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LEI DE INTRODUO DO CDIGO CIVIL
Esta aula foi postada no site do final do curso Intensivo II, mas ministrada em
19/08/09, para o curso de Notarial.
1. HISTRICO
A histria da LICC muito curiosa. Inicialmente, foi criada no direito francs.
que l na Frana, quando se editou o Cdigo Francs de 1804, se percebeu a
necessidade de uma lei que compatibilizasse o sistema jurdico francs com aquele
novo cdigo. At 1804, o sistema francs tinha como referncia o Estado, o Poder
Pblico. Assim, de forma a compatibilizar o novo sistema com o ordenamento como
um todo editou-se uma lei de acomodao.
Seguindo o modelo francs, o direito brasileiro repetiu a frmula. Assim, quando
se editou o Cdigo Civil de 1916, procurou-se editar uma lei de acomodao, de
compatibilizao do sistema. S que aquela Lei de Introduo ao Cdigo Civil
terminou sendo modificada em 1942 e agora ns temos uma nova LICC e esta nova
lei, que est em vigor, j com outro esprito, modificada, no mais aquela lei
originria.
No nosso sistema, a Lei de Introduo ao Cdigo Civil o DL 4657/42, apelidado
por ns de LICC, o nosso objeto de estudo.
2. OBJETO E APLICAO
E de que maneira a LICC introduz o Cdigo Civil? Quer que eu seja sincero? De
modo nenhum porque, em verdade, a LICC no e nem nunca foi um lei de
introduo ao cdigo civil. Na verdade, a LICC um cdigo geral sobre normas.
uma lei cujo objeto formatar a estrutura das normas, desde a sua elaborao at a
sua efetiva aplicao. A LICC um cdigo de normas. uma lei que tem por objeto,
no o estudo da pessoa, mas o estudo das normas. um cdigo sobre a elaborao,
a vigncia, a aplicao no tempo, a aplicao no espao, a interpretao, enfim,
um cdigo sobre normas. mais do que isso, uma lei cujo objeto a aplicao de
toda e qualquer lei.
Com isso, se a LICC ao cdigo civil um cdigo de normas, no h dificuldade
em concluir que a aplicao da LICC uma aplicao universal. mais do que uma
lei do Cdigo Civil. uma lei universal. A LICC se aplica universalmente, em qualquer
dos ramos do direito, qualquer que seja o espao da cincia jurdica. E isso por um
motivo simples. Aplica-se em qualquer ramo do direito porque a LICC um cdigo
normativo, de qualquer norma. Assim, no direito penal, no direito administrativo, no
direito comercial, no direito do trabalho, qualquer que seja o ramo do direito tem
sempre a incidncia da LICC porque ela, nada mais do que um cdigo sobre as
normas como um todo.
Ateno! bem verdade que essa incidncia universal da LICC conta com
algumas excees: No campo do direito penal e no campo do direito tributrio.
300
Nesses casos, somente se admite a analogia como mecanismo de integrao das
normas in bonam partem. Vou repetir. A aplicao da LICC conta com algumas
excees e dentre essas excees possvel apontar, nesse momento, duas
excees: no caso do direito penal e do direito tributrio. Espaos nos quais o uso da
analogia somente possvel in bonam partem. A analogia como mecanismo de
integrao da normal, como mecanismo de preenchimento de lacunas. No direito
penal e no direito tributrio, a analogia somente ocorre in bonam partem.
Eu quero arrematar essas notas introdutrias para dizer que j h no congresso
um projeto de elaborao de uma nova Lei de Introduo, a sim, corrigindo a sua
nomenclatura. A LICC mudar de nome, em boa hora, deixar de manter essa
relao indevida. Ela vai se chamar Cdigo de Organizao de Normas.
3. ESTRUTURA DA LEI DE INTRODUO AO CDIGO CIVIL
Vigncia das normas Arts. 1. e 2. Obrigatoriedade Art. 3. Integrao da norma Art. 4 Interpretao Art. 5 Aplicao da Lei no Tempo Art. 6. Aplicao da Lei no Espao Arts. 7 ao 19.
4. VIGNCIA DAS NORMAS Arts. 1 e 2
O primeiro a ser lembrado que a lei passa por diferentes momentos. So
diferentes momentos na sua formao, na sua composio. Em primeiro lugar, no se
pode esquecer que uma lei existe formalmente com a sua promulgao. Todavia, o
momento de existncia da norma, que a promulgao, no determina, ainda a sua
vigncia. A vigncia da lei vir expressa no prprio texto. Ou seja, toda lei existe
formalmente com a promulgao, mas esta promulgao ainda no lhe suficiente
para indicar a vigncia. Essa vigncia s vir posteriormente, conforme indicado no
prprio texto.
Imagine uma lei que foi regularmente promulgada e ganhando uma vacatio
legis, um perodo para que todos dela tomem conhecimento. Vocs podem perceber
que existem diferentes momentos, o da existncia, que se d com a promulgao, e o
da sua vigncia.
No nosso direito, historicamente, a vigncia das normas ficou submetida regra
do art. 1 da LICC, que diz o seguinte:
Art. 1o Salvo disposio contrria, a lei comea a
vigorar em todo o pas quarenta e cinco dias depois de
oficialmente publicada.
1o Nos Estados estrangeiros, a obrigatoriedade da
lei brasileira, quando admitida, se inicia trs meses depois
de oficialmente publicada. (Vide Lei 2.145, de 1953)
301
O professor no leu os demais pargrafos:
2o A vigncia das leis, que os Governos Estaduais
elaborem por autorizao do Governo Federal, depende
da aprovao deste e comea no prazo que a legislao
estadual fixar. (Revogado pela Lei n 12.036, de 2009).
3o Se, antes de entrar a lei em vigor, ocorrer nova
publicao de seu texto, destinada a correo, o prazo
deste artigo e dos pargrafos anteriores comear a correr
da nova publicao.
4o As correes a texto de lei j em vigor
consideram-se lei nova.
A Lei de Introduo, portanto, estabelece que a vigncia das leis ser indicada
expressamente no prprio texto. E se o texto no indicar? 45 depois de oficialmente
publicada no territrio nacional e 3 meses no territrio estrangeiro quando admitida a
incidncia da lei brasileira.
S que a, do jeito que ficou escrito na LICC fica parecendo que o legislador
indicar, se quiser, uma vacatio legis diferente de 45 dias. Entendendo que o texto do
art. 1, da LICC no era to claro, to explcito quanto deveria, editou-se o art. 8, da
LC 95/98. Este art. 8 foi tratar da mesma matria. Veio regulamentar a mesma
questo, s que de forma ligeiramente diferente, ao dizer que a vigncia da lei no
uma opo do legislador. O legislador no vai indicar a vigncia da lei se ele quiser.
No! A vigncia da lei deve ser obrigatoriamente indicada. A lei existe formalmente
na promulgao, mas quando foi publicada tem que indicar a sua vigncia porque
esse prazo de vigncia, esse prazo que indicado para que as pessoas tomem
conhecimento importante. Num pas como o nosso, com tantas leis, em que
praticamente todo ms somos apresentados a leis importantes, necessrio que toda
lei traga um prazo para que todos dela tomem conhecimento. necessrio que toda
lei traga um prazo para que as pessoas se costumem com ela. A esse prazo se d o
nome de vacatio legis.
Art. 8. A vigncia da lei ser indicada de forma
expressa e de modo a contemplar prazo razovel para que
dela se tenha amplo conhecimento, reservada a clusula
entra em vigor na data de sua publicao para que as leis de pequena repercusso.
Vacatio legis o prazo previsto em lei para que dela todos tomem conhecimento. um prazo de espera, de acomodao, durante o qual, a lei, apesar
de j existir, de j ter sido publicada, ainda no ganhou vigncia. Durante o prazo de
vacatio legis, malgrado a lei exista e tenha sido publicada, ainda no tem vigncia.
Toda lei tem que ter vacatio: art. 8, da LC 95/98. E a vacatio deve corresponder
ao nmero de dias necessrios para que todos dela tomem conhecimento. No em
meses, no em anos. O art. 8 diz que toda lei deve ser em nmero de dias.
E mais ainda: a frmula da clusula esta lei entra em vigor na data de sua publicao fica agora restrita s leis de pequena repercusso. Vale dizer, se uma lei
302
no de pequena repercusso, obrigatoriamente, ela deve ter vacatio porque a
frmula referida apenas para as leis de pequena repercusso.
Exemplo: a Lei 12.004/09 (lei bem recente, de 31/07/09) apenas consolidou em
sede legislativa o entendimento da Smula 301, do STJ que diz assim: a recusa do suposto pai de se submeter ao exame de DNA na ao de investigao de
paternidade faz presumir a prova que se pretendia produzir. Ou seja, se o ru, na ao de investigao de paternidade se recusar a fazer o DNA, presume-se que ele
o pai. E essa presuno relativa.
STJ Smula 301 Em ao investigatria, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz
presuno juris tantum de paternidade. (LEI 12.004/09).
Voc j sabia disso? Desde 2001 voc sabe disso. Se voc sabia disso desde
2001, essa foi uma lei de ampla ou de pequena repercusso? Obviamente, se o
entendimento j est enraizado em ns desde 2001, foi uma lei de pequena
repercusso. Ela entrou em vigor na data de sua publicao porque foi uma lei de
pequena repercusso.
Mas logo depois, foi editada a Lei 12.008/09 (nova Lei de Adoo), que mexeu
na CLT, no CPC, no ECA, mexeu em todo sistema jurdico, mais de 100 artigos. E a eu
pergunto: lei que mexe na CLT, no CPC, no ECA, no CP, no CC, tudo ao mesmo
tempo, de pequena repercusso? Claro que no. Tem vacatio legis? 90 dias. Ento,
a Lei 12.008/09 traz uma vacatio de 90 dias porque no de pequena repercusso.
E se o legislador entender que uma lei de pequena repercusso quando no
? No tem sano porque a compreenso sobre se uma determinada lei ou no
de pequena repercusso fica a cargo do legislador. ele que delibera sobre se uma
lei ou no de pequena repercusso. Por isso que o prprio texto legal quem pode
deliberar se uma lei vai ou no entrar em vigor na data de sua publicao. E com isso,
eu quero dizer que no h nenhuma possibilidade de se transferir a um terceiro, que
no seja o prprio legislador a deliberao sobre se uma lei ou no de pequena
repercusso. Mas o certo que a regra geral que toda lei tem que ter um perodo
de vacatio e somente pode conter a expresso esta lei entra em vigor na data de sua publicao se for de pequena repercusso.
Outro detalhe importante que o perodo de vacatio legis deve ser indicado
em nmero de dias. Isso porque o art. 8, da Lei Complementar 95/98 trouxe consigo
um critrio de contagem do prazo de vacatio.
Presta ateno: antes de estudarmos o critrio de contagem de vacatio legis,
eu quero te ensinar os critrios de contagem dos prazos do direito civil em geral. Voc
sabe contar prazo de direito civil? Eu sei que todo mundo aprendeu a contar prazo de
direito processual. Mas de direito material, de direito civil? Exemplo: h quanto tempo
voc casado? Posse um negcio importantssimo com prazo porque tem posse de
ano e dia, esbulho e turbao de ano e dia, fora nova, fora velha. Enfim, eu sei que
muito importante aprender a contar prazo e voc vai aprender a contar prazo
comigo. O art. 132, do Cdigo Civil o artigo:
303
Art. 132. Salvo disposio legal ou convencional em
contrrio, computam-se os prazos, excludo o dia do
comeo, e includo o do vencimento.
1 Se o dia do vencimento cair em feriado,
considerar-se- prorrogado o prazo at o seguinte dia til.
2 Meado considera-se, em qualquer ms, o seu
dcimo quinto dia.
3 Os prazos de meses e anos expiram no dia de
igual nmero do de incio, ou no imediato, se faltar exata
correspondncia.
4 Os prazos fixados por hora contar-se-o de
minuto a minuto.
Prazo em dia computa dia a dia. Exclui o primeiro e inclui o ltimo.
Prazo em ms e ano computa de data a data.
Este o critrio do art. 132 do Cdigo Civil.
Meado do ms sempre o dia 15, no importa quantos dias tenha o ms.
No direito civil, 30 dias e 1 ms no so a mesma coisa porque 30 dias so
contado dia a dia, incluindo o primeiro e excluindo o ltimo e o ms contado de
data a data. Se eu falar de um prazo de 1 ms iniciado no dia 25 de fevereiro, voc j
sabe que ele vai at 25 de maro. Mas se eu falar num prazo de 30 dias se iniciando
no dia 25 de fevereiro, vai depender de quantos dias tenha fevereiro e, com certeza,
no vai dar 25 de maro.
A contagem do prazo de vacatio legis submete-se a uma frmula diferente,
malgrado o resultado seja o mesmo. s para atrapalhar a vida de quem faz
concurso. D no mesmo, mas a frmula diferente. Na forma do 1, do art. 8, da LC
95/98, a contagem do prazo de vacatio legis se d da seguinte forma:
1 A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleam perodo
de vacncia fa-se- com a incluso da data da publicao e do ltimo dia do prazo,
entrarem vigor no dia subsequente sua consumao integral.
Ateno: a contagem do prazo se d dia a dia, incluindo o primeiro (ficou
diferente agora), incluindo o ltimo (totalmente diferente) e olha a burrice final: mas
somente comea a vigorar no dia subsequente ao trmino do prazo. Resumindo: na
prtica a mesma coisa porque inclui o primeiro e inclui o ltimo, mas s comea a
vigorar no dia subsequente consumao integral do prazo. Mas voc precisa saber
que o critrio de contagem do prazo de vacatio diferente.
por isso que todo prazo de vacatio deve ser expresso em nmero de dias. Mas
voc deve estar pensando: mas Cristiano, e se o legislador (que no de confiana), porventura, estabelecer um prazo de vacatio em ms ou ano? Ele j fez e vou lhe mostrar: o art. 2044 do Cdigo Civil prova irrefutvel de que o legislador
oligofrnico, pior do que Tssio (?) da novela porque ele mesmo, legislador, disse:
todo prazo de vacatio deve ser em nmero de dias. A ele prprio diz:
304
Art. 2.044. Este Cdigo entrar em vigor 1 (um) ano
aps a sua publicao.
Pera, criatura! Voc no disse que o prazo de vacatio era em nmero de dias?
Como que voc estabelece vacatio em ano ou em ms? Quer o pior? Como que
a gente vai contar isso? Eu to perguntando porque uma coisa certa: o critrio de
contagem do prazo de vacatio um critrio cabvel somente para a contagem em
nmero de dias. No serve para esse a. A voc aprendeu comigo: toda vez que uma
determinada situao no est submetida lei especial, aplica-se a lei geral. A
contagem do prazo de vacatio em ms ou em ano, naturalmente, fica submetida ao
art. 132, do Cdigo Civil e o art. 132 diz o qu? De data a data. Logo, se o Cdigo foi
publicado em 11/01/02, entrou em vigor em 11/01/03. Computa a vacatio de data a
data e ponto final. No tem outra frmula porque o 1, do art. 8, da LC 95 somente
prev a contagem do prazo de vacatio em nmero de dias e no em nmero de
anos.
A essa altura voc j deve saber que toda lei tem existncia na sua
promulgao, mas ainda no tem vigncia e que a vigncia tem que ser indicada
expressamente no seu prprio texto, reservada a clusula entra em vigor nesta data para as leis de pequena repercusso e que o prazo de vacatio deve ser em dias e
deve ser contado na frmula do 1, do art. 8, da LC 95. Eventualmente, prazo de
vacatio contado em ms ou ano, aplica-se o art. 132, do Cdigo Civil.
Diante disso, voc percebe que o art. 1, da LICC no foi revogado, mas
assumiu carter apenas e to-somente residual porque ns somente vamos utilizar o
art. 1 quando, indevidamente, o legislador deixar de estabelecer prazo de vacatio.
Indevidamente porque o art. 8, da LC 95 diz que toda lei tem de ter vacatio. E que ela
s pode entrar em vigor na data de sua publicao se for de pequena repercusso.
Vale dizer, se ela no de pequena repercusso e se o legislador esqueceu de indicar
a vacatio a, sim, utiliza-se o art. 1 e ela entra em vigor 45 dias depois de oficialmente
publicada.
Art. 1o Salvo disposio contrria, a lei comea a
vigorar em todo o pas quarenta e cinco dias depois de
oficialmente publicada.
Ateno agora para o que eu vou dizer! Marque de vermelho, passe o amarelo,
mas lembre-se: todas essas regras que eu acabei de dizer no se aplicam aos atos
normativos administrativos. Elas se aplicam apenas aos atos normativos legislativos. Os
atos normativos administrativos (decreto, portaria, regulamento, resoluo, etc.)
entram em vigor sempre na data de sua publicao. A eles no se aplica a
sistemtica nem da LICC, nem da LC 95.
Detalhe muito importante e que vira e mexe cai em concurso: imagine uma lei
em perodo de vacatio. A lei j existe. Ela apenas no tem vigncia. Uma lei em
perodo de vacatio pode ser modificada? Cai toda hora essa pergunta, se possvel
alterar uma lei em perodo de vacatio. Ela j existe e se ela j existe, s pode ser
modificada por uma lei nova. Ento, anote: Durante o perodo de vacatio, se a lei j
existe, ela s pode ser modificada em sua estrutura por uma lei nova. Claro! Ela j
existe, apenas no tem vigncia!
305
E vou mais longe. Supondo que o que se pretende no modificar a lei no
perodo de vacatio, mas apenas e to-somente corrigir erros materiais e inexatides.
Para corrigir erros materiais e inexatides, no precisa de lei nova, bastando a
republicao do texto. Se basta a republicao do texto para a correo, o prazo de
vacatio se reinicia. Repetindo: durante o perodo de vacatio, malgrado no tenha
vigncia, a lei j tem existncia. Por isso, qualquer mudana no seu contedo somente
pode se dar por meio de nova lei. Porm, a correo de erros materiais e de
inexatides se d por mera republicao. Neste caso, esta republicao implica
tambm no reincio do perodo de vacatio. Claro, publicou de novo! Mas esse reincio
do prazo s para a parte corrigida. O perodo de vacatio se reinicia somente para a
parte corrigida.
25 Concurso de MP/RJ (2002): O novo CC foi publicado em 11/01/02, entrando
em vigor um ano aps a sua publicao. Se, durante o perodo de vacatio legis, forem
feitas correes em normas do Direito de Famlia, publicadas em 01/10/02, indaga-se
quando entraro em vigor: a) as normas alterada? B) As normas relativas ao direito
das obrigaes?
Correes precisam de nova lei? No. Basta republicar. Resposta de a: 01/10/03 porque foram as normas corrigidas que tero reincio da vacatio. Letra b: As normas relativas ao direito das obrigaes no foram corrigidas, ento seguem a
vacatio originria: 11/01/03. Veja, portanto, que essa questo vem sendo trabalhada
sempre.
TJ/SP: No que tange vigncia da lei:
a) se antes de entrar a lei em vigor, ocorrer nova publicao de seu texto,
destinada correo, o prazo para sua vigncia no se inicia depois da nova
publicao; - Falso. Voc viu que se reinicia somente para a parte corrigida.
b) as correes a texto de lei j em vigor passam a integrar a lei corrigida
imediatamente; - Se a lei j est em vigor, qualquer correo somente por lei nova.
Falso. Vai ter uma nova lei, uma nova vacatio, tudo novo.
c) no se destinando a vigncia temporria, a lei ter vigor at que outra a
revogue ou estabelea disposies a par das j existentes, independente da
compatibilidade; - Falso. J vamos ver isso.
d) a regra geral para o comeo da vigncia da lei que esta passe a vigora 45
dias aps a data da publicao oficial, no territrio brasileiro ou estrangeiro; - Falso. No
territrio estrangeiro so trs meses.
e) as correes a texto de lei j em vigor consideram-se lei nova Perfeito.
Vejam que o assunto muito importante. um assunto que vem sendo
explorado continuamente pelos concursos.
Mas a surge uma coisa importante. Uma lei ganha vigncia quando ela
completa o perodo de vacatio. Ganhando vigncia, ela ser provida de
obrigatoriedade. Iniciada a sua vigncia, a lei passa a ter obrigatoriedade. Se
tornando obrigatria, surge um problema: at que momento a lei ter vigncia? At
quando perdura a lei? A resposta a essa indagao submete-se ao princpio da
continuidade, expressamente acolhido pelo art. 2, da LICC. De acordo com esse
artigo, uma vez em vigor e no se destinando vigncia temporria, a lei perdura at
que outra expressa ou tacitamente a revogue.
306
O princpio da continuidade assegura que toda e qualquer lei, uma vez em
vigor, no se destinando vigncia temporria, permanecer em vigor at que se
torne incompatvel, ou seja, at que uma outra, expressa ou tacitamente a revogue.
Ateno! O direito brasileiro no admite o famoso dessuetudo, que
revogao pelos costumes. Isso porque, no nosso sistema, a revogao das leis, ou
expressa ou tcita. E o que o dessuetudo? a revogao pelos costumes (uma lei brasileira pode ser revogada se as pessoas no a cumprem). Para ns, a revogao
tem que ser ou expressa ou tcita. Aprende uma coisa: o art. 9, da LC 95/98 diz que
preferencialmente a revogao deve ser expressa. No nosso sistema, uma lei no se
destinando vigncia temporria e entrando em vigor, perdura vigorando at que
outra expressa (o prprio texto da lei nova indica a revogao) ou tacitamente (lei
nova regula inteiramente matria tratada por lei anterior) a revogue.
A revogao pode ser total ou parcial. Quando for total, se chama ab-
rogao. E quando for parcial se chama derrogao.
Revogao total Ab-rogao Revogao parcial Derrogao.
Agora vem uma das coisas mais importantes para quem anda fazendo
concurso. Art. 2:
Art. 2o No se destinando vigncia temporria, a
lei ter vigor at que outra a modifique ou revogue.
PREFERENCIALMENTE DE FORMA EXPRESSA (art.9, da LC
95/98), NO TODO OU EM PARTE, PROIBIDO O DESSUETUDO.
1o A lei posterior revoga a anterior quando
expressamente o declare, quando seja com ela
incompatvel ou quando regule inteiramente a matria de
que tratava a lei anterior.
O 1 est dizendo: a lei posterior revoga a anterior quando for expressa ou
tcita. Mas voc j viu que preferencialmente ser expressa (art. 9, da LC). Para tudo
agora: lei nova que traz disposies a par de uma lei j existente sobre a mesma
matria revoga ou no? Voc viu: lei posterior revoga anterior de forma expressa ou
tcita: tcita, quando traz dispositivos incompatveis. Expressa quando indica. Mas se a
lei nova sobre a mesma matria traz disposies a par, revoga ou no? A resposta
est no 2:
2o A lei nova, que estabelea disposies gerais ou
especiais a par das j existentes, no revoga nem modifica
a lei anterior.
A questo aqui vernacular, gramatical. Disposies a par significa ao lado. Ou seja, uma lei nova sobre a mesma matria com disposies a par, nem expressa nem tacitamente revoga e nem modifica porque s pode revogar ou
modificar disposies incompatveis com as j existentes. Cai direto isso em concurso.
Lei nova que contenha disposies a par da j existente sobre a mesma matria no
revoga e nem modifica. S revoga ou modifica quando as disposies forem
incompatveis com a matria. Ou quando a revogao for expressa.
307
O direito brasileiro no admite a repristinao das leis. Em termos prticos, isso
significa que a revogao da lei revogadora no restabelece os efeitos da lei
revogada. Desse modo, podemos dizer que se uma lei A est em vigor e revogada
pela lei B. Se a lei B for revogada pela lei C, no se repristinam os efeitos da Lei A.
Restauram-se os efeitos da lei A? No. A revogao da lei revogadora no
restabelece os efeitos da lei revogada. Portanto, no existe a repristinao de leis.
Nesse sentido, o art. 2, 3, da LICC:
3o Salvo disposio em contrrio, a lei revogada
no se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigncia.
Mas h excees. O direito brasileiro no admite repristinao, mas o incio do
pargrafo diz: salvo disposio em contrrio. Est dizendo que o direito brasileiro no admite a repristinao. Mas o direito brasileiro admite efeitos repristinatrios quando
houver expressa previso da prpria lei. A lei A foi revogada pela lei B. A lei C veio a
revogar a lei B. A lei C no faz restaurar os efeitos da Lei A porque no existe
repristinao, mas podem existir efeitos repristinatrios: quando a lei C expressamente
dispuser nesse sentido. Se a lei C expressamente dispuser nesse sentido, os efeitos da lei
A so retomados pela lei C. Quem estar em vigor no a lei A, mas a lei C. Ento,
no existe repristinao, mas podem existir efeitos repristinatrios.
Todo este raciocnio serve tambm para o testamento. A revogao do
testamento revogador no restabelece os efeitos do testamento revogado.
Existe no Brasil um caso de repristinao. Voc j viu que os efeitos
repristinatrios dependem de expressa previso. Mas anote: existe um caso de
repristinao no direito brasileiro, que ocorre atravs de controle de
constitucionalidade. O art. 27, da Lei 9.868/99 (Lei de Controle de
Constitucionalidade), estabelece que atravs de controle concentrado de
constitucionalidade (realizado pelo STF) possvel a repristinao. Basta voc imaginar
que a lei revogadora foi declarada inconstitucional porque se a lei revogadora foi
declarada inconstitucional, naturalmente ela tratada como se nunca tivesse existido.
E se assim, a consequncia disso que os seus efeitos so aniquilados, inclusive o
efeito revogador. Portanto, a declarao de inconstitucionalidade da lei revogadora
restabelece os efeitos da lei revogada uma vez que ela passa a ser tratada como se
nunca tivesse existido e, por isso, nesse caso, temos repristinao.
Devemos lembrar que a jurisprudncia do STF, preocupada com o fato de que
a declarao de inconstitucionalidade de uma lei s vezes demora e durante o
perodo em que ela vigorou contou com uma presuno de constitucionalidade, vem
entendendo que, ao declarar a inconstitucionalidade de uma lei, lhe possvel
controlar os seus efeitos. Ou seja, o Supremo entende que possvel uma modulao
dos efeitos da declarao de inconstitucionalidade. O Supremo resguarda para si
mesmo o direito de dizer: essa lei inconstitucional, mas inconstitucional daqui para frente. uma modulao da eficcia da inconstitucionalidade. Se o Supremo modulou, nesse caso, mantm-se a revogao e no haver repristinao. Somente
haver repristinao se a declarao de inconstitucionalidade se deu com efeitos
retroativos. S nesse caso. Tambm no esquea que possvel a declarao de
inconstitucionalidade mesmo por meio de medida cautelar.
308
Acabamos de estudar os arts. 1e 2, da LICC. Vimos a vigncia das normas.
Agora, vamos estudar a obrigatoriedade das normas.
5. OBRIGATORIEDADE DAS NORMAS Art. 3
Art. 3o Ningum se escusa de cumprir a lei, alegando
que no a conhece.
A obrigatoriedade das normas nada mais do que a proibio de alegao
de erro de direito, tambm conhecido como princpio da obrigatoriedade. Ningum
pode alegar que desconhece a lei para furtar-se sua incidncia. Esta proibio de
alegao de erro de direito parte de um pressuposto, de uma presuno, que a
presuno de conhecimento de leis. O art. 3 entende que como toda lei cumpriu a
vacatio e a vacatio era destinada a que todos dela tomassem conhecimento, o art. 3
parte da premissa de que todos conhecem a lei, por isso, ningum pode alegar o seu
desconhecimento.
Essa presuno relativa ou absoluta? possvel conhecer todas as leis? A
presuno de conhecimento de leis relativa, nunca absoluta porque certo que h
casos em que se admite a alegao de desconhecimento de leis. E que casos so
esses? O maior volume de permisso de alegao de erro de direito est no direito
penal. O maior volume de excees vem do direito penal. o direito penal que nos
depara com o maior nmero de casos em que se permite a alegao de erro de
direito. Eu vou dar um exemplo: se no me engano, o art. 65, do CP, permite alegao
de erro de direito para atenuante de pena. O outro exemplo o do artigo que fala do
erro de proibio. O erro de proibio e a possibilidade de atenuante de pena so
dois exemplos de permisso de alegao de erro de direito em direito penal.
No campo do direito civil, a possibilidade de alegao de erro de direito bem
menor. Os dois grandes exemplos so:
Casamento putativo Art. 1.561 o casamento de boa-f com erro (de fato ou de direito). Casei com minha irm sem saber que era minha irm
(erro de fato). Mas posso ter casado com minha irm, sabendo que era
minha irm porque eu no sabia que a lei proibia este casamento (erro de
direito). Nesses casos, posso alegar, desde que esteja de boa-f porque o
casamento putativo exige a boa-f.
Negcio jurdico Art. 139, III Permite alegao de erro de direito no negcio jurdico como vcio de vontade, portanto, tornando o negcio
anulvel. Exemplo recente do TJ/RJ: uma pessoa comprou um imvel em
Petrpolis. Comprou um terreno para construir uma casa de vereaneio. Foi
at a prefeitura pegar a licena para construir e a prefeitura disse que no
era possvel construir ali por conta de uma lei municipal que probe a
construo nessa rea. Aquilo era rea non edificandi, limitao
administrativa ao direito de construir. A pessoa s comprou porque no
conhecia a lei. Se soubesse que no podia construir ali no teria adquirido.
O erro foi de direito. E o TJ/RJ, comprovado o erro de direito, anulou o
contrato de compra e venda. Aqui erro de direito por vcio de vontade,
tornando o negcio anulvel.
309
6. INTEGRAO DAS NORMAS Art. 4
Art. 4o Quando a lei for omissa, o juiz decidir o caso
de acordo com a analogia, os costumes e os princpios
gerais de direito.
Integrar uma norma colmat-la. preencher um vazio. Integrao da norma
colmatao, preenchimento do vazio. O art. 4 consagra entre ns a proibio ao
non liquet. Isso significa que o juiz no pode eximir-se do dever de julgar alegando
desconhecimento ou a lacuna da lei.
O juiz no pode deixar de julgar alegando que no conhece a lei ou que no
existe lei. So coisas diferentes. O juiz no pode alegar que no conhece a lei porque
presume-se que o juiz conhea todas as leis. Presuno de conhecimento de leis. Essa
presuno absoluta ou relativa? relativa, porque h quatro situaes em que o juiz
pode mandar a parte fazer prova da lei. O art. 337 do CPC estabelece as 4 excees
regra de presuno de que o juiz conhece todas as leis.
Art. 337 - A parte, que alegar direito municipal,
estadual, estrangeiro ou consuetudinrio, provar-lhe- o teor
e a vigncia, se assim o determinar o juiz.
Nessas quatro hipteses, o juiz no est obrigado a conhecer a lei. Mas a tem
razo Alexandre Cmara ao dizer que quando o art. 337 alude a direito estadual e
direito municipal,pressupe-se que seja de um municpio ou de um estado em que ele
no tenha jurisdio. Se de um municpio ou de um estado em que ele tenha
jurisdio, j no pode mais alegar. O juiz no pode alegar o desconhecimento da lei.
Salvo nas hipteses do art. 337, do CPC, quando se tratar de direito municipal,
estadual, estrangeiro ou consuetudinrio. Claro que ele no pode dizer que no
conhece a lei se o municpio ou estado onde ele exerce a jurisdio.
Do mesmo modo, no pode alegar desconhecimento de direito estrangeiro se
se trata de pas do Mercosul por conta do protocolo de Las Leas. O juiz, por isso, no
pode alegar o desconhecimento de direito estrangeiro de pas do Mercosul. Direito de
pas do Mercosul, presumidamente, ele conhece. Alis, no s presumir que ele
conhea a legislao dos pases do Mercosul. Documentos oficiais de pas do
Mercosul no precisam passar por traduo juramentada. Assim, nem o juiz pode
alegar o desconhecimento das leis dos pases integrantes do Mercosul e tambm os
documentos oficiais no precisam ser traduzidos por tradutor juramentado.
(Intervalo)
No havendo norma sobre determinada matria, qual a providncia a ser
adotada pelo juiz? Art. 4, da LICC:
Art. 4o Quando a lei for omissa, o juiz decidir o caso
de acordo com a analogia, os costumes e os princpios
gerais de direito.
Portanto, quando a lei for omissa, o juiz decidir preenchendo as lacunas,
integrando a norma. A atividade de integrao uma atividade de preenchimento
310
de lacunas, de vazios. E essa integrao da norma se d na forma do art. 4, do CPC:
analogia, costumes e princpios gerais. Este um rol taxativo e preferencial. Dizer isso
dizer que s existem esses mecanismos de integrao. dizer que a integrao da
norma se d somente dessa forma e, preferencialmente, nesta ordem:
1 Usa a analogia
2 Usa os costumes
3 Usa os princpios gerais
Em outras palavras, o juiz no pode deixar de julgar alegando
desconhecimento da lei. Ele no pode dizer que no conhece a lei porque
presumidamente ele conhece todas as leis, com exceo das hipteses do art. 337,
do CPC. Tambm no pode o juiz deixar de julgar alegando a ausncia, a falta de lei
porque quando no houver lei, ele deve julgar com base na analogia, nos costumes e
princpios gerais de direito, rol taxativo e preferencial.
6.1. Analogia
a integrao da lei (colmatao do vazio) pela comparao, ou seja,
quando o juiz preenche um vazio comparando uma situao com omisso legislativa
com outra situao prxima, parecida, que est tratada em lei. O uso da analogia no
direito penal e no direito tributrio somente possvel in bonam partem. Um bom
exemplo de analogia o art. 499, do Cdigo Civil, que trata do contrato de compra e
venda:
Art. 499. lcita a compra e venda entre cnjuges,
com relao a bens excludos da comunho.
O art. 499 fala de cnjuges, mas no fala de companheiros. E a eu perguntaria:
lcita a compra e venda entre companheiros na constncia da unio estvel? O
cdigo no fala. Se ele no fala, a situao omissa, mas o juiz tem que decidir sobre
se vlida ou no a compra e venda entre companheiros. Na ausncia da lei ele se
vale da analogia em primeiro lugar. Se lcita a compra e venda entre cnjuges na
constncia do casamento, tambm lcita a compra e venda entre companheiros na
constncia da unio estvel, desde que relativa a bens excludos da comunho.
Analogia com o art. 499, do Cdigo Civil.
Mas no Brasil, h dois tipos de analogia:
Analogia legis o juiz compara uma situao ftica no prevista em lei com uma outra situao que est especificamente prevista em lei
Analogia juris O juiz no compara com um dispositivo de lei especfico, mas com o sistema jurdico como um todo, com os princpios, enfim.
Unio homossexual no est prevista em lei. Como no existe dispositivo legal
tratando do tema, o juiz pode se eximir do dever de julgar? No. Ele tem de julgar. Mas
ele vai julgar com base em qu? Ele vai julgar por analogia. Se ele comparar uma
unio homossexual com uma unio estvel que est prevista no cdigo, analogia
legis. Ele comparou com uma situao especfica tratada em lei. Mas se ele comparar
com o sistema de direito de famlia: princpio da pluralidade, princpio da liberdade,
311
da igualdade, da dignidade, agora ele comparou com o sistema. Ento, a analogia
aqui a analogia juris. Portanto, a analogia pode ser juris ou juris.
Interpretao ampliativa Cuidado para no confundir analogia com interpretao ampliativa. Essa, uma diferena tnue, porm, importante. Eu vou usar
como exemplo, o art. 157, 2, do CC. Analogia colmatao de lacuna pela
comparao com uma outra situao. Interpretao ampliativa o elastecimento da
prpria norma. Na analogia aplica-se uma norma criada para uma situao a uma
outra situao no prevista. A analogia elastece a norma que foi criada para uma
situao para aplic-la a outra. Interpretao ampliativa quando elastece o sentido
da norma criada para aquela situao. Vejam o art. 157, 2, que trata do instituto da
leso:
2 No se decretar a anulao do negcio (POR
LESO), se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte
favorecida (QUE SE BENEFICIA) concordar com a reduo
do proveito (INDEVIDO).
Algum est obtendo uma vantagem indevidamente e concorda em reduzir
essa vantagem. No haver anulabilidade do negcio. Eu pergunto: aplica-se isso no
estado de perigo? No estado de perigo (art. 156) no existe essa norma e a vem a
indagao: no estado de perigo tambm se aproveita a regra do 2, ou seja, no
haver anulao do contrato por estado de perigo, se a parte que beneficia
concordar com a reduo do proveito? Sim. E veja o que diz o Enunciado 148, da
Jornada de Direito Civil, que trata da matria:
Enunciado 148 Art. 156: Ao estado de perigo (art. 156) aplica-se, por analogia, o disposto no 2 do art. 157.
Isso porque aquela reduo do proveito, afastando a anulabilidade foi criada
para leso. Aplica-se ao estado de perigo por analogia. Se eu dissesse: na prpria leso a reduo pode evitar a anulabilidade quando a parte beneficiada, embora
no concordando expressamente, concordou tacitamente. Interpretao extensiva. Na interpretao extensiva se elastece o sentido da norma para a prpria situao
criada. Analogia ocorre quando se elastece o sentido da norma para alcanar uma
outra situao, que no foi aquela originariamente prevista. Logo, no h que se
confundir analogia com interpretao extensiva.
6.2. Costumes
Os costumes so os usos reiterados de um lugar. Se o juiz no consegue
preencher a lacuna pela analogia, ele deve preencher pelos costumes. E integrando
pelos costumes, ele vai faz-lo de acordo com os usos reiterados de um determinado
lugar. Os costumes, como usos reiterados de um lugar devem ser utilizados pelo juiz
sem expressa determinao de lei e sem violar a lei. Eu explico. que vamos encontrar
no nosso sistema trs diferentes tipos de costumes: os costumes podem ser:
a) Costumes secundum legem Isso significa que foi a prpria lei que mandou aplicar os costumes. O prprio legislador mandou aplicar os costumes. Logo,
os costumes secundum legem constituem a prpria aplicao da lei.
Exemplo: art. 445, 2. No art. 445, 2, o legislador diz expressamente que
312
quando se tratar de ao edilcia para reclamar vcio redibitrio sobre
animal, o juiz deve utilizar o prazo de acordo com os costumes do lugar.
Costumes secundum legem a mera aplicao da lei.
2 Tratando-se de venda de animais, os prazos de
garantia por vcios ocultos sero os estabelecidos em lei
especial, ou, na falta desta, pelos usos locais, aplicando-se
o disposto no pargrafo antecedente se no houver regras
disciplinando a matria.
b) Costumes contra legem abuso do direito. proibido no nosso sistema o uso de costumes contra legem. O uso de algum costume contra legem
abuso.
c) Costumes praeter legem Aqui, sim, integrao da norma. A lei no previu o momento de usar o costume praeter legem. Como o juiz no conseguiu
decidir por analogia, ele se vale dos costumes. Um exemplo bastante
comum de uso de costume praeter legem o dano moral por cheque ps
datado depositado antes do prazo. A loja cria em voc uma expectativa de
que o cheque s vai ser depositado em uma determinada data e deposita
antes. exemplo tpico.
Toda vez que um costume for invocado pela parte, o juiz no tem obrigao de
conhec-lo de ofcio. Ele pode mandar a parte provar aquele costume alegado em
seu favor. O juiz no tem obrigao de saber se aquele costume realmente existe.
Portanto, a prova dos costumes da parte interessada, que o invocou. Tem absoluto
sentido isso.
6.3. Princpios Gerais de Direito
Nada mais so do que recomendaes genricas. A expresso princpios gerais de direito so diretrizes universais de justia social. Em outras palavras: se o juiz no conseguiu colmatar a lacuna, preencher o vazio pela analogia e pelos costumes,
ele lana mo de uma clusula geral, de uma frmula genrica, mas que permite a
ele uma soluo.
Os trs princpios gerais do direito so:
No lesar a ningum
Dar a cada um o que seu
Viver honestamente
Se o juiz no conseguiu colmatar a lacuna pela analogia, se no conseguiu
pelos costumes porque naquele lugar no havia costumes sobre a matria, ento, ele
o faz pelos princpios gerais do direito. Alto grau de subjetivismo, sem dvida, porque
ele vai julgar de acordo com frmulas genricas, frmulas de justia social. No lesar a
ningum. Dar a cada um o que seu, viver honestamente.
S tem um detalhe: cuidado para no confundir princpio geral de direito com
princpio fundamental de direito. que os princpios fundamentais de direito no se
313
confundem com os princpios gerais. A comparao simples e eficiente: os princpios
se dividem em princpios fundamentais e princpios gerais (ou princpios informativos).
Princpios fundamentais So opes ideolgicas do sistema jurdico. Tm fora normativa.
Princpios gerais (informativos) So meras recomendaes, com alto grau de subjetivismo. So mtodo integrativo. Mecanismo de colmatao. No
tm fora normativa. No so opes ideolgicas.
A diferena : os princpios fundamentais tm fora normativa, j os princpios
gerais so mtodo integrativo, mecanismo de colmatao. Ou seja, quando se tratar
de princpio fundamental, que so aqueles que esto no sistema, eles tm fora
normativa. Tm aplicao direta. Exemplo: proteo da inocncia no direito penal,
proteo do trabalhador no direito do trabalho, pluralidade das famlias no direito de
famlia, funo social da propriedade nos direitos reais.
Partindo dessa premissa, eu poderia estabelecer uma redao mais clara para
o art. 4:
Art. 4o Quando a lei (NORMA-REGRA + NORMA
PRINCPIO FUNDAMENTAL) for omissa, o juiz decidir o caso
de acordo com a analogia, os costumes e os princpios
gerais de direito (PRINCPIOS MERAMENTE INFORMOATIVOS).
Quando o art. 4 diz quando a lei for omissa, est falando tanto da norma-regra, quanto da norma princpio fundamental (no qualquer princpio, mas os
princpios fundamentais de direito).
Os princpios fundamentais do sistema possuem fora normativa, possuem fora
de lei. Esses princpios gerais que o juiz usa para colmatao, quando no conseguir
fazer isso pela analogia e pelos costumes, esses so princpios meramente informativos.
Ateno agora! No nosso sistema, os princpios fundamentais tm papel primrio ou
secundrio? Eles tm papel primrio. Quem possui papel secundrio, melhor dizendo
quaternrio, so os princpios informativos (no lesar a ningum, dar a cada um o que seu e viver honestamente). Os princpios fundamentais, por sua vez, esto
espalhados por toda parte. Nos registros pblicos, por exemplo, temos o princpio da
veracidade. O princpio da veracidade fundamental dos registros pblicos.
Concluindo: o art. 4 acolheu a proibio ao non liquet o juiz no pode alegar o desconhecimento da lei, salvo nas hipteses do art. 337 e no pode alegar
ausncia de lei porque deve preencher a lacuna na forma do art. 4, da LICC.
Observao importante: excepcionalmente o nosso sistema como mecanismo
de integrao da norma o uso da EQUIDADE. O que equidade? Vem da expresso
do livro tica a Nicmaco, de Aristteles. Ali ele cria um conceito de justia equitativa
(no justia distributiva). Justia distributiva distribuir justia, acesso justia, justia
social, etc. Justia equitativa a ideia do bom, do justo, do reto, que vem do livro.
Nicmaco era o filho de Aristteles e ele escreveu esse livro em sua homenagem
dizendo: o virtuoso, o bom, o justo o que est no meio. Nem tanto ao mar, nem tanto
terra. O equilbrio, a razo quem d o ideal de justia. Assim, justia equitativa d
ideia de justia equilibrada. Equidade equilbrio, ponderao, razoabilidade. O uso
314
da equidade pelo juiz deve se dar somente nos casos em que a lei atribui a ele, juiz, o
poder de decidir por equidade. O juiz somente poder decidir por equidade nos casos
em que o prprio sistema lhe encarrega de faz-lo, nos casos em que o prprio
sistema entrega a ele o uso dessa equidade. A utilizao da equidade judicial
excepcional. O juiz somente julgar por equidade nos casos em que a lei autoriza. Trs
exemplos de uso da equidade:
a) Art. 1.109, do CPC, procedimentos de jurisdio voluntria Nos procedimentos de jurisdio voluntria o juiz pode decidir por
equidade. No est preso legalidade estrita.
b) Art. 413, do Cdigo Civil Reduo da clusula penal Este dispositivo permite ao juiz reduzir o valor da clusula penal
equitativamente quando ela for abusiva ou quando a obrigao tiver
sido cumprida parcialmente:
Art. 413. A penalidade deve ser reduzida
eqitativamente pelo juiz se a obrigao principal tiver sido
cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for
manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a
finalidade do negcio.
a) nico do art. 944, do Cdigo Civil - Uso da equidade para reduo
do valor da indenizao. Se a culpa foi leve ou levssima, apesar de o
dano ter sido extenso, o juiz pode reduzir eqitativamente a
indenizao.
Pargrafo nico. Se houver excessiva desproporo
entre a gravidade da culpa e o dano, poder o juiz reduzir,
eqitativamente, a indenizao.
excepcional no sistema brasileiro o uso da equidade judicial. Esses so os
mecanismos de integrao da norma.
7. INTERPRETAO DAS NORMAS Art. 5
Interpretar descobrir o sentido e alcance. Enquanto no art. 4 ns falvamos
de integrao, portanto, de preenchimento de lacuna, no art. 5, vamos falar de
interpretao (buscar o sentido e alcance) da norma. A diferena: o art. 4 fala da
ausncia de norma e, faltando norma, o juiz preenche o vazio. No art. 5, a norma
existe. O juiz apenas precisa indicar o seu sentido e o seu alcance.
O direito brasileiro diz que toda aplicao de lei deve ser precedida de
interpretao. Portanto, o direito brasileiro nega a incidncia do brocardo latino in
claris interpretatio cessit. Ou seja, esse ditado diria que quando a lei for clara, cessa a
atividade de interpretao. No nosso direito, esse ditado no tem aplicao porque,
mesmo na clareza da lei dever haver uma interpretao, por mais que seja literal,
gramatical. Toda aplicao precedida de interpretao. Se o juiz vai interpretar o
art. 5 vai dizer como ele faz isso:
315
Art. 5o Na aplicao da lei, o juiz atender aos fins
sociais a que ela se dirige e s exigncias do bem comum.
O art. 5 est dizendo que toda interpretao da lei deve ser teleolgica,
sociolgica, isso porque diz que toda interpretao da lei deve atender aos fins sociais
a que ela se dirige. E se assim, toda interpretao deve ser teleolgica, finalstica,
sociolgica, deve se preocupar com a impactao social da norma jurdica.
Mas para quem anda estudando muito, notadamente direito constitucional,
no podemos esquecer de um detalhe importante: no esquea que toda
interpretao da norma deve, prioritariamente, ser conforme a constituio. De
acordo com a tese mais atual do direito constitucional, de acordo com as lies mais
contemporneas dos nossos grandes constitucionalistas, a primeira atividade
interpretativa que se impe, em qualquer caso, a interpretao conforme a
Constituio. Ou seja, a primeira coisa que se deve fazer ao ler um texto normativo,
interpret-lo conforme a Constituio. E interpret-lo conforme a Constituio levando
em conta os fins sociais a que se dirige a norma.
Um bom exemplo disso o art. 1.276, 2, do Cdigo Civil. Este artigo cuida da
perda da propriedade pelo abandono.
Art. 1.276. O imvel urbano que o proprietrio
abandonar, com a inteno de no mais o conservar em
seu patrimnio, e que se no encontrar na posse de outrem,
poder ser arrecadado, como bem vago, e passar, trs
anos depois, propriedade do Municpio ou do Distrito
Federal, se se achar nas respectivas circunscries.
2 Presumir-se- de modo absoluto a inteno a
que se refere este artigo, quando, cessados os atos de
posse, deixar o proprietrio de satisfazer os nus fiscais.
Presume-se de forma absoluta o abandono da propriedade quando o titular
deixa de pagar por trs anos consecutivos os tributos incidentes sobre o prprio imvel.
O 2 no diz e no precisa dizer que este abandono, presumido de forma absoluta,
depende da formao do devido processo legal. Presume-se, portanto, de forma
absoluta, que o proprietrio teve chance de se defender na via administrativa. Se o
Poder Pblico, antes de tomar a propriedade dele, lhe deu o direito de defesa. A isso
se d o nome de interpretao conforme, quando se interpreta uma norma conforme
a Constituio.
Um outro exemplo de interpretao conforme o art. 1.337, do Cdigo Civil,
que fala da multa aplicada ao condmino antissocial ( o cara que usa substancia
entorpecente na rea comum, para o carro na vaga errada, etc.):
Art. 1337. O condmino, ou possuidor, que no
cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o
condomnio poder, por deliberao de trs quartos dos
condminos restantes, ser constrangido a pagar multa
correspondente at ao quntuplo do valor atribudo
contribuio para as despesas condominiais, conforme a
316
gravidade das faltas e a reiterao, independentemente
das perdas e danos que se apurem.
Esta multa aplicada ao condmino antissocial, o cdigo no diz, mas depende
do devido processo legal. preciso oportunizar defesa a ele, garantir-lhe o direito de
impugnar, de produzir prova, etc. Isso porque precisamos fazer a interpretao
conforme a Constituio. Assim, toda interpretao de norma deve ser uma
interpretao teleolgica e deve tambm ser uma interpretao conforme a
Constituio.
Outro detalhe importante o resultado da interpretaa da norma jurdica, que
pode ser:
Ampliativo garantias e direitos sociais e individuais Declarativo normas de direito administrativo Restritivo normas que estabeleam privilgio, sano, renncia, fiana
e aval.
Ou seja, a interpretao pode elastecer o sentido da norma, declarar o sentido
da norma ou restringir o sentido da norma. Aqui, alguns comentrios se impem: no
se esquea que direitos fundamentais e direitos sociais previstos na CF merecem
interpretao ampliativa, submetem-se a critrio de interpretao ampliativa. J as
normas de direito administrativo, submetem-se a uma interpretao declarativa. O
resultado da interpretao da norma deve ser ampliativo, declarativo ou restritivo. Se
se trata de direitos e garantias individuais e sociais, a interpretao deve ser
ampliativa. Se a norma de direito administrativa, a interpretao deve ser
declarativa, por conta do princpio da legalidade. Interpretao restritiva para qu?
Cai toda hora em concurso: Submete-se interpretao restritiva as normas que estabeleam privilgio, sano, renncia, fiana e aval. Nesse sentido, o art. 819, do cdigo, que vai estabelecer a necessidade de interpretao restritiva da fiana:
Art. 819. A fiana dar-se- por escrito, e no admite
interpretao extensiva.
Por conta disso, o STJ editou a Smula 214:
STJ Smula 214. O fiador na locao no responde por obrigaes resultantes de aditamento ao qual no
anuiu.
Isso porque a fiana se interpreta restritivamente e a interpretao restritiva da
fiana resulta na concluso a que chegou a smula 214, do STJ. Este o resultado
restritivo da interpretao das normas.
8. APLICAO DA LEI NO TEMPO Art. 6
317
Art. 6 A Lei em vigor ter efeito imediato e geral,
respeitados o ato jurdico perfeito, o direito adquirido e a
coisa julgada.
1 Reputa-se ato jurdico perfeito o j consumado
segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.
2 Consideram-se adquiridos assim os direitos que o
seu titular, ou algum por ele, possa exercer, como aqueles
cujo comeo do exerccio tenha termo pr-fixo, ou
condio pr-estabelecida inaltervel, a arbtrio de outrem.
3 Chama-se coisa julgada ou caso julgado a
deciso judicial de que j no caiba recurso.
O art. 6, da LICC, consagra o princpio da irretroatividade das normas. Segundo
esse princpio, a lei nova se aplica aos fatos pendentes e futuros. Dessa forma, a lei
nova no se aplica aos fatos pretritos. A lei nova tende aos fatos pendentes e futuros,
no se aplicando aos fatos pretritos. E se a lei nova se aplica aos fatos pendentes e
futuros, nunca aos pretritos, voc j pode perceber que a regra geral a
irretroatividade.
Todavia, excepcionalmente, o ordenamento permite a retroao dos efeitos de
uma lei nova quando:
Houver expressa disposio nesse sentido
Alm de existir expressa disposio nesse sentido, a lei nova no viole o ato
jurdico perfeito, a coisa julgada e o direito adquirido.
Assim, a regra geral a irretroatividade, a de que a lei nova se presta a
regular os fatos pendentes e futuros. A retroao dos efeitos de uma lei nova depende
da conjugao desses dois requisitos: expressa previso nesse sentido e desde que
essa retroao no viole o ato jurdico perfeito, a coisa julgada e o direito adquirido.
Somente pela combinao dos dois requisitos que se admite, excepcionalmente,
efeito retroativo para uma lei nova.
Detalhes importantes:
Direito adquirido somente tem contedo patrimonial Direito adquirido somente aquele que foi incorporado ao patrimnio. Em outras palavras, no existe
direto adquirido de carter personalssimo. Todo direito adquirido sempre de
contedo patrimonial.
O STF vem entendendo que no existe direito adquirido em face da norma
constitucional, seja oriunda do poder constituinte originrio, seja oriunda do poder
constituinte derivado. No se pode falar em direito adquirido em face do texto
constitucional porque o texto constitucional cria um novo sistema. Como assim, no
se pode alegar direito adquirido em face do texto constitucional. E diz o Supremo:
nem em face do poder constituinte originrio e nem do derivado. O que o STF est
dizendo que no existe direito adquirido em face de emenda constitucional. No
existe alegao de direito adquirido em face de emenda constitucional. esta a
posio do Supremo.
Coisa julgada a qualidade que reveste os efeitos decorrentes de uma deciso judicial contra a qual j no cabe mais impugnao. Falando em coisa
318
julgada, nossa jurisprudncia vem admitindo a tese da relativizao dos efeitos da
coisa julgada. Nossa jurisprudncia nutre simpatia pela tese da relativizao dos
efeitos da coisa julgada. A respeito desse tema, as aes filiatrias. Nas aes
filiatrias, por exemplo, a jurisprudncia relativiza os efeitos da coisa julgada. S no
esquece de um detalhe: como a regra geral a proteo da coisa julgada, somente
se pode falar em relativizao dela para garantir um outro valor de sede tambm
constitucional. A tese da relativizao da coisa julgada somente pode ser admitida
quando se destinar a proteger um outro valor tambm previsto constitucionalmente.
S nesse caso.
Ato jurdico perfeito aquele ato que j exauriu todos os seus efeitos. aquele ato jurdico que no mais produz efeitos, que j exauriu a sua substncia, j cumpriu o
seu itinerrio. No confunda ato jurdico perfeito com relao jurdica continuativa. As
relaes jurdicas continuativas no podem ser atos jurdicos perfeitos porque os seus
efeitos ainda se produzem. Exemplos: Casamento e contrato ainda no encerrado,
ainda no extinto. So relaes jurdicas continuativas.
Relaes jurdicas continuativas Como as relaes jurdicas continuativas, que no so atos jurdicos perfeitos, sero tratadas no tempo? Eu disse que o ato jurdico
perfeito no pode ser atingido pela lei nova, que se destina aos atos jurdicos futuros e
pendentes e o ato jurdico perfeito no pendente. Pendente a relao jurdica
continuativa. Ateno! Em se tratando de relao jurdica continuativa (no se trata
de ato jurdico perfeito), sua existncia e validade ficam submetidas lei do tempo
em que o ato foi celebrado, em que a relao foi formada. Porm, sua eficcia fica
submetida lei atual. A lei nova atinge as relaes continuativas somente no plano da
eficcia porque existncia e validade ficam submetidas lei antiga.
Se uma pessoa casou sob a gide do Cdigo de 1916 essa pessoa pode se
utilizar da mudana do regime de bens? Quem permite a mudana o cdigo novo.
Para saber se pode ou no mudar o regime de bens, voc deve pensar: regime de
bens diz respeito existncia, validade ou eficcia? Regime de bens diz respeito aos
efeitos patrimoniais, portanto, eficcia. Pode mudar porque a lei nova se aplica no
plano da eficcia. Agora, se eu quero discutir se um casamento celebrado sob a
gide do Cdigo de 16 vlido ou no,eu devo olhar para o Cdigo de 16 porque
existncia e validade esto no cdigo velho. Somente a eficcia est no cdigo
novo. Esta a regra qual se submetem as relaes jurdicas continuativas.
Cuidado para no confundir irretroatividade da norma, que eu acabei de
apresentar, com ultratividade da norma.
Ultratividade da norma A ultratividade da norma um fenmeno temporal interessante. a possibilidade de invocar, de aplicar, uma lei j revogada mesmo
depois de sua revogao. No direito penal isso mais comum porque l tem a regra
da aplicao da lei mais benfica. Por fora dessa regra, comum, no direito penal,
invocar a ultratividade da norma, sendo comum aplicar lei revogada mesmo depois
da sua revogao. No direito civil esse fenmeno muito mais raro. E o exemplo o
direito das sucesses. Princpio de saisine. Esse princpio diz que a lei que norteia a
sucesso a lei do tempo de sua abertura. Desse modo, supondo que algum morreu
no ano de 2000, mas cujo inventrio s agora foi aberto, este inventrio submete-se s
regras do Cdigo de 16, j revogado. E submete-se por conta do fenmeno da
ultratividade (permite que uma lei revogada seja aplicada mesmo depois de sua
319
revogao). No direito civil, direito sucessrio. A respeito do tema, a Smula 112, do
STF, confirmando a ultratividade da norma:
STF Smula 112 O imposto de transmisso causa mortis devido pela alquota vigente ao tempo da abertura da sucesso.
A irretroatividade, portanto, a regra. A retroatividade s possvel quando
expressa e desde que no viole o ato jurdico perfeito, a coisa julgada, o direito
adquirido. Eficcia rege-se pela lei nova. Vigncia e validade regem-se pela lei velha.
Um exemplo que vem sendo muito debatido e importante. Quem mora em
condomnio construdo antes do novo cdigo seguramente passou por esse problema.
At o advento do novo cdigo, a multa por atraso de condomnio era de 20%. O novo
cdigo abaixou de 20 para 2%. Pergunta-se: se o condomnio foi formado antes do
novo cdigo e, portanto, previa anteriormente uma multa de 20, agora deve ser
reduzida para 2? s voc pensar: a multa est em que plano? Existncia, validade
ou eficcia? A multa por atraso (clusula penal) no tem nada a ver com a existncia
do condomnio, que existe independentemente de multa. Validade tambm no
porque a formao do condomnio vlida independentemente de multa. A multa
diz respeito taxa de manuteno e a taxa de manuteno um dos efeitos do
condomnio. Ento, mesmo os condomnios formados anteriormente vigncia do
cdigo tero multa mxima de 2%. E esta a soluo do STJ, exatamente falando
sobre as relaes jurdicas continuativas.
9. APLICAO DA LEI NO ESPAO Arts. 7 a 19
A regra geral que no Brasil aplica-se a lei brasileira. A regra, portanto, o
princpio da territorialidade. Entretanto, h casos excepcionais em que se admite a
aplicao da lei estrangeira no Brasil. por isso que a LICC acolheu o princpio da
territorialidade moderada ou mitigada. Pois bem, se a regra geral a de que no Brasil
aplica-se a lei brasileira, podemos afirmar que somente se aplica a lei estrangeira
excepcionalmente, nos caos previstos em lei. Territorialidade moderada.
Mas preciso que se estabelea um elo, uma regra de conexo. O direito
brasileiro estabeleceu como regra de conexo a regra do estatuto pessoal.
Excepcionalmente, se admite a aplicao da lei estrangeira quando a lei permitir. E a
lei vai permitir em determinados casos. E para a lei dizer quais so esses casos, ela se
vale de uma regra de conexo. E qual a regra que nos conecta ao ordenamento
estrangeiro permitindo que ele aqui seja aplicado? a regra do estatuto pessoal.
Estatuto pessoal significa a lei do domiclio do interessado.
So sete excees regra geral do sistema. Excees previstas em lei (regra do
estatuto pessoal lei do domiclio):
a) Nome
b) Personalidade
320
c) Capacidade
d) Direito de famlia
e) Bens mveis que a pessoa traz consigo
f) Penhor Porque o penhor direito real sobre bens mveis g) Capacidade para suceder
So as sete hipteses em que se admite a aplicao da lei estrangeira.
Juliana est louca para casar e conhece em pleno carnaval de Salvador um
francs que quer com ela se casar. Mas o francs casado em Paris. Se assim, pode
casar com ela? No porque direito de famlia, se ele j casado l, o estado civil dele
aqui o mesmo que ele j tinha. Aplica-se a regra do estatuto pessoal. E se ao invs
ela conheceu um rabe, sendo que na Arbia admite-se a bigamia? Ele j casado
l, pode casar aqui? Ele invoca o estatuto pessoal. Mas no pode porque, ateno, a
aplicao destas sete excees depende da compatibilidade constitucional, com a
ordem jurdica interna. Se for incompatvel com nosso sistema no se aplica o estatuto
pessoal. A aplicao dessas sete excees depende de compatibilidade interna, sob
pena de afronta soberania nacional.
Excees das excees
A regra o princpio da territorialidade, admitindo-se, excepcionalmente, a
aplicao da lei estrangeira nos casos do estatuto pessoal, nas sete hipteses previstas
em lei que voc conferiu comigo. S que o sistema prev mais trs excees, que so
excees da exceo. Nas trs hipteses que viro agora ser aplicada a lei
estrangeira sem o estatuto pessoal:
a) Bens imveis Lei do lugar em que estiverem situados. b) Lugar da obrigao (internacional) O lugar do domiclio do proponente. c) Regra sucessria mais benfica No que tange direito da sucesso,
quando se tratar de bens de estrangeiro situados no Brasil, aplica-se a lei
sucessria mais benfica.
So dez hipteses de aplicao da lei estrangeira no Brasil: sete submetidas ao
estatuto pessoal e trs submetidas regra prpria.
No Brasil, um banco recebe em garantia um imvel que est situado na Bolvia.
A execuo hipotecria se dar de acordo com o Cdigo Civil do Brasil ou da Bolvia?
Da Bolvia.
Se voc celebrou um contrato internacional e no estabeleceu o lugar da
obrigao, o lugar ser o do domiclio do proponente.
Voc casado com estrangeiro que morreu deixando bens no Brasil. Aplica-se
a lei sucessria mais benfica.
So as trs excees da exceo.
E eu termino dizendo que alm da aplicao da lei estrangeira no Brasil nas dez
excees que acabamos de ver, tambm se permite o cumprimento de sentena,
carta rogatria ou laudo arbitral estrangeiro no Brasil desde que tenha obtido a
321
homologao pelo STJ. O STJ homologa, mas a execuo ser por juiz federal de
primeira instncia, seja qual for a matria.
Para que o STJ homologue uma sentena, um laudo arbitral ou uma carta
rogatria estrangeira exige-se, alm da compatibilidade constitucional, o requisito da
Smula 420 do Supremo que diz expressamente: s ser possvel homologar no Brasil
deciso judicial que tenha transitado em julgado:
STF Smula 420 No se homologa sentena proferida no estrangeiro sem prova do trnsito em julgado.
O STF vem entendendo que toda e qualquer deciso judicial estrangeira, seja
declaratria, constitutiva ou condenatria, qualquer deciso judicial estrangeira, s
pode ser cumprida no Brasil se houver homologao pelo STJ. Por isso, o nico do
art. 15, da LICC, que dizia que no dependem de homologao as sentenas meramente declaratrias do estado das pessoas foi revogado pela Lei 12.036/09 (de 01/10/09). Em razo da supervenincia dos arts. 483 e 484 do CPC, j entendia o
Supremo que estava revogado tacitamente o nico do art. 15, do CPC, porque toda
e qualquer sentena estrangeira precisa de homologao do STJ.
Obs.: Quando o professor deu essa aula, a Lei 12.036, que revogou
expressamente o nico do art. 15 da LICC, ainda no tinha sido publicada.
Transcrevi o pargrafo anterior, portanto, adaptando a fala do professor referida
alterao.
Art. 483 - A sentena proferida por tribunal estrangeiro
no ter eficcia no Brasil seno depois de homologada
pelo Supremo Tribunal Federal.
Pargrafo nico - A homologao obedecer ao
que dispuser o Regimento Interno do Supremo Tribunal
Federal.
Art. 484 - A execuo far-se- por carta de sentena
extrada dos autos da homologao e obedecer s regras
estabelecidas para a execuo da sentena nacional da
mesma natureza.
Transcrevo, por contra prpria, os demais artigos da LICC, no obstante o
professor no os tenha lido (talvez por falta de tempo?) Ateno para a novidade do 6, do art. 7:
Art. 7o A lei do pas em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o
comeo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de famlia.
1o Realizando-se o casamento no Brasil, ser aplicada a lei brasileira quanto aos
impedimentos dirimentes e s formalidades da celebrao.
2o O casamento de estrangeiros poder celebrar-se perante autoridades
diplomticas ou consulares do pas de ambos os nubentes.
3o Tendo os nubentes domiclio diverso, reger os casos de invalidade do
matrimnio a lei do primeiro domiclio conjugal.
4o O regime de bens, legal ou convencional, obedece lei do pas em que tiverem
os nubentes domiclio, e, se este for diverso, a do primeiro domiclio conjugal.
322
5 - O estrangeiro casado, que se naturalizar brasileiro, pode, mediante expressa
anuncia de seu cnjuge, requerer ao juiz, no ato de entrega do decreto de
naturalizao, se apostile ao mesmo a adoo do regime de comunho parcial de
bens, respeitados os direitos de terceiros e dada esta adoo ao competente registro.
6 O divrcio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os cnjuges forem brasileiros,
s ser reconhecido no Brasil depois de 1 (um) ano da data da sentena, salvo se
houver sido antecedida de separao judicial por igual prazo, caso em que a
homologao produzir efeito imediato, obedecidas as condies estabelecidas
para a eficcia das sentenas estrangeiras no pas. O Superior Tribunal de Justia, na
forma de seu regimento interno, poder reexaminar, a requerimento do interessado,
decises j proferidas em pedidos de homologao de sentenas estrangeiras de
divrcio de brasileiros, a fim de que passem a produzir todos os efeitos legais.
(Redao dada pela Lei n 12.036, de 2009).
7o Salvo o caso de abandono, o domiclio do chefe da famlia estende-se ao outro
cnjuge e aos filhos no emancipados, e o do tutor ou curador aos incapazes sob sua
guarda.
8o Quando a pessoa no tiver domiclio, considerar-se- domiciliada no lugar de
sua residncia ou naquele em que se encontre.
Art. 8o Para qualificar os bens e regular as relaes a eles concernentes, aplicar-se-
a lei do pas em que estiverem situados.
1o Aplicar-se- a lei do pas em que for domiciliado o proprietrio, quanto aos bens
moveis que ele trouxer ou se destinarem a transporte para outros lugares.
2o O penhor regula-se pela lei do domiclio que tiver a pessoa, em cuja posse se
encontre a coisa apenhada.
Art. 9o Para qualificar e reger as obrigaes, aplicar-se- a lei do pas em que se
constiturem.
1o Destinando-se a obrigao a ser executada no Brasil e dependendo de forma
essencial, ser esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto
aos requisitos extrnsecos do ato.
2o A obrigao resultante do contrato reputa-se constituda no lugar em que residir
o proponente.
Art. 10. A sucesso por morte ou por ausncia obedece lei do pas em que
domiciliado o defunto ou o desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situao
dos bens.
1 A sucesso de bens de estrangeiros, situados no Pas, ser regulada pela lei
brasileira em benefcio do cnjuge ou dos filhos brasileiros, ou de quem os represente,
sempre que no lhes seja mais favorvel a lei pessoal do de cujus.
2o A lei do domiclio do herdeiro ou legatrio regula a capacidade para suceder.
Art. 11. As organizaes destinadas a fins de interesse coletivo, como as sociedades e
as fundaes, obedecem lei do Estado em que se constiturem.
1o No podero, entretanto. ter no Brasil filiais, agncias ou estabelecimentos antes
de serem os atos constitutivos aprovados pelo Governo brasileiro, ficando sujeitas lei
brasileira.
323
2o Os Governos estrangeiros, bem como as organizaes de qualquer natureza, que
eles tenham constitudo, dirijam ou hajam investido de funes pblicas, no podero
adquirir no Brasil bens imveis ou susceptveis de desapropriao.
3o Os Governos estrangeiros podem adquirir a propriedade dos prdios necessrios
sede dos representantes diplomticos ou dos agentes consulares.
Art. 12. competente a autoridade judiciria brasileira, quando for o ru domiciliado
no Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigao.
1o S .autoridade judiciria brasileira compete conhecer das aes, relativas a
imveis situados no Brasil.
2o A autoridade judiciria brasileira cumprir, concedido o exequatur e segundo a
forma estabelecida pele lei brasileira, as diligncias deprecadas por autoridade
estrangeira competente, observando a lei desta, quanto ao objeto das diligncias.
Art. 13. A prova dos fatos ocorridos em pas estrangeiro rege-se pela lei que nele
vigorar, quanto ao nus e aos meios de produzir-se, no admitindo os tribunais
brasileiros provas que a lei brasileira desconhea.
Art. 14. No conhecendo a lei estrangeira, poder o juiz exigir de quem a invoca
prova do texto e da vigncia.
Art. 15. Ser executada no Brasil a sentena proferida no estrangeiro, que rena os
seguintes requisitos:
a) haver sido proferida por juiz competente;
b) terem sido os partes citadas ou haver-se legalmente verificado revelia;
c) ter passado em julgado e estar revestida das formalidades necessrias para a
execuo no lugar em que ,foi proferida;
d) estar traduzida por intrprete autorizado;
e) ter sido homologada pelo Supremo Tribunal Federal.
Pargrafo nico. No dependem de homologao as sentenas meramente
declaratrias do estado das pessoas. (Revogado pela Lei n 12.036, de 2009).
Art. 16. Quando, nos termos dos artigos precedentes, se houver de aplicar a lei
estrangeira, ter-se- em vista a disposio desta, sem considerar-se qualquer remisso
por ela feita a outra lei.
Art. 17. As leis, atos e sentenas de outro pas, bem como quaisquer declaraes de
vontade, no tero eficcia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a
ordem pblica e os bons costumes.
Art. 18. Tratando-se de brasileiros, so competentes as autoridades consulares
brasileiras para lhes celebrar o casamento e os mais atos de Registro Civil e de
tabelionato, inclusive o registro de nascimento e de bito dos filhos de brasileiro ou
brasileira nascido no pas da sede do Consulado.
Art. 19. Reputam-se vlidos todos os atos indicados no artigo anterior e celebrados
pelos cnsules brasileiros na vigncia do Decreto-lei n 4.657, de 4 de setembro de
1942, desde que satisfaam todos os requisitos legais.
Pargrafo nico. No caso em que a celebrao desses atos tiver sido recusada pelas
autoridades consulares, com fundamento no artigo 18 do mesmo Decreto-lei, ao
324
interessado facultado renovar o pedido dentro em 90 (noventa) dias contados da
data da publicao desta lei.
FIM