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    Meu interesse neste artigo no a con-formao fsica das cidades construdas naAmrica por portugueses ou espanhis, oplanejamento urbano que elas porventuratenham tido, nem saber qual delas era maisordenada ou racional , mas justamente en-tender como se constroem essas imagenssobre elas. Dessa forma no pretendo con-firmar as afirmaes de que as cidades luso-brasileiras so ordenadas ou desordenadas,planejadas ou espontneas, nem em quemedida elas so mais ou menos diferentesdas cidades hispano-americanas. No soas cidades reais o meu objeto, mas sim assuas projees.

    Se as cidades podem ser vistas em mui-tos aspectos, do ponto de vista dos colonos,como um mal necessrio, como se fossemparasitas dos produtores rurais, competin-do com os colonizadores no processo deextrao de excedente, por outro lado, oscolonos no podiam fazer nada sem as ci-dades. As exigncias da colonizao de-mandavam evidentes funes urbanas(Ross e Telkamp, 1985, p. 1). Essas fun-es so aquelas relacionadas exigncia

    de portos para escoamento da produo co-lonial, finanas, segurana, com o cresci-mento da presena de fornecedores, comer-ciantes, artesos, etc. Mas o que torna umacidade uma cidade colonial? Para AnthonyKing este conceito amplo e engloba umagrande variedade de experincias no tem-po e no espao, mas podemos consideraralgumas caractersticas comuns: domniode uma populao indgena por uma mino-ria estrangeira, etnicamente diferente; oencadeamento de civilizaes radicalmen-te distintas em alguma forma de relaciona-mento; a imposio de uma sociedade in-dustrial sobre uma sociedade no-industria-lizada (apenas para o caso do sculo XIX);um relacionamento antagnico no qual opovo colonizado submetido a instrumen-tos de poder colonial (King, 1985, p. 9).Para entender as cidades coloniais neces-srio ainda ter em conta que tipo de cultura

    urbana os colonizadores encontram nosterritrios conquistados e quais os motivose circunstncias da colonizao; em suma,essas cidades variam no tempo e no espao,

    bem como na sua inteno. Assim, a cidadepode ser entendida como uma ponta-de-lana da penetrao econmica, poltica ecultural, segundo a qual a organizao, oureorganizao, estrutural da sociedade oudo territrio colonizado tem lugar (King,1985, p. 13). No caso da colonizao portu-guesa e espanhola na Amrica elas possu-em, alm de funes administrativas e eco-nmicas, um carter de difusoras da cristan-dade e do modo de vida europeu, queAnthony King (1985, p. 16) chama dehispanicizao e cristianizao. Dessamaneira, a manuteno de ndios e colonosem aldeamentos e cidades facilitaria a difu-so desses valores cristos e europeus.

    No entanto, muitos trabalhos que tra-tam das cidades no mundo colonial demons-tram que havia uma diferena muito gran-de entre a importncia que davam portu-gueses e espanhis aos ncleos urbanoscomo elementos de conquista dos espaoscoloniais. Mais do que diferena, uma opo-sio total entre as duas formas de cons-truir e encarar as cidades. Em 1936 SrgioBuarque de Holanda, em seu clebre Razes

    do Brasil , declarou que toda a estrutura denossa sociedade colonial teve sua base forados meios urbanos (Holanda, 1988, p. 41).Na Amrica Espanhola o traado dos cen-tros urbanos denuncia o esforo determi-nado de vencer e retificar a fantasia capri-chosa da paisagem agreste: um ato defi-nido da vontade humana (Holanda, 1988,p. 62). J os portugueses, mesmo em seusmelhores momentos, sua obra colonizado-ra teve um carter mais acentuado defeitorizao do que de colonizao (Ho-landa, 1988, p. 74), j que no convinhaque se fizessem grandes obras a menos queproduzissem benefcios imediatos. Fruto deum realismo extremo, que aceita a vida,em suma, como a vida , sem cerimnias,sem iluses, sem impacincias, sem mal-cia e, muitas vezes, sem alegria, a cidadeque os portugueses construram na Amri-ca no produto mental, no chega a con-

    tradizer o quadro da natureza, e sua silhue-ta se enlaa na linha da paisagem. Nenhumrigor, nenhum mtodo, nenhuma previdn-cia, sempre esse significativo abandono que

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    exprime a palavra desleixo [] (Holan-da, 1988, p. 76). Esse sentimento de queno vale a pena, essa ordem que aceita,ao contrrio da industriosidade espanhola,que faz com desleixo e certa liberdade, a ordem do semeador, ao contrrio daquelaque compe com o trabalho, que a doladrilhador (Holanda, 1988, p. 82). Nessasmetforas Srgio Buarque de Holanda defi-niu a oposio que separaria as cidades por-tuguesas das cidades espanholas na Amri-ca: as primeiras nascidas e crescidas sob osigno da desordem e da improvisao en-quanto as ltimas so produto mental, detraado uniforme, planejado e ordenado.

    Robert Smith levou ainda mais longeessa oposio ao afirmar que as cidadesportuguesas cresceram sem planejamen-to, numa espcie de confuso pitoresca que tpica das cidades luso-brasileiras, tantoquanto a ordem e a clareza so tpicas dourbanismo da Amrica Espanhola (Smith,1955, p. 7). Enquanto os espanhis desen-volvem na Amrica o plano em grelha, outabuleiro, antes mesmo que ele se estabele-a e seja aceito na Europa, os portugueses

    reproduzem em suas conquistas odesconfortvel sistema medieval basea-do na defesa pela ocupao de lugares al-tos, da a preferncia dos portugueses pelaocupao das reas litorneas no Brasil,enquanto os espanhis optam pelo interior(Smith, 1955, pp. 7-8). Seguimos aqui aordem do semeador e do ladrilhador, pois,se os espanhis transformam a natureza peloplanejamento e pelo artifcio de sua indus-triosidade, os portugueses apenas semeiamseus pequenos e pitorescos ncleos urba-nos pela costa, arranhando-a como caran-guejos, onde a necessidade de artifcio menor. Se os espanhis estavam na van-guarda do urbanismo em suas cidades naAmrica, os portugueses revivem velhasirregularidades medievais no Novo Mun-do (Smith, 1955, p. 10). O traado medie-val, com suas ruas tortas e terreiros desi-guais, uma regresso na medida em que

    abandona o traado em xadrez j usadoanteriormente na Mesopotmia, no Egito enas cidades greco-romanas. Sua renascen-a na Amrica Espanhola representa a

    revitalizao de um lugar-comum da anti-gidade, uma das maiores contribuiesda Amrica histria do urbanismo (Smith,1958, p. 15). Assim, no pode haver doistipos de urbanismo mais opostos: o espa-nhol empregando a forma rgida do xadrezclssico, povoaes localizadas em stiosplanos no interior, selecionados com cui-dado, seguindo um cdigo rgido de instru-es que deram origem s famosas Leis dasndias; e o portugus, que escolhia os stiosmais acidentados do litoral, cujas cidadescresceram sem planta prvia, com ruas es-treitas e ngremes, dificultando a comuni-cao. As formaes que resultaram sotodas diferentes, desordenadas e extrema-mente pitorescas (Smith, 1958, p. 22).

    Essa extrema pobreza em cidades quecaracteriza o Brasil colonial no corres-ponderia apenas s condies de nossa co-lonizao, imensido do territrio ou pequena populao de Portugal, mas seriatambm um reflexo da tradio portuguesada poca e, mais proximamente, resultavado regime dominante das capitanias heredi-trias (Azevedo, 1956, p. 14). Tradio

    medieval ou antiurbanismo generalizadono Brasil de ento (Azevedo, 1961, p. 26),os males do Brasil so? Apesar de pequenase mal-caladas, apesar do antiurbanismoportugus, algumas aglomeraes urbanasalcanavam foros de cidade sem que hou-vesse justificativa, como afirma Aroldo deAzevedo. A cidade de Filipia, ou Paraba,evidentemente no deveria ter recebidosemelhante honraria, no fossem motivosfortuitos e ocasionais (Azevedo, 1956, p.20). Nossa Senhora da Assuno do CaboFrio, antiga feitoria, elevada categoria decidade em 1615, sem razes poderosas que

    justificassem a medida (Azevedo, 1956, p.22). Da mesma forma Mariana, em 1745,como sede de bispado, e Oeiras, em 1761,por influncia do conde de Oeiras, futuromarqus de Pombal, so elevadas nobrecategoria de cidade igualmente sem nadaque justificasse, a no ser a vaidade de um

    poderoso ministro e as exigncias da Igre- ja, em detrimento de outras vilas quemaiores razes possuam para receber talgalardo (Azevedo, 1956, p. 37).

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    Em raro estudo dedicado exclusivamen-te cidade colonial no Brasil, diz NelsonOmegna que por ser mais rural do que cita-dino o portugus timbrou por ignorar aordem na edificao das cidades, nadainventou ou criou no planejamento das vi-las nas novas terras da Amrica (Omegna,1971, p. 9). Os colonos portugueses nocuidaram de incrustar a cidade na paisa-gem, apenas afundavam-na no solo, se-meavam-na, podemos dizer. E o faziamto sem cuidado que quase todas as nossasvilas inauguradas nos sculos XVI e XVIIforam postas pelos seus fundadores em s-tios inadequados; por isso vemos que amaioria delas teve de se trasladar para no-vos locais (Omegna, 1971, p. 10). Pobre-za e insignificncia so as caractersticasprincipais dessas cidades, que sofriam acompetio da roa, onde as fortunas flo-rescem nas casas-grandes (Omegna, 1971,p. 50). Com exceo de uns poucos portos,vilas mineiras ou centros que concentram aburocracia, as cidades vivem em modestoregime de auto-suficincia, servidas por um

    aparelhamento singelo, com fraco comr-cio e nenhuma indstria, no desenvol-vendo, a bem dizer, verdadeiras atividadesurbanas (Omegna,1971, p. 29).

    Improvisadas e, conseqentemente,provisrias. Havia no Brasil um certo desa-pego ao lugar, o que se revelava no deslei-xo da prpria urbanizao. Por mais de umsculo os colonos quase sempre encaravamo Brasil como coisa provisria [] (Ara-

    jo, 1997, pp. 31-2). E esse sentido do pro-visrio e do fugaz revelava-se no desleixoda urbanizao, ou mesmo na falta de ur-banizao (Arajo, 1997, p. 37). Em Sal-vador, por exemplo, a maior cidade da co-lnia, era tudo acanhado, de poucas ruas,poucas casas, poucas pessoas, vida mon-tona, modorrenta, s animada em dias defesta ou de comrcio grado, quando muitagente dos engenhos vinha cidade paradespachar o acar e comprar coisas supr-fluas (Arajo, 1997, pp. 37-8). Confirma-se aqui o carter secundrio, e mesmo pa-rasitrio da cidade colonial, fornecedora dosuprfluo, que vivia apenas em funo

    S. Salvador/ Baya de todoslos Santos(esta ilustraoe as seguintes

    pertencem aolivro Imagens

    de Vilas eCidades doBrasil Colonial ,de NestorGoulart Reis,So Paulo,

    Edusp, 2001)

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    da populao que habitava os engenhosonde se produzia a verdadeira riqueza dopas. Emanuel Arajo lembra, comoexemplos dessa pequenez e acanhamento,que, em So Paulo, talvez a mais acanhadade todas as vilas, em 1585 moravam ape-nas seiscentos brancos em 120 casas (Ara-

    jo, 1997, pp. 38-9; grifo meu), e em 1765,em todo o seu permetro urbano no haviamais do que novecentas edificaes e apopulao livre no chegava a quatro milhabitantes (Arajo, 1997, pp. 41-2; grifomeu). As poucas cidades que havia, quan-do no eram apenas pontos de passagementre as mercadorias do interior e os portosque as levavam Europa, serviam comoescolas da vadiagem, do crime e do vcio.De fato, havia um hbito colonial arraiga-do na populao: o desprezo pela cidade,pela coisa pblica (Arajo, 1997, p. 51).So, por isso, essas cidades mal localiza-das e ralamente habitadas, quase sempre deruas estreitas e imundas, abrigando umapopulao em sua maioria de gente queocupava construes acanhadas e miser-veis (Arajo, 1997, p. 82).

    Na obra de colonizao portuguesa,quase no h Estado, afirma Paulo Marins,sendo ela, assim como a criao de suasvilas, obra de particulares, que criavam seuprprio urbanismo, sem obedecer a re-gras precisas. Nem mesmo encontraram os

    portugueses o exemplo urbanstico to de-senvolvido dos grandes imprios conquis-tados pelos espanhis como os incas e osastecas, nada mais do que a desconcertanteviso de florestas irreconhecveis e de sil-vcolas em ednica nudez (Marins, 2001,p. 45). Essa cidade construda em meio a

    uma natureza totalitria ambgua, semrigor e sem planificao geomtrica comoa cidade criada pelos espanhis, criadalivremente, seu traado sendo comandadopela topografia ou, quem sabe, pelas se-dutoras sugestes dos proprietrios (Ma-rins, 2001, p. 82). Improvisava-se um te-cido de aspirao urbana, como improvisa-va-se a prpria conquista de um territrioquase intil, imensamente extenso e desar-ticulado aos olhos lusitanos (Marins, 2001,p. 45). Nada mais do que entrepostos entreos engenhos e os portos que levavam a suaproduo Europa, tributrias e secund-rias em relao economia exportadora,ligando-se apenas ao pequeno comrcio,ao menos nos anos anteriores s invasesholandesas, as cidades eram apenas sedespolticas e religiosas (Marins, 2001, p. 55).

    Ordem, desordem, planejamento, des-leixo so as oposies que marcam as ima-gens sobre as cidades coloniais no Brasil.Nestor Goulart Reis Filho procurou de-monstrar que a desordem no foi to gran-de como se preconiza, existindo medidas

    Estampaque ilustrao livro deHenry Hondius(1625)

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    Carmen Aranovich considera que tantoportugueses como espanhis partiam de umpressuposto comum para suas prticas co-lonizadoras: eles realizaram a conquista apartir de assentamentos que se podem cha-mar urbanos. Esses centros constituiriamuma unidade com os distritos rurais quelhes correspondiam, no existindo dife-renciao do ponto de vista poltico-admi-nistrativo (Aranovich, 1983, p. 384). Paraessa autora os processos urbanizadores dasduas coroas ibricas foram diferentes ape-nas enquanto as condies de colonizaotambm se mantiveram diferentes. A fun-dao de cidades na Amrica Portuguesarepresentaria para os seus habitantes asegurana, ou iluso de segurana, que pro-duz o viver no marco de certa ordem legalpreestabelecida, alm de representar acontinuidade de um modo de vida e cos-tumes que transplantaram a um meio com-pletamente novo (Aranovich. 1983, p.388). No entanto, ordem, clareza e traa-dos regulares no parecem ter sido freqen-tes, no porque no desejassem os portu-gueses, mas porque algumas condies

    impediam, como a enormidade das terrasfrente ao escasso nmero de colonos,inexistncia de tribos sedentrias, topogra-fia acidentada e o desconhecimento pelatradio urbana portuguesa do traadoretilneo (Aranovich, 1983, p. 388).

    Maria Fernanda Bicalho afirma que nocaso brasileiro o empenho urbanizador daCoroa atravs da criao de cidades re-ais, martimas e fortificadas, consistiu numdos elementos fundamentais no apenas daposse e defesa do territrio, mas sobretudodo processo de colonizao (Bicalho,1998, pp. 39-40). Diz ainda que no espa-o do Novo Mundo que as novas apreen-ses conceituais do territrio urbano, tema-tizadas pela Renascena, sero testadas erelativizadas (Bicalho, 1998, p. 41). Ascidades coloniais atraem, ainda, os maisimportantes funcionrios da Coroa, encar-regados da estrutura poltica, jurdica, ad-

    ministrativa, econmica e militar da col-nia. Para essa autora a cidade colonial erapalco fsico e simblico das estruturas dopoder poltico e econmico do Estado por-

    tugus, espao de sua plena visibilidade eao mesmo tempo lugar no qual nada deve-ria escapar sua ao e controle (Bicalho,1998, p. 43).

    Paulo Santos, comentando os estudossobre a cidade no Brasil, observa a existn-cia de trs grupos ou linhas de interpreta-o: primeiro os que as consideram comono chegando a contradizer o quadro danatureza, exprimindo o desleixo do povoa-dor, apoiados claramente na interpretaode Srgio Buarque de Holanda; depois osque as encaram com complacncia, comoexprimindo solues de canhestra ingenui-dade do colono; no terceiro grupo estariamos que consideram um progresso as cida-des construdas com traados regulares. Dizo autor que ele aspira pertencer a um quartogrupo,

    partindo do princpio de que a seduoque as cidades de plano informal desper-tam no homem moderno, e vai ao ponto deas guindarem s altitudes de monumentosnacionais, resulta da genuinidade dessascidades como expresso sincera da vida, e

    da autenticidade como interpretao de umsistema de conceitos urbansticos cujasrazes recuam at os obscuros tempos daIdade Mdia peninsular muulmana acrist (Santos, 2001, p. 76).

    Para ele, ainda, as cidades de traadosregulares, nesse sentido, so regresses,abstraes do esprito de que a vida noparticipa (Santos, 2001, p. 76).

    Finalmente, nem medieval, nem pito-resca, nem ordenada, nem espontnea, paraGiovanna Rosso Del Brenna a cidade colo-nial portuguesa teria sido barroca. Para essaautora a contribuio dos estudos que indi-cam uma poltica urbanizadora centraliza-da, principalmente no sculo XVIII, im-portante, mas essa reabilitao e justifica-o do urbanismo portugus no Brasil parcial, pois o urbanismo portugus con-tinua no fundo sendo avaliado de acordocom o modelo hispano-americano. Estaviso, para ela, parte da convico da su-perioridade intrnseca da cidade de padrorigorosamente geomtrico sobre a cidade

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    de formao espontnea ou semi-espont-nea, que no ajuda a compreender o espa-o urbano colonial (Del Brenna, 1982-83,p. 142). Dialogando com Paulo Santos, DelBrenna sugere que as descries de espa-os urbanos que o arquiteto d como sendode origem medieval seriam na verdadebarrocas. Apenas o carter no-monumen-tal dos edifcios e a pequena escala damaioria das realizaes impediu, para ela,uma leitura em chave barroca da cenaurbana colonial no Brasil (Del Brenna,1982-83, p. 144). O crescimento urbano dacidade colonial portuguesa se configura,para ela, como um processo espontneomas no casual; produto no tanto da incriae da irracionalidade da qual falaram SrgioBuarque de Holanda e Robert Smith []mas muito mais fruto de uma lgica diver-sa, de acordo com as hierarquias e objeti-vos do projeto colonial portugus (DelBrenna, 1988, p. 452).

    AS IMAGENSImagem da desordem, da irraciona-

    lidade, ora da dependncia em relao aocampo, ora da auto-suficincia, as cidadescoloniais so tambm a imagem do vazio:so vazias de atividade, movimento, eco-nomia, construes e povo. Imagens que serepetem insistentemente, que so projeesde outros observadores que visitaram edescreveram nossa natureza e nossos arre-medos de cidades, os viajantes e naturalis-tas que por aqui passaram e deixaram porescrito o que supostamente viram e conhe-ceram na Amrica dos portugueses. Queimagens nos deram eles de nossas cidadescoloniais?

    Primeiramente o aspecto fsico, as ruas,casas, edifcios pblicos, aquilo que super-ficialmente define o urbano, de uma pobre-za assustadora. Thomas Lindley, contra-bandista britnico que foi hospedado pornossas prises coloniais entre 1802 e 1803,observou sobre Porto Seguro que suas ruasso suficientemente largas, retas, mas dis-postas de maneira irregular. As casas tm

    geralmente um s pavimento, so baixas emal construdas, de tijolos moles, juntadoscom barro e recobertos de argamassa. To-das tm aspecto sujo e miservel (Lindley,1969, pp. 148-9). Com relao a Salvadora imagem no menos negativa: as cons-trues datam principalmente do sculoXVII, sendo mal feitas, e, devido fragi-lidade dos materiais empregados, estragam-se rapidamente, o que reduziu a aparnciade muitas, outrora suntuosas (Lindley,1969, pp. 160-1). No apenas mal traadas,mas sobretudo sujas, as ruas so aperta-das, estreitas, miseravelmente pavimenta-das, nunca esto limpas, apresentando-sesempre repugnantemente imundas(Lindley, 1969, p. 163). Na Mogi-Mirimvisitada por Saint-Hilaire em 1818 em suaviagem pela provncia de So Paulo, ascasas so baixas, muito pequenas e, emsua maioria feitas de paus cruzados e barrocinzento, o que lhes d uma aparncia muitotriste. No creio que, poca de minhaviagem, o seu nmero passasse de muito decem, tendo eu visto apenas duas que eramsobrados (Saint-Hilaire, 1976, p. 105). As

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    ruas da mal ladrilhada So Paulo so pla-nas e largas, porm pequenas e nenhumatem um traado regular (Saint-Hilaire,1976, p. 128). Sorocaba, vista dos morrosvizinhos at produz um efeito agradvel napaisagem, mas observada de perto

    a cidade muito feia. As ruas no socaladas e, sendo em declive, apresentamsulcos profundos cavados pela gua daschuvas. De um modo geral, as casas sopequenas havendo poucas com mais de umpavimento; so cobertas de telhas, feitas detaipa, e todas possuem um quintal plantadode bananeiras e laranjeiras (Saint-Hilaire,1976, p. 185).

    Em alguns locais o nome de cidade nemse justifica, como era o caso da Franca visi-tada por Saint-Hilaire: exceo de umpequeno nmero de artesos e de comerci-antes de produtos alimentcios os habitan-tes do lugar eram todos agricultores, os quais,segundo o costume, possuam casa na cida-de apenas para a passar o domingo, perma-necendo o resto da semana em propriedades

    rurais (Saint-Hilaire, 1976, p. 89).O Rio de Janeiro ainda no era a Cidade

    Maravilhosa de hoje, embora tivesse algunsadmiradores. Na primeira metade do scu-lo XIX, quando visitada pelo comercian-te ingls John Luccock, ainda no h muitodo que se gabar na opinio desse observa-dor. Diz ele que os edifcios pblicos dasgrandes cidades da Europa emprestaram aosdo Rio seus nomes e finalidades,

    comunicando-lhes porm, pouca coisa almdisso; pouco do seu esplendor e, se possvel,menos ainda da sua propriedade. Acontececom as instituies pblicas algo de muisemelhante; no passam, no geral, de arre-medos pifiamente falhos dos originais quepretendem imitar (Luccock, 1942, p. 37).

    A Catedral carioca, na descrio deLuccock,

    consiste numa edificao baixa, singela ecompacta []. Dentro, as paredes so caia-das, sem ornamentaes e sujas. O altar,por sua vez, to simples quanto a igreja

    Vista da cidadede So Paulo

    parte sul.Original

    manuscrito daColeo Dr.

    Joo MoreiraGarcez (1821)

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    revelando o conjunto que muito pouco apro-veitou de qualquer das predilees dos gran-des ou dos ricos. A orquestra fica na extre-

    midade sul, desajeitadamente pregada ren-te ao forro. Em redor vem-se os sinais demuitos alicerces, muitos deles crescidos demato (Luccock, 1942, p. 37).

    To decadente a imagem desse tem-plo que at mesmo a natureza se apossa deseu espao, crescendo o mato dentro daprincipal igreja da cidade. Ewbank, apesarde louvar a beleza do convento de So Bentodo Rio, no se deixa seduzir por suas ruas.As ruas so geralmente retas, mas a RuaDireita curva. Como Damasco, as cida-des catlicas tm sempre uma rua chamadadireita por mais sinuosa que seja. So es-treitas, desviando dos acidentes geogrfi-cos da cidade, as montanhas e as praias, ascarruagens passam muito prximas dasfachadas das casas.

    A Rua do Rosrio uma genuna ruamourisca antiga []. Como penoso paraos animais puxarem carros por esses cami-nhos! No entanto o que se poder dizer dossacrifcios humanos em suor e esforos, in-

    cessantemente oferecidos em tais ruas comoem muitos altares (Ewbank, 1976, p. 73).

    Spix e Martius tambm no se impres-sionam com a feio arquitetnica do Rio.Observam eles que as construes da cida-de so em geral de feio mesquinha esemelhantes s da parte velha de Lisboa(Spix e Martius, 1976, v. 1, p. 43), emboraacrescentem que a presena da corte deveinfluir positivamente neste aspecto. Emoutras cidades menores, o aspecto aindamais desolador. Oeiras no passa de umapovoao insignificante, que consta de al-gumas ruas irregulares, com casas baixasde barro caiadas de branco (Spix e Martius,1976, v. 2, p. 217). Em So Lus, noMaranho, as ruas so irregulares, parteem ladeiras, e mal caladas ou sem cala-mento. A residncia do governo apresentaextensa fachada, faltando-lhe, porm, adignidade e elegncia prprias desses edi-fcios (Spix e Martius, 1976, p. 244).Observam que Salvador est localizada emterreno desigual, numa escarpa ngremeque deixa espao ao longo da praia paraapenas uma nica rua principal, cortada nomeio por alguns becos. Vastas fachadas

    Detalhe doPlan de Rio

    jenairio ,original

    manuscrito da BibliotqueNationale,Paris (1731)

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    de trapiches a armazns, beira-mar, e emcima, altas casas de morada, em cuja facepara o mar existem compridas varandas demadeira, deixam esperar antes uma cidadecomercial e populosa do que belamenteedificada (Spix e Martius, 1976, p. 129).Opinio compartilhada por Rugendas, paraquem na Bahia h grande nmero de edi-fcios pblicos, mas eles so muito maisnotveis pelo tamanho que pela beleza daarquitetura (Rugendas, 1979, p. 86). So-bre Vila Rica, Rugendas no deixa de su-blinhar tambm a feira de sua arquitetu-ra. Diz ele que as igrejas e edifcios pbli-cos da cidade, do ponto de vista artstico,no apresentam nada de notvel. Datam,quase todas as igrejas e outras constru-es, de uma poca em que a arquiteturase achava em plena decadncia, no so-mente em Portugal mas ainda em quasetodos os pases da Europa (Rugendas,1979, p. 71). Mistura de estilos, decadn-cia, resduos gticos, infelizes imitaesdo antigo, tudo misturado sem arte. Nacolnia explica-se tambm a falta de gos-to e arte pelo fato de que os artistas que

    abandonaram a metrpole no eram pre-cisamente os melhores, o que explica porque os edifcios mais vastos e mais ricosdo Brasil so desprovidos de beleza(Rugendas, 1979, p. 72).

    No apenas nos edifcios pblicos quese mostra a pobreza e a desordem das cida-des brasileiras, mas tambm nas casas par-ticulares, mesmo daqueles mais ricos. Nemnas casas, nem no mobilirio, conseguimosencontrar muitas coisas que ns nos acos-tumamos a considerar como essenciais aoconforto; no as encontramos nem mesmonas habitaes mais espaosas e fornidas(Luccock, 1942, p. 80). Mesmo nos sobra-dos dos ricos a sensibilidade do civilizado ferida, tamanha a falta de conforto e higi-ene. Diz Luccock que nesses sobrados huma rea aberta para a entrada de carrua-gens e cavaleiros:

    Um largo lance de degraus conduz do ptioao andar de cima, onde se encontram oscmodos de estar e de dormir, dos quaisalguns bastante ofensivos delicadeza bri-tnica, por causa da bulha, do calor e do

    Planta dacidade de S.Sebastio doRio de Janr o... ,original do livrode Vilhena,

    BibliotecaNacional, Riode Janeiro(1775)

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    forte cheiro de animais guardados embai-xo; mas essas coisas pareciam no produ-zir efeitos desagradveis nos nervos debrasileiros (Luccock, 1942, p. 80).

    Ewbank chama a ateno de que a maio-ria das casas no Rio possui dois andares,algumas trs e muitas apenas um,

    todas grotescamente misturadas como namaioria das cidades antigas. No se encontrauma quadra uniformemente construda. Noexiste o que nossos construtores chamariamde bela fachada pois todas as entradas ficamno nvel da rua, no sendo permitidos nemescadas nem prticos. No h tambm noRio uma casa de tijolos ou de madeira. To-das tm paredes de pedra bruta (como os ali-cerces de nossos prdios) cobertas de rebocode cal e marga (Ewbank, 1976, p. 74).

    Pois nos deparamos aqui no apenascom a feira, mediocridade e insignificn-cia das cidades brasileiras, mas com a faltade civilidade, de decoro e de educao. Faltaao Brasil a urbanidade dos modos e costu-

    mes que fazem de um pas uma civilizao.Para Lindley, por exemplo, a origem por-tuguesa faz dos brasileiros menos civiliza-dos. Comentando a imundcie e grosseriados desgraados que o rodeiam, ou seja,o costume chocante de uns catarem pio-lhos nas cabeas dos outros, observa queno surpresa aos que j tenham visitadoa Espanha, Portugal ou o sul do continenteeuropeu. Com o agravante de que o que seobserva apenas entre o vulgo nesses pa-ses, no Brasil encontrado em todas asclasses (Ewbank, 1976, p. 53). MesmoMaria Graham, muito mais simptica aoBrasil do que o contrabandista Lindley, nodeixa de notar a falta de civilidade das ca-sas brasileiras, mais especificamente dosportugueses do Brasil. No Rio de Janeirovisita algumas famlias portuguesas comuma compatriota inglesa: as casas, namaior parte, so repugnantemente sujas.Sua delicadeza britnica, confirmando aimpresso de Luccock, tambm feridacom as celas para escravos e cavalariasdos andares trreos, e com a viso de se-

    nhoras que dificilmente poder-se-ia acre-ditar que fossem de sociedade.

    Como no usam coletes, nem espartilhos,o corpo torna-se indecentemente desalinha-do, logo aps a primeira juventude; e isto tanto mais repugnante quanto elas se ves-tem de modo muito ligeiro, no usam len-os no pescoo e raramente os vestidos tmqualquer manga. Depois, nesse clima quen-te, desagradvel ver escuros algodes eoutros tecidos, sem roupa branca, direta-mente sobre a pele, o cabelo preto mal pen-teado e desgrenhado, amarrado inconveni-entemente, ou, ainda pior, em papelotes, ea pessoa toda com a aparncia de no tertomado banho (Graham, 1956, p. 148).

    Tambm os homens portugueses tmtodos aparncia desprezvel. Nenhum pa-rece ter qualquer educao acima da dosescritrios comerciais e todo o tempo deles gasto, creio eu, entre o negcio e o jogo(Graham, 1956, p. 157). Faltando a civili-dade, no se desenvolveu aqui o gosto. Amesma Maria Graham observa nas casas

    que visitou gravuras e pinturas, as ltimasos piores borres que nunca vi, que de-coravam geralmente as paredes (Graham,1956, pp. 148-9). E Saint-Hilaire, apesarde elogiar a beleza das casas dos habitantesmais graduados de So Paulo e sua hospi-talidade, no deixa de notar que as suassalas so ornadas de gravuras, as quais,entretanto, so constitudas pelo refugo daslojas europias. Era to pouca a noo dearte do povo do lugar, poca de minhaviagem, que eles nunca deixavam de mechamar para admirar suas obras-primas(Saint-Hilaire, 1976, p. 128).

    A hora das refeies deixava claro aosvisitantes estrangeiros a falta de lustrocivilizador desta terra de misrias habi-tada por novos godos (Lindley, 1969, pp.50 e 163). Lindley fica chocado com osmodos dos convidados de um jantar na casado capito Jos Joaquim Veloso, em Salva-dor, que, apesar de serem bem mais finosdo que os que havia conhecido em PortoSeguro, possuam o horrvel costume dopas, qual seja, o de comer com as mos, em

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    vez de usar facas e garfos, posto que nohouvesse falta desses utenslios (Lindley,1969, p. 63). A sensibilidade britnica deLuccock foi mais uma vez ferida em umarefeio da qual participou:

    Comem muito e com grande avidez, eapesar de embebidos em sua tarefa, aindaacham tempo para fazer grande bulha. Aaltura da mesa faz com que o prato chegueao nvel do queixo; cada qual espalha seuscotovelos ao redor e, colocando o pulso

    junto beirada do prato, faz com que pormeio de um pequeno movimento hbil, ocontedo todo se lhe despeje na boca. Poroutros motivos alm deste no h grandelimpeza nem boas maneiras, durante a re-feio; os pratos no so trocados, sendoentregues ao copeiro segurando-se o garfoe faca numa mesma mo; por outro lado, osdedos so usados com tanta freqnciaquanto o prprio garfo. Considera-se comoprova incontestvel de amizade algumcomer do prato de seu vizinho; e, assim,no raro os dedos de ambos se vejam si-multaneamente mergulhados num s pra-

    to (Luccock, 1942, p. 84).

    Uma das causas de tanta barbrie pode sero fato de se observar to pouco, neste pas,

    a matria de subordinao de classes. AFrana, em sua fase de mais completa re-voluo e igualdade dos cidados jamais oexcedeu a esse respeito. V-se aqui, o em-pregado branco conversar com o patro emtermos de igualdade e cordialidade, discu-tir-lhe as ordens e questionar a seu respei-to, se so contrarias opinio que julguemais fundada (Lindley, 1969, p. 71).

    Talvez o que explique isso seja a mistu-ra de raas e de mestios, que em So Pau-lo, para Saint-Hilaire, resulta em compli-caes no s embaraosas para a adminis-trao como perigosas para a moral pbli-ca (Saint-Hilaire, 1976, p. 71). Essesmestios de ndias e brancos, to comunsnos campos de Piratininga, so to poucoprevidentes quanto os seus antepassados[os ndios] e talvez mais apticos do que

    eles. Podemos acrescentar ainda que in-dolncia desses homens se juntam, de ummodo geral, a palermice e a impolidez(Saint-Hilaire, 1976, p. 85).

    O catolicismo pitoresco das cidadesportuguesas na Amrica um dos ndicesde sua incivilidade; ele , nas imagens deviajantes e naturalistas, ao mesmo tempocausa e conseqncia da aparnciadesordenada e suja e da falta de civilidadedesses centros urbanos. Observando a pro-cisso de Nossa Senhora da Conceio daPraia em Salvador, Lindley se surpreendecom a venerao que essas imagens des-pertam no povo, que geralmente as adorade maneira devota e abjecta, como se con-tivessem a essncia da prpria Divindade,baixada terra na ocasio, in propria

    persona (Lindley, 1969, p. 83). No dia deReis, msicos ambulantes cruzam as ruasem grupos, indo de casa em casa, sem amenor cerimnia, e fazendo em cada umao mais brbaro tumulto; e depois de repe-tirem as mesmas tolas formalidades, se-guem adiante para importunar o moradormais prximo. Muito mais do que uma

    comemorao crist, pareceu ao contraban-dista um carnaval italiano, cheio de con-fuso, mas sem o esprito picante e o vivointeresse que inspira esta festa (Lindley,1969, p. 100). Saint-Hilaire tambm ques-tiona a religiosidade atrasada e pitorescados brasileiros. Assistindo Procisso deCinzas em So Joo Del Rei ele se impres-siona com as imagens de gosto duvidosolevadas pelos fiis, que no faziam justia seriedade e importncia do evento:

    Essa srie de figuras era de uma bizarriaextrema; havia, entretanto, pior gosto noconjunto do que nas mincias. As roupasconvinham s personagens que as vestiam;as tintas eram frescas, e no pude deixar deachar as imagens muito bem esculpidas,pensando, sobretudo, que elas o foram, noprprio lugar, por homens desprovidos debons modelos. O que a procisso exibia demais ridculo eram as crianas de raa bran-ca, que seguiam cada andor e representa-vam anjos. A seda, os bordados, as telas efitas tinham sido to prodigalizados nas suas

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    vestimentas, que apenas podiam caminhar,perdidos no meio do ridculo (Saint-Hilaire, 1944, p. 100) (*).

    Luccock tambm deplorou aspectos dareligiosidade dos luso-brasileiros e seuspreconceitos, que lhes impediam uma die-ta mais saudvel. Observa ele que o povocostuma se alimentar de carne de porco commuita avidez, como se o encantassem to-das as oportunidades de demonstrar que noso nem judeus nem maometanos. Duvidono entanto que essa espcie de alimento, talcomo produzido no Brasil, possa consti-tuir uma dieta no s desejvel como sau-dvel (Luccock, 1942, p. 31). J o carnei-ro no consumido porque dizem que no comida prpria de cristo, por ter sido oCordeiro Divino que tomou consigo ospecados do mundo (Luccock, 1942, p. 30). curioso observar que uma viajante con-tempornea, Elizabeth Bishop, que viveumais de vinte anos no Brasil, reproduzmuitas das imagens que seus antecessorescristalizaram na historiografia. Diz ela emcarta de 27 de julho de 1960, ao poeta Robert

    Lowell, que a igreja do Brasil

    vive me dando calafrios protestantes. Umanoite no Rio, pedi emprestado uma camiso-la numa situao de emergncia. Quandofui me deitar, senti alguma coisa me arra-nhando o peito, na altura do corao; procu-rei e encontrei uma coisa presa com alfinete.De incio pensei que fosse uma esponja dep-de-arroz pequena talvez uma novamaneira de se perfumar , mas quando pe-guei o objeto vi que nele havia uma inscri-o, quase invisvel: Agnus Dei. Isso per-tencia a uma mulher que eu sempre conside-rara inteligente , embora catlica uma dasboas (Bishop, 1995, p. 417).

    DESCRIO E INTERPRETAO:TU

    NO TE MOVES DE TI basicamente no sculo XIX que as

    imagens da cidade colonial se cristalizam:

    nesse momento que o urbano se torna umproblema de fato; nesse momento tambmque se comea a definir a idia de Naobrasileira cada vez mais separada de Portu-gal, cada vez mais oposta ao passado colo-nial e opresso lusitana. Define-se tam-bm nesse momento um narrador de ficoque tematiza o que o Brasil, quais suasorigens, e junto com esse narrador de ficose define igualmente um narrador historia-dor, objetivo e voltado s fontes e documen-tos. Para isso os viajantes so imprescind-veis, pois eles do confiabilidade e veraci-dade s imagens que criam em sua prosa eem suas pranchas. O que parece darconfiabilidade a essas impresses e notas ,de um lado a prpria existncia da viagem,de outro, o fato de se tratar de um olhar deestrangeiro. De se tratar de algum de fora,mas que de fato teria testemunhado o quenarra (Sssekind, 1990, p. 49). Testemu-nhos estes que so tanto descritivos comovisuais, cujas imagens teriam um carterprobatrio, que seria tanto mais histricoquanto pudesse comprovar a coincidnciade traos nela presentes com os desse real

    externo, objetivo, a cidade que lhe serviu demodelo (Meneses, 1996, p. 153). Tendovisto, testemunhado e observado, e aindamais sendo estrangeiros, o que lhes dava umaobjetividade que outros no teriam, suas des-cries e imagens recebem o estatuto de fi-delidade com o real.

    Essa prosa de fico e a histria nacionalque se desenvolvem nesse momento buscamdar densidade e fiabilidade a esta paisagembrasileira, um compromisso em afirmar umaessncia original da nacionalidade(Sssekind, 1990, p. 127). Viajantes e cronis-tas se movem pela cidade colonial, mas comose no se movessem de si mesmos em suasdescries. Descrio e interpretao j vm

    juntas (Sssekind, 1990, p. 162) nesses re-latos aparentemente objetivos, por serem nar-rao do visto e do vivido, relatados por quemesteve l e realmente experimentou o quedescreve. Esses viajantes esto condenados a

    dizer sempre a verdade, a descrever sempre oreal; espera-se deles, enquanto observadoresexternos e desinteressados, uma viso obje-tiva que apenas retrate o verdadeiro, o exis-

    * Devo a minha amiga MariaRegina Emery Quites a indica-o desta paisagem.

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    tente. Sua ateno voltada aos costumestpicos , peculiares e pitorescos , que fazemparte daquilo que forma a identidade e a par-ticularidade do Brasil. Por seu turno, ahistoriografia quase nunca se move das ima-gens criadas por esses observadores e poroutros que deixaram relatos sobre as cidadescoloniais, como funcionrios rgios, admi-nistradores e cronistas, nem da idia do pla-nejamento urbano como algo intrinsecamen-te bom e desejvel. Espera-se encontrar o pla-nejamento na Amrica Portuguesa antesmesmo que ele tenha sido sistematizado naEuropa, na segunda metade do sculo XIX.Se de um lado uma parte da historiografianega o ordenamento urbano s cidades portu-guesas na Amrica, outra parte procura osindcios de sua presena; mas a prpria idiado ordenamento e do planejamento no questionada.

    As imagens criadas pelos viajantes so-bre as cidades tm como substrato, na ver-dade, a imagem de natureza e de civilizaoque eles trazem ao Brasil. a natureza queinteressa maioria deles, no o urbano. Oque caracteriza as terras deste Novo Mundo

    sua natureza exuberante, ednica, que aomesmo tempo fascina e horroriza, que im-pede o desenvolvimento da civilizao, e ascidades so vistas como tributrias dessanatureza que a tudo domina. Spix e Martiusao iniciarem a sua descrio do Rio de Ja-neiro observam que quem chega convenci-do a encontrar nesta parte do mundo desco-berta h apenas trs sculos uma naturezainteiramente rude, violenta e invicta, po-deria esperar que ao menos na capital doBrasil, com a influncia da cultura da velhae educada Europa, se encontrasse um espa-o alheio selvajaria americana.

    Lngua, costumes, arquitetura e afluxo dosprodutos da indstria de todas as partes domundo do praa do Rio de Janeiro aspec-to europeu. O que, entretanto, logo lembraao viajante que ele se acha num estranhocontinente do mundo, sobretudo a turbavariegada de negros e mulatos, a classe ope-rria com que ele topa por toda parte, assimque pe o p em terra. Esse aspecto foi-nosmais de surpresa que de agrado. A natureza

    inferior, bruta, desses homens importunos,seminus, fere a sensibilidade do europeu queacaba de deixar os costumes delicados e asfrmulas obsequiosas de sua ptria (Spix eMartius, 1976, pp. 41-2).

    No apenas a pobreza material, a irre-gularidade do traado urbano ou as ruastortas e mal caladas que caracterizam acidade colonial no Brasil, mas a falta daurbanidade, dos traos de civilizao semos quais no se pode falar em cidades, aomenos em verdadeiras cidades. O caso daSo Paulo estudada por Ana Edite Montia emblemtico da cidade colonial portu-guesa da Amrica. Quando administrado-res e viajantes reclamam da aparncia pri-mitiva de So Paulo, evidente a refern-cia: o arcasmo no est vinculado persis-tncia da vida campestre, mas ausnciados paradigmas definidores da urbanidadecomo sinais de uma cidade civilizada(Montia, 1990, p. 10). exatamente issoque para Spix e Martius no faz do Rio deJaneiro, apesar de suas construes, de seucomrcio, de seu aspecto europeu, uma

    verdadeira cidade. Partimos aqui dessaopo pela idia de uma vida urbana dife-renciada da vida do campo, ou da natureza,que coloca em destaque a noo de artif-cio , da arte do homem distinguindo-o defi-nitivamente dos outros seres do mundoanimal, e remete para a concepo de artecomo transposio de uma idia em umaobra , como algo intrnseco ao campo daracionalidade e da industriosidade(Bresciani, 1992, p. 11).

    Essa cidade vista por cronistas, viajan-tes e historiadores desordenada, subme-tida natureza hostil e sem atrativos.Atrofiada pela ignorncia, reclusa e grave,parece esterilizada pelos seus prpriosreferenciais: privacidade, valores antiqua-dos, criatura arruinada, impenetrvel eopaca (Montia, 1990, p. 11). Preocupa-da em romper com a tradio colonial por-tuguesa e com a dependncia, em denunci-ar os defeitos dessa cidade e justificar asmudanas urbansticas de incios do sculoXX, em romper com esse tecido urbano topreso s tradies rurais, pertencentes ao

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    Essa cidade adjetivada como catlica,mourisca, antiga, velha, sensual, africana,em oposio cidade europia e ordenada:ela no deixa de ser cidade, como lembramSpix e Martius, mas no todavia a cidade

    do artifcio, da arte e da obra; ela ainda oque nos prende ao atraso da colonizao. Aimprovisao de uma espcie de burguesiaurbana no Brasil teria trazido s cidadescertas atitudes peculiares at ento aopatriciado rural que no se coadunam coma vida urbana. Estereotipada por longosanos de vida rural, a mentalidade de casa-grande invadiu assim as cidades e conquis-tou todas as profisses, sem excluso dasmais humildes (Holanda, 1988, pp. 55-6).O oficial de carpinteiro descrito porLuccock e citado por Srgio Buarque deHolanda, que se vestia maneira de fidalgoe se recusava a usar das prprias mos paracarregar as ferramentas de seu ofcio, o

    exemplo de que o passado de dependnciae de atraso do domnio portugus na Am-rica persistia e que a urbanizao no esta-va completa pois, se a cidade tornara-seurbs , todavia no era civitas .

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