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1 Nilda Ensinaraprender versao final 3.doc

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Ensinaraprender/aprenderensinar: o lugar da teoria e da prtica em didtica e em currculo

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ENSINAR E APRENDER/APRENDER E ENSINAR: O LUGAR DA TEORIA E DA PRTICA EM DIDTICA

Jos Carlos Libneo

1. Didtica, campo de investigao e de exerccio profissional

A identificao da didtica como campo investigativo e rea profissional pode comear com uma boa pergunta: quais so as relaes entre pedagogia e didtica? As respostas remetem a diferentes entendimentos. Na tradio dos estudos em didtica, fundada em boa parte em pedagogos alemes como Herbart, Dilthey e em tericos russos, a didtica um ramo da pedagogia, esta compreendida como cincia da formao humana, compreendendo o fenmeno educativo em sua globalidade. Na dcada de 1960, primeiro na Frana e depois em outros pases europeus, foi introduzida a denominao cincias da educao, colocando a educao como objeto de estudo de um conjunto de cincias humanas e sociais, de alguma forma recusando cientificidade e legitimidade epistemolgica pedagogia, provocando a disperso no estudo da problemtica educativa. Numa outra direo, tambm na Frana, estudiosos e investigadores da didtica e das didticas especficas iniciaram por volta dos anos .... um movimento de valorizao da didtica, e especialmente das didticas especficas, situando didtica e pedagogia como duas dimenses da docncia, sem nenhuma relao hierrquica entre elas. didtica caberia o estudo dos processos de ensino e aprendizagem em sua relao imediata com os contedos dos saberes a ensinar, a organizao das situaes didticas e a escolha dos meios de ensino, enquanto pedagogia caberiam as questes gesto da classe em seus aspectos relacionais e na organizao de situaes pedaggicas (Altet, 1997, p.11). Ou seja, para esse grupo de autores, na didtica, a aprendizagem pensada com a lgica dos saberes, na pedagogia com a lgica da sala de aula, ou seja, a dinmica das relaes entre alunos. Esse movimento continua sendo bastante representativo na Frana, com repercusso em vrios pases.

Em paralelo a esse movimento, surgiu outro grupo de investigadores denominado de novos pedagogos. Entre esses, Houssaye define a pedagogia como uma reflexo sobre a prtica educativa, articulando na ao pedaggica a teoria e a prtica: o que deve haver em pedagogia certamente uma proposta prtica, mas ao mesmo tempo uma teoria da situao educativa referida a essa prtica, ou seja, uma teoria da situao pedaggica (2004, p.12). Para esse autor, a pedagogia e a didtica, mais do que campos complementares, so uma e mesma coisa.

Desde os anos 1980 desenvolveram-se no mbito anglo-americano, com difuso no Brasil, estudos sobre currculo numa perspectiva sociocrtica com forte peso em temas sociolgicos e culturais, formando o campo da chamada teoria curricular crtica, em que os temas da didtica so subsumidos no campo do currculo. A autonomizao desse campo investigativo, antes vinculado didtica, acabou levando formao de dois campos cientficos paralelos, com objetos de investigao coincidentes, mas que atualmente buscam espaos de convergncias.

No Brasil, onde vigora uma notria dependncia do pensamento estrangeiro em educao herdado de vrias culturas e de vrias tradies epistemolgicas, europias ou norte-americanas, certamente se fazem presentes todos esses significados de didtica. assim que em nossas instituies de formao de educadores incidem posies, em meio a conhecidas divergncias, que identificam os estudos sobre o fenmeno educativo ora como pedagogia (cincia pedaggica), cincia da educao, cincias da educao, ora como docncia, neste caso, identificando pedagogia e ensino.

Uma breve incurso na histria da educao brasileira mostraria que at o incio dos anos 1980, vigoravam principalmente dois entendimentos, o da pedagogia como cincia da educao, na viso catlica e herbartiana, e o da cincia da educao na viso escolanovista normeamericana. A movimentao poltica iniciada no Brasil nessa mesma dcada provocou o questionamento do formato curricular dos cursos de formao de professores, provocado em boa medida pela introduo do pensamento marxista na educao associada incorporao da teoria da reproduo de Bourdieu e Passeron e da teoria dos aparelhos simblicos de Estado de Althusser (Cf. SAVIANI, 1983). Nesse momento a Pedagogia criticada pelo seu lado reprodutor, conservador, razo que levou algumas instituies formadoras a assumir a formulao francesa de cincias da educao. Esse posicionamento, no entanto, logo cedeu espao a movimentos propositores de reformas no sistema de formao de professor, nos quais os estudos pedaggicos sistematizados foram substitudos por um curso de formao de professores, conforme o mote de que a base da formao de todo educador a docncia. Essa concepo de pedagogia, praticamente identificada com a docncia, colocando no mesmo plano a pedagogia e didtica, acabou prevalecendo nos currculos de formao profissional e na prpria legislao educacional em vigor desde 2006. Adversrios dessa posio criticaram nas propostas da Associao Nacional pela Formao de Profissionais da Educao (ANFOPE) o enfraquecimento dos estudos pedaggicos, uma vez que os cursos de Pedagogia deixaram de formar o pedagogo em sentido estrito e passaram a formar exclusivamente o professor, ainda que em cursos denominados de pedagogia (Cf. LIBNEO, 2009; LIBNEO, 2006; LIBNEO E PIMENTA, 1999)Uma viso ampliada de pedagogia

Neste texto, a pedagogia assumida como um campo de estudos sobre o fenmeno educativo, portadora de especificidade epistemolgica que, ao possibilitar o estudo do fenmeno educativo, busca a contribuio de outras cincias que tem a educao como um de seus temas. A pedagogia vista como rea de conhecimento que tem por objeto as prticas educativas em suas vrias modalidades incidentes na prtica social, investigando a natureza do fenmeno educativo, os contedos e os mtodos da educao, os procedimentos investigativos. Entendemos que a educao se caracteriza como processo de formao das qualidades humanas, enquanto que o ensino o processo de organizao e viabilizao da atividade de aprendizagem em contextos especficos para esse fim. Para alm do dilema posto entre o pedagogo que faz escola e o pedagogo que pensa a educao, avanamos para um entendimento mais interativo dessas posies, aproximando-nos, ainda que parcialmente, da posio de Houssaye sobre o trabalho de pedagogo, em que a pedagogia por um lado cincia, mas, por outro, arte e tambm uma orientao para a ao educativa (Houssaye, 2004). Em sntese, a Pedagogia a teoria e a prtica da educao, e a didtica, o campo da pedagogia que trata das relaes entre ensino e aprendizagem, em contextos especficos.

Mencionamos que o objeto de estudo da pedagogia so as prticas educativas, responsveis pela atuao sobre a formao e o desenvolvimento do ser humano, em condies materiais e sociais concretas. Por isso, as investigaes tericas e empricas da sociologia, da psicologia, da antropologia, da economia, da histria da educao, ou da cultura, das polticas sociais, da gesto do sistema de ensino e das escolas, da didtica, etc., devem ocorrer em funo das aes e processos formativos propiciadas pelas vrias modalidades de educao. Em outro texto proponho uma definio de educao em relao aos processos formativos do ser humano:

A educao uma prtica social, materializada numa atuao efetiva na formao e desenvolvimento de seres humanos, em condies socioculturais e institucionais concretas, implicando prticas e procedimentos peculiares, visando mudanas qualitativas na aprendizagem escolar e na personalidade dos alunos (LIBNEO, 2008).

intrnseco s prticas educativas seu carter de mediao mediante cultural o qual favorece o desenvolvimento dos indivduos na dinmica sociocultural de seu grupo, sendo que o contedo dessa mediao so os saberes e modos de ao, isto , a cultura que vai se convertendo em patrimnio do ser humano. A pedagogia refere-se teoria e prtica desses processos. Ela no restringe sua reflexo a prticas escolares, mas a estende a um imenso conjunto de outras prticas educativas existentes na sociedade sob variadas modalidades: na famlia, no trabalho, na rua, na fbrica, nos meios de comunicao, na poltica e, tambm, na escola. Ao mesmo tempo, a pedagogia tem um carter social e poltico. A educao uma prtica social que busca realizar nos sujeitos humanos as caractersticas de humanizao plena, mas ela ocorre em meio a relaes sociais, ou seja, a pedagogia lida com o fenmeno educativo enquanto expresso de interesses sociais em conflito na sociedade. por isso que a pedagogia expressa finalidades scio-politicas, ou seja, uma direo explcita da ao educativa relacionada com um projeto de gesto social e poltica da sociedade. A pedagogia, portanto, uma reflexo sobre a atividade educativa, uma orientao para a prtica educativa, uma direo de sentido das prticas de formao humana a partir de objetivos e valores necessrios humanizao das pessoas numa sociedade concreta. Ela se refere no apenas ao como se faz, mas, principalmente, ao por que se faz, de modo a orientar o trabalho educativo para as finalidades sociais e polticas almejadas pelo grupo de educadores.

Nesse modo de compreender a pedagogia est inserida a didtica, que o modo de ser da pedagogia em situaes especficas de ensino e aprendizagem. Pedagogia e didtica formam uma unidade, se correspondem, mas no so idnticas, pois, se fato que todo trabalho didtico trabalho pedaggico, nem todo trabalho pedaggico trabalho didtico. A didtica tem como objeto de estudo o processo de ensino-aprendizagem em sua globalidade, isto , suas finalidades sociais e pedaggicas, os princpios, as condies e meios da direo e organizao do ensino e da aprendizagem, pelos quais se assegura a mediao docente de objetivos, contedos, mtodos, formas de gesto do ensino, visando a apropriao consciente pelos alunos de contedos, mtodos de pensamento e modos de agir.

2. A natureza do didtico: Aprender e ensinar/ensinar e aprender

Na tradio da investigao pedaggica, a didtica tem sido vista como um conhecimento relacionado a processos de ensino e aprendizagem que ocorrem em ambientes organizados de relao e comunicao intencional, visando a formao intelectual e moral dos alunos. Autores pertencentes tradio da teoria histrico-cultural mostram a mediao didtica como sendo a forma de ativao do processo de aprendizagem. L. Klingberg escreveu que o carter cientfico do ensino dado pela conduo do processo de ensino com base no conhecimento das leis que governam o processo de conhecimento. Segundo ele:

O processo docente do conhecimento - embora somente em alguns casos se descubra o novo de forma objetiva um insubstituvel campo de exerccio para o desenvolvimento das foras cognoscitivas dos alunos, para sua curiosidade, sua alegria pela investigao e as descobertas, sua capacidade de poder perguntar, de ver problemas e chegar metodicamente sua soluo (1972, p. 47).

O didata russo, M. A. Danlov tambm antecipava um entendimento do trabalho de professor como mediao entre os aspectos externos e os aspectos internos da educao e do ensino, visando a consecuo da aprendizagem dos alunos. Ele escreveu:A didtica estuda o processo de ensino, em cujo desenvolvimento tem lugar a assimilao dos conhecimentos sistematizados, o domnio dos procedimentos para aplicar estes conhecimentos na prtica, e o desenvolvimento das foras cognoscitivas dos educandos. Seu objeto de investigao o processo de ensino em seu conjunto e sua tarefa bsica a revelao das regularidades gerais deste processo que tm carter objetivo, colocando em primeiro plano as condies em que se manifesta (p.34).

Na mesma direo segue Lompscher (1999), para quem a organizao didtica visa a promover a atividade de aprendizagem dos alunos: A organizao didtica dos processos de aprendizagem (...) deve ser orientada em direo atividade dos alunos. Desse modo, a efetividade do ensino se revela ao assegurar as condies e os modos de viabilizar o processo de conhecimento pelo aluno, ou seja, a aprendizagem.

Numa perspectiva socioconstrutivista, Yves Lenoir reconhece, na relao educativa escolar, a existncia de dois processos de mediao: aquele que liga o sujeito aprendiz ao objeto de conhecimento (relao S O), chamado de mediao cognitiva, e aquele que liga o formador professor a esta relao S O, chamado de mediao didtica (cf. LENOIR, 1996, p.29). Presume-se a um professor que assegura os modos e condies da relao do aluno com o conhecimento.

Destaca-se nessas definies um entendimento explcito do ensino como atividade de mediao para promover o encontro formativo - afetivo, cognitivo, tico, esttico - entre o aluno e o objeto de conhecimento, ou seja, a confrontao ativa do aluno com a matria, destacando-se o papel das condies concretas para a realizao dessa atividade. Em 1990 eu escrevia no livro Didtica:Definindo-se como mediao escolar dos objetivos e contedos do ensino, a didtica investiga as condies e formas que vigoram no ensino e, ao mesmo tempo, os fatores reais (sociais, polticos, culturais, psicossociais) condicionantes das relaes entre docncia e aprendizagem. (...) O processo didtico de transmisso/assimilao de conhecimentos, habilidades e valores tem como culminncia o desenvolvimento das capacidades cognoscitivas dos alunos, de modo que assimilem ativa e independentemente os conhecimentos sistematizados (LIBNEO, 1990).

A caracterizao da didtica como mediao do processo de ensino-aprendizagem no abandona a clssica metfora do tringulo didtico, mas a amplia, j que a relao de mediao faz explicitar o papel do professor na orientao da atividade de aprendizagem do aluno, considerados o contexto e as condies do ensino e da aprendizagem. Com isso, a relao dinmica entre trs elementos constitutivos do ato didtico o professor, o aluno, a matria formam as categorias da didtica: Para que ensinar? O que ensinar? Quem ensina? Para quem se ensina? Como se ensina? Sob que condies se ensina e se aprende? (LIBNEO, 1994). Tais categorias formam, por sua vez, o contedo da didtica.

O para qu ensinar pe o problema dos objetivos da educao geral: o que se espera da escola e do ensino em relao formao humana, consideradas as demandas e exigncias da sociedade, da localidade, do desenvolvimento cientfico e tecnolgico, das exigncias pela qualidade de vida? Que objetivos definir numa sociedade marcada por desigualdades sociais, econmicas, culturais, em que os grupos sociais dominantes exercem influncia determinante sobre objetivos e contedos da educao escolar? O para qu ensinar consiste, assim, numa questo crucial, que antecede tudo o mais.

O que ensinar remete seleo e organizao dos contedos, decorrentes de exigncias sociais, culturais, polticas, ticas, ao essa intimamente ligada aos objetivos,os quais expressam a dimenso de intencionalidade da ao docente, ou seja, as intenes sociais e polticas do ensino. A seleo dos contedos implica, ao menos, os conceitos bsicos das matrias e respectivos mtodos de investigao, a adequao s idades e ao nvel de desenvolvimento mental dos alunos, aos processos internos de interiorizao, aos processos comunicativos na sala de aula, aos significados sociais dos conhecimentos.

Quem ensina remete aos agentes educativos, presentes na famlia, no trabalho, nas mdias. Na escola, o professor pe-se como mediador entre o aluno e os objetos de estudo, enquanto os alunos estabelecem com o conhecimento uma relao de estudo. Quem ensina supe, pois, quem aprende, incluindo a as caractersticas individuais e socioculturais dos alunos implicadas no desenvolvimento e aprendizagem. A par disso, professores e alunos esto implicados numa relao social que se materializa na sala de aula mas, tambm, na dinmica das relaes internas que ocorre na escola em suas prticas organizativas e institucionais, o que remete ao como ensinar e aos contextos e condies em que se realiza o ensino.

O como ensinar corresponde aos mtodos, procedimentos e formas de organizao do ensino, em estreita relao com objetivos e contedos, estando presentes, tambm, no processo de constituio dos objetos de conhecimentos.

As condies das aes didticas dizem respeito, no geral, ao contexto social, cultural, organizacional, coletivo em que se situam as situaes pedaggico-didticas concretas em que se realiza o processo de ensino-aprendizagem. Mais especificamente, referem-se, por um lado, s polticas educacionais e diretrizes normativas para o ensino; s prticas socioculturais, familiares, locais; por outro lado, ao funcionamento da escola como as prticas de organizao e gesto, o espao fsico, o clima organizacional, os meios e recursos didticos, o currculo, os tempos e espaos; s condies pessoais e profissionais dos professores; s caractersticas individuais e socioculturais dos alunos, s disposies internas para estudo e acompanhamento das atividades didticas, necessidades sociais e aprendizagem; ao relacionamento entre professor e alunos, alunos e colegas.

Verifica-se que, a partir dos elementos constitutivos do ato didtico, h uma intensa articulao com outros campos cientficos tais como a teoria do conhecimento, a psicologia da aprendizagem e do desenvolvimento, a sociologia, a teoria do currculo, a pesquisa cultural, etc., visando compreenso do fenmeno ensino. Desse modo, a didtica se assume como disciplina de integrao, articulando numa teoria geral de ensino as vrias cincias da educao e compondo-se com as metodologias especficas das disciplinas curriculares. Ou seja, combina-se o que geral, elementar, bsico, para o ensino de todas as matrias com o que especfico das distintas metodologias, em estreito vnculo com a teoria do conhecimento, a psicologia aplicada ao ensino e a sociologia das situaes escolares e dos contextos socioculturais.

O processo ensino-aprendizagem na teoria histrico-cultural

A teoria histrico-cultural proposta por Vygotsky e seguidores compatvel com as noes de mediao didtica, mediao cognitiva e prticas sociais. Para esses autores, a aprendizagem humana se caracteriza como mudanas qualitativas na relao entre a pessoa e o mundo, pela mediao de instrumentos ou ferramentas culturais envolvendo a interao entre pessoas, culminando com a internalizao de significados sociais, especialmente saberes cientficos, procedimentais e valorativos. Em sntese, o desenvolvimento das funes mentais superiores supe a internalizao de ferramentas culturais/formas culturais de comportamento/signos, j desenvolvidas na sociedade por meio da linguagem. Para Vygotsky, todas as funes mentais superiores so relaes sociais internalizadas, ou seja, o desenvolvimento das capacidades mentais engendrado no processo de apropriao e reconstruo da cultura.

Na educao escolar, o papel do ensino , precisamente, promover o desenvolvimento mental por meio da aprendizagem, convertendo a aprendizagem em desenvolvimento. Tem-se, assim, a subordinao da mediao didtica mediao cognitiva, a servio da qual est o processo de aprendizagem e ensino, num contexto espacio-temporal determinado. Sendo assim, a didtica (e as didticas especficas) consiste na sistematizao de conhecimentos e prticas referentes aos fundamentos, condies e modos de realizao do ensino e da aprendizagem dos contedos, habilidades, valores, visando o desenvolvimento das capacidades mentais e a formao da personalidade dos alunos.

Nesta definio aparecem importantes noes conexas teoria histrico-cultural. Se o aspecto definidor da didtica a mediao da mediao cognitiva, ou seja, mediao das relaes do aluno com os objetos de conhecimento, ento, o conceito de referncia da didtica a mediao das relaes entre ensino e aprendizagem voltadas para o desenvolvimento humano. O trabalho dos professores consiste em ajudar o aluno, por meio dos contedos, a adquirir capacidades para novas operaes mentais ou modificar as existentes, com o que se operam mudanas qualitativas em sua personalidade. H, aqui, uma relao imediata da didtica com os contedos dos saberes a ensinar, a ativao das capacidades intelectuais dos alunos e a organizao das situaes didticas com os meios adequados.

Desde Vygotsky e seguidores, formou-se o entendimento de que o ensino para o desenvolvimento constitui-se num principio humanstico, sendo a base do direito de todas as crianas e jovens instruo, ou seja, educao geral bsica. A muitas pessoas causa estranheza o uso da palavra instruo no vocabulrio da teoria histrico-cultural, associando-a idia de adestramento, transmisso de conhecimento. No entanto, a recorrncia ao seu sentido na lngua russa possibilita resolver mal-entendidos. Prestes (2010) traz um amplo esclarecimento sobre a palavra do russo obutchenie, largamente utilizada em textos de tericos da teoria histrico-cultural e traduzida por instruo, ensino e, na maior parte das vezes, por aprendizagem. Em verdade, a palavra refere-se ao processo simultneo de instruo, estudo, aprendizagem, ou seja, o processo ensino-aprendizagem implicado na instruo. Prestes esclarece que essa palavra, traduzida por aprendizagem, estaria indicando um processo psicolgico prprio do sujeito (como corre em boa parte das teorias da aprendizagem), descartando ou secundarizando a transmisso intencional de conhecimento (ou seja, o ensinar por meio da atuao de uma outra pessoa no processo de aprendizagem). Escreve Prestes:Para Vigotski, a atividade obutchenie pode ser definida como uma atividade autnoma da criana que orientada por adultos ou colegas e pressupe, portanto, a participao ativa da criana no sentido de apropriao dos produtos da cultura e da experincia humana. Isso o mais importante. Poder-se-ia argumentar que a expresso ensino-aprendizagem seria a mais adequada para a traduo da palavra obutchnie. Todavia, em russo, essa palavra implica uma unidade desses processos e a mera juno por hfen de duas palavras no transmite a ideia que Vigotski atribui a ela: uma atividade autnoma da criana que orientada por algum que tem a intencionalidade de faz-lo. Ou seja, obutchenie implica a atividade da criana, a orientao da pessoa e a inteno dessa pessoa. (...) Por tudo isso, a palavra que, a nosso ver, mais se aproxima do termo obutchenie de Vigotski instruo (PRESTES, 2010, P. 188)

Estamos, pois, preparados agora para entender o ensinaraprender e o aprenderensinar, na perspectiva histrico-cultural. Vygotsky escreveu que somente boa aquela instruo (ensino) que vai adiante do desenvolvimento, ao despertar e provocar toda uma srie de funes que se encontram em estado de maturao na zona de desenvolvimento prximo (VYGOTSKY, 2007, p. 360), guiando o processo de desenvolvimento, envolvendo a atuao colaborativa de outras pessoas. Ou seja, a zona de desenvolvimento prximo (ou iminente, como prefere Prestes) define a condio da criana em relao a funes mentais ainda em maturao (funes que no concluram o seu desenvolvimento), e que podem ser desenvolvidas com a ajuda do adulto. Escreve Vigotsky:

Vygotsky esclarece a noo de zona de desenvolvimento prximo na qual ocorre a compreenso consciente e o uso voluntrio dos conceitos, em colaborao com o pensamento do adulto. Ele escreve:

A fora dos conceitos cientficos se manifesta em uma esfera integralmente determinada pelas propriedades superiores dos conceitos: a compreenso consciente e a voluntariedade. Justamente nesta esfera os conceitos cotidianos mostram sua debilidade, fortes na esfera da utilizao espontnea, situacional e concreta, na esfera da experincia e do empirismo. O desenvolvimento dos conceitos cientficos comea na esfera da compreenso consciente e da voluntariedade e continua mais alm, crescendo para abaixo, at esfera da experincia pessoal e do concreto. O desenvolvimento dos conceitos espontneos comea na esfera do concreto e emprico e se move em direo s propriedades superiores dos conceitos: a compreenso consciente e a voluntariedade. A relao entre o desenvolvimento destas duas linhas opostas revela, indubitavelmente, sua verdadeira natureza: trata-se da relao entre a zona de desenvolvimento prximo e o nvel atual do desenvolvimento (Ib., p. 377).

Est claro, nessa citao, o papel da escola na formao dos conceitos cientficos a partir dos conceitos espontneos, em que o aluno pode ultrapassar o nvel de conhecimento que j possui para ascender aos conhecimentos cientficos com a colaborao do adulto. Ao mesmo tempo, a aprendizagem uma atividade do aluno, mas necessita de uma interveno do outro, por meio da mediao, da a idia de instruo, no entendimento de Prestes, como uma atividade autnoma da criana que orientada por algum que tem a intencionalidade de faz-lo. Remetemo-nos, pois, ao entendimento de que o ensino e a aprendizagem formam uma unidade dentro de um mesmo processo, ainda que cada termo guarde sua especificidade, no podendo ser subsumido um no outro. A didtica investiga esse processo no seu conjunto, buscando articular a interao entre o ensino e o estudo, entre o ensino e o desenvolvimento das capacidades intelectuais..

assim que escola e ensino, pela mediao do professor, existem para promover e ampliar o desenvolvimento das capacidades cognitivas e a formao da personalidade. Por isso, o problema pedaggico-didtico diz respeito s formas pelas quais prticas sociais formam o desenvolvimento cognitivo, afetivo e moral dos indivduos sendo que os resultados social, pedaggico, cultural, da escola, expressam-se nas aprendizagens efetivamente consumadas. A atividade pedaggica somente pedaggica se ela mobiliza as aes mentais dos sujeitos, visando a ampliao de suas capacidades cognitivas e a formao de sua personalidade global. Essa formao de aes mentais ou novos usos de uma ao mental requer, por parte dos alunos, uma atividade de estudo e, da parte dos professores, a mediao didtica, precisamente a interveno intencional na formao de processos mentais do aluno.

Algumas derivaes desse posicionamento

Em outro texto (LIBNEO, 2010b), eu destacava algumas tarefas urgentes para o revigoramento terico e profissional da didtica: retomada do estudo aprofundado do campo terico e investigativo da pedagogia, cujo objeto a prtica educativa visando a formao e o desenvolvimento humano em situaes concretas; a retomada, na mesma direo, dos estudos em didtica voltados s relaes entre ensino e aprendizagem; aprofundamento das peculiaridades da pesquisa didtica na escola, no ensino, nos processos cognitivos; ampliao das abordagens dos elementos constitutivos da didtica visando clarear os contextos e as condies concretas do ensino e da aprendizagem, introduzindo questes socioculturais, antropolgicas, lingsticas, estticas, comunicacionais, miditicas. As consideraes a seguir referem-se principalmente a esta ltima tarefa, uma vez que o ensino uma prtica social, portanto impregnado de vrias dimenses: a social, a cultural, a poltica, psicolgica, a biolgica, etc. A didtica necessita de outros campos de conhecimento para a compreenso do seu objeto de estudo e seu campo de prtica, o ensino. As contribuies atuais tm vindo da sociologia crtica do currculo, da psicolingstica, da pesquisa cultural, da psicopedagogia, da teoria da ao comunicativa, das teorias holsticas, da teoria da complexidade, entre outras. A seguir, so abordadas algumas dessas contribuies.

A teoria curricular crtica traz importantes aportes problemtica investigao da didtica ao ajudar a compreender as relaes entre os processos de seleo, distribuio, organizao e ensino dos contedos curriculares e a estrutura de poder do contexto social. Especialmente nos ltimos anos, por influncia da sociologia da educao desenvolvida na Inglaterra, Frana e Estados Unidos, a investigao no campo do currculo tem destacado temas como as culturas particulares, a diferena, a pluralidade das linguagens, as relaes de poder. Tais temas so, sem dvida, muito relevantes e podem perfeitamente ser includos na problemtica terica e prtica da didtica, desde que sejam conectadas aos esforos de melhoria da escola pblica, de focar nas questes de aprendizagem e desenvolvimento de processos cognitivos. A concordncia de tericos da didtica e do currculo em torno de alguns pontos comuns relacionados com a prtica docente, ainda que no anulem divergncias tericas, concorre para evitar a presena de posies imobilistas entre os professores que atuam nas escolas. Em texto de 1988, apresentei as divergncias mas, tambm, as possibilidades de convergncias entre os campos da didtica e do currculo (LIBNEO, 1988)

Outra interface diz respeito s relaes entre didtica e epistemologia, temtica que tem motivado estudos entre didatas franceses, conforme h mencionado aqui, com forte inspirao do pensamento de Bachelard e, tambm, presente da teoria do ensino para o desenvolvimento de V. Davlov, mencionada mais adiante neste texto (LIBNEO, 2010a). A didtica, medida que lida com o processo mental do conhecimento, est em ntima relao com questes lgicas e psicolgicas. Ou seja, a apropriao de saberes supe os procedimentos investigativos de constituio dos saberes, e isto um problema eminentemente epistemolgico. Nesse sentido, a didtica no pode prescindir dos contedos especficos das disciplinas ensinadas para desenvolver suas investigaes. Sendo assim, no se pode falar de uma didtica geral, nem de mtodos gerais de ensino aplicveis a todas as disciplinas. A didtica somente faz sentido se estiver conectada lgica cientfica da disciplina que ensinada. De sua parte, ela oferece s disciplinas especificas o que comum e essencial ao ensino. Ao efetuar essa tarefa de generalizao, a didtica se converte em uma das bases essenciais das didticas especficas. Em uma das bases porque a didtica recorre a outros tipos de conhecimento alm daqueles da matria ensinada, por exemplo, da psicologia, da sociologia, da antropologia.

Outra fonte de enriquecimento do contedo da didtica so os temas da cultura e das prticas socioculturais, pois incidem diretamente na escola, no ensino e na aprendizagem dos alunos. A cultura um conjunto de conhecimentos, valores, crenas, moral, costumes, modos de agir e de se comportar, adquiridos pelos seres humanos enquanto membros de uma sociedade, de uma comunidade e que caracteriza o modo como as pessoas vivem e agem. claro que esses elementos da cultura convertem-se, em primeiro lugar, nas mediaes culturais que mobilizaro o ensino e a aprendizagem dos alunos. Com efeito, as escolas se defrontam com caractersticas socioculturais dos alunos, trazidas dos seus contextos de vida cotidiana, que afetam sua participao nas aprendizagens. Tambm os professores so portadores de caractersticas culturais, cujos saberes, valores, quadros de referncia, formas com que lidam com a profisso, marcam fortemente suas prticas docentes. A prpria escola tem uma cultura, que o modo como atuam as pessoas que nela trabalham. Alm disso, atravessam a escola a cultura cientfica, a cultura social, as culturas juvens, a cultura das mdias, constituindo uma transversalidade de culturas. Escrevem Davydov e Markova que as caractersticas psico-fisiolgicas das crianas so mediadas, desde o nascimento, pelo entorno social, o qual atua no desenvolvimento mental.

Dessa forma, o verdadeiro papel das caractersticas psicofisiolgicas no desenvolvimento mental da criana pode, a nosso ver, ser verificada apenas no curso da educao, o qual "intensifica" as caractersticas psicofisiolgicas (plasticidade, dinamicidade) que promovem o desenvolvimento e "atenuam" as propriedades , que poderiam prejudicar o desenvolvimento integral da criana. (DAVYDOV e MARKOVA, 1983, p.5).

Portanto, a contribuio da pesquisa cultural imprescindvel para a didtica porque prticas socioculturais e institucionais esto por detrs de mudanas no desenvolvimento e na aprendizagem dos alunos. Este tema ser retomado em vrios captulos deste livro, especialmente no terceiro e oitavo.

As tecnologias da comunicao e da informao j no podem ser tomadas apenas como recursos audiovisuais. As mdias fazem parte das mediaes culturais que caracterizam o ensino. Como qualquer contedo, so portadoras de idias, emoes, atitudes, habilidades, portanto, instrumentos de mediao cultural, ferramentas pedaggicas, ou seja, so elementos didticos propiciadores e mobilizadores da relao do aluno com os conhecimentos, habilidades, atitudes, valores.

A valorizao da experincia subjetiva e da pluralidade de linguagens reala a importncia das relaes comunicativas, do dilogo, do entendimento lingstico e da busca de consenso nos processos de tomada de deciso. Associado com o forte impacto das mdias na vida da escola, o tema da comunicao provoca mudanas no trabalho do professor, j que a aula deve ser cada mais uma prtica interativa onde se desenvolve o dilogo, a capacidade de ouvir o outro, de reconhecer as diferenas.

As perspectivas das teorias holsticas e da teoria da complexidade trazem substantivas contribuies didtica em temas como a unidade entre o sujeito e o mundo, a mente e a atividade, o equilbrio dinmico entre o homem e o meio biofsico em que a sociedade e a natureza formam um nico ecossistema, o sistema da vida. Nesta linha tambm est a noo de pensamento complexo. A inteligibilidade complexa, ou o pensar mediante a complexidade, significa buscar as inter-relaes das coisas, uma idia muito prxima da reflexo dialtica em que se buscam as relaes essenciais entre os fenmenos, ou seja, o modo geral como situaes da realidade vo se dispondo entre si no espao e no tempo, em que o sistema vai se constituindo a partir de suas relaes externas e interna.3. A perspectiva da teoria histrico-cultural: a didtica para o desenvolvimento de V. Davidov

Vasili Davdov, pertencente terceira gerao de pedagogos da Escola de Vygotsky, formulou a teoria do ensino desenvolvimental ou ensino para o desenvolvimento. Denomina-se desenvolvimental aquele ensino que impulsiona e amplia o desenvolvimento das capacidades cognitivas mediante a formao de conceitos e o desenvolvimento do pensamento terico-cientfico (LIBNEO, 2004).

A teoria de ensino de Davdov teve origem em investigaes sobre a organizao do ensino em escolas russas onde constatou a predominncia da concepo tradicional de aprendizagem baseada na formao do pensamento emprico, descritivo e classificatrio. Segundo ele, conhecimentos que se adquirem por mtodos transmissivos e de memorizao no se convertem em ferramenta para lidar com a diversidade de fenmenos e situaes que ocorrem na vida prtica. Um ensino mais duradouro e que se dirige formao da personalidade dos alunos deve basear-se no desenvolvimento do pensamento terico-cientfico, ao qual se chega pelo mtodo da reflexo dialtica. Trata-se de um processo pelo qual se revela a essncia e desenvolvimento dos objetos de conhecimento e, com isso, a aquisio de mtodos e estratgias cognitivas gerais de cada cincia, em funo de analisar e resolver problemas e situaes concretas da vida prtica. O pensamento terico se forma pelo domnio dos procedimentos lgicos do pensamento que, pelo seu carter generalizador, permite sua aplicao em vrios mbitos da aprendizagem. Desse modo, Davdov prope a superao de um tipo de pensamento emprico, que tem sido o mais freqente nas escolas, pelo pensamento terico-cientfico, que o que ajuda efetivamente a formar o pensamento.

H trs idias bsicas da didtica para o desenvolvimento: a) O bom ensino o que promove e amplia o desenvolvimento humano por meio da apropriao de conhecimentos, habilidades e capacidades cognitivas; b) Ensina-se para que os alunos formem o pensamento terico, isto , formem e atuem com conceitos em sua relao com a realidade; c) Formar conceitos o mesmo que formar e desenvolver aes mentais, capacidades de pensar.a) O ensino para o desenvolvimento do pensamento e da personalidade.

Para Davdov, na tradio da teoria histrico-cultural, a principal tarefa da escola consiste em ensinar os alunos a orientar-se independentemente na informao cientfica e em qualquer outra, ou seja, ensin-los a pensar mediante um ensino que impulsione o desenvolvimento mental. Desse modo, a atividade escolar consiste na apropriao de conhecimentos, capacidades intelectuais, mtodos da atividade formados historicamente os quais, por sua vez, impulsionam o desenvolvimento. Mudanas qualitativas no desenvolvimento mental geram capacidade para a apropriao de novos conhecimentos e habilidades de contedo mais complexo. A instruo ou ensino (obutchenie) um sistema de organizao e mtodos para assegurar o processo de apropriao da experincia socialmente formada, promovendo mudanas qualitativas no desenvolvimento mental (Cf. DAVYDOV e MARKOVA, 1983, p. 5). Escrevem esses autores:Enquanto a apropriao a reproduo pela criana da experincia socialmente desenvolvida e a instruo formal a forma de organizao desta apropriao em condies histricas determinadas, em uma determinada sociedade, o desenvolvimento caracterizado principalmente por alteraes qualitativas no nvel e na forma das capacidades, tipos de atividade, etc, apropriados pelo indivduo. (...) A apropriao o resultado da atividade empreendida pelo indivduo quando ele aprende a dominar mtodos socialmente desenvolvidos de lidar com o mundo dos objetos e a transformar esse mundo, os quais gradualmente tornam-se o meio da atividade prpria do indivduo (Ib.)

O caminho dessa apropriao por meio do ensino a formao de conceitos cientficos pelos quais os alunos podem ter o domnio do modo geral pelo qual o objeto de conhecimento construdo, interiorizando os modos de atividade anteriores aplicados investigao dos conceitos e modos de agir vinculados a esses conceitos. A interiorizao desses modos de atividade da experincia social permite criar no sujeito dispositivos auto-reguladores das aes e comportamentos dos indivduos, ou seja, tal como mencionado acima, tornam-se meios da atividade prpria do indivduo.

Esta formulao reala a atividade humana scio-histrica e coletiva na formao das funes mentais superiores, portanto o carter de mediao cultural do processo do conhecimento e, ao mesmo tempo, a atividade individual de aprendizagem pela qual o indivduo se apropria da experincia sociocultural como ser ativo. Considerando-se que os saberes e instrumentos cognitivos se constituem nas relaes intersubjetivas, sua apropriao implica a interao com outros j portadores desses saberes e instrumentos. Em razo disso, a educao e o ensino constituem formas universais e necessrias do desenvolvimento mental, em cujo processo se ligam os fatores socioculturais e as condies internas dos indivduos.b) A formao do pensamento terico-cientfico pelos conceitos

Se pensamento a faculdade de formular conceitos, aprender formar o pensamento terico-cientfico, isto , formar conceitos tericos apropriados de um objeto de estudo. A didtica para o desenvolvimento pe em primeiro plano a apropriao pelos alunos de conceitos, competncias e habilidades do pensar, modos de ao que se constituam em instrumentalidades para lidar praticamente com a realidade, ou seja, resolver problemas, enfrentar dilemas, tomar decises, formular estratgias de ao. Davdov prope uma adequada soluo para a questo do domnio dos contedos e da formao dos processos mentais: enquanto forma conceitos cientficos, o individuo incorpora as aes mentais, capacidades e procedimentos lgicos ligadas a esses conceitos e vice-versa. Ele escreve:

Os conhecimentos de um indivduo e suas aes mentais (abstrao, generalizao, etc.) formam uma unidade. (...) legtimo considerar o conhecimento, de um lado, como o resultado das aes mentais que implicitamente abrangem o conhecimento e, de outro, como um processo pelo qual podemos obter esse resultado no qual se expressa o funcionamento das aes mentais. Conseqentemente, totalmente aceitvel usar o termo conhecimento para designar tanto o resultado do pensamento (o reflexo da realidade), quanto o processo pelo qual se obtm esse resultado (ou seja, as aes mentais). (DAVYDOV, 1988, p. 21)

Para Davdov, o contedo da atividade de aprendizagem escolar o conhecimento terico. A referncia bsica do processo de ensino so os objetos cientficos (os contedos), que precisam ser apropriados pelos alunos mediante a descoberta de um princpio interno do objeto e, da, reconstrudo sob forma de conceito terico na atividade conjunta entre professor e alunos. A reconstruo e reestruturao do objeto de estudo constituem o processo de interiorizao, a partir do qual se reestrutura o prprio modo de pensar dos alunos, assegurando, com isso, seu desenvolvimento mental.

A formao dos conceitos e do pensamento terico-cientfico ocorre por meio da ascenso do abstrato ao concreto. Para isso, trata-se inicialmente de ir ao cerne dos conceitos, buscando a determinao primeira de relaes por meio da anlise do contedo trabalhado, o que corresponde ao percurso do mtodo da reflexo dialtica. Em seguida, os alunos vo verificando como esta relao geral se manifesta em outras relaes particulares do material estudado, seguindo o caminho da abstrao generalizao. Esse modo de estruturao das disciplinas escolares contribui para formar nos escolares um pensamento cientfico-terico, condio para o desenvolvimento mental. Ele escreve:

Quando os alunos comeam a usar a abstrao e a generalizao iniciais como meios para deduzir e unir outras abstraes, eles convertem as estruturas mentais iniciais em um conceito, que representa o ncleo do assunto estudado. Este ncleo serve, posteriormente, s crianas como um princpio geral pelo qual elas podem se orientar em toda a diversidade do material curricular factual que tm que assimilar, em uma forma conceitual, por meio da ascenso do abstrato ao concreto. (Ib., p. 22)

O procedimento didtico a ser seguido na interiorizao de conceitos de uma disciplina escolar depende do exame das condies histricas em que foram originados e que os levaram a se tornar essenciais, ou seja, os conceitos no se do como conhecimentos j prontos, devendo ser deduzidos a partir do modo geral de sua constituio e do abstrato. Por sua vez, a formao dos conceitos e a generalizao em relao ao material estudado dependem da realizao de tarefas de aprendizagem que possibilitem o exerccio de operaes mentais da transio do universal para o particular e vice-versa.

Resulta da a importncia da anlise do contedo como base para o ensino de uma disciplina, a partir da busca do desenvolvimento histrico que vai levando constituio do objeto de estudo ligada, bem como a considerao dos motivos do aluno (j que se trata de um ensino para o desenvolvimento humano).

Em sntese, podemos dizer, em primeiro lugar, que aprender a pensar teoricamente pensar e atuar com conceitos, ou seja, formar aes mentais. Trata-se de internalizar, apropriar-se de um modo geral de ao mental prprios da cincia ensinada, que possibilita a apropriao da realidade, aplicando um conceito geral a situaes particulares. Em segundo lugar, formam-se conceitos por meio da formao de aes mentais (procedimentos lgicos), que permitem representar coisas no nosso pensamento. Em terceiro lugar, o caminho para a formao de aes mentais est nos processos de investigao e constituio de uma cincia (aprender o processo de origem e desenvolvimento das coisas e acontecimentos) decorrendo, da, a relao mtua entre contedos e aes mentais. Davdov recomenda a aprendizagem baseada em problemas e o ensino com pesquisa, em que o professor intervm ativamente nos processos mentais das crianas e produz novas formaes da atividade mental por meio dessa interveno.

c) O caminho da aprendizagem

O planejamento de ensino comea com a anlise de contedo, em que primeiramente se buscam as relaes fundamentais, essenciais, ou seja, a formulao de uma idia que expressa o princpio interno do tema em estudo (que o conceito nuclear), e descobrir como esta relao aparece em muitos problemas especficos.O princpio interno a relao geral estabelecida entre os vrios elementos que constituem um objeto de estudo, captada no processo de desenvolvimento e constituio desse objeto na prtica social e histrica. Essa anlise tem a ver com a identificao do caminho percorrido pelo cientista para apreender o objeto de investigao. Segundo Chaiklin:

O propsito da atividade de aprendizagem ajudar os alunos a dominarem as relaes, abstraes, generalizaes e snteses que caracterizam os temas de uma matria. Este domnio refletido na sua habilidade para fazer reflexo substantiva, anlise e planejamento. A estratgia educacional bsica para dar aos alunos a possibilidade para reproduzir pensamento terico a de criar tarefas instrucionais cujas solues requeiram a formao de abstraes substantivas e generalizaes sobre as idias centrais do assunto. Esta aproximao fundamentada na idia de Vygotsky da internalizao, isto , algum aprende o contedo da matria aprendendo os procedimentos pelos quais se trabalham os temas especficos da matria (Chaiklin 1999. p. 191).

O segundo passo consiste em identificar os conceitos bsicos ou noes-nucleares, a partir da anlise de contedo, de modo a organizar os tpicos do plano de ensino. Esses tpicos precisam estar adequados aos motivos dos alunos, pois os contedos devem mobilizar motivos, forma pela qual atuam no desenvolvimento da personalidade.

O terceiro passo do caminho da aprendizagem a identificao das aes mentais a desenvolver, ou seja, o que se deseja que os alunos internalizem (ou se apropriem) em relao a conceitos que sero utilizados como ferramentas mentais.

O quarto passo a formulao de tarefas de aprendizagem em que a relao geral aparece em problemas especficos, em casos particulares. As tarefas so, por exemplo, explorao de materiais, planejamento de experimentos, exerccios de anlise e sntese, comparao, deduo, resoluo de problemas, correlaes de causa e efeito, formulao de hipteses, etc.

Finalmente, preciso formular procedimentos de avaliao formativa e somativa em relao interiorizao de conceitos (formao de aes mentais).

Verifica-se que o caminho didtico implica contedos e objetivos, mas estes somente fazem sentido se os alunos so ajudados na formaes de suas aes mentais. Na verdade, o grande objetivo construir dispositivos didticos slidos que permitam a identificao das operaes mentais a realizar e prever as situaes pedaggico-didticas em que ser posta em prtica. Meirieu escreve que nenhum contedo existe fora do ato que permite pens-lo, da mesma forma que nenhuma operao mental pode funcionar no vazio, ou seja, a formao de aes mentais supe os contedos, pois as aes mentais esto j presentes nos processos investigativos e procedimentos lgicos da cincia ensinada. Em concordncia com a perspectiva terica de didtica trazidos neste texto, escreve sabiamente Meirieu:Na verdade, mais do que a elaborao de instrumentos, o quer prea ns importa o procedimento didtico que tentamos promover, aquele consiste no simplesmente em proclamar o que queremos que o aluno saiba, mas sim, em questionar a respeito do que deve se passar em sua cabea para que chegue onde queremos, e criar, a partir da, o dispositivo que d corpo e vida operao mental identificada. O que importa a capacidade do professor de traduzir os contedos de aprendizagem em procedimentos de aprendizagem, isto , em uma seqncia de operaes mentais que ele procure compreender e instituir na sala de aula. O que importa fazer de um objetivo programtico um dispositivo didtico, e isso s possvel atravs da anlise da atividade intelectual a ser desenvolvida e atravs da busca das condies que garantem seu xito (MEIRIEU, 1998, p. 117)

Para ilustrar a noo de caminho didtico para formar e atuar com conceitos, podemos dar um exemplo sobre ensinar e aprender em tpicos de educao ambiental. A educao ambiental ocupa-se de processos intencionais de comunicao e interiorizao de saberes conhecimentos, experincias, habilidades, valores, modos de agir cabendo ao ensino organizar os contedos, prever objetivos na forma de aes mentais e desenvolver e formas metodolgicas e organizativas do ensino. O resultado esperado desse ensino o desenvolvimento de capacidades de pensar e agir ambientalmente, para o que se vai em busca da origem e desenvolvimento histrico dos contedos, processos de investigao e modos de agir da educao ambiental. Isso implica apropriar-se de modos de aplicao de modos de investigao e processos de pensamento aplicados na anlise de problemas e situaes concretas relacionados com o ambiente. Desse modo, a correta didtica da educao ambiental consistiria em ajudar os alunos a captar o percurso da investigao pelo qual vai se constituindo o saber ambiental e descobrir o caminho metodolgico pelo qual podem interiorizar esse percurso, para que aprendam a pensar e a agir autonomamente em relao a prticas scio-ambientais. Assim, o aluno internaliza o modo geral de ao menta, ou seja, adquire um mtodo terico geral sobre a educao ambiental, para aplic-lo a situaes particulares da realidade. Est a idia que est por detrs da expresso conhecimento terico-cientfico.4. O papel da didtica na formao de professores: teoria e prtica

Os professores realizam um trabalho que se caracteriza por uma atividade humana peculiar, a atividade pedaggica. Toda atividade humana est dirigida a um objeto que, no caso da atividade pedaggica, outra atividade, a atividade de aprendizagem. A noo de atividade assumida na teoria histrico-cultural implica o princpio da unidade entre a mente e a atividade, ou seja, uma atividade de mentalizar e uma atividade material, objetiva, uma referida outra, uma impregnando a outra, de modo a podermos dizer que, no nosso comportamento, no nosso ser, h uma unidade indissolvel das duas dimenses da existncia humana, a teoria e a prtica. Essa relao define a natureza da prxis pedaggica: a atividade humana prtica fundamentada teoricamente. Em sentido mais especfico, a atividade interna do sujeito possui uma estrutura constituda pelas necessidades, motivos, finalidades e condies de realizao. Por sua vez, a realizao da finalidade posta para a atividade, em determinadas condies, depende da realizao de diversas aes, cada ao composta por uma srie de operaes em correspondncia com as condies peculiares da tarefa (Cf. LEONTIEV, p.82). Assim, atividade surge de necessidades, que impulsionam motivos orientados para um objeto. O ciclo que vai de necessidades a objetos se consuma quando a necessidade satisfeita, sendo que o objeto da necessidade ou motivo tanto material quanto ideal. Para que estes objetivos sejam atingidos, so requeridas aes. O objetivo precisa sempre estar de acordo com o motivo geral da atividade mas so as condies concretas da atividade que determinaro as operaes vinculadas a cada ao. Segundo Leontiev:

(A atividade se refere) queles processos que, realizando as relaes do homem com o mundo, satisfazem uma necessidade especial correspondente a ele. (...) Por atividade, designamos os processos psicologicamente caracterizados por aquilo que o processo, como um todo, se dirige (i.e, objeto), coincidindo sempre com o objetivo que estimula o sujeito a executar essa atividade, isto , o motivo.(1988, p.68).

Com base nesse entendimento, o professor realiza uma atividade pedaggica no decurso da qual so realizadas aes e operaes, tendo em vista o objetivo. Desse modo, o trabalho do professor uma atividade terico-prtica, nem s teoria nem s prtica, mas uma atividade prtica que sempre terica, sempre pensada, um movimento do pensamento, do que resulta uma prtica pensada. Ou seja, a prtica profissional de professores no uma mera atividade tcnica, ou seja, no se constitui como mero fazer resultante de habilidades tcnicas, mas como atividade terica e prtica.

Da considerao de que o objeto de trabalho da atividade pedaggica a atividade de aprendizagem, resultam trs coisas: a) a atividade de aprendizagem refere-se apropriao pelo aluno de conhecimentos, habilidades e modos de ao; b) os modos de realizar a atividade pedaggica precisam ser aprendidos, ou melhor, apropriados por quem vai desempenhar essa atividade; ou seja, na formao profissional, a atividade pedaggica converte-se em atividade de aprendizagem, de modo que as diretrizes de formao profissional precisam orientar sobre os modos pelos quais deve ser conduzida a atividade de aprendizagem; c) a atividade pedaggica tem como centro (ncleo) a tarefa de aprendizagem (ou tarefas cognitivas como anlise e sntese, comparao, soluo de problemas, formulao de hipteses, etc.) que mobilizam a atividade de aprendizagem dos alunos em relao apropriao de conceitos cientficos.

Verifica-se, assim, que a formao profissional de professores, na perspectiva adotada aqui, baseia-se num pressuposto ineludvel da teoria histrico-cultural: a educao escolar tem uma influncia decisiva no desenvolvimento mental e essa formao escolar s boa se essa influncia acontece. Ora, a formaao do aluno depende principalmente da apropriao dos conhecimentos cientificos. Esta posio no admite a ideia corrente, principalmente em documentos do Banco Mundial e com larga influncia na educao brasileira, de que crianas de estratos sociais empobrecidos no conseguem entender o conceito e, portanto, o ensino fundamental deve ser limitado ao domnio de conhecimentos elementares, prticos, tais como ler, escrever, contar. Nessas condies, alunos acabam tendo um descompasso em seu desenvolvimento mental, passando toda o perodo do ensino desenvolvimental sem formar no nivel desejado suas capacidades, compromentendo toda a aprendizagem escolar posterior. Para contrapor a essa situao, ser preciso pensar a formao para a atividade pedaggica com base em outro conceito de atividade de aprendizagem, ou seja, aquele que a compreende como apropriao de conceitos cientficos e, atravs deles, a formao de capacidades intelectuais.

Os elementos constitutivos da didtica e as categorias que formam seu conceito, bem como as consideraes sobre a mediao didtica no processo ensino-aprendizagem, possibilitam dimensionar a configurao da atividade pedaggica, condio bsica para definir o contedo da formao profissional dos professores. Se se trata de priorizar na escola a apropriao de conceitos cientficos, est claro que o objeto de investigao da didtica o processo de ensino-aprendizagem em relao assimilao de conhecimentos e modos de ao. Tem-se, ento, como pressuposto, que a questo central do ensino o conhecimento, ou melhor, o processo mental do conhecimento ou, ainda, o desenvolvimento das capacidades mentais dos alunos por meio dos conhecimentos sistematizados nos contedos escolares. Assim, a atividade de ensino volta-se para a aprendizagem desse conhecimento em funo da formao da personalidade dos alunos.

Sendo assim, para que um professor transforme as bases da cincia em que especialista, em matria de ensino, e com isso oriente o ensino dessa matria para a formao da personalidade do aluno, preciso que ele tenha, pelo menos: a) domnio do contedo da matria, como condio imprescindvel para fazer anlise dos conceitos, organiz-los em funo dos motivos dos alunos e do desenvolvimento de suas capacidades intelectuais, e manej-los com competncia; b) conhecimento pedaggico do contedo, ou seja, saber ligar os princpios gerais que regem as relaes entre o ensino e a aprendizagem com problemas especficos do ensino de determinada matria; c) responsabilizao pelo papel educativo do processo docente, ou seja, orientar o ensino dos contedos para a formao da personalidade (ensino para o desenvolvimento humano); c) conhecimento das caractersticas individuais e sociais dos alunos; d) conhecimento das prticas socioculturais e institucionais em que os alunos esto envolvidos e as formas como atuam na aprendizagem; e) provimento das condies que propiciam o trabalho ativo e criador dos alunos, nos processos de seu desenvolvimento intelectual.

Esses requisitos da formao profissional indicam muito claramente que a aprendizagem da profisso requer, aos menos, quatro caractersticas profissionais do professor. Em primeiro lugar, a apropriao terico-crtica de conhecimentos, sejam aqueles de fundamentos da educao sejam aqueles relacionados como conhecimento profissional especfico (a didtica, as metodologias especficas, o contedo das matrias quem iro ensinar). So conhecidas as deficincias na formao de professores, especialmente das sries iniciais do ensino fundamental, em relao ao domnio de contedos e apropriao de ferramentas cognitivas (Cf., por ex., LIBNEO, 2010c). Uma segunda caracterstica da formao a apropriao de metodologias de ensino e de formas de agir que dem melhor qualidade e eficcia ao trabalho docente. A atividade pedaggica se caracteriza por aes que impulsionam a atividade de aprendizagem e, para isso, so requeridas capacidades e habilidades especficas, providas pelo conhecimento pedaggico do contedo. Pela sua natureza, o trabalho educativo um trabalho prtico, entendendo prtico no sentido de envolver uma ao intencional, pensada, dirigida a objetivos. O professor aprimora o seu trabalho apropriando-se de instrumentos de mediao desenvolvidos na experincia humana, que tornam mais eficaz o ensino das matrias e a formao de aes mentais pelos alunos. No se trata de tecnicismo, mas de associar de modo mais efetivo o modo de fazer e o princpio terico-cientfico que lhe d suporte. A reflexo sobre a prtica no resolve tudo, a experincia refletida no resolve tudo. So necessrias estratgias, procedimentos, modos de fazer, com o suporte do conhecimento terico, que ajudam a orientar com mais competncia a aprendizagem dos alunos.

A terceira caracterstica o conhecimento das caractersticas individuais e socioculturais dos alunos, pois a atividade de aprendizagem , tipicamente, uma atividade do aluno, visando mudanas qualitativas no aluno, no seu desenvolvimento. O conhecimento dos alunos necessrio para a anlise dos contedos e organizao do plano de ensino. o momento em que o professor formula tarefas de aprendizagem com suficiente atrativo para canalizar os motivos dos alunos para o contedo. Esta a maneira de ligar o contedo e o desenvolvimento da personalidadeA quarta caracterstica diz respeito ao conhecimento do papel das prticas socioculturais e institucionais na motivao e aprendizagem dos alunos. No basta obter o conhecimento terico e os meios pedaggico-didticos de melhorar e potencializar a aprendizagem dos alunos, preciso considerar os contextos concretos em que se d a formao. No se pode separar as pessoas que atuam e o mundo social da atividade.

Permeando estes quatro aspectos da formao de professores, esto as convices tico-politicas. preciso que no processo de formao os estudantes vo aprendendo a colocar-se frente realidade, apropriar-se do momento histrico de modo a pensar historicamente essa realidade e reagir a ela, numa direo emancipadora. A dimenso crtica da atividade profissional permeia todo o processo de formao, j que o processo do conhecimento histrico, implicando uma cultura crtica em relao aos objetos de conhecimento e atividade profissional.

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Em seu texto, Prestes recorre a dois autores, Rieber e Carton (p. 184), que destacam no termo obutchenie duas partes: o verbo uchit (ensinar) e o verbo reflexivo uchisia (ser ensinado, aprender pela instruo, estudar). Conforme me informa Achiles Dallari, preocupado em seus trabalhos com problemas de traduo do russo de textos de psicologia e educao, a palavra utchnie significa, mais propriamente, estudos, aprendizagem, aprendizado, mas, tambm, ensino, ensinamento, exerccio ttico; e que obutchnie significa ensino, instruo, neste caso, destacando a importncia de se esclarecer o papel, nessa palavra, do prefixo ob, que pode significar: em face de, em troca de, diante de, para, por causa de, etc. O estudo de Prestes e a contribuio de Dallari deixam poucas dvidas: obutchenie refere-se a instruo, isto , processo intencional, sistemtico, de ensino-aprendizagem em qualquer contexto social de educao.

Sobre isso, Dayidov e Markova escrevem que a tarefa de aprendizagem representa a operacionalizao da abordagem do ensino voltado para o desenvolvimento. Segundo eles, o principal contedo da atividade educativa a assimilao (apropriao) de mtodos generalizados de ao no domnio dos conceitos cientficos e as mudanas qualitativas que vo ocorrendo, em decorrncia disso, no desenvolvimento mental da criana. (...) A aprendizagem no apenas a aquisio de um domnio do conhecimento... , principalmente, um processo de mudana, de reorganizao e enriquecimento da prpria criana (p.6). Ou seja, a tarefa de aprendizagem como centro da atividade pedaggica o procedimento peculiar que possibilita a participao ativa do aluno no processo de aprendizagem.