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2014. Escola de Gestão Pública – EGP. Todos os dire itos ...lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/sma/usu_doc/apostila_contexto... · Do ponto de vista sociológico, é corporação

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2014. Escola de Gestão Pública – EGP. Todos os direitos reservados.

A responsabilidade pelo conteúdo e imagens desta obra é do(s) respectivo(s) autor(es). O conteúdo

desta obra foi licenciado temporária e gratuitamente para utilização no âmbito do Sistema Prefeitura

Municipal de Porto Alegre, através da EGP. O leitor se compromete a utilizar o conteúdo desta obra para

aprendizado pessoal, sendo que a reprodução e distribuição ficarão limitadas ao âmbito interno dos

cursos.

A citação desta obra em trabalhos acadêmicos e/ou profissionais poderá ser feita com indicação da

fonte. A cópia desta obra sem autorização expressa ou com intuito de lucro constitui crime contra a

propriedade intelectual, com sanções previstas no Código Penal, artigo 184, Parágrafos 1º ao 3º, sem

prejuízo das sanções cíveis cabíveis à espécie.

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Catalogação elaborada pela Bibliotecária Gicele Farias Gomes – CRB 10/2195

L269c Langaro, Nelson Barbieux. Contexto da Administração Pública. Prefeitura Municipal de Porto Alegre - PMPA / Secretaria Municipal de

Administração – SMA / Nelson Barbieux Langaro. -- Porto Alegre: PMPA/SMA/ EGP-Escola de Gestão Pública: PMPA, 2014.

92 p.il.

Módulo 2: Líder na Gestão Pública Inclui bibliografia 1. Administração Pública. 2. Estado. 3. Modelos de Estado, Governo e Administração Pública. 4. Serviços Públicos.

CDU 35

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PREFEITO DE PORTO ALEGRE José Fortunati

VICE-PREFEITO Sebastião Melo

SECRETÁRIO MUNICIPAL DE ADMINISTRAÇÃO Paulo Guimarães

SECRETÁRIO MUNICIPAL DE ADMINISTRAÇÃO ADJUNTO Carlos Fett

COORDENADOR DA ESCOLA DE GESTÃO PÚBLICA José Carlos Lucas Machado

Escola de Gestão Pública – EGP

Rua Siqueira Campos 1300, sala 955– 9o andar – Porto Alegre/RS – CEP: 90010-170

Tel: (51) 3289-1177

E-mail: [email protected]

Twitter: @EGft_ftortoAlegre

Facebook: facebook.com/escoladegestaopublica

ELABORAÇÃO Nelson Barbieux Langaro

COMISSÃO DE AVALIAÇÃO E ACOMPANHAMENTO Elisa Marcon Aquino Kerber

Denise Regina dos Santos Barcellos

Tanise Amália Pazzim

EQUIPE EGP

Adriana Beiler

Ana Claudia Aguiar Passos

Claudia Gloger

Eduardo da Cunha Fonseca

Fernando Telles de Paula

Gicele Farias Gomes

Giovane Pasqualito Fialho

Marcio Vedana

Natasha Duarte Amarante

Nelson Barbieux Langaro

Nissia Fortes Sauer

Roberto de Souza Del Frari

Simone Rosa da Matta

José Carlos Lucas Machado

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Secretaria Municipal de Administração (SMA)

A Secretaria Municipal da Administração - SMA é o órgão central dos sistemas

de pessoal e desenvolvimento de recursos humanos, documentação, transportes

administrativos e modernização administrativa do município. Cabe à SMA a criação de

órgãos, com suas respectivas estruturas organizacionais, racionalização e organização

dos processos de trabalho.

Entre as suas responsabilidades está a elaboração de legislação e

regulamentação de todo o sistema de pessoal, Estatuto dos Servidores Públicos (Lei

Complementar 133/85), Planos de Carreira no âmbito da administração centralizada,

orientação da administração descentralizada, e exame dos projetos de lei do Executivo

e do Legislativo.

Além de realizar a capacitação e promover o aprimoramento funcional dos

servidores, compete à SMA o desenvolvimento de pesquisas com vistas à fixação da

política salarial, a realização de concursos públicos, o ingresso e posse de servidores,

oferecendo, ainda, bolsas de estágios, bem como subsídios de alimentação e

transporte.

A SMA orienta, coordena e controla as atividades relativas à despesa de

pessoal, ao processamento do pagamento dos servidores, à elaboração de atos

administrativos, ao lançamento de registros funcionais, ao controle de gratificações,

aos benefícios e às aplicações da legislação no âmbito da administração centralizada.

A SMA também administra a documentação oficial do município, conservada no

Arquivo Municipal, devidamente controlada e numerada pelo Protocolo Central, realiza

a triagem e a microfilmagem dos papéis oficiais. Compete-lhe, ainda, estudar, elaborar,

organizar, coordenar e acompanhar as atividades relativas à organização, à

racionalização e à modernização administrativa, bem como às políticas de recursos

humanos, de qualificação e de desenvolvimento funcional no âmbito municipal.

Também é sua atribuição coordenar o sistema de transportes oficiais da

administração centralizada, além de administrar os serviços de divulgação oficial do

município - por meio do Diário Oficial de Porto Alegre - DOPA e os serviços de

manutenção, conservação e segurança do Edifício Intendente Montaury e demais

prédios ocupados pela Secretaria.

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Caracterização da Escola de Gestão Pública (EGP)

A EGP é a área da SMA responsável pelas práticas relacionadas à

aprendizagem no âmbito profissional, dentre elas, treinamento, desenvolvimento,

qualificação, atualização, aperfeiçoamento, aprimoramento e educação. Sua sede está

localizada na Rua Siqueira Campos, nº 1300, 9°andar, sala 955.

As atividades de formação e capacitação são desenvolvidas no 14º andar, que

contempla um auditório, uma sala de informática e três salas de aula.

Missão

Produzir e difundir conhecimentos científicos ligados à gestão pública e desenvolver

competências profissionais que potencializem a eficácia das estratégias do Município

de Porto Alegre.

Visão

Ser reconhecida, no âmbito municipal e nacional, pela excelência na qualificação

profissional de servidores e na produção de conhecimentos relevantes para a eficácia

da gestão pública municipal.

Valores

Visão estratégica

Inovação

Cientificismo

Excelência

Eficácia

Memória institucional

Objetivos Estratégicos

1. Qualificar a gestão pública municipal, através do desenvolvimento dos servidores,

nas competências necessárias ao exercício dos cargos, funções e ao serviço público;

2. Promover a construção de conhecimentos, no âmbito da gestão pública, e a

permanente qualificação dos servidores da Prefeitura Municipal de Porto Alegre;

3. Buscar maior resolutividade das políticas públicas, mediante a qualificação dos

servidores públicos municipais;

4. Atuar, com excelência, na qualificação e aperfeiçoamento profissional dos servidores

públicos e no desenvolvimento de metodologias gerenciais aplicáveis na administração

municipal.

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Apresentação do Curso

Módulo II – Líder na Gestão Pública

Curso 2: O Contexto da Administração Pública

Objetivos Específicos:

O Programa visa capacitar os participantes a:

• Conhecer os papéis e a responsabilidade das funções de liderança e sua relação com a prática

da gestão pública;

• Aplicar os princípios que dão base ao Serviço Público no exercício da gestão organizacional.

Impacto no desenvolvimento das seguintes Competênci as:

Comprometimento com o Serviço Público; Foco no Serviço ao Cidadão; Visão Estratégica.

Conteúdo Programático:

Estado

• Elementos do Estado

• Noção conceitual de Estado

• Público e o Privado

Administração Pública

• Conceito

• Natureza e Fins da Administração Pública

• Princípios da Administração

• Prestação dos serviços pela Administração Pública

• Poderes e Deveres do Administrador Público

Serviços Públicos

• Conceito de Serviço Público

• Classificação dos Serviços Públicos

• Servidores Públicos

• Cargos e Funções

Modelos de Estado, Governo e Administração Pública

• Administração Pública Patrimonialista

• Administração Pública Burocrática

• Administração Pública Gerencial

• Reforma do Estado no Brasil

• Proposta de um novo modelo de Gestão Pública

Carga Horária: 16 horas/aula.

Este curso integra o 2º Módulo – Líder na Gestão Pública que faz parte de um Programa composto por

cinco Módulos Temáticos por competências.

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SUMÁRIO

1 ESTADO......................................................................................................................... 10

1.1 Introdução: Elementos do Estado ......................................................................... 10

1.2 Noção Conceitual de Estado................................................................................. 10

1.3 Organização Fundamental do Estado na Constituição de 1988 e o Município ..... 13

1.4 Público e o Privado: .............................................................................................. 17

2 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA .............................. .......................................................... 21

2.1 Conceito................................................................................................................ 21

2.2 Natureza e Fins da Administração Pública............................................................ 23

2.3 Princípios da Administração.................................................................................. 24

2.3.1 Princípios expressos ...................................................................................... 24

2.3.2 Princípios não expressos ou implícitos:.......................................................... 27

2.3.3 Outros princípios que merecem destaque ...................................................... 29

2.4 Prestação dos Serviços pela Administração Pública............................................. 30

2.4.1 Administração Pública Direta (centralizada): .................................................. 31

2.4.2 Administração Pública Indireta (descentralizada): .......................................... 31

2.4.3 Outras formas de descentralização dos serviços públicos: ............................ 34

2.5 Poderes e Deveres do Administrador Público....................................................... 35

3. SERVIÇOS PÚBLICOS.................................. ................................................................ 39

3.1 Conceito de serviço público .................................................................................. 39

3.2 Classificação dos Serviços Públicos ..................................................................... 40

3.3 Servidores Públicos: ............................................................................................. 43

3.4 Cargos e Funções:................................................................................................ 44

3.5 Estabilidade do servidor público:........................................................................... 46

3.6 Seleção de pessoas no setor público:................................................................... 46

3.6.1 Concurso Público: .......................................................................................... 46

3.7 Exoneração e demissão:....................................................................................... 47

3.8 Responsabilidade dos Servidores: ........................................................................ 48

3.9 Responsabilidade por improbidade administrativa: ............................................... 48

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3.10 Lei de Responsabilidade Fiscal ...................................................................... 49

4 MODELOS DE ESTADO, GOVERNO E ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA . ....................... 51

4.1 Administração Pública Patrimonialista .................................................................. 52

4.2 Administração Pública Burocrática........................................................................ 53

4.3 Administração Pública Gerencial .......................................................................... 59

4.3.1 Reforma do Estado no Brasil:......................................................................... 63

4.3.2 A Nova Gestão Pública- NGP......................................................................... 70

4.3.3 Consenso de Washington:.............................................................................. 72

4.3.4 O movimento reinventando o governo............................................................ 73

4.3.5 Problemas e Contradições da Nova Gestão Pública – Administração Pública Gerencial ........................................................................................................ 78

4.3.6 Proposta de um novo modelo de Gestão Pública:.......................................... 80

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................... ....................................................85

GLOSSÁRIO.......................................... .......................................................................88

10

1 ESTADO

1.1 Introdução: Elementos do Estado

Considerando grande parte dos estudiosos da área de direito administrativo, é

possível referir os principais elementos de Estado , quais são:

População: entende-se pela reunião de indivíduos num determinado local,

submetidos a um poder central. O Estado vai controlar essas pessoas, visando o bem

comum. A população pode ser classificada como nação, quando os indivíduos que

habitam o mesmo território possuem como elementos comuns a cultura, a língua, a

religião e sentem que há, entre eles, uma identidade; ou como povo, quando há

reunião de indivíduos num território e que, apesar de se submeterem ao poder de um

Estado, possuem nacionalidades, cultura, etnias e religiões diferentes.

Território: espaço geográfico onde reside determinada população. É limite de

atuação dos poderes do Estado. Vale dizer que não poderá haver dois Estados

exercendo seu poder num único território e os indivíduos que se encontram num

determinado território estão obrigados a se submeterem.

Soberania: é o exercício do poder do Estado, internamente e externamente. O

Estado, dessa forma, deverá ter ampla liberdade para controlar seus recursos, decidir

os rumos políticos, econômicos e sociais internamente e não depender de nenhum

outro Estado ou órgão internacional. A essa autodeterminação do Estado dá-se o nome

de soberania.

‘ 1.2 Noção Conceitual de Estado

Para compreendermos o significado de Estado, inicialmente faremos uma breve

descrição dos conceitos e, após, abordaremos como esse se organiza e se estrutura.

Para Meirelles (2012, p. 62),

10

[...] O conceito de Estado varia segundo o ângulo em que é considerado. Do ponto de vista sociológico, é corporação territorial dotada de um poder de mando originário (Jellinek); sob o aspecto político, é comunidade de homens, fixada sobre território, com potestade superior de ação, de mando e de coerção (Malberg); sob prisma constitucional, é pessoa jurídica territorial soberana (Biscaretti di Ruffia): na conceituação do nosso Código Civil, é pessoa jurídica Direito Público Interno (art. 41,I). Como ente personalizado, o Estado tanto pode atuar no campo do Direito Público como no do Direito Privado, mantendo sempre sua única personalidade de Direito Público, pois a teoria da dupla personalidade do Estado acha-se definitivamente superada. Esse é o Estado de Direito, ou seja, o Estado juridicamente organizado e obediente às suas próprias leis.

Para o autor, o Estado é constituído de três elementos originários e

indissociáveis: Povo (é o componente humano do Estado), Território (a sua base física)

e o Governo Soberano (elemento condutor do Estado, que detém e exerce o poder

absoluto de autodeterminação e auto-organização emanado do povo).

Segundo o Dicionário Houaiss (2009), o Estado é um conjunto das instituições

(governo, forças armadas, funcionalismo público, etc.) que controlam e administram

uma nação; também é país soberano, com estrutura própria e politicamente

organizado.

Para Matias–Pereira (2010, p. 01),

O Estado existe fundamentalmente para realizar o bem-comum. Os teóricos que cuidam da análise desta finalidade do Estado desdobram- se em três vertentes: o bem-estar, a segurança e a justiça. A interdependência dos fins do Estado assume particular importância em relação à grande e última finalidade do Estado: a promoção do bem- comum. O Estado, nesse sentido, enquanto forma de organização política por excelência da sociedade, pode ser aceito como espaço natural de desenvolvimento do poder político.

O autor correlaciona também o conceito de cidadão e o exercício da cidadania

com o Estado, ou seja, o Estado é o lugar no qual o cidadão exerce a sua cidadania1.

1 Segundo Dalmo Dallari (2008), "a cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social".

11

Assim, toda a nova proposta de reforma do Estado deve considerar a premissa de

melhorar a qualidade da prestação de serviço público com a intenção de incrementar

cada vez mais essa cidadania e favorecer a sociedade. Já, para a Administração

Pública, o objetivo primordial é a promoção e desenvolvimento dos seus cidadãos,

mediante a garantia de seus direitos, os quais estão estabelecidos na CF/88.

De outra forma, ser cidadão é fazer valer seus direitos e cumprir seus deveres. A

cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de

participar ativamente da vida e do governo de seu povo.

Segundo Marshall (1967 apud SANTOS, 2009, p. 24):

a cidadania implica um sentimento de pertencimento e lealdade a uma civilização, que se constitui em patrimônio comum de uma dada coletividade. Tal pertencimento, por sua vez, se estabelece a partir dos deveres de cada indivíduo para com o Estado, mas também – e sobretudo – pelos direitos que este Estado lhe garante:[...] direitos civis [...] direitos políticos [...] direitos sociais2.

Matias–Pereira (2010), ao falar sobre o Estado e a reforma do mesmo ressalta

que é importante considerarmos que a Reforma de Estado precisa estar apoiada na

defesa deste enquanto coisa pública, no qual o patrimônio público deve ser de todos e

para todos, atendendo as demandas dos cidadãos. Além disso, o autor afirma que

mesmo que a Administração Pública se inspire no modelo de gestão privadas,

devemos ressaltar que nunca se deve perder a perspectiva de que o setor privado visa

ao lucro, enquanto a Administração Pública busca realizar sua função social.

Em outras palavras, o autor afirma que a existência do Estado ocorre para a

realização do bem comum, observando-se a três vertentes essenciais que são o bem-

estar, a segurança e a justiça.

Já para Cicco e Gonzaga (2011, p.47), o Estado é:

Uma instituição organizada política, social e juridicamente, ocupa um território definido e, na maioria das vezes, sua lei maior é uma Constituição. É dirigido por um governo soberano, reconhecido interna e

2 Consultar glossário.

12

externamente, sendo responsável pela organização e pelo controle social, pois detém o monopólio legítimo do uso da força e da coerção.

Outro autor, Coelho (2009a), comenta que o Estado exerce o poder supremo

sobre o conjunto de indivíduos que ocupam um determinado território e exerce

influência na ação e comportamento das pessoas.

O autor vai além, quando afirma que:

Estado e poder são, portanto, dois termos indissociáveis. Mas a capacidade de uma organização exercer o poder sobre o conjunto de indivíduos que ocupa um território não é suficiente para definir o Estado. Se isso bastasse, teríamos – por exemplo – de reconhecer como Estado as organizações criminosas que controlam algumas favelas do Rio de Janeiro e outros bairros das periferias de grandes cidades brasileiras, uma vez que são a força dominante que dita as regras de comportamento a serem seguidas por todos os seus habitantes. Ou então teríamos de reconhecer como Estado as organizações guerrilheiras que ocupam e controlam parte do território da Colômbia. (COELHO, 2009a, p. 14)

Assim, para que seja possível diferenciar o poder exercido pelo Estado do poder

de outros grupos que o exercem em territórios ou com alguns indivíduos mediante o

uso de força física, é necessário introduzir a noção fundamental da legitimidade, ou

seja, esse poder tem que ser outorgado pela sociedade. Dessa forma, o Estado não

admite concorrência e exerce de forma monopolista o poder político, que é o poder

supremo nas sociedades contemporâneas.

Norberto Bobbio (apud COELHO, 2009a), afirma que o poder do Estado também

apresenta duas características distintivas do poder estatal, que são:

• Universalidade: o Estado toma decisões em nome de toda a coletividade que ele

representa e não apenas da parte que exerce o poder.

• Inclusividade: em princípio, nenhuma esfera da vida social encontra-se fora do

alcance da intervenção do Estado.

Serrano, por sua vez, afirma:

Na concepção republicana democrática o Estado é um instrumento criado pela sociedade para realizar tarefas coletivas. A noção básica é muito simples de entender. A sociedade se reuniu, através de seus representantes eleitos, para criar ou constituir o Estado Brasileiro.

13

Constituir significa fazer nascer o Estado. Significa organizá-lo, estabelecer sua estrutura e modo de funcionamento e, fundamentalmente, oferecer poder e autoridade para realizar as tarefas coletivas (funções públicas) a que se destina. E, ao mesmo tempo, estipular os limites ao exercício deste Poder (direitos dos indivíduos submetidos a sua autoridade) (SERRANO, 1995).

Para o autor, tanto a estrutura, a finalidade e a forma de funcionamento do

Estado são estabelecidas em conjunto com outros valores sociais numa carta de regras

e princípios, a qual se tornará numa espécie de contrato para os cidadãos e

governantes que é a Constituição da República. Por outro lado, esta Constituição

espelha um conjunto de valores sociais básicos que criou o Estado, os quais nortearão

todas as suas ações.

Ainda, de acordo com Serrano, a nossa Constituição atribui ao Estado a

realização de três tarefas coletivas (funções públicas) básicas, ou seja, três tarefas ou

funções fundamentais, das quais, decorrem todas as outras. Estas três funções básicas

do Estado são as seguintes:

1) Administrar os interesses públicos ou coletivos;

2) Estabelecer normas de convivência entre os indivíduos e entre o indivíduo e o

Estado;

3) Aplicar essas normas de convivência, julgando quem tem razão, quando

houver um conflito de interesses entre indivíduos ou entre o indivíduo e o Estado

1.3 Organização Fundamental do Estado na Constituiç ão de 1988 e o

Município

Além disso, o Estado é dividido em três poderes: o Legislativo, o Executivo e o

Judiciário, independentes e harmônicos entre si e com suas funções reciprocamente

indelegáveis (CF, art. 2º). Cada poder tem suas atribuições, a saber: A função do

Legislativo é a elaboração da lei (função normativa), a função do Executivo é a

conversão da lei em ato individual e concreto (função administrativa) e a função do

Judiciário é a aplicação coativa da lei aos litigantes (função judicial).

14

Na Constituição Federal da República de 1988, a organização do Estado é

esboçada da seguinte maneira:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional;

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Art. 18º A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, Estados, o Distrito Federal, e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.

Outro aspecto importante que Serrano ressalta é o fato do Estado Brasileiro ser

organizado sob a forma de Federação, onde o exercício do poder é distribuído em três

instâncias: a União, os Estados e os Municípios. Cabe lembrar que uma instância não é

subordinada a outra, mas as três instâncias são subordinadas às regras da

Constituição. Por outro lado, cada instância tem uma competência diferente das outras,

ou seja, estas realizam tarefas coletivas diferentes entre si e só podem editar normas

(leis) e realizar atos que estejam previstos na sua competência. Quem estipula as

competências da União, dos Estados e dos Municípios é a Constituição.

Já para Santos (2006, p.37), “O Estado é uma entidade com poder de regular e

disciplinar as relações ente os membros de uma sociedade, visando a garantir a

sobrevivência e o bem-estar geral da população. É uma criação da própria sociedade

moderna, para servi-la”.

15

O autor descreve a construção do Estado como uma delegação da sociedade:

Assim, a sociedade transferiu a essa instituição, por ela organizada, parte de seu poder de ação e de sua liberdade, para que, por meio das leis, da aplicação da justiça e do recolhimento de impostos, fosse garantida a ordem interna e promovido o atendimento às necessidades básicas de toda a população. (SANTOS, 2006, p. 37)

Continuando, o autor comenta que o Estado se organizou de diferentes

maneiras, mas manteve uma estrutura composta por órgãos públicos, um corpo de

servidores (civil e militar) um grupo de dirigentes. Toda essa estrutura é mantida por

arrecadação de impostos e tributos.

O autor distingue, também, as entidades estatais que organizam uma federação:

A União (pessoa jurídica de direito público, investida pela Constituição, que exerce, em

parte, a soberania nacional), Estado - Membro (é um Estado que tem seus próprios

órgãos com estatuto próprio e uma entidade estatal sobreposta aos Estados Federais),

Município (pessoa jurídica de direito público dotado de capacidade civil plena para

exercer direitos e obrigações em seu próprio nome).

Já, para Bächtold (2008, p. 17):

O conceito de Estado moderno está estreitamente vinculado com a noção de poder institucionalizado, isto é, o Estado se forma quando o poder se assenta em uma instituição e não em um indivíduo. Assim, podemos dizer que, no Estado moderno, não há poder absoluto, pois mesmo os governantes devem se sujeitar ao que está estabelecido na Lei.

Continuando, o autor descreve como se estrutura a Organização do Estado

brasileiro:

República – Forma de governo em que é eleito um representante para ser o

chefe de estado, com característica da eleição periódica desse representante.

Federação - é o nome atribuído à união de Estados diferentes em torno de uma

administração única, onde cada um dos Estados federados perde a sua

soberania em si, em face de uma soberania de um Estado Federal.

16

A Administração Pública é exercida em cada um dos três níveis: Federal,

Estadual e Municipal. Para cada um dos níveis de administração há atribuições gerais

e específicas.

Considerando a nossa realidade mais próxima, a esfera municipal, descrevemos

a seguir as competências do município, conforme a Constituição Federal/88:

Art. 30 - Compete aos Municípios: I - legislar sobre assuntos de interesse local; II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber; III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei; IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual; V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial; VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação pré-escolar e de ensino fundamental; VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população; VIII - promover, no que couber adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano; IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

Art. 31 - A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei.

É importante salientar que o aparelho de Estado é uma estrutura organizacional

do Estado, em seus três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e três níveis

(União, Estados-membros e Municípios). O aparelho do Estado é constituído pelo

governo, pela cúpula dirigente nos três poderes, por um corpo de funcionários e pela

força militar. O Estado, por sua vez, é mais abrangente que o aparelho, porque

compreende adicionalmente o sistema constitucional-legal, que regula a população nos

limites de um território.

Por fim, devemos lembrar que o Estado Brasileiro está consolidado como um

Estado de Direito , ou seja, é aquele em que o poder exercido é limitado pela Ordem

Jurídica vigente, que irá dispor, especificamente, desde a forma de atuação do Estado,

17

suas funções e limitações, até as garantias e direitos dos cidadãos. Dessa forma, o

Estado e sua população estão submetidos ao Direito.

Em síntese, podemos concluir que o Estado é uma figura abstrata que foi criada

pela sociedade para atender e regulamentar a vida em sociedade e, essencialmente,

destinada a atender a coletividade e a preservar o interesse público. Pode ser

entendida também como uma criação humana destinada a manter a coexistência

pacífica dos indivíduos, a ordem social, de forma que os seres humanos consigam se

desenvolver, e proporcionar o bem estar a toda sociedade.

Hoje, de forma esquemática, podemos considerar que o Estado moderno tem

como Forma de governo a Monarquia e a República. E o Sistema de governo se

caracteriza por ser Presidencialista ou Parlamentarista. Já o Regime de governo pode

ser Democrático ou Autoritário (Totalitário)3.

1.4 Público e o Privado:

Conforme Coelho (2009b, p. 16)

[...] a clara separação entre esfera pública e esfera privada é a marca distintiva das sociedades capitalistas e democráticas contemporâneas em relação às demais. Dessa separação fundamental decorrem todas as outras diferenciações relevantes no interior dessas sociedades, como a existente entre um Direito Público e um Direito Privado; entre Estado e sociedade civil; e entre poderes do Estado e direitos do cidadão.

Para o autor, na esfera pública , os indivíduos são sempre concebidos como

cidadãos, seja servidores do Estado, usuários dos serviços públicos ou sujeitos

submetidos às leis e normas impostas pelo Estado.

Já na esfera privada , os indivíduos são concebidos como pessoas físicas e/ou

jurídicas que visam à satisfação de seus interesses particulares e objetivos –

econômicos, políticos, religiosos, culturais etc.

Diferenças entre Administração Pública e Privada

3 Ver Glossário.

18

Segundo Santos (2006), na Administração Pública o gestor tem a obrigação de

cumprir fielmente os preceitos do direito e da moral administrativa que regem a sua

atuação e essas ordens e instruções estão concretizadas nas leis, regulamentos. Daí o

dever indeclinável do gestor público de agir segundo os preceitos do direito e da moral

administrativa, porque tais aspectos é que expressam a vontade do titular dos

interesses administrativos – o povo – e condicionam os atos a serem praticados no

desempenho do munis público que lhe é confiado. Ao contrário, na administração

privada, o administrador recebe as ordens e instruções dono ou proprietário e os

objetivos são somente o lucro desses ou a satisfação de interesses particulares.

Para Meirelles (2012), na Administração particular e privada é lícito fazer tudo

que a lei não proíbe, mas na administração pública só é permitido fazer o que a lei

autoriza.

Santos (2006), elabora uma síntese sobre algumas diferenças básicas entre

administrações pública e privada.

Quadro 1

Aspecto Administração pública Administração privada

Político Funcionamento e resultados, bons ou maus, têm impacto político. O processo decisório sofre fortes ingerências políticas.

Há autonomia decisória. O impacto político é menor.

Econômico Orientada para o bem-estar social. Output em grande parte não mensurável. Organizações não competitivas no mercado. Rentabilidade dispensável (custo-benefício)

Orientada para o lucro. Output mensurável. Organização competitiva. Rentabilidade vital para o crescimento e sobrevivência.

Organizacional Grandemente afetada e/ou dirigida por forças externas. Objetivos econômicos e sociais. Alto grau de interdependência entre as organizações. Órgãos com funções múltiplas e concomitantes. Carência de bancos de dados. Gerência com grande rotatividade. Gerentes não assumem riscos próprios.

Tem controle mais amplo sobre ela mesma. Objetivos predominantemente econômicos. Maior autonomia em relação a outras organizações. Órgãos com funcionalidade específica e bem discriminada. Existência freqüente de bancos de dados. Gerências mais estáveis. Há riscos de emprego de capital se

19

houver insucesso.

Obs.: Para o funcionamento do setor público, outros aspectos relativos a recursos humanos (admissão, demissão, número, remuneração etc.), compras e contratações, obtenção de recursos financeiros etc. tem leis específicas

Fonte: SANTOS (2006, p. 19)

Sobre a natureza da gestão pública e da gestão privada, utilizamos os conceitos

desenvolvidos pelo Programa de Gestão da Secretaria de Gestão – Ministério do

Planejamento, Orçamento e Gestão, contidos no Instrumento para Avaliação da Gestão

Pública – Ciclo 2008-2009 (Brasil, 2009)4, onde são apontadas diversas características

que diferenciam as organizações da administração pública das organizações da

iniciativa privada, como:

• Enquanto as organizações do mercado são conduzidas pela autonomia da vontade

privada, as organizações públicas são regidas pela supremacia do interesse público e

pela obrigação da continuidade da prestação do serviço público.

• O controle social é requisito essencial para a administração pública contemporânea

em regimes democráticos, o que implica em garantia de transparência de suas ações e

atos e na institucionalização de canais de participação social, enquanto que as

organizações privadas estão fortemente orientadas para a preservação e proteção dos

interesses corporativos (dirigentes e acionistas).

• A administração pública não pode fazer acepção (predileção) de pessoas, deve tratar

a todos igualmente e com qualidade. O tratamento diferenciado restringe-se apenas

aos casos previstos em lei. Por outro lado, as organizações privadas utilizam

estratégias de segmentação de “mercado”, estabelecendo diferenciais de tratamento

para clientes preferenciais.

• As organizações privadas buscam o lucro financeiro e formas de garantir a

sustentabilidade do negócio. A administração pública busca gerar valor para a

sociedade e formas de garantir o desenvolvimento sustentável, sem perder de vista a

obrigação de utilizar os recursos de forma eficiente.

• A atividade pública é financiada com recursos públicos, oriundos de contribuições

compulsórias de cidadãos e empresas, os quais devem ser direcionados para a

4 O Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização – GesPública – foi instituído pelo

Decreto nº 5.378 de 23 de fevereiro de 2005

20

prestação de serviços públicos e a produção do bem comum. A atividade privada é

financiada com recursos de particulares que têm legítimos interesses capitalistas.

• A administração pública tem como destinatários de suas ações os cidadãos, sujeitos

de direitos, e a sociedade, demandante da produção do bem comum e do

desenvolvimento sustentável. A iniciativa privada tem como destinatários de suas

ações os “clientes” atuais e os potenciais.

21

2 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 2.1 Conceito

A Administração Pública, conforme Matias–Pereira (2010), de forma geral,

designa o conjunto de serviços e entidades responsáveis pela realização de atividades

administrativas, ou seja, responsáveis pela execução das decisões políticas e

legislativas. Nesse caso, a Administração Pública tem como objetivo a gestão de bens

e interesses da comunidade no âmbito dos três níveis de governo: federal, estadual ou

municipal, sempre observando os preceitos do direito e da moral, orientados para o

bem comum.

De outra forma, o autor considera a Administração Pública como a totalidade da

estrutura de estado, que objetiva atingir, por meio da execução dos serviços públicos, a

satisfação das necessidades da população e o bem coletivo.

Conceito distinto nos traz Meirelles (2012, p. 66):

Administração Pública – em sentido formal, é o conjunto de órgãos instituídos para a consecução dos objetivos do Governo; em sentido material, é o conjunto das funções necessárias aos serviços públicos em geral; em acepção operacional, é o desempenho perene e sistemático, legal e técnico, dos serviços próprios do Estado ou por ele assumidos em benefício da coletividade. Numa visão global, a Administração é, pois, todo o aparelhamento do Estado preordenado à realização de serviços, visando à satisfação das necessidades coletivas [...].

Portanto, podemos afirmar que a Administração Pública é toda atividade

desenvolvida pelo Estado, através de seus órgãos públicos, destinados a executar

atividades de interesse coletivo que asseguram a satisfação das necessidades de toda

população, como, por exemplo, a segurança, a cultura, a saúde e o bem estar dessa

população.

Em outras palavras, Administração Pública é o conjunto de órgãos, serviços e

agentes do Estado que procuram satisfazer as necessidades da sociedade.

Administração pública é a gestão dos interesses públicos por meio da prestação de

serviços públicos, sendo dividida em administração direta e indireta.

Existem três níveis de atuação na Administração Pública: federal, estadual e

municipal. Cada um desses níveis tem um conjunto de órgãos para realização de

22

determinadas tarefas ou prestação de serviços, de acordo com a sua competência

definida constitucionalmente. Assim, administrar é comandar, dirigir, governar. Quando

os interesses são públicos, ou da coletividade, temos a Administração Pública.

Nesse sentido, conforme Bobbio (1998 apud Matias–Pereira, 2010, p. 63), “[...] a

expressão Administração Pública designa o conjunto das atividades diretamente

destinadas à execução das tarefas ou incumbências consideradas de interesse público

ou comum, numa coletividade ou numa organização estatal.”

Meirelles (2012, p. 66), por sua vez, chama a atenção para o uso incorreto do

conceito Governo como sinônimo de Administração Pública, ou seja, mesmo que eles

se confundam na medida em que se concretizam através de ações e serviços públicos,

somente o Governo representa a “[...] expressão política de comando, de iniciativa, de

fixação de objetivos do Estado e da manutenção da ordem jurídica vigente. O Governo

atua mediante atos de soberania na condução dos negócios públicos”.

O Governo é o conjunto de órgãos constitucionais responsáveis pela função

política do Estado, ou seja, compreende as atividades típicas dos três Poderes,

Executivo, Legislativo e Judiciário, onde a atividade típica do Executivo é administrar, a

do Legislativo é legislar e do Judiciário é exercer o Poder Jurisdicional.

Por outro lado, a administração não pratica atos de governo; pratica tão somente

atos de execução, com maior ou menor autonomia funcional, segundo a competência

dos órgãos e de seus agentes. Trata-se da atividade típica do Poder Executivo, mas

também pode ser exercido pelos Poderes Legislativo e Judiciário, ao exercerem

atividade administrativa.

Ao comparar Governo e Administração, enfatiza Meirelles (2012, p. 67):

Comparativamente, podemos dizer que o governo é atividade política e discricionária; administração é atividade neutra, normalmente vinculada à lei ou à norma técnica. Governo é conduta independente; administração é conduta hierarquizada. O Governo comanda com responsabilidade constitucional e política, mas sem responsabilidade profissional pela execução; a administração executa sem responsabilidade constitucional ou política, mas com responsabilidade técnica e legal pela execução. Administração é o instrumental.

23

É importante também diferenciarmos políticas públicas de Estado e de Governo,

sendo as primeiras definidas com finalidades estruturantes e/ou imprescindíveis do

Estado (educação, saúde, segurança, habitação, etc.) e, as segundas, aquelas que

encerram um conteúdo da diretriz política da administração (ex.: políticas de gênero).

A Administração Pública constitui um importante segmento da ciência da

administração. Ela representa o aparelhamento do Estado e funciona como o

instrumento do governo para planejar, organizar, dirigir e controlar todas as ações

administrativas, no sentido de dar plena e cabal satisfação das necessidades coletivas

básicas.

2.2 Natureza e Fins da Administração Pública

Conforme Meirelles (2012, p. 88), a natureza da administração pública é a de um

múnus público 5 para quem exerce, isto é, a obrigação de defender, conservar e

aprimorar os bens, serviços e interesses da coletividade.

Assim, o administrador público fica obrigado a cumprir fielmente aos preceitos do

direito e da moral administrativa que regem a sua atuação. Quando investido em cargo

ou função pública, todo administrador público assume o compromisso de bem servir a

coletividade, porque é o desejo do povo, como legítimo destinatário dos bens, serviços

e interesses administrados pelo Estado.

Conforme Bächtold (2008, p. 26),

A palavra administração vem do latim ad (direção) e minister (obediência), ou seja, o administrador dirige obedecendo à vontade de quem o contratou. Assim, o administrador público vai conduzir seu trabalho procurando atender à necessidade da população que o elegeu (obediência ao seu objetivo).

5 Conjunto de funções as quais são obrigação de um indivíduo; cargo, emprego; ofício. Múnus público, o que emana do poder público ou da lei e que é exercido em proveito da coletividade. O que procede de autoridade pública ou da lei, e obriga o indivíduo a certos encargos em benefício da coletividade ou da ordem social.

24

Para Meirelles (2012, p. 88), os fins da administração pública resumem-se num

único objetivo: o bem comum da sociedade. Portanto, toda atividade do administrador

público deve ser orientada para esse objetivo, porque a comunidade não institui a

administração senão como meio de atingir o bem-estar social. Todo ato administrativo

que se afaste desse objetivo é ilícito e imoral.

2.3 Princípios da Administração

O Direito Administrativo brasileiro pressupõe que os princípios da Administração

Pública estão consolidados em regras de observância permanente e obrigatória:

legalidade, moralidade, impessoalidade ou finalidade6, publicidade, eficiência,

razoabilidade, proporcionalidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica,

motivação e supremacia do interesse público. Conforme Meirelles, os cinco primeiros

encontram-se no art. 37, caput, da CF/88 e os demais, embora não mencionados,

decorrem do nosso regime político, tanto que, ao lado daqueles, fora textualmente

enumerados pelo art. 2º da Lei federal 9.784, de 29.199, e também podem ser

encontrados na Constituição do Estado/RS e Lei Orgânica do Município.

2.3.1 Princípios expressos

PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ESTRITA

Determina que todos os atos devam necessariamente estar em conformidade

com as leis. Só é permitido ao administrador fazer aquilo que a lei autoriza.

A legalidade está no alicerce do Estado de Direito, no princípio da autonomia da

vontade. Baseia-se no pressuposto de que tudo o que não é proibido, é permitido por

6 A Constituição/88 não se referiu expressamente ao princípio da finalidade, mas o admitiu sob a denominação de princípio da impessoalidade.

25

lei. Mas o administrador público deve fazer as coisas sob a regência da lei imposta.

Portanto, só pode fazer o que a lei lhe autoriza.

Adota-se o critério de subordinação à lei. A legalidade significa que a

Administração Pública, nos atos vinculados, não tem liberdade e nem vontade pessoal,

só pode fazer o disposto em lei;

PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA

Vincula o administrador à probidade administrativa. É um ajustamento a uma

composição ao que é ético, ao que deva o órgão público realizar. Para isto, o

administrador tem que ter conhecimento do que é administração pública e das normas

que regem a atividade pública que ele venha a desenvolver em um determinado órgão.

Nos casos de improbidade administrativa, os governantes podem ter suspensos

os seus direitos políticos, além da perda do cargo na administração, seguindo-se o

ressarcimento dos bens e a nulidade do ato ilicitamente praticado. Há um sistema de

fiscalização (interno e externo) ou mecanismo de controle de todos os atos

administrativos praticados. Por exemplo, o Congresso Nacional exerce esse controle

através de uma fiscalização contábil externa ou interna sobre toda a Administração

Pública.

A administração deve ter não apenas uma atuação legal, mas também moral,

pautada na ética, honestidade, lealdade, boa fé. No entanto, a moralidade a ser

obedecida é a administrativa e não a moralidade comum que trata da distinção entre o

bem e o mal.

PRINCÍPIO DA FINALIDADE OU DA IMPESSOALIDADE

Não pode haver privilégios ou discriminação na administração pública. Também

é vedado praticar atos sem finalidade pública.

Trata-se da ausência de subjetividade. A atividade administrativa deve ser

dirigida com finalidade pública, aos cidadãos em geral, sem favoritismos,

discriminações benéficas e ou detrimentos. A norma administrativa deve ser

26

interpretada e aplicada de forma que melhor garanta a realização do fim público a que

se dirige.

Está dirigido ao interesse coletivo. A finalidade do Estado é dar às condições

básicas de vida à população em termos de saúde, educação etc. e não privilegiar

alguém ou algum grupo.

Conforme Meirelles (2012, p. 89), ”O ato ou contrato administrativo realizado

sem interesse público configura desvio de finalidade”.

É importante ressaltar que o princípio da Impessoalidade pode ser visto como

um desdobramento do princípio da Igualdade , ou seja, no art. 5º da CF/88, prevê-se

que todos têm direitos iguais sem qualquer distinção. Para o administrador não é

diferente. Ele não pode distinguir as situações, sendo obrigado, por lei, a agir de

maneira igual em situações iguais, desigual em situações desiguais (como no caso de

tratamento diferenciado, ou de maneira compensatória, dados alguns segmentos como

as Pessoas com Necessidades Especiais - PNE).

PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE OU DA DIVULGAÇÃO E DA

TRANSPARÊNCIA

Determina que todo ato administrativo seja divulgado oficialmente

(transparência), para conhecimento público e para início de seus efeitos. O que é feito

na administração pública são atos administrativos e para que tenham validade no

direito é necessário que esse ato seja divulgado nos órgãos próprios para essa

divulgação, por exemplo, Diário Oficial.

Não confundir publicidade de ato administrativo com propaganda do governo,

que é prevista pela CF/88, no art. 37, em seu parágrafo 1º, 7. O ato está contido no

princípio da legalidade, porque nesse princípio o administrador só fará o que a lei

determina e autoriza.

Esse princípio visa garantir o controle através da sociedade da gestão

administrativa, a fim de conferir à mesma validade e eficácia.

7 § 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos

27

O princípio da transparência é expresso em lei e é de aplicação obrigatória para

os Municípios, conforme a Lei 12.527 de 18 de novembro de 2011, conhecida como a

Lei de Acesso à Informação, a qual dispõe sobre os procedimentos a serem

observados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, com o fim de garantir o

acesso a informações, previstos na Constituição Federal.

PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA

Exige que a administração atue com presteza, perfeição e sempre tenha por

objetivo o atingimento de resultados práticos (busca pelo interesse público). Também

chamado de princípio da boa-administração. Aqui, a administração não deve se

contentar em exercer seus atos dentro da legalidade, mas buscando resultados

positivos para o serviço público. Esse princípio deve nortear a atuação da

Administração Pública no sentido de produzir resultado de modo rápido e preciso, de

maneira que os resultados de suas ações satisfaçam plenamente as necessidades da

população. Tal princípio refuta a lentidão, o descaso, a negligência e a omissão,

práticas que, não raramente, são observadas nas ações da Administração Pública

brasileira.

Para esses 5 princípios, existe uma forma de agrupá-los ou de lembrá-los

utilizando-se da expressão – LIMPE, que é uma combinação das primeiras letras

desses princípios, ou seja, os princípios da: Legalidade, Impessoalidade, Moralidade,

Publicidade e Eficiência. Existem alguns slogans relacionados à sigla, como “Limpe a

administração pública”, “Se deseja uma boa administração pública, limpe!”, “Vamos

manter limpa a administração pública”.

2.3.2 Princípios não expressos ou implícitos:

Conforme alguns dos principais especialistas em direito administrativo, existem

outros princípios, como os princípios não expressos, ou implícitos na Constituição

Federal e Expressos na Lei nº. 9.784/99. São eles:

28

PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE

É o princípio da proibição de excesso, que tem por objetivo aferir a

compatibilidade entre os meios e os fins, de modo a evitar restrições desnecessárias

ou abusivas por parte da Administração Pública.

As competências da administração pública devem ser feitas proporcionalmente,

sendo ponderadas, segundo as normas exigidas para cumprimento da finalidade do

interesse público. Tanto o principio da proporcionalidade e da razoabilidade constituem

instrumentos de controle dos atos estatais abusivos, seja qual for a sua índole.

SEGURANÇA JURÍDICA

É a exigência de estabilidade nas situações jurídicas, mesmo daquelas que, em

sua origem, apresentam vícios de ilegalidade.

A segurança jurídica existe para que a justiça, finalidade maior do Direito, se

concretize e pode-se afirmar que a segurança jurídica concede aos indivíduos a

garantia necessária para o desenvolvimento de suas relações sociais, tendo, no Direito,

a certeza das consequências dos atos praticados.

MOTIVAÇÃO

Por princípio, as decisões administrativas devem ser motivadas formalmente, ou

seja, a parte dispositiva deverá vir precedida por uma explicação ou fundamentos de

fato e de direito. Nos processos e nos atos administrativos a motivação é entendida

como a indicação dos pressupostos de fato e de direito.

Para todas as ações dos servidores públicos, deve existir uma explicação, um

fundamento de base e direito. O princípio da Motivação é o que vai fundamentar todas

as decisões que serão tomadas pelo agente público.

É importante ressaltar que, por força da Teoria dos Motivos Determinantes, o

agente fica vinculado aos motivos que fundamentaram a prática do ato, segundo a qual

só é valido o ato se os motivos enunciados efetivamente aconteceram. Nesse sentido,

pois, a menção de motivos falsos ou inexistentes nulifica irremediavelmente o ato

29

praticado. Ou seja, os atos que serviram de suporte à decisão do agente integram a

validade do ato.

AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO

Assegura aos litigantes em processos administrativos, sejam eles disciplinares

ou não, a possibilidade de expor seus argumentos através de ampla defesa, com todos

os meios e recursos a ela inerentes. Dessa forma, garante aos administrados o direito

de refutar alegações, produzir provas próprias, desde que lícitas, e recorrer de

decisões que ameacem ou lesem direito seu.

SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO

Também conhecido como princípio da primazia do interesse público, ou

simplesmente, princípio do interesse público. Consiste na premissa de que todos os

atos administrativos devem ser praticados com um único fim: o atendimento do

interesse público.

No entanto, o princípio da supremacia do interesse público também determina

que, em caso de contraposição entre interesses particulares e interesses públicos, os

últimos devem prevalecer sobre os primeiros.

Segundo a própria Constituição, “todo o poder emana do povo”, por isso o

interesse público irá trazer o benefício e bem-estar à população.

2.3.3 Outros princípios que merecem destaque

A legislação brasileira, principalmente através da Constituição Federal, traz

também outros princípios e garantias que merecem destaque, tais como:

DURAÇÃO RAZOÁVEL DOS PROCESSOS

A CF/88, em seu art.5º, inciso LXXVIII, determina: “ A todos, no âmbito judicial e

administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que

garantam a celeridade da sua tramitação”.

30

Dessa forma, em atendimento a essa regra constitucional, é inconcebível o

prolongamento desnecessário dos processos, os sobrestamentos inúteis e os

burocratismos estéreis.

PRINCIPIO DA CONTINUIDADE DOS SERVIÇOS PÚBLICOS

Visa evitar solução de descontinuidade na prestação dos serviços públicos,

impedindo que a coletividade sofra prejuízos em razão de eventual destaque a

interesses particulares, a exemplo das greves. O serviço público deve ser prestado de

forma continua e sem interrupção para não prejudicar os usuários e/ou a sociedade.

Quando existe a paralisação do serviço, no caso de ocorrência de greve, existem

serviços que não podem sofrer solução de continuidade (interrupção), conforme

previstos na Constituição e leis correlatas, que estipulam quais os serviços essenciais e

que não podem paralisar totalmente como, por exemplo: tratamento e abastecimento

de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; assistência

médica e hospitalar; distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;

serviços funerários e transporte coletivo; captação e tratamento de esgoto e lixo, etc.

2.4 Prestação dos Serviços pela Administração Públi ca

Para Meirelles (2012. p. 67), “o Governo e a administração, como criações

abstratas da Constituição e das Leis, atuam por intermédio de suas entidades (pessoas

jurídicas), de seus órgãos (centros de decisão) e de seus agentes (pessoas físicas

investidas em cargos e funções)[...]”.

O autor descreve entidade como pessoa jurídica, pública ou privada e órgão

como um elemento despersonalizado que tem por objetivo a realização das atividades

da entidade, através de seus agentes. Para o autor, as entidades classificam-se em

estatais, autárquicas, fundacionais, empresariais e paraestatais.

31

Sob o aspecto operacional, a Administração Pública é o desempenho perene e

sistemático, legal e técnico dos serviços próprios do Estado, em benefício da

coletividade. Ela pode ser direta ou indireta.

2.4.1 Administração Pública Direta (centralizada):

É composta pelas suas entidades estatais (União, Estados, Municípios e Distrito

Federal), consideradas pessoas jurídicas de Direito Público.

É constituída pelos serviços integrados na própria estrutura administrativa do

Estado, por meio das entidades políticas (União, Estados, Distrito Federal e

Municípios), de seus órgãos e de seus agentes, todos integrantes da própria estrutura

estatal ou Poder Central.

Órgãos Públicos são centros especializados de competência, ou rol de

atribuições e responsabilidades estabelecidos dentro da própria estrutura administrativa

estatal. Pode-se assim dizer, também, que são unidades de atuação do Estado

desprovidas de personalidade jurídica.

São exemplos de órgãos públicos: ministérios, secretarias, departamentos,

comissões, repartições, etc.

No município, a Administração Direta (centralizada) é aquela composta por

órgãos ligados diretamente ao poder municipal. São os próprios organismos dirigentes

e suas secretarias.

As pessoas que trabalham na Administração Pública direta são chamadas de

funcionários públicos ou servidores públicos.

2.4.2 Administração Pública Indireta (descentralizada):

É aquela composta por entidades com personalidade jurídica própria, que foram

criadas para realizar atividades de Governo de forma descentralizada. São exemplos

as autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista.

A ideia de administração indireta funda-se no conceito da descentralização da

Administração Pública, que vem a ser a distribuição de competências e atribuições do

Estado para outras pessoas jurídicas.

32

A administração indireta pode ser observada quando o poder público cria uma

nova pessoa jurídica, seja ela de direito público ou privado, e a ela atribui a titularidade

e a incumbência da execução de determinado serviço público, ou de interesse público,

exercendo, assim, a descentralização administrativa.

Todas as entidades da administração indireta apresentam as seguintes

características: personalidade jurídica própria, seja ela de direito público ou privado;

patrimônio próprio; vinculação a órgãos da administração direta.

Os órgãos da administração indireta são autônomos, sujeitando-se, contudo, à

supervisão do ministério respectivo (ou secretaria), através de uma série de medidas,

como indicação ou nomeação dos dirigentes da entidade, aprovação de suas contas e

outros, não significando, contudo, que estejam hierarquicamente subordinados à

administração direta. As entidades da administração indireta são:

Autarquia: serviço autônomo criado por lei, com personalidade jurídica,

patrimônio e receita próprios para executar atividades típicas da Administração Pública,

atividades que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e

financeira descentralizada.

Em suma, as autarquias são entes administrativos autônomos, criados por lei

específica, com personalidade jurídica de direito público interno, para a consecução de

atividades típicas do poder público, que requeiram, para uma melhor execução, gestão

financeira e administrativa descentralizada.

No município de Porto Alegre, temos as seguintes autarquias: DMAE, DEMHAB,

DMLU e PREVIMPA.

Empresa Pública: entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado,

com patrimônio próprio e capital exclusivo da União, do Estado ou do Município, criada

por lei para a exploração de atividade econômica que o Governo seja levado a exercer

por força de contingência ou de conveniência administrativa, podendo revestir-se de

qualquer das formas admitidas em direito.

Muito embora as empresas públicas sejam pessoas jurídicas de direito privado,

submetem-se a algumas normas de direito público, como a obrigatoriedade de

realizarem licitações e concursos públicos e a vedação de seus servidores acumularem

cargos públicos de forma remunerada.

33

O regime de trabalho predominante nas empresas públicas é o celetista. No

entanto, nos cargos de gestão, cuja nomeação se dá por indicação dos chefes do

Poder Executivo a que se vinculam, temos a presença de servidores comissionados,

submetidos ao regime estatutário, lembrando que não é admitido o provimento de

empregos públicos em comissão.

No município de Porto Alegre, a EPTC é considerada uma empresa pública.

Fundação Pública: entidade criada por lei e dotada de personalidade jurídica de

direito público ou privado. É o patrimônio público personalizado destinado à persecução

de finalidades de interesse público.

Seu patrimônio é exclusivamente público e estão submetidas ao controle da

administração direta, e/ou do Ministério Público e do Tribunal de Contas.

A FASC é a fundação de direito público e o IMESF é a fundação de direito

privado no âmbito municipal.

Sociedade de Economia Mista: entidade dotada de personalidade jurídica de

direito privado, instituída mediante autorização legislativa e registro em órgão próprio

para exploração de atividade econômica, sob a forma de sociedade anônima, cujas

ações com direito a voto pertençam, em sua maioria, ao município ou a entidade da

administração indireta.

Sua administração com participação do Poder Público está encarregada da

realização de atividade econômica ou serviço de interesse coletivo outorgado ou

delegado pelo Estado (ex.: Petrobrás).

No município, a PROCEMPA e a CARRIS são as sociedades de economia

mista.

Seu patrimônio é formado com bens públicos e subscrições particulares. Não

está ela sujeita à falência, mas seus bens são penhoráveis e executáveis e a entidade

pública que a instituiu responde, subsidiariamente, pelas suas obrigações. Regem-se

pelas normas aplicáveis às empresas privadas, inclusive quanto às obrigações

trabalhistas e tributárias. Seu pessoal é constituído de empregados regidos pela

legislação trabalhista, previdenciária e acidentária comum.

As pessoas que trabalham na Administração Pública indireta são chamadas de

funcionários públicos ou servidores públicos e/ou empregados públicos.

34

2.4.3 Outras formas de descentralização dos serviços públ icos:

Outra forma de descentralização dos serviços públicos são as concessões, as

permissões e as autorizações.

A Concessão que o Estado dá ao concessionário deve ser feita sempre através

de licitação, um processo de análise das propostas mais vantajosas para o Estado,

significando, portanto, uma medida de uso racional dos recursos públicos.

Para Meirelles (2012), a concessão é a delegação contratual da execução do

serviço, sendo autorizado e regulamentado pelo Executivo; o contrato implica encargos

e vantagens recíprocos; não há transferência de propriedade pública ao concessionário

e não há privação de qualquer direito ou prerrogativa pública. Também deve ser

conferida sem exclusividade.

A Concessão é sempre feita no interesse da coletivida de, tendo o dever

(concessionário) de prestar o serviço em condições adequadas para o público. (art.

175. CF).

Toda concessão fica submetida às normas de natureza regulamentar

(disciplinam o modo e a forma) e as de ordem contratual (condições de remuneração);

o poder de regulamentar as concessões é inerente e indespojável do concedente

(Executivo). O transporte coletivo é um exemplo de concessão.

Além dessa modalidade, o poder público pode se valer de serviços permitidos.

Permissões são todos aqueles serviços em que a administração estabelece os

requisitos para sua prestação ao público e, por ato unilateral (termo de permissão ),

comete a execução aos particulares que demonstrarem capacidade para seu

desempenho; a permissão é em princípio discricionária e precária, mas admite

condições e prazos para exploração do serviço, a fim de garantir rentabilidade e

assegurar a recuperação do investimento do permissionário visando atrair a iniciativa

privada.

As permissões estão regulamentadas pela Lei nº. 8.987, de 13 de fevereiro de

1995, Capítulo XI, art. 40. No município, o serviço de táxis e sepultamento ou cremação

são exemplos de serviços permitidos.

35

2.5 Poderes e Deveres do Administrador Público

Conforme Meirelles (2012, p. 111): “Os poderes e deveres do administrador

público são os que estão expressos em lei, os impostos pela moral administrativa e os

exigidos pelo interesse da coletividade”.

Para ele, o poder administrativo é atribuído à autoridade para remover interesses

particulares que se opões ao interesse público.

Cada gestor público ou agente da administração é investido de uma parcela de

poder público e deveres específicos do cargo, função, serviço ou atividade pública que

exerça, com responsabilidades próprias de suas atribuições. Em função de serem

poderes instrumentais, trazem em si a característica de dever, sendo de realização

obrigatória sempre que objetivem interesse público.

Diferente do direito privado em que o poder de agir é uma faculdade, no direito

público é uma imposição, um dever para o agente que detém o poder, não se

admitindo a omissão da autoridade diante de situações que exigem sua atuação. A

Administração responde, civilmente, pelas omissões ou comissões lesivas de seus

agentes.

Esses poderes da Administração Pública são prerrogativas que viabilizam e

fazem valer a supremacia do interesse público em relação ao interesse individual.

Estes poderes dão autoridade ao agente público, quando, por lei, recebe competência

decisória e força para impor suas decisões aos administrados. Só podem ser usados

como atributos do cargo ou função, e não como privilégio da pessoa que o exerce. O

agente público fora do exercício do cargo ou da função não pode usar da autoridade

pública nem invocá-la por vontade própria para superpor-se aos demais cidadãos, pois,

se não está no exercício de suas funções, deixa de ser autoridade, igualando-se aos

demais. Tal conduta caracterizaria abuso de poder, acarretaria na ilegalidade do ato e,

conforme o caso tipificaria o crime de abuso de autoridade.

Para Meirelles (2012), os principais poderes do administrador público são:

poder-dever de agir; dever da eficiência; dever da probidade e dever de prestar contas.

A seguir veremos mais detalhadamente esses poderes e deveres do

administrador público:

PODER-DEVER DE AGIR: O poder tem para o agente público o significado de

dever para com a comunidade e para com os indivíduos. Para o cidadão o poder de

36

agir é facultativo, para o administrador público é uma obrigação de atuar, sempre

observando o princípio de exercitá-lo em benefício da comunidade. Quando ocorre a

omissão da autoridade ou o silêncio da administração, gera responsabilidade e

penalização para o agente omisso e/ou administração negligente.

DEVER DE EFICIÊNCIA: é o que se impõe a todo agente público de realizar

com suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional. A eficiência

funcional é, pois, considerada em sentido amplo, abrangendo não só a produtividade

de quem ocupa o cargo ou a função como perfeição do trabalho e sua adequação

técnica aos fins visados pela administração. A verificação de eficiência atinge aspectos

quantitativo e qualitativo do serviço.

DEVER DE PROBIDADE : esse dever está previsto pela CF/88 como essencial

na conduta do administrador público como elemento necessário à legitimidade de seus

atos. O dever de probidade deve ser entendido como o dever que todo administrador

público tem de pautar suas atividades no estrito cumprimento dos princípios da

honestidade e moralidade pública. Quando existe o ato administrativo praticado com

lesão aos bens e interesses públicos também fica sujeito à invalidação pela própria

administração ou pelo poder judiciário, por vício de improbidade, que é uma

ilegitimidade.

DEVER DE PRESTAR CONTAS: Constitui dever do administrador público a

prestação de contas referente à gestão dos bens e interesses da coletividade. Nota-

se que a prestação de contas se refere a todos os atos do administrador público no

trato dos bens e interesses da coletividade. Quando se refere ao dinheiro público, a

obrigação da prestação de contas se torna obrigatória. Para o administrador público é

uma decorrência natural da administração como encargo de gestão de bens e

interesses alheios; a gestão se refere aos bens e interesses da coletividade e assume

o caráter de múnus público, isto é, de um encargo para com a comunidade.

37

Atualmente, essa prestação de contas feitas pelo administrador público a instâncias controladoras ou à sociedade civil é também conhecida como

Accountability8.

Para a ENAP (c2006), Accountability pode ser caracterizada pela situação onde

todo o individuo que ocupa um cargo público tem o compromisso da prestação pública

de contas (no inglês, accountability) e que envolve um amplo conjunto de formas de

controle dos cargos pela comunidade, pois todo cargo público envolve certas

expectativas a respeito de sua função e daquilo que promete ser capaz de realizar em

prol da comunidade. Também é importante lembrar que todo cargo público requer um

considerável investimento da comunidade: entre outros, pagamento de salários,

treinamento, aperfeiçoamento e recursos adicionais no ambiente do trabalho para o

bom exercício da função. Esse investimento deve retornar na forma de serviços

adequados e a comunidade tem que ser capaz de controlar se esse objetivo está

sendo satisfeito.

Quanto à utilização do poder por parte dos administradores públicos, podem

ocorrer as situações de USO E ABUSO DE PODER .

O uso do poder é a prerrogativa da autoridade, mas esse poder tem que ser

usado normalmente, sem abuso. O uso normal do poder implica a observância das

normas legais, a moral da instituição, a finalidade do ato e as exigências do interesse

público. O poder que é conferido ao administrador público deve ser para ser utilizado

em benefício da coletividade administrada, mas usado nos justos limites que o bem-

estar social exigir.

O abuso de poder ocorre quando a autoridade ultrapassa os limites de suas

atribuições - excesso de poder, ou se desvia das finalidades administrativas - desvio de

finalidade. O abuso de poder pode tanto ocorrer na forma da ação como na da

omissão, já que as mesmas são capazes de afrontar a lei e causar lesão a direito

individual do administrado.

8 É um termo da língua inglesa, sem tradução exata para o português, que remete à obrigação de

membros de um órgão administrativo ou representativo de prestar contas a instâncias controladoras ou

a seus representados. Outro termo usado numa possível versão portuguesa é responsabilização.

38

Outra distorção no uso do poder é quando ocorre a omissão da administração,

ou seja, a autoridade pública tem o dever de agir frente a uma situação determinada e

não o faz, implicando em prejuízos à coletividade ou particulares. Esse fato acarreta a

correção judicial, indenização ao prejudicado e responsabilização civil, penal,

administrativa e política do agente público.

39

3. SERVIÇOS PÚBLICOS

3.1 Conceito de serviço público

Conforme Meirelles (2012, p. 376):

A Constituição Federal dispõe expressamente que incumbe ao Poder Público, na forma da lei, a prestação de serviços públicos. Dessa forma, a lei disporá sobre o regime de delegação, os direitos dos usuários, a política tarifária, a obrigação de manter serviço adequado e as reclamações relativas à prestação (arts. 175, parágrafo único, e 37, § 3.°).

Para o autor, a atribuição primordial da Administração Pública é prestar serviços

essenciais ou secundários à coletividade, através de seus funcionários ou

administrados. Esses serviços podem ser essenciais (serviços públicos) ou apenas

úteis à comunidade (serviços de utilidade pública). De forma geral, quando falamos de

serviço público, incluímos ambas as categorias.

Pietro (2006), define serviço público como toda atividade material que a lei

atribui ao Estado com o objetivo de satisfazer as necessidades coletivas, seja através

da prestação direta de serviços ou da delegação de serviços, mas sob regime jurídico

total ou parcialmente público.

A autora também ressalta que cabe ao Estado a escolha, por meio da lei, de

quais atividades são consideradas serviços públicos.

Outro autor, Mello (2002, p. 600), define o serviço público como:

Toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça às vezes, sob um regime de Direito Público, portanto consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais, instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo.

40

Em outras palavras, o Serviço Público é criado por lei e é uma obrigação do

Estado. O Estado por sua vez pode realizar a sua gestão de forma direta, por meio dos

órgãos da Administração Pública ou de forma indireta, por meio de concessão ou

permissão. O regime jurídico pode ser público ou privado de acordo com o que estiver

disposto em lei. É importante salientar, que todo o serviço público corresponde a uma

atividade de interesse público, mas que nem toda atividade pública é serviço público.

Outro aspecto importante a ser destacado acerca dos serviços públicos são os

requisitos do serviço e os direitos do usuário, amplamente difundidos entre os

cidadãos. Conforme Meirelles (2012), os requisitos do serviço são sintetizados em 5

princípios que a administração deve exigir de quem realiza os serviços, que são o

princípio da permanência (impõe continuidade do serviço), o da generalidade (serviços

iguais prestados a todos), o da eficiência, o da modicidade (tarifas razoáveis) e o da

cortesia (bom tratamento).

É importante lembrarmos que os direitos do usuário são essenciais na prestação

de serviços, mediante os regulamentos estabelecidos em lei. Esses serviços só podem

ser oferecidos se realmente atenderem aos direitos dos usuários.

Para Matias–Pereira (2010, p. 216):

As necessidades coletivas são satisfeitas por meio de serviços de interesse geral, que são denominados públicos. Dessa forma, sempre que o Estado presta um serviço de interesse geral, mobilizando pessoas e bens para satisfazer às necessidades coletivas, realiza serviço público. Assim, serviço público é todo aquele imprescindível à coletividade e, como tal, declarado pelos poderes competentes, cuja prestação está a cargo do Estado. Observe-se que, mesmo que instituições privadas atuem em uma dessas áreas, o governo tem a obrigação de colocar à disposição da população esses tipos de serviços.

3.2 Classificação dos Serviços Públicos

Meirelles (2012, p. 379) propõe a classificação dos serviços públicos levando-se

em conta a essencialidade, a adequação, a finalidade e os destinatários dos serviços,

41

classificando-os em públicos e de utilidade pública; próprios e impróprios do Estado;

administrativos e industriais; “uti universi” e "uti singuli”.9

Serviços Públicos : são os serviços que a administração presta diretamente à

comunidade, por reconhecer sua essencialidade e necessidade para a sobrevivência

dos membros da coletividade e do próprio Estado. Por essa razão, são considerados

privativos do poder público, no sentido de que só a administração deve prestá-los, sem

delegação a terceiros, mesmo porque, geralmente, exigem atos de império e medidas

compulsórias em relação aos administrados. Exemplos desses serviços são os de

defesa nacional, os de polícia e os de preservação da saúde pública.

Serviços de utilidade pública : são os serviços que a administração,

reconhecendo sua conveniência (não essencialidade, nem necessidade) para os

membros da coletividade, presta-os diretamente ou concorda em que sejam prestados

por terceiros (concessionários, permissionários ou autorizatários), nas condições

regulamentadas e sob seu controle, mas por conta e risco dos prestadores, mediante

remuneração dos usuários. São exemplos dessa modalidade os serviços de transporte

coletivo, gás, telefone e energia elétrica.

De acordo com Meirelles (2012, p. 380):

No primeiro caso (serviço público), o serviço visa a satisfazer necessidades gerais e essenciais da sociedade, para que ela possa subsistir e desenvolver-se como tal; na segunda hipótese (serviço de utilidade pública), o serviço objetiva facilitar a vida do indivíduo na coletividade, pondo à sua disposição utilidades que lhe proporcionarão mais conforto e bem-estar. Daí se denominarem, os primeiros, serviços pró-comunidade e, os segundos, serviços pró-cidadão, fundados na consideração de que aqueles (serviços públicos) se dirigem ao bem comum e estes (serviços de utilidade pública), embora reflexamente interessem a toda comunidade, atendem precipuamente às conveniências de seus membros individualmente considerados.

Serviços próprios do Estado: são aqueles que se relacionam intimamente com

as atribuições do poder público (segurança, polícia, higiene, saúde públicas, etc.) e

para a execução dos quais a Administração usa da sua supremacia sobre os

9 Consultar glossário

42

administrados. Por essa razão, só devem ser prestados por órgãos ou entidades

públicas, sem delegação a particulares. Esses serviços, por sua essencialidade,

geralmente são gratuitos ou de baixa remuneração, para que fiquem ao alcance de

todos os membros da coletividade.

Serviços impróprios do Estado: são os serviços que não afetam

substancialmente as necessidades da comunidade, mas satisfazem ao interesse

comum de seus membros, e, por isso, a administração os presta remuneradamente,

por seus órgãos ou entidades descentralizadas (autarquias, empresas públicas,

sociedades de economia mista, fundações governamentais), ou delega sua prestação a

concessionários, permissionários ou autorizatários. Esses serviços, normalmente

rentáveis, podem ser realizados com ou sem privilégio (não confundir com monopólio),

mas sempre sob regulamentação e controle do poder público competente.

Serviços administrativos: são os serviços que a administração executa para

atender às suas necessidades internas ou preparar outros serviços que serão

prestados ao público, tais como os da imprensa oficial, das estações experimentais e

outros dessa natureza.

Conforme já visto no capítulo sobre Administração Pública, no que se refere à

prestação dos serviços pela Administração Pública, pode ser direta (centralizada),

através de órgãos públicos como, ministérios, secretarias, departamentos, repartições,

etc., ou pode ser Indireta (descentralizada), através de entidades com personalidade

jurídica própria, que foram criadas para realizar atividades de governo de forma

descentralizada como, as autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de

economia mista.

Também é importante lembrarmos que esses serviços públicos prestados de

forma descentralizada exigem a regulamentação e controle pelo poder público,

qualquer que seja a modalidade de sua prestação aos usuários, ou seja, o fato de tais

serviços serem delegados a terceiros, particulares, não retira do Estado seu poder de

regulamentá-los e controlá-los.

43

Portanto, "Deve o Estado [...], no exercício do poder inerente à sua soberania,

fixar tarifas, determinar standards de serviço, fiscalizar a estrutura financeira de todas

as empresas de serviços de utilidade pública”. (MEIRELLES, 2012. p. 385),

3.3 Servidores Públicos:

Conforme Bergue (2010, p. 20), são agentes públicos as pessoas que prestam

serviços ao Estado e às pessoas jurídicas da administração indireta. O autor divide

estes agentes públicos em três categorias, a saber:

• Agentes Políticos: são os componentes do governo em seus primeiros

escalões, como presidente, governador, prefeitos e seus imediatos como

ministros e secretários no poder executivo, senadores, deputados, vereadores

no poder legislativo e juízes e desembargadores no poder judiciário, além de

promotores e procuradores no Ministério Público e ministros e conselheiros nos

tribunais de Contas;

• Servidores Públicos: são as pessoas que prestam serviços ao ente estatal10 e

são divididas em:

o Servidores Estatutários: são as pessoas que e ocupam cargos públicos

e seu vínculo laboral é regulado por estatuto próprio.

o Empregados Públicos: são aquelas pessoas cuja relação laboral com o

ente estatal é regida pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT e

ocupam empregos públicos.

o Servidores Temporários: são agentes admitidos por prazo determinado

para atender necessidades temporárias. Exercem funções públicas, sem

estarem vinculados a empregos públicos.

• Particulares em colaboração com o Poder Público: são pessoas que prestam

serviços ao Estado e não têm vínculo empregatício, como, por exemplo, os

10 Ente Estatal são pessoas jurídicas de Direito Público que integram a estrutura constitucional do Estado e têm poderes políticos a administrativos, tais como a União, os Estados-membros, os Municípios e o Distrito Federal

44

empregados de empresas concessionárias e permissionárias ou aquelas

pessoas que são convocadas para prestação de serviços ao Estado como os

jurados ou convocados para o serviço militar e/ou eleitoral.

Ser servidor público é uma vocação, como destacado pela ENAP (c2006), pelo

caráter nobre da atividade. A missão de servir a uma comunidade promovendo o bem

comum é honrada e dignificante. Essa vocação exige desprendimento: por mais bem

pago que seja o servidor, o serviço público jamais será o lugar ideal para quem busca o

mais alto retorno que o mercado de trabalho pode oferecer.

Normalmente, o Estado convoca seus quadros de carreira para uma dedicação

plena e, em muitas vezes, com dedicação exclusiva. O profissionalismo do serviço

público é mais do que o exercício de uma função, pois exige uma conduta adequada

baseada em valores éticos, direcionados ao bem-estar comum, exigindo também

competências como imparcialidade, objetividade e excelência, dedicação, empenho em

servir à comunidade, etc.

Também devemos ressaltar que, além dessas competências e qualidades

profissionais, é necessário adotar-se uma postura de decoro. Essa postura

compreende não apenas a retidão de uma ação, mas também a visão que a sociedade

tem dessa ação como sendo correta.

3.4 Cargos e Funções:

Conforme Meirelles (2012, p. 477):

Cargo público é o lugar instituído na organização do serviço público, com denominação própria, atribuições e responsabilidades específicas e estipêndio correspondente, para ser provido e exercido por um titular, na forma estabelecida em lei; função é a atribuição ou o conjunto de atribuições que a Administração confere a cada categoria profissional ou comete individualmente a determinados servidores para a execução de serviços eventuais, sendo comumente remunerada através de pro labore. Diferencia-se, basicamente, do cargo em comissão pelo fato de não titularizar cargo público.

45

O autor salienta que as funções de confiança só podem ser exercidas por

servidores ocupantes de cargo efetivo e podem ser destinadas apenas às atribuições

de direção, chefia e assessoramento (CF, art.37, V).

Bergue (2010, p. 326), diferencia cargos comissionadas e funções de confiança

da seguinte forma:

Assim, os cargos comissionados são estruturas funcionais autônomas, passíveis de serem ocupadas por indivíduo que não detém vínculo laboral anterior e permanente com o ente ou órgão. As funções de confiança, por seu turno, constituem um agregado de atribuições que são adicionadas à pessoa designada, já investida em cargo de provimento efetivo.

Para o autor, a designação de pessoas para os cargos em comissão e funções

de confiança deve observar a convergência entre a confiança pessoal e os critérios

técnicos, ou como ele mesmo descreve, “[...] a escolha do designado para o exercício

dessas atividades deve combinar confiança e competência em medidas proporcionais,

jamais em prejuízo da última”. (BERGUE, 2010, p. 327)

Por outro lado, considerando-se as características do Estado Patrimonialista11

ainda existente na Administração Pública Brasileira, devemos dar ênfase aos critérios

técnicos também para evitarmos as distorções como aquelas onde se valorizam mais a

natureza das relações pessoais existentes entre quem pode fazer a designação e o

designado, como nos casos semelhantes ao nepotismo.

Cabe também aqui destacar a definição apresentada pela Escola Nacional de

Administração Pública - ENAP (c2006, p. 12):

“Cargo público é o conjunto de atribuições e responsabilidades, previstas em uma estrutura organizacional, as quais são assumidas pelos servidores públicos. A ocupação de um cargo público implica graus distintos de poder de mando e decisão”. [...] “a missão do servidor público é, necessariamente, zelar pela res publica e estar a serviço dos interesses e aspirações dos cidadãos”.

11 Estado patrimonialista caracterizado como aquele onde os bens patrimoniais do Estado estão misturados com os dos dirigentes. Este assunto será abordado de forma mais aprofundada no capítulo 4.

46

Dessa forma, o servidor público faz pela comunidade o que esta não pode fazer

por si mesma e representa-a na medida em que faz o que essa necessita e exige.

Em síntese, a responsabilidade do servidor público será norteada por três

aspectos da consciência político-moral:

• o servidor público zela por algo que não lhe pertence.

• o servidor público tem poder e autonomia proporcionais à sua missão.

• o servidor público faz coisas importantes, não em seu próprio nome, mas em

nome de uma coletividade.

3.5 Estabilidade do servidor público:

Conforme Bergue (2010), a estabilidade é uma garantia constitucional que os

servidores adquirem depois de aprovados no estágio probatório12. Esta possibilidade

de aquisição de estabilidade constitui uma das principais características dos cargos

públicos, sendo que a mesma não existe em empregos públicos, mas, por outro lado,

estes empregados públicos têm o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS.

Por fim, o autor ressalta que, a partir da promulgação da CF/88, a estabilidade não

ocorre mais no serviço público e sim no cargo.

3.6 Seleção de pessoas no setor público:

3.6.1 Concurso Público:

Conforme Meirelles (2012, p. 494):

A obrigatoriedade de concurso público, ressalvados os cargos em comissão e empregos com essa natureza, refere-se à investidura em cargo ou emprego público, isto é, ao ingresso em cargo ou emprego isolado ou em cargo ou emprego público inicial da carreira na administração direta e indireta. O concurso é o meio técnico posto à disposição da Administração Pública para obter-se moralidade,

12 Art. 41 da CF/88.

47

eficiência e aperfeiçoamento do serviço público e, ao mesmo tempo, propiciar igual oportunidade a todos os interessados que atendam aos requisitos da lei [...].

Ressaltamos que, tanto para servidor público (estatutário) e quanto para

empregado público, a única forma de admissão no serviço público é através de

concurso público. Excetuam-se aqui os cargos em comissão.

Desde a CF/67, os concursos públicos só podem ser através da realização de

provas ou da realização de provas e apresentação de títulos. A Administração Pública

pode utilizar-se do processo seletivo , que é um expediente menos complexo, mas

com o qual deve também observar os princípios da isonomia, da igualdade e permitir a

competição entre todos os interessados. Cabe ressaltar que o processo seletivo é

utilizado nas contratações do regime celetista enquanto o concurso público refere-se ao

regime estatutário.

O concurso público, conforme Bergue (2010, p. 537), presta-se à garantia e

eficiência e moralização no processo de ingresso de pessoal no serviço público. Diz-se

que esse instrumento é moralizador, em essência, pelo fato de ser público. Mais que

isso, por garantir igualdade relativa de acesso aos cargos e empregos públicos àqueles

que atendam aos requisitos estabelecidos em lei para seu provimento.

Bem implementado, o certame de caráter público, contribui significativamente

para escolha do profissional mais apto dentre aqueles disponíveis no mercado de

trabalho, segundo os critérios de seleção definidos. Nesse sentido é fator de eficiência.

Outra maneira de acesso ao serviço público é através da contratação por prazo

determinado, o que, conforme Bergue (2010), caracteriza uma exceção à norma

instituída para o ingresso ao serviço público, que se dá somente através de concurso.

Essa exceção está contida no Art.37, IX, da CF/88, que regulamenta as contratações

por tempo determinado e deve ser utilizada apenas para atender à necessidade

temporária de excepcional interesse público.

3.7 Exoneração e demissão:

A exoneração do servidor público pode ocorrer no estágio probatório seja por

desempenho ou inadequação ao serviço público. Também pode ocorrer quando for de

iniciativa do servidor, ou, no caso de servidor estável, quando for motivada por

48

insuficiência de desempenho, ou quando do limite de despesa com pessoal (art. 169,

CF/88).

Já a demissão poderá ocorrer quando houver infração disciplinar punida com

essa pena, mas essa só pode ocorrer após a utilização da ampla defesa por parte do

servidor.

3.8 Responsabilidade dos Servidores:

A responsabilização dos servidores é um dever da administração e específico de

todo chefe em relação a seus subordinados.

Esta responsabilização pode ser classificada em Responsabilidade

Administrativa, Responsabilidade Civil e Responsabilidade Criminal:

Responsabilidade Administrativa : é a que resulta da violação de normas

internas pelo servidor sujeito ao estatuto e disposições complementares estabelecidas

em lei, decreto ou regulamento relativo à função pública.

Responsabilidade Civil : é a obrigação que se impõe ao servidor de reparar o

dano causado à administração por culpa ou dolo no desempenho de suas funções e é

apurada através da Justiça Comum.

Responsabilidade Criminal : é a que resulta do ato cometido que resulta em

crimes funcionais, definidos em lei federal.

3.9 Responsabilidade por improbidade administrativa :

Como já visto no capítulo referente à Administração Pública, todo agente público

deve agir com probidade13, ou seja, deve adotar uma conduta ética e moral que zele

pelos bens e interesses públicos. Quando isso não ocorre, esses atos são conhecidos

como os de improbidade administrativa.

13 Probidade é a qualidade de quem é probo e significa retidão, honradez, brio e observância rigorosa

dos deveres da justiça e da moral. Integridade tem significado semelhante e é uma qualidade atribuída a uma pessoa honesta, incorruptível, cujos atos são irrepreensíveis.

49

A Lei nº. 8.429, de 2 de junho de 1992, dispõe sobre as sanções aplicáveis aos

agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo,

emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras

providências. Essa lei trata dos atos de improbidade praticados por qualquer agente

público e estabelece três espécies de atos de improbidade:

• os que importam enriquecimento ilícito (art. 9º);

• os que causam lesão ao patrimônio público (art. 10); e

• os que atentam contra os princípios da Administração Pública (art.11).

As disposições dessa lei alcançam todas as pessoas qualificadas como agentes

públicos, na administração direta, indireta e fundacional, ainda que transitoriamente,

com ou sem remuneração.

Além dessa lei, a própria CF/88 prevê no art. 37, XXI, § 4º “Os atos de

improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da

função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e

gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.”

3.10 Lei de Responsabilidade Fiscal

A Lei complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, conhecida com a Lei de

Responsabilidade Fiscal, estabelece em seu art. 1º as normas de finanças públicas

voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências. Em seu

parágrafo 1º :

§ 1o A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar.

50

Portanto, todos os gestores públicos são responsáveis por manter o equilíbrio

das contas públicas, bem como por cumprir as metas estabelecidas, sendo

responsabilizados caso não consigam.

51

4 MODELOS DE ESTADO, GOVERNO E ADMINISTRAÇÃO

PÚBLICA

Matias-Pereira (2010, p. 129), ao abordar sobre a vinculação entre Estado e

Administração Pública:

O debate sobre a articulação entre Estado e a Administração Pública é tão importante que necessita ser situado de acordo com o conceito de Estado. O Estado pode ser aceito como um conjunto de instituições criadas, recriadas e ajustadas para administrar conflitos e tensões em um determinado território, ou seja, a noção de conflito e tensão é essencial a esse conceito. Por ser um ente abstrato, o Estado se materializa por meio de instituições, que são o Executivo, o Legislativo, o Judiciário, as forças militares, os governos subnacionais e a Administração Pública. Todas essas instituições vão materializar e arbitrar esses conflitos e tensões que são levados para o Estado.

Conforme o autor, a Administração Pública seria o aparelho de estado

organizado com a função de executar serviços que satisfaçam as necessidades da

população, ou seja, é um conjunto de atividades destinadas à execução de obras e

serviços para o interesse da sociedade. O autor refere que, partir da criação do Estado

moderno, existe na trajetória da administração pública três formas de atuação:

Administração Pública patrimonialista, a burocrátic a e a gerencial.

Conforme Bresser-Pereira (2006a, p. 42):

O Estado moderno começa, em termos políticos, como absoluto; em termos econômicos, como mercantilista; e em termos administrativos, como patrimonialista. A monarquia, que se confundia com o Estado, era um importante patrimônio econômico e político, recebendo receitas de impostos e da participação em empresas monopolistas. [...] No estado patrimonial não havia distinção nítida entre patrimônio público e patrimônio privado.

A seguir, trataremos de cada uma das três formas de atuação da Administração

Pública.

52

4.1 Administração Pública Patrimonialista

Assim, na Administração Pública patrimonialista, conforme Matias–Pereira

(2010, p. 113), o aparelho de Estado atua como uma extensão do poder do monarca.

Os servidores públicos possuem status de nobreza real. Os cargos funcionam como

recompensas, o que gera nepotismo. Isso contribui para a prática de corrupção e do

controle do órgão público por parte dos soberanos.

Já, conforme o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado – MARE14

(1995), no patrimonialismo, o aparelho do Estado funciona como uma extensão do poder do

soberano, e os seus auxiliares, servidores, possuem status de nobreza real. Os cargos são

considerados prebendas. A res publica não é diferenciada da res principis, ou seja, é uma

forma da administração pública que se caracteriza pela privatização do Estado, pela

interpermeabilidade dos patrimônios público e privado. O príncipe não faz clara distinção entre

patrimônio público e seus bens privados.

Para Bergue (2010), a Administração Patrimonialista tem os seguintes traços

característicos:

• a propriedade pública confundindo-se com a propriedade privada do administrador;

• o aparelho administrativo do Estado como extensão do poder do dirigente;

• a tendência ao nepotismo, alicerçada em geral nos seguintes valores:

✓ crença de que laços familiares constituem a mais plena garantia de lealdade;

✓ oportunidade de distribuição de oportunidade profissional ou riqueza para a

família;

✓ e garantia de maior probabilidade e conivência com eventuais desvios.

• os cargos, especialmente os comissionados, são considerados feudos passíveis de

distribuição na forma de reconhecimento pessoal ou como moeda.

A característica fundamental do patrimonialismo é a dificuldade que têm alguns

gestores de definir precisamente os limites de fronteira entre o público e o privado,

diferenciando o patrimônio público do patrimônio do governante. Nesse modelo, os

14 O Plano Diretor da Reforma do Estado foi elaborado pelo Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado – MARE.

53

servidores públicos são considerados “empregados” do administrador e não do ente

estatal.

Em síntese, no Patrimonialismo, o Estado existe como uma extensão do poder

dos governantes e os seus servidores são servidores dos governantes. Os cargos são

considerados benesses para os amigos dos que governam. Nessa forma de

Administração Pública, existe uma total confusão entre o que é público e o que é

privado, pois o patrimônio público (res publica) se mistura com os bens do governante

(res principis). Essa forma foi predominante no período dos estados absolutistas que

vigoraram até o século XIX (Monarquias absolutistas européias).

Assim, o patrimonialismo utiliza o patrimônio público para atender as demandas

e necessidades pessoais dos governantes, incorrendo em mau uso dos recursos

públicos, como nos casos de corrupção, nepotismo etc., em vez de proteger o

patrimônio público contra os interesses privados.

4.2 Administração Pública Burocrática

Segundo Matias-Pereira (2010), a Administração Pública Burocrática surge na

segunda metade do século XIX, com o propósito de combater a corrupção e o

nepotismo comuns na Administração Patrimonialista. Tinha como diretrizes a

profissionalização, uma carreira pública, hierarquia funcional, impessoalidade,

formalismo. Dessa forma, procurava controlar os processos e o ingresso à carreira

pública, com regras na admissão, controle nas compras, buscando maior eficiência do

Estado.

Essa forma de administração era adequada para responder às demandas de um

Estado pequeno como era o caso do Estado vigente na época. Apoiava-se em normas

rígidas, o que não exigia um sistema descentralizado de gestão. Nesse modelo

burocrático, o Estado não tinha dificuldade de executar diretamente os serviços sob

sua responsabilidade. Portanto, o Estado era eficiente enquanto os serviços oferecidos

eram ainda muito reduzidos e o Estado limitava-se a manter a ordem e administrar a

justiça, a garantir os contratos e a propriedade.

54

Conforme Bresser–Pereira (2006, p. 241):

A administração pública burocrática foi adotada em substituição à administração patrimonialista, que definiu as monarquias absolutas e na qual o patrimônio público e o privado eram confundidos. Nesse tipo de administração, o Estado era entendido como propriedade do rei. O nepotismo e o empreguismo, se não a corrupção, eram a norma. Esse tipo de administração revelar-se-ia incompatível com o capitalismo industrial e as democracias parlamentares que surgiram no século XIX. É essencial para o capitalismo a clara separação entre o Estado e o mercado; só pode existir democracia quando a sociedade civil, formada por cidadãos, distingue-se do Estado ao mesmo tempo que o controla. Tornou-se assim necessário desenvolver um tipo de administração que partisse não só da clara distinção entre o público e o privado, mas também da separação entre o político e o administrador público. Surgiu então a administração burocrática moderna, racional-legal.

A Administração Burocrática está embasada pelos conceitos da teoria

burocrática de Max Weber15, os quais postulavam que a organização poderia ser

eficiente por excelência, se essa conseguisse detalhar antecipadamente e nos

mínimos detalhes como as coisas deverão ser feitas, ou seja, a organização

burocrática é uma organização cujas consequências desejadas se resumem na

previsibilidade do seu funcionamento.

Segundo Bächtold (2008), no sistema burocrático, a subordinação não é às

pessoas e sim às normas estabelecidas dentro da organização. Os cargos devem ser

preenchidos por mérito (concurso, eleição, nomeação), baseando-se em

procedimentos formais revestidos de legalidade. Assim, qualquer pessoa dentro da

estrutura pode aspirar a uma ascensão profissional.

Dessa forma, podemos caracterizar o paradigma organizacional burocrático

como um sistema que privilegia a padronização e formalização de procedimentos em

nome da eficiência e, entre suas inúmeras características, podemos elencar algumas

que podem ser associadas ao modelo burocrático de gestão pública:

• obediência a normas e regulamentos;

15 Max Weber - Sociólogo, historiador e político alemão que estudou as grandes organizações da sua época. É considerado um dos fundadores do estudo moderno da sociologia, mas sua influência também pode ser sentida na economia, na filosofia, no direito, na ciência política e na administração. Foi um dos principais autores sobre a Teoria Organizacional conhecida como Burocrática.

55

• racionalidade e divisão do trabalho;

• hierarquização da autoridade (organizações militares);

• a eficiência;

• a profissionalização;

• os controles administrativos e rotinas e procedimentos padronizados

(controles rígidos dos processos, como, por exemplo, na admissão de

pessoal, nas compras);

• formalidade das comunicações (por escrito, com vistas à comprovação e à

padronização);

• impessoalidade nas relações (valorização do cargo ou da função em

detrimento do indivíduo);

• competência técnica e meritocracia (difere da Administração Patrimonialista,

pois privilegia os critérios mérito e competência técnica, em vez de critérios

particulares);

• previsibilidade do funcionamento;

• a profissionalização do servidor público e a ideia de carreira pública.

Matias-Pereira (2010, p. 53) descreve o que é burocracia:

A burocracia16 é o tipo de administração caracterizada por uma hierarquia formal de autoridade, na qual existem regras definidas para a classificação e solução de problemas, que devem ser estendidas às comissões e aos organismos coletivos de decisão e formas escritas de comunicação. Em geral, é peculiar das repartições e instituições estatais; porém, em certa medida, pode ser verificada nas grandes corporações privadas. O termo burocracia é utilizado também em outros sentidos: serve para designar tanto o conjunto de funcionários – ou burocratas – como para qualificar uma forma de proceder lenta, rotineira, que dificulta e entrava toda decisão.

16 Segundo Weber, a burocracia, enquanto forma de dominação, se sustenta sobre o conhecimento técnico que, além de conferir caráter racional, a transforma em instrumento capaz de assegurar alta eficiência administrativa. Isso pressupõe certa racionalidade impessoal que, guiada por regras formais que padronizam e conferem igualdade no tratamento dos casos, define com precisão as relações de mando e subordinação, mediante a distribuição das atividades a serem executadas e de acordo com os fins a que se visa.

56

Muitas dessas características adotadas na administração do Estado foram um

avanço em relação à antiga Administração Patrimonialista, uma vez que deram um

caráter mais profissional à organização e tornaram-na mais eficiente. Entre tantas

vantagens desse novo paradigma burocrático, podemos citar:

• Racionalidade em relação ao alcance dos objetivos da organização;

• Precisão na definição do cargo e na operação, pelo conhecimento exato dos

deveres;

• Rapidez nas decisões, pois cada um conhece o que deve ser feito e por quem;

as ordens e papéis tramitam através de canais preestabelecidos;

• Uniformidade de resposta (está prescrita na norma);

• Uniformidade de rotinas e procedimentos, favorecendo a padronização, a

redução de custos e erros, pois as rotinas são definidas por escrito;

• Redução de atrito entre as pessoas, todos conhecem os limites de

responsabilidade e o que é exigido da função;

• Confiabilidade, pois as decisões são previsíveis e impessoais (seguem as

normas);

• Benefícios para os funcionários, pois são motivados a seguir carreira na

organização;

• Critérios de seleção e escolha de pessoal estão baseados na capacidade e na

competência técnica, implicando melhor quadro funcional.

Já no Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado – MARE (1995), a

qualidade fundamental da administração pública burocrática é a efetividade no controle

dos abusos; seu defeito, a ineficiência, a auto-referência, a incapacidade de voltar-se

para o serviço aos cidadãos vistos como clientes. Esse defeito só vai ser constatado

quando o Estado precisa aumentar a oferta de serviços, uma vez que, no inicio da

administração burocrática, os serviços do Estado eram muito reduzidos, onde o Estado

A palavra burocracia vem do francês bureau – oficina (escritório) + c ratie

(poder, autoridade).

57

limitava-se a manter a ordem e administrar a justiça, a garantir os contratos e a

propriedade.

A administração pública burocrática distingue claramente o público e o privado e

o combate à corrupção e o nepotismo patrimonialista foi um de seus maiores objetivos.

Para isto foram consolidadas as idéias de profissionalização, carreira, hierarquia

funcional, impessoalidade e formalismo. A organização se caracterizava por ser

racional e eficiente e preocupada com o controle e não se preocupando com a

ineficiência promovida.

Apesar de inúmeras vantagens em relação à administração patrimonialista na

prática, a organização e a administração burocrática apresentaram alguns problemas,

ou disfunções nas suas características, como, por exemplo, nos casos de excesso de

apego às normas ou a substituição dos fins pelos meios.

A seguir, descreveremos algumas dessas disfunções, mais conhecidas da

organização burocrática.

Disfunções da burocracia

• Internalização das regras e apego excessivo aos regulamentos, como no caso

em que cumprir as normas passa a ser mais importante que atingir os objetivos.

A atividade -meio passa a ser o resultado a ser alcançado e não a atividade fim

que atende o usuário.

• Excesso de formalismo e de documentação, tornando os prazos de execução

muito demorados.

• Resistência a mudanças, isto é, na medida em que tudo é padronizado e

previsto com antecipação, o funcionário se acostuma a uma estabilidade,

proporcionando-lhe segurança a respeito de seu trabalho. Qualquer mudança

tende a ser interpretada como algo que desconhece, tornando-se indesejável.

• A base do processo decisorial – quem toma decisões é aquele que ocupa o

posto hierárquico mais alto, mesmo que nada saiba sobre o tema.

• Conformidade às rotinas – com o tempo, as regras tendem a se tornar

absolutas, sagradas, conduzindo a uma rigidez no comportamento do burocrata

58

que se restringe ao desempenho mínimo. Perde iniciativa, criatividade e

inovação.

Segundo Matias-Pereira (2010), as duas principais causas do desvirtuamento da

burocracia são a centralização e verticalização do processo decisório, tendo como

consequência a morosidade dos trâmites processuais na estrutura hierárquica em

sentido ascendente; e a falta de flexibilidade, quando existe uma preocupação

excessiva, obsessiva em seguir regras. Assim, quando surgem casos que não se

encaixam com precisão às regras, não há lugar para modificação. Dessa forma, a

burocracia transforma-se no emperramento do processo decisório, conectado a um

emaranhado de regras que não permitem a sua transposição.

Hoje em dia, o termo burocracia, assumiu diversos significados, sendo muito

comum estar associada a uma conotação pejorativa, uma vez que tende a ser

relacionada à ineficiência, atrasos, confusão, autoritarismo, privilégio, entre outras

expressões sempre de caráter negativo. Passamos a chamar de burocracia os defeitos

do sistema, ou seja, suas disfunções, como o exagerado apego aos regulamentos,

excesso de formalismo, resistência mudanças, despersonalização do relacionamento,

conformidade às rotinas e procedimentos, etc. e não os aspectos positivos em relação

ao patrimonialismo.

O desgaste da organização burocrática começa no momento em que o Estado

começa a prestar mais serviços e a população passa a exigir mais serviços e melhor

atendimento das demandas coletivas, ou nas palavras de Matias-Pereira (2010, p.

113):

Assim, em função da adoção do modelo de Estado burocrático, impõe- se a reforma do serviço público, por ser um pré-requisito para tornar efetiva a ação da organização estatal. Neste contexto, quando o Estado passa a ser democrático (século XX), e tem como responsabilidade gerar o bem comum, por meio do atendimento adequado das crescentes demandas da população, ocorre significativa ampliação das suas funções nos campos socioeconômico e político. O aumento dessas pressões e a incapacidade do estado burocrático de atendê-las de maneira satisfatória colocam em xeque o Estado burocrático. Tem- se, portanto, início do processo de transformações, com a introdução da reforma da gestão pública, que busca transformar o modelo de Estado burocrático em Estado gerencial.

59

Para Bresser–Pereira (2006, p. 242):

Após a II Guerra Mundial houve uma reafirmação dos valores burocráticos, mas, ao mesmo tempo, a influência da administração de empresas começou a se fazer sentir na administração pública. As idéias de descentralização e de flexibilização administrativa ganharam espaço em todos os governos. Entretanto, a reforma da administração pública só ganharia força a partir dos anos 1970, quando teve início a crise do Estado, que levaria à crise também sua burocracia. Em consequência, nos anos 1980 iniciou-se uma grande revolução na administração pública dos países centrais em direção a uma administração pública gerencial.

Segundo Abrucio (2006), nos anos 70, devido à crise financeira mundial e os

exemplos de ineficiência na gestão pública buscaram-se soluções para esse quadro,

entre as quais, a adoção de instrumentos de gestão orçamentária, tornando as finanças

públicas mais vinculadas a objetivos do que a regras rígidas do serviço público. Assim,

a solução foi introduzir mecanismos gerenciais na administração pública. Mas somente

nos anos 80, em função do clima intelectual e político reinante e do esfacelamento do

aparato estatal estruturado no pós-guerra, que o modelo de administração burocrática

sofreu seu maior desgaste. Nesse momento, o modelo gerencial, importado das

práticas do setor privado, foi a base norteadora para a execução das reformas.

4.3 Administração Pública Gerencial

Conforme Coelho (2009a, p. 100):

Na virada dos anos 1970 para a década de 1980, o modelo de desenvolvimento econômico e social até então vigente, marcado pela forte intervenção do Estado em praticamente todas as esferas da vida social, parecia ter-se esgotado. Nesse contexto, ressurgiram, com força, as idéias liberais até então adormecidas, para reativar as economias e colocar novamente o mundo na rota do crescimento. O renascimento desse ideário convencionou-se chamar de neoliberalismo e seria protagonizado no mundo pelos governos de Margaret Thatcher, no Reino Unido (1979-1990), e de Ronald Reagan, nos Estados Unidos (1981-1989).

60

Ainda segundo Coelho (2009a), a agenda neoliberal, inicialmente adotada pela

Inglaterra e Estados Unidos e, posteriormente, em diversos países do mundo, estava

alicerçada no tripé: desregulamentação, privatizações e abertura dos mer cados.

Assim, os defensores dessa proposta argumentavam que era necessário

desregular os mercados, porque o número excessivo de regras e controles estatais

sobre a economia inibia os investimentos privados, comprometendo o crescimento

econômico. Dentre inúmeras medidas adotadas, o plano centrou-se nas relações de

trabalho, buscando reduzir a quantidade de leis e de restrições trabalhistas criadas pelo

Estado, favorecendo dessa maneira a novas contratações e/ou a criação de empregos.

Também eram favoráveis à privatização de empresas, pois alegavam que as

empresas estatais eram ineficientes e deficitárias. A consequência disso resultaria em

crescentes déficits a serem cobertos pelos contribuintes.

Dessa forma, a privatização buscava tornar essas empresas eficientes e

lucrativas, além de possibilitar que o Estado não arcasse mais com esse prejuízo e,

também, que pudesse aplicar seus recursos em áreas de competências obrigatórias

como educação, saúde e assistência social.

No Brasil, a privatização se torna parte integrante das reformas econômicas

iniciadas pelo Governo Collor. Para tanto, foi instituído o Programa Nacional de

Desestatização (PND), através da Lei nº 8.031, de 12.04.90, alterada pela Lei 9.491, de

09.09.1997. Nessa época, são concentrados esforços na venda de estatais produtivas,

pertencentes a setores estratégicos, o que permite a inclusão de empresas

siderúrgicas, petroquímicas e de fertilizantes no PND. Nos anos seguintes, são

incluídos os setores elétrico, financeiro e as concessões das áreas de transporte,

rodovias, saneamento, portos e telecomunicações.

. O terceiro eixo da estratégia demandava a abertura dos mercados nacionais

para a concorrência internacional, única forma de produzir uma modernização de todos

os setores da atividade econômica, conferindo-lhes eficiência e competitividade.

É importante contextualizarmos aqui o Estado como Burocrático em suas três

dimensões mais significativas, como a econômica, a social e a administrativa, conforme

descrevermos a seguir:

61

• Econômica: significativa intervenção do Estado na economia. Objetivava

garantir emprego e atuar em setores estratégicos para o desenvolvimento

nacional.

• Social: conhecido como o Estado do Bem-Estar Social (Welfare State), com

suas políticas públicas na área social, para garantir as necessidades básicas da

população, de forma a garantir ao cidadão os direitos sociais, como educação,

saúde e habitação.

• Administrativa – Estado de modelo burocrático, onde predomina em sua forma

de funcionamento a impessoalidade, neutralidade e racionalidade do aparato

governamental.

No entanto, no novo modelo de Estado, o Gerencial, buscou desde o inicio a

adoção de uma postura empresarial (empreendedora) e focada no aumento de receitas

e no maior controle dos gastos públicos. Esse novo modelo é facilitado pelo momento

em que se encontrava a economia mundial, ou seja, em uma enorme crise, o que não

possibilitava a viabilização da manutenção do Estado de Bem Estar Social, o qual

proporcionava à população uma vasta oferta de serviços como educação, saúde,

habitação, etc. A partir desse momento, começam a ser repensadas quais as

finalidades do Estado, já que esse não consegue mais se manter e, portanto, tem que

ser reformado.

Assim, surge a proposta de devolução ao setor privado, daqueles serviços que o

poder público não tem condições de prestar com eficiência, sobrando ao Estado

aqueles que são exclusivos a ele, como segurança/defesa, diplomacia, fiscalização,

etc.

Já o Centro Latino Americano de Administração para o Desenvolvimento - CLAD

(1998)17, quando expõe os motivos para a reforma do Estado, afirma:

A reforma do Estado tornou-se o tema central da agenda política mundial. A origem deste processo ocorreu quando o modelo de Estado montado pelos países desenvolvidos no pós-guerra, responsável por uma era de prosperidade sem igual no capitalismo, entrou em crise no

17 Este documento foi preparado pelo Conselho Científico do CLAD e aprovado na sua sessão de 14 de Outubro de 1998 pelo Conselho Diretor do CLAD, que é composto pelas máximas autoridades governamentais responsáveis pela modernização da Administração Pública e da reforma do Estado dos 25 países membros.

62

final da década de 70. Num primeiro momento, a resposta foi a neoliberal-conservadora. Dada a imperiosa necessidade de reformar o Estado, restabelecer seu equilíbrio fiscal e equilibrar o balanço de pagamento dos países em crise, aproveitou-se a oportunidade para se propor, simplesmente, a redução do tamanho do Estado e o predomínio total do mercado. A proposta, entretanto, fazia pouco sentido econômico ou político. Depois de algum tempo, constatou-se que a solução não estaria no desmantelamento do aparelho estatal, mas em sua reconstrução.

Sobre a crise do Estado, Matias-Pereira (2010) considera quatro fatores que

foram fundamentais para agravar a crise do modelo do Estado de Bem-Estar: os

crescentes desequilíbrios internos, evidenciados nos déficit fiscais; a espiral

inflacionária, que repercutiu na dinâmica do comércio internacional; o crescimento da

dívida externa; a crise de legitimidade social, impulsionada pelo processo de

segmentação da sociedade em que se confrontaram setores minoritários enriquecidos

com uma crescente classe média.

Frente a essa crise, o CLAD enfatizava que a proposta seria a de construir um

Estado para enfrentar os novos desafios da sociedade do século XXI, que além de

garantir o cumprimento dos contratos econômicos, este deveria ser forte o suficiente

para assegurar os direitos sociais e a competitividade de cada país no cenário

internacional. Dessa forma, entendiam que a Reforma Gerencial aumentaria a

capacidade do Estado em ser eficiente no atendimento de demandas da sociedade.

Contudo, existia uma preocupação em não eliminar ou privatizar o Estado,

deixando somente o mercado como referência, conforme veremos abaixo:

Desse modo, a Reforma gerencial não opta pelos princípios do mercado como o ordenador por excelência dos novos rumos do setor público. A proposta do CLAD é de que o caminho para modernizar a administração pública passa pela redefinição das relações entre a sociedade e o Estado, construindo uma esfera pública que de fato envolva a sociedade e os cidadãos na gestão das políticas públicas. – (CLAD, 1998)

Em síntese, a proposta do CLAD de Reforma Gerencial busca aumentar a

eficiência, a efetividade e a democratização do Poder público e, a partir disso,

fortalecer a capacidade do Estado para promover o desenvolvimento econômico e

social.

63

Conforme o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (MARE, 1995) a

crise do Estado era caracterizada pelos seguintes fatos:

• Como uma crise fiscal, caracterizada pela crescente perda do crédito por parte

do Estado e pela poupança pública que se torna negativa;

• O esgotamento da estratégia estatizante de intervenção do Estado, a qual se

reveste de várias formas: o Estado do bem-estar social nos países

desenvolvidos, a estratégia de substituição de importações no terceiro mundo e

o estatismo nos países comunistas;

• A superação da forma de administrar o Estado, ou seja, a superação da

administração pública burocrática.

Segundo Bresser–Pereira (2006b, p. 264),

O objetivo geral da reforma administrativa será transitar de uma administração pública burocrática para a gerencial. Essa mudança, porém, não pode ser realizada de um dia para o outro. Nem deve ocorrer com a mesma intensidade nos diversos setores. Na verdade, a administração pública gerencial deve ser construída sobre a administração pública burocrática. Não se trata de fazer tábula rasa desta, mas de aproveitar suas conquistas, os aspectos positivos que ela contém, ao mesmo tempo que se vai eliminando o que já não serve.

4.3.1 Reforma do Estado no Brasil:

No Brasil, seguindo esta tendência mundial do questionamento sobre o tamanho

e o papel do Estado, bem como a necessidade de reformá-lo, nos anos 90, o Ministério

da Administração Federal e da Reforma do Estado – MARE propôs um Plano Diretor

da reforma do Aparelho do Estado que definia os objetivos e estabelecia as diretrizes

para a reforma da administração pública brasileira, o qual veremos a seguir:

O novo plano justificava-se uma vez que o Estado estava esgotado, ou seja,

A crise do Estado teve início nos anos 70, mas só nos anos 80 se tornou evidente. Paralelamente ao descontrole fiscal, diversos países passaram a apresentar redução nas taxas de crescimento econômico, aumento do desemprego e elevados índices de inflação. Após várias tentativas de explicação, tornou-se claro, afinal, que a causa da

64

desaceleração econômica nos países desenvolvidos e dos graves desequilíbrios na América Latina e no Leste Europeu era a crise do Estado, que não soubera processar de forma adequada a sobrecarga de demandas a ele dirigidas. A desordem econômica expressava agora a dificuldade do Estado em continuar a administrar as crescentes expectativas em relação à política de bem-estar aplicada com relativo sucesso no pós-guerra. (PLANO DIRETOR DA REFORMA DO ESTADO, 1995, p. 10)

O Plano Diretor objetivava a reconstrução da Administração Pública em bases

modernas e racionais. Mesmo reconhecendo que o modelo de administração

burocrática tinha produzido um grande avanço em relação ao modelo de administração

patrimonialista, uma vez que a administração pública formal, baseada em princípios

racional-burocráticos, se contrapunha ao patrimonialismo, ao clientelismo, ao

nepotismo. Contudo, esse modelo burocrático, ao limitar-se a padrões hierárquicos

rígidos e ao concentrar-se no controle dos processos e não dos resultados, revelou-se

ineficiente para resolver os novos desafios que o país passou a enfrentar diante de

toda a crise do Estado e às novas demandas surgidas com o novo cidadão que exigia

muito mais eficiência do Estado.

Dessa forma, a proposta era a de buscar uma nova maneira de administração

pública, aqui conhecida como Administração Pública Gerencial, a qual embasada em

conceitos atuais de administração e eficiência, voltadas para o controle dos resultados

e descentralizada para poder chegar ao cidadão, que seria um cliente privilegiado dos

serviços prestados pelo Estado. Para tanto, seria necessário reorganizar as estruturas

da administração pública, com ênfase na qualidade e na produtividade do serviço

público e na profissionalização do servidor.

Conforme o Plano Diretor, a reação inicial à crise foi a inadequada proposta

neoliberal, caracterizada pela ideologia do Estado mínimo e só no início dos anos 90

surge uma resposta consistente com o desafio de superação da crise: a ideia da

reforma ou reconstrução do Estado, em vez do estado mínimo proposta inicialmente.

Assim, a reconstrução do Estado trazia em sua proposta os seguintes

pressupostos:

• O ajustamento fiscal duradouro;

• Reformas econômicas orientadas para o mercado, que, acompanhadas de

uma política industrial e tecnológica, garantam a concorrência interna e criem

as condições para o enfrentamento da competição internacional;

65

• A reforma da previdência social;

• A inovação dos instrumentos de política social, proporcionando maior

abrangência e promovendo melhor qualidade para os serviços sociais;

• A reforma do aparelho do Estado, com vistas a aumentar sua “governança”,

ou seja, sua capacidade de implementar de forma eficiente políticas públicas.

O Plano Diretor chama a atenção para a importância de se distinguir a reforma

do Estado da reforma do aparelho do Estado, ou seja, enquanto a reforma do Estado é

um projeto amplo que diz respeito às várias áreas do governo e ao conjunto da

sociedade brasileira, a reforma do aparelho do Estado tem um escopo mais restrito:

está orientada para tornar a administração pública mais eficiente e mais voltada para a

cidadania.

A reforma do Estado deveria ser compreendida dentro do contexto da

redefinição do papel do Estado, o qual deveria deixar de ser o responsável direto pelo

desenvolvimento econômico e social pela via da produção de bens e serviços, para

fortalecer-se na função de promotor e regulador desse desenvolvimento. Além dessas

premissas, o plano propunha a descentralização para o setor público não-estatal da

execução de serviços que não envolvem o exercício do poder de Estado, mas devem

ser subsidiados pelo Estado, como é o caso dos serviços de educação, saúde, cultura

e pesquisa científica.

Conforme o Plano Diretor, no Aparelho do Estado é possível distinguir quatro

setores, a saber:

Núcleo Estratégico : Corresponde ao governo. É o setor que define as leis e as

políticas públicas, e cobra o seu cumprimento. É, portanto, o setor onde as decisões

estratégicas são tomadas. Corresponde aos Poderes Legislativo e Judiciário, ao

Ministério Público e, no poder executivo, ao Presidente da República, aos ministros e

aos seus auxiliares e assessores diretos, responsáveis pelo planejamento e formulação

das políticas públicas.

Atividades Exclusivas: É o setor em que são prestados serviços que só o Estado

pode realizar. São serviços em que se exerce poderes exclusivos do Estado como os

66

poderes de regulamentar, fiscalizar e fomentar, bem como a cobrança e fiscalização

dos impostos, a polícia, a previdência social básica, o serviço de desemprego, a

fiscalização do cumprimento de normas sanitárias, o serviço de trânsito, a compra de

serviços de saúde pelo Estado, o controle do meio ambiente, o subsídio à educação

básica, o serviço de emissão de passaportes, etc.

Serviços Não Exclusivos : Corresponde ao setor onde existe uma parceria entre o

Estado com outras organizações públicas não-estatais e privadas, mas o Estado está

presente na medida em que regulamenta e controla os serviços, já que esse envolvem

direitos humanos fundamentais, como os da educação e da saúde. Além disso, os

recursos produzidos não podem ser transformados em lucros. São exemplos deste

setor: as universidades, os hospitais, os centros de pesquisa e os museus.

Produção de Bens e Serviços para o Mercado: Corresponde à área de atuação das

empresas. É caracterizado pelas atividades econômicas voltadas para o lucro que

ainda permanecem no aparelho do Estado como, por exemplo, as do setor de infra-

estrutura. Havendo privatização, deve existir uma regulamentação rígida.

Em síntese, conforme o documento do Plano Diretor,

[...] o Estado reduz seu papel de executor ou prestador direto de serviços, mantendo-se, entretanto, no papel de regulador e provedor ou promotor destes, principalmente dos serviços sociais como educação e saúde, que são essenciais para o desenvolvimento, na medida em que envolvem investimento em capital humano; para a democracia, na medida em que promovem cidadãos; e para uma distribuição de renda mais justa, que o mercado é incapaz de garantir, dada a oferta muito superior à demanda de mão-de-obra não-especializada. Como promotor desses serviços o Estado continuará a subsidiá-los, buscando, ao mesmo tempo, o controle social direto e a participação da sociedade. (PLANO DIRETOR DA REFORMA DO ESTADO, p. 13)

Outras ações merecem destaque na reforma de Estado brasileiro como, a

criação de Agências Reguladoras que permitiram ao Estado desempenhar o papel de

regular em detrimento do papel do Estado produtor de bens de serviços. A criação

destas agências ocorreu através do Programa Nacional de Desestatização, no governo

Collor e, posteriormente, revogada pela Lei nº 9.491, de 9 de dezembro de 1997.

67

Segundo Matias–Pereira (2010, p. 169),

[...] O que se torna relevante para o advento da atividade regulatória estatal não é mais a supressão da intervenção estatal direta na ordem econômica, mas basicamente: (i)a separação entre o operador estatal e o ente encarregado da regulação do respectivo setor; e (ii) a admissão do setor regulador da existência de operadores provados competindo com o operador público (introdução do conceito de competição em setores sujeitos à intervenção estatal direta).

Atualmente, existem muitas agências reguladoras no Brasil e, entre elas,

destacamos algumas como, a ANATEL (Agencia Nacional de Telecomunicações,

ANVISA (Agencia Nacional de Vigilância Sanitária) ANAC (Agencia Nacional de

Aviação Civil).

.

Bresser Pereira (1997), ao falar da Reforma de Estado define as principais

características da Administração Pública gerencial, também chamada de nova

Administração Pública:

• orientação da ação do Estado para o cidadão-usuário ou cidadão-

cliente;

• ênfase no controle dos resultados através dos contratos de gestão

(ao invés de controle dos procedimentos);

• fortalecimento e aumento da autonomia da burocracia estatal,

organizada em carreiras ou corpos de Estado, e valorização do

seu trabalho técnico e político de participar, juntamente com os

políticos e a sociedade, da formulação e gestão das políticas

públicas;

• separação entre as secretarias formuladoras de políticas públicas,

de caráter centralizado, e as unidades descentralizadas,

executoras dessas mesmas políticas;

• distinção de dois tipos de unidades descentralizadas: as agências

executivas, que realizam atividades exclusivas de Estado, por

definição monopolistas, e os serviços sociais e científicos de

caráter competitivo, em que o poder de Estado não está

envolvido;

68

• transferência para o setor público não-estatal dos serviços sociais e

científicos competitivos;

• adoção cumulativa, para controlar as unidades descentralizadas,

dos mecanismos (1) de controle social direto, (2) do contrato de

gestão em que os indicadores de desempenho sejam claramente

definidos e os resultados medidos, e (3) da formação de quase-

mercados em que ocorre a competição administrada;

• terceirização das atividades auxiliares ou de apoio, que passam a

ser licitadas competitivamente no mercado.

Conforme Abrucio (2006, p. 176):

A crise do Estado afetou diretamente a organização das burocracias públicas. Por um lado, os governos tinham menos recursos e mais déficits. O corte de custos virou prioridade. No que tange à Administração Pública, isso produziu dois efeitos. Primeiro, a redução dos gastos com pessoal, que era vista como uma saída necessária — os discursos das administrações de Thatcher e Reagan representaram o ponto máximo dessa tendência. Segundo, a necessidade de aumentar a eficiência governamental, o que, para boa parte dos reformadores da década de 80, implicava uma modificação profunda do modelo weberiano, classificado como lento e excessivamente apegado a normas. Em suma, considerava-se o antigo modelo ineficiente.

Segundo Matias-Pereira (2010), a reforma e modernização do Estado começam

a ser implantadas quando o modelo de Estado de Bem-Estar entrou em crise no final

da década de 1970. A proposta foi a adoção de um modelo neoliberal-conservador. As

políticas propostas na década de 1980 visavam o restabelecimento do equilíbrio fiscal e

do balanço de pagamentos dos países em crise. Assim, as medidas tomadas foram

orientadas com a única preocupação: reduzir o tamanho do Estado e viabilizar o

predomínio total do mercado. Após algum tempo, constatou-se que a melhor medida a

ser tomada não é o desmantelamento do Estado e sim, a sua reconstrução. Desse

modo, o entendimento foi a necessidade de se construir um novo Estado capaz de

enfrentar os novos desafios vigentes à época. Esse Estado deveria ser capaz de

garantir o cumprimento dos contratos econômicos e ser forte o suficiente para

assegurar os direitos sociais e a competitividade de cada país no cenário internacional.

69

Para o autor, a partir do início da década de 1980, houve uma tendência mundial

em favor da Reforma do Estado, com uma nítida preocupação dos governos em

empreender esforços para modernizar e agilizar a Administração Pública. Esse

movimento pode ser considerado como a construção de novo paradigma da

Administração Pública Gerencial.

Para ele, a Reforma do Estado foi a substituição do modelo burocrático pelo

modelo gerencial. Modelo este, baseado em princípios e conceitos da administração

das empresas privadas como: administração por objetivos, downsizing18, serviços

públicos voltados para o consumidor, pagamento por desempenho, qualidade total,

formas de descentralização, etc.

A retomada de teorias críticas às burocracias estatais e favoráveis aos ideais liberais do Estado-mínimo foi reforçada coma chegada dos governos conservadores na Grã-Bretanha, em 1979 (Margaret Thatcher), e dos republicanos nos Estados Unidos em 1980 (Ronald Reagan). Coube aos governantes daqueles dois países implantarem as primeiras reformas no antigo modelo, logo no início da década de 1980. (MATIAS–PEREIRA, 2010, p. 100)

Bresser–Pereira (2006a, p. 36), ao referir sobre os objetivos da reforma de

Estado, comenta:

Depois da grande crise dos anos 80, na década dos 90 está se construindo um novo Estado. Esse novo Estado resultará de reformas profundas. Tais reformas habilitarão o Estado a desempenhar as funções que o mercado não é capaz de executar. O objetivo é construir um Estado que responda às necessidades de seus cidadãos; um Estado democrático, no qual seja possível aos políticos fiscalizar o desempenho dos burocratas e estes sejam obrigados por lei a lhe prestar contas, e onde os eleitores possam fiscalizar o desempenho dos políticos e estes também sejam obrigados por lei a lhes prestar contas. Para tanto, são essenciais uma reforma política que dê maior legitimidade aos governos, o ajuste fiscal, a privatização, a desregulamentação – que reduz o “tamanho” do Estado – e uma reforma administrativa que crie meios de se obter uma boa governança. Neste trabalho, descrevi as características desta última reforma – a reforma do aparelho do Estado-, uma reforma que propiciará que se estabeleça, no setor público, uma administração pública gerencial.

18 Ver glossário

70

Para o Plano Diretor da reforma do Estado (1995), a reforma deve ser

compreendida no contexto da redefinição do papel do Estado, que deixa de ser o

responsável direto pelo desenvolvimento econômico e social através da produção de

bens e serviços para tornar-se um promotor e regulador do desenvolvimento. Dessa

forma, o Estado deveria reduzir seu papel de prestador de serviços e preocupar-se

mais com o papel de regulador e promotor desses serviços, principalmente dos

serviços sociais como educação e saúde.

Além disso, a proposta de reforma do Estado deveria predominantemente estar

orientada pelos valores da eficiência e qualidade na prestação de serviços públicos e

pelo desenvolvimento de uma cultura gerencial nas organizações.

Na apresentação do Plano Diretor de Reforma do Estado (1995, p. 7) pelo

mandatário da Nação, a proposta do mesmo se caracterizava por:

[...] organizar as estruturas da administração com ênfase na qualidade e na produtividade do serviço público; na verdadeira profissionalização do servidor, que passaria a perceber salários mais justos para todas as funções. Esta reorganização da máquina estatal tem sido adotada com êxito em muitos paises desenvolvidos e em desenvolvimento.

4.3.2 A Nova Gestão Pública- NGP

O aumento das expectativas e das demandas dos cidadãos em uma parcela significativa dos países passou a exigir uma nova forma de orientação na prestação de serviços por parte da Administração Pública para responder a esta crescente exigência da população. A qualidade dos serviços que são ofertados e o nível de satisfação do cidadão/cliente é o referencial na NGP (fortemente embasada em um modelo gerencial), que se apresenta, em escala mundial, como novo paradigma do final do século XX. Essas transformações ocorriam num contexto de globalização e difusão de Tecnologia da Informação, que por sua vez, refletiam profundamente no ambiente de negócios, exigindo das organizações mais flexibilidade nas suas operações.” (MATIAS–PEREIRA, 2010, p. 104)

Conforme o autor (2010), as reformas na Administração Pública, adotadas pelos

países que necessitavam melhorar a eficiência, a eficácia e a efetividade das suas

prestações de serviços, foram denominadas como New Public Management – Nova

71

Gestão Pública (NGP)19, a qual propunha em seu escopo teórico algumas medidas

como:

• Redução do tamanho do setor público;

• Maior autonomia e responsabilidade dos gestores (agência);

• Empowerment (delegação e descentralização);

• Reengenharia;

• Ênfase nos resultados e na necessidade de serem medidos (indicadores de

avaliação);

• Orientação para os clientes;

• Desregulamentação das leis trabalhistas, tornando a contratação de pessoal

mais flexível;

• Qualidade na prestação dos serviços públicos;

• Transparência da informação (accountability).

• Governança20

Bergue (2010, p. 189), também trata do modelo gerencial:

O traço central capaz de diferenciar esse modelo, em relação ao padrão burocrático de gestão, é a acentuada ênfase nos resultados. Enquanto a organização burocrática – veja-se a estrutura geral de Estado vigente – tem sua tônica na definição de processos e rotinas de operação, com o propósito de alcançar um fim específico, e deposita preponderantemente sobre o processo (meios) os esforços de gestão, na perspectiva gerencial essa ênfase é concentrada no alcance dos resultados da ação do poder público. Assim, segundo a lógica gerencial, a administração deve concentrar recursos na gestão, com vistas a resultados, ou seja, o planejamento da ação, a organização dos recursos necessários, a condução do processo (direção) e o controle devem privilegiar, como parâmetro de elaboração, a avaliação, o resultado das ações.

O mesmo autor faz um resumo sobre os principais valores do modelo de

Administração Pública Gerencial, conforme quadro abaixo:

19 Tradução de New Public Management – NPM. No Brasil, a Nova Gestão Pública também foi denominada como Nova Administração Pública - NAP, mas, atualmente, ambas são mais conhecidas por Administração Pública Gerencial.

20 Ver Glossário

72

Quadro 2 - Valores da nova administração pública, tecnologias gerenciais e correspondentes práticas de governo

Valores da nova administração pública

Conceitos e/ou tecnologias gerenciais

Prática adotada administração pública

na

1. Descentralização política: transferência de recursos e atribuições aos níveis regional e local.

Descentralização: delegação de autoridade.

Gestão de PSF, etc.

programas: PACS,

2. Descentralização administrativa: delegação de autoridade e autonomia par agentes.

Empowerment; delegação de autoridade; controle sutil (social).

Delegação de bens e serviços públicos; empregados públicos; terceirização.

3. Organizações flexíveis ao invés de autoritárias e monolíticas.

Downsizing; eficiência; terceirização; reengenharia.

Terceirização; programas de demissão voluntária; privatizações; delegações.

4. Organizações flexíveis ao invés de autoritárias e monolíticas.

Adhocracia; organizações flexíveis; participação; flexibilidade das relações.

Gestão por programas OSCIP’s; organizações sociais; delegação de bens e serviços públicos; empregos públicos.

5. Confiança limitada. Descentralização; delegação de autoridade; controle sutil (social).

Gestão por programas; avaliação de desempenho permanente de servidores.

6. Controle por resultados. Gestão por processos; eficácia gerencial; avaliação de desempenho; accountability; transparência.

Gestão por programas; delegação de bens e serviços públicos; avaliação de desempenho permanente dos servidores; contratos de gestão.

7. Administração voltada para o atendimento do cidadão.

Foco no cliente: gestão pela qualidade; gestão por processos.

Gestão por programas; ouvidoria; prestação de contas; audiências públicas.

Fonte: BERGUE (2010, p.193).

Conforme o autor, os principais valores gerenciais são: racionalidade, primazia

do privado frente ao público, eficiência, produtividade, competências, gestão e

avaliação de desempenho.

4.3.3 Consenso de Washington:

Conforme Paula (2005), o ano de 1989 foi marcado pela reunião realizada

em Washington, com representantes do governo norte americano, altos funcionários

dos organismos financeiros internacionais e economistas de diversos países, reunião

que sacramentou o famoso Consenso de Washington, do qual surgiram as principais

ideias sobre a reforma de Estado e a Nova Administração Púbica - Administração

Pública Gerencial.

Na reunião realizada em Washington, o economista John Williamson fez uma síntese delas, apresentando um receituário de 10 medidas: o

73

ajuste estrutural do déficit público, a redução do tamanho do Estado, a privatização das estatais, a abertura ao comércio internacional, o fim das restrições ao capital externo, a abertura financeira às instituições internacionais, a desregulamentação da economia, a reestruturação do sistema previdenciário, o investimento em infra-estrutura básica e a fiscalização dos gastos públicos”. (PAULA, 2005, p. 113)

4.3.4 O movimento reinventando o governo

Continuando, a autora relata que, concomitante a esse período de propostas

para novas formas de gestão pública, surgiu também nos anos 1990 o movimento

gerencialista e a cultura do management21, originárias da área privada, adaptadas para

o setor público, originando o movimento reinventando o governo, elaborado pelos

consultores David Osborne e Ted Gaebler.

Conforme esses autores, os 10 princípios que levariam a uma reinvenção do

governo seriam:

• o governo catalisador, navegando em vez de remar – a prestação de serviços

públicos não é uma tarefa governamental, mas algo que se deve assegurar aos

cidadãos. Logo, é muito importante a habilidade do Estado em formar parcerias com

a iniciativa privada para realizar privatizações e também mobilizar grupos

comunitários para a prestação de serviços públicos;

• governo que pertence à comunidade, dando responsabilidade ao cidadão em vez

de servi-lo - a transferência de responsabilidades da burocracia para as

comunidades deve ser incentivada, pois estas são mais flexíveis e estão mais

próximas dos problemas;

• governo competitivo, introduzindo a competição na prestação de serviços – a

introdução da competição no setor público é vantajosa porque aumenta a eficiência,

melhora a qualidade do atendimento, além de encorajar a inovação e o

engajamento dos serviços públicos;

• governo orientado por missões, transformando órgãos burocratizados – tal como no

setor privado, o governo deve se orientar por missões tal como empresas privadas

fazem ao utilizar princípios do planejamento estratégico, pois isso ajuda a tornar as

organizações mais eficientes do que aquelas que se orientam por normas e regras;

21 Ver Glossário

74

• governo de resultados, financiando resultados, não recursos – uma constante

avaliação de resultados e desempenhos facilita a distinção entre o sucesso e o

fracasso, além de possibilitar a recompensa dos bons resultados e a correção dos

problemas;

• governo e seus clientes, atendendo às necessidades dos clientes e não da

burocracia – os cidadãos estão cansados da burocracia e querem ser mais

valorizados como clientes. Logo, é recomendável o uso da administração da

qualidade e a criação de sistemas de prestação de serviços mais simples e

transparentes;

• o governo empreendedor, gerando receitas e não despesas – seguindo o espírito

empreendedor, o governo deveria poupar mais, criar meios de gerar novas receitas,

vincular a dotação orçamentária ao desempenho de cada departamento e criar

remunerações variáveis para os administradores públicos;

• o governo preventivo, a prevenção em lugar da cura – os governos devem investir

em programas de prevenção e atuar de forma mais estratégica, planejando suas

ações e a dotação orçamentária;

• o governo descentralizado, da hierarquia à participação e trabalho de equipe – as

organizações descentralizadas são mais rápidas em responder às necessidades

dos clientes e também mais motivadoras para os funcionários, pois permitem a

inserção da administração participativa e do empowerment;

• governo orientado para o mercado, induzindo mudanças através do mercado – os

programas governamentais apresentam uma série de defeitos quando comparados

com similares realizados pelo mercado e poderiam ser mais bem-sucedidos se

fossem oferecidos por ele.

Conforme a autora, Paula (2005, p. 53):

O movimento reinventando o governo está diretamente relacionado com a emergência da indústria do management, que é composta pelos seguintes pilares que se inter-relacionam e se reforçam: as escolas de administração, as empresas de consultoria, os “gurus” empresariais e a mídia de negócios. Durante os anos de 1980 e 1990, os agentes da indústria do management ajudaram a consolidar o movimento das organizações burocráticas e a valorização da cultura do management e a conversão de técnicas e práticas administrativas em “modismos gerenciais”.

75

Para autora, nos Estados Unidos, o movimento gerencialista também contribuiu

para criar um novo imaginário organizacional e social: a cultura do management22.

Essa cultura ficou caracterizada e consolidada, através da produção de livros, revistas

e outros objetos de consumo presentes no mundo de negócios. Além disso, produziu

uma cultura repleta de símbolos organizacionais como os “gurus”, “gerentes -heróis” e

os consultores.

A cultura do management pode ser definida como um conjunto de pressupostos

compartilhados pelas empresas, quais sejam:

• a crença numa sociedade de mercado livre:

• a visão do indivíduo como auto - empreendedor;

• o culto da excelência como forma de aperfeiçoamento individual e

coletivo;

• o culto de símbolos e figuras emblemáticas, como palavras de efeito

(inovação, sucesso, excelência), “gerentes heróis”;

• a crença em tecnologias gerenciais que permitem racionalizar as

atividades organizacionais grupais.

Já no modelo britânico de gestão publica, que teve seu início em 1979, com a

chegada ao poder de Margaret Thatcher, o foco foi direcionado à reprodução de

técnicas administrativas do setor privado e na questão da eficiência, além da

privatização de serviços públicos, bem como a utilização de técnicas e práticas da

administração do setor privado e delegação de responsabilidades públicas para a

comunidade.

Algumas medidas estabelecidas foram a descentralização do aparelho de

Estado, que separou as atividades de planejamento e execução do governo e

transformou as políticas públicas em monopólio dos ministérios; privatização das

estatais; terceirização dos serviços públicos; regulação estatal das atividades públicas

conduzidas pelo setor privado; e uso de ideias e ferramentas gerenciais advindas do

setor privado.

A autora descreve que as recomendações feitas pelo Consenso de Washington

e pelos organismos internacionais, ou seja, as reformas orientadas para o mercado se

transformaram em um parâmetro para a América Latina e foram adotadas como

22 Conceito desenvolvido pela própria autora em conjunto com Wood Jr (2002)

76

modelo de gestão pelo Centro Latinoamericano de Administración para el Desarrollo –

CLAD e outros pesquisadores e centros acadêmicos.

Por fim, para a autora, a reforma gerencial ocorrida no Brasil foi um

desdobramento do ajuste estrutural da economia, que teve início com a adesão do

governo Collor às recomendações do Consenso de Washington para a crise latino-

americana. Inicialmente, o discurso reformista incorporou as recomendações

neoliberais, propondo uma redução do tamanho do Estado brasileiro e outras medidas

de restrição da atuação estatal. Em 1995, o ministro Bresser Pereira apresentou o

Plano Diretor da Reforma de Estado - MARE, que foi debatido nas reuniões do

Conselho da reforma de Estado e também integrou a pauta de discussões da reforma

constitucional no Congresso Nacional.

Assim em 1998, foi aprovada a emenda da reforma administrativa que efetivou

as mudanças estruturais necessárias para legitimar a reforma gerencial. Conforme

Bresser-Pereira, (2006b), a reforma gerencial teve três dimensões: a institucional, a

cultural e a gestão, onde a dimensão institucional se refere à reestruturação do

aparelho de Estado, que previa que as atividades estatais fossem divididas em dois

tipos: Atividades exclusivas do Estado e Atividades não exclusivas de Estado. Já na

dimensão cultural a estratégia era transformar a cultura burocrática do Estado em

cultural gerencial. Por fim, a dimensão da gestão previa a utilização das ideias e

ferramentas de gestão do setor privado criticamente adaptadas ao setor público, como

os programas de qualidade, a reengenharia organizacional, a administração

participativa e outras.

A partir desses parâmetros, foram elaborados pelo governo alguns programas e

projetos como o Programa de Qualidade e Participação, o Programa de Reestruturação

e qualidade dos Ministérios e a implementação de uma nova política de recursos

humanos. Para a implementação de alguns desses programas, a partir de 1998, foram

utilizados ferramentas gerencialistas como o Ciclo de Melhoria Continua (Ciclo PDCA –

planning-doing-checking-acting) formulado no contexto do método Deming de

gerenciamento e o benchmarking, que significa a imitação e reprodução de processos,

técnicas e praticas administrativas bem- sucedidas.

Os programas visavam integrar os cidadãos à ação pública, definir indicadores

de desempenho para avaliar resultados e níveis de satisfação de clientes-cidadãos e

estimular a criatividade, o trabalho em equipe, a cooperação, etc.

77

No Brasil, a reforma de Estado pode ser sintetizada no quadro a seguir com

autoria de (Matias-Pereira, 2010, p. 96)

Quadro 3: Síntese da trajetória das reformas administrativas, modernização

administrativa e reforma do Estado no Brasil

Ações Casos Medidas orientadoras Processos adotados

Reforma Administrativa

DASP O Problema está nos meios. Reforça o papel da burocracia. Princípios – centralização e padronização

Soluções (a burocracia ortodoxa); busca de problemas (burocracia patrimonial). Projeto Maurício Nabuco – implantado de maneira autoritária.

Modernização Administrativa

Administração paralela (Governo JK)

O problema está na adequação entre meios e fins – necessidade de uma burocracia flexibilizada para fins de desenvolvimento respectivamente

Problemas (rigidez e incapacidade) em busca de soluções (grupos executivos e Decreto-lei nº 200, respectivamente). Elabora-se diagnóstico (Comissão de Simplificação Burocrática – COSB; e Comissão Amaral Peixoto, respectivamente); proposições legais; e implementa-se mediante forte liderança top-down (grupos executivos) ou de forma autoritária (Decreto-lei nº 200).

Reforma do Estado

Governo Collor - 1990/1991

Princípios – descentralização e flexibilização. O Estado como problema.

Soluções (desmonte e enfraquecimento do papel do Estado).

Reforma do Estado

Governo FHC - 1995/2002

O Estado como problema (a crise do Estado e da administração burocrática segundo a visão neo- institucionalista econômica). Construção do Estado regulador. Deslocamento entre planejamento e gestão – um plano de adequação do Estado (Plano Diretor) não atrelados a metas de desenvolvimento; um plano de desenvolvimento (PPA 2000 -2003) sem um modelo de adequação do Estado para sua implementação. Orientação dominante do ajuste fiscal obstruiu tanto o Plano Diretor quanto o PPA. Princípios – desestatização, flexibilidade, foco no cliente, orientação para resultados, controle social.

Soluções (nova gestão pública; “administração gerencial”) em busca de problemas (a “administração burocrática”). Elaboram-se planos (PD, PPA) com baixo envolvimento e participação dos atores envolvidos, o que gera baixo grau de implementação. As políticas de gestão se fragmentam e prevalece a orientação do ajuste fiscal.

Revitalização do Estado

O Plano de Gestão Pública do Governo Lula 2003/2006 e

20007/2010

O Estado como solução – papel ativo na redução das desigualdades e promoção do desenvolvimento. A Administração Pública pode e deve ser otimizada para aumentar a capacidade de governo. Princípios – redução do déficit institucional; fortalecimento da capacidade de formular e implementar políticas; otimização de recursos; participação, transparência e ética.

Problemas (diagnóstico institucional da APF) em busca de soluções (um plano de gestão pública). O Plano de Gestão como uma agenda positiva – implementação dos PPAs 2004 –2007 e 2008-2011, inovações gerenciais e equacionamento de problemas estruturais da administração federal. Busca-se elaborar um diagnóstico participativo; debatem-se os problemas; elabora-se um plano coletivo de governo; constrói-se uma rede de implementação com ampla sustentação. Os resultados do primeiro mandato (2003- 2006) ficam abaixo do esperado, em termos de eficiência, eficácia e efetividade, bem como na transparência e ética. Pretende-se no período de 2007-2011 reforçar a governança, com a superação das

78

dificuldades encontradas para se implantarem as políticas públicas, devido à rigidez e ineficiência da máquina administrativa.

Fonte: MATIAS-PEREIRA (2010, p. 96)

4.3.5 Problemas e Contradições da Nova Gestão Pública – A dministração

Pública Gerencial

Para Matias–Pereira (2010, p. 107):

Em termos teóricos, o gerencialismo (NPM/NGP) levanta sérios problemas e contradições. Em primeiro lugar, parte de suposições que não demonstra e que são autênticas falácias, como o pressuposto de que a gestão empresarial é inerentemente superior à gestão pública e de que o papel dos cidadãos pode ser reduzido ao de consumidores. Em segundo lugar, o new public management insiste, por um lado, na descentralização e no desaparecimento dos escalões intermédios, mas, por outro, acentua a necessidade de controle financeiro e coordenação orçamental, o que gera incoerências e contradições no processo de decisão e implementação das políticas públicas. Os governos alijam as responsabilidades de funcionamento dos serviços públicos e, simultaneamente, querem controlar esse funcionamento. Finalmente, muitos serviços públicos são difíceis de serem medidos em termos de eficiência e avaliação de performance, o que torna a aplicação da new public managemet muito problemática.

Já para Hood (1991 apud Matias–Pereira, 2010, p. 107), as criticas a esse novo

modelo de gestão são:

• A primeira crítica é de que o new public managemet não tem qualquer

conteúdo teórico, é uma roupagem vazia.

• A grande consequência do gerencialismo (NPM/NGP) tem sido o aumento

exponencial dos controladores orçamentais e de performance, sem que o

fato se tenha traduzido em melhorias dos serviços públicos, como vem sendo

constatado pelos cidadãos.

• Embora se apresente como promotor do bem comum, o manageralismo, na

realidade, tem servido de veículo para interesses particulares, criando uma

elite de novos gestores públicos, cujos privilégios são muito superiores aos

dos antigos administradores.

79

• Além disso, a new public managemet deve ser entendida como um modelo

de gestão pública de matriz britânica, dificilmente exportável para outras

estruturas e culturas administrativas.

Para Paula (2005, p. 82), os limites da nova administração pública seriam:

• formação de uma nova elite burocrática;

• centralização do poder na instâncias executivas;

• inadequação da utilização das técnicas e práticas advindas do setor

privado no setor público;

• dificuldade de lidar com a complexidade dos sistemas administrativos e a

dimensão sociopolítica da gestão:

• incompatibilidade entre a lógica gerencialista e o interesse público.

Segundo Abrucio (2006), na metade da década de 1980 a discussão em torno do

modelo gerencial tornou-se mais complexa e ganhou novos rumos. A mais importante

mudança foi a tentativa de se constituir de serviços públicos voltados para os anseios

dos clientes/consumidores. Neste momento, surge o Consumerism23 como uma

evolução do modelo gerencial. É nesse ponto que o modelo gerencial sem abandonar

o conceitual empresarial vinculado à eficiência e à busca da qualidade dos serviços

também começa a envolver o aspecto público da administração pública.

Em artigo anterior, Abrucio (1997, p. 24), ressalta algumas questões sobre a

relação entre o governo como prestador de serviços públicos e a população como:

A crítica mais geral é direcionada ao conceito de consumidor de serviços públicos. Em primeiro lugar, com relação à diferença que existe entre o consumidor de bens no mercado e o “consumidor” dos serviços públicos. Como aponta Pollitt, é mais complexa a relação do prestador de serviço público com o consumidor, já que ela não obedece ao puro modelo de decisão de compra vigente no mercado. Aliás, há determinados serviços públicos cujo caráter é compulsório, isto é, não existe a possibilidade de escolha, como provam a utilização em determinados momentos dos hospitais e dos serviços policiais”.

23 Ver Glossário

80

O autor também salienta que, para vários autores24, o conceito de consumidor

deve ser substituído pelo de cidadão, em razão de que o conceito de cidadão é mais

amplo do que o de cliente/ consumidor, uma vez que a cidadania implica direitos e

deveres e não só liberdade de escolher os serviços públicos.

4.3.6 Proposta de um novo modelo de Gestão Pública:

Após muitas críticas ao modelo Gerencial e suas evoluções como o

Consumerism e outros, algum teóricos começaram a propor novos caminhos, seja

reelaborando o modelo gerencial ou, também, incluindo conceitos novos ao mesmo.

Entre estas novas propostas destacamos algumas relevantes.

Conforme Abrucio (2006), o modelo de administração conhecido como Public

servive orientation – PSO, é um modelo que procura encontrar os novos caminhos

abertos pela discussão gerencial, explorando suas potencialidades e preenchendo

suas lacunas. Esta nova proposta dá ênfase aos temas do republicanismo e da

democracia, utilizando-se de conceitos como accountability, transparência, participação

política, equidade e justiça, questões praticamente ausentes do debate no modelo

gerencial. O foco inicial foi a problemática da descentralização e a inclusão das virtudes

políticas da descentralização diferentemente do gerencialismo puro, onde a

descentralização era valorizada como meio de tornar mais eficazes as políticas

públicas, ou no consumerism, onde a descentralização era um meio de conferir aos

consumidores o direito de escolher os equipamentos sociais que lhes oferecessem a

melhor qualidade.

Já na nova proposta, o fundamental é o conceito de cidadão, pois esse tem

conotação coletiva (cidadania como um conjunto de cidadãos com direitos e deveres)

ao contrário do termo consumidor (ou cliente) que tem um referencial individual, que na

maioria das vezes privilegia a proteção dos direitos do indivíduo, ou então dá mais

valor ao mercado do que à esfera pública. Por fim, é a partir do conceito de esfera

pública (domain public) que se estrutura o conjunto de ideias da public service

orientation, sem, contudo, descartar as ideias desenvolvidas no âmbito do public

management. As concepções a respeito de eficiência, qualidade, avaliação de

24 Ver, entre outros, WALSH, 1991; POLLITT, 1990; CLARKE, 1993; STEWART & RANSON, 1988; FREDECKSON, 1992

81

desempenho, flexibilidade gerencial, planejamento estratégico continuam relevantes,

mas há a tentativa de aperfeiçoá-las em um contexto em que o referencial da esfera

pública é o mais importante.

Essas questões, referentes às contradições do novo modelo gerencial, deverão

servir para uma reflexão mais aprofundada sobre esse modelo, principalmente, as que

questionam a simples e indiscriminada importação de técnicas e ferramentas da

administração privada, adaptadas à administração pública sem serem observadas as

peculiaridades desta última. Essa questão é trazida por alguns autores, entre os quais

podemos destacar Bergue e Klering (2010).

No Brasil, as ações mais importantes para a melhoria da qualidade da gestão

pública foram:

• Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade – PBQP, criado em 1990.

• Programa Qualidade e Participação na Administração Pública – QPAP, criado

em 1995, com a Reforma do Estado.

• Programa da Qualidade no Serviço Público – PQSP, foi criado em 1999, no

Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.

• Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização – GESPÚBLICA ,

que unificou o Programa da Qualidade com o Programa Nacional de

Desburocratização, criado em 2005 pelo Governo Federal (Decreto No. 5378, de

23/02/2005).

O Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratiz ação –

GESPÚBLICA , conforme documento da Secretaria de Gestão do Ministério do

Planejamento, Orçamento e Gestão é o resultado da evolução histórica de diversas

iniciativas do Governo Federal para a promoção da gestão pública de excelência, que

objetivam contribuir para a qualidade dos serviços públicos prestados ao cidadão e

para o aumento da competitividade do País. Esse programa buscava a mudança de

paradigma administrativo, ou seja, da administração burocrática para a administração

gerencial.

Essa proposta renovou os paradigmas da administração pública brasileira e

exigiu a busca de novos métodos e práticas de gestão.

82

Assim, houve a necessidade da construção de um Programa de Qualidade no

serviço público que estivesse alinhado com as novas propostas, onde as organizações

públicas tivessem foco em resultados e no cidadão.

Para Ferreira (2009), com a publicação do Documento de Referência/2009, ficou

estabelecido que o GESPÚBLICA é uma política pública formulada para a gestão, que

baseia-se em um modelo de gestão pública singular, que incorpora à dimensão técnica,

própria da administração, a dimensão social, até então restrita à dimensão política.

Assim, pode–se dizer que o GESPÚBLICA busca promover a participação da

sociedade no seu movimento e suas principais características são: ser essencialmente

pública; estar focada em resultados para o cidadão; ser federativa.

Atualmente, está em processo de consolidação um Modelo de Excelência para a

Gestão Pública - MEGP, o qual considera como essenciais os princípios, conceitos e

linguagem que caracterizam a natureza pública das organizações e que impactam na

sua gestão. Visa entender, respeitar e considerar os principais aspectos inerentes à

natureza pública das organizações e que as diferenciam das organizações da iniciativa

privada, sem prejuízo do entendimento de que a administração pública tem que ser

excelente e eficiente.

O Modelo de Excelência em Gestão Pública está alicerçado nos seguintes

fundamentos: Pensamento sistêmico; Aprendizado Organizacional; Cultura da

Inovação; Liderança e constância de propósitos; Gestão baseada em processos e

informações; Visão de Futuro; Geração de Valor; Comprometimento das pessoas; Foco

no cidadão e na sociedade; Desenvolvimento de parcerias; Responsabilidade social;

Controle Social; Gestão participativa.

Juntamente a esse modelo de Gestão Pública, podemos ressaltar outro aspecto

muito relevante para a construção de um novo modelo de Estado. Para tanto,

utilizamos a proposta ou entendimento de Bresser-Pereira (2009, p. 126):

Os cidadãos necessitam de um Estado forte para proteger seus direitos, garantir sua segurança: não só a segurança pessoal e política, mas, também, a segurança resultante de um bom sistema educacional, um sistema efetivo de assistência à saúde, um sistema de renda mínima e um sistema de aposentadoria. Os mercados asseguram uma alocação de recursos relativamente eficiente, mas não protegem os cidadãos. Os mercados globais e a competição generalizada tornam a insegurança ainda mais manifesta. Para atingir a segurança necessária, os cidadãos não têm alternativa se não organizar a ação coletiva na forma de um

83

Estado democrático forte - um Estado que, no século XXI, será social- liberal e republicano.

O autor, em seu livro Construindo o Estado Republicano, inova quando fala de

direitos dos cidadãos, pois além dos direitos do cidadão já conhecidos, como os

direitos civis, políticos e sociais, ele propõe uma nova categoria, a dos direitos

republicanos:

Assim como os cidadãos têm direito à liberdade e à propriedade (direitos civis), direitos de votar e de serem eleitos (direitos políticos), direito ao trabalho, à educação, à saúde e uma renda mínima (direitos sociais), tem direito a que a res pública continue a serviço de todos em vez de ser controlada por interesses privados (direitos republicanos)”. (BRESSER-PEREIRA, 2009, p. 129).

Para Matias–Pereira (2010), a modernização da Administração Pública

deve buscar de forma permanente a estruturação de um modelo de gestão que possa

alcançar diversos objetivos, como a melhoraria na qualidade da oferta de serviços à

população, juntamente com o aperfeiçoamento do sistema de controle social da

Administração Pública, combater a corrupção, privilegiar a transparência, promover a

valorização do servidor público, entre outros.

Quando o autor trata sobre os objetivos e fundamentos principais que devem

constar na reforma do Estado ele propõe:

A reforma do Estado não pode se restringir à reestruturação administrativa e à busca do equilíbrio fiscal. Deve ter como objeto principal a consolidação do processo democrático, a estabilidade econômica e o desenvolvimento sustentável com justiça social. Assim, a priorização da reforma de Estado é uma medida necessária para que o governo possa atender de forma adequada às demandas da sociedade. O atendimento dessa demandas exige que o Estado se torne cada vez mais eficiente, eficaz e efetivo na prestação de serviços públicos, com qualidade e menores custos para a sociedade. (Matias–Pereira, 2010, p. 246)

A modernização da Administração Pública e a reforma do Estado devem sempre

levar em consideração a natureza da esfera pública e a esfera privada, como bem

lembrado por Bresser-Pereira (2009, p. 343), quando enfatiza a necessidade de

84

estarmos atentos às diferenças entre gestão pública e privada, quando da importação

de práticas e conceitos da administração privada para a Administração Pública, porque

na gestão privada o mecanismo de coordenação é o mercado e o objetivo é o lucro, e

na gestão pública o mecanismo é o político e o objetivo é o interesse público. Ele

propõe que, em vez de importar as práticas e conceitos organizacionais de um setor

para o outro, o importante é filtrar e reelaborar criticamente os conceitos e técnicas.

Ao finalizar, utilizamos os questionamentos levantados por Kettl (2006) sobre o

dilema que existe frente à reforma do Estado, pois se por um lado os reformadores

desejam um Estado menor e mais eficiente, inspirado nas regras do mercado e

administrado por profissionais com experiência no setor privado, por outro lado, a

administração pública não é uma simples função de produção e o administrador público

tem que ser sensível ao interesse público.

Lembrando que a regra do mercado não coincide com desejo de promover o

bem público, o autor faz uma advertência e conclui: “Uma reforma genuína deve

procurar sempre o equilíbrio entre os novos mecanismos geradores de eficiência, sem

jamais perder de vista as eternas questões relativas a res publica” (KETTL, 2006, p.

105).

85

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ABRUCIO, Fernando Luiz. Os avanços e os dilemas do modelo pós-burocrático: a reforma da administração pública à luz da experiência internacional recente. In: BRESSER-PEREIRA, L. C.; SPINK, P. K. (Org). Reforma do Estado e administração pública gerencial . Rio de Janeiro: FGV, 2006.

ABRUCIO, Fernando Luiz. O impacto do modelo gerencial na Administração Pública Um breve estudo sobre a experiência internacional recente. Cadernos ENAP . Brasília, n. 10, c1997, 52 p. Disponível em: <www.enap.gov.br/index.php?option=com_docman&task=doc/> . Acesso em: 20 out 2013.

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GLOSSÁRIO: Accountability:

É o conjunto de mecanismos e procedimenos que levam os decisores

governamentais a prestarem contas dos resultados de suas ações, garanindo-se maior

transparência e a aexposição das políticas públicas. (Matias – Pereira, 2010, p.71)

É um termo da língua inglesa, sem tradução exata para o português, que remete

à obrigação de membros de um órgão administrativo ou representativo de prestar

contas a instâncias controladoras ou a seus representados. Outro termo usado numa

possível versão portuguesa é responsabilização .

Accountability pode ser traduzida também para o português, deficientemente,

por "prestar contas". «Accountability» significa que quem desempenha funções de

importância na sociedade deve regularmente explicar o que anda a fazer, como faz, por

que faz quanto gasta e o que vai fazer a seguir. Não se trata, portanto, apenas de

prestar contas em termos quantitativos mas de auto-avaliar a obra feita, de dar a

conhecer o que se conseguiu e de justificar aquilo em que se falhou.

Consumerism:

O consumerism seria uma evolução do modelo gerencial puro, que se

caracterizou principalmente, pelo conceito de cliente/consumidor nos serviços públicos.

Contudo, houve muitas críticas ao conceito, uma vez que existe uma grande diferença

entre cliente e consumidor do usuário dos serviços públicos, pois no último caso, o

modelo de usuário não obedece ao modelo de decisão de compra vigente no mercado.

Formas e Regime de Governo:

Monarquia : O poder do governo é concentrado em uma única pessoa, nessa forma de

governo o poder é repassado hereditariamente, e as propriedades inerentes a

soberania é concebida diante dos poderes especiais, além da tradição existente.

Oligarquia : Corresponde a um regime de governo vinculado ao controle de uma

quantidade restrita de pessoas e essas desfrutam de uma série de vantagens devido a

sua condição alicerçada no poder.

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República : Na República os representantes do povo são eleitos pelos próprios, de

forma direta ou indireta, a principal característica da República é de estabelecer a

justiça e o bem estar comum.

Aristocracia : São governos centralizados nas mãos de poucas pessoas, podendo ser

nobres ou não.

Democracia : Na democracia o representante é escolhido pelo povo através de votação

para que assegure primordialmente a vontade popular. Atualmente a democracia é

dividida em três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário, que devem ser autônomos

e harmônicos.

Parlamentarismo : No parlamentarismo as decisões sofrem maior influência pelo

parlamento, são eles os responsáveis por indicar um chefe de governo e também um

primeiro ministro, sendo assim é possível que o chefe do governo seja um presidente

ou um monarca.

Presidencialismo : No presidencialismo o Presidente e seus ministros compõem o

Poder Executivo, já os deputados federais e os senadores compõem o Poder

Legislativo e por fim todo juiz e magistrado compõem o Poder Judiciário. Os poderes

citados devem controlar uns aos outros de forma equilibrada, o chefe do governo nesse

caso é o presidente.

GesPública:

O Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização – GesPública – foi

instituído pelo Decreto nº 5.378 de 23 de fevereiro de 2005 e é o resultado da evolução

histórica de diversas iniciativas do Governo Federal para a promoção da gestão pública

de excelência, visando a contribuir para a qualidade dos serviços públicos prestados ao

cidadão e para o aumento da competitividade do País. (Secretaria de Gestão –

Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão/Governo Federal).

Governança:

Governança Corporativa

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Governança Corporativa é o sistema pelo qual as organizações são dirigidas,

monitoradas e incentivadas, envolvendo as práticas e os relacionamentos entre

proprietários, conselho de administração, diretoria e órgãos de controle. As boas

práticas de Governança Corporativa convertem princípios em recomendações

objetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor da

organização, facilitando seu acesso ao capital e contribuindo para a sua longevidade.

Instituto Brasileiro de Governança Corporativa - IBGC) Management:

É um modelo de gestão que geralmente está associado ao setor privado e é uma

abordagem racional para a tomada decisões. Os administradores são agentes que

maximizam o uso de recursos para atingir metas organizacionais e alimentar o

crescimento corporativo. Paula, (2005)

Serviços Públicos:

Serviços Gerais ou “uti universi” - são aqueles que a Administração presta sem Ter

usuários determinados, para atender à coletividade no seu todo. Ex.: polícia,

iluminação pública, calçamento. Daí por que, normalmente, os serviços uti universi

devem ser mantidos por imposto (tributo geral), e não por taxa ou tarifa, que é

remuneração mensurável e proporcional ao uso individual do serviço.

Serviços Individuais ou “uti singuli” - são os que têm usuários determinados e

utilização particular e mensurável para cada destinatário. Ex.: o telefone, a água e a

energia elétrica domiciliares. São sempre serviços de utilização individual, facultativa e

mensurável, pelo quê devem ser remunerados por taxa (tributo) ou tarifa (preço

público), e não por imposto.