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CCUUAANNGGOO2 Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

Sumário ExecutivoSumário Executivopresente relatório é umasequência do realizadoem 2005, Lundas: As Pe-

dras da Morte, que aborda osefeitos trágicos da exploraçãodos diamantes na vida das po-pulações locais, os incentivosinstitucionais à violação perma-nente dos direitos humanos,com a privatização da violência,e ao saque desmedido dessesrecursos.

Por incapacidade finan-ceira e logística, este trabalhocircunscreve-se apenas à baciahidrográfica do Cuango, ouseja, ao município com o mes-mo nome. O primeiro relatórioprocurou ser mais abrangente,envolvendo as províncias daLunda-Norte e Sul, numa exten-são territorial de quase 200.000kms e mais de um milhão dehabitantes. O Cuango, com umasuperfície de 6.818,8 kms,situa-se no extremo sudoesteda província da Lunda-Norte etem uma população de 140.000habitantes, segundo estimativasoficiais. Essa região é notóriapela imigração ilegal, às deze-nas de milhar, por causa dogarimpo e consequente comér-cio.

Como área tradicional deexploração de diamantes, oCuango alberga três grandesprojectos diamantíferos a saber:Sociedade de DesenvolvimentoMineiro (SDM), com sede nacapital administrativa do Cuan-go; Sociedade Mineira do Cuan-go (SMC), no sector de Cafunfo,e Sociedade Mineira Luminas,na comuna do Luremo. Por suavez, a SDM é protegida pelaAlfa-5, a SMC conta com o con-curso da Teleservice e a Lumi-nas tem contrato com a K&PMineira.

Com o termo da "Opera-ção Brilhante" , em Fevereiro de2005, as empresas privadas desegurança assumiram, na práti-ca e de forma integral, na regiãodo Cuango, a responsabilidadede combater o garimpo.

Em termos práticos toda aregião do Cuango, com excep-ção das zonas administrativasdo Estado e algumas áreas deconcentração populacional, po-de ser considerada de zonarestrita e de protecção , confor-me a Lei nº16/94 de 7 de Outu-bro que institui o Regime Espe-cial das Zonas de Reserva Dia-mantífera. Esse regime tambémé conhecido como a Lei dosDiamantes.

Ademais, nas zonas restri-tas e de protecção, de acordocom o nº1 do artº 20º, da Lei dosDiamantes, "é proibida [...] qual-quer espécie de actividade eco-

"Para nós, "Para nós, Angola é um país estrangeiro. Angola é um país estrangeiro. Nós, angolanos, somos tratados piores do que animais", Nós, angolanos, somos tratados piores do que animais",

José Bartolomeu, garimpeiroJosé Bartolomeu, garimpeiro

O

Resultados EsperadosDiscussão, na Assembleia Nacional, da Lei dos Diamantes,

actualmente usada para justificar o saque e a violência, de modoa transformá-la num instrumento jurídico de protecção, também,dos interesses das populações locais.

O fim das práticas de sadismo, crueldade e humilhação porparte das empresas privadas de segurança e exploradorasmineiras contra a população do Cuango.

Sensibilização da opinião pública nacional e internacionalsobre o comportamento neo-colonialista da indústria diaman-tífera em Angola.

Tomada de medidas concretas e públicas, por parte dogoverno, para o respeito e a protecção da vida humana, nasáreas diamantíferas.

Maior abordagem pública sobre a realização de investi-mentos sociais e de diversificação da mono-economia dos dia-mantes, por forma a fomentar a criação de empregos, para esta-bilidade social e política da região.

nómica, seja qual for a sua natu-reza, industrial, comercial, agrí-cola ou outra [...].

Com efeito, o Governodividiu o Cuango em três parce-las e entregou-as à SDM, SMCe Luminas. Por essa via, a Alfa-5, contratada pela SDM, contro-la a sede do Cuango, a K&PMineira (Luminas) o Luremo e aTeleservice (SMC) o sector deCafunfo. Assim, o controlo exer-cido por essas empresas pri-vadas de segurança estende-sea todo o território do Cuango.Os métodos utilizados resu-mem-se na violação sistemáticados direitos humanos, em nomeda Lei e da autoridade concedi-da pelo Estado.

Essas violações têm umprofundo cariz de sadismo umavez que, de forma generalizada,a prática dos guardas das trêsempresas incide em violentar assuas vítimas nas nádegas, emdespi-los e circulá-los na via pú-blica, assim como outros rituaisde humilhação. Utilizam, comoinstrumentos privilegiados detortura, a pá, o cabo desta, cata-nas e mocas. No caso particularda Alfa-5, documentam-sevários casos em que as vítimassão obrigadas a ter relaçõeshomossexuais entre si, tendochegado ao extremo de seforçar um genro a violar o seusogro.

Trabalhos forçados nasinstalações e áreas de trabalhodas referidas empresas deexploração diamantífera torna-ram-se parte da rotina dos ga-rimpeiros, como punição admi-nistrada pelas referidas empre-sas. Outrossim, a K&P Mineiraexerce um duplo papel ao pres-tar serviços, à Sociedade Minei-ra Luminas e, ao mesmo tempo,à Sodiam/LKI e Ascorp. Noprimeiro caso, tem a missão deexpulsar os garimpeiros da áreade concessão da Luminas, oque o faz com total arbitrarie-dade e violência. No segundocaso, protege e acompanha aSodiam/LKI e a Ascorp no agen-ciamento e patrocínio dos ga-rimpeiros bem como nas tran-sacções com estes.

Apesar da Lei dos Dia-mantes salvaguardar a práticada exploração artesanal de dia-mantes, ou seja o garimpo legal(Capítulo III da Lei nº16/94) , porparte das populações locais, oGoverno prefere remete-las auma situação de ilegalidadepermanente.

Qualquer actividade agrí-cola ou comercial, na região,como no resto das Lundas,carece de autorização directado governador provincial. É con-

hecida a inexistência de qual-quer licença de exploração arte-sanal ou para a prática da agri-cultura de subsistência entre apopulação local. Assim, o Go-verno impede-a de sobreviversem recurso à ilegalidade.

Trágicas são as conse-quências. Por exemplo, a 20 deAbril de 2006, guardas da K&PMineira impediram FranciscoPinto de pescar no Rio Lumo-nhe, com o argumento de que orio e os peixes também sãoparte da concessão da SMC e oagrediram até perder os senti-dos. Óscar Neves apanhou umacoronhada no olho e uma surrade cintos da Teleservice por tersido encontrado a tomar banhono Rio Cuango, onde sempre ofez, como os outros aldeães,por inexistência de água canali-zada na região. Porque, o riotambém "foi concessionado".

A Lei sobre as EmpresasPrivadas de Segurança (Leinº19/92 de 31 de Julho) proíbe,no seu artº4º alínea a) as activi-dades de segurança que envol-vam "investigação criminal dequalquer tipo". O nº2 do artº4ºproíbe "as actividades das em-presas privadas de segurançaque colidam com o desempe-nho das funções próprias dasforças e serviços de segurançae de protecção civil do Estado".

Essas empresas não ob-servam os deveres especiaisde, segundo a alínea a) doartº15º da mesma Lei, "dar ime-diato conhecimento à autori-dade judicial ou policial compe-tente de qualquer crime públicode que tenham conhecimentono exercício das suas funçõesou que esteja na eminência deser cometido".

A alínea b) artº15º da refe-rida Lei, exige que se evite que"a actuação do seu pessoalpossa ser confundida pelo públi-co com a dos elementos dasForças Armadas ou das forças eserviços de segurança e pro-tecção civil do Estado".

Os casos documentadosdemonstram claramente o totaldesrespeito pela Lei e uma arbi-trariedade sem precedentes,por parte dessas empresas emdeter, interrogar e torturar cida-dãos, assim como patrulhar viaspúblicas e bairros, uniformiza-dos e armados para situaçõesde combate.

Por sua vez, as empresasdiamantíferas em nada con-tribuem para a minimização damiséria das populações naquelaregião, para além da propagan-da empresarial. Sem empregosou outras alternativas, as popu-lações locais tornam-se exclusi-

vamente dependentes do garim-po e presas fáceis das políticasde combate ao garimpo. Essacombinação letal vai dizimandoas populações de forma lenta ecom o silêncio cúmplice degovernos e instâncias interna-cionais mais preocupados emobter contratos lucrativos ou afazer fretes ao regime. A regiãodo Cuango tem a particulari-dade de estar sob controloefectivo, do ponto de vista mili-tar, de forças privadas de segu-rança. Tal situação representa,pois, uma ameaça à instituiçãode um verdadeiro Estado deDireito e democrático em Ango-la.

Por sua vez, a subalter-nização da administração local,autoridades policiais e militaresaos desígnios das empresasque operam na região, ante anegligência da Endiama, comoconcessionária, conta com acobertura de altas figuras doregime que velam apenas pelosseus interesses particulares.

Desse modo, o acessoprivilegiado às riquezas man-tém-se sujeita ao binómio daviolência e da corrupção. Amanutenção do poder em Ango-la continua amarrada a essalógica, em detrimento da trans-parência e da verdadeira demo-cracia.

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CCUUAANNGGOO 3Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

O GovernoO Governo"Os garimpeir"Os garimpeiros não são cães"os não são cães"

Gomes Maiato, governadorGomes Maiato, governador da Lunda-Norda Lunda-Nortete

a sequência da publi-cação do relatório Lun-das: As Pedras da Morte,

o Ministro da Administração doTerritório, Virgílio Fontes Perei-ra, concedeu uma audiência aoautor, a 05 de Junho de 2005,para dialogar sobre a situaçãoda administração do Estado eos direitos humanos nas Lun-das. Esteve presente o DirectorNacional de Administração Lo-cal, António da Costa LopesFaria.

Como medidas, informousobre o encontro que manteria,no dia seguinte, com o Pri-meiro-Ministro Fernando Diasdos Santos "Nandó", a quemtransmitiria as preocupaçõesexpostas no encontro, bemcomo faria chegar uma cópiado relatório ao seu superiorhierárquico.

Mais elaborou sobre asinquietações do seu partidorelacionadas com a situaçãovigente naquela região e ospreparativos, à data, da visitado Vice-Presidente do MPLA,Pitra Neto, para uma abor-dagem sobre "o desenvolvi-mento sócio-económico" daLunda-Norte.

Uma vez que o presenterelatório se resume apenas àregião do Cuango, bem sepode aferir a redução de ten-sões entre a administração lo-cal e a respectiva população,

N

maior recompensa do pre-sente trabalho humanitário,num ambiente tão desolador

como o das Lundas, é a afirma-ção, por parte da população local,sobre a relativa melhoria no com-portamento da PN, na localidadede Cafunfo.

Esse reconhecimento pro-vém, de forma espontânea e gra-ta, de cidadãos comuns que reve-lam o alívio que sentem quandovêm os agentes da PN a patrulhara vila, desarmados (sem AK’s),durante o dia.

O caso da ManassejaLituaia (cfr. anexo 9.1) foi o pontode viragem. Uma comissão deinvestigação, mandatada peloComando-Geral da PN, acom-panhou-a à Cafunfo, Cuango eDundo, tendo resultado em mu-danças dos efectivos afectos à in-vestigação criminal e imposição

de maior disciplina aos agentesda ordem pública, no relaciona-mento com a população.

Durante a visita do autor, a

título de exemplo, foi possívelobter a devolução da arca frigorí-fica de António José Panzo, 43anos, que o investigador Bumba,

colocado no Luremo, confiscou, a6 de Fevereiro de 2006, de formacoerciva e ilegal da residência dosupracitado.

O investigador havia inter-ceptado António José Panzo, navia do Mussango, com cinco pe-dras de diamantes. Para além dese apossar das referidas pedras,já na Esquadra Policial do Lure-mo, o investigador exigiu maisU$600 pela libertação do indiví-duo. Na impossibilidade de pagarpelo resgate da liberdade, oagente Bumba perguntou ao deti-do se tinha uma arca em casa, aoque este respondeu afirmativa-mente.

Para ter certeza do sucessodo seu expediente, o investigadorlevou a arca para a residência detrânsito da PN, tendo obrigado ocidadão a aguardar junto doelectrodoméstico, por mais de

duas horas, até que as cervejasestivessem bem geladas. Casocontrário, passaria mais tempo nacadeia. Com as cervejas a "esta-lar", António Panzo passou ape-nas uma noite na cela da esqua-dra.

Tendo o caso chegado aosseus superiores, em Cafunfo e noCuango, apurou-se a veracidadedos factos, ordenou-se a restitu-ição do bem alheio e se aplicou adevida sanção, com a transferên-cia do agente e outros procedi-mentos disciplinares não especifi-cados.

Em resposta, um oficial localreconhece que a população temmudado, no mesmo diapasão,dispondo-se cada vez menos afazer justiça por mãos próprias oua confrontar os agentes da Lei eda Ordem, como nos anos passa-dos.

AA Polícia Nacional (PN)A Polícia Nacional (PN)

desde o segundo semestre de2005.

Como ilustração, o admin-istrador municipal do Cuango,Passos Gonga, ao ouvir, doautor, à porta da sua residên-cia, relatos sobre os desman-dos das empresas privadas desegurança contra as popula-ções locais, a 1 de Abril de2006, de imediato informou ogovernador da Lunda-Norte,Gomes Maiato.

De início, o administradortentou atribuir as denúncias a"uma certa oposição" que tempor objectivo "difamar e dene-grir a imagem do governo e dopartido no poder, o MPLA".Diante das evidências fotográfi-cas e a demonstração da reco-lha directa dos casos expostos,por parte do autor, o adminis-trador manifestou desconheci-mento da situação e lamentoua omissão de tais dados nassuas reuniões semanais comas autoridades policiais, mili-tares e tradicionais, oposição esociedade civil.

No segundo encontro, a10 de Abril de 2006, o admin-istrador Passos Gonga mani-festou as diligências encetadaspelas autoridades locais e pro-vinciais no sentido de averiguaro conteúdo das denúnciasjunto dos visados e a conse-quente tomada de medidas.

Para além dos encontros

a nível local, orientados peloadministrador Passos, a 12 deMaio de 2006, o GovernadorGomes Maiato reuniu com oPresidente do Conselho deAdministração da Endiama,Arnaldo Calado, e represen-tantes das empresas privadasde segurança.

No encontro, de acordocom um dos presentes, o Go-vernador manifestou-se contraas práticas arbitrárias dasempresas diamantíferas SDM,SMC e Luminas, assim comoas acções das suas contrata-das, no caso, a Alfa-5, K&PMineira e Teleservice.

Segundo o testemunhode Paulina Lassaleth , assis-tente do governo provincial, "ogovernador declarou que asreferidas práticas "têm provo-cado um sentimento de revoltana população. O governadordisse ser urgente inverter oquadro, porque os diamantestêm de trazer benefícios e nãomortes".

"O governador afirmoutaxativamente que – ‘os garim-peiros não são cães. São pes-soas e não quero ouvir dizerque mataram mais algum ga-rimpeiro’", afirma Paulina Las-saleth, sobre o descontenta-mento de Gomes Maiato. Essedescontentamento revelou-semaior porque, dias antes, teveem sua posse fotografias e da-

dos sobre os nove garimpeirosmortos em Calonda/Lucapa, naLunda-Norte, por agentes daTeleservice, ainda de acordocom a fonte local.

(...)Por sua vez, o gestor da

Endiama, Arnaldo Calado,exigiu o fim imediato dos abu-sos contra os cidadãos . Deacordo com a assistente do go-verno provincial, Arnaldo Ca-lado referiu-se ainda à necessi-dade "de transformar os dia-mantes numa indústria de paz"e manifestou-se pessoalmente"envergonhado com o que temacontecido".

De acordo com PaulinaLassaleth, Arnaldo Calado"referiu que o papel de protec-ção não é o de tirar vidas. Eleexprimiu que a Endiama sente,assume e pede desculpas pú-blicas por todo o mal causadopelas empresas de segurança".

Aqui se nota a demissãodas responsabilidades consti-tucionais do governo. O artº 22da Lei Constitucional determinaque "o Estado respeita e pro-tege a vida da pessoa huma-na". Por sua vez, o artº 23 damesma Lei define que "nen-hum cidadão pode ser submeti-do a tortura nem a outros trata-mentos ou punições cruéis,desumanos ou degradantes".

Todavia, a única medidaconcreta tomada, recentemen-

te pelo governo respeitante àproblemática dos diamantescinge-se à aprovação, a 10 deMaio de 2006, da nova políticade comercialização de dia-mantes. Esta, "redefine o papelda Sodiam (cfr. secção 5.1), evisa valorizar o diamante nacio-nal mediante uma política decomercialização flexível queencoraje o investimento, gereempregos e proporcione aosintervenientes benefícios eco-nómicos acrescentados ".

Para o efeito, citando ocomunicado de imprensa daComissão Permanente do Con-selho de Ministros, "a comer-cialização de diamantes brutose lapidados assentará numnovo modelo que incorpora acompra e venda de diamantesem Luanda, através das salasde compra e venda da Sodiame a venda de diamantes noexterior, por meio dos chama-dos Centros de Compra eVenda – Sodiam Trading Cen-ters ".

Como se pode depre-ender, nas circunstâncias dasLundas, continua a não haverqualquer política capaz devalorizar a componente huma-na local e, se empregos sãogerados com a nova política,estes são para Luanda e para oexterior. O que deixa a popu-lação local na mesma ou empior situação.

Ponte do Pone, onde a PN disputa a sua autoridade

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CCUUAANNGGOO4 Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

A Ponte da DiscórdiaA Ponte da Discórdiam dos símbolos mais mar-cantes do desgoverno quetem lugar na região doCuango é o controlo insta-

lado pela Teleservice na pontedo Pone.

Em respeito à liberdade decirculação de pessoas e bens, aPN procedeu, no ano passado, àremoção de todos os postos decontrolo que havia estabelecidona região, incluindo o do Pone.Nas proximidades dessa área, aTeleservice ergueu, a seguir, umcontrolo privado.

A 2 de Fevereiro de 2006,como ilustração das consequên-cias do acto de estabelecimentodo referido controlo, o chefe doposto da Teleservice exigiu aoadministrador municipal doCuango, Passos Gonga, umaexplicação, por escrito, por terautorizado o trânsito de duas via-turas que não constavam da listaentregue pelas autoridades lo-cais para o uso da ponte e da viano referido dia.

O administrador dirigia umacaravana que transportava osrestos mortais do Rei Kulachin-go, da Baixa de Kassanje, paraXá-Muteba. Fazia-se acompa-nhar do comandante municipalda PN, do comandante daEsquadra Policial de Cafunfo edo chefe local dos Serviços de

U

As Subsidiárias da PNAs Subsidiárias da PNrês intervenções oficiaisdistintas sobre a relaçãoentre a PN e as empresas

privadas de segurança, bemcomo sobre o comportamentodestas, elucidam o estado decoisas.

A 26 de Janeiro de 2006, ocomandante-geral da PN, JoséAlfredo "Ekuikui" "defendeu "anecessidade de uma aliança só-lida entre a polícia e as empre-sas de segurança privada , nu-ma reunião com os responsáveisdas referidas empresas.

"A segurança privada éuma actividade necessária e in-dispensável para a missão daPN de manutenção da paz etranquilidade da população,constituindo-se igualmente nu-ma parte salutar da sociedadedemocrática nacional" disse ocomissário .

Segundo a Rádio Nacionalde Angola, a reunião, "organiza-da pela Direcção Nacional deOrdem Pública, serviu para trocade informações sobre o estado

da segurança pública no país,análise sobre a organização efuncionamento dos serviços desegurança e análise dos mecan-ismo de transição de in-formações .

Em menos de uma semanaapós a realização da referidareunião, a 31 de Janeiro de2006, o comando-geral da PN,através da sua Direcção Nacio-nal de Ordem Pública, emitiu umcomunicado contra gravesirregularidades cometidas porempresas privadas de segu-rança. O comunicado acentuavaa ameaça de tomada de severasmedidas contra os prevarica-dores:

O cometimento de crimes diver-sos, destacando-se os homicídios, dis-paros anárquicos e roubos, a exposi-ção excessiva e desnecessária dearmas de fogo durante a protecção deobjectivos e na escolta de valores, sãooutros atropelos à Lei.

À lista de violações, junta-se ofacto das empresas de segurançainterditarem a entrada do pessoal da

Polícia Nacional em locais sujeitos porlei à fiscalização, tais como, Portos,Aeroportos, Hotéis, aeronaves eembarcações comerciais ou o desar-mamento dos mesmos e outras enti-dades oficiais autorizadas por inerên-cia de funções e devidamente identifi-cadas . Sobre a relação entre aPN e as empresas privadas desegurança, as declarações doprimeiro-ministro, Fernando Diasdos Santos, numa interpelaçãona Assembleia Nacional, a 2 deMaio de 2006, apresentam umaoutra imagem.

"As empresas de segu-rança privada são órgãos sub-sidiários da Polícia Nacional,são supervisionadas e contro-ladas pelo Comando-Geral daPolícia Nacional através da suaDirecção Nacional de Ordem Pú-blica, devem informação aocomando-geral e à Polícia Na-cional e são obrigadas a co-operar sempre que solicitadas ",afirma o Primeiro-Ministro e ex-Comandante-Geral da PN

PING-PONG

Sobre o caso da libertaçãodos garimpeiros detidos pelasempresas privadas de seguran-ça e entregues às esquadras lo-cais, vários oficiais locais, tantoem Cafunfo como no Luremo,argumentam, no mesmo dia-pasão, que tais empresas têmextravasado as suas competên-cias e o combate ao garimpopassa pela criação de empre-gos. Por não terem autorizaçãosuperior para falar, os oficiaispedem anonimato. "Nós enten-demos o drama das populações.Não têm empregos. Por exem-plo, a Luminas emprega menosde 10 locais, praticamente nosserviços de limpeza.

A esse propósito, importarelembrar as afirmações do 2ºComandante-Geral da PN,Comissário Paulo de Almeida,ao fazer o balanço da "OperaçãoBrilhante", por si coordenada. "Éevidente que ali nessas regiõesnão há uma actividade produtivavisível.

As pessoas não produzem,não há uma indústria e pratica-mente não há emprego. E aúnica fonte que elas julgam derendimento é o garimpo. (...)".

Na entrevista, o ComissárioPaulo de Almeida não deixou dereferir o papel das concession-adas. "Os próprios projectos deexploração diamantífera deve-riam honrar os seus compromis-sos; no quadro dos contratoseles devem criar uma série decondições como escolas e outrotipo de realizações de caráctersocial. Tudo isso falhou. (...)"

"Eles torturam os garim-peiros e trazem-nos para aqui.Quando exigimos que eles as-sumam a responsabilidade di-zem sempre que são ordens deLuanda. Não lhes podemos to-car. Não temos autorização. Seprendemos um deles vem logouma ordem para soltá-lo", re-mata a fonte policial.

O capítulo sobre a PN continua na pág. 19

T

Informação (SINFO). Os homensda Teleservice borrifaram-separa a solenidade do acto fúne-bre e a presença de taisindividualidades. Coube-lhesexprimir quem dava ordens nolocal.

"Nem o comandante muni-cipal evitou a humilhação doadministrador. Ele disse que ostipos da Teleservice estavam aser muito assanhados e quasese gerou ali uma grande con-fusão", explica um oficial da PN,presente no acto e que pediuanonimato.

A 30 de Março passado, oautor deslocou-se à ponte. Doisguardas, um fardado e outro àpaisana informaram que o carronão podia passar. "Não temosordens e nem conhecemos ocarro". Ante a explicação de umavisita aos bairros da Bananeira eLubola, os seguranças inquiri-ram detalhadamente sobre osmotivos da visita ao bairro. Maisexplicaram que, para transportarabastecimentos ou passageirosaos referidos bairros, algunstaxistas estão autorizados afaze-lo "uma vez por semana ecom carga mínima"

Todos os argumentos evo-cados sobre a liberdade de circu-lação de pessoas e bens e oinédito de Angola ter uma ponte,

numa via pública, como proprie-dade privada de uma companhiacaíram em saco roto.

António João Manuel, de13 anos, encontrava-se encosta-do a uma árvore, a vários metrosde distância do posto, há maisde uma hora, fatigado e aqueixar-se de dores por causado abcesso que lhe deformava orosto. Os guardas impediram-no,e aos seus amigos, de atraves-sar a ponte, para regressar àcasa, no aldeamento dos Boli-nhos. No dia anterior, o meninodeslocou-se a um posto médicona vila de Cafunfo, para cuidardo abcesso e os três amigos,solidários, o acompanharam.

Um dos guardas ao ver oautor a conversar com o meninoe a tirar notas, teve a lucidez deo chamar e permitir a sua pas-sagem, mas não sem um ralhetepor ter explicado a sua situação.

O sub-chefe do grupo, Sr.Zumba, revistou a viatura, infor-mou dos procedimentos para apassagem sobre a ponte e, con-frontado com a discussão sobrea liberdade de circulação de pes-soas e bens, solicitou a inter-venção, via rádio, do seu chefe,o Sr. Correia.

"O senhor é membro dogoverno ou uma autoridade quequeira passar?" interrogou o

chefe. À resposta negativa, o Sr.

Correia prosseguiu, " a ponte éda companhia e esta impõe assuas regras. A companhia arran-jou a estrada e determina quemcircula aqui. O governador, asautoridades locais e Luanda têmconhecimento disso", pontuali-zou.

Um especialista da corpo-ração garante que, sobre osarbítrios da Teleservice , "temoscassetes gravadas, informaçõesprestadas a nível provincial, cen-tral e à Teleservice.

"Dizem-nos sempre que aTeleservice é uma empresa degenerais e não pode ser inco-modada, porque os generais sepodem bater [poder militar]. A PNnão pode entrar na área de juris-dição da Teleservice, para evitarconfrontos entre polícias e gen-erais. São ordens superiores",desabafa o oficial.

"Não podemos prendê-losporque temos ordens para não ofazer, aguardamos por uma deci-são do governo central. Os Tele-service chegam a cobrarUS$100 por cada carro que tran-sita o controlo. O Ministério daDefesa, a PN, em Luanda, estãotodos informados", continua ooficial.

Mais adianta sobre a re-

cepção de várias comissões docomando provincial, que "já visi-taram até o próprio controlo, in-formaram as autoridades centra-is e Luanda exige que se man-tenha a situação como tal".

"Houve erros graves na for-mação dessas empresas. Puse-ram comandos para lidar com apopulação. As consequênciasestão à vista", enfatiza.

Por sua vez, o porta-voz doComando-Geral da PN, Superin-tendente Carmo Neto, afirma, deforma categórica, que "nem oGeneral Ndalu nem o Comis-sário Ekuikui admitiriam isso [osabusos imputados à Teleservicee em geral ]. Há pessoas queabusam dos seus bons nomes equerem aproveitar-se da situa-ção".

Segundo o porta-voz, a PNtem estado a descentralizar oseu comando de modo a dotaras províncias de maior autono-mia e capacidade de respostapara os problemas que se colo-cam a nível local.

Mais afirma que o ministrodo Interior, o General RobertoMonteiro Leal, "tem-se manifes-tado preocupado com o quadrojurídico da PN e tem feito diligên-cias para melhorar a situaçãodos direitos humanos e ouvir asvozes discordantes".

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CCUUAANNGGOO 5Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

As Forças Armadas Angolanas As Forças Armadas Angolanas mporta, mesmo que de for-ma muito breve, abordartambém a inserção das FAA

no contexto das violações sis-temáticas dos direitos humanosno Cuango. Nota-se o envolvi-mento, na qualidade de sóciosdas empresas privadas desegurança, dos principaisgenerais do exército, como pa-trões dos violadores.

Por sua vez, João AbreuXicalo, 24, denuncia o Brigadei-ro Simão Safa Cotripa, coman-dante das FAA em Cafunfo,como patrocinador do garimpona área do Lucola e responsá-vel moral pela morte do seuirmão Zeferino Muassefo, doseu tio Binoca Walikissa, e peloferimento de Mariana João.

Segundo o depoimento deJoão Xicalo, assim como de vá-rias testemunhas, a mando doBrigadeiro Cotripa, o Tenente-Coronel Cawanga solicitou, aoSoba Kabundula, uma área deexploração de garimpo na mar-gem do Rio Lucola, em Cafun-fo, para o primeiro.

Para fiscalização da acti-vidade de garimpo, instalaram-se na área 12 soldados da Polí-cia Militar devidamente arma-dos. As testemunhas informam

I

Sodiam/LKI a Cara do GarimpoSodiam/LKI a Cara do Garimpomodus operandi da So-diam configura, de certomodo, a política de im-

proviso do governo e, por con-sequência, da empresa públicaEndiama, a quem o Estado atri-bui o exclusivo direito deconcessionária no domínio dosdiamantes.

Desde 2003, a Sodiamdetém o direito exclusivo decomercialização de diamantesem Angola. A Endiama detém99% da Sodiam, enquanto oInstituto Angolano de Participa-ções do Estado (IAPE) segura1% das acções.

Por sua vez, a Sodiam,representada pelo seu Presi-dente do Conselho de Adminis-tração, Arnaldo Calado, as-sinou, a 24 de Abril de 2004, umcontrato com a Lazare KaplanInternational (LKI), uma com-panhia registada sob as Leis deDelaware, Estados Unidos daAmérica, para a compra conjun-ta de diamantes no mercado in-formal, ou seja provenientes dogarimpo.

A LKI entra na joint-ven-ture, segundo o contrato a que

O

que, passados quatro dias detrabalhos, oito dos soldadosreceberam ordens de retirada,tendo permanecido quatro, en-tre os quais o cabo JambaAntónio, para verificar a lava-gem do cascalho.

Consta que, durante a la-vagem do cascalho, o caboapoderou-se de uma pedravaliosa e decidiu celebrar, em-briagando-se à vontade comkapuka. Na noite do mesmodia, a 8 de Outubro de 2005, oreferido cabo manifestou aosgarimpeiros que trabalhavamno "projecto", guardado por ele,a sua premeditação para mataralguém naquele dia.

"O meu irmão Zeferinodisse-lhe – não vais matar nin-guém, porque aqui ninguém tedeve", conta João Xicalo.

Zeferino Muassefo tevemorte imediata com um tiro nopeito, ao que se seguiu outrotiro fatal no ouvido direito de Bi-noca Walikissa, tendo a vende-deira Mariana João sido alveja-da nas nádegas. Esta sobre-viveu ao ferimento e a famíliaevacuou-a para Luanda a fimde receber assistência médicaadequada.

"O cabo foi levado lá pelo

Brigadeiro Safa Cotripa paracontrolar os seus projectos pri-vados de garimpo. Das tropasque ele levou para lá quatroestavam no terreno quandoisso aconteceu", revela JoãoXicalo. Os familiares das víti-mas, encabeçados pelo rege-dor Samukualo e o cidadãoJoão Sambawaia, dirigiram-seao Brigadeiro Safa Cotripa, res-ponsável pela Guarnição deCafunfo, que, tendo ouvido ocaso, exprimiu as suas condo-lências e desembolsou a quan-tia de US$800 para os óbitos.

"Ele disse que a respon-sabilidade não era da sua uni-dade, porque o autor era umdesertor, que tinha sido expulsodo exército por crime idêntico.No entanto, encaminhou o casoao procurador militar, o tenenteAmaral, que nos disse ser nor-mal a prática de desertorescontinuarem a envergar a fardamilitar para actividades degarimpo e outras de naturezacriminal", diz João Sambawaia.

Segundo o interlocutor, otenente Amaral informou-os so-bre a criação de uma comissãode inquérito, para averiguar ocaso e a eventual captura dosuspeito. "Até à presente data

nunca mais ouvimos falar da talcomissão nem de qualqueroutra informação sobre o as-sunto", lamenta João Samba-waia.

"Levámos o caso à PN.Eles informaram-nos que abor-daram o Brigadeiro Cotripapara saber do paradeiro do tro-pa. No dia seguinte voltámos àesquadra e o investigadordisse-nos que o caso já tinha

sido transferido para o Dundo. "Pediram-nos para falar,

mais uma vez, com o Brigadei-ro Cotripa. Fomos ter com ele ejá não nos recebeu. Mandou asua tropa, armada, para correrconnosco da propriedade dele.Depois, ele gritou para nós –Dei-vos dinheiro para o óbito evocês querem exigir mais?"Explica João Xicalo sobre odesfecho do caso.

o autor teve acesso, com expe-riência, capacidade financeira eknow-how na comercializaçãode diamantes, assim como coma sua vasta rede mundial devendas e distribuição .

O caso da Sodiam mereceatenção pormenorizada por setratar da instituição oficialmentemandatada para negociar comos garimpeiros, as principais

vítimas das violações dos direi-tos humanos nas Lundas.

Por acordo mútuo, a LKIobriga-se a prestar assistênciatécnica na comercialização dosdiamantes do garimpo.

A alínea a) do Artº 6º docontrato, referente às obriga-ções da LKI é confidencial eestá em branco. A alínea b) domesmo articulado garante a

assistência técnica da LKI emtodas as fases do processo decompra de diamantes no mer-cado informal [garimpo ]. Ade-mais, a alínea c) obriga a LKI aprestar "assistência na elabo-ração do relatório formal, numformato apropriado, durante aúltima semana de cada ciclo detransacções, sobre o trabalhorealizado, perspectivas de mer-

cado e sugestões e recomen-dações pertinentes". Outro pon-to importante a reter é a alíneae) do mesmo articulado em quea LKI participa na organizaçãodos postos de compra (local-mente conhecidos como con-tuários) no mercado informal.

Para garantia de confiden-cialidade, as alíneas a) e b) donº1 do artº 13º, referente ao tipode impostos a aplicar nas tran-sacções aparecem em branco.O disposto no nº2 do artº 13º jáé explícito quanto à obrigaçãodas partes em liquidar todos osimpostos antes da exportaçãode diamantes. Que impostos? Émister perguntar, tendo em con-ta o facto da Sodiam/LKI nãoregistar, emitir recibos dastransacções, nos contuários, noacto de compra dos diamantesjunto dos garimpeiros. O mes-mo se passa com as transac-ções que decorrem nas matas,nos locais de garimpo.

O Artº 8º do Anexo I doCapítulo II do referido acordo,estipula a supervisão dos pos-tos de compra de diamantes,

Zeferino Muassefo, morto a tiropor um cabo das FAA.

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CCUUAANNGGOO6 Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

Sodiam Internacional Sodiam Internacional or sua vez, como parte da estratégia deexpansão da Endiama no mercado inter-nacional, esta associou-se ao Grupo Lev

Leviev na constituição da Sodiam InternationalLtd, uma empresa de direito israelita .

Assim, a Sodiam International Ltd. encar-rega-se da comercialização de "parte conside-rável dos diamantes de Angola, a partir dosseus escritórios em Tel Aviv" provenientes dosector formal ", escreve a revista da Endiama.

Essa operação resume-se, de forma pri-mária, na aquisição, por parte da SodiamInternational Ltd. de diamantes à Sodiam SARL,a detentora exclusiva dos direitos de comerciali-zação de diamantes no mercado angolano .

Para o efeito, o Grupo Leviev financia acompra de diamantes e responsabiliza-se "pelapromoção da formação de quadros angolanosnas áreas de avaliação e comercialização de

diamantes no mercado internacional ".Essa sociedade tem, por outro lado, a mis-

são de "granjear prestígio internacional a nívelda indústria, tornando a Sodiam uma marcaconhecida e respeitada" , bem como a maxi-mização das receitas resultantes da venda dediamantes.

As palavras de Lev Leviev, no acto deinauguração da Sodiam Internacional, EmIsrael, numa cerimónia presidida pelo ministroisraelita das Finanças, Benjamin Netanyahu,são um aviso à navegação e auto acusatórias."Como nos ensinam os sábios, um bom negócioé aquele que gera benefícios para todos.Queremos que todos saiam a ganhar. E, paraquem, como nós, sabe o que é sofrer na carnea dor causada pela guerra, quando se desejaalgo a alguém acontece muito rápido. Quere-mos progresso para o povo de Angola ".

P

Ascorp e a Ascorp e a Lei do PoderLei do Poder

m 2003, o Governo manifestou o seu descontentamentopara com Lev Leviev, por incumprimento das obrigaçõescontratuais que os animavam e consequente falta de

benefícios para o país. Assim, anulou o Acordo-Quadro de 11de Outubro de 1999 que concedia à Angola Selling Corporation(Ascorp) o direito exclusivo da compra de diamantesangolanos, e em cuja constituição a Welox, de Lev Leviev, e aTrans Africa Investments, detêm 49% do capital.

Estranhamente, a Ascorp, apesar da revogação do con-trato, até à presente data continua a operar na região doCuango, e para além desse domínio, no agenciamento e com-pra de diamantes dos garimpeiros.

A tabela seguinte demonstra os principais postos de com-pra da empresa em Cafunfo, cuja segurança está a cargo daK&P Mineira. Esta empresa está associada à Ascorp, comquem partilha escritório, em Luanda, à Rua ComandanteKwenha, 279, Bairro do Maculusso. O Director-Geral K&PMineira, José Gomes Maria Rodrigues exerce parte das suasfunções no edifício sede da Ascorp, à Rua Guilherme PereiraInglês, n°43, 7°andar.

Lev Leviev aparece, numa outra frente, com 47% do cap-ital da fábrica de lapidação de diamantes (Angola PolishingDiamonds SA), inaugurada em Luanda, a 3 de Novembro de2005, pelo Presidente da República José Eduardo dos Santos.A Sodiam retém 48% da sociedade, enquanto um consórcio deempresas angolanas (PROJEM) assume os restantes 5% donegócio. Essa iniciativa pretende gerar receitas no valor deUS$240 milhões por ano com a exportação de diamantes lapi-dados , procurando reduzir, desse modo, as perdas com aexportação apenas de diamantes em bruto. "Por cada USD 9milhões de diamantes em bruto vendidos ao exterior, os nossosclientes estrangeiros depois de os lapidarem arrecadam qual-quer coisa como USD 56 milhões" salienta uma das adminis-tradoras da Endiama Prospecção e Produção, Sandra Vascon-celos, à Endiama Hoje.

Por aqui se pode notar o beneplácito das mais altasinstâncias do país à promiscuidade comercial e à ilegalidade.Lev Leviev dá volta ao fim do contrato da Ascorp, e torna-sesócio da Sodiam Internacional, parte da subsidiária da Endiamaque detém o direito exclusivo de comercialização de diamantes,no exterior do país. Ademais, controla metade das acções dafábrica de lapidação e impõe-se, também, na compra de dia-mantes do garimpo, através da Ascorp, mesmo sem coberturalegal. E, como se não bastasse, a promiscuidade dos negóciosleva-o, também, a ter as suas impressões digitais na K&PMineira.

E

Tabela 2Comprador Emp. de SegurançaLocalidade

Ascorp Casa Mãe K&P MineiraCafunfoAndy – Ascorp K&P MineiraCafunfo

Didy Kinwany – Ascorp K&P MineiraCafunfoDjopiss – Ascorp K&P MineiraCafunfo

Hassana Bokolo – Ascorp K&P MineiraCafunfo

por um ou mais especialistas deavaliação da LKI, enquanto osarticulados 9º, 11º e 12º apare-cem em branco. Uma vez adqui-ridos, em parceria, a LKI passa aser proprietária exclusiva dosdiamantes (take sole title) deacordo com o Artº 13º do contra-to.

Com essa descrição docontrato, que liga a LKI à So-diam, se pode julgar a co-res-ponsabilidade da primeira noincentivo ao garimpo e na fugaao fisco. A Sodiam/LKI revela-se, também, cúmplice nos abu-sos perpetrados pelas empresasprivadas de segurança contra osgarimpeiros, em particular pelaK&P Mineira, que também pro-tege os seus contuários e acom-panha os seus compradores nas

negociações com esses mes-mos garimpeiros.

Para evitar a exaustão,lista-se apenas os principaispostos de venda situados nalocalidade de Cafunfo, a loca-lidade, na região do Cuango,com maior dinâmica no tráficoinformal de diamantes:

Na arena internacional, aLKI manifesta-se como apoianteintegral e cumpridora das políti-cas que proíbem a comercializa-ção de diamantes de conflito eprevinem a lavagem de dinheiro.Ademais, afirma cumprir, naíntegra, com a legislação norte-americana referente à comer-cialização transparente de dia-mantes e contra o branquea-mento de capitais .

A companhia demonstraorgulho em ser um dos mem-bros fundadores, entre muitasque subscreve, da iniciativaGlobal Compact das NaçõesUnidas, para "a partilha de valo-res e princípios que darão umaface humana ao mercado glo-bal".

Esse orgulho se estendena parceria e na cobertura diplo-mática que encontra junto dogoverno norte-americano, atra-vés da sua Agência para oDesenvolvimento Internacional(USAID), com a qual MauriceTempelsman, o patrão da LKI,se associa na qualidade de filan-tropo.

Ambas as instituiçõesanunciaram, a 16 de Junho de2005, com grande cobertura me-

diática, a disponibilização deUS$1,5 milhão, por parte da LKIe sob gestão da USAID, para"melhorar a oferta de serviçossociais à população local e ofe-recer oportunidades de cresci-mento económico". O Jornal deAngola especifica esse apoio,durante um período de trêsanos, como sendo o "acessoaos cuidados de saúde, à edu-cação e ao crédito para ascomunidades locais".

De certo modo, essa par-ceria, pela especificidade da re-gião, revela um dos maiores dra-mas de África. Regiões extrema-mente ricas são reduzidas a tea-tros de representação da filan-tropia ocidental, de uma supostaajuda humanitária para a sua

estabilidade e desenvolvimentohumano pelos mesmos interes-ses que as saqueiam, e sempreem estrita cumplicidade com ospoderes cleptomaníacos locais.

Odete António poderá ser,por exemplo, uma das eventuaisbeneficiárias das oportunidadesque a LKI e a USAID se dispõema criar. A 28 de Março de 2006os seguranças da K&P Mineira,da mesma empresa que protegea Sodiam/LKI impediram-na, e aum grupo de camponesas, decolocar a sua mandioca no RioCuango, para a transformar embómbó, o principal alimento daregião. Com o argumento deque as mulheres servem devigias para, supostamente, avi-sar os seus maridos da aproxi-mação dos seguranças, cam-ponesas e garimpeiros são trata-dos da mesma forma. O exemp-lo de Odete António é generali-zado na bacia hidrográfica doCuango.

Maior parte da populaçãodo Luremo cultiva nas áreas deCangau, Txatxo e Poco. Assim,impedem-nos de sobreviver poriniciativa própria, sem que lhesseja proporcionado condiçõesalternativas de trabalho e secriam expedientes para transfor-mar gente trabalhadora, auto-suficiente, em dependentes cró-nicos da pretensa caridade inter-nacional.

Em Angola, em particularno Cuango, a face humana é ada tragédia, em contradição comos princípios vivamente alcando-rados por Maurice Tempelsman."O desenvolvimento humano"que a parceria USAID/LKI pro-move nas Lundas configura,pois, o branqueamento diplomá-tico de uma situação de terror.

Bastaria à LKI de MauriceTempelsman realizar, na região,um negócio que primasse pelorespeito dos direitos elemen-tares da população. Sem direitosnão há oportunidades.

Comprador Localidade Emp. de Segurança

Alidep’s – Sodiam/LKI Cafunfo K&P Mineira

Baba – Sodiam/LKI Cafunfo K&P Mineira"Casa Mãe"– Sodiam/LKI

Free Sam – Sodiam/LKIMiami – Sodiam/LKI

Tshatsho Bala – Sodiam/ LKI

CafunfoCafunfoCafunfoCafunfo

K&P MineiraK&P MineiraK&P MineiraK&P Mineira

Tabela 1

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CCUUAANNGGOO 7Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

EndiamaEndiamaa qualidade de conces-sionária exclusiva dos dire-itos mineiros, ao abrigo das

Leis 1/92 e 16/94, a Endiama par-ticipa na prospecção, pesquisa,reconhecimento e exploração dediamantes na bacia do Cuango.Actualmente fá-lo através dosprojectos designados por SDM,SMC e Luminas que mais adiantesão abordados de forma indivi-dual e ao pormenor.

Ademais, a Endiama, atra-vés da sua subsidiária Sodiam,que detém o direito exclusivo decomercialização dos diamantesde Angola, se associa à empresaLKI e ao Grupo Lev Leviev parafacilitar e rentabilizar a venda dosdiamantes.

Outrossim, a Endiama é co-proprietária da Alfa-5, uma em-presa privada de segurança queresponde pela protecção de umnúmero considerável de projectosdiamantíferos, incluindo a SDM eo Catoca, o quarto maior kimberli-to do mundo, situado na provínciada Lunda-Sul.

Pelo seu papel exclusivo e oseu carácter de intervenção emtodos os projectos ora em análi-se, a Endiama detém responsa-bilidades também exclusivassobre a situação dos direitoshumanos no Cuango. Por con-seguinte, a Endiama deve as-sumir a responsabilidade pelomodo como o comportamento

das empresas privadas de segu-rança e dos seus clientes, asexploradoras, afecta os garim-peiros e a população local, emgeral.

A 22 de Maio de 2006, aEndiama realizou uma reunião doseu Conselho Consultivo Alar-gado, tendo discutido fundamen-talmente, segundo uma fonte daempresa, a responsabilidade dasempresas privadas de segurançanos actos de violência contra osgarimpeiros, bem como a trans-formação destes em trabalha-dores artesanais e protegidos porlei.

Tendo a Endiama declinadofazer comentários oficiais, a fonterefere a criação de uma comissãotécnica para verificar e investigaros actos individuais dos agentesdas empresas privadas de segu-rança e entregá-los à justiça.

Quanto aos garimpeiros, amesma fonte confirma ter aempresa chegado à conclusão deque a melhor via para solucionaro problema do garimpo é a pro-visão de um mecanismo legalconducente ao estabelecimentode "cooperativas de artesãos".

"Estamos a discutir umaaproximação empresarial em queos garimpeiros passam a traba-lhadores artesanais, organizadosem cooperativas, para explora-rem áreas não-industriais e ven-derem a sua produção oficial-

mente para evitar o tráfico ilegalde diamantes", revela a fonte.

"Para o efeito, vamos identi-ficar as áreas não exploráveis,em termos industriais ou aquelasjá abandonadas e ver como atri-buir essas pequenas concessõesaos artesãos sem perigar o espa-ço das actuais concessões ououtras a outorgar", continua afonte.

Mais afirma não ter sidolevantada a questão da ausênciade registo de transacções entre aSodiam, Ascorp e os garimpeiros,no sentido de se garantir, tam-bém, a protecção dos interessesdestes. Assim como serviria paracontrolar o fluxo de negócios e osdevidos valores a que o Estadotem direito em matéria de impos-tos e outros.

Enquanto a Endiama seexpande num mundo altamenteindustrializado e rico como Israel,Bélgica, Hong-Kong, Dubai eNova Iorque, no Cuango, asegunda região que mais dia-mantes e receitas lhe garante, aempresa pública e as suas as-sociadas apenas se mostram pre-paradas para deixar rastos demiséria e de destruição ambientalno quintal, Angola.

Nem sequer uma tenda aEndiama consegue montar nolocal para manifestar a sua pre-sença social junto das popula-ções locais.

N

Sociedade de DesenvolSociedade de Desenvol --vimento Mineiro (SDM)vimento Mineiro (SDM)

distância entre o slogande relações públicas daSDM e a realidade é, sem

rodeios, a da publicidade enga-nosa, como se verificará noinventário de abusos no Cuan-go.

Com uma área de con-cessão de 2,950 km_, na baciahidrográfica do Cuango, a SDMé uma empresa mista entre aEndiama, com 50% das acções,e a brasileira Odebrecht MiningService Inc. (OMSI), detentorada outra metade das acções .

Em 2004, a SDM alcançouuma retenção de 622 mil quila-tes, que a manteve como o se-gundo maior produtor de dia-mantes em Angola, com 11%,

ao passo que o Projecto Catocaliderou com 67% do total de 4,8milhões de quilates extraídosformalmente. A SDM reportouvendas no valor de US$102,693milhões e lucros de US$16,251milhões. No entanto, a SDMestima, para 2006, a exaustãoda actual área de concessão.

No Brasil, país de origemda Odebrecht, os abusos deque esta é co-responsável, noCuango, como gestora da SDMe cliente da Alfa-5, teriam mere-cido o repúdio da opinião públi-ca brasileira e investigação porparte das suas entidades judici-ais. Em Angola, país que a aco-lhe as suas promíscuas rela-ções com o poder lhe conferem

imunidades e simpatia.A Odebrecht é o que se

pode considerar como das maisprivilegiadas companhias aoperar em Angola, sendo inclu-sive uma das principais curado-ras da Fundação Eduardo dosSantos, do Presidente da Repú-blica.

Em meados de 2005, ostrabalhadores da SDM escre-veram ao Vice-Presidente doMPLA e Ministro da Adminis-tração Pública e Segurança So-cial para denunciar o "neo-colo-nialismo" do director da referidaempresa, o brasileiro MarceloGomes, através de "actos deinjustiça e discriminação contraos trabalhadores angolanos".

"Pr"Precioso é o homem"ecioso é o homem"Slogan da SDMSlogan da SDM

A

Sociedade LuminasSociedade LuminasLuminas controla umaárea de exploração alu-vial de diamantes, na ba-

cia hidrográfica do Cuango, decerca de 2,690 km, assimcomo uma segunda área adja-cente de 246 km. Desde Marçopassado, a propriedade daLuminas se encontra em dis-puta no Tribunal Federal dosEstados Unidos, em Wash-ington D.C, depois da Endiamater sido processada, a 18 deMaio de 2005, no Estado doTexas, pela IDAS Resources.

De acordo com o contratosubscrito a 31 de Outubro de2002, a IDAS, como financia-dora do projecto, detinha umaparticipação de 51% do capital,a Endiama 38% e a Twins Ltd,11%. Uma vez recuperado oinvestimento da IDAS, estatransferiria 2% das suas ac-ções à Twins Ltd.

A Twins Ltd é uma empre-sa do General António dosSantos França "Ndalu", últimoChefe do Estado-Maior Gene-ral do Exército das extintasFAPLA, ex-embaixador de An-gola nos Estados Unidos daAmérica e actual Presidente daDe Beers Angola.

O General França Ndalutem a sua sede no paraíso fis-

cal das Ilhas Cook (Pacífico),no endereço ANZ House, MainRoad, Avarua, Rarotonga. Acompanhia entra na sociedadepara, segundo o ponto a) doArtº 7º do acordo, "mobilizar osmeios necessários ao seualcance, por forma a garantir aeficiência e a segurança dasoperações ".

No entanto, o projecto ar-rancou sem a IDAS, uma con-cessionária da Adastra Mine-rals Inc. A partir de Setembrode 2004, esta entendeu que aEndiama renunciou às suasobrigações contratuais e recor-reu ao litígio contra a empresaangolana, acusando-a de negli-gência e má-fé, tendo solicita-do compensação pelos danoscausados.

Por sua vez, a empresaNofar Mining B.V, de origemholandesa, aparece como in-terveniente no projecto, segun-do tabela providenciada pelaEndiama ao FMI.

Diligências junto da En-diama dão conta que a terceiraparceira do projecto, a NofarMining B.V, é uma empresa pri-vada criada pelo Grupo LevLeviev e que detém o capitalanteriormente reservado àIDAS Resources.

A

Sociedade Mineira do Cuango Sociedade Mineira do Cuango Sociedade Mineira doCuango situa-se especifi-camente na zona de Ca-

funfo. O referido projecto é lider-ado pela ITM Mining, com 50%do capital social, enquanto aEndiama detém 35% e a em-presa angolana Lumanhe queda-se com 15% das acções. A suaprimeira produção data de Maiode 2005.

Constituída em 1993, aITM Mining orgulha-se de ser amais antiga das exploradorasdiamantíferas, como criação daITM International e dos gestoresséniores em Angola da RoanSelection Trust InternationalLimited (RST), o braço mineiroda primeira.

Conforme informação con-stante no site da ITM Mining, “aRST foi a empresa de explora-ção mineira da ITM Internationalresponsável pela maior parte daprodução diamantífera angolanaentre 1986 e 1992” e cujas oper-ações centravam-se região doCuango.

Como lembrança, pelapassagem da RST no Cuango,restam, para além da devas-tação florestal e buracos, unsgeradores de electricidade avari-ados que têm sido motivo decontenda entre a administração

e a população local. Por sua vez, a Lumanhe –

Extracção Mineira, Importação eExportação, Limitada é constituí-da por seis quotas iguais, novalor nominal de KzR100.000.000.00, repartidasentre:

General António EmílioFaceira

General Armando da CruzNeto

General Luís PereiraFaceira

General Adriano MakevelaMckenzie, Chefe de Divisão deReconhecimento e Informaçãodo Estado Maior-General dasFAA

General João Baptista deMatos

Carlos Alberto HendrickVaal da Silva

Com excepção do GeneralAdriano Mackenzie e de CarlosAlberto Hendrick Vaal da Silva,os outros sócios da Lumanhesão-no também da Teleserviceque garante a segurança do pro-jecto mineiro.

A gestão da projecto, porparte da ITM, está à cargo deJeffrey Watkins, presidente doconselho de gerência, e CarlNiemann, director de operaçõesmineiras.

A

2

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CCUUAANNGGOO8 Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

Anotação sobre a Alfa-5Alfa-5 foi criada a 25 deFevereiro de 1993, com oobjectivo primário de in-

tervir e proteger as áreas dia-mantíferas nos anos de guerra.

Para além do Grupo En-diama, detentora de 30% docapital, os outros sócios são:

General César AugustoPugliese

Rui Carlos Sousa GaioLaurinda Cassuamo

Nelumba, casada, sob regimede comunhão de bens, com oGeneral Agostinho FernandesNelumba "Sanjar", actual Che-fe do Estado-Maior Generaldas FAA.

Agostinho César deMatos, irmão do General JoãoBaptista de Matos, então Che-fe do Estado-Maior Generaldas FAA, por altura da criaçãoda empresa.

O artº4º da escritura da

A

Os Agentes da Nova OrdemOs Agentes da Nova Ordem"V"Vocês pensam que os contuários dos estrangeiros ocês pensam que os contuários dos estrangeiros

estão a comprar milho? Se são diamantes, então, quem estáestão a comprar milho? Se são diamantes, então, quem estáa cavá-los?"João José Massaco, 36 anos, garimpeiroa cavá-los?"João José Massaco, 36 anos, garimpeiro

As Violações da Alfa-5CASO Nº 1

Vítima: Vemba Careca, 32anos, natural do UígeData: 28 de Maio de 2006Local: Kakuku, CuangoDescrição dos acontecimen-tos: Os guardas da Alfa-5, aoavistarem um grupo de garim-peiros na labuta, dispararamsem aviso contra os mesmos.Uma bala atingiu VembaCareca no lado esquerdo dopeito. Com um morto no ter-reno, os seguranças bateramem retirada.

Os sobreviventes dirigi-ram-se ao Comando Municipalda PN, na vila do Cuango, paradenunciar o homicídio. Assim,os responsáveis da Alfa-5,segundo informações recolhi-das junto das instâncias polici-ais, encaminharam os autoresdo tiroteio à PN. Esta, por suavez, instou a direcção da SDMa assumir a compra do caixãoe o transporte do corpo paraCafunfo, onde se encontra afamília do malogrado, para arealização do funeral.

CASO Nº 2

Vítima: Guilherme CarlosMartins, 27 anos, natural doLubalo, Lunda-NorteData: 28 de Maio de 2006Local: Tximbulagi, CuangoDescrição: Uma bofetada nacara, para início de conversa,

coronhadas por todo o corpo euma noite inteira amarrado deforma brutal pelos pulsos pare-cia ser todo o sofrimento deGuilherme Martins, aprisiona-do pela Alfa-5, por volta das19H15, enquanto garimpavana margem do Rio Cuango.

"Às 6H00, do dia seguin-te, surraram-me com um caboeléctrico, nas costas. Quandoviram que eu estava muitoinflamado, libertaram-me. Asminhas mãos estão deficien-

tes. Já não consigo pegar emnada", lamenta GuilhermeMartins.

CASO Nº 3

Vítima: Joaquim José, 28anos, natural de Cafunfo

Data: 5 de Maio de 2006Local: Vuka, CafunfoDescrição: Numa ronda, apósa meia-noite, uma patrulha daAlfa-5 surpreendeu, dentre vá-rios garimpeiros, Joaquim José

a cavar. Apanhou uma surracom cabos eléctricos, que lhedeixou marcas por todo ocorpo. Passou o resto da noitesob detenção. Às 8H00, como"pequeno almoço" teve direitoa oito mocas na região lombar,deitado de barriga para baixo.

O cidadão confirma ape-nas o mesmo castigo para ou-tros garimpeiros sem precisaro número porque, de acordocom as suas explicações, ape-nas se preocupou com o seu

próprio sofrimento.

CASO Nº 4

Vítima: António Jaime, 29anos, natural do MoxicoData: 9 de Abril de 2006Local: Ilha de TxissueiaDescrição: Uma patrulha deseis elementos da Alfa-5 abor-dou igual número de garim-peiros, ao fim da tarde. Obri-gou os garimpeiros a despir assuas vestes e submeteu-os àsessão de espancamentos.Seis pás nas nádegas e duasnas mãos para cada um.

"Eles queriam colocar ocabo da pá entre as minhaspernas e depois puxar comforça para soltar o cabo, da pá.Eu disse que eles me podiambater mas assim não. Podiamme matar.

"O Daniel, da Alfa-5, disseque tinham de me bater muitoporque eu, como geólogo dobairro, tinha sido chamado poreles para lhes mostrar ondeestão os diamantes. Eu tinharecusado", justifica AntónioJaime, que mereceu mais duaspalmatórias com uma pá.

"O poder que eles têm é anossa falta de união. Elesembebedam os regedores esobas para estes não permi-tirem a discussão dos proble-mas do povo. Não temos gov-erno", desabafa o cidadão.

Alfa-5 determina o seu objectosocial, "independentemente dequalquer outra actividade queo Conselho de Administraçãodecida empreender e seja le-galmente permitido por lei". Im-porta reproduzir os dois primei-ros pontos, dos seis que oconstituem:

1. "Prestação de serviçosde segurança privada atravésdo controlo de áreas de acessoreservado, a protecção e vigi-lância de bens patrimoniaismóveis e imóveis, de institui-ções e estabelecimentos públi-cos e particulares, nomeada-mente de natureza financeira,industrial ou comercial.

2. Formação de pessoalpara o exercício dessas activi-dades".

A Alfa-5 possui um centrode formação em Viana, Luan-da, onde os seus efectivos são

submetidos a um programa ri-goroso de formação. Por isso,os abusos cometidos não sãoobra de guardas ignorantes oucom fraca preparação.

Algumas das operaçõesrealizadas pela Alfa-5 contamcom a colaboração das FAA,cujo comando militar da regiãose encontra ligado às insta-lações centrais da SDM. Oacesso principal à SDM é feito,antes, por um posto de contro-lo das FAA, que procede àprimeira identificação, ao quese segue a cancela gerida pelaAlfa-5. Essa ligação estreita, anível da associação comercialde generais à Endiama, da par-tilha física de espaço entre asFAA, SDM e Alfa-5, bem comoas operações conjuntas, reve-lam a dificuldade em acusar,de forma precisa, o grupo ouindivíduo responável pelos

abusos cometidos na região doCuango.

A presença de um cida-dão estrangeiro armado, aquem os garimpeiros acusamde comandar algumas dasoperações de que têm sidoalvos, levanta muitas interroga-ções. Das informações recolhi-das no local, evoca-se o nomede Jimmy Gildier, um cidadãobritânico, responsável pela se-gurança da SDM.

De forma corajosa, o So-ba Xassamba, de Txipexe, re-vela a rotina dos pescadoreslocais em retirar corpos degarimpeiros nas zonas ribeirasonde colocam as suas armadi-lhas, os aldeães acarretamágua entre outras tarefas do-mésticas, e afirma que a "Ope-ração Kissonde, dessa empre-sa, está a matar muito. Há láum branco, o Jimmy, que é

muito mau e está à frente dis-so". Perante a estupefacção,um jovem local contou sobre oencontro do seu grupo com umcidadão estrangeiro, a quemreconheceu apenas ser de ra-ça branca, que havia decidido"caçar" os garimpeiros de for-ma solitária, armado com umaAK, cartucheira no peito, e umacatana.

"Ele surpreendeu-nos,apontou-nos a arma e, ao ten-tar aproximar-se para nos obri-gar a deitar e amarrar, eupuxei-lhe a arma e espancá-mo-lo com pontapés e coro-nhadas. Depois, pusemo-nosem fuga porque sabíamos queos homens da Alfa-5 andavampor perto. Eles foram retaliar àtoa, contra os jovens comquem eles cruzavam e na vilado Cuango, estavam commuita raiva", conta o jovem.

Vemba Careca, morto a tiro enquanto garimpava.

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CCUUAANNGGOO 9Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

(...)

CASO Nº 6

Vítima: Zelito Lunga Umwe, 36anos, natural do Dundo,Lunda-Norte, Data: 28 de Março de 2006Local: TxissueiaDescrição: A ceia de ZelitoUmwe, na companhia de trêsoutros garimpeiros, por voltadas 19H00, terminou comvómitos de sangue. Umapatrulha da Alfa-5 encontrou-os a comer e, sem boa-noitenem bom apetite, desatou aespancá-los com coronhadas emocas. Segundo GuilhermeAdriano, um dos garimpeiros, oseu primo Zelito Umwe foiquem mais coronhadas apa-nhou ao ponto de vomitar san-gue, que também lhe escorriapelas narinas. "Ele acabou porlevar 13 pontos nas costas, porcausa de uma coronhada",conta o primo que disse tersido espancado, também, massem gravidade.

CASO Nº 7

Vítima: Zelito Mualunene, 28anos, natural do Cuango Data: 28 de Março de 2006Local: TxissueiaDescrição: Duas pás desferi-das na região lombar do cida-dão em causa foram o sufi-ciente para deixá-lo acamadopor 15 dias. Uma patrulha daAlfa-5 encontrou-o a garimpar,entre muitos cujo número nãosoube especificar, por voltadas 14H00, obrigou os pri-sioneiros a mudar a roupa ecortou um pé de cada par decalças recolhido.

De acordo com ZelitoMualunene, a seguir, os garim-peiros receberam ordens paradeitaram-se, de barriga parabaixo, e assim lhes foi adminis-trado o espancamento nascostas e nas nádegas. Osguardas da Alfa-5, conta ogarimpeiro, procederam, adi-ante, à queima das camisas ecalçados das vítimas e bater-am em retirada, deixando-asapenas com as "calças ampu-tadas".

CASO Nº 8

Vítimas: Luciano Joaquim,Adriano Ngamatchituba, Sozi-nho Walinhengue e AlexandreQuianga, 35 anos, natural deCapenda-Camulemba, Lunda-NorteData: 15 de Março de 2006Local: Riacho Txicuele, nosarredores da Vila do CuangoDescrição: Segundo depoi-mentos de Alexandre Quianga,um efectivo de 18 operacionaisda Alfa 5 surpreendeu, porvolta das 10H00, um grupo de27 garimpeiros a laborar no ria-

cho. "Eles começaram a dis-parar bué de tiros, tipo guerra",enfatiza o entrevistado.

Tendo impedido a fugados garimpeiros, os segu-ranças prosseguiram a suaacção dando ordens para queos garimpeiros despissem assuas vestes e alinhassem,deitados no chão, de barrigapara baixo, para administraremo castigo. Alexandre Quiangadescreve o que se passou aseguir. "Bateram-me nas náde-gas, com uma pá. Levei trêsvezes. Depois acrescentaram-me três mocas em cada umadas mãos e levei mais três nobraço direito que me partiu osossos".

Luciano Joaquim, AdrianoNgamatxituba e Sozinho Wali-nhengue, que se encontravamno grupo de garimpeiros e pas-saram pela mesma punição,apareceram, mais tarde, mor-tos com sinais de esfaquea-mento e golpes de catana,instrumento muito usado nosactos de tortura pelos agentesde segurança privada.

CASO Nº 9

Vítima: Francisco Paulo Ita, 29anos, natural do CuangoData: 15 de Março de 2006Local: Ilha de TxissueiaDescrição: Uma composiçãode 30 elementos da Alfa-5 etrês soldados das FAA tomoude assalto a ilha, por volta das9H00 da manhã, e aprisionouseis garimpeiros, de acordocom Francisco Ita.

"Revistaram-nos os ânus-es com as varetas das armas,que espetavam mesmo lá den-tro", explica o garimpeiro sobreo modo como os seus captoresprocuravam por diamantes.

Já na sessão de tortura,os elementos da Alfa-5 e dasFAA obrigaram os garimpeirosa despir as roupas e, segundoo entrevistado, "bateram-noscom bastões eléctricos nasnádegas, palmas da mão eplantas dos pés".

Francisco Ita conta terapanhado 29 bastões porqueos seus algozes adoptaram osistema de bater de acordocom a idade de cada vítima.

"Transpo r ta ram-nos ,depois, até à porta de armasdas FAA [Comando Regional ]onde nos libertaram de cue-cas", afirma o garimpeiro.

Recalcitrantes, o mesmogrupo de garimpeiros regres-sou à Ilha, ao fim da tarde, noafã de proceder à lavagem docascalho. Capturados. "Dessaveja mijei sangue com a porra-da", descreve Francisco Ita.

Qual teimosia, os garim-peiros tentaram uma terceiravez, à meia-noite, lavar o cas-calho e caíram na emboscada."Eles nos disseram que o Go-

verno vendeu até os rios evocês vão ficar apenas com ospiolhos", ressalta o cidadão.Francisco Ita refere que osguardas espancaram os garim-peiros, à vontade, com pon-tapés, socos e mocas.

CASO Nº 10

Vítima: Januário Sebastião, 33anos, natural do CuangoData: 15 de Março de 2006Local: Riacho Txicuele, nosarredores da Vila do CuangoDescrição: Integrante dogrupo de 27 garimpeiros apri-sionados nas margens doRiacho Txicuele, para além desalientar como foi castigado"com duas pás reforçadas nasnádegas, três porretes nasmãos e duas mocas dascostas", denuncia a queimadas roupas dos garimpeirosdepois de terem sido obrigadosa despir.

"Depois da porrada,meteram-nos num camião Ka-maz e levaram-nos para umamata, a uma grande distânciada vila, e deixaram-nos lá.Tivemos de regressar a pé",conta Januário Sebastião.

Numa revelação curiosa,o garimpeiro afirma que a oper-ação foi dirigida por "um bran-co estrangeiro, muito mau, quesó anda com catana e aleija osgarimpeiros".

"Nós costumamos a vermuitos corpos no rio. Os Alfa-5se encontram, por exemplo,uma pessoa isolada ou três,eles aniquilam mesmo", pontu-alizou.

CASO Nº 11

Vítima: Gonçalves Mateus, 28anos, natural do CuneneData: 10 de Março de 2006Local: Margens do Rio Lulo,MuxindaDescrição: Uma patrulha daAlfa-5 chefiada por um cidadãoidentificado pelo nome deAbreu Afonso, abordou, logopela manhã, um grupo de qua-tro garimpeiros na labuta. Trêsescaparam.

De acordo com SalvadorCaetano, que conseguiu esca-par, os efectivos da Alfa-5 obri-garam Gonçalves Mateus abeber água do rio enquanto opontapeavam no traseiro, mer-gulharam a cabeça da vítimana água e continuaram aespancá-lo. "Um dos guardasespetou-lhe uma baioneta nolado direito da cara e aban-donaram-no. Saímos dos es-conderijos, levámos o Gon-çalves até Cafunfo e daí o eva-cuamos para Luanda", teste-munha Salvador Caetano.

CASO Nº 12

Vítima: Armando GonçalvesTomás, 30 anos, natural doUígeData: 7 de Março de 2006Local: Bairro da Pedreira,CuangoDescrição: Uma patrulha daAlfa-5 interpelou o cidadão navia pública, revistou o saco emque levava material de garimpoe, mediante, tal evidência,segundo o seu testemunho,passaram ao acto de punição.

De acordo com ArmandoTomás, os seguranças espan-caram-no com o cabo da pá,torceram-lhe o braço direito atédeslocar os ossos e o arras-taram, a uma boa distância,para a margem do Rio Cuango,supostamente para o afoga-rem. "Graças a mim, que esta-va lá no rio e dei conta da situ-ação. Deixaram o indivíduo elevei-o até ao bairro", conta opescador, preferindo o anoni-mato, que o salvou.

Armando Tomás teve deser evacuado, pela família, afim de receber tratamentomédico adequado em Luanda.

CASO Nº 13

Vítima: Nzuzi Kamata, 40 anosnatural da RDCData: 18 de Fevereiro de 2006Local: Ponte sobre o RioCuango, área de MuxindaDescrição: Os seguranças daAlfa-5, de acordo com o teste-munho do seu amigo e compa-nheiro de garimpo Tozé Gilber-to, interpretaram os argumen-tos de irmandade, boa vizin-hança, desemprego e redis-tribuição de riqueza articuladospor Nzuzi Kamata, como umaaula de moral e uma afronta àsua autoridade.

Tozé Gilberto declara queNzuzi Kamata se encontravana ponte, perto das 9H00, como seu material de garimpo,onde os seguranças o abor-daram, interrogaram e o es-pancaram. Em função da res-posta sobre as razões que olevavam a garimpar em ter-ritório alheio, os guardas ates-taram inúmeras coronhadas nacabeça e na região abdominaldo congolês, segundo o amigoque estava presente no localdo acontecimento.

Os guardas deixaram-noem estado crítico. Tozé Gilber-to socorreu Nzuzi Kamata atéum posto médico na Samba,em Muxinda. De acordo com oseu depoimento, o congolêsfaleceu na madrugada do diaseguinte.

CASO Nº 14

Vítima: Simão Manuel, 41anos, natural de MalanjeData: 17 de Fevereiro de 2006Local: Área de garimpo 28,Muxinda, município de Xá-

MutebaDescrição: Uma patrulha daAlfa-5 cruzou, na via pública,com Simão Manuel. Este tinhaem sua posse alguns "meiosde trabalho", no caso peneiras.Os guardas, segundo o malan-jino, perguntaram-lhe sobre asua actividade ao que respon-deu ser vendedor de materialde garimpo. Não esperandopela segunda pergunta, tentoua fuga e foi alvejado com doistiros no braço esquerdo.

"Os homens abandona-ram-me no local. Um sene-galês recuperou-me, pôs-menum carrinho de mão e foiandando comigo até apare-cerem os meus amigos MonizNgongo e o Edgar Morais queme levaram até à família",conta Simão Manuel.

A família cuidou de eva-cuá-lo para o hospital de Sauri-mo, onde recebeu a devidaassistência médica.

CASO Nº 15

Vítima: Calunga Bernardo, 26anos, natural de Xá-MutebaData: 14 de Fevereiro de 2006Local: Txipaxi, arredores davila do CuangoDescrição: Ao fim da tarde, 13efectivos da Alfa-5 detiveram14 garimpeiros. "Quando nosapanharam, eu disse que eraangolano e não me deviammaltratar por estar na minhaterra. Um dos guardas man-dou-me f****".

"Aí, ele ordenou [aos out-ros guardas] que me amar-rassem com cordas. Bateu-mecom 15 porretes nas nádegase sete nas plantas dos pés.

"Queimaram as nossasroupas, incluindo o meu bilhetede identidade. Levaram-nos decarro até à vila do Cuango,nós sem roupa, e giraramconnosco para que todos, atéas mamãs no mercado, nosvissem. Passámos frente àadministração municipal, àcasa do administrador eComando Municipal da PN",lamenta Calunga Bernardo.

Numa outra fórmula decastigo, os guardas conduzi-ram os garimpeiros emdirecção ao município de Xá-Muteba, onde os libertaram,na mata. "Fizemos uma camin-hada de mais de seis horaspara regressar ao Cuango".

"Estamos como órfãos,sem ninguém para defender-nos. Sofremos muito", diz ocidadão.

CASO Nº 16

Vítima: Da Costa, 34 anos,natural do Cuílo, Lunda-NorteData: 13 de Fevereiro de 2006Local: Txipaxi, arredores da

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CCUUAANNGGOO10 De 22 a 29 de Julho 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

vila do CuangoDescrição: Ao serem aborda-dos por uma patrulha da Alfa-5,em número não determinado,13 garimpeiros ousaramrevoltar-se contra os seusperseguidores. De acordo como depoimento de Da Costa, osseguranças feriram um dosgarimpeiros a tiro, na sua apro-ximação, o que gerou indig-nação por parte dos colegas.Um tiroteio determinou o con-trolo da situação e a sorte dosrevoltados. Da Costa apanhouuma catanada na planta dospés que lhe causou ferimento,mais tarde suturado com 33pontos. "Os outros foram es-pancados de forma brutal",conta o garimpeiro. No seutestemunho refere que umoutro garimpeiro, cuja identi-dade desconhece, mas quefazia parte do grupo, foi encon-trado morto, pouco depois nasproximidades do local ondedecorreu a captura, aparente-mente afogado.

CASO Nº 17

Vítima: António João Luís, 28anos, natural do HuamboData: 28 de Janeiro de 2006Local: Margem do Rio Lulo,MuxindaDescrição: Ao cair da tarde,uma patrulha da Alfa-5 detec-tou uma comunidade de garim-peiros e efectuou disparos emsua direcção para os imobi-lizar, de acordo com AntónioJoão Luís. Dos 18 garimpeiros,13 conseguiram escapar. Doscinco capturados, mais trêsevadiram-se na preparação dacaminhada para Muxinda.

Os dois prisioneiros paga-ram pelos outros. "Um dosAlfa-5 esfaqueou-me nas ná-degas e na cabeça. Amarra-ram-nos e nos levaram aoBairro Mussanga, a pontapéspelo caminho, onde nos deixa-ram nus", depõe António JoãoLuís, que identificou o seucompanheiro de infortúnio ape-nas pelo nome de Tomás.

CASO Nº 18

Vítima: Diandré Julião, 23anos, natural de Caungula,Lunda-NorteData: 17 de Janeiro de 2006Local: Txipaxi, arredores davila do CuangoDescrição: Depoimentos deDiandré Julião dão conta doenvolvimento de 25 garimpei-ros por mais de 30 efectivos daAlfa-5, por volta das 9H00 damanhã.

"Apanhámos cinco páscada um, nas nádegas, e con-duziram-nos até às instalaçõescentrais da SDM onde traba-lhámos, de bikini apenas, atéàs 18H00, sem água nemcomida", denuncia o cidadão.

Parte do castigo incluiu ocorte de um pé de cada par decalças, ao que não escaparamtambém os calções. O jovemrevela o nome do chefe da mis-são da Alfa-5 como sendo "oTomás, do Grupo Kissonde" –"especializado" em apear osgarimpeiros em regiões dis-tantes do locais onde são cap-turados para os forçar a longasmarchas.

CASO Nº 19

Vítimas: Rodelho André Cam-

bala, 31 anos, natural de Ca-funfo; Simão Francisco, 26anos, natural do Cuango, e ou-trosData: 7 de Janeiro de 2006Local: Margem do Rio Cuan-go, junto à sede municipal doCuangoDescrição: Uma patrulha daAlfa-5 surpreendeu um grupode garimpeiros na labuta e, deacordo com os testemunhos deJesus e Feliz Cambala, osseguranças efectuaram dispa-ros aos alvos.

Da acção, resultou a mor-te de Rodelho, que os irmãosgarantem ter sido atingido na

cabeça. Os pescadores recu-peraram o seu corpo, passa-dos dois dias, amarrado a umapedra e atirado ao rio.

Em relação a Simão Fran-cisco, os irmãos Cambala, afir-mam ter sido atingido na regiãoabdominal e o seu corpo acha-do, passados três dias, nasmesmas condições.

Os irmãos, contam aindaa existência de uma terceiravítima mortal, com um tiro notórax, cuja identidade não con-seguiram apurar, que foi enter-rado no local, envolto num

cobertor.Em conversa com o pai

de Rodelho, André Cambala,este garante continuar à espe-ra das investigações levadas acabo pela PN.

"Até agora não dizemnada e a Alfa-5 não deu qual-quer apoio para o óbito".

Rodeado por membros dasua comunidade, alguns dosquais pescadores, conta amorte de um quarto garimpei-ro, cuja identidade desconhe-ce, torturado no local e quesucumbiu no posto médico, nodia seguinte.

CASO Nº 20

Vítima: Mateus Ngola, 25anos, natural do CuangoData: 24 de Dezembro de2005Local: Ilha de TxissueiaDescrição: Uma patrulhamista da Alfa-5 e soldados dasFAA montou emboscada amais de 70 garimpeiros, pertodas 06H00 da manhã. "Elesconseguiram capturar uns 40,mandaram-nos despir as rou-pas e obrigaram-nos a fazerexercícios militares, assim

mesmo nus."Depois mandaram-nos

fingir que estávamos a andarde mota, a seguir tínhamos degritar à toa, como se fossemosmalucos. Pronto. Aí começa-ram a bater-nos com catanas,pás e porretes, nas palmas damão, nas nádegas e em todo ocorpo", descreve Mateus Ngolaque afirma ter sido espancadotambém nas plantas dos péscom catana.

"Os militares das FAAtambém torturaram os garim-peiros, incluindo a mim. Elesdisseram-nos que era a missãodeles. Quem coordenou a ope-

ração foi um branco estran-geiro, fardado e armado, quetambém bateu nos angolanos,mas não a mim", revela ogarimpeiro.

"Meteram-nos, depois,num camião Kraz e libertaram-nos na ponta do bairro, vila doCuango, sem roupa. Cheguei àcasa com o corpo todo inflama-do. A minha família choroumuito".

Nota: Essa entrevistateve lugar, a 9 de Abril de 2006,na vizinhança da adminis-tração municipal, minutos de-pois do autor ter conversadocom o administrador, que man-ifestou total desconhecimentoda situação – apesar das suasreuniões semanais com oscomandantes da PN e dasFAA.

CASO Nº 21

Vítima: Adriano Óscar, 24anos, natural de Caungula,Sérgio Zacarias, 17 anos,Bernardo Tito, 11 anos, ambosnaturais do Cuango, JoãoAndré Candala, 23 anos, Ven-tura Sanzangue, 25 anos am-bos naturais de Camaxilo,Lunda-Norte.Data: 19 de Dezembro de2005Local: Bairro Cambala, Acam-pamento da Alfa-5, no TuazaDescrição: Uma patrulha detrês elementos da Alfa-5emboscou mais de 20 garim-peiros na via pública e, sob amira das suas AK’s, conduziu-os ao posto de observação doTazua, de acordo com teste-munhos de Adriano Óscar.

O jovem tenta contar, aossoluços, o que se passou naunidade. Os seus companhei-ros, também presentes noacto, revelam o nível de sadis-mo dos seus captores. Sobameaça de fogo, "quando sou-beram que o mais velho FelipePaulo era sogro do Adriano,obrigaram-nos a ter relaçõessexuais".

"Eles destruíram uma fa-mília. Assim, como possoencarar o meu sogro na minhacasa ou na casa dele? Comolidar normalmente com a mi-nha mulher, se dormi com o paidela?", questiona-se AdrianoÓscar.

"O comandante do postodo Tuaza obrigou também oSérgio Zacarias (17 anos) a terrelações sexuais com o Bene-dito Tito (11 anos)", teste-munha João André Candala.

Essa testemunha garanteque, um dos seguranças daAlfa-5, no momento em que sedivertiam a "acasalar" osgarimpeiros perguntou quempertencia à Igreja Universal doReino de Deus, sua confissãoreligiosa. "Eu disse logo que

"O rio é nosso, agora nãopodemos pôr lá os pés. Eu lamento. Fizemos rituaispara esses senhores explorarem osdiamantes, agora nosescorraçam, na nossa própria terra".Muana Cafunfo, 2.4.06

Vítima mortal da segurança da Alfa-5. A família clama por justiça.

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CCUUAANNGGOO 11Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

A Resposta da Alfa-5A Resposta da Alfa-5Director-Geral da Alfa-5,Francisco Guerra, emresposta à descrição su-

mariada dos casos acima ex-postos, a 19 de Abril de 2006,enfatiza, antes de mais, que aconduta da sua empresa serege pelas leis do país.

"A nossa missão é pre-venir e combater as práticas degarimpo e nunca dar respaldoa comportamentos alvitrantesque ofendam a dignidade hu-mana.

"A nossa gestão é des-centralizada. Não posso dizerse esses casos tiveram lugarou não, porquanto não recebiqualquer informação a respeito", reage o oficial general emcomissão especial de serviçona Endiama.

Francisco Guerra evocaas condições sócio-económi-cas na região, tais como o de-semprego quase absoluto,como um dos ângulos pelaqual deve ser vista a questãodos direitos humanos. O de-semprego fomenta o garimpoque, por sua vez, alimenta otráfico ilícito de diamantes e,por consequência, o uso demecanismos coercivos para oseu combate.

Um outro elemento para-lelo aos abusos, por parte dos

efectivos da Alfa-5 na região doCuango, tem a ver com o usodos nomes dos generais quefazem parte da sociedade,como livre trânsito para a im-punidade. A esse propósito, oresponsável da Alfa-5 conside-ra tal uso como "indevido eabusivo".

Francisco Guerra argu-

menta que a empresa tem "su-gerido procedimentos parafacilitar a circulação de pes-soas que vivem na área. Temosproposto o censo populacional,meios de controlo da popula-ção por forma a evitar que se-jam molestadas".

"As nossas operaçõessão descentralizadas. Não são

ordens de Luanda. Se os indi-víduos adoptam esse compor-tamento é por consciência indi-vidual. É o que se passa umpouco nessas áreas", explica ogestor. Para si, "pela nossa ex-periência, temos conseguidoque os projectos tenham rela-ções excelentes com as autori-dades tradicionais e a popu-

lação em geral"Contrariamente à imagem

de brutalidade da Alfa-5 juntodas populações locais, Francis-co Guerra é categórico: "nãoacredito que esse comporta-mento seja generalizado entreos nossos homens, mas nãodescuro alguns casos individu-ais que possam manchar obom nome da empresa. E,temos alguns exemplos tris-tes".

O oficial general afirmaque a Alfa-5 envia, todos osmeses, um relatório de activi-dades à PN, "quanto mais nãoseja ao sector provincial quecontrola as empresas de segu-rança".

Mais adianta sobre a rig-orosidade no enquadramentodo pessoal de segurança quepassa por testes psicotécnicos."Temos um centro de formaçãono Kikolo. O nosso programade treinamento e as matériasque ministramos foram aprova-dos pela PN.

"Por mais pobres que se-jamos, temos todos direito àdignidade humana" remata ogestor, justificando, mais umavez, a ausência de qualquer or-dem, a partir de Luanda, para otratamento cruel e desumanodos garimpeiros.

O

sim. Apesar de ser católico,menti e ele não deixou que eufizesse sexo", confessa JoãoAndré Candala. Todavia, areligião não o poupou de apan-har 15 porretes nas nádegas.

Ventura Sanzangue expli-cou que o chefe dos Alfa-5, noTuaza, encarregou-se pessoal-mente de torturar os garimpei-ros. Estes encontravam-se jádespidos e já tinham capinadoà volta do posto. Segundo ogarimpeiro, o "chefe" aplicou-lhes um mínimo de 12 porretescada, para os mais calmos, euma rodada adicional de 20para cada "refilão".

Nos dois dias seguintes,Adriano Óscar caiu nas malhasdos Alfa-5, tendo levado mais20 porretes nas nádegas e, noúltimo dia, por obra da sua tei-mosia, teve a pena reduzidapara 5 porretes.

"Depois o chefe deles [dogrupo da Alfa-5] falou con-nosco para pagarmos US$100por dia, por pessoa, para po-dermos trabalhar em paz",denuncia o garimpeiro.

CASO Nº 22

Vítima: Alexandre Pascoal, 36anos, natural de Capenda Ca-

mulembaData: 9 de Dezembro de 2005Local: Ilha de TxissueiaDescrição: De madrugada,por volta das 4H00, uma com-posição mista tomou deassalto a área de garimpo. Ale-xandre Pascoal e outros garim-peiros, anotaram a presençade 33 efectivos da Alfa-5, 7 sol-dados das FAA e 5 elementosda Segurança Industrial daSDM.

Durante a operação, osgarimpeiros, calculados em110 pelo interlocutor, passarampelo ritual de despir a roupa,testemunhar a queima da mes-ma, deitar de barriga parabaixo e receber o castigo."Cada um de nós levou com 10porretes de choque eléctriconas nádegas. Aqueles que refi-lavam levavam mais", afirma ogarimpeiro.

Segundo Alexandre Pas-coal, "os guardas puseram-nosem fila indiana, obrigaram-nos,com as armas apontadas paranós, a fazer sexo, dois a dois.Como muçulmano, essa foi amaior humilhação da minhavida. Eles tiravam fotografias".

Depois, "puseram-nosnos camiões e deixaram-nosjunto ao bairro, nus. Alguns,

que tinham cuecas, aproxi-mavam-se das casas para pe-dir panos ou enviar recados àsfamílias para nos levarem rou-pas".

Em relação ao nível deviolência de que são alvos,Alexandre Pascoal apenas afir-ma que, "se o Governo quiserver onde estão os mortos cau-sados pela Alfa-5, pode vir terconnosco para indicarmosonde estão as sepulturas.

"O Leão, da Alfa 5, queera o torturador mais famoso,morreu no tempo chuvoso.Matou, na operação, dois mer-gulhadores a tiro e mais o aju-dante deles. Os outros Alfa-5tinham furado as bóias dosgarimpeiros para ninguém sairdo rio, mas ele também acaboupor morrer afogado".

(...)

CASO Nº 29

Vítima: João Baptista, 30 anosData: 23 de Junho de 2005Local: Cajivunda, município deXá-Muteba, Lunda-NorteDescrição: O cidadão encon-trava-se a garimpar numa áreaanteriormente ocupada pelaSociedade de Desenvolvi-mento Mineiro (SDM) que, en-

tretanto, a abandonara. Efec-tivos da Alfa-5 atacaram o locale, segundo depoimentos deJoão Baptista, amarraram-lheas mãos e os pés, atiraram-noao capim ao qual atearam fogoe assim o abandonaram. Comoconsequência tem a rosto, asmãos e os pés severamentequeimados, bem como outraspartes do seu corpo. Não rece-beu qualquer assistência dacompanhia.

CASO Nº 30

Vítima: André Muxito, 31 anos,natural do CuangoData dos factos: 14 de Junhode 2005Local: Ponte do Rio Cuango,entre a aldeia Manuel Angola ea sede municipal do Cuango,Lunda-NorteDescrição: Por volta das10H00, guardas da empresaprivada de segurança Alfa 5,surpreenderam um grupo degarimpeiros a lavar a cascalhona margem do Rio Cuango.Obrigaram-nos a deitar o cas-calho para o rio. Segundo tes-temunhos locais, os guardaspontapearam e atiraram àágua o cidadão André Muxito,por não se ter despachado

com a ordem. Não sabia nadare, devido à forte corrente dorio, morreu afogado.

Rafael Samutale ao ver oamigo a afogar-se, escapou aocontrolo dos guardas e correupara a aldeia e contou o suce-dido. Enfurecidos, os aldeãesmarcharam contra o posto decontrolo mais próximo da Alfa5. Diante do afluxo de pessoas,segundo os aldeães, os guar-das dispararam contra os pop-ulares tendo ferido, com gravi-dade, Enoque Albino CongoCambolo, 26, nos membrosinferiores. Transportado para aclínica da SDM, em Luzamba,o pessoal médico da empresaresponsável pelos guardasrecusou-se a prestar sequer osprimeiros socorros ao ferido. Apopulação deixou-o na referidaclínica.

Em retaliação, os popu-lares decidiram atacar, à pe-drada, todas as viaturas lig-adas à SDM que circulassepela via Mucussuca-ManuelAngola. Após cinco dias semlhe prestar a devida atençãomédica, segundo testemunhaslocais, a SDM decidiu enviar oferido para Luanda a fim dereceber tratamento médicoadequado.

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CCUUAANNGGOO12 Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

O Poder da K&P MineiraO Poder da K&P MineiraK&P Mineira é uma subsi-diária da V.S.S.B – Vigi-lância e Sistemas de

Segurança Bancária, GrupoK&P, SARL.

Constituem a sociedadedo referido grupo, segundoescritura publicada em Diárioda República – III Série, n°40,de 21 de Maio de 2002 – asseguintes individualidades:

Comissário José Alfredo‘’Ekuikui’’, Comandante-Geralda Polícia Nacional

Comissário Alfredo Eduar-do Manuel Mingas ‘’Panda’’,Comandante da Polícia deIntervenção Rápida “Ninjas”

Sub-Comissário EliasDumbo Livulo, ComandanteProvincial da Polícia Nacionalna Lunda-Norte

Hugo Garrocho AlvesSardinha

Sub-Comissário EugénioPedro Alexandre, Director doGabinete Jurídico do Comando-Geral da Polícia Nacional

José Gomes Maria Rodri-gues, actual Director-Geral daK&P Mineira

A

CASO Nº 1

Vítima: Morais Ambrósio, 27anos, natural de LuremoData: 26 de Maio de 2006Local: Margem do RioCuango, na área de Ngungo,LuremoDescrição: Efectivos da K&PMineira, em número não deter-minado, tomaram de assalto aárea de garimpo de Ngungo e,com armas em posição defogo, impediram a fuga deMorais Ambrósio. Primeiro,trataram-no a pontapés e coro-nhadas no peito e, já no chão acontorcer-se, segundo o seudepoimento, os guardas apli-caram-lhe mais de 20 pauladasnas costas. Libertaram-no aseguir.

CASO Nº 2

Vítima: Félix Damião, 28 anos,natural de BenguelaData: 17 de Maio de 2006Local: BulaDescrição: Um pequeno-al-moço bastante indigesto paraFélix Damião e Cia. Sete segu-ranças da K&P Mineira sur-preenderam os garimpeiros a

matabichar , de manhã cedo, ecom as armas apontadas obri-garam-nos a deitar a comidapara o chão e a despir as rou-pas. Félix Damião conta tersido espancado com 20 mocasnas costas. Passou mais dequatro horas de cativeiro àsmãos dos seguranças

CASO Nº 3

Vítima: Deloy Mpemba, 20anos, natural de LuremoData: 17 de Maio de 2006Local: Bula, LuremoDescrição: Ao fim do dia, umgrupo de garimpeiros terminoua labuta nas margens do RioLué e dirigiu-se ao Bairro doKelengue. Pelo caminho, en-contraram uma patrulha daK&P Mineira que os tratou comuma sessão de espancamen-tos, nas nádegas, com o caboda pá.

Deloy Mpemba não selembra quantos garimpeiroseram ao todo nem os homensda segurança. "Bateram-metanto ao ponto de me inflamaras nádegas e perder os senti-dos. Quando despertei já esta-va escuro e não conseguia

andar. Tive de dormir alimesmo, até ao dia seguinte. Epraticamente fui a rastejar atéao bairro", testemunha o cida-dão.

Até à presente data, De-loy Mpemba apresenta sériasferidas nas nádegas e caminhacom o apoio de paus, a fazerde muletas.

CASO Nº 4

Vítima: Timóteo Bândua, 30anos, natural de Mbanza-Con-go, ZaireData: 7 de Maio de 2006Local: LuremoDescrição: A caminho doaldeamento de Mona Mahan-go, proveniente do Bairro Ke-lengue, ao cair da tarde, ocidadão cruzou com umapatrulha de três elementos daK&P Mineira.

"Mandaram-me parar eobrigaram-me a ler o que esta-va escrito na placa, à beira daestrada [Área de concessãoLuminas]. Depois disseram –‘você não sabe que esta é umaárea de concessão e é proibidopassar a esta hora?’" DescreveTimóteo Bândua.

a roupa toda. Tentámos reagircontra a ordem e dispararamcontra nós. Graças ao Senhor,os tiros não atingiram ninguém.Obedecemos e mandaram-nosdeitar no chão. Logo começoua dança da kabetula, comoeles denominam a tal surra.Cada um de nós apanhou com10 pás nas costas e outras 10mocas nas mãos", detalhaAbel Mateus.

A seguir, os garimpeirosforam encaminhados até aoRio Lumonhe, onde os liber-taram, perto das 18H00, apósduas horas e meia de cativeiro,de tronco nu e descalços. "Elesapoderaram-se dos nossosmeios. Deixaram-nos com ascalças porque estavam rotas,de ajoelhar no trabalho", expli-ca o garimpeiro.

CASO Nº 6

Vítimas: Seba João Fernando,40 anos, Tomás Adão, 18 anos,ambos naturais do UígeData: 20 de Abril de 2006Local: Bula, LuremoDescrição: O cidadão emcausa, encontrava-se a lavar o

"Eu respondi o seguinte:Estou na estrada, numa viapública. Não tenho nenhummaterial de garimpo para vo-cês desconfiarem de mim. Aíeles começaram a bater-mecom coronhadas de AK-M nascostas".

"Quando tentei reagir,apontaram-me as armas e jánão fiz nada, visto que eramtrês elementos todos armados.Mandaram-me deitar no chãotiraram o cinto que eu tinha nascalças e com o mesmo me sur-raram, nas costas, durante uns10 minutos", explica a vítimaque a seguir recebeu ordenspara continuar a sua jornada.

CASO Nº 5

Vítima: Abel Mateus, 40 anos,natural de LuremoData: 20 de Abril de 2006Local: Kelengue, LuremoDescrição: Um grupo de seteelementos da K&P Mineiraabordou três garimpeiros quecaminhavam pela estrada emdirecção ao bairro. Provinhamdo garimpo nas margens doRio Lué.

"Obrigaram-nos a mudar

Os Desmandos da K&P MineiraOs Desmandos da K&P Mineira

A K&P Mineira presta, naregião do Cuango, os serviçosmais antagónicos. Por um ladodedica-se, de forma brutal, aocombate contra o garimpo, con-forme relatos abaixo menciona-dos. Por outro, detém o mono-pólio de protecção dos postosde compra de diamantes da So-diam/LKI e Ascorp e acompa-nha os compradores nas tran-sacções que estes realizamdirectamente nas áreas degarimpo. A 3 de Março, pelas13H40 o autor acompanhou,em Muanhangando, a uma dis-tância conveniente, uma equipada K&P Mineira que escoltavaum comprador estrangeiro,afecto à Sodiam/LKI.

Dirigiam-se à área degarimpo para transaccionardirectamente com os garimpei-ros. A esse propósito, JoãoJosé Massaco, 36, por duas ve-zes torturado por segurançasda K&P Mineira, no RioLumonhe (Luremo), coloca noar uma questão pertinente:"Vocês pensam que os con-tuários dos estrangeiros estão a

comprar milho? Se são dia-mantes, então, quem está acavá-los?". A resposta é óbvia,os garimpeiros. O nível de vio-lência perpetrado pelas empre-sas de segurança privada éproporcionado, logo à partida,pelo excessivo material bélicoque carregam consigo. Osseguranças da K&P Mineira vis-tos em acção, como rotina,levam cartucheiras ao peitocom vários carregadores debalas.

A 30 de Março de 2006,um grupo atravessou o bairroda Kinzamba, nas proximidadesda Vila do Luremo, pelas17H00, tendo a população localreferido ser diária a sua pre-sença no bairro bem como otemor que inspiram.

Minutos depois foi pos-sível abordar as sentinelas deserviço no portão principal daSociedade Mineira Luminas. Noimprovisado posto de obser-vação, junto à cancela de aces-so, se encontravam detidos oitogarimpeiros amarrados uns aosoutros, denotando sinais de já

terem sido espancados con-forme prática local.

À pergunta sobre as ra-zões que motivavam os guar-das a maltratar os seus compa-triotas de forma tão brutal, osentinela esboçou um sorriso edisse, sem se preocupar com osentido da sua afirmação, que"o nível de stress do angolano émuito elevado, daí a frustração.Na verdade somos todos ango-lanos e devíamos tratar-nosuns aos outros de forma dife-rente". O seu colega, num actode contrição, pegou num paco-te de bolachas e atirou aos pri-sioneiros.

Vários funcionários doprojecto, incluindo um sénior,passaram pelo local sem quese tivessem importado com ofacto da empresa estar a serutilizada como centro de deten-ção ilegal de garimpeiros.

Sobre a ilegalidade dadetenção dos garimpeiros, nasinstalações da Luminas e na-quelas condições, o guardaapontou o indicador para o seupeito, na sigla da empresa ins-

crita no uniforme. "Sabe o quesignifica K&P?" – Perguntou. Aoreceber uma negativa explicou-se: "Isso é dos bosses, eles éque mandam. Vai ter com eles".

No dia seguinte, uma pa-trulha da K&P Mineira passou,a pé, diante do autor, que ano-tava casos na aldeia de Donga,à berma da estrada, por voltadas 18H00, com 10 garimpeirosamarrados uns aos outros e emfila indiana, alguns dos quais asangrar. Dirigiam-se às insta-lações da Luminas.

É nessas instalaçõesonde o cidadão russo YuriKovtun, conhecido como o"boxeur do Luremo", pela suabrutalidade, espancou o cida-dão angolano Simão ArmindoVerónica, a 2 de Outubro de2005, até deixá-lo em estadograve.

Tendo o caso chegado deimediato ao conhecimento dasautoridades policiais, estas deti-veram o russo, sob o processo263/05, e tiveram de o libertarno dia seguinte por "ordenssuperiores". O caso parou aí.

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CCUUAANNGGOO 13Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

cascalho, na área de garimpodo Bula, quando os segurançasafectos à K&P Mineira o sur-preenderam, com as armasapontadas para os garimpeiros.

"Bom, começaram a bater-nos com os cabos das pás, queusamos no garimpo". SebaFernando conta ter apanhado15 cabos da pá nas nádegas emais cinco em cada mão. Fingiuter desmaiado. Os seguranças,segundo o seu depoimento,procuraram reanimá-lo despe-jando-lhe baldes de água, o quelhe conferiu energias para afuga.

Conta ainda ter passadopelo ritual de despir a roupa eter fugido apenas de bikini, pois,antes da surra, os guardas havi-am queimado todas as roupasrecolhidas. Não soube precisarquantos garimpeiros sofreramàs mãos dos guardas.

Encontrando-se no mes-mo local e tendo-se apercebidoda captura do seu conterrâneo,Tomás Adão esboçou a fugasem sucesso. Deu-se conta deestar sob a mira de uma arma.Teve de obedecer ao ritual demudar a roupa, deitar-se nochão e apanhar 30 chicotadas.Passadas duas semanas, aindase queixava de inflamações edores nas costas.

CASO Nº 7

Vítimas: António Eliseu, 14anos, e Bartolomeu Mussuel, 19anos, ambos naturais do Lure-moData: 20 de Abril de 2006Local: Bula, LuremoDescrição: No raide das10H00, o pequeno António Elis-eu e o seu amigo BartolomeuMussuel também caíram nasmalhas da K&P Mineira, namargem do Rio Cuango.

"Mandaram-nos sair daágua, e levei logo uma chapa-da. O guarda perguntou-mecomo era possível uma criançaestar já a praticar o garimpo?Eu respondi que não tenhocomo sustentar os meus estu-dos, porque o meu pai não tra-balha e não há empregos noLuremo", explica António Eliseu.

Os guardas da K&PMineira interpretaram a expli-cação, segundo António Eliseu,como uma afronta à sua autori-dade e um deles bateu-lhe coma padiola na cabeça. A seguirapanhou com 15 mocas nasmãos e na região lombar. Findoo castigo, os seguranças ins-truíram a criança, de acordocom o seu depoimento, a servirde porta-voz junto de outras cri-anças para as desincentivar dogarimpo.

"Eu disse-lhes que a terraé nossa e eles é quem sabemse nos matam ou nos transfe-rem para outro lugar onde nãohá diamantes", explica o "porta-

voz".Quanto a Bartolomeu

Mussuel, ao insurgir-se contra oespancamento do menor, sentiuo peso da arma na cabeça.Uma coronhada atirou-o para aágua e a sangrar. "Um dos se-guranças, ao tentar segurar-mepara não ser levado com a cor-rente, deixou cair o chapéu.Isso causou-lhe fúria, por ver ochapéu a ir com a corrente.Tiraram-me da água e ponta-pearam-me a valer", refere ocidadão.

Antes da soltura, Eliseu eBartolomeu Mussuel estiveramretidos, por cerca de duashoras, nas instalações da Lumi-nas.

CASO Nº 8

Vítima: Francisco Pinto, 17anos, natural do LuremoData: 20 de Abril de 2006Local: Margem do Rio Lumo-nhe, Kelengue

Descrição: O jovem encontra-va-se a pescar, logo pela ma-nhã, quando os guardas daK&P Mineira interromperam asua actividade.

"Eles disseram-me paradeixar de pescar no rio, porqueos peixes também estão incluí-dos na área de concessão dia-mantífera", revela FranciscoPinto.

Ao tentar argumentar emsua defesa, o pescador contaque um dos guardas lhe atingiuviolentamente com um pau na

cara. "Desmaiei e aban-donaram-me", informa o jovem.

CASO Nº 9

Vítimas: Kassongo Fisto, 24anos, natural de Kahemba,RDC, Morais Guilherme, 31anos, natural de Camaxilo,Lunda-NorteData: 19 de Abril de 2006Local: Kelengue, LuremoDescrição: Garimpeiros ma-

drugadores, Kassongo Fisto eum grupo de colegas caíram naemboscada montada pelos se-guranças da K&P Mineira na viade acesso ao Rio Lué, por voltadas 4H00 da manhã.

Mais lestos, outros garim-peiros escaparam-se a cobertoda escuridão. Kassongo Fistoindica que os guardas o apan-haram e a Morais Guilherme."Mudaram-nos as roupas, man-daram-nos deitar de costas,assim mesmo nus, e cada umde nós apanhou com 30 cabos

da pá nas nádegas. Quandotentei reagir, deram-me comuma coronhada da boca, come-cei a sangrar e perdi os senti-dos", conta o cidadão congolês.

Por sua vez, Morais Gui-lherme afirma que os guardasexigiram dele silêncio e obe-diência ao notarem a imobili-dade de Kassongo Fisto, paraevitar o mesmo "destino".

"Eu respondi. Já mataramo meu amigo, podem matar-me

também. O guarda disse ‘vóssois um cão morto!’". Ao ten-tarem ver se o meu amigo esta-va mesmo morto, eu aproveiteia distracção e fugi.

CASO Nº 10

Vítima: Ndombe Massala, 30anos, Ndombe, 29 anos, e Txi-kanda Mossogi, todos da RDCData: 13 de Abril de 2006Local: Kelengue, LuremoDescrição: Os efectivos daK&P Mineira surpreenderam osindivíduos em referência a lavarcascalho e, de acordo com ex-plicações dos próprios, amar-raram-nos, um ao outro, pelacintura. Encaminhados até àcaserna dos captores, pas-saram à condição de "escravos"com a tarefa de acarretar água,varrer e lenhar.

"Depois, bateram-me como cabo da pá nas nádegas", la-menta Txikanda Mossogi, semprecisar o número de vezesque apanhou.

No caso de Nday Ndombe,este conta como "mandaram-me deitar no chão, de barrigapara baixo, e bateram-me como cabo da pá na coluna".

Ndombe Massala, paravariar, apanhou na cabeça. E,"soltaram-nos", conta.

CASO Nº 11

Vítima: Adão Mílton, 27 anos,natural do LuremoData: 12 de Abril de 2006Local: Mona MahanguDescrição: Interceptado na viapública, a meio da tarde, AdãoMílton, conta como dois segu-ranças da K&P Mineira lherevistaram os bolsos e o ânus àprocura de diamantes.

"Quando tentei falar, co-meçaram a bater-me na cara. Omeu colega fugiu. Um dos segu-ranças disse ao outro para medar um tiro. O outro respondeuque não, porque o meu colega,que fugiu, poderia descobrirtudo. Aí, deram-me com umamoca na coluna e soltaram-me", descreve Adão Mílton.

CASO Nº 12

Vítimas: Magalhães Carlos, 30anos, natural do Luremo, eJean Claude, 32 anos, da Re-pública Democrática do CongoData: 30 de Março de 2006Local: Riacho do Cangau,TxatxoDescrição: "Aqui, nas Lundas,não temos fábricas, empregos,nada! Só diamantes", depõe oangolano.

Cercados, ao meio-dia,por três elementos da seguran-ça da K&P Mineira, os garim-peiros tiveram de experimentaruma nova sensação. Cantarnus. "Mandaram-nos cantar e

Deloy Mpemba , torturado nas nádegas pelasegurança da K&P Mineira , mal

caminha com a ajuda de um pau.

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CCUUAANNGGOO14 Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

dançar ndombolo , sem roupanenhuma. Depois de cantar-mos, mandaram-nos deitar eapanhámos cada 50/60 chi-batadas nas costas, nas náde-gas e nas pernas", explica Ma-galhães Carlos, apoiado pelocongolês que mostra os sinaisda tortura.

Como pena suplementar,tiveram de capinar nas insta-lações do projecto, debaixo dechuva, o que lhes permitiu fugir,sem aguardar pela ordem desoltura.

CASO Nº 13

Vítima: Silva Matumona, 29anos, natural de Kahemba,RDCData: 30 de Março de 2006Local: KelengueDescrição: Cinco efectivos daK&P Mineira montaram tocaiana picada em direcção ao RioCuango e, por volta das 14H00,detiveram um grupo de garim-peiros a quem despacharambofetões na cara.

"Eles disseram-nos quetínhamos muita sorte, porqueeles tinham sonhado muito bemnesse dia. Libertaram-nos coma ordem apenas de corrermosaté ao bairro", conta Silva Matu-mona, um dos garimpeiros"abençoados" pelo sonho dosguardas.

CASO Nº 14

Vítima: Ngunza Moisés, 47anos, natural de Caungula,Lunda-NorteData: 29 de Março de 2006Local: Margens do Rio Cuango,área do Bula, LuremoDescrição: Necessitando deforça de trabalho, três efectivosda K&P Mineira realizaram umrusga na zona em referência,munidos de cães, e detiveramNgunza Moisés, na companhiade dois cidadãos do CongoDemocrático, Mbila Mahingi eMutombo.

"Amarraram-nos os três,em fila indiana, e levaram-nospara o posto deles onde acar-retámos água, lavámos as far-das deles, capinámos e limpá-mos a tenda deles. Soltaram-nos ao fim do dia", afirma ogarimpeiro.

CASO Nº 15

Vítima: Ndeye Kassongo, 33anos, da RDCData: 26 de Março 2006Local: Ngoya, LuremoDescrição: Por volta das19H00, de acordo com o teste-munho de Ndeye Kassongo,efectivos da segurança da K&Pmontaram emboscada numadas vias, em forma de posto decontrolo, e assim detiveram umnúmero não determinado degarimpeiros e passantes.

"Obrigaram-nos a despir aroupa e amarraram-nos pelacintura [uns aos outros] e emfila indiana. Levaram-nos até aoposto deles no Bula. Des-pejaram-nos água no corpo,para doer mais, e assim come-çaram a espancar-nos comcoronhadas e cabos da pá",afirma o congolês.

Os garimpeiros passaramuma noite de cativeiro, no postodo Bula. No dia seguinte, "man-daram-nos acarretar água evarrer os arredores do posto.Fizemos o matabicho para eles.Deram-nos funge, comemos efomos libertados", refere NdeyeKassongo.

CASO Nº 16

Vítima: Francisco Melo Kingan-go António, 22 anos, natural deMalanjeData: 23 de Março de 2006Local: BulaDescrição: Um efectivo da K&PMineira encontrou FranciscoAntónio no buraco, na labutapelos diamantes e assestou-lhe, de imediato, com umamoca na cabeça.

"Comecei a sangrar muitoe o outro guarda pediu para quenão me batessem mais. Derammuita porrada nos outros (qua-tro) e levaram-nos até à esqua-dra da polícia, no Luremo, ondetivemos de capinar antes denos mandarem para casa", afir-ma o cidadão, ainda com sutu-ras na cabeça.

CASO Nº 17

Vítimas: Samba Martinho, 22anos, e Luzia José, 30 anos,ambas naturais do LuremoData: 20 de Março de 2006Local: Margens do Rio Cuango,área do Txatxo, LuremoDescrição: Segundo depoi-mentos de uma testemunhaocular, que preferiu o anonima-to, por volta das 11H30, seiselementos da K&P Mineira dis-persaram os garimpeiros que seencontravam na área, com fortetiroteio, e privaram as duas sen-horas, que se dedicavam a tare-fas domésticas. Violaram-nas.

"As vítimas, acompanha-das pelos sobas, apresentaramqueixas ao administrador JoãoBernardo, do Luremo, que fezouvidos de mouco", conta atestemunha.

CASO Nº 18

Vítimas: José Bartolomeu, 48anos, natural do Luremo,Data: 20 de Março de 2006Local: Riacho Kinzamba, Lure-moDescrição: Uma patrulha daK&P Mineira, em número nãodeterminado, envolveu um gru-po de garimpeiros por volta das11H00 e, de forma ritual,

obrigou-os a despirem-se. Deacordo com José Bartolomeu,por insubordinação, "o Jaimeapanhou mais de 30 catanadasnas nádegas diante da esposa,a D. Tété. O João Martins, oAnselmo Mutombo, o Lóló, oIsaac (do Uíge), o Paulino, oSimão Mussanda e eu tambémapanhámos com catanadas".

Prosseguindo, os elemen-tos da K&P Mineira procuraramestabelecer um acordo com osgarimpeiros, de acordo comJosé Bartolomeu, para queestes lavassem o cascalho e re-partissem a produção com osseus torturadores.

Segundo narração dointerlocutor, "Nós recusámos.Levaram-nos para dentro dasinstalações da Luminas, juntodas tendas deles, onde obri-garam-nos a rebolar na lamaenquanto nos batiam com chi-cotes. Eles eram mais de 10, in-cluindo o chefe deles, o Adão, etodos batiam. Passámos lá atarde toda, na esfrega, a gati-nhar na lama e tudo o mais".

"Por isso, para nós, Angolaé um país estrangeiro. Nós,angolanos, somos tratados pio-res do que animais", indigna-seJosé Bartolomeu.

CASO Nº 19

Vítima: Wilson Ngamba, 27anos, natural de Kikuit, RDCData: 14 de Março de 2006Local: KelengueDescrição: Uma patrulha daK&P Mineira envolveu um grupode garimpeiros que, às pri-meiras horas da manhã, lavavao cascalho. "Eles apontaram-nos as armas. Tentámos fugir eeles disseram que soltariam oscães. Aí, nós parámos. Pergun-taram-nos se já tínhamos con-seguido algumas pedras. Commedo, dissemos que sim e pedi-ram para ver os diamantes",conta Wilson Ngamba.

"Nós mostrámos duaspedras. Eles disseram que nóstínhamos mais pedras escondi-das e respondemos que não.Obrigaram-nos, então, a lavartodo o cascalho. Conseguimosmais quatro pedras", prossegueo garimpeiro.

"Aí eles começaram adançar. Não nos bateram, ape-nas se apoderaram de todas aspedras, destruíram os nossosequipamentos e mandaram-nosregressar ao bairro", narraWilson Ngamba.

CASO Nº 20

Vítima: António Francisco daSilva, 22 anos, natural de Ma-lanjeData: 10 de Março de 2006Local: Muhetu, LuremoDescrição: Dos sete garim-peiros detectados pela patrulhada K&P Mineira, às primeiras

horas da manhã, apenas Antó-nio Francisco da Silva caiu nasmalhas dos perseguidores. Osoutros escaparam.

"Castigaram-me com 45pás nas nádegas, nas costas enas mãos. Fiquei uma semanade cama, todo inflamado", contao cidadão.

CASO Nº 21

Vítima: Nestor Mbavo, 29 anos,da RDCData: 10 de Março de 2006Local: KelengueDescrição: "Bateram-me com ocabo da pá na cabeça. Quandoviram que eu estava a sangrar,obrigaram-me a mudar a roupae mandaram-me para casa ape-nas de bikini", explica o garim-peiro, sobre o que lhe aconte-ceu, quando os seguranças daK&P Mineira o abordaram aofim do dia. Os seus dois colegasescaparam ao primeiro sinal de"estranha presença".

"À entrada do bairro, pedia uma amiga para me arranjaruns calções para eu vestir epoder passar pelas pessoas",conta Nestor Mbavo.

CASO Nº 22

Vítima: Abreu José Domingos,38 anos, natural de Xá-MutebaData: 2 de Março de 2006Local: BulaDescrição: O cidadão em refer-ência manifesta-se conhecedordos seus direitos e de leis vi-gentes no país. Procurouevocá-los num controlo impro-visado pela K&P Mineira, na viado Bula, para revistar as viatu-ras em trânsito, numa das quaisviajava com a sua mercadoria.

Os seguranças alegavam,segundo Abreu Domingos, pre-venir a circulação de material degarimpo, mas estenderam a suaacção a mercadorias como ali-mentos, roupas, etc.

"Eu não admiti tal atitude.Eu disse que, como angolano,não tenho que ser castigadodessa maneira. Expliquei queos seguranças só têm a missãode controlar as minas e não avia pública", explica o cidadão.

"Logo, espetaram-me umafaca no lado direito do peito.Queimaram a minha mercado-ria toda e perdi US$200", de-nuncia Abreu Domingos.

Por altura da recolha dainformação, a 13 de Abril , ocidadão ainda continuava a re-ceber assistência médica e emcondições precárias.

CASO Nº 23

Vítimas: António João, 45 anos,João José Massaco, 36 anos, eJosé Calelau, 28 anos, todosnaturais do LuremoData: 20 de Fevereiro de 2006Local: Luremo

Descrição: "Eles disseram-nosque estão aqui para nos cortaras caudas", conta António Joãosobre a apresentação feita por4 elementos da segurança daK&P Mineira, após estes teremefectuado cinco disparos paraimpedir a fuga de sete garim-peiros.

O entrevistado afirma terapanhado 30 catanadas nasnádegas. Por sua vez, JoãoMassaco refere ter sido espan-cado nas plantas dos pés. JoséCalelau teve a pá colocada en-tre as pernas e, assim, um doselementos da K&P Mineirapuxou-a, com toda a força, paraseparar o cabo da pá, batendonos ossos das pernas da vítima.

No cumprimento do sis-tema vigente de tortura e trabal-hos forçados, os garimpeirostiveram de capinar ao redor doposto de observação da K&PMineira.

"Voltamos ao tempo daescravatura. Aqui [no Cuango]estamos na escravatura e algu-ns populares querem refugiar-se no Congo Democrático",dramatiza João Massaco.

CASO Nº 24

Vítimas: José Bartolomeu, 48anos, Sebas, 42 anos, AvelinoAntónio, 36 anos, AndréBragas, 32 anos, todos naturaisdo LuremoData: 18 de Fevereiro de 2006Local: Riacho Kinzamba, Lure-moDescrição: Elementos da K&PMineira cercaram o local ondese encontravam os garimpeiros.

"Eles obrigaram-nos adeitar de barriga para baixo. Umdeles sentava na cabeça e ooutro nas nádegas do garim-peiro, enquanto o terceiro açoi-tava nas costas com catana",descreve José Bartolomeu.Este enfatiza que, nessas con-dições, não era possível contaro número de catanadas reser-vado a cada vítima. "Aí era sógritar, eles batem muito mal",afirma.

Encaminhados para asinstalações da Luminas, osgarimpeiros tiveram de revelaros seus dados pessoais. Deseguida, conduziram-nos até àesquadra policial do Luremoonde encontraram a liberdade,após terem pago o 2.000 kwan-zas cada, o equivalente aUS$25.

CASO Nº 25

Vítima: José Pedro, 54 anos,natural do LuremoData: 7 de Fevereiro de 2006Local: Margens do Rio Lu-monhe, junto à aldeia do DongaDescrição: Quatro efectivos daK&P Mineira abordaram, porvolta das 6H00 da manhã um

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CCUUAANNGGOO 15Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

Resposta Resposta da K&Pda K&PMineiraMineiraDe 7 de Abril a 27 deJunho de 2006, o autortentou, inúmeras vezes,contactar o Director-Geral da K&P Mineira,José Gomes MariaRodrigues, quer porcarta e fax quer por viatelefónica junto da suasecretária, a Sra. Rosa.Ignorou todas as solici-tações.

grupo de sete garimpeiros.Três garimpeiros meteram-selogo em fuga. "Como eu era omais velho do grupo, os K&PMineira disseram-me que eutinha de sofrer mais. Aplica-ram-me várias catanadas nasnádegas, um deles pôs a páentre as minhas pernas e pu-xou com toda a força para sep-arar o cabo da pá. O ferro ba-teu nos ossos das pernas ealeijou", descreve José Pedro.

Terminada a sessão deespancamentos, "eles exigiramum pagamento de US$200 porpessoa, para a nossa liber-tação. Insistiram, mesmo de-pois de termos explicado quejá tínhamos um acordo com oscolegas deles para trabalhar-mos na área. Por volta das18H00 do mesmo dia apare-cerem em nossa casa para ne-gociar uma percentagem.

"No dia seguinte, pren-deram-nos outra vez, nomesmo sítio, pagámos maisUS$100 para nos deixarem tra-balhar com a moto-bomba emais US$1200 de percenta-gem [sobre os lucros do garim-po]. O chefe do grupo era oToni", denuncia José Pedro.

"Aqui, nas Lundas, esta-mos muito mal", remata.

CASO Nº 26

Vítima: João Manuel Santana,33 anos, natural do CuangoData: 22 de Dezembro de2005Local: Kanzu – IDescrição: Por volta das14H00, uma patrulha de quatroelementos da segurança daK&P Mineira surpreendeu umgrupo de garimpeiros. "Umbranco estrangeiro, que alega-va ser encarregado da explo-ração dirigia a composiçãodeles [K&P Mineira]. Obri-garam-nos a mudar a roupa.Os outros fugiram e eu fiqueisozinho", revela João Santana.

Tendo servido de saco depancadaria dos seus captores,transportaram-no, na car-roçaria de uma carrinha, debikini apenas, até à sede daLuminas, "onde me deram unscalções rotos para vestir e unschinelos estragados, e ficaramcom a minha roupa e sapatil-has", explica o cidadão.

Conduzido à esquadrapolicial do Luremo, o oficial deserviço, segundo depoimentode João Santana, recusou-se adetê-lo por ausência de umaqueixa e provas de ter cometi-do algum crime. Diante daesquadra, os guardas desem-baraçaram-se do garimpeiro.

CASO Nº 27

Vítima: Adriano LeonardoBarros, 22 anos, natural de

LuandaData: 28 de Novembro de2005Local: Margens do Rio Cuan-go, área do TxatxoDescrição: O segurança daK&P Mineira identificado pelonome de Leonardo MateusBaptista, encontrou AdrianoLeonardo Barros no buraco, aexplorar diamantes, e desferiu-lhe dois tiros na perna direita.

A família da vítima pres-

sionou a Luminas a assumir aevacuação do ferido paraLuanda, o que aconteceu nodia seguinte. O jovem deuentrada no Hospital Militar deLuanda, a 29 de Novembro eteve alta compulsiva a 12 deDezembro de 2005 por acumu-lação de dívidas, resultante dotratamento.

"A minha irmã, a mãe doAdriano, tem estado a exigir dacompanhia o pagamento dotratamento para remover osferros que o miúdo tem na per-na e eles já não querem saberdo assunto. O estrangeiro [nasinstalações da Luminas]comquem ela tem estado a falarnão diz nada".

Quanto às razões do dis-paro, a Sra. Rosa informa queo seu sobrinho, no dia anterioraos disparos, pagou ao segu-rança Leonardo Mateus Bap-tista a quantia de US$50 e umagarrafa de vinho, como "licen-ça de exploração". "Ainda porcima, dispararam contra omiúdo e queriam atingir maisum jovem que estava ao lado",desabafa a tia.

CASO Nº 28

Vítima: Bernardo Marco, 42anos, natural do LuremoData: 20 de Novembro de2005Local: Margens do Rio Cuan-go, área do Txatxo. Descrição: Uma patrulha de

dois elementos da K&P Minei-ra, com as armas apontadaspara o buraco onde se encon-travam quatro garimpeiros,chamou a si a responsabilida-de de julgar os presos. "Man-daram-nos sair do buraco edeitar de barriga para o chão.Um deles chamou-me de feiti-ceiro, sem juízo, por estar agarimpar e bateu-me com seiscatanas nas costas, bem pux-adas. Ainda tenho quatro cica-

trizes", diz o garimpeiro."Os outros levaram sete

catanadas cada e mandaram-nos retirar. No dia seguinte,voltámos ao local para lavar ocascalho. Apanharam-nosoutra vez e bateram-nos comcatanas também", explica Ber-nardo Marco

CASO Nº 29

Vítima: Domingos Morais, 46anos, natural de MalanjeData: 15 de Outubro de 2005Local: Barragem do Metle,Ngungo, LuremoDescrição: Por volta das9H00, um grupo da K&P Minei-ra atacou a área de garimpo."Nós tínhamos acabado dematabichar e nem tivemostempo de fugir. Um deles aque-ceu a catana no fogo ondepreparámos o café e bateu-menas nádegas, quatro vezes,com a catana bem quente",descreve Domingos Morais.

"Um dos agentes da PN,que tinha o seu projecto [degarimpo] e estava a trabalharconnosco, ameaçou os guar-das da K&P Mineira dizendoque um dia as armas serãodesenterradas para combateresse tipo de abusos. Assim,deixaram-nos em paz", conta oentrevistado.

Domingos Morais teste-munhou que, no mesmo dia,durante a operação, os segu-ranças da K&P Mineira alve-

jaram a tiro "a mãe de um con-golês", desconhecendo, noentanto, o nome e o destino dasenhora.

CASO Nº 30

Vítima: Carlos Timóteo, 50anos, natural do Quela,Malanje, Joãozinho, 16 anosData: 1 de Setembro de 2005Local: Margens do Rio Cuan-go, área do Txatxo

Descrição: "O protecção físicaOsvaldo, da K&P Mineira, apa-receu com uma cartucheira nopeito de 10 carregadores. Nóséramos uma equipa de quatro,dois a trabalhar com a moto-bomba e dois na peneira.Levou-nos para dentro daLuminas, onde pássamos o diatodo a capinar" descreveCarlos Timóteo.

Cumprida a fase dos tra-balhos forçados, nas insta-lações do referido projecto dia-mantífero, transferiram-nospara a posição do Cangauonde o guarda, identificadopelo nome de Osvaldo, aplicoua sentença. "Primeiro puseramo Joãozinho deitado de barrigapara baixo. O Osvaldo bateu-lhe com sete pás bem remadasnas nádegas. Talvez, por cau-sa da idade [16 anos], o miúdoquase comia a terra, de tantasdores. Eu, como mais velho,levei apenas três pás nascostas. Ele bateu os outroscom pás também", relata ocidadão.

Mais adiante, os guardasconduziram os garimpeiros atéàs celas da esquadra policialdo Luremo, onde estes pernoi-taram. De acordo com o inter-locutor, que também se identifi-cou como sendo o chefe doburaco onde garimpavam, "osagentes disseram-nos que nãoéramos criminosos, que o pro-blema era da falta de empre-gos. Mandaram-nos limpar a

esquadra e soltaram-nos"

CASO Nº 31

Vítima: João José Massaco,36 anos, natural do LuremoData: 30 de Agosto de 2005Local: Margens do RioLumonhe, LuremoDescrição: Com recurso a umforte tiroteio, nove elementosafectos à K&P Mineira detiver-am oito garimpeiros, no perío-do da manhã. "Estenderam-nos nas rochas e bateram-noscom catanas, nas nádegas.Eles batem muito mal, corrembem e têm muita força", recon-hece o garimpeiro.

Mais detalhes não pôdeprovidenciar porque "os dis-paros que fizeram na mata pa-recia um ataque militar e, de-pois, as dores da porrada eramtantas que não dava para pen-sar em mais nada". Enca-minharam-nos até à sede daLuminas, onde capinaram atéao fim da tarde.

CASO Nº 32

Vítima: Alé Sibo, 31 anos, daRDCData: 31 de Maio de 2005Local: Bairro Muana MahangoDescrição: Testemunhas ocu-lares afirmam que um grupo denove elementos da K&PMineira causaram alvoroço nobairro ao dirigirem-se àresidência de Alé Sibo. Nãohouve tempo para acomodaros seus visitantes. "Ele disse-lhes que ia buscar cadeirasdentro de casa para sesentarem e deram-lhe logo trêstiros no pé esquerdo", confir-mam os vizinhos.

Os mesmos afirmam quea acção era uma consequênciado envolvimento de ambas aspartes no garimpo. Houvedesentendimentos e suspeitassobre a eventual existência edesaparecimento de umapedra valiosa. Os guardasdecidiram punir o "suspeito"com tiros.

Demonstração da tortura da pá, queconsiste em deslocá-la do cabo porum forte puxão contra a tíbia.

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CCUUAANNGGOO16 Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

O Comando da TeleserviceO Comando da TeleserviceTeleservice é uma empresaprivada de segurança deDireito angolano legalmente

reconhecida a 16 de Dezembro de1993, com um montante total de500,000 acções repartidas entreos seus sócios pela ordem que sesegue:

General António dos SantosFrança "Ndalu", detentor de50,000 acções.

General João Baptista deMatos, subscritor de 50,000 ac-ções.

General Luís PereiraFaceira, ex-Chefe do Estado-Maior do Exército das FAA, com45,000 acções.

General António EmílioFaceira, ex-Comandante dos"Boinas Vermelhas" Comandos,40,000 acções.

José Carlos de SousaFigueiredo, 40,000 acções.

José Pedro Fernandes daSilva, 40,000 acções.

General Armando da CruzNeto, ex-Chefe do Estado-MaiorGeneral das FAA, actual embaixa-dor no Reino de Espanha, 35,000

A

CASO Nº 1

Vítima: Floriano Moisés, 24anos, natural de CafunfoData: 14 de Maio de 2006 Local: Cateu, CafunfoDescrição: Surpreendido por umtiroteio dos seguranças da Tele-service, enquanto lavava o cas-calho, Floriano Moisés ar-rependeu-se de ter tentado afuga. Segundo o seu depoimen-to, um dos guardas espetou-lhe ocano da arma na boca, paraprovar o sabor da pólvora.

"Obrigaram-me a lavar todoo cascalho. Consegui três pedrasde diamantes. Não consegui ava-liar o peso porque não tinhabalança", explica o garimpeiro.

Depois de lhe ter recebidoas pedras, de acordo com o seutestemunho, um dos guardas as-sestou-lhe com uma moca nanuca. "Perdi os sentidos", dizFloriano Moisés.

Passada uma hora e meia,o garimpeiro e mais três colegasretomaram a labuta. Os segu-ranças da Teleservice , mais umavez, o apanharam. "Apanhámos,cada, com 16 cabos da pá nascostas e nas mãos, amarraram-nos e encaminharam-nos até àsua tenda, onde fomos obrigadosa fazer limpeza. Soltaram-nos aseguir", conta Floriano Moisés

As Violações da TeleserviceAs Violações da Teleservice

acções.General Paulo Pfluger

Barreto Lara, ex-Chefe da Direc-ção Principal de Planeamento eOrganização do Estado Maior-Ge-neral das FAA, 30,000 acções.

De forma impressionante, aTeleservice detêm o monopólio naprestação de serviços de segu-rança às petrolíferas, em Angola.Constam do leque a Sonangol,Chevron-Texaco, Total, Norsk-Hydro, Esso, Petromar, Hal-liburton.

Na área dos diamantesgarante protecção à De BeersProspecting (Lucapa), SociedadeMineira do Lucapa (Lucapa), As-sociação Chitotolo (Nzagi), ITM(Mufutu) todos situados na provín-cia da Lunda-Norte.

Como garantia da qualidadedos seus serviços, de acordo coma brochura da empresa, "aTeleservice possui, em Luanda,um centro de formação profis-sional, dotado de quadros for-madores, com formação técnica epedagógica adquirida em centrosespecializados no exterior do país,

o que garante um alto nível deaproveitamento dos instruendos".Esse centro conta com a assistên-cia técnica e supervisão perma-nente da empresa sul-africanaGray Security.

A Teleservice providenciaainda, a cada agente seu, um livrode bolso cujo conteúdo inclui códi-gos de conduta e disciplina paraos oficiais e agentes de segu-rança. Esse guia enfatiza a neces-sidade de uma postura de brioprofissional junto ao cliente, derespeito às leis e à companhia,assim como de representação dasua imagem.

O rigor profissional e a qua-lidade de formação dos agentesde segurança da Teleservice, emteoria, se estende também aosdestacados no Cuango. No episó-dio da ponte foi possível testar asua estrutura de acção e o nívelda cadeia de comando. Ao tratar-se apenas da passagem de umaviatura, os guardas comunicaramao chefe imediato que, por suavez, ao esgotar a justificação dassuas ordens, apelou à intervenção

do chefe acima de si.O caso da ponte encerra

grande simbolismo por mais umarazão. A 11 de Abril de 2006, ocomando da Esquadra Policial deCafunfo movimentou um efectivopara a ponte situada na via princi-pal do Pone, um improviso demanilhas, nas proximidades doPonto Zero, área de controlo daTeleservice. Segundo um oficial daPN, destacado para a operação, adescoberta de um lençol de dia-mantes debaixo da ponte,"inspirou os efectivos da Tele-service a patrocinar um grupo degarimpeiros e a protegê-los, nosentido de efectuarem a explo-ração do local, com o risco de faz-erem desabar a ponte e cortar aligação rodoviária entre Cafunfo eLuremo".

A 17 de Maio de 2006, efecti-vos policiais envolveram a zona daponte do Pone, de madrugada.Entretanto, um grupo de quatroagentes, à paisana, disfarçadosde taxistas, negociavam com osguardas da Teleservice a suapassagem pela ponte por US$50.

Um dos agentes tirou uma foto,como prova dos abusos da Tele-service. Na reacção, instalou-seum breve tiroteio, sem ter causadoalguma vítima.

O cerco estava montadopelos agentes policiais e da acçãoresultou a prisão dos guardasBernardo Custódio, Emílio ErnestoElione, Lourenço Miguel eAndrade Miguel, assim como aapreensão de quatro armas dotipo AK-M e uma metralhadoraPKM.

As forças da ordem públicaqueimaram o referido posto deobservação da Teleservice, quetambém servia de centro de tortu-ra. Como ilustração, a 6 deFevereiro de 2006, o Sr. TomásTxiualua, 42 anos, encontrou umcadáver em decomposição, comsinal de ter sido abatido a tiro,junto à tenda do posto em ques-tão. Comunicou o facto à esqua-dra local para averiguação docaso. Um oficial da referidaesquadra confirmou o caso como"mais uma prova da arbitrariedadeda Teleservice".

(...)

CASO Nº 3

Vítima: Gegé André Mulemesso,29 anos, natural de Lucapa,Lunda-NorteData: 2 de Maio de 2006 Local: Kamabo, CafunfoDescrição: "Encontraram-me alavar o cascalho e perguntaram-me se a área era do meu pai,para estar ali a garimpar à von-tade. Eu respondi que sou an-golano, desempregado e que ogarimpo é o meu método desobrevivência", explica o garim-peiro sobre o seu encontro comos guardas da Teleservice, porvolta das 15H00.

"Aí começou a guerra!Atiraram-me para o chão, espan-caram-me com 30 cabos da pánas coxas e cinco nas palmas damão. Soltaram-me depois de trêshoras", contabiliza GegéMulemesso.

CASO Nº 4

Vítima: Jacinto António Bartolo-meu, 26 anos, natural de Caun-gula, Lunda-NorteData: 25 de Abril de 2006 Local: Kamabo, CafunfoDescrição: Uma patrulha decinco guardas da Teleservice

encontrou Jacinto Bartolomeu alavar cascalho com o seu colegaNeves Felipe.

Vendaram-lhes os olhos eos encaminharam, de carro, até àdirecção da SMC, de acordo como seu depoimento, onde pas-saram por um pequeno inter-rogatório. Se sabiam que a área,onde garimpavam, "estava vendi-da ou não"?

À resposta de que não sabi-am, segundo Jacinto Bartolomeu,um dos guardas esclareceu "averdade", acusou-os de tres-passe de propriedade alheia eaplicou um castigo de 20 chico-tadas nas mãos e 10 nas náde-gas para cada um. Para referên-cia pública do castigo, o guardacuidou de cortar um pé de cadapar de calças das vítimas.

CASO Nº 5

Vítima: Óscar Tito Neves, 20anos, natural de Camaxilo,Lunda-NorteData: 12 de Abril de 2006 Local: Pone, CafunfoDescrição: De nada valeu aÓscar Neves ter tomado banhona margem do Rio Cuango, naárea do Pone, ao fim do dia. Deregresso à casa, teve de prestarcontas, na via pública, aos guar-das da Teleservice sobre o uso e

a propriedade do rio."Eles perguntaram-me se

eu não sabia que estava numaárea de concessão mineira. Euexpliquei que todos os filhos daterra tomam banho no rio [inexis-tência de água canalizada] ecomo se proíbe as pessoas de ofazer?

"Acertaram-me com umacoronhada no olho. Caí. Amar-raram-me os pés e as mãos esurraram-me com um cinto,durante quase meia hora.Soltaram-me depois", descreve obanhista.

CASO Nº 6

Vítima: Quinito Muamussombo,25 anos, natural de Saurimo,Lunda-SulData: 10 de Abril de 2006 Local: Ponte do Pone, CafunfoDescrição: Pouco antes domeio-dia, Quinito Muamissomboia a circular pela ponte do Pone,de motorizada, com destino aobairro dos Bolinhos, situado naárea de concessão da SDM,quando os guardas da Teleser-vice o interpelaram.

O cidadão levava, às cos-tas, uma mochila com peixeseco, arroz, massa alimentar eaçúcar. "Ao verem os produtosalimentares, os seguranças

acusaram-me de garimpeiro. Eutentei discutir e apanhei com umacoronhada na cara. Sangreipelas narinas", explica QuinitoMuamissombo.

O motociclista conta que oshomens da Teleservice queima-ram a mochila e tentaram fazer omesmo com a motorizada, masdesistiram da ideia e preferiramespancá-lo com mocas na regiãolombar. Retiveram-no por duashoras.

CASO Nº 7

Vítima: Armindo João Caetano,18 anos, natural de CafunfoData: 10 de Abril de 2006Local: Margem do Rio Cuango,área de Kamabo, CafunfoDescrição: Seis garimpeiros ten-taram a fuga ao aperceberem-sedo cerco que os envolvia, depoisdo meio dia. Em reacção, osperseguidores fizeram disparosao ar para impedir a corrida.

Após a captura, ArmindoCaetano conta os procedimentos"extra-judiciais" por que passou,a partir do momento em os seuscaptores o obrigaram a despir aroupa. Nu, molharam-lhe o corpotodo, assim como a moca comque foi violentado, repetidas ve-zes, na região lombar. Dor mais

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CCUUAANNGGOO 17De 22 a 29 de Julho 2006OPERAÇÃO KISSONDE

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

aguda sentiu quando lhe que-braram o dedo anelar.

Mais adiante, o jovem dizter caminhado cerca de 40 kms,a partir da Rio Lumonhe, nacomuna do Luremo, para ondeos seguranças da Teleservice otransportaram e apearam, deregresso à Cafunfo. Queixa-sede ter chegado a casa com ospés inflamados.

CASO Nº 8

Vítima: Henriques Mateus, 32anos, natural do CuangoData: 9 de Abril de 2006 Local: Rio Lué, CafunfoDescrição: Guardas da Teleser-vice cercaram um grupo degarimpeiros, por volta das 11H30,que se encontrava a banhar, aostiros. De acordo com depoimen-tos de familiares, os guardastrataram Henriques Mateus apontapés e coronhadas no peitoe nas costas ao ponto de expelirbastante sangue pela boca. Semprecisarem o número de garim-peiros que tiveram a mesmasorte, os familiares informam queos guardas transportaram Henri-que Mateus, de carro, até à zonado Pone, onde o abandonaram.Socorrido por passantes, osfamiliares afirmam que o cidadãomorreu a caminho da vila deCafunfo.

CASO Nº 9

Vítimas: Adão Gonçalves Moi-sés, 50 anos, Domingos Novais,38 anos, ambos naturais doLubalo, Lunda-NorteData: 8 de Abril de 2006 Local: Pone, CafunfoDescrição: Adão Moisés tevecerca de quatro horas para mos-trar os seus dotes de dançarinoàs mãos dos guardas da Teleser-vice, que o abordaram na área degarimpo do Pone e o levarampara o seu posto de observaçãocomo entretenimento.

"Quando chegámos à tendadeles, despiram-nos a roupa,ficámos de bikini, e obrigaram-nos a dançar Sassa Tchokwé . Ogarimpeiro que não dançasseapanhava porrada com o cabo dapá nas costas", afirma o cidadão.

Um dos guardas, segundoo seu depoimento, atingiu-lhecom um cabo da pá nos dedos damão esquerda e causado fractu-ra, por ter reclamado dançar con-tra a sua vontade.

Por sua vez, DomingosNovais, conta o castigo que lhefoi aplicado por ter tentado fugir àsessão de dança. "Ao tentar cor-rer, um dos guardas deu-me umarasteira, caí e apanhei com 30cabos da pá na coluna, por issonão consigo andar em condi-ções". Por volta das 13H00, osgarimpeiros receberam ordem desoltura.

(...)

Jack Cuiulula, mordido por um cão,sujeito a trabalhos forçados e torturado

pela segurança da Teleservice

CASO Nº 11

Vítimas: Pedrito Mateus, 42anos, natural do CuangoData: 7 Abril de 2006 Local: Kamabo, CafunfoDescrição: O cidadão em causateve de ser suturado, com 12pontos na cabeça devido a umgolpe de moca desferido por umguarda da Teleservice.

Seis elementos, da referidaempresa, detectaram um grupode garimpeiros a lavar o casca-lho, na margem do Rio Cuango, eaplicaram a Pedrito Mateus umcorrectivo de 15 mocas na regiãolombar, para além do ferimentona cabeça.

CASO Nº 12

Vítima: Xavier Kola, 32 anos,

Eduardo Homme, 33 anos, eDúdú, 30 anosData: 7 de Abril de 2006Local: BulaDescrição: Os quatro garim-peiros aprisionados, no mesmoburaco, por volta das 6H00 damanhã, tiveram o "privilégio depatrulhar" pelo mato com os seustrês captores da Teleservice, pormais de três horas.

"Quando chegámos à tendadeles [Teleservice], junto ao RioLué, torturam-nos feio. Apanheicom 15 cabos da pá em cadamão e mais 15 nas nádegas",explica Xavier Kola, indicandotambém o mesmo castigo paraos outros companheiros.

Para além dos seus"sócios", Xavier Kola indica tam-bém a captura, no mesmo local,mas numa posição diferente, do"Nico e o Adilson" que receberamsentença similar, um total de 30cabos da pá nas mãos e mais 15nas nádegas.

Como complemento dapena, em forma de trabalhosforçados, "eu cortei capim, oEduardo lavou as fardas e os ou-tros acarretaram água", explica ointerlocutor.

CASO Nº 13

Vítima: Armando Txitxi, 27 anos,natural do município de Caun-gula, Lunda-NorteData: 7 de Abril de 2006Local: BulaDescrição: Três efectivos daTeleservice detiveram oito garim-peiros na área de garimpo doBula, por volta das 10H00, en-quanto um número maior con-seguiu escapar.

"Antes de nos levaram àtenda deles, bateram-nos com ocabo da pá, 18 em cada mão e18 nas nádegas", afirma Arman-do Txitxi, mostrando a mãoesquerda, ainda inflamada e umdos dedos que perdeu a mobili-dade. "Por refilar, levei mais trêspaus na cabeça", conta o garim-peiro.

Na tenda, nas instalaçõesda Sociedade Mineira do Cuan-go, os guardas distribuíram, aosgarimpeiros, trabalhos forçados."Uns tiveram de capinar, outrosacarretaram água, alguns lava-ram as fardas deles e, depois das17H00, libertaram-nos", informaArmando Txitxi.

CASO Nº 14

Vítima: Adão Salvador Moisés,28 anos, natural de Saurimo,Lunda-SulData: 6 de Abril de 2006Local: Margem do Rio Cuango,área de Kamabo, CafunfoDescrição: Emboscado na pica-da para o rio, Adão Moisés contater servido de alvo, para a práticade tiro, de um dos seis membrosda patrulha da Teleservice. Emvão tentou escapar. À mercê,segundo o seu depoimento, osseguranças atingiram-no comvárias coronhadas na cabeça atésangrar bastante. Para o humi-lhar, despiram-no e o obrigarama caminhar, na via pública trajan-do apenas umas cuecas, até aoposto de observação da Teleser-vice, junto ao Rio Lué, que con-

trola a área do Bula. Nesseposto, permaneceu detido, semquaisquer procedimentos legais,durante cinco dias. Após a sualibertação, um taxista recolheu-o,junto à margem do Rio Lué, edeu-lhe boleia até Cafunfo. Oscompanheiros procederam à suaevacuação para Saurimo, tendoantes transitado por Muxinda.

(...)

CASO Nº 16

Vítima: Cambamba Kabaka, 34anos, natural de Bandundu, RDCData: 30 de Março de 2006Local: Área do Catote, BulaDescrição: "Eles andam semprecom cordas e tinham dois cães.Por isso, não fugi", refere o cida-dão congolês sobre a rusga efec-tuada por quatro efectivos da

Teleservice, às primeiras horasda manhã.

As articulações dos braçosdo deponente, à data da entre-vista, apresentavam feridas tal abrutalidade com que foi amar-rado pelos cotovelos. A mesmasorte tiveram outros oito garim-peiros aprisionados no mesmolocal. "Levaram-nos para a tendadeles [no Bula] onde passámos odia a fazer trabalhos domésticos.

A seguir, passaram para afase do sadismo, com a ordempara despir as roupas. "O chefedo posto pegou no cabo da pá,mandou-nos deitar, de barrigapara baixo, e bateu-nos a todos.Cada um de nós apanhou 20 nosgémeos, 20 nas mãos e 20 nasnádegas", detalha CambambaKabaka.

(...)

CASO Nº 18

Vítima: Dicasso Mutomossi, 29anos, da República Democráticado CongoData: 30 de Março de 2006Local: BulaDescrição: Uma patrulha de trêsefectivos da Teleservice aprisio-

nou 10 garimpeiros, por volta das6H00, e administrou-lhes o ritualdas pás.

"Torturaram cada um denós com 40 pás (10 em cadamão e 10 em cada gémeos. De-pois levaram-nos à tenda delesonde acarretamos água, lavámosroupa, limpámos e cozinhámospara eles", descreve DicassoMutomossi

CASO Nº 19

Vítima: Trésor Munanga, 24anos, natural de Bandundu,República Democrática doCongoData: 30 de Março de 2006Local: Margens do Rio Lue, áreado Bula, CuangoDescrição: Cinco efectivos daTeleservice tomaram o controloda área de garimpo do Bula, porvolta das 9H00, e detiveram oitoindivíduos. "Amarraram-nos compelos cotovelos e levaram-nosaté à tenda deles na posição doCaipupo", explica o cidadão con-golês.

"Aí, despiram-nos e tortu-raram-nos com 20 paus cada (10nas nádegas, cinco nas mãos ecinco nos gémeos. Queimaramos nossos calçados e duranteseis horas tivemos de acarretarágua, lavar roupa. Outros garim-peiros prepararam o almoçodeles de arroz, com feijão ecarne. Não nos deram nada paracomer", Trésor Munanga.

(...)

CASO Nº 21

Vítima: Papi Kissenga, 28 anos,natural de Kikuit, RDCData: 29 de Março de 2006Local: BulaDescrição: Um grupo da Tele-service, composto por três segu-ranças, surpreendeu Papi Kis-senga e mais dois companheirosnum buraco. "Amarraram-nos pe-los cotovelos. Levei três coron-hadas na cabeça".

Encaminhados ao posto deobservação dos referidos segu-ranças, os garimpeiros, segundoo entrevistado, tiveram de acar-retar água, apanhar lenha, lavaras fardas e preparar o jantar doscaptores, um menu de funge comcarne.

Foram libertados depois daceia dos guardas.

(...)

CASO Nº 25

Vítima: Manuel Ngoya, 26 anos,natural do LuremoData: 21 de Março de 2006Local: BulaDescrição: Tendo montado umsistema de vigia, perto do meio-dia, os garimpeiros debandaramao notarem a aproximação deefectivos da Teleservice. Julga-ram suficiente esconder-se no

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CCUUAANNGGOO18 Setembro de 2006

SEMANÁRIO DE INFORMAÇÃO GERAL

OPERAÇÃO KISSONDE

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

capim a poucos metros dos bura-cos que garimpavam. Debalde."Detectaram a nossa posição,cercaram-nos e apontaram-nosas armas", conta Manuel Ngoya.

"Éramos cerca de 20 garim-peiros, mandaram-nos sentar nochão, um deles cortou paus e ini-ciou a bater-nos, um por um",continua o garimpeiro.

"Ali é só bater. Ele próprio éque fica cansado, larga um indiví-duo e pega noutro. Só um batia.Quem chefiava o grupo era umbranco estrangeiro, que tambémestava armado com AK. Nãosabemos qual é a sua origem",revela Manuel Ngoya.

Segundo o interlocutor,"levaram-nos em três carrinhasToyota Hilux até ao posto delesno Quimango, mais de 50 kms dolocal onde nos aprisionaram. Lácapinámos até ao anoitecer.Libertaram-nos no posto de con-trolo da Teleservice, no Cangau,e fomos obrigados a regressar apé, até ao Cafunfo".

CASO Nº 26

Vítima: Estevão Calenga, 48anos, natural do município deCaungula, Lunda-NorteData: 21 de Março de 2006Local: BulaDescrição: "Pergunto se a Tele-service foi mandada para aquipara maltratar e matar o povo?"Frustrado, Estevão Calenga ini-cia o seu testemunho.

"Levei com 18 cabos da pánas nádegas, no sítio onde fuiapanhado. Quem me apanhou foio chefe deles, um branco comsotaque estrangeiro. Esse bran-co é que dava ordens para nosbaterem", revela o garimpeiro.

Sem ter prestado atençãoao número de efectivos da Tele-service envolvidos na operaçãoou o número de garimpeirosrecolhidos, Estevão Calengaconta que foram parar ao postode observação da Teleservice, noCangau, onde, a posteriori, rece-beram ordens de soltura.

Na jornada de regresso acasa, a pé e de madrugada, aopassarem nas proximidades doposto de controlo do Ponto Zero,instalado pela Teleservice, osgarimpeiros foram recolhidos,outra vez, pelos seguranças lo-cais. "A patrulha deles apanhou-nos a andar no asfalto, na viapública, levaram-nos para o pos-to onde nos surraram com man-gueira, que tinha um pau lá den-tro. Eu apanhei 25 mangueirasnas nádegas", conta EstevãoCalenga.

"Havia um aleijado, no nos-so grupo, que desmaiou duas ve-zes com a porrada e acrescen-taram-lhe mais. Os da Teleser-vice diziam que ele estava a fin-gir", descreve o garimpeiro.

"Se tivesse emprego, eunão estaria no garimpo. Nãoestamos a roubar, a terra é nos-

Resposta da TeleserviceResposta da TeleserviceDirector-Geral da Teleservice, NelsonRamalho, garante o estrito cumprimento daLei por parte da sua empresa.

Após ouvir uma resenha de actos de brutalidadepraticados por efectivos da Teleservice, suportadapela exibição de algumas fotos comprovativas,Nelson Ramalho manifesta-se: "pode ser que hajaexcessos. Não temos que usar situações menoscorrectas. Quem determina as áreas de acesso epatrulhamento são as próprias companhias".

O gestor, um coronel na reserva, explica umdos maiores problemas que a sua empresa temverificado no combate ao garimpo. "Antes detí-nhamos os garimpeiros e os entregávamos à PN,que os libertava logo a seguir. Por isso optámos poraconselhamentos".

Ante à insistência sobre o nível de abusos,bem como o emprego de cães na perseguição aosgarimpeiros, o Director-Geral da Teleservice afirmaque "não temos cães. Não usamos cães. Pode serum caso excepcional".

Mais adianta que a maioria dos garimpeirossão estrangeiros e "pode haver excessos, porquealguns são teimosos".

De forma peremptória, Nelson Ramalho negaa existência de qualquer ordem, a partir deLuanda, para a sistematização das práticas de tor-tura, entre as três empresas a operar na área, queinclui o ritual de despir os garimpeiros e espancá-los sobretudo nas nádegas como forma de humi-lhação. "Não é política da empresa", reafirma.

Sobre a questão do controlo do Ponto Zero,estabelecido pela Teleservice junto à ponte, naárea do Pone, Cafunfo, o director realça que a

ponte é pertença do projecto mineiro. "São políticasdo projecto, nós apenas damos cumprimento. Oprojecto regulou a circulação de viaturas três vezespor semana", diz.

"A nossa imagem não é de violência. Se aspessoas pudessem identificar os autores seriabom. A população tem de colaborar", adiantaNelson Ramalho.

"Nós temos uma missão: impedir o garimpo emanter a segurança nas áreas concessionadas",afirma o Dr. João Pedro, jurista da empresa e mem-bro da Comissão dos Direitos Humanos da Ordemdos Advogados de Angola.

"Há questões melindrosas. Às vezes apare-cem brigas pessoais. O nosso procedimento é aapreensão dos materiais de garimpo. Levamos ogarimpeiro à PN que o solta logo. A seguir, eleregressa ao trabalho", explica o jurista. "Deixámosde entregar o material de garimpo à PN porque osseus agentes depois o vendem. Nós tambémtemos homens que estão sujeitos a tudo. Nãoacredito que haja esses casos", refere o jurista, quetambém é colaborador do Escritório dos DireitosHumanos das Nações Unidas, na qualidade de for-mador para os direitos humanos.

Por sua vez, o Director-Geral da Teleservice,Nelson Ramalho, enfatiza que a sua empresa temfeito ciclos de palestras para melhor capacitar osseus homens "Estamos mais avançados no Nzagie Lucapa. Este é um projecto novo. Vamos engajar-nos cada vez mais, porque o garimpo está a tomaroutros contornos. Temos de aconselhar os nossosclientes sobre as melhores práticas para lidar como fenómeno", avança.

O

sa! Lutámos para isso. Nem já notempo da guerra se castigavamas pessoas dessa maneira",argumenta o cidadão.

CASO Nº 27

Vítima: Silvério Malange Kalu-cango, 30 anos, natural de Sau-rimoData: 21 de Março de 2006Local: BulaDescrição: Numa rusga efectua-da à área de garimpo, ao meio-dia, efectivos da Teleservice, emnúmero não determinado, captu-raram 25 garimpeiros, de acordocom informações prestadas porSilvério Kalucango.

"Eu apanhei com 15 cabosda pá nas nádegas. Os outrosreceberam uma dose de 25 a 30cabos nas nádegas dependendoda sorte de cada um", ilustra oentrevistado.

Acto contínuo, "amarraram-nos uns aos outros, colocaram-nos em viaturas e rumámos paraa posição da Teleservice, noVuka, a cerca de 50 kms de dis-tância do sítio onde fomos reco-lhidos". Como parte da punição,segundo o declarante, os ele-mentos de segurança da Teleser-vice submeteram os garimpeirosa trabalhos forçados. Tiveram delavar as fardas, engraxar as bo-tas, acarretar água, capinar àvolta das instalações. Libertadosno local, a marcha de regresso àcasa pelos próprios pés, paraalguns, levou dois dias, de acor-do com Silvério Kalucango.

CASO Nº 28

Vítima: Manuel Muassanza, 25anos, natural do LuremoData: 15 de Março de 2006Local: Camissombo, BulaDescrição: Surpreendidos a la-var cascalho, por três efectivosda Teleservice e um cão, seisgarimpeiros tiveram de se sub-meter a trabalhos forçados noposto de controlo dos seuscaptores.

"Eles soltaram o cão e estemordeu-me na perna esquerda.Aumentaram a minha dor commais oito pás (cinco nas nádegase três nas mãos). Os outros tam-bém levaram porrada e só nossoltaram de madrugada", dizManuel Muassanza.

CASO Nº 29

Vítima: Gingongo Ndua, 23anos, natural do LuremoData: 3 de Março de 2006Local: BulaDescrição: Três seguranças daTeleservice e um cão acercaram-se de um grupo de quatro garim-peiros que se encontravam numburaco a cavar.

Na tentativa de fuga dosgarimpeiros, segundo GingongoNdua, os guardas soltaram o cãoe incitaram-no a apanhar os fugi-

tivos. "O cão cravou os dentes naminha perna esquerda. O cãosoltou-me apenas quando elesordenaram. Mandaram-me em-bora", explica o garimpeiro.

CASO Nº 30

Vítima: Jack Cuiulula, 32, naturalde KinshasaData: 26 de Fevereiro de 2006Local: BulaDescrição: Encontrados a tirarcascalho num buraco, por voltadas 13H00, quatro garimpeirosestiveram à mercê de um cãosolto por efectivos da Teleser-vice. O cão mordeu Jack Cuiululanas nádegas. Os elementos daTeleservice, em número nãodeterminado, encaminharam osdetidos no seu posto de obser-vação. "Despiram-nos. Eu apa-nhei 15 vezes com o cabo da pánas nádegas", conta Cuilula deforma quase imperceptível, prati-camente imobilizado e com ocorpo a apodrecer na região dobaixo ventre, no dia da entre-vista, a 31 de Março de 2006.

Omar Bongo, 23 anos, quefazia parte do grupo e se apre-sentou como parente de JackCuiulula, levou com cinco mocasnas nádegas. "Depois disso, tive-mos de acarretar água e fazeroutros trabalhos domésticos paraos guardas. Libertaram-nos às18H00". Dado o estado grave emque se encontrava o cidadãocongolês, o autor prestou-lhe

assistência, evacuando-o daaldeia para o Hospital de Cafun-fo, a maior unidade de saúde domunicípio do Cuango. Recente-mente remodelado e reinaugura-do, com pompa e circunstânciapelo governo provincial daLunda-Norte, o hospital nemsequer está em condições degarantir água aos pacientes.

O gesto de apoio estendeu-se à compra de alguns medica-mentos básicos para os primei-ros socorros, como antibióticos, ebaldes de água para a higiene docidadão. Infelizmente, por faltafundos que pudessem asseguraro tratamento do indivíduo emcausa, o hospital teve de o isolarnum quarto, que pouco depois setornou nauseabundo porque jánão havia medicamentos paraprosseguir com o seu tratamentoou alguém que cuidasse da suahigiene.

A 1 de Abril de 2006, oautor visitou a Esquadra Policialde Cafunfo para informar sobre ocaso de Jack Cuiulula. O sectorde investigação procedeu, deimediato, com a constituição deum processo, tendo recolhido asdeclarações do enfermo, assimcomo o fotografou. A 11 de Abrilde 2006, o autor foi chamado adepor no referido sector, peloInvestigador Luís, na sequênciadas investigações.

(...)CASO Nº 32

Vítima: Baptista, 27 anos, natur-

al do Cuilo, Lunda-NorteData: 6 de Fevereiro de 2006Local: Área do Pone, CafunfoDescrição: Detido na via públi-ca, quando se dirigia ao garimpo,por elementos da Teleserviceafectos ao posto de controlo doPonto Zero, o cidadão acimamencionado ousou reclamar,segundo o seu depoimento.

Para além de o torturaremcom o cabo da pá, um dosguardas espetou-lhe uma umafaca na palma da mão direita.Libertaram-no a seguir.

(...)

CASO Nº 34

Vítima: Kims Kimbango, 25anos, natural de BandunduData: Janeiro de 2006Local: Canal do BulaDescrição: Uma patrulha de trêsefectivos da Teleservice interpe-lou um grupo de garimpeiros,pouco depois do meio-dia, queoperava no canal.

Kims Kimbango conta queos seus dois companheiros con-seguiram escapar, apesar do tiro-teio para os impedir, mas ele nãoteve a mesma sorte porque játinha o cão às costas. "O cãoarranhou-me nas costas eu caí ea seguir mordeu-me na perna.Os seguranças levaram-me paraa tenda deles onde tive de acar-retar 18 bidões de água, de 20litros cada. Às 16H00 libertaram-me", conta o garimpeiro.

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CCUUAANNGGOO 19Setembro de 2006

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

OPERAÇÃO KISSONDE

As Duas As Duas Velocidades da PNVelocidades da PN

e modo comparativo, porexemplo, em Muxinda,onde a atenção das enti-

dades superiores não se fazsentir, a confusão impera. Umailustração, a 4 de Dezembro de2005, dois agentes da PostoPolicial de Samba (municípiode Xá-Muteba) interpelaram ocidadão Txindele Rafael, 29anos, na área de garimpo deTxissema, e assenhoraram-sede US$3000 e mais uma bal-ança de diamantes que estetinha em sua posse.

Na troca de argumentos,o agente Joaquim Domingos,28 anos, segundo testemu-nhas, sacou da pistola, de mar-ca Star, e atingiu Rafael Txin-dele, à queima-roupa, naregião abdominal e pé direito.Em retaliação, os garimpeirosenvolveram os agentes, desar-maram-nos e os torturaramcom paus e outros objectos atédeix-á-los em estado de comis-eração.

O investigador Edmundo,da unidade policial de Muxin-da, liderou o grupo de socorro.O agente Gomes André, 22anos, morreu duas horas de-pois de ter dado entrada noPosto Médico da Lassalatona.Joaquim Domingos resistiu efoi evacuado para o Bairro doSamba onde, segundo popu-lares, encontrou a morte. Dis-cretamente, a família de Rafael

D Txindele retirou-o de um outroposto médico para onde osagentes o encaminharam,algemado, e o transferirampara Malanje por razões desegurança.

Por sua vez, a 25 deJaneiro de 2006, na localidadede Muxinda, um grupo de 10agentes da PN, sob comandode Guito, abordou o cidadãoAdriano Mendes, 28 anos,revistou-o e apossou-se deUS$500 que tinha num dosbolsos e a seguir trataram-no apontapés, estendido no solo, epartiram-lhe o braço direito. Avítima dirigiu-se à esquadra deMuxinda para apresentar quei-xa e ninguém o atendeu.

Já no município de Caun-gula, mais distante ainda daspreocupações provinciais ecentrais, o comandante local,conhecido apenas por Ngola, éo principal responsável pelosdesmandos da PN naquelalocalidade.

Três casos servem parademonstrar o que ali se tempassado. A 7 de Setembro de2005, um dos guardas doCmdte. Ngola, em companhiade um civil, aterrorizaram umgrupo, na vila, contra quemdisparavam com AKs. Os civis,desdobraram-se, desarmaramos atacantes e enfurecidos osespancaram.

Organizaram-se e man-

dataram um grupo de civispara encaminhar os agentes àesquadra. De acordo comdepoimentos dos populares, oCmdte. Ngola recebeu o repre-sentante da população à porra-da e com impropérios tribais,segundo os quais, "aqui nen-hum tchokwé pode me substi-tuir".

Num outro caso, BetoSatchumo, 35 anos, dirigiu-seà esquadra, a pedido do seuirmão Xavier, 45 anos, que seencontrava acamado, parasolicitar os salários em atrasodeste. De acordo com o seudepoimento, o pedido enfure-ceu o Cmdte.

Ngola que, de imediato,se encarregou de espancarpessoalmente o cobrador, apontapés, no que foi auxiliadopelo seu guarda. A seguir,ordenou o encarceramento doemissário, por várias horas, atélhe passar a raiva. Como con-sequência, Beto Satchumoqueixa-se de ter perdido aaudição num dos ouvidos.

O referido comandante, a10 de Novembro de 2005, nodia anterior ao da celebraçãoda Independência Nacional,ordenou o espancamento deRafael Muanguinza, com 50mocas nas costas. A vítimainsistiu na cobrança de umadívida junto do guarda-costasdo Cmdte. Ngola e, para além

da tortura, teve de ouvir osimpropérios tribais do oficial,que "nem os tchokwé nem osbailundos podem piar" na suaárea de jurisdição.

estado em que se en-contra a PN, em termosde meios materiais e

humanos, desacredita ocombate enérgico à imigra-ção ilegal, fuga ao fisco entreoutros actos lesivos aosinteresses nacionais, pro-metidos pelo Ministro do In-terior, General Roberto LealMonteiro .

"Aqui não temos sequeruma viatura de serviço ecada oficial ou agente quequiser usar um rádio de co-municação tem de comprar oseu. Há casos em que são oscompradores de diamantes aoferecer os rádios [aosagentes policiais], para con-trolar os seus interesses",explica um efectivo policialcolocado em Cafunfo.

Como consequência,repetidas vezes, agentes daPN têm de importunar auto-mobilistas para obteremtransporte com o propósitode realizar as suas missões.

Outro exemplo, formi-dável, é a iminência da Es-quadra Policial de Cafunfoser engolida por uma granderavina de vários metros deprofundidade, colocando emrisco não só a vida dos pró-prios agentes, como a doscidadãos que se encontrama contas com a justiça.

Discursos, Discursos, promessas promessas e realidadee realidade

O

A Estratégia e a A Estratégia e a Demissão do GovernoDemissão do Governo

ConclusõesConclusões

Reconhece-se o esforçoda PN na melhoria do seu rela-cionamento com a população,na bacia do Cuango, através dorespeito pelos direitos humanose da cidadania comum.

É clara a coincidência en-tre o estabelecimento do relati-vo bom comportamento dosagentes da ordem pública e oagravamento da violação dosdireitos humanos por parte deinstituições privadas.

O Governo é responsávelpela transferência da acção decombate ao garimpo, daPN/FAA, para as empresas pri-vadas de segurança sem que,para o efeito, tenha estabeleci-do procedimentos de fiscaliza-ção e delimitação legal dosactos destas. Em termos práti-cos, o Governo privatizou a vio-lência a favor das empresas pri-

vadas de segurança.Nota-se a ausência de

uma política de Estado naadministração sócio-económicado Cuango e o total abandonodas populações à violência, àmiséria e à sua sorte.

O modo obscuro como seatribuem as concessões, se fir-mam as responsabilidadessociais das empresas e as facil-idades concedidas aos gen-erais também são da estritaresponsabilidade do governo.

A Endiama, mais preocu-pada com a sua imagem inter-nacional, assim como o própriogoverno, revela-se refém dosinteresses económicos particu-lares e estrangeiros. Nãodemonstra um mínimo deautoridade nas suas acçõesque revertam em benefício paraas populações locais.

Modernização para impor a Lei e aOrdem.

O poder arbitrário do Cmdte. Ngola.

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CCUUAANNGGOOOPERAÇÃO KISSONDE

Os Diamantes da Humilhação e da Miséria

1. A "Operação Brilhante", uma acção combinada entre forçaspoliciais e militares para o combate ao garimpo e à entrada ilegalde estrangeiros, teve início em finais de 2003 e estendeu-se atéFevereiro de 2005. Essa operação abrangeu as províncias daLunda-Norte e Sul, Malanje e Bié e, segundo dados divulgadospelo Ministério do Interior, resultou na expulsão de 256.417estrangeiros ilegais.

2. O artº 17º, nº1 da Lei dos Diamantes estipula que éproibido o acesso às zonas restritas salvo para o pessoal vincula-do à actividade de produção de diamantes. A excepção aplica-seapenas aos dirigentes do Estado e as pessoas e entidades que sedeslocarem em serviço oficial. O Governo concede às conces-sionárias, no artº 18º, nº1, liberdade para regular a circulação depessoas nas áreas a estas atribuídas.

3. De igual modo, o ponto 1 do artº 19º da Lei do Diamantesproíbe a circulação de mercadorias nas zonas restritas "sem auto-rização da concessionária", enquanto o ponto 2 do mesmo articu-lado permite tal circulação mediante o acompanhamento de guiade expedição passada pela concessionária. O relatório Lundas: aspedras da morte apresenta uma análise jurídica detalhada sobre aLei dos Diamantes e o seu impacto perverso no seio daspopulaçõeslocais.Cfr. [www.fmsoares.pt/iniciativas_registo_indi-vid.asp?id=000466]

4. A Lei dos Diamantes pode ser consultada, na íntegra, em[www.endiama.co.ao/pdfs/Lei16_94.pdf]

ReferênciasReferências

"O poder que eles têm é a nossa falta de"O poder que eles têm é a nossa falta deunião. Eles embebedam os regedores e sobasunião. Eles embebedam os regedores e sobas

para estes não permitirem a discussão dos propara estes não permitirem a discussão dos pro--blemas do povo. Não temos governo", desabafa oblemas do povo. Não temos governo", desabafa o

cidadão.cidadão.António Jaime, 29 anos, “geólogo do bairro”

Marques, Rafael e Rui Falcão de Campos (2005), Lundas as Pedras da Morte: Relatório sobre os Direitos Humanos, OffsetLda.

Diário da República III Série – nº 33 – 20 de Agosto de 1993, pág. 655Diário da República, III Série – Nº33 – 12 de Agosto de 1994, pág. 999.Diário da República, III Série – Nº49 – 08 de Dezembro de 1995, pág.806Diário da República – III Série, n°40, de 21 de Maio de 2002

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Cori, Isaquiel, Operação Brilhante detém mais de 300 mil estrangeiros ilegais, Jornal de Angola de 4 de Dezembro de 2005[www.jornaldeangola.com/artigo.php?ID=31883]

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go.php?ID=47450]Jornal de Angola, Companhia promove desenvolvimento da Lunda-Norte, 17 de Junho de 2005 [www.jornaldeangola.com/arti-

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[www.jornaldeangola.com/artigo.php?ID=44043] Jornal de Angola, Mais empreendimentos económicos, 4 de Novembro de 2005 [www.jornaldeango-

la.com/artigo.php?ID=40468] Lazare Kaplan International Inc.10-K/A for 5/31/04 Exhibit 10(V) [www.secinfo.com/dsvRa.z13h.b.htm]Lazare Kaplan International Inc. 10-K. For 5/31/05 [www.secinfo.com/dsvRa.z3B9.htm] Mateus, Eugénio, Trabalhadores da SDM descontentes escrevem a Pitra Neto, 13 de Maio de 2005, Multipress/Voz da

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BibliografiaBibliografia

AA realidade das Lundas é gravada de improviso,realidade das Lundas é gravada de improviso,na memória dos que sofrem e testemunham.na memória dos que sofrem e testemunham.