como depósito de
materiais e que, hoje, oferecem-se como descanso para quem sobe até a
lanterna, torre-observatório. Mas não se trata apenas de torre-observatório,
vista panorâmica. Quem sobe à lanterna, faz também o caminho de
observação do próprio crescimento da cúpula, suas vísceras estruturais.
A lanterna, nesse sentido, será outro fragmento da bricolagem que se
superpõe à própria cúpula.
Essas cristas de mármore são assim coligadas na sua extremidade
superior delimitando e constituindo uma plataforma.
Trata-se de uma estrutura realizada por operações de colagem de
blocos esculpidos. Sob a luz do sol, a única cor que poderia fingir a
imaterialidade do mármore seria o branco.
A luz celeste absorvida pela lanterna dirige-se para dentro da igreja,
especificamente, para a cruz do altar. Nesse ponto da cruz, ocorre uma fusão
de luzes, já que a cruz também recebe a luz projetada pela rosácea do portal
principal. Na convergência de todos os pontos no infinito, está Deus.
Aproximar a cúpula de Brunelleschi à Catedral de Brasília poderá
parecer algo impossível ou estranho. No entanto, a Catedral de Brasília, opera
sínteses de fragmentos arquitetônicos de outros tempos- espaços, construindo
o espaço arquitetônico como um simulacro.
Os costelões de concreto atrelados uns aos outros propõem uma
decomposição de força vetorial, em que a força vertical é absorvida pela
fundação e, a horizontal, na junção superior dos pilares. Trata-se de um
sistema estrutural muito simples que se associa, analogicamente, a uma tenda
indígena.
Niemeyer ao usar a mesma estrutura de forças da tenda indígena faz
rememorar a história daquele espaço que, à semelhança de Roma, que está
sobre escombros de uma Roma antiga, Brasília ergue-se como cidade
projetada.
A estrutura que se assemelha a uma tenda indígena, parece reler, ao
inverter a relação côncavo/convexo, a cúpula de Brunelleschi, apresentando,
no entanto, a igreja como uma grande lanterna. Opera-se, dessa maneira, um
processo de fragmentação e deslocamento de significados que revela a igreja
como um espaço-luz.
Por sua vez, a relação concreto armado e vidro rememoram e
ressignificam, simultaneamente, os vitrais góticos. Lá a luz do sol atravessa e
ilumina a narração de cenas da vida de Cristo. Aqui, a técnica do vitral, como
estrutura de mosaico, satura-se e constrói a igreja como se fosse um
caleidoscópio.
O reflexo da luz, possibilitado pela água do fosso e a estrutura
fragmentária do vitral narra cenas-cores atmosféricas que não só se
diferenciam de acordo com a luz do dia, da noite e das condições
meteorológicas, como também permitem a construção de imagens-paisagens
diferentes, dependendo de onde se coloca o receptor. Essas cenas-cores
permitem rememorar e associar-se a outros fragmentos de imagem-paisagem.