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AULA SOBRE A LIBERDADE DE EXPRESSÃO DOS POLICIAIS E BOMBEIROS MILITARES. INTRODUÇÃO[1] No início do exercício profissional na caserna do Corpo de Bombeiros Militar do Estado de Mato Grosso no ano de 2004, teve-se a oportunidade de presenciar as péssimas condições de trabalho, a insuficiência de qualificação técnico- profissional, além de diversas práticas abusivas cometidas pelos superiores contra os servidores de baixa patente. Tais circunstâncias geram, obviamente, insatisfação e desmotivação nestes servidores, que repercuti diretamente na qualidade da prestação do serviço de segurança pública à sociedade que, por sua vez, deixa de confiar ou valorizar a instituição, fazendo perpetuar o insucesso da segurança pública. Foi observado, no entanto, que mesmo diante dos problemas e dos abusos, os militares de baixa patente se quedavam inertes e calados por medo de perseguições e mais abuso que vem revestido de uma fictícia legalidade, visto que o Regulamento Disciplinar Militar do Estado de Mato Grosso, Decreto nº 1239, de 21 de abril de 1978, prevê pena de até 30 (trinta) dias de prisão ao militar que criticar ato do governo ou de superior hierárquico ou por recorrer ao judiciário sem antes esgotar a esfera administrativa, pois

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AULA SOBRE A LIBERDADE DE EXPRESSÃO DOS POLICIAIS E BOMBEIROS MILITARES.

INTRODUÇÃO[1]

No início do exercício profissional na caserna do Corpo de Bombeiros Militar do

Estado de Mato Grosso no ano de 2004, teve-se a oportunidade de presenciar

as péssimas condições de trabalho, a insuficiência de qualificação técnico-

profissional, além de diversas práticas abusivas cometidas pelos superiores

contra os servidores de baixa patente.

Tais circunstâncias geram, obviamente, insatisfação e desmotivação nestes

servidores, que repercuti diretamente na qualidade da prestação do serviço de

segurança pública à sociedade que, por sua vez, deixa de confiar ou valorizar a

instituição, fazendo perpetuar o insucesso da segurança pública.

Foi observado, no entanto, que mesmo diante dos problemas e dos abusos, os

militares de baixa patente se quedavam inertes e calados por medo de

perseguições e mais abuso que vem revestido de uma fictícia legalidade, visto

que o Regulamento Disciplinar Militar do Estado de Mato Grosso, Decreto nº

1239, de 21 de abril de 1978, prevê pena de até 30 (trinta) dias de prisão ao

militar que criticar ato do governo ou de superior hierárquico ou por recorrer ao

judiciário sem antes esgotar a esfera administrativa, pois nunca, dentro da

caserna matogrossense, se discutiu a vigência de tal Regulamento Disciplinar

que sequer foi recepcionado pela nova ordem constitucional.

Assim, este trabalho visa demonstrar a ilegalidade das normas militares

cerceadoras da livre manifestação do pensamento, como afronta à dignidade

da pessoa humana do profissional da segurança pública, motivo pelo qual se

propõe a criação de políticas públicas para efetivamente garantir o exercício de

tal direito, a fim de possibilitar que temas como a discriminação, corrupção,

abusos e as demais dificuldades da segurança pública venham à tona para

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propiciar a plena discussão dos temas relacionados à segurança pública,

criando um ambiente apto para a mudança e melhoria da segurança no Brasil.

Com efeito, há várias regras do Regulamento Disciplinar Militar e do Código

Penal Militar que não foram recepcionadas pela nova ordem constitucional,

porém o presente trabalho concentrar-se-á apenas no cerne para a solução

dos problemas da segurança pública, que é o discurso democrático, a criação,

a livre manifestação do pensamento.

A livre manifestação do pensamento é o pilar principal no qual se sustenta a

democracia, já que esta se pauta no debate livre à procura da melhor tomada

de decisão para o bem comum da sociedade. Não há democracia nem Estado

Democrático de Direito sem a livre manifestação do pensamento, motivo pelo

qual o seu cerceamento leva ao autoritarismo e ao descontrole da atividade

governamental.

A liberdade de expressão é definida como direito natural, decorrente da própria

natureza humana, sendo, portanto, um direito fundamental, intransferível e

inerente ao direito da personalidade e à dignidade da pessoa humana. É um

direito individual com repercussão nos direitos coletivos e difusos, visto que o

Estado Democrático de Direito depende de cidadãos informados, conscientes e

politizados aptos a tomar decisões para a melhoria da coletividade. Nesse

sentido, o Ministro do Supremo Tribunal de Federal, Marco Aurélio[2], sintetiza

que a Liberdade de Expressão é um direito fundamental do cidadão,

envolvendo o pensamento, a exposição de fatos atuais ou históricos e a crítica.

A Declaração de Direitos humanos e do Cidadão, de 1789, em seu artigo 11

dispõe que a livre a manifestação do pensamento e das opiniões é um dos

direitos mais preciosos do homem.

Pontes de Miranda[3] pondera que liberdade psíquica é a base para toda e

qualquer liberdade, abrangendo tudo que serve para enunciar e dar sentido,

incluindo a liberdade de manifestar para com as demais pessoas ou enquanto

ao homem consigo mesmo.

Norberto Bobbio[4], em obra o futuro da Democracia, define democracia como

“um conjunto de regras de procedimento para a formação de decisões coletivas

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em que está prevista e facilitada a participação mais ampla possível dos

interessados” e Edilson Faria[5] ensina brilhantemente que democracia e

censura são termos antitéticos, antagônicos, inconciliáveis.

Com efeito, a livre circulação de opiniões e pluralismo ideológico faz oposição

ao monopólio governamental. Assim, ao se vedar ou limitar o direito à liberdade

de expressão, institui-se um sistema antidemocrático e autocrata.

Nesta seara, democracia versus censura, Pinto Ferreira[6], leciona que no

Estado Democrático, defende-se, no aspecto positivo, a livre manifestação do

pensamento e, sob o aspecto negativo, veda-se qualquer tipo de censura,

impedindo que a liberdade de expressão sofra algum tipo de limitação prévia

concernentes à censura de natureza política, ideológica ou artística.

Desmond Fischer[7] afirma que a evolução gradual da democracia faz um

paralelo com desmistificação do processo de comunicação e a conseqüente

disseminação da informação e dos meios de comunicá-la, pois quanto mais

pessoas tiverem informações, melhor será a sociedade e mais forte sua base

democrática, pois o direito de comunicar-se ultrapassa o conceito legal e

alcança o conceito filosófico e ético, já que é no nível político, sócio-culturais,

econômicas e legais do direito de comunicar se tornam mais significativos,

devendo, portanto, garantir esse direito em sua plenitude.

A manifestação do pensamento, para Aluizio Ferreira[8] É pressuposto para

uma convivência democrática plena, uma vez que necessita de discussão,

negociação, oposições e embates de idéias, pois estas são instrumentos de

que se valem para firmar suas convicções, persuadindo ou convencendo os

respectivos pares e obtendo unanimidades ou consensos.

Todavia, durante o período militar (1964-1985), viveu-se sob uma política

governamental autoritária e antidemocrática, movida pela censura e pela

manipulação das informações pelo Estado. A liberdade de expressão da

sociedade, civil ou mesmo militar, era controlada pela alta cúpula do governo

que buscava, independentemente de quaisquer meios ou força, perpetuar-se

no poder.

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Muita coisa mudou com o fim do governo militar, mas ainda restam resquícios

daquele período funesto. A diminuição da censura com advento da

promulgação da Constituição da República foi um significativo avanço político,

social, cultural e científico ao país, no entanto a censura continua existindo em

vários setores da sociedade, com destaque especial às instituições da

segurança pública, principalmente as militares, já que nestas instituições vive-

se um verdadeiro período de “cala a boca”, propiciada pela aplicação de

algumas normas que não foram sequer recepcionadas pelo novo ordenamento

jurídico.

Nesse sentido, continuam sendo ilegalmente aplicados, especificadamente ao

que concerne à liberdade de expressão, o artigo 166 do Decreto-Lei nº 1.001,

de 21 de outubro de 1969 e outras normas, com o mesmo fim, dispostas nos

Regulamentos Disciplinares Militares das Polícias Militares.

Tais institutos, cerceadores da liberdade de expressão, devem ser

imediatamente expurgos do nosso ordenamento jurídico, pois somente à

Constituição cabe a regulação da liberdade de expressão nos termos do artigo

220, o qual se transcreve com destaques:

“Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a

informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer

restrição, observado o disposto nesta Constituição.”

Assim, todo e qualquer tipo de censura ou cerceamento à liberdade de

expressão disposta em lei é inconstitucional, visto que cabe somente à

Constituição Federal tal regulação, como se demonstrará neste trabalho.

A alternativa encontrada pelos servidores da segurança pública, principalmente

os militares, foi recorrer à tecnologia da internet, fazendo uso dos blogs como

meio para manifestação do pensamento e discussão pela melhoria da

prestação dos serviços de segurança à sociedade, bem como pela busca

incessante por valorização profissional e otimização das condições de trabalho

do policial.

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1. CERCEAMENTO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO DOS MILITARES

Constantemente têm-se notícias de que militares foram punidos com prisão por

se manifestarem publicamente, ora por criticar ato de governo ou de superior

hierárquico ora por fazer reivindicações por melhoria da condição de trabalho.

Com advento do acidente do Boeing 737-800 da companhia Gol com Jato

Legaci, no qual morreram 154 (cento e cinqüenta e quatro) pessoas, veio à

tona a discussão da liberdade de expressão dos militares e a importância desta

manifestação à sociedade.

Em uma entrevista à Folha on line em 17 de abril de 2007[9], na qual se

discutia o acidente da Companhia Gol, o presidente da Associação Brasileira

de Controladores de Tráfego Aéreo, Wellington Rodrigues, afirmou que na

região onde aconteceu o acidente havia um “buraco negro”, uma “zona cega”

onde não se tinha visualização por radar e que as informações e problemas

eram repassados ao grau superior diariamente, porém nada ou quase nada foi

feito para melhorar a segurança do tráfico aéreo no Brasil.

Em 30 de Março de 2007 o Estadão[10] noticiou que o Sargento da

aeronáutica, Jonas Teixeira Junior, havia sido preso sob a alegação de

insubordinação por registrar, no livro de ocorrências oficial, irregularidades e

deficiências que podiam comprometer a segurança de vôo em Salvador,

procedimento este que havia sido proibido pelo comando do Cindacta local.

Ora, há quantas décadas o problema na segurança aérea já existe? Era

realmente necessária a morte de centenas de vítimas para se cogitar uma

mudança ou pelo menos para se discutir o problema?

Infelizmente não, mas a censura estatal sob a égide da “hierarquia e disciplina”

levou aqueles passageiros à morte. O que se busca com esse exemplo de

repercussão nacional é demonstrar a incoerência das normas militares que

punem injustamente a liberdade de expressão.

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Assim, as normas militares que cerceam a liberdade de expressão não

poderiam encontrar abrigo no atual Estado Democrático de Direito, mas que

devido ao abuso de poder dos superiores hierárquicos, bem como a não

declaração de que tais normas militares contrariam a Constituição, permitem

que os abusos se perpetuem com eficácia no nosso ordenamento jurídico.

Com efeito, os regulamentos disciplinares das Polícias Militares e das Forças

Armadas, bem como o Código Penal Militar proíbem a liberdade de expressão

dos militares, cominando penas restritivas de liberdade que podem chegar a

um ano.

Neste sentido estabelece o artigo 166 do Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de

outubro de 1969. Transcreve-se o tipo legal:

“Publicar o militar ou assemelhado, sem licença, ato ou documento oficial, ou

criticar públicamente ato de seu superior ou assunto atinente à disciplina

militar, ou a qualquer resolução do Govêrno:

Pena - detenção, de dois meses a um ano, se o fato não constitui crime mais

grave.”

Loureiro Neto[11], em análise do referido tipo penal, aduz que publicar significa

tornar público, notório, enquanto criticar significa censurar, dizer mau. Assim

configuraria crime a conduta de criticar publicamente, de modo a ser recebido

por indeterminado número de pessoas, ato de seu superior ou assunto atinente

à disciplina militar, ou a qualquer resolução do governo.

Os regulamentos disciplinares também estabelecem penas de prisão de até 30

(trinta) dias ao militar que manifeste seu pensamento. Remete-se à norma

disposta no item 70 e 101 do anexo II do Decreto 1329 de 1978 (Regulamento

Disciplinar da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso), o qual

semelhantemente é repetido na maioria dos Regulamentos Disciplinares no

Brasil. In Verbis:

“70 - Publicar ou contribuir para que sejam publicados fatos, documentos ou

assuntos policiais-militares que possam concorrer para o desprestígio da

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Corporação ou firam a disciplina ou a segurança”. (item 70 do anexo II do

RDPM-MT) (...)

“101 - Discutir ou provocar discussões, por qualquer veículo de comunicação,

sobre assuntos políticos, militares ou policiais-militares, excetuando-se os de

natureza exclusivamente técnicos, quando devidamente autorizado” (item 101

do anexo II do RDPM-MT)

O Código Penal Militar de 1969 e a maioria dos regulamentos disciplinares

militares das polícias estaduais são frutos de um Estado Autoritário, que por

mais de décadas cerceou as liberdades fundamentais com fito à proteção a

esse mesmo regime, visto que todos eles foram criados com este propósito.

Tais institutos cerceam a liberdade de expressão dos cidadãos militares,

afrontando diretamente o princípio fundamental da dignidade da pessoa

humana, limitando o direito pleno à vida dos militares e prejudicando a

sociedade que somente tem acesso a parte das informações. Informações

estas no mínimo manipuladas pelo Estado Militar, que sob a desculpa da

“segurança nacional” da hierarquia, disciplina, vem prendendo os militares que

ousam exercer o seu direito de liberdade de expressão.

Ao considerar como crime ou transgressão o exercício da liberdade de

expressão, retrocede-se ao período inquisitorial, ou pelo menos impedimos que

se alcance a democracia plena e de fato.

O Código Penal Militar como os Regulamentos Disciplinares remontam ao

período nefasto da ditadura, quase todos criados entre a década de 60 e 80,

período cujos objetivos dos governantes eram manter-se a qualquer custo no

poder, mesmo que este custo fosse a censura, um cala-boca, aos “anti-

governo”.

Toda norma legal tem como escopo a pacificação social o que nos obriga a

reconhecer como crime apenas as condutas perniciosas à sociedade, ou seja,

somente as condutas que exponham real perigo para coletividade devem ser

reprimidas por leis penais que não é o caso da manifestação do pensamento.

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A norma penal em um Estado Democrático de Direito exige mais do que a

mera tipificação em lei, pois tal requisito isoladamente é inidôneo para cecear

as liberdades fundamentais, devendo a conduta, além de estar tipificada,

ofender o sentimento social de justiça, bem como estar a norma

consubstanciada nos princípios constitucionais, não se admitindo critérios

absolutos na definição dos crimes, os quais passam a ter a exigência de ordem

formal e material.

A exigência formal, requisitada pelo o inciso II do artigo 5º da Constituição

Federal, a qual assevera que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer

alguma coisa senão em virtude de lei, deve ser interpretada em conjunto com o

princípio da dignidade da pessoa humana, exigência material.

Neste sentido, o professor Fernando Capez[12] leciona que a norma penal no

Brasil de hoje deve estar em compatibilidade formal e material com

mandamentos constitucionais, sob pena de afrontar o próprio Estado

Democrático de Direito:

“Com isso, pode-se afirmar que a norma penal em um Estado Democrático de

Direito não é apenas aquela que formalmente descreve um fato como infração

penal, pouco importando se ele ofende ou não o sentimento social de justiça;

ao contrário sob pena de colidir com a Constituição, o tipo incriminador deverá

obrigatoriamente selecionar, dentre todos os comportamentos humanos,

aqueles que possuem de fato real lesividade social.

Sendo a norma penal, princípio básico de República Federativa do Brasil,

constituída em Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º III) uma lei como

essa característica de mera discriminação formal será irremediavelmente

inconstitucional.

Assim, o tipo penal ou a sua aplicação, quando, a pretexto de cumprir uma

função de controle social, desvincula-se totalmente da realidade, sem dar

importância à existência de algum efetivo dano ou lesão social, padecerá

irremediavelmente do vício de incompatibilidade vertical com o princípio

constitucional de dignidade humana.”

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Com efeito, o fato de a conduta de “criticar publicamente ato de seu superior ou

assunto atinente à disciplina militar, ou a qualquer resolução do Governo” estar

tipificado como crime punível com prisão em um Código Penal Militar não faz

com que tal conduta seja criminosa, visto não trazer lesividade à sociedade,

muito pelo contrário, apenas pode-se dizer que vivemos em um Estado

Democrático de Direito se tivermos plena liberdade de expressão, limitada

apenas por valores constitucionais, onde a crítica, a informação, a

comunicação, estejam ao acesso de todos.

Nesta seara continua Fernando Capez:

“É imperativo do Estado Democrático de Direito a investigação ontológica do

tipo incriminador. Crime não é apenas aquilo que o legislador diz sê-lo

(conceito formal), uma vez que nenhuma conduta pode, materialmente, ser

considerada criminosa se, de algum modo, não colocar em perigo valores

fundamentais da sociedade.

Imaginemos um tipo com a seguinte descrição: ‘manifestar ponto de vista

contrário ao político dominante ou opinião contrária a orientação política

dominante. Pena: 6 meses a 1 ano de detenção.’

Por evidente, a par de estarem sendo obedecidas as garantias de existência de

subsunção formal e de veiculação em lei, materialmente esse tipo não teria

qualquer subsistência por ferir o princípio da dignidade humana e, por

conseguinte, não resistir ao controle de compatibilidade vertical com os

princípios insertos da ordem constitucional.”

Nesse mesmo sentido, Loureiro Neto[13] ensina que o objeto do Direito Penal,

seja o comum como o militar, é a proteção dos bens ou interesses

juridicamente relevantes, devendo valorá-los de acordo com o contexto

histórico e as concepções ético-políticas dominantes.

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Assim, taxar como crime a liberdade de expressão não faz com que tal conduta

seja criminosa, visto que materialmente a liberdade de expressão se trata de

uma conduta defendida e protegida pela própria Carta Magna Brasileira. Além

disso, observa-se, que a Constituição não faz distinção entre cidadãos civis e

militares, negros ou brancos, pobres ou ricos, pois a todos é garantindo a

manifestação do pensamento, limitando tal direito apenas à norma

constitucional.

Ademais, ao censurar as opiniões e a expressão dos militares, seja eles de

quaisquer patentes, impomos no país uma limitação de soluções para

segurança pública, impedindo as mudanças desejadas, pois, infelizmente,

alguns servidores beneficiam-se do caos na segurança pública, e estes não

almejam transformações.

Assim, ao não permitir a expressão das opiniões dos militares, monopoliza-se

as informações aos dogmas estatais ou aos interesses de certos comandantes,

os quais nem sempre são os condizentes à proteção da pátria, já que se tornou

comum o uso da máquina pública em benefício dos detentores do poder.

Não se pode negar que os atuais políticos diante de “problemas”,

principalmente na segurança pública, tentam ocultá-los ao invés de resolvê-los,

muitas vezes, falseando dados e informações. Por isso os servidores da

segurança pública deveriam divulgar a real situação de tais órgãos e serviços

para que a solução fosse dada o mais rápido possível, por meio do próprio

Governo do Estado ou por Intervenção Federal.

É inegável que um soldado, executor direto e detentor de conhecimentos

específicos na área de segurança pública, ao ser ouvido, poderá contribuir para

a melhoria dos serviços de proteção do homem. Agora, puni-lo por divulgar seu

pensamento na intenção de tentar melhorar a condição da segurança pública é

no mínimo ilógico e nefasto, além de ofender o Estado Democrático de Direito.

Assim, a proibição a manifestação do pensamento pelos militares, atenta

axiológica e teleologicamente contra os princípios que preconizam o interesse

da coletividade, já que os militares, por experiência e contato direto com o

sistema de segurança, conhecem os pormenores e as necessidades para

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redução da criminalidade. Ao se calarem diminuem a possibilidade de avanços

significativos no aparelho de segurança pública, já que informações

importantes deixarão de serem veiculadas, restringindo idéias que levariam a

sociedade à discussão e a vicissitudes que trariam mudanças na melhoria da

segurança.

Ao proibir as críticas aos atos dos superiores e ao governo, mascara-se a real

situação da segurança pública, já que a sociedade obtém apenas às

informações “oficiais” as quais são repassadas em proveito do próprio agente

da administração pública, uma vez que ninguém é capaz de assinar e divulgar

sua própria incompetência ou a inabililidade daquele que o nomeou ou o

colocou no poder.

Destarte, estas informações oficiais visam apenas demonstrar que os

governantes e os detentores do poder estão tomando as melhores decisões

para a efetiva e beníguina mudança na situação da segurança no país, quando

realmente a verdade real está longe daquilo que foi dito e que se conhece.

Neste sentido, é inadmissível e criminosa a ocultação ou censura de

informações relevantes à diminuição da criminalidade no Brasil e, por isso, é

impróprio permitir que se lance informações inverídicas ou maquiadas em

benefício de alguns, pois ao esconder as verdades, calando ou fazendo calar,

aflora-se a conivência para com a criminalidade, o que faz perpetuar o

insucesso da prestação do serviço de segurança pública à sociedade, pois

somente através do vislumbramento da realidade tem-se condição efetiva de

mudar este quadro.

Deve-se, ao contrário do que acontece, criar incentivos para que os militares se

expressem, denunciando as mazelas, os abusos, as corrupções e crimes,

mesmo que advenha de dentro da sua própria instituição, criando e

fomentando políticas públicas para a constante discussão do tema, inclusive,

criando programas efetivos de proteção aos servidores honestos que

denunciam os crimes cometidos pelos próprios operadores da segurança

pública.

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2. PROTEÇÃO LEGAL AO DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO

O cerceamento à livre manifestação do pensamento, atenta contra todo

ordenamento jurídico brasileiro, principalmente, contra a Constituição Federal e

aos vários Tratados Internacionais, incidindo para que o atual Estado

Democrático de Direito estabelecido no país regrida aos tempos da ditadura

militar.

Com efeito, a Constituição Federal estabelece que é livre a manifestação do

pensamento, a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de

comunicação, independentemente de censura ou licença e, ainda, garante que

a manifestação do pensamento não sofrerá qualquer restrição. Destaca-se os

incisos IV e IX do artigo 5º e o artigo 220 os quais transcrevo:

“Art. 5º (...)

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de

comunicação, independentemente de censura ou licença;

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a

informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer

restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena

liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação

social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e

artística.”

Ademais, quanto à Administração Pública, informar deixa de ser um direito e

passa a ser um dever, é o caso da publicidade obrigatória dos atos praticados

pela Administração pública, imposta pelo artigo 37 da Constituição Federal.

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O princípio da publicidade apresenta dupla acepção. Refere-se o princípio à

publicação oficial dos atos da Administração Pública como pressuposto de sua

eficácia, impedindo que o ato produza efeitos e a outra acepção concerne à

transparência e à moralidade, visto que é inaceitável a existência de atos

sigilosos ou confidenciais que pretendam criar, restringir ou extinguir direitos.

Tão verdadeira essa assertiva que a Constituição garante que todos têm direito

a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de

interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de

responsabilidade nos termos do artigo 5º, inciso XXXII. Neste sentido se

manifestou o eminente Ministro do STF, Carlos Ayres Brito[14]:

“Mais ainda, visibilidade que, tendo por núcleo o proceder da Administração

Pública, toma a designação de “publicidade” (art. 37, caput, da CF).

Publicidade como transparência, anote-se, de logo alçada à dimensão de

“princípio”, ao lado da “legalidade”, “impessoalidade”, “moralidade” e

“eficiência”. Sendo certo que a publicidade que se eleva à dimensão de

verdadeira transparência é o mais aplainado caminho para a fiel aplicação da

lei e dos outros três princípios da moralidade, da eficiência e da

impessoalidade na Administração Pública.”

No mesmo voto,15 o ministro relator enfatiza a garantia dada pela constituição

à liberdade de expressão:

“Com efeito, e a título de outorga de um direito individual que o ritmo de

civilização do Brasil impôs como conatural à espécie humana (pois sem ele o

indivíduo como que se fragmenta em sua incomparável dignidade e assim

deixa de ser o ápice da escala animal para se reduzir a subespécie), a

Constituição proclama que ”é livre a manifestação do pensamento, sendo

vedado o anonimato” (inciso IV do art. 5º). Assim também, e de novo como

pauta de direitos mais fortemente entroncados com a dignidade da pessoa

humana, a nossa Lei Maior estabelece nesse mesmo art. 5º que: a) “é livre a

expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,

independentemente de censura ou licença” (inciso IX); b) “é livre o exercício de

qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais

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que a lei estabelecer” (inciso XIII); c) ”é assegurado a todos o acesso à

informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício

profissional” (inciso XIV); d) “conceder-se-á habeas data: a) para assegurar o

conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de

registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter

público: b) para a retificação de dados, quando não prefira fazê-lo por

processo sigiloso, judicial ou administrativo” (inciso LXXII)”.

A livre manifestação do pensamento, também, é tutelada pelos Tratados

Internacionais celebrados pelo governo brasileiro, os quais garantem a todos o

direito amplo de se comunicar, sobre quaisquer assuntos nos limites impostos

pela própria Constituição.

Nesta seara, pode-se destacar o preâmbulo e o artigo XIX da Declaração

Universal dos Direitos Humanos, celebrado e ratificado pelo Brasil, que dispõe:

“Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos

resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e

que o advento de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a

salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do

ser humano comum,” (...)

"Todo o homem tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito

inclui a liberdade de, sem interferências, ter opiniões e de procurar, receber e

transmitir informações e idéias por quaisquer meios, independentemente de

fronteiras". (sem destaque na fonte)

O Brasil e outros países latino-americanos assinaram em 1996 e

posteriormente em 29 de maio de 2006 a Declaração Internacional de

Chapultepec no intuito de consagrar a liberdade de expressão e de imprensa.

A declaração estabelece que:

“I- Não há pessoas nem sociedades livres sem liberdade de expressão e de

imprensa. O exercício dessa não é uma concessão das autoridades, é um

direito inalienável do povo. II - Toda pessoa tem o direito de buscar e receber

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informação, expressar opiniões e divulgá-las livremente. Ninguém pode

restringir ou negar esses direitos.

Ainda há o Pacto de São José da Costa Rica, a Declaração Americana Sobre

Direitos Humanos, aprovada pelo Congresso Nacional e ratificada pelo

presidente da República por meio do Decreto 678/92, de 6-11-92[15] que

dispõe que em seu artigo XIII:

"Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse

direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e

idéias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por

escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de

sua escolha. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios

indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de

imprensa, de freqüências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos

usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados

a obstar a comunicação e a circulação de idéias e opiniões".

Enfim, Constituição Federal e os Tratados Internacionais mencionados,

garantem de forma ampla, geral e irrestrita, aos civis ou militares, a liberdade

de expressão, proibindo qualquer forma de registro, licença ou censura.

José Afonso da Silva[16] ensina que direito de liberdade de expressão e

comunicação obedecem aos seguintes princípios:

a) Não sofrerão qualquer restrição independentemente do meio ou veículo de

comunicação, observado o disposto na Constituição;

b) Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena

liberdade de informação jornalística;

c) É vedada toda e qualquer forma de censura de natureza política, ideológica

e artística;

d) A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de

autoridade;

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e) Os serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens dependem de

autorização, concessão ou permissão do Poder Executivo Federal, sob controle

do Congresso Nacional;

f) Os meios de comunicação não podem ser objeto de monopólio.

Porém, mesmo com o advento de toda tutela jurídica em proteção à

manifestação do pensamento, os militares encontram-se tolhidos de se

expressar.

3. MANIFESTAÇÃO DO STF QUANTO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO DOS

MILITARES

Em maio de 1998, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou habeas corpus nº

75.676 - RJ no qual figurou como paciente um militar da reserva que fora

acusado de crime de publicação ou crítica indevida (artigo 166 do CPM) por ter

concedido uma entrevista à rede rádio CBN, na qual criticou publicamente ato

do Comandante Geral da PMRJ, o governo do Estado, os cursos de formação

profissional ministrados aos policiais e à política de segurança pública.

Transcrevo as palavras tidas como criminosas:

“... esses policiais que estão indo pro confronto estão completamente

despreparados, eles não fazem treinamento de tiros há anos. Eles não são

avaliados nas suas condições profissionais, nas suas condições emocionais”.

(...)

“E como a Secretaria de Segurança não faz o que deve ser feito, o Governo

não faz aquilo que tem obrigação de fazer, lança mão dessas soluções

mágicas, entende?(...)

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Porque, na verdade, no Rio de Janeiro se reinstalaram o DOI-CODI, mas só

para favelado e morador de bairro pobre”.

O eminente Ministro relator Sepúlveda Pertence aduziu ao parecer do Dr

Edson de Almeida, pela procuradoria-Geral, para ratificar a concessão do

habeas Corpus. Nesse parecer asseverou-se que as Polícias Militares são

apenas corporações militarizadas, cuja função é de policiamento ostensivo e de

preservação da ordem pública, função esta eminentemente civil. Ainda

acrescentou que as proibições do artigo 166 do CPM são censuras.

Transcreve-se:

“Ora, ao contrário do que ocorre com as Forças Armada, que são instituições

militares pela sua própria natureza, as Polícias Militares, cuja função de

policiamento ostensivo e de preservação da ordem pública é eminentemente

civil, são apenas corporações militarizadas mas, nem por isso, assumem,

contra a natureza das coisas, status de instituições militares”(...)

“Em verdade, submeter o policial militar da reserva ou reformado às proibições

do artigo 166 do Código Penal Militar, sequer se cogitando de manifestações

ofensivas, representa clara limitação à livre manifestação do pensamento e

estabelecimento de uma forma de censura” (CF art. 5, IV e IX)

Foi discutida, também, a manifestação do pensamento por militar no Habeas

Corpus 83.125-7 julgado em 16/09/2003, cujo relator foi expressivo Ministro

Marco Aurélio. Nesse Habeas Corpus, buscava a concessão para extirpar o

crime tipificado no artigo 219 do CPM o qual considera crime propalar fatos,

que sabe inverídicos, capazes de ofender a dignidade ou abalar o crédito das

forças armadas ou a confiança que estas merecem do público (artigo 219 do

CPM).

Nesse caso, o paciente havia publicado livro intitulado “Feridas da Ditadura

Militar” abordando temas, tidos como ofensivo ao Exercito, tais como

desapropriação realizada pela União de terras pertencentes a pequenos

agricultores no município de Formosa, Estado de Goiás, destinado toda sua

extensão para o inadequado uso militar; torturas praticadas durante o período

militar e sobre a guerrilha do Araguaia.

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O ministro relator iniciou seu voto afirmando que não há Estado Democrático

de Direito sem observância da liberdade de expressão, estando garantido tal

direito fundamental no artigo 5º da Constituição Federal. Acrescenta que o

artigo 220 da Constituição Federal preceitua que a manifestação do

pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma,

processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado os limites

impostos pela mesma Constituição.

Ainda neste julgado o Ministro Marco Aurélio destaca parecer da Procuradoria

Geral da República, o qual se faz importante transcrever:

“Não há absolutamente nada na denúncia que demonstre, de forma

inequívoca, que os fatos propalados pelo recorrido sejam inverídicos, falsos,

mentirosos, caluniosos, muito menos que ele tivesse plena consciência disso.

Aliais seria verdadeiramente aberrante tachar de inverdade uma tela tão triste

da nossa história recente como o da repressão e da tortura, nem se podendo,

em nome da proteção da honra e da intimidade, restringir a livre manifestação

do pensamento quando se trata da discussão e crítica de arbitrariedades

patrocinadas ou consentidas pelo Poder Público...”

Em análise de liminar referendada pelo Tribunal Pleno do STF, da ação

arguição de descumprimento de preceito fundamental nº 130[17], o eminente

Ministro Carlos Brito consignou que a referida lei de imprensa não mais se

enquadra aos padrões da Democracia, visto que a liberdade de expressão

deve se obstar apenas aos preceitos dispostos na Constituição, motivo pelo

qual se suspendeu os efeitos da Lei de imprensa até o julgamento de mérito

que acabou por declarar tal lei incompatível com a Constituição Federal.

Vejamos trecho da decisão em liminar:

“Em que pese a ressalva do relator quanto à multifuncionalidade da ADPF e

seu caráter subsidiário, há reiterados pronunciamentos do Supremo Tribunal

Federal pela aplicabilidade do instituto. Princípio constitucional de maior

densidade axiológica e mais elevada estatura sistêmica, a Democracia avulta

como síntese dos fundamentos da República Federativa brasileira. Democracia

que, segundo a Constituição Federal, se apóia em dois dos mais vistosos

pilares: a) o da informação em plenitude e de máxima qualidade; b) o da

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transparência ou visibilidade do Poder, seja ele político, seja econômico, seja

religioso (art. 220 da CF/88).

A Lei n. 5.250/67 não parece serviente do padrão de Democracia e de

Imprensa que ressaiu das pranchetas da Assembléia Constituinte de 87/88.

Entretanto, a suspensão total de sua eficácia acarreta prejuízos à própria

liberdade de imprensa. Necessidade, portanto, de leitura individualizada de

todos os dispositivos da Lei n. 5.250/67. Procedimento, contudo, que a

prudência impõe seja realizado quando do julgamento de mérito da ADPF.

Verificação, desde logo, de descompasso entre a Carta de 1988 e os seguintes

dispositivos da Lei de Imprensa, a evidenciar a necessidade de concessão da

cautelar requerida (...)”

4. RELATIVIZAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

É verdadeira a assertiva de que não há nenhum direito absoluto, por mais

fundamental que seja, já que todo direito tem como correspondente um dever.

Nem o direito a vida se coloca absoluto, já que este direito é relativizado

quando se admite a pena de morte nos casos de guerra declarada.

Os direitos concernentes à livre manifestação do pensamento, conforme afirma

Luis Gustavo G.C de Carvalho[18], são de eficácia plena, não admitindo

qualquer tipo de contenção por lei ordinária a não ser meramente confirmativa

das restrições que a própria constituição menciona nos incisos do artigo 5º.

Assim se há limites à liberdade de informação eles decorrem necessariamente

da Constituição que são o direito à intimidade, direito à imagem, direito à honra

e os valores éticos sociais.

Assim, por exemplo, a declaração do direito de liberdade de expressão, taxado

no inciso IV do artigo 5º da CF, está limitado no mesmo corpo do dispositivo,

pois se declara um direito “é livre a manifestação do pensamento” e logo em

seguida se exige um dever “vedado o anonimato”, ou, ainda, garante-se um

direito “é livre a manifestação do pensamento” e em seguida se impõe uma

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responsabilidade para quem abusa deste direito “são invioláveis a intimidade, a

vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a

indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação[19]”.

Ademais, como expõe Sylvio Motta[20], que os direitos individuais têm

hierarquia constitucional e, por conseguinte, só podem ser limitados por

expressa autorização legal com fundamento na própria constituição. Assim, os

direitos fundamentais ou são limitados pela própria constituição ou por lei

criada por determinação constitucional.

No caso dos direitos de liberdade de expressão, incluído, a manifestação do

pensamento, a atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, a

relativização é permitida apenas através da própria constituição.

A exemplo, pode-se destacar o artigo 220 da CF que assevera “A manifestação

do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma,

processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto

nesta Constituição”.

Observe que o texto constitucional é incisivo “nos termos desta constituição”,

não dando margem à relativização do deito a liberdade de expressão por via de

lei infraconstitucional. Assim, apenas a Constituição Federal está autorizada a

relativizar o direito a liberdade de expressão.

Ademais, os direitos fundamentais têm garantida a aplicabilidade imediata,

conforme parágrafo primeiros do artigo 5º da CF[21], não precisando de lei

para torna efetivo tal exercício, com exceção dos direitos fundamentais em que

a própria constituição exige regulamentação por lei. Nestes casos, chamados

de normas de eficácia contida, a constituição faz referência à expressão “na

forma da lei”.

Não é caso dos direitos concernentes à liberdade de expressão, que além de

ter sua aplicação imediata, só podem ser limitados pelas normas expressas no

texto constitucional.

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Neste mesmo sentido já se manifestou o Supremo Tribunal Federal:

"Liberdade de expressão. Garantia constitucional que não se tem como

absoluta. Limites morais e jurídicos. O direito à livre expressão não pode

abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral que implicam

ilicitude penal. As liberdades públicas não são incondicionais, por isso devem

ser exercidas de maneira harmônica, observados os limites definidos na própria

Constituição Federal (CF, artigo 5º, § 2º, primeira parte). O preceito

fundamental de liberdade de expressão não consagra o ‘direito à incitação ao

racismo’, dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda

de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra. Prevalência

dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica."[22]

É obvio que a liberdade de expressão é inerente ao ser humano, fazendo parte

do direito à vida em lato senso, porém é não absoluto e encontra limites dentro

da própria Constituição Federal a fim de proteger outros direitos fundamentais.

Nesse sentido transcreve-se trecho do voto do ministro Carlos Brito exarado na

ação de ADPF 130:

“É de se perguntar, naturalmente: mas a que disposições constitucionais se

refere o precitado art. 220 como de obrigatória observância no desfrute das

liberdades de pensamento, criação, expressão e informação que, de alguma

forma, se veiculem pela imprensa? Resposta: àquelas disposições do art. 5º,

versantes sobre vedação do anonimato (parte final do inciso IV); direito de

resposta (inciso V); direito a indenização por dano material ou moral à

intimidade, à vida privada, à honra e imagem das pessoas (inciso X); livre

exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações

profissionais que a lei estabelecer (inciso XIII); direito ao resguardo do sigilo da

fonte de informação, quando necessário ao exercício profissional (inciso XIV)”.

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Portanto, é livre a manifestação do pensamento desde que identificável o seu

autor[23], pois ao autor deve recair os efeitos da expressão do próprio

pensamento, recebendo os devidos créditos ou respondendo pelos abusos que

por ventura ocorra.

Portanto, a manifestação do pensamento estará condicionada ao não

anonimato, mas há exceções. Quando as informações prestadas possam

colocar em risco a vida do informante, este tem o direito de se manter oculto,

como, por exemplo, nas delações contra organizações criminosas, inclusive, tal

atitude é incentivada pelo Estado através dos disk denúncias.

Também, assegura-se o sigilo quanto às fontes de origem de informações

recebidas ou recolhidas por jornalistas, rádio-repórteres ou comentaristas[24]

nos casos em que o informante possa sofrer retaliações ou risco de morte,

respondendo aos abusos, neste caso, quem divulgar a informação.

Da mesma forma, o direito à manifestação do pensamento encontra óbices nos

casos de danos à personalidade, discriminação ou racismo, pois o Estado

brasileiro busca o bem de todos sem preconceito de origem, raça, cor, religião,

trabalho, idade e quaisquer outras formas de discriminação[25], primando pela

isonomia perante a lei[26] e pela tutela à personalidade, conforme rol do artigo

5º:

“V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da

indenização por dano material, moral ou à imagem; (...)

X -são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das

pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral

decorrente de sua violação”.

A manifestação do pensamento discriminatória está estritamente proibida,

respondendo o autor, na esfera cível, pelos danos morais e patrimoniais

causados pela informação e, na esfera penal, responderá pelos crimes de

injúria, difamação ou racismo.

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Ana Marina Nicolodi[27], em seu artigo intitulado Conflitos entre direitos

fundamentais – liberdade de imprensa versus direito à vida privada, direito à

imagem e direito à honra, publicado na Revista Jus Vigilantibus, discorre que o

direito à intimidade e à imagem são de igual hierarquia constitucional à

liberdade de expressão e de informação, não subsistindo diferença de

qualidade entre os direitos juridicamente tutelados, sendo possível a

prevalência, por meio de ponderação casuística entre os bens e valores

jurídicos sub examine.

Assim, quando se conflitam direitos fundamentais, caberá aos aplicadores da

lei, analisando as peculiaridades de cada caso concreto, ponderar os bens

jurídicos, valorando, por meio da razoabilidade, à qual direito fundamental

deverá ser restringido para fazer prevalecer a unidade axiológica da

Constituição Federal.

5. A INTERNET COMO ALTERNATIVA À LIBERDADE DE EXPRESSÃO DOS

MILITARES.

A rede mundial de computadores, popularmente conhecida de internet, foi uma

verdadeira revolução ao sistema de comunicação mundial, propiciando a troca

de informações por quase todo o planeta. Trata-se de um conglomerado de

computadores interligados por rede que possibilita a transferência de dados.

De acordo com informações extraídas da Winkpédia[28], a internet era utilizada

no ano de 2007 por 16,9 % da população mundial, cerca de 1,1 bilhões de

pessoas. Hoje estima-se que esse número ultrapassa os de 1,7 bilhão de

pessoas. .

Surgiu durante o período da Guerra Fria (1947-1991), com intuito de armazenar

informações secretas dos Estados Unidos em caso de ataque da Ex União

Soviética. Em menos de 04 (Quatro) anos de criação, a internet já conseguia

atingir cerca de 50 (cinquenta) milhões de pessoas.

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Em 1997, com a popularização da internet, surgiram os blogs que são uma

espécie de sites com estrutura para atualização rápida e simples, organizados

de forma cronológica inversa, podendo ser escrito por uma ou mais pessoas. A

maioria deles funciona como um diário “on line”, onde o autor escreve seu

pensamento, coloca fotos, vídeos, musicas, etc, possibilitando a interação entre

leitores e autores através de espaços reservados para comentários.

Os blogs dominaram a internet. No ano de 2007 já eram mais de 112 milhões

de blogs por todo o mundo, tratando dos mais variados assuntos e, por isso, a

palavra blog assumiu o significado de mídia onde o indivíduo expresse sua

opinião[29].

Os servidores do setor da segurança pública viram a nova idéia como forma de

discutir os assuntos relacionados às suas atividades, tecendo críticas e

propondo inovações ou simplesmente repassando as notícias de interesse às

categorias.

A participação dos servidores da Segurança Pública no Brasil em blogs ainda é

pequena, mas vem crescendo rapidamente. De acordo com informações

extraídas blog Diário de um policial Militar[30], em 2006 havia 7 (sete) blogs

relacionados à segurança pública e polícia, todos do Rio de Janeiro. No início

do ano de 2008 essa lista contava com 37 (trinta e sete) blogs distribuídos em

nove Estados brasileiros, no final de 2008 esta lista já ultrapassava 60

(sessenta) blogs distribuído em 14 (quatorze) Unidades Federativas, conforme

tabela 1 e 3 anexas.

Durante os meses de abril e maio de 2009, tentou-se, de forma simplória,

analisar a atuação destes 60 (sessenta) blogs relacionados à segurança

pública com intuito de verificar sua relação com a liberdade de expressão dos

servidores da segurança pública.

O primeiro tópico analisado nos blogs foi a territoriedade. A Unidade da

Federação que mais possui blogs relacionados com a segurança pública é o

Estado do Rio de Janeiro, tendo catalogado 27 (vinte sete) blogs, em segundo

lugar vem o Estado de São Paulo com 8 (oito) blogs, depois vem Bahia e

Distrito Federal com 4 (quatro) blogs, em seguida aparece o Estados do Rio

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Grande do Sul com 3 (três) blogs, depois contando com (02) dois blogs

aparecem os Estados do Mato Grosso, Minas Gerais, Piauí e Sergipe. Os

Estados de Amapá, Goiás, Pará, Pernambuco, Rio Grande do Norte contam

com apenas 01 (um) blog. Não foram observados a existência de blogs nos

demais Estados brasileiros. (Ver Tabelas 1 e 2 anexas).

O fato de os servidores da segurança pública do Estado do Rio de Janeiro

serem os pioneiro e os que mais aderiram ao novo sistema de mídia digital, os

blogs, como meio de exercer a liberdade de expressão, é facilmente explicado

pelas péssimas condições de trabalho, pela falta de garantia de direitos, entre

os quais destaco que são os servidores da segurança pública pior

remunerados do Brasil, bem como por serem os que mais morrem e matam em

combate ao crime.

Outro fato observado, foi crescimento expressivo dos blogs entre os servidores

da segurança pública, acumulando o crescimento de aproximadamente 1000%

(mil por cento) em dois anos, fato que tornou objeto de estudo das Nações

Unida para Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em parceria com o

centro de Estudo de soluções para a segurança pública (CESeC) da

Universidade Cândido Mendes, do Rio de Janeiro conforme noticiou-se a

Agencia do Estado em artigo escrito por Mário Sergio Lima[31] . (Ver tabelas 1

e 3 anexas)

Assevera ainda Mário Sergio Lima que além do exercício do direito à liberdade

de expressão exercida pelos servidores da segurança pública por meio dos

blogs, essa tendência trouxe mais motivação à categoria que vem ampliando a

discussão e trocando informações entre eles. Aponta ainda que a explicação

para o fenômeno crescente dos blogs dá-se devido ao choque entre os novos

policiais que vem entrando na corporação.

Estão em voga nos blogs dois temas principais. A melhoria da condição de

trabalho e salários e por outro lado a censura, inclusive, com notícias de

punições disciplinares decorrente de crítica ao governo e ao sistema de

segurança pública entre os quais destaco os blogs do Maj Wanderby[32] e o

Jusmilitar[33] cujo blog é de minha autoria. .

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Acessando a cada um dos 60 (sessenta) blogs, pôde-se observar, também,

que cerca de 30% (trinta por cento) deles são de autores anônimos, bem como

uma a maioria dos comentários de leitores são postados por anônimos. (ver

tabelas 1 e 4 anexas)

Com efeito, ao criarmos blog Jusmilitar- site em defesa dos militares em julho

de 2007, foi possível observar que cerca 90% (noventa por cento) dos

comentários e acessos vêm de servidores da segurança pública e entre esses

comentários pelo menos 80% (oitenta por cento) são postados anonimamente

ou são identificados através de pseudônimos.

O anonimato entre os servidores da segurança pública advém, em regra, não

por força de normativa, visto que quando a declaração não vai de encontro ao

interesse do governo ou do comandante o militar não é repreendido, todavia

quando o militar se expressa de forma contrária ao interesses dos detentores

do poder a punição ou perseguição é certa. A título de exemplo, dos meus

cinco anos de trabalho no Corpo de Bombeiros Militar do Estado de Mato

Grosso eu nunca havia sido convidado a participar de uma reunião deliberativa

na Instituição. A primeira, da qual participei foi justamente a Conferência

Municipal do CONSEG (Conferência Nacional de Segurança Pública) em

Cuiabá-MT e quando se teve a oportunidade de se expressar, comentando das

dificuldades encontradas e da necessidade da melhoria da condição de

trabalho, este autor foi repreendido com a seguinte frase: “Lopes, se você está

achando ruim, pede baixa”. Absurdo!

Tais fatos nos demonstram que o cerceamento da liberdade de expressão, o

medo e a injustiça pairam sobre os servidores da segurança pública de baixa

patente. Desta forma, a alternativa encontrada para minimizar a censura foi a

internet por meio dos blogs, local propício à discussão em prol da melhoria da

segurança publica no Brasil.

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6. CONCLUSÃO.

Todos - militares e civis - têm direito à liberdade de pensamento e de

expressão, podendo buscar, receber e difundir informações e idéias,

verbalmente ou por escrito, artística ou cientificamente por qualquer processo

ou meio que deseje, não podendo o Estado ou instituições proibir ou cercear

esse direito sob o pretexto de “segurança nacional” ou “hierarquia e disciplina”,

visto que a liberdade de expressão é fundamento de um Estado Democrático

de Direito, inclusive, tutelada constitucionalmente nos termos dos incisos IV, IX,

XIII, LXXII do art. 5º.

A livre manifestação do pensamento foi uma conquista difícil em progressão

histórica na qual se destaca, dentre muitos, que os principais acontecimentos

que sucederam até o pleno reconhecimento desse direito: Declaração dos

Direitos do Bom povo de Virgínia (1776),a Revolução Francesa e a Declaração

dos Direitos do Homem (1789), a Declaração Universal dos Direitos do Homem

(1948), Constituição da República Federativa do Brasil (1988) e o

reconhecimento pela Corte Constitucional Brasileira, Supremo Tribunal

Federal, de que a liberdade de expressão é livre nos termos da constituição,

sendo portanto inconstitucional a sua regulamentação por lei. (2009)[34].

Nestes termos, o artigo 166 do Código Penal Militar, bem como as normas

dispostas nos Regulamentos Militares que restrinjam ou cause embaraços à

livre manifestação do pensamento são normas atentatórias aos fundamentos

do Regime Democrático e da Republica Federativa do Brasil e, por isso, deve

ser expurgada para sempre do nosso sistema jurídico.

Considerar como crime a liberdade de expressão dos militares é torná-los parte

de uma subclasse de cidadãos, já que não lhe são garantidos a plenitude dos

direitos fundamentas, principalmente ao que concerne à livre manifestação do

pensamento que é um direito inerente à espécie humana, deixando-o à escala

de mero animal.

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É livre a manifestação do pensamento, a expressão da atividade intelectual,

artística, científica e de comunicação, a criação, a informação, sob qualquer

forma, processo ou veículo, não podendo nenhuma lei restringir tais direitos,

sendo, portanto, vedada toda e qualquer censura de natureza política,

ideológica e artística, assim como, veda-se a aplicação de qualquer sanção

não disposta na Carta Magna Brasileira, pois é límpida essa garantia no inciso

IV do artigo 5º o qual expõe que “é livre a manifestação do pensamento, sendo

vedado o anonimato”, não havendo, em hipótese alguma, a possibilidade de

cogitar que tal direito seja vedado ao militar, pois retiraria deste a dignidade da

pessoa humana, bem como roubaria da sociedade o direito ao acesso à

informação plena, impondo ao país um período de Exceção oculta.

Conclui-se, portanto, que o único meio idôneo a melhoria da prestação de

serviço em segurança pública no Brasil é a garantia de proteção dos direitos

fundamentais de todos os cidadãos - inclusive os da segurança pública –

através de políticas sociais e sistema normativo legítimo, democrático e

obediente aos princípios constitucionais, criando um ambiente apto à discussão

aberta e coerente acerca da segurança pública e dos meios para a construção

de uma sociedade livre, justa e solidária, com garantia de desenvolvimento e

erradicação das todas as formas de discriminação.

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http://www.diariodeumpm.net/2006/11/25/a-blogosfera-da-seguranca-publica-

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LIMA, Mário Sérgio Lima. Agencia do Estadão. Blogosfera Policial Cresce e

vira estudo da ONU. www.estadao.com.br/noticias/cidades,blogosfera-policial-

cresce-no-brasil-e-vira-estudo-da-onu,352987,0.htm. Acesso em 20 de maio de

2009.

REVISTA JUS VIGILANTIBUS, Segunda-feira, 1º de outubro de 2007

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023 Referências

bibliográficas, NBR 6024 Numeração progressiva das seções de um

documento, NBR 6027 Sumários, NBR 6028 Resumos, NBR 6029,

Apresentação de livros e folhetos – Procedimento, NBR 6032, Abreviação de

títulos de periódicos e publicações seriadas – Procedimento, NBR 6822,

Preparo e apresentações de normas brasileiras – Procedimento, NBR 10520,

Apresentação de citações em documentos, NBR 10524, Preparação da folha

de rosto de livro – Procedimento, NBR 10719, Apresentação de relatórios

técnicos-científicos, NBR 12225 Títulos de lombada – Procedimento.

Disponível em www.abnt.org.br, acesso em entre 20 a 30 de maio de 2009.

Page 31:  · Web viewSendo certo que a publicidade que se eleva à dimensão de verdadeira transparência é o mais aplainado caminho para a fiel aplicação da lei e dos outros três princípios

Notas:

[1] Texto adaptado da Monografia Liberdade de Expressão dos Policiais e

Bombeiros Militares. Apresentada no 1º Concurso de Monografia do SENASP,

obtendo a 2ª colocação.

[2] STF. HC nº 83.125-7 DF, relator Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma,

julgamento 16/09/2003, DJ 07/11/2003 coator Superior Tribunal Militar.

[3] MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários à Constituição de

67, tomo V, 3ª p 150

[4] STF. Voto do Ministro do STF, Carlos Ayres Brito, relator da ADPF nº 130

em decisão em Sessão Plenária do dia 28 de abril de 2009.

[5] FARIAS, Edilsom. Democracia, censura e liberdade de expressão e

informação na Constituição Federal de 1988. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n.

51, out. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?

id=2195>. Acesso em: 15 fev. 2009.

[6] FERREIRA, Pinto. Código Eleitoral Comentado. v1. p 68

[7] FISCHER, Desmond. O Direito de Comunicar, Expressão, Informação e

Liberdade. p 19 e 91

[8] FERREIRA, Aluízio. Direito à informação, direito à comunicação: direitos

fundamentais na Constituição Brasileira. p 87

[9] Disponível em http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/clipping/abril/para-presidente-de-

associacao-de-controladores-motim-foi-erro-estrategico

[10] Disponível em:

http://www.estadao.com.br/arquivo/cidades/2007/not20070330p17630.htm

[11] LOUREIRO NETO, José da Silva. Direito Penal Militar. p 134

[12] CAPEZ, Fernando. Curso de direito e penal; parte especial, p 15

[13] LOUREIRO NETO, José da Silva. Direito Penal Militar. p 23

Page 32:  · Web viewSendo certo que a publicidade que se eleva à dimensão de verdadeira transparência é o mais aplainado caminho para a fiel aplicação da lei e dos outros três princípios

[14] ADPF 130, Sessão Plenária do dia 30 de abril de 2009. Disponível em

www.stf.jus.br

[15] Publicado no Diário Oficial da União no dia 9 de novembro de 1992, pp

15.562-15.567

[16] SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. Ed 24, São

Paulo: Malheiros, 2005, p 244

[17] ADPF 130-MC, Rel. Min. Carlos Britto, julgamento em 27-2-08, DJE de 7-

11-08

[18] CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Liberdade de

Informação e o Direito Difuso a Informação Verdadeira.p 65

[19] Constituição Federal, artigo 5º, inciso X.

[20] MOTTA FILHO, Sylvio Clemente da. Direito Constitucional: teoria,

jurisprudência e 1.000 questões. 17ed. p 72

[21] Constituição Federal, artigo5º § 1º - “As normas definidoras dos direitos e

garantias fundamentais têm aplicação imediata”

[22] STF - HC 82.424, Rel. p/ o ac. Min. Maurício Corrêa, julgamento em 17-9-

03, DJ de 19-3-04

[23] Constituição Federal, Artigo 5º, inciso IV

[24] Lei de Imprensa - Lei nº. 5.250 de 09 de fevereiro de 1967 - Artigo 7º da

[25] Constituição Federal, artigo 3º, inciso IV

[26] Constituição Federal, artigo 5º, caput, inciso, VIII e XIII

[27] REVISTA JUS VIGILANTIBUS, Segunda-feira, 1º de outubro de 2007

[28] PORTUGAL. WINKIPÉDIA. Site de internet aberto, no qual se incluem

informações criando uma gigantesca enciclopédia digital, já tendo catalogado

mais de 1 milhão de artigos. Endereço: http://pt.wikipedia.org/wiki/Hist

%C3%B3ria_da_Internet. Acessado em 15 de maio de 2009.

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[29] Dados extraídos de http://pt.wikipedia.org/wiki/Internet

[30] SOUZA, Alexandre. A blogosfera da segurança publica cresceu e agora

precisa dialogar. Diario de um Policial Militar, 26/nov. 2006. Disponível em:

http://www.diariodeumpm.net/2006/11/25/a-blogosfera-da-seguranca-publica-

cresceu-e-agora-precisa-dialogar/ Acesso em: 15 maç. 2009.

[31] LIMA, Mário Sérgio Lima. Agencia do Estadão. Blogosfera Policial Cresce

e vira estudo da ONU. www.estadao.com.br/noticias/cidades,blogosfera-

policial-cresce-no-brasil-e-vira-estudo-da-onu,352987,0.htm. Acesso em 20 de

maio de 2009.

[32] www.wanderbymedeiros.blogspot.com

[33] Jusmilitar- Site em defesa dos militares - www.jusmilitar.blogspot.com

[34] Sessão Plenária do STF de 30 de abril de 2009, na qual declarou que a Lei

de Imprensa (Lei nº 5250/67) é incompatível com a atual Constituição Federal

de 1988 - “Nada mais nocivo e perigoso do que a pretensão do Estado de

regular a liberdade de expressão e pensamento”, disse o ministro Celso de

Mello

Informações Sobre o Autor

Júlio César Lopes da Silva

Licenciatura Plena em Letras Português/Inglês pela UFMT; Bacharel em Direito

pela faculdade ICEC/UNIP; Técnico em Turismo pelo CEFET-MT,

Especialização em Direito do Trabalho, Professor e Militar do Corpo de

Bombeiros Militar do Estado de Mato Grosso, www.jusmilitar.blogspot.com.