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2 Jorge Hessen€¦ · O Espiritismo sem o Cristo perde —o norte pág. 40 12. Praticar o Evangelho, sim! Ganhar dinheiro à custa do Cristo, nunca! — pág. 42 13. Reflexões históricas

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2 – Jorge Hessen

O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

Jorge Hessen

1ª edição: 28 de janeiro de 2020

São Paulo, Brasil

Revisão: Irmãos W.

Formatação: Ery Lopes

Produção digital e distribuição gratuita por:

Autores Espírita Clássicos

Portal Luz Espírita

3 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

Jorge Hessen

O ESPIRITISMO É CRISTÃO?

COM CERTEZA!

************************

“Fé inabalável é somente aquela que pode encarar a razão face a face,

em todas as épocas da humanidade”. ― Allan Kardec ―

************************

BRASIL – 2020

4 – Jorge Hessen

Índice

Introdução — pág. 5

1. Jesus, nascido há dois milênios, foi crucificado aos 38 anos de idade — pág. 7

Onde e quando nasceu Jesus? — pág. 10 2. Mitologia, Kardec e Maria - uma reflexão sobre natureza biológica de Jesus — pág. 12 3. "Jesus é o emergir de um arquétipo plasmado no inconsciente coletivo”? — pág. 15 4. Doutrina dos Espíritos sem Jesus não faz sentido — pág. 19 5. Legítima visão espírita de Jesus de Nazaré — pág. 22 6. Netflix e o grupelho Porta dos fundos achincalham o Cristo e os cristãos — pág. 24 7. A convertida de Migdol, uma Apóstola de Jesus — pág. 29 8. Jesus foi com toda pujança o Mestre por excelência — pág. 31 9. Algumas anotações doutrinárias sobre Jesus: diálogo com uma confreira — pág. 35 10. Jesus e a marcha da deformidade espírita — pág. 38 11. O Espiritismo sem o Cristo perde o norte — pág. 40 12. Praticar o Evangelho, sim! Ganhar dinheiro à custa do Cristo, nunca! — pág. 42 13. Reflexões históricas e as defecções do cristianismo sem Jesus — pág. 45

13-a. Discurso pronunciado no célebre Concílio de 1870, pelo Bispo Strossmayer — pág. 47

14. A Terceira Revelação é a personificação de Jesus que retorna ao mundo — pág. 54

5 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

Introdução

Ainda encontramos "espíritas" que questionam o aspecto cristão da

Terceira Revelação. Negam a excelsitude de Jesus Cristo com evidente descontrole

emocional, referindo-se ao Mestre como se Ele fosse um homem vulgar. Para esses

seres apalermados em suas fanfarras imaginárias, alertamos o seguinte:

ESPIRITISMO É CRISTÃO, SIM!

É verdade que pouco importa os teimosos desencontros e controvérsias a

respeito do Cristo, o essencial, para os que se esforçam por segui-Lo, é sentir e

praticar os Seus ensinamentos. Há os que no outro extremo O confundem com o próprio Criador. Mas, sob o

ponto de vista da lógica kardeciana, a humanização de Jesus torna os cristãos mais

esperançosos na autotransformação moral, pois leva seus seguidores a serem mais

disciplinados e conscienciosos. Do contrário, a “deificação de Jesus” faz do “MODELO

e Guia” uma entidade inalcançável, e assim torna suas lições inexecutáveis, pois são

atos próprios à vida de um “extraterrestre” ou do próprio “Deus” (para os místicos).

Na Terra, onde se multiplicam as conquistas da inteligência, algumas

resvalam e se enterram nas valas rasas das retóricas vazias, e fazem-se mais

complexos os quadros do sentimento amarfanhado no materialismo, saibamos que

Ele (Jesus) no campo da Humanidade [foi o único] orientador completo,

irrepreensível e inquestionável, que renunciou à companhia dos anjos para viver e

conviver com os homens. Sem Jesus, o Espiritismo deteriora e acaba! Fazendo coro com as sábias

palavras de Chico Xavier, relembramos que o Mestre Jesus está na nossa experiência

cotidiana. Tanto é verdade, que em nossas agruras e dissabores pungentes, o

primeiro nome de que nos lembramos, capaz de nos proporcionar alívio e reconforto, é JESUS.

Nos tempos áureos do Evangelho o apóstolo Pedro, mediunizado, definiu a

transcendência de Jesus, revelando que Ele era "o Cristo, o Filho de Deus vivo". No

século XIX o Espírito de Verdade atesta ser Ele "o Condutor e Modelo do Homem".

6 – Jorge Hessen

Para o célebre pedagogo e gênio de Lyon, o Cristo foi "Espírito superior da ordem

mais elevada, Messias, Espírito Puro, Enviado de Deus e, finalmente, Médium de

Deus."

Não há dúvidas que Jesus foi o Doutrinador Divino e por excelência o "Médico

Divino", segundo André Luiz. Por sua vez, Emmanuel o denomina de "Diretor angélico

do orbe e Síntese do amor divino". Jesus é o Caminho, a Verdade e a Vida.

Jorge Hessen

Brasília, 23 de janeiro de 2020

7 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

1

Jesus, nascido há dois milênios,

foi crucificado aos

38 anos de idade

O nascimento de Jesus é o episódio que, tradicionalmente, demarca o início

da era cristã. Porém, em face de um erro de cálculo, cometido no século 6 d.C., pela

Igreja, as datas não coincidem. Sabe-se, atualmente, que Jesus nasceu antes do ano 1,

provavelmente, entre 6 e 5 a.C. Pode-se afirmar isso, com razoável segurança, graças

à narrativa muito precisa do Evangelho de Lucas.

Segundo o evangelista, o fato aconteceu na época do recenseamento,

ordenado pelo imperador romano César Augusto. Esse censo, o primeiro realizado na

Palestina, tinha por objetivo regularizar a cobrança de impostos. Os historiadores

estão de acordo em situar tal fato político no período que vai de 8 a 5 a.C.

O Papa João Paulo II declarou, numa ocasião, que Jesus não nasceu no ano 1,

pois a data correta do natalício do Mestre, ainda, era desconhecida, conforme informa

a revista Veja, de janeiro de 1987. Curiosamente, a enciclopédia O Mundo do Saber1,

registra: Jesus nasceu em Belém-Judeia, em 4 a.C. Ante muitas controvérsias sobre a questão, colhemos informes no seio da

própria Igreja, quando, no século VI (525 a D.), o sacerdote Dionísio, fanático por

matemática, recebendo a incumbência para "descobrir" a data exata do nascimento

do Cristo, fixou-a no ano 754, do calendário romano2, e que foi aceita pela cúpula da

Igreja Católica. Mas, o clérigo Dionísio começou a pesquisa partindo de uma premissa

equivocada, pois, manteve como referência o batismo do Mestre, ocorrido no 15º ano

do governo do Imperador Tibério César3 e tinha absoluta convicção (à época) de que

o imperador romano iniciou o governo no ano 14; a conclusão foi "lógica", 14+15=29,

onde tentou buscar confirmação no Novo Testamento, quando Lucas, no Capítulo 3,

versículo 23, registra ter sido Jesus batizado com 29 anos de idade (!!??...). Outro fato histórico relevante, é que Tibério César governava o Império

1 Enciclopédia O Mundo do Saber, Editora Delta-Volume 1.

2 2761 anos já se passaram da fundação de Roma.

3 Lucas, 3: 1 a 6.

8 – Jorge Hessen

desde o ano 9 d. C.; logo, o equívoco do padre matemático subtraiu, de 4 a 5 anos, da

história cristã, cronologicamente regida pelo calendário gregoriano4. Aliás, erro já

devidamente assumido pelo Vaticano.5

Existe outro fator que comprova o erro de cálculo de Dionísio: sabemos,

pela tradição dos textos das escrituras, que Herodes, o Grande, quando teve notícia

do nascimento do Cristo, ordenou a matança de todas as crianças nascidas, nos dois

últimos anos, em Belém e cercanias da Judéia. Na ocasião, Maria e José, pais de Jesus,

refugiaram-se em outro país (Egito).

Ora, a História se encarrega de registrar que Herodes morreu, exatamente,

no ano que nasceu Jesus (mesmo ano da ordem do infanticídio generalizado), logo,

pelos dados que possuímos, considerando-se o calendário de Roma, e se Jesus era, de

fato, um recém-nascido à época da matança, atualmente estaríamos em 2015.

Na obra Sabedoria do Evangelho, afirma-se que Jesus teria, ao menos, 38

anos ao ser crucificado. Outros autores concordam com essa tese. O escritor John

Drane coloca o nascimento de Jesus no ano 5, antes da Era Cristã.6 O Gen. Milton

Orreilly, exegeta, num artigo para a Revista Presença Espírita, de Salvador, Bahia,

afirma que o Diácono Dionísio, o pequeno, errou ao estabelecer o início da Era Cristã.

Afirma ele que o nascimento se deu no ano 747 da fundação de Roma, e a crucificação

no ano 785, portanto, Ele teria 38 anos quando foi crucificado, pois, 785 - 747 = 38.7

Ainda, sobre o isso, compulsamos o livro Crônicas de Além-Túmulo, ditado

pelo Espírito Humberto de Campos, psicografado por Francisco Cândido Xavier, e

encontramos, no capítulo intitulado "A Ordem do Mestre", o curioso trecho: "João —

disse o Mestre — lembraste do meu APARECIMENTO na Terra? Recordo-me Senhor.

Foi no ANO 749 da era romana, apesar da arbitrariedade do frei Dionísio, que,

calculando no século VI, da era cristã, colocou, ERRADAMENTE, o vosso natalício em

754 (...)". (grifamos).

A propósito, diante dessas alusões controversas, somos também impelidos

a levantar a seguinte questão: teria nascido Jesus no dia 25 de dezembro, conforme

reza a tradição do Vaticano? Não encontramos nenhuma referência histórica que

venha corroborar essa versão. Atualmente, os estudiosos têm como certo que o 4 O calendário gregoriano, aceito nos nossos dias em praticamente todo o mundo, só passou a vigorar a partir de 1582, quando foi promulgado pelo Papa Gregório XIII, tendo posteriormente sido gradualmente aceite por todos os países.

5 Tibério César sucedeu Augusto que morreu no dia 19 de agosto do 767 da fundação de Roma, 14 da nossa era, quando assumiu de fato o título de César e começou a governar. Portanto, João começou a pregar no ano 28. O batismo de Jesus, antes da Páscoa de 29, estava com 35 anos. E na crucificação ocorrido no ano 31 da nossa era, 784 da fundação de Roma, Jesus tinha 38 anos de idade.

6 O historiador judeu Josefo, afirma que Herodes morreu nos primeiros meses do ano 4 a. C. após um eclipse da lua, que ocorreu entre 13 e 14 de março do ano 4 a. C. Portanto, pelo calendário vigente o Rei Herodes, o infanticida, teria morrido quatro anos antes de Jesus nascer! Há muitos estudos históricos e astronômicos sobre isso.

7 disponível no site http://ceirmajacyra.weebly.com/o-nascimento-de-jesus.html, acesso em 12 de dezembro de 2019.

9 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

festejado NATAL substituiu uma celebração pagã — a "Saturnais", uma homenagem a

Saturno (deus da agricultura pela tradição latina),8 realizada, sempre, no solstício de

inverno, isto é: o dia mais curto do ano na região de Roma, pelo fato de o sol nascer

mais tarde e se pôr mais cedo no horizonte.

Por isso, não é preciso fazermos um esforço descomunal de raciocínio para

entendermos a lógica de a maior festa da cristandade representar, atualmente, uma

celebração, demasiadamente, comprometida com as incompatíveis ambições do

mundo comercial. É o Natal comercial, com a sua mentalidade utilista, que já

contaminou toda a nossa sociedade.

Nada se esquece: presentes, "suaves" bebidas alcoólicas, mesas fartas,

abraços festivos (nem sempre sinceros e demasiadamente convencionais), cartões de

"boas festas", pagodes, esfuziantes sambinhas (pelo menos aqui nas terras do

Cruzeiro do Sul), marchinhas carnavalescas, enfim, será que realmente se lembra do

suposto "aniversariante"?

Como se não bastassem as contradições históricas, há, ainda, o problema da

localidade do Seu nascedouro. Mateus, seguido por Lucas, afirma que Jesus nasceu

em Belém — hoje, em território palestino. Essa afirmação chegou a ser contestada

por alguns estudiosos contemporâneos, pois Belém era a cidade de Davi e, segundo a

tradição, o Messias esperado deveria surgir entre a descendência desse antigo rei de

Israel.

Situar o nascimento em Belém — dizem os muitos estudiosos — era uma

forma de legitimar Jesus na condição de Messias. Embora interessante esse raciocínio

crítico, não se apoia em nenhuma prova convincente. Lucas, ao contrário, oferece um

bom argumento a favor de Belém: José, o esposo de Maria, futura mãe de Jesus,

pertencia a uma família originária daquela cidade e a regra do recenseamento exigia

que cada indivíduo se alistasse em sua localidade de origem. Por isso, a maioria dos

especialistas aceita Belém sem reservas.

Obviamente, na condição de espíritas, sabemos que pouco importa os

teimosos desencontros e controvérsias a respeito da data e local correto do

nascimento do Cristo, até porque, o essencial, para os que se esforçam por segui-Lo, é

sentir e praticar os Seus ensinamentos, e, em face disso mesmo, fazemos uma

adaptação às ideias de Vinícius (pseudônimo de Pedro de Camargo), no seu artigo

publicado em o Reformador, da FEB, em 1929. Ei-la:

8 O 25 de dezembro é obviamente uma data simbólica. Nesse dia, como vimos (Saturnais) ocorria em Roma o festival pagão do Solis Invictus (Sol Invencível). Realizado logo depois do solstício de inverno — quando o percurso aparente do Sol ocupa sua posição mais baixa no céu — o evento celebrava o triunfo do astro, que voltava a ascender no firmamento. Muito cedo, os cristãos associaram as virtudes solares a Jesus, atribuindo-lhe várias qualidades do deus Apolo. Isso aconteceu por volta do ano 330 D.C.

10 – Jorge Hessen

Onde e quando nasceu Jesus?

Perguntemos para Maria de Magdala e ela nos responderá:

— Jesus nasceu em Betânia. Foi certa vez, que a sua voz, tão cheia de pureza e santidade, despertou em mim a sensação de uma vida nova com a qual, até então, jamais sonhara.

Perguntemos a Pedro e ele nos responderá:

— Jesus nasceu no pátio do palácio de Caifás, na noite em que o galo cantou pela 3ª vez, no momento em que eu o havia negado. Foi neste instante que acordou minha consciência para a verdadeira vida.

Perguntemos a João, o evangelista, e ele nos responderá:

— Jesus nasceu no dia em que meu entendimento, iluminado pela sua divina graça, me fez saber que Deus é amor.

Perguntemos a Thomé, o discípulo incrédulo, e ele nos responderá:

— Jesus nasceu em Jerusalém, naquele dia memorável e inesquecível em que Ele nos pediu para tocar as suas chagas e me foi dado testemunhar que a morte não tinha poder sobre o filho de Deus. Só então compreendi o sentido de suas palavras: EU SOU O CAMINHO A VERDADE E A VIDA.

Perguntemos a Dimas, o bom ladrão, e ele nos responderá:

— Jesus nasceu no topo do calvário, precisamente, quando a cegueira e a maldade humanas pensavam aniquilá-Lo para sempre. Naquele instante Ele me dirigiu um olhar cheio de ternura e piedade, que me fez esquecer todas as misérias deste mundo e perceber as maravilhas do céu...

Perguntemos a Paulo de Tarso e ele nos responderá:

— Jesus nasceu na Estrada de Damasco, quando, envolvido por intensa luz que me deixou cego, pude ver a sua figura nobre e serena que me perguntava: - Saulo, Saulo, por que me persegues? E, na cegueira, passei a enxergar um mundo novo quando eu lhe disse: Senhor, o que queres que eu faça?

Perguntemos a Joana de Cusa e ela nos responderá:

— Jesus nasceu no dia em que, amarrada ao poste, no circo de Roma, eu ouvia o povo gritar: — Negue! Negue! E o soldado, com a tocha acesa dizendo: — Este teu Cristo ensinou-lhe apenas a morrer? Foi neste instante que, sentindo o fogo subir pelo meu corpo, pude, com toda clareza e sinceridade, dizer: — Não me ensinou apenas isto, Jesus me ensinou, também, a amá-Lo.

Perguntemos à mulher de Samaria e ela nos responderá:

— Jesus nasceu junto à fonte de Jacob, na tarde em que me pediu de beber e me disse: — Mulher, eu posso te dar da água que sacia toda a sede, pois vem do amor de Deus e santifica as criaturas. Naquela tarde, soube que Jesus era, realmente, um profeta

11 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

de Deus e lhe pedi: — Senhor, dá-me desta água!

Perguntemos a João Batista e ele nos responderá:

— Jesus nasceu no instante em que, chegando ao rio Jordão, pediu-me que o batizasse. E, ante a meiguice do Seu olhar e a majestade da Sua figura pude ouvir a mensagem do alto: "Este é o meu filho amado, no qual pus a minha complacência!" E compreendi que chagara o momento d’Ele crescer e eu diminuir, para a glória de Deus.

Perguntemos à mulher pecadora e ela nos responderá:

— Jesus nasceu na praça pública de Cafarnaum, quando, colocada na Sua frente, Ele olhava para a multidão que reclamava o meu apedrejamento, serenamente falou "Aquele que estiver sem pecado atire a primeira pedra. Passado algum tempo, tomou as minhas mãos, levantou-me do chão e perguntou: — Mulher, onde estão os teus juízes? Ninguém te condenou? Também Eu não te condeno. Vai e não peques mais. Saí dali, experimentando uma sensação nova no meu espírito que transformou a minha vida.

Perguntemos a Lázaro e ele nos responderá:

— Jesus nasceu em Betânia, na tarde em que visitou o meu túmulo e disse: — Lázaro, levante e venha para fora. Naquele momento compreendi, finalmente, que Ele era a Ressurreição e a vida.

Perguntemos a Judas Iscariotes e ele nos responderá:

— Jesus nasceu no instante em que eu assistia a Seu julgamento e condenação, e as 30 moedas que recebera em pagamento, por tê-Lo entregue aos juízes, queimavam em minhas mãos. Ao devolvê-las para os sacerdotes, compreendi que Jesus estava acima de todos os tesouros terrenos e era, verdadeiramente, o Messias.

Perguntemos, finalmente, a Maria de Nazaré, onde e quando nasceu Jesus, e ela nos responderá:

— Jesus nasceu em Belém, sob as estrelas, que eram focos de luzes guiando os pastores e suas ovelhas ao berço de palha. Foi quando o segurei em meus braços pela primeira vez, que senti cumprir-se a promessa de um novo tempo, através daquele Menino que Deus enviara ao mundo, para ensinar aos homens a lei maior do amor. Agora pensemos um pouquinho: E para nós, quando e onde nasceu Jesus?

Uma vez demonstradas as evidentes contradições cronológicas acerca do

nascimento de Jesus, com informações e materiais de pesquisa para os estudiosos,

estamos convictos de que a nossa maior tarefa, nos naturais anseios de aprender,

será, invariavelmente, aperfeiçoar nosso ser aos moldes das magnas lições do Eterno

Amigo da Humanidade.

12 – Jorge Hessen

2

Mitologia, Kardec e Maria

- uma reflexão sobre natureza

biológica de Jesus

Os evangelhos de Lucas e Mateus descrevem que Maria manteve-se

“virgem” e que Jesus hipoteticamente fora concebido pelo "Espírito Santo", ou seja, a

concepção de Maria acontecera de forma "sobrenatural", sem a participação do

esposo, conquanto já fosse recém-casada com José à época.

A crença na virgindade de Maria e a suposta “fecundação divina” nada mais

é senão uma “fotocópia” rudimentar, diríamos, uma imitação burlesca, dos mitos

pagãos organizados pelas castas sacerdotais ancestrais. A explicação desses pormenores históricos é indispensável ao espírita, para

preservar-lhe contra as deturpações místicas impostas por longos anos pela

tradicional instituição “unificadora” do Brasil. Até porque pesquisas e estudos sobre

a fábula mitológica, bem como da História das Religiões, comprovam de maneira

categórica a origem da alegoria do nascimento virginal. Indubitavelmente o Evangelho sofreu a influência da mitologia grega. Por

isso, devemos separar o mito helênico do que é ensinamento moral. A rigor, foi

exatamente por isso que Allan Kardec, ao publicar O Evangelho Segundo o

Espiritismo, transcreveu tão somente o ensino moral de Jesus. Historicamente, a “virgindade” de Maria embrenhou-se de tal forma no

imaginário coletivo dos cristãos que se incorporou ao seu nome. É verdade! A “virgem Maria” transformou o filho Jesus em vulto mitológico, e nada melhor para

exaltar o “homem-deus” do que situá-lo como filho de uma “virgem”. Por falar nisso, Allan Kardec fez oportuno ensaio comparativo a respeito das teorias do pecado

original e da virgindade de Maria, situando a mãe de Jesus como virgem, não do

ponto de vista biológico, mas sob o enfoque espiritual.9 Em conformidade com determinadas narrativas do Evangelho, Maria teria

recebido a visita lendária de um “anjo” de nome Gabriel, o qual anunciou à jovem sua

“fecundação” através da intervenção do "Espírito Santo". Ora, a Doutrina Espírita nos 9 KARDEC, Allan. Revista Espírita, janeiro de 1862, Brasília: Ed. Edicel, 2002

13 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

convida a desenvolver uma fé raciocinada, analisando sensatamente as narrativas do

Evangelho.

Ante os dilemas interpretativos dos conceitos literais escritos pelos

apóstolos, o Codificador advertiu que a religião deve caminhar em consonância com a

ciência, de modo que a primeira não ignore a última, e vice-versa.

Cá para nós, qual seria a desonra de Maria sobre a maternidade segundo as

leis biológicas? Teria ela traído José e se “corrompido moralmente” conforme já

ouvimos de alguns? O que pensar da oblata suprema de Jesus no Calvário se seu

corpo fosse um sortilégio “quintessenciado”? Seria uma representação ridícula!

Será que dá para conceber o Cristo (MODELO) imune de dor, em face do

seu corpo ser energeticamente “sutilizado”, enquanto os primeiros cristãos

mergulhados na carne seriam devorados pelas feras nas arenas romanas?

Não paira nenhuma dúvida de que Maria foi um Espírito muito elevado

moralmente, razão pela qual recebeu a missão sublime de gestar o “MODELO e Guia”

da humanidade. Porém, Jesus foi ridiculamente transformado numa figura mitológica

e, sendo um “ídolo deificado”, não poderia ter nascido do “pecado original” das

tradições adâmicas.

O fato de Jesus ter sido concebido de forma “milagrosa” contradiz as vias

naturais de reprodução humana, e para a Doutrina dos Espíritos esta é uma questão

de elevadíssima importância, uma vez que a fecundação biológica é uma decorrência

das Leis Naturais.

Em resumo, reafirmamos que a fecundação de Maria se deu por vias

decididamente normais, através da respeitosa comunhão sexual com seu esposo, tal

como ocorre entre todos os casais equilibrados da Terra.

Em face disso, Kardec apresenta Jesus como o MODELO mais perfeito para a

evolução humana; logo, o seu corpo deveria ter a mesma constituição biológica

daqueles aos quais ele deveria servir de MODELO, e seu testemunho basear-se na

subordinação às leis naturais.

Ah!, dizem que a ciência pode gerar um humano através da fertilização in

vitro ou outros métodos não uterinos. Ora, ainda que o perispírito de Jesus seja o

mais puro da Terra, Ele não derrogaria as leis de reprodução. Portanto, Jesus não

poderia aparentar estar biologicamente encarnado, senão o período da manjedoura

até a cruz teria sido um simulacro de um ilusionista amador ou uma caricata

encenação teatral.

Sob o ponto de vista da lógica kardeciana, a humanização de Jesus torna os

cristãos mais esperançosos na autotransformação moral, pois leva seus seguidores a

serem mais disciplinados e conscienciosos. Do contrário, a “deificação de Jesus” faz

14 – Jorge Hessen

do “MODELO e Guia” uma entidade inalcançável, e assim torna suas lições

inexecutáveis, pois são atos próprios à vida de um “extraterrestre” ou do próprio

“Deus” (para os místicos).

A concordância com o “Jesus mitológico” abre precedentes para outros

entendimentos igualmente lendários a respeito da vida e do legado do Mestre de

Nazaré, mas infelizmente, apesar de serem ideias extravagantes, acabam sendo

admitidas como verdadeiras a partir da aceitação de premissas ingênuas.

Como analisamos, o Espiritismo alerta para uma visão da natureza biológica

de Jesus, desmistifica a virgindade de Maria, mostrando sua grandeza maternal.

A legítima literatura espírita juntamente com os ensinamentos recebidos

dos espíritos superiores (durante a Codificação) garante que Deus jamais quebraria a

harmonia das leis da natureza. Por que haveria Jesus de desrespeitar a lei de

reprodução biológica?

15 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

3

Jesus é somente o emergir de um

arquétipo plasmado no

inconsciente coletivo?

Stephen Sawyer, desenhista que vive em Kentucky, EUA, autor das imagens

do Cristo com peitoral tatuado, braços musculosos, recentemente publicadas na capa

do jornal The New York Times, inventou o projeto Art4God para tentar aproximar os

jovens do “cristianismo”.

Sawyer acredita-se um legítimo pregador (!?...) do Messias de Nazaré.

Através de livros, revistas e blogs, Stephen tem viajado os Estados Unidos divulgando

a sua bizarra ideologia, retratando a figura máscula de Jesus igualando-O a um super-

herói.

Embora os desenhos sejam absolutamente grotescos e chocantes, é muito

difícil em uma sociedade aberta, democrática e plural como a nossa, evitar

expressões como essas, ou opiniões e teses, tenham elas ou não caráter histórico,

científico, religioso ou moral, público ou privado.

Todavia, o Espiritismo preconiza e defende a liberdade de expressão

responsável, ou seja, quando exercida de forma justa e respeitosa, de modo que não

venha a agredir ou desmerecer o direito de crença do seu semelhante.

A partir do momento que Deus dotou de razão o homem e lhe conferiu o

livre-arbítrio, permitiu dessa forma que o mesmo abrace o caminho que espera ser o

mais acertado para ele, tornando-o responsável pelas suas preferências. Quem somos

nós para impor a quem quer que seja a nossa vontade, ou aquilo que acreditamos ser

o melhor?

Todavia, quando lemos a matéria relativa à veiculação da imagem de Jesus,

igualando-O aos chamados homens “sarados”, ficamos extremamente indignados,

pois guardamos a certeza de que a memória e imagem do Mestre devem ser

respeitadas e veneradas no alcance máximo da liberdade humana.

É bem verdade que os espíritas não idolatram nenhum mensageiro em

pinturas, fotos, esculturas, etc., Mas, esse comportamento de Sawyer cremos ser uma

violentação gratuita e inteiramente desnecessária como tantos outros desrespeitos já

16 – Jorge Hessen

praticados sob a “proteção” da vilipendiada liberdade de expressão, que culmina

atingindo o sentimento de todos aqueles que têm Jesus como exemplo de moral,

caráter, bondade, amor, humildade.

No que tange à aparência de Jesus, sabe-se que atualmente não existe uma

unanimidade de como ele era realmente. Mas, Públio Lêntulos dizia que:

“Ele era belo de figura e atraia os olhares. Seu rosto inspirava amor e temor ao mesmo tempo. Seus cabelos eram compridos e louros, lisos até as orelhas, e das orelhas para baixo cresciam crespos anelados. Dividia-os ao meio uma risca e chegavam-lhes aos ombros segundo o costume da gente de Nazareth. As faces cobriam de leve rubor. O nariz era bem contornado, e a barba crescia, um pouco mais escura do que os cabelos, dividida em duas pontas. Seu olhar revelava sabedoria e candura. Tinha olhos azuis com reflexos de várias cores. Este homem amável ao conversar, tornava-se terrível ao fazer qualquer repreensão. Mas mesmo assim sentia-se Nele um sentimento de segurança e serenidade. Ninguém nunca o via rir.

”Muitos, no entanto, O tinham visto chorar. Era de estatura normal, corpo ereto, mãos e braços tão belos que era um prazer contemplá-los. Sua Voz era grave. Falava pouco. Era modesto. Era belo quanto um homem podia ser belo".10

Como se observa há dois mil anos havia um Homem incomum, entre os

milhões de habitantes terrestres... E Esse Homem singular veio tornar-se o centro da

história da humanidade. Muito mais do que isso: Ele se tornou um marco para a

história da humanidade, de tal modo que até o tempo histórico é contado tendo-O

como referência.

Como se não bastasse, em meio à crescente proliferação de ideias

esdrúxulas sobre o Cristo, há infelizmente no seio do movimento espírita os que

desejam ver Jesus banido das hostes doutrinárias. São arautos caolhos que têm

deturpado a legítima concepção espírita sobre o Meigo Rabi da Galileia. São

bonifrates das trevas que espalham as extravagantes ideias do tipo: "Jesus é somente

o emergir de um arquétipo plasmado no inconsciente coletivo".

Nos seus devaneios, tais títeres atestam que, de “tudo quanto a civilização

cristã reteve de Jesus, nesses dois milênios, muito mais há de mito.” Enxovalham

nossas mentes com afirmativa: — "Nosso Jesus não é o mítico Governador do Planeta,

aquele que vive, entre Anjos e Tronos, na bela ficção literária de Humberto de

Campos" e, ainda, regurgitam outras pérolas frasais como:

— "Nosso Jesus, inteiramente homem, não evoluiu em linha reta" e, mais

ainda, vociferam: — "Jesus não criou nenhuma nova moral. Apenas interpretou,

adequadamente, aquela que sempre esteve no coração do homem por todos os

tempos e lugares.”! Que talento! Tratam, o mais supremo dos seres da criação como 10 Descrição tradicional feita pelo pró-consul Públios Lentulos.

17 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

um "João ninguém".

Na Terra, onde se multiplicam as conquistas da inteligência (algumas

resvalam e se enterram nas valas profundas das retóricas vazias) e fazem-se mais

complexos os quadros do sentimento amarfanhado no materialismo, saibamos que

Ele (Jesus) no campo da Humanidade [foi o único] orientador completo,

irrepreensível e inquestionável, que renunciou à companhia dos anjos para viver e

conviver com os homens.

Nos tempos áureos do Evangelho o apóstolo Pedro, mediunizado, definiu a

transcendência de Jesus, revelando que Ele era "o Cristo, o Filho de Deus vivo".11 No

século XIX o Espírito de Verdade atesta ser Ele "o Condutor e Modelo do Homem".12

Para o célebre pedagogo e gênio de Lyon, o Cristo foi "Espírito superior da ordem

mais elevada, Messias, Espírito Puro, Enviado de Deus e, finalmente, Médium de

Deus".13 Não há dúvidas que Jesus foi o Doutrinador Divino14 e por excelência o

"Médico Divino", segundo André Luiz.15 Por sua vez, Emmanuel o denomina de

"Diretor angélico do orbe e Síntese do amor divino".16

Para a maioria dos teólogos, Jesus é objeto de estudo, nas letras do Velho e

do Novo Testamento, imprimindo novo rumo às interpretações de fé. Para os

filósofos, Ele é o centro de polêmicas e cogitações infindáveis. Para nós espíritas,

Jesus foi, é e será sempre a síntese da Ciência, da Filosofia e da Religião.

"Tudo tem passado nestes dois mil anos, na Terra, mas a [Sua] Palavra brilha como

um Sol sem ocaso, guiando as ovelhas tresmalhadas, os cordeiros perdidos do

Rebanho de Israel à porta do aprisco, para restituí-los ao Bom Pastor".17 O

Espiritismo vem colocar a Mensagem do Cristo na linguagem da razão, com

explicações racionais, filosóficas e científicas, mas, vejamos bem, sem

abandonar, sem deixar de lado o aspecto emocional que é colocado na sua expressão

mais alta, tal como o pretendeu Jesus, ou seja o sentimento sublimado, demonstrando

assim que o sentimento e a razão podem e devem caminhar pela mesma via, pois

constituem as duas asas de libertação definitiva do ser humano.

Inobstante não ser a experiência humana uma estação de prazer, por isso,

continuemos trabalhando no ministério do Cristo, recordando que, por servir aos

outros, com humildade, sem violências e presunções, Ele foi tido por imprudente e 11 Mateus, 13: 16-17.

12 KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, RJ: Ed. FEB, 2001, questão 625.

13 KARDEC, Allan. A Gênese, RJ: Ed. FEB, 1998, XV, item 2.

14 XAVIER, Francisco Cândido. Os Mensageiros, Ditado pelo Espírito André Luiz, RJ: Ed FEB, 2000, cap. 27).

15 XAVIER, Francisco Cândido. Missionário da Luz, Ditado pelo Espírito André Luiz, RJ: Ed FEB 2003, cap. 18.

16 XAVIER, Francisco Cândido. O Consolador, Ditado pelo Espírito Emmanuel, RJ: Ed FEB 2001, 283 e 327.

17 SCHUTEL, Cairbar. Parábolas e ensinos de Jesus, SP: ed. O Clarim - Matão, 1993.

18 – Jorge Hessen

rebelde, transgressor da lei e inimigo da população, sendo escolhido por essa mesma

multidão para receber com a cruz a gloriosa coroa de espinhos, mas sob o influxo do

bom ânimo Ele venceu o mundo!

O Cristo é o modelo de virtudes para todos os homens . E mais ainda. Jesus

Cristo é incomparável em face da dedicação e a santidade que Ele dispensa à

Humanidade. Nós, que ainda estamos mergulhados nos pântanos das questiúnculas

teológicas, não temos parâmetros para avaliar a Sua magna importância para o

Espiritismo, isto porque a Sua excelsitude se perde na escura bruma indevassável dos

milênios.

Dizemos mais: O Espiritismo sem Jesus pode alcançar as brilhantes

expressões acadêmicas, mas não passará de atividade fadada a modificar-se ou

desintegrar-se, como todas as conquistas superficiais da Terra. E o espírita cristão,

que não cogitou da sua iluminação com o Evangelho do Mestre, pode ser virtuose da

inteligência, Phd de qualquer coisa e filósofo, com as mais subidas aquisições

científicas, mas estará sem bússola e sem norte no momento do “furacão” inevitável

da dor moral.

Temos dito!

19 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

4

Doutrina dos Espíritos sem Jesus

não faz sentido

Mais uma vez levantamos a questão sobre o surradíssimo realejo dos que

intentam banir o Cristo da Doutrina Espírita, para transformá-la — pasmem! —

Numa espécie de academia de "doutores antimísticos". Volto ao tema, porque tais

confrades têm se colocado como vítimas da pecha de afugentadores do Mestre Maior

das hostes doutrinárias. Trôpegos, cavalgam, suspirando a falácia de que peregrinam

o calvário da xenofobia contra eles.

É evidente que há um estranho movimento de alguns confrades, para

expulsar Jesus do Espiritismo ou, pelo menos, reduzi-lo a mera figura de segundo

escalão no ideário espírita, iniciativa infeliz que esbarra na firme convicção do

próprio Kardec, que o reconhece como a figura mais importante da Humanidade. Os discípulos de Angeli Torterolli (aquele que insultou várias vezes Bezerra

de Menezes no século XIX, na famigerada luta entre "místicos e científicos"), nos dias

de hoje, alguns desenterram ossos e relembram-lhe o nome como uma das figuras

mais expressivas(?!) e desconhecidas do movimento espírita brasileiro. Tais coveiros criticam Chico Xavier e Emmanuel (na afirmação de que, por

ter sido o Padre Manuel da Nóbrega, estava trazendo influência católica) para o

Espiritismo e, — acreditem! — afirmam que o "Kardec brasileiro" era mariólatra e

nunca abandonou sua simpatia pelo catolicismo(?!). Achincalham, até, a figura do pioneiríssimo Olympio Teles de Menezes,

alcunhando-o de espiritólico, pois, que conciliava os princípios espíritas com algumas

crenças católicas. As trevas são poderosas? Claro! Atualmente, essas tropas, disfarçadas de

espíritas, infiltradas no movimento doutrinário brasileiro, querem separar a parte

científica, filosófica e religiosa da Doutrina, afirmando que o Espiritismo não é

religião, ou seja, estão querendo colocar Jesus como coadjuvante do projeto do

Espiritismo. As hordas das regiões densas são poderosas e se "organizam", uma vez que

têm, como meta, a retirada de Jesus dos estudos espíritas. Se conseguirem retirar o

20 – Jorge Hessen

Cristo da Doutrina Espírita, a casa espírita se transforma em escola de fantoches da

ilusão, vira circo mesmo, vira comédia! Se abolirmos os estudos evangélicos do

projeto espírita, vira negócio estranho, lembrava nosso velho Chico.

Sejamos lúcidos e francos: Sem Jesus, o Espiritismo deteriora e acaba!

Fazendo coro com as sábias palavras de Chico Xavier, relembramos que o Mestre

Jesus está na nossa experiência cotidiana. Tanto é verdade, que em nossas agruras e

dissabores pungentes, o primeiro nome de que nos lembramos, capaz de nos

proporcionar alívio e reconforto, é JESUS. (...)

No filosofismo desses obsedados, usa-se o reforço de palavras ocas, através

de arranjos de definições e conceitos que sempre giram em torno de um mesmo eixo,

qual rosca-sem-fim, e sem avanços efetivos. Confrades esses, encabrestados por

astutos cavaleiros das brumas umbralinas, atestam que Kardec escreveu o Evangelho

para apaziguar os teólogos, tentando uma aproximação com a Igreja (!)

Nesse desenfreado galope de raciocínio, desrespeitam a seriedade do ínclito

Druida de Lyon. Arremessam, na estribaria, o caráter ilibado de Kardec e a firmeza de

suas convicções. O bom senso nos sussurra, obviamente, que os teólogos ortodoxos

não ficaram satisfeitos com o terceiro livro do Pentateuco Kardeciano.

Pensam que é só isso? Não, tem mais! Então, vejamos: apregoam, esses

vanguardeiros da arrogância, que é necessário atualizar e contextualizar o

pensamento do Codificador. Que os centros espíritas precisam se transformar em

centros de cultura espírita, sem as amarras do religiosismo decrépito e ultrapassado.

São, inequivocamente, androides das trevas que espalham as esdrúxulas

ideias: "Jesus é somente o emergir de um arquétipo plasmado no inconsciente

coletivo". Nesse arroubo de supremo reducionismo, atestam que, de tudo quanto a

civilização cristã reteve de Jesus, nesses dois milênios, muito mais há de mito.

Enxovalham nossas mentes com afirmativa do tipo:

— "Nosso Jesus não é o mítico Governador do Planeta, aquele que vive,

entre "Anjos e Tronos", na bela ficção literária de Humberto de Campos" e, ainda,

regurgitam outras pérolas frasais como: — "Nosso Jesus, inteiramente homem, não

evoluiu em linha reta" e, mais ainda, cacarejam: — "Jesus não criou nenhuma nova

moral. Apenas interpretou, adequadamente, aquela que sempre esteve no coração do

homem por todos os tempos e lugares!

Que talento, hein! Tratam, o mais supremo dos homens como um "João

ninguém".

Em que pese nossas palavras mais contundentes no texto, temos a dúlcida

energia para afirmar que Jesus é o Governador espiritual do planeta e de todos os

espíritos que nele se encontram. Suas faculdades morais e espirituais jamais

21 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

poderemos definir em nossa paupérrima linguagem humana. Ele foi a manifestação

do amor de Deus, a personificação de sua bondade. Para o célebre pedagogo e gênio

de Lyon, o Cristo foi "Espírito superior da ordem mais elevada, Messias, Espírito

Puro, Enviado de Deus, é Diretor angélico do orbe e Síntese do amor divino".

Sua lição, acima de editos e espadas, decretos e encíclicas, sobe sempre e

cresce cada vez mais, na acústica profunda da audição humana, preparando os

homens e a vida para a soberania do Amor Universal.

Embora seja Ele o centro de polêmicas e cogitações infindáveis, Jesus, para

nós espíritas, foi, é, e sempre será a síntese da Ciência, da Filosofia e da Religião.

Concretamente, a Doutrina dos Espíritos sem Jesus não faz sentido como uma Nova

Ordem Espiritual para a Humanidade.

22 – Jorge Hessen

5

Legítima visão espírita

de Jesus de Nazaré

Em meio à crescente proliferação de ideias exóticas no seio do nosso

movimento, sobremodo nos preocupam aquelas cujo resultado é a deturpação da

legítima visão espírita de Jesus de Nazaré.

Existem alguns confrades inquietos e invigilantes que desejam proscrever

Jesus do Espiritismo. São pessoas dotadas de maiúscula insensatez que regurgitam

suas santas ignorâncias e as torturantes cantilenas de que Jesus não é o único modelo

de amor absoluto (?). Alegam que seria injusto que 2/3 da população da Terra que

"nunca" ouviram falar do Messias, ficassem "órfãos" de suas lições.

Segundo a revista alemã Der Spiegel o panorama estatístico de religiosos

atuais do Orbe é o seguinte: Cristãos não católicos (17,0%), Cristãos católicos

(16,9%), Muçulmanos (23,1%), Hindus (13,0%), Budistas (6,1%), Judeus (0,2%) e

Outros (23,7%). Observa-se que 1/3 da humanidade procura seguir os ensinamentos

de Jesus, e para a crença dos outros 2/3 que não "conhecem" o Cristo, apesar do

mundo globalizado atual, existiram e existem outros seres luminares, porém todos

foram, são e serão discípulos de Jesus.18

Em verdade Jesus, durante milênios, enviou seus emissários para instruir

povos, raças e civilizações com conhecimentos e princípios da lei natural. Além disso,

há dois mil anos, veio pessoalmente ratificar os conhecimentos já existentes,

deixando a Boa Nova como patrimônio para toda Humanidade.

Examinando o trajeto histórico das civilizações identificamos que em todos

os tempos houve missionários, fundadores de Religião, filósofos, Espíritos Superiores

que aqui encarnaram, trazendo novos conhecimentos sobre as Leis Divinas ou

Naturais com a finalidade de fazer progredir os habitantes da Terra. Entretanto, por

mais admiráveis que tenham sido suas missões, nenhum se iguala ao Adorável

Nazareno. Até mesmo porque todos eles estiveram a serviço do Mestre

Incomparável, o Guia e Governador Espiritual deste mundo de expiação e provas. 18 Emmanuel explica que os capelinos, ao serem recebidos por Jesus, teriam guardado as reminiscências de seu planeta de origem e das promessas do Cristo, que as fortalecera ao longo do tempo, "enviando-lhes periodicamente os seus missionários e mensageiros." Os enviados do infinito falaram na China milenar, no Egito, na Pérsia etc.

23 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

Kardec, na introdução de O Evangelho Segundo o Espiritismo escolhe

dentre as cinco partes o Ensino Moral, o único que não está afeito a controvérsias,

podendo inclusive unir todas as crenças em torno da sua mensagem universalista.

Quando Allan Kardec questionou os Espíritos sobre quem teria sido o ser

mais evoluído da Terra, recebeu uma resposta tão curta quanto profunda: "Jesus!".

Sua lição é não só a pedra angular do Consolador Prometido, da Doutrina dos

Espíritos, mas a régua de medida, o referencial universal com que aferiremos o nosso

proceder, o nosso avanço ou o nosso recuo no processo de espiritualização que nos

propusermos: a visão real do que somos no íntimo de nossa consciência e quão perto

ou distante estejamos do amado Mestre Jesus que nos exorta a amarmos uns aos

outros como Ele nos amou.19

Amado por uns, odiado por outros, indiferente para muitos, Jesus deixou

ensinamentos muito singelos, mas profundos, ele aplicou a filosofia que difundia,

desconcertando os inimigos gratuitos, granjeando apoios no povo e confundindo os

restantes. Aos Espíritas sinceros cumpre não perder de vista essa realidade de suma

importância — a total vinculação do Espiritismo com os ensinos de Jesus, o

Cristianismo primitivo, pela base moral comum a ambos, sem desvios impostos pelo

interesse dos homens.

Ele vela pela nau terrestre e Se compadece de cada um de nós, facultando-

nos recomeço e paz. Cada palavra que o Mestre plasmou na atmosfera terrena dirige-

se a todos nós, ontem, hoje e sempre independente de onde possamos estar ou do

que fazemos.

O Meigo Galileu transcende as dimensões da análise convencional e do grau

de desenvolvimento científico, moral ou espiritual do maior dos nossos intelectuais,

porquanto Ele já era o construtor de todo o nosso Sistema Solar, quando sequer a

vida neste planeta se apresentara.

19 Revista Reformador – novembro de 1998.

24 – Jorge Hessen

6

A convertida de Migdol, uma

Apóstola de Jesus

A biografia de Maria de Magdala é um dos mais admiráveis temas da

história do Cristianismo, destacando-se como exemplos inesquecíveis sua sujeição na

ilusão da beleza inóspita e sua posterior ternura aos hansenianos do Vale dos

Imundos.

Segundo consta na tradição, a “mansão” daquela mulher, em Magdala ou

Migdol (torre), hoje el-Mejdel, à época cidade localizada na costa ocidental do Mar da

Galileia, era procurada pelos príncipes das sinagogas, abastados comerciantes,

bilionários senhores de terras e de escravos, funcionários de alta categoria da

administração herodiana, que lhe assentavam no cofre moedas de ouro, joias,

dracmas de prata, perfumes raros, presentes exóticos.

Aquela mulher ficou conhecida como Maria Madalena, personagem que traz

à tona discussões com interpretações dessemelhantes sobre sua vida. Destarte,

optamos por esquadrinhar um consenso a propósito de determinadas questões

fundamentais, para que nossa pesquisa não perdesse apropriada uniformização do

seu conteúdo. Há quem afirme que muito mais a tradição do que a realidade se

encarregou de difundir a suposta má fama de Madalena. “O Talmud apresenta como

casada com o judeu Pappus Benjudah, que abandonou para unir-se ao oficial de

Herodes chamado Panther; não era necessariamente uma "pecadora pública" nem

uma "viciada" como a descreve Gregório Magno”.20 Muitos a identificam como

endemoninhada (por sete obsessores), prostituta (as bases históricas dessa última

afirmação parecem ser bastante frágeis para alguns exegetas). Sabe-se, com certeza,

que a Maria difamada de Magdala não era feliz.

Alguns escritores e estudiosos contemporâneos, baseados nos Evangelhos

Canônicos, nos livros apócrifos do Novo Testamento e nos escritos gnósticos,

sobretudo Margaret George, Henry Lincoln, Michael Baigent e Richard Leigh, autores

do livro O Santo Graal e a Linhagem Sagrada (1982), e Dan Brown, autor do romance 20 PASTORINO, Carlos T. Sabedoria do Evangelho, Rio de Janeiro: Ed Sabedoria, 1964.

25 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

O Código da Vinci (2003), apesar de proporem teses mirabolantes, descrevem Maria

Madalena como uma apóstola.

Certa noite, instada por uma serva de confiança, permitiu um diálogo sobre

um Excelso Peregrino que percorria as estradas da Galileia e da Judeia.

Entusiasmada, no dia seguinte, servindo-se de frágil embarcação, atravessou o lago

para conhecer Jesus, em Cafarnaum. Os dias se passaram até quando o Cristo esteve

em Magdala, a proprietária da famosa “casa nobre” tomou de um vaso de alabastro

que continha o perfume do lótus, comprada a preço de ouro.

Era seu presente ao sublime Rabi da Galileu. Sabendo-O num banquete em

casa de Simão, um rico comerciante da Galileia, para lá se dirigiu.21 Quase ao final da

ágape, rompendo a segurança, a famosa e afamada de Magdala22 irrompe na sala e se

arroja aos pés do sublime Galileu. O endinheirado Simão, dono do casarão se enche

de fúria, mas receia determinar expulsá-la.23

O afetuoso Nazareno exalta o gesto daquela corajosa Madalena que

ajoelhada a seus pés, rega-os com suas lágrimas, enxuga-os com seus sedosos cabelos

e os unge com o sobrenatural bálsamo que invade todo o recinto. O divino Senhor

simplesmente diz: por esse gesto te digo que os teus muitos pecados te são

perdoados, porque muito amou; mas aquele a quem pouco é perdoado, pouco ama.

Mulher, a tua fé te salvou; vai-te em paz.24

Avaliava o Mestre o coração daquela alma intensamente amorosa,

transitoriamente fraquejada sob o guante da ilusão da beleza física desértica. Por isso

investiu na sua recuperação, incentivando a modificar de vida, o que ela acolheu com

a consistência adamantina da sua personalidade forte e iniciou um rumo novo,

transformando-se, depois da Mãe de Jesus, no maior exemplo de Amor na face da

Terra.

Na manhã subsequente a população de Magdala soube, surpreendida, a

notícia da conversão da mulher, insígnia da iniquidade. Ela abrira mão de todos os

bens materiais que possuía e, com o estritamente necessário, iniciara nova vida.

Juntou-se discretamente aos que seguiam o Messias, mas infelizmente por várias

vezes, recebeu a bofetada da suspeição.

No transcurso dos meses, atingindo os momentos da traição de Judas, da

prisão de Jesus, do julgamento arbitrário, ei-la, peregrinando para o Gólgota, 21 Não deve ser confundido com outra cena semelhante, ocorrido mais tarde (em abril do ano seguinte) na casa de Simão, ex-leproso, em Betânia (Mateus, 26:6-13, Marcos, 14:3-9 e João, 12:1-8), quando Maria de Betânia, irmã de Marta, executou o mesmo gesto.

22 Alguns exegetas não reconhecem Maria Madalena como sendo a mulher da narrativa de Lucas.

23 Por delicadeza, Marcos omite o nome da mal-afamada. Esse silêncio fez com que na igreja antiga se desenvolvesse uma interpretação extremamente confusa.

24 Lucas, 7:47 e 48.

26 – Jorge Hessen

acompanhando-O. A convertida de Magdala conservou-se ao pé da cruz, unida a

Maria de Nazaré e ao jovem João Evangelista. No instante em que a fronte do Mestre

pendeu pesada, ansiou abraçar-se outra vez aos Seus pés e osculá-los com soberana

veneração, porém se sentiu imobilizada.

No domingo (três dias após o martírio da Cruz), chegando ao túmulo do

Mestre ao lado de Joana de Cusa, Maria (mãe de Marcos) e outras mulheres25,

deparou com a pedra do sepulcro deslocada, dobrados os lençóis de linho que lhe

haviam envolvido o corpo e o sepulcro vazio. Madalena teve receio que os fanáticos

judeus houvessem furtado e escondido o corpo do Príncipe da Paz.26 Enquanto as

demais mulheres retornaram a Jerusalém, a fim de noticiar o sucedido, Madalena

conservou-se no jardim adjacente, a chorar.

A nostalgia feita de agonia lhe enxovalhava o coração, quando escutou a

dúlcida voz do Crucificado, chamando-a: — Mulher! [“Gyne”]27 Ela se volta, e mal

consegue avistar um vulto, os olhos ainda embaciados pelas lágrimas e as pupilas

dilatadas pela escuridão do sepulcro. Seria o jardineiro? Teria ele ocultado o corpo do

Divino Amigo? Então, os ouvidos descobrem o que os olhos não podem desvendar: a

voz torna a chamá-la, mas desta vez pelo nome: Maria! Quando a filha de Magdala

ouve aquela voz transcendente chamando: “Maria!”, ocorre uma transformação

admirável: ela reconhece o suave Rabi redivivo, e exclama: “— Raboni28, meu

Mestre!” E, literalmente, tenta abraçá-lo, todavia não era momento para tocá-lO.29

Interessante meditar “por que razões profundas deixariam o Divino Mestre

tantas figuras mais próximas de sua vida para surgir aos olhos de Madalena, em

primeiro lugar? O gesto de Jesus é profundamente simbólico em sua essência divina.

Dentre os vultos da Boa Nova, ninguém fez tanta violência a si mesmo para seguir o

Salvador, como a inesquecível obsedada de Magdala.”.30

A ex-vendedora de ilusões difamada pelos madalenos, em quem se

costumava atirar injúrias, no encontro com o Mestre materializado redescobre sua

identidade e até amplia seu horizonte existencial. Ao reconhecer Jesus,

imediatamente O coloca acima, chamando-O Raboni. O Cristo estava ali, redivivo,

radioso como a madrugada recém nascida. 25 De acordo com Lucas e Marcos, o objetivo, para as mulheres se dirigirem ao túmulo, foi embalsamar o corpo de Jesus com especiarias.

26 A pilhagem de sepulturas era algo bem comum na Palestina, onde as tumbas ficavam acima do chão. Diante disso, um crime devia ser esperado, uma vez que Jesus foi sepultado num túmulo emprestado, de um rico doador.

27 Em grego, mulher é gyne, de onde derivam as palavras portuguesas “gene”, “genética”, “gênero”, “gênesis”.

28 O termo Raboni é mais solene que o habitual Rabi.

29 Na narrativa joanina, Madalena ela é destacada como primeira testemunha do túmulo vazio (20:1-10) e como a primeira pessoa a quem o Senhor ressurrecto apareceu (20:11-18), em contraposição aos Sinópticos, onde ela dividiu estas experiências com várias outras mulheres (Mateus, 28:1-10; Marcos, 16:1-8; Lucas, 24: 1-11.

30 XAVIER, Francisco Cândido. Caminho, Verdade e Vida, ditado pelo Espírito Emmanuel, RJ: Ed FEB, 1999, cap. 92).

27 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

Madalena foi anunciar o episódio aos apóstolos, que não acreditaram. Por

que haveria Jesus de aparecer logo para ela? No entanto, Maria de Nazaré a abraçou e

lhe pediu detalhes. Os dias que se seguiram foram de saudades e recordações. As

notícias auspiciosas chegavam-lhe aos ouvidos.

Soube que naquele mesmo dia, indo dois discípulos para suas residências

situadas nos arrabaldes (Emaús), distante de Jerusalém sessenta estádios31, os

discípulos enquanto conversavam, o Cristo se lhes juntou e se pôs a caminhar com

eles (Jesus havia tido seus pés dilacerados na crucificação); — mas não O

reconheceram. “Ao aproximarem-se de suas casas, o Crucificado queria ir adiante. Os

dois disseram-Lhe: — Fica conosco, que já é tarde. Ele entrou com os dois. Estando

com eles à mesa, dividiu o pão, abençoou-o e lhes deu. Abriram-se-lhes ao mesmo

tempo os olhos e ambos O reconheceram; Jesus, porém, lhes desapareceu das vistas.

Madalena soube que Jesus apareceu também para “Simão Pedro, Tomé,

Natanael, os filhos de Zebedeu e dois outros de seus discípulos à margem do mar de

Tiberíades”.32

Depois disso, “Jesus os conduziu para Betânia e, tendo levantado as mãos,

os abençoou, e, tendo-os abençoado, se separou deles e foi arrebatado ao infinito.

Quanto a eles, depois de o terem adorado, voltaram para Jerusalém, cheios de

alegria”.33

A convertida de Magdala experimentou solidão e abandono e, para suavizar

a imensa saudade do Rabi, passou a andar pelas longas praias que tanto O

relembravam. Numa dessas tardes, encontrou leprosos que vinham da Síria a fim de

buscar o socorro da cura. Ela os abraçou, dizendo-lhes que Jesus foi crucificado.

Deteve-se por horas a falar, saudosa, do que aprendera com quem era o Caminho, a

Verdade e a Vida. Depois, seguiu com eles ao vale dos imundos (leprosos).

Alguns anos após, devorada pela lepra, sentindo que ia desencarnar,

desejou rever Maria de Nazaré e foi a Éfeso. Após três dias de delírios, sentiu-se

repentinamente expulsa do corpo, na praia onde encontrara os leprosos sírios e, sua

aparência era de quando jovem e bela. Nesse momento vê caminhar sobre as águas a

figura de Jesus que lhe disse:

— Vem Maria, já atravessaste a porta estreita. Todas as tuas culpas estão

perdoadas porque muito amaste e muito sofreste. Eu estava a tua espera. Agora

dorme. Eu te escolho para que venhas ao meu reino! Madalena adormeceu nos braços

de Jesus. 31 O estádio romano valia 625 pés romanos, ou seja, 185 metros.

32 KARDEC, Allan. A Gênese, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1977, item 59.

33 Lucas, 24: 50 -53 e Atos dos Apóstolos, 9:12.

28 – Jorge Hessen

Jesus realizou duas hierarquias de “ressurreição”: “ressurreição” do corpo,

e “ressurreição” do espírito. “Ressuscitou” Lázaro, e “ressuscitou” Madalena. Aos

olhos do mundo, a primeira dessas duas maravilhas assume maiores proporções,

mas, aos olhos de Deus, o segundo prodígio é mais belo, mais valioso. O corpo de

Lázaro veio a morrer após aquela “ressurreição”.

Madalena nunca mais morreu, porque o que nela ressurgiu não foi a carne,

foi o espírito. O mundo se maravilha na “ressurreição” de Lázaro. O Mundo Espiritual

Superior se extasia da “ressurreição” de Madalena.

Especula-se que após essa encarnação dos tempos apostólicos, Maria de

Magdala ainda teve outras encarnações, até chegar a encarnar pela última vez como

Madre Teresa de Ávila (Santa Teresa de Jesus) cujo nome verdadeiro era Teresa de

Cepeda y Ahumada, uma revolucionaria religiosa nascida na Espanha em 1515 e

falecida em 1582.34 “Se non è vero, é ben trovato”.35

34 Disponível em http://feparana.com.br/parolima.com - acesso em 16/02/2012. 35 "Se não é verdade, é bem contado."

29 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

7

Jesus foi com toda pujança o

Mestre por excelência

Entre todos os temas sobre os quais tenho escrito, os mais fascinantes são

aqueles em que discorro sobre Jesus. Ele que é a mais elevada expressão humana e a

mais mencionada da História.

O Mestre foi, é e sempre será, inspiração para os majestosos arranjos

literários e sobretudo para obras de arte (música, pintura, teatro, escultura, poesia).

Mesmo assim, nenhum vocábulo, fórmula poética, artística, filosófica ou qualquer

louvor em Sua memória conseguirá traduzir o que Ele representa para cada um de

nós.

Ele é a avenida, a veracidade e a existência. Nenhuma pessoa irá ao Criador,

senão por Ele. Todos os milhares de volumes dos mais variados livros ditos sagrados

Jesus resumiu em uma única citação, que abrange toda a sabedoria e cultura

terrestres — amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo.

O seu desempenho foi o de colossal fanal, fulgurando nossas estradas e

mostrando a todos como poderemos obter a felicidade. Foi um Educador por

excelência, tanto que foi o único adjetivo que teve o seu apoio, o de Mestre.

É verdade! Jesus jamais aceitou qualquer outra qualificação, e o único título

que admitiu foi o de ser chamado de Mestre. Verdadeiramente, Jesus foi com toda a

pujança o Mestre por excelência. Translúcido como um cristal era o Seu caráter — e no entanto, Ele continua

sendo o maior enigma de todos os séculos. Para alguns religiosos, é entronado como

uma divindade. O motivo pelo qual alguns consideram Jesus um Semideus, é a sua

colossal elevação espiritual. Diante Dele, todos ficamos muito pequeninos,

ressaltando-se as nossas deficiências e inferioridades. Perante o Mestre, somos tão

nanicos que ele nos parece ser uma Divindade. Daí a confusão de alguns religiosos. Um dos mandamentos inesquecíveis de Jesus está contido no Sermão da

Montanha. Nessa belíssima lauda, avaliada por Mahatma Gandhi como a mais pura

essência do cristianismo, a ponto de o Iluminado da Índia pronunciar que se um

cataclismo extinguisse toda a sabedoria humana, com todos os seus livros e

30 – Jorge Hessen

bibliotecas, se restasse apenas o Sermão da Montanha, as gerações futuras teriam

nele toda a beleza e sabedoria necessárias para a vida.

Jesus é o redentor, o consolador, o diretor planetário, o Profeta, o Mestre.

Não adulava os poderosos e não oprimia os excluídos sociais. Não repudiava

"madalenas" nem apedrejava “adúlteras” — mas lançava os penitentes verbos de

perdão.

Por servir ao próximo, com modéstia, sem agressões e arrogâncias, Ele foi

tido como insensato e rebelde violador da lei e inimigo da população, sendo escolhido

por essa mesma turba para receber com a cruz o glorioso laurel de acúleos. Mas o

sacrifício Dele não deve ser apreciado tão somente pela dolorida demonstração do

Calvário.

A coroa e a cruz representaram o desfecho da obra do Mestre, mas o

sacrifício na sua exemplificação se constatou em todos os dias da sua passagem pela

Terra. Anunciando as bem-aventuranças à população no monte, não a desvia para a

brutalidade, a fim de assaltar o celeiro dos outros. Multiplica, Ele mesmo, o pão que a

reconforta e alimenta.

Não alicia o povo a reclamações. Recomenda acatamento aos patrimônios

da direção política, na circunspecta expressão "a César o que é de César".

Evidenciando as apreensões que o vestiam, diante da renovação do mundo íntimo,

não se regozijou em assentar-se no trono dos gabinetes, de onde os generais e os

legisladores costumam ditar ordens.

Desceu, Ele próprio, ao seio do povo e entendeu-se pessoalmente com os

velhos e os doentes, com as mulheres e as crianças. A Sua lição fulge como um Sol

sem crepúsculo, conduzindo a Humanidade ao Porto da paz! Para a maioria dos

teólogos, Ele é objeto de estudo, nas letras do Velho e do Novo Testamento,

imprimindo novo rumo às interpretações de fé.

Para os filósofos, Ele é o centro de polêmicas e cogitações infindáveis.

Conquanto alguns (kardequiólogos) tentem bani-lo do movimento espírita, para nós,

ESPÍRITAS, Jesus foi, é e será sempre a síntese da Ciência, da Filosofia e da Religião

(tripé do edifício Espírita).

A Doutrina dos Espíritos vem colocar o Evangelho do Cristo na linguagem

da razão, com explicações racionais, filosóficas e científicas. Sem abandonar o aspecto

sensível da emoção que é colocado na sua expressão profunda, demonstra que o

sentimento e a razão podem e devem caminhar pela mesma alameda, pois

constituem as duas asas de libertação definitiva do homem.

31 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

8

Algumas anotações

doutrinárias sobre Jesus:

diálogo com uma confreira

Sem uma religião definida, embora crente em Deus, uma leitora dos artigos

do nosso blog pediu-nos alguns esclarecimentos. Ela mesma considera inaceitável a

fé cega nos mitos da Gênese Mosaica e do Novo Testamento, citando os seis dias da

Criação, a arca de Noé, Adão e Eva, a serpente e a maçã, o Paraíso perdido, a virgem

Maria de Nazaré, a estrela guia, etc.

Porém, o que mais a intriga é: Por que deificaram somente Jesus, se tantos

outros cristos que, certamente, passaram pela humanidade e que, também, deveriam

operar os tais “milagres”, permaneceram anônimos na História? Segundo ela, como

admitir que Jesus tenha vindo ao mundo para sofrer pelos nossos “pecados”? Por que

Deus não impediu a crucificação do Mestre, consentindo que O matassem?

Percebemos que o raciocínio da nossa leitora é aguçado, sem dúvida; mas,

faz-se mister considerar que o raciocínio humano vem sendo trabalhado, de muitos

séculos no planeta, pelos vícios de toda sorte. “Temos plena confirmação deste

asserto no ultra racionalismo europeu, cuja avançada posição evolutiva, ainda agora,

não tem vacilado entre a paz e a guerra, entre o direito e a força, entre a ordem e a

agressão”.36

Sobre as questões, vamos por partes. Os hábitos mentais dos espíritas,

também, tendem a ser conduzidos pela fé raciocinada.

Sobre os mitos mosaicos que cita, lembramos que se Moisés se utilizou de

muitas metáforas, e se não transmitiu ao mundo a lei definitiva, ele deu, à Terra, as

bases da Lei divina e imutável. Aqui devemos considerar que os homens receberão,

sempre, as revelações divinas de conformidade com a sua posição evolutiva.

Para nós, a Humanidade da Era Cristã recebeu a grande Revelação em três

aspectos essenciais: Moisés trouxe a missão da Justiça; o Evangelho, a revelação

insuperável do Amor, e o Espiritismo, em sua feição de Cristianismo redivivo, traz,

por sua vez, a sublime tarefa da Verdade. 36 XAVIER, Francisco Cândido. O Consolador, ditado pelo espírito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed FEB, 2001.

32 – Jorge Hessen

Sem querer esbarrar na deificação do Cristo, sabemos que no centro das

três revelações encontra-se Jesus-Cristo, como o fundamento de toda a luz e de toda a

sabedoria. Portanto, não há outros Cristos na Terra. Ele, o Mestre, está conosco há

mais de 4,5 bilhões de anos. Jesus foi o divino escultor da obra geológica do planeta.

Junto de seus prepostos, iluminou a sombra dos princípios com os eflúvios

sublimados do seu amor, que saturaram todas as substâncias do mundo em

formação. E mais ainda, “Todas as entidades espirituais encarnadas no orbe terrestre

são Espíritos que se resgatam ou aprendem nas experiências humanas, após as

quedas do passado, com exceção de Jesus-Cristo, fundamento de toda a verdade neste

mundo, cuja evolução se verificou em linha reta para Deus, e em cujas mãos angélicas

repousa o governo espiritual do planeta, desde os seus primórdios”.37

Sobre a supremacia do Cristo, lembremos do “Meu Pai e eu somos Um”.

Essa afirmativa evidenciava a sua perfeita identidade com Deus, na direção de todos

os processos atinentes à marcha evolutiva do planeta terrestre.38 Por várias razões,

qualquer comentário sobre o Cristo não julgamos acertado fazer, para não

condicionar a figura Dele aos meios humanos, num paralelismo injustificável,

porquanto, em Jesus, temos de observar a finalidade sagrada dos gloriosos destinos

do espírito. “N’Ele, cessaram os processos tacanhos de julgamentos humanos, sendo

indispensável reconhecer, na sua luz, as realizações que nos compete atingir.

Representando, para nós outros, a síntese do amor divino, somos compelidos a

considerar que, de sua culminância espiritual, enlaçou, no seu coração magnânimo,

com a mesma dedicação, a Humanidade inteira, depois de realizar o amor

supremo”.39

É que Jesus, com Amor, manifestou-se na Terra no seu esplendor máximo;

Com Jesus, a Justiça e a Verdade nada mais são que os instrumentos divinos de

exemplificação, Ele que é o Cordeiro de Deus, alma da redenção de toda a

Humanidade. Portanto, o tipo mais perfeito que Deus ofereceu ao homem para lhe servir

de guia e modelo foi o Cristo. Para Allan Kardec, “Jesus é para o homem o exemplo da

perfeição moral a que pode pretender a humanidade na Terra. Deus nos oferece Jesus

como o mais perfeito modelo, e a doutrina que ensinou é a mais pura expressão de

sua lei, porque era o próprio Espírito Divino e foi o ser mais puro que apareceu na

Terra. Se alguns daqueles que pretenderam instruir o homem na lei de Deus algumas

vezes o desviaram, ensinando-lhe falsos princípios, foi por se deixarem dominar por 37 XAVIER, Francisco Cândido. O Consolador, ditado pelo espírito Emmanuel - pergunta 243.

38 idem pergunta 288.

39 idem pergunta 327.

33 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

sentimentos muito materiais e por ter confundido as leis que regem as condições da

vida da alma com as do corpo. Muitos anunciaram como leis divinas o que eram

apenas leis humanas criadas para servir às paixões e dominar os homens”.40

A respeito dos mitos e crendices do Novo Testamento, sabemos que foram

impostos por seres sem escrúpulos. A começar com Constantino, que permitiu o

famigerado Concílio de Niceia. Posteriormente, com Teodósio, oficializando o

Cristianismo no Estado Romano. Em 384, São Jerônimo teve a missão de redigir uma

tradução latina do Antigo e do Novo Testamento.

Essa tradução tornar-se-ia a norma das doutrinas da Igreja: foi o que se

denominou a Vulgata. Essa tradução oficial, que deveria ser definitiva, segundo a

cúpula da Igreja, foi, entretanto, alterada em diferentes épocas, por ordem dos

ulteriores pontífices. Portanto, os chamados livros canônicos, foram submetidos a

diversas e trágicas interpolações para satisfazer os mesquinhos interesses da Igreja.

“Sufocaram, antes de desabrochar, os fortalecedores princípios que teriam conduzido

os povos à verdadeira crença, à que eles hoje em dia inda procuram. Tudo para

assegurar, fortalecer, tornar inabalável a autoridade da Igreja”.41

Sobre a crucificação do Messias, permitida por Deus, deve ser apreciado,

tão-somente, pela dolorosa expressão do Calvário? Cremos que não, pois o Gólgota

representou o coroamento da obra do Senhor, mas, o sacrifício na sua exemplificação,

verificou-se em todos os dias da sua passagem pelo planeta.

E o cristão deve buscar, antes de tudo, o modelo nos exemplos do Mestre, porque o

Cristo ensinou com amor e humildade o segredo da felicidade espiritual, sendo

imprescindível que todos os discípulos edifiquem, no íntimo, essas virtudes, com as

quais saberão demonstrar ao calvário de suas dores, no momento oportuno.42 Os

mistérios das Leis divinas são insondáveis. Óbvio que não cai um fio de cabelo de

nossas cabeças sem que Deus o saiba e permita. A crucificação estava nos

ditames da Vontade suprema e não havia como ser modificada. E, mais ainda, a

crucificação teve efeito simbólico, uma vez que, após a condenação, o Mestre ressurge

para nós.

Desde então, a morte deixou de ser o lúgubre ingresso para o Nada;

porquanto, na verdade, é a esplendorosa revelação de que a vida é eterna, como

perenes serão as realizações do bem, na terra e no espaço. Quando o Celeste Amigo

revelou o Túmulo Vazio, Ele venceu a morte. É verdade! Todos os evangelistas

narram as aparições de Jesus, após sua crucificação, com circunstanciados 40 KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, Rio de Janeiro: Ed. Feb, 2001, pergunta 625.

41 DENIS. Léon. Cristianismo e Espiritismo, Rio de Janeiro: Editora FEB, 2001.

42 XAVIER, Francisco Cândido. O Consolador, ditado pelo espírito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed FEB, 2001, pergunta 286.

34 – Jorge Hessen

pormenores, que não permitem se duvide da realidade do fato. Pois bem, minha irmã,

eis o motivo pelo qual Deus não impediu a crucificação de Jesus.

35 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

9

JESUS E A MARCHA

DA DEFORMIDADE ESPÍRITA

É comum localizamos em nossas hostes doutrinárias alguns confrades

agindo semelhantes aos “crentes evangélicos” (da ala neopentecostal), talvez por

“olho gordo”, exaltando inflamados o “nome” Jesus, a “imagem” do Crucificado, a

“personalidade” do Messias, quase sempre sob argumentos desprovidos de

coerência, comprovando desconhecimento dos códigos morais do Evangelho

racionalmente explicados por Allan Kardec e os Espíritos superiores.

Por causa do “cristianismo” arcaico, a figura de Jesus se caracteriza por

debilitada representação simbólica e, como sabemos, todo símbolo que passa do

tempo fica enferrujado, desgastado e perde a sua essência e sentido. É óbvio que

reverenciamos o excelso valor de Jesus e O defendemos enquanto Verdade Maior,

porém, sem afastar um milímetro da lógica kardequiana. Encontramos no MEB (movimento espírita brasileiro) muitos “espíritas” de

sacristia, como dizia Arnaldo Rocha, ou seja, espíritas “rezadores” (artificiais e

dissimulados), que muito reza (tagarelando) e não se cuida da própria honra. Conhecemos embustes de oradores que falam apaixonadamente sobre Jesus

(chegam a chorar de emoção), que discursam sobre o valor da monogamia, na união

familiar, todavia fazem andar a “fila” das esposas. Há ilustres palestrantes “espíritas”

que insistem nos temas repetitivos, sempre sob a lideranças dos agenciadores de

seminários improdutivos. Nessa inadvertência seguem algumas federativas (mal dirigidas) que

insistentemente promovem congressos inócuos, pobres de conteúdos e

onerosíssimos (não gratuitos) sempre destinados aos espíritas endinheirados. Em tais eventos (congressos soberbos e inóxios) expõe-se temas

evangélicos recorrentes, desgastados, abarrotados de trivialidades e lugares comuns,

defendidos com afetação e tradicionalíssimas vozes veludíneas banhada de

camuflada emoção veiculadas por intocáveis palestrantes sacralizados, santificados e “insubstituíveis” ante os apelos idolátricos da frenética e delirante caravana de

“espiritólicos”.

36 – Jorge Hessen

Aliás, não obstante “carismáticos”, há oradores endeusados que fazem das

palestras proferidas e a fama obtida nos escombros reivindicatórios da extravagante

multidão de “espiritólicos”, uma execranda máquina de fazer dinheiro. Sim! São os

confrades vendilhões da mensagem do Espiritismo.

Neste cenário ainda há espaço para identificarmos “espíritas oba-oba”,

espalhafatosos, recheados de fraternidade de boteco, sorrisos maquinais,

comportamentos que contrastam com a simplicidade cristã. Isso tudo sem

aprofundarmos nas práticas de diretores de órgãos oficiais (federativas) que se

esgrimam (mentalmente) pela caça do poder de direção do MEB, totalmente

distantes do exemplo edificante da humildade. Tais líderes intransigentes traem a si

mesmos, aos amigos, ao MEB e a Kardec.

Certificamos que o caminho do MEB tem sido de duas vias: uma é ocupada

pela chamada liderança “oficial”, dos espíritas autócratas, entupidos de “não me

toques”, apinhados de salamaleques; a outra via é ocupada pelos espíritas

“aguerridos”, fieis a Kardec, lealdade essa que nada tem a ver com extremismo ou

intolerância, porém compromisso com a verdade.

Os “combativos” fazem o trabalho de fustigar a “oficialidade”, de vergastar

os eternos “donos” do MEB para não os deixar comodamente em “berço esplêndido”

sob os narcóticos da ilusão.

Os “combativos” de Kardec são, por isso, mal vistos e execrados

permanentemente, tidos como desagregadores, mas são eles que agem com a

coragem e virilidade necessária para evitar a perda total de uma doutrina tão cara à

humanidade.

Quando se trata da moral, Jesus é o grande exemplo. Quando se trata de

conhecimento espírita, Kardec é a verdade. Não pode haver mais espaço para o

estereótipo de um Jesus decrépito, idolatrado, da tradição arcaica, pois o Espiritismo

fez avançar no conhecimento de modo que sem o Espiritismo Jesus permanece no

estado da incompreensão e da superficialidade do simbolismo sectário.

Portanto, jamais pode haver espaço para um Espiritismo segundo o

Evangelho, pois o evangelho não pode explicar o Espiritismo; ao contrário, apenas o

Espiritismo pode explicar o evangelho. Como me ensinou um atilado espírita de

vanguarda.

O futuro do Espiritismo está fixado nesse quadro contemporâneo, das lutas

entre os que defendem os princípios kardequianos e os fracos, que mais se importam

com os aplausos da plateia, com os resultados que agradam à audiência e os

transformam famosos.

A luz intensa da verdade os incomoda, daí a preocupação em defenderem-

37 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

se para não perder o comando. Desfiguram o Espiritismo para se manterem na posse

do “movimento espírita oficial”.

Cabe aos impávidos “combativos” do bem se contraporem a isso, mesmo

sabendo que a luta é inglória sob o aspecto da capacidade de deter a marcha do

embuste doutrinário. Mas como Jesus foi desfigurado e ainda se mantém deformado

enquanto amor sem igual, o Espiritismo prosseguirá em sua desfiguração contínua,

mas ao mesmo tempo se manterá firme e forte enquanto conhecimento fundamental

para o despertamento da consciência humana.

38 – Jorge Hessen

10

Netflix e o grupelho Porta dos

fundos achincalham o Cristo e

os cristãos

Paulo de Tarso escreveu aos Gálatas "Que ninguém se iluda, porque de Deus

[e Suas Leis] não se zomba, aquilo que o homem semear ele vai colher".43 Esse alerta

é para o grupelho Porta dos Fundos e a Netflix porque decidiram zombar de Jesus e

da religiosidade da grande maioria dos brasileiros. É o que está ocorrendo atualmente, como o lançamento do filmeco A

Primeira Tentação de Cristo previsto para a data máxima da cristandade (Natal). Na

verdade, trata-se de repugnante “comédia”, para claramente zombar da venerável

figura do Cristo. Alguns “atores-espantalhos”, jugulados por irracionais ideologias

avermelhadas, fidedignos “comédias ambulantes” e desajustados consigo mesmos

apostam chacotear os consagrados valores éticos, morais e religiosos dos cristãos.

Notabilizado por peças de “humor pervertido” que tendem importunar a fé cristã, o

tal grupelho Porta dos Fundos nunca disfarçou a aversão contra a estrutura religiosa

cristã. Para o próximo Natal, o repugnante grupelho montou o ignóbil filmeco, que

já está disponível no Netflix. Na sinopse desse lixo dito cinematográfico, “José” e

“Maria” prepararam uma festa surpresa para “Jesus”, porém “Jesus” aparece na festa

acompanhado de seu “namorado”. Na festança um dos convidados revela ser o

próprio “Deus” e informa a missão de Jesus, o que parece contrariar os planos de

Jesus que deseja gozar a vida. O lixo cinematográfico expõe “Jesus” corrompido pelo sexo, mostrando um

relacionamento homossexual d’Ele e Satanás, além de um triângulo amoroso entre

“Deus”, “Maria” e “José”. Inclusive, em alguns trechos do “filmeco”, Jesus aparece

tomando chá alucinógeno e se questionando sobre sua própria missão na terra. Será que a Carta Magna do Brasil afiança esses irresponsáveis autores o

direito de se manifestarem com tais insultos? O direito constitucional à liberdade de 43 Gálatas 6:7.

39 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

expressão não justifica agressões morais. A Constituição não é salvo conduto para

abusos e atos blasfemos, moralmente condenáveis e absolutamente desrespeitosos.

A atitude do abominável grupelho Porta dos Fundos golpeia a liberdade

religiosa e desfigura fortemente o legítimo conceito de arte. Desde que uma suposta

obra dita de arte ofende seriamente a crença de uma admirável e pacata população,

há um excesso sujeito à punição, porque injuria a honra da tradição cristã.

É um lixo cinematográfico que promove intolerância religiosa escondido de

liberdade de expressão. Além do que, a memória e imagem de Jesus devem ser

respeitadas e veneradas no alcance máximo da liberdade humana. Portanto, é uma agressão brutal e completamente desnecessária como

tantos outros desrespeitos já praticados sob a “proteção” da vilipendiada liberdade

de expressão, que culmina atingindo o sentimento de todos aqueles que têm Jesus

como exemplo de moral, caráter, bondade, amor, humildade. Que talento desprezível desse “grupelho”! Tratam, o mais supremo dos

seres da criação como um "João ninguém". Estejam cientes, “panelinha do Porta dos fundos”, que os espíritas cristãos

assentamos a Mensagem de Jesus na linguagem do amor, com as devidas explicações

racionais, filosóficas e científicas, todavia, sem abdicarmos e sem deixarmos de lado o

aspecto emocional que é colocado na sua expressão mais alta, tal como o pretendeu

Jesus. Apesar desse desrespeitoso “grupelho”, inobstante não ser a experiência

humana uma estação de prazer, ainda assim continuaremos trabalhando no

ministério de Jesus, recordando que, por servir ao próximo, com modéstia, sem

agressões e arrogâncias, Ele foi tido por insensato e gay (para o grupelho), infrator da

lei e opositor da população, sendo indicado por essa mesma turba para receber com a

cruz a gloriosa coroa de espinhos, entretanto sob a força do Amor Jesus venceu o

mundo!

Uma conveniente atitude cristã seria o boicote à Netflix, que tal?

40 – Jorge Hessen

11

O Espiritismo sem o Cristo perde o

norte

Ainda encontramos irmãos "espíritas" que questionam o aspecto cristão da

Terceira Revelação. Negam a excelsitude de Jesus Cristo com evidente e enfermo

descontrole emocional, referindo-se ao Mestre como se Ele fosse um homem vulgar.

Para esses seres atoleimados em suas fanfarras imaginárias, alertamos o seguinte:

Espiritismo é CRISTÃO, Sim!

O grande mestre espiritual Emmanuel elucida a questão dizendo que

"somente o Cristianismo restaurado pode salvar o mundo que se perde. Nossa missão

é essencialmente cristã, na restauração da fé viva e na revivência das tradições

simples dos tempos apostólicos. Não temos a presunção de pedir o atestado de óbito das escolas religiosas,

nem desejamos estabelecer a luta dogmática e o sectarismo. Desejamos tão-só

reavivar a crença pura, a fim de que o homem, na qualidade de herdeiro divino, possa

entrar na glória espiritual da compreensão de Jesus Cristo".44 Se aceitamos os preceitos da Doutrina Espírita, não podemos negar-lhes

fidelidade. Prevendo esses indesejáveis movimentos em nossas hostes, as falanges

das trevas tem se organizado e investido duro contra o Espiritismo Cristão. Os gênios

das sombras do além desejam desintegrar o Cristo e o Cristianismo do contexto

Espírita. Não podemos permitir isso JAMAIS. Têm surgido, ultimamente, muitas práticas absurdas no movimento espírita

e precisamos orar e vigiar mais. Espiritismo sem o Cristo perde o sentido como

projeto de evangelização humana. O Espiritismo sem o cristo perde o rumo. O iluminado Chico Xavier

advertiu: "Se tirarmos o Cristo do Espiritismo, vira comédia. Se tirarmos o aspecto

cristão do Espiritismo, vira um negócio. A Doutrina Espírita é ciência, filosofia e

religião. Se tirarmos a religião, o que é que fica? Jesus está na nossa vivência diária,

porquanto em nossas dificuldades e provações, o primeiro nome de que nos

44

XAVIER, Francisco Cândido. Coletâneas do Além, ditado por espíritos Diversos, Cap. “Cristianismo Restaurado”, por Emmanuel, pag. 74, São Paulo: Ed FEESP, 1981.

41 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

lembramos, capaz de nos proporcionar alívio e reconforto, é JESUS.".45

Alguns confrades descomprometidos com a reforma moral, que se

vangloriam de seus dúcteis e frágeis conhecimento acadêmicos, que se autointitulam

laicos (“kardequólogos, phd’s espíritas”), distantes de quaisquer argumentos

racionais e/ou inteligíveis, persistem em disseminar a fadigosa cantilena de que se é

preciso fugir do Cristianismo (ou Espiritismo-Cristão), do religiosismo, do igrejismo

na Doutrina Espírita. Insistem e querem fundar um “Espiritismo” acadêmico

composto de “notáveis” da ilusão. Que me perdoem os leitores!

Sob o viés dessa sandice conceitual sobre o mestre lionês, escrevem livros,

artigos, fazem “congressos”, palestras, invariavelmente escravizados aos impulsos

telepáticos dos "gênios das trevas".

Destarte, pela tendência desses chamados "espíritas laicos", percebe-se que

o Cristianismo, redivivo no Espiritismo, ainda encontrará, por algum tempo, a

resistência das mentes vulcanizadas na prepotência, da má-fé, da arrogância, apesar

de O Evangelho representar a grande síntese de todas as propostas filosóficas que

visam aprimorar o homem. Os “gênios desmemoriados”, arautos de ideias primárias,

esquecem-se de que o Cristo é o modelo de virtudes sobre-humanas. Nada se

compara à dedicação e a santidade que o Mestre Maior dispensa à Humanidade.

Nós, que ainda estamos mergulhados no vício da corrupção, alertam os

Benfeitores, não temos parâmetros para avaliarmos a Sua magna importância para o

Espiritismo, porque a Sua perfeição se perde na noite indevassável dos séculos.

O Espiritismo sem o Cristo pode alcançar as melhores expressões

acadêmicas, mas não passará de atividade destinada a modificar-se ou desaparecer,

como todas as conquistas transitórias do mundo. E o espírita, que não cogitou da sua

iluminação com o Evangelho do Príncipe da Paz, pode ser um intelectual, um doutor e

um filósofo, com as mais elevadas aquisições culturais, mas estará sem bússola e sem

roteiro no instante da tempestade inevitável da provação. 45 Entrevistas com Chico Xavier disponíveis em http://www.espirito.org.br/portal/artigos/diversos/religiao/espiritismo-sem-jesus.html e http://www.meumundo.americaonline.com.br/eespirita/espiritismo_sem_jesus.htm.

42 – Jorge Hessen

12

Praticar o Evangelho, sim!

Ganhar dinheiro à custa da

mensagem do Cristo, nunca!

É justo transformar um templo religioso em uma Agência Mercantil? Em

uma espécie de núcleo financeiro lucrativo? Será que Deus consente tal

procedimento? Foi isso o que nos ensinou Jesus? Viver o Evangelho, Sim! Ganhar dinheiro à custa da mensagem do Cristo,

Nunca! Até porque nada é tão ilegítimo para um cristão que o exercício da

mercantilagem do Evangelho. É deprimente identificarmos “religiosos” (ressalvando-

se as exceções) que se postam quais “missionários” do Cristo, com evidente desprezo

ao código sublime do amor ao próximo. Tais líderes distinguem-se pelo verbalismo descomedido, comentam

tediosos os mais variados assuntos, inobstante não chegarem a qualquer arremate de

raciocínio. Exaltam as emoções infelizes da arrogância entre os seus seguidores,

cumulando-os de alusões faustosas embora vazias de sentido. O Cristo advertiu em vários segmentos do Evangelho sobre os

“evangelizadores” oportunistas, comparando-os a "lobos em pele de cordeiros". A

lógica humana é dilacerada diante da exploração da fé. Não há como emudecer

perante os que se valem das redes de televisão, jornais, livros, internet e rádios para

pregar o Evangelho em “nome de Deus”, deslumbrando os seguidores afirmando que

a clemência do Pai somente pode ser obtida através da doação de dinheiro. O que assistimos presentemente são reedições das ardilosas vendas de

indulgências, matriz da Reforma Protestante. Mas, se alguém surge dizendo-se “apóstolo” do Cristo, desconfiemos da sua sanidade mental, pois na realidade o que

tem surgido são “mercenários” e não missionários do Mestre. Tais pregadores

exaltam a ignorância com altas doses de soberba e se alardeiam guias e evangelistas.

Há muitos falsos cristos e falsos profetas representados por filosofias, doutrinas,

seitas e religiões mercantilistas que escravizam os homens e exploram a boa-fé das

pessoas que sofrem.

Jesus, há dois mil anos repreendeu: "Está escrito: A minha casa será

43 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

chamada casa de oração. Porém, vós a tendes transformado em covil de ladrões".46

Hoje, discorrem sobre as escrituras numa maníaca exaltação do Cristo, atrelam suas

prédicas à moeda de troca, onde quem for mais generoso (mão aberta) e destinar

maior quantia em dinheiro terá maior benefício “celestial”.

Os desprevenidos seguidores nutrem-se da "fé cega" que lhes é infligida por

meio de discursos abrasados e encenações de pseudoexorcismos, onde o que de fato

ocorre são catarses anímicas e/ou “incorporações” de obsessores que se deleitam

diante dos patéticos e deprimentes espetáculos.

E como se não bastasse, comercializam-se os mais singulares amuletos

quais “potes com água do Rio Jordão”; “frascos de perfumes e óleos com cheiro de

Jesus”; “pedras do templo onde Jesus pregou”; “caixinha contendo porção de areia

pisada por Jesus”; “fragmentos de madeiras da cruz do Calvário”; “lotes, casas e

mansões no céu”. É evidente que um santuário religioso não pode ser análogo à loja comercial

onde se negociam mercadorias com Deus. Será que desconhecem que o templo

cristão é local para meditações e cogitações sobre os desacertos e diligências para

melhoria de comportamento de cada um de nós? O que dizer dos “evangelistas” de grandes plateias que cobram fortunas

para pregar, que alimentam através da eloquência verbal a idolatria da sua

personalidade? São vendilhões modernos e profissionais do Evangelho que execram

trabalhar, abominam o argumento de que o Cristo convidou-nos a carregar nossas “cruzes”, granjear "o pão" com o “suor” de nosso trabalho, e que só granjearemos o

“Reino dos Céus”, isto é, a paz de espírito, se fizermos ao semelhante o que desejamos

a nós mesmos. Sim! "Ai de vós, condutores de cegos, pois que dizeis: Qualquer que

jurar pelo templo, nada é; mas o que jurar pelo ouro do templo, ou pela oferta, este

faz certo. Insensatos e cegos! Pois qual é maior: a oferta, o ouro, ou o templo de Deus?”.47

A única moeda que o Criador acolhe como câmbio é o amor ao próximo.

Todavia, infelizmente boa parte do legado religioso que se transfere para as atuais

gerações tange à cobiça, ao encanto dos sentidos físicos, à conquista de poder a todo

custo, cedendo cancha à brutalidade e à confusão. O fanatismo que vem sendo desenvolvido em torno do misticismo

decrépito, investido para amealhar recursos monetários, visando patrocinar a “saúde” daqueles que mais prontamente a possam comprar a peso de ouro, tem 46 Mateus, 21: 12 e 13.

47 Mateus, 23: 16,

44 – Jorge Hessen

oferecido ambiente ao materialismo e ao utilitarismo em que as pessoas deleitam-se,

afastadas da misericórdia, da solidariedade, da fraternidade, ante o desafio da

autêntica experiência do amor ao próximo, conforme vivido por Jesus.

Paulo escreveu: “De fato, grande fonte de lucro é a piedade com o

contentamento. Porque nada temos trazido para o mundo, nem coisa alguma

podemos levar dele. Tendo sustento e com que nos vestir, estejamos contentes. Ora,

os que querem ficar ricos caem em tentação, e cilada, e em muitas concupiscências

insensatas e perniciosas, as quais afogam os homens na ruína e perdição. Porque o

amor do dinheiro é raiz de todos os males; e alguns, nessa cobiça, se desviaram da fé

e a si mesmos se atormentaram com muitas dores. Tu, porém, ó homem de Deus, foge

destas coisas; antes, segue a justiça, a piedade, a fé, o amor, a constância, a

mansidão.”.48

Por essas muitas razões é fácil perceber que presentemente os autênticos

adeptos do Evangelho ainda formam pequenino grupo muito semelhante ao período

das dolorosas experiências dos três primeiros séculos de disseminação da mensagem

do Cristo nos domínios de César.

48 1 Timóteo, 6:6-11.

45 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

13

Reflexões históricas e as

defecções do cristianismo sem

Jesus

Com base nas declarações do Espírito Emmanuel, decidimos formatar e

publicar em nossas páginas as ajuizadas reflexões históricas sobre o Cristianismo

sem Jesus, conforme foram publicadas no livro A Caminho da Luz. Fazendo isso,

estamos oportunizando aos leitores conhecer um pouco melhor Emmanuel e a

famosa Carta do Bispo Strossmayer, lida no Vaticano em 1870, quando da decretação

da Infalibilidade papal.

Segundo escreve o mentor de Chico Xavier, no capítulo intitulado

“Identificação da besta apocalíptica”, sobre as narrativas do Apocalipse, lemos que “a

besta poderia dizer grandezas e blasfêmias por 42 meses, acrescentando que o seu

número era o 666 (Apocalipse, 13:5 e 18).

Examinando-se a importância dos símbolos naquela época e seguindo o

rumo certo das interpretações, podemos tomar cada mês como sendo de 30 anos, em

vez de 30 dias, obtendo, desse modo, um período de 1260 anos comuns, justamente o

período compreendido entre 610 e 1870, da nossa era, quando o Papado se

consolidava, após o seu surgimento, com o imperador Focas, em 607, e o decreto da

infalibilidade papal com Pio IX, em 1870, que assinalou a decadência e a ausência de

autoridade do Vaticano em face da evolução científica, filosófica e religiosa da

Humanidade”.49

Com referência ao misterioso número 666, Emmanuel pronuncia: “sem nos

referirmos às interpretações com os números gregos, em seus valores, devemos

recorrer aos algarismos romanos, em sua significação, por serem mais divulgados e

conhecidos, explicando que é o Sumo-Pontífice da igreja romana quem usa os títulos

de VICARIVS GENERALIS DEI IN TERRIS, VICARIVS FILII DEI e DVX CLERI, que

significam ‘Vigário-Geral de Deus na Terra’, ‘Vigário do Filho de Deus’ e ‘Príncipe do

Clero’. Bastará ao estudioso um pequeno jogo de paciência, somando os algarismos 49 XAVIER, Francisco Cândido. A Caminho da Luz, ditado pelo Espírito Emmanuel, 22 a. edição, pag. 123 Rio de Janeiro, Ed FEB, 1996.

46 – Jorge Hessen

romanos encontrados em cada título papal a fim de encontrar a mesma equação de

666, em cada um deles. Vê-se pois, que o Apocalipse de João tem singular importância

para os destinos da Humanidade terrestre”.50

Emmanuel ainda tece comentários sobre as PROVAÇÕES DA IGREJA,

lembrando que “aproximando-se o ano de 1870, que assinalaria a falência da Igreja

com a declaração da infalibilidade papal, o Catolicismo experimenta provações

amargas e dolorosas. Exaustos de suas imposições, todos os povos cultos da Europa

não enxergaram nas suas instituições senão escolas religiosas, limitando-se-lhes as

finalidades educativas e controlando-se-lhes o mecanismo de atividades”.51

Recorda o autor espiritual de Há dois mil anos que “compreendendo que o

Cristo não tratara de açambarcar nenhum território do Globo, os italianos,

naturalmente, reclamaram os seus direitos no capítulo das reivindicações,

procurando organizar a unidade da Itália sem a tutela do Vaticano. Desde 1859

estabelecera-se a luta, que foi por muito tempo prolongada em vista da decisão da

França, que manteve todo um exército em Roma para garantia do pontífice da Igreja.

Mas a situação de 1870 obrigara o povo francês a reclamar a presença dos

guardas do Vaticano, triunfando as ideias de Cavour e privando-se o papa de todos os

poderes temporais, restringindo-se a sua posse material. Começa, com Pio IX, a

grande lição da Igreja. O período das grandes transformações estava iniciado, e ela,

que sempre ditara ordens aos príncipes do mundo, na sua sede de domínio, iria

tornar-se instrumento de opressão nas mãos dos poderosos.

Observava-se um fenômeno interessante: a Igreja, que nunca se lembrara

de dar um título real à figura do Cristo, assim que viu desmoronarem os tronos do

absolutismo com as vitórias da República e do Direito, construiu a imagem do Cristo-

Rei para o cume dos seus altares”.52 Emmanuel cita ainda que após as “afirmativas do

Sílabo e depois do famoso discurso do bispo Strossmayer (vide discurso a seguir), em

1870, no Vaticano, quando Pio IX decretava a infalibilidade pontifícia, o Clero tenta

reabilitar-se através de encíclicas de cunho social.

50 XAVIER, Francisco Cândido. A Caminho da Luz, ditado pelo Espírito Emmanuel, 22 a. edição, pag. 123 Rio de Janeiro, Ed FEB, 1996.

51 Idem.

52 Idem.

47 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

13-A

Discurso pronunciado no célebre Concílio

de 1870, pelo Bispo Strossmayer53

Veneráveis padres e irmãos:

Não sem temor, porém com uma consciência livre e tranquila, ante Deus que nos julga, tomo a palavra nesta augusta assembleia.

Prestei toda a minha atenção aos discursos que se pronunciaram nesta sala, e anseio por um raio de luz que, descendo de cima, ilumine a minha inteligência e me permita votar os cânones deste Concílio Ecumênico com perfeito conhecimento de causa.

Compenetrado da minha responsabilidade, pela qual Deus me pedirá contas, estudei com a mais escrupulosa atenção os escritos do Antigo e Novo Testamento, e interroguei esses veneráveis monumentos da Verdade: se o pontífice que preside aqui é verdadeiramente o sucessor de São Pedro, Vigário do Cristo e Infalível Doutor da Igreja.

Transporei-me aos tempos em que ainda não existiam o Ultramontanismo e o Galicanismo, em que a Igreja tinha por doutores: Paulo, Pedro, Tiago e João, aos quais não se pode negar a autoridade divina, sem pôr em dúvida o que a santa Bíblia nos ensina, santa Bíblia que o Concílio de Trento proclamou como a Regra da Fé e da Moral. Abri essas sagradas páginas e sou obrigado a dizer-vos: nada encontrei que sancione, próxima ou remotamente, a opinião dos ultramontanos? E maior é a minha surpresa quando, naqueles tempos apostólicos, nada há que fale de papa sucessor de São Pedro e Vigário de Jesus Cristo!

Vós, Monsenhor Manning, direis que blasfemo; vós, Monsenhor Pio, direis que estou demente! Não, monsenhores; não blasfemo, nem perdi o juízo! Tendo lido todo o Novo Testamento, declaro, ante Deus e com a mão sobre o crucifixo, que nenhum vestígio encontrei do papado.

Não me recuseis a vossa atenção, meus veneráveis irmãos! Com os vossos murmúrios e interrupções, justificais os que dizem, como o Padre Jacinto, que este concílio não é livre se assim for, tende em vista que esta augusta assembleia, que prende a atenção de todo o mundo, cairá no mais terrível descrédito.

Agradeço a S. Excia. o Monsenhor Dupanloup, o sinal de aprovação que me faz com a cabeça; isso me alenta e me faz prosseguir.

Lendo, pois, os santos livros, não encontrei neles um só capítulo, um só versículo que dê a Pedro a chefia sobre os apóstolos.

Não só o Cristo nada disse sobre esse ponto, mas, ao contrário, prometeu tronos a todos os apóstolos (Mateus, 19: 28), sem dizer que o de Pedro seria mais elevado que os dos outros!

Que diremos do seu silêncio?

A lógica nos ensina a concluir que o Cristo nunca pensou, em elevar Pedro à chefia do Colégio Apostólico.

Quando o Cristo enviou os seus discípulos a conquistar o mundo, a todos — igualmente — deu o poder de ligar e desligar, a todos — igualmente — fez a promessa do Espírito Santo.

Dizem as Santas Escrituras que até proibiu a Pedro e a seus colegas de reinarem ou 53 Fonte: http://www.autoresespiritasclassicos.com/Autores%20Espiritas%20Classicos%20%20Diversos/Cairbar%20Schutel/10/Cairbar%20Schutel%20-

%20Cartas%20a%20Esmo.htm.

48 – Jorge Hessen

exercerem senhoria (Lucas, 22:25 e 26).

Se Pedro fosse eleito Papa, Jesus não diria isso, porque, segundo a nossa tradição, o papado tem uma espada em cada mão, simbolizando os poderes espiritual e temporal.

Ainda mais: se Pedro fosse papa ou chefe dos apóstolos, permitiria que esses seus subordinados o enviassem, com João, a Samaria, para anunciar o Evangelho do Filho de Deus? (Atos, 8:14).

Que direis vós, veneráveis irmãos, se nos permitíssemos, agora mesmo, mandar Sua Santidade Pio IX, que aqui preside, e Sua Eminência, Monsenhor Plantier, ao Patriarca de Constantinopla, para convencê-lo de que deve acabar com o Cisma do Oriente?

O símile é perfeito, haveis de concordar!

Mas temos coisa ainda melhor:

Reuniu-se em Jerusalém um concílio ecumênico para rescindir questões que dividiam os fiéis.

Quem devia convocá-lo? Sem dúvida Pedro, se fosse papa. Quem devia presidi-lo? Por certo que Pedro. Quem devia formular e promulgar os cânones? Ainda Pedro, não é verdade? Pois bem: nada disso sucedeu! Pedro assistiu ao concílio com os demais Apóstolos, sob a direção de Tiago! (Atos, 15).

Assim, parece-me que o filho de Jonas não era o primeiro, como sustentais.

Encarando agora por outro lado, temos: enquanto ensinamos que a Igreja está edificada sobre Pedro, Paulo (cuja autoridade devemos todos acatar) diz-nos que ela está edificada — sobre o fundamento da fé dos apóstolos e profetas, sendo a principal pedra do ângulo, Jesus Cristo (Efésios, 2: 20).

Esse mesmo Paulo, ao enumerar os ofícios da Igreja, menciona apóstolos, profetas, evangelistas e pastores; e será crível que o grande Apóstolo dos Gentios se esquecesse do papado, se o papado existisse? Esse olvido me parece tão impossível como o de um historiador deste concílio que não fizesse menção de Sua Santidade Pio IX.

(Apartes: Silêncio, herege! Silêncio!)

Acalmai-vos, veneráveis irmãos, porque ainda não concluí. Impedindo-me de prosseguir, provareis ao mundo que sabeis ser injustos, tapando a boca do mais pequeno membro desta assembleia. Continuarei:

O Apóstolo Paulo não faz menção, em nenhuma das suas Epístolas, às diferentes Igrejas, da primazia de Pedro; se essa existisse e se ele fosse infalível como quereis, poderia

Paulo deixar de mencioná-la, em longa Epístola sobre tão importante ponto?

Concordai comigo: A Igreja nunca foi mais bela, mais pura e mais santa que naqueles tempos em que não tinha papa.

(Apartes: Não é exato! Não é exato!)

Por que negais, Monsenhor de Laval? Se algum de vós outros, meus veneráveis irmãos, se atreve a pensar que a Igreja, que hoje tem um papa (que vai ficar infalível), é mais firme na fé e mais pura na moralidade que a Igreja Apostólica, diga-o abertamente ante o Universo, visto como este recinto é um centro do qual as nossas palavras voam de polo a polo!

Calai-vos? Então continuarei:

Também nos escritos de Paulo, de João, ou de Tiago, não descubro traço algum do poder papal! Lucas, o historiador dos trabalhos missionários dos apóstolos guarda silêncio sobre tal assunto!

Isso vos deus preocupar muito.

49 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

Não me julgueis um cismático!

Entrei pela mesma porta que vós outros; o meu título de bispo deu-me direito a comparecer aqui, e a minha consciência, inspirada no verdadeiro Cristianismo, me obriga a dizer-vos o que julga ser verdade.

Penso que, se Pedro fosse vigário de Jesus Cristo, ele não o sabia, pois que nunca procedeu como papa: nem no dia de Pentecostes, quando pregou o seu primeiro sermão, nem no Concílio de Jerusalém, presidido por Tiago, nem em Antioquia, nem nas Epístolas que dirigiu às Igrejas. Será possível que ele fosse papa sem o saber?

Parece-me escutar de todos os lados: Pois Pedro não esteve em Roma? Não foi crucificado de cabeça para baixo? Não existem os lugares onde ensinou e os altares onde disse missa nessa cidade?

E eu responderei: Só a tradição, veneráveis irmãos, é que nos diz ter Pedro estado em Roma; e como a tradição é tão somente a tradição da sua estada em Roma, é com ele que me provareis o seu episcopado e a sua supremacia?

Scalígero, um dos mais eruditos historiadores, não vacila em dizer que o episcopado de Pedro e a sua residência em Roma devem-se classificar no número das lendas mais ridículas! (Repetidos gritos e apartes: tape-lhe a boca, fazei-o descer dessa cadeira!)

Meus veneráveis irmãos, não faço questão de calar-me, como quereis, mas não será melhor provar todas as coisas como manda o apóstolo e crer só no que for bom? Lembrai-vos de que temos um ditador ante o qual todos nós, mesmo Sua Santidade Pio IX, devemos curvar a cabeça: Esse ditador, vós bem o sabeis, é a História!

Permiti que repita: folheando os sagrados escritos, não encontrei ó mais leve vestígio do papado nos tempos apostólicos.

E, percorrendo os Anais da Igreja, nos quatro primeiros séculos, o mesmo sucedeu!

Confessar-vos-ei que encontrei o seguinte:

Que o grande Santo Agostinho, Bispo de Hipona, honra e glória do Cristianismo e secretário no Concílio de Melive, nega a supremacia ao bispo de Roma!

Que os bispos da África, no Sexto Concílio de Cartago, sobe presidência de Aurélio, bispo dessa cidade, admoestavam a Celestino, Bispo de Roma, por supor-se superior aos demais bispos, enviando-lhes comissionados e introduzindo o orgulho na Igreja.

Que portanto, o papado não é instituição divina.

Deveis saber, meus veneráveis irmãos, que os padres do Concílio de Calcedônia colocaram os bispos da antiga e da nova Roma na mesma categoria dos demais bispos.

Que aquele Sexto Concílio de Cartago proibiu o título de Príncipe dos Bispos, por não haver soberania entre eles.

E que São Gregório I escreveu estas palavras, que muito aproveitam à tese: "Quando um patriarca se intitula Bispo Universal, o título de patriarca sofre incontestavelmente descrédito. Quantas desgraças não devemos nós esperar, se entre os sacerdotes se suscitarem tais ambições?

Esse bispo será o rei dos orgulhosos! (Pelágio II, Cett. 15).

Com tais autoridades e muitas outras que poderia citar-vos, julgo ter provado que os primeiros bispos de Roma não foram reconhecidos como bispos universais ou papas, nos primeiros séculos do Cristianismo.

E para mais reforçar os meus argumentos, lembrarei aos meus veneráveis irmãos que foi Osio, bispo de Córdova, quem presidiu o Primeiro Concílio de Nicéia, redigindo os seus cânones; e que foi ainda esse bispo que, presidindo o Concílio de Sardica, excluiu o enviado de Júlio, Bispo de Roma!

50 – Jorge Hessen

Mas da direita me citaram estas palavras do Cristo “Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja”.

Sois, portanto, chamados para este terreno.

Julgais, veneráveis irmãos, que a rocha ou pedra sobre que a Santa Igreja está edificada é Pedro; mas permiti que eu discorde desse vosso modo de pensar.

Diz Cirilo, no seu quarto livro sobre a Trindade: “A rocha ou pedra de que nos fala Mateus é a fé imutável dos Apóstolos”.

Olegário, Bispo de Poitiers, em seu segundo livro sobre a Trindade, repete: “aquela pedra é a rocha da fé confessada pela boca de Pedro. É no seu sexto livro mais luz nos fornece dizendo: “e sobre esta rocha da confissão da fé que a Igreja está edificada”.

Jerônimo no sexto livro sobre Mateus é de opinião de que Deus fundou a sua Igreja, sobre a rocha, ou pedra, que deu nome a Pedro.

Nas mesmas águas navega Crisóstomo, quando, em sua homilia 56 a respeito de Mateus, escreve: "Sobre esta rocha edificarei a minha Igreja: e esta rocha é a confissão de Pedro."

E eu vos perguntarei, veneráveis irmãos, qual foi à confissão de Pedro? Já

que não me respondeis, eu vo-la darei: "Tu és o Cristo, o filho de Deus.''

Ambrósio, Arcebispo de Milão; Basílio de Salência e os padres do Concílio de Calcedônia, ensinam precisamente a mesma coisa.

Entre os doutores da Antiguidade Cristã, Agostinho ocupa um dos primeiros lugares, pela sua sabedoria, e pela sua santidade. Escutai como ele se expressa sobre a Primeira Epístola de João: "Edificarei a minha Igreja sobre esta rocha, significa claramente que é sobre a fé de Pedro."

No seu tratado 124, sobre o mesmo João, encontra-se esta frase significativa: "Sobre esta rocha, que acabais de confessar, edificarei a minha Igreja; e a rocha era o próprio Cristo, filho de Deus."

Tanto esse grande e santo bispo não acreditava que a Igreja fosse edificada sobre Pedro, que disse em seu sermão n. 13: "Tu és Pedro, e sobre esta rocha ou pedra, que me confessaste, que reconheceste, dizendo: Tu és o Cristo, o filho de Deus vivo, edificarei a minha Igreja; sobre mim mesmo: pois sou o Filho de Deus vivo, edificarei sobre mim mesmo, e não sobre ti."

Haverá coisa mais clara e positiva?

Deveis saber que essa compreensão de Agostinho; sobre tão importante ponto do Evangelho, era a opinião corrente do mundo cristão naqueles tempos. Estou certo de que não me contestareis.

Assim é que, resumindo, vos direi:

1. Que Jesus deu aos outros apóstolos o mesmo poder que deu a Pedro. 2. Que os apóstolos nunca reconheceram em Pedro a qualidade de vigário do Cristo e

infalível Doutor da Igreja. 3. Que o mesmo Pedro nunca pensou ser papa, nem fez coisa alguma como papa. 4. Que os concílios dos quatro primeiros séculos nunca deram, nem reconheceram o

poder e a jurisdição que os bispos de Roma queriam ter. 5. Que os Padres da Igreja, na famosa passagem: “Tu és Pedro e sobre essa pedra (a

confissão de Pedro) edificarei a minha Igreja” nunca entenderam que a Igreja estava edificada sobre Pedro (super petrum), isto é: sobre a confissão da fé do Apóstolo.

51 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

Concluo, pois, como a História, a razão, a lógica, o bom senso e a consciência do verdadeiro cristão, que Jesus não deu supremacia alguma a Pedro, e que os Bispos de Roma só se constituíram soberanos da Igreja confiscando um por um, todos os direitos do episcopado!

(Vozes de todos os direitos do episcopado! Vozes de todos os lados: Silêncio, Insolente! Silêncio! Silêncio!)

Não sou insolente! Não, mil vezes não!

Contestai a História, se ousais fazê-lo; mas ficai certos de que não a destruireis!

Se eu alguma inverdade, ensinai-me isso com a História, da qual vos prometo fazer a mais honrosa apologia! Mas, compreendei que não disse ainda tudo quanto quero e posso dizer! Ainda que a fogueira me aguardasse lá fora, eu não me calaria!

Sedes pacientes como manda Jesus. Não juntei a cólera ao orgulho que vos domina!

Disse Monsenhor Dupanloup, nas suas célebres Observações sobre este Concílio do Vaticano, e com razão, que se declararmos infalível a Pio IX, necessariamente precisamos sustentar que infalíveis também eram todos os seus antecessores. Porém, veneráveis irmãos, com a História na mão, vos provareis que alguns papas faliram.

Passo a provar-vos, meus veneráveis irmãos, com os próprios livros existentes na

Biblioteca deste Vaticano, como é que faliram alguns dos papas que nos têm governado:

O papa Marcelino entrou no Templo de Vesta e ofereceu incenso à deusa do Paganismo.

Foi, portanto, idolatra; ou pior ainda foi apóstata.

Libório consentiu na condenação de Atanásio; depois passou-se para o Arianismo.

Honório aderiu ao monoteísmo.

Gregório I chamava Anticristo ao que se impunha como Bispo Universal; entretanto, Bonifácio III conseguiu obter do parricida Imperador Focas este título em 607.

Pascoal II e Eugênio III autorizavam os duelos, condenados pelo Cristo: enquanto Júlio

II e Pio IV os proibiram. Adriano II, em 872, declarou válido o casamento civil; entretanto, Pio VII, em 1823, condenou-o!

Xisto V publicou uma edição da Bíblia, e com uma bula recomendou a sua leitura; e aquele Pio VII excomungou a edição!

Clemente XIV aboliu a Companhia de Jesus, permitida por Paulo III; e Pio VII restabeleceu-a!

Porém, para que mais provas? Pois o nosso Santo Padre Pio IX não acaba de fazer a mesma coisa quando, na sua bula para os trabalhos deste Concílio, dá como revogado tudo quanto se tenha feito em contrário ao que aqui for determinado, ainda mesmo tratando-se de decisões dos seus antecessores?

Até isso negareis?

Nunca eu acabaria, meus veneráveis irmãos, se me propusesse a apresentar-vos todas as contradições dos papas, em seus ensinamentos!

Como então se poderá dar-lhes a infalibilidade? Não sabeis que, fazendo infalível Sua Santidade, que presente se acha e me ouve, tereis de negar a sua falibilidade e a dos seus antecessores.

E atrevereis a sustentar que o Espírito Santo vos revelou que a infalibilidade dos papas data apenas deste ano de 1870?

Não vos enganeis a vós mesmos: Se decretais o dogma da infalibilidade papal, vereis os protestantes, nossos rancorosos adversários, penetrarem por larga brecha com a bravura

52 – Jorge Hessen

que lhes dá a História.

E que tereis vós a opor-lhes? O silêncio, se não quiserdes desmoralizar-vos. (Gritos: É demais; basta! basta!)

Não griteis, monsenhores! Temer a História, é confessar-vos derrotados! Ainda que pudésseis fazer correr toda a água do Tibre sobre ela, não borraríeis nem uma só de suas páginas! Deixai-me falar e serei breve.

Virgílio comprou o papado de Belizário, tenente do Imperador Justiniano. Por isso foi condenado no Segundo Concílio da Calcedônia, que estabeleceu este cânone: "O bispo que se eleve por dinheiro será degradado".

Sem respeito àquele cânone, Eugênio III, seis séculos depois, fez o mesmo que Virgílio, e foi repreendido por Bernardo, que era a estrela brilhante do seu tempo.

Deveis conhecer a história do Papa formoso: Estevão XI fez exumar o seu corpo, com as vestes pontificais: mandou cortar-lhe os dedos e o arrojou no Tibre. Estevão foi envenenado; e tanto Romano como João, seus sucessores, reabilitaram a memória de Formoso.

Lede Plotino, lede Barônio, Barônio, o Cardeal! É dele que me sirvo!

Barônio chega a dizer que as poderosas cortesãs vendiam, trocavam e até se apoderavam dos bispados; e, horrível é dizê-lo, faziam seus amantes serem papas!

Genebrado sustenta que, durante 150 anos, os papas, em vez de apóstolos, foram apóstatas!

Deveis saber que o Papa João XII foi eleito com a idade de apenas dezoito anos; e que seu antecessor era filho do Papa Sérgio com Marozzia!

Que Alexandre XI era... nem me atrevo a dizer o que ele era de Lucrecia! e que João XXII negou a imortalidade da alma, sendo deposto pelo Concílio de Constança.

Já nem falo dos cismas que tanto têm desonrado a Igreja. Volto, porém, a dizer-vos que se decretais a infalibilidade do atual Bispo de Roma, devereis decretar também a da todos os seus antecessores: mas, vós atrevereis a tanto? Sereis capazes de igualar, a Deus todos os incestuosos, avaros, homicidas e simoníacos Bispos de Roma? (Gritos: Descei da cadeira, descei já! Tapemos a boca desse herege).

Não griteis, meus veneráveis irmãos. Com gritos nunca me convencereis! História protestará eternamente sobre o monstruoso dogma da infalibilidade papal; e, quando mesmo todos vós aproveis, faltará um voto, e esse voto é o meu!

Mas, voltemos à doutrina dos Apóstolos:

Fora dela só há erros, trevas e falsas tradições. Tomemos a eles e aos profetas nossos únicos mestres, sob a chefia da Jesus.

Firmes e imóveis como a rocha, constantes e incorruptíveis nas inspiradas Escrituras digamos ao mundo: Assim como os sábios da Grécia foram vencidas Paulo, assim a Igreja Romana será vencida pelo seu 98.

(Gritos clamorosos: Abaixo o protestante! Abaixo o calvinista! Abaixo o traidor da Igreja!)

Os vossos gritos, monsenhores, não me atemorizam, e só vos comprometem. As minhas palavras têm calor, mais minha cabeça está perene. Não sou de Lutero, nem de Calvino, nem de Paulo, e, sim, e tão somente, do Cristo! (Novos gritos: Anátema! Anátema vos lançamos!)

Anátema! Anátema! para os que contrariam a Doutrina de Jesus! Ficai certos de que os apóstolos, se aqui comparecessem, vos diriam a mesma coisa que vos acabo de declarar.

Que lhes direis vós, se eles, que predicaram e confirmaram com o seu sangue,

53 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

lembrando-os o que escreveram, vos mostrassem o quanto tendes deturpado o Evangelho do Amado Filho de Deus? Acaso lhes diríeis: Preferimos a doutrina dos Loiolas à do Divino Mestre?

Não! mil vezes não! A não ser que tenhais tapado os ouvidos, fechado os olhos e embotado a vossa inteligência, o que não creio.

Oh, se Deus nos quer castigar fazendo cair pesadamente a sua mão sobre nós, como fez ao faraó, não precisa permitir que os soldados de Garibaldi nos expulsem daqui; basta deixar que façais de Pio IX um Deus, como já fizeste uma deusa de Maria!

Evitai, sim, evitai, meus veneráveis irmãos, o terrível precipício a cuja borda estais colocados! Salvai a Igreja do naufrágio, que a ameaça, e busquemos todos, nas sagradas Escrituras, a regra da Fé que devemos ter e professar! Digne-se de assistir-me! Tenho concluído!

(Todos os padres se levantaram, muitos sairão da sala; porém, alguns prelados Italianos, americanos, franceses e Ingleses rodearam o inspirado orador e, com fraternais apertos de mão, demonstraram concordar com o seu modo de pensar.)

Coisa singular: desde a tal infalibilidade dos papas, vem a Igreja como se

atirando num despenhadeiro, de cabeça para baixo!

Quão inspirado estava o Bispo Strossmayer!

54 – Jorge Hessen

14

A Terceira Revelação é a

personificação de Jesus que

retorna ao mundo

A lei do Antigo Testamento teve em Moisés a sua personificação; a do Novo

Testamento tem-na no Cristo. O Espiritismo é a Terceira Revelação da Lei de Deus,

mas não tem a personificá-la nenhuma individualidade, porque é fruto do ensino

dado, não por um homem, sim pelos Espíritos, que são as vozes do Céu, em todos os

pontos da Terra, com o concurso de uma multidão inumerável de intermediários.

É, de certa maneira, um ser coletivo, formado pelo conjunto dos seres do

mundo espiritual, cada um dos quais traz o tributo de suas luzes aos homens, para

lhes tornar conhecidos esse mundo e a sorte que os espera.54

Sabemos que a Lei de Deus foi expressa no Sinai a Moisés, as Lições de Jesus

em Israel e a Terceira Revelação a Allan Kardec na França de 1857. Cada uma dessas

revelações foi a expansão das ideias apresentadas anteriormente, obedecendo a

inequívoca lei do progresso. Obviamente toda Revelação tem por característica a

Verdade. Se for desmentida por fatos, deixa de ter origem Divina, pois Deus não se

engana nem mente.

Observemos que com Moisés temos o impacto da força e do temor, para

arrancar os homens da idolatria (bezerro de ouro) e da submissão ao paganismo.

Com Jesus temos o exercício da fé e do amor, para livrar o homem do

aguilhão dos formalismos, da tradição, inspirando-o à prática da fraternidade. Com os

Espíritos concretiza-se o emprego da verdade, que ilumina a fé pelo raciocínio, para

que o espírito humano possa amar compreendendo sua transcendência. O homem já

não deve temer, nem apenas crer e amar, mas também e, sobretudo saber para que

crê e porque ama.

Uma importante revelação se cumpre na época atual: a que nos mostra a

possibilidade de se comunicar com os seres do mundo espiritual, pela mediunidade.

Esse conhecimento não é novo, sem dúvida; mas permaneceu, até os nossos

dias, de certa forma, no estado de letra morta, quer dizer, sem proveito para a 54 KARDEC, Alan. O Evangelho Segundo o Espiritismo, RJ: Ed. FEB,2003, Cap I.

55 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

Humanidade.55

O mestre Lionês explica que o Cristo, tomando da lei antiga o que era eterno

e divino, e rejeitando o que não era senão transitório, puramente disciplinar e de

concepção humana [leis mosaicas], acrescentou a revelação da vida futura, a das

penas e recompensas que esperam o homem depois da morte.

Dando-nos a conhecer o mundo invisível, as leis que o regem, suas relações

com o mundo visível, a natureza e o estado dos seres que o habitam e em

consequência, o destino do homem depois da morte. A ideia vaga da vida futura

acrescenta a revelação do mundo invisível que nos cerca e povoa o espaço, e, com

isto, fixa a crença, dá-lhe um corpo, uma consistência, uma realidade no

pensamento.56

Um dos pontos altos da Terceira Revelação é a lei das vidas sucessivas,

objetivando demonstrar que o Espírito não encarna uma só vez, mas, tantas e

quantas forem necessárias a fim de se tornar um Espírito perfeito e portador das

mais nobres qualidades morais e espirituais.

A reencarnação, cujo princípio o Cristo colocou no Evangelho, mas sem

defini-lo, é, sem dúvida, uma das leis mais importantes reveladas (relembradas) pelo

Espiritismo, no sentido de que lhe demonstra a realidade e a necessidade para o

progresso.

A Terceira Revelação, bem longe de negar ou de destruir o Evangelho, vem

ao contrário, confirmar, explicar e desenvolver, pelas novas leis da Natureza que

revela, tudo o que o Cristo disse e fez; traz a luz sobre o ponto obscuro dos seus

ensinamentos, de tal sorte que aqueles para quem certas partes do Evangelho eram

ininteligíveis, ou pareciam inadmissíveis, as compreendem sem esforço, com a ajuda

do Espiritismo, e as admitem, veem melhor a sua importância e podem separar a

realidade da alegoria.

Não resta dúvida de que, os Evangelhos têm sido entendidos, ao longo dos

séculos, precipuamente em sua feição literal; mas, com a Revelação dos Espíritos, a

interpretação literal, tendo em vista o estádio evolutivo das gerações, de há muito

não prevalece. O Espiritismo — Terceira Revelação —, com suas raízes mais

profundas fincadas no Evangelho do Cristo, não deixa de apresentar-se como

doutrina essencialmente dinâmica, evolutiva.57

Para André Luiz a Terceira Revelação entroniza a certeza que a

mediunidade atual é, essencialmente, a profecia das religiões de todos os tempos. 55 KARDEC, Alan. A Gênese, RJ: Ed. FEB, 2001, Cap I.

56 Idem.

57 Artigo de Juvanir Borges de Souza, publicado em Reformador - abril de 1977.

56 – Jorge Hessen

Com a diferença de que a mediunidade hoje é uma concessão do Senhor à

Humanidade em geral, considerando-se a madureza do entendimento humano, à

frente da vida.58

A mediunidade em si não é coisa recente, a diferença atualmente dela é tão-

somente a forma de mobilização, porque a liderança religiosa de várias procedências

jaz, há muitos séculos, engessado no estéril culto exterior, espetaculizando

indebitamente o conjunto das revelações metafísicas.

Sobretudo a religião Cristã de várias denominações, que deveria ser a mais

consistente e a mais simples das propostas de fé, há vários séculos se embutiu no

superficialismo dos templos de pedra. Era mister, transferir-lhes os princípios, a

benefício do mundo que, cientificamente, hoje se banha no clarão de nova era.59

Motivo pelo qual, pela Terceira Revelação, o Senhor da Vida deliberou que a

mediunidade fosse trazida do colégio sacerdotal à praça pública, a fim de que a noção

da eternidade, através da sobrevivência da alma, desperte a mente narcotizada do

povo. O próprio Cristo, Instrumento de Deus por excelência, se utilizou da

mediunidade para acender a luz da sua Doutrina de Amor.

Seja aliviando as dores de enfermos e asserenando os que estavam sob o

impacto da aflição, e não raro, comunicou-se com os desencarnados, alguns dos quais

Espíritos sofredores a subjugarem obsedados de diversas gradações. E, além de

surgir em colóquio com Moisés materializado no Tabor, Ele mesmo é o grande

ressuscitado, legando aos homens o sepulcro vazio.60

A Terceira Revelação, sem quaisquer arrogâncias, simbolicamente, é Jesus

que retorna ao mundo, instando-nos ao crescimento espiritual. À Revelação Espírita

deveremos, acima de tudo, a luz para vencer os tenebrosos enigmas da

desencarnação, a fim de que nos consorciemos, afinal, com as legítimas noções da

consciência cósmica. E como ressalta André Luiz: será pouco revelar a excelsitude da

Justiça? Será desprezível descortinar a vida em suas ilimitadas facetas de evolução e

eternidade?61

Portanto, através da Terceira Revelação observaremos embevecidamente,

dos cimos da consciência de realidade, os estreitos compartimentos das cogitações

terrenas, compreendendo racionalmente, por fim, que o esplendor reservado ao

homem é excelso e infinito, no Reino Divino do Universo.

Com a certeza na vida futura que o Espiritismo comprova de modo tão

claro, o homem adquire força para seguir sua caminhada, certo de que um dia esse 58 XAVIER, Francisco Cândido. Nos Domínios da Mediunidade, RJ: Ed FEB, 1999, Cap. "Apontamentos à Margem".

59 Idem.

60 Idem ibidem.

61 Idem ibidem.

57 – O Espiritismo é Cristão? Com Certeza!

Deus interno que existe dentro de nós resplenderá inteiramente e ofuscará de vez o

homem velho que ainda faz morada em nossa alma.

58 – Jorge Hessen