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O DESENVOLVIMENTO DA PSICO-ONCOLOGIA: IMPLICAÇÕES PARA A PESQUISA E INTERVENÇÃO PROFISSIONAL EM SAÚDE Áderson L. Costa Junior 1 Universidade de Brasília 1 Professor Adjunto do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB). E-Mail: <[email protected] >

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  • O DESENVOLVIMENTO DA PSICO-ONCOLOGIA: IMPLICAES PARA A PESQUISA E INTERVENO PROFISSIONAL EM SADE

    derson L. Costa Junior1

    Universidade de Braslia

    1Professor Adjunto do Instituto de Psicologia da Universidade de Braslia (UnB). E-Mail:

  • RESUMOEste artigo, de carter descritivo e crtico, apresenta a rea da psico-

    oncologia como integrante do contexto da psicologia da sade, incluindo seus

    objetivos e principais tpicos de interesse cientfico e profissional. O texto inclui,

    ainda, uma sntese das principais temticas estudadas em psico-oncologia e

    apresentadas em congressos brasileiros da rea. Discute-se a necessidade da

    implementao de pesquisas cientficas, com rigor metodolgico, teis promoo

    de condies favorveis ao atendimento especializado de pacientes submetidos a

    tratamento mdico e seus familiares, bem como a implementao de oportunidades

    de formao terico-tcnica especficas para a rea.

    Palavras-chave: psico-oncologia, psicologia da sade, cncer, pesquisa em psicologia.

    ABSTRACTThis article of descriptive and critical character, introduces the psychooncology

    area as integrant of health psychology context, including its scientific and

    professional interest objectives and main topics. The text includes, yet, a thematic

    main synthesis studied in psychooncology and introduced in Brazilian congresses of

    this area. It discusses the need of scientific research implementations, with

    methodological rigidity, useful to favorable conditions promotion of specialized

    assistance to patients submitted to medical treatment and their families, as well as

    opportunity specific formation theoretician-technique implementations for the area.

    Key words: Psychooncology, Health Psychology, Cancer, Psychology Research..

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  • Introduo: o cncerSegundo a Organizao Mundial de Sade (OMS), o cncer deve ser

    analisado como um problema de sade pblica, que atinge indivduos de todas as

    idades e em todos os continentes, constituindo-se na segunda principal causa geral

    de morte por doena em todo o mundo, responsvel por 6 (seis) milhes de bitos

    anuais.

    No Brasil, dados do Instituto Nacional do Cncer (INCA) tambm apontam o

    cncer como a segunda principal causa de morte por doena, responsvel por

    10,86% dos bitos em 1994, o que representou pouco mais de 95 mil mortes. Por

    regio, observa-se que a incidncia de morte por cncer aumenta proporcionalmente

    da regio nordeste (onde a terceira causa de morte por doena, responsvel por

    6,34% dos bitos) para a regio sudeste, com 11,93% do bitos por doena e para a

    regio sul do pas, onde o cncer responde por 15,19% das mortes por doena,

    conforme dados estatsticos de 1994.

    Por tratar-se de uma doena crnica de prognstico nem sempre favorvel,

    responsvel por parcela significativa de bitos e cujo tratamento pode exigir nveis

    de tolerncia bastante elevados, observa-se nas ltimas dcadas do Sc. XX uma

    enorme mobilizao cientfica e profissional de praticamente todas as cincias da

    sade, inclusive da Psicologia, no sentido do desenvolvimento de novas

    modalidades teraputicas de preveno e de tratamento do cncer.

    A psico-oncologiaConsiderando-se a definio da rea de psicologia da sade proposta pela

    American Psychological Association (APA), como um campo de contribuio

    cientfica e profissional, especfica da psicologia enquanto disciplina, que visa a

    promoo e a manuteno da sade, a preveno e o tratamento de doenas

    (Matarazzo, 1980), podemos demarcar um campo de interface entre a oncologia

    (rea da Medicina que estuda o cncer) e a psicologia, denominada psico-oncologia,

    como um dos elementos integrantes da rea da psicologia da sade.

    Sendo assim, possvel descrever a psico-oncologia como um campo

    interdisciplinar da sade que estuda a influncia de fatores psicolgicos sobre o

    desenvolvimento, o tratamento e a reabilitao de pacientes com cncer. Entre os

    principais objetivos da psico-oncologia est a identificao de variveis psicossociais

    e contextos ambientais em que a interveno psicolgica possa auxiliar o processo

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  • de enfrentamento da doena, incluindo quaisquer situaes potencialmente

    estressantes a que pacientes e familiares so submetidos.

    Fatores psicolgicos intervenientes sobre processos de desenvolvimento de

    doenas em seres humanos j foram referidos desde pocas milenares da medicina

    chinesa, embora estudos sistemticos que investigassem a relao entre variveis

    de natureza psicolgica e o desenvolvimento de cncer somente tenham sido

    delineados a partir de meados da dcada de 40 (Holland, 1991). Estudos mais

    recentes permitem apontar evidncias de que a resposta psicolgica do paciente ao

    cncer constitui varivel interveniente significativa sobre os resultados do

    tratamento, podendo, inclusive, afetar a durao de sua sobrevivncia (Carey &

    Burish, 1988; Scott, 1994; Simonton, Matthews-Simonton & Creighton, 1987).

    Conforme descrito em Della Porta (1983; citado em Miyazaki & Amaral, 1995),

    em termos de fatores de risco, reconhece-se que mais de 80% dos casos de cncer

    esto associados a fatores ambientais, incluindo o meio em geral, ambiente

    ocupacional, ambiente de consumo e ambiente cultural (p. 241). Sob tais

    perspectivas, a contribuio potencial da psico-oncologia para o entendimento da

    influncia de variveis psicossociais sobre processos de gerao de neoplasias

    malignas e para o desenvolvimento de estratgias que auxiliem o indivduo doente a

    enfrentar o processo de tratamento so inegveis.

    Observa-se que a psico-oncologia vem se constituindo, nos ltimos anos, em

    ferramenta indispensvel para promover as condies de qualidade de vida do

    paciente com cncer, facilitando o processo de enfrentamento de eventos

    estressantes, se no aversivos, relacionados ao processo de tratamento da doena,

    entre os quais esto os perodos prolongados de tratamento, a teraputica

    farmacolgica agressiva e seus efeitos colaterais, a submisso a procedimentos

    mdicos invasivos e potencialmente dolorosos, as alteraes de comportamento do

    paciente (incluindo desmotivao e depresso) e os riscos de recidiva.

    Atualmente, podemos dizer que acompanhamento psicolgico do paciente e

    de seus familiares, em todas as etapas do tratamento, constitui elemento

    indispensvel da assistncia prestada (Bearison & Mulhern, 1994; Carvalho, 1994;

    Dahlquist, Czyzewski & Jones, 1996; Gimenes, 1996). Deve-se observar, entretanto,

    que por se tratar de uma rea relativamente recente, so muitos os fatores

    psicossociais vinculados a um episdio de cncer ainda no suficientemente

    compreendidos por pesquisadores e profissionais da rea. Temas relacionados

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  • adaptao comportamental e ajuste emocional do paciente ao tratamento,

    estratgias de enfrentamento em contextos estressantes, indicadores de qualidade

    de vida, efeitos psicossociais do tratamento do cncer a longo prazo e modalidades

    de interveno psicolgica junto ao paciente e familiares ainda sero, por exemplo,

    alvo de estudos cientficos e assunto de discusso pelos prximos anos.

    Embora ainda permeado por um carter catastrfico, o diagnstico de cncer

    e seu conseqente tratamento vm obtendo resultados cada vez favorveis.

    Avanos farmacolgicos tm permitido a gerao de agentes quimioterpicos cada

    vez mais eficientes e com maior controle de efeitos colaterais desconfortveis; ao

    mesmo tempo, descobertas genticas e imunolgicas, bem como novas tcnicas de

    diagnstico, tm permitido a identificao precoce de formaes neoplsicas

    (Cassileth & Chapman, 1996; Farah, 1997). Em consequncia, taxas demonstrativas

    de sobrevida vm apresentando ndices percentuais ascendentes, engrossando a

    proporo de ex-pacientes de cncer (Greaves, 1998).

    Os ndices de sobrevida so ainda mais significativos quando considerado o

    cncer infantil. A incidncia mdia de cura de leucemia linfide aguda, principal

    modalidade de cncer em crianas, passou de 30%, na dcada de 60, para mais de

    70% na dcada de 90. Segundo Wood e Bunn (1996), a taxa de remisso completa

    de leucemia linfide aguda tem sido geralmente superior a 90% e a taxa de cura em

    cinco anos tem sido no mnimo de 50%; considerando os pacientes que completam

    entre dois e meio e trs anos de terapia de manuteno sem recidiva, a chance de

    cura superior a 80%.

    necessrio ressaltar, ainda, que embora a evoluo tecnolgica no campo

    da medicina venha produzindo resultados altamente significativos, campanhas de

    esclarecimento pblico e de estmulo ao desenvolvimento de comportamentos de

    preveno tambm so responsveis, parcialmente, por estatsticas encorajadoras

    de sucesso de tratamento. O compromisso social da psicologia (e de outras cincias

    da sade) inclui a formao de profissionais capacitados para identificar perfis de

    personalidade e repertrios de comportamento de risco, intervindo no sentido de que

    o indivduo atendido possa ter a oportunidade de adquirir e manter comportamentos

    de sade, tais como a evitao de situaes de vulnerabilidade, a prtica de exames

    peridicos e o desenvolvimento de ambientes favorveis ao convvio pessoal,

    familiar, social e profissional.

    No caso da psico-oncologia, o atendimento profissional, independente da

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  • abordagem terico-filosfica do psiclogo, deve ultrapassar os limites do consultrio

    e da prtica psicoterpica, inadequada e insuficiente para o cumprimento dos

    objetivos da psico-oncologia, indo buscar e trabalhar com o paciente onde quer que

    ele se encontre (na sala de espera do hospital, na enfermaria, na sala de

    procedimentos invasivos, em casa, ou em qualquer outro local) e incluindo a

    participao ativa de diferentes profissionais. A psico-oncologia deve ser entendida

    como um instrumento que viabiliza atividades interdisciplinares no campo da sade,

    desde a pesquisa cientfica bsica at os programas de interveno clnica.

    A interveno em psico-oncologia baseada em modelos educacionais e no

    em modelos mdicos ou clnicos que enfatizam estruturas patolgicas e

    atendimentos teraputicos individuais. O profissional, no contexto da psico-

    oncologia, deve priorizar a promoo de mudanas de comportamento relacionadas

    sade do indivduo. A experincia de tratamento deve se constituir em uma

    condio de aprendizagem scio-comportamental e cognitiva para o paciente; cabe

    ao psiclogo demonstrar que os repertrios de comportamentos adquiridos no

    contexto do tratamento podem ser teis em diversas situaes de risco, mesmo

    aquelas distantes do contexto de doenas e tratamentos mdicos, a que o indivduo

    for submetido.

    Algumas informaes sobre a psico-oncologia no BrasilNo Brasil, Gimenes (1994) descreve a psico-oncologia como uma rea de

    interface entre a oncologia e a psicologia, tomando por base concepes de sade e

    doena inerentes ao modelo biopsicossocial, que se ocupa: 1) com a identificao

    do papel de fatores psicossociais, tanto na etiologia quanto no desenvolvimento da

    doena; 2) com a identificao de fatores de natureza psicolgica envolvidos com

    preveno e reabilitao do paciente portador de cncer; 3) com a sistematizao de

    um corpo de conhecimentos que possa fornecer subsdios tanto assistncia

    integral do paciente oncolgico e de sua famlia, como tambm formao de

    profissionais de sade envolvidos com o seu tratamento. A autora destaca que a

    psico-oncologia comeou a surgir como rea de conhecimento, quando profissionais

    da rea de sade passaram a reconhecer que o desenvolvimento do cncer, bem

    como a andamento do processo de tratamento da doena, sofriam a influncia de

    variveis sociais e afetivas que estavam alm da circunscrio mdico-biolgica.

    A partir da dcada de 90, profissionais e pesquisadores que atuavam em

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  • psico-oncologia passaram a se reunir, com periodicidade bienal, nos Encontros

    Brasileiros de Psico-Oncologia; os dois primeiros, em 1990 e 1992, ocorreram sob a

    presidncia do Dr. Luiz Pedro Pizzato e da Dra. Maria da Glria Gimenes,

    respectivamente. Em 1998, foi realizado o V Encontro Brasileiro e o III Congresso

    Brasileiro de Psico-Oncologia, em Goinia, GO. Em 2.000, realiza-se o VI

    Congresso Brasileiro de Psico-Oncologia.

    Mesmo com a existncia de indicadores da expanso da atuao profissional

    em psico-oncologia no Brasil, um levantamento de dados efetuado junto aos

    trabalhos apresentados e temas discutidos durante os Congressos e Encontros

    Brasileiro de Psico-Oncologia, apontou: a) a existncia de um perfil profissional

    ainda um pouco assistencialista e; b) uma maior quantidade de relatos de

    experincia profissional, em detrimento de estudos de investigao cientfica, com

    rigor metodolgico. O levantamento considerou a afiliao institucional e regional

    dos trabalhos, os temas em psico-oncologia que mais interessavam aos psiclogos,

    o tipo de trabalho desenvolvido e a variabilidade metodolgica utilizada.

    Considerando-se a varivel afiliao institucional, o levantamento apontou

    que pouco mais de 60% dos trabalhos tinham autores vinculados a hospitais ou

    servios de psicologia hospitalar, enquanto menos de um tero dos trabalhos foram

    desenvolvidos por profissionais ou pesquisadores ligados a instituies de ensino

    (universidades e faculdades de psicologia e/ou de cincias da sade). A tabela, a

    seguir, explicita estas informaes.

    Afiliao Institucional Porcentagem (%)Servios de psicologia

    hospitalar

    62,8 %

    Instituies de ensino e

    parcerias hospital-

    universidade

    31,1%

    Outros ou

    informao no disponvel

    6,1%

    No que se refere afiliao regional, observou-se que o estado de So Paulo

    rene a maior concentrao de profissionais e pesquisadores em psico-oncologia

    (pelo menos aqueles que participam dos congressos da rea) e que as grandes

    distncias entre as regies do Brasil parecem facilitar a participao de profissionais

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  • que se encontram fisicamente prximos do local em que se realiza o congresso. Em

    1996, realizado em Salvador, BA, um tero dos trabalhos apresentados foram de

    autores do estado de So Paulo, seguidos pela Bahia (15,7%), Paran (8,2%),

    Distrito Federal (7,5%) e Gois (6,7%), entre outros menos representados.

    J em 1998, com a realizao do Congresso em Goinia, GO, novamente

    pouco mais de um tero dos trabalhos apresentados foram de autores do estado de

    So Paulo, seguidos de trabalhos de Gois (22,4%), Distrito Federal (14,2%), Rio

    Grande do Sul (8%) e Paran e Bahia (6% cada), entre outros menos

    representados. Ressalta-se, no caso dos trabalhos do Distrito Federal, que todos

    eram de autores relacionados Universidade de Braslia, incluindo docentes, alunos

    de ps-graduao e de graduao e ex-alunos ( poca, funcionrios de instituies

    hospitalares da rede de sade do Distrito Federal).

    No que se refere aos temas mais abordados pelos profissionais e

    pesquisadores que atuam em psico-oncologia, podemos citar os seguintes, em

    ordem decrescente: atendimento psicolgico a crianas com cncer (17,8% dos

    trabalhos), atendimento psicolgico a pacientes com cncer de mama (15,6% dos

    trabalhos), atendimento psicolgico em contextos de terminalidade e morte (14,4%),

    desenvolvimento de atividades por equipes multidisciplinares de sade (11%),

    preparao e atendimento psicolgico a pacientes cirrgicos (8,5%), atendimento ao

    familiar do paciente com cncer (6,5%), preocupaes com a formao de

    profissionais de psicologia para atuao em psico-oncologia (4,9%) e outros menos

    freqentes e estatisticamente no significativos nesta distribuio. Observou-se,

    ainda, uma tendncia ao aumento da variabilidade temtica abordada, ao longo

    destes eventos realizados na dcada de 90.

    Destaca-se, em relao aos dados acima, que um tero de todos os trabalhos

    desenvolvidos em psico-oncologia, se restringiam a dois temas bsicos: cncer

    infantil e cncer de mama. Esta distribuio irregular permite levantar a hiptese de

    existncia de algumas carncias em psico-oncologia no Brasil: a existncia de

    muitos pacientes que ainda no dispem de atendimento psicolgico e/ou equipes

    de sade que no possuem psiclogos em seus quadros de pessoal.

    Por outro lado, observa-se que o fato do terceiro tema mais abordado estar

    relacionado ao desenvolvimento de atividades por equipes multidisciplinares de

    sade, pode constituir um indicador da significativa penetrao de modelos de

    ateno integral sade em oncologia, corroborando a definio de psico-oncologia

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  • proposta por Gimenes (1994).

    Quanto ao tipo de trabalho desenvolvido, pouco mais de 60% se referiam a

    relatos de experincia, em que o(s) autor(es) descrevia(m), de modo mais genrico

    ou no, sua(s) experincia(s) profissional(is) junto a um ou mais servios de

    atendimento a pacientes de oncologia. Observa-se que nem sempre as informaes

    contidas eram suficientes para permitir ao leitor compreender os objetivos e/ou os

    procedimentos de trabalho utilizado(s) pelo(s) autor(es). Poucos trabalhos continham

    informaes que indicassem preocupao do(s) autor(es) com procedimentos

    sistemticos de interveno profissional, critrios eletivos quanto a que

    procedimento utilizar e em que situao, ou preocupaes com medidas de eficcia

    ou efeitos da interveno profissional executada.

    Ainda sobre o tipo de trabalho, observou-se que menos de 25% se referiam a

    relatos de pesquisa no contexto da psico-oncologia, incluindo a investigao de

    variveis contextuais e intervenientes sobre processo de tratamento da doena.

    Observou-se que a maioria destes trabalhos pertencia a autores vinculados a

    universidades ou hospitais-escola, cujas dependncias eram utilizadas para

    atividades de ensino e/ou coleta de dados de pesquisa.

    A principal modalidade metodolgica utilizada, por psiclogos, ainda parece

    ser o atendimento clnico em carter psicoteraputico, incluindo uma ampla variao

    de abordagens terico-filosficas da psicologia (terapias de base analtica, terapia

    em situao de crise, psicoterapias breves e abordagens cognitivo-

    comportamentais). Destaca-se, nos ltimos congressos, uma crescente participao

    de outras metodologias como os atendimentos a grupo de pacientes e familiares,

    programas de recreao e de desenvolvimento de habilidades de enfrentamento,

    acompanhamentos domiciliares, grupos de auto-ajuda, entre outros, o que indica

    uma tendncia de expanso metodolgica da rea conforme as demandas vo

    sendo identificadas.

    Discusso e implicaes para a psicologia da sadeSobre a carncia de servios especializados em psico-oncologia no Brasil,

    necessrio efetuar uma anlise mais detalhada, que se inicia com a prpria

    dificuldade do reconhecimento do papel do profissional de Psicologia. Uma parcela

    significativa da populao desconhece ou possui um entendimento inadequado

    sobre o que a psicologia e sua amplitude de intervenes profissionais, no campo

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  • da sade e em outros campos de interveno profissional; a psicologia

    freqentemente enquadrada como um instrumento disposio do tratamento de

    doentes mentais ou portadores de desequilbrios emocionais, ou, relacionada a

    procedimentos mgicos e adivinhatrios ou a prticas alternativas no reconhecidas

    como psicolgicas, cuja legislao especfica da psicologia sobre esta matria nem

    sempre cumprida pelo prprio psiclogo.

    Ressalta-se que para uma outra parte da populao, com nvel de

    esclarecimento mais elevado acerca da psicologia, a imagem do psiclogo est

    associada a de um clnico especializado que atua em consultrio, como profissional

    autnomo e cujos servios somente so acessveis pequena camada da

    populao com condies financeiras para custear um atendimento psicoteraputico

    geralmente de carter prolongado.

    O desconhecimento sobre a psicologia pode ser detectado mesmo entre

    profissionais de sade (mdicos, odontlogos, enfermeiros, outros); observa-se que

    o apoio ou acompanhamento psicolgico ao paciente em tratamento de patologias

    crnicas considerado essencial pela maioria deste profissionais, entretanto, nem

    todos so capazes de explicitar os objetivos ou descrever o trabalho de um

    psiclogo dentro de uma instituio de sade.

    No campo da sade, observa-se a necessidade da adaptao de mtodos e

    tcnicas da psicologia clnica ao contexto hospitalar (ou de instituies de sade). A

    psicologia da sade precisa desvincular-se da manuteno de modelos de atuao

    clnica, centrados em atendimentos psicoteraputicos individualizados e restritos a

    consultrios localizados dentro do hospital, estimulando o trabalho do psiclogo no

    mbito da promoo e da preveno da sade. Conforme aponta Rey (1997), o

    desenvolvimento da psicologia da sade representou um questionamento aos

    modelos centrados na doena, destacando o carter social da interveno

    profissional. Entretanto, segundo o autor, a elaborao terica de um marco

    alternativo que servisse de base a esta nova rea, no se desenvolveu com a

    mesmo ritmo que caracterizou o surgimento de novas formas de interveno e

    prticas profissionais (p. 276).

    Tal anlise justifica a maior concentrao, em psico-oncologia, de trabalhos

    de interveno profissional, nem sempre sistemticos ou subsidiados por elementos

    tericos ou tcnicos suficientes. Outro fator responsvel parcialmente por esta

    realidade uma defasagem de qualidade na formao acadmica do estudante de

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  • psicologia; ainda so ainda poucos os cursos de graduao em psicologia que

    ofertam disciplinas ou que possuem formaes especficas para a atuao cientfica

    e profissional no campo da sade. Disciplinas de graduao, de carter optativo,

    com contedo concentrado em psico-oncologia so ainda mais raras. Tambm nem

    sempre adequada a formao em metodologia cientfica oferecida por grande

    parte do cursos de graduao em psicologia. A pesquisa cientfica em psicologia

    deveria ser entendida como pr-requisito obrigatrio para subsidiar intervenes

    profissionais, principalmente em reas emergentes ou sem corpo terico

    consistentemente elaborado, como o caso da psico-oncologia.

    Nos ltimos anos, a proliferao de cursos de graduao em psicologia, em

    todas as regies de pas, sem condies mnimas de funcionamento e sem controle

    dos rgos de educao competentes, indicam uma tendncia de reduo geral na

    qualidade e na competncia tcnica dos profissionais que se formam. Espera-se,

    com as reformulaes geradas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educao, que os

    cursos de graduao em psicologia possam flexibilizar seus currculos, cumprindo as

    diretrizes curriculares propostas pela Comisso de Especialistas em Ensino e

    Psicologia. Segundo o citado documento, por exemplo, a formao em psicologia

    deve basear-se nos seguintes eixos estruturantes: fundamentos epistemolgicos e

    histricos da psicologia, fenmenos e processos psicolgicos bsicos, fundamentos

    metodolgicos, procedimentos para investigao cientfica e prtica profissional,

    interfaces com campos afins de conhecimento e prticas em campos de atuao

    institucionais e sociais.

    Objetivando a continuidade do desenvolvimento da psico-oncologia, visando a

    produo de um corpo sistemtico de conhecimento, algumas sugestes podem ser

    encaminhadas. Em primeiro lugar, necessrio ampliar o espectro de situaes, em

    oncologia, em que o psiclogo est presente, abrangendo sub-especialidades de

    cncer cuja representatividade de trabalhos em congressos da rea mnima ou

    inexistente; este objetivo poder ser cumprido com a oferta de disciplinas

    especficas de psico-oncologia ainda nos cursos de graduao, com a ampliao

    dos cursos de ps-graduao em psicologia da sade e em psico-oncologia e com o

    estmulo insero profissional de psiclogos em instituies de sade, hospitalares

    ou no.

    essencial estreitar a relao entre a produo cientfica de conhecimento na

    rea e a prestao de servios profissionais especializados em psico-oncologia,

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  • elevando-se o nvel tcnico em que se d a interveno psicolgica junto ao

    paciente e equipe de sade, exigindo-se, ainda, a adequao terico-metodolgica

    dos profissionais demanda social que se instala. O psiclogo deve preocupar-se

    no apenas com a sua interveno profissional em psico-oncologia, mas tambm

    com os efeitos que ela proporciona, utilizando metodologias de mensurao de

    eficcia a curto e longo prazo.

    Tambm necessrio estimular a maior divulgao do conhecimento na rea,

    integrando pesquisadores e profissionais nos mesmos eventos e proporcionando a

    oportunidade para discusses tericas, tcnicas e prticas que envolvam todos

    aqueles que tem interesse na rea da sade, quer sejam profissionais autnomos,

    psiclogos lotados em servios de psicologia hospitalar, professores de psicologia e

    pesquisadores de rea bsica ou aplicada.

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