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51 Casas de engenho do Rio de Janeiro – século XVIII – metodo- logia de estudo a partir de múltiplas fontes Ana Lucia Vieira dos Santos (Fundação Casa de Rui Barbosa) O presente trabalho visa estabelecer metodologia multidisciplinar para a análise de casas históricas e as formas de morar das elites dos séculos XVIII-XIX no Rio de Janeiro, e se inscreve em parceria luso-brasileira para o projeto “A Casa Senhorial em Lisboa e no Rio de Janeiro (sécs. XVII, XVIII e XIX). Anato- mia dos Interiores”, estabelecida entre a Fundação Casa de Rui Barbosa, por in- termédio do grupo de pesquisa Museu-casa: memória, espaço e representações, e a Fundação Ricardo do Espirito Santo e Silva (FRESS) e a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH). A primeira tarefa geral do projeto consiste num inventário completo das casas senhoriais nas áreas geográficas consideradas, Lisboa e Rio de Janeiro. Num primeiro estágio, a seleção de casas a serem estudadas foi guiada por sua existência física e razoável grau de conservação. O conjunto dos imóveis selecio- nados resultou bastante heterogêneo, deixando clara a indefinição conceitual do que seria uma casa senhorial no Rio de Janeiro. Não foi possível estabelecer quais seriam as casas senhoriais por crité- rios meramente arquitetônicos. Um dos estudos que chega a uma classificação tipológica das casas fluminenses é o artigo sobre as sedes de fazenda do vale do rio Paraíba, escrito por Joaquim Cardoso e depois revisto por Alcides da Rocha Miranda e Jorge Czajkowski 1 . A tipologia estabelecida nesses trabalhos para as casas rurais não se aplica integralmente às casas urbanas, e é característica da segunda metade do século XIX, não atendendo plenamente períodos anteriores. A classe senhorial do Rio de Janeiro variou bastante, até pelas constantes modificações de status político e econômico da própria cidade. Entender e definir o que foi a elite da sociedade carioca certamente é tarefa para os historiadores, e nos reportamos em especial aos estudos de João Fragoso. Após seu trabalho sobre os negociantes da praça do Rio de Janeiro 2 , Fragoso recuou seus estudos até a ocupação inicial da cidade do Rio de Janeiro, facilitando a compreensão das famílias mais antigas, suas estratégias de aquisição e manutenção de patrimônio, ocupação de território e até mesmo de representação social 3 . De acordo com Fra- goso e Bicalho 4 , a formação da primeira elite colonial foi baseada na participação na conquista, e consolidou-se pelo sistema de mercês que resultou no exercício do poder municipal e concessão de terras. A propriedade de vastas extensões de terras e a obrigação de torná-las produtivas transformou conquistadores em senhores de engenho, produtores do principal bem de exportação da colônia. Ser senhor de engenho exigia o controle de diversas variáveis, como explica Manoela Pedroza: “...dependia estreitamente de relações no campo da política que permi-

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Casas de engenho do Rio de Janeiro – século XVIII – metodo-logia de estudo a partir de múltiplas fontes

Ana Lucia Vieira dos Santos(Fundação Casa de Rui Barbosa)

O presente trabalho visa estabelecer metodologia multidisciplinar para a análise de casas históricas e as formas de morar das elites dos séculos XVIII-XIX no Rio de Janeiro, e se inscreve em parceria luso-brasileira para o projeto “A Casa Senhorial em Lisboa e no Rio de Janeiro (sécs. XVII, XVIII e XIX). Anato-mia dos Interiores”, estabelecida entre a Fundação Casa de Rui Barbosa, por in-termédio do grupo de pesquisa Museu-casa: memória, espaço e representações, e a Fundação Ricardo do Espirito Santo e Silva (FRESS) e a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH).

A primeira tarefa geral do projeto consiste num inventário completo das casas senhoriais nas áreas geográficas consideradas, Lisboa e Rio de Janeiro. Num primeiro estágio, a seleção de casas a serem estudadas foi guiada por sua existência física e razoável grau de conservação. O conjunto dos imóveis selecio-nados resultou bastante heterogêneo, deixando clara a indefinição conceitual do que seria uma casa senhorial no Rio de Janeiro.

Não foi possível estabelecer quais seriam as casas senhoriais por crité-rios meramente arquitetônicos. Um dos estudos que chega a uma classificação tipológica das casas fluminenses é o artigo sobre as sedes de fazenda do vale do rio Paraíba, escrito por Joaquim Cardoso e depois revisto por Alcides da Rocha Miranda e Jorge Czajkowski1. A tipologia estabelecida nesses trabalhos para as casas rurais não se aplica integralmente às casas urbanas, e é característica da segunda metade do século XIX, não atendendo plenamente períodos anteriores.

A classe senhorial do Rio de Janeiro variou bastante, até pelas constantes modificações de status político e econômico da própria cidade. Entender e definir o que foi a elite da sociedade carioca certamente é tarefa para os historiadores, e nos reportamos em especial aos estudos de João Fragoso. Após seu trabalho sobre os negociantes da praça do Rio de Janeiro2, Fragoso recuou seus estudos até a ocupação inicial da cidade do Rio de Janeiro, facilitando a compreensão das famílias mais antigas, suas estratégias de aquisição e manutenção de patrimônio, ocupação de território e até mesmo de representação social3. De acordo com Fra-goso e Bicalho4, a formação da primeira elite colonial foi baseada na participação na conquista, e consolidou-se pelo sistema de mercês que resultou no exercício do poder municipal e concessão de terras. A propriedade de vastas extensões de terras e a obrigação de torná-las produtivas transformou conquistadores em senhores de engenho, produtores do principal bem de exportação da colônia. Ser senhor de engenho exigia o controle de diversas variáveis, como explica Manoela Pedroza: “...dependia estreitamente de relações no campo da política que permi-

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tissem a acumulação de capital, a obtenção de terras e de mão-de-obra compulsó-ria, e a manutenção de privilégios comerciais.”

A ocupação inicial da cidade foi objeto dos estudos de Maurício Abreu, reu-nidos em sua obra Geografia Histórica do Rio de Janeiro5. Nos reportamos, ainda, a Fania Fridman, que se debruçou sobre as propriedades das ordens religiosas6.

A seleção das primeiras casas do século XVIII a serem trabalhadas con-templou bens sobreviventes, tombados pelo IPHAN, e são imóveis rurais do en-torno próximo do Rio de Janeiro colonial que foram sedes de engenhos de açúcar. São casas que pertenceram a “famílias senhoriais”, com todas as nuances e difi-culdades de definição que o termo encerra para o Brasil Colonial7.

Iniciamos o trabalho pelas casas dos engenhos do Capão do Bispo, Colum-bandê, Taquara, Engenho d´Água e Viegas.

Fig. 1 - As cinco casas de engenho do século XVIII.

A partir dos citados estudos de Maurício Abreu e Fania Fridman sobre a ocupação inicial do território carioca, elaboramos mapas que nos permitem compreender melhor a situação desses engenhos em relação ao núcleo da cidade colonial.

O engenho do Capão do Bispo era o mais próximo da cidade. Essas terras integravam a enorme sesmaria dos jesuítas, que confrontava com o termo da cida-de. A fazenda foi confiscada à Companhia de Jesus em 1759, sendo desmembrada e leiloada em 1761. A propriedade que ficou conhecida como Capão do Bispo foi adquirida por D. José Joaquim Justiniano Mascarenhas de Castelo Branco, o primeiro brasileiro nato a ser nomeado bispo na colônia.

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Fig. 2 - Localização das casas em relação ao antigo Largo do Paço no centro do Rio de Janeiro.

O engenho de Columbandê localiza-se na região que se chamava “banda d’além”, cujo acesso mais rápido exigia o cruzamento da baía de Guanabara. Abreu esclarece que esta área foi inicialmente ocupada por grupos de cristãos novos8, que aí se mantiveram até o início do século XVIII, quando sofreram per-seguição pelo Santo Ofício. Os então proprietários de Columbandê eram Ana do Vale, viúva de Duarte Rodrigues de Andrade, e seus filhos Manoel do Vale da Silveira e José Ramires do Vale, que tiveram a propriedade confiscada pelo Fisco Real, após processo da Inquisição.

O Engenho d’ Água e o da Taquara localizam-se na região açucareira da baixada de Jacarepaguá, e foram inicialmente propriedade de Salvador Correia de Sá, por duas vezes governador-geral do Rio de Janeiro. A família Correia de Sá foi uma das que compuseram a primeira nobreza da colônia, obtendo proprie-dades na faixa subsequente à das terras dos jesuítas, com acesso mais fácil ao núcleo urbano.

A fazendo do Viegas é a mais distante da cidade. A viagem da propriedade até o centro urbano levava três dias, antes das melhorias dos caminhos ocorri-das no início do século XIX. O proprietário original também foi personagem do processo de conquista, mas o tamanho da propriedade e a distância da cidade demonstram uma menor proeminência social.

Uma vez que essas propriedades já foram objeto de vários estudos, co-meçamos o trabalho organizando os dados já conhecidos. Os imóveis foram comparados em seus aspectos gerais, como localização, implantação, acesso, e particulares, como planta e fachada. A intenção principal era buscar aspectos comuns, e determinar lacunas nos estudos anteriores que se pode almejar pre-encher.

Foram preparadas plantas digitais padronizadas, a partir dos arquivos ce-didos pela pesquisadora Maria Paula Van Biene9. As plantas foram colocadas na mesma escala, e orientadas em relação ao Norte.

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Fig. 3 – Plantas orientadas em relação ao Norte.

O conjunto se revelou menos homogêneo do que o esperado, apesar de todas os imóveis terem a mesma função de casa-grande de um engenho de cana. Há certamente um partido comum, que pode ser resumido na descrição de Lucio Costa para a casa do Capão do Bispo:

“três características fundamentais:escada de alvenariaalpendre e pátiotelhado sustentado por colunas da ordem toscana à maneira alentejana...”10

A orientação é totalmente distinta, independente da posição geográfica, o que aponta para a locação das casas em função da topografia e da produção, permitindo a constante vigilância dos trabalhos do engenho pelo proprietário. O acesso às casas se faz lateralmente. O acesso central aparece no Engenho d’ Água e na Taquara, aparentemente como fruto de reforma das fachadas.

A diferença de escala é marcante, sendo a casa da Taquara muito maior do que as demais.

Além das diferenças que poderiam haver nas fortunas dos proprietários, que certamente influenciavam o que eles podiam e queriam construir, outro dado chama a atenção: nem todas as casas serviram como residência para seus donos, podendo ser usadas apenas nos períodos em que era necessária sua presença na

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fazenda. A partir dos estudos de Fragoso e de Mauricio Abreu11, é possível perce-ber situações distintas: o imóvel era a principal propriedade da família, servindo como moradia ao proprietário ou era uma propriedade secundária, a casa sendo usada para estadas eventuais, ligadas à supervisão da produção; era a única pro-priedade rural, servindo ou não de residência ao proprietário.

Sabemos que a Taquara só foi habitada de forma permanente a partir de 1837, quando foi ocupada por Ana Maria Teles Barreto de Menezes e Francisco Pinto da Fonseca, pais do Barão da Taquara, passando por várias reformas e am-pliações que lhe deram as características atuais.

As plantas dessas casas são uma espécie de “mapa mudo”, uma vez que não conhecemos ao certo a destinação de cada cômodo. Além das diversas modi-ficações, nem sempre claras, as casas chegaram até nós destituídas de seu conteú-do, e muitas têm hoje uso não-residencial. A leitura dos compartimentos internos se faz com base nos costumes, e numa tipologia que se pode estabelecer a partir de outros exemplares mais contextualizados. Na primeira fase da pesquisa opta-mos por comparar apenas os compartimentos cuja finalidade é mais clara.

Fig. 4 – Capelas.

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Todas as casas têm capela, indispensável ao atendimento das necessidades religiosas, uma vez que as longas distâncias e dificuldades de acesso não permi-tiam uma fácil ida à sede da freguesia. O oratório particular era também um sím-bolo de status, estando presente em muitas casas urbanas de famílias importantes. Em todos os nossos exemplos, a capela localiza-se de forma a atender também à comunidade. Na casa do Capão do Bispo, o oratório está inserido no corpo da casa, com acesso tanto interno quanto externo. No Engenho d’Água, Taquara e Viegas, a capela se destaca da casa, mantendo com ela uma comunicação que permite que a família a acesse sem precisar misturar-se aos demais participantes da celebração. Em Columbandê a capela se separa da casa por um pátio.

A entrada se dá através de alpendre ou varanda, que também aparece nos fundos da casa do Engenho d’ Água. A circulação interna é feita em grande parte de cômodo para cômodo.

Em Columbandê, Taquara e Capão do Bispo aparece o pátio interno com varanda periférica que proporciona outro tipo de circulação. Em Viegas o pátio aparece nos fundos, com alguns compartimentos laterais, indício talvez de uma ampliação que não se concretizou.

Fig. 5 - Varandas e pátios.

Em todas as casas é possível determinar os compartimentos que servem de sala, por sua posição ligada à varanda de acesso e suas dimensões maiores.

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Fig. 6 - Salas.

Identificamos também compartimentos na faixa frontal da edificação, que po-dem ter servido como gabinetes ou alcovas, recebendo pessoas estranhas à família. Alguns desses cômodos tem acesso tanto pela varanda quanto pelo interior da casa, outros têm acesso exclusivamente pela varanda. É bem conhecida a necessidade da hospitalidade na sociedade colonial, bem como a firmeza de separar o hóspede da família. Esse é o uso mais provável dos cômodos que têm apenas acesso externo.

Uma revisão geral dos objetivos do projeto reduziu a extensa lista original de casas a apenas dez exemplares a serem estudados numa primeira fase, ficando o século XVIII representado pelos engenhos do Capão do Bispo, Taquara e Viegas.

As três casas selecionadas para aprofundamento da pesquisa foram inicial-mente propriedade de famílias que alcançaram destaque na sociedade colonial. A Taquara foi propriedade de uma das principais famílias estabelecidas na cidade, o Capão do Bispo de importante membro da Igreja, e Viegas de famílias com menos recursos políticos e relacionais do que as primeiras. Apesar das diferentes trajetórias das propriedades, o trabalho preliminar com as plantas aponta para a possibilidade de se estabelecerem tipologias. O uso de documentação escrita, ainda que referente a outras casas do mesmo período e na mesma região, permite que se busque uma melhor compreensão dos usos e modos de vida nessas propriedades.

No que se refere ao Capão do Bispo, encontramos os dados referentes à conformação da propriedade comprada pelo bispo D. José Joaquim Justiniano Mascarenhas de Castelo Branco do espólio desapropriado dos jesuítas. A pro-

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priedade resultou de várias compras, ampliando os limites da fazenda original. Seus outros bens ficavam na área do Passeio Público, mais especificamente no “largo da mãe do Bispo” e rua dos Barbonos. A documentação demonstra que sua família tinha também bens na área mais central da cidade, em torno do largo do Paço. As propriedades do bispo são exemplo do patrimônio particular de religio-sos. Muito se tem escrito sobre o patrimônio das ordens religiosas, mas não há nada sistemático sobre as propriedades particulares de padres e bispos, que apa-recem frequentemente na documentação. Muitas vezes herança de família,outras patrimônio amealhado por eles próprios, esses bens eram transmitidos a parentes colaterais,ou pessoas indicadas nos testamentos, em estratégias que ainda estão por estudar.

A casa deste engenho está hoje em meio ao tecido urbano, totalmente des-tituída de seu contexto original. Ainda não foi possível determinar se a casa foi construída pelo bispo, ou se ele já encontrou alguma edificação no local. O do-cumento de doação aos sobrinhos do bispo12 apenas cita a casa, não fornecendo maiores detalhes. As análises preliminares da planta indicam que o pátio interno e os cômodos posteriores podem ter sido acrescentados a uma casa menor pree-xistente.

A casa do Engenho da Taquara pertence aos descendentes da família Teles de Menezes. Seu proprietário inicial não morava lá de forma permanente, tendo diversas fazendas e uma boa casa na cidade.

Através de Rudge13, ficamos sabendo que essa casa foi construída a partir de 1738, depois da reunificação dos engenhos Novo e de Dentro por Antônio Teles de Menezes em 1717.

Por essa época Antônio reconstruiu no Largo do Paço a casa que ficou co-nhecida como do Arco do Teles, com projeto do brigadeiro José Fernandes Pinto Alpoim, o que leva Rudge a especular que este profissional possa também ter atuado na construção da casa do Engenho da Taquara.

Não foi ainda possível determinar se o edifício hoje existente corresponde ao menos em parte à casa original. O segundo pavimento é apenas parcial, for-mando uma espécie de camarinha. É possível que não fizesse parte do edifício primitivo. A entrada central pode ter sido feita junto com o segundo pavimento, uma vez que a estrada que dá acesso à casa chega pelo seu lado direito, por onde poderia haver escada para a varanda, dentro do padrão encontrado em outros engenhos. Segundo Rudge, a varanda superior teria sido fechada numa reforma em 1882.

Tínhamos poucas informações iniciais sobre o engenho do Viegas. Essa propriedade localiza-se na antiga freguesia de Campo Grande. Uma elite que des-cendia diretamente dos primeiros povoadores, e teve acesso a fartas distribuições de terras compunha o grupo de proprietários dessa área. Ao contrário dos senho-res da área de Jacarepaguá, que mantinham boas casas na cidade, os proprietários de Campo Grande residiam em suas fazendas. Boa parte desses senhores enfren-

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tou dificuldades financeiras com o esgotamento do ciclo da cana, formando um grupo que no século XIX ainda detinha certo prestígio social, mas pouco poder econômico. O engenho do Viegas foi propriedade dos Garcia do Amaral e depois dos Antunes Suzano.

Os Garcia do Amaral tornaram-se proprietários do Engenho do Viegas por volta de 1721, provavelmente pelo casamento de um moço Amaral com uma moça Viegas14. Conseguimos na documentação informações sobre a sucessão dos proprietários, mas nenhuma descrição da casa. Compreender a sucessão é tare-fa complicada, pois há muitos homônimos nas duas famílias. Manoela Pedroza realizou um vasto estudo sobre as propriedades da área de Campo Grande15, e confirma que o engenho do Viegas mudou de mãos no início do século XIX por dívidas de seu proprietário, Antônio Garcia do Amaral. Os Garcia do Amaral possuíam outras propriedades na região, assim como seus sucessores, os Suzano.

A casa fica hoje no bairro de Senador Camará, também sobre uma peque-na colina, numa área de preservação ambiental. O exame preliminar da planta mostra um claro acréscimo nos fundos, criando um estreito pátio interno. Há uma simetria na planta, sugerindo que esta conserva em grande parte sua conformação original.

Dos três imóveis em estudo, só foi possível visitar um, o do Capão do Bispo, que está em processo de restauração. O antigo engenho do Viegas está vazio e abandonado, em péssimo estado de conservação. A casa da Taquara ainda pertence à família do Barão de Taquara, e está em melhor condição, embora não se tenha ainda permissão para uma visita.

O mau estado das construções e as muitas obras por que passaram criaram um certo impasse para o estudo. Não há mais qualquer vestígio da decoração in-terna original. A documentação escrita encontrada16 tampouco forneceu informa-ções importantes sobre os interiores. No entanto, a visita ao Capão do Bispo pôs em evidência a riqueza dos fluxos e da distribuição dos espaços internos.

A casa foi sempre um local de refúgio do indivíduo e da família, protegen-do dos outros membros da comunidade, dos inimigos e mesmo do Estado. Ela tem também uma função de representação, seja pela sua localização, seja por suas características construtivas. A sua organização interna determina a distribuição das pessoas e das atividades. A evolução dos conceitos de conforto e intimidade podem ser estudados a partir das mudanças dos espaços domésticos.

Buscamos suporte teórico na obra Architectures de la Vie Privée17, que trata da evolução dos interiores residenciais na França, do século XVII ao XIX, fazendo uma análise da especialização dos espaços, bem como da evolução da distribuição e dos usos. O trabalho de Eleb e Debarre é fortemente focado nas relações entre espaço doméstico e mentalidades, sem deixar de lado o papel dos arquitetos, tanto como teóricos quanto como mediadores entre novos hábitos e usuários. A pesquisa que desenvolvemos no projeto Casa Senhorial – Lisboa- Rio de Janeiro aproxima-se dessa abordagem.

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De acordo com essas autoras, o período determinante para que se com-preendam as mudanças na organização das casas é o início do século XVII. É na década de 1620 que começam a aparecer na França dispositivos espaciais disso-ciando os espaços onde se fica daqueles onde se passa. Esses dispositivos resulta-ram na invenção e multiplicação dos espaços de passagem, permitindo a divisão da circulação, e evidenciando transformações nas relações do grupo doméstico. Os mecanismos de circulação são os corredores, as antecâmaras, escadas que se multiplicam, entre outros. A sua posição relativa, a orientação e as ligações privi-legiadas que criam revelam novas relações e usos no interior da casa.

Em minha tese sobre a casa carioca18, ficou clara essa função dos corre-dores. Nas pequenas casas estudadas, o corredor não era onipresente como se esperava e estava descrito na literatura clássica sobre a casa brasileira, e a sua introdução no programa da construção pareceu estar mais ligada à necessidade de separar e organizar o trânsito de pessoas de diferentes estatutos sociais do que simplesmente a uma solução espacial de circulação.

Antes de prosseguir, cabe esclarecer o conceito de dispositivo usado por Eleb e Debarre, que passaremos a adotar. Dispositivo é a organização de elemen-tos, colocados de forma particular para produzir determinado efeito, seja essa intenção explícita ou não. Os dispositivos escolhidos para uma determinada so-lução espacial propõem um certo modo de relações interpessoais, mas também relações econômicas (trabalho e produção nos espaços doméstico) e sociais mais largas.

Até o início do século XVII as habitações eram compostas de espaços poli-valentes. Com poucas divisões internas, os espaços eram usados para as diversas atividades cotidianas indistintamente. Assim, o leito podia comumente ser en-contrada no cômodo maior, onde também se recebia, se comia e se trabalhava; o mesmo fogo que aquecia a família servia para cozinhar. Entre 1620 e 1880 esses espaços começam a se especializar, acompanhados de forte teorização pelos os arquitetos, mediadores entre usuários e novos modos de vida.

Até o primeiro terço do século XVII, os diversos cômodos se comunicam diretamente, e são ao mesmo tempo lugar de estada e de circulação. Sala e quarto são polivalentes e muitas vezes o mesmo cômodo serve aos dois usos, sendo a nomenclatura dos espaços ainda bastante restrita. O uso é dado pelo mobiliário, e não pela localização ou conformação espacial do compartimento.

Esse quadro pode ser confirmado para o Rio de Janeiro, até o final do século XVIII. A documentação por mim estudada19 demonstra que a primeira diferenciação perceptível é entre sala e “quartos” em geral, aparecendo em se-guida a cozinha. Reitero que a expressão “alcova” referia-se ao lugar onde fi-cava o leito, criando uma diferenciação dos demais “quartos”, onde podiam de-senvolver-se outras atividades. O fato de que o uso só era identificável através do mobiliário explica por que muitas vezes os peritos avaliadores que produzi-ram os laudos contidos nos inventários post-mortem não identificavam os espa-

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ços, usando expressões genéricas como “quartos para cômodo”. Se os espaços estivessem vazios, podiam servir para qualquer uso, não havendo padrões de distribuição arquitetônica que os identificassem necessariamente. Isso explica também o porquê das poucas plantas que temos para esses períodos mais re-cuados não terem legendas quanto ao uso dos cômodos. Se os espaços eram polivalentes, não haveria necessidade de legendá-los. Cumpre agora determinar a partir de que data as legendas apareceram, e que usos foram estabelecidos em primeiro lugar.

As casas cariocas eram construídas em parcelas mais fundas do que largas, com dois ou três vãos. A ideia de intimidade parece surgir a partir da introdução do quinto cômodo, quando já existe um quarto destacado, de acesso mais difícil e menos público. É interessante notar que nas casas cariocas o corredor aparece a partir da introdução do quinto cômodo, sendo raro em casas menores que isso. As casas que tinham uso profissional, com loja na frente, são as que primeiro vão apresentar corredor lateral, permitindo o acesso direto aos fundos, onde ficava a parte privada da edificação.

A partir do surgimento de uma teoria da distribuição, observável nos tra-tados de arquitetura, os cômodos se multiplicam, assim como a terminologia que destaca novos usos. Há uma multiplicação de salas e quartos, conforme ativida-des específicas encontram espaços planejados para elas: salas de espera , salas de jantar, salas de música, quarto de costura, etc. Os cômodos em sucessão, com uso variável, são substituídos por arranjos espaciais dentro de novas regras. A casa torna-se cada vez mais uma expressão do aparato.

As casas do Capão do Bispo, do Viegas e da Taquara foram objeto de análi-se gráfica das plantas, especialmente no que se refere à distribuição e circulação, conforme figuras 7, 8 e 9. A casa do Viegas parece ser a mais antiga, embora tenha sofrido acréscimos claros.

Em nenhum dos casos foi possível ainda precisar uma data de construção. Tampouco ficou claro se a casa do Capão do Bispo já existia quando passou a D. Justiniano, sendo nesse caso obra dos jesuítas, ou se foi construída por ele mes-mo. Em todo caso, as casas se estruturam de modo distinto.

As casas possuem uma grande sala ocupando o trecho central da fachada principal, voltadas para a varanda de acesso. Essa sala dá acesso a uma varanda de fundos, voltada para um pátio. A distribuição torna-se totalmente diferente a partir daí, como se pode ver nas plantas em anexo.

Na casa do Viegas, a sala é o principal dispositivo de distribuição, dando acesso aos cômodos laterais, quartos e/ou alcovas. De acordo com Ranum20, até fins do século XVIII a sala é o “espaço primordial do habitat”, local onde toda a vida familiar se desenrola. A sala do engenho do Viegas parece ter essa função central, sendo ponto de passagem quase inevitável na circulação. Em torno do pá-tio aparecem outros cômodos, sem comunicação direta com a sala, que parecem ter sido acrescentados à construção ao longo dos anos. Essa distribuição sugere

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que os cômodos em volta do pátio fossem dedicados ao serviço, e possivelmente armazenagem. Aparecem também nesta casa cômodos que estão no corpo prin-cipal mas só tem acesso externo, seja pela varanda frontal, pelo pátio ou mesmo pelo quintal. No caso dos quartos que dão para a varanda frontal, pode-se admitir que sejam os aposentos reservados para hospedagem de estranhos, fartamente descritos na literatura. Os cômodos voltados para fora nos fundos da casa de-veriam estar ligados ao serviço e à produção, podendo mesmo ter servido como senzalas.

Na casa do Capão do Bispo, a sala é um elemento de ligação entre a varan-da de acesso e o pátio central. É este que assume a principal função de distribui-ção, dando acesso a todos os cômodos, com exceção da capela e de um quarto que a ela corresponde, na outra extremidade da varanda frontal. Este quarto poderia funcionar como gabinete ou antecâmara do quarto maior que lhe é contíguo. Res-salto que o termo antecâmara é comum na literatura sobre a casa europeia, mas ainda não apareceu na documentação do Rio de Janeiro, embora suas funções se-jam reconhecíveis em determinados cômodos. O gabinete é descrito por Ranum como um aposento de origem monástica, sendo um dos primeiros cômodos a ter uso privado dentro da casa. É um local de refúgio, leitura, contabilidade e oração, não exigindo grande mobiliário. O quarto que está ligado ao possível gabinete também se comunica com a sala e a varanda que circunda o pátio central, sendo o cômodo que parece ter circulação privilegiada, compatível com o uso pelo dono da casa.

Não se sabe em que momento a casa do Capão do Bispo passou a ser ha-bitada de forma permanente, se é que o foi. D. Justiniano deixou a propriedade em testamento para seus sobrinhos, assim como os bens existentes na região do atual Passeio Público. Não havia uma família a ser considerada na configuração original da casa, e os descendentes do Bispo talvez nunca a tenham usado como moradia ou propriedade de recreio (há uma longa disputa pelos bens, que tem como principais objetos as propriedades da cidade).

A casa não tem a circulação de cômodo a cômodo, tão comum na casa co-lonial, assim como nas casas europeias. Esse tipo de circulação é considerada por Monique Eleb como uma circulação privilegiada, exclusiva das pessoas íntimas. As portas de ligação dos cômodos podem ter sido fechadas mais recentemente, em nome de uma maior intimidade, mas isso teria deixado traços detectáveis na restauração. Não há menção à existência dessas portas nos documentos do IPHAN. Assim sendo, é bastante provável que os cômodos à volta do pátio cen-tral fossem usados para o serviço, gestão da propriedade, e mesmo acomodação da entourage do Bispo. É mais ou menos pacífico que os dois grandes cômodos dos fundos funcionavam como cozinhas. Entre a sala e a capela, um cômodo alongado que denominamos saguão dá acesso ao pátio interno, sem que seja ne-cessário passar pela sala. Dali é possível assistir às celebrações religiosas de for-ma mais reservada.

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Fig.7 – Fluxos, usos e distribuição na casa do Capão do Bispo.

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O imóvel do engenho da Taquara é o maior de nossa amostra, e o único que possui um segundo pavimento, ainda que parcial. Sabemos que a confi-guração atual data aproximadamente da década de 1880, quando houve uma grande reforma. A casa teria sido construída sobre outra, mais antiga e arrui-nada. Notam-se traços dessa construção original na parte frontal da casa, que tem paredes significativamente mais grossas do que o restante do edifício. Pa-rece que o pátio central surgiu numa segunda etapa de construção, sendo que a sequência de cômodos que fecha o pátio aos fundos pode representar uma terceira campanha de obras. O principal dispositivo de distribuição é o pátio central, aparecendo dois corredores que dão acesso direto ao exterior, um deles na altura da capela, possivelmente proporcionando um acesso reservado para a família. Os quartos do segundo pavimento ficam bastante isolados do resto da construção, sendo possível acessá-los sem passar pelo interior da casa, e nem mesmo pelas salas.

Ainda de acordo com Monique Eleb, a divisão da casa em 3 setores – so-cial, íntimo e serviço – só se concretiza em meados do século XIX. Até então as funções se misturavam, sendo a primeira divisão a exclusão dos serviços das áreas de vivência da família. As casas em estudo são coerentes com essa teoria. As cozinhas aparecem bem delimitadas nos fundos das casas, e em especial em Viegas é possível que num primeiro momento a cozinha fosse totalmente separa-da do corpo principal da casa. A faixa frontal mistura as funções sociais e íntimas, e há cômodos intermediários, com função de difícil definição, uma vez que não se encontraram descrições coevas.

O estudo das casas de engenho setecentistas no Rio de Janeiro apresen-ta muitos desafios. As múltiplas fontes de que podemos dispor para o estudo das formas de morar não são facilmente encontráveis para o Rio de Janeiro, e os imóveis estão em péssimo estado de conservação, com acesso restrito. A análise dos fluxos e da distribuição permite avançar na compreensão dos inte-riores, sendo necessário a expansão da amostra, para que se busquem padrões que levem a uma classificação tipológica. A comparação com outras casas portuguesas, na metrópole ou nas colônias da África e Índia é importante para a compreensão da circulação de modelos e tipos arquitetônicos no império português.

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Fig.8 – Fluxos, usos e distribuição na casa da Taquara.

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Fig.9 – Fluxos, usos e distribuição na casa do Viegas.

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Notas e referências1. CARDOSO, Joaquim. Um tipo de casa rural do Distrito Federal e Estado do Rio. Arquitetura Civil II. São Paulo: FAU/USP e MAC/IPHAN, 1975. (Textos Escolhidos da Revista do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.) .MIRANDA, Alcides da Rocha; CZAJKOWSKI, Jorge. Aspectos de uma arquitetura Rural do século XIX. In PIRES, Fernando Tasso Fragoso. Antigas Fazendas de Café da Província Fluminense. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.2. FRAGOSO, João Luís. Homens de Grossa Aventura – Acumulação e Hierarquia na Praça Mercantil do Rio de Janeiro. 1790-1830. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998.3. FRAGOSO, João Luis. “A nobreza da República: notas sobre a formação da primeira elite senhorial do Rio de Janeiro (séculos XVI e XVII)”. Topoi - Revista de História. vol. 1 - nº 1- jan-dez/2000. Programa de Pós-Graduação em História Social da UFRJ. 4. Ibidem; BICALHO, Maria Fernanda Baptista. Conquista, mercês e poder local: a nobreza da ter-ra na América portuguesa e a cultura política do Antigo Regime. Alm. Braz., São Paulo, n. 2, nov. 2005. Disponível em <http://www.revistasusp.sibi.usp.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi-d=S1808-81392005000200002&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em 09 set. 2012.5. ABREU, Mauricio de Almeida. Geografia Histórica do Rio de Janeiro (1502-1700).Rio de Janeiro: Andrea Jakobsson Estúdio & Prefeitura do Município do Rio de Janeiro, 2010.6. FRIDMAN, Fania. Freguesias do Rio de Janeiro ao final do século XVIII. In Anais do II Encontro Internacional de História Colonial. Mneme – Revista de Humanidades. UFRN. Caicó (RN), v. 9. n. 24, Set/out. 2008. ISSN 1518-3394. Disponível em www.cerescaico.ufrn.br/mneme/anaisFRIDMAN, Fania. Donos do Rio em nome do Rei. Uma história fundiária da cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor/Garamond, 1999. 7. Ver FRAGOSO, op.cit. e BICALHO, op.cit.8. ABREU, op.cit.,v. 2, p. 93-104.9. VAN BIENE, Maria Paula. A arquitetura das casas-grandes remanescentes dos engenhos de açúcar no Rio de Janeiro setecentista. Diss. Rio de Janeiro: UFRJ/Artes Visuais, 2007.10. Parecer de Lucio Costa no processo de tombamento da fazenda do Capão do Bispo. IPHAN/Processo de Tombamento.0367-T-47. Casa: Suburbana (Avenida), nº 4616 (Fazenda Capão do Bispo), no municí-pio do Rio de Janeiro, estado do Rio de Janeiro. (Rio de Janeiro/RJ).11. FRAGOSO, op. cit. ABREU, Mauricio de Almeida. Um quebra-cabeças (quase) resolvido: Os en-genhos da Capitania do Rio de Janeiro - séculos XVI e XVII . In Revista Electrónica de Geografía y Ciencias Sociales. Vol. X, núm. 218 (32), Barcelona: Universidad de Barcelona,ago 2006.12. ANRJ, CODES, Fundo EJ, Casa de Suplicação, Jacinto Furtado de Mendonça. No 2230, Caixa 208, 1811. EJ.0.ACI.1524.13. RUDGE, Raul Telles. As sesmarias de Jacarepaguá. São Paulo: Kosmos, 1983.14. PEDROZA, Manoela. Engenhocas da moral: Uma leitura sobre a dinâmica agrária tradicional (fre-guesia de Campo Grande, Rio de Janeiro, século XIX). Tese. Campinas: IFCH/UNICAMP, 2008., p. 75.15. PEDROZA, Manoela. op.cit. PEDROZA, Manoela. Passa-se uma engenhoca. Ou como se faziam transações com terras, engenhos e crédito em mercados locais e imperfeitos (freguesia de Campo Grande, Rio de Janeiro, séculos XVIII e XIX). VARIA HISTORIA, Belo Horizonte, vol. 26, nº 43: p.241-266, jan/jun 2010.16. Escrituras e inventários post-mortem.17. ELEB-VIDAL,Monique, DEBARRE-BLANCHARD, Anne. Architectures de la vie privée, XVIIe--XIXe siècles. Bruxelles, Archives d’Architecture Moderne, 1989.18. SANTOS, Ana Lucia Vieira dos. A Casa Carioca. Estudo sobre as formas de morar no Rio de Janei-ro. 1750-1850. Tese. Niterói: PGGHis/UFF, 2005.19. Laudos de avaliação contidos em inventários post-mortem, disponíveis no Arquivo Nacional do Rio de Janeiro.20. RANUM, Orest. Os refúgios da Intimidade. In ARIÈS, Philippe. DUBY, Georges (orgs.). História da Vida Privada. Da Renascença ao Século das Luzes. São Paulo: Companhia das Letras, 1991. v. 3, p. 211-265.