01-MetodologiadaHistoria

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METODOLOGIA DA HISTRIA

1 Edio - 2007

SOMESB Sociedade Mantenedora de Educao Superior da Bahia S/C Ltda.Gervsio Meneses de OliveiraPresidente

William OliveiraVice-Presidente Superintendente Administrativo e Financeiro Superintendente de Ensino, Pesquisa e Extenso Superintendente de Desenvolvimento e Planejamento Acadmico

Samuel Soares

Germano Tabacof

Pedro Daltro Gusmo da Silva

FTC - EaD Faculdade de Tecnologia e Cincias - Ensino a DistnciaReinaldo de Oliveira BorbaDiretor Geral Diretor Acadmico Diretor de Desenvolvimento e Inovaes Diretor Comercial

Marcelo Nery

Roberto Frederico Merhy Mrio Fraga

Jean Carlo NeroneDiretor de Tecnologia Diretor Administrativo e Financeiro Gerente Acadmico Gerente de Ensino

Andr Portnoi

Ronaldo Costa Jane Freire

Luis Carlos Nogueira AbbehusenGerente de Suporte Tecnolgico Coord. de Softwares e Sistemas Coord. de Telecomunicaes e Hardware Coord. de Produo de Material Didtico

Romulo Augusto Merhy Osmane Chaves Joo Jacomel

MATERIAL DIDTICO Produo Acadmica Produo TcnicaGerente de Ensino

Jane FreireSuperviso

Joo JacomelCoordenao Reviso Final Editorao Ilustraes

Ana Paula Amorim

Carlos Magno Brito Almeida Santos Francisco Frana de Sousa Junior Francisco Frana de Sousa Junior

Coordenao de Curso

Jorge Bispo

Aldaci Lopes Ana Carolina AyresAutor(a)

Equipe Anglica de Fatima Silva Jorge, Alexandre Ribeiro, Cefas Gomes, Cluder Frederico, Delmara Brito, Diego Arago, Fbio Gonalves, Francisco Frana Jnior, Israel Dantas, Lucas do Vale, Marcio Serafim, Mariucha Silveira Ponte, Tatiana Coutinho e Ruberval Fonseca Imagens Corbis/Image100/Imagemsourcecopyright FTC EaD Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/98. proibida a reproduo total ou parcial, por quaisquer meios, sem autorizao prvia, por escrito, da FTC EaD - Faculdade de Tecnologia e Cincias - Ensino a Distncia.

www.ead.ftc.br

SUMRIO

DELINEANDO A DISCIPLINA HISTRIA: CONTEDOS E MTODOS ______________________________________________________ 7A HISTRIA COMO DISCIPLINA ESCOLAR ____________________________ 7FUNO SOCIAL DO ENSINO DE HISTRIA E CIDADANIA ___________________________ CONHECIMENTO HISTRICO

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_________________________________________________ 16

HISTRIA DO ENSINO DA HISTRIA NO BRASIL ___________________________________ 23 ENSINO DE HISTRIA NOS CURRCULOS ATUAIS __________________________________ 32 ATIVIDADE COMPLEMENTAR _________________________________________________ 40

FATO HISTRICO E CONSTRUO DE CONCEITOS ___________________ 42CONSTRUO DO FATO HISTRICO

___________________________________________ 42

TENDNCIAS HISTORIOGRFICAS E A SALA DE AULA ______________________________ 47 A CONSTRUO DE CONCEITOS HISTRICOS EM SALA DE AULA _____________________ 53 A TEMPORALIDADE NO ENSINO DE HISTRIA ____________________________________ 57 ATIVIDADE COMPLEMENTAR _________________________________________________ 66

SABERES E PRTICA DE ENSINO EM HISTRIA ________________ 66MTODOS DE ENSINO E USO DE DOCUMENTOS NO-ESCRITOS ______ 66MTODOS: TRADIO, INOVAO E ECLETISMO

_________________________________ 66

A QUESTO DA HISTRIA LOCAL ______________________________________________ 72 AULAS DE CAMPO: MUSEUS; CONSTRUES E STIOS IMAGENS, MSICA E ENSINO DE HISTRIA

______________________________ 75

______________________________________ 78

ATIVIDADE COMPLEMENTAR _________________________________________________ 80

SUMRIO

MATERIAIS DIDTICOS: USO DE DOCUMENTOS ESCRITOS E AVALIAOLIVRO DIDTICO DE HISTRIA ________________________________________________ 81 USO DIDTICO DE DOCUMENTOS ESCRITOS

_____________________________________ 86

LITERATURA E HISTRIA _____________________________________________________ 90 AVALIAO

______________________________________________________________ 93

ATIVIDADE COMPLEMENTAR _________________________________________________ 97

GLOSSRIO _____________________________________________________________ 99 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS _________________________________________ 100

Apresentao da DisciplinaOl, seja bem vindo (a)!Caros educadores e estudantes, estamos chegando a mais um momento de nosso percurso de construo de conhecimento de grande importncia. A partir de agora, o como ensinar, o de que forma ensinar, ser to ou mais importante do que o que ensinar, pois os amores e os dios pelas disciplinas nascem quando apresentamos posturas distorcidas e incoerentes com o nosso discurso docente. A disciplina Metodologia da Histria tem como objetivo propiciar a reflexo sobre os aspectos tericos e prticos relacionados aos processos de ensino/aprendizagem, ampliando esta discusso para as temticas metodolgicas que circundam sua prxis. Abordaremos, nesta disciplina, pressupostos tericos e prticos que sustentam uma prtica educacional significativa do ensino da Histria, buscando promover um exerccio de reflexo a esse respeito, ressaltando aspectos ideolgicos, filosficos, psicolgicos que lhes servem como referncias e, principalmente, vislumbra o exerccio para a construo de uma prtica pedaggica, considerando a autonomia, a histria e o papel dos educandos e educadores no processo ensino/aprendizagem. A disciplina Metodologia da Histria encontra-se dividida, por questes metodolgicas, em dois grandes blocos temticos, que, na verdade, se complementam. Possui carga horria de 72 horas. O primeiro bloco temtico intitula-se Delineando a Disciplina Histria: Contedos e Mtodos, e ser desenvolvido a partir de dois temas: A Histria como Disciplina Escolar e Fato Histrico e Construo de Conceitos. O segundo bloco temtico denomina-se Saberes e Prticas e Ensino de Histria, e ser desenvolvido em temas, como: Mtodos de Ensino e Uso de Documentos No-Escritos e Materiais Didticos: Uso de Documentos Escritos e Avaliao. Temos o desafio de pr mos obra, defender a prtica de uma Histria Crtica e significativa, garantindo, assim, o acesso a uma educao de qualidade.. Estamos pondo em suas mos um comeo, e no uma concluso. Um comeo que alerta e convida. Sendo assim, o nosso material didtico foi pensado para potencializar sua aprendizagem e reflexo. Por este motivo, leia, discuta, questione, busque, realize todas as atividades propostas, v alm... acreditamos no seu potencial para aproveitar bastante este mdulo. Desejamos sucesso na sua prtica educativa! Prof Aldaci Lopes Prof Ana Carolina Ayres

DELINEANDO A DISCIPLINA HISTRIA: CONTEDOS E MTODOSA HISTRIA COMO DISCIPLINA ESCOLARFUNO SOCIAL DO ENSINO DE HISTRIA E CIDADANIAAntes de iniciarmos as nossas discusses propriamente ditas, consideramos indispensvel que o professor de Histria revisite o seu prprio objeto de estudo e seu trabalho docente...

Para refletir...

Com a difuso das idias iluministas, a Histria ensinada distanciou-se, cada vez mais da inuncia da Igreja. Entretanto, sua organizao como disciplina escolar est diretamente relacionada com a transformao do estado da Histria como campo de conhecimento (Como disciplina escolar estamos compreendendo, segundo Fonseca (2003, p. 15), [...] o conjunto de conhecimentos identicado por um ttulo ou rubrica, e dotado de organizao prpria para o estudo escolar . Durante todo o sculo XIX, a organizao dos sistemas de ensino variou conforme as conjunturas nacionais, mas sempre havia a importncia dada formao do cidado de acordo com o sistema social e econmico. Esse complexo processo de fortalecimento das identidades nacionais e de legitimao dos poderes polticos ocorria no momento em que a Histria comeava a apresentar maior sistematizao nos seus mtodos de investigao, com seu saber objetivamente elaborado e teoricamente fundamentado. Dessa forma, a Histria passou a ocupar uma posio central entre as disciplinas escolares: ao ensino da Histria caberia apresentar um passado glorioso da nao e de seus grandes vultos. No Brasil, a Histria, como disciplina escolar, ocorreu aps a Independncia, com o incio da estruturao de um sistema de ensino para o Imprio. O pensamento da elite poltica e intelectual apontava, cada vez mais, para a elaborao de uma histria nacional que pudesse ser difundida por meio da educao, colocando como central a questo da identidade nacional. Foi muitoMetodologia da Histria7

A Histria da Histria ensinada: e ns com isso?

importante, nesse sentido, a criao do Instituto Histrico e Geogrco Brasileiro (IHGB), em 1838, que promoveu um concurso de monograas sobre como escrever a Histria do Brasil. Von Martius, bvaro vencedor do concurso, propunha uma Histria que considerasse a mistura das trs raas na formao de uma identidade brasileira. Tal concepo permanece no senso comum e pode ser percebida ainda no ensino, na mdia e tambm no cotidiano escolar. Reetindo sobre o quadro em que se inscreveu a constituio da Histria como disciplina escolar no Brasil, percebemos que questes consideradas bsicas atualmente, como as questes identitrias e aquelas relacionadas formao do cidado, estiveram presentes desde o seu incio. Essa permanncia merece ser considerada em suas diferentes conjunturas e, por isso, Identidade, Cidadania e Cultura fazem parte do esquema conceitual que fundamenta a proposta de nosso trabalho. Ora, a misso do pensamento elitizado, que compreendia a Histria como mestra da vida, de fazer do ensino da Histria um instrumento de formao de cidados e legitimao da ordem vigente, deveria considerar, alm de privilegiar o Estado e a ao de grandes personagens, o universo cultural no qual se inserem os sujeitos desse ensino. Isso se reetiu, por exemplo, na chamada Era Vargas, quando se estendeu o cultivo de uma memria para a construo de uma identidade nacional, ampliando o ensino escolar para uma educao que considerasse as polticas de preservao do patrimnio e as festas cvicas. Os livros didticos e as comemoraes passaram a ser instrumentos para a manuteno de determinadas vises de mundo e de Histria, sendo ferramentas de mediaes entre as prticas polticas e as culturais. Com o passar das dcadas, as imbricaes entre cultura, poltica e ensino da Histria passaram a expressar novas conjunturas que possibilitam um redimensionamento dessa permanncia. Analisando, por exemplo, os Parmetros Curriculares Nacionais e seus reexos no cotidiano do prossional da Histria, percebe-se que a prtica docente da Histria tem caminhado de acordo com as principais questes de seu tempo, incorporando diferentes concepes de ensino e de Histria, mas com a preocupao de formar o cidado de acordo com uma ordem social que deve ser legitimada. Hoje, em todo o mundo globalizado, a vida cotidiana coletiva se constitui um dos principais eixos do ensino da Histria, e as temticas a ela referentes so importantes para destaques acerca das diferenas culturais e tnicas, incentivando o respeito s diversidades. No entanto, tambm condicionam os cidados e suas identidades, mantendo desigualdades. Por isso, estamos considerando os diferentes aspectos que relacionam Identidade, Cidadania e Cultura inseridos nas perspectivas atuais do ensino da Histria. (Tal reexo, que preocupa prossionais do ensino da Histria em todo o mundo, foi exposta por Christian Laville, em 29 de julho de 2004, durante a conferncia de encerramento do V Encontro Nacional - Perspectivas do Ensino da Histria. O texto de sua conferncia est nos Anais Eletrnicos do evento).Ensinar Histria? Histrias?

Pode-se propor ao ensino de Histria uma outra formulao sobre sua nalidade: levar progressivamente o aluno a reconhecer a existncia da Histria crtica e da Histria interiorizada,

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a viver conscientemente as especicidades de cada uma delas, a distinguir suas diferentes exigncias e suas ligaes inseparveis. (Henri Moniot, APUD Bittencourt, 2004) O historiador um pouco menos ignorante (ou um pouco mais pretensioso) que o comum dos mortais. Enquanto a humanidade busca, sem sucesso, resposta s eternas questes sobre a origem da vida, o historiador acha que consegue desmisticar o passado antevendo o que j aconteceu. De fato, desvendar o passado requer fontes signicativas, abundantes e organizadas, grupo de pessoal interessado e curioso em busca de teorias signicativas que permitam a aproximao entre pesquisa e documentao. Segundo Fonseca (2003), as mudanas operadas no ensino de Histria nas ltimas dcadas do sculo XX ocorreram articuladas s transformaes sociais, polticas e educacionais de uma forma mais ampla, bem como aquelas ocorridas no interior dos espaos acadmicos, escolares e na indstria cultural. Neste sentido, importante no separarmos a investigao e o debate sobre o ensino, do contexto em que produzido, do conjunto de relaes de espao de saber e poder, especialmente das relaes entre universidades, indstria editorial e escolas de Ensino Fundamental e Mdio. Fonseca (2003) tambm pontua que nas ltimas dcadas do sculo XX a produo historiogrca e educacional aumentou signicativamente. Desta forma, tanto o mercado editorial quanto a mdia preocuparam-se em valorar o debate sobre o que ensinar em Histria aos milhes de jovens que freqentam as escolas brasileiras. Sendo assim, o debate sobre o ensino de Histria deve enfatizar os processos formativos que se desenvolvam nos diferentes ambientes e nos diferentes cidados diferentes formas de educao, considerando a sociedade marcada por diferenas e desigualdades.Aprofundando o texto!

Como o professor de Histria pode conceber o ensino desta disciplina para abordar a cidadania de forma signicativa e critica? O qu da cultura, da memria ele deve trabalhar nas suas aulas de Histria? O que signicativo, vlido e importante para ser ensinado da Histria do Brasil e do Mundo? A Lei de Diretrizes e Bases da Educao Brasileira (LDB) o documento que norteia a educao brasileira. imprescindvel que todo educador tenha acesso e busque desvend-la na sua rea de conhecimento. Sendo assim, em forma de diretrizes, o documento expressa o que da cultura e da histria o Estado brasileiro considera, hoje, necessrio ensinar aos alunos nas aulas de Histria. Art. 26. Os currculos do ensino fundamental e mdio devem ter uma base nacional comum, a ser complementada em cada sistema de ensino e estaMetodologia da Histria9

belecimento escolar, por uma parte diversicada exigida pelas caractersticas regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela. 4. O ensino da Histria do Brasil levar em conta as contribuies das diferentes culturas e etnias para a formao do povo brasileiro, especialmente das matrizes indgena, africana e europia. Art. 36. O currculo do ensino mdio observar o disposto na Seo I deste Captulo e as seguintes diretrizes: I - destacar a educao tecnolgica bsica, a compreenso do signicado da cincia, das letras e das artes, o processo histrico de transformao da sociedade e da cultura; a lngua portuguesa como instrumento de comunicao, acesso ao conhecimento e exerccio da cidadania; II - adotar metodologias de ensino e de avaliao que estimulem a iniciativa dos estudantes; Lei de Diretrizes e Bases da Educao Brasileira, n 9394/96Disponvel em:

Voltando a Fonseca (2003), a transformao do ensino de Histria estratgica no apenas na luta pelo rompimento com as prticas homogneas e a crticas, mas tambm com a criao de novas prticas escolares. O objetivo do saber histrico escolar constitudo de tradies, idias, smbolos e signicados que do sentido s diferentes experincias histricas. Essa perspectiva de ensino temtico e multicultural presente nos PCNs deve ser acompanhada de uma mudana pedaggica e na formao inicial e continuada do docente. atravs da prtica que os conhecimentos do professor so mobilizados, reconstrudos e assumem signicados diversos. Tal perspectiva conclama professores de Histria sensveis, com postura crtica, reexo permanente sobre suas aes no cotidiano escolar, no sentido de rever os saberes e as prticas. Essa postura do professor ir possibilitar alcanar as diretrizes apontadas pelos Parmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de Histria, lanado ocialmente pelo Ministrio da Educao em 1997. As diretrizes apontam e reforam a preocupao com a incluso, a diversidade cultural e a cidadania no currculo de Histria. Vejamos alguns aspectos abordados para o ensino de Histria: Os Parmetros Curriculares Nacionais constituem um referencial de qualidade para a educao no Ensino Fundamental em todo o Pas. Sua funo orientar e garantir a coerncia dos investimentos no sistema educacional, socializando discusses, pesquisas e recomendaes, subsidiando a participao de tcnicos e professores brasileiros, principalmente daqueles que se encontram mais isolados, com menor contato com a produo pedaggica atual.OBJETIVOS GERAIS DE HISTRIA

Espera-se que, ao longo do ensino fundamental, os alunos, gradativamente, possam ampliar a compreenso de sua realidade, especialmente confrontando-a e relacionando-a com outras realidades histricas, e, assim, possam fazer suas escolhas e estabelecer critrios para orientar suas aes. Nesse sentido, os alunos devero ser capazes de:10

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reconhecer que o conhecimento histrico parte de um conhecimento interdisciplinar; compreender que as histrias individuais so partes integrantes de histrias coletivas; conhecer e respeitar o modo de vida de diferentes grupos, em diversos tempos e espaos, em suas manifestaes culturais, econmicas, polticas e sociais, reconhecendo semelhanas e diferenas entre eles, continuidades e descontinuidades, conitos e contradies sociais; questionar sua realidade, identicando problemas e possveis solues, conhecendo formas poltico-institucionais e organizaes da sociedade civil que possibilitem modos de atuao; dominar procedimentos de pesquisa escolar e de produo de texto, aprendendo a observar e colher informaes de diferentes paisagens e registros escritos, iconogrcos, sonoros e materiais; valorizar o patrimnio sociocultural e respeitar a diversidade social, considerando critrios ticos; valorizar o direito de cidadania dos indivduos, dos grupos e dos povos como condio de efetivo fortalecimento da democracia, mantendo-se o respeito s diferenas e a luta contra as desigualdades. Parmetros Curriculares NacionaisDisponvel em: .

O Ensino da Histria e a construo da cidadania

O futuro emergir como resultado da ao humana(Peccei) O homem cria sua prpria realidade e, segundo Ferreira (1995), tem seus prprios recursos de compreender e interpretar essa realidade, torn-la lgica e signicativa para o conjunto de indivduos. Compreendendo, analisando e interpretando todas as dimenses da realidade, torna possvel a interao e a organizao social pela existncia de signicados culturalmente compartilhados. , pois, atravs do conhecimento do mundo, adquirido, formal e informalmente, a partir de suas experincias e do convvio em sociedade, pelas trocas lingsticas e reconhecimento de smbolos, em um processo sistemtico de formao intelectual e moral do indivduo, que se processa a construo de sua dimenso enquanto cidado. A conscientizao um processo que permite ao homem compreender a realidade que o cerca, como ela se estrutura, o que ele e a reagir a essa realidade, assumindo seu destino e dos seus semelhantes com autonomia, buscando sempre melhores condies de vida. um ser aberto, insatisfeito, no completo (ARAJO, 1998).

Metodologia da Histria

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Nesse processo de conscientizao e busca, vai descobrindo a dimenso de suas possibilidades e necessidades, bem como as formas de super-las, mediante sua participao na sociedade na qual est inserido. Assim, podemos identicar dois aspectos de sua personalidade: sociabilidade enquanto a propenso do homem para viver junto com os outros e comunicar-se com eles, torn-los participantes das prprias experincias e dos prprios desejos, conviver com eles as mesmas emoes e os mesmos bens, e politicidade entendendo-se como o conjunto de relaes que o indivduo mantm com os outros, enquanto faz parte de um grupo social. (Battista Mondin, apud. Betioli, 1995). Na realidade, so dois aspectos de um mesmo fenmeno: por ser socivel, o homem procura conviver com seus semelhantes e formar com eles certas associaes estveis. Uma vez inserido em grupos organizados, ele torna-se um ser poltico, ou seja, membro de uma polis, garantindo direitos e assumindo deveres (Betioli, id.) A cidadania, ento, um status concedido queles que so elementos integrais de uma comunidade (Targino, 1991). Nesse sentido, a idia de cidadania implica um conceito de igualdade, uma vez que todos os que possuem esse status so iguais, no que diz respeito aos direitos e obrigaes pertinentes ao status (Targino, id.). Mas, contrariamente idia de igualdade que a cidadania sugere, a estraticao social, que concede o status, um sistema de desigualdade que se acentua e se agrava no sistema capitalista. Como entender isso? Etimologicamente, cidado signica membro livre de uma determinada cidade, por origem ou adoo, assumindo um conjunto de razes culturais, polticas e sociais, movimentando-se nesse conglomerado sociopoltico e econmico, dinamizando o complexo cultural, sugerindo uma idia coletiva e pluralista dos termos cidadania e cidado. Assim, o cidado-indivduo move-se no social e o cidado-coletivo participa do social (Varela, 1999). A denio de cidado de Aurlio Buarque (apud. Targino, 1991) refere-se ao indivduo no gozo dos direitos civis e polticos de um Estado, ou no desempenho de seus deveres para com este. Os direitos sociais esto excludos, portanto, explicitamente, dessa denio. O desenvolvimento da cidadania, assim, exerce pouca inuncia sobre a desigualdade. Segundo essa viso, os direitos sociais desenvolvem-se margem da proteo do Estado. Para melhor compreendermos essa desagregao dos direitos fundamentais do homem, lancemos um olhar sobre Marshall (citado por Arajo, 1998, p. 7; e Varela, 1999), que apontou trs elementos constitutivos dos direitos de cidadania, em sua evoluo histrica e pertinente era moderna: os direitos civis representam os direitos do indivduo na sociedade e referem-se liberdade individual; os direitos polticos so conquistados a partir dos direitos civis assegurados e ampliados pelo direito de participar do exerccio do poder, mediante o voto ou investido de autoridade, como representante eleito; os direitos sociais direito a usufruir bem-estar social e econmico, de acordo com padres que garantam a dignidade humana.

Qual Histria? Qual Cidadania? O que ensinar?

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Segundo Bittencourt (2004), os objetivos ou nalidades de ensino de uma disciplina escolar precisam ser analisados, pois inserem e integram a constituio ou transformao paradigmtica de um determinado campo de conhecimento produzido na escola e para a escola, mas fundamental considerar que o atual papel do ensino de Histria est na compreenso do sentir-se sujeito histrico e em sua contribuio para a formao de um cidado crtico. As propostas curriculares abordam o ensino de Histria como aquele que visa contribuir para a formao de um cidado crtico para que o aluno adquira uma postura crtica em relao sociedade em que vive. As introdues dos textos ociais reiteram que o ensino de Histria, ao estudar o passado, tem como objetivo fazer com que o aluno compreenda o futuro e se sinta agente social capaz de transformar realidade que o cerca. Os Parmetros Curriculares Nacionais e a Cidadania A educao para a cidadania proposta pelos PCN tem em vista desenvolver entre crianas e jovens a partir dos Temas Transversais valores gerais de solidariedade, compaixo, tolerncia, preparando-as para participar no futuro, dentro ou fora do local de trabalho, de aes voltadas, em ltima instncia, aos excludos ou queles que no dispem de uma condio de vida minimamente digna, mas tambm s questes voltadas sade e preservao ambiental, bem como aquelas ligadas aceitao das diferenas religiosas, culturais, de opo sexual, etc. A relao da disciplina Histria e Cidadania nos PCNs Cidadania e cultura no mundo contemporneo. Problemticas pertinentes questo da cidadania na Histria: No Brasil: os homens bons no perodo colonial; a escravido e a luta pela liberdade; o poder oligrquico, o coronelismo e o voto na Repblica Velha; as Constituies e as mudanas nos direitos e deveres dos cidados, as ditaduras e a supresso de direitos polticos e civis (Estado Novo e governo militar aps 1964), experincia liberal democrtica de 1945-1964, o conceito de cidadania, hoje, no Brasil e a percepo da condio de cidado pela populao brasileira, as desigualdades econmicas e sociais e as aspiraes de direitos pela populao brasileira hoje; No mundo: a cidadania em Atenas e em Roma; a cidadania nas comunas medievais; os ideais iluministas e as prticas de cidadania durante a Revoluo Francesa; as prticas de cidadania a partir da independncia dos Estados Unidos; o socialismo, o anarquismo, o comunismo, a socialdemocracia, o nazismo e o fascismo na Europa, experincias histricas autoritrias na Amrica Latina, as declaraes dos Direitos Universais do Homem e os contextos de suas elaboraes. Os direitos das mulheres, dos jovens, das crianas, das etnias e das minorias culturais, a pobreza e a desigualdade social e econmica no mundo. Processo de formao, expanso e dominao do capitalismo no mundo: A expanso do comrcio na Europa no Renascimento, a expanso colonial e o acmulo de riquezas pelos Estados Nacionais europeus, as alianas entre a burguesia e os Estados Absolutistas, a industrializao e a concentrao urbana, as polticas econmicas liberais, a diviso internaMetodologia da Histria13

cional do trabalho, os projetos socialistas, o imperialismo europeu e o capitalismo monopolista, a expanso imperialista norte-americana, os pases socialistas e comunistas; A crise do capitalismo na dcada de 30, a diviso do mundo nos blocos capitalista e socialista, as crises do capitalismo nas dcadas de 70 e 80, desestruturao do mundo socialista, etc.; Problemticas pertinentes cultura contempornea: Rdio, televiso, livros, jornais, revistas, cinema, computador, propaganda, criao artstica. Diferenas, semelhanas, transformaes e permanncias no conceito de cidadania, procurando sintetizar os estudos realizados: Estudos das relaes presente-passado das economias capitalista e socialista, das idias e prticas acerca da cidadania e das lutas por mudanas na vida cotidiana e na qualidade de vida; Estudos de localizao cronolgica e das duraes temporais dos conceitos e das prticas dos cidados.Disponvel em: .

De acordo com os Parmetros Curriculares Nacionais, ca explcito a expectativa enftica da relao entre o ensino de Histria e o seu papel formativo de uma cidadania crtica, ou seja, espera-se que o professor de Histria forme um determinado tipo de cidado. Segundo Segal (apud Bittencourt, 2004), importante distinguir os objetivos da Histria ensinada nos nveis fundamental e mdio daqueles pretendidos nos cursos superiores. Estes ltimos visam formar prossionais, no caso historiadores ou professores de Histria; enquanto que, para os outros nveis, a Histria deve contribuir para a formao do indivduo comum, que enfrenta o cotidiano contraditrio de violncia, desemprego, greves, congestionamentos, que recebe informaes simultneas de acontecimentos internacionais, que deve escolher seus representantes para ocupar os vrios cargos da poltica institucionalizada. Este indivduo que vive o presente deve, pelo ensino da Histria, ter condies de reetir sobre tais acontecimentos, localiz-los em um tempo conjuntural e estrutural, estabelecer relaes entre os diversos fatos de ordem poltica, econmica e cultural. A relao entre Histria escolar e cidadania tambm nos faz pensar sobre as nalidades polticas da educao e, especicamente, no nosso caso, da disciplina Histria. Assim como da importncia de uma formao poltica que a Histria tem a desempenhar no processo ensino-aprendizagem presente no currculo educacional. De maneira geral, a explicitao do conceito de cidado que aparece nos contedos limitado cidadania poltica, formao do eleitor dentro das concepes democrticas do modelo liberal. Nas sries iniciais, os contedos formulam o ensino das prticas polticas institucionais possveis, indicando os cargos eletivos dos municpios e Estados da federao e a diviso de poderes de estado. Informam, ainda, sobre os deveres cvicos de cidado, tais como a necessidade de pagamento de impostos, prestao de servio militar, e tem sido introduzido estudos sobre as leis de trnsito e ainda preservao do meio ambiente,14

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especialmente nas sries iniciais. A cidadania social, que abarca os conceitos de igualdade, de justia, de diferenas, de lutas e de conquistas, de compromissos e de rupturas, tem sido apenas esboadas em poucas propostas. E, mais ainda, existe uma diculdade em explicitar a relao entre cidadania social e a poltica e entre cidadania e trabalho. Desta forma, cabe enfatizar que a ampliao do conceito de cidadania, com a introduo e explicitao de cidadania social confere ou deveria conferir uma outra dimenso aos objetivos da Histria quanto ao seu papel de formao poltica dos alunos, implicando, ainda, uma reviso mais aprofundada dos contedos propostos. (BITTENCOURT, Circe. (Org.). O saber Histrico na sala de aula, 2004.

Bibliografia Comentada...BITTENCOURT, Circe (org.). O saber histrico na sala. So Paulo: Contexto, 1998. Estimula a discusso e a reexo dos professores preocupados com a formulao do ensino de Histria, que envolve a redenio dos contedos e dos mtodos de ensino. Uma obra fundamental para professores e estudantes de Histria e para todos quantos se interessam pelos rumos da educao no Brasil. FONSECA, Silva Guimares. Didtica e prtica do ensino da histria. 2. ed. So Paulo: Papirus, 2003. Esse livro apresenta reexes sobre Didtica e Prticas de Ensino de Histria desenvolvidas, no Ensino Fundamental e Mdio, pela autora e por diversos professores, formadores, pesquisadores e alunos, em diferentes espaos e pocas. O texto est dividido em duas partes. A primeira contm uma anlise das principais dimenses do ensino de Histria, que so temas centrais nos cursos de formao docente; a histria da disciplina e seus objetivos, o currculo, as diretrizes legais, as abordagens historiogrcas recorrentes, a questo dos livros didticos e a formao da cidadania. A segunda parte apresenta questes didticas, prticas de ensino, sugestes de metodologia, relatos, tcnicas de ensino e comentrios crticos, visando a troca de experincias entre os prossionais que, cotidianamente, (re)constroem as prticas educativas em sala de aula. Ao nal, encontram-se reexes e sugestes para o desenvolvimento da prtica pedaggica nos processos de formao prossional, a m de questionar e redimensionar as relaes entre teoria e prtica, saberes disciplinares, pedaggicos e experincias, nos campos da Didtica, da Metodologia e da Prtica de Ensino.

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CONHECIMENTO HISTRICOResposta Skank Composio: Samuel Rosa / Nando Reis Bem mais que o tempo Que ns perdemos Ficou pra trs tambm O que nos juntou Ainda lembro Que eu estava lendo S pra saber O que voc achou Dos versos que eu z Ainda espero Resposta Desfaz o vento O que h por dentro Desse lugar que ningum mais pisou Voc est vendo O que est acontecendo Nesse caderno sei que ainda esto Os versos seus To meus Que peo Nos versos meus To seus Que esperem Que os aceite Em paz Eu digo que eu sou O antigo do que vai adiante Sem mais Eu co onde estou Prero continuar distante

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Ao tratar da questo do conhecimento, deve-se ter presente, em primeiro lugar, que ele uma atividade intelectual na qual o homem procura compreender e explicar o mundo que o constitui e o cerca. Enquanto atividade intelectual, o conhecimento consiste num processo efetivo de radicao do homem no mundo. Por isso, sem conhecimento no pode haver mundo (BOMBASSARO, 1992, p. 18). Se a racionalidade e historicidade denem o conhecimento que o homem produz e, ao procurar mostrar a relao intrnseca de interdependncia entre o terico e o prtico, revelada pelo uso dos verbos conhecer e saber, possvel indicar dois momentos especcos da epistemologia contempornea a tendncia analtica e a tendncia histrica. Com isso, possvel delinear o contexto no qual a questo central pode ser apresentada. De maneira que se pode armar que racionalidade e historicidade so interdependentes quando se trata de considerar o conhecimento, de modo geral; e o conhecimento produzido pela investigao cientca, de modo especco. O carter histrico do conhecimento tem dois motivos, um deles que o passado que o carregou at ns se manifesta como histria e, depois, porque o presente quando interpreta o passado, faz histria. A tradio segundo a perspectiva hegeliana nos permite ter certeza da historicidade do conhecimento. Ele uma ao que se vincula no somente ao individual, mas tambm ao coletivo. Pode-se dizer que a epistemologia uma teoria do conhecimento, pois est centrada no sujeito que conhece e no objeto que conhecido. A historiciade e a racionalidade so categorias essenciais para a anlise do conhecimento. A historicidade e a racionalidade esto vinculadas ao homem e, sem ele, no existe conhecimento. O homem como ser racional interage com o mundo e faz histria, resgata a histria dos seus antepassados para construir o presente e fazer a sua prpria histria. O Conhecimento Histrico na Sala de Aula Problematizar o conhecimento histrico em sala de aula muito importante na formao intelectual do aluno e do professor. Proporciona que os objetivos fundamentais do ensino sejam os de desenvolver a compreenso da realidade histrico-social. Podemos entender, ento, que este o grande desao enfrentado pelo professor de Histria para construir uma prxis reexiva e dinmica que alcance os objetivos propostos atualmente pelas diretrizes educacionais. atravs do espao de sala de aula que professores e alunos de Histria ultrapassam limites com o objetivo da construo do conhecimento: O professor quem vai explicitar o passado com novidades, utilizando as memrias e tem a possibilidade de guiar e dominar em nome do conhecimento; Os alunos, com seus projetos e problemas, que devem ser mediados pelo professor. Diante dessas pontuaes, notamos que a sala de aula um espao vivo e cheio de sobressaltos: cada aula nica, trazendo sempre novidades e surpresas nem sempre planejadas, propiciando ao professor uma certa dose de resilincia. Sendo assim, o professor de Histria deve trabalhar com os alunos formas de adquirir ferramentas de trabalho necessrias para a formao do educando.Metodologia da Histria

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Quais so essas ferramentas? O saber-fazer; O saber-fazer bem; Lanar os germes do histrico. O professor o responsvel por ensinar aos alunos a levantar problemas, socializ-los, discuti-los, buscando transformar em cada aula de Histria temas e problemticas. Ensinar Histria, neste sentido, propiciar ao aluno o processo de fazer e do construir a Histria. Deve car explcito que o conhecimento histrico no adquirido como um dom, mas construdo. O aluno deve entender que o conhecimento histrico no adquirido como um dom comumente ouvimos os alunos armarem Eu no dou para aprender Histria nem mesmo como uma mercadoria que se compra bem ou mal. (BITTENCOURT, Circe. O saber histrico na sala de aula, 2004). A partir das discusses apresentadas e das transformaes educacionais, entendemos que histria deve ser trabalhada dentro de outra realidade, de outro ngulo, na qual o indivduo possa fazer parte dela e dessa realidade, que o leve a se sentir, tambm, agente da histria, no s como produto, mas tambm, como produtor da histria. O historiador no deve fazer imposio ao alunado a seguir a maneira tradicional de se aprender histria, mas ajud-los a compreend-la com outra realidade atravs do esprito crtico. Uma histria ensinada com uma viso crtica, porque ir, com certeza, mostrar a boa formao e empenho do professor de Histria. Com isso, atingir um novo modelo de ensino de histria, em que os velhos paradigmas que constitua a antiga forma de ensinar sejam modicados pelos futuros professores de histria. O professor de Histria deve utilizar outro tipo de ensino que leve na aprendizagem no dimetro de romper as barreiras do ensino que misticava a viso burguesa. Pois, ser que na atualidade o Ensino de Histria est abrindo espaos para que os grupos sociais tenham uma maior participao no currculo do componente curricular de Histria? Um novo ensino de histria em que abranja os que caram e cam margem da sociedade, com a plena forma de oportunidade de resgatar sua cidadania e sua cultura, bem como ter sua cultura respeitada. Na verdade, a proposta a de revolucionar o Ensino de Histria. E, com isso, queremos que os indivduos tenham capacidade de pensar de uma maneira deferente do modelo tradicional e que os historiadores formem cidados pensantes e crticos diante desse novo Ensino de Histria e da realidade do mundo em que vivemos. Nesse caso, o professor de Histria deve tentar e colocar em prtica o novo tipo de ensinar histria, com base em um ngulo diferente em que o aluno se inclua atravs desse processo de ensino-aprendizagem no processo histrico. Ns, professores, se no aprendermos a trabalhar o conhecimento histrico de modo reexivo, todo o nosso trabalho ser redundante, isto , como dizia Renato Russo, Tempo Perdido...18

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E ser que podemos PERDER TEMPO? Ou o tempo Histria? Tempo Perdido Legio Urbana Composio: Renato Russo Todos os dias quando acordo, No tenho mais o tempo que passou Mas tenho muito tempo: Temos todo o tempo do mundo. Todos os dias antes de dormir, Lembro e esqueo como foi o dia: Sempre em frente, No temos tempo a perder. Nosso suor sagrado bem mais belo que esse sangue amargo E to srio E selvagem E selvagem E selvagem Veja o sol dessa manh to cinza: A tempestade que chega da cor dos teus Olhos castanhos Ento me abraa forte E diz mais uma vez Que j estamos distantes de tudo: Temos nosso prprio tempo. No tenho medo do escuro, Mas deixe as luzes acesas agora, O que foi escondido o que se escondeu, E o que foi prometido, ninguem prometeu Nem foi tempo perdido; Somos to jovens tao jovens tao jovens

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A produo de conhecimentos como atividade docente no signica que o professor realize a soma das atividades de ensino e pesquisa, mas signica pensar o ensino como processo permanente de investigao e de descobertas individuais e coletivas. Produzir novos conhecimentos um pressuposto metodolgico que pode colaborar com a prtica docente, dependendo da viso do professor. tarefa urgente do professor valorizar e articular o trabalho pedaggico com os mltiplos saberes produzidos na experincia cotidiana, assim como em outras dimenses da sociedade. A msica pode ser uma grande parceira para a construo desses caminho para o ensino de Histria no Brasil.O CONHECIMENTO HISTRICO

por Keith C. Barton A disciplina de Histria reveste-se de uma grande importncia no mundo moderno, apesar de as pessoas diferirem na sua compreenso da natureza e do objetivo do conhecimento histrico. Para os educadores, a disciplina envolve a anlise de relaes causa e efeito, numa tentativa de compreender como que a sociedade humana evoluiu com o passar do tempo. Enquanto que outros educadores podem usar a Histria como fonte primeira de lies morais, ou como uma maneira de identicar heris e viles, para celebrar ou condenar. De uma mesma maneira, para algumas pessoas, a Histria surge como fonte de identidade individual e pessoal, uma histria que explica quem somos, de onde viemos, como famlia, comunidade, nao ou etnia. Outros ainda podem considerar o passado como uma forma de divertimento ou de preenchimento pessoal uma rea de mobilirio antigo, edifcios restaurados e sadas para runas pr-histricas. A maioria de ns, de fato, usa provavelmente a Histria para todos estes ns numa dada altura.Disponvel em:

necessrio destacar que s importante uma aprendizagem signicativa para o aluno. Sendo assim, ca claro o trabalho com o conhecimento histrico em sala de aula, particularmente em duas direes. (SCHIMIDT, 2004). Na primeira, o contedo precisa ser desenvolvido na perspectiva de sua relao com a cultura e experincia dos alunos, assim como suas representaes construdas. Na segunda, para uma aprendizagem signicativa, preciso construir em sala de aula um ambiente de compartilhamento de saberes.

Levantando questes...O que signica problematizar o conhecimento histrico?

Em primeiro lugar, signica partir do pressuposto de que ensinar Histria construir um dilogo entre o presente e o passado, e no reproduzir conhecimentos neutros e acabados sobre fatos que ocorreram em outras sociedades e outras pocas.O que signica partir do cotidiano dos alunos e do professor?

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Partir do cotidiano dos alunos e do professor signica trabalhar contedos que dizem respeito sua vida pblica e privada, individual e coletiva.

Saiba um pouco mais...As relaes existentes entre a histria e o cinema no so recentes, pois datam do surgimento deste, h um sculo. No entanto, o seu estudo mais aprofundado remonta h apenas trs dcadas e ainda se encontra longe de alcanar uma situao de relativo conforto no que concerne formulao de um arcabouo terico slido. Quer aprender Histria atravs do cinema?

Existe uma innidade de lmes no-documentrios que se reportam ao passado. Todavia, eles se diferem bastante uns dos outros, fato que diculta que lhes seja dado um tratamento cientco e sistemtico. pensando nessa diculdade que propomos uma classicao para os lmes histricos no-documentrios, baseada em critrios que consideram o contedo histrico dos mesmos e que compreende os seguintes tipos: Reconstruo histrica: corresponde aos lmes que abordam acontecimentos histricos cuja existncia comprovada pela historiograa e que contam com a presena de personagens histricos reais no seu enredo (interpretados por atores), cuja delidade relativa e se modica de um lme para outro. No se trata apenas dos lmes em que se realiza uma reconstruo audiovisual do passado (o que dicilmente levado s ltimas conseqncias) ou mesmo dos fatos, mas tambm, daqueles em que so esboadas interpretaes histricas, utilizando fatos comprovadamente reais. Como exemplos de reconstrues histricas, podemos citar Outubro (1927, S. Eisenstein), A lista de Schindler (1993, S. Spilberg), Spartacus (1960, S. Kubrick), 1592: a conquista do paraso (1992, Ridley Scott) ou A rainha Margot (1994, Patrice Chreau). Biograa histrica: trata-se dos lmes que se debruam sobre a vida de um indivduo e as sua relaes com os processos histricos. Na maior parte dos casos, esses lmes se limitam abordagem da vida dos chamados grandes homens, ou seja, aqueles indivduos destacados pela historiograa escrita e, principalmente, a tradicional. Como exemplos, citamos Napoleo (1927, Abel Gance), Cromwel (1970, Ken Hughes), Lamarca (1994, Srgio Resende) ou Rosa Luxemburgo (1986, Margareth von Trotta). lme de poca: compreende aqueles lmes cujo referente histrico no passa de um elemento pitoresco e alegrico, e cujo argumento nada possui de histrico no sentido mais amplo do termo. So inmeros os exemplos de lmes de poca: Sissi (1955, Ernst Marishka), A amante do rei (1990, Axel Corti) ou Anglica e o rei (1965, Borderie). Mesmo assim, alguns deles podem possuir elementos interessantes para o historiador, principalmente aqueles em que existe uma preocupao formal maior com a reconstruo ambiental e dos costumes, como o caso de Ligaes perigosas (1988, Steaven Frears), por exemplo. Fico histrica: abarca os lmes cujo enredo ccional, mas que, ao mesmo tempo, possui um sentido histrico real. Como exemplo deste tipo de lme, podemos citar O nome da rosa (1986, Jean-Jaques Annaud), A greve (1923, Eisenstein), A guerra do fogo (1981, Jean-JaquesMetodologia da Histria

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Annaud), Lili Marlene (1980, Fassbinder), etc. Filme-mito: so aqueles lmes que se debruam sobre a mitologia e que podem conter elementos importantes para a reexo histrica. Muitas vezes, o mito apresentado em paralelo a fenmenos histricos reais. Podemos citar, por exemplo, El Cid (1961, Antonny Mann) e A guerra de Tria (1961, Giorgio Ferroni). lme etnogrco: agrupa os lmes realizados com interesses cientco-antropolgicos. Como exemplo, podemos citar a produo pioneira de Flaherty (Nanouk, o esquim). adaptaes literrias e teatrais: engloba os lmes que so oriundos de uma adaptao de obras literrias e teatrais do passado. Alguns exemplos so Germinal (1995, Claude Berri) , Lucola: o anjo pecador (1975, Alfredo Sternheim), Os miserveis (1978, Gleal Joadan), Hamlet (1990, F. Zefrelli), Henrique V (1945, Laurence Olivier), 1984 de Orwell (1984, Michael Readford).Disponvel em:

Concluindo, a relao entre conhecimento histrico a ser ensinado e a cultura experiencial do aluno deve desenvolver-se num processo de reconstruo e compartilhamento de saberes culturais peculiares ao ambiente vivenciado pelo aluno e a sociedade como um todo. O conhecimento histrico tem inuenciado o ensino a desempenhar um papel mais relevante na formao do aluno, a ter conhecimento sobre sua identidade racial e a respeitar as desigualdades tnicas, envolvendo a reexo sobre a atuao do indivduo em suas relaes pessoais com o grupo de convvio, suas afetividades e sua participao no coletivo. J que ele, mesmo tendo seu lado individual, faz parte de um todo, o coletivo. Vale ressaltar ainda que o docente deve estar atento ao saber histrico j produzido e tambm a outras formas de saberes como aqueles difundidos pelos meios de comunicao a m de que possa problematiz-los, estabelecendo possibilidades de interpretao do passado, presente e futuro e propiciando, assim, a formao contnua e reexiva do educando. As especicidades e saberes locais, trabalhados com o objetivo de desenvolver uma conscincia crtica acerca das relaes da Histria ensinada em confronto com a atividade de pesquisa, esclarecendo os meandros da produo da Histria, possibilitar ao historiador-educador proporcionar uma nova concepo de sua prtica e uma nova forma de aprendizagem e desenvolvimento dos processos histricos. Compreendemos que possvel abordar a realidade de natureza local sem perder de vista uma anlise globalizante. Nesta prtica de reavaliao do saber docente, a Histria cumpre seu papel social.

Bibliografia Comentada...SCHIMIDT, Maria Auxiliadora. Ensinar histria. So Paulo.Scipione.2004. Esta obra oferece aos professores uma oportunidade para entrar em contato com propostas recentes destinadas ao ensino de histria. De forma clara, agradvel e enriquecedora, este manual ensina a ensinar histria por meio do trabalho com documentos e com a construo da narrativa histrica. Mostra, assim, como histrico em sala de aula. A experincia das autorasFTC EaD | HISTRIA

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- uma profunda ligao com o mundo acadmico e a vivncia intensa como docentes, seja nas classes de crianas e adolescentes, seja nas aulas da universidade ou nas atividades de formao continuada de professores - a garantia de uma obra indita e realmente til queles que buscam uma alternativa para suas aulas de histria. CARRETERO, Mrio. Aprendizado de conceitos sociais e histricos.In: CARRETERO, Mrio. Construir e ensinar As cincias sociais e a Histria. Porto Alegre: Artmed,1997. p.34-36. Carretero elabora algumas consideraes em torno do signicado do trabalho com conceitos da Histria, destacando as principais caractersticas dos conceitos histricos.

HISTRIA DO ENSINO DA HISTRIA NO BRASIL

A invocao do passado constitui uma das estratgias mais comuns nas interpretaes do presente. O que inspira tais apelos no apenas a divergncia quanto ao que ocorreu no passado e o que teria sido esse passado, mas tambm a incerteza se o passado de fato passado, morto e enterrado, ou se persiste, mesmo que talvez, sobre outras formas. Edward Said Anal para que serve a Histria? Como deve ser ensinada na Educao Bsica? Que gradaes devem ser observadas nos Ciclos I, II e Ensino Mdio? Primeiramente, devemos considerar que Histria a cincia humana bsica na formao do aluno, pela possibilidade de faz-lo compreender a realidade que o cerca e, conseqentemente, dot-lo de esprito crtico, que o capacitar a interpretar essa mesma realidade. Segundo Nadai (apud PINSKY et al., 2006), a Histria, como disciplina escolar autnoma, surgiu nos ns do sculo XIX, na Europa, imbricada nos movimentos de laicizao da sociedade e de constituio das naes modernas [...]. Genealogia e mudana sero, assim, os suportes do discurso histrico recm-institudo: a investigao das origens da civilizao contempornea s tem sentido atravs das sucessivas etapas de sua formao. No Brasil, desde a criao da Histria como disciplina, no sculo XIX, esta percorreu vrios caminhos, numa trajetria plural de difcil mapeamento. Com a sua implantao no Colgio D. Pedro II, a disciplina foi sustentada por diferentes concepes de Histria e tendncias historiogrcas. (SCHIMIDT, 2004) Vale ressaltar que, mesmo aps a Proclamao da Repblica, a principal referncia dos programas curriculares continuou sendo a Histria. Com a Lei 5.692/71, foi ocializado o ensino de Estudos Sociais nas escolas brasileiras, cando os contedos especcos da Histria destinados apenas aos alunos do antigo 2 grau. Neste sentido, a concepo de contedos da Histria continua atrelado a uma concepo tradicional.Metodologia da Histria23

Na dcada de 80, a Histria ensinada nas escolas e universidades foi objeto de questionamentos quanto a sua funcionalidade. As reexes apresentadas nesse perodo apontam a existncia de diversas abordagens e temticas para o ensino de Histria, alm de questionar o currculo, foram questionados tambm: Os contedos; As metodologias; O livro didtico; As nalidades do ensino; As questes epistemolgicas do conhecimento histrico; A reproduo do conhecimento histrico. A dcada de 80 foi bastante expressiva para combater a proposta de Estudos Sociais, identicadas com os interesses e as ideologias polticas dominantes. A reconquista da disciplina Histria, como conhecimento especco e autnomo, causou discusses acadmicas e permitiu tambm um perl de professor de Histria cuja formao era dividida, nesse perodo, entre os cursos de graduao em Licenciatura em Histria curta ou plena, alm do curso de Estudos Sociais curto ou pleno. Ainda na dcada de 80, a Histria trabalhada nas escolas e universidades brasileiras foi objeto debates e inmeros estudos, tornando-se um campo de pesquisa de teses, dissertaes e publicaes, como livros e artigos especializados. As reexes apresentadas nesse perodo apontam a existncia de diversas abordagens e temticas para o ensino de Histria, alm de questionamentos acerca dos contedos curriculares, das metodologias de ensino, o livros didtico e dos objetivos de ensino. As questes epistemolgicas do conhecimento histrico e a problemtica da reproduo do conhecimento no ensino da Histria para a escola fundamental e mdia tambm tornaram-se objeto de discusso. Os anos 90 trouxeram, nas entrelinhas, a crise da Histria e a possibilidade de novos paradigmas tericos. Foram apresentadas mudanas no currculo de Histria para adequ-la sociedade contempornea, concomitantemente a necessidade de organizar os currculos a partir da Lei Federal n 9.394 de 20 de dezembro de 1996, determinou competncia da Unio, do Distrito Federal e dos Municpios o estabelecimento de novas diretrizes para a organizao de currculo e seu contedo mnimo. Questes relativas ao tempo presente so base de vrias concepes e estratgias do ensino da Histria. Entretanto, as relaes entre o presente e o passado, no Ensino Fundamental, merecem cautela e reexo, para que no se incorra em analogias excessivas e anacronismos. preciso, todavia, considerar que a clssica idia de que o passado ajuda a explicar o presente permite, por meio da transposio didtica, estabelecer relaes diversas (por exemplo, de causa e efeito) entre acontecimentos e perodos, construindo uma espcie de dilogo entre as realidades do presente e do passado, e desenvolvendo a percepo de alteridades. O tempo, matria-prima da Histria, sempre foi, no por acaso, de grande importncia para a compreenso de seu ensino. Questes de fundamentao cognitiva, relacionadas construo da noo de tempo, foram amplamente estudadas, sobretudo, por Piaget e seus sucessores.24

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Entretanto, a partir desses estudos, outras questes foram levantadas e debatidas envolvendo a construo da noo do tempo histrico, as noes relativas aos nveis e ritmos da durao, a percepo das diferentes temporalidades e de uma historicidade, e, at mesmo, a construo de uma conscincia histrica. Paralelamente a esse processo, foi redimensionada a importncia da construo da noo de espao para o ensino da Histria no 3 e 4 ciclos, passando a ser importante a percepo de um espao alterado e recriado no tempo sob a inuncia intencional do trabalho humano. Sociedade e Trabalho, aqui, passam a ser os principais conceitos com as quais necessitar trabalhar o ensino da Histria para construir as percepes das possibilidades da relao espao/ tempo e de suas representaes. As sociedades e o trabalho humanos, assim considerados, so, portanto, o grande objeto da histria a ser ensinada. As possibilidades de reconstruo e de representao do passado, considerando-se as diferentes temporalidades, exige o desenvolvimento de noes derivadas da interface espao/ tempo, como: sucesso, durao, simultaneidade, permanncias, rupturas, mudanas, etc. Observamos que a construo dessas noes uma operao mltipla, que ocorre principalmente pelo processo de escolarizao e que aponta para a compreenso da causalidade histrica, devendo o professor estar atento s diferentes situaes do ensino em que possam ser exploradas, sem perder de vista a relatividade cultural (outros contextos culturais que possam ser diferentes a respeito do tempo e do espao.). As questes relativas relao espao/tempo e suas formas de compreenso so a base do entendimento do mundo histrico e da construo de uma conscincia histrica. Nesse sentido, para alm das questes cognitivas, destacamos uma preocupao bastante contempornea em relao s questes das sensibilidades. Dessa forma, importante que o ensino da Histria esteja considerando a construo no apenas de noes e/ conceitos, mas tambm de sentimentos. Os estudos mais recentes sobre o assunto apontam a necessidade de se construrem pertenas e se reconhecerem sentimentos e sensibilidades tambm por meio do ensino da Histria. O reconhecimento sensvel de que os sentimentos tambm tm sua histria possibilitam compreender no apenas o que o Outro disse ou fez, mas aquilo que foi. A construo de um sentimento de pertena junto ao aluno, por sua vez, ao desenvolver a compreenso de que a experincia (histria vivida) de cada um pertence ao uir da histria de tantos, impulsionaria a construo de uma conscincia histrica. Dessa forma, oferecendo-se ao aluno diversas oportunidades de reconhecer o passado, criar-se-iam mltiplas possibilidades de caminhos na complexa histria que seu prprio crescimento, por meio da construo do sentido de pertena (a este espao/ tempo). Dependemos, no entanto, do reconhecimento da importncia da Memria para o ensino da Histria, em um mundo que privilegia, cada vez mais, a efemeridade das informaes (conseqncia do redimensionamento da relao espao/ tempo conferida pela atual tecnologia) e a velocidade do esquecimento. Nesse sentido, necessria a compreenso de que o reconhecimento de uma pluralidade de passados que apontar os possveis futuros. As questes do tempo presente e as possveis relaes entre as noes de espao/ tempo compem, dessa forma, o o condutor de nossa viso de rea. Pensamos, assim, que o ensino da Histria, ao compreender as possveis relaes entre Memria e Ensino da Histria, tendo em vista o esquema conceitual Identidade, Cidadania e Cultura e as noes de Sociedade e Trabalho, dever considerar as diversas formas de relaes de poder presentes em nossa sociedade.

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Em resumo, o ensino da Histria no Brasil passou por vrias transformaes, que acompanharam, muitas vezes, as mudanas ocorridas na organizao e nas propostas educacionais brasileiras. Segundo Schmidt (2004), podem-se apontar trs fases caractersticas desse ensino: A fase tradicional; A fase do predomnio dos Estudos Sociais; A fase do ensino da Histria.As transformaes do ensino da Histria no Brasil

Compreenso da nao brasileira como fruto da integrao entre trs raas: branca, ndia e negra. Integrao do educando em um meio cada vez mais amplo. Estudo da histria do presente, evitando o estudo do passado pelo passado. Formao de cidados para a sociedade em desenvolvimento, democrtica e industrial. Contribuio para a construo da cidadania. Desenvolvimento de raciocnios historicamente corretos. Aquisio da capacidade de anlise da relao presente-passado. Apreenso da pluralidade de memrias, e no somente da memria nacional. Preocupao com as nalidades do ensino da Histria no mundo contemporneo.

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A partir da tabela, podemos perceber uma evoluo da disciplina Histria que passou a ser tratada como autnoma nas ltimas sries do Ensino Fundamental e ampliou seu espao em nvel mdio. O contedo da Histria ensinada assumiu diferentes imagens nos diversos espaos onde se discute as reformulaes, visando revaloriz-la como campo de saber autnomo fundamental para a formao da cidadania.

Texto complementar...A disciplina Histria nasce em 1837, com o Colgio Pedro II, no Rio de Janeiro. O currculo era denido a partir das orientaes do Instituto Histrico e Geogrco Brasileiro, IHGB, responsvel por formular a genealogia nacional. A formao da nacionalidade era a grande questo do momento e a escola tinha por objetivo formar o herdeiro dessa evoluo para lider-la. A Histria do Brasil escrita e ensinada na escola como o resultado da contribuio do negro, do branco e do ndio, que forjaram uma raa mestia, sem qualquer conito. O ndio, destacado o seu herosmo, era tratado como povo extinto; o negro, como mercadoria produtora de outras mercadorias cuja contribuio tnica vinha sendo diluda pela miscigenao. Finalmente, ao branco era atribuda a contribuio pela transmisso da cultura europia passada a todos atravs da lngua28

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e da catequese, experincias consideradas altamente positivas. O o condutor o processo civilizatrio e o grande objetivo a construo de um sentimento de identidade nacional do cidado patriota. Nas dcadas que se seguiram manteve-se esta viso da Histria como genealogia da nao, instrumento para o desenvolvimento do patriotismo e do sentimento nacional, cuja unidade repousa sobre os pilares das unidades tnica, administrativa, territorial e cultural. A Histria, ensinada como uma sucesso de feitos patriticos era associada ainda aos ritos comemorativos, laudatrios dos heris da ptria.(KESSEL, Zilda. Memria nos Parmetros Curriculares. Disponvel em: .

Os Parmetros Curriculares Nacionais trazem um resumo histrico do percurso do ensino da Histria no Brasil. Vamos ler um pouco?CARACTERIZAO DA REA DE HISTRIA

A Histria no Ensino Fundamental Nem sempre est claro para os educadores por que a Histria faz parte do currculo escolar e qual a importncia da sua aprendizagem na formao do jovem. Mas essas questes so fundamentais quando se pretende reetir, repensar ou posicionar-se em relao ao ensino de Histria praticado. Na inteno de auxiliar o professor na reexo sobre os pressupostos histricos e pedaggicos de concepes de ensino e sobre as abordagens e contedos selecionados para os estudos escolares, apresenta-se na seqncia um histrico da rea no Brasil sem pretender esgotar o seu elenco de problemticas. Esse histrico pretende contribuir para que o professor se posicione diante do ensino de Histria, especialmente quanto s suas nalidades e possibilidades de transformaes. De modo geral, o ensino de Histria pode ser caracterizado a partir de dois grandes momentos. O primeiro teve incio na primeira metade do sculo XIX, com a introduo da rea no currculo escolar. Aps a Independncia, com a preocupao de criar uma genealogia da nao, elaborou-se uma histria nacional, baseada em uma matriz europia e a partir de pressupostos eurocntricos. O segundo momento ocorreu a partir das dcadas de 30 e 40 deste sculo, orientado por uma poltica nacionalista e desenvolvimentista. O Estado tambm passou a realizar uma interveno mais normativa na educao e foram criadas as faculdades de losoa no Brasil, formando pesquisadores e professores, consolidando-se uma produo de conhecimento cientco e cultural mais autnoma no pas. A Histria, como rea escolar obrigatria, surgiu com a criao do Colgio Pedro II, em 1837, dentro de um programa inspirado no modelo francs. Predominavam os estudos literrios voltados para um ensino clssico e humanstico e destinados formao de cidados proprietMetodologia da Histria29

rios e escravistas. [...] Os objetivos da insero da Histria do Brasil no currculo estavam voltados para a constituio da idia de Estado Nacional laico, mas articulado Igreja Catlica. O Estado brasileiro organizava-se politicamente e necessitava de um passado que legitimasse a sua constituio. Os acontecimentos histricos ensinados iniciavam com a histria portuguesa, a sucesso de reis em Portugal e seus respectivos governos e, na seqncia, introduzia-se a histria brasileira, as capitanias hereditrias, os governos gerais, as invases estrangeiras ameaando a integridade nacional. Os contedos culminavam com os grandes eventos da Independncia e da Constituio do Estado Nacional, responsveis pela conduo do Brasil ao destino de ser uma grande nao. O Instituto Histrico e Geogrco Brasileiro (IHGB), criado no mesmo ano do Colgio Pedro II, produziu uma srie de trabalhos que gerou conseqncias para o ensino da Histria nacional. Seus membros lecionavam no colgio e foram responsveis pela formulao dos programas, elaborao de manuais e orientao do contedo a ser ensinado nas escolas pblicas. Nas escolas confessionais, mantinha-se o ensino da Histria Universal e da Histria Sagrada. A primeira proposta de Histria do Brasil elaborada pelo Instituto e que repercutiu no ensino de Histria destacava a contribuio do branco, do negro e do ndio na constituio da populao brasileira. Apesar de valorizar a idia de miscigenao racial, ela defendia a hierarquizao que resultava na idia da superioridade da raa branca. Privilegiava o Estado como o principal agente da histria brasileira, enfatizando alguns fatos essenciais na constituio do processo histrico nacional, as faanhas martimas, comerciais e guerreiras dos portugueses, a transferncia e o desenvolvimento das instituies municipais portuguesas no Brasil, o papel dos jesutas na catequese e as relaes entre a Igreja e o Estado. A Histria era relatada sem transparecer a interveno do narrador, apresentada como uma verdade indiscutvel e estruturada como um processo contnuo e linear que determinava a vida social no presente. [...] A Histria Nacional identicava-se com a Histria Ptria, cuja misso, juntamente com a Histria da Civilizao, era integrar o povo brasileiro moderna civilizao ocidental, reforando a viso linear, determinista e eurocntrica da Histria. Na sua especicidade, a Histria Ptria era entendida como o alicerce da pedagogia do cidado e seus contedos deveriam enfatizar as tradies do passado homogneo de lutas pela defesa do territrio e da unidade nacional e os feitos gloriosos de personagens identicados com ideais republicanos. no contexto do nal do sculo XIX que so construdos alguns mitos da Histria brasileira, presentes at hoje no ensino (bandeirantes como Raposo Tavares e Borba Gato, militares como Duque de Caxias, mrtires como Tiradentes, etc.). A moral religiosa foi absorvida pelo civismo, orientando a idia de que os contedos da Histria Ptria no deveriam car restritos ao mbito especco da sala de aula. Prticas e rituais cvicos, como festas, desles, eventos comemorativos e celebraes de culto aos smbolos da Ptria, foram desenvolvidos para envolver o conjunto da escola e estabelecer o ritmo do cotidiano escolar. Esperava-se que o estudante recebesse uma formao moral crist atrelada a uma conscincia patritica, sustentada na ideologia da cincia, do progresso e da ordem. Apesar dos discursos e das sucessivas reformas, os governos republicanos das primeiras dcadas do sculo XX pouco zeram para alterar a situao da escola pblica, mantendo-se a j precria formao de professores, geralmente autodidatas. Mesmo assim ou por isso mesmo,30

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o perodo constituiu-se em momento de fortalecimento do debate dos problemas educacionais. Surgiram propostas alternativas ao modelo ocial de ensino, logo reprimidas pelo governo republicano, como as escolas anarquistas, com currculo e mtodos de ensino prprios, nos quais a Histria deixava de enfocar a hierarquia entre povos e raas, para identicar-se com os principais momentos das lutas sociais, como a Revoluo Francesa, a Comuna de Paris, a Abolio, etc. A partir de 1930, com a criao do Ministrio da Educao e Sade Pblica e a Reforma Francisco Campos, acentuou-se o fortalecimento do poder central do Estado e o controle sobre o ensino. Com a criao das universidades inicia-se a formao do professor secundrio. Ao mesmo tempo amplia-se e consolida-se, ainda que com diculdades, um campo cultural autnomo com a expanso do cinema e do rdio. [...] O ensino de Histria era um instrumento de desenvolvimento do patriotismo e da unidade tnica, administrativa, territorial e cultural da nao. Com o processo de industrializao e urbanizao, repensou-se sobre o papel da populao brasileira na Histria. Enquanto alguns estudos continuavam a identicar as razes do atraso do pas no predomnio de um povo mestio, outros apontavam a necessidade de se buscar conhecer a identidade nacional, sua especicidade cultural em relao a outros pases, como meio de assegurar condies de igualdade na integrao da sociedade brasileira civilizao ocidental. No debate educacional na dcada de 30, tornou-se vitoriosa a tese da democracia racial expressa em programas e livros didticos de ensino de Histria. Por esta tese, na constituio do povo brasileiro predominavam a miscigenao e a total ausncia de preconceitos raciais e tnicos. O povo brasileiro era estudado como descendente de brancos portugueses, ndios e negros, e, a partir dessa trade, de mestios. Nessa perspectiva, todos conviviam harmonicamente em uma sociedade multirracial e caracterizada pela ausncia de conitos. [...] Sob inspirao do nacional-desenvolvimentismo, nas dcadas de 50 e 60, o ensino de Histria voltou-se especialmente para as temticas econmicas. O reconhecimento do subdesenvolvimento brasileiro levou ao questionamento da predominncia da produo agrcola-exportadora e valorizao do processo de industrializao. Enfatizou-se o estudo dos ciclos econmicos, sua sucesso linear no tempo . cana-de-acar, minerao, caf e industrializao e, exclusivamente, a Histria de cada centro econmico regional que era hegemnico em cada poca. A ordenao sucessiva e linear indicava a determinao histrica de que o desenvolvimento s seria alcanado com a industrializao. [...] Nesta poca, alm da constatao da importncia do ensino de Histria na formao do cidado poltico, ele passou a ser considerado tambm fundamental para a formao intelectual do estudante. Incorporou objetivos para promover o seu pensamento crtico. [...] A escola vive, hoje, contradies fundamentais. Seus agentes lutam simultaneamente por mudanas e pela manuteno de tradies escolares. Mantm articulaes com esferas polticas e institucionais, incorporam expectativas provocadas por avaliaes de desempenho do sistema educacional brasileiro, orientam-se por avaliaes para ingresso no ensino mdio ou superior, buscam contribuies de pesquisas e experincias acadmicas e procuram atender parte das exMetodologia da Histria31

pectativas sociais e econmicas das famlias, dos alunos e dos diferentes setores da sociedade. A constatao dessas contradies fortalece, cada vez mais, a convico de que o saber escolar est relacionado a uma diversidade de tradies prprias da histria da educao brasileira e mantm relaes com poderes e valores diversicados da realidade social. Impe a necessidade de valorizar o professor como um trabalhador intelectual ativo no espao escolar, responsvel junto com seus iguais pela clareza e denio dos objetivos e dos contedos para a disciplina que leciona. Aponta para o fato de que a transformao da prtica do docente s acontece quando, no exerccio de seu trabalho, ele coloca em discusso suas aes, explicita seus pressupostos, problematiza a prtica, busca e experimenta alternativas de abordagens e de contedos, desenvolve atividades interdisciplinares, faz escolhas diversicadas de recursos didticos, analisa diculdades e conquistas, compartilha experincias e relaciona a prtica com a teoria. (BRASIL. Ministrio da Educao. Parmetros Curriculares Nacionais: Histria, 2000).

Bibliografia Comentada...PINSKY, Jaime (org). O ensino de Histria e a criao do fato. So Paulo:Contexto,1984. uma discusso muito atual sobre as formas de os historiadores criarem o fato histrico, dos livros didticos reproduzirem estas verdades e de muitos professores apresentarem-nas como denitivas. Embora com posies tericas diferentes, os autores colocam-se numa postura antipositivista e ressaltam a importncia da historicidade e at o subjetivismo como ingredientes da leitura do passado.

ENSINO DE HISTRIA NOS CURRCULOS ATUAIS

Por que Histria? Papai, ento me explica para que serve a histria (Marc Bloch, 2001)

Milhares so os jovens que, como o garoto do qual fala Marc Bloch na introduo do seu livro escrito em 1943 Apologia da Histria ou o Ofcio de Historiador, dirigem essa questo aos professores de Histria em suas salas de aula. Responder aos jovens essa questo requer muito mais do que saber falar a eles com clareza, simplicidade e correo sobre o que a Histria. Requer oferecer-lhes condies para reetirem criticamente sobre sua experincia de viver a histria e para identicarem as relaes que essas guardam com experincias histricas de outros sujeitos em tempos, lugares e culturas diversas da sua. Auxiliar os jovens a construrem o sentido do estudo da Histria constitui-se, pois, num desao que requer aes educativas articuladas. Trata-se de lhes oferecer um contraponto que permita resignicar suas experincias no contexto e na durao histrica da qual fazem parte e, tambm, apresentar os instrumentos cognitivos que os auxiliem a transformar os aconteci32

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mentos contemporneos e aqueles do passado em problemas histricos a serem estudados e investigados.

Como Ensinar...A integrao da Histria com as demais disciplinas das Cincias Humanas, as aproximaes entre Histria ensinada e a produo acadmica e os avanos do debate historiogrco aborda a importncia dos novos temas em Histria, a redenio do tratamento metodolgico da pesquisa, das fontes documentais, dos agentes sociais. Reconhece-se, tambm, o papel das competncias de leitura e interpretao de fontes e de textos, alm de enfatizar noes bsicas a serem trabalhadas no ensino mdio, como a identidade, a cidadania, a memria, o tempo histrico, priorizando ritmos e durao histricos. A partir de problemticas contemporneas, pode-se selecionar os contedos signicativos por meio da escolha de temas que respondam a esses problemas. A organizao dos contedos por temas, aliada prtica da pesquisa, apresentada como uma possibilidade que contribui para o desenvolvimento de competncias e habilidades, aptas a favorecer a formao do estudante como cidado. Ao nal, um quadro demonstra a correspondncia entre os trs campos de competncias gerais da rea com as competncias e habilidades especcas a serem desenvolvidas em Histria. (BRASIL, 2000).

A PERSPECTIVA CRTICA DO CURRCULO

Atualmente, em sentido lato, o estudo na rea do currculo no avanou muito alm dos pressupostos e paradigmas clssicos existentes h algumas dcadas. H uma aceitao passiva das posturas que em grande medida desconsideram a complexidade do estudo do currculo e que por essa razo no tm realmente contribudo para mudar as perspectivas bsicas. A anlise marxista elaborada, a partir da dcada de 70, por estudiosos ligados rea de sociologia da educao, possibilitou, atravs da dialtica, novos estudos sobre o currculo, o que representou uma tentativa de construir um novo modelo de elaborao curricular.HORN, Geraldo Balduino. Ensino de Histria e seu Currculo:Teoria e Mtodo.Petrpolis.RJ: Vozes,2006.

Histria nas Atuais Propostas Curriculares As transformaes do ensino de Histria podem ser identicadas mediante a anlise de vrias propostas curriculares elaboradas a partir de 1980 pelos Estados, Municpios e pelos Parmetros Curriculares Nacionais, produzidos pelo poder federal na segunda metade da dcada de 90. Nos ltimos dez anos tem surgido uma variedade de propostas que almejam proporcionar o ensino de Histria mais signicativo para a gerao do mundo tecnolgico, com seus ritmosMetodologia da Histria33

diversos de apreenso do presente e seu intenso consumismo, o qual desenvolve, no pblico escolar, expectativas utilitrias muito acentuadas.(BITTENCOURT, 2004).

Segundo Bittencourt (2004), as propostas curriculares inserem-se em um momento importante do ensino de Histria, entretanto ela ressalta a importncia de analisar o rigor metodolgico para as novas propostas dos currculos para podermos perceber efetivamente se est ocorrendo o processo de mudanas. H propostas de mudanas que precisam ser identicadas, contudo devemos vericar as tradies escolares que permanecem e as vrias interpretaes dadas aos antigos contedos e mtodos. Uma Outra Proposta de Currculo Os currculos no somente deveriam inquietar o professor, mas deveriam tambm (...) dar pistas de para onde o novo mundo e a nova escola esto a caminhar. Da a necessidade desta nova proposta ser simples e objetiva, possvel mas instigante, vivel mas que caiba a utopia da construo de uma nova sociedade: que passa pela escola, no se resume nela, mas no prescinde dela. E portanto, de cada um de ns. As discordncias comeam quando se analisa o papel poltico desses currculos e das escolas organizadas a partir deles. De acordo com Palma Filho, em cuja gesto iniciou-se o projeto de reforma de curricular da Histria: 1) o currculo no pode ser separado do social, deve ser historicamente situado e culturalmente determinado; 2) o currculo um ato inevitavelmente poltico, que objetiva a emancipao das camadas populares. A escola onde se aplicaria tal currculo era vista: (...) como um espao de luta, de contradio, e nesse sentido, do ponto de vista poltico acaba por transmitir uma mensagem otimista, de esperana. Para Palma Filho, a escola era uma instituio poltica, capaz de promover mudanas estruturais na sociedade e nesse sentido, um dos espaos em que o indivduo exerce seu direito cidadania. No faz sentido, por outro lado, atribuir escola o papel de agncia conscientizadora do povo a respeito de seus direitos e do seu potencial de ao poltica, como foi postulado por vrios pedagogos nos ltimos dez anos. (...) necessrio reconhecer que a escola uma instituio cujo objetivo fundamental a socializao dos conhecimentos acumulados. No h como negar que o papel inerente escola seja a transmisso do saber sistematizado - formao cultural como instrumento de insero social dos indivduos enquanto cidados. esta a sua funo possvel e indispensvel. A escola no capaz de desenvolver a conscincia poltica necessria para que o cidado consiga exercer de fato a sua cidadania. Ao contrrio da perspectiva libertria proclamada por Palma Filho, a escola possui poderes bastante limitados, cabendo a ela instrumentalizar o cidado para sua adequao sociedade.34

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Mais uma Perspectiva Crtica de Currculo O Currculo de Histria tem se revelado um projeto pedaggico de suma importncia na formao de professores e pesquisadores. Ao no dissociar ambas habilidades, o currculo tem trazido luz uma nova gerao capaz de operar com os conhecimentos, mtodos e teoria da histria nos diversos nveis de atuao. A operacionalizao do Currculo exige da coordenao o domnio de sua losoa. O interessante equilbrio entre a relao coordenao, e os corpos discente e docente concretiza o dinamismo do prprio currculo.COMPETNCIAS E HABILIDADES ESSENCIAIS

... Ensinar Histria ensinar a fazer Histria. impossvel ensinar Histria sem o domnio suciente de como se d a produo histrica. Ensinar no se perfaz com transmitir conhecimentos, muito menos informao. Nem o professor mero revendedor de mercadoria disponvel no estoque do curso, ou simples executante de um programa de distribuio (facilitada por tcnicas didticas) de noes consolidadas pelo uso. Ao contrrio, a reconstruo do prprio processo de pesquisa deve participar, de uma forma ou outra, do processo pedaggico. J se v que esta perspectiva permite resolver tambm a falsa dicotomia de objetivos de um curso de Histria, indeciso entre a formao do pesquisador e do professor: as diferenas existem, claro, mas so de grau, contexto e organizao prtica do trabalho, no de natureza (MENEZES, 1984). Diramos mesmo que a losoa de curso implicada nesta passagem que reproduzimos a nica forma conseqente de defender a unio indissolvel do ensino e da pesquisa na escola ponto de unanimidade das associaes de todos os segmentos da comunidade universitria. Sergundo Horn (2006), atualmente, em sentido lato, o estudo na rea do currculo no avanou muito alm dos pressupostos e paradigmas clssicos existentes h algumas dcadas. H uma aceitao passiva das posturas que em grande medida desconsideram a complexidade do estudo do currculo e que por essa razo no tm realmente contribudo para mudar suas perspectivas bsicas. Se tomarmos a educao como seleo e organizao de conhecimento disponvel em determinado perodo e o currculo como uma totalidade de experincias organizadas com o m de possibilitar acesso a tais conhecimentos, vericamos que a assero acima indica o caminho que necessita ser percorrido. Os currculos escolares tm sido objeto de muitas anlises que situam seu signicado sciopolticos. Essa dimenso precisa ser considerada para determinar o caminho da educao escolar e de cada disciplina a m de atender a congurao de um conhecimento prprio da sociedade contempornea. As reformulaes curriculares nos anos 90 advm da nova congurao mundial e dos modelos econmicos vigentes. Esta lgica cria novas formas de submisso ao mundo capitalista. Segundo Bittencour (2004), existe a lgica de privatizao, do lucro, da tecnologia, lgica essa que submete as polticas e procura impor suas metas a todos os pases. sociedade, cabe a difcil tarefa de ser educada para competir e viver de acordo com a lgica do mercado, que exige domnios mais amplos do conhecimento. Sendo assim, nos pases emergentes caracterizados pelas desigualdades, necessrio objeMetodologia da Histria35

tivos especcos segundo a lei do mercado. O pblico escolar existente em tais condies heterogneo e para ser atendido em nvel aceitvel de escolaridade, alm de investimentos considerveis do setor o governamental necessita de currculos exveis para se adequar as circunstncias e diversidades. As contradies nas reformulaes curriculares diante de tamanha diversidade se tornaram inevitveis, apesar da tendncia de homogeneizao da sociedade globalizada. Desta forma, Bittencourt (2004) arma que, no Brasil, as reformulaes curriculares iniciadas no processo de redemocratizao da dcada de 80 pautaram-se pelo atendimento s camadas populares com enfoques voltados para uma formao poltica que pressupunha fortalecimento da participao de todos os setores sociais no processo democrtico. Juntamente com tais propsitos, introduziram-se diversas propostas que estavam sendo elaboradas, tambm os projetos vinculados aos das polticas liberais, voltadas para os interesses internacionais. Como parte da poltica do governo federal, alinhado ao modelo liberal, o MEC comprometeu-se a realizar total reformulao curricular, que abarcasse todos os nveis de escolarizao, do infantil ao superior, para atender aos novos pressupostos educacionais. De acordo com Bittencourt (2004), para os currculos do Ensino Fundamental e Mdio foram elaborados os Parmetros Curriculares Nacionais (PCN), sob uma orientao internacional oriunda de pressupostos da psicologia de aprendizagem piagetiana. Vale ressaltar que essa tendncia psicologista dos currculos no nova, mas foi redimensionada sob novas perspectivas, prevalecendo as interpretaes de alguns educadores, notadamente a do espanhol Csar Coll daquela que se denomina construtivismo. Essa linha de orientao para os currculos norteou as relaes dos pases ibricos e da Amrica Latina, especialmente a do Mercosul.

Texto Complementar...As Concepes de Contedos Escolares de Aprendizagem...

Hoje, mais do que nunca, a histria uma disputa. Certamente, controlar o passado sempre ajudou a dominar o presente; em nossos dias, contudo, essa disputa assumiu uma considervel amplitude.Marc Ferro

Repensando as escolas Ilustrao: Michael Duffy Rethinkingshools.org Eleger a cidadania como eixo vertebrador da educao escolar implica colocar-se explicitamente contra valores e prticas sociais que desrespeitam aqueles princpios, comprometendo-se com as perspectivas e decises que os favoream. Isso refere-se a valores, mas tambm a conhecimentos que permitam desenvolver as capacidades necessrias para a participao social efetiva (PCN Temas Transversais, 1998: p. 25).

Se realizarmos uma rpida leitura dos currculos de Histria, por exemplo, elaborados no Brasil a partir dos anos 1980, em especial dos Parmetros Curriculares Nacionais (PCN) para o ensino fundamental e mdio, perceberemos a armao recorrente (quase nauseante) da necessidade de se formar alunos com autonomia intelectual e pensamento crtico. Tal armao, a todo o momento, parece querer ad36

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vertir os professores da importncia de se afastar a idia que a disciplina tem a misso de imprimir nas conscincias coletivas uma narrativa nica exaltando a nao e o Estado. E no de se estranhar a insistncia nessa advertncia, uma vez que, desde seu nascedouro como rea de saber no sculo XIX at a segunda metade do sculo XX, o ensino da Histria nas escolas no era mais do que uma forma de educao cvica pedagogia do cidado. Sua nalidade maior era conrmar a nao no Estado em que se encontrava no momento, justicar sua ordem social e poltica e ao mesmo tempo seus dirigentes e criar nos membros da nao o sentimento de pertencimento, respeito e dedicao para servi-la. O aparelho didtico desse ensino era uma narrao de fatos seletos, momentos fortes, etapas decisivas, grandes personagens, acontecimentos simblicos e, de vez em quando, alguns mitos graticantes. Cada pea dessa narrativa tinha sua relevncia e era cuidadosamente selecionada pelos construtores da memria]. H, portanto, uma tradio de longa data de se pensar e ensinar a histria, que ainda impera no cotidiano da sala de aula, a se enfrentar quando se prope novas maneiras de ser, sentir e saber o mundo.Cada criana ou jovem brasileiro, mesmo de locais com pouca infraestrutura e condies socioeconmicas desfavorveis, deve ter acesso ao conjunto de conhecimentos socialmente elaborados e reconhecidos como neSobre o autor: cessrios para o exerccio da cidadania para deles poder usufruir. Se existem diRenilson Rosa Ribeiro ferenas socioculturais marcantes, que Bacharel, Licenciado e Mestre em Histria IFCH/UNICAMP determinam diferentes necessidades de aprendizagem, existe tambm aquilo Doutorando em Histria Cultural - IFCH/UNICAMP que comum a todos, que um aluno de Professor de Educao Bsica de Rede Ocial de Ensino do Es- qualquer lugar do Brasil, do interior ou tado de So Paulo do litoral, de uma grande cidade ou da zona rural, deve ter o direito de aprender Disponvel em: tado (PCN Introduo, 1997: p. 35).

CURRCULOS X CONTEDO ESCOLARES

As propostas curriculares recentes tm demonstrado centrar-se na relao ensino e aprendizagem e no mais exclusivamente no ensino como antigamente. Estudos recentes assinalam as diferentes formas de produo dos currculos e os diferentes sujeitos que executam as tarefas sendo possvel distinguir o conjunto de elementos que deles participam e os integram desde a sua elaborao enquanto documento ocial at a efetivao dos professores e alunos na sala de aula. Segundo Bittencourt (2004), atualmente a idia de currculo concebida em todas as dimenses: Currculo formal (pr-ativo ou normativo) criado pelo poder estatal; Currculo real (interativo) correspondente ao que realizado na sala de aula por professores e alunos; Currculo oculto constitudo por aes que impem normas e comportamentos vividos nas escolas, mas sem registros ociais, tais como discriminaes tnicas e sexuais, valorizao do individualismo, ausncia ou valorizao do trabalho coletivo; Currculo avaliado materializa-se pelas aes dos professores e das instituies ao meMetodologia da Histria37

direm o domnio dos contedos explcitos pelos aluno e incorpora valores no apenas instrucionais, mas tambm educacionais como habilidades tcnicas da cultura letrada. Vale ressaltar que as divergncias sobre os contedos escolares ainda permeiam o cotidiano escolar ou currculo real, assim como esto implcitas nas formulaes dos currculos ociais. O debate sobre este tema tem trazido avanos para o estabelecimento de critrios de seleo de contedos, resultando em uma concepo mais complexa quanto ao ensino-aprendizagem. Bittencourt (2004) enfatiza ainda que com os currculos mais recentes os contedos escolares correspondem a integrao dos vrios conhecimentos adquiridos na escola. Destarte concebem-se como contedo escolar tanto os contedos escolares de cada disciplina como a aquisio de valores, habilidades e competncias que fazem parte das prticas escolares. Os contedos escolares incluem, por exemplo, aprendizagem de novas linguagens, desde a norma culta da lngua ao domnio do signicado das imagens das revistas em quadrinhos, de propagandas ou de lmes. Em Histria, devemos compreender a apreenso de contedos como alm da capacidade dos alunos dominarem informaes e conceitos de perodos histricos, mas, principalmente, a capacidade dos educandos estabelecer relaes e comparaes com outras pocas, utilizando de diversos recursos, desde leitura de mapas, imagens, tabelas, grcos ou de interpretao de textos. Bittencourt (2004) enfatiza algo importante a todo e qualquer professor: A escola no apenas o lugar onde os alunos so alfabetizados ou obtm informaes de maneira sistematizada pelas disciplinas escolares, mas tambm a instituio em que se aprendem os contedos sociais e culturais associados a comportamentos, valores e iderios polticos. Esse conjunto de saberes so contedos escolares, que exigem, portanto, uma integrao nos programas e planos escolares e devem ser igualmente planejados e avaliados. Diante do exposto ao longo do texto, possvel armar que existe no Brasil uma diversidade de formas de ensinar e aprender Histria no decorrer do processo de implementao dos Parmetros Curriculares Nacionais e dos sistemas nacionais e estaduais de avaliao. importante observar que se consolidou entre ns mltiplas concepes tericas, polticas, ideolgicas e metodolgicas no ensino de Histria desenvolvido nas redes pblica e privada.

Texto complementar...Propostas Curriculares de Histria: Caractersticas Gerais A alterao nas formulaes tcnicas dos textos curriculares, que passaram a apresentar fundamentaes sobre conhecimento histrico e sobre os demais tpicos da disciplina; A preocupao com a implementao dos currculos, buscando sua legitimidade junto aos professores, justicando sua produo e procurando diluir formas de resistncia aos documentos ociais;38

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A redenio do papel do professor, fornecendo-lhe maior autonomia no trabalho pedaggico, concepo est expressa na ausncia de um rol de contedos estabelecidos de forma obrigatria para cada srie ou ciclo; Apresentao mais detalhada dos pressupostos tericos metodolgicos do conhecimento histrico; A fundamentao pedaggica baseada no construtivismo, expresso de maneiras diversas, mas tendo como princpio que o aluno sujeito ativo no processo de aprendizagem; Aceitao de que o aluno possui conhecimento prvio sobre os objetos de estudos histricos, obtido pela histria de vida e pelos meios de comunicao, o qual deve ser integrado ao processo de aprendizagem; A introduo de estudos histricos a partir das sries iniciais do Ensino Fundamental.

Bibliografia Comentada...HORN, Geraldo Balduino. Ensino de Histria e seu Currculo: Teoria e Mtodo. Petrpolis.RJ: Vozes,2006. Um dilogo que aborda a realidade contempornea do Brasil e seus professores da rea, analisando as formas vigentes de ensino da histria e discute a possibilidade de uso do contexto vital e da histria da comunidade local em que o aluno est inserido como metodologias deste aprendizado. REVISTA BRASILEIRA DE HISTRIA. So Paulo: ANPUH: Marco Zero, n. 25/26,1993 (Memrias, histria e historiograa Dossi Ensino de Histria). Neste nmero da Revista Brasileira de Histria, h artigos dedicados ao ensino de histria alm das resenhas. Discutem-se a histria oral, a memria, a historiograa, a teoria da histria e algumas questes especcas do ensino de histria.

Metodologia da Histria

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Atividade Complementar1. Com base nos objetivos apresentados nos Parmetros Curriculares Nacionais para a disciplina Histria, explicite sua opinio sobre as idias que traduzem o trabalho, inserindo o tema cidadania no ensino de Histria.

2. Leia: Etimologicamente, cidado signica membro livre de uma determinada cidade, por origem ou adoo, assumindo um conjunto de razes culturais, polticas e sociais, movimentando-se nesse conglomerado sociopoltico e econmico, dinamizando o complexo cultural, sugerindo uma idia coletiva e pluralista dos termos cidadania e cidado. Assim, o cidado-indivduo move-se no social e o cidado-coletivo participa do social (Varela,