041 Manejo Clinico Usuario Crack

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    DiretrizesClnicasProtocolosClnicos

    041Manejo Clnico do Usurio de Crackltima reviso: 13/08/2013

    Estabelecido em: 10/04/2013

    Responsveis / UnidadeFernando Teixeira Grossi- Mdico | IRS

    Rafael Miranda de Oliveira- Mdico | IRS

    Disponvel em www.fhemig.mg.gov.bre intranet

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    INTRODUO/RACIONAL

    O crack consiste em substncia de abuso produzida a partir da pasta da cocana adicionada aobicarbonato ou amnia e gua, e inmeras outras substncias gerando composto que pode serfumado ou inalado. Seu nome faz referncia sonoridade quando queimada a pedra de crack nocachimbo. A utilizao da substncia provoca euforia de grande magnitude e curta durao comdesenvolvimento de fissura, isto , urgncia para repetir o uso. O baixo custo e o imediato efeitoa torna a droga utilizada principalmente pelas classes sociais de baixa renda. O consumo de crack um fenmeno recente, surgido nos ltimos 25 anos nos Estados Unidos e h 20 anos no Brasil.Em alguns pases europeus o problema tornou-se relevante h pouco mais de cinco anos. Doislevantamentos nacionais realizados pelo CEBRID em 2001 e 2005 detectaram que o uso na vidaaumentou de 0,4% para 0,8% no Brasil. A maioria (62,8%) dos usurios de crack apresentacritrios positivos para dependncia ao longo de sua histria de consumo. O usurio de crackiniciante parece apresentar maior risco para dependncia e complicaes do uso quandocomparado ao usurio de cocana inalada. Sabe-se que o uso de substncias psicoativas eleva achance de outros transtornos psiquitricos como tambm existe elevada incidncia de

    comorbidades com uso de drogas entre portadores de transtornos psiquitricos.

    OBJETIVOS

    1. Orientar o suporte sintomtico na intoxicao.2. Estabelecer um fluxo especfico de tratamento.3. Promover a reabilitao.4. Possibilitar a abstinncia.5. Promover a reduo de danos.6. Contribuir na constituioda rede de cuidados ao usurio de crack.

    SIGLAS

    ASSIST Alcohol Smoking and Substance Involvement Screening TestCAPS ad Centro de Ateno Psicossocial em lcool e drogasCEBRID -Centro Brasileiro de Informaes sobre Drogas PsicotrpicasCID -Cdigo Internacional de DoenasCRAS Conselho Regional de Assistncia SocialCREASCentro de Referncia Especializado de Assistncia SocialDSM -Manual diagnstico e estatstico das doenas mentais da Associao de Psiquiatria Norte

    AmericanaESF Estratgia Sade da FamliaHIV -Vrus da Imunodeficincia HumanaIM -IntramuscularIV IntravenosoNASF Ncleo de Assistncia Sade da FamliaNIDA -National Institute on Drug AbuseOMS -Organizao Mundial de SadePTI -Plano Teraputico IndividualSPA -Substncia Psicoativa

    TDAH -Transtorno de Dficit de Ateno e HiperatividadeUNODOC -United Nations Office on Drugs and Crime

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    MATERIAL/PESSOAL NECESSRIO

    Enfermeiros e tcnicos de enfermagem; Assistente social; Terapeuta ocupacional; Psiclogo; Mdico clnico geral e psiquiatra; Formulrios do exame de enfermagem e ASSIST; Exames laboratoriais de imagem; Material assistencial.

    ATIVIDADES ESSENCIAIS

    Princpios do tratamento efetivo National Institute on Drug Abuse (NIDA)

    1.

    Nenhum tratamento efetivo para todos os pacientes.2. O tratamento necessita ser facilmente disponvel.3. O tratamento deve atender s vrias necessidades e no somente ao uso de drogas.4. O tratamento necessita ser constantemente avaliado e modificado de acordo com as

    necessidades do paciente.5. Permanecer em tratamento por perodo adequado fundamental para a efetividade.6. Aconselhamento e outras tcnicas comportamentais so fundamentais para o tratamento.7. Medicamentos so importantes, principalmente quando combinados com terapia.8. A comorbidade deveria ser tratada de forma integrada.9. Desintoxicao s o comeo do tratamento.

    10.

    O tratamento no necessita ser voluntrio para ser efetivo.11.A possibilidade de uso de drogas deve ser monitorada.12.Avaliao sobre HIV, hepatites B e C e aconselhamento para minimizao de riscos.

    Recuperao um processo longo e, muitas vezes, so necessrios vrios perodos detratamento.

    1.Acolhimento e avaliao clnica

    Dados estatsticos apontam que os usurios de crack so aqueles que menos buscam ajuda entre

    os usurios de substncias de abuso. Buscam apenas em situaes agudas, na vigncia das quaispreferem internao e apresentam baixa adeso posterior ao tratamento ambulatorial. Aavaliao inicial , portanto, um momento importante do tratamento. Pode ser realizada porqualquer profissional de sade que deve desenvolver habilidades e competncias paraidentificao e manejo dos comportamentos adictos.

    O acolhimento consiste no primeiro contato do usurio com o servio. Deve ser entendido noapenas como um processo burocrtico de triagem clnica, mas sim, segundo as diretrizes doHumaniza SUS, momento de acolhida subjetiva com possibilidade de escuta, ambincia eempatia.

    O acolhimento momento crucial na abordagem ao usurio. Constitui-se para alm de meraavaliao clnica. momento de interveno teraputica. Diante da baixa adeso e continuidade

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    ao tratamento, postura preconceituosa, destituda de afeto na relao profissional de sade-paciente e descrena para com a teraputica fortalecem uma transferncia negativa com aperpetuao desta condio clnica, impossibilitando interveno eficaz. Ao contrrio, apromoo de um espao acolhedor e isento de preconceitos, que possibilite a escuta subjetiva eo insight, vem fortalecer o vnculo teraputico.

    A promoo do acolhimento dever considerar:

    Abordagem emptica; Ausncia de conceitos moralistas; Possibilitar um espao de escuta; Desenvolver a crtica; Fortalecer a aliana teraputica.

    2. Triagem clnica

    2.1. Equipe de Enfermagem

    Triagem clnica diz respeito avaliao clnica inicial, geralmente realizada pela equipe deenfermagem, quando so aferidos os dados vitais e aplicada entrevista com foco nadeteco de fatores clnicos agravantes. Deve identificar fatores de risco ou complicaesclnicas que necessitem priorizar ateno mdica imediata, tanto do ponto de vista clnicoquanto psiquitrico (veja entrevista de enfermagem no Protocolo 027- Acolhimento aosUsurios de lcool e Droga).

    2.2. Assistente Social

    Abordagem e participao ativa dos familiares e acompanhantes elevam as chances desucesso do tratamento possibilitando a adeso ao mesmo, alm de promover oatendimento global s necessidades do usurio.

    Investigar a realidade social do usurio e a implicao do uso do crack em seucontexto;

    Conhecer e avaliar as relaes familiares/sociais do usurio e a estruturao desses

    vnculos, visando o seu fortalecimento; Garantir o direito social do usurio por meio do acesso s polticas pblicas, atravs

    dos encaminhamentos, que se fizerem necessrios rede scio-assistencial (abrigos,planto social, CRAS, CREAS, Conselhos de Direitos, dentre outros); Contribuir na construo do PTI.

    3. Entrevista mdica e avaliao clnica inicial

    Durante a avaliao clnica inicial necessrio entender as relaes estabelecidas com a droga,seu grau de dependncia, bem como as conseqncias clnicas numa perspectivabiopsicossocial, abordando todas as necessidades do usurio.

    O padro de uso da droga pode ser aferido pela aplicao do ASSIST (ver PC 027-Acolhimento aos Usurios de lcool e Drogas).

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    Problemas ligados ao uso

    Existem consequncias fsicas, psquicas e sociais diretamente relacionadas ao uso desubstncias que so entendidos como fatores agravantes do hbito nocivo. Possibilitamavaliao do grau de dependncia e as repercusses do uso. Alguns pacientes, mesmo diante

    de fatores agravantes mantm seu hbito nocivo.

    Consequncias Relacionadas ao uso de SPA

    Repercusses Fsicas

    Convulses; Desnutrio; Exposio a doenas sexualmente transmissveis, dentre

    outros.

    Repercusses psquicas Quadros depressivos; Transtornos psicticos; Transtornos de pnico.

    Repercusses sociais

    Perda de emprego; Rompimentos familiares;

    Abandono escolar;

    Envolvimento com questes legais; Comportamento de risco: prostituio, exposio violncia

    urbana e ao trfico de drogas.

    4. Comorbidades clnicas

    Diversas so as complicaes clnico-somticas ligadas ao uso da substncia. Podem serinduzidas, perpetuadas ou facilitadas pelo uso da substncia. Avaliao clnica e laboratorial parte importante da propedutica. Alguns exames faro parte da abordagem inicial, contudo, oclnico dever nortear-se pelas queixas e achados do exame do usurio a fim de dirigir suaconduta. (Ateno aos critrios fornecidos no Protocolo de Acolhimento ao Usurio de lcool eDrogas).

    Ateno especial deve ser dirigida para o risco de doenas sexualmente transmissveis.

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    Aparelho Digestivo

    Qualquer via de administraoIsquemia mesentricalcera gastroduodenalInfarto mesentricoPneumoperitnioColite

    Via inalatriaEsofagite

    Olhos, Ouvidos, Nariz eGarganta

    Via intranasalQueimaduras de nariz, orofaringe, septo nasalNecrose de septo nasalRiniteSinusiteLaringite

    Via inalatriaLeses trmicas

    Doenas InfecciosasVia endovenosa e via inalatria(*)

    AIDSHepatite B e C

    Neurolgicas

    CefaliasDoenas cerebrovascularesCrises convulsivasTranstornos de movimento

    Renais Insuficincia renal aguda por rabdomilise

    Ginecolgicas Gravidez de alto risco (m formao, prematuridade, baixo peso,descolamento de placenta)Lactao (indicada suspenso da lactao)

    (*) Apesar do consumo de crack no apresentar risco de infeco para o usurio, este acaba exposto sDSTs/AIDS devido ao maior envolvimento com a troca de sexo para a obteno de crack.Fonte: Ellenhorn et al (1997) 16(C)

    6. Exames laboratoriais indicados para avaliao inicial do usurio de crack

    Hemograma e coagulograma;

    Enzimas hepticas; Amilase; Perfil lipdico; Glicemia; Funo renal; Eletrlitos; Protenas totais e frao; Sorologia: HIV, VDRL, Hepatites; HCG(se mulher em idade frtil); TBC; Radiografia de trax; Eletrocardiograma.

    Conforme Protocolo de Acolhimento ao

    Usurio de lcool e Drogas os quadros clnicosque demandem maiores cuidados devero serencaminhados aos Hospitais Clnicos.

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    7. Dosagem srica de drogas

    No uma rotina, entretanto, pode ser til para os casos de dvida diagnstica acompanhadosde psicopatologia indefinida. Funciona com screening toxicolgico. Pode fazer parte doacompanhamento do usurio durante o tratamento, monitorando a evoluo do mesmo.

    8. Comorbidades psiquitricas

    A presena de transtornos psiquitricos associado ao consumo de substncias de abuso umfenmeno bem documentado. A comorbidade muitas vezes subestimada e subdiagnosticada.Sintomas referentes a um transtorno mental muitas vezes so atribudos ao uso agudo ousndrome de abstinncia. O contrrio tambm se faz presente.

    A correta identificao da comorbidade psiquitrica necessria por funcionar como fatoragravante, indutor e perpetuador da condio de dependncia ou abuso, bem como interferir noprognstico e correta conduta teraputica. Entre os indivduos com transtornos mentais, cerca de

    um tero utilizam substncias psicoativas; entre os usurios na comunidade, cerca de um quintoapresentam transtornos mentais associados. O transtorno de personalidade a comorbidademais comum (50 a 90%) seguida pelos transtornos afetivos (depresso, transtorno bipolar edistimia - 20 a 60%) e pelos transtornos psicticos (esquizofrenia, transtornos delirantes eesquizofreniformes - 20%). Transtornos de ansiedade e do espectro do impulso como TDAHesto comumente associados.

    A comorbidade aumenta a gravidade dos sintomas e a refratariedade ao tratamento piorando oprognstico. Outro fator importante de ser avaliado por ser muito frequente o poliuso, ou seja,o uso de outras substncias de abuso associado ao crack como benzodiazepnicos, solventes,

    lcool, cocana, maconha, anfetaminas dentre outros.

    9. Intoxicao aguda e abuso: manejo clnico na urgncia

    Os efeitos agudos da intoxicao pela cocana/crack em geral so bem conhecidos. Estasintomatologia conseqncia dos efeitos psicoestimulantes com repercusses fisiolgicas, emespecial, pela ativao do sistema adrenrgico. Entre as respostas fisiolgicas esto o aumento dapresso arterial, da freqncia cardaca e respiratria, da temperatura corporal, dilatao pupilar,estado de hipervigilncia e aumento da atividade motora.

    A intoxicao geralmente autolimitada e demanda apenas monitorizao e atendimento deapoio. Em uma parcela dos casos complicaes clnicas e/ou psiquitricas podem estar presentes.

    Complicaes psiquitricas secundrias intoxicao aguda ou abuso so freqentes e ocorremem cerca de 40% dos casos.

    Quando o indivduo apresenta um transtorno mental associado (comrbido) ao uso desubstncias de abuso o quadro mais grave aumentando a chance de busca por tratamento. Apesquisa de comorbidades importante por alterar o tratamento e o prognstico.

    Quadros de agitao com alteraes da conduta so freqentes, possivelmente na maior parte

    quando associados psicopatologia coexistente. Alguns casos de extrema agitao psicomotora(delirium excitatrio) so descritos aps intoxicao por cocana. Nesta condio clnica faz-se

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    necessrio avaliar a necessidade de conteno fsica (Protocolo de Conteno Fsica-PC33) diantedo risco para si e para terceiros.

    Pacientes agitados podem ser tratados com benzodiazepnicos, antipsicticos ou associao deambas as medicaes conforme gravidade do quadro. O uso de medicao IM ou IV estindicado caso haja impossibilidade de administrao Via Oral.

    Sintomas psicticos (delrios paranides e alucinaes) geralmente ultrapassam o tempo de aoda substncia cocana. O Haloperidol 05mg pode ser utilizado nesta condio.

    Antipsicticos fenotiaznicos como clorpromazina e levomepromazina devem ser evitados porreduzir o limiar convulsivo.

    Estados paniformes induzidos ocorrem na forma de ansiedade paroxstica e os benzodiazepnicospodem ser administrados com preferncia os de curta durao como lorazepam 02mg.

    Os quadros maniformes podem ser abordados com medicao especfica.

    Complicaes clnicas devem ser pesquisadas mesmo quando os sintomas psiquitricossobressaem. Avaliar a existncia de quadros hipoglicmicos, distrbios metablicos e quadrosconfusionais desencadeados por trauma craniano ou quadros infecciosos.

    Fluxograma 1: Acolhimento do usurio de crack

    Intoxicao

    Avaliao Mdica

    Avaliao de Enfermagem Quadros hipoglicmicos Distrbios metablicos Quadros confusionais:

    Trauma e infecciosos

    Acolhimento

    Conteno Fsica

    Comorbidadespsiquitricas

    * Monitorizao* Apoio

    * Benzodiazepnicos* VO, IM ou IV* Associar antipsicticos* VO, IM ou IV

    Grave

    Estados

    de Pnico

    Leve

    * Ambiente tranquilo* Lorazepam 2mg

    Agitao Intensa(Delrium excitatorio)

    Encaminhar Psiquiatria

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    Quadro 2: Condutas na intoxicao por cocana

    Condutas nos quadros de intoxicao por cocana

    Leve GraveDelirium

    excitatrioObservao

    Quadros deagitao/

    alteraes deconduta

    - Asseguramento decuidados;

    - Monitorizao dosdados vitais;

    - Ambiente tranquiloe com poucos

    estmulos sensorais.

    - Benzodiazepnicos(Diazepam 5-10 mgVO,IV ou IM);

    - AntipsicticosHaloperidol 5 mg VO,

    IMou IV;- Ou Associao de

    ambos casonecessrio

    ContenoMedicamentosa

    e fsica podeser necessria

    Sintoma

    psicticos(paranide,iluses ou

    alucinaes)

    Asseguramento decuidados eambiente calmo

    Haloperidol 5m VO,IM ou IV

    Haloperidol5mg VO, IMou IV

    Evitarantipsicticos

    fenotiaznicos:Clorpromazinae levomepro-

    mazina

    Estados depnico

    Asseguramento decuidados e ambiente

    tranquiloLorazepam 2mg VO

    10-

    Overdose

    Dentre as complicaes clnicas agudas relacionadas ao consumo da cocana a overdose amais conhecida e considerada emergncia mdica. definida como a falncia de um ou maisrgos decorrente do estado de hiper estimulao central e simptica. So sinais clnicos deoverdose pela cocana:

    Midrase; Taquicardia; Hipertenso; Arritmia; Hipertermia; Angina no peito com ou sem infarto pode estar presente;

    Hemorragia intracraniana; Rabdomilise pode estar presente levando ao bito frequentemente por insuficinciacardiorrespiratria.

    A suspeita de overdose indica o encaminhado imediato para Unidades Clnicas; As complicaes cardiorrespiratrias decorrentes do uso da cocana so as mais

    freqentes entre as no psiquitricas, sendo a angina do peito a que apresenta a maiortaxa, cerca de 10% dos usurios. Em torno de um tero dos acidentes vasculares emjovens esto relacionados ao consumo de drogas;

    Quanto s complicaes pulmonares, os sintomas mais comuns so dor torcica,dispnia, tosse seca ou com eliminao carboncea e febre. Hemoptise est presente em

    6 a 26% dos casos. Derrame pleural tambm pode ocorrer. Agresso trmica,vasoconstrio e inalao de impurezas so fatores etiolgicos a ser pesquisados;

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    Complicaes neurolgicas freqentes so os episdios convulsivos, sintomasneurolgicos focais, cefalias, transtornos do movimento e alteraes da conscincia.

    Figura 1: Principais complicaes decorrentes da overdose de cocana

    Fonte:Projeto Diretrizes, volume 2, 2003

    11. Desintoxicao

    O termo desintoxicao muitas vezes deturpado em sua conceituao. Trata-se, a princpio, detratamento sintomtico de suporte para aqueles quadros de intoxicao aguda, assim, sendoapenas uma abordagem pontual e auto-limitada.O prolongamento da ateno clnica visa abordar os sintomas de fissura iminentes estendendo-sepelo perodo de duas a quatro semanas. Essa abordagem tem sido cada vez mais valorizadadentro do processo de tratamento dos usurios uma vez que parece aumentar a adeso aostratamentos subsequentes.

    12. Manejo clnico da sndrome de dependncia e abstinncia

    A dependncia para qualquer substncia de abuso, dentre elas tambm o crack, consideradacomo uma sndrome clnica (Sndrome de Dependncia), que contm critrios clnicos

    definidores, como consta no CID10.

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    Entre os sintomas clnicos definidores destacam-se o padro de uso compulsivo tipo binge(consumo episdico de doses excessivas, muitas vezes levando intoxicao) associado asintomas de tolerncia e abstinncia.Dentre os sintomas de abstinncia, diferente da sndrome de abstinncia alcolica, questiona-sese a dimenso somtica est presente. Os sintomas da abstinncia cocana soeminentemente psquicos, segundo alguns autores, sendo os depressivos e ansiosos os mais

    comumente encontrados. Sintomatologia prevalente se faz na forma de fissura. Segundo oUnited Nations Office on Drugs and Crime (UNODOC) e a Organizao Mundial de Sade, afissura refere-se a um desejo intenso de consumir uma substncia psicoativa a fim de repetir aexperincias dos seus efeitos prazerosos.Outro conceito defende que a fissura engloba no somente o desejo, mas a inteno deconsumir uma substncia psicoativa, alvio dos afetos negativos, dos sintomas abstinncias e abusca de um efeito positivo.

    A avaliao da fissura apresenta dificuldades decorrentes da prpria falta de consenso cientficoa cerca de sua definio. Outra dificuldade o fator da percepo da fissura por cada usurio

    ser muito varivel. Em algumas situaes aspectos psicofisiolgicos so enfatizados, comotaquicardia. Em uma grande maioria dos casos aspectos subjetivos esto em pauta. A presenade fissura relatada aps o consumo imediato, na abstinncia e no desuso prolongado. Pareceser mais intensa na vigncia do uso e apresenta trs fases:

    Quadro 3: Fases da Evoluo da Fissura

    Fases da Evoluo da Fissura

    Crash

    caracterizada por sintomas comoansiedade, depresso, parania eintenso desejo em retomar o uso

    (craving ou fissura).

    Incio: 15a 30 apsltima dose

    Durao: 8 horas a 4 dias

    Sndrome disfrica tardia

    H presena de sonolncia,irritabilidade, anedonia, desejo pelo

    consumo, bem como ideaosuicida.

    Incio: 12 a 96 horasDurao: 2 a 4 semanas

    Fase de extinoSintomas disfricos diminuem ou

    cessam e a fissura torna-seintermitente.

    Durao de meses

    Consideraes gerais sobre o plano de tratamento

    Tratamento interdisciplinarA multifatoriedade desta condio clnica demanda uma abordagem interdisciplinar,possibilitando ao conjunta numa lgica biopsicossocial. Um bom plano teraputico contacom o suporte mdico, psicolgico, social, terapia ocupacional, dentre outros profissionais.

    Referncia tcnicaO profissional de referncia aquele que, no plano de tratamento, tem competncia chave

    e o maior contato com o paciente. Tem como funo gerenciar o tratamento do usurio eapresentar-se como referncia diante de suas necessidades. So atribuies da referncia

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    tcnica: reviso e atualizao do plano teraputico, integrao das atividades desenvolvidascom os demais profissionais, facilitar a insero social, identificar carncias, mapear a redesocial e proporcionar o acolhimento familiar.

    Projeto teraputicoO projeto Teraputico consiste no plano de tratamento desenvolvido pela equipe sob

    coordenao do Tcnico de Referncia adaptado s necessidades individuais e atuais dousurio. Corresponde a um conjunto de metas e intervenes planejadas objetivandomelhorar o funcionamento psicossocial e reabilitao do usurio.

    Manejo psicoterpico e farmacolgico utilizado para a abordagem da sndrome deabstinncia

    O dissulfiram, ainda em estudo tem sido utilizado para aliviar o desejo e a urgncia pela

    droga. Utilizado na dose de 250 a 500 mg/dia apresenta benefcio no tratamento dodependente de cocana, aumentando a possibilidade de manuteno em abstinncia.

    muito til quando a dependncia tambm de lcool;

    O modafinil na dose de 200 a 400 mg no apresenta benefcio estatisticamente significante,apesar da tendncia de manuteno e, abstinncia;

    O topiramato na dose de 200 a 400 mg utilizado para reduzir o comportamento de busca,contudo, sem bases cientficas consolidadas. Demais modalidades farmacolgicas soisentas de comprovao cientifica;

    Naltrexona quando coexiste a dependncia por etlicos; Bupropiona quando desejado cessar o tabagismo; cido Valprico quando identificado subgrupo de usurios com marcante agressividade e

    transtorno do impulso; Antipsicticos potentes, ainda sem comprovao cientfica, alguns autores no

    recomendam o seu uso de na vigncia de fissura.

    13- Critrios para internao

    A hospitalizao clnica est indicada nas seguintes situaes:

    Overdose que suscita medidas de suporte; Alteraes persistentes do estado mental, hipertermia significativa ou rabdomilise,

    coagulopatias, acidose metablica, hipertenso severa, dor torcica sugestiva de isquemia

    de miocrdio, falncia renal , respiratria ou heptica; Risco de quadro grave de abstinncia ou portadores de quadros clnicos concomitantes

    bem documentados ou histria de passado de uso pesado de lcool que pode agravar aevoluo clnica.

    Indicao de tratamento em Unidades psiquitricas:

    Histria bem documentada de no adeso ou de no se beneficiarem de tratamento em

    regime extra-hospitalar;

    Comorbidade psiquitrica importante que por si s exigiria atendimento hospitalar ou cujos

    transtornos impossibilitem adeso a tratamento extra-hospitalar;

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    Casos em que o uso das substncias ou comportamentos constituem perigo iminente parasi ou para terceiros;

    Usurios com fissura vividas com angstia/ansiedade, pouco empenhados em abster-se douso da substncia ilcita associado a vulnerabilidade social e fcil acesso ao uso da droga.A internao pode ser indicada como medida prvia para a insero em tratamento dadependncia.

    Fatores que influenciam a escolha do local de tratamento: Capacidade e disposio do usurio em cooperar com o tratamento; Capacidade de autocuidado; Ambiente social/familiar favorvel ou de alto risco; Necessidade do usurio da estrutura, do apoio e do acompanhamento para manter-se

    seguro e abstinente; Preferncia do usurio por um determinado tratamento desde que adequado ao padro de

    consumo da droga, riscos mdicos associados, acessibilidade e nvel de atendimentonecessrio e metas do plano;

    Complexidade do caso exige servio bem aparelhado para atendimento adequado.

    A internao muitas vezes deve ser imediata a fim de garantir a segurana do paciente eestabilizao do quadro clnico. Aps a estabilizao o usurio deve ser encaminhado para oingresso em tratamento de longa durao (CAPSad ou Comunidade Teraputicas) aonde de fatose dar o tratamento da dependncia/abuso da substncia.

    Os hospitais psiquitricos devem ser reservados para os casos de duplos diagnsticos, e devemoferecer servios especializados no tratamento da dependncia de substncias psicoativas emassociao com quadros psiquitricos gravese de difcil manejo em ambiente extra-hospitalar.

    O tratamento em regime de CAPS-ad deve ser considerado para os pacientes egressos dasinternaes psiquitricas que apresentam risco de lapsos e recadas ou que no tiverem obtidoresultados satisfatrio com abordagem ambulatorial.

    Devero ser encaminhados para tratamento nos CAPS-ad e CMT usurios que requerematendimento intensivo/semi-intensivo com razovel possibilidade de abster-se do uso dasubstncia ilcita fora de um ambiente restrito.

    14- Encaminhamento e articulao com a rede

    Rede integrada de ateno psicossocial

    O sistema de ateno ao usurio formado por uma rede integrada composta por diversosdispositivos. Compe esta rede leitos em hospital geral e psiquitrico, hospitalizao diurna emCAPS ad, Consultrios de Rua, tratamento ambulatorial, ESF e NASF, albergamento scio-teraputico e moradia assistida.

    Diversos, porm ainda insuficientes, so os dispositivos disponibilizados ao tratamento do usuriode crack. Entendendo o tratamento numa lgica integral e multidisciplinar, importante a

    articulao com a rede de apoio ao usurio. As Intervenes nas urgncias apesar de representarum atendimento de cunho sintomtico e pontual devem se pautar pelos princpios aqui

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    apresentados atentando que este pode ser o melhor e talvez nico momento para sensibilizaoe encaminhamento do tratamento.

    Dada a complexidade do tratamento desta questo, os dispositivos de atendimento devem estararticulados com a rede de apoio ao usurio com a finalidade de construir um horizonte para a suainsero no tratamento.

    ITENS DE CONTROLE

    1. Nmero absoluto de pacientes usurios de crack atendidos no acolhimento / Nmero

    absoluto de pacientes atendidos no trimestre.2.

    Nmero absoluto de exames de HIV, Hepatite B e C solicitados.

    REFERNCIAS

    1. Alessandra Diel, Daniel Cruz Cordeiro, Ronaldo laranjeira. Tratamento farmacolgico paradependncia qumica: da evidncia cientfica prtica clnica. Art med, Porto Alegre. 2010.

    2. AR Lingford-Hughes, S Wech, L Peters and DJ Nutt. BAP updated guidelines: evidence-based guidelines for the pharmacological management of substance abuse, harmful use,addiction and comorbidity: recommendations from BAP. Journal of Psychopharmacology0(0) 1-5. 2012.

    3. Associao Brasileira de Psiquiatria. Projeto diretrizes/ Associao MdicaBrasileira/Conselho Federal de Medicina: Abuso e dependncia de crack. AMB/CFM. 2011.

    4. Conselho Federal de Medicina. Diretrizes gerais mdicas para assistncia integral ao crack

    2011.5. Dependncia Quimica, autores:Alessandra Diehl, Daniel Cruz Cordeiro, Ronaldo Laranjeiras

    e colaboradores, editora Artmed, 2011, Porto alegre.6. Diretrizes para o tratamento de transtornos psiquiatricos, da American Psychiatric

    Association, compendio 2006, editora Artmed, 2008.7. Marcelo Ribeiro, Ronaldo laranjeiras. O tratamento do usurio de crack. 2 ed. Artmed,

    Porto Alegre. 2012.8. O tratamento do usurio de crack. Organizadores: Marcelo Ribeiro e Ronaldo Laranjeiras.

    Editora Artmed, 2012. Porto alegre.

    Bibliografia suplementar

    1. J Bras Pneumol. 2008 ;34(5):323-3272. National Institute for Health and Clinical Excellence :Psychosis with coexisting substance

    misuse Assessment and management in adults and young people. 2011

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    O risco de infarto agudo do miocrdio aumenta 24 vezes, 60 min. aps o uso da cocanaem pessoas que so consideradas de baixo risco e parece que a ocorrncia do IAM no

    est relacionada com a quantidade usada, a via de administrao ou a frequncia do uso.

    ANEXOI

    Pulmo de Crack

    Uma vez que o pulmo o principal rgo exposto, complicaes pulmonares sofreqentemente observadas como conseqncia do ato de fumar o crack. Embora de 25 a 60%dos usurios de crack apresentem sintomas respiratrios aps fumar a droga, poucos procuramassistncia mdica por isso.

    A inalao de crack pode induzir uma variedade de alteraes pulmonares agudas, incluindoedema pulmonar, hemorragia alveolar difusa, exacerbaes agudas graves de asma, barotrauma,infiltraes pulmonares com eosinofilia, pneumonia intersticial no especfica e bronquioliteobliterante com pneumonia em organizao, bem como infiltraes pulmonares agudasassociadas a um espectro de achados clnicos e patolgicos, referida como pulmo de crack.Uma vez que a hemorragia pulmonar e leso pulmonar aguda de outras naturezas so

    radiologicamente indistinguveis, o desenvolvimento de falncia respiratria com opacidadesbilaterais que aparecem logo aps o uso do crack e clareiam rapidamente aps a interrupo douso tambm tem sido denominado pulmo de crack.

    Os sintomas mais comumente observados so dor torcica, dispnia, tosse produtiva, febre ehemoptise. Podem ser observadas queimaduras nas pontas dos dedos ou escarros de cor negra,ou carbnicos.

    Os pacientes usurios de crack e com sintomas pulmonares descritos acima devem ter avaliaopulmonar com radiografia de trax, hemograma, gasometria arterial, PCR, e se necessrio outros

    exames (tomografia computadorizada de trax) para diagnstico diferencial entre o pulmo decrack e outras patologias pulmonares (pneumonia, asma, embolia pulmonar, tuberculose, edemacardiognico), e devem ser encaminhados para internao clnica quando necessrio.

    O uso de curtos perodos de corticide controverso, podendo haver recuperao da lesopulmonar com a interrupo da droga. (J Bras Pneumol. 2008; 34(5):323-327)

    Complicaes cardiovasculares do crack

    A dor torcica a principal queixa dos usurios de cocana quando procuram o servio de

    emergncia e, por isso, pacientes com dor torcica no traumtica devem ser questionados arespeito do uso da droga.

    Aproximadamente metade dos pacientes com infarto agudo do miocrdio (IAM) relacionado aouso da cocana no tem nenhuma evidncia de doena coronariana aterosclertica naangiografia.

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